RONALD CUTLER

O PERGAMINHO SECRETO

Tradução HAROLDO NETTO

ROCCO2008

DEDICATÓRIA

À minha família e amigosAos meus ancestrais

A todas as pessoas que amei e que não estão mais comigo

eA vocês, meus leitores.

CAPÍTULO 1

JOSH COHAN SENTIA-SE ESPIRITUALMENTE ENGRANDECIDO. VISITARA um incontável número de sítios arqueológicos em mais de trinta países, mas Masada era inigualável. Lembrava uma ilha no céu, uma fortaleza no topo de um platô montanhoso no deserto em eterna vigilância do Mar Morto, cerca de quatrocentos metros abaixo. Josh afastou-se da multidão, deslocando-se para um ressalto horizontal de pedra de onde contemplou o céu azul e sem nuvens. Depois baixou os olhos para o Mar Morto e se deu conta de que estava desfrutando da mesma vista que os combatentes judeus tinham há quase dois mil anos, quando se defrontaram com o poderio de Roma. A paisagem não mudara.Fechou os olhos e ouviu o murmúrio do vento. Permitiu-se mergulhar naquele instante, mas, em vez de acalmá-lo, o som aumentou cada vez mais, primeiro transformando-se no agourento sibilo de uma serpente e, depois, graduando para um crescendo de vozes. Como um coro grego, os milhares de vozes cantavam...Do início até o fim: liberdade, compaixão, tolerância, sacrifício...Com os olhos da imaginação, Josh viu um cordeiro sendo levado por um rio de sangue. Labaredas se erguiam da terra, cobrindo as nuvens com um vermelho profundo e vivo.As vozes incorpóreas reverberavam no ouvido de Josh. Quando abriu os olhos, viu as sombras de um número infindável de pessoas no chão.

Um... Um... Um... Um... Eles cantavam.Mas quando olhou para cima a fim de ver quem lançara as nuvens, não havia nada senão o céu e o som do bater das asas invisíveis.Josh já visitara Masada três vezes, e em todas elas as vozes tinham lhe falado. Nunca, porém, experimentara algo como aquilo. Era um homem da ciência, e, embora amasse as histórias que aquele deserto guardava, era treinado para encontrar a verdade em artefatos e ossos. O poder histórico do lugar simplesmente fizera com que sua imaginação lhe pregasse peças. As vozes, claro, não eram reais.Mas, e se fossem? Mesmo que não passassem de um fruto da sua imaginação, poderiam encerrar algum significado além do perímetro seguro do passado antigo?Josh seguiu para o norte rumo a Jerusalém pela Rota 90, uma estrada protegida pelos israelenses. A sua direita, ficava o azul profundo do Mar Morto, e, mais além, iluminadas pelo sol de fim de tarde, as montanhas da Jordânia. À esquerda, o deserto da Judéia expandia-se em uma extensão de colinas e cavernas tão vasta que ocultara os Pergaminhos do Mar Morto por quase dois mil anos. Josh gostaria de saber que segredos ainda estariam enterrados por lá nos dias de hoje.Mas ele estava saindo de licença do seu trabalho de arqueólogo. Aquele ano sabático era exatamente o que precisava: uma pausa restauradora longe da política departamental do museu da universidade. Israel o convidara não

apenas como estudioso, mas também como homem e judeu - mesmo que apenas cultural e não praticante - e chegara a hora de atender o chamado. Sentira-se transformado no momento do desembarque no aeroporto de Tel Aviv. Contemplando o céu azul, sentindo o cheiro do ar, teve a convicção de que tocara em solo sagrado. Ele pertencia àquele lugar. Alguma coisa o vinculava àquela terra.Seus pensamentos retornaram à solene majestade de Masada e sentiu-se caminhando em meio a seus antigos cidadãos. A energia do lugar era inegável, mesmo a tantos quilômetros de distância.Em seu devaneio, a imagem da caverna adiante mal aparece. É o bastante, contudo, para desencadear uma torrente de sonhos relembrados - anos de visões que Josh era incapaz de explicar.Ele cambaleia através do deserto, o silvo ameaçador é cada vez mais alto à medida que a serpente voa e cospe e arremete mais e mais às suas costas. A areia que o cerca, inflama-se e as chamas do incêndio sobrenatural espalham-se adiante e de cada lado de Josh como que a protegê-lo, iluminando seu caminho por entre a brancura ofuscante do meio-dia. Ele segue a trilha na direção das montanhas, mas a Terra parece ter sido virada de cabeça para baixo, com o céu embaixo e as rochas pairando em cima. Logo à sua frente, suspensa nas cordas das labaredas, está a caverna fria e escura, com a boca recurvada dramaticamente para baixo.

Com a cabeça girando e os ouvidos latejando, Josh meteu o pé no freio e o Land Rover derrapou para o lado da estrada. Por sorte, não havia outros carros por perto e ele parou sem mais conseqüências que o barulho do cascalho esmagado pelos pneus. Respirou fundo e tentou firmar as mãos que seguravam o volante. Ainda tonto no minuto seguinte, abriu a porta e saiu cambaleando à procura de terra firme.O sol quente pesava como se estivesse apoiado no seu crânio, e ele dobrou o corpo, a cabeça pendurada e os cotovelos procurando se apoiar nos joelhos. Teve medo de que fosse vomitar, mas a sensação de tontura desapareceu tão repentinamente quanto começara. Respirando com mais facilidade, abriu os olhos e contem-plou, por entre os joelhos, a extensão do deserto mais além.Era exatamente como tinha visto em todas aquelas noites - o céu embaixo, as colinas acima e a insólita forma da abertura propriamente dita. Nunca tinha visto nada assim em Israel nem em parte alguma do mundo.Lentamente, com crescente apreensão, Josh apanhou a mochila no carro e começou a galgar o caminho que levava à caverna. Em questão de minutos, a terra e o suor tinham se misturado em riachos de lama que escorriam na nuca. Em sonhos, já estivera assim bem perto da caverna - perto da entrada, mas nunca dentro. Quando se aproximou da boca, perguntou-se se seria realmente possível entrar. Sempre tinha

acordado antes de dar esse passo. O que aconteceria agora?As terminações nervosas de Josh ficaram eriçadas quando ele atravessou o limiar da caverna. Alguma coisa o esperava lá dentro; sabia disso com certeza, da mesma forma como soubera em cada sonho interrompido. Acendeu a lanterna e dirigiu o facho de luz para a frente, entrando mais fundo no desconhecido. Enquanto andava, seu nervosismo ia se dissipando, substituído por uma sensação de tranqüilidade que raramente experimentara antes. Mesmo com a curiosidade em alerta máximo, o corpo estava inacreditavelmente relaxado.Aprofundando-se mais, viu saliências de rocha projetando-se de todos os lados, prontas para fazer com que invasores imprudentes tropeçassem. Josh não ia tropeçar, contudo. Iluminou a parede à sua frente, revelando uma série de desenhos apenas perceptíveis. Aproximou-se mais, constatou a existência de letras que reconheceu como sendo aramaico e, debaixo delas, uma linha interrompida. Segurou a lanterna a uns dez centímetros da inscrição, mas percebeu que seria impossível traduzir. Havia letras quase que totalmente incompletas, enquanto outros caracteres tinham desaparecido pela ação do tempo e decomposição do material. Josh se concentrou na linha interrompida. Parecia apontar para baixo.Está me dizendo para cavar.Não era um pensamento; era uma convicção.

Josh caiu de joelhos e apalpou o terreno ao pé da parede diretamente embaixo das marcas. Era quase tão sólido quanto pedra - duro demais para cavar - mas sabia que precisava tentar. Pegou uma pá pequena na mochila e começou a sondar a resistente camada superior do solo. Após longos minutos, conseguiu chegar a uns trinta centímetros abaixo da superfície. Foi quando notou a tampa de um objeto enterrado. Josh inclinou-se mais e tocou no que parecia cerâmica. Quando examinou mais de perto, reconheceu imediatamente como um artefato de uma era distante.Em todas as versões do sonho, ele soubera que havia alguma coisa esperando por ele na caverna, embora nunca tivesse entrado nela. O que aconteceria agora?Trabalhou febrilmente, perdendo a noção do tempo. Enquanto cavava, não podia deixar de se lembrar da última escavação onde estivera - a que o impulsionara na direção deste ano sabáti-co. Não era um projeto seu e, na verdade, tampouco se tratava de sua área de competência, mas quando um colega mais antigo faz um pedido especial de ajuda, não é possível declinar. Mesmo com o pouco que sabia a respeito de política universitária, tinha certeza disso antes de ter viajado para o México.Por mais de um mês trabalhara sob o inclemente sol do Iucatã, filtrando a terra, procurando uma relíquia ou artefato qualquer. Era assim a atividade padrão de um arqueólogo - muitas horas de trabalho e poucas descobertas. A

empolgação e o mistério da exploração tornavam a busca compensadora, mesmo que resultasse em nada.Josh tinha a reputação de ser meticuloso mesmo na execução da menor das tarefas, por isso freqüentemente lhe eram atribuídas as tarefas menores. Certo dia, inesperadamente, ele desenterrou a ponta de uma pedra diferente das outras. Cavando com cuidado maior ainda, veio a expor a estátua de um desconhecido deus maia. Seu coração batia forte quando saiu dali; era para aquilo que ele vivia. Delicadamente, embrulhou o artefato que teria uns quinze centímetros e foi procurar Coughlin, chefe da escavação, um tipo rude, mas que tinha estabilidade por integrar o quadro permanente.- Cough - disse, incapaz de ocultar seu entusiasmo -, acabo de descobrir uma coisa que você devia ver.O supervisor estudou o artefato.- Parece autêntico - disse, alisando pensativamente a barba. - Mas eu não ficaria muito entusiasmado antes de voltarmos à universidade e realizarmos uma bateria de testes completa.Seis semanas mais tarde, em uma reunião no mundialmente famoso museu da Universidade de Pensilvânia, Coughlin anunciou a descoberta a um salão lotado de professores, repórteres e estudantes.- Senhoras e senhores — disse, alimentando a emoção do momento -, fiz uma importante descoberta arqueológica: a estátua de um

desconhecido deus maia. O artefato está em excelentes condições e pode nos fornecer indicações sobre o desaparecimento dos maias, já que data do período imediatamente anterior ao desaparecimento de sua civilização.Josh ficou atônito. Coughlin não reconhecera ter sido ele o autor da descoberta. Naquele momento percebeu que seu departamento era tão - senão mais - preocupado com posição social e poder quanto com a ciência. E a constatação o deixou enojado.No dia seguinte, foi ao gabinete de Coughlin.- Quis lhe falar ontem depois do anúncio da nossa descoberta, mas você saiu muito depressa.Coughlin puxou a orelha direita.- O que é que há? Você parece zangado.- Ontem você não me reconheceu como o autor da descoberta do artefato.- Josh - disse Coughlin, condescendente -, você é simplesmente parte de uma equipe, cujo líder sou eu.Josh sentiu o sangue esfriar nas veias.- Uma descoberta desta escala não ocorre com freqüência. Foi algo muito importante para mim.- Seja bem-vindo ao mundo real, Cohan. Quando atingir meu nível, você vai entender.- Isso não vai ficar assim - disse Josh, fervendo de raiva. - Vou procurar a mídia. Eu...Coughlin levantou a mão para interrompê-lo.- Não creio que você tenha entendido. Tenho décadas de experiência. Com a experiência, vem muita influência. Se você fizer qualquer coisa para me prejudicar, posso arranjar para que

nunca mais chegue perto de uma escavação significativa pelo resto de sua carreira.Josh sentiu-se tão furioso que não foi capaz de falar. Sua intuição lhe dizia para não prosseguir, mas ele seguiu adiante assim mesmo, contestando as falsas afirmativas de Coughlin. Não adiantou nada. Coughlin era muito bem protegido pelos seus amigos. Josh sabia que tinha perturbado o status quo e que pelo menos umas poucas pessoas viam Coughlin, agora, como ele realmente era. Presumiu que, embora a universidade não fosse validar suas acusações contra o arqueólogo-chefe, tampouco iria puni-lo tendo em vista suas recentes realizações.Ainda assim, a experiência deixara Josh mais que um pouco desiludido. Talvez devesse ter seguido sua intuição e simplesmente dado as costas a toda aquela confusão. Seu instinto raramente havia lhe falhado, e ele não deveria ter dado ouvidos a seu ego. Do jeito como estava, as condições na universidade se tornaram muito difíceis de suportar. E assim, Josh candidatou-se a um ano sabático num lugar pelo qual sentia ter forte ligação emocional, e foi para Israel.Era interessante que a própria confusão que ele julgara que fosse arruiná-lo houvesse favorecido sua ida para Israel. E se não fosse por Coughlin, talvez ele nunca dirigisse naquela estrada ou conseguisse fazer a conexão com seu sonho.Finalmente o trabalho terminou. Josh calçou um par de luvas cirúrgicas e, com todo o cuidado, levantou o jarro cilíndrico do chão. Embora consideravelmente menor, era similar aos

recipientes que continham os Pergaminhos do Mar Morto, encontrados a não mais que quinze quilômetros daquela caverna.Ele tirou a camiseta, envolveu delicadamente o jarro e, com cuidado, o colocou na mochila. Seria capaz de fazer uma inspeção muito melhor do artefato no hotel do que ali na caverna escassa-mente iluminada.Estava quase escuro quando Josh desceu cuidadosamente a colina na direção da estrada. Ao se aproximar, viu um jipe militar bege parado ao lado de seu Land Rover. Ao lado do jipe, estavam dois soldados israelenses, altos, fortes e sérios. Ambos com as armas apontadas diretamente para ele.- Tire a mochila e ponha no chão - ordenaram. - Depois coloque as mãos na cabeça.Josh obedeceu.- Sou um arqueólogo americano passando férias em Israel - disse, a voz trêmula.O mais claro dos dois soldados caminhou em sua direção, abaixando a arma.- Qual é o seu nome?- Josh Cohan. Sou professor na Universidade de Pensilvânia.- Onde está sua identidade? - quis saber o homem, fortemente armado e agora a trinta centímetros de distância.O coração de Josh bateu mais forte e sua mente disparou. Se eles abrissem a mochila e encontrassem o jarro, iriam confiscá-lo prontamente. Ele não podia perder outra descoberta, especialmente para dois garotos

empolgados que provavelmente destruiriam o artefato tentando descobrir do que se tratava.Com o fuzil do outro soldado ainda apontado para o seu coração, Josh avaliou suas opções e decidiu assumir a atitude do estrangeiro amistoso.- E então, como está o deserto? - brincou, tentando aliviar um pouco a tensão.Porém, nenhum dos soldados respondeu. Ao contrário, o louro passou a arma para as costas e deu mais um passo em frente. Josh pôde sentir seu hálito quente na parte lateral do pescoço.- Documentação - exigiu de novo, ar severo, o suor brilhando nas rugas da testa.- Lamento, mas acho que está no carro — disse Josh, na esperança de que a mentira não fosse muito evidente.Ele ouviu o barulho da trava do fuzil do outro soldado sendo liberada na hora em que foi empurrado contra o Land Rover, pernas abertas e braços no capô. Sem querer chamar atenção para a mochila, esperou até que o soldado se ajoelhasse para revistar suas pernas e tornozelos a fim de arriscar um olhar na direção em que ela se encontrava, totalmente esquecida.De repente sentiu uma mão no seu bolso de trás e, sem explicação, o israelense afastou-se. Josh ouviu barulho de papel dobrado sendo aberto e depois a estática de um aparelho de rádio emissor-receptor. Era o soldado entrando em contato com o centro de comando. Ele tinha achado a licença de motorista de Josh assim como a fotocópia do passaporte que sempre

carregava quando pegava a estrada. Josh ficou assombrado. Tinha certeza de que deixara os documentos na mochila. E ele se orgulhava de ser metódico...Após um silêncio demorado e desconfortável, o rádio estalou de novo e alguém do outro lado se pronunciou.- Ele está limpo.Finalmente o soldado com cara de sefardita abaixou a arma.- Posso pegar minha mochila? - perguntou Josh, da forma mais casual possível.- O que é que tem dentro?- Minhas coisas pessoais e uns suvenires. Quer inspecionar?Era um jogo, mas Josh tinha esperança de que valeria a pena se arriscar. Já fora liberado pelo comando, e agora apostava como os dois garotos estavam tão ansiosos quanto ele próprio para sair do calor e voltar para a estrada.O soldado louro olhou para a mochila por uns segundos e finalmente virou-se para Josh.- Não precisa.Josh pegou a mochila e lançou-a sobre os ombros.Outro jipe militar parou, carregando dois outros soldados israelenses armados.- Está tudo bem aí?- Está — respondeu o de cabelo escuro, que fez um gesto com a cabeça para Josh. - Você pode ir.Ele só esperava que seu alívio não fosse demasiado evidente quando voltou para o carro. O que teria acontecido se eles encontrassem o

jarro na mochila? Nunca os teria convencido a deixá-lo em seu poder. E o que acontecera com Coughlin não seria nada, comparado à perda deste artefato. Josh não era tão bom assim em mensagens vindas do além, mas alguma coisa naquele jarro o vinha chamando havia muitos anos.A lua cheia brilhava quando Josh começou a atravessar o deserto na direção de Jerusalém. Em menos de uma hora estaria de volta ao Jerusalém Pearl Hotel. Lá, finalmente, poderia examinar sua descoberta.Foi ao passar pelo oásis de Ein Gedi que Josh deu-se conta da importância das últimas horas. Seu sonho recorrente não era mais um sonho. Ele o levara ao jarro... Aonde o levaria a seguir?

Capítulo 2

A JANELA DO QUARTO DE JOSH NO HOTEL DAVA PARA A ANTIGA MU-ralha da Cidade Velha. Amava aquela localização, próxima do centro espiritual de três grandes religiões. Estivera ali inúmeras vezes no decorrer dos anos, e em todas as ocasiões sentira-se em casa. Aquele era o lugar de seus antepassados, e seu corpo parecia vibrar de forma diferente. Embora mal pudesse esperar para abrir o jarro, ainda gastou um instante para admirar a cidade antes de começar. Era uma paisagem magnífica. Lamentavelmente, também perigosa. Nunca existira época mais perigosa no Oriente Médio, e aquela cidade estava bem no centro do conflito. Uma tragédia dentro de uma tragédia.

Finalmente Josh pegou o pacote e, com todo o cuidado, retirou a camiseta que recobria o cilindro. Uma espécie de choque elétrico atravessou-lhe o corpo. Havia uma razão pela qual encontrara aquele jarro. Daria agora o primeiro passo no sentido de descobri-la.Segundo a lei israelense, todas as descobertas arqueológicas são propriedade do Estado, e devem ser colocadas sob o controle da Direção de Antiguidades de Israel (Israel Antiquities Authority - IAA), a agência governamental com jurisdição sobre as descobertas arqueológicas. Josh sabia que precisava entregar o jarro e que eles poderiam excluir dos registros oficiais o fato de ter tomado parte na sua própria descoberta. No entanto, não conseguia lembrar nada na lei que estipulasse um prazo para entregar os achados arqueológicos à IAA. Na sua avaliação, o jarro ficara enterrado por milênios. A IAA podia viver sem ele por mais alguns dias.Mais uma vez ele calçou as luvas cirúrgicas e começou a primeira parte do que certamente seria um processo longo e delicado. A tampa do jarro fora lacrada firmemente com cera. Abri-la exigiria o máximo de cuidado, já que quebrar o jarro ou danificar seu conteúdo, mesmo que ligeiramente, seria um pecado imperdoável. Josh pegou uma faquinha na mochila e trabalhou muito devagar, removendo a tampa após diversos minutos.No seu interior, ele encontrou um cilindro de linho. Hesitou por um momento e depois o retirou com cuidado. O linho estava em tão boas

condições que Josh começou a questionar sua autenticidade. Quando os arqueólogos descobriram os manuscritos do Mar Morto, encontraram centenas de fragmentos representando aproximadamente 850 rolos de pergaminho. Em apenas dez casos, mais de cinqüenta por cento do manuscrito original sobreviveu. Um único, o de Isaías, estava completo. Se aquele jarro tinha mais de dois mil anos, como seu conteúdo poderia estar perfeitamente preservado?Cautelosamente, Josh desenrolou a embalagem de linho para revelar um rolo de pergaminho. O cientista que havia nele sentia- se ao mesmo tempo desconfiado e empolgado com as possibi-lidades... No entanto, mais uma vez aquela mesma sensação de tranqüilidade de antes o envolveu. Como era possível sentir-se tranqüilo num momento assim? Quando descobria algo em um sítio arqueológico, explodia de tanta adrenalina. Agora, contudo, sentia-se inexplicavelmente em paz.Desenrolou a primeira seção do pergaminho e examinou de perto. As palavras ali escritas estavam em aramaico, um idioma praticamente esquecido que fora falado naquela região. Josh o aprendera quando estudara para obter seu doutorado em Arqueologia Bíblica. Manchinhas minúsculas cercavam muitas das palavras. Eram os únicos sinais evidentes de antiguidade.Josh acendeu todas as luzes do quarto, pegou a lupa e começou a lenta e árdua tarefa de traduzir. Embora tivesse levado a noite inteira

para completar os primeiros parágrafos, não percebeu a passagem do tempo. As palavras que leu o deixaram tão completamente em transe que, sem dúvida, teria trabalhado dias e dias sem parar.

Eu sou Yehoshua ben Yosef. Nas próximas duas semanas irei ao encontro do meu destino. Escrevo este pergaminho para que saibam a verdade sobre quem sou, o que prego e aquilo em que acredito. Sou um profeta com visões do futuro e escrevo a fim de impedir que ocorra aquilo que mais temo — que meus ensinamentos sejam esquecidos, ou, pior, que eu seja mal interpretado e minha mensagem subvertida pelo contador de mentiras.Utilizo as parábolas para ensinar, mas até mesmo meus companheiros mais próximos têm problemas para compreender o seu significado. Escrevo agora de um modo que o mais simples dos homens e a mais simples das mulheres possam entender e, ainda assim, toque o coração dos mais brilhantes cérebros.Nasci em Nazaré, na Galiléia, durante o último ano do reinado de Herodes o Grande. Meus pais, Miriam e foseph, eram judeus religiosos que obedeciam às leis de Moisés e à santidade da Torá. Cresci estudando cada palavra desse documento sagrado. Quando criança, tive sonhos e visões que me fizeram sentir que minha vida tinha um propósito especial. Rezei todos os dias, estudei a Torá, meditei e aprendi a curar. Minha missão era buscar o caminho de ajudar os

outros, particularmente os pobres, os desesperançados e os espiritualmente famintos. Meu plano era libertar meu povo da ocupação romana e estabelecer um céu aqui na Terra.

Josh afastou-se do pergaminho e esfregou os olhos. Quando olhou pela janela, notou a luz do sol batendo na persiana. Voltou o olhar para o rolo de pergaminho. Tanta coisa mais para traduzir. Tanta coisa mais para descobrir. O que encontrara já era, contudo, de tirar o fôlego.Pudesse ele acreditar no que lera até agora, o autor era o homem conhecido hoje como Jesus Cristo.Andou de um lado para outro no pequeno quarto, incapaz de compreender com clareza o que acabara de ler. Aquele documento devia ser uma fraude. De que outra forma poderia explicar o estado do pergaminho? No entanto, se não fosse um embuste, era o mais monumental achado arqueológico da História.Josh passou as mãos pelo cabelo, tentando ordenar seus pensamentos. Devia procurar a IAA? O departamento encarregado das antiguidades teria os recursos necessários para determinar a autenticidade do pergaminho. Porém, quanto perderia se comunicasse a descoberta? Deixariam que ele fizesse parte da equipe de pesquisa? Receberia crédito pela descoberta?Decidiu não se arriscar. Faria uma cópia do rolo inteiro e depois o entregaria a LAA, sob a condição de que o envolvessem por completo.

Limpou o chão e desenrolou cuidadosamente o pergaminho até que ficasse estendido em toda a largura do quarto. Em seguida, pegou a câmera digital e pôs-se a acioná-la furiosamente. Quando terminou, enrolou cuidadosamente o pergaminho tal como estava e tirou fotos da capa de linho. Por fim, recolocou o rolo no jarro e prendeu a tampa com firmeza.Pegou, então, o laptop, conectou à câmera e transferiu as fotos para o computador. Mesmo que a IAA o mantivesse afastado do rolo propriamente dito, tinha agora sua cópia digital com que trabalhar. Não era muito, mas era o melhor que podia fazer naquelas circunstâncias.Agora que pelo menos o texto estava de algum modo mais seguro, Josh notou que o estômago roncava e se deu conta de que fazia quase 24 horas que não comia. Ainda assim, sentia-se mais exausto que faminto. Com visões de um dia extraordinário reluzindo em sua mente, ele se deitou e caiu rapidamente em um sono perturbado.

Capítulo 3

JOSH ESTÁ DIANTE DE FILAS E MAIS FILAS DE CRUZES. ELE PODE VER centenas de homens em agonia, pulsos amarrados com cordas, pregos enterrados nos calcanhares, deixados para apodrecer sob o fatal sol do deserto.Um grupo de centuriões ri debochadamente, a luz solar se refletindo em seus capacetes e nas

pontas afiadas de suas lanças, enquanto suas vítimas sofrem mortes dolorosas e humilhantes. — Isto é o que vocês, cães judeus, ganham quando desafiam o poder de Roma — provoca um dos soldados, e os outros se juntam a ele com cínico júbilo.Ele acordou banhado de suor. O pesadelo fora real demais. Agora que descobrira o jarro, todos os sonhos ganhavam uma nova dimensão. Qual seria o significado deste? Será que todos os seus sonhos estariam fadados a se tornarem realidade de algum modo?Tomou banho, fez a barba e desceu para o espaçoso saguão do hotel. Passava um pouco das nove horas da manhã. Não dormira muito. Comprou uma xícara de café turco e uma fatia de rugulach no quiosque e dirigiu-se para um telefone público em um canto quieto do salão. Era excelente o sinal do celular, mas ele queria evitar ser rastreado. Queria que as pessoas a quem ia chamar soubessem o menos possível acerca de sua identidade, até que ele considerasse que não havia problema.- Shalom, Israel Antiquities Authority — disse uma voz feminina. - Como posso ajudar?- Shalom. Eu gostaria de falar com a pessoa encarregada da pesquisa arqueológica.- Posso saber seu nome, por favor, e o motivo da sua ligação?- Acho que posso ter descoberto algo que seria de grande interesse do seu departamento de pesquisa.- Um momento.

Josh olhou em torno do agitado saguão do hotel. Muita gente se movimentando, começando o dia como turistas ou trabalhadores. Como seria trabalhar ali todos os dias, tentar ocupar-se num emprego normal e viver uma vida também normal quando o perigo podia atacar a qualquer momento? A cidade de Jerusalém era pacífica a maior parte do tempo. Havia, no entanto, uma sensação de desconforto quando se tomava um ônibus ou se entrava em um shopping center, café ou clube noturno.A esta altura dos acontecimentos, quem morava ou trabalhava em qualquer uma das maiores cidades do mundo tinha, no mínimo, um certo medo inconsciente da violência, mas aqui as chances eram muito maiores de que algo fosse realmente acontecer. Havia uma parte na vida daquelas pessoas que ele, como americano, ja-mais poderia compreender. A coragem necessária para tocar a vida naquelas circunstâncias impressionava Josh profundamente.Após alguns momentos, uma voz com forte sotaque israelense fez-se ouvir.- Alô, aqui quem fala é Moshe Ben Daniel. Com quem estou falando?- Sou um professor de arqueologia americano. Minha especialidade é arqueologia bíblica.- O que posso fazer para ajudá-lo?- Eu gostaria de me encontrar com o senhor - respondeu Josh.- A respeito de quê?

- Eu talvez tenha descoberto um artefato que será de grande interesse para o senhor.A voz do outro lado da linha deu uma risada.- Vocês, arqueólogos americanos, pensam que sabem tudo. Vocês destroem mais artefatos do que descobrem.Josh ficou furioso. Detestava ser estereotipado e sempre tomava cuidados extraordinários em cada sítio que visitava.- Se não está interessado - disse bruscamente -, levarei minha descoberta para os Estados Unidos.- É contra a lei israelense.- Só se o artefato for autêntico, e, como o senhor não está interessado, nunca saberá se é ou não.Moshe suspirou audivelmente.- Ótimo, fale-me a respeito.Josh protegeu o telefone com ambas as mãos em concha para que ninguém que estivesse por perto pudesse ouvi-lo com clareza.- Encontrei um jarro em uma caverna nas proximidades do Mar Morto e ele parece ser do período do Segundo Templo. Se vocês determinarem que é autêntico, poderá ser uma descoberta importante.Houve um momento de silêncio do outro lado, finalmente Moshe perguntou:- Onde está o artefato agora?- Em segurança, comigo.- E onde está você?- Prefiro não dizer até que nos encontremos. E gostaria muito que isso pudesse acontecer o mais rápido possível.

A pausa seguinte estendeu-se mais que a primeira. Por que aquele sujeito hesitava? Se fosse o contrário, se fosse ele, Josh, quem recebesse um telefonema assim, ia querer ver a pessoa em seu escritório imediatamente.- Posso me encontrar com você ao meio-dia.Três horas? Uma verdadeira eternidade.- Onde? Vocês têm escritórios em toda a Jerusalém.- Nossa sede fica no Museu Arqueológico Rockefeller, rua Sultan Suleiman, Jerusalém Leste. Mas você não será autorizado a passar pela segurança se não me disser seu nome.Josh sabia que ele dizia a verdade, mas hesitou por um momento. Teria que confiar naquele homem, antes de vê-lo.- E Josh Cohan - disse. - Eu o vejo lá.Josh desligou o telefone e olhou em torno. Havia mais gente agora do que quando fizera a ligação. Tentou descobrir se havia alguém prestando atenção indevida a ele, e depois percebeu que estava sendo paranóico. Ninguém sabia o que estava em seu poder ou o que aquilo podia significar para o mundo.Por que, então, se sentia tão pouco à vontade?Tinha coisas a fazer antes do encontro. A primeira foi descobrir um cibercafé de onde poderia enviar as fotos do manuscrito para seu servidor seguro, na Universidade. Elas estariam muito mais a salvo lá do que no seu laptop. O Departamento tinha sistemas múltiplos para impedir a ação de hackers, e Josh codificara o arquivo visando proteção adicional.

Depois, com o jarro e o seu precioso conteúdo na mochila, Josh cruzou a cidade para se encontrar com Avner Katz, velho amigo dos tempos de curso secundário. Avner era um cara alto, corpulento e dono de um sorriso largo. Depois do curso secundário, Avner concretizara seu velho sonho de se mudar para Israel e estudar a Torá e o Talmude em uma ieshivá. Já fazia quinze anos que vivia em Israel, e era o proprietário de uma loja de suvenires e antiguidades no Quarteirão Judaico da Cidade Velha.- Josh — exclamou Avner quando ele entrou na loja. — Não vejo você há anos e agora o vejo duas vezes em duas semanas. A que devo esta honra?- Não vejo bastante essa sua cara linda - respondeu Josh, rindo. - Na verdade, estou pensando em me mudar permanentemente para cá a fim de poder vê-lo o tempo todo.Avner deu uma gargalhada.- Você fala como um sujeito que está precisando de uns dólares emprestados.O sorriso desapareceu do rosto de Josh e Avner também ficou sério. Josh inclinou-se na direção do amigo, olhou para os dois clientes que estavam na loja e murmurou:- Na verdade, eu preciso que você me faça um favor.O sorriso de Avner desapareceu quase que por completo.- E eu que pensava que a universidade pagasse bem. Claro. Quanto você precisa?Josh sacudiu a cabeça bruscamente.

— Não preciso de dinheiro. Preciso que você guarde uma coisa em um lugar muito seguro.A expressão do rosto de Avner substituiu as palavras que ele não pronunciou.Josh olhou em torno de novo. Entrara uma nova pessoa na loja. Será que já tinha visto aquele homem antes? Mais uma vez ele afastou a paranóia.— Descobri uma coisa em uma escavação. Pode ser uma fraude, mas, se for verdadeira, será uma descoberta monumental. Não posso guardar no meu quarto e ainda não estou preparado para entregar à IAA.— Vou saber de que se trata?— Explico tudo entre um drinque e outro em breve. Por ora, se você pudesse fazer isto por mim sem perguntas, eu ficaria muito agradecido.Avner deu um tapinha no ombro dele.— Por você, qualquer coisa. Mas é claro que você vai pagar os drinques quando me contar toda a história, não vai?— Tantos quantos forem necessários.— Não faça promessas que não pode cumprir, meu amigo. Vamos, eu o levarei lá embaixo, onde está meu cofre. Tenho algumas coisas valiosas aqui.Josh examinou o salão da loja uma última vez. O homem que entrara minutos antes fora embora. Por que tinha lhe parecido tão familiar? Não conseguira reconhecer seu rosto.Virou-se e seguiu Avner até os fundos da loja.

Capítulo 4

JOSH PEGOU UM TÁXI PARA IR A JERUSALÉM LESTE. A ÁREA FICAVA AO norte da Cidade Velha e ia do Portão de Damasco ao Portão de Herodes, de onde descia até seu destino, o Museu Arqueológico Rockefeller. Construído com dois milhões de dólares doados por John D. Rockefeller em 1927, o museu contém uma das mais importantes coleções arqueológicas de Israel.O táxi seguiu por trechos da Jerusalém Leste que deixaram Josh apreensivo. Sabia que, misturados à vasta maioria de gente pacífica e tranqüila, havia uns poucos tipos com potencial para enorme violência. Ali era onde morava a maioria dos árabes palestinos de Jerusalém e a parte da cidade que eles afirmavam que seria a capital do futuro estado palestino. Era um lugar com um passado violento e quase certamente com um futuro de igual violência.O museu em si ficava perto das muralhas da Cidade Velha em um dos melhores setores da área, ao lado de um bairro árabe próspero na estrada de Nablus. Era um famoso ponto de referência da cidade, construído elegantemente na década de 1930, em arenito branco e rosa, com uma torre octogonal característica e impres-sionante. A edificação combinava lindamente com a arquitetura bizantina, islâmica e arte decô, e era onde ficava a sede da Israel Antiquities Authority.

O Departamento de Antiguidades foi criado em 1948, com a fundação do Estado de Israel. Em 1967, seus escritórios foram transferidos do Museu de Israel para o prédio do Museu Rocke-feller. Com a passagem de uma nova lei em 1990, o nome mudou para Israel Antiquities Authority.Josh sabia que a IAA era responsável pelas antiguidades do país e pelos sítios arqueológicos — escavação, preservação e conservação assim como pelos tesouros antigos nacionais. Sua responsabilidade se estende também à inspeção do comércio de antiguidades e ao combate ao roubo e furtos. A IAA tem, inclusive, sua própria força de segurança com a mesma autoridade da polícia regular. Conhecidos como inspetores, a maior parte dos integrantes dessa força é de ex-membros das Forças de Defesa Israelenses.Embora chefiada pelo Diretor Geral, a IAA era administrada por um conselho de dezesseis membros compostos de ministros do governo e arqueólogos de algumas das maiores universidades de Israel.À entrada do museu, Josh foi recebido por dois guardas que pediram sua identidade e quiseram saber o propósito de sua visita. Eram mais polidos que os soldados que o haviam detido na estrada, mas não menos sérios. Após uma bateria de perguntas, obviamente destinadas a avaliar se ele era um risco, mandaram que passasse. Ele já se acostumara com tantas medidas de segurança para entrar em um prédio ali em Israel, mas hoje, com seu próprio sistema

de alerta já ativado em nível máximo, as precauções o deixaram especialmente inquieto.Esperou quinze minutos até que um homem de meia-idade e já começando a ficar calvo entrou distraidamente na recepção.- Josh Cohan?- Eu mesmo - Josh levantou-se e apertou a mão do homem.- Shalom. Eu me chamo Moshe Ben Daniel. Seja bem-vindo à IAA.- Muito obrigado por me ter atendido.Moshe conduziu Josh até seu escritório, uma sala pequena e sem janela cujos conteúdos pareciam ter sido atirados lá dentro de qualquer maneira.- Por favor, desculpe a bagunça. Tenho andado especialmente ocupado nos últimos tempos. Trouxe o artefato?- Não, não trouxe.Moshe olhou para ele irritado.- Por que não? Pelo que entendi, era esse o objetivo do nosso encontro.- Eu queria ter uma conversa com o senhor primeiro e depois entregá-lo em segurança.O homem resmungou e sentou-se à sua mesa.- Você sabe que, sob a lei israelense, se o artefato for autêntico pertence ao Estado.- Sei disso.- Presumo que saiba também que tem que ter nossa permissão para escavar, coisa que não tem.- Sim, mas eu não planejava fazer uma escavação. Descobri o artefato acidentalmente.Moshe fulminou Josh com o olhar.

- Acho difícil de acreditar.Josh levantou-se e encarou Moshe diretamente nos olhos.- Foi o que aconteceu. Se eu não quisesse fazer a coisa certa, não estaria aqui. Vim procurar o senhor embora esta tenha sido de longe a descoberta mais significativa que já fiz.Josh podia dizer que Moshe não sabia o que fazer dele.- Você nem sabe se o artefato é autêntico - lembrou o homem mais velho.- Sim, é verdade, mas sinto que é. Fortemente, muito fortemente... É por isso que é crítico para mim que eu esteja na equipe de pesquisa que vai determinar sua autenticidade.Moshe olhou para Josh como se ele estivesse falando chinês.- É um pedido e tanto. Raramente temos gente de fora envolvida em pesquisa. Não me lembro de nenhum caso assim em nossos laboratórios.- Lamento mas realmente vou ter que insistir. E devo dizer que representarei uma vantagem para sua equipe. Já fiz datação por isótopo radioativo de carbono e estou familiarizado com todas as principais técnicas de datação, inclusive a tipologia de cerâmica. Nos últimos dez anos tenho trabalhado como professor de arqueologia da Universidade da Pensilvânia.- Bem, já é alguma coisa, pelo menos. Tem um currículo?Josh fez que sim.- Trouxe uma cópia. Tinha a sensação de que o senhor poderia pedir.

Moshe pegou o currículo das mãos de Josh, examinou rapidamente e depois tirou uma pilha de papéis de cima de uma cadeira c fez um gesto para que ele se sentasse.Josh contou a história de como tinha encontrado a caverna, diplomaticamente excluindo a parte dos seus sonhos, e disse a Moshe como havia encontrado o jarro.- Lembra-se de onde ficava a caverna?- Entre Masada e Ein Gedi, a uns quinhentos metros da estrada. Tenho certeza de que sou capaz de encontrá-la de novo.- Se o jarro e seu conteúdo forem autênticos, nós escavaremos a caverna. Onde está o artefato agora?- Em um local seguro.- Você terá que entregá-lo.- Eu sei. E vou entregar assim que o senhor me disser que vou fazer parte da equipe de pesquisa.- Lá vem essa história novamente... - Moshe permaneceu em silêncio por um longo momento, e Josh gostaria de saber o que ele estaria pensando. Sabia que não tinha muita influência ali e sem dúvida nenhuma Moshe também sabia disso. De qualquer modo, lutaria até o fim.Uma batida na porta quebrou o silêncio.- Pai, eu... oh, sinto muito, não sabia que estava acompanhado.Josh virou-se para a cabeça que aparecera na porta. Uma visãochocante. Era aquela a filha do homem? A coisa mais generosa que podia se dizer a respeito da

aparência física de Moshe era que ele era uma pessoa comum. A mulher que acabara de chamá-lo de "pai", contudo, era mais que simplesmente atraente. Tinha grandes e reluzentes olhos azuis, cabelo negro como a asa da graúna, pele azeitonada e lábios lindamente modelados. Não era bela no sentido clássico, mas possuía o que ele tantas vezes se referia como "um rosto interessante". Era algo que se tinha que olhar. Parecia natural, exótica. A figura de Cleópatra lhe veio à mente, mas Josh decidiu que provavelmente era por ter estado muito focado nos tempos bíblicos desde que descobrira o pergaminho.- Tudo bem, Danielle - disse Moshe. - Na verdade, fico satisfeito por você ter passado aqui.Danielle entrou na sala do pai e virou-se para Josh. Ele não costumava notar muito as mulheres, mas aquela era extremamente notável. Mais que qualquer outra coisa, Josh teve a estranha sensação de que já tinham se encontrado antes, mesmo que não conseguisse se lembrar desse encontro.- Danielle, este é Josh Cohan. Ele é um professor de arqueologia americano. Josh, esta é minha filha Danielle.Ela estendeu a mão e ele a apertou. Seu aperto de mão era ao mesmo tempo suave e firme.- Prazer em conhecê-lo, Josh - disse Danielle. - Eu amo os Estados Unidos.Josh sorriu.

- Pode deixar que vou transmitir sua declaração — disse ele, na mesma hora se arrependendo por dizer algo tão fútil. Danielle reagiu com um sorriso polido, embora ele tivesse certeza de que ela devia estar considerando-o socialmente inepto, na melhor das hipóteses.- Danielle também é arqueóloga - disse Moshe. - Trabalhamos sozinhos de vez em quando.Danielle virou-se para o pai.- Por sinal, foi por isso que vim falar com você. Tenho uma atualização dos resultados da escavação dos escombros do Monte do Templo. Volto depois quando você não estiver ocupado.- Não, fique, estou interessado na sua opinião sobre a descoberta de Josh. É um jarro que ele pensa datar do período do Segundo Templo.Os olhos de Danielle se arregalaram, embora Josh um segundo atrás tivesse jurado que isso seria impossível.- É mesmo? Você acha que é autêntico? - Não sei ao certo - ele respondeu - mas minha intuição diz que se trata de algo especial.Mais uma vez Josh relatou a história de sua escavação na caverna e os resultados notáveis. Danielle ouviu atentamente e por fim perguntou:- O que o fez entrar na caverna?Josh respondeu: - Foi pura sorte.- Pura sorte? - ela perguntou, incrédula. E encarou Josh. - Não acredito.Era difícil desviar os olhos dela, mas ele se sentiu agredido pelo seu antagonismo.

- Você não precisa acreditar em mim. Eu encontrei o jarro. O modo como encontrei não é relevante. Se não estiverem interessados, eu simplesmente o levo de volta.Danielle continuou encarando Josh atentamente por mais alguns segundos. Ele imaginou ter detectado um esboço de sorriso nos seus lábios. Ela é fascinante - e acho que vou ficar bem afastado.Abruptamente, ela rompeu o contato visual e virou-se para o pai.- Você viu o jarro?Moshe franziu a testa.- Josh tem algumas questões que acha terem que ser resolvidas antes que ele se disponha a mostrar sua descoberta.Danielle dirigiu-lhe um olhar enviesado. De algum modo, a recriminação dela era muito mais difícil de suportar que a do pai. Josh levantou as mãos como que para se proteger.- Acredito que seja a descoberta mais importante de minha vida. Preciso de alguma segurança de que não serei eliminado do processo.Danielle inclinou-se na direção de Josh como se fosse remover um fiapo do seu colarinho - ou esbofeteá-lo. Então, pôs ambas as mãos nas pernas, olhou para o pai e levantou-se.- Vocês dois precisam decidir essa questão. Precisamos saber se o jarro é verdadeiro.Ela virou-se e foi embora. Como podia ter saído tão subitamente? Não estavam no meio de uma conversa?

- Danielle não tem paciência para regatear - explicou Moshe.- Esta profissão deve enlouquecê-la. As discussões parecem fazer parte do nosso trabalho.Moshe reagiu com um sorriso discreto.- Não me faça começar a discutir isso — ele sacudiu a cabeça e, por um segundo, pareceu perdido em recordações, num gesto surpreendentemente apaziguador. Ao se recuperar, fechou a cara e estabeleceu de novo contato visual com Josh. - Seria difícil para mim convocar minha equipe de pesquisa e propor sua presença como observador, sem primeiro examinar o jarro.Josh observou Moshe desconfiadamente.- Posso levá-lo até onde se encontra o jarro, mas primeiro preciso de sua palavra de que, depois de vê-lo, defenderá minha posição junto aos seus associados.- Se ele parecer tão autêntico a meus olhos como pareceu aos seus, eu farei isso.- Também preciso de sua promessa de que não contará a ninguém - absolutamente ninguém - que vai se encontrar comigo ou que sabe qual é a localização do jarro.Após um momento, Moshe deu de ombros.- Vou tentar.- Tentar não basta.Josh começou a se levantar para ir embora quando Moshe falou:- Está bem, eu não conto a ninguém e, se o jarro passar no meu exame, farei o melhor que estiver

ao meu alcance para convencer minha equipe de pesquisa a permitir que você faça parte do projeto.Josh examinou o rosto de Moshe em busca de sinais de falsidade.- Encontre-se comigo na porta do meu hotel amanhã às nove horas.- O Jerusalem Pearl?Josh não tinha dito onde estava hospedado. Como Moshe sabia? - Foi uma suposição lógica - disse Moshe, respondendo à pergunta que não fora feita.

CAPÍTULO 5

MOSHE CHEGOU PONTUALMENTE ÀS NOVE HORAS DA MANHÃ E ENCONtrou Josh à sua espera na porta do hotel. Josh subiu no carro e eles seguiram para a Cidade Velha, onde orientou o diretor da IAA para estacionar perto do imponente Portão de Sião. Construído em 1540, ele define a linha divisória entre o Bairro Judeu e o Bairro Armênio.Os dois homens dirigiram-se para o Bairro Judeu. Ao caminhar pelas estreitas ruas de pedra, Josh não conseguiu se livrar da sensação de que estavam sendo seguidos. Sempre obedecia aos seus instintos, mas não saberia dizer o quanto confiáveis eles estariam agora, vendo tudo ou como profético ou como potencialmente ameaçador. Não gostava daquela sensação, mas não podia fazer nada contra ela. Parou e deu uma olhada para trás, mas não encontrou nada

de suspeito nos rostos e gestos das pessoas próximas.Seguiram até uma rua cheia de lojinhas e estandes dedicados a vender objetos para turistas. A apreensão de Josh aumentou. Pegou Moshe pelo braço e puxou-o para dentro de uma loja de suvenires.- O que estamos fazendo aqui? - perguntou Moshe, mais perturbado que ansioso.- Acho que alguém nos segue.- Não vejo ninguém.Josh deu uma olhada pela vitrina da loja. Só havia poucas pessoas lá fora - dois padres altos e algumas turistas.- Moshe, padres católicos são comumente encontrados aqui no Bairro Judeu?- A Cidade Velha é o centro religioso do universo. Sacerdotes são encontrados em toda parte. Eu não me preocuparia com dois padres, se fosse você.As palavras de Moshe em nada ajudaram a tranqüilizar Josh. Sua intuição fez-se ouvir com mais intensidade. E se Moshe tivesse vazado a informação sobre minha descoberta às pessoas erradas? Podia confiar naquele homem? Devia confiar? Josh sabia apenas que, se queria fazer com que as coisas prosseguissem, precisava mostrar o jarro a Moshe. Não ia a lugar algum fingindo ser um espião-chefe.Josh conduziu Moshe até a calçada e depois à loja de Avner, a não mais que cinqüenta metros de distância.

Avner cumprimentou Josh calorosamente assim que o viu.- É como nos velhos tempos da escola - comentou, aproximando-se mais do amigo. - Espero que não vá me levar para beber agora. É um tanto cedo.Josh deu uma risada.- Vamos beber mais tarde. Por ora, quero apresentar-lhe Moshe ben Daniel.Avner apertou a mão de Moshe e lhe deu as boas-vindas à sua loja.- Tem mais alguém aqui? - perguntou Josh olhando em torno.Avner examinou atentamente a loja e sorriu.- Não, a menos que esteja escondido atrás de um dos balcões.- Quero mostrar a Moshe o jarro, mas antes preciso ter certeza de que não fomos seguidos.Josh adiantou-se até a vitrina e deu uma olhada. Os dois padres altos ainda andavam sem destino, mas não prestavam atenção a Josh ou à loja. Seus sentidos vibravam, parecendo preocupados com alguma coisa do lado oposto da rua. Virou-se para encarar Moshe e Avner.- Avner, Moshe e eu precisamos ir à sua sala dos fundos. Você pode, por favor, ficar aqui e manter-se alerta contra pessoas suspeitas?- Você é paranóico - disse Avner, rindo. Ele deu um soco de brincadeira no ombro de Josh.- Não - retrucou ele, arrogante -, só cuidadoso.Avner sacudiu a cabeça em sinal de reprovação. Era óbvio que achava divertido o comportamento dramático do amigo, o que irritava Josh um

pouco. Talvez se Avner soubesse do que se tra-tava não se mostrasse tão despreocupado. Claro que isso requeria contar a ele o que estava em jogo.- Esperem aqui - disse Avner, encaminhando-se para os fundos da loja. - Quando eu tirar o artefato de dentro do cofre, chamo vocês.Menos de um minuto depois, ele os chamou. Eles entraram no depósito que servia também de escritório para Avner. Moshe dirigiu-se, decidido, à escrivaninha, puxou uma lupa do bolso do paletó e começou a examinar a superfície do jarro.O exame feito por Moshe foi minucioso, com inspeção de inúmeras características diversas vezes.- Definitivamente ele lembra alguns dos jarros do período do Segundo Templo - disse ele, levantando a tampa. Notou a presença do rolo de pergaminho protegido por uma capa de linho e fechou de novo.- Não vai dar uma olhada no rolo?- Seria melhor agora se eu não tirasse o rolo. Já vi o suficiente para estar interessado que minha equipe examine este artefato a fim de determinar sua autenticidade. Convocarei o grupo esta tarde para uma reunião.- A que ponto o senhor vai convencê-los a deixar que eu me junte a vocês?Moshe fez uma pausa.- Estudei seu currículo e fiz uma pesquisa na Internet por minha conta. Descobri que conhecia inclusive um de seus trabalhos, embora não o

reconhecesse pelo nome. Farei tudo o que estiver ao meu alcance para tê-lo na equipe.Josh assentiu e chamou Avner.- Muito obrigado - agradeceu ao amigo. - Poderia agora fazer o favor de guardar o jarro de volta no cofre?- No cofre? - perguntou Moshe surpreso. - Pensei que pudéssemos levar conosco.- Por ora fica aqui. Quando confirmar que posso participar da autenticação, eu o entregarei na IAA. Mas lembre-se, o senhor não irá dizer a ninguém qual é a atual localização do jarro.Moshe parecia prestes a discutir, mas seus ombros arriaram.- Posso ver que vai ser um desafio trabalhar com você.Josh agradeceu a seu amigo e ele e Moshe saíram da loja. Quando viraram a rua, os dois padres ainda se encontravam nas proximidades de um estande de tecidos. Um deles inclinou-se um pouco para sentir o linho com os dedos e seu crucifixo soltou-se, refletindo a luz do sol da manhã. O padre sorriu placidamente para Josh quando eles passaram, mas, ao enfiar furtivamente o colar debaixo da roupa, o arqueólogo americano notou que o pingente não era parecido com nenhuma cruz que já tivesse visto, mas que era, isto sim, um outro ícone inteiramente diverso.

CAPÍTULO 6

SENTADOS EM TORNO DA MESA DE REUNIÕES NA SEDE DA IAA ESTAvam cinco das melhores cabeças de Israel. Era um grupo eclético, integrado por cristãos, judeus e agnósticos dos três continentes, alguns com décadas de trabalho de campo nas costas, outros ainda se deleitando com a glória de terem se formado no topo da classe na Universidade Hebraica. Todos tinham duas coisas em comum: eram especialistas de classe mundial em arqueologia bíblica e haviam sido escolhidos a dedo por Moshe.Mesmo antes do início do esquema do plano secreto, Moshe sabia que aquele projeto seria sensível. Isto significava que todo o mundo envolvido no projeto não precisava apenas ser brilhante, mas também altamente diplomático. Israel como um todo era um filão arqueológico de primeira linha, mas a área em torno de Jerusalém era particularmente rica e complexa. Ali ficavam alguns dos locais mais importantes do judaísmo, do cristianismo e do islamismo. Era, por outro lado, uma cidade rica de história e abundante em conflitos. Isto significava que qualquer nova descoberta podia afetar as vidas espirituais de uma parte enorme da população mundial. É claro que a maior parte das escavações eram realizadas de forma rotineira, atraindo muitos turistas, mas despertando as paixões apenas de acadêmicos e de leigos mais entusiasmados. Ainda assim, sempre havia a chance de que alguém tropeçasse em uma inscrição com um novo texto da Casa de Davi ou em outros Pergaminhos do Mar Morto.

Tendo em vista as insólitas circunstâncias daquela descoberta e os estranhos eventos dos últimos dias, Moshe sentiu-se satisfeito por estar trabalhando com uma equipe tão sólida - e estrategicamente diversificada. Havia no grupo competência bastante para qualquer eventualidade relacionada com o trabalho propriamente dito, assim como influência dentro das várias comunidades religiosas para reduzir quaisquer tensões políticas. Mais importante, Moshe trabalhava com diversos deles havia anos, e achava que os conhecia intimamente. Quando um grupo trabalha tão unido, pouca coisa pode ser escondida.- Muito obrigado por terem se reunido mesmo tendo sido avisados em cima da hora - disse Moshe, dando a reunião por iniciada. - Chamei vocês aqui porque um jarro antigo foi encontrado perto da Rota 90, pouco mais de três quilômetros ao sul de Ein Gedi. O jarro foi descoberto por um americano professor de arqueologia chamado Josh Cohan.- Qual a razão da reunião? — interrompeu o reverendo Barnaby Smith, um americano protestante que usava uma barba completa e óculos com armação de metal mal ajustados.- O artefato não foi encontrado no mercado negro ou nos locais conhecidos pelas falsificações e fraudes - respondeu Moshe. - Cohan encontrou o jarro acidentalmente, enterrado em uma caverna. Além do mais, ele contém um manuscrito que Cohan afirma estar

em melhores condições do que qualquer Manuscrito do Mar Morto.Padre André Billet, um sacerdote católico com uma reputação ião proeminente quanto sua calvície, levantou a mão rechonchuda.- Estamos de posse do jarro? - perguntou ele, com forte sotaque francês.- Não, e é justamente por isto que nos encontramos aqui. Cohan não vai liberá-lo enquanto não aceitarmos que ele faça parte da nossa equipe de pesquisa.- Jamais deixaremos uma pessoa de fora participar na nossa pesquisa - protestou Alon Paul, um jovem israelense. Sendo filho de um dos maiores benfeitores do museu, ele podia se mostrar defensivo acerca de qualquer pessoa que recebesse tratamento preferencial, e trabalhava duro para conquistar o respeito dos colegas. Esperava que os demais fizessem o mesmo.Michael Berg, outro prodígio israelense, concordou.- Seria um erro terrível - disse, bruscamente. Berg jamais fora tímido para enunciar suas opiniões.Enquanto Moshe examinava a sala, o padre Billet e o reverendo Smith balançaram a cabeça concordando com Michael.- Ele tem que nos entregar o jarro - disse um homem com um imenso bigode de leão-marinho e flamejante cabelo ruivo, aparentando mais ser um vagabundo de praia que um arqueólogo brilhante. Jonathan Levi era o quarto israelense

ali presente. - E a lei. Devíamos simplesmente mandar uns elementos da nossa segurança tirar o jarro dele.Moshe sacudiu a cabeça.- Não penso que seja a coisa certa a fazer neste instante. — Já estive com o professor Cohan em duas ocasiões. Ele não vai desistir do artefato tão facilmente.Berg bateu com a mão na mesa.- Ele não tem alternativa.- Isso pode ser verdade, Michael, mas penso que Cohan possa representar uma vantagem. Ele escreveu diversos trabalhos importantes no nosso campo. E foi também um importante colaborador no livro Tornando possível o impossível.- Eu li esse livro - declarou o reverendo Smith.- Todos nós lemos, baseados justamente em sua recomendação, Barnaby - disse o padre André. Vários outros dos presentes balançaram a cabeça, confirmando.Michael adiantou-se.- Por que você está defendendo a idéia dele se juntar a nós? Mesmo que seja altamente credenciado, o que tem a oferecer que nós já não tenhamos?- Michael, você sabe tão bem quanto qualquer um de nós como é importante a paixão em nosso trabalho. Acredite em mim quando afirmo que Josh Cohan tem abundância de paixão.Alon sacudiu bruscamente a cabeça.

- Não gosto da idéia de adicionar alguém novo à nossa equipe. O que mais você sabe a respeito dele?Mandei o nosso pessoal da segurança investigar. Não há nada em seu passado que sugira quaisquer problemas.Alon ainda não estava convencido.- Mas o que você descobriu sobre ele no que diz respeito a trabalhar com outras pessoas?- Parece que houve conflitos em seu passado. Aconteceu alguma coisa sobre a qual ninguém quis falar antes dele ter vindo para Israel.- Coisa boa não pode ser.Nossos investigadores ficaram com a impressão de que Josh foi envolvido, mas que não foi ele a causa. Ainda assim, você tem razão. Às vezes as pessoas atraem os problemas. O resultado da avaliação do seu background não sugere isso, contudo. O quadro pintado foi de um homem cuja tendência é trabalhar sozinho. Parece que não faz muitos amigos entre os colegas, mas tampouco faz inimigos.Moshe ficou observando enquanto Alon absorvia a informação.- Ainda não estou convencido de que devamos autorizá-lo a integrar nossa equipe - disse ele, com relutância.Moshe já ia responder quando o reverendo Smith interveio.- Eu tenho uma solução. Nós oferecemos fazer do professor americano um observador. Ele pode observar e participar de nossa pesquisa e exames. Se concordar, é claro que teremos que

lhe pedir para assinar um contrato de confidencialidade.Não tenho certeza... - disse Michael, apreensivo.Moshe endireitou-se na cadeira.Cavalheiros, eu vi o jarro. Há uma chance excelente de que seja autêntico. Podíamos continuar discutindo interminavelmente, mas sugiro que adotemos a proposta de Barnaby. Lembrem-se do motivo pelo qual fazemos o que fazemos.Relutantemente, o resto da equipe concordou.

Capítulo 7

JOSH NÃO SE EXERCITAVA TANTO QUANTO GOSTARIA DESDE QUE CHEgara a Israel. Em casa, ele costumava correr dez quilômetros todos os dias, fossem quais fossem as condições atmosféricas. Ali, em férias mas trabalhando, as distrações eram demasiado numerosas. Tendo em vista os acontecimentos dos últimos dias, no entanto, sabia que uma corrida lhe faria bem.Enquanto corria, seus pensamentos vagaram, como acontecia sempre, para seus pais adotivos. Ele acabara de voltar de uma corrida quando recebeu a notícia de que tinham morrido em um desastre de avião. Desde então, nunca mais saíra para se exercitar sem que visse os rostos deles. De muitos modos, aquilo era um presente, uma oportunidade para visitá-los mentalmente com regularidade. E Josh os amara muito e sentia que tinham sido as únicas pessoas do mundo a

verdadeiramente compreendê-lo. Perdê-los representara uma dor que ele nunca fora capaz de liberar, mas vê-los com os olhos da mente enquanto corria era um alívio, por menor que fosse.Invariavelmente, contudo, os pensamentos nos pais o levavam a pensar nas pessoas que tinham desistido dele. Como muitas crianças adotadas, Josh não podia entender por que seus pais biológicos o tinham abandonado. Com freqüência, entretinha fantasias de procurá-los. Fizera alguns esforços em várias oportunidades, mas de nada adiantaram. Parecia-lhe irônico que, como arqueólogo, pudesse descobrir antiguidades escondidas há muito tempo, mas não fosse capaz de encontrar quem lhe dera sua herança genética. Com o tempo, desistira de tentar. Se não estavam interessados em conhecê-lo, ele tampouco se sentia motivado a saber quem eram.Concentrando-se novamente no caminho, Josh manteve um ritmo constante através das ruas de Jerusalém, muito embora as multidões tornassem isso um desafio considerável. O exercício mostrou ser revigorante, as endorfinas liberadas pelo esforço ajudaram a acabar com a tensão e a prudência que o dominavam desde a descoberta do pergaminho.Os bons sentimentos duraram somente até a hora em que retornou para o quarto - e descobriu que tinha sido revistado. Encontrou tudo jogado, como se uma poderosa rajada de vento houvesse soprado ali, desalojando tudo que estava no

caminho. Suas roupas e objetos estavam por toda parte. O laptop fora retirado do estojo e jogado em cima da cama. Justamente quando conseguira convencer-se de que estava sendo paranóico, percebeu que não o fora suficientemente.Sentindo-se furioso e traído, passou a hora seguinte tentando restaurar a ordem do quarto. Para seu espanto, não faltava nada. Mesmo o dinheiro que escondera despreocupadamente na gaveta das cuecas ainda estava lá.Claro que não falta nada, pensou. Eles vieram buscar o jarro e o jarro não está aqui.Josh sentou-se na beirada da cama. Tinha sido estúpido por relaxar quando seus instintos lhe diziam para permanecer alerta. Não cometeria o mesmo erro de novo. Até que fosse confirmada a autenticidade do jarro ficaria tão alerta como nunca.O telefone tocou e seus sentidos imediatamente ficaram aguçados.- Alô? - atendeu Josh, a voz firme e determinada. Não houve nada senão silêncio do outro lado da linha. - Alô — repetiu Josh.- É Josh Cohan quem está falando? - perguntou um homem de voz grave e abafada.- Ele mesmo.- Quero o jarro e seu conteúdo até a meia-noite de hoje. Telefono depois com as instruções de onde deixá-lo.Quando Josh falou de novo estava surpreendentemente calmo.

- Quem é você?- Sou o legítimo proprietário do jarro.- De que você está falando?- Você também tem um papel a desempenhar - disse a voz com frieza e despreocupação. - Seu papel era encontrar o jarro. Esse papel agora terminou.Um arrepio percorreu a espinha de Josh.- Você pode entregar o pergaminho como exigi. Se não o fizer, pode ter certeza de que usarei outros meios para obtê-lo.A linha foi desligada, mas o telefone tocou de novo quase que imediatamente. Josh hesitou - precisava avaliar aquela ameaça e recuperar o autocontrole - mas sabia que precisava ganhar algum tempo para não assumir uma atitude desafiadora tão no início do jogo. Após mais um toque, ele atendeu.- Shalom, Josh, aqui é Moshe.Todas as chances eram de que Moshe estivesse diretamente ligado tanto à invasão do seu quarto como ao telefonema ameaçador.- O que você deseja? - perguntou Josh asperamente.- Telefonei mais cedo e deixei recado. Não recebeu?Josh notou pela primeira vez que a lâmpada que anunciava novas mensagens estava acesa. Moshe devia ter ligado enquanto estava correndo. A última coisa em que Josh pensou ao entrar em casa foi no telefone.- Não vi não.

- Falei com meus colegas e temos uma proposta para lhe fazer. Posso me encontrar com você no seu hotel para discuti-la?- Parece que a sua gente já organizou uma reunião no meu quarto.- De que é que você está falando? - indagou Moshe, obviamente confuso.- Você está me dizendo que não tem nada a ver com a invasão e a revista do meu quarto enquanto eu estava fora?- Seu quarto foi saqueado? - Ou Moshe estava genuinamente surpreso ou era um excelente ator.- Talvez você tenha terceirizado a invasão do quarto. E o que me diz do telefonema com ameaças? Sua participação no telefonema foi maior, certo?- Telefonema ameaçador? Josh, o que está acontecendo?- Você falou com alguém sobre o jarro?- Só com a Danielle - você estava lá quando falei - e os outros membros da minha equipe. E você sabia que eu ia contar a eles. Que história é essa de telefonema ameaçador?- Alguém acaba de me telefonar para dizer que queria o jarro à meia-noite e deu a entender que faria o que fosse necessário para se apoderar dele se eu não obedecesse.- E você acha que eu tive alguma coisa a ver com isso? Josh, eu juro que não sei de nada!Josh prometera a si próprio confiar em seus instintos e, por algum motivo, eles indicavam que Moshe estava dizendo a verdade.

- Alguém mais sabe a respeito do jarro e o deseja com todas as suas forças. Se você quer se encontrar comigo, não pode ser aqui. Tenho certeza de que alguém está de olho em mim. Vou sair do hotel às escondidas e encontrá-lo na entrada da Cidadela, na Cidade Velha, dentro de uma hora.- Tenha cuidado.- Se você não estava envolvido com essa trama antes, Moshe, agora está. Não sou o único que precisa ter cuidado.

CAPÍTULO 8

DEPOIS QUE DESLIGOU, JOSH FEZ O QUE PÔDE PARA DISFARÇAR SUA identidade - não muito, considerando os recursos de que dispunha. Nunca tencionara ser um James Bond. Arqueologia era sua vida, não tramas de aventuras em que as duas linhas se cruzassem. Há uma razão pela qual eruditos decidem ser eruditos, pensou.Pediu à arrumadeira para guardar o laptop no cofre do hotel, pegou o elevador onde fez diversas paradas aleatórias, desceu voando a escada, subiu de novo e finalmente saiu por uma porta de serviço. Não tinha idéia se conseguira ou não iludir as pessoas que o seguiam, mas aquilo era o melhor de que era capaz.A Cidadela ficava perto do Portão de Jaffa da Cidade Velha, próxima ao Bairro Armênio e a menos de trezentos metros da igreja do Santo

Sepulcro, onde os cristãos acreditam que Jesus foi crucificado e ressuscitou.A Cidadela é uma fortaleza estratégica construída por Herodes o Grande há mais de dois mil anos, e é onde alguns estudiosos acham que foi o local da condenação de Cristo. Como muitos locais em Jerusalém, tem profundo significado histórico, o que se pode ver refletido em sua arquitetura: a Torre de Davi, uma de suas cinco torres e única sobrevivente, paira sobre a Cidade Velha como uma força misteriosa, a guardar o passado.O dia estava frio e nublado e a chuva já tinha começado a cair. Havia poucas pessoas na rua normalmente entupida de gente. Josh encontrou Moshe esperando junto à porta do Museu da Cidadela.- Shalom - disse Josh, balançando ligeiramente a cabeça ao se aproximar de Moshe.Moshe virou-se, olhou enviesado para Josh e só então se aproximou.- Shalom, Josh. O que você fez com seu cabelo?- Eu estava tentando... Oh, esquece.- Que história é essa de telefonemas ameaçadores e gente seguindo você?Josh ainda não estava inteiramente certo de que podia confiar em Moshe, mas a expressão nos olhos do homem parecia genuína. Conduziu-o até um canto reservado.- Alguém quer o rolo e parece que o deseja muito mesmo. Não sei por quê.- Isto é loucura. Durante todos os anos em que trabalho com isso nunca vi nada parecido.

Não tenho razão para acreditar que a voz que ouvi hoje estivesse apenas tentando me intimidar. O sujeito falava a sério - e não sei ao certo até onde ele estaria disposto a ir. Você tem certeza ilc que ainda deseja envolver-se com isso?Moshe o encarou de perto.- Como você próprio já disse, na realidade não tenho uma alternativa, tenho?- Não, suponho que não - respondeu Josh, com um sorriso amargo. Nesta hora percebeu um brilho de emoção nos olhos de Moshe. Estavam naquilo juntos. - O que você queria me dizer? - perguntou.- Meus colegas e eu concordamos em que você pode observar nosso trabalho de pesquisa. Terá acesso a todos os nossos procedimentos de pesquisa e cópias de todas as nossas decisões.- Isso significa que serei incluído em tudo, certo? Preciso acessar todos os procedimentos e testes, assim como preciso ter acesso a todos os documentos e informações que você e suas colegas receberem.- Combinado. Se você vai ter que lidar com visitantes ameaçadores, o mínimo que podemos fazer é nos assegurar de que seu envolvimento com a pesquisa seja total.Moshe adiantou-se e apertou a mão de Josh. No instante em que o fez, Josh percebeu um movimento qualquer com o canto do olho.- Alguém está nos observando - murmurou.Moshe virou a cabeça.- Como é que você sabe?

- Eu vi algo. Vamos - Josh começou a descer a rua.- Para onde estamos indo?- Para longe daqui. Precisamos descobrir se estamos mesmo sendo seguidos.- Tenho uma idéia.Moshe passou a conduzir Josh pelas ruas estreitas, até que pararam em um quiosque e Josh notou um homem muito alto, vestido inteiramente de preto, parando a não mais de quinze metros deles. Quando pararam de novo, o homem continuava perto.- Por que mandariam um gigante desses nos seguir? - perguntou Josh em voz alta quando voltaram a andar. - É quase como se quisessem que eu saiba que estão nos vigiando.- Querem deixar bem claro que estão falando a sério.Josh deu uma risada melancólica.- Podiam ter se poupado esse trabalho.Moshe segurou o braço de Josh.- Venha, posso terminar com isso agora - ele levou o americano para uma loja que vendia reproduções de artefatos. - O dono é meu amigo.Joel era um sujeito baixinho de cabelos grisalhos e rosto oval. Tinha aparência de quem carregava um peso de quinhentos quilos de lixo sobre os ombros.- Temos que dar o fora daqui - disse Moshe a Joel. - Estão nos seguindo.- Seguindo vocês? Por quê?- Explico outra hora.

Joel obviamente percebeu a urgência na voz de Moshe, porque os conduziu bruscamente para os fundos da loja. Abriu uma porta que dava em uma escadaria que os três homens desceram. Uma porta de madeira grossa no fim da escada abria para um túnel escassamente iluminado.- Vocês vão sair na rua - disse Joel, dando uma olhada na escada. Josh seguiu seus olhos. O enorme homem de preto não estava lá. Será que Moshe tinha razão? A presença daquele sujeito seria simplesmente uma tentativa para confirmar a seriedade do telefonema dado anteriormente? Se fosse, o objetivo fora atingido.Moshe e Josh caminharam uns quinhentos metros antes de chegarem à abertura do túnel perto do Portão dos Mouros. Não havia ninguém atrás deles e nenhum dos transeuntes parecia estar vigiando. Deixaram a Cidade Velha pelo portão e Moshe fez parar um táxi.- Você pode vir comigo até a IAA? - perguntou ele, entrando no táxi. - Quero examinar algumas coisas com você.- Posso estar lá daqui a uma hora. Tenho umas coisinhas para resolver antes.Moshe gemeu quando sua secretária lembrou que ele tinha um encontro marcado com Alexander Paul. Embora fosse uma pessoa agradável e doasse imensas somas de dinheiro para os museus de Israel, ele esperava ser tratado como um dignitário. Moshe não eslava disposto a fazer firulas a ninguém naquele dia. Tudo em que ele realmente queria pensar era naquele rolo de pergaminho.

Meia hora mais tarde, contudo, Paul apareceu na sua porta.- Moshe, que bom ver você. Espero não o estar incomodando demais.- Nunca, Alexander, nunca - disse Moshe, levantando-se da cadeira atrás da escrivaninha para cumprimentar o benfeitor. - Sempre tenho tempo para você. Por favor... sente-se.Moshe esperou que Paul se acomodasse e depois sentou de novo. O homem certamente era um tipo peculiar. Tinha mais de um metro e oitenta, um corpo atlético e cintilantes olhos azuis. Aparentava quarenta e muitos anos ou cinqüenta e poucos, embora Moshe soubesse que era muito mais velho. Segundo Moshe, uma fortuna incalculável era a coisa mais perto possível da Fonte da Juventude.- Posso lhe servir algo, Alexander?- Um cafezinho seria uma maravilha. Eu adoraria especialmente um cappuccino, se fosse possível.Paul sabia muito bem que era possível — só não era conveniente. Servir-lhe um cappuccino significaria mandar a secretária à sala de refeições do museu. Moshe telefonou para ela e fez-lhe o pedido. Depois se voltou para o bilionário.- Como posso ajudá-lo hoje, Alexander?Paul inclinou-se um pouco para a frente.- A exposição das Descobertas da coleção do Monte do Templo abre no Museu de Israel dentro de poucas semanas, não é mesmo?

- É verdade. O museu está fazendo bastante publicidade. Espero que você esteja planejando comparecer à inauguração de gala.- Sem dúvida alguma. É claro. Não perderia de jeito nenhum. - Paul hesitou. - O problema diz respeito aos britânicos.- Os britânicos?Paul simulou constrangimento, o que Moshe sabia que era o prenúncio de um dos seus "pequenos" pedidos.- Meus sócios em um enorme empreendimento imobiliário que concluí recentemente. Vou ter um lucro imenso com esse negócio e você sabe qual é o destino favorito que dou aos meus lucros. Antevejo nisso aí um excelente negócio para nós dois. Seja como for, os britânicos vêm a Jerusalém para assinar os contratos. Sei que eles adorariam ver a exposição do Monte do Templo, mas o problema é que vão chegar e sair alguns dias antes da inauguração. Há alguma chance de você me ajudar com isso?Moshe não podia acreditar que tivesse que lidar com uma coisa tão banal quando podia estar trabalhando para decifrar o pergaminho. Ainda assim, manter alguém como Alexander Paul feliz tornava possível para ele fazer partes interessantes do seu trabalho.- Tenho certeza de que posso arranjar alguma coisa.- Excelente - disse Paul, levantando-se. - Vou mandar minha secretária ligar com os detalhes.- Sim senhor. Qualquer coisa que queira. Moshe sentia-se frustrado, mas não falou nada.

- Por favor, fique à vontade - disse, representando o papel esperado dele.Paul virou-se na direção da porta.- Não vai querer esperar seu cappuccino? - perguntou Moshe, sabendo de antemão a resposta.- Lamento, mas não vai ser possível. Por favor, agradeça à sua secretária quando ela voltar, sim?Moshe levantou-se para acompanhar Paul. Quando chegaram à porta, Josh começava a entrar, quase esbarrando no bilionário. Os dois homens pararam a menos de meio metro de distância um do outro.- Alexander, permita-me apresentar você a Josh Cohan. Ele está nos trazendo algo interessante. Josh, este é Alexander Paul.Paul inclinou-se na direção de Josh e apertou sua mão. O homem tinha um aperto de mão fortíssimo e Moshe viu Josh estremecer ligeiramente, apanhado de surpresa.- Vou ter notícias desse "algo interessante"?Josh olhou para Moshe e depois para Paul.- Não sei se já estamos prontos para compartilhar isto.Paul riu jovialmente. Soltou a mão que apertava a de Josh e colocou-a no ombro de Moshe.- Meus milhões não compram mais o que compravam antigamente.Moshe deu uma palmadinha no braço dele.- Se este artefato for autêntico, providenciarei uma exibição particular para você, Alexander.

O milionário despediu-se de Moshe batendo em seu ombro e dirigiu-se para a porta.- Vou esperar pelo seu chamado com ansiedade. Prazer em conhecê-lo, Josh. Continue fazendo descobertas.- Sim, prazer em conhecê-lo também. Muito obrigado, tentarei.Paul sorriu, acenou e prosseguiu para o corredor.- Alexander Paul ajuda a manter em evidência alguns dos museus mais importantes de Israel - disse Moshe a Josh enquanto os dois observavam o milionário se afastar.- Ele realmente consegue exibições particulares?- Considerando as doações que faz, ele pode ter o que quiser. E nunca deixa que nos esqueçamos disso nem por um segundo. Venha. Vamos tentar fazer alguma coisa significativa.A sala de Moshe continuava tão desorganizada quanto da última vez que Josh a vira, algo que praticamente deixou passar despercebido.- Não consigo tirar da cabeça aquele telefonema, assim como aquela pessoa que nos seguiu. Quem desejaria tão intensamente o pergaminho?- Poderemos compreender melhor depois que tivermos uma chance de examinar o manuscrito. Por falar nisso, quando você vai trazê-lo?- Assim que eu pegá-lo. Você tem um telefone de onde eu possa ligar para o Avner?Com um gesto, Moshe indicou o aparelho que estava em cima de sua mesa.- Use o meu. Aperte o terceiro botão. Volto em um minuto.

Lamentavelmente, Avner não atendeu o telefone quando Joshligou. Josh pensou um pouco para ver se valia a pena deixar recado, mas concluiu que não tinha escolha.- Olá, Avner, aqui é o Josh. As coisas estão ficando um pouco assustadoras. Você tem que tomar muito cuidado. Alguém quer aquela coisa e a impressão que tenho é de que estão dispostos a matar para se apoderar dela - Josh consultou o relógio. - Vou me encontrar com você na sua casa às oito horas depois que a loja fechar. Não deixe ninguém entrar, a menos que seja eu.Dois minutos depois que Josh desligou, Moshe e outro homem entraram na sala.- Josh, este é Michael Berg. É um dos meus colegas que vai trabalhar conosco no projeto.Michael sorriu.- Congratulações pela descoberta. Quando vamos vê-la?- Amanhã - respondeu Josh. - Isto é, se eu ainda estiver respirando.Michael arregalou os olhos.- Como?- O documento no interior do jarro é uma coisa muito poderosa. Evidentemente não sou o único que pensa assim, muito embora, tanto quanto seja do meu conhecimento, seja o único que o viu. Está acontecendo alguma coisa aqui que eu ainda não consegui compreender - Josh respirou fundo e considerou os obstáculos que tinha à

frente. - Só espero viver o bastante para des-cobrir o que seja.

CAPÍTULO 9

QUANDO SE ACOMODOU NO BANCO DO PASSAGEIRO DO AUTOMÓVEL que Moshe conseguira para levá-lo de volta ao hotel, Josh ficou espantado por ver Danielle ao volante. Vestida com short cáqui que deixavam à mostra suas pernas compridas e uma blusa branca folgada, era, inquestionavelmente, o motorista mais atraente que já tivera.Não estavam, contudo, sozinhos. No banco de trás havia um sujeito de cabelos escuros que era o exemplo vivo da contradição de uma carinha de bebê com músculos volumosos, sorriso em-plastrado de orelha a orelha. Josh teve a impressão de que o rapaz sabia alguma coisa que ele não sabia, mas seu desapontamento transformou-se rapidamente em apreensão quando notou que o Mister Músculo segurava uma Uzi.Danielle pôs a mão quente sobre a de Josh.- Josh, esse aí é o Dov. Faz parte da segurança e foi designado para proteger você.Josh apertou a mão de Dov cautelosamente.- Eu agradeço, mas não preciso de proteção.- Claro que precisa - contrapôs Danielle enfaticamente. — Sei o que está acontecendo. Sua vida está em perigo.Quando ela soube da ameaça? Com que grau de intimidade trabalhava com o pai?- Eu sou capaz de me proteger...

Mas Danielle o interrompeu.- Não penso que você compreenda aquilo contra o que está se defrontando. Provavelmente não devo lhe dizer isso, mas acreditamos que alguém de dentro da IAA esteja tentando liquidar o projeto.- Não se trata exatamente de uma novidade para mim.- Josh, a pessoa responsável pela invasão do seu quarto certamente é alguém da equipe de pesquisa do meu pai.Ela achava que ele era burro?- Repito, não é nenhuma novidade. Já tinha pensado nisso. Aliás, não me custou muito esforço.Danielle franziu a testa.- Então aqui está uma coisa que você ainda não sabe. Como eu disse, provavelmente não sou autorizada a lhe contar isso, mas você devia saber agora o que está no campo oposto. Nos últimos seis meses, alguns artefatos foram roubados. Acreditamos ter sido obra de alguém de dentro. Pusemos algumas pessoas da IAA sob vigilância. Essas ameaças contra você podem fazer parte de algo mais amplo e, se forem, você se defender está completamente fora dos limites de suas possibilidades.Se a intenção de Danielle era aumentar a ansiedade de Josh, estava fazendo um excelente trabalho.- O que você e o Dov podem fazer por mim que eu próprio não possa?Danielle apontou para o banco de trás.

- Bem, disparar uma Uzi com precisão letal, por exemplo. A menos, é claro, que você seja um atirador de elite com um carregamento de munições que contrabandeou de seu país - os olhos dela reluziram. - O seu CV não dizia nada disso.Josh olhou para Dov, ou, mais especificamente, para a arma dele. Seria bom ter aquilo ao seu lado. Supondo, é claro, que ele estivesse do seu lado.- Josh, você tem que confiar em nós - disse Danielle, parecendo ter lido seus pensamentos.- Pode me dar uma boa razão?- Porque estamos com você nesta encrenca.- Como posso saber disso? - perguntou ele bruscamente, permitindo que a tensão dos últimos dias aflorasse. Mas arrependeu-se imediatamente. - Falando sério, Danielle - disse, em um tom mais suave. - Como posso saber que vocês estão realmente comigo?Mais uma vez ela apertou a mão dele.- Você pode saber porque nós acreditamos nas mesmas coisas. Nós amamos a arqueologia. A arqueologia é levada muito à sério neste país. Faz parte de nossa herança. As descobertas podem mudar nossa história, nosso destino.Foi um belo discurso, pronunciado apaixonadamente, mas não soou verdadeiro.- Se eu fosse acreditar em todo o mundo que ama a arqueologia, não estaria nesta situação em que me encontro agora. Imagino que o trabalho feito por alguém de dentro de que me

falou foi feito por quem também ama a arqueologia.Danielle recostou-se e expirou ruidosamente.- Você está certo, Josh. Não pode confiar em mim, em Dov, no meu pai e tampouco em qualquer outra pessoa da IAA. Esqueça tudo que falei.Josh virou-se e deu uma olhada em Dov. O sorriso do homem desaparecera e ele agora olhava estoicamente pela janela. Virou-se depois para Danielle. Podia realmente confiar nela? Queria confiar por um sem-número de razões. Seu instinto lhe dizia que não era ela o inimigo.- Tenho andado um pouco tenso nos últimos tempos - disse, encabulado.Ela fechou os olhos por um momento e depois o encarou.- Nem cheguei a perceber - disse.Josh deu uma risada, ansioso por mudar de assunto e esquecer o perigo por algum tempo.- Sugiro não irmos para meu hotel - disse. - A que horas fecha a igreja do Santo Sepulcro?Danielle pareceu ficar um pouco confusa com a pergunta.- Acho que estão cumprindo o horário de verão, o que significa que não fecham senão à meia-noite.- Seria bom ir lá.- Então nós iremos. Talvez eu possa lhe mostrar uma ou duas coisinhas. Você já caminhou pela muralha de onde se vê a Cidade Velha?- Muitas vezes.

- Mas nunca contemplou a paisagem segundo minha perspectiva - ela girou a chave na ignição.- Estou em suas mãos - concordou Josh, sem realmente ter a menor idéia do que ela quis dizer.

As muralhas da Cidade Velha foram construídas por Suleiman, o Magnífico, no século XVI, e eram um ponto de observação perfeito de onde se contemplar algumas das paisagens mais dramáticas da cidade.Danielle apontou na direção do Monte do Templo, com seu Domo Dourado da Rocha montando guarda sobre Jerusalém.Debaixo de todo aquele brilho - disse ela - jaz a rocha onde Abraão quase sacrificou seu filho Isaac e onde, num sonho, o profeta Maomé ascendeu ao céu no seu cavalo. É considerada santa pelos fiéis de três religiões que devotaram milhares de anos e milhões de vidas em conflito a despeito de sua herança espiritual comum. Até mesmo os romanos sentiram o poder desse lugar. Depois de destruírem Israel e o Segundo Templo, construíram seu próprio templo naquele mesmo lugar e dedicaram ao culto de Júpiter. Mais tarde, no sexto século, tornou-se uma igreja cristã. Aí então, em 638, os muçulmanos conquistaram a cidade, destruíram a igreja e a substituíram, em 691, por um templo com a estrutura que você vê agora. Tanta destruição e criação ali, bem na nossa frente... Se ao menos conseguíssemos descobrir um modo de dar sentido a tudo isso.

As informações não eram novas para Josh, mas ouvir como Danielle as expressava fez com que ele se sentisse do mesmo modo. A cidade tinha um significado muito profundo para ela, algo que ele podia apenas começar a entender. Observou a expressão animada do seu rosto quando ela continuou o giro.O que me interessa mais, Josh, é o que jaz debaixo do Monte do Templo. Acredito que haja literalmente camadas sobre camadas de história debaixo do sítio arqueológico, uma fortuna de descobertas esperando para serem examinadas. Espero ser capaz de explorar essa área um dia.- Por que não agora? - perguntou ele. Sabia qual era a resposta, claro, mas algo lhe dizia que aquela mulher era capaz de conseguir fazer praticamente tudo o que quisesse.- Não posso - disse Danielle. - E político demais - ela apontou para uma parede mais abaixo. - Está vendo os buracos?- Estou.- São cicatrizes da Guerra dos Seis Dias de 1967. Havia muito mais em torno da Cidade Velha. Este lugar tem sido disputado em guerras mais que qualquer outro na história. Nos últimos três mil anos houve quarenta guerras travadas aqui. Ironicamente, contudo, Jerusalém é chamada de cidade de paz.Com Dov seguindo atrás, bem junto deles, Josh e Danielle caminhavam lentamente, quase que langorosamente. Tendo em vista todo o acontecido nos últimos dias, era difícil imaginar sentir-se tão relaxado, mas o fato era que,

naquele lugar, Josh não sentia necessidade de se apressar.- Sinto-me engrandecida aqui - disse Danielle sonhadoramente. Ele não precisou lhe perguntar o que queria dizer com aquilo.Josh teve vontade de dar o braço a ela. De onde viria essa vontade? Embora seu coração lhe dissesse que podia confiar nela, a cabeça instava para que ficasse em guarda. Com a exceção de Avner, não tinha certeza de que podia confiar em qualquer pessoa naquele país. Mesmo assim não queria ficar em guarda com Danielle. Todo seu instinto lhe dizia para valorizar aquele momento, regozijar-se com a presença dela, banhar-se na sua luz. De que se tratava aquilo? Sim, ela era linda e Josh dificilmente poderia se considerar imune à atração da beleza feminina. No entanto, raramente sentira-se dominado por ela. Romance era para quem tinha menos o que fazer com sua vida. Ele pensava no amor com a mesma freqüência com que pensava na sua aposentadoria - ou seja, nunca. No entanto, seria ridículo ignorar a atração que sentia por Danielle, por mais desconcertante que fosse.- Alô? Você está aí? - ela perguntou, sorrindo para ele e pressionando com o ombro o braço dele por um momento. Parecia cada vez mais bonita a seus olhos sempre que a fitava.Só estou fascinado pela vista - respondeu ele, com um sorriso encabulado.Ela se virou.- É magnífica, não é?

Josh e Danielle entraram no chamado Caminho da Muralha, o caminho para pedestres que se estendia por quatro quilômetros no topo da muralha em torno da Cidade Velha, pelo acesso próximo ao Portão de Jaffa e a Cidadela. Era possível caminhar por três quartos do itinerário, seguindo no topo dos paredões de arenito amarelo claro, mas, por motivos de segurança, era proibido passar pelo trecho que dava para o Monte do Templo.Josh contemplou demoradamente a vista panorâmica daquela cidade de sonhos, conquistadores e esperança. Levantou os olhos para o céu azul e brilhante de Jerusalém e as bojudas nuvens brancas e depois desceu para a terra que tinha testemunhado tanto derramamento de sangue e conflitos. Será que aquele lugar um dia cumpriria seu verdadeiro destino?Pararam em um observatório de onde podiam ver o dourado e cintilante Domo da Rocha. Como grande parte da cidade, não só era magnífico como também fonte de disputas intermináveis.Por diversos minutos ficaram apreciando a paisagem em silêncio. Josh sentiu que aquele momento - o Domo, a cidade, a mulher - era absolutamente indescritível. Dava a impressão de que o tempo tinha parado. Podia permanecer ali indefinidamente se Danielle não se virasse para ele com entusiasmo juvenil.- Vamos visitar a Muralha Ocidental - disse, empolgada.

O Primeiro Templo foi construído pelo rei Salomão em 950 a.C. e destruído pelos babilônios em 586 a.C. Foi reconstruído como Segundo Templo entre 538 a.C. e 515 a.C. Em 20 a.C. o rei Herodes começou a ampliá-lo e torná-lo mais grandioso. Ele morreu quase cinqüenta anos antes do término da obra em meados do Primeiro Século. Quando os romanos destruíram Jerusalém em 70 d.C., o Segundo Templo foi reduzido a escombros.A única parte que restou foi a Muralha Ocidental. Dois mil anos de orações e tradição fizeram dela, também conhecida como Muro das Lamentações, o lugar mais sagrado dos judeus. Judeus em todo mundo, não importa onde se encontrem, voltam-se para o Muro quando oram, vendo-o como sua conexão com o passado e esperança no futuro.Junto ao Muro, segundo a prática judaica ortodoxa, uma barreira preta de ferro separava os homens das mulheres. Josh olhou por cima dela e viu Danielle a uma pequena distância. Parecia radiante, como se o sol tivesse decidido brilhar somente sobre ela. Eu poderia me acostumar com essa vista, pensou Josh, mas afastou imediatamente o pensamento. Esta seria uma boa oportunidade para me controlar.Josh ergueu a cabeça e contemplou o imponente conjunto de blocos de pedra, com mais de quinze metros de altura. Depois tocou no muro, fechou os olhos e começou a rezar. Nunca sentira qualquer certeza da existência de Deus. A razão pela qual escolhera o trabalho de sua vida era a esperança de encontrar uma resposta definitiva.

Com bastante freqüência, sentia-se inclinado a acreditar que a noção de um poder abrangente que conduzia o universo era, na melhor das hipóteses, imperfeita. De pé ante aquele muro, contudo, coração e cérebro estimulados pelos últimos acontecimentos, Josh sentiu que talvez valesse a pena enviar uma mensagem para o éter a fim de ver se alguma coisa voltava. Esta era a vantagem de ser agnóstico, certo? Podia não ter todas as respostas, mas pelo menos era, teoricamente, aberto a todas as possibilidades.Mostre-me o que devo fazer, murmurou ele, sentindo-se simultaneamente esperançoso e ridículo.Recuou para longe do muro e abriu os olhos. A primeira coisa que viu foi Danielle a sorrir para ele, após concluir sua oração. A barreira ainda os separava, mas apenas por mais um minuto. O primeiro pensamento dele quando se uniram novamente foi pegar a mão dela, mas resistiu outra vez. Em vez disso, virou-se para se certificar de que Dov ainda estava por perto e em seguida seguiram todos para o Santo Sepulcro.

A igreja do Santo Sepulcro era um dos lugares mais significativos tio mundo cristão, embora carecesse da majestade da basílica de São Pedro em Roma, da catedral de Notre Dame em Paris ou mesmo a de Saint Patrick em Nova York. Confinada dentro de uma área de lojas e casas, não se destacava sobre o seu entorno, tinha dois

domos, o maior dos quais protegia o mais santo dos sítios - o túmulo de Jesus Cristo.Dov esperou do lado de fora, uma Uzi escondida debaixo do casaco. Josh já estivera ali diversas vezes e sempre tinha a mesma sensação de desconforto, a impressão de que alguma coisa não estava como devia. Assim que entraram no lugar santo essa sensação retornou, substituindo a paz e o prazer que sentira desde que tinham entrado na Cidade Velha.Atravessaram um pátio pavimentado de pedras e entraram por um portal grande, em arco, ornamentado por uma estreita guarnição da pedra clara típica de Jerusalém. A igreja estava entupida de turistas, peregrinos e sacerdotes de seis diferentes grupos cristãos: ortodoxos gregos, católicos romanos, armênios, sírios, abissínios e coptas. Cada grupo guardava ciumentamente seu território. Cada um deles tinha sua hora prescrita para rezar a missa, acender velas e abrir janelas. As várias seitas competiam tanto quanto os Yankees e os Red Sox. Josh inclusive lera recentemente uma notícia de briga a socos entre dois grupos religiosos.Josh e Danielle atravessaram o átrio, passaram pelas capelas grega ortodoxa, armênia e copta e seguiram na direção do Gólgota, o local da crucificação. Por fim chegaram à Rotunda, uma grande cúpula ou domo, sustentada por colunas de mármores e dezoito pilares. No centro dessa Rotunda ficava o Santo Sepulcro.O casal juntou-se a uma longa fila de peregrinos e turistas e ficou esperando em silêncio. Josh

sentiu-se tenso, o desconforto aumentando. Danielle, contudo, já tinha se doado inteiramente ao momento e à energia do lugar. Quando a fitou, ela atraiu seu olhar e sorriu com uma expressão de conhecimento profundo que ele achou estranhamente tranquilizadora.Depois de meia hora entraram na tumba pequena e apinhada de gente. Josh olhou as quarenta e três lâmpadas suspensas sobre o mármore que cobria a laje de pedra. Era ali que Cristo tinha sido sepultado e era ali que diziam ter ressuscitado. Muitos dos turistas e peregrinos choravam, caíam de joelhos e oravam em uma explosão de grande intensidade espiritual e emocional.- Não aconteceu aqui - murmurou Josh para Danielle. Eram as primeiras palavras que ele falava em algum tempo. O pensamento surgira repentinamente na sua cabeça, como se tivesse sido colocado ali por uma outra pessoa.- Como assim?- Não posso explicar. Não sei ao certo - ele sacudiu a cabeça, confuso, e deixou o Santo Sepulcro, dirigindo-se para a saída da igreja. Ao fazê-lo, olhou por entre a multidão e reparou num vulto muito alto parado em um lugar sombrio, vestindo um traje sacerdotal preto. Josh teve certeza de que era o homem que o seguira e a Moshe na véspera. Ele fulminou Josh com o olhar e deu a impressão de que ia apanhar algo sob suas roupas.De repente seu desconforto agravou-se e se transformou em pânico. Pegou a mão de Danielle

e a conduziu rapidamente para fora da igreja. Dov estava na entrada.- Sua Uzi está carregada? - perguntou Josh ao guarda-costas.- Claro.- Ótimo. Pode ser que você tenha que usá-la.- O que está acontecendo? - indagou Danielle, a preocupação fazendo com que falasse mais alto. - Por que saímos tão depressa?- Alguém estava lá. Vamos dar o fora daqui.Eles saíram correndo rapidamente pelas ruas estreitas do Bairro Cristão da Cidade Velha e se enfiaram em uma loja de suvenires. Josh deu uma olhada na rua e tentou recuperar o fôlego.- Acho que não fomos seguidos - disse.- O que foi aquilo? - indagou Danielle. Não parecia assustada. Na verdade, dava a impressão de estar um pouco aborrecida.Josh deu outra olhada na rua para ver se estavam mesmo em segurança. O gigante ameaçador não podia ser visto em parte alguma. Respirou fundo e encarou Danielle.- Ele sumiu.- Quem sumiu?O sujeito que nos seguiu foi o mesmo que me seguiu ontem. Ele interrompeu a perseguição nas duas vezes, entretanto - Josh tentou avaliar se aquilo fazia algum sentido. Nenhuma das experiências que tivera na vida o preparara para aquilo. - Ele está tentando me assustar. Quer que eu saiba que está por perto. Não está tentando me capturar.- Pelo menos por enquanto.

CAPÍTULO 10

O MESTRE AGUARDAVA EM PACIENTE CONTEMPLAÇÃO NA OBSCURIdade do esconderijo subterrâneo. Embora a empolgação dos seus seguidores aumentasse a cada novo desenvolvimento e revelação da profecia, ele queria saborear a deliciosa antecipação dos eventos prestes a se desenrolarem. Era uma posição que só podia ser desfrutada por quem estivesse em uma situação vantajosa. O Mestre respirou fundo por trás da máscara de serpente, inalando as moléculas de milhares de anos. O lugar era frio, úmido e tão antigo quanto parecia ser. Altamente estimulante.Após diversos minutos em silêncio, ele ajeitou o manto negro, demorando-se a alisar até mesmo a menor das pregas imaginárias antes de dar por terminado seu trabalho. Finalmente ele se virou para seu servo.- Mestre - disse o homem gigantesco, fazendo uma reverência.O Mestre fez um sinal para que ele permanecesse ereto.- Você fez um bom trabalho. O próximo grupo procederá com mais discrição.- Muito obrigado, Mestre. Tive muitas oportunidades para matar o homem, mas não matei porque o senhor me disse para não matar. Por que o quer vivo?O Mestre respirou fundo de novo, mas desta vez com a intenção de se acalmar. O gigante era

valioso mesmo que fosse quase que absurdamente estúpido.- Ele precisa continuar vivo a fim de nos levar até o artefato. Uma vez que o artefato esteja em nossas mãos, não haverá mais motivo para que ele viva.Lentamente, como que a absorver algum profundo ensinamento esotérico, o gigante balançou afirmativamente a cabeça enorme.- Muito obrigado, Mestre - disse. - Eu entendo agora.O Mestre achava irônico que um crânio tão grande contivesse um cérebro tão pequeno. Só que, na verdade, inteligência e pensamento independente não eram necessariamente traços a serem encontrados em um devoto. Crença justa e força bruta era tudo o que se fazia necessário. O Mestre trabalhava para estabelecer um delicado equilíbrio para seus seguidores, com a combinação certa de dependência e direito de ter avivadas as chamas da fé. Quanto à força bruta, aquele fiel era mais do que qualificado.- Quero ir com você ao Portão dos Mouros - disse o Mestre.- Lá você se encontrará com alguns de nossos irmãos. Tenho um plano que deverá nos ajudar a entrar na posse do velho documento. Você vai gostar, acho eu. Envolve o aprisionamento de uma jovem cativante.- Essa mulher é uma das nossas? - aventurou-se o servo, obviamente impressionado com a própria capacidade detetivesca.

- Tecnicamente, não - respondeu o Mestre com um sorriso.- Ainda não.

Capítulo 11

NO CAMINHO PARA O CARRO, JOSH DEU UMA OLHADA NO RELÓGIO, viu que eram 7:45 e decidiu mudar de plano.Tocou Danielle no ombro.- Você está armada?Danielle espantou-se com a pergunta.- Não, é claro.- Acho que será melhor para você pegar o carro e me encontrar às 8:15, à entrada do Portão dos Mouros. Mas seja extremamente cuidadosa. Se achar que está sendo vigiada ou seguida, telefone pedindo auxílio e saia da área.- Não compreendo. Por que estamos nos separando? - perguntou ela, um tanto irritada e mais do que um pouco desapontada. - Sou eu que vim acompanhada de um segurança, lembra?- Você estará mais segura se não estiver comigo quando eu precisar sair.Os olhos de Danielle se arregalaram.- Você vai pegar o jarro?Uma voz dentro da cabeça de Josh disse para que ele fugisse com aquela mulher - para simplesmente esquecer tudo o que estava acontecendo e dar o fora de Israel com ela. Claro que não lhe deu ouvidos. - Você estará mais segura se também não souber aonde estarei indo.

Danielle inclinou a cabeça.- Josh, a sua preocupação é muito delicada, mas não aceito ser mimada desde que tinha oito anos de idade.- Não estou mimando você e sim sendo prudente. Quanto menos gente souber a respeito disso, melhor.Danielle parecia prestes a protestar, mas Josh levantou a mão.- Não é uma questão de confiança.Ela lhe dirigiu um olhar de raiva.- Certamente parece ser.Josh sacudiu a cabeça.- Acredite em mim, não é. Confio em você. Sinceramente, Danielle.Danielle parece avaliar a hipótese de continuar a discussão, mas sua expressão suavizou-se.- Você vai levar Dov, não vai?Josh deu uma olhada no guarda-costas.- Nunca se sabe quando uma Uzi será necessária.Danielle adiantou-se e beijou Josh ternamente no rosto. O beijo foi apenas um sopro, mas reverberou na alma dele.- Tenha cuidado - disse ela.Josh respirou fundo.- Terei. Verei você dentro de pouco tempo perto do Portão dos Mouros.Josh localizou a entrada obscura da loja de Avner. Ninguém o seguia. A esta altura, tinha certeza disso porque seus perseguidores tornavam sua presença intencionalmente óbvia. Bateu e viu Avner espiando pelo olho mágico.

Imediatamente, ouviu as trancas da porta sendo abertas.Quando Avner abriu a porta, seu rosto normalmente jovial estava tenso. - O recado que você deixou na secretária me deixou morto de medo. Que história é essa de assassinos? Passei a tarde inteira olhando por cima do ombro. Ele notou a presença de Dov e o fitou desconfiadamente. - Quem é esse aí? - perguntou.- O nome dele é Dov - respondi. - Trabalha para a segurança da IAA e foi designado para me proteger.Avner fez com que entrassem e trancou a porta mais uma vez, as mãos trêmulas enquanto verificava três vezes se os ferrolhos estavam bem passados. Seguiu rapidamente para os fundos da loja.- Espero que você saiba o que está fazendo com esse negócio, Josh. Não é comum que as pessoas do seu ramo se envolvam com assassinos. Tampouco as pessoas do meu ramo.Josh nunca tinha visto o amigo tão nervoso. Sentia-se mal por tê-lo metido naquilo, mas na ocasião em que lhe trouxera o jarro para guardar, Avner era a única pessoa no país em que podia confiar.Ele entrou no escritório e retornou com a mochila, entregando-a para Josh como se estivesse a segurar uma bomba de tempo. Josh pegou aquilo e sorriu para o amigo.- Suponho que esteja lhe devendo mais que uns drinques, hein?

Avner deu uma risada, mas continuou nervoso.- O melhor jantar em Jerusalém seria um começo - mas apenas um começo.- Combinado. Assim que tudo isto acabar. Você escolhe o lugar.Exatamente neste instante, Josh sentiu uma pontada fria que percorreu sua espinha até a nuca. Que seria aquilo? Sem dúvida aquela era uma situação tensa que se sobrepunha a uma situação que já era tensa - mas seu sistema de alerta de repente passara a trabalhar em excesso. Precisava levar o rolo de pergaminho para um local mais seguro. Não se sentiria à vontade enquanto não fizesse isso. - Alô?Josh despertou do seu devaneio para ver Avner fitando-o.- Desculpe. É que ultimamente ando divagando muito.Avner conteve uma risada.- Oh, eu entendo. É a desculpa que vai me dar quando se esquecer de me pagar o tal jantar grã-fino.A brincadeira do grandalhão pôs Josh à vontade.- Eu vou me lembrar, não se preocupe — disse ele. - Iremos a um lugar refinado. Desses que a gente tem que vestir paletó e gravata. Você tem paletó e gravata, não tem, Avner?Avner fingiu sentir-se desconcertado com a pergunta.- Puxa vida, não sei. Vou ter que verificar no fundo do meu closet.

- Faça isso. E tentaremos nos reunir na semana que vem.- Combinado.Josh sorriu e pensou com ansiedade no jantar. Seria bom relaxar com o velho amigo depois da loucura dos últimos dias.O Portão dos Mouros estava a menos de dez minutos de distância. Era sempre fortemente defendido porque ficava entre um bairro judeu e outro árabe. Àquela hora da noite o terminal de ônibus estava deserto. Josh procurou o carro de Danielle, mas não estava lá. Consultou o relógio, eram 8:15h da noite. Tinha certeza de que ela estaria ali a qualquer instante.A sensação estranha de frio que o acometera na loja de Avner cedera um pouco, mas agora ele sentiu outra pontada. O que seus nervos estavam lhe fazendo? Fez um gesto a Dov para segui-lo e juntos os dois atravessaram o terminal para ver se alguém os estava observando. Não havia ninguém à vista, mas quem sabe o que as sombras escondem?De repente, um sopro de vento à sua esquerda fez com que os sentidos de Josh disparassem. Ele parou, mas, antes que pudesse avisar Dov para ter cuidado, o guarda-costas desabou, um punhal fincado no pescoço. Ao cair, com o sangue jorrando do pescoço, Dov ainda conseguiu sacar a Uzi do coldre e disparar alguns tiros, os projéteis atingindo o chão com estrépito e ricocheteando nas sombras.Josh não tinha idéia de onde os agressores vieram ou aonde foram, mas não havia tempo

para tomar precauções. Correu para o lado de Dov e levou um banho de sangue. O punhal tinha sido lançado contra ele, tinha certeza disso. Mas Dov fora surpreendido. E por que não o tinham atacado depois de derrubarem o guarda-costas? Alguma coisa saíra errada?O cantar dos pneus de um carro chamou a atenção de Josh para a entrada do portão. Ali, dois homens de longas túnicas pretas correram para um carro que se deslocava devagar. Antes que pudesse pensar em persegui-los, os homens tinham entrado no carro e desapareceram.Da direção oposta, Josh podia ouvir gritos e o barulho de botas ecoando no terminal vazio. Quando a segurança israelense correu em sua direção, Josh virou-se para Dov.Gorgolejando sangue e em espasmos, Dov estava obviamente em péssimas condições. Ele tinha arrancado o punhal do pescoço e o sangue jorrava enquanto ele tentava contê-lo. Josh era bem versado em primeiros socorros, mas aquilo era muito mais sério do que qualquer coisa com que ele já se deparara antes. Pegou um pano na mochila e tentou pressionar bastante para interromper a hemorragia, embora soubesse que o esforço seria inútil.Mantendo a pressão, Josh fechou os olhos e pediu ajuda. Em sua mente, imaginou o fluxo de sangue cessando e os pulmões de Dov sendo invadidos pelo ar de que tanto necessitava. Josh sentiu-se meio tonto; a insanidade que o envolvia era esmagadora. Concentre-se em Dov! Ordenou a si próprio. Abriu os olhos para ver se

estava fazendo algum progresso e deparou-se com o guarda- costas olhando para ele. Não estava mais lutando. Na verdade, parecia em paz. Seria a proximidade da morte? Sua respiração era regular, quase relaxada.Josh levantou o pano ensangüentado. A hemorragia praticamente cessara e o que saía agora do ferimento era um fio de sangue.Três policiais israelenses correram para o seu lado, empunhando suas armas. Josh fez sinal para que vissem que estava desarmado e apontou para a Uzi de Dov caída no terreno a uns três metros de distância. Um dos policiais pegou-a e os demais guardaram as armas.- Vamos chamar uma ambulância - disse um deles. - Mostre sua identidade.Josh exibiu a identidade e contou o que tinha acontecido. Em questão de minutos, ouviu a sirene de uma ambulância que se aproximava. Os israelenses eram, por necessidade, preparados para tragédias súbitas.- Quer ir para o hospital com seu amigo? - perguntou um dos policiais.Mas Josh não estava ouvindo mais. Acabava de se dar conta de que conhecia o carro em que seus agressores tinham escapado. Era o de Danielle.Um policial anotou os dados do hotel de Josh e disse:- Vá ao nosso quartel-general amanhã. Vamos precisar que responda a mais algumas perguntas. - Para terminar, ele escreveu seu

endereço em outro pedaço de papel e entregou a Josh.Josh aguardou os paramédicos fazerem o curativo de Dov e depois levá-lo para a ambulância. Surpreendentemente, Dov manteve-se consciente o tempo todo. O homem devia estar morto.O que acontecera quando Josh impusera as mãos no guarda- costas?A resposta a esta pergunta e a muitas outras teria que esperar. Ele tinha muitas outras indagações para responder primeiro.

Capítulo 12

JOSH, NA VERDADE, NÃO VIU DANIELLE COM OS HOMENS QUE FUGIram no carro dela, mas sabia que estava com eles. Teria sido seqüestrada... Ou participava da trama, qualquer que fosse, na qual ele se metera sem querer? Era impossível para Josh acreditar que ela pudesse ter alguma coisa a ver com quem quer que o estivesse seguindo, mas havia muitas incongruências em tudo aquilo. Se Danielle estivesse envolvida, significava que aquela aventura acabava de assumir sua forma mais feia e perigosa. Caso contrário, estava correndo sério risco.A única coisa que Josh sabia com certeza era de que precisava de ajuda. Acreditava ser capaz de cuidar de si próprio, mas não podia identificar

seus adversários e resgatar Danielle - se é que ela precisasse ser resgatada - sozinho. Tinha começado a confiar nela e até mesmo a sentir-se à vontade com Dov. Mas com os dois fora de cena agora, havia apenas uma outra pessoa que ele conhecia em todo o país a quem podia recorrer. Já pedira muita coisa a Avner, mas precisaria pedir mais. Ia lhe dever um verdadeiro banquete quando tudo aquilo terminasse.Josh seguiu caminhando sozinho através das ruazinhas estreitas e sombrias. Olhou as casas antigas de pedra que o cercavam, e sentiu como se tivesse recuado no tempo. Engraçado, pensou, as pessoas tendem a pensar no passado como em um tempo mais inocente. E não era verdade, era? Quando fora a última vez em que aquela terra fora verdadeiramente inocente?Ele virou a esquina e viu a loja de Avner. A luz estava acesa e a porta da frente aberta. Imediatamente seus nervos vibraram. Não fazia sentido que Avner estivesse com a loja aberta, especialmente após a última conversa que haviam tido.Com todo o cuidado, Josh entrou na loja e dirigiu-se para os fundos.- Avner?Nenhuma resposta. Na verdade, não havia o menor ruído. Silêncio absoluto. A loja tinha uma quietude que não era natural - algo que Josh jamais experimentara na presença de Avner.- Avner, sou eu, Josh. Você está aí?Os sentidos de Josh entraram em alerta máximo - alguma coisa definitivamente estava muito

errada ali. No entanto, enquanto se deslocava cautelosamente na direção do escritório de Avner, uma parte dele estava centrada naquela calma estranha que experimentara antes, quando começara a decifrar o texto do pergaminho. Onde normalmente o pânico o estaria dominando, Josh sentia uma certa percepção, e alguma coisa mais que não sabia definir. Era quase como que uma tristeza insuportável, mas não específica, como uma emoção impessoal. Sentia-se como se seu coração estivesse prestes a explodir de tanta compaixão.Até que abriu a porta.Nada poderia tê-lo preparado para o que viu, e tão inexplicavelmente quanto se apossara dele, aquela calma desapareceu.O corpo de Avner, nu, tinha sido preso pelas mãos na parede dos fundos. Vísceras e sangue acumulavam-se a seus pés, vindo do buraco cavernoso da barriga. No peito, onde antes ficava a estrela de Davi que usara desde a infância, pendurada em um colar, havia agora o desenho rebuscado de uma serpente entrelaçada em uma cruz. A morte imobilizara seu rosto em uma careta de agonia.Josh caiu no chão, vomitando. Gemeu de dor pela perda do amigo querido. Chorou até sentir que as lágrimas iriam dominá-lo.- Desculpe, Avner - ele gemeu. - Não podia saber que isso ia acontecer. Jamais teria envolvido você.

Josh obrigou-se a olhar o rosto de Avner, imobilizado pela morte em uma máscara de agonia. Enfureceu-se com o que viu, e com a fúria veio a determinação. Pôs-se de pé, lutou contra a repugnância e beijou no rosto o homem corpulento.- Não deixarei que sua morte fique sem significado.Quando recuou, tinha sangue nas mãos.

A polícia chegou minutos depois que Josh chamou. Uma coisa com que se podia contar naquela cidade era uma reação rápida dos tiras.- Isto parece um assassinato ritual - disse um policial depois de examinar o corpo. Josh podia ver que, apesar de tudo que aquele policial já devia ter visto na sua linha de trabalho, aquilo o deixara chocado.- Sem dúvida - confirmou Josh.- O que é que você sabe a respeito?- Mais do que eu gostaria e muito menos do que o necessário.Josh passou os vinte minutos seguintes explicando o que acontecera. Um segundo policial revistou sua mochila e tirou o jarro.Josh o tirou cuidadosamente das mãos dele.- Este é um jarro que descobri em uma caverna nas proximidades do Mar Morto. Já tomei as providências para entregá-lo à IAA.Um dos policiais foi para a frente da loja, puxou o celular e fez uma ligação. Retornou cinco minutos mais tarde.

- Acabei de falar com Moshe Ben Daniel e ele confirmou sua história. Depois que terminarmos a investigação aqui, você deve ser levado à IAA.Josh assentiu com indiferença. Passava rapidamente do choque para a raiva e vice-versa. Naquele momento sentia-se exausto.- Talvez seja melhor sentar um pouco - disse o primeiro policial.- Eu quero ajudar.- Não pode ajudar aqui. Por favor, vá se sentar em algum lugar: está parecendo muito abalado.Josh assentiu mais uma vez e sentou-se numa cadeira atrás de um dos balcões. Chegou uma ambulância com o saco para transportar o corpo. Josh limitou-se a observar o trabalho, perguntando-se que tipo de coisa seria chamado a fazer a seguir.Quando Josh chegou na IAA, Moshe e a equipe de arqueologia estavam na entrada à sua espera. Conduziram-no para dentro.- Você está bem? - perguntou Moshe.- Um dos meus melhores amigos foi assassinado por causa do conteúdo desta mochila. Existe algum modo possível de eu estar bem?- Sinto muito, Josh.- Não é só isso. Precisamos falar em particular.Moshe virou-se para os outros homens.- Em um minuto estaremos lá com vocês.Dois arqueólogos pareceram ficar ofendidos com a dispensa. Josh não se importou.- O que você precisa me contar?- Dov está no hospital e Danielle... desapareceu.Moshe ficou tenso.

- Como assim, ela desapareceu?- Danielle devia ter ido se encontrar conosco no Portão dos Mouros. Não apareceu, mas cheguei a ver o carro dela. Os homens que atacaram Dov fugiram nele, a toda a velocidade.A expressão de Moshe passou a ser de alarme, com o olhar distante.- Moshe, quão bem você conhece sua filha?Moshe dirigiu-lhe um olhar agressivo.- Eu a conheço tão bem quanto qualquer homem conhece um filho adulto. O que você pretende com essa pergunta?- Há alguma razão para acreditar que ela possa estar ligada a isso?- Você está me perguntando se eu acredito que minha filha é uma criminosa e assassina?Josh esperou um momento para que a tensão entre ele e Moshe amenizasse.- Estou perguntando se ela poderia ser uma cúmplice involuntária.Moshe sacudiu a cabeça.- Danielle não é nada que ela não queira ser.- Então pode ser que ela esteja metida numa encrenca muito séria.Moshe fechou os olhos por um longo momento e Josh chegou a imaginar se não estaria rezando.- Você não precisa se preocupar com ela - disse Moshe, abrindo os olhos. - Danielle sabe cuidar de si. Na verdade, provavelmente ela é muito mais do que aquilo que você é capaz de lidar, Josh.- Com o devido respeito, Moshe, acho que você não está entendendo...

- Não, Josh, acho que é você quem não está entendendo. Eu devia ter explicado isso antes, quando vi pela primeira vez aquele brilho nos seus olhos. Desculpa, mas minha filha é muito... arrebatada. Ela é dona de uma energia que atrai muitos homens; mas também é muito independente e, sob certos aspectos, impulsiva. Se bem conheço Danielle ela está por aí atrás de um fio de história ou mergulhada de cabeça em alguma nova experiência. Vai aparecer daqui a uns dias. Sempre aparece.Josh ficou desconcertado, mas algo mais profundo que seu orgulho lhe dizia que Moshe estava errado daquela vez.- Olha só o que eles fizeram com Avner e Dov. Danielle pode se encontrar em sério perigo agora. Precisamos fazer alguma coisa.- Minha filha está bem - disse Moshe, decidido. E depois, falando mais baixo, cabeça baixa. — Tem que estar. Ela é tudo o que eu tenho.Então, ele mudou rapidamente de atitude e de assunto, como se o momento anterior não tivesse valido nada.- Vamos examinar o jarro - disse ele. - Está cercado de tanto horror... precisamos entender o porquê.

Josh bateu com a palma da mão no ombro do homem mais velho, seguindo-o até as salas da IAA. Nós a encontraremos, pensou. Ainda não sei ao certo como, mas nós a encontraremos.

Capítulo 13

OS ARQUEÓLOGOS TINHAM SE REUNIDO EM TORNO DO JARRO E A EMPOLGAÇÃO DELES ERA PALPÁVEL.No mínimo um daqueles homens estava envolvido na morte de Avner e no seqüestro de Danielle, pensou Josh. No entanto, agora mais parecem garotos brincando.- A aparência é similar à da cerâmica do primeiro século - disse Jonathan, forçando caminho entre os demais membros da equipe a fim de dar uma olhada mais de perto.Padre André, mais velho e experiente, não ia quebrar o protocolo, empolgado ou não.- A peça foi embebida em água limpa para remoção dos sais solúveis? - perguntou ele, com um quase imperceptível traço de censura na voz.Josh examinou cuidadosamente cada homem. Considerava espantoso que apenas uns dias atrás ele pensara que aquele momento o teria enchido com a mesma emoção. A impressão que tinha agora é que nada seria tão simples novamente.O reverendo Barnaby Smith, um homem tão magro e esquisito que lembrava a figura de Ichabod Crane, o personagem de A lenda do cavaleiro sem cabeça, retornou com um jarro de cerâmica do primeiro século que fora pegar na coleção do museu, e pôs os dois artefatos lado a lado.Josh reconheceu o procedimento como uma classificação tipológica. Através daquele

processo, eles classificariam o novo jarro com base em uma série de atributos, comparando-o com outras peças do mesmo período. Era o primeiro passo para datá-lo e determinar sua autenticidade.Os arqueólogos reuniram-se em torno do jarro. Não eram autorizados a tocar no artefato; tinham que confiar nos olhos nus. O olho pode ser uma ferramenta poderosa na avaliação e análise de cerâmica. A equipe estudou o tamanho e a forma do jarro, detendo-se na análise dos detalhes da superfície externa. Observaram o corte transversal do vaso, que indicava o grau em que a argila fora trabalhada e a natureza, tamanho e quantidade dos materiais adicionados à argila para lhe dar ponto e melhorar suas qualidades de cozimento. Todos esses atributos ajudariam os arqueólogos a determinar o período e o local da criação do jarro. Mais tarde submeteriam o artefato ao exame de datação por radiocarbono, que determinaria, dentro de uma margem de cinqüenta anos, a idade do pergaminho.Eram duas horas da madrugada quando Moshe finalmente sugeriu que fizessem uma pausa e recomeçassem no dia seguinte ao meio-dia.- Todos poderão estar presentes? - perguntou ele.Era uma pergunta retórica, mas, a despeito da exaustão generalizada, todos aquiesceram entusiasmadamente. Exceto Josh.- Tenho um compromisso às dez horas - disse ele, a cabeça a mil com pensamentos sobre

Avner, Dov e Danielle -, mas tentarei estar aqui a tempo.Padre André foi o primeiro a dizer boa-noite a Josh.- É evidente que esta descoberta já representou um custo terrível para você. Sinto muito pela sua perda. Peço desculpas se o que vou dizer parece indelicadeza, mas a verdade é que estou achando tudo muito empolgante. Se o jarro for autêntico, o pergaminho pode vir a ser um salto extraordinário.Josh assentiu em silêncio e estudou detidamente o homem, procurando o que no pôquer chamam de "sinal", um indicador que revelasse que cartas ele tinha.- Muito obrigado pelas suas condolências - agradeceu, por fim.Padre André saiu sem mais uma palavra e logo foi seguido pelos demais. Apenas Josh, Moshe e um segurança permaneceram.Moshe ergueu cuidadosamente o artefato e o colocou em um cofre.- É seguro esse cofre? - perguntou Josh.- Tão seguro quanto qualquer outra coisa aqui nas dependências da IAA.- Por que isto não me faz sentir melhor?Moshe encarou Josh, mas abaixou os olhos.Josh teve que lutar contra uma repentina onda de raiva. Lembre-se, disse a si próprio, ele está tão angustiado quanto eu.- Descobriremos mais amanhã - disse Moshe, um tanto contrafeito. - Onde você estará hoje à noite?

- No meu hotel. Onde mais poderia estar?- Você precisa mesmo fazer essa pergunta?Josh não tinha pensado muito na sua segurança pessoal nas últimas horas. - O que você sugere?- Temos instalações aqui. Podemos mantê-lo protegido até que possamos providenciar uma solução melhor. As acomodações são relativamente confortáveis.Josh conteve uma risada. O conceito de "confortável" pareceu-lhe completamente estapafúrdio àquela altura dos acontecimentos.

Capítulo 14

DANIELLE SENTIU FRIO. JAZIA DEITADA EM UMA LAJE DE PEDRA, NUA, a não ser por um leve manto. Na escuridão, não era capaz de distinguir nada do que a cercava ou mesmo se estava sozinha. Sabia apenas que havia cordas prendendo fortemente suas mãos, braços e pés.Depois de algum tempo ouviu vozes e tentou, sem sucesso, virar a cabeça na direção do som.- O que é que nós vamos fazer com ela?- Esperar as instruções do Mestre.- Se eu não tivesse feito voto de castidade você sabe o que eu gostaria de fazer.- Nós somos homens santos. Não devemos ter pensamentos impuros.Danielle fechou os olhos, tentando suprimir a ansiedade que sentiu com aquelas palavras. Em sua experiência, pensamentos impuros

precipitavam ações impuras, indiferentemente ao treinamento das pessoas.Abriu os olhos novamente e tentou enxergar alguma coisa. Já se adaptara à penumbra, mas tudo parecia ainda informe. Com base nos ecos das palavras que acabara de ouvir e na pedra sob seu corpo, Danielle desconfiou que estivesse em uma das tumbas que cercavam a Cidade Antiga. Havia centenas delas, alguns datando de mais de três mil anos atrás. Seria difícil que a encontrassem ali - se é que havia alguém à sua procura. Gostaria de saber se seu pai tinha pelo menos se dado conta de que ela desaparecera. Já sumira por alguns dias em outras oportunidades, quase sempre com um homem que a tivesse entusiasmado. Seu pai nunca aprovara tais excursões, mas acabara se acostumando.E Josh? Alguma coisa acontecera entre eles na noite anterior, algo que não acontecia a Danielle com muita freqüência. Não desejara fugir com ele, mas definitivamente queria estar à seu lado. Não podia afirmar, contudo, se ele se sentia do mesmo modo - o que era estranho, pois sempre sabia quando um homem estava interessado. Como reagira ao seu desaparecimento? Estaria preocupado, ou apenas imaginava que tivesse querido fugir dele?Se nem seu pai nem Josh percebessem que desta vez era diferente, não tinha ninguém que a ajudasse, exceto ela própria. Puxou de novo as cordas e instantaneamente compreendeu que soltar-se seria praticamente impossível.

CAPÍTULO 15

JOSH ENTROU NA DELEGACIA PRÓXIMA A CIDADE VELHA.- Pois não? - perguntou um policial obeso sentado atrás de uma imensa mesa de madeira.- Disseram-me para que eu viesse aqui hoje de manhã - respondeu Josh. - Os policiais não chegaram a informar seus nomes, mas me deram isso aqui.O tira gordo estendeu a mão, sem se dar o trabalho de se levantar, examinou o pedaço de papel sem maiores entusiasmos, pegou o telefone e discou um número. Em menos de um minuto, os dois policiais conhecidos de Josh apareceram e o escoltaram até uma sala.- Como vai indo seu segurança? - perguntou o mais alto dos dois, que se apresentou como Yosef.- Telefonei para o hospital duas horas atrás e me disseram que seu estado é estável. Parece que vai sair dessa.- Graças a você.- Não, ele teve sorte.O mais baixo, Avraham, disse:- Ao contrário do seu outro amigo.- É - concordou Josh, num fio de voz.Yosef exibiu um punhal negro.- Esta é a arma usada no ataque ao seu guarda-costas ontem à noite.Josh examinou-a detidamente.- É só uma cópia, mas parece uma faca usada pelos Sicários cerca de dois mil anos atrás.

- Usadas por quem?- Os Sicários. Um grupo de revolucionários do Primeiro Século. Há quem os chame de assassinos. Carregavam punhais como este escondidos sob seus trajes e os usavam para atacar as Forças Romanas e os judeus que as apoiavam.- Bem - disse Avraham parece que tanto o segurança quanto o seu amigo que foi morto...- O nome dele era Avner - disse Josh, mais defensivamente que tencionara.- Ambos foram atacados pelo mesmo grupo.Josh balançou a cabeça afirmativamente.- Imaginei a mesma coisa.- Sabe quem são eles?- Não, mas vou descobrir.Avraham adiantou-se na direção de Josh.- Esta não é a sua linha de trabalho, sr. Cohan.Josh encarou-o sem se perturbar.- Esta não é mais a questão.- Jerusalém é uma cidade muito perigosa, como o senhor já deve saber a esta altura. Deixe a investigação por nossa conta.- Agradeço muito a ajuda de vocês, mas não posso simplesmente ficar parado. Devo mais que isto a Dov e Avner.Josh não chegou a mencionar Danielle. Não sabia, sinceramente, o que dizer a respeito dela. Também não tinha idéia de como procurá-la, mas, ainda assim, achou melhor deixar a polícia de fora.Esperava não estar cometendo outro erro fatal.

Josh foi o último a chegar à IAA e, quando entrou apressadamente no laboratório, os outros arqueólogos já estavam examinando o jarro vermelho em cima da mesa.- Está em tão boas condições que é difícil acreditar que seja antigo - comentou padre André.Os outros concordaram entusiasticamente.Alon, um dos quatro cientistas israelenses presentes, dirigiu um olhar desconfiado a Josh.- Você abriu a tampa?- Sim, abri rapidamente, tirei o pergaminho e examinei sua condição.- Preferia que não tivesse feito isso - disse o reverendo Barnaby.Mas Josh assegurou a todos que sabia o que estava fazendo.- Tive o máximo cuidado, calcei luvas cirúrgicas para não deixar marcas e guardei exatamente do modo como encontrei - decidiu não mencionar o fato de ter fotografado o pergaminho antes de fechar e selar a tampa.- Então você leu - disse Smith. Não foi uma acusação e sim uma suposição resignada.Josh podia ver que alguns membros da equipe ainda se mostravam desconfiados por causa do seu envolvimento, e ele não queria fazer mais inimigos do que já tinha.- Li um trecho muito pequeno. Como vocês sabem, esse tipo de tradução demanda uma enorme quantidade de tempo.- O que estava escrito?

- Acho que você vai querer descobrir por si próprio.- Se você já leu, por que não nos contar? - retrucou Alon.- Porque é preciso ler para acreditar.- Você acreditou? - perguntou o reverendo Barnaby, dando a Josh espaço para manobra e pondo o jovem arqueólogo no devido lugar.- Vou esperar até que os testes do carbono 14 fiquem prontos - disse Josh, sem saber se era aquilo mesmo.

A descoberta da datação por carbono radiativo ou C14 foi um acontecimento monumental na história da arqueologia. Seu autor, o professor Willard F. Libby, ganhou o prêmio Nobel em 1960 por ter descoberto que, considerando que o C14 desaparecia com velocidade constante e mensurável, seria possível avaliar a idade de qualquer espécime orgânico comparando o C14 remanescente nele com substâncias orgânicas de idades conhecidas. A descoberta abalou os alicerces do mundo da arqueologia ao responder a pergunta-chave: que idade tem este objeto?Mas não poderia lhes dizer nada a respeito do autor do pergaminho. A despeito de todos seus estudos e das modernas tecnologias a que tinham acesso, e também das duas pessoas mortas ao longo do caminho, Josh sabia que a crença ou descrença, em última análise, seriam uma questão de fé. Ainda assim, não podia negar aquela sensação persistente de calma e conhecimento. Àquela altura, ele não sabia o que

fazer, mas, como se encontrava em um laboratório cercado por outros arqueólogos, a escolha, por ora, era simples.Como se atendesse a um sinal, naquele exato momento um homem de cerca de cinqüenta anos entrou na sala. Descabelado, mais parecia um maestro que um cientista.- Este é Steven Fishman - disse Moshe a Josh, apresentando-o. - É o nosso especialista em carbono radiativo.- Vamos ver o que temos aqui - disse Fishman, entusiasmado, avançando direto para o artefato. - Tudo bem se eu abrir a tampa?Diversos arqueólogos balançaram a cabeça energicamente.Com cuidado, Steven abriu o jarro e fez o rolo de pergaminho deslizar para fora, tocando-o apenas com luvas cirúrgicas. Abriu o rolo e parou na primeira seção.- A aparência é mesmo de pergaminho.- Está escrito em aramaico - disse padre André, inclinando- se sobre o pergaminho. Estudou o documento cuidadosamente. Josh imaginou que estivesse traduzindo. De repente ele parou, o rosto lívido.- Não penso que devêssemos começar a tradução antes que Steven termine o exame - disse, a voz trêmula.- Vai levar só uns dias - disse Steven. Ele cortou um pedacinho minúsculo na ponta do rolo. - Vou pedir ao conselho que libere o acelerador porque tenciono usar a técnica de espectrometria de massa, pois assim poderemos ter o resultado o

mais rapidamente possível. No entanto, ainda precisarei de tempo para preparar a amostra, já que qualquer contaminação pode invalidar o resultado. Estou tão ansioso quanto vocês para ver como isto terminará, mas não vale à pena correr riscos.Moshe virou-se para os demais.- Devemos esperar?- Não! - exclamou Alon impaciente. - Vamos pelo menos dar uma olhada nas condições do texto.Diversos arqueólogos reuniram-se em torno do rolo. Josh ficou de lado, sabendo muito bem de que se tratava.- Vai ser um desafio para nós traduzir todas as palavras - disse Jonathan.- Pode tomar mais tempo do que planejamos, mas vamos conseguir.Padre André levantou os olhos do documento.- Se este rolo é mesmo do período do Segundo Templo, trata- se de uma descoberta assombrosa.Seus olhos fixaram-se nos de Josh, que não teve mais que uma vaga idéia do significado do olhar do sacerdote.

CAPÍTULO 16

PASSARAM-SE HORAS, E DANIELLE SENTIA-SE FAMINTA E COM SEDE. Amarrada daquele jeito e sem saber se veria novamente a luz do dia, sua mente começou a lhe pregar peças. Estava certa de que tinha ouvido coisas movendo-se leve e rapidamente à sua volta. Depois começou a imaginar cabeças

separadas do corpo pairando sobre ela, olhando-a com maldade e lascívia. Começou a ter a sensação de que sua pele estava sendo espetada com milhares de agulhas minúsculas. A onda de dor atacou-a em toda parte simultaneamente - e ela não conseguiu se mover. Quis gritar, mas de algum modo também não pôde.Subitamente, a dor cessou. Mais uma vez sentiu a laje sobre a qual estava deitada e por uns poucos momentos pensou em sobreviver, em dar um jeito qualquer para fugir. Então, ela quis mudar de posição, sentiu as cordas que a aprisionavam e sua ansiedade disparou.De repente Danielle não conseguiu ver mais nada, tudo branco. O coração disparou enquanto tentava lutar contra esta última alucinação, mas, quando as imagens começaram a retornar, ela percebeu que não se tratava do produto de sua mente torturada e sim de uma luz ofuscante acesa diante do seu rosto. Aos poucos, seus olhos se adaptaram e ela viu onde se encontrava - um espaço claustrofóbico cortado em um muro de pedra. Conforme adivinhara e temera, encontrava-se dentro de uma tumba.A luz percorreu a extensão do seu corpo com excruciante lentidão. Por fim, o homem atrás da lâmpada falou:- Vou desamarrar você - disse, com uma voz grave. - Não tente fugir ou serei forçado a machucá-la.O homem aproximou-se e com mãos enormes soltou-a. Enquanto tentava fazer o sangue

circular nos seus membros, ele tirou-a do espaço confinado.Subitamente ele acendeu outra luz, mais uma vez cegando Danielle temporariamente. Mais ou menos um minuto mais tarde, ela o viu pela primeira vez. Ele vestia um manto negro. Um véu cobria-lhe o rosto, mas os penetrantes olhos amarelos brilhavam em sua cabeça. Ela o conhecia. Já vira aqueles olhos antes. Mas onde?- Você está péssima - disse ele, tom sombrio. - Tire seu manto.Lentamente ela obedeceu até ver-se completamente nua. Sentia-se vulnerável, humilhada e impotente. Danielle sempre des-prezara essas emoções, e a combinação delas a enfureceu. Mas não podia fazer nada. O homem era facilmente uns trinta centímetros mais alto que ela e provavelmente teria duas vezes seu peso. Tudo o que podia fazer era observá-lo observando-a. Os pensamentos dele eram dolorosamente transparentes. O que faria se ele a atacasse? O que poderia fazer?Ele lhe entregou um pedaço de pão e um copo com água.- Beba, coma. Agora.Ela obedeceu enquanto ele a molestava com os olhos. Estava tão faminta que mal notou, mas, à medida que a fome e a sede cediam, o senso de revolta retornava. Odiava aquele homem. Se pudesse o mataria.Ele parecia ignorar todas essas coisas. Apontou para um canto onde havia um buraco no chão. Ela hesitou, mas foi até lá e satisfez suas

necessidades. Depois ele lhe deu um sabonete e um balde de água e ela se lavou. Não disse uma só palavra; só olhava.Por fim, ocorreu a Danielle que aquele gigante era o homem que seguira Josh, Dov e ela na saída da igreja do Santo Sepulcro. Que também tinha seguido Josh antes. Para quem trabalhava? O que queria? O que estava planejando fazer com ela?Ele chegou mais para perto dela, tão perto que seus corpos se tocaram. Passou a mão calejada no seu ombro, desceu pelo braço e em torno das nádegas.Não deixe que isto aconteça comigo, ela implorou silenciosamente. Por favor, não deixe que isto aconteça comigo.Abruptamente, ele recuou, virou e pegou o robe que ela usara antes.- Vista isso de novo - ordenou.Danielle, pela primeira vez feliz em obedecer, fez rapidamente o que ele disse. Sabia que ele tinha se excitado e também sabia que não tinha forças para detê-lo, mas ainda assim ele próprio se contivera. Isso queria dizer que ao seu seqüestrador ainda restava um resquício de decência? Ou estava simplesmente prolongando sua tortura?Não podia continuar desse jeito. Precisava de um plano, imaginar um modo de se libertar. Decidiu dirigir-lhe a palavra. Talvez se acreditasse que gostava dele, baixasse a guarda em dado momento.

- Qual é o seu nome? - perguntou ela, torcendo para não deixar transparecer na voz a angústia que sentia e querendo que soasse amistosa.- Alu - respondeu ele asperamente.Danielle arriscou um sorriso.- Que nome raro e interessante.- Você sabe quem foi Alu?- Não.A resposta dele foi insolente:- O filho de uma mulher semita com o demônio.Sua risada congelou os ossos de Danielle.

CAPÍTULO 17

JOSH MAL PODIA SE CONCENTRAR NO QUE OS OUTROS ARQUEÓLOGOS estavam dizendo. O próprio pergaminho ficara um pouco de lado. Só podia pensar no que acontecera a Avner e tentar adivinhar o que acontecera a Danielle. A cada hora que se passava ele se convencia mais e mais de que o desaparecimento de Danielle nada tinha a ver com o ataque a Dov. Ela fora seqüestrada, tinha certeza absoluta. Mas por quê? O que seus raptores pensavam que ela sabia sobre o pergaminho? Evidente que se a pessoa que inva-dira o quarto de Josh e o ameaçara pelo telefone fosse membro da IAA, saberia também que Danielle tinha pouca ou nenhuma informação a prestar.Eu não sou talhado para pensar deste modo, pensou Josh. Não são esses os mistérios que devo resolver.

A despeito das diversas horas de debate teórico, os arqueólogos realmente não podiam fazer muito enquanto os resultados do exame de datação por radiocarbono não chegassem, e no meio da tarde todos concordaram em fazer uma pausa até o dia seguinte. Para Josh, o final da reunião custou demais. Era uma loucura, na opinião dele, que perdessem tanto tempo assim discutindo com Danielle ainda desaparecida. Se isto não fosse importante para todos os arqueólogos, tinha que ser uma prioridade absoluta para Moshe. Mas o homem parecia preso em areia movediça. Estaria tão atônito com o sumiço da filha que não era capaz de agir ou havia algo por trás de sua aparente despreocupação? Josh não sabia o que pensar a respeito de coisa alguma.

Para sua proteção, a segurança do museu havia transferido Josh para um apartamento a menos de dois quilômetros a pé da Cidade Antiga. Apenas Moshe e o novo guarda-costas, Ari, conheciam o novo endereço. Já tinha passado e muito o prazo final que lhe tinham dado para entregar o pergaminho, mas ele ainda estava vivo. Pelo menos algo estava funcionando adequadamente.Josh estava exausto, sem forças para seguir em frente. Precisava de alguns minutos para se recuperar e depois iria à procura de Danielle, mesmo que não tivesse um plano claro para encontrá-la. Josh praticamente tropeçava de cansaço ao atravessar a porta da frente do

apartamento. Jogou as chaves em cima da mesa e se atirou no sofá. Precisava descansar uns minutos a fim de formular um plano de ação. Em questão de segundos estava dormindo.Ele está de pé diante da Cidadela, a forma imponente da torre de Davi erguendo-se acima da magnífica fortaleza. À distância, Josh pôde ver o domo da Igreja do Santo Sepulcro...Encontra-se ao mesmo tempo presente à cena e distanciado. Enquanto observa, sem ser visto e incapaz de interagir com quem quer que fosse à sua volta, cruzados protegidos por armaduras rodeiam judeus — homens, mulheres e crianças — e os conduzem na direção da sinagoga. Josh pode sentir que as pessoas estão cheias de medo e sabe que suas vidas correm grave perigo. Sabe que elas também não são capazes de se salvarem e pode sentir seu sofrimento e desesperança.Quando todos estão do lado de dentro, os cruzados trancam o prédio. Depois, friamente, como se aquilo fosse apenas mais um dia de trabalho, ateiam fogo à sinagoga. Josh quer desesperadamente ajudar, encontrar algum modo de libertar as vítimas inocentes, mas não consegue se mover.O som dos gritos enche o ar e só há nuvens de fumaça negra e labaredas, que se refletem nas armaduras dos cruzados e projetam sombras longas e assustadoras sobre o sinal da cruz pintado no seu estandarte.Josh não pode senão assistir ao incêndio do prédio, incapaz de desviar os olhos. Com o

tempo, os gritos cessam e o edifício da sinagoga se transforma em cinzas.

Josh acordou do pesadelo com o coração disparado. Instintivamente pegou um exemplar do novo Testamento e leu Mateus 10:34.Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer paz e sim a espada.

Os cruzados tinham usado espadas para matar milhares de judeus. Teriam feito isso em nome de Jesus, o Judeu?Baseado em tudo quanto Josh lera a respeito de Jesus, o personagem histórico, ele fora um homem de amor. Como as coisas podiam ter saído tão erradas? Embora não houvesse evidência empírica de que ele tenha existido, segundo a opinião geral Jesus pregara o bem e as boas ações; foram outras pessoas, que não o tinham conhecido, que distorceram sua mensagem. Será que quem quer que estivesse tentando roubar o pergaminho ansiava por dis-torcer as palavras recentemente descobertas do mesmo modo — e deixar o mesmo legado de violência?

CAPÍTULO 18

ALU PRECISAVA CAMINHAR. PRECISAVA ENTENDER O QUE ESTAVA acontecendo dentro da sua cabeça. Era um homem profundamente religioso - muito mais do que muitos dos nomeados "pios". Levava seu compromisso com o Mestre a sério, assim

também como seu voto de castidade. Nem uma só vez desobedecera a uma ordem dele, e desta vez não deveria ser diferente. Mas o plano saíra errado.A segurança israelense aparecera no Portão dos Mouros antes que os outros tivessem conseguido completar sua parte da missão, e, para que pudessem fugir, tiveram que seqüestrar um carro com a mulher ainda dentro. Quiseram matá-la imediatamente, antes que o Mestre descobrisse como tinham sido descuidados, mas assim que Alu pôs os olhos nela não permitiu. Ao contrário, ele a levara para a tumba onde a escondera até decidir o que faria.Não podia explicar suas ações, nem para si próprio. Mas havia algo na expressão amedrontada dos seus olhos, misturado com... seria bondade? Ternura, talvez? Fazia com que Alu se lembrasse de alguém - e de alguma coisa que há muito tempo ele tentava esquecer. Agora, ao caminhar apressadamente pelas ruas a fim de fugir do seu pânico, foi levado de volta à outra época, muito tempo atrás, quando ele descobrira o que era ser sozinho. Podia ver aquele momento com tanta clareza como se tivesse acabado de acontecer.Tinha doze anos de idade, ainda uma criança, e geralmente se sentava no banco de trás do carro. Nesta ocasião, contudo, a mãe insistira para que se sentasse ao lado dela no banco da frente.

- Você é tão atraente quanto um artista de cinema - disse ela, ajeitando uma mecha do seu cabelo.Alu corou e se contorceu no banco.- Você está dizendo isso só porque sou seu filho.- De modo algum. Não vê como as garotas olham para você?- Não - ele era tímido, e ainda sem graça na sua adolescência recente. Não estava acostumado a ser alvo de atenções, mas era bom ser elogiado daquele jeito, como homem.- Você é muito alto para sua idade e tem um queixo forte. São coisas que não têm nada a ver com o fato de eu ser sua mãe. Mesmo que não fosse, acharia você bonito.Alu sorriu e admirou o belo rosto da mãe.Foi a última imagem pacífica que teria.De repente, uma picape bateu na traseira do carro em que estavam, e eles se viram engolfados pelas chamas. Alu não se lembrava do que aconteceu a seguir. Disseram-lhe mais tarde que ele fora lançado pela porta e caíra no meio da rua, severamente queimado e em estado de choque. A mãe tinha ficado presa dentro do automóvel e morrera incinerada ao tentar libertar-se.As cicatrizes de Alu foram tanto físicas quanto mentais. Ainda parecia um artista de cinema, só que agora um vilão de um filme de horror. Com metade do rosto desfigurado e a querida mãe morta, ele retirou-se do mundo. Só o Mestre não se encolhia de medo ao vê-lo ou o xingava. Só o Mestre o aceitou e lhe mostrou a verdadeira luz

de Deus. Alu ligava-se ao seu salvador por muito mais que simples gratidão.Aquela mulher, contudo - ela fizera alguma coisa a ele.Quando a vira pela primeira vez, lembranças há muito esquecidas ressurgiram. Alu viu Danielle, mas em sua mente quem via era sua mãe renascida. Tinha a mesma boca bonita e suave e o cabelo negro. E o fitava com qualquer coisa da afeição que um dia vira nos olhos da mãe. O coração de Alu foi atraído para ela. Talvez aquela mulher um dia pudesse até vir a gostar dele.Quando Alu contemplou seu corpo nu, sentiu um desejo sexual de um tipo que jamais sentira antes. A mulher era magnífica; quando tocou nela foi como tocar em fogo. Não o fogo que o desfigurara quando menino e o forçara a usar um véu - estas chamas eram deliciosas. Ao invés de consumi-lo, fizeram com que se sentisse mais forte.Ele a desejava tão desesperadamente que estava pronto a abjurar seus votos e possuí-la à força, se necessário — o que seria o caso, claro, porque ninguém ia querer fazer amor voluntariamente com um monstro tão execrável. A paixão o subjugou, mas, quando se moveu para entregar-se à luxúria, viu o medo em seus olhos e interrompeu-se. Não podia magoá-la.Então ela lhe falara, não como alguém que estivesse apavorada c sim como uma amiga. Gostava dele. Talvez tivesse até mesmo admirado seu controle. Resolvera assustá-la com aquela história sobre seu nome porque ele

próprio se sentira amedrontado com aquela confusa torrente de emoções.Alu seguiu correndo pela Via Dolorosa, o cérebro tão disparado quanto o corpo gigantesco. Não foi senão quando o telefone u lular tocou que ele parou e procurou recuperar o fôlego.-Sim?- Como está a garota?- Mestre, eu posso explicar...- Os outros já foram punidos pela negligência e insubordinação. O que nos preocupa agora, Alu, é se nossa missão foi comprometida por esta imprudência.- A garota está ótima. Amedrontada e confusa, mas incólume. Depois de alimentá-la, amarrei-a de novo e coloquei-a de volta no nicho.- Quando você vai voltar lá?- Estou a caminho agora.- Quando chegar lá, mate-a.O coração de Alu disparou.Mas eu pensei...- Você está questionando o Mestre? Esta nunca foi sua função. Você seguirá minhas ordens - a linha ficou muda por um instante.- Mestre, posso falar, por favor? Nunca o questionei em nada e sempre cumpri todas as suas ordens.- É verdade. É por isto que ainda está vivo.Alu mordeu o lábio. Dizer mais uma palavra seria suicídio. Mas lembrou-se do rosto lindo de Danielle e seu coração desejou-a vivamente. Tinha que haver alguma coisa que pudesse fazer.

— Mestre, depois de tantos anos de serviço leal ao senhor e à sua causa, peço que me ouça desta vez - ele tinha que pensar rapidamente.Houve outra pausa antes do Mestre responder.— Você avalia o preço que terá de pagar se eu não gostar do que ouvir?- Eu compreendo - disse Alu, cuidadosamente. - Muito obrigado, Mestre. Serei sempre seu humilde servo. - Alu mal conseguiu pronunciar as palavras seguintes, tão fortemente batia seu coração. - Acho que será melhor para nós poupar a garota.- Impossível. Ela sabe demais.— Mestre, eu a interroguei meticulosamente - Alu estava mentindo, mas não tinha outra saída. - Não acredito que ela tenha conhecimento de qualquer coisa que possa nos prejudicar. Quem sabe poderíamos trocá-la pelo artefato?- Ela conhece a localização de um de nossos locais de encontro.— Ela sabe que se encontra em uma tumba, mas não sabe onde é localizada. Quando a seqüestramos, nós a vendamos e só fomos tirar a venda quando já estava no nicho da muralha.De uma hora para outra, sem o menor sinal que antecipasse aquilo, o Mestre soltou uma risada cruel e zombeteira.- Você está apaixonado, Alu? Pensa que ela gosta de você tanto quanto você gosta dela?O Mestre riu muito, e ouvir suas gargalhadas causou imensa dor em Alu. Mas a dor lhe deu coragem para continuar abrindo seu coração.

— Mestre, se o senhor a quiser morta, eu a matarei, mas não vejo prejuízo para nós se a deixarmos ir. Já derramamos bastante sangue.- Se o artefato for autêntico e o que ele diz for prejudicial à nossa causa, haverá sangue derramado para alimentar uma legião de vampiros por gerações e gerações - o Mestre riu de novo.A risada decresceu em intensidade lentamente.- Você tem razão, Alu, você tem sido um servo leal. Se quiser conservar a garota para alimentar por mais algum tempo suas fantasias, eu serei magnânimo. Deixarei a seu cargo a decisão de quando matá-la. Se for uma decisão errada, contudo, sua morte terá sido causada por você mesmo.- Sim, Mestre - agradeceu Alu. O Mestre desligou e Alu ficou olhando para o telefone. Jamais alguém convencera o Mestre a mudar de idéia.Será que pagaria com a vida a honra de ser o primeiro?

Alu sentiu-se poderoso e aterrorizado ao mesmo tempo. Precisava controlar-se e pedir orientação a Deus. Só havia um único lugar aonde podia ir.Envolto em mito e lenda, o Monte das Oliveiras é onde muitos judeus piedosos acreditavam que teria lugar o Dia do Julgamento final, quando os mortos literalmente se ergueriam das sepulturas. Era também ali que ficava o Getsêmane, o jardim aonde Jesus e seus discípulos tinham ido na noite anterior à sua prisão e julgamento. Embora fosse apenas um iniciado e estivesse longe de ser

sábio ou santo como o Mestre, Alu sempre sentia a emoção do santo julgamento de Deus quando ia até lá. Ali, na colina íngreme, de onde era possível ver a muralha da Cidade Antiga a leste do Monte do Templo, em meio ao antigo cemitério judeu e muitas sepulturas, ele sempre conseguia se livrar das tentações mundanas e reencontrar a fé.Mas ao deslocar-se na encosta deserta, tornou-se cauteloso. Dois homens davam a impressão de o seguirem a cerca de cinqüenta metros às suas costas. Decidiu não se arriscar, virou-se e voltou para a Cidade Antiga. Passou pelo Portão de Santo Estevão, a principal conexão entre o Bairro Muçulmano e as ruas onde moram os árabes, a leste. Alu seguiu pela rua Sha'ar Ha'arayot, passando pelo Mosteiro da Flagelação onde, de acordo com a tradição, Jesus recebeu a cruz e foi açoitado. Desceu correndo uma rua estreita e cheia de gente e desapareceu na multidão.

Só depois que a noite caiu Alu voltou à tumba onde mantinha Danielle cativa. Ela já se encontrava lá havia vinte e quatro horas, tendo comido apenas um pedaço de pão com água. Ele foi até o nicho, puxou-a para fora e a desamarrou. Desta vez levou queijo junto com o pão. Ao recebê-lo, Danielle agradeceu com um sorriso que o aqueceu com seu calor. Nenhum dos dois falou enquanto ela comia avidamente e depois satisfez suas necessidades.Quando voltou, parou diante de Alu. Vestida como um anjo com um manto branco e fino, a

beleza de Danielle parecia emitir uma luz própria mesmo ali naquela tumba fria e escura. Mas era uma luz frágil e seu rosto subitamente contraiu-se quando ela rompeu em lágrimas.- O que há de errado? - perguntou Alu, sem saber ao certo como reagir. Tencionava ser gentil, mas sua voz era demasiado alta e as manoplas rudes e desajeitadas em vez de reconfortantes, quando tentou acariciar-lhe o cabelo.- Estou com medo — disse ela, soluçando. - Sinto falta de meu pai. Sinto falta de minha vida. Sei que você vai me matar.Os soluços sacudiram o corpo de Danielle e o coração de Alu se apiedou dela. Surpreendendo a si próprio, ele se adiantou e tomou-a nos braços. Ainda mais surpreendentemente, ela não re-sistiu. Na verdade, foi receptiva ao gesto reconfortante.Ela gosta de mim. Ela não me vê como um monstro.— Não vou matar você — disse ele suavemente.Danielle ergueu os olhos para ele, as lágrimas escorrendo pelo rosto.— Como posso acreditar em você?Alu a abraçou com força de novo, sentindo seu corpo reagir ao dela. Obrigou-se a manter sob controle sua sensualidade.- Pode acreditar em mim, porque eu jamais farei alguma coisa que a magoe - assegurou.Danielle encostou o rosto no peito dele.- Então me solta.

Ela começou a chorar de novo e Alu ficou chocado ao ver como lhe parecia pequena agora. Seu sofrimento rasgou-lhe o coração. (Queria protegê-la e, no entanto, o Mestre o mataria se a libertasse. E se a mantivesse presa e ela viesse a sofrer - talvez mesmo em suas próprias mãos - viveria o resto da vida com esse tormento.- Danielle - disse Alu, pronunciando as palavras antes que sua mente pudesse protestar mais -, você sabe onde se encontra?Ela choramingou, fungando, e levou um momento para recobrar as forças. - Estou em uma tumba - ficou quieta por um segundo e prosseguiu. - Há centenas delas em Jerusalém e nas cercanias. Já estive em outras, mas pelo lado de dentro todas parecem iguais.Alu sabia que ela estava dizendo a verdade. Ele próprio estivera em muitas tumbas e era impossível distingui-las sem vê-las de fora. Sentiu-se subitamente jubiloso ao perceber que podia cometer um ato de bondade sem comprometer o Mestre.- Se eu libertar você - disse ele -, vou precisar de sua palavra de honra que não dirá a ninguém onde esteve.Danielle o encarou de novo. O brilho dos seus olhos fez com que desejasse ficar para sempre com ela nos braços.- Juro que não sei onde estou.- Ninguém pode saber.Ela balançou lentamente a cabeça.- Eu prometo.

Alu fechou os olhos, compreendendo a conseqüência das suas próximas palavras.Ainda há tempo de mudar de idéia, pensou Alu enquanto vendava Danielle. Segurou a mão dela e a levou para fora da tumba. O Mestre não precisa saber. Nunca. Direi ao motorista que houve uma mudança de planos. Alu sabia, contudo, que não mudaria de idéia. Perdera o poder de feri-la quando ela olhara para ele pela primeira vez com tanta piedade e compreensão. Danielle nunca vira seu rosto, mas Alu estava convencido de que ela o via de um modo como ninguém mais no mundo vira antes.Andaram uns cem metros e Alu mandou que parasse.- Eu volto - disse. - Não faça nada. Não quero machucar você.- Eu espero - prometeu Danielle.Poucos minutos depois, Alu retornou e conduziu Danielle pela descida da encosta. O carro que os esperava levou-os a uma região deserta do setor leste de Jerusalém.Quando a ajudou a saltar, Alu disse para que não tirasse a venda antes de cinco minutos.Danielle aquiesceu.- E lembre-se... não deve falar com ninguém sobre onde você esteve.- Eu prometo - disse ela, sorrindo calorosamente. - Nunca falarei.Alu teve vontade de beijá-la, ou pelo menos abraçá-la mais uma vez. Mas como explicaria um gesto de carinho ao motorista? Tinha que resistir. Fixou os olhos em Danielle por mais um mo-

mento, sabendo que talvez nunca mais a visse. Queria memorizar cada detalhe daquela visão.- Nunca diga uma palavra - insistiu ele e entrou no carro. O motorista arrancou rapidamente, mas Alu virou-se e ficou olhando Danielle pela janela de trás até que ela deixou de ser visível.

Capítulo 19

PROCURAR DANIELLE ERA INÚTIL. A CIDADE ERA SIMPLESMENTE GRANDE demais. Havia um número enorme de lugares para escondê-la e Josh praticamente não tinha pistas. Sentiu-se frustrado e com raiva de si próprio. Devia ser capaz de fazer mais coisas pelas pessoas de quem gostava. Ela estaria bem? Estaria viva? Danielle já era uma vítima da sua descoberta, mas se ela tivesse morrido por causa disso nunca conseguiria se perdoar.Sabendo que enlouqueceria se não fizesse alguma coisa, Josh buscou alívio nas imagens do pergaminho que armazenara no laptop. O rolo de pergaminho propriamente dito se compunha de nove seções, todas escritas em aramaico e com alguns trechos pouco legíveis. Passou os olhos pelo texto tentando se concentrar ou encontrar algum sinal que lhe dissesse o que fazer a seguir. Estava inquieto e o clarão da tela causava-lhe uma dor de cabeça lancinante. Ainda assim, a promessa representada pelos segredos do

pergaminho tinha tal poder sobre Josh que não o largava.Gostaria de saber como a IAA lidaria com a descoberta. Será que a considerariam genuína ou apenas mais um entre as centenas de falsos artefatos que chegavam às suas mãos? Mesmo que decidissem que não era autêntico, teria realmente alguma importância? Haviam surgido controvérsias anteriormente, como a que cercava o Ossário de Tiago - a caixa de pedra com os ossos de Tiago, filho de José e irmão de Jesus. A Direção de Antiguidades de Israel o considerou uma fraude, mas alguns peritos discordam.Josh compreendia o dilema deles: o mercado negro de antiguidades de Israel estava em plena expansão. Alguns dos maiores comerciantes de antiguidades do país estavam sendo investigados por fraude e comércio ilegal e muitos dos artefatos da nação tinham sido considerados falsos. A IAA estava cheia de serviço e, ainda assim, tinha a obrigação de levar a sério cada nova descoberta. De muitos modos, eles eram os guardiões da história da civilização.Josh tinha a estranha sensação de que sua descoberta era autêntica, embora nenhum dos exames - carbono 14, paleográfico ou tipográfico - tivesse ficado pronto. O que, por sinal, seria apenas o primeiro passo e, sob muitos aspectos, o mais fácil. Datar o manuscrito era a parte fácil; determinar a identidade do autor era quase impossível. Ainda assim, Josh estava profundamente convicto, de um modo que não

era capaz de explicar, de que conhecia a identidade de quem escrevera o manuscrito.Ele já traduzira a primeira seção e agora começava a examinar as palavras seguintes. Mais uma vez leu o nome do autor: Yehoshua ben Yosef-Joshua filho de José. O nome em aramaico de Jesus de Nazaré... para milhões, era Deus. Para outros, um profeta ou homem santo. Para alguns, um rabino iluminado. Havia quem o considerasse um mero mortal e outros ainda que o viam como um mito.Quanto a Josh, buscava a verdade histórica nas narrativas bíblicas. Em muitos casos, duvidava que aqueles que eram considerados os autores dessas narrativas o fossem de fato. Na verdade, estava convencido por seus estudos e pesquisas, de que a maior parte da Bíblia é baseada em mitos e lendas. No entanto, mesmo questionando a real autoria dos textos, gostava de ler seus ensinamentos e encontrava ali valiosas lições de grande sabedoria.Os arqueólogos tinham concordado em esperar até que as provas de datação fossem feitas para continuarem a traduzir o pergaminho - mas é claro que não sabiam que Josh tinha aquelas ima-gens. Ele decidiu continuar o trabalho agora, sabendo que seria a única coisa que amenizaria a sua ansiedade por causa de Danielle. Como na primeira parte, a tradução foi difícil e lenta, e a tarefa por si só, já complicada, dificultada pelos caracteres desbotados e incompletos. Até tarde da noite, Josh trabalhou a fim de comprar outra passagem:

Eu era criança quando descobri que era diferente. Brincava perto de um regato quando outro menino jogou uma pedra que me acertou no braço direito, causando-me imensa dor. A raiva cresceu dentro de mim. Desejei mal ao meu agressor e, para minha surpresa, ele caiu e pareceu estar morto. Esmagado pela culpa que senti, corri até o menino sem vida, toquei nele e desejei que abrisse os olhos. E assim foi. Daquele dia em diante percebi que precisava controlar minha raiva.Quando eu tinha seis anos, minha mãe, Miriam, me disse que guardava um segredo que ia me contar quando chegasse a ocasião adequada. Nunca chegou a me dizer o que era. Eu já ouvira alguns dos aldeões bisbilhotarem dizendo que meu pai, foseph, não era realmente meu pai. Também faziam outros comentários maliciosos sobre isso.Na infância, eu era travesso e vivia metido em problemas. Quando rapaz, comecei a domar meus demônios interiores. Estudava a Torá e rezava todos os dias. Experimentei os prazeres da carne, mas, com o tempo, vim a descobrir que era um impedimento à minha missão. Por este motivo decidi adotar o celibato.Já desde os tempos de menino, senti que minha vida tinha um propósito maior. Eu tinha trinta anos quando descobri qual era esse propósito. O sol claro iluminava as águas do rio Jordão na hora em que João apareceu. João era chamado de Batista. João Batista olhou para mim como se

tivesse me conhecido sempre. Ele me imergiu na água e gritou para que eu me arrependesse, pois o final dos tempos estava próximo. "Arrependa-se", ele gritou com uma voz retumbante e a multidão em volta ficava fascinada com cada palavra que pronunciava.João me encarou e um sorriso apareceu no seu rosto sério. Seus olhos escuros, castanhos, pareceram penetrar minha alma e ele disse: "Você é o escolhido. "Não entendi o que quis dizer, mas naquela noite tive um sonho. Eu seria o pastor dos pobres, dos oprimidos, dos frustrados e dos desesperançados. Eu seria seu rabino, seu mestre e ia curá-los.

A cada palavra traduzida, mais e mais Josh ficava convencido da autenticidade do pergaminho. Aquele não era o Jesus das histórias infantis ou dos livros escritos centenas de anos após a sua morte. Eram palavras escritas por um homem que conhecia a vida, que compreendia os tempos em que vivia e que se sentia confuso com os próprios dons. Um homem que falava dos prazeres da carne e de lutar para conter a raiva que sentia. Em outras palavras, um homem de verdade, não um mito ou símbolo.Josh sentira-se fascinado por Jesus em toda a sua vida adulta. Ao trazer aquelas palavras para o século atual, contudo, sentiu-se ainda mais próximo daquele homem do que jamais se sentira antes. O que era estimulante, claro, mas também o deixava um tanto desconcertado.

Fisicamente exausto, mas sentindo-se realizado pela primeira vez em dias, Josh caiu num sono sem sonhos. No dia seguinte descobrira um modo de salvar Danielle. Tinha certeza disso.Ele acordou com o toque do telefone. Podia jurar que mal tinha fechado os olhos, mas a luz do dia já entrava pela janela do quarto.- Josh, aqui é Moshe. Tenho uma notícia maravilhosa: Danielle está livre.Ele sentou-se subitamente na cama.- Ela está livre? Está bem?- Danielle está abatida, mas fisicamente incólume. Agora está sedada e tenho certeza de que vai precisar de alguma ajuda; mas está salva, graças a Deus.A emoção na voz de Moshe revelou pela primeira vez o quão amedrontado ele se sentira por causa da filha.- Você chegou a descobrir alguma coisa a respeito do que aconteceu a ela? - perguntou Josh, tentando ser delicado.- Ela foi abduzida por um homem gigantesco chamado Alu e mantida cativa em uma tumba. De algum modo, Danielle conseguiu convencê-lo a libertá-la - Moshe deu uma risadinha. - Pro-vavelmente nunca competiu antes com alguém inteligente como Danielle.Na mesma hora Josh se lembrou do gigante de preto que por duas vezes percebera que o estava seguindo. Mas sabia que tinha que haver outros capangas envolvidos. Os dois homens que ataca-ram Dov, por exemplo, eram muito mais baixos.

- Achei que você ia gostar de saber - disse Moshe, trazendo Josh de volta ao presente.- Sim, claro; muito obrigado por ter me telefonado — quando a notícia de que Danielle estava em segurança foi assimilada, Josh permitiu-se pela primeira vez sentir todo o desespero causado pela sua perda. Algo quase tão avassalador quanto a magnitude de sua alegria ao saber que ela estava bem.- Quando posso vê-la? - perguntou, ansiosamente.- Precisamos dar um pouco de tempo a ela. Deixar que absorva tudo o que aconteceu.- Eu gostaria de ajudá-la.- Você irá ajudá-la - garantiu Moshe, mantendo a distância.Basta lhe dar um tempinho.- Claro - concordou Josh. Afinal de contas, Moshe tinha o direito de ser o protetor da filha em uma ocasião daquelas. A despeito dos próprios sentimentos, Josh sabia que ele e Danielle iam querer algum tempo a sós. - Moshe? Sinto-me feliz por você.Moshe ficou quieto por um longo momento.- Sinta-se feliz por todos nós, Josh - respondeu Moshe, com um travo na garganta.

CAPÍTULO 20

DANIELLE ABRIU OS OLHOS PARA DESCOBRIR QUE SE ENCONTRAVA deitada em um sofá firme e confortável, debaixo de uma coberta acolchoada. Era a cama da sua

infância, um dos lugares mais seguros que conhecera.Sentou-se vagarosamente e esfregou a testa. Alu a soltara por uma razão que compreendia apenas parcialmente. Lembrava-se de ter sido vendada no carro e de ver que fora deixada em uma rua desconhecida enquanto o carro se afastava em alta velocidade. Não se lembrava de muito mais após isso, mas obviamente conseguira chegar à casa do pai. Estava claro agora do lado de fora, mas não saberia dizer ao certo que horas eram. Dando uma olhada no relógio do quarto, viu que era o início da tarde.Ela dispôs-se a saltar da cama, mas quando puxou a coberta sentiu um calafrio no corpo, como se estivesse resfriada. Odiava o que estava lhe acontecendo - primeiro o seqüestro, e agora o corpo fraco e vulnerável. Não era uma sensação com a qual estivesse acostumada e pensou em combatê-la. Mas depois de ficar sentada na beira da cama por um momento, com as pernas parecendo dois pesos mortos e o sangue latejando na garganta, finalmente cedeu e se meteu de novo debaixo do edredom. Talvez fosse melhor deixar que cuidassem dela, por algum tempo, só daquela vez.Alguns minutos mais tarde seu pai meteu a cabeça pela abertura da porta a fim de checar seu estado. Quando viu que estava acordada entrou no quarto e foi se colocar ao lado da cama. Beijou-a gentilmente.- Como está se sentindo? — perguntou ele.- Não tão bem quanto eu gostaria.

Moshe sentou-se na beira da cama e segurou a mão de Danielle.- Você passou por uma coisa terrível.- Já passei por coisas terríveis antes - ela protestou, ainda achando difícil aceitar aquilo passivamente.Ele apertou-lhe a mão.- Não como agora.Danielle fechou os olhos por um instante. Não gostou do que viu.- Pensei que ele fosse me estuprar - murmurou. - Pensei que ia me matar e me deixar apodrecendo ali.- Ele pagará pelo que fez, querida. Nós encontraremos um jeito de fazer com que ele pague.Ela olhou fundo nos olhos do pai. Ele sempre fora muito protetor, embora ela já tivesse provado muito tempo atrás que era capaz de se defender.- Para ser sincera, papai, eu ficaria igualmente feliz esquecendo que ele tenha existido.- Talvez isso também seja possível - Moshe hesitou. - Mas talvez não seja.Danielle sabia que o pai estava falando a verdade e que aquilo não era um trauma que pudesse soterrar no fundo da mente.- Isto obviamente tem a ver com o pergaminho que Josh achou e as ameaças que ele recebeu...Neste ponto, uma idéia ocorreu-lhe pela primeira vez.Moshe viu que ela ficara lívida e falou calmamente para tranqüilizá-la. - Josh está bem.

Ficou muito preocupado com você, mas eu telefonei para avisar que você estava bem.Mesmo exausta e em meio a seu trauma, Danielle ficou surpresa com a intensidade do alívio que sentiu subitamente. Mesmo assim, sabia que não podia dar tudo por terminado. Josh ainda podia estar em sério perigo. Uma coisa a intrigava, porém. - Você sabe o que queriam comigo?Moshe deu umas palmadinhas na mão dela, distraído.Não sei. Nunca entraram em contato conosco a respeito de você — ele deixou escapar uma risadinha. - Cheguei até a ter esperanças de que você tivesse sumido mais uma vez em uma de suas aventuras... Só posso imaginar que você conseguiu ser libertada antes deles a usarem para qualquer que tenha sido a finalidade para a qual a seqüestraram.Danielle apertou com força a mão do pai e eles se encararam, olhos nos olhos, por longo tempo. Depois soltou a mão e preparou-se para se levantar de novo.- Você devia ficar deitada - disse ele, em um tom tipicamente paternal.Dan girou as pernas para se sentar. Não houve calafrio desta vez. Ela soube que poderia ficar de pé.- Não, não devo. Acredite em mim, a última coisa que quero fazer a esta altura dos acontecimentos é deitar. Quero ver Josh. Pode me levar aonde você o escondeu?Moshe inclinou a cabeça.

- Não precisa. Ele está aqui na sala há horas.

CAPÍTULO 21

JOSH SENTIU A FORÇA DO PROFUNDO TRANSE CONTEMPLATIVO EM QUE entrara. Era assim que pensava que formulava as perguntas que não podia responder de nenhum outro modo. Quando em transe profundo, visualizava os campos de energia do seu corpo e tentava controlá-los. A princípio não conseguira, mas após incontáveis tentativas no curso de diversos anos, aprendera o bastante para conseguir algum êxito. Começou a trabalhar com o que pareciam ser os doze campos de energia mais importantes. Depois de algum tempo descobriu um livro sobre medicina chinesa e identificou os mesmos campos de energia usados em acupuntura. Claro que lá usavam agulhas: Josh usava sua mente. Ele praticava regulando o fluxo de sangue para as diferentes partes do seu corpo e manipulando a energia.Josh descobriu que tinha este dom especial aos cinco anos de idade. Avner bateu com seu trenó e perdeu os sentidos. Instintivamente, Josh colocou as mãos sobre ele, sentiu a força de sua vida irradiando para fora e, em uma questão de instantes, Avner estava sentado, querendo saber o que acontecera. As outras crianças acharam aquilo estranho, e até o próprio Avner pareceu sem graça com o que tinha acontecido. Envergonhado com aquele episódio, Josh mantivera em sigilo seus exercícios e nunca mais

usara seu dom em qualquer outra pessoa até o incidente com Dov no Portão dos Mouros.Agora, enquanto se concentrava na respiração, passou a formular perguntas a si próprio sobre o pergaminho, do seqüestro de Danielle, e por que alguém tinha recorrido à violência, seqüestro e assassinato para se apoderar do que ele havia achado. Visualizava apenas fragmentos do que deveria ser um quadro maior — uma serpente e uma corrente de ouro - mas as respostas permaneciam elusivas.Então, sem atingir um grande clímax para suas visões, Josh sentiu-se compelido a sair do transe. Todas as suas meditações terminavam desse modo e ele nunca tentava forçar uma outra maneira. Cada sessão durava tanto quanto devia.Quando abriu os olhos, viu Danielle em pé ao seu lado. De alguma maneira, mesmo depois de tudo por quanto havia passado, ela estava radiante.- Cochilando? - perguntou ela, bem-humorada. - Que bom que não ficou preocupado demais com o meu estado.Ele sorriu. Sentira falta da sua voz.- Imaginei que não precisava me preocupar muito com alguém capaz de fugir no auge da conversa de uma tumba guardada por um gigante horrível.Danielle riu e o coração dele deu um pulo de alegria. Inclinou- se na sua direção.- Você está bem?Ela sentou-se ao seu lado no sofá.- Vou ficar.

Antes que pudesse se conter, ele adiantou-se e tomou-a nos braços, puxando-a para junto do seu peito com tanta força quanto nunca abraçara ninguém em sua vida. Queria transmitir-lhe força e fazer com que soubesse que faria qualquer coisa que estivesse ao seu alcance para impedir que ela sofresse de novo angústia semelhante. Ao mesmo tempo, contudo, buscava a sua força - a força que ela podia lhe proporcionar apenas por estar presente em sua vida.- Eu me preocupei demais com você - disse ele, com a voz surpreendentemente áspera - e não conseguia atinar com o que devia fazer. Tentei encontrá-la, mas não sabia onde procurar.Danielle se aconchegou mais nos seus braços.- Estou de volta. Consegui voltar.- Minha intenção não era vê-la sofrer desse modo. Mudou tudo para mim.Ela ergueu a cabeça.- Não é possível. Precisamos descobrir o que for possível sobre o pergaminho. Precisamos descobrir por que alguém o deseja tanto. Você não pode mudar agora, não pode recuar. Você...Josh interrompeu-a, sorrindo.- Não, não era isto que eu queria dizer. Foi você que mudou tudo para mim.Ele aproximou os lábios, beijou-a gentilmente e depois com lima paixão súbita e desesperada. Beijar Danielle foi como entrar cm outra forma de transe. Sentiu-se mais leve, quase como se ti-vesse abandonado o corpo. Ao mesmo tempo, contudo, nunca se sentira mais enraizado. Havia

respostas aqui, também. Que respondiam perguntas que nunca pensara fazer.

Capítulo 22

OS GUARDIÕES ESTAVAM REUNIDOS SOB A CIDADE ANTIGA, EM SEU esconderijo subterrâneo. Aquele era o quartel-general da seita havia mais de setenta anos, desde antes da criação do moderno Estado de Israel. Vestidos como padres católicos eram capazes de circular pelo Bairro Cristão, sem atrair a atenção dos soldados israelenses e da polícia, acostumados a ver religiosos trajando roupas clericais. O subterfúgio dava certo praticamente sem esforço, já que os clérigos são considerados acima da culpa e ninguém se dava o trabalho de examiná-los perto o suficiente para distinguir as diferenças no vestuário dos Guardiões - diferenças como armas e facas escondidas debaixo das batinas.A luz dos archotes colocados em tocheiras presas às paredes antigas projetava sombras compridas que cortavam o obscuro espaço da reunião. Os doze Escolhidos estavam sentados em bancos de pedra, que datavam do primeiro século, à espera do Mestre. Embora por fora estivessem em silêncio, interiormente cantavam a uma só voz.Louvemos ao Deus Criador.

Nós lhe agradecemos pelo seu eleito Paul, pois apenas ele fala com a Voz Verdadeira.Conceda-nos a força para resistir às falsas profecias e ao Demiurgo, o deus menor do Gênesis.Permita-nos carregar sua mensagem até os Últimos Dias.Eles repetiram as Quatro Proclamações por incontáveis minutos enquanto esperavam.Quando a energia das vozes interiores atingiu o auge, o Mestre permitiu que os Escolhidos compartilhassem de sua presença, fazendo sua entrada em traje de gala. Vestia o mesmo manto religioso que os acólitos, mas trazia no rosto a máscara sagrada da serpente. Em torno do pescoço usava o símbolo da seita: a cobra enrolada no crucifixo.- Tenho muitas coisas para discutir com vocês - disse o Mestre cin uma voz sonora. - Mas primeiro tenho que lhes falar sobre um de nossos irmãos que nos falhou e tem que ser julgado.O Mestre manteve seus seguidores em silenciosa expectativa por algum tempo, permitindo que a gravidade de suas palavras fosse assimilada.- Todos vocês compreendem a seriedade da nossa missão. Cada um de vocês sabe como é importante que nos levantemos contra os cegos que acreditam no falso deus. É nosso privilégio e também o dever que juramos cumprir, preparar este mundo doente para o Arrebatamento que se aproxima. Vocês foram escolhidos para essa tarefa assim como eu fui escolhido para liderar vocês. Como seu Mestre, devo ser obedecido -

totalmente. No entanto, um de vocês preferiu agir sozinho, abandonando a trilha certa. Hoje vocês têm que me ajudar a julgar um de nossos membros que falhou.- Sim, Mestre - disseram os Escolhidos em uníssono.O Mestre virou-se para o mais alto entre todos eles, fixando o olhar enquanto o homem enorme se contorcia.- Levante-se, Alu.- Quer saber por que eu lhe pedi para levantar?- Não, Mestre.O olhar do Mestre parecia perfurar a cabeça do gigante.- Você está me dizendo que me desobedeceu conscientemente?Alu sacudiu rapidamente a cabeça.- Eu não o desobedeci por querer, Mestre. Não tive intenção de fazer nada desse tipo. Mas a judia era tão encantadora, tão irresistível. Não pude me conter.- E deixou que ela escapasse.Os olhos de Alu dardejaram. Teria ele revelado mais do que o Mestre já sabia? Mas não tinha volta.- Sim, Mestre - disse, sabendo muito bem o que aquelas palavras podiam acarretar.- Você complicou nossos planos desnecessariamente, Alu, e na sua fraqueza causou perigo potencial para seus irmãos e toda a missão. E por quê? Por causa de uma prostituta semita? Tratei você como um filho. Quando

ninguém ligava para você eu o aceitei como se fosse um dos meus. É assim que me paga?- Desculpe, Mestre - murmurou Alu, o rosto quente de vergonha por baixo do véu.- Você tem mais alguma coisa a dizer em sua defesa? - insistiu o Mestre, implacável.O sangue latejou na cabeça de Alu e sua visão ficou embaçada de tanto conflito e raiva. Mas a emoção esgotou-se por si só e o privou de qualquer idéia de desafio. Por alguns momentos ele não disse nada. Quando finalmente falou, as palavras mal saíram de seus lábios.- Ela gostou de mim, Mestre.O Mestre virou-se de frente para os outros.- Alu está possuído. Irmãos, precisamos ajudá-lo. Temos que expulsar o demônio que está dentro dele.Os escolhidos assentiram.O Mestre olhou de novo para Alu.- Tire seu manto - ordenou, pronunciando malignamente as palavras.Rapidamente, Alu despiu-se e ficou só com a roupa de baixo.Cada um dos Escolhidos pegou um chicote e começou a bater no gigante. Alu sofreu em silêncio enquanto o ruído das chicotadas reverberava nas paredes de pedra da câmara.Após dezenas de chicotadas, o Mestre deu por encerrada a flagelação. Alu desabou de encontro a uma parede próxima.- Está pronto para se arrepender dos seus pecados, meu filho?Alu era uma posta de sangue.

- Sim, Mestre - respondeu, arquejando e suando, a voz repleta de agonia.- Se algum dia você me desobedecer de novo sabe qual será a conseqüência.- Sim, Mestre.- Não sou impiedoso, mas não se atreva a pensar que por ser o nosso melhor assassino, irei poupá-lo da punição prevista para os heréticos pela lei sagrada.Como que obedecendo a algum sinal invisível, dois acólitos entraram na câmara e escoltaram a enorme criatura para fora da sala de reuniões. Depois que desapareceram das vistas, o Mestre dirigiu-se aos outros.- Esperamos mais de novecentos anos pela realização da profecia e, irmãos, a ocasião está muito próxima. Mesmo agora que a Direção de Antiguidades de Israel está de posse do documento sagrado que validará as conclusões do nosso primeiro mestre e as cartas secretas de Paulo. Conforme foi profetizado, este documento acenderá a santa centelha do julgamento, inspirando a Batalha das Batalhas e a destruição de todo q mal do mundo. Este confronto prenunciará a Segunda Vinda do Espírito de Jesus de que lalam nossas sagradas escrituras. Vocês devem se preparar; quando o pergaminho tiver sido autenticado, nós agiremos.

CAPÍTULO 23

JOSH RETEVE DANIELLE EM SEUS BRAÇOS O MÁXIMO QUE PÔDE. BEIjaram-se apaixonadamente por algum tempo,

a temperatura entre eles subindo perigosamente. Não havia dúvida na cabeça de Josh que ele queria levar aquilo mais longe - estar com Danielle liberara alguma coisa ao mesmo tempo primitiva e nobre dentro dele - que podia garantir que ela se sentia do mesmo modo. Mas ali não era o lugar adequado. Não no sofá do pai dela, com Moshe tendo acabado de sair para fazer umas compras. Josh beijou-a até que sentiu toda sua determinação desaparecer. Então a puxou de costas delicadamente e acomodou sua cabeça no peito. Danielle não entendeu a princípio e começou a puxar sua camisa, mas, com um beijo na testa, ele enviou sua mensagem. Depois ficaram deitados em silêncio - como se precisassem de palavras - e desfrutaram o momento.- Os últimos dias têm sido um verdadeiro passeio em uma montanha-russa - disse ela, após diversos minutos de silêncio. Sua voz dançou em cima da quietude.- Eu preferia não ter experimentado esses mergulhos.Danielle fez um carinho no peito de Josh.- Eu também. A subida, contudo, é inacreditável - ela arqueou o pescoço para cima e beijou-lhe o queixo. - Gosto da vista daqui.Ele aconchegou-se melhor de encontro a ela.- Não sei quando esse passeio termina, Danielle. Não tenho idéia do que os seus seqüestradores desejam. Obviamente está relacionado com o pergaminho, só pode ser, mas não sou capaz de adivinhar o que estão planejando.

- Quisera ter descoberto alguma coisa enquanto eles me mantiveram presa.- Eles sabem quem é o autor - disse Josh - ou pelo menos quem o autor diz que é. Se aquelas realmente são palavras de Jesus, terão ramificações incríveis. Algumas pessoas não iam querer que essas palavras fossem divulgadas, mas como saberiam disso antes que autenticássemos e traduzíssemos o documento? E se ele disser ilgo completamente diferente do que achamos que deve ser?- Algumas pessoas não aceitariam correr esse risco.- Você tem razão... Diferentes grupos religiosos terão diferentes interpretações da mensagem do pergaminho - o rosto de Josh ficou pensativo. - Católicos e cristãos tradicionais ficarão iranstornados se Jesus não declarar que é o Messias. Ou pior, não mencionar sua divindade.- Josh, você deve ter consciência do potencial de controvérsia que esse pergaminho representa. Você pode estar no olho de um furacão.- Suponhamos que o pergaminho não mencione a divindade de Jesus. Nas primeiras palavras, o autor diz que está escrevendo duas semanas antes de ir ao encontro do seu destino. Isso quer dizer que o maior evento na vida de Jesus - a paixão - ainda não aconteceu. Muitos incidentes podem ter ocorrido nessas duas semanas.- Ainda penso que o pergaminho criará intensa controvérsia.- Não obrigatoriamente. O que traduzi até agora não é uma descrição da fé de Jesus, mas sim do

Jesus histórico. Muitas pessoas se sentirão mais próximas dele por causa de sua humanidade.- Você não acredita que Jesus era Deus ou o Messias, acredita?- Não — disse ele, percebendo a força da sua convicção somente quando pronunciou a palavra. - Acho que não.Danielle levantou a cabeça para fitá-lo por diversos e longos segundos. Depois apoiou de novo a cabeça no seu peito.Josh apertou-a com força. Se não fosse pelo pergaminho jamais a teria conhecido. Ao mesmo tempo, contudo, ela não estaria em perigo. A vida muitas vezes é desconcertante demais para que a gente possa compreendê-la.Lentamente, ele se moveu como que para levantar do sofá.- Estamos saindo? - perguntou Danielle.- Eu estou, infelizmente, seu pai e eu planejamos nos encontrar com os outros membros da equipe a fim de discutir nossos próximos passos - tudo o que Josh realmente queria era ficar abraçado com ela pelo resto do dia.Danielle também se sentou, ao lado dele.- Vou com você.- Por favor, não. Você está em segurança aqui. Não sei se estaremos seguros lá fora.Ela sorriu maliciosamente.- Quer dizer então que está tudo bem você ficar em perigo, mas eu não posso? De que se trata? Alguma forma de cavalheirismo?

- Você não acha que basta o que passou nos últimos dias? - perguntou, ao mesmo tempo surpreso e admirado com a resistência dela.A animação de Danielle cedeu ao ver que o bom senso estava do lado dele.- Talvez você esteja com a razão.Josh beijou-a primeiro na testa e depois, mais amorosamente, nos lábios.- Descanse. Você devia estar se recuperando. Pode se sentir bem agora, mas ninguém volta ao normal tão rapidamente após aquilo por que você passou.Danielle assentiu.- Quando você volta?- Não sei - ele sorriu. - Alguns daqueles arqueólogos realmente falam sem parar.Ela beijou-lhe na face e comprimiu o rosto no dele.- Só quero que você volte.Josh não tinha a menor dúvida de que voltaria. Sabia com uma certeza que jamais nada, absolutamente nada, poderia mantê-lo afastado daquela mulher.

Capítulo 24

QUANDO JOSH E MOSHE CHEGARAM AO CAFÉ CHAGALL, NA RUA BEN Yehuda, André, Alon, Barnaby, Jonathan e Michael já estavam sentados a uma mesa redonda grande, conversando e tomando café.

Em todos os pratos podiam se ver restos de bagels e salgadinhos.- Como vai Danielle? - perguntou padre André.- Ela é notável — disse Josh, espontaneamente. Moshe dirigiu- lhe um olhar enviesado e Josh na mesma hora sentiu-se envergonhado. - Quer dizer, acho notável o seu rápido restabelecimento. Danielle é muito resistente.- Ela está indo tão bem quanto era esperado - disse Moshe com firmeza. Josh tinha se encontrado com Moshe a uma quadra do café. Quando Moshe perguntou-lhe como avaliava o estado de sua filha, Josh teve certeza de que ele sabia o que brotara entre os dois. Ainda assim, nenhum deles disse uma palavra a respeito. Era mais uma complicação, embora muito mais fácil de lidar.Moshe chamou o garçom e pediu café e croissants para si e para Josh.- Alguma novidade sobre os exames do pergaminho? — perguntou Alon, voltando ao assunto do momento. A energia do grupo modificou-se palpavelmente quando os homens se inclinaram para a frente, toda a conversa fiada esquecida.- Ainda não - respondeu Moshe. - Steven e sua equipe precisam de mais uns dias, e os paleógrafos continuam o exame das inscrições no papiro. Um relatório inicial é esperado para terça-feira.Não era a resposta que estavam esperando e Jonathan resmungou frustrado. Os membros mais velhos da equipe, contudo, acostumados com

aquele jogo de espera, balançaram a cabeça re-signadamente, aprovando.O reverendo Barnaby virou-se para Josh.- Você acredita que o manuscrito seja autêntico?- Não sei - respondeu Josh, cuidadosamente. — Mas tenho uma forte sensação de que é.- E acha que o autor é Jesus de Nazaré?- É quem ele diz ser.Barnaby fechou os olhos. Foi quase como se tivesse se recolhido em uma oração silenciosa. Quando abriu, sua expressão era de calma.- Há anos procuro alguma evidência histórica da existência do nosso Salvador. A confirmação oficial da autenticidade do documento significaria que minhas preces foram atendidas.- E se ele contradisser o Novo Testamento? — perguntou Alon, empolgado demais para se dar o trabalho de ser delicado. - Isso modificará suas crenças?- Não terá importância - assegurou Barnaby. - A fé não vem da cabeça e sim do coração. Minha crença em Jesus deu significado e objetivo a minha vida. Mesmo assim, ouvir seus pensamen-tos e ter uma visão do Jesus histórico enriqueceria meu trabalho e minha existência.Michael intrometeu-se, apontando com um pedaço de bagel.- O Evangelho segundo Marcos foi escrito por volta do ano 70 da era comum, quarenta anos depois que Jesus foi crucificado. O de Mateus foi escrito por volta do ano 80, o de Lucas em 90 e o de João no ano 100. E os evangelhos não combinam uns com outros. Nenhum dos

evangelistas conheceu Jesus pessoalmente, portanto é natural que haja algumas incoerências.Padre André interveio.- Os Evangelhos são a Palavra de Deus. Acredito neles com todo o meu coração. Jesus é meu Senhor e Salvador. Morreu na cruz para salvar a humanidade, e se os homens tivessem seguido seus ensinamentos, o mundo não estaria nas condições em que se encontra.Josh não pôde deixar de se sentir cético a respeito daquele rompante.- O senhor segue todos os ensinamentos dele? O senhor ama o seu próximo, particularmente aqueles cujas crenças são contrárias às suas?O padre franziu a testa.- Eu amo a humanidade e tenho compaixão por aqueles que não acreditam no Salvador... muito embora eles venham a terminar ardendo no inferno.Josh tomou um gole de café para ocultar seu desgosto pela visão que André tinha do mundo.- E você, em que acredita? - perguntou André incisivamente.- A respeito de quê?- Deus e a religião.- Religião é um assunto delicado e há obviamente muitas opiniões diferentes. Não quero ofender ninguém.- Acho que você não ofenderá a nenhum de nós se externar suas crenças.Josh notou que os outros arqueólogos balançavam a cabeça, concordando. E, embora

não se sentisse confortável discutindo suas crenças pessoais em público, viu-se compelido a atendê-los.- Há uma razão para acreditar que um poder maior governa o universo. No entanto, penso que é possível que esteja além de nossa compreensão saber o que ou quem é esse poder.- Parece-me que você é agnóstico — disse Jonathan.- Acho que os agnósticos ficam mais à vontade com a sua ambivalência do que eu - admitiu Josh. - Eu realmente quero encontrar uma resposta, embora não tenha um interesse especial em qual possa ser ela. Tenho confiança de que chegará o dia em que a encontrarei - ele pensou que tinha acabado de falar, mas novas palavras surgiram, espontaneamente. - Tenho que dizer que não suporto gente fanática que acredita que o seu caminho é o único. É como dizer que Deus está em um quarto e não em outro. A intolerância religiosa, em especial da parte de pessoas que afirmam serem piedosas, é a pior forma de hipocrisia.Josh sentiu que estava ficando emocionado. Agora que abrira a boca, tinha muito mais a dizer a esse respeito. Mas ele emudeceu, contudo, com o barulho terrível de uma explosão que sacudiu a terra.Os arqueólogos correram para a rua e viram pessoas mortas e feridas em toda parte. Ao ver aqueles corpos de homens, mulheres e crianças, Josh sentiu-se profundamente abalado e brotaram lágrimas dos seus olhos. Teria ele, de

algum modo, causado aquilo com seu discurso extravagante? Será que o mundo precisava real-mente de outro exemplo da intolerância contra a qual acabara de se pronunciar?Dezenas de pessoas haviam sido atingidas. Josh precisava ajudar, mas não sabia ao certo o que fazer primeiro. Como em resposta, os gemidos de uma menina chegaram até ele por entre a barulheira. Ela sangrava terrivelmente.Aquela visão fez com que Josh se lembrasse de algo acontecido muitos anos atrás, quando ele era um garoto de cinco anos, feliz e extrovertido. Tinham acabado de cair mais de dez centímetros de neve, Josh e Avner juntaram-se a um grupo de crianças que brincavam com seus trenós na rua Franklin, na zona norte de Filadélfia. A rua estreita era margeada por fileiras de velhos edifícios de três e quatro andares que datavam do século XIX. No meio da rua corriam trilhos não mais usados e cheios de ferrugem. A neve caía com tanta intensidade que Josh perdeu Avner de vista.De repente, ele ouviu um grito. Josh largou o trenó e disparou na direção do som. Um grupo de crianças cercava Avner que estava deitado no chão, inconsciente e respirando com dificuldade. Tinha um galo do tamanho de um ovo no lado direito da cabeça, e um ferimento feio na têmpora esquerda que sangrava muito. O trenó dele, danificado pela colisão com a escada de um edifício, estava ao lado.Josh correu para Avner. Agindo intuitivamente, como se possuído por algum encantamento, Josh

fechou os olhos e tocou no ferimento de Avner. Poucos segundos depois o sangramento cessou e ele abriu os olhos.As outras crianças olharam espantadas para Josh. Seth Feinberg, um menino atarracado e brigão, de cabelo vermelho e pele cheia de manchas, gritou:- Você é uma aberração.Como se ele fosse o regente de um coral, as outras crianças o acompanharam.- Você é uma aberração - eles provocaram. - Fique longe de nós, seu monstro.O coração disparado, Josh ajudou Avner a pôr-se de pé e ignorou a zombaria.- Você não devia ter feito isso - disse Avner defensivamente.Josh ficou atônito.- Eu ajudei você - gaguejou. - Você é meu melhor amigo.Avner desviou os olhos, confuso, e talvez também com um pouco de medo.- Não sei o que foi que você fez, mas não devia ter feito - com isso ele pegou o trenó e foi embora.Humilhado, Josh jurou nunca mais usar seu inexplicável poder de novo. Ali em Israel, contudo, descobriu que era impossível manter sua palavra.Josh olhou para a menina que sangrava e decidiu agir. Rasgou parte da camisa e passou em torno da perna direita dela, segurando de modo a estancar o fluxo de sangue. Como tinha feito com Dov, concentrou-se no ferimento, orando - se é

que esta era a palavra certa - pedindo para que fechasse. Um minuto ou dois mais tarde levantou o pano a fim de examinar o corte e viu que o sangramento tinha reduzido consideravelmente.Em uma ocasião mais calma - se é que isso ia acontecer de novo - Josh tentaria ver como aquilo podia fazer sentido. Mas não havia tempo para questionar nada agora.Você vai ficar boa - disse Josh. — A ambulância já vai chegar e levar você para o hospital.A garota gemeu de novo.- Dói muito.Josh sentiu a dor como se o ferimento torturasse seu próprio corpo.Querendo ajudá-la de qualquer modo, ele impôs as mãos sobre ambos os lados da sua cabeça e disse:- Você logo ficará boa.Por alguns segundos a menina continuou a fazer caretas e a se contorcer. Em dado instante, contudo, abriu os olhos e fitou Josh. No princípio, simplesmente encarou-o. Depois a tensão do seu rostinho cedeu e, lentamente, deixou as pálpebras se fecharem. A respiração dela tornou-se mais relaxada.Moshe pôs a mão no ombro de Josh.- Como foi que você fez isso?- Não fiz nada de especial. Só removi o seu medo.As sirenes das ambulâncias encheram o ar.Josh pôs-se de pé.

- Moshe, por favor, certifique-se de que a ambulância a leve sem perda de tempo. Vou ver o que mais posso fazer para ajudar.Ele esquadrinhou a área, procurando outros necessitados. Mais ou menos a trinta metros de distância localizou três padres. Não ajudavam os feridos, mas simplesmente observavam a cena. Quando viram Josh olhando para eles, contudo, fugiram, desaparecendo na multidão.Josh soube que a explosão era ligada ao pergaminho, à morte de Avner, ao seqüestro de Danielle... mas os quem e os porquês não tinham importância por ora. Focalizou de novo a atenção nos feridos, sendo agora levados em ambulâncias enquanto judeus ortodoxos piedosamente recolhiam pedaços dos corpos.Alon aproximou-se.- Está sob controle agora. Os paramédicos sabem o que fazer. Nós deveríamos retomar nossa reunião.A idéia de discutir arqueologia diante de tamanha carnificina pareceu ridícula a Josh.- Talvez possamos nos reunir amanhã no museu.Os olhos de Alon estreitaram-se.- Temos coisas importantes a discutir. Se você não fosse americano compreenderia que nossa missão também é fazer com que a vida continue diante de um acontecimento destes.- Não vou me desculpar por ser americano, Alon. Da mesma maneira como não vou me desculpar pela minha compaixão.Alon fulminou-o com um olhar. Os nervos de Josh estavam em frangalhos. Não tinha certeza de

que seria capaz de se controlar se Alon o desafiasse de novo.Moshe e os demais estavam por perto.- Josh tem razão - disse Moshe.Os outros concordaram, uns mais relutantemente que outros, e logo se dispersaram, deixando Josh olhando a cena até que todas as vítimas tivessem sido removidas.

Capítulo 25

JOSH PASSOU UMA HORA ANDANDO PELA CIDADE ANTIGA, TENTANDO ver se conseguia entender o que acabara de testemunhar. Como arqueólogo e estudante de história conhecia mais exemplos de atrocidades humanas do que gostaria. Ainda assim, o que vira nos últimos dias o tinha deixado extremamente abalado. Fora tanto ódio - dirigido a ele, dirigido a pessoas de quem gostava, dirigido a pessoas que nunca vira - que seu instinto de sobrevivência lhe dizia que fosse para o mais longe possível daquele lugar.Josh sabia, no entanto, que não podia fugir. Precisava aprender mais sobre o pergaminho e descobrir se o autor era mesmo Jesus. Precisava estar presente quando os analistas confirmassem o que já sabia no fundo do seu coração - que o pergaminho era verdadeiro.E, para ser realista, não havia escapatória. Ele estava no meio da confusão. A data limite que seus inimigos desconhecidos tinham lhe dado para entregar o pergaminho vencera há muito

tempo, mas nem por um segundo Josh pensou que pudessem ter desistido de suas ameaças. Estavam aguardando o devido tempo, embora Josh não soubesse dizer o motivo.Depois da caminhada ele pegou um táxi de volta para a nova residência e ficou surpreso de encontrar Danielle na sala, juntamente com diversos homens que não conhecia. Seu primeiro impulso foi protegê-la, mas ela parecia demasiado relaxada para estar em perigo.— O que está fazendo aqui? - perguntou.— Parece que somos companheiros de quarto agora — respondeu Danielle com um brilho nos olhos. Fizeram com que eu me mudasse para cá hoje de tarde para fins de segurança.— Quem?— Meu pai e as autoridades.Seu pai a transferiu para cá?- Ele sabia que eu estaria protegida aqui - Danielle sorriu sedutoramente. — E há muitos quartos.Ele olhou para os quatro homens que a acompanhavam.- Não quer me apresentar seus amigos?Danielle apontou para o tipo magro e vigoroso sentado no sofá.- Esse é Ethan, meu guarda-costas.O homem balançou a cabeça para Josh, que retribuiu com um tímido sorriso de gratidão.- Os outros - Danielle indicou os outros três - são seguranças do Estado de Israel. Estão aqui para nos proteger.

Danielle não mencionou os nomes. Era bem possível que eles não tivessem lhe dito. Josh supôs que deviam ser inspetores da IAA ou agentes da Shin Bet, o equivalente do FBI. Significava que o governo tinha conhecimento do que estava ocorrendo e compreendia as conseqüências. Josh esperava que fosse uma boa coisa.O pergaminho podia ser uma bomba política para Israel, um país pequeno do tamanho do estado de Nova Jersey e que atraía mais a atenção da mídia mundial do que inúmeros países muitas vezes maiores. Israel tinha o direito de ficar apreensivo por causa do pergaminho, que seria capaz de desencadear amargos debates tanto em círculos judaicos como cristãos e poderia causar sérios problemas políticos.As coisas continuam a ficar cada vez mais interessantes — disse Josh à ninguém em particular, seus olhos fixando-se nos de Danielle. Desde a última vez em que tinham se visto, seu corpo desejara desesperadamente o dela. Embora a sensação ainda fosse forte, provavelmente ia decorrer muito tempo antes que estivessem sozinhos de novo. - Então somos colegas de quarto.- Assim parece.- Só eu, você e quatro dos melhores agentes de segurança de Israel.Danielle rolou os olhos.- É.Josh respirou fundo.

- Acho que vou para o meu quarto descansar um pouco. O dia foi muito cheio.

Josh fechou a porta do quarto. Sabia que o sono ajudaria depois de um dia tão tumultuado. Sabia também que o sono não era uma opção válida naquele instante. Não com Danielle sentada logo ali do lado. Não depois do que acontecera entre os dois naquela manhã. Não depois da explosão, do incidente com a garotinha e da visão dos três sacerdotes.Foi até o closet. Enterrado debaixo de uma pilha de roupas sujas estava o seu laptop. Pegou-o, digitou a senha que criara para o arquivo e as fotografias do pergaminho surgiram. Naquela noite a tradução o ajudaria mais do que o sono ou a meditação. A concentração intensa necessária para traduzir afastaria tudo mais. Naquele momento, a perspectiva lhe pareceu muito atraente.

Deixei meus pais e dei início a minha missão. Logo depois minha mãe e meus irmãos tentaram me deter e me impedir de pregar. Pensaram que eu tinha enlouquecido. Magoou-me ver que minha própria família não acreditava em mim.Meu irmão Tiago e eu discutíamos o tempo todo. Ele sempre foi o favorito dos meus pais. Durante o último mês acertamos nossas diferenças e agora compartilhamos a maioria dos pontos de vista. Se eu morrer quando for a Jerusalém, direi a Tiago para que prossiga com minha missão.

Dirigi-me para o interior, para as cidadezinhas e aldeias. O local onde eu morava me rejeitou, da mesma forma que as pessoas da periferia. A maior parte dos meus ensinamentos não era ouvida. Isto me frustrava e me enfurecia, tanto que eu amaldiçoei as cidades de Chorzin e Betsaida à danação eterna, o que lamento ter feito. Controlar minha raiva e frustração tem sido uma luta na maior parte de minha vida. Apenas um grupo pequeno de judeus piedosos acreditou em mim. Evitei as cidades dos gentios porque minha mensagem se destina ao meu próprio povo, a tribo de Israel. Que está sofrendo agora, tanto espiritual quanto politicamente.Aqui na Galiléia nós não somos governados diretamente pelos romanos, mas sim pelo seu fantoche Herodes. Estou cercado por galileus orgulhosos, nacionalistas e militaristas. Judas o Galileu deu início a um grupo chamado de os zelotes, e eles planejam derrubar os romanos pelo uso da força. Assim seria cumprida a profecia messiânica: nossa terra deverá ser libertada dos invasores e nunca mais o homem lutará com o homem. A maior parte do nosso povo acredita que o Messias, ou o ungido, é um líder militar que nos levará à vitória e se tornará o Rei dos Judeus.Anseio pelo dia em que o mundo pertencerá a uma só comunidade, a humana. E, no entanto, minha própria família está dividida. A hostilidade entre os saduceus, os fariseus, os batistas, os zelotes e a comunidade me perturba. Nós todos somos judeus. As seitas podem tomar diferentes

caminhos, mas todas levam ao nosso Deus. Al-guns de meus companheiros mais chegados querem que eu lidere uma guerra contra nossos conquistadores. Se formos bem-sucedidos, eles acreditam que eu me tornarei o prometido messias Rei dos Judeus. No entanto, o meu povo está dividido demais para que isto aconteça. Assim sendo, escolho um caminho diferente. Mais espiritual. Muitos judeus acreditavam que o mundo fosse acabar como o Batista tinha pregado. Eu também. Agora acredito em outra coisa. Muitos milhares de luas passarão antes que sobrevenha o final dos tempos.

Muitos milhares de luas. Josh ponderou sobre a última sentença ao mesmo tempo em que a fadiga se apoderava dele.

CAPÍTULO 26

AO FINAL DO SEU TURNO, ETHAN, O GUARDA-COSTAS, VERIFICOU como estava a adormecida Danielle e passou o serviço para seu substituto. Tudo feito, dirigiu-se para a rua. Escondida por baixo da jaqueta marrom, levava uma Uzi micro-especial.Ethan caminhou duas quadras até o ponto do ônibus. Era uma noite sem lua, escura, e as ruas estavam incomumente quietas. Era difícil também um ar tão parado.Ele ouviu o ronco do motor de um carro e virou-se. Um Mercedes preto parou ao seu lado.- Quer uma carona? - perguntou uma voz de dentro do carro.

Ethan viu que o rosto do motorista era familiar; tratava-se deum dos arqueólogos que trabalhavam com ele na IAA. Ethan estava cansado após um longo turno de serviço, e ficou satisfeito com a oferta.- Obrigado - ele agradeceu, ao entrar para sentar-se no banco do passageiro. - O ônibus não vem com muita freqüência a esta hora da noite.- Não é nada.Ethan percebeu que eles não estavam sozinhos no carro. Virou-se e viu no banco detrás dois homens enormes vestidos de preto. Seus rostos eram inexpressivos. Um frio de desassossego percorreu-lhe a espinha.- Como vão indo as coisa no esconderijo? - perguntou o motorista. Ethan virou-se para a frente do carro, embora algo lhe dissesse que devia ficar de olho nos homens do banco detrás.- Tudo bem. Sem problemas.- Não houve outras ameaças?- Não. Nada.- Ótimo. Certamente não queremos que algo terrível aconteça. A propósito, você não contou a ninguém que me deu a localização do esconderijo, contou?Por que ele ia perguntar uma coisa dessas? Ethan não se lembrava de ter dado ao arqueólogo essa informação. Tinha certeza de que o homem já sabia.- Não, claro que não.Bom trabalho, Ethan. Você cumpriu bem sua missão.

Ethan viu agora que tinha razão em sentir medo. Soube também que tinha feito o contrário de um "bom trabalho". Ao revelar involuntariamente a localização deles, pusera Danielle e Josh em perigo.Precisava salvar aqueles que tinha obrigação de proteger. Precisava também se salvar. Tentou sacar a Uzi, mas antes que tivesse chance de agir, sentiu o frio do aço no seu pescoço.Então, de repente, uma dor imensa e a escuridão.

Capítulo 27

NA SEGUNDA-FEIRA DE MANHÃ, JOSH CHEGOU AO MUSEU ACOMPAnhado por dois seguranças e entrou na sala de reuniões. Sentados à mesa oval estavam Moshe, o reverendo Barnaby, Alon, Jonathan, Michael e padre André.- Você parece exausto - disse Jonathan.- O fim de semana foi difícil. Não dormi bem esta noite - explicou Josh, omitindo ter passado quase que a noite toda em claro traduzindo o manuscrito. Notou que nenhum dos outros pare-cia tão afetado pela explosão da véspera quanto ele. Será que isso acontecia com quem morava ali há muito tempo?- Cavalheiros - disse Moshe —, antes de começar, precisamos discutir alguns aspectos legais relativos ao pergaminho. Não saberemos senão no fim da semana se ele é ou não autêntico. Se for, contudo, teremos que manter

sigilo absoluto. Quero que todos vocês me dêem sua palavra de que não discutirão o que descobrirmos com ninguém até que consigamos autorização do governo para divulgar o encontrado.Os demais assentiram. Josh encarou-os e depois se virou para Moshe com a expressão preocupada.- Por que o governo está tão preocupado com o sigilo deste caso? De que estão com medo?Moshe pareceu achar as perguntas de Josh ridículas.- Se o manuscrito for autêntico, afetará cada canto deste mundo.- Claro - disse Josh. - Compreendi isso desde o primeiro momento em que li as palavras de abertura. Mas não é cedo demais para nos preocuparmos com o impacto do pergaminho? Ele ainda não foi autenticado e se contiver palavras similares às do Novo Testamento e a sua essência, muitas pessoas acreditarão que se trata de uma peça verdadeira, mesmo que não tenhamos uma prova definitiva.- Eu compreendo a razão pela qual o governo quer manter tudo secreto - disse Michael. - Jerusalém é a capital da fé. Olhe em torno e você verá milhares de pessoas visitando lugares su-postamente sagrados, e no entanto nem um só sítio bíblico pode comprovadamente ser associado a Jesus ou a qualquer outra figura das Escrituras.Padre André ficou evidentemente irritado.

A fé não está na cabeça e sim no coração. Todo mundo que visita os locais sagrados sai daqui com uma experiência religiosa profunda e espiritualmente engrandecido.Moshe levantou a mão.- Vocês sabem o quanto aprecio um debate animado, mas precisamos voltar ao trabalho. Temos que seguir a ordem de manter segredo dada pelo governo. Concordam?Josh continuou sem entender, mas mesmo assim concordou com os demais.Moshe abriu a pasta e retirou uma pilha de documentos de confidencialidade.- Então tenho certeza de que não terão problemas para assinar este contrato - ele empurrou uma cópia para cada arqueólogo.- Você não confia em nós? - quis saber padre André, claramente magoado.Moshe sacudiu a cabeça.- Trabalho há anos com muitos de vocês. Sabem que confio em cada um. Quem insiste nisto é o governo.Relutantemente, todos assinaram.Barnaby entregou seu contrato a Moshe.- Já teremos amanhã os testes iniciais da inscrição?- Com certeza - respondeu.Você já está de posse dos exames preliminares da cerâmica?Recebi quando cheguei aqui hoje de manhã. Nossos peritos cotejaram o jarro onde estava o manuscrito com alguns artefatos da coleção do museu. Os testes mostraram que a cerâmica é

igual à usada no primeiro século. A cor e a composição do jarro evidenciam uma correspondência perfeita, mas o exame da pátina não foi conclusivo. Não foram encontradas moedas com o jarro, ou quaisquer inscrições que possam nos ajudar a estabelecer uma data mais precisa. Eles planejam continuar com os exames.Como que obedecendo a uma deixa, Steven Fishman, chefe do laboratório do carbono 14, entrou a passos largos no recinto e entregou um bilhete a Moshe. Os resultados dos seus exames não eram esperados senão no fim da semana.- Fui surpreendido - disse Moshe. - O exame foi mais rápido que o que pensávamos, com base em indicações anteriores. Assim sendo, tenho uma surpresa para vocês. O primeiro teste de datação com base no C14 terminou. Stephen, por favor, conte-nos suas descobertas.Fishman tinha a aparência de um cientista famoso, lembrando Einstein com um corte de cabelo melhor. Naquela manhã estava obviamente empolgado.- Cavalheiros - começou, entusiasmado -, recebi permissão para usar o acelerador de partículas. Assim sendo, será possível realizar a análise da massa do artefato com o método conhecido como AMS (Accelerator mass spectometry) em que os íons são acelerados a energias cinéticas extraordinariamente altas antes da análise da massa. Como todos sabem, esse método tem uma capacidade excepcional de analisar com sensibilidade e precisão as composições elementares e isotópicas. Ademais, requer

apenas uma fração do tamanho da amostra de métodos mais antigos e mais convencionais, embora custe duas ou três vezes mais. Foi uma sorte enorme termos conseguido aprovação da nossa."Quando cheguei esta manhã", continuou Fishman, "realizei o teste AMS. Mas eu tinha uma quantidade de sobra da amostra do pergaminho suficiente para poder realizar também o exame pelo método tradicional da contagem das partículas beta. Como sabem, este método leva dias para chegar ao resultado final. Meu plano é usar este resultado para validar o primeiro. Segundo o sistema AMS de datação, o pergaminho do rolo é do período do Segundo Templo, entre 50 a.C. e 50 d.C. e, tendo em vista que a amostra era livre de qualquer contaminação, considero o resultado tanto preciso quanto confiável."Aquilo não surpreendeu Josh. Ele sabia no fundo do coração que a datação do pergaminho era autêntica. Permaneceu em silêncio, observando a reação dos seus colegas. Moshe, Michael, Jonathan e Barnaby estavam evidentemente entusiasmados. Padre André e Alon, por outro lado, não demonstravam emoções. Será que rea-giam sempre daquele modo a uma notícia dramática como aquela?- Eu gostaria de lhes dar uma data exata, cavalheiros - disse Stcven, em um tom levemente escusatório -, mas a datação pelo C14 é conclusiva com uma diferença de cinqüenta

anos para mais ou para menos da idade real do artefato.- Quer dizer então que é autêntico - disse Barnaby, jubilosamente.Steven assentiu.- Baseado no exame AMS é.Um murmúrio de empolgação espalhou-se pelo grupo, mas Alon o interrompeu de pronto.- Só porque o pergaminho data do primeiro século da era comum não quer dizer que o autor seja quem alega. A personificação literária ou pastiche era comum na antiguidade.- Alon apresenta um excelente argumento - aprovou Josh. - Só quando tivermos feito a verificação final da autenticidade do pergaminho é que poderemos determinar que Jesus poderia ter ido o autor do que está escrito lá. Pelo menos seremos capazes de formular uma suposição com uma base razoável.O burburinho na sala acalmou.Padre André olhou para Moshe.- Onde está o pergaminho agora?- Nós o guardamos em um cofre especial e determinamos pesadas medidas de segurança. Estamos em meio ao processo de fotocopiar o texto em segurança e, a partir de amanhã, vocês serão divididos em duplas. Cada equipe receberá uma das seções do manuscrito. Quando terminarem de traduzir, apresentem-me seu trabalho e aí eu lhes darei a outra parte.— Poderemos ver todas as traduções? - quis saber padre André.Moshe balançou a cabeça afirmativamente.

— E tornaremos a ver o original?— Sim - informou Moshe, mas só de acordo com as circunstâncias apropriadas.— Você está muito preocupado com essa coisa de sigilo. Primeiro foram os acordos formalizando a confidencialidade do assunto. Agora isto. Moshe, o que está havendo?— Não posso lhe dizer, André. - Gostaria, mas não posso.— Eles simplesmente não confiam em nós - disse Alon.— Não posso acreditar que não confiem em nós - ponderou o reverendo Barnaby, a boca contorcida em um esgar de desaprovação e os olhos dardejando pela sala, como que a pedir apoio. - Isto jamais aconteceu desde que comecei a trabalhar aqui.— Asseguro-lhes que há uma boa razão para que seja mantido o sigilo neste nível - disse Moshe calmamente. - Uma razão muito boa.Com exceção de Moshe, todos os componentes da equipe de pesquisa foram ao restaurante do museu para almoçar.— Nunca vi tantos agentes de segurança por aqui — comentou o reverendo Barnaby quando se sentaram. - Estão por toda parte. Há gente que nunca vi antes.— Medidas de segurança mais estritas e acordos de confidencialidade - padre André virou-se para Josh. - Sua descoberta parece ter modificado nossa cultura.Alon e Michael concordaram.

— Poderá mudar a cultura de todo o mundo se pudermos comprovar a autoria - disse Jonathan, entusiasticamente.Josh preferiu não responder nada a padre André e limitar-se a fitá-lo nos olhos. Ainda não se sentia seguro em relação àqueles homens - e nunca se esquecia por um único instante que um deles estava envolvido no assassinato do seu amigo Avner, no ataque a Dov, no seqüestro de Danielle, e que o ameaçara feri-lo e roubar o jarro para sabe-se lá qual propósito sinistro.Josh deu-se conta de que mal conhecia os três arqueólogos israelenses, Jonathan, Alon e Michael. Não parecia provável que qualquer um deles pudesse estar envolvido com uma sociedade secreta, especialmente uma vinculada de algum modo à figura do Cristo, mas já se deparara com surpresas maiores em Israel.Josh decidiu que estava na hora de começar a conhecer melhor aqueles homens, e uma abordagem casual e simpática era sua melhor aposta, se quisesse calcular qual deles era o traidor. Virou-se para Michael.- Eu soube que você está há pouco tempo aqui na IAA.- Isso mesmo - concordou Michael. - Só uns poucos meses.- Está gostando?- Como não gostar? O trabalho sempre é fascinante. Nem sempre tão fascinante quanto este agora, mas assim mesmo fascinante.Os olhos de Michael desviaram-se de Josh enquanto ele avaliava a pergunta.

- As lembranças mais felizes da minha infância são de quando meu pai me levava aos locais sagrados em Israel e explicava a história deles. Quando eu tinha onze anos ele me levou a um monte de terra feito com os remanescentes de uma sucessão de aldeamentos anteriores e me deixou escavar. Meu pai me levou por todo o país, sempre explorando o passado, sempre em clima de diversão. Acho que o amor que ele sentia pela história me contaminou.Havia emoção genuína na voz de Michael quando ele falou sobre o pai, o que comoveu Josh.- Ele parece ser um bom homem - comentou.- Ele era um homem bom - uma máscara de dor cobriu o rosto de Michael e seus olhos desviaram-se para o chão. - Dois anos atrás tomou o ônibus errado.A esta altura Josh sabia muito bem o que aquilo significava.- Sinto muito - disse, mesmo que as palavras parecessem dolorosamente inadequadas.- Muito obrigado. Esta cidade cobra seu preço a todo mundo.Na semana anterior Josh viera a compreender aquilo em um nível muito pessoal. Em um gesto que surpreendeu a si próprio, ele levantou a mão e tocou no braço de Michael.Josh notou que Alon estava olhando para eles. Mas quando se virou para encará-lo, desviou os olhos. Pensou em engajá-lo na conversa, mas decidiu que não. Achou que aprenderia mais sobre Alon observando seu modo de agir do que ouvindo suas palavras. Josh notara que Alon

tendia a permanecer distante a maior parte do tempo, como se estivesse em outro mundo. A única vez que tinham se falado fora no confronto após a explosão da véspera. Josh conhecera gente assim, pessoas que viviam em suas próprias mentes. Será que aquela mente continhas idéias brilhantes - ou esconderia segredos?Josh a seguir voltou a atenção para Jonathan. Com seu comprido cabelo vermelho e bigode de elefante-marinho, mais parecia um astro do rock dos anos 1960 que um arqueólogo.- Jonathan, como você está enfrentando o nosso projetinho?- É legal! - exclamou Jonathan, entusiasmado.Pela primeira vez naquele dia Josh deu uma gargalhada descuidadamente. A expressão era engraçada, vinda de Jonathan, com seu forte sotaque israelense. Devia ser fã do cinema americano.- Gostei da sua escolha de palavras. Já esteve nos Estados Unidos?- Algumas vezes. Visitei parentes em Nova York e na Califórnia. O surfe lá é melhor do que aqui. Você é solteiro?- Como? - perguntou Josh, apanhado desprevenido e sem saber ao certo como responder sinceramente.- Você é solteiro? Devíamos sair juntos um dia. Eu ficaria muito feliz em mostrar-lhe Tel Aviv. Tem uns lugares quentíssimos, e as mulheres de Israel certamente sabem como se divertir.

Josh pensou imediatamente em Danielle. Ele nunca saíra à procura de lugares quentes, de qualquer forma, e isso era a última coisa em que pensaria agora.- Acho que meu prato está bastante cheio...- Trabalhe duro... divirta-se mais ainda... meu lema sempre foi esse. Não permita que eu lhe dê uma impressão errônea. Terminei sendo o terceiro da minha turma na universidade e prefiro estar numa escavação arqueológica a em qualquer outro lugar. Nosso "projetinho" é a coisa mais empolgante que vi em anos - e isso inclui um fim de semana alguns meses atrás do qual não consigo me lembrar direito, mas que jamais esquecerei.Josh deu outra risada. Já tinha sido algum dia tão folgado quanto Jonathan? Quantas pessoas teriam?Um alarme interrompeu seus pensamentos. Em seguida ouviu-se uma voz pelo sistema de alto-falantes:- Por favor, fiquem onde se encontram.Padre André mergulhou debaixo da mesa e diversos outros arqueólogos seguiram seu exemplo.Josh permaneceu sentado, pronto para ajudar, fosse como fosse. Quando os seguranças atravessaram correndo o restaurante na direção do corredor, ocorreu a Josh que aquele ataque - porque não tinha dúvidas de que se tratava de um ataque - podia ser uma manobra diversionária com a finalidade de criar o caos no prédio e facilitar o roubo do manuscrito. Se fosse

este o caso, Josh não poderia fazer nada. E este pensamento o encheu de ansiedade.Então o alarme cessou abruptamente e um silêncio estranho encheu a sala. Um minuto mais tarde a voz foi ouvida outra vez pelos alto-falantes: - Muito obrigado por sua cooperação durante este teste dos nossos sistemas de segurança.Padre André e os outros se levantaram e em todas as mesas os comensais retornaram à sua conversa e comida.Nem que eu vivesse um milhão de anos me acostumaria a isso, pensou Josh, ao mesmo tempo em que percebia que, de certo modo, já começara a se acostumar.

CAPÍTULO 28

JOSH VOLTOU AO APARTAMENTO COM DOIS AGENTES DA SHIN BET designados para protegê-lo. Quando entrou no apartamento e viu Danielle lendo na sala, seu corpo relaxou. Que vida melhor que aquela poderia desejar, se podia desfrutar do seu calor o tempo todo?Os olhos dela iluminaram-se ao vê-lo. Levantou-se de um salto, largando o livro no chão e correu para beijá-lo ligeiramente nos lábios.- Como vai? - indagou Josh.- Enlouquecendo. Os armários que fazem a segurança não me deixam ir a parte alguma. Tenho certeza de que sou capaz de convencer Ethan, mas ele ainda não apareceu.

- A idéia não é de que você deve passar uns dias recuperando- se em um local seguro?Danielle afastou a idéia com um gesto.- Ficar sentada em um quarto abafado o dia inteiro não ajuda em nada a minha recuperação.Josh deu uma risada. Os israelenses eram de uma resistência incrível, mas poucos chegariam aos pés de Danielle.- Se você quer sair, vai ter que negociar com as autoridades. Quando foi a última vez que falou com seu pai?- Ele telefonou de manhã. Virá à noite.- Tenho certeza de que inventará um meio de convencê-lo a deixá-la sair.O brilho no olhar de Danielle deixou bem claro que ela passara a vida persuadindo seu pai com sucesso. Josh, contudo, não saberia dizer ao certo se queria que ela tivesse êxito agora. Não queria que se sentisse enclausurada, mas gostava de saber que se encontrava em um lugar onde podia encontrá-la.- Você vai ter que se distrair comigo até ele chegar.- Quem disse que tenho tempo?Danielle aproximou-se mais.- Você está querendo me dizer que não quer se distrair comigo?Josh sentiu a temperatura do seu corpo elevar-se.- Eu definitivamente não disse nada disso - ele olhou em torno para os quatro agentes espalhados pela sala. - O que você tem em mente? Não estamos exatamente sozinhos.

- Venha comigo ao meu quarto.Josh sentiu um arrepio na espinha.- Seu quarto? Você não ouviu a parte sobre não estarmos sozinhos?Danielle esboçou um sorriso hipnotizador.- Basta me acompanhar.Ele não tinha certeza se estava preparado para aquilo - tendo em vista especialmente os brutamontes contratados pelo pai dela - mas segurou sua mão e seguiu-a até o quarto do lado, onde havia um tabuleiro de xadrez armado em cima de uma mesa.- Você quer jogar xadrez? - perguntou Josh, desconcertado.- O que você pensou que eu queria dizer quando perguntei se não queria "se distrair"?Josh pensou em como se sentira ao beijá-la e seus joelhos quase se dobraram.- Pensei que você jogasse damas.- Damas é para crianças. Sente-se e se prepare para perder.Sacudindo a cabeça admirado, Josh sentou-se diante de Danielle. Os seguranças permaneceram do lado de fora. O que os agentes da Shin Bet pensaram que estava acontecendo ali qualquer um podia imaginar. Pelo que Josh sabia, Danielle já tentara arrastar um deles para ali a fim de jogar xadrez com ela.Josh não jogava xadrez desde a faculdade. O que evidenciou ser um problema nos primeiros lances quando Danielle utilizou uma abertura que ele nunca tinha visto antes. Ele se recuperou cerca de dez jogadas depois e conseguiu se sustentar

quase até o fim do jogo. Aí então a falta de prática fez-se presente de novo.Tornou-se óbvio que Danielle tinha um plano e ele não. Ele previu o cheque-mate quatro jogadas antes.Danielle sorriu alegremente quando derrubou seu rei.- Você joga bem direitinho.- É mesmo? Como é que você sabe?Ela deu uma palmadinha carinhosa na sua mão.- Fui campeã de xadrez na faculdade. Ganhei de todo mundo, inclusive de um rapaz que atualmente é considerado um dos dez melhores jogadores do mundo. Você jogou melhor que muita gente.Josh não se sentiu particularmente reconfortado.- Vou querer revanche, você sabe. Não jogo há muito tempo. Jogarei muito melhor na próxima vez.Danielle levantou-se e passou para o lado de Josh. Acariciando-lhe a nuca, ela se sentou no seu colo.- Por falar em revanches, estou querendo uma com você já há alguns dias - ela se aninhou melhor e o beijou na orelha. - Se na segunda vez você for muito melhor que na primeira, não sei como vou me controlar.Josh mudou a posição do corpo e beijou-a com toda a paixão que sentia por ela. O corpo de Danielle derreteu-se e se fundiu ao seu e ele sentiu uma onda de energia como nada que já sentira antes. Explorou os músculos das costas de Danielle, sentindo seus seios se comprimirem

de encontro ao seu tórax. Quando ela começou a puxar a camisa dele para fora das calças, Josh levantou-a da cadeira e carregou-a para a cama. Quando a deitou com delicadeza viu o desejo em seus olhos e percebeu que precisava desesperadamente daquela mulher.- Não sei como dizer o quanto eu queria isso - murmurou ele.No momento em que se deitava ao lado dela, ouviu um telefone tocar em algum canto distante de sua mente. Não deu atenção e começou a desabotoar a blusa de Danielle.Não foi possível, contudo, ignorar as fortes batidas na porta.- Acha que pode transmitir um recado? - exclamou Danielle, ansiosa.- É o seu pai. Falei que você estava ocupada, mas ele disse que precisava falar com você.Josh enterrou o rosto na cama. Danielle beijou sua nuca e disse:- Volto já. Não saia daqui.- Não posso sair daqui! - exclamou Josh, desapontado.Danielle abriu a porta e pegou o telefone da mão do segurança.- Oi, papai.- Shalom - era a voz de seu pai, mas o cumprimento careceu do habitual calor.- Papai, você está bem?- Surgiu um imprevisto e não vou poder estar com você hoje de noite. Sinto muito.- Você parece preocupado, tem certeza de que está bem?

- Não se preocupe comigo. Vou ficar bem. E você, como se sente?- Estou ótima. Na verdade, mais do que ótima.- Excelente. Fico feliz em saber disso.O jeito abrupto do pai falar teve um efeito perturbador em Danielle.- Papai, você tem certeza de que não está sentindo nada?- Sim, sinto-me cem por cento. Desculpe ter interrompido, mas não quis deixar recado quando estava me desculpando por cancelar um compromisso com você.- Está bem - murmurou ela. - Shalom. Eu amo você.Danielle cortou a ligação e ficou olhando fixamente para o telefone. Jamais tinha conversas como aquela com o pai. Os dois se conheciam bem demais para não serem absolutamente sinceros um com outro. Por que ele não quis lhe contar o que havia de errado?Ela se sentou na beira da cama. Josh continuava deitado, só que agora estava de lado, com a cabeça apoiada em um dos braços.- Meu pai não vem hoje - disse ela.- Está tudo bem?- Acho que não. Ele me pareceu tenso.- Provavelmente é só uma complicação qualquer da IAA. Parece que tem havido bastante encrenca por lá.- É, provavelmente - concordou Danielle, num fio de voz, sabendo com certeza absoluta que havia mais alguma coisa. - Josh, você me odiaria se eu lhe pedisse para só me abraçar?

Josh sentou-se imediatamente, tomou-a nos braços e puxou-a de volta para a cama.- Eu a abraçarei sempre que você quiser.Passou os braços em torno dela com mais força. Danielle amava sentir a presença daquele homem ao seu lado. Mas não bastava para minimizar a sensação de que algo estava terrivelmente errado.

CAPÍTULO 29

OS DOZE ESCOLHIDOS SE LEVANTARAM E FIZERAM REVERÊNCIAS QUANDO O MESTRE APARECEU NA CÂMARA.- Saudações, meus irmãos - ele foi dizendo, um tom glacial na voz. - Descobrimos graças a nossos recursos próprios que os primeiros exames autenticaram o pergaminho. Foi comprovado ter sido escrito quando Nosso Senhor andou por esta terra. Acredito mais do que nunca que é o pergaminho sagrado da profecia. Se for verdade, validará todas as nossas crenças e poderemos começar a executar nossos planos."Há, contudo, a possibilidade de que o pergaminho contenha uma mensagem diferente. Neste caso, teremos que destruí-lo - e todos os que tiverem conhecimento dela - antes que seu conteúdo herético seja liberado para conhecimento do público."Quer o pergaminho apóie nossas crenças quer não, temos que obtê-lo de qualquer maneira."

O Mestre olhou seus seguidores. Sentiu o poder que tinha, um controle total sobre eles, o que lhe deu enorme satisfação.- Não permitirei que nada se interponha no nosso caminho. A ocasião chegou, a hora é esta; o mundo atingiu o pináculo da corrupção e o nosso destino é destruir aqueles que tiverem culpa. Temos que converter os incréus em crentes ou então lhes dar o mesmo destino que tiveram os expurgados por nossos irmãos du-rante a Inquisição. Precisamos limpar o caminho para o retorno do Espírito de Deus. Mil e novecentos anos se passaram desde que Marcião, que seu nome seja louvado, surgiu e tornou-se nosso primeiro grande Mestre. Nossos irmãos permaneceram fortes em sua fé e gestos desde aquele tempo, perseverando diante de grande antagonismo e sob o manto da discrição. Todo o sacrifício deles serviu para nos trazer ao momento atual.Os Doze Escolhidos balançaram a cabeça, concordando, ao mesmo tempo, como se tivessem treinado.- Muitos de nossos aliados detêm altas posições governamentais em todo o mundo e apenas esperam que eu dê o sinal. A hora do julgamento se avizinha. Nós triunfaremos. Não há poder na Terra que possa nos deter."Vocês foram escolhidos por causa da sua fé, inteligência e força física. Precisaremos de todas as suas qualidades para executar o plano divino."

O Mestre olhou para além dos doze homens, para além da muralha, e enxergou um futuro que somente ele podia ver com clareza.- Meus irmãos, estamos testemunhando o alvorecer de um novo mundo, e nós... nós... somos a luz.

CAPÍTULO 30

O SOL DE JERUSALÉM CINTILAVA RADIANTE NO CÉU DA MANHÃ, LANÇANDO UMA LUZ DE ESPERANÇA E SONHOS NA CIDADE.Josh ligou a televisão para ver o noticiário matinal. A primeira matéria que ouviu fez com que seu coração afundasse.- Doze pessoas, inclusive os terroristas-suicidas e duas crianças pequenas foram mortas em um ataque a um shopping.Ele desligou o aparelho, desolado. Tentou controlar a raiva, mas lágrimas escorreram de seus olhos. Quando terminaria a violência?Uma hora mais tarde estava sentado no Museu Rockefeller com os outros membros da equipe arqueológica, esperando que Moshe aparecesse com as missões de cada um. Josh não tivera notícias suas desde que ele telefonara para a filha - e aquele telefonema a deixara perturbada pelo restante do dia. Danielle se convencera de que alguma coisa preocupava o pai, e bastou um olhar para ele, no instante em que entrou na sala, para confirmar a pertinência da observação dela. Moshe dava a impressão de sucumbir sob o peso do mundo.Moshe parou na frente da sala, cabeça baixa.

- Antes de começarmos os trabalhos de hoje, tenho que compartilhar com todos vocês uma notícia terrível. Ontem de tarde a polícia descobriu o corpo de um agente de segurança do museu. Seu nome era Ethan Benjamin e sua ausência tinha sido participada. A maior parte de vocês o conheceu. Ele trabalhou aqui durante cinco anos.Josh ficou assombrado com a notícia. Ethan Benjamin era um dos guarda-costas de Danielle. Ela lhe dissera que Ethan estava atrasado para o início do seu turno, mas Josh não pensara mais no assunto. Devia ter se mostrado curioso com o fato de um segurança israelense se atrasar para o início do serviço, o tipo de coisa que simplesmente não acontece. Mais um lembrete de que precisava prestar atenção a tudo agora. Sua antiga atitude de lidar com o mundo não era mais válida.Os outros arqueólogos ficaram obviamente chocados e entristecidos, mas Moshe deu a impressão de não ter capacidade de continuar de pé. Seria por causa da morte de Ethan, ou haveria uma outra razão?- Seu corpo foi encontrado em uma rua deserta de Jerusalém Leste - informou Moshe.- Ele foi morto por algum terrorista? - quis saber padre André.- Não, acreditamos que tenha sido obra de alguma seita. Seu corpo foi queimado e a garganta cortada. Nós o identificamos graças à aliança de casamento que usava na mão esquerda.

Outra morte ritual, exatamente como a de Avner... duas pessoas que tinham apenas uma ligação superficial com o pergaminho. Pela milésima vez, Josh perguntou-se que seria aquilo que ele descobrira e trouxera para o mundo.- Alguma idéia de quem o tenha matado? - perguntou o reverendo Barnaby, a voz trêmula.- Nada. Os assassinos não deixaram indícios. Nossos investigadores presumem que, já que ele havia saído do serviço, deve ter sido seqüestrado antes de embarcar no ônibus na volta para casa. Aparentemente ele foi morto e depois levado para outro lugar onde seu corpo foi queimado.Josh permaneceu sentado em silêncio, observando os demais. Não tinha qualquer dúvida de que o homem responsável pela morte de Ethan estava sentado ali naquela sala agora. Cada momento que esse homem continuasse a agir era mais um momento em que vidas inocentes correriam perigo. Precisava descobrir a identidade do traidor antes que mais alguém morresse.Moshe voltou a falar.- Está na hora de continuar nosso trabalho, por mais difícil que isto possa parecer após a notícia que acabo de dar. Ainda hoje, ou amanhã, o chefe do departamento de fraudes da IAA virá falar com vocês sobre este projeto.- Isso é mesmo necessário? - protestou Alon.A expressão de Moshe ficou ainda mais sombria.- A esta altura, tudo é necessário.Ninguém disse uma palavra.

- Enquanto isso, voltaremos a trabalhar na tradução. Vamos nos dividir em duplas. Alon, você está com o reverendo Barnaby, Jona- than e Michael, vocês dois ficam juntos e eu trabalho com padre André. Como foi combinado anteriormente, Josh será observador.Moshe fez um sinal e os assistentes do laboratório trouxeram três pranchas fotográficas enormes, colocando uma na mesa de cada equipe.- Os senhores têm aí excelentes fotografias das três primeiras seções do pergaminho. Sei que todos aqui são fluentes em aramaico, mas, por favor, não precisam se apressar. Se tiverem qualquer problema ou precisarem da ajuda de qualquer tipo de seus colegas, por favor, não hesitem em pedir. Queremos que esta tradução seja a mais precisa possível.Os homens começaram a estudar as pranchas quando Isaac, chefe do departamento de inscrições, entrou na sala.- Moshe, a datação da inscrição está completa.- E os resultados?Isaac virou-se para se dirigir a todo o grupo.- Comparamos a inscrição do manuscrito encontrado com a dos pergaminhos do Mar Morto. Concluímos que a caligrafia e o estilo são similares. Como sabem, os pergaminhos do Mar Morto estavam escritos em hebraico, não em aramaico, como este. Os dois idiomas são muito parecidos, contudo. Encontramos similaridades no formato das letras e no ângulo de inclinação das inscrições. Nossa conclusão é que o

documento foi escrito em alguma ocasião entre 50 a.C. e 50 d.C.- Estes testes estão validando um ao outro - disse Barnaby. - Aumentam as chances de que o manuscrito seja autêntico.Moshe levantou um dedo.- Não tire conclusões apressadas. Ainda há outros testes que precisam ser completados.Os arqueólogos começaram a traduzir as páginas que Josh já lera. Como iriam reagir ao que estava escrito nelas? Será que iam acreditar, como Josh, que tinham sido escritas pela mão de Jesus de Nazaré?Josh admirou a aplicação deles, mas logo duas perguntas mais importantes surgiram na sua cabeça: quantas pessoas mais morreriam por causa do pergaminho? E, entre todas as pessoas que trabalhavam naquela sala, qual teria sido responsável pelas mortes já ocorridas?

CAPÍTULO 31

DANIELLE ESTAVA COMEÇANDO A SE SENTIR IRRITADA POR CAUSA DO confinamento e Josh precisava se libertar do peso de suas próprias preocupações.Desde que o guarda-costas dela fora assassinado, Moshe agia de maneira incomum - embora compreensível - inflexível no tocante a Danielle se arriscar a ir à cidade em qualquer circunstância. - Eu o considero responsável - ele dissera a Josh, e Josh não saberia dizer se fora uma demonstração de confiança ou acusação.

De qualquer modo, a noite que passariam fora e juntos teria que esperar.Por ora, Josh teria que ser criativo se quisesse levar Danielle para um encontro romântico dentro dos limites da casa-esconderijo. Após cuidadosa deliberação, decidiu pedir uma refeição no Chakra, um dos melhores restaurantes da cidade. O cardápio de lá era de primeira - especialmente os pasteizinhos com recheio de carne de cordeiro - e Josh tinha certeza absoluta de que ele e Danielle seriam capazes de resolver a questão do estado de espírito sozinhos. Como toque final, ele mandou os guardas buscarem o pedido no restaurante, assegurando assim pelo menos um curto período de privacidade.- Sinto-me tão feliz por finalmente estar a sós com você - disse Josh, abrindo uma garrafa de cabernet, o Jerusalem Heights Winery. Encheu dois copos e levou para o sofá, onde deu um para Danielle e depois se acomodou ao lado dela, abraçando-a amorosamente. — Mas duvido que seu pai fosse ficar satisfeito.- Acho que meu pai sabe que há limites que definem até onde ele pode me proteger - disse ela. - Além do mais, seja o que for que você planejou para hoje, asseguro-lhe que serei uma cúmplice voluntária.Danielle levantou o copo e eles brindaram à noite que tinham pela frente, embora Josh tivesse suas dúvidas. O poder de sedução de Danielle era incontestável, mas ele não conseguia deixar de se preocupar com a segurança dela.

- Moshe realmente mudou depois da morte de Ethan - disse Josh.- É como se estivesse me mantendo à distância. Será apenas preocupação, ou você acha que tem mais alguma coisa acontecendo?- Acho que ele se sente um pouco responsável - respondeu Danielle. - Se ele não tivesse designado Ethan para tomar conta de mim, isto provavelmente não teria acontecido.Josh tinha idéia de como era sentir-se responsável pelo infortúnio dos outros.- Ele não pode ter certeza, contudo. Não há dúvida em minha cabeça que Ethan foi morto por causa do pergaminho, mas pode ter sido por algo completamente independente do seu trabalho de proteger você.- Pode ser. Mas acho que meu pai realmente gostava de Ethan. Ethan costumava falar com ele sobre seus filhos o tempo todo.Uma vez mais Josh sentiu o fardo da sua descoberta. Pessoas inocentes tinham sofrido porque ele tinha descoberto aquele pergaminho. O preço compensaria? Dificilmente a família de Ethan acharia que sim.Josh fez um esforço para desviar seus pensamentos. Não podia devolver aos filhos de Ethan o seu pai, da mesma forma que não pudera fazer nada por Avner. Continuaria a lamentar as duas mortes, mas sabia também que havia outra vida preciosa sentada ao seu lado e precisava fazer o que estivesse ao seu alcance para torná-la melhor.

- OK, ontem eu descobri, para minha surpresa, que você é uma impiedosa jogadora de xadrez. Que outros segredos preciso saber?Danielle tomou um gole de vinho e sorriu timidamente.- Se eu contasse, não seriam mais segredos, seriam?- Você está querendo dizer que eu preciso descobri-los sozinho?- Não estaria aí metade da graça?Impossível não perceber a insinuação sexual por trás daquelas palavras. Josh imediatamente relembrou a sensação dos corpos de ambos abraçados na cama - antes de o telefone interromper a paixão pelo resto do dia. Ele chegou a estremecer com a sensação.- Sim, eu gosto muito de fazer descobertas - disse Josh, sugestivamente. - Mas talvez você possa me dar algumas dicas.Danielle deu de ombros.- Sou apenas uma mulher humilde que vem de uma família humilde.- Por que será que acho difícil acreditar em suas palavras?Danielle deu uma risada.- Por que estou sendo interrogada? Não sei nada a seu respeito a não ser que você tem um cérebro gigantesco e é um grande beijador.- Você acha que sou um grande beijador?- Talvez o seu cérebro afinal não seja tão exageradamente grande.

- Não, isto está me interessando. Sabe, nunca cheguei realmente a pensar se beijava bem ou não.Danielle aproximou-se mais e fixou os olhos nos dele.- Você beija de modo magnífico, Josh. Topo de linha.- Você é bem informada sobre como os outros caras beijam?Ela fechou a cara.- Você está brincando, não está?Josh levantou as palmas das mãos.- Retiro a pergunta - disse, o olhar tímido desviado para o copo de vinho. - Sinto muito, a adolescência de vez em quando eclode na gente.- O que é especialmente útil quando se tentam evitar certos assuntos.Josh sacudiu a cabeça.- Não estou querendo evitar nada. É só que não há muito a dizer que você já não saiba. É preciso muita coisa para alimentar um cérebro exageradamente grande, você sabe disso.- Isso quer dizer que seu intelecto consumiu os instintos mais básicos?- Não, em absoluto. Acredite em mim, ainda tenho muitos instintos básicos. Apenas não os libero com muita freqüência.- Por quê?- Porque não me dão o mesmo estímulo. - Oh.Danielle subitamente ficou rígida e afastou-se um pouco. Josh precisou de alguns segundos para perceber que tinha dito a coisa errada. Assim

que isto aconteceu, estendeu o braço de novo e segurou-lhe a mão.- Eu devia ter dito que não me davam o mesmo estímulo até quando conheci você. Se eu não admitisse que meus instintos básicos explodem quando estamos juntos, estaria mentindo desca-radamente.Danielle apertou a mão dele, levou-a aos lábios e a beijou.- Muito obrigada.- Só que eles não parecem nem um pouco básicos quando estamos juntos. Eu diria, sei lá, que passam a ser elevados.- Muitas filosofias afirmam que uma poderosa conexão romântica chega às raias do espiritual.- Já li isso. Mas nunca senti antes.- Vou lhe contar um segredo, Josh: nem eu. Mas estou sentindo agora.Josh beijou Danielle o mais arrebatadamente que pôde, derrubando seu copo de vinho ao levantá-la do sofá.- Acho que perdi o apetite - disse ele maliciosamente. - O que você acha de passarmos para o quarto para que os rapazes possam comer em paz quando voltarem?Fazer amor com Danielle foi tudo quanto Josh esperava. Ela era obviamente uma amante mais experimentada que ele e num cantinho da sua mente ele se perguntou onde ela teria aprendido como proporcionar tanto prazer. O resto de sua mente, contudo - consciente, inconsciente, espiritual, tudo - viu-se completamente es-

magado pela sensação e pela mais intensa expansão emocional que ele já havia conhecido.Josh literalmente não foi capaz de se saciar com o corpo de Danielle. A maciez de sua pele, a suavidade de seus contornos e a beleza escultural de seu corpo o deixaram em transe. Mesmo depois que a paixão foi temporariamente saciada, não conseguiu parar de tocá-la. Deixou a ponta dos dedos deslizarem sonhadoramente ao longo do corpo dela, quando as cabeças dos dois mais uma vez se juntaram para trocar beijos carinhosos.- Não sei se você sabe que vou ter que prendê-la aqui nesta cama o resto de nossas vidas - murmurou ele.- Quisera que fosse possível - ronronou Danielle.- Hum, isto soa absolutamente perfeito aos meus ouvidos. - Ela o beijou de novo e depois mudou a posição do corpo para repousar a cabeça no peito de Josh.Nunca vou deixar você, Danielle, repetiu Josh. Desta vez, não chegou a pronunciar as palavras. Mesmo assim, tinha certeza de que, de algum modo, ela pôde ouvi-lo.

Capítulo 32

JOSH ACORDOU CEDO NA MANHÃ SEGUINTE. DEITADO ALI COM Danielle nos braços, tinha experimentado o sono mais repousante de que era capaz de se lembrar, só que, mesmo sob as melhores circunstâncias, ele nunca dormira mais que quatro horas por

noite. Com a luz clara do sol se intrometendo pelas frestas da veneziana, Josh sentiu uma paz profunda. O cheiro do cabelo de Danielle, o peso cálido dele cobrindo seu peito... aquilo era perfeito, era exatamente como deveria ser. A última coisa do mundo que desejava era perturbá-la, portanto ele decidiu-se por meditar.Fechou os olhos e respirou fundo, dando início ao processo de indução que descobrira no tempo da faculdade. Visualizou-se descendo um lance de escadas, e, à medida que descia cada degrau, ia se aprofundando mais e mais na própria mente.Josh meditava de diversas maneiras a fim de atingir propósitos diferentes. Se estivesse procurando resposta para uma questão irritante, formulava a pergunta repetidamente naquele estado. Se estivesse atrás de uma compreensão mais profunda de um enigma intelectual, levaria esse enigma consigo para o subconsciente. Se sentisse necessidade de relaxamento, não tentaria fazer qualquer outra coisa além de esvaziar a mente.Ele não precisava de relaxamento hoje. Depois da noite com Danielle, seu corpo sentia-se mais relaxado do que em qualquer outra oportunidade desde que chegara a Israel. Assim sendo, decidiu deixar-se levar ao sabor da sorte, ver o que sua mente queria lhe dizer.Em algum ponto no fundo do seu estado de meditação, Josh encontrou uma série de imagens, como se estivessem sendo exibidas em uma tela de cinema dentro de sua mente: os rostos de seus pais adotivos, Miriam e

Emmanuel, apareceram e desapareceram diante dele. Viu-se correndo e rindo na companhia deles, brincando no quintal aos quatro anos de idade, meses talvez antes de eles morrerem em um desastre de avião. Esta cena dissolveu-se e ele viu uma mulher andando sozinha. Era escultural e de cabelos escuros, e, embora nunca a tivesse visto antes, lhe parecia incrivelmente familiar. Era como se ela o conhecesse completamente e estivesse apenas esperando que ele se lembrasse para segui-la. Então a cena mudou de novo e Josh viu um homem dirigindo sozinho em uma rodovia, sem outro carro à vista. Agora era este homem quem parecia saber. Tão rapidamente quanto aparecera, esta imagem dissolveu-se em outra, a de um menininho caminhando na sua direção. Não havia pano de fundo: o menino parecia estar caminhando no ar. Josh tentou distinguir as feições da criança, mas por algum motivo não conseguiu vê-lo com clareza.Em meio a uma neblina, as sombras de quatro homens se materializaram e depois desapareceram repentinamente, substituídas por um homem vestido com calça jeans azul e camiseta branca. A aparição sem rosto atacou Josh e os dois começaram a lutar. O tempo pareceu ficar suspenso enquanto os dois se defrontavam naquela luta aparentemente eterna. Nem Josh nem seu oponente eram capazes de subjugar o outro, até que, de repente, Josh enca-rou o fantasma e viu o seu próprio rosto.

No instante do reconhecimento, Josh começou a sair do transe. Sentiu a cabeça de encontro ao travesseiro e o braço de Danielle apoiado no seu peito. Ouviu também uma leve batida na porta do quarto. Deslocando delicadamente o braço de Danielle para que ela não acordasse, Josh levantou-se, vestiu a calça e atendeu a porta. Era Boaz.- Sei que é cedo, e peço desculpas por interromper - disse ele, mas acho que deva ver isto. Um minuto atrás fui até a sacada fumar um cigarro e encontrei uma pedra com esta mensagem presa nela.Boaz entregou o bilhete a Josh."Podemos matar você a qualquer momento e este momento está chegando. Desfrute cada respiração, Josh. Nunca saberá qual será a última."- Precisamos transferir vocês dois - disse o guarda-costas.- Não quero.- Na verdade não tem escolha. Eles sabem onde você se encontra.- E se nos mudarmos eles vão nos encontrar de novo — Josh não estava tentando bancar o herói; sabia que não seriam capazes de fugir daquilo. O confronto que os esperava mais adiante era algo que teria que enfrentar de peito aberto quando chegasse a hora.- Nada fazer é um erro - protestou Boaz.- Fazer qualquer coisa pode ser um erro - Josh virou-se para trás e viu Danielle dormindo pacificamente. - Transfira a Danielle, se faz

questão. O mais importante é que ela permaneça em segurança.

Capítulo 33

JOSH PULOU DE NOVO NA CAMA E ABRAÇOU DANIELLE. A CADA MOmento que passava ao seu lado, ela se tornava mais e mais preciosa para ele; e agora, mais uma vez, a felicidade dos dois teria que ser interrompida. Teria que convencê-la a ir para algum outro lugar, mesmo que isto significasse que teriam que se separar. Se alguma coisa acontecesse a ela seria pior do que se ele próprio morresse.Danielle acordou e o fitou diretamente nos olhos.- Estava me vendo dormir? - perguntou, com um sorriso sonhador.- Confesso minha culpa - estava.Ela se aninhou melhor nos seus braços.- Como é que eu sou quando estou dormindo?- Eternidade - disse Josh simplesmente. A palavra surgira de repente em sua cabeça e ele a pronunciara antes de considerar seu significado.Os olhos de Danielle cintilaram e, sem mais uma palavra, ela o deitou de costas e começou a ungir a inteira extensão do seu corpo com beijos. Tempo e espaço se fundiram quando eles voltaram a se amar com toda a paixão que tinham compartilhado na noite anterior.As 10:30 Josh já havia se reunido aos outros arqueólogos no laboratório, onde aguardavam a chegada de Moshe. Quando o chefe do projeto

finalmente apareceu, com quinze minutos de atraso, não estava sozinho.- Este é Goner Goldman - apresentou Moshe. - Ele é o diretor da unidade de investigação de roubos e fraudes da IAA.O homem alto e vigoroso deu um passo em frente.- Meu departamento está ciente do seu projeto; na verdade, tornou-se um item de alta prioridade para o meu pessoal. Fraudes e roubos de artefatos são problemas sérios aqui em Israel. É enorme o número de pessoas que desejam uma conexão com a religião que professam e, desta forma, ficam desesperadas por uma relíquia ou uma lembrança. Este é o motivo pelo qual se tornam vítimas fáceis de comerciantes desonestos. É muito grande o número de fiéis que terminam com "artefatos" falsificados nas mãos.- O que isto tem a ver conosco? - indagou padre André. - Dificilmente iremos vender um pergaminho a um antiquário.Goner aquiesceu.- O senhor tem razão, é claro. No entanto, pode-se dizer que é infinitamente mais importante prevenir atividades ilegais ou fraudulentas neste caso. O senhor não concorda, padre André?O velho sacerdote assentiu silenciosamente.- Tendo em vista a importância potencial do seu projeto, iremos monitorar a situação bem de perto. Viremos aqui de tempos em tempos para fazer algumas perguntas. Esperamos que sejam cooperativos.

Jonathan levantou a mão.- Que tipo de perguntas?- Conversaremos com cada um de vocês em particular a fim de discutir seu progresso na tradução do pergaminho e quaisquer opiniões pessoais que possam ter em relação a ele.- Continuo sem compreender o propósito de tudo isso. O que temos a ver seja com fraude, seja com roubo?- Nosso interesse é unicamente proporcionar segurança ao progresso de suas descobertas.Depois que Goner saiu, as fotocópias e passagens já traduzidas foram novamente distribuídas e a equipe de arqueólogos começou seu trabalho.- Eu gostaria que nos deixassem em paz - disse Michael.Alon concordou.- Essas interrupções não passam de perda de tempo.Moshe pigarreou para chamar atenção.- O governo e a Direção de Antiguidades só querem se assegurar de que o projeto esteja sendo conduzido apropriadamente. Eles não apenas estão se defendendo como também nos protegendo.Padre André estava visivelmente preocupado.- Estou começando a pensar que tudo isso é uma imensa perda de tempo. Se o pouco que traduzimos até agora serve de indicação, a mim parece que se trata de uma fraude elaborada e antiquíssima. Essas não podem ser palavras escritas por Jesus...

- Nós mal começamos - interrompeu o reverendo Barnaby. - Tudo vai dar certo.André não pareceu convencido.- Nada pode desafiar minha fé em Nosso Senhor - murmurou, praticamente para si próprio.- A fé não é baseada na lógica - disse Josh. - E sim naquilo que se sente. Ela proporciona esperança nas épocas ruins, ela nos ajuda a lidar com nossos medos e, nas melhores circunstâncias, ajuda a nos tornarmos pessoas melhores.- Presumo que você esteja sugerindo que o fanatismo não seja uma dessas melhores circunstâncias - arriscou Moshe.Moshe avaliou as palavras por um momento.- Qualquer coisa levada ao extremo pode ser perigosa. Um homem olha para o seu livro sagrado - seja a Bíblia, o Corão ou o Baghavad Gita - e vê amor e o modo adequado de tratar os outros. Outro homem, que é impulsionado pelo ódio, procura passagens que justifiquem o ódio e o preconceito que sente.- O meu Deus é um Deus de paz e amor - disse o reverendo Barnaby, enfaticamente. - "Ame seus inimigos, abençoe os que lhe desejam mal e faça o bem aos que o odeiam", disse Jesus no Sermão da Montanha.Josh concordou.- Esta é uma magnífica expressão de amor e tolerância, mas aqueles que odeiam prefeririam ler: "Aquele que não me seguir será lançado fora como uma vara seca. Tais varas são recolhidas, juntas, arremessadas no fogo e lá ardem." A

Igreja Católica usou esta passagem durante centenas de anos para justificar a morte dos descrentes na fogueira.Barnaby lançou um olhar furioso a Josh. Certamente ele lera aquela passagem centenas de vezes. Por que ouvi-la agora o deixava assim tão incomodado?

CAPÍTULO 34

MESMO A DUAS QUADRAS DE DISTÂNCIA, ALU PODIA VER O EDIFÍCIO. Fora necessário grande esforço e uma investigação cuidadosa para descobrir aquela localização, e ele tinha que ser cuidadoso para não ser percebido pelos seguranças colocados na parte de fora do prédio, ou mesmo pelos seus próprios irmãos. Ele se encontrava em uma situação precária: não podia se arriscar a cair das boas graças do Mestre e continuava atormentado pela lembrança de Danielle. Sabia que ela realmente se importava com ele. Desobedecera ao Mestre ao não matá-la e pagara o devido preço. Que não era nada comparado com tê-la conservado viva ou com a possibilidade de a reencontrar.Órfão e desfigurado após o acidente que matara sua mãe, Alu tornou-se um pária. Inteiramente sozinho, tinha vagado entorpecido pelas vielas de Jerusalém, tomado por uma raiva amarga e interminável. Mas o Mestre o recolhera, ensinara-lhe as verdades sagradas e ele começou a ver que o sacrifício era o único caminho que levava a Deus. À medida que aprendeu a aceitar as

bênçãos do próprio sofrimento, passou a adorar o homem cujo rosto nunca vira, por estar sempre atrás da máscara da serpente. Alu sabia que o amor do Mestre finalmente o recuperara, integrando-o em uma única pessoa.Quando o Mestre mandou que matasse pela primeira vez, ele ficou atônito. Não sabia ao certo se Deus perdoava o assassinato, embora entendesse que o Mestre compreendesse Deus em um nível muito mais alto do que ele jamais seria capaz. Alu foi incumbido de matar um membro do grupo deles, suspeito de vazar in-formações para não-membros. Hesitou a princípio, mas, quando chegou o momento da verdade, ficou surpreso com a intensidade do prazer que sentiu ao enterrar a faca nas vísceras do irmão caído. Daquele ponto em diante, matar tornou-se um ato sagrado.O Mestre costumava ser generoso em seus elogios sempre que Alu perpetrava um assassinato. Após provar que era um matador competente e um seguidor fiel, Alu foi promovido e passou a ser um dos Doze Escolhidos. Naquele dia, o Mestre disse palavras que traduziram para ele o sentido mais profundo de sua missão. "Te-mos que trazer a Igreja de volta à suas raízes, Alu, de volta aos fundamentos escritos por Paulo e aceitos apenas parcialmente pelos bispos em Nicéia, no ano de 325. Vestiremos nossa armadura, destruiremos os infiéis e criaremos um só mundo, unido em Cristo."Mesmo depois de passado tanto tempo, Alu ainda era capaz de ouvir as palavras portentosas

que o Mestre pronunciara naquele dia. Seu coração encheu-se de orgulho com a força do seu significado e com o papel que poderia desempenhar na ajuda do cumprimento daquela missão. O Mestre era um homem extraordinário, um sacrossanto servo de Deus.No entanto, enquanto Alu esteve ali parado observando o lar temporário de Danielle, soube que tinha uma missão mais importante. A lembrança do rosto de Danielle inundou ainda mais de emoção a sua alma. Se pudesse estar com ela, sua vida seria completa. Hoje ele apenas olharia. Mas em breve a veria de novo, e então a possuiria para sempre.

Capítulo 35

Os PERGAMINHOS DO MAR MORTO FORAM ESCRITOS PELOS ESSÊNIOS, uma seita monástica judaica sediada no deserto entre o primeiro século a.C. e o primeiro século da era cristã. Quando os rolos de pergaminho foram descobertos em 1947, foi montada uma equipe de arqueólogos composta de cientistas que eram padres católicos, pastores protestantes e um leigo. Não foram incluídos arqueólogos judeus no grupo. Pior ainda, a maior parte dos arqueólogos da equipe foi considerada anti-semita e anti-sionista - um conflito de interesses que era simplesmente o procedimento padrão naquele tempo.Em resposta a esse legado de exclusão, Israel fez um esforço consciente para incluir regularmente

cientistas de diferentes religiões e nacionalidades em seus programas arqueológicos. O processo de seleção da IAA para o pergaminho encontrado por Josh não foi exceção. Embora a equipe fosse liderada e composta prioritariamente por judeus, mais uma vez os cristãos desempenhavam um papel importante. Um desses cristãos, o padre André, se aproximou do outro, a preocupação vincando-lhe o rosto.- Barnaby, eu queria que você fosse comigo até o corredor. Precisamos discutir a primeira parte da tradução.Barnaby concordou.Os outros arqueólogos, imersos no trabalho, não deram atenção à saída dos dois do laboratório.André e Barnaby deslocaram-se para um cantinho reservado.Padre André parecia confuso.- Estou seriamente preocupado com que o manuscrito possa dizer. Você não acha que...- Calma, André - interrompeu o americano. - Nós apenas começamos a tradução.- Você sabe que eu sou um católico conservador.- Sim, e daí?- Estou preocupado com a possibilidade do manuscrito invalidar a divindade de Jesus e a natureza messiânica de sua missão.- Por que se preocupar? Nós não sabemos sequer se foi Jesus quem escreveu o documento.- Sim, mas tenho o pressentimento de que isso não vai dar certo.

- Não seja pessimista, André. Passei minha vida inteira pesquisando o Jesus histórico. Se ele for o autor do manuscrito, finalmente teremos uma prova histórica da sua existência.- Isso pode ser o suficiente para você, como liberal, mas eu não quero ter minhas crenças alteradas.- Pense no que está dizendo. Se você realmente acredita, nada poderá mudar sua fé. Além disso, é praticamente impossível atestar que esse manuscrito tenha sido escrito por Jesus.André respirou fundo.- Você tem razão.- Mas eu espero que tenha sido. A parte que li me aproximou mais de Jesus. Amei sua humanidade. O autor do manuscrito é um grande homem e professor, um verdadeiro profeta.- É evidente que você pensaria assim. Você chega a simpatizar com os cristãos que tentam invalidar algumas das histórias e ensinamentos do Novo Testamento.- Amo Jesus tanto quanto você. Se o manuscrito encontrado por Josh me permitir conhecê-lo melhor e contiver algumas surpresas, ficarei feliz.A expressão do rosto de André tornou óbvio que ele não compartilhava daquele sentimento.- Você informou ao Vaticano a existência do pergaminho? — perguntou Barnaby.- Não, estou esperando que a tradução progrida mais. Mas seja o que for que ele contenha, não permitirei que abale minhas convicções.Barnaby passou o braço pelo ombro do padre.

- É assim que deve ser.O dia passou rapidamente e a equipe começou a dar por encerrados os trabalhos. Jonathan, louco para sair cedo, a fim de se preparar para um encontro importante à noite, foi o primeiro a sair. Michael ofereceu uma carona a Alon, que morava nas cercanias de Jerusalém e logo depois padre André e Barnaby deixaram o edifício juntos, separando-se na rua, onde tomaram direções opostas para as respectivas casas.Era uma distância de quase dois quilômetros do museu até o seu apartamento, e padre André sentiu-se satisfeito por estar respirando ar puro - e desfrutando de um pouco de solidão - ao mesmo tempo em que pensava nas palavras que havia traduzido durante o dia. Andou apenas algumas quadras, contudo, quando foi abordado por dois homens em trajes sacerdotais.- Olá, meu irmão - disse um deles.A voz tirou André de suas reflexões. Olhou para o sacerdote, mas não o reconheceu. Depois percebeu que já o vira, mas não conseguia se lembrar de onde.- Olá - respondeu André. - Posso ajudá-lo?O homem grande parou de andar e padre André perdeu temporariamente o outro de vista.- Na verdade, pode sim - disse o intruso.André ia perguntar como poderia ajudar quando um pano malcheiroso foi pressionado de encontro ao seu rosto. Percebendo, então, que estava em perigo lutou com desespero, mas inutilmente.

Pouco antes de perder a consciência, André notou um carro preto reduzir a marcha e parar a alguns metros de distância.Jonathan já tinha dirigido pouco mais que um quilômetro quando notou que um carro o seguia. Ficou tenso e olhou pelo espelho retrovisor, mas se acalmou quando viu a figura paternal de um padre católico ao volante.Jonathan deixou Jerusalém e seguiu para Tel Aviv pela Rodovia 1. O carro preto continuou atrás dele. Intuiu que havia algo de errado naquilo. Certamente havia outros carros na estrada, e certamente era bem possível que um padre estivesse a caminho de Tel Aviv da mesma maneira que Jonathan. Mas quando este trocava de pista, o outro também trocava. Quando Jonathan acelerava, o outro carro também acelerava.Então, o carro preto desapareceu, Jonathan virou-se para olhar por cima do ombro, mas não conseguiu vê-lo em parte alguma. Como pudera desaparecer tão rapidamente? Sua mente estaria lhe pregando peças?Ele respirou fundo, aliviado, e pensou na mulher que veria em menos de uma hora. No bar, na outra noite, ela deixara claro que era muito mais divertida em particular do que em público. Jonathan então a convidou para jantar no seu apartamento, embora estivesse seguro de que tão cedo não se sentariam à mesa para jantar.De repente sua atenção foi atraída de volta à estrada por um ofuscante par de faróis que se refletiam no seu espelho retrovisor. Reduziu um

pouco a velocidade para confirmar seu pior medo - o carro preto reaparecera e bem nos seus calcanhares. A meio caminho de Tel Aviv, com adrenalina bombeando em todo seu corpo, Jonathan enfiou o pé no acelerador. Passando em alta velocidade por entre os carros, ele correu para escapar de seus perseguidores. Não sabia o que aquela gente queria dele, mas não estava a fim de reduzir a marcha para descobrir.Ao chegar no limite da cidade, Jonathan deu um golpe de direção que o fez passar perto demais de uma mulher em um Mercedes. Pôde ver o medo nos olhos dela quando puxou o volante com força na direção oposta, mal conseguindo controlar o carro. Ao rodar em uma pista vazia, teve certeza de que seus perseguidores estavam tentando empurrá-lo para a morte... mas quando conseguiu retomar o controle do automóvel, o carro preto não estava mais à vista.- Qual é a sua opinião a respeito do andamento do projeto? - perguntou Michael, ao volante do seu carro.- Até agora bem - resmungou Alon.Michael riu desdenhosamente.- Você é a pessoa que menos fala que eu conheço. Estamos nos aproximando da maior descoberta de nossas carreiras e tudo que tem a dizer é "bem"?- Falar pode meter a pessoa em encrenca. Quanto menos se fala, melhor é. O silêncio é de ouro.- Pronto, acaba de pronunciar três sentenças. Muito obrigado por ter se aberto comigo.

Estavam seguindo por uma rua secundária de Jerusalém quando Michael notou que um carro preto parecia fazer todas as curvas que ele fazia. Quando parou num sinal vermelho, o tal carro parou a meio metro atrás do seu pára-choque. Ele virou-se e, à luz da intercessão, pôde ver que o motorista era um sacerdote. Estranho, pensou, e decidiu que o melhor seria tentar fugir dele, religioso ou não. Quando o sinal abriu e Michael disparou, o padre, contudo, permaneceu no seu encalço.- Acho que estamos sendo seguidos por um padre - disse Michael, a voz hesitante.Alon virou a cabeça para dar uma olhada.- Acho que você está sendo paranóico. O que há de estranho em um padre dirigir um carro? Há centenas deles nesta cidade.- Eles não costumam seguir os outros, e este cara está grudado em mim.- Você acha que os padres têm alguma habilidade divina ao volante? Muito provavelmente são tão barbeiros quanto qualquer um.Alon provavelmente estava certo. Não devia passar de paranóia sua. O projeto do pergaminho e os horríveis eventos do passado o tinham perturbado mais que percebera.Quando pararam em outro sinal, Michael fechou os olhos e disse a si próprio para relaxar. Não chegou a ver o carro preto parar ao seu lado. Nem tampouco a pistola que com um tiro ar-rancou a tampa da sua cabeça.

O barulho de passos pesados chamou a atenção do reverendo Barnaby. Ele virou a cabeça e viu dois homens em trajes sacerdotais andando rapidamente na sua direção. A cada passada se aproximavam mais e mais dele.Algo disse a Barnaby para fugir, e depressa. Olhou em torno procurando um lugar onde pudesse se esconder daqueles homens e ficou aliviado por ver uma dupla de árabes aproximando-se na direção contrária. Barnaby correu para eles e os cumprimentou calorosamente. Os dois pareceram ficar surpresos, mas responderam ao cumprimento com a mesma intensidade. Exatamente o que precisava. Havia um café não muito longe. Talvez eles o acompanhassem até lá.Estranhamente, os padres continuaram a se aproximar. Ao emparelharem com ele, olharam os árabes com evidente aversão e — para o horror de Barnaby — sacaram as armas.Ao ser arrastado pelos falsos padres, Barnaby viu o sangue dos árabes empoçando nas frestas da calçada e soube que, involuntariamente, trouxera a morte para os amáveis estranhos. Rezou, pedindo a Deus que o perdoasse.

CAPÍTULO 36

JOSH ACHAVA ASSOMBROSO ENTRAR NO APARTAMENTO COM A CABEÇA cheia de idéias e ser capaz de livrar-se de todas elas segundos depois de ver Danielle. Tinha arruinado diversos romances através dos anos por ficar excessivamente preocupado com outras coisas para preservá-los. Agora era praticamente incapaz de outra coisa que não manter a atenção concentrada como um foco de raio laser naquela mulher dinâmica.- Algum progresso hoje? - perguntou ela, depois de beijá-lo levemente nos lábios.Josh não sabia ao certo o que os seguranças pensariam daquelas manifestações de afeto, mas também conseguiu expulsar essa questão de sua mente com facilidade.- Não é fácil definir progresso aqui. A equipe traduziu mais um trecho do manuscrito e tivemos uma palestra sobre segurança. Isso é progresso?- Acho que você saberá em breve. Quisera poder estar lá ao seu lado.Josh beijou-a de novo e segurou sua mão. Os seguranças não os acompanhavam dentro do quarto, portanto podiam ter mais privacidade ali. - Eu também gostaria que você estivesse traba-lhando conosco. Não é seguro, claro, especialmente desde que concluímos que um dos integrantes da equipe é o responsável por nos colocar em perigo.Danielle fechou a porta, beijou-lhe o pescoço e abriu o zíper da sua jaqueta.

- Aposto como eu também descobriria isso.Ele a beijou apaixonadamente.- Pensando melhor, não sei ao certo se qualquer um de nós dois seria capaz de descobrir alguma coisa se estivéssemos juntos lá na IAA.Josh tomou-a nos braços e, lentamente, os dois foram andando na direção da cama, caindo em cima das cobertas. Josh não pensou em coisa alguma na hora seguinte que não fosse a suavidade da sua pele, a profundeza de seus olhos e o calor do seu contato.Mais tarde, deitados languidamente juntos, Josh percebeu que aqueles momentos após a paixão eram iguais a quando meditava - impossíveis de quantificar e extremamente renovadores. Mas enquanto flutuava no espaço, o corpo de Danielle moldado ao seu, bateram à porta.- Josh, posso entrar?Era Moshe.- Me dê um minuto, Moshe. Saio já - ele se virou para Danielle e beijou-lhe o cabelo. - Acho que é agora que seu pai descobre a nosso respeito.- Ele provavelmente já sabe. Afinal, foi quem contratou os seguranças.Ele vestiu-se rapidamente e saiu seguido por ela. Moshe olhou de um para outro, mas não compartilhou seus pensamentos.- Oi, Moshe - arriscou Josh -, não estava esperando você.- Josh, temos problemas grandes e não estou exagerando.- De que você está falando?

- Danielle, por favor, deixe a sala - disse Moshe asperamente.- Ela pode ficar. Lembra que ela é membro não-oficial da nossa equipe?- Não temos mais uma equipe. Padre André, reverendo Barnaby e Alon foram seqüestrados.- Não! — exclamou Danielle, agarrando-se ao braço de Josh.Josh não ficou tão surpreso quanto ela.- Devíamos ter posto guardas tomando conta deles e adivinhado que algo assim aconteceria, especialmente depois dos ataques a Danielle e Ethan.- Está piorando - disse Moshe, sua voz um quase inaudível gemido de derrota.- Até que ponto pode piorar? - perguntou Danielle.- Mataram Michael.- Oh, meu Deus! - disse ela, soluçando. Parecia ter perdido um amigo íntimo e as lágrimas começaram a escorrer pelo seu rosto. Josh abraçou-a fortemente e Moshe continuou.- Só Jonathan conseguiu escapar antes que os seqüestradores o pegassem.Josh tentou analisar o que acabara de ouvir. Se todos os arqueólogos tinham sido atacados, qual deles seria o traidor? Encarou Moshe fixamente e rejeitou a idéia.- Jonathan seria capaz de identificar seus agressores?- Eram sacerdotes, ou homens vestidos como sacerdotes.- Sacerdotes de verdade? Duvido. É tudo o que temos?

- Foi só o que eu soube. A única outra informação concreta que temos é a notícia de que quando os seqüestradores levaram o reverendo Barnaby, mataram dois transeuntes árabes.Josh sacudiu a cabeça.- Só para piorar tudo.- Nosso pessoal de segurança e o Shin Bet já estão procurando mais indícios. É bem possível que o Mossad também se una a eles.Danielle puxou o braço de Josh e tentou parecer esperançosa.- Com esse nível de poder de fogo, esses fanáticos serão apanhados em 24 horas.- Eu gostaria de acreditar nisso - disse Moshe -, mas tenho minhas dúvidas. Essas pessoas são excelentes no que fazem. Evidentemente têm espiões por toda parte. Não são um grupo terro-rista oficial, mas agem como se fossem.- Como é que você sabe tanto a respeito deles? - indagou Josh, subitamente irritado. - Tem mais alguma coisa que você não nos contou?- Faz parte do meu trabalho saber esse tipo de coisa. E não, não há mais nada de concreto que eu possa lhe contar a esta altura. Tudo o mais são especulações e pistas.Danielle deu um passo na direção do pai.- O que posso fazer para ajudar? Moshe levantou a mão.- Nada, Danielle. Você deve ficar longe de tudo isso, entendeu? - ele apontou para os seguranças. - E assegure-se de que essa gente tenha sempre você sob suas vistas.

CAPÍTULO 37

OS GUARDIÕES SENTARAM-SE DIANTE DE SEU MESTRE NO ANTIGO ESCONDERIJO SUBTERRÂNEO.- Meus irmãos, sinto-me muito orgulhoso de vocês - disse ele. - Nossa missão foi um sucesso completo. Temos três prisioneiros que serão interrogados e depois oferecidos em troca pelo pergaminho.- Agora temos que mergulhar mais fundo ainda em nosso esconderijo. Precisamos ser mais cautelosos que nunca, ou corremos o risco de vermos destruída nossa fraternidade e falharmos aos olhos de Deus. Nossas ações recentes chamaram atenção sobre nós, mas eram absolutamente necessárias. Temos que fazer sacri-fícios, como fizeram nossos irmãos que nos antecederam. Nossa missão é clara e ninguém pode nos deter.- Durante anos atuamos como monges e mantivemos um perfil discreto, enquanto esperávamos que a profecia se cumprisse. Atrevemo-nos a esperar que o pergaminho recentemente encontrado seria o documento antecipado pela profecia, as palavras divinas de Nosso Senhor e o arauto do seu retorno. Mas lamentavelmente trata-se de uma fraude escrita por um impostor que diz ser nosso salvador. Agora temos que destruir o pergaminho antes que ele ocasione dano irreversível.Um burburinho instalou-se no grupo até que o Mestre ergueu a mão para impor silêncio. Ele virou-se para um guarda.

- Traga o primeiro prisioneiro.O guarda voltou com padre André.- Bem-vindo - disse o Mestre, provocando o religioso sarcasticamente. - Espero que esteja gostando de nossa hospitalidade, pois não?Padre André permaneceu em silêncio, mas o repuxar nervoso do seu olho denunciava a verdade.- Bem, você ainda nem começou a sofrer - a voz do Mestre ficou fria e dura. - Claro, se cooperar, pode ser que venhamos a nos dispor a trocar sua vida pelo pergaminho. Há alguma coisa que queira dizer em sua defesa?O tique nervoso na fisionomia do padre agravou-se.- Sou apenas um simples padre que vive uma vida modesta dedicada à oração, ao estudo e ao progresso da arqueologia. Não acredito em violência nem em assassinatos. São coisas que nos levam para o fogo do inferno.- Padre, não precisa temer pelas nossas almas. Já matamos muitos antes de você, mas não sofreremos os tormentos do inferno, pois somos os Guardiões da verdadeira Igreja e protegemos seus ensinamentos. Matar em nome de Deus não é pecado.- Você deveria se envergonhar por usar a religião como justificativa para os seus atos. Tenho pena de você.Um dos Guardiões pegou um chicote preto grosso e golpeou o velho padre nas costas.Padre André estremeceu com a dor, mas não emitiu um único som.

- Pare - ordenou o Mestre asperamente. - Não bata nele de novo. Estou gostando de nossa discussão. Você é um padre católico, não é?- Sim - respondeu padre André com os dentes cerrados.- Claro que é. Sei tudo a seu respeito. Você é um tradicionalista. Na verdade, nós compartilhamos muitas crenças similares.- Tenho certeza de que não - contestou André, ganhando força pela sua atitude moral. - Certamente não sou adepto do assassinato de pessoas inocentes.- Por que não? - perguntou o Mestre, sua voz banhada em açúcar e fúria. - Nosso Senhor não condena a morte dos que não acreditam.- Mentira.- Talvez você não seja um estudante da Bíblia tão perspicaz quanto eu pensava - o Mestre pegou uma tocha apagada presa na parede de pedra e agitou-a diante do rosto do padre. - Esta mesma tocha foi usada para queimar pessoas vivas durante a Inquisição. É uma de nossas muitas relíquias.Padre André olhou para a tocha como se ela fosse incendiar-se espontaneamente e queimá-lo. O Mestre sentiu especial prazer com o desconforto do velho religioso.- Um de nossos ancestrais escreveu um livrinho chamado Os protocolos dos sábios de Sião — disse o Mestre. — É uma das grandes obras anti-semitas nos últimos 125 anos. Talvez você a tenha lido, André. Sei que compartilha minhas idéias sobre os judeus.

- Você está errado - protestou o padre. - Posso ser preconceituoso de um modo ou de outro, mas não odeio ninguém.- É mesmo? Você viu o manuscrito. Não concorda que seja a obra de um impostor?- Não traduzi o suficiente para chegar a qualquer conclusão.- Mas Nosso Senhor é descrito com forte identidade judaica.- Ele era judeu.- Blasfêmia! Jesus disse, quando enfrentou os judeus, "Serpentes, raça de víboras! Como escapareis da condenação do inferno?"- Jesus pode ter se enfurecido com algumas pessoas - retorquiu André -, mas ele amava sua religião e seus irmãos judeus. Tanto sua mãe quanto seu pai eram judeus, assim como todos seus discípulos. Ele mesmo lhes disse que, quando saíssem para pregar, se dirigissem apenas aos judeus. "Não ireis pelo caminho dos gentios", disse ele, "nem entrareis em cidade dos samaritanos, mas ide antes às ovelhas perdidas da casa de Israel".- Não é verdade! Você não conhece os seus próprios inimigos? Praticamente todas as pessoas neste mundo conhecem. Quando assumirmos o poder, mataremos todos os que não crêem: muçul-manos, judeus e os cristãos que abandonaram sua religião. Inclusive os budistas, hindus e ateístas sentirão a nossa ira - a voz do Mestre aumentou de volume. - Você não conhece a verdade... somente eu e meus seguidores conhecemos a verdadeira essência de Jesus.

- Você acredita no Segundo Advento? - perguntou padre André.- Claro. Esperamos por ele. Será quando teremos nossa vitória final.- Então você acredita que Jesus voltará.- Sabemos que sim, e durante o nosso tempo de vida.- Então quando ele retornar - disse André, tomado de justa indignação -, você o matará... Porque Jesus é judeu.Por trás da máscara, os olhos do Mestre estreitaram-se em uma mistura de choque e repugnância quando ordenou, enfurecido:- Tirem-no daqui.

CAPÍTULO 38

RELUTANTEMENTE, JOSH CONCORDOU COM A DECISÃO DE MOSHE de suspender a tradução oficial do manuscrito enquanto os investigadores procuravam os membros abduzidos da equipe. Com Jonathan precisando de alguns dias para se recuperar e Moshe sendo o único integrante oficial do projeto, não havia realmente alternativa. O que ninguém, nem mesmo Danielle, sabia, era que Josh tinha uma cópia do documento no seu iaptop. Agora, com Danielle saindo para fazer compras com um dos guardas do Shin Bet, Josh abriu o arquivo e retomou a tradução do ponto onde deixara.Josh tinha chegado na parte do pergaminho onde as inscrições eram indistintas, apenas perceptíveis. Aquela era a seção que ofereceria mais trabalho ao tradutor. Algumas das letras

eram invisíveis e outras tinham partes do texto em aramaico faltando. Foi uma tradução difícil e que consumiu muito tempo, mas aos poucos as palavras emergiram.A maior parte das pessoas espera pelo Messias prometido. Houve muitos que afirmaram ser esse Messias. No entanto, nenhum correspondeu à profecia de Isaías de que Israel seria livre da dominação estrangeira e todas as guerras cessariam.Aqui na Galiléia, João, o Batista, foi morto por Herodes, que temia que o crescente número de seguidores do profeta acabasse por liderar uma revolta. João era inofensivo, limitava-se a pregar o arrependimento. No entanto, como tantos outros que atraíram partidários, ele foi morto.O caminho que sigo vai além do arrependimento. Tenho a esperança de ajudar a construir um reinado justo aqui na Terra para pôr fim ao sofrimento, curar os doentes de espírito e preparar a humanidade para a última reunião com o seu criador. Preguei para poucos e depois os poucos se tornaram muitos. Escolhi um punhado de judeus pios que eram próximos de mim e eles se tornaram meus discípulos. Preguei para os ignorantes e para os pobres, pois sua situação era pior. Eles me tratavam de Rabino e às vezes de "meu Senhor". Mas usavam esse tratamento tão-somente por uma questão de respeito, exatamente como as pessoas na Galiléia e na Judéia me chamam de filho de Deus, como ocasionalmente se referem uns aos outros, significando que todos nós somos filhos de Deus.

Comecei a me preocupar, contudo, quando alguns de meus seguidores começaram a me chamar de Messias. Ainda tenho que corresponder à profecia. Os romanos mataram muitos homens que se denominavam profetas e messias. A maioria deles era de homens de paz, e, no entanto, todos sofreram mortes horríveis.Josh leu a tradução muitas vezes, tentando descobrir algum novo sentido - um sentido que talvez pudesse usar em sua situação atual. Sabia a respeito do uso comum do título "Senhor", mas nunca ouvira falar daquele emprego da expressão "filho de Deus". Certamente que o homem que surgia daquelas páginas, embora similar, era diferente do Jesus da fé difundida pela Igreja. Ainda assim parecia inteiramente real. Se pudessem provar que o próprio Jesus escrevera aquele manuscrito, isso mudaria muitas percep-ções. De certo modo, mudaria o mundo.Naquele instante, tornou-se evidente pela primeira vez para Josh que aquela poderia ser a razão pela qual alguém estava disposto a matar para obter o pergaminho. E se o quisessem não pela riqueza a que corresponderia uma tal descoberta, mas por uma razão inteiramente diferente - destruí-lo a fim de manter as pessoas eternamente no escuro a respeito de quem Jesus teria realmente sido.Mais uma vez Josh lembrou a si próprio para estar atento a todo símbolo e sinal. Aquele conceito novo podia ser sem sentido, mas não podia correr o risco de rejeitar nada.Danielle retornara algumas horas antes, enquanto Josh ainda fazia a tradução, e não o perturbara. Ele

ficou grato por sua compreensão e apoio, mas agora que tinha terminado o trabalho daquela noite, ansiava pela sua presença novamente. Foi até o quarto dela, viu que dormia profundamente, e, por mais tentado que se sentisse para meter-se na cama ao lado dela, reconheceu que a tradução o deixara esgotado. Embora não tivesse dúvidas de que se recuperaria tão logo a tivesse nos braços, estaria um caco na manhã seguinte. Pela primeira vez desde que eram amantes, ele permitiu-se ser sensato.Voltou para o seu quarto e, antes que pudesse se sentar na cama, o telefone tocou.- Josh, é o Moshe. Os seqüestradores ligaram para a IAA e ofereceram trocar Barnaby, Alon e padre André pelo pergaminho.- Como é que você vai lidar com isso? - perguntou Josh, subitamente alerta, quisesse ou não.- Acho que a vida deles é mais importante que o documento.Josh ficou atônito com a resposta.- Você planeja dar o pergaminho aos seqüestradores?- É a minha recomendação, mas o governo e os órgãos de segurança é que darão a palavra final.Josh mal podia crer no que estava ouvindo.- Quer dizer então que os fanáticos terminarão com o pergaminho e nós com três cadáveres.- Por que diz isso?- Acho que os fanáticos querem o pergaminho porque a intenção deles é suprimir seu conteúdo.- Trata-se de um salto dedutivo e tanto da sua parte.

- Não tanto quanto você pensa - ele hesitou e percebeu que não tinha escolha senão aprofundar mais. - Traduzi mais o manuscrito do que lhe disse.Moshe ficou em silêncio por diversos segundos.- Quanto você leu?- Não tanto quanto gostaria.- E acha que há nele algo que um grupo radical tentaria impedir que viesse à tona.Até que ponto Josh acreditava realmente em tudo aquilo? Até que ponto estava disposto a prosseguir com três vidas em jogo? - Acho que é uma possibilidade. Se eu estiver certo, eles matarão Barnaby, Alon e André por não saberem até que ponto do texto eles terão lido.- Não posso arriscar a vida de três bons homens com base em uma possibilidade.- Sei que não pode. Mas sabe melhor do que eu que há uma chance muito boa deles matarem os reféns depois que conseguirem o resgate desejado. Acontece o tempo todo.- Já recomendei que entregássemos o pergaminho. Nada do que você disse agora me convence do contrário.Josh viu que não adiantava tentar dissuadir Moshe. Pelo menos por ora.- Os seqüestradores deram um prazo?- Querem o manuscrito em quarenta e oito horas ou um dos reféns morre.- Quero que você me dê tanto tempo quanto possível dessas quarenta e oito horas.- Por quê? O que você pode fazer para ajudar?- Prometa que me dará o tempo.

Moshe mais uma vez ficou quieto por alguns segundos.- Esforce-se ao máximo - disse, por fim. - Mas saiba que não posso esperar por você. Há muita coisa em jogo. - Com esta ele desligou.Mesmo cansado como estava, Josh não conseguiu dormir. Precisava continuar a traduzir antes que fosse tarde demais, e formular um plano que ajudasse a resgatar os reféns ou - no mínimo dos mínimos - ganhasse mais tempo.

Capítulo 39

NOS SUBTERRÂNEOS DA CIDADE ANTIGA, O MESTRE ANDAVA DE UM lado para outro no chão de pedra do esconderijo secreto, esperando que dois dos Guardiões remanescentes trouxessem o prisioneiro. A maior parte dos seus seguidores já tinha sido deslocada como medida de precaução. Após os recentes seqüestros e assassinatos, a caçada à sua seita fora intensificada, e os membros tiveram que se espalhar e se esconder.Enquanto esperava, o Mestre vestiu a máscara de serpente e ajustou o pequeno dispositivo harmônico que alterava sua voz. Não era o caso de o prisioneiro reconhecê-lo. Ainda não.Uma porta abriu-se e os Guardiões trouxeram o reverendo Barnaby. Ele estava acorrentado, mas, ao contrário do padre André, não fora vendado.- Então você é o líder desse grupo do mal - disse Barnaby, ironicamente. O Mestre ficou satisfeito

por ver que o religioso ainda tinha algum espírito de luta.- É evidente que você está enganado, meu amigo - disse o Mestre docemente. — Nós não somos o mal de jeito nenhum. Nós somos os Guardiões.- Chamem a si próprios do que bem desejarem. Vocês são seqüestradores e assassinos.- Soldados, talvez. Mas assassinos? Por que diz uma coisa dessas?- Quando me seqüestraram, um dos seus bandidos assassinou dois árabes inocentes.- Oh, aquilo. Aquilo não foi assassinato e sim serviço público.O rosto de Barnaby contorceu-se.- Uma vida árabe é tão preciosa quanto a sua; mais, na verdade.O Mestre se irritou.- Continua dizendo isso e se juntará a eles - gritou. Depois fez um gesto indicando a parede às suas costas. - Contemple minha espada. Ela data do século XII, quando foi empunhada pelos meus irmãos cruzados. Desde então, ela vem derramando o sangue de muitos descrentes.O queixo de Barnaby projetou-se para a frente.- Não tenho medo de morrer. Quando isso acontecer, irei para perto do meu Senhor e Salvador. E Ele, e somente Ele, me julgará pelo modo como tratei meu próximo.- Que lindo discurso — disse o Mestre, com uma risada.O rosto de Barnaby ficou vermelho.

- Diferentemente de você, eu me importo com as pessoas. Cristãos, muçulmanos ou judeus, todos são meus irmãos.O Mestre aproximou-se mais e viu os olhos do reverendo se arregalarem. Havia medo neles, a despeito dos protestos do religioso.- Você devia ter parado nos cristãos. Será julgado, na verdade, pelas simpatias pelos muçulmanos e pelos assassinos do Cristo, os judeus.- Os judeus não mataram Jesus. Ele escolheu morrer para salvar a humanidade. Se há quem culpar, é a humanidade.O Mestre girou nos calcanhares.- Não ponha à prova minha paciência. Se continuar a falar desse modo serei forçado a matá-lo.- Ninguém vai me forçar a fazer nada. Vocês, que se autodenominam Guardiões, são reconhecidos pela Igreja Católica?O Mestre não viu motivo para mentir.- Somos considerados radicais em excesso pelo Vaticano. No entanto, virá o dia em que eles nos reconhecerão, ou nós assumiremos o controle de Roma e destruiremos os que ficarem no nosso caminho.- Duvido que a Igreja Católica um dia venha a reconhecer um grupo tão desprezível quanto o seu.- O que é que você sabe a respeito do mal? Mal é o bastião dos que não acreditam e não aceitam os ensinamentos de Paulo.- Você acredita em Cristo?- Pergunta absurda.

- Ele era judeu.O Mestre riu de novo.- Vejo que você foi ludibriado pela conspiração judaica.- Como pode ser uma conspiração quando milhões de judeus foram mortos em nome de Cristo por maníacos como você?Milhões, pensou o Mestre. Se isso fosse verdade.- Trata-se de outro exagero dos judeus - disse ele, cuspindo as palavras — como o Holocausto.Barnaby ficou ruborizado.- Estive nos campos de concentração de Auschwitz, Buchenwald e Dachau. Vi com meus próprios olhos os horrores dos fornos e das câmaras de gás, da mesma forma que vi as fotografias das vítimas inocentes.O Mestre fez um gesto mandando que o prisioneiro se calasse. Ele conhecia muito bem a ficção tão disseminada de que seis milhões de judeus tinham sido mortos durante o Holocausto. Não passava de uma ridícula tentativa para ganhar simpatia.- Talvez tenham sido mortos um milhão de judeus. Quando eu chegar ao poder matarei o resto.- E os cristãos que não acreditam nas mesmas coisas? - indagou Barnaby, horrorizado.- Eles terão uma chance para ver a luz. Os que não aderirem irão se juntar aos demais no inferno!O rosto de Barnaby ficou escarlate de raiva.- É você quem vai arder nas chamas do inferno juntamente com o demônio!A discussão perdera seu valor como entretenimento. O Mestre gostava de um debate, mas esperava que seus inferiores fossem mais

criativos. Enquanto as palavras de Barnaby ainda reverberavam nas paredes da pequena câmara, o Mestre pegou na parede e desembainhou a espada de oitocentos anos. Logo em seguida removeu a máscara.- Oh, meu Deus... você! Não, como é que foi capaz? - exclamou o reverendo Barnaby, assombrado.Sem responder à inútil pergunta de Barnaby, o Mestre brandiu a espada com a ferocidade de um carrasco experiente, decapitando o religioso em um único golpe.

CAPÍTULO 40

OS SEGURANÇAS SACARAM SUAS ARMAS ASSIM QUE OUVIRAM A BATIDA na porta da frente do apartamento. Quando espiaram pelo olho mágico, contudo, abriram imediatamente.Josh reconheceu um dos recém-chegados como Goner Goldman, chefe do departamento de roubos e fraudes da IAA, mas nunca tinha visto os dois homens que o acompanhavam.Goner indicou-os com um gesto.- Estes são Aaron Brodsky e Giuseppe Kaplan.Os dois homens não podiam ser mais diferentes um do outro. Embora ambos aparentassem estar na casa dos quarenta, Aaron era desajeitado, com olhos protuberantes e um rosto que vira melhores dias, enquanto Giuseppe exibia um ar nobre só contrabalançado pelo seu piercing e tinha olhos cor de avelã que pareciam observar tudo.Josh apertou a mão dos dois.

- Giuseppe - um nome incomum para um israelense.- Giuseppe é Yoseph em italiano. Meus pais são da Itália. Giuseppe quer dizer "Deus multiplicará".- Entendo - disse Josh, devidamente instruído. - E então, o que podemos fazer por vocês?Giuseppe levantou a mão.- Tem mais alguém aí?- Sim. Danielle está no outro aposento.Ao ouvir seu nome, Danielle apareceu, de jeans e camiseta.- Oi, caras - disse. Ficou evidente a Josh que havia reconhecido os três homens.- Shalom - eles responderam.- Temos que falar com Josh em particular - disse Giuseppe.Goner virou-se para Danielle.- Seria uma boa idéia para você pegar um dos nossos seguranças e ir às compras.Danielle dirigiu-lhe um sorriso irônico.- Não estou com disposição de fazer compras, mas recebi a mensagem alto e bom som. Vou me manter afastada por algum tempo.- Danielle, não informe a ninguém que estamos conversando com Josh - e isso inclui o seu pai - disse Aaron bruscamente.Danielle assentiu em silêncio, embora um certo brilho nos seus olhos fosse interpretado por Josh como uma reação às palavras de Aaron, indicando que ela pensava que ele devia se acalmar. Ela pôs a mão de leve no braço de Josh.- Vejo você mais tarde. Vai ficar por aí?- Estarei por aqui.

- Ótimo - disse ela com um sorriso que prometia um mundo, ao mesmo tempo em que deixava o apartamento, escoltada por Gideon.Josh ficou olhando para a porta até que ela se fechou, quando se virou para os homens.- O que está acontecendo? - perguntou.Aaron adiantou-se mais.- Estamos aqui para lhe fazer algumas perguntas relacionadas à situação dos reféns e o pergaminho.- Antes de responder a qualquer pergunta, preciso saber a quem estarei respondendo. A única pessoa que conheço aqui é o Goner.Os olhos de Aaron estreitaram-se.- Eu trabalho na segurança israelense.- Shin Bet?- Os agentes do Shin Bet nunca reconhecem o que são. Basta que pense em mim como um segurança.- Eu sou o chefe da segurança da IAA - disse Giuseppe em tom casual, ao mesmo tempo em que examinava o lugar.- Onde está Moshe? Ele não trabalha com vocês?Giuseppe balançou a cabeça afirmativamente.- De vez em quando, mas ele não faz parte oficialmente da segurança. Toda a sua equipe de arqueólogos está sob vigilância, da mesma forma que outros elementos da IAA. Nós acreditamos que o líder desse grupo de fanáticos trabalhe na IAA. Suspeitamos também que ele tenha um ou mesmo dois dos seus parceiros trabalhando com ele no mesmo órgão.- Vocês têm alguma idéia de quem eles sejam?

- Temos nossas suspeitas — disse Aaron, que circulava pela sala. - Mas aqui em Israel, como nos Estados Unidos, é preciso estar de posse de provas em número suficiente para que se possa efetuar alguma prisão.- Podem me dizer de quem suspeitam?- Não seria inteligente por ora - respondeu Aaron, sacudindo a cabeça.Josh não sabia ao certo como interpretar aquilo. Era evidente que aqueles dois homens da segurança queriam extrair informações dele. Mas não desejavam se expressar com clareza.- Vocês estão planejando ceder à imposição dos seqüestradores e lhes dar o pergaminho?- Ainda não nos decidimos — disse Giuseppe. - Ainda estamos debatendo a linha de ação adequada.Mais respostas vazias. Aquilo não ia levar a nada.- Sustento que a ação apropriada é não ceder às exigências dos seqüestradores. Eles matarão os reféns de qualquer maneira. E se os fanáticos obtiverem o pergaminho irão destruí-lo.- Por que eles iriam fazer isso?- Não posso lhes dizer exatamente por quê. No entanto, tenho a forte sensação de que é isso que acontecerá. Escutem, estou pensando nisso desde a última vez em que falei com Moshe. Preciso da cooperação de vocês. Tenho um plano para pegar os seqüestradores em uma armadilha. Ele requer acesso ao laboratório de pesquisa hoje à noite. Quero também segurança extra aqui e a garantia de que o pergaminho esteja muito bem guardado.

- Já se encontra sob segurança máxima - disse Goner. - Qual é o seu plano?- Acho que tudo o que esses fanáticos fizeram até agora não passou de uma manobra diversionária. Acredito que o plano verdadeiro é tentar roubar o pergaminho. Precisamos fazer algo para nos assegurar de que isto não acontecerá.

CAPÍTULO 41

DANIELLE E SEU GUARDA-COSTAS PASSEAVAM PELAS PASSAGENS ESTREItas do Quarteirão Cristão dos Mercados da Cidade Antiga. A rua estava cheia de compradores e de peregrinos - assim também como de perigo.Alu sentiu o coração disparar ao olhar para ela. Sabia o risco que estava correndo. Mas sabia também que ela podia se importar com ele e então não fazia mal que os Guardiões descobrissem. Por Danielle valia a pena perder tudo.Alu esperou a oportunidade de se aproximar. Localizou um conhecido batedor de carteiras examinando a multidão, como um atirador apontando para o alvo. Moveu-se rápida e decisivamente, agarrou o ladrãozinho e o prendeu de encontro a uma parede de pedra. Sustentou-o com os pés fora do chão, cortando o fluxo de sangue destinado aos braços do rapazinho, e ficou contemplando o desespero evidente nos olhos dele.- Tenho um trabalho para você - disse, gravemente, deixando que ele se apoiasse no chão novamente. Apontou para a multidão. - Está vendo aquela mulher ali?

O descuidista gaguejou ao responder:- A de calça jeans e camiseta?- Exatamente. Quero que você roube a bolsa dela e saia correndo.Os olhos do homem faiscaram, mas ele não se moveu.- Agora! - comandou Alu, ameaçador. - Vai!O ladrão lançou um último olhar cauteloso para Alu e saiu.Ele disparou pela rua apinhada de gente, aproximou-se de Danielle e levou sua bolsa enquanto ela virava a cabeça. Como Alu esperava, o guarda-costas saiu correndo atrás do ladrão. Guardas de segurança agem por instinto, e desta vez foi exatamente o instinto que o traiu. Tolamente deixou Danielle sozinha no meio da multidão. Alu se asseguraria de que ela nunca mais fosse vulnerável de novo.Ele saiu do meio da multidão, colocou uma luva grande empapada de clorofórmio sobre a boca de Danielle e levantou-a nos braços. Foi o mais delicado que conseguiu, carregando-a com a cabeça aninhada nos braços. A multidão pareceu presumir que fossem um casal e que ela ficara doente. Carregou-a para o outro lado da rua onde entrou numa loja de suvenires quase vazia na Via Dolorosa. Levou-a para os fundos da loja e desceu um lance de escada até um quarto frio e escuro.Ele a deitou e ajoelhou-se ao seu lado, esperando que recuperasse a consciência.- Danielle, não quero machucar você. Só quero falar com você.Os olhos dela estavam arregalados de terror.

- Por que está fazendo isso? Você me libertou.- Você não pensou em mim? - perguntou ele, confuso. - Eu senti que havia alguma coisa entre nós.- De que é que você está falando?- Eu... Eu amo você.O rosto de Danielle expressou toda a sua perturbação quando ela sacudiu a cabeça de um lado para outro. Alu não esperara que fosse reagir daquele modo. Danielle devia estar alegre por vê-lo de novo e dizer-lhe que o amava também.- Sei que você está chocada - gaguejou ele, sua confusão transformando-se rapidamente em humilhação -, mas...Mas Alu não teve a chance de terminar seus pensamentos, porque, de repente, de alguma maneira, o Mestre surgiu.- Por que trouxe esta mulher para cá? - berrou o Mestre. - Avisei a você para que jamais desobedecesse às minhas ordens. Agora assinou sua sentença de morte!O Mestre deu um bote repentino e Alu tentou defender-se, mas subitamente sentiu uma dor penetrante e avassaladora. Todo o espírito de luta o abandonou e ele desabou no chão. Olhou para Danielle, querendo tocar nela mais uma vez. Mas não conseguia lazer com que seu corpo gigantesco reagisse, por mais que se esforçasse. Levante a mão. Toque no seu rosto. Mas ele limitou-se a ficar simplesmente encarando-a, implorando em silêncio até que a capacidade de ver abandonou seus olhos.

CAPÍTULO 42

A REUNIÃO DE JOSH COM AARON, GONER E GIUSEPPE CONTINUOU NO INÍCIO DA TARDE.- O que é que vocês sabem sobre estes fanáticos? - perguntou ele, servindo uma rodada de forte café turco.Aaron tomou um gole e balançou a cabeça em aprovação.- A maior parte de nossas informações é reservada, e só pode ser divulgada com permissão especial.- Quais são as informações que vocês podem compartilhar?Os três seguranças se entreolharam antes que Giuseppe respondesse.- Houve doze assassinatos não resolvidos no ano passado em Jerusalém que não foram cometidos por nenhum grupo terrorista conhecido. Desconfiamos que esta organização tenha cometido pelo menos alguns deles. O grupo tem mantido um perfil discreto. Apenas na semana passada é que sentimos que podemos ligar esses assassinatos a esta seita.- O grupo tem um nome?- Encontramos material escrito insuflando o ódio contra árabes e judeus que trazia o nome "os Guardiões". Eles odeiam os árabes com ardor, mas esse ódio não é nada comparado ao que sentem pelos judeus. Referem-se aos judeus como "os assassinos de Cristo".- Nós sabemos que não foram os judeus que mataram Cristo — disse Josh. — A crucificação era

uma forma romana de execução. A forma de execução dos judeus naquele tempo era o apedrejamento.Giuseppe e Aaron concordaram.Josh continuou.- Pôncio Pilatos foi um dos mais cruéis dos prefeitos romanos. Crucificou milhares de judeus. O imperador inclusive o convocou a Roma a fim de explicar sua crueldade excessiva. Pilatos odiava os judeus, em especial os que acreditava que pudessem ameaçar o domínio romano. Crucificava-os cruelmente, sem um pingo de piedade. Na verdade, dos milhares de judeus mortos, um único esqueleto foi encontrado. Os romanos nunca permitiram que houvesse um enterro judeu para as vítimas da crucificação. Deixavam os corpos presos à cruz para serem comidos, primeiro pelas aves de rapina e depois pelos cães selvagens. Não tencionavam apenas humilhar os judeus, mas também dar um aviso: aquilo era o que aconteceria aos que desobedecessem à autoridade de Roma.- Você conhece história - disse Giuseppe.- Sei muito mais sobre ódio e fanatismo.Giuseppe riu, sem achar graça.- Bem, você certamente está no lugar apropriado. Este é o epicentro histórico do ódio.- Mas é também - retrucou Josh, dedo em riste - o centro da fé. Algum dia essa contradição será retificada.Aaron descansou a xícara e se serviu de mais café.- Mas de que modo?

Josh odiou o cinismo que percebeu na voz do agente de segurança. Fixou os olhos no café, vendo além do líquido escuro o seu próprio passado.- Eu era um pessimista. Achava que a humanidade era uma causa perdida. Lia um jornal e ficava enojado com tantas notícias negativas. Ligava a televisão e desprezava a crueldade a que assistia. Era como a maioria das pessoas: não pensava ser capaz de fazer algo a respeito daquilo. Por isso tentei tornar-me imune a tudo. Concentrei-me nos meus próprios problemas. Percebo hoje que estava errado. Pretendo fazer diferença, de algum modo, de algum jeito.Nenhum dos homens respondeu. Josh não quisera passar um sermão, mas o fato é que as palavras foram saindo como se tivessem sido pronunciadas por alguma outra pessoa. Estava na hora de mudar de assunto. - Qual é o plano de vocês para proteger o pergaminho e libertar os reféns? — perguntou.Foi Giuseppe quem respondeu, claramente satisfeito pela troca de assunto.- Ainda não decidimos o que fazer a respeito dos reféns, mas o pergaminho se encontra em um cofre de alta segurança no museu.- Como poderão protegê-lo se os Guardiões já tiverem se infiltrado na IAA?- Não é permitido o acesso de ninguém ao manuscrito. Só o meu parceiro mais íntimo e eu temos a combinação do cofre.- Espero que esse seu parceiro seja confiável.- Eu poria minha vida em suas mãos.

- Tem planos para trocar os seqüestrados pelo manuscrito?- Nós concordamos com você - respondeu Aaron. - A menos que libertemos os reféns, eles morrerão.Josh ficou feliz ao ver que estavam no mesmo barco.- Tenho um esquema que talvez possa resgatar os reféns sem precisarmos passar o manuscrito às mãos deles. Seria um teste para as verdadeiras intenções dos fanáticos.- Vamos ouvir seu esquema.- Vocês têm jarros antigos similares ao que continha o rolo de pergaminho?- O jarro em si é muito comum.- Bem, então vocês têm um que possam perder?- Acho que podemos dispor de um deles.- Como já falei, preciso de acesso ao museu hoje à noite. Ninguém pode saber que irei lá. Alguns itens serão necessários: um pedaço de pergaminho e um instrumento de escrita usado aproxi-madamente dois mil anos atrás.Giuseppe franziu a testa.- Exatamente, qual é o objetivo de seu plano?- Resgatar os reféns e, ao mesmo tempo, descobrir a identidade do líder dos Guardiões.

Capítulo 43

DANIELLE AINDA NÃO HAVIA VOLTADO NA HORA EM QUE OS HOMENS da segurança foram embora. O que parecia um tanto estranho, já que ela não poderia ter adivinhado que Goner e os outros ficariam o

tempo que ficaram. Ainda assim, estivera trancada por tanto tempo desde a sua abdução, que Josh imaginou que provavelmente ela estivesse aproveitando o passeio.Ele voltou para o quarto e abriu o arquivo da cópia do manuscrito. Ainda tinha dúvidas a respeito das motivações dos Guardiões para começar, se eles seriam mesmo os seqüestradores. Era preciso adiantar-se o máximo possível no documento; apenas quando conhecesse os seus segredos seria capaz de compreender por que alguém recorreria a tamanhos extremos a fim de controlá-lo.De pronto, Josh notou que havia algo diferente nas novas passagens. Como sempre, estavam escritas em aramaico e, como sempre, a tradução foi lenta e laboriosa. Neste caso, agora era complicado pelas letras que faltavam. Enquanto olhava para a imagem da página na tela, os espaços onde antes havia letras pularam em cima dele. Será que havia uma imagem ali? Não, não parecia. Mas talvez houvesse uma imagem qualquer. A primeira omissão veio nas primeiras cinqüenta páginas, onde apenas uma letra era invisível. Na seqüência seguinte, cem letras, cinco estavam faltando. O padrão prosseguiu até a 156a letra, onde havia mais cinco faltando. Depois, na 211a, havia a falta de sete caracteres. Josh ficou perplexo e sua confusão aumentou quando viu que havia mais sete letras falando na 268a. A omissão final veio na letra 325, onde, desta vez, eram oito letras que faltavam. Após isso o texto corria sem interrupção.Josh reviu o padrão das letras que faltavam e escreveu 1-5-5- 7-7-8. Não parecia ter qualquer

significado. Escreveu as letras em uma variedade de combinações, tentando descobrir um padrão ou um código. Se houvesse uma mensagem ali, ele não conseguia compreender.Nada disto é aleatório, pensou ele, embora tivesse a impressão de que as palavras vinham de fora. Sacudiu a cabeça, num esforço para clareá-la. Estava sentindo dificuldade em pensar com obje-tividade. Estava se concentrando em demasia ou não estava se concentrando bastante?Levantou-se um minuto para ver se Danielle tinha chegado, mas as únicas outras pessoas no apartamento eram os guarda-costas dele. Onde ela teria ido? E por que de repente se sentia apre-ensivo por causa dela?Sabendo que ficaria louco se começasse a imaginar cenários que explicassem onde Danielle poderia estar, ele voltou para seu quarto e concentrou-se na tradução. Como sempre, mergulhou no processo e não viu o tempo passar.

Inicialmente acreditei nos ensinamentos dos fariseus de que um dia os mortos se levantarão das sepulturas. Agora compartilho da crença de um grupo no deserto conhecido como a comunidade, de que a ressurreição será mais espi-ritual que física. Não temo a morte, pois acredito que meu espírito seja eterno.Vivo em uma terra ocupada. Meu rebanho sofre em um mundo de desigualdades e injustiça. Meu desejo era banhar os integrantes do meu rebanho com a luz da esperança e um amanhã melhor. Nós todos somos iguais perante Deus.

Onde Deus existe? Ele vive no coração e na mente. Uma parte de cada um de nós remonta ao início da criação. É a centelha divina. Abra-se e poderá senti-la.Eu curo apenas com base na fé. Dou vida aos que estão espiritualmente mortos. Tenho visto demônios com os rostos da culpa, do espírito impuro, da frustração dos crimes e da falta de fé. Expulso esses demônios para fora das pessoas e os substituo pela sensação da fé, espírito limpo e bem-estar. Nós humanos temos a capacidade de escolher entre as ações boas e as más, pois ambas residem em nós. Se você roubar, estuprar ou cometer assassinato sofrerá as conseqüências dos seus atos. Coisas pequenas podem ser perdoadas, mas a absolvição deve ser conquistada.A fé não é uma desculpa para matar ou prejudicar seu irmão ou irmã. Quem quer que use nossos textos ou os ensinamentos das outras religiões a fim de justificar coisas sofrerá as mais terríveis conseqüências — a perda eterna da sua alma.

Ao ler a tradução, Josh pensou imediatamente nos Guardiões. Estava mais convencido do que nunca de que aquele grupo fanático - fosse qual fosse sua identidade - não queria a divulgação das pa-lavras inscritas naquele pergaminho. E logo atrás deste pensamento surgiu um outro - os Guardiões fariam o que quer que fosse necessário para impedir aquele pergaminho de ver a luz do dia.Josh deu uma olhada pela janela. Estava ficando escuro. Mais uma vez foi ver Danielle. Ela ainda

não tinha voltado. E ele soube, com absoluta certeza, que ela estava em grave perigo.Ele não soube ao certo como agir. Por que era sempre assim quando se tratava de Danielle? Deveria sair à rua para procurá-la? Neste caso, aonde iria? Jerusalém era grande demais e ele não linha idéia de por onde começar.Deu uma olhada no relógio e viu que já eram quase sete horas. Deveria deixar o museu dentro de pouco tempo. Como poderia fazer isso quando a mulher a quem amava se encontrava em perigo? Por outro lado, estava certo de que tinham sido os Guardiões que a haviam abduzido antes; se agora tinham repetido a dose, então o seu plano poderia ajudar a salvá-la. Na verdade, podia ser a única chance que tinham.Exatamente neste instante o telefone tocou e Josh apressou-se a atender, na esperança de ouvir a voz de Danielle.- Alô? - disse ele, a voz cheia de esperança.Houve um momento de silêncio e depois uma voz conhecida:- Temos os reféns e queremos o pergaminho.O sangue de Josh gelou nas veias.- Quais são os nomes dos reféns? - ele perguntou.- Você sabe quem são.- Não me venha com tolices. Diga logo o que deseja.Mais uma vez a voz hesitou por um momento.- Traga o jarro e o pergaminho para a frente da Igreja do Santo Sepulcro amanhã às quatro da tarde. Nada de truques ou os reféns morrerão.

Quero que você — e mais ninguém - entregue o jarro e seu conteúdo. Somente então libertaremos os reféns. Mas se virmos qualquer elemento da polícia ou da segurança, eles morrerão... assim como você. Será uma morte lenta e sofrida, eu lhe asseguro.Josh sabia o que dissera a Moshe e aos elementos da segurança a respeito de uma troca de reféns. Mas agora, tendo que enfrentar a situação ele próprio, não sabia ao certo como reagir. Poderia manter sua convicção de que a troca seria inútil se significasse que havia alguma chance para Danielle ser salva?- Danielle Ben Daniel é um de seus reféns? - perguntou Josh.Mas já tinham desligado.

Capítulo 44

DANIELLE ESTAVA AMARRADA, AMORDAÇADA E VENDADA NA MALA DE um carro ou van. Ela ouvia o barulho do motor e sentia as vibrações e ocasionais solavancos causados pela estrada, o que lhe dizia que estava sendo transportada - mas para onde?Impossível saber, e ela não tinha certeza se queria saber. Em vez disso, preferiu lutar contra suas amarras. Era quase inconcebível que aquilo estivesse acontecendo de novo.O carro sacudiu e ela sentiu uma pontada terrível na perna esquerda. As cordas estavam presas com muita força. Quem quer que tivesse feito aquilo

não ligava a mínima se ela morresse ou vivesse. A escuridão tornou-se invasiva e o tempo pareceu se estender infinitamente. Estavam rodando havia muito tempo.Ela pensou no homem da máscara de serpente, o homem que tinha matado Alu. Ouvira a voz dele antes. Mas onde?Josh viria atrás dela? Ele poderia vir? Quando voltara para casa da última vez, ele dissera como se sentira frustrado ao tentar encontrar um jeito de encontrá-la. Desta vez seria diferente?Dizer que o romance deles tinha sido um furacão era uma meia verdade. Danielle nunca se apaixonara por um homem daquela maneira. Ela sabia tudo sobre paixonites - já vivera sua cota de aventuras tempestuosas - mas desta vez era algo inteiramente diferente. Por mais estranho que parecesse, alguma coisa dentro dela lhe dizia que tinha conhecido Josh em algum ponto do passado.Ainda assim, desde que o conhecera, sua vida estivera em constante perigo. Talvez fosse um sinal para bater em retirada antes que fosse tarde demais - se é que já não era. Talvez a companhia de Josh fosse muito perigosa.O carro passou por cima de outra protuberância e Danielle expulsou aqueles pensamentos de sua consciência.

Capítulo 45

FIXANDO OS OLHOS ATRAVÉS DA JANELA DO PASSAGEIRO DE UM DOS carros não caracterizados pertencentes ao departamento encarregado das antiguidades, Josh fitou a esfera de fogo cor de laranja, os restos do sol poente de Jerusalém.Chegaram ao museu pouco antes das oito horas da noite. Josh não viu nenhum guarda do lado de fora do edifício, mas ao entrar imediatamente localizou Giuseppe e diversos outros membros da segurança. Três outros agentes estavam posicionados no laboratório de pesquisa e na parte de trás do prédio, e, bem ao lado do cofre onde estava guardado o pergaminho, mais dois. Ainda assim, ele não se sentia seguro. Os Guardiões eram determinados e tinham demonstrado ser mais que capazes de realizar o inesperado.Em cima de uma das mesas do laboratório havia uma réplica do jarro. Josh ficou aliviado ao ver que parecia idêntico ao artigo genuíno. Ao seu lado, havia um pergaminho e um instrumento de escrita do primeiro século. Quando terminou os preparativos finais, o sol já tinha se posto e o que entrava pelas persianas era a luz sinistra do crepúsculo. Era como se Josh tivesse entrado em outro mundo, em outra época.Josh puxou a primeira folha de pergaminho e começou a escrever em aramaico - as mesmas palavras que tinha traduzido. Ele as estudara com tanta intensidade que elas pareciam marcadas a fogo em sua cabeça. Havia algo mais acontecendo ali, contudo. O pergaminho ativara uma parte do seu cérebro que até então estivera adormecida,

uma parte que registrava eventos críticos com total claridade.Foi preciso mais de uma hora para completar a primeira folha e um pouco menos para a segunda. Depois, quando ele estava começando a trabalhar na terceira, o estrondo de uma explosão sacudiu o quarto. Vinha da parte de trás do prédio, e Josh soube imediatamente qual tinha sido o alvo: o cofre.Josh disparou correndo pelo corredor, onde se juntaram a ele quatro seguranças que corriam na mesma direção. Mas, antes que chegassem na parte de trás do prédio, ouviram-se tiros de pisto-la, ecoando no corredor comprido. Quando eles contornaram a esquina e chegaram ao local da explosão, viram dois seguranças estirados no chão, mortos, sangue e pedaços de corpo por toda parte. A porta do cofre fora aberta com uma explosão que também abrira um rombo na parede de trás. Procurou o jarro, mas sabia que não o encontraria em parte alguma.Mais tiros foram disparados em algum ponto do lado de fora do prédio, e por isso Josh arrastou-se através do buraco na parede para o terreno dos fundos do edifício. Lá havia mais dois corpos; desta vez, porém, estavam vestidos com a roupa tradicional dos assassinos árabes medievais. Apenas seus olhos mortos eram vistos por trás dos véus. O ar recendia a explosivos e excremento.Giuseppe pulou por cima da parede, seguido por Goner.- Eram três assaltantes. Matamos todos.

- Pensei que vocês tinham garantido a absoluta segurança disto aqui — disse Josh em tom acusador.- Nós deliberadamente mandamos que nossos homens ficassem no interior da casa a fim de não chamar a atenção - explicou Giuseppe. - Isto deveria ter permitido que capturássemos quais-quer intrusos do lado de dentro. Certamente não esperávamos que fossem atacar pela parede dos fundos usando explosivos.- Há somente dois corpos aqui. Onde está o terceiro?Giuseppe voltou-se para a direção da rua.- Atiramos e matamos o terceiro quando ele fugia de carro. Era um táxi sem placa de licença, provavelmente de propriedade de um árabe local.- Pensei que os Guardiões não fossem árabes.- E não são. Esses homens eram profissionais, mercenários.Josh gemeu ao ouvir a nova informação. Fez com que se lembrasse mais uma vez de como era mal equipado para participar daquele jogo.- Por favor, digam-me que conseguiram recuperar o pergaminho.- Não foi preciso.- Como assim? - perguntou ele, incrédulo.- O pergaminho não se encontrava aqui. Nós tomamos as precauções devidas muito seriamente aqui.

CAPÍTULO 46

JOSH RETORNOU AO APARTAMENTO AGARRANDO-SE A ESPERANÇA DE que Danielle estivesse lá quando chegasse. Faltavam poucos minutos para as duas horas da madrugada. Boaz, o guarda-costas, roncava no sofá. Josh sacudiu-o até acordá-lo.- Fico satisfeito de ver que você está tomando conta da casa.Boaz bocejou.- Acabo de cair no sono. Que horas são?Josh apontou o relógio na parede.Duas horas, não posso acreditar! - exclamou Boaz, parecendo verdadeiramente espantado. - A última vez que verifiquei era meia-noite e meia.- Danielle está?- Não a vi.Josh odiou a sensação que teve na boca do estômago. A morte e a destruição que vira no museu tinham sido mais um lembrete de como eram sérios seus inimigos. Sabia que tinham seqüestrado Danielle de novo. O que não sabia era se estava viva ou morta.Foi até o quarto dela para confirmar com os próprios olhos sua ausência e depois se dirigiu para o seu quarto. Certamente não ia dormir: talvez pudesse fazer algum progresso com a tradução. Quando chegou lá, contudo, viu o estojo do computador em cima da cama. Alguém tinha quebrado o trinco e roubado o laptop.Josh voltou para a sala pisando duro.

- Boaz, o seu serviço quando nem eu nem Danielle estamos aqui é vigiar o apartamento e não deixar ninguém entrar.- Não deixei.- Bem, alguém invadiu meu quarto e roubou o laptop.- Impossível. Estive aqui o tempo todo.- Você estava adormecido pelo menos há uma hora. Por que não havia outros agentes de segurança?- Amos está de guarda lá fora. O plantão dele é de onze às sete.Josh deu uma olhada na direção da porta e fez contato visual com o seu próprio guarda-costas.- Nós não o vimos quando entramos.- Como pode ser uma coisa dessas? - disse Boaz, levantando-se do sofá de um pulo. Procurou Amos do lado de fora da porta e seguiu pelo corredor, seguido de perto por Josh.Amos não podia ser visto em parte alguma e Boaz foi chamar o elevador.Josh o deteve.- Vamos de escada.Ao descerem em louca disparada, Josh quase tropeçou num corpo que jazia estirado no patamar do primeiro piso.- Acho que acabei de encontrar Amos.Josh tomou o pulso de Amos. Seu coração ainda estava batendo. Tinha um galo de pequeno tamanho na cabeça. Obviamente alguém tinha batido na cabeça dele para que perdesse a

consciência. Josh tentou acordá-lo e, após um momento, conseguiu.- Onde estou? - perguntou Amos, enrolando a língua.Josh e Boaz sustentaram Amos pelos braços e o levaram escadas acima para o apartamento. Depois que o deitaram no sofá, Josh voltou ao seu quarto a fim de examinar as janelas. Estavam fechadas e trancadas. Foi no quarto de Danielle fazer o mesmo, mas lá também encontrou tudo em ordem.- O que foi que aconteceu? - quis saber Boaz.- Quem quer que tenha roubado o laptop deve ter surpreendido Amos e o fez perder a consciência com uma pancada. Os assaltantes deviam ter uma chave, caso contrário o teriam acordado. Quando me aproximei de você, senti um leve odor de clorofórmio. Puseram você para dormir e se asseguraram de que permaneceria dormindo o tempo que fosse necessário.Boaz aquiesceu gravemente.- Por que não leva Amos para casa? Quando se sentir melhor vou querer conversar com ele.Boaz deu uma olhada no guarda de Josh.- Não devia haver apenas um de nós de serviço.Josh não estava disposto a ser muito polido.- Não faz muita diferença aqui, não é mesmo?Boaz ainda tentou discutir, mas desistiu rapidamente. Ele sabe que ferrou tudo, pensou Josh. Só não sabe a que ponto. Antes de sair com Amos, contudo, Boaz insistiu para que Josh ficasse com sua pistola de 9mm para a própria proteção.

- Duas pessoas armadas são melhores que uma - disse ele.Mas duas pessoas armadas teriam qualquer efeito contra os recursos dos Guardiões?

CAPÍTULO 47

EXAUSTO, JOSH PERMANECEU DEITADO NA CAMA, TENTANDO EM VÃO cair no sono. Seu coração batia disparado; podia ouvi-lo e inclusive sentir o sangue latejando em seus ouvidos. Fechou os olhos de novo, mas começou a tossir e a se virar - era inútil.Levantou-se e se arrastou até o canto do quarto, onde assumiu uma posição de meio lótus. Podia ser que, se meditasse, relaxasse o suficiente para cair no sono. Precisava de todo e qualquer auxílio que pudesse obter agora, porque estava certo de que o dia seguinte seria o mais difícil de toda a sua vida.Josh fechou os olhos e começou a respirar fundo. Não adiantou. Imagens de Danielle passavam pela sua mente. O toque dela, o contato da pele do seu corpo quando os corpos dos dois se juntavam, a expressão do olhar que nunca vira igual. Gostaria de saber se iria vê-la de novo.Fez a si próprio a mesma pergunta em relação ao manuscrito. O original desaparecera. Da mesma forma a cópia que estava no laptop. Não tinha acesso à cópia que salvara no servidor do seu escritório e, mesmo que tivesse, ninguém acreditaria que fosse autêntica. A menos que de alguma forma recuperasse o original, o mundo

jamais leria as palavras que traduzira - palavras que ele confiara à memória.Josh tentou respirar fundo de novo. Visualizou a seqüência de cores vermelho, azul, amarelo, verde e púrpura, mas ainda assim não conseguiu relaxar. Finalmente apelou para a indução pelos degraus de uma escadaria. Esta pareceu ter algum impacto. A cada passo que dava sentia aprofundar-se mais e mais. Contava os degraus à medida que descia: 199, 198... Por fim, se sentiu totalmente relaxado e em contato com o inconsciente.Nada se apresentou a ele por diversos minutos. Então as quatro sombras apareceram de novo, transformando-se em fantasmas sem rosto. Em seguida juntou-se a eles um quinto fantasma sem rosto, que se colocou no meio da formação, como que assumindo o lugar de honra. Depois a aparição do meio deu um passo à frente e suas feições inexistentes assumiram a forma de um homem de olhos castanhos escuros e nariz proeminente. Tratava-se de um tipo bastante comum, mas tinha os olhos mais intensos que ele jamais vira. Josh não o conhecia, mas havia algo estranhamente familiar na sua figura.O espectro falou com uma voz grave e ressonante, como se tivesse lido a mente de Josh.- Eu sou quem eu sou.- O que você quer de mim? - indagou Josh.- Você tem o poder, o intelecto e, mais importante, a coragem de fazer a diferença neste mundo.- Da mesma forma que tantos outros.

- Não como você. O mundo não vê ninguém parecido com você há muitos, muitos anos. Olha só nós cinco. Nós somos parte de você.Josh não entendeu o que ele quis dizer.- Não precisa ficar confuso. Tudo o que você foi e que será já vive no seu interior. Aprofunde-se em sua memória genética, pois nós nos encontramos lá, no seu inconsciente. Você precisará de todo o poder que tem, e pode ser que não seja suficiente. O mundo é muito mais complicado hoje em dia e os problemas mais severos; mas você precisa seguir pela trilha que é a sua.O espírito sorriu. "Desejo-lhe sucesso desta vez. Se precisar de mim, basta ouvir a voz da sua intuição."Assim que emitiu a palavra final, a aparição desapareceu.Por diversos e longos momentos, a mente de Josh permaneceu tranqüila. Nenhuma imagem nova surgiu. Então seus pensamentos começaram a alcançar o nível da normalidade. O que estava acontecendo? Haveria algo que se sobrepunha aos eventos e que se apoderara de sua vida? Quando descobriu o manuscrito e traduziu suas palavras de abertura, antecipou uma experiência trans-cendente, algo capaz de mudar verdadeiramente sua vida, talvez mesmo a prova que procurara desde sempre. Josh, no entanto, foi lembrado de que sempre questionara o valor da fé verdadeira. A fé dividia. A fé consistentemente levava à violência. E, quase sempre, não tinha uma compensação.

Seu estado de espírito sombrio ficou mais sombrio ainda. Ele recorrera à meditação na esperança de obter respostas, não para ter uma confirmação do seu ceticismo. Tentou ir mais fundo de novo, descendo a escadaria de sua mente. Contou de trás para frente dúzias de degraus e parou. Esperando por ele na escada obscura havia uma folha de papel - uma página do pergaminho. Concentrou-se nela intensamente, tentando determinar o motivo pelo qual estava ali.Notou, então, palavras que pulara quando traduzira a página - palavras que não conseguiu identificar como sendo aramaico.Ribbono shel Olam.Olhando para as palavras agora ele entendeu por que não as vira. Eram hebraicas e não aramaicas. Por que o autor teria feito aquilo?E o que significavam?Ribbono shel Olam.Ele ouvira esta frase antes, embora não conseguisse lembrar onde. Certamente não eram palavras de uso comum. Josh procurou em sua mente a tradução e encontrou: Senhor do Universo. Examinou as sentenças que a rodeavam e não viu ligação. Por que aquilo estava ali?Josh concentrou-se nas palavras e começou a repeti-las:Ribbono shel Olam.Ribbono shel Olam.Ribbono shel Olam.

Sentiu que o transe se aprofundava, como se tivesse entrado em uma nova parte de sua mente. Após uns momentos, ouviu uma voz que era familiar, mas que decididamente não era a sua."Há um tremendo poder nestas palavras. Eu as repito vezes sem conta e elas me conectam à centelha divina. Esta centelha está dentro de você. Está dentro de todos nós, mas poucos são os que sabem de sua presença e menos ainda aqueles que já a usaram. Todas as respostas que você busca, encontrará."A voz desapareceu e Josh de repente sentiu o aposento que o rodeava. Ouviu os barulhos que bloqueara enquanto meditava e depois abriu os olhos e notou que seu corpo estava banhado de suor.Teria sua transcendência recém-iniciado?

Capítulo 48

JOSH DORMIU POR QUASE QUATRO HORAS, DESPERTANDO ÀS OITO da manhã de sábado. Vestiu-se rapidamente e meteu a 9mm no bolso da calça cáqui. Não se sentia confortável carregando uma pistola, mas, naquelas circunstâncias, não achava que tivesse outra alternativa. Boaz tinha razão a esse respeito.Com o guarda-costas ao seu lado, Josh caminhou até a Cidade Antiga. A todo instante olhava em torno, procurando alguém que parecesse suspeito. Observava cada veículo e pessoa dentro de um raio de cem metros. Àquela altura dos acontecimentos, qualquer um poderia ser inimigo.Entrou na Cidade Antiga pelo Portão de Jaffa. Cada vez que ia àquele lugar sentia-se como se tivesse feito uma viagem ao passado. Adorava as ruas estreitas de pedra e a arquitetura dos tempos antigos e medievais; o destino de Josh, contudo, era bem mais moderno — um cybercafé localizado no coração do Bairro Judeu. Enquanto avançava sem pressa, Josh observava velhos árabes, judeus ortodoxos, padres, peregrinos e turistas. Eram os padres que o preocupavam. Toda vez que encontrava alguém vestido com algo semelhante a uma batina, temia que fosse um membro dos Guardiões. Nenhum dos que passaram por ele, contudo, apresentou qualquer ameaça.Quando chegou ao cybercafé, Josh viu que estava fechado. Sem saber como fora capaz de esquecer que era o dia do sabá judaico e que nenhum dos

estabelecimentos e restaurantes do Bairro Judeu abriria.Dirigiu-se então ao Bairro Cristão, na esperança de encontrar um lugar onde pudesse entrar na Internet. Ao contrário do Bairro Judeu, o Cristão estava entupido de turistas e peregrinos. Depois de caminhar por diversas ruas, finalmente conseguiu encontrar um café onde podia acessar a Internet e escolheu um computador perto dos fundos, longe dos outros usuários. Ali ele conectou-se e digitou a senha que lhe permitia entrar no Departamento de Arqueologia da Universidade de Pensilvânia. Sentia-se aliviado por saber que o sistema de senhas de Penn, criado por alguns dos melhores cérebros da universidade, era quase impossível de ser invadido mesmo pelo mais sofisticado dos hackers.Uma vez tendo acessado a rede do departamento, digitou nova senha de seis dígitos que o levou para outra janela, onde digitou mais uma senha, agora de oito dígitos. Agora podia comunicar-se com o computador do seu escritório. Inseriu a senha para abrir o arquivo do pergaminho e então apareceram as fotos do documento.Agora é que vinha a parte mais difícil. Josh sabia que tinha uma memória extraordinária. Era assim desde sempre, sendo capaz de se lembrar do mais ínfimo dos detalhes. Mas será que conseguiria memorizar cinco páginas escritas em aramaico no meio do barulho de um café bastante freqüentado? Se ia mesmo traduzir o resto do

pergaminho e decifrar seus segredos, não tinha outra escolha.Usando algumas das técnicas que dominava na meditação, Josh concentrou-se profundamente nas páginas. Em menos de uma hora tinha decorado todo o restante do manuscrito, gravado para sempre na memória.— O que é que você foi fazer lá? - perguntou seu guarda-costas quando eles voltaram a caminhar pelo Bairro Cristão.— Eu precisava estudar algo.— Você parecia estar profundamente concentrado.Josh avaliou o guarda bem de perto.— Era importante.Continuaram caminhando pelo Bairro Cristão, Josh ainda olhando para trás de vez em quando a fim de ver se alguém o estava seguindo. Tinha uma má impressão acerca de alguém, mas continuou andando. Depois de uns cem metros, contudo, ele viu de novo o mesmo estranho. Era um sujeito vestido como turista, boné de beisebol dos Yankees de Nova York e uma camiseta com as palavras "Jerusalém Cidade de Deus" impressas na frente. Barba bem-feita, sem uma característica que realmente o distinguisse. A não ser pelo fato de ter bem mais que um metro e oitenta de altura, o homem era bastante comum.Josh e seu guarda-costas pararam em uma loja de suvenires, fingindo dar uma olhada nos objetos à mostra. Os olhos de Josh, contudo, não saíram por um segundo do estranho. Que ficou parado em

frente à loja, presumivelmente apreciando a paisagem.— O que é que você acha desse sujeito? — perguntou Josh ao guarda-costas.— Eu também estava de olho nele. Vamos ter cuidado.Poucos minutos depois deixavam a loja de suvenires e seguiam na direção do Portão de Jaffa. O estranho continuou à espreita, e Josh mudou de direção, decidindo-se pela Igreja do Santo Sepul-cro. Ao chegarem na entrada da igreja, o estranho tinha sumido.Josh estudou por longo tempo a comprida fila de turistas e peregrinos que circulava pela rotunda, onde ficava situada a tumba de Cristo. Não reconheceu nada de anormal - por ora, pelo menos. Mas a troca estava prevista para ter lugar ali às quatro da tarde, e Josh não tinha idéia de que os Guardiões sabiam que não estavam de posse do pergaminho original. Será que os planos deles haviam mudado? Danielle seria um de seus reféns? Qual seria o próximo lance deles?Josh virou-se para o segurança.— Podemos ir - disse. O guarda não perguntou para onde estavam indo, o que foi ótimo, porque Josh não sabia ao certo como haveria de responder - se é que responderia.

Capítulo 49

NA ESPERANÇA DE QUE UMA MUDANÇA DE CENÁRIO LHE DESSE UMA nova perspectiva, Josh sentou-se no bar-terraço do

lendário King David Hotel, o endereço das celebridades e chefes de estado que visitavam Israel. A despeito de tudo que fervilhava em sua cabeça, ele não podia deixar de admirar a estonteante vista da Cidade Velha, um lugar onde mito e realidade co-existiam. Enquanto refletia sobre os acontecimentos dos últimos dias, o toque alto do celular despertou Josh do seu devaneio.— Por onde tem andado? Passamos a última hora tentando encontrá-lo - era Giuseppe Kaplan.— Desliguei o telefone por algum tempo. O que houve?— Hoje de manhã ocorreu outro incidente do lado de fora do museu.O susto deixou Josh sem ar.— O que aconteceu?— Prefiro não tratar disso ao telefone. Vou mandar um carro pegar você em quinze minutos.— Estou no King David.— Nós o pegamos na entrada principal.Josh saltou do veículo e respirou fundo duas vezes antes de dirigir-se à entrada do museu. O chefe da segurança da IAA estava no saguão, esperando-o para cumprimentá-lo.— Por favor, siga-me até minha sala - disse Giuseppe, a cara fechada.— De que se trata tudo isso? - perguntou Josh temendo a resposta, porque, no fundo do coração, sabia que estava prestes a tomar conhecimento de uma coisa horrível.— Vamos para minha sala. Prefiro discutir este assunto em particular.

Uma vez lá, Josh posicionou-se na cadeira dura e desconfortável que ficava logo em frente à mesa de Giuseppe.Giuseppe pegou um maço de cigarros.— Você fuma? - ofereceu.— Não, mas fique à vontade.Josh esperou em silêncio agonizante enquanto Giuseppe pegou um isqueiro e acendeu um cigarro, de uma marca israelense que ele não reconheceu.Giuseppe deu umas duas tragadas e só depois falou.— Esta manhã, às 6:37h, grandes malas contendo os restos de dois corpos foram descobertas perto da fachada do prédio.Josh conteve a respiração e Giuseppe continuou.— Os corpos foram esquartejados e decapitados. Um deles era do reverendo Barnaby Smith e o outro de Gideon Shapiro, um de nossos guardas de segurança.Josh encarou Giuseppe, atônito. Gideon era o homem que saíra do apartamento com Danielle. As repetidas tentativas de entrar em contato com ele haviam falhado. Agora sabiam por quê.— E Danielle?Giuseppe deu uma última tragada no cigarro antes de esmagá- lo no cinzeiro.— Eu não sabia ao certo se devia mostrar-lhe isto, mas é importante que o faça - disse. - Havia uma foto presa no torso de Gideon. Era um retrato de Danielle.

Giuseppe passou-lhe o retrato e Josh sentiu intensa dor no peito e estômago. Na foto, Danielle jazia deitada no altar com as mãos presas e os olhos fechados. Os olhos de Josh encheram-se instantaneamente de lágrimas. Tristeza e ódio invadiram-no.— Ela está...— Pode ser que Danielle não esteja morta. Minha equipe está estudando possíveis pistas que a localizem. Começamos investigando sítios religiosos, em especial os mais antigos, para ver se reconhecemos o altar que aparece no retrato.Se ela estiver viva, preciso salvá-la, pensou Josh, o medo queimando sua mente. Se não estiver, preciso fazer com que cada Guardião pague pela sua morte.Josh pôs a mão sobre o ombro de Giuseppe.— Não quero mais a proteção dos seus agentes de segurança. Posso cuidar de mim. Preciso de liberdade para operar sozinho.— Isso é loucura. Você ainda corre grave perigo e requer segurança 24 horas por dia.— Eu posso fazer o que preciso - disse Josh com absoluta segurança.— Não posso autorizar que você aja sozinho.— Você não tem que me autorizar a fazer nada. Só precisa ficar fora do meu caminho.Giuseppe ficou em silêncio por alguns segundos. Josh sabia que ele não queria aceitar a interferência de qualquer homem.Por fim ele resolveu pegar outro cigarro.

— Você vai ter que nos manter a par de todas as suas atividades.— Eu manterei. É claro que duvido que seja necessário, já que vocês certamente estarão monitorando cada passo meu.Giuseppe suspirou e assentiu.— Claro.— Então, onde está o pergaminho?Antes que Giuseppe pudesse responder, um segurança entrou correndo na sala.— Tem alguém no telefone que insiste em falar com você. Alega ter informações referentes aos assassinatos de Barnaby e Gideon.— Transfere e não se esqueça de botar um grampo na linha.— Dá para ligar o viva-voz? - pediu Josh. - Eu gostaria de ouvir.Giuseppe acionou o botão do viva-voz.— Aqui é Giuseppe Kaplan - atendeu.— Posso considerar que você já teve a oportunidade de admirar nosso trabalho manual? - provocou a voz familiar da outra ponta da linha. - A garota está recebendo tratamento especial também. Pretendemos nos divertir ainda mais com ela.Josh não pôde se conter.— Vocês são uns filhos-da-mãe doentes!A voz no alto-falante riu.— Estou vendo que você tem companhia. Deve ser o sr. Josh Cohan, não é? Quero que o sr. Cohan saiba que temos também grandes planos para ele.

Ainda fervendo intimamente de raiva, Josh recuperou a compostura e ficou ouvindo, sentado, em silêncio.Giuseppe inclinou-se sobre o telefone.— O que você quer?— Ainda estou de posse dos reféns. Não pensei que teria de trocá-los pelo pergaminho, mas depois da debacle de ontem à noite, estou disposto a ser generoso e fazer uma troca. Telefonarei mais tarde com minhas instruções.A ligação foi interrompida.Josh sentiu uma raiva como nunca experimentara antes. A vontade que teve foi de entrar pelo telefone adentro e arrancar com as próprias mãos a vida daquele sujeito.— O que é que você vai fazer? - exclamou, dirigindo a raiva para a única direção construtiva que podia.Giuseppe balançou a cabeça devagar, claramente abatido pelos eventos recentes. Josh adivinhou que ninguém jamais se habituava àquele tipo de coisa.— Não sei ao certo. Você terminou seu projeto de ontem?— Não, fui interrompido pela explosão.— Quero que o complete.— Você planeja usá-lo?— Só se formos obrigados.Josh não queria se atrasar, mas entendia que o texto do manuscrito ainda podia ter valor.

— Vou terminar antes de deixar o museu. Depois vou rastrear os Guardiões.— Como pretende fazer isso?— Não sei - admitiu Josh. - Vou deixar que meus instintos me guiem.— Você vai precisar de instintos sobre-humanos, então. Tem certeza de que não quer proteção?Josh olhou diretamente nos olhos de Giuseppe.— Admita, Giuseppe. Você não pode me prometer mais que prometeu à Danielle.

Capítulo 50

JOSH DEIXOU O MUSEU E PEGOU UM TÁXI PARA A ESQUINA DAS RUAS St. Mark e Khabad, onde os bairros cristão, judaico e muçulmano se sobrepunham. Ali ele subiu uma escadaria íngreme que levava a um telhado da Cidade Antiga. Um ponto de observação perfeito, que oferecia uma visão panorâmica da multidão que circulava lá embaixo.Você vai precisar de instintos sobre-humanos. A advertência de Giuseppe reverberava nos ouvidos de Josh. Instinto era tudo que ele tinha com que pudesse trabalhar - além de um monte de detalhes superficiais e vagos a respeito de uma possível seita mística. Precisaria mais do que instintos sobre-humanos para encontrar Danielle - da própria mão de Deus.Josh subiu mais até que viu a magnífica Cúpula da Rocha, revestida em ouro de catorze quilates - o terceiro lugar mais santo no mundo muçulmano, depois de Meca e Medina. Dali, Josh localizou seu

próximo destino. Desviando-se de antenas parabólicas e passando por cima de muros divisórios, teve a visão majestosa da Igreja do Santo Sepulcro, com suas cúpulas imponentes. A maior das duas era especialmente impressionante, já que guardava o túmulo de Cristo diretamente sob ela. Josh pôde ver centenas de pessoas entrando e saindo da igreja. Tinha encontrado um ponto de observação perfeito para monitorar a multidão lá embaixo.Depois de uma hora, ele estava começando a criticar seu plano. Ou nada de suspeito estava acontecendo nas proximidades da igreja, ou seus instintos tinham falhado por completo. Mas justa-mente quando estava prestes a desistir, notou um homem extraordinariamente alto destacando-se entre os turistas e peregrinos. Duas coisas atraíram sua atenção: o gorro do time de beisebol dos Yankees e o grande crucifixo negro em torno do pescoço. Quando o homem entrou na igreja, Josh desceu correndo a escada e atravessou a rua, misturando-se o melhor que pôde à multidão que se acotovelava para entrar na igreja. Em meio a tanta gente, seu campo de visão ficou bastante restrito. Ainda assim, Josh confiou no sentimento visceral que lhe dizia para simplesmente ter paciência. Cerca de vinte minutos depois o homem do gorro de beisebol reapareceu, seguindo pela Via Dolorosa. Josh seguiu-o bem de perto, manobrando por entre a multidão que congestionava as velhas ruas calçadas de pedra. Após cerca de quinhentos metros, ele mergulhou

em uma loja velha com um cartaz pintado à mão com as palavras "A Espada de Deus".Josh entrou também e deslocou-se casualmente pelos corredores entre as vitrinas que exibam supostas relíquias, a maior parte quinquilharias cristãs, sempre de olho no falso turista. Mas quando chegou no fundo da loja, o homem pareceu desaparecer repentinamente. Tudo o que Josh viu foram pesadas cortinas do teto ao chão, movendo-se ligeiramente. Percebeu que devia ter sido localizado. Por um momento chegou a pensar em passar por ali também; se fosse uma saída de fundos, ainda poderia alcançar o estranho suspeito. Mas notou então que, entre os suvenires costumeiros, havia outros itens normalmente não encontrados nas outras lojas do bairro - como, por exemplo, uma réplica exata da espada de um cruzado. A Espada de Deus, pensou Josh, e a coisa toda começou a fazer sentido. Devia estar se aproximando do esconderijo secreto dos Guardiões. Estariam tentando pegá-lo numa armadilha? Neste caso, não estava disposto a engolir a isca.Quando Josh retornou ao apartamento, encontrou Aaron, outro dos seguranças de Giuseppe, à sua espera.— O que é que você quer? - perguntou, sem tentar esconder sua irritação. Queria que a IAA o deixasse em paz para fazer o que precisava fazer.— Houve certo burburinho lá no museu e eu quis lhe dar a dica. Ao que parece, chegaram os resultados de outros testes, os que deviam dar a

idade do pergaminho, e os resultados foram inconclusivos.— Inconclusivos? Como assim? - exclamou Josh, exasperado. Não tinha tempo para aquilo agora. - Todos os exames iniciais comprovaram a autenticidade do pergaminho.— O último teste de carbono 14 levantou algumas questões.— Questões? Que questões poderiam justificar o envio de um segurança com o recado? E por que está me dizendo isto agora? - a paciência de Josh estava se esgotando. Danielle continuava desaparecida e, quanto mais tempo ele perdesse com aquele tipo de conversa fiada "inconclusiva", maior seria a chance de perdê-la para sempre.— Eu só achei que você queria saber — argumentou Aaron - tendo em vista tudo o que está acontecendo.O que Aaron realmente estaria querendo? Será que queria sugerir que Josh podia ter levado diversos homens à morte e posto a vida de Danielle em risco por causa de uma fraude? Josh já se perguntara muitas e muitas vezes o que teria ele trazido para o mundo ao descobrir o pergaminho. As conseqüências já tinham sido mais horríveis do que ele podia ter imaginado. Mas não havia dúvida em sua cabeça de que o pergaminho era verdadeiro.Ainda assim, ele foi atingido pela insinuação, e subitamente deu-se conta da culpa esmagadora e do medo que vinha sentindo - ou melhor, não sentindo, e sim trabalhando duro para esconder

debaixo da atividade febril. Mas não podia deixar-se levar pelas emoções, porque senão não seria capaz de fazer nada por Danielle. Mas será que a faina de evitá-las poderia, de algum modo, estar impedindo seu progresso? Precisava encontrar um modo de conviver com o medo, quer gostasse ou não. Sentou-se no sofá, respirou fundo e concentrou-se por um momento em relaxar os músculos tensos.— Onde está o pergaminho agora? - perguntou.— Está conosco - respondeu Aaron, sentando-se. - Foi removido do cofre do museu 24 horas antes da tentativa de roubo. Está em local seguro.— Disse a alguém onde ele está escondido?— Nem eu sei. Apenas duas pessoas sabem, e a identidade delas é secreta.Josh adiantou-se um pouco.— O que é que você sabe sobre um grupo que se autodenomina "Os Guardiões"?— Os Guardiões? - repetiu Aaron, levantando uma sobrancelha. - O nome não aparece com freqüência. Eles são um culto religioso. Afirmam que existem desde sempre.— Quanto tempo é "desde sempre"?— De acordo com a nossa inteligência, quase dois mil anos. Eles acreditam que são os verdadeiros cristãos.— É espantoso como todo grupo alega ser o único que detém "A Resposta" - resmungou Josh. - Quando vocês souberam deles?— Eles estão por aí desde que começamos a operar na Cidade Antiga, em 1967.

Josh recostou-se e mudou o foco do seu olhar para além de Aaron, depois da janela, a visão da cidade lá embaixo.— Quando Mark Twain visitou Jerusalém em 1869, escreveu a respeito da reunião de um culto cristão radical similar aos Guardiões atuais.— Essa eu não sabia - confessou Aaron.— Os que integraram as Cruzadas pertenciam a um culto secreto.— Sim, a Ordem dos Templários.Josh assentiu.— Exatamente. Os Templários começaram com apenas nove membros e sua tarefa principal era proteger os peregrinos em visita a Jerusalém. Duvido muito que fossem os Guardiões. Mas havia outros, alguns dos quais envolvidos na luta propriamente dita e que se especializavam em matar os que não fossem crentes. Cavaleiros estes que pertenciam a uma sociedade secreta desco-nhecida, possivelmente os Guardiões.— O que isto tem a ver com o que acontece hoje em dia?Josh deu de ombros.— Nada, talvez. Mas pode ser que haja uma conexão. De qualquer modo, os Guardiões viveram sob seus olhos vigilantes durante quarenta anos. Por que não os prenderam?Aaron brincou com um lápis em cima da mesinha de centro. Para Josh, ficou evidente que a pergunta o deixara embaraçado.— Foi apenas há pouco tempo que eles se engajaram em atividades criminosas

incontestáveis. Até então nunca tínhamos sido capazes de ligá-los diretamente a nenhum crime. Nós nos orgulhamos de sermos tolerantes no que diz respeito à religião. Mesmo que um grupo tenha pontos de vista extremos, desde que se mantenha dentro da lei, nós não os importunamos. Desde a sua descoberta, contudo - Aaron fez uma pausa - as coisas mudaram. Os Guardiões tornaram-se violentos. Ou talvez apenas mais ousados. De um modo ou de outro, estamos planejando acabar com eles.— Isso tudo é informação antiga - rebateu Josh. - Diga-me alguma coisa que eu não saiba.— Como o quê?— Alguma coisa de novo a respeito das crenças deles?Aaron descansou o lápis.— Admitidamente, sabemos muito pouco. Descobrimos uma literatura de ódio cuja autoria acreditamos ser atribuída a eles. Também têm um segredo que afirmam estar em seu poder há séculos.— E você sabe do que se trata?— Nunca conseguimos descobrir. Tudo o que sabemos é que se refere aos primeiros tempos do cristianismo.Josh levantou-se de novo e foi até a janela, organizando os pensamentos ao mesmo tempo em que observava a correria de todos os dias na rua lá embaixo. Aparentemente, era como qualquer outra cidade, cheia de gente comum vivendo suas vidas comuns. Mas Josh sabia que

essa aparência podia ser enganadora. Relembrou a descoberta que fizera algumas horas atrás. Deveria compartilhar a nova informação com Aaron? Trabalhar com ele seria uma ajuda ou um estorvo? Josh não sabia ao certo, mas sabia também que havia enormes riscos à tentativa de seguir em frente sozinho.— Acho que descobri algo - disse, cautelosamente. Contou então a Aaron que vigiara a igreja do Santo Sepulcro, falou sobre o homem com o boné dos Yankees e sobre a descoberta da Espada de Deus.Aaron ficou paralisado enquanto Josh contava sua história. No final, balançou a cabeça em sinal de agradecimento.— Você é melhor detetive do que eu imaginava.— E então, o que fazemos agora?Aaron levantou-se.— Temos que ir atrás deles. Não saia daqui enquanto não tiver notícias minhas. Vou organizar uma expedição para hoje à noite.

CAPÍTULO 51

SOB UMA IGREJA VELHA E ABANDONADA PERTO DO MAR DA GALILÉIA, a uns cem quilômetros ao norte de Jerusalém, o Mestre aguardava um de seus agentes. Não gostava que o fizessem esperar. Caminhava de um lado para outro no velho piso, pressionando as têmporas para controlar a ira crescente. Mas quando ouviu o homem se aproximando colocou

rapidamente a máscara, escondendo as emoções sob a cabeça de serpente.O agente finalmente chegou à sombria catacumba. Fez uma reverência e o Mestre gesticulou para que se sentasse em um dos bancos de pedra, diante de uma caverna na parede.— Faça seu relatório.O agente contorceu-se e sentou-se confortavelmente na superfície fria e dura do banco.— Nada está acontecendo na IAA. Creio que mudaram o pergaminho para outro local.— Tem alguma idéia para onde?— Ninguém com quem falei parece saber.O Mestre pensou por um momento, andando novamente para trás e para a frente.— Alguém suspeita que você esteja trabalhando para nós?O agente sacudiu a cabeça.— Não creio que alguém lá faça a mínima idéia.— Ótimo. Você se saiu bem.O agente pareceu satisfeito com o elogio. Depois seus olhos voltaram-se para o chão.— Mestre, posso lhe perguntar por que deseja o pergaminho?O Mestre ficou em silêncio por um segundo, brincando com a idéia.— Há muita coisa que você não sabe a respeito do nosso grupo. Se eu lhe contasse, seria...

digamos assim, contra o seu melhor interesse compartilhar a informação com alguém.— Mestre, juro que não vou contar a ninguém.— Nossa linhagem remonta a quase dois mil anos atrás. Durante todo esse tempo houve uma longa sucessão de Mestres. Tenho a honra de ocupar a posição agora e de incentivar sua tradição. Temos um segredo sagrado, uma chave espiritual que apenas eu sou capaz de compreender. Virá o dia em que compartilharei este segredo com o próximo Mestre, que então tomará meu lugar como mantenedor da verdade.O agente interrompeu entusiasticamente.— O que é que tem o segredo a ver com o pergaminho?— Jamais me interrompa - advertiu o Mestre, ameaçadoramente.O agente encolheu-se no úmido banco de pedra.— Perdoe-me, Mestre. Perdoe a este seu humilde servente. Eu jamais o ofenderia e tampouco poria em perigo minha chance de me tornar um Guardião.— Você será recompensado pelos seus serviços muito em breve - disse o Mestre, que ressaltou suas palavras balançando a cabeça afirmativamente. - É com prazer que compartilho isto com você agora. Parte de nossa doutrina, de nosso texto sagrado, alude a um documento escrito por Nosso Deus e Salvador, Jesus Cristo. De acordo com a profecia, quando este documento for encontrado validará nossos ensinamentos e o segredo que me foi confiado. Nesse dia, o

equilíbrio do poder começará a ser alterado e a missão que esperamos centenas de anos para realizar será posta em andamento.— Então por que o senhor ficou tão perturbado quando lhe informei dos detalhes das inscrições do manuscrito?— Porque as palavras do seu manuscrito são sacrílegas. Não se trata do documento sagrado da profecia e sim de uma falsificação sórdida.— Então por que o senhor ainda o quer?O Mestre fechou a cara. Seu agente estava fazendo perguntas demais. Ainda assim, o Mestre se orgulhava da integridade de suas convicções e nenhum mal poderia advir se contasse a verdade.— Porque se vier a ser publicado, a mensagem do falso manuscrito poderá causar dano irreparável à nossa causa. Mesmo que seja revelada a fraude, sua mera publicação, mesmo que por curiosidade, poderia plantar a semente da dúvida em nossos membros mais fracos. Queremos o pergaminho para destruí-lo.O agente aquiesceu.— Eu entendo. Muito obrigado, Mestre, por me dar a honra de sua confiança. Mas agora será que o senhor não pode me dizer quando me tornarei um Guardião?O Mestre enfiou lentamente a mão por dentro do longo manto, como se estivesse se coçando. Queria desfrutar daquele momento.— Pode ser que você nunca venha a ser um Guardião - disse, com a voz carregada de desdém. - Mesmo que você tenha sido muito útil, ainda

assim você continua sendo judeu, degenerado pelo próprio sangue.O agente pôs-se de pé.— Mas Mestre, eu não lhe servi bem e fiz tudo o que me pediu?— Serviu - respondeu o Mestre. - Do mesmo modo que foi bem pago pelos seus serviços.— Minha lealdade não está à venda - retorquiu o agente, magoado com a insinuação. — Odeio os judeus tanto quanto o senhor. Não fosse por eles e meu pai não teria morrido durante a invasão do Líbano. Eu servi ao senhor por respeito e devoção à nossa causa.— Nunca foi a sua causa - contrapôs o Mestre. - Seus pais de sangue determinaram seu destino.— Mas Mestre, tenho sido leal. Sacrifiquei tudo pelo senhor, mesmo que isso significasse trair meus amigos e colegas.— É verdade - disse o Mestre com um sorriso sinistro -, e por isso terá sua recompensa final. Você amou profundamente seu finado pai, não amou? Como seus serviços não são mais necessários, vou despachar você ao encontro dele.Com um gesto fácil, como se estivesse se livrando de uma mosca incômoda, o Mestre puxou a espada de sob o manto e decapitou o informante, Jonathan.— Guardas! - chamou, e dois de seus seguidores apareceram no pórtico da câmara do Mestre. Ele lançou um olhar fulminante para o corpo e depois se voltou para os homens.— Levem esta carcaça daqui e incinerem.

Capítulo 52

A VIGIA DA PORTA DE AÇO FOI FECHADA E DANIELLE VIU-SE FINALMENTE sozinha - pelo menos por ora. Exausta, foi se deitar no catre de baixa altura encostado na parede de rocha da sua cela. Uma cama de pedras seria mais confortável do que isto, pensou ela. Pensou em se deitar no chão, imaginando que pudesse ser mais confortável. Mas o chão era imundo; com o quê, ela nem queria saber.Tinha que dar o fora dali, mas não sabia sequer quantos seqüestradores eram, e muito menos onde estava presa. Precisava de um plano.O olhar de Danielle perdeu-se no teto enquanto ela vasculhava a mente atrás de um jeito para fugir. Uma coisa era certa - teria que confiar nos recursos de que dispunha, e naquela hora tudo com que podia contar eram seu cérebro e seu corpo. Há muito tempo sabia como usar seu poder de sedução para conseguir o que desejava, mas agora a idéia fez com que parasse para pensar. Ainda assim, podia ser a única chance de escapar com vida.Já sabia que seus captores eram sexualmente inibidos. Não há chuveiro aqui na cela, mas aposto como devem ter em algum lugar. Talvez a levassem lá, se achassem que sairiam ganhando com isto.Tratava-se de um plano arriscado. Alu fora claramente atingido e, por isso mesmo, fácil de manipular. Mas ela brincara apenas com suas

emoções, e, mesmo que tivesse chegado perto de estuprá-la, Danielle sabia o que estava fazendo. Se intencionalmente excitasse aqueles homens, as conseqüências poderiam ser devastadoras. A única esperança que tinha era no que ouvira um de seus captores dizer para o outro - que nenhum mal poderia ser feito a ela antes que o Mestre a visse. Embora não ansiasse nem um pouco por tal encontro, era provável que lhe assegurasse mais algum tempo.Pouco depois ouviu o barulho da vigia da porta sendo aberta. Correu para perto e apertou o rosto contra o pequeno orifício, suplicando para os dois guardas do outro lado.- Por favor - disse, caprichando na sua melhor voz de dama em perigo -, é tão sujo aqui dentro. Posso pelo menos tomar um banho de chuveiro?Não pareceu funcionar, porque a vigia foi fechada e Danielle ficou privada da única visão que tinha do mundo exterior.Depois de cerca de uma hora, a porta de aço abriu-se de novo. Desta vez dois homens vestidos de preto fizeram um gesto mandando que ela os seguisse. Apenas os olhos deles eram visíveis por trás dos véus que cobriam seus rostos. No corredor, outros dois homens esperavam por eles vestidos do mesmo modo.Era evidente que não pensavam que fosse necessário um efetivo muito grande para contê-la. Os guardas estavam ali para alguma outra função. Danielle sentiu que tremia, mas teve que lembrar a si própria o motivo pelo qual estava fazendo

aquilo. Além disso, podia ser que conseguisse estimular alguma dissensão entre as fileiras deles.Danielle seguiu os quatro homens no corredor estreito, que parecia ter mais celas trancadas em ambos os lados. Até que finalmente chegaram a uma porta grande e larga. Os guardas apontaram para que ela entrasse. Era um banheiro enorme com seis chuveiros grandes.De repente ela entrou em pânico, lembrando-se das narrativas horríveis que lera a respeito do Holocausto. Mas chegara tão longe e se quisesse ter um mínimo de chance teria que manter-se cal-ma. Deixou cair o roupão e, ao ficar totalmente nua, foi alvo dos olhares lascivos dos guardas. Respirando fundo para ver se conseguia manter a compostura, ela começou a se ensaboar. Tentou convencer-se de que tudo aquilo fazia parte do seu plano e que, na verdade, estava com a mão ganhadora. Mas quando olhou de novo na direção da porta viu que os quatro homens iniciais tinha sido reforçados por outros seis, e, mesmo que estivesse de costas para eles, podia sentir a quentura ameaçadora dos seus olhares.O sabonete escorregou-lhe das mãos e veio a cair perto dos seus pés. Pela força do hábito, Danielle inclinou-se para apanhá-lo, sem se dar conta a princípio do que fizera. Esforçou-se ao máximo para não parecer provocativa, mas a queda acidental do sabonete foi tudo que os homens precisavam ver. Um rápido olhar confirmou seus piores receios. Pelo menos seis dos homens tentavam esconder as ereções por baixo dos

mantos. A violência da luxúria em seus olhos fez com que ela se retraísse e conseguisse se recom-por, pegando a toalha que tinham lhe dado e se dedicando à tarefa de enxugar-se.- Podem passar o manto agora? - perguntou ela, a voz trêmula com a combinação exata de desamparo e insinuação para manter viva a farsa. Três dos seus captores correram para pegar a delicada peça de roupa. Danielle agradeceu e vestiu-se rapidamente, desejando que o material não fosse tão transparente. Os próximos minutos seriam os mais arriscados.Quando ela entrou no corredor, a tensão subitamente saiu do controle e seus medos foram concretizados. Antes que soubesse o que estava acontecendo, diversos homens se jogaram para cima dela, segurando-a e arrancando seu manto. Os homens supostamente santos começaram a agarrá-la na suas partes mais íntimas, num desafio carnal às ordens que deveriam obedecer.Danielle se arriscara e perdera. E para quê? O que havia conseguido? O que tinha feito? Não tinha mais influência agora do que antes.Justamente nesta hora uma voz estrondosa soou no corredor.- O que vocês estão fazendo?Os guardas libertaram-na imediatamente, agachados no chão como criancinhas. Danielle também caiu de joelhos.- Vocês se atreveram a me desafiar e agora serão punidos!

Os olhos de Danielle examinaram rapidamente o corredor mal iluminado, procurando o homem atrás da voz, mas ele permaneceu invisível.- Levem-na de volta para a cela imediatamente - ele gritou, e seus lacaios correram para cumprir a ordem.Em segurança - pelo menos por ora - Danielle percebeu que, embora seu esquema não tivesse funcionado de acordo com o plano, ganhara algumas informações valiosas. Agora sabia em que tipo de lugar estava presa e sabia também que havia pelo menos onze seqüestradores no esconderijo.Ironicamente, o chefe deles fora quem a salvara. Isso significava duas coisas: ou ele não tencionava fazer-lhe mal... ou tinha outros planos para ela, talvez ainda mais sádicos. Mas sua estratégia funcionara melhor do que havia esperado. Eles podiam ter se beneficiado com umas poucas alegrias ilícitas, mas pelo menos oito de seus captores estavam prestes a sofrer muito mais do que ela.Danielle permitiu-se um breve momento de satisfação. Foi fugaz, contudo, pois sabia que seu próximo encontro quase que certamente seria com o Mestre em pessoa.

CAPÍTULO 53

JOSH E AARON ESTAVAM UM AO LADO DO OUTRO NO TELHADO QUE dava para a igreja do Santo Sepulcro. O homem tem uma tal capacidade para a majestade e a reverência, pensou Josh, olhos fixos na magnífica estrutura. Por que essa capacidade sempre tem que ser pervertida?- Bela noite para uma incursão - comentou Aaron em voz baixa, trazendo Josh de volta para o momento.- Você participou de muitas?- Um número demasiado grande. Mas geralmente o alvo eram terroristas islâmicos, não cristãos. Estamos pisando em território novo aqui. Isto é, se as suas deduções forem corretas.Josh não sabia ao certo como responder, e por isto nada disse. Estariam certas suas deduções? Tinham sido baseadas tão-somente em instinto e especulações — o que sentira ao ver o boné dos Yankees e o que vira na loja A Espada de Deus. Quanto de sua especulação se devera ao desejo desesperado de salvar Danielle? E até que ponto o que considerava como instinto não fora apenas obra de sua mente ansiosa?- Nós tínhamos conhecimento da loja na Via Dolorosa - continuou Aaron, proporcionando a Josh um alívio momentâneo. - Ela faz parte do Bairro Cristão desde que começamos a vigiar aquela área. Observamos muitos religiosos entrarem e levarem um considerável espaço de tempo para sair. A princípio presumimos que estivessem apenas comprando imagens religiosas. Mais tarde,

concluímos que se tratava de um lugar de reunião usado por alguma organização inofensiva de religiosos. Nunca violavam a lei. Mas não foi senão quando você telefonou e nossa equipe de vi-gilância verificou sua informação que nós nos sentimos razoavelmente seguros de que aquilo lá era o esconderijo deles. Com um pouco de sorte, teremos hoje o fim dos problemas que causaram.- Quando vai começar a incursão?- Quando estiver bastante escuro.- Você não acha que já está bastante escuro? Não tem praticamente mais ninguém nas ruas.Aaron olhou para o céu como se quisesse determinar se aquela era a escuridão desejada. Depois pegou seu walkie-talkie.- Prontos? - perguntou no bocal do aparelho.- Estamos esperando que o nosso homem apareça do lado de fora da loja para nos dar o sinal - disse a voz no outro lado, por entre os estalos da estática.Aaron acenou com a cabeça para Josh, num gesto de compreensão.- Esperar é sempre a pior parte.Josh só queria entrar logo em ação. Será que a mulher a quem amava estava em algum perigo terrível apenas a alguns metros de distância? E se não chegassem lá a tempo?Por fim, Aaron deu o sinal. Como um maestro regendo uma orquestra, ele pôs seus homens em movimento com um gesto amplo, e o ataque teve início. Policiais e seguranças fortemente armados puseram abaixo a porta da frente da loja e Josh os

seguiu quando deu para passar por entre os escombros. Todos se dirigiram rapidamente para os fundos da loja e arrancaram a cortina. Cerca de um metro atrás dela havia uma parede de pedra. Seria realmente um beco sem saída? Josh sabia o que tinha visto. Tinha certeza de que havia mais alguma coisa ali atrás.Após um exame detalhado, a polícia descobriu a alavanca que abria a parede e desceram uma escada de alvenaria em espiral. Quando chegaram na parte mais baixa, viram-se em um ambiente de total escuridão. Quando a polícia acendeu as lanternas, Josh viu que se encontravam em um salão amplo com bancos de pedra, silencioso como um cemitério à meia-noite.Atravessaram o salão cuidadosamente e abriram uma velha porta de madeira que dava para um corredor comprido. Nele, Josh viu diversas portas que pareciam ser de celas de uma prisão.Examinaram cada centímetro daquele espaço, mas nada encontraram. Finalmente um dos policiais gritou do fim do corredor.- Aqui! Tem outra porta!O resto da força de ataque deslocou-se. Levantaram o trinco e abriram a porta, que dava para um túnel grande que, por sua vez, se subdividia em diversos outros menores. Parecia não haver fim para a miríade de túneis secretos e passagens que jaziam sob a Cidade Antiga.- Parece que chegamos atrasados - disse Aaron, sua voz uma mistura de desapontamento com frustração.

O desapontamento de Josh foi exponencialmente maior.- Eles sabiam que estávamos vindo.- O homem que você seguiu provavelmente deu a dica - disse Aaron. - Vamos dar uma olhada, assim mesmo. Eles estavam com pressa, talvez tenham sido descuidados.Ele e Josh atravessaram o portal e entraram no túnel. Era impossível saber que caminho os Guardiões tinham tomado.Aaron sacudiu a cabeça lentamente.- Nós os observamos desde que você ligou. Vimos dois suspeitos entrarem no esconderijo, mas não saíram. Agora sei por quê. Usaram o túnel para escapar do nosso ataque.- Isso foi horas atrás. Estive aqui por volta das três e meia da tarde, quando os fanáticos tentaram me atrair para uma armadilha. Quando eles viram que não os segui, perceberam que eu conhecia a localização do esconderijo e imaginaram que eu voltaria. Pela aparência das coisas, contudo, a impressão que dá é que a maioria saiu antes do início da tarde. Eu gostaria que seus homens verificassem os cômodos, particularmente os que parecem ser celas, procurando sinal de ocupação recente.- Estamos fazendo muito mais. Estamos interrogando todos os empregados da loja da frente. Mandamos trazer um gerador para iluminar cada centímetro quadrado disto aqui. Tenho certeza de que nossos investigadores encontrarão pistas importantes.

A polícia espalhou-se e começou a vasculhar os túneis. Aaron e Josh seguiram pela ramificação principal, detendo-se à entrada de cada uma das muitas passagens menores.- Tenho um palpite, Aaron. Vamos seguir por aqui e ver no que vai dar.Aaron dirigiu um olhar de espanto a Josh, mas seguiu-o por cerca de duzentos metros até que pararam de repente. Uma enorme laje de pedra tinha sido rolada para barrar o caminho do que parecia ser outra porta. Mas não parecia haver marcas na poeira a não ser as das próprias pegadas deles. Quem quer que tivesse bloqueado aquele túnel fizera isso muitos anos atrás.

Capítulo 54

VISTO DE FORA, O EDIFÍCIO COMERCIAL NÃO PARECIA DIFERENTE DE qualquer outro de Nazaré. Um prédio comum, sem nada que o distinguisse, com uma modesta loja, ao nível da rua, que produzia um lucro razoável vendendo panfletos e mapas à corrente constante de turistas que vinha visitar a basílica e o mar da Galiléia, a uma pequena distância dali. Não tinha, contudo, nada de comum.Aquele prédio servia de refúgio aos Guardiões havia mais de cinqüenta anos. Tinha cerca de três mil metros quadrados de área construída acima do solo, onde não só funcionava uma respeitável empresa, como também servia de fachada para o quartel-general internacional dos Guardiões.

Embaixo, porém... era onde as coisas eram realmente interessantes. O bunker subterrâneo - equipado para resistir inclusive a ataques nucleares - abrangia toda a extensão da estrutura, consistindo de doze aposentos, sendo que o maior deles, a sala de reuniões, tinha mais de duzentos metros quadrados de área, com 75 lugares sentados. Ao contrário do esconderijo de Jerusalém, com seus velhos bancos de pedra, tinha todos os confortos de um teatro moderno, inclusive com inclinação do piso e um elaborado sistema de iluminação que conferia uma visão ainda mais dramática ao verdadeiro ponto focal da sala: o altar elevado, elaboradamente entalhado e revestido de ouro puro.Era ali que o Mestre presidia seu rebanho e onde os rituais mais sagrados eram realizados. Mas agora a sala de reuniões estava vazia, exceto pelo Mestre propriamente dito. Ele estava sentado no palco, iluminado pelo clarão vermelho de uma lâmpada, aguardando o entretenimento da noite. Divertia-se pensando que se o idiota do Alu não tivesse capturado de novo a mulher, ela não estaria ali. Claro, ela havia atendido a uma finalidade no papel de refém; mas agora que os arqueólogos haviam descoberto, por acaso, o esconderijo de Jerusalém e transtornado seus planos, este papel passara a ser inútil. A esta altura dos acontecimentos, o Mestre simplesmente antecipava com ansiedade a distração que teria antes de matá-la.

A refém entrou escoltada na sala de reuniões, coberta por um manto leve que expunha cada curva do seu corpo.- Removam a veste e coloquem-na no altar - ordenou o Mestre. - Mas amarrem frouxamente - acrescentou, o rancor gotejando das palavras. - Vou me deleitar vendo-a lutar um pouco.Depois de cumprirem as ordens do Mestre, seus seguidores fizeram uma reverência e se afastaram. O interrogatório não teria testemunhas.O Mestre, com sua máscara de serpente e o manto adequado, observou a saída de seus subordinados e voltou a atenção para a mulher. Nunca prestara muita atenção nela, mas agora, vendo-a deitada à sua frente, sua paixão começou a levantar.- Você é mesmo linda como dizem - comentou ele. - Vejo agora o que Alu achou tão atraente.- Alu era psicótico - Danielle riu, sua voz surpreendentemente arrogante, levando-se em conta a situação em que se encontrava.O Mestre aproximou-se dela, que recuou.- Você só vai falar quando eu mandar, está me entendendo?Danielle permaneceu em silêncio.O Mestre inspecionou o corpo dela como um mercador de escravos, da cabeça às pontas dos dedos dos pés. A judia o excitava.- Você é mesmo sedutora - ele provocou. - Os Guardiões, é claro, são todos celibatários. Apenas um pode fazer amor a uma mulher. Por sorte, sou eu.

O Mestre estudou o rosto de Danielle, acariciando-a, enquanto ela encarava desafiadoramente sua máscara. Os olhos dela, seu cabelo, o ângulo dos seus ossos malares e até mesmo a voz o lembra-vam alguém que ele conhecera muito tempo atrás. Alguém igualmente encantadora. Como não vira antes? Isso ia ser ainda mais prazeroso do que imaginara.Debruçou-se sobre o corpo dela, envolvendo com a mão em concha o seio direito e roçando levemente o pequeno sinal de nascença embaixo do mamilo. De repente ficou tenso. Não podia ser.- Quando você nasceu? - indagou ele, recuando.- No dia 28 de maio. Tenho vinte e sete anos de idade. O sangue do Mestre congelou.- Onde está sua mãe?- Ela morreu quando eu tinha cinco anos - respondeu Danielle, a voz traduzindo mais confusão do que medo.- Você foi adotada?- Acho que não. Se fui, meus pais nunca me disseram nada. O Mestre contemplou Danielle, decidindo o que fazer com ela. Sua cabeça girou loucamente. Ele procurou um sinal que o orientasse.Até que por fim foi até um telefone e gritou meia dúzia de ordens a seus acólitos.- Levem-na de volta para a cela e dêem a ela comida de verdade, não apenas pão e água. E vistam-na com algo menos revelador.Os Guardiões apareceram rapidamente para pegar Danielle. Depois que a libertaram e levaram

embora, o Mestre ficou sozinho na sala de reuniões, desconcertado.Por que o destino lhe dera uma mão tão perversa?

CAPÍTULO 55

BEM NO FUNDO DA REDE DE TÚNEIS QUE CORRIA POR BAIXO DA CIDADE antiga, Josh e Aaron se detiveram, intrigados com a laje que bloqueava o caminho. Josh notou a existência de uma pequena abertura do lado direito da pedra, na parte junto do chão, mas parecia muito pequena para permitir que alguém passasse por ali rastejando.- Os Guardiões possivelmente passaram por aqui - disse Aaron. - Esta laje não é mexida há anos, talvez séculos.Josh comprimiu a pedra com as mãos, tentando inutilmente deslocá-la. Mas um sentimento estranho o invadiu, uma espécie de certeza existente em suas células de que havia algo de muito especial do outro lado. Uma voz no fundo de sua consciência murmurou: Este é o lugar. O que significaria? Teria alguma coisa a ver com os Guardiões? Josh procurou uma resposta em sua alma. Não. A mensagem tinha outro significado.- Aaron - disse Josh baixinho -, não percamos mais tempo aqui. Precisamos nos concentrar em achar a rota de fuga dos Guardiões. Não é aqui.Aaron o fitou com um olhar intrigado e, após algum tempo, assentiu. Já iam a meio caminho do

túnel no sentido contrário quando encontraram três seguranças carregando picaretas e pés-de-cabra.Josh levantou a mão espalmada para detê-los.- Podem voltar. Mudamos os planos. Tiveram sorte na procura da rota de fuga?- Não - respondeu um dos homens -, mas encontramos isto.Ele entregou a Aaron o que parecia um pequeno livro de orações, provavelmente deixado para trás acidentalmente na pressa dos Guardiões de fugir.- Deixe-me ver - pediu Josh. Abriu a capa de couro surrada e viu que era a Bíblia - só que todo o Velho Testamento e a maior parte do Novo estavam faltando. O livro continha apenas as epístolas de Paulo e uma parte pequena do evangelho de Lucas.- Olhe aqui! - exclamou um policial todo empolgado, cuja voz vinha de algum ponto mais no fundo. - Tem outra saída.Josh, Aaron e os demais recuaram pelo túnel principal e depois seguiram as vozes até que deram em outra passagem estreita, que desviava à esquerda em uma segunda escadaria. No seu topo, havia outra porta de madeira grossa, que por sua vez dava não em um beco sem saída, mas sim em uma capela pequena e conhecida. Estavam na igreja do Santo Sepulcro.- É fácil ver por que os Guardiões não chamavam atenção - disse Aaron, aludindo ao traje eclesiástico dos fanáticos. - Mas como fariam para sair com seus reféns sem serem notados?

- Quem sabe eles não ficassem escondidos aqui? - sugeriu Josh.- Pode ser também que já tivessem sido mortos - assim que pronunciou as palavras, Aaron percebeu o que elas significariam para Josh. - Sei que Danielle é importante para você - disse ele, pondo a mão no ombro de Josh -, e detestaria ter que lhe dar más notícias... mas ficaria surpreso se ela ainda estivesse viva.O coração de Josh lhe disse que Aaron estava enganado.Um dos seguranças adiantou-se e comunicou que estavam com algumas empregadas da loja reunidas, prontas para serem interrogadas. Aaron e Josh refizeram seus passos até lá, onde encontraram três mulheres apavoradas detidas por dois guardas de segurança.Aaron se dirigiu às três ao mesmo tempo, sem perder tempo com amenidades.- O que é que vocês sabem a respeito dos religiosos que se reúnem no subterrâneo aqui embaixo?- Não sei de nada - disse uma das mulheres, a voz trêmula. - Eu via os santos homens entrarem e saírem, e, como eles são os donos da loja, achava que tinham o direito de estar aqui. Desapareciam atrás da cortina e eu não fazia perguntas. Às vezes eu os via saírem e às vezes não. Nunca falavam com qualquer uma de nós.- Alguma de vocês já esteve lá embaixo? - indagou Aaron.

- Somos proibidas de ir além das cortinas - disse a mais velha das mulheres. — Disseram para nós que apenas os sacerdotes eram autorizados.- Vocês notaram se alguém os acompanhou nos últimos tempos?A mais jovem levantou a cabeça.- Eu estava trabalhando no início da semana e me lembro de que trouxeram alguém que parecia doente. Não tenho certeza, mas a impressão que tive foi de que os religiosos iam ajudá-lo.Josh intrometeu-se no interrogatório.- Vocês os viram trazer outra pessoa, uma mulher, talvez?- Há muitas mulheres que vêm aqui, mas são todas compradoras.As outras empregadas da loja balançaram a cabeça, concordando.Aaron fez mais algumas perguntas, mas ficou claro que as mulheres nada sabiam do que acontecia embaixo de onde trabalhavam. Após algum tempo, mandou-as embora.A polícia continuou seu trabalho, colhendo evidências e interrogando os proprietários das lojas vizinhas. Quando o telefone tocou, Josh atendeu, certo de que ouviria a voz de Giuseppe.- Quero o pergaminho - exigiu uma voz grave. - Sem truques, falsificações e emboscadas. Vemos cada movimento que vocês fazem, como já devem saber a esta altura, mas estou oferecendo uma última chance. Nós ainda temos os reféns. Na segunda-feira faremos uma troca. Vocês nos dão o pergaminho e nós lhes entregamos um de seus

amigos. Em mais vinte e quatro horas, se esti-vermos satisfeitos com o que tivermos recebido, outro refém será entregue. Quanto ao terceiro, vá à igreja de Santa Maria Madalena no monte das Oliveiras. Deixei para você um pequeno prêmio de consolação debaixo do décimo-terceiro banco. Faça o que eu lhe disse e receberá notícias nossas amanhã com a localização da nossa troca.Ele desligou.

CAPÍTULO 56

HAVIA MUITA COISA A SER FEITA, MAS JOSH SABIA QUE SEU CORPO O trairia se não conseguisse pelo menos dormir um pouco. Deitou- se planejando apenas um rápido cochilo e ao invés disso caiu num sono profundo e sem sonhos. Poucas horas mais tarde, foi acorda-do pelo som da campainha.Aaron entrou no quarto rapidamente, sem se importar com a formalidade de esperar convite.- Nossos homens recuperaram o pacote na igreja.- De que se tratava? - perguntou Josh, ainda meio tonto.Aaron exibiu um saquinho de plástico cheio de cinzas.- De quem...- Quase impossível saber - interpôs Aaron, muito sério.O coração de Josh se angustiou. Outra pessoa fora morta por causa do pergaminho — mas ele se

recusava a crer que fosse Da- nielle. No entanto, havia pouco consolo para ele, já que sabia que as cinzas deviam pertencer ou a padre André ou a Alon.- Veio com um bilhete - disse Aaron, passando o bilhete para Josh.Cinzas às cinzas... pó ao pó... Eu fiz a cortesia de lhe mandar um pacote mais compacto desta vez. Da próxima, contudo, posso não ser tão gentil.O tempo das brincadeiras acabou. Siga minhas instruções à risca ou os outros reféns sofrerão mortes bem menos agradáveis. O pergaminho será meu, de um jeito ou de outro; em que condições, depende de você.Josh olhou para Aaron, enojado.- Não podemos acreditar numa só palavra que esse sujeito diz.- Sei disso. Lamentavelmente, não temos nenhum ponto a nosso favor se quisermos ter uma chance de resgatar os reféns com vida. Ele está com todos os trunfos.Josh sentia-se mais frustrado do que nunca. Os fanáticos continuavam a aumentar as apostas e ele não podia fazer nada para se contrapor às suas ações.- E ainda tem mais - prosseguiu Aaron. — Recebemos outro telefonema. Tinha a ver com as tais regras a que ele se refere nesse bilhete. Querem que você faça a entrega do pergaminho. Deixou bem claro que não aceitarão nenhuma outra pessoa.- Mais parece uma sentença de morte.

- A esta altura, não tenho idéia do que devo lhe dizer. Tudo o que sei é que ainda há duas vidas em jogo. Uma vez trocamos quatrocentos terroristas pelos corpos de três de nossos soldados. Mesmo os despojos da nossa gente são importantes para nós. Temos que encontrar um modo de resgatar os reféns.A mente de Josh girou. Um dos reféns era Danielle. Ele tinha certeza. Aaron estava certo. Precisavam encontrar um modo de resgatar quem quer que tivesse sido deixado para trás.- Há arqueólogos na IAA em que você confie?- A maioria deles é digna de confiança.- Escolha dois deles que sejam os mais competentes na detecção de artefatos falsos e mande que se dirijam à IAA o mais rápido possível. Não diga que o jarro e o pergaminho falsos são imitações. Peça que dêem a opinião deles no que concerne à autenticidade. Se passar no exame deles, há uma boa chance de que possamos tapear os Guardiões. Este será o primeiro passo.- E qual será o passo dois?- Preciso de um laptop, já que o meu foi roubado. Também quero os dados biográficos, o máximo que conseguir, da equipe que está estudando o pergaminho, inclusive informações sobre o passado dos pais. Consegue fazer isso antes das oito da noite?- O que você está pensando em fazer?- Não vale a pena lhe contar, a menos que dê certo. De outra forma é apenas mais especulação... e chega de especulações.

Em menos de uma hora Aaron tinha mandado um novo laptop para o apartamento. Josh familiarizou-se com a máquina, entrou na Internet e foi trabalhar. Começou por digitar a palavra "ódio" em um mecanismo de busca e obteve o assombroso número de 13 milhões de resultados. Precisava estreitar a busca. A seguir, digitou "grupos de ódio", mas o número continuou alto, na base de dois milhões e meio de resultados. Tentou "Guardiões" e reduziu para 200 mil. Finalmente, quando digitou "grupos ódio judeus" e "Guardiões" juntos, o número caiu drasticamente. Empenhou-se nessa pesquisa durante cerca de uma hora e meia, sem encontrar outra coisa senão becos sem saída. Mas quando deu com um ícone de uma serpente enrolada em uma cruz, viu que tinha encontrado o que estava procurando. Clicou no endereço e foi levado a um site de baixo orçamento de um grupo auto-intitulado "Guardiões da Verdade."A página principal era um templo de ódio, cheia de mentiras estereotipadas e propaganda tendenciosa, com coisas tão sórdidas que validavam a doutrina cristã do pecado e do mal. Se Satã existisse, pensou Josh, seria um freqüentador regular daquela página. Poderia até mesmo ter escrito algum dos artigos.

OS GUARDIÕESOS ÚNICOS CRISTÃOS VERDADEIROS

Quer conhecer os verdadeiros segredos da Cristandade? Temos em nosso poder informações nunca reveladas e profecias de eventos que acontecerão. Temos membros espalhados por todo o mundo, mas para se associar a nós é preciso que você se cadastre. Após preencher o questionário e depois de verificar suas in-formações, entraremos em contato por e-mail. Nossos membros são do sexo masculino e devem estar dispostos a guardarem o celibato.Enquanto está visitando nosso site, nós o convida-mos a consultar alguns de nossos livros e artigos favoritos. Clique nos links para ler excertos.

Livros:OS protocolos dos sábios do Sião (escrito por um de nossos membros há mais de cento e vinte anos). Minha luta (Mein Kampf)

Artigos:A praga islâmicaA Iluminação budista é o caminho do inferno Quem é o verdadeiro povo escolhido: (Não é o povo judeu)Quem matou Kennedy e por quê? Por que os grupos cristãos ortodoxos interpretam erroneamente a Bíblia e jamais entrarão no céu?Por que o ódio é a parte mais importante do amorHolocausto, uma solução importante para o controle populacional

Os judeus e os muçulmanos são os filhos de Satã Iraque - um bom começo A Inquisição não foi longe o bastante Como os hindus perderam o borco e quando mor-rem, sua pira não será seu único fogo 5 papas que nós amamos 5 papas que arderão no inferno As cem pessoas que controlam o mundo e nos lideram no caminho da destruição moral Por que Hitler falhou O verdadeiro PauloPor que os ateus estão destruindo o mundo Por que Jesus não era kosher.

Links:Nenhum - o nosso é o único site em que a verdade é dita.

Bate-papo:Clique aqui para se comunicar conosco ou com os outros.Josh examinou detidamente o sítio, procurando indícios. Escaneou alguns dos artigos, mas a maioria era apenas o lixo tipicamente encontrado nos portais destinados a insuflar o ódio, cheios de textos lunáticos e juncado de erros de imprensa e falhas filosóficas. Aquilo simplesmente não combinava. Estavam lidando com um poderoso grupo de fanáticos altamente organizados e inteligentes, mas aquele site fazia com que parecessem palhaços delirantes.Já pensava em desistir. Lera tanto quanto poderia agüentar e sentia o sangue latejar nas têmporas.

À medida que sua raiva aumentava, Josh sentiu-se mergulhando na própria emoção que os Guardiões tanto prezavam - o ódio. Não permitiria que ele próprio acabasse contribuindo com a missão deles.Nesse ponto, localizou algo que capturou sua curiosidade. Havia diversos artigos escritos por alguém que se assinava O Mestre. Josh abriu o primeiro artigo, uma diatribe, e rapidamente des-cobriu que o tal Mestre era um sujeito que odiava indiscriminadamente. Odiava judeus, muçulmanos, protestantes e mesmo os católicos liberais. Mas era também calculista e articulado... o que lhe pareceu familiar. Josh procurou indícios no artigo, mas tudo o que pôde encontrar foram palavras peçonhentas e ideologia tendenciosa. Era evidente que o homem tinha câncer na alma, mas o que assustou Josh foi obviamente seu carisma e poder de persuasão. Impossível não se lembrar de Hitler e, pela primeira vez, ele percebeu contra o que se batia. Aquilo era bem maior que o amor que sentia por Danielle - algo que não acreditava possível, mas que agora o tornava disposto a sacrificar a vida por ela. Josh deu-se conta de que se não fossem detidos, os guardiões desencadeariam sua perversão pelo mundo, deixando nada senão cinzas no trajeto. Não podia permitir que isso acontecesse.Fechou os olhos e tentou relaxar. Não era capaz de racionalizar seu caminho por entre tantas dificuldades, e sabia que a meditação seria a melhor alternativa para acessar a sabedoria superior de que necessitava. Tentou visualizar a escadaria e contar os degraus descendentes como

tinha feito tantas vezes antes. Mas sua visão interior não estava funcionando. Via apenas escuridão e um facho de luz intermitente. Respirou fundo, concentrando-se na sensação gerada pelo ar quando passava pelas suas narinas, entrando e saindo. Continuou respirando assim por mais diversos minutos e logo conseguiu enxergar com mais clareza; não era um facho de luz afinal, e sim um cursor intermitente. Com a clareza súbita daquela percepção, Josh foi arrancado do seu estado meditativo e quando seus olhos se abriram, estavam focados diretamente no link de comunicação em tempo real que ficava na parte de baixo da tela do monitor.Podia ser tolice, mas Josh clicou no botão e a página começou a carregar. Era uma página comum de correspondência pela Internet, com centenas de mensagens e respostas. Josh concentrou-se em uma das mais recentes. De alguém que se chamava a si próprio de "Ossos".Estamos próximos de conseguir o item. Ainda estou em casa ansioso por notícias suas.Abaixo desta mensagem havia algo que parecia ser uma resposta, mas não era nada além de uma série de números.

5 22 13 19 26 26 12 10 20

Ao continuar a ler, Josh viu outras mensagens em códigos numéricos. Os Guardiões usavam seu site para se comunicar. Se pudesse quebrar o código, Josh poderia descobrir seus planos ou mesmo seu novo esconderijo.

Era outro quebra-cabeça para resolver, e depressa.

CAPÍTULO 57

DANIELLE ESTAVA NO QUARTO PEQUENO E SEM JANELAS QUE LHE SERvia de prisão. Suas condições tinham melhorado, mas uma coisa continuava absolutamente igual: estava trancada, sem ter como sair. Danielle fez a única coisa que parecia ajudá-la a resistir - pensou em Josh. Tinham passado tão pouco tempo juntos e, no entanto, Danielle sentia ter com ele uma ligação como jamais tivera com alguém. Reviveu os momentos que haviam passado juntos em sua mente, recriando cada detalhe de suas conversas, de suas caminhadas e do modo como fizeram amor. A única coisa que evitava pensar era na realidade óbvia de que o tempo deles juntos muito provavelmente terminara.Seu novo captor não era como os antigos. Danielle sabia que não seria capaz de enganar o Mestre e, com um truque, fazer com que a soltasse. Por mais desesperada que estivesse para reunir-se no-vamente a Josh, compreendia perfeitamente sua situação: ia morrer ali.Ela ouviu o tilintar de uma chave na fechadura e um guarda entrou na cela, interrompendo seus pensamentos. Você deve ter agradado ao Mestre — disse o homem mascarado. - Seu jantar hoje é mais que pão com água.

Danielle encarou o homem enorme. Seu olhar pareceu perturbá-lo. Qual é o seu nome? - ela arriscou, disposta a se agarrar a qualquer chance que aparecesse. Você não deve falar - disse o homem, a voz cheia de desprezo. - Eu poderia espancá-la por causa disso. O Mestre matará você se tocar em mim - retrucou Danielle, sem saber ao certo de onde vinha aquela bravata ou o que pretendia com ela.O guarda esbofeteou Danielle com força. Ela ficou atônita, tanto pela força do tapa quanto pelo fato de ele tê-la agredido. Levou a mão ao rosto. Não pense que é especial, sua prostituta. O Mestre gosta de brincar com suas vítimas. Se pensa que ele vai ser bonzinho com você, é uma louca.O homenzarrão aproximou-se dela ameaçadoramente e apertou-lhe o rosto entre os dedos da mão imensa. Talvez ele até me deixe brincar um pouco com você antes que morra.Alguma coisa se rompeu dentro de Danielle naquele instante. Não agüentava mais a humilhação e a dominação. Virou depressa a cabeça e mordeu a mão do homem. Ele urrou e deu um pulo para trás. Vai pagar por isso, sua vaca! - ele gritou, atingindo-a com um tapa muito mais forte que o primeiro. E aí não parou mais, foi batendo e batendo e batendo.

Em pouco tempo, Danielle deixou de sentir os golpes.— Pare imediatamente! - trovejou o Mestre ao entrar na câmara e encontrar o guarda espancando Danielle.Ele virou-se e se encolheu imediatamente. Ela me provocou, Mestre.O Mestre atirou o guarda de encontro à parede. Se foi este o caso, então você é provocado com demasiada facilidade. Talvez este serviço não seja adequado à sua pessoa. E provável que você precise de algo que requeira menos... raciocínio. Vou deixar uma coisa bem clara para você, se algum dia tocar nela de novo, vai experimentar o Inferno muito antes de eu enviá-lo para lá.O Mestre desviou o olhar para Danielle, que jazia ensangüentada no chão. Deixe-nos em paz e traga um enfermeiro aqui.O guarda saiu rapidamente e o Mestre ajoelhou-se para pegar a inconsciente Danielle nos braços. Procurou o pulso e quando conseguiu sentir, ajoelhou e limitou-se a ficar com ela no colo.Quando o enfermeiro retornou com uma maca, o Mestre a depositou cuidadosamente no leito, afastando uma mecha de cabelo da sua testa. Ele apontou para Danielle. - Se ela morrer, você morre também. Entende?O enfermeiro fez que sim, o sangue fugindo do seu rosto.

Capítulo 58

Aaron retornou ao apartamento de Josh mais tarde, naquela mesma noite, com uma grande pasta preta. Trouxe-lhe as informações que pediu - anunciou, quando a colocou em cima da mesa da cozinha e abriu os fechos. Estava cheia de documentos e arquivos. Foi rápido - disse Josh. - Estou impressionado. Você deu uma olhada nesse material?Aaron sacudiu a cabeça. Eu não, acabo de receber. Pode ficar mais um pouco para examinarmos juntos? Se você tiver café, eu topo. Acabo de fazer um bule - disse Josh, grato pela companhia. - Estou com a impressão de que ficarei acordado a noite toda.Josh serviu duas xícaras e passou uma para Aaron.Durante toda a hora seguinte os dois homens estudaram os arquivos que Aaron trouxera. Após verificar um número incontável de páginas, a intuição de Josh funcionou de novo. Há informações interessantes aqui - disse ele, esfregando os olhos. É preciso investigar todos, pensou. - Mas preciso checar o passado de mais algumas pessoas. Quero a genealogia de padre André, Alon e pais, Moshe e a falecida esposa, e Danielle.Josh tinha um palpite a respeito do relacionamento de Moshe com Danielle - algo que podia ter profundas implicações com tudo que estava acontecendo.

Em quanto tempo você pode me dar isso? Que tal agora? - respondeu Aaron, abrindo o celular e ligando para seu escritório. Pediu que entrassem em contato com o centro de pesquisa genealógica do museu Bet Hatfutzot em Tel Aviv, onde podem ser encontrados dados de mais de 3 mil comunidades judaicas. Depois Aaron ligou para outra agência que tinha os registros de todas as adoções feitas em Israel desde 1948. Estou tentando também encontrar informações sobre a loja crista de suvenires na Cidade Antiga - disse a Josh. - Minha fonte não tem registros anteriores a 1948. Enquanto isso, a mãe de Jonathan telefonou e disse que não o vê desde que ele saiu de casa ontem de manhã. Parece que ele sempre liga para ela a fim de dar notícias. Antes de vir para cá, minha agência checou com a polícia local e hospitais, mas ninguém sabia de seu paradeiro. Esqueci de acrescentar o nome dele à lista que lhe dei. Não se preocupe, eu já o tinha incluído.Josh voltou-se novamente para a papelada que Aaron trouxera. Aaron, não penso que devêssemos fazer a troca de reféns; é um fracasso garantido. Precisamos formular um outro plano. Estou começando a pensar do mesmo modo. Quando recebi o laptop que você mandou, entrei na Web para ver se achava pistas ou informações sobre os Guardiões. Acho que encontrei a verdadeira página deles. E eles a estão

usando para trocar informações na forma de código numérico. Se eu puder quebrar esse código, isso talvez nos leve a algum lugar. Você sabe alguma coisa sobre decifrar códigos? - perguntou Aaron, claramente em dúvida. Até certo ponto, eu ganho a vida decifrando códigos - assegurou Josh. Assim mesmo, a minha agência tem alguns dos melhores decifradores de códigos do mundo.Por alguma razão que não estava clara para ele, Josh ainda sentia alguma relutância em compartilhar tudo com Aaron. Se eu não tiver conseguido nada até as oito horas da manhã de amanhã, você pode dar para eles.Aaron levantou-se. Vejo você então amanhã às oito.Obrigado pelo voto de confiança, pensou Josh, observando Aaron sair. Logo voltou sua atenção novamente para os papéis que ele trouxera. A informação ali contida podia ser útil. No entanto, alguma coisa lhe dizia que a informação codificada podia render mais ainda.Hora de voltar ao trabalho.Josh trabalhou até tarde da noite a fim de decifrar a mensagem do Guardião para "Ossos". Estudou as séries de números, tentando estabelecer a relação de uns com outros por intermédio de um código alfabético simples: A= 1, B=2, C=3 e assim por diante. Como era de se esperar, esta abordagem não o levou a parte alguma.

Estariam os números vinculados a um idioma estrangeiro? Será que a mensagem era em hebraico? O alfabeto hebraico só tinha vinte e duas letras. O latim clássico era outra possibilidade, com suas vinte e três letras. E se as letras fossem revertidas, com o A sendo igual a 2 6 e o Z a 1 ? Tentou isso, e para seu assombro, funcionou.

V E N H A A O Q G 5 22 13 19 26 26 12 10 20

Fácil demais. Seria possível que a idéia de código dos Guardiões fosse assim tão simplória? Certamente que ele decifrara a mensagem. Mas estaria ela ali por alguma razão que ele não compreendia?Foi ver outras mensagens, na esperança de que dessem outros indícios. Venha ao QG não significava muito por si só, especialmente porque ele não tinha idéia de onde ficava esse quartel-ge-neral. No entanto, nenhuma das outras era transmitida do mesmo modo. Os códigos eram muito mais complexos e duas horas mais de tentativas não produziram qualquer resultado.Josh retornou para a página principal do site. O que mais podia descobrir ali? Passou o mouse por cima da guia História na barra de navegação. Era capaz de jurar que ainda não tinha explorado

aquilo ali, mas o telefone tocou antes que ele pudesse seguir o link. Josh, aqui é o Aaron. Alguma informação nova? Temos um novo incidente. Lembra de Steven Fishman? Sim, claro, o chefe da datação de artefatos na IAA. Está morto. Encontramos seu corpo por volta das 11 da noite em uma vala perto das muralhas da Cidade Antiga. O corpo estava em pedaços, só a cabeça escapou inteira. Tinha um pedaço de papel na boca onde escreveram uma palavra: "traidor".Josh sentiu que seu corpo perdia as forças. Outra morte que podia ser diretamente causada pela sua descoberta. Por que eles iam querer matar Fishman? - perguntou. Não sei — respondeu Aaron, parecendo tão confuso quanto Josh. - Ele era um cara quieto, o tipo do sujeito em que a gente não repara nunca. Vou verificar o passado dele e coligir tantos dados quantos puder. Meu palpite é que vamos encontrar alguma conexão entre Steven Fishman e os Guardiões. Espere - disse Josh. - Segundo Steven, o pergaminho era autêntico com base no seu exame do C14. Mais tarde ele relatou que um segundo exame usando um tipo diferente de processo de carbono radiativo foi inconclusivo. Acha que pode haver uma conexão?

Tudo é possível. Se tivéssemos melhor idéia do que os Guardiões realmente desejam, poderíamos ser capazes de entender o que estão fazendo aqui. Estou trabalhando nisso - asseverou Josh. E nós também.Os dois desligaram e Josh voltou para o laptop. Não tinha tempo para chorar a morte de Steven Fishman. O único modo de honrar sua vida era impedir que assassinos conquistassem seus objetivos. Ele clicou no link História do site dos Guardiões.Nós somos os únicos cristãos verdadeiros. Nossa irmandade recua aos tempos de Paulo e conhece os mais bem guardados segredos da cristandade, revelados a nós por Paulo, nosso Mestre, assim declarado vinte anos depois de sua morte. Desde Paulo, nossa seita teve muitos grandes Mestres que nos conduziram nesses quase 2.000 anos. Durante todo esse tempo nossa irmandade tem sido a guardiã do grande segredo. Alguns de nossos mestres são homens bem conhecidos como Marcion, Inocêncio IV e Torquemada. Outros ex-pressaram sua grandeza mais discretamente.No Concílio de Nicéia realizado no anno domini 325, nosso oitavo Mestre foi um dos bispos presentes. Foi o Imperador Constantino que reuniu os bispos em Nicéia e foi lá que as doutrinas cristãs foram consideradas canónicas.Os membros da nossa organização eram original-mente parte da Igreja Católica, mas se afastaram. Por mais de mil anos fingiram ser católicos, enquanto praticavam nossas crenças em segredo.

Na maior parte do tempo estivemos em boa posição, particularmente quando fizeram a coisa certa: suprimiram aqueles que não acreditavam.Há mais de quatrocentos anos a Igreja descobriu a nossa existência, declarou-nos heréticos e fomos excomungados. Nossos membros esconderam-se para não serem queimados. Mudamos o nome do nosso grupo para Guardiões, protetores da fé verdadeira.O dia virá em que assumiremos o controle da Igreja e limparemos a Terra de todo o mal. Os únicos sobreviventes serão os verdadeiros crentes.Nossa organização tem membros espalhados por todo o mundo. Alguns dos homens mais poderosos e influentes são nossos Irmãos. Conservam-se em segredo para que os Sábios de Sião não os matem. O centro de nossa fé não é em Roma e sim no verdadeiro centro da Cristandade, a Terra Santa. Lá o nosso Mestre governa com os Doze Escolhidos.Nossos membros fazem votos de sigilo. Se traírem esses votos serão punidos ou mortos. Temos que proteger a irmandade. Leia nossos artigos, e se compartilhar de nossas crenças, entre em contato conosco por e-mail e quando nossa revolução começar, você será parte dela.Aquele texto era bem mais articulado do que o que aparecia no resto do site - fato que reforçou o palpite de Josh de que a página fora carregada recentemente. Mas por quê? Seus olhos desviaram-se para o canto inferior esquerdo da página, onde viu a imagem de um crucifixo negro

com uma serpente enrolada nele. Com toda a certeza, ele tinha visto essa imagem antes, mas agora que podia estu- dá-la mais detidamente, pôde interpretar seus detalhes mais sutis. A serpente é um símbolo do renascimento e ícone de diversas religiões pagãs. No caso, esta serpente era uma víbora típica de Israel, uma das mais agressivas e letais do Oriente Médio, muito provavelmente a que é citada na Bíblia. O que tudo aquilo significava?Josh releu a história dos Guardiões. Se a organização era secreta, por que iriam revelar tantas informações ao observador casual? Tinha que haver uma razão e, de algum modo, Josh sentia que era diretamente relacionada a ele.A única questão era saber como.

CAPÍTULO 59

OS DOZE ESCOLHIDOS TINHAM SE REUNIDO NO PORÃO ILUMINADO por velas, juntamente com outros 20 membros influentes da seita. Nervosismo e ansiedade enchiam o ar enquanto eles circulavam e conversavam, aguardando, impacientes, a chegada do seu líder. Mas quando o Mestre entrou no teatro e dirigiu-se ao altar, fez-se silêncio na mesma hora. Bem-vindos, meus irmãos — disse o homem, por trás da máscara de serpente.Os Guardiões o saudaram com uma reverência profunda e ocuparam seus lugares.

Tenho questões importantes a discutir com vocês. Foi trazido ao meu conhecimento que um número pequeno de irmãos tem questionado algumas de nossas ações recentes. Quero que fique bem claro que eu não desculpo atos de violência gratuitos. Aqueles que morreram estavam bloqueando nosso sagrado caminho e tinham que ser destruídos. Não se pode permitir que nada nos impeça de cumprir nossa missão. A palavra de Deus deve vir antes de nossos sentimentos individuais ou desejos. Este é o dever que fomos incumbidos de cumprir."Matar aquele que não crê é reafirmar a nossa fé e colher uma recompensa espiritual. Um dia, que virá em breve, o mundo se unirá em nossas crenças e os sobreviventes irão se aquecer na gló-ria da luz e Naquele que está voltando para fazer com que ela brilhe eternamente."O Mestre adiantou-se um pouco no tablado, erguendo os punhos cerrados. Durante a maior parte de nossa história nós ficamos quietos a observar a violência e o mal nos cercar. Nós participamos disso? Não! - os membros gritaram em uníssono. A passividade não funcionou e por isto decidimos agir. Algumas de nossas ações podem ser violentas, mas são essenciais para a consecução dos nossos objetivos. Nossos irmãos que nos antecederam engajaram-se em feitos sangrentos, que algumas pessoas deploravam. Mas os resultados foram gloriosos: as mortes de milhares de ímpios. Nossos adversários estão

convencidos de que somos consumidos pelo ódio. São ignorantes e não conhecem a grandeza de nossa verdade sagrada: somos cheios de amor. E o nosso amor que nos inspira a modificar o mundo. Eles não têm conhecimento de que tudo começou com o nosso primeiro Mestre, o bem abençoado Paulo, cujos segredos nós guardamos e reverenciamos.Neste instante toda a platéia se levantou e irrompeu numa calorosa salva de palmas. Como vocês sabem - o Mestre teve que gritar, para que a reunião voltasse à ordem -, parte de minha responsabilidade é assegurar a sucessão dos nossos líderes do futuro. Um dia meu filho se tomará o sétimo Mestre de nossa linhagem. Ainda assim, hoje nós nos preparamos para uma visão maior. Uns poucos privilegiados entre vocês serão selecionados para testemunhar o ritual a ser celebrado da união sexual, que assegurará a futura pureza de nossa dinastia."Mas agora", gritou o Mestre, avançando para a parte da frente do palco, "nós estamos sendo ameaçados como nunca antes. Acontecimentos recentes nos levaram a um confronto com pode-rosas forças do mal. Temos que nos preparar para o grande combate que vem aí, e no qual alguns de vocês sacrificarão a própria vida. Lembrem-se de que não há honra maior que morrer no campo de batalha de Deus. O verdadeiro mártir tem garantido seu lugar no céu."O Mestre virou-se para o altar.

Nós vos rogamos, oh Senhor, mande-nos de volta o Espírito do seu Filho...Seus seguidores caíram de joelhos, chorando, extasiados, quando se juntaram a ele na oração:Permita-nos que limpemos a Terra com sangue e fogo,Permita-nos que nos aprontemos para a hora do Seu retorno.

Capítulo 60

DE MUITAS MANEIRAS Josh SENTIU-SE COMO SE TIVESSE VOLTADO ao início. Tinha mais indícios, alguns fornecidos pelos próprios Guardiões, mas não sabia mais a respeito da localização deles do que antes. Também não tinha idéia se Danielle estava viva. A única coisa que o impedia de enlouquecer de preocupação era uma fé inexplicável de que a veria de novo.De volta ao seu quarto no apartamento, Josh procurou respostas no manuscrito. Embora quase nada parecesse claro no momento, ele tinha certeza de que havia algo no texto que o ajudaria a compreender o que acontecia à sua volta - se ao menos pudesse traduzir o resto e se aprofundar mais. O primeiro passo era entrar em um leve estado de meditação. Tinha dado certo no passado, quando precisava relembrar grandes blocos de informação que "fotografara" em sua mente. Fechou os olhos e começou a descer a escada que dava no seu subconsciente; mas a descida foi lenta, como se ele estivesse na contramão de uma escada rolante.

Um número excessivo de pensamentos povoava sua mente. Era hora de agir, não de meditar. No entanto, Josh sabia no fundo do coração que não podia agir - não enquanto não tivesse adquirido um pouco de senso de direção. Sua vigilância da Cidade Antiga podia ter lhe dado uma idéia geral de onde os Guardiões se escondiam, mas a menos que tivesse muita sorte, jamais os encontraria a tempo.Ribbono shel Olam.As palavras saltaram na sua mente como se alguém as tivesse jogado ali. Eram palavras que tinham um poder extraordinário. Que o levaram a um senso de comunicação com o divino que ele jamais experimentara. E, no entanto, desde que Danielle desaparecera, esquecera-se delas.Para onde o levariam agora?Usando as palavras hebraicas como um mantra, Josh focou toda sua atenção no som:Ribbono shel Olam.Ribbono shel Olam.Ribbono shel Olam.Espantosamente, desapareceu tudo o que até então o distraía e Josh sentiu-se puxado na direção de alguma coisa. Não tinha idéia de para onde estava indo, mas permitiu-se ser levado sem questionamentos.Abruptamente sua viagem foi interrompida e uma página do pergaminho apareceu diante dele. Leu as palavras em aramaico, mas, ao contrário de antes, a tradução veio-lhe quase que instanta-neamente, como se o entendimento do idioma não

fosse resultado de anos de estudo e sim a expressão de sua língua-mãe.Receio que haja os que interpretarão mal minha mensagem e tentarão usá-la de modo a lucrarem com ela. Essas forças corromperam meus ensinamentos. Acautelem-se contra elas, pois tentarão destruir todos os que se lhes opuserem. Contem minha história e as verdades que ela re-vela. Há um trabalho incompleto que tem que ser terminado.Forças tentarão destruir o novo mensageiro. Tenham cuidado, pois essas forças poderão ter a face da virtude. Essa face não passa de um disfarce. É uma máscara mesmo para o próprio demônio.O homem de espírito imundo distorcerá meus ensinamentos e mesmo assim buscará refugio na minha casa. Ele não é bem-vindo lá e deverá ser expulso.As palavras foram desaparecendo e Josh percebeu que estava totalmente desperto. Há os que interpretarão mal minha mensagem e tentarão usá-la de modo a lucrarem com ela. Isto tinha que ser uma visão profética da ascensão dos Guardiões. Jesus soubera instintivamente o que o mundo descobriu muitas vezes nos dois milênios seguintes - que grandes males podem ser feitos em nome da religião.Mas o que ele quisera dizer com: "O homem de espírito imundo distorcerá meus ensinamentos e mesmo assim buscará refugio na minha casa"? Essas palavras haviam sido escritas antes do esta-

belecimento da Igreja, antes que os cristãos começassem a pensar no santuário como a casa de Deus. O que aquilo significava que ele ainda não sabia? Jesus era de Nazaré. Seria uma pista? Ainda assim, precisava de uma informação mais precisa.Onde ficava a casa de Jesus em Nazaré? Ninguém parecia saber. Poucos dos verdadeiros locais da vida de Jesus eram conhecidos com exatidão. Josh vasculhou a memória. Havia estudado toda aquela área cuidadosamente. O que podia usar agora do que tinha aprendido?Outra imagem emergiu em sua mente: a cúpula da basílica da Anunciação. Era a igreja bem no meio de Nazaré, construída no ponto onde a lenda sustentava que o anjo Gabriel aparecera a Maria e revelara que ia ter um filho de Deus.Será que era ali que Jesus considerava sua casa?Era lá que Josh precisava ir?

CAPÍTULO 61

JOSH TENTOU COMER, MAS NÃO SENTIA ABSOLUTAMENTE UM PINGO de fome. Tinha tentado dormir antes, mas não conseguira. Toda vez que fechava os olhos a imagem da Basílica da Anunciação surgia em sua cabeça. Aquilo era mais que um palpite. Podia parecer loucura, mas Josh sentia que o pergaminho, talvez até mesmo o autor do manuscrito, falava diretamente com ele. Algumas semanas atrás ele teria achado ridícula uma coisa

dessas. Agora, contudo, a evidência era por demais persuasiva.Aaron não atendia o celular e tampouco o telefone fixo da sua sala na IAA. Racionalmente, Josh sabia que era muito cedo e que Aaron tinha direito a uma noite de descanso. Mas seus instintos reclamavam vigorosamente; cada minuto que ficasse parado era um minuto a mais que dava aos Guardiões. Um minuto que podia custar a vida de Danielle.Josh considerou a idéia de ir sozinho à basílica, mas era racional o bastante para perceber a enorme tolice que seria. Assim, fez a única coisa que podia - esperou.Josh ficou andando de um lado para o outro na sala de jantar do apartamento. Inquieto demais para relaxar. Chegar às oito da manhã já foi bastante difícil; mas cada um dos vinte minutos que se seguiram, foi excruciante. Finalmente a campainha da porta soou.- Desculpa por chegar tarde - disse Aaron. - Mas o atraso valeu à pena. Tenho uma informação importante para lhe dar. Tem café aí, um café bom e forte?Josh apontou para a cozinha.- Está na cozinha. Fiz um bule, mas não estou querendo tomar. A última coisa de que preciso nesta manhã é cafeína.Os dois foram juntos para a cozinha.

- O que é que você sabe sobre a Basílica da Anunciação? — perguntou Josh, indo direto ao ponto.Aaron olhou para ele, confuso, ao mesmo tempo que servia o café.- É construída em local sagrado de Nazaré. Por que quer saber?- É onde os Guardiões estão escondidos.Aaron ficou imóvel, segurando o bule do café no alto.- Como é que você sabe disso?- Recebi uma dica.- De quem? — quis saber Aaron, espantado.- Uma fonte muito confiável.Aaron balançou a cabeça vagarosamente e descansou o bule de café.- Essa sua informação faz sentido - comentou.- Também acho - disse Josh. Achou estranho Aaron não insistir para saber detalhes sobre sua fonte, mas achou bom não ser preciso inventar explicações.- Faz sentido porque hoje cedo o carro de Jonathan foi encontrado nas cercanias de Nazaré. Nossos investigadores acreditam que ele passava informações aos Guardiões referentes à IAA e ao pergaminho.- Como foi que eles chegaram a essa conclusão? - perguntou Josh, desapontado. Tinha se acostumado e passado a gostar de Jonathan... ou, pelo menos, era o que pensava.- Ultimamente ele fora posto sob vigilância. Viram-no muitas vezes engajado em longas

conversações com religiosos no bairro cristão da Cidade Antiga.Se isso fosse verdade, pensou Josh, por que tinham levado tanto tempo para suspeitarem dele? Às vezes o processo parecia inten-cionalmente obtuso.- O que mais? - pressionou.- Na semana passada uma grande quantia de dinheiro foi depositada na conta dele. Houve pelo menos três ocasiões em que ele disse que ia se distrair na noite de Tel Aviv, mas não foi. Sus-peitamos que na verdade tenha comparecido a assembléias dos Guardiões.Josh evocou a imagem de Jonathan, com seu cabelo ruivo e bigode de leão-marinho. Difícil acreditar que uma pessoa de aparência tão jovial pudesse ser tão perversa. O fato era que a esta altura Josh já sabia que as aparências realmente enganam.- Este era um vazamento - disse. - Precisamos agora encontrar o outro.- Nós encontraremos.- Já começaram as investigações na área onde foi encontrado o carro de Jonathan?Aaron olhou para o relógio.- Já. Devem ter começado uma hora atrás.- Quero ir à Basílica da Anunciação.- Iremos. Você precisa ver isto primeiro. Fomos ao museu hoje cedo e examinamos a sala de Steven Fishman. Encontramos uma carta na sua mesa.Aaron entregou a folha manuscrita a Josh.

Se você estiver lendo isto, então já terei morrido. Saiba que, a despeito do que possa parecer, minha morte não foi acidente ou suicídio. A verdade é que, por razões que agora parecem tolas, cometi o erro de aceitar $25.000 a fim de invalidar os exames para determinação da idade do manuscrito. Na ocasião, eu acreditava que meu ato não fosse ter conseqüências maiores. Apenas mais tarde, quando os fanáticos revelaram o que realmente desejavam, foi que me dei conta do que tinha feito. Atormenta-me saber que contribuí para seu esquema maligno. Só duas coisas importam agora: primeiro, lamento muito mais que possam imaginar por ter mentido. Todos os exames que realizei comprovaram, sem sombra de dúvida, que o pergaminho data do período do Segundo Templo. Segundo, os Guardiões têm que ser detidos. Só espero que você tenha encontrado este bilhete a tempo.

- Há traidores em toda parte - disse Aaron.Josh levantou os olhos para ele.- Pode ser, mas não creio que tenha sido um traidor. O que fez não foi senão o produto de sua ingenuidade e, é claro, da cobiça humana.Aaron tomou um gole de café, desconcertado.- Tenho outra informação ainda mais interessante - disse.- Descobrimos que Moshe não é o pai biológico de Danielle. Ela foi adotada.Josh não ficou espantado.

- Quando e como a mãe adotiva dela morreu? - perguntou.- Sophie morreu de câncer de mama quando Danielle tinha cinco anos.Josh considerou por um momento a informação e perguntou:- Quem são os seus verdadeiros pais?- A agência de adoções declarou que não há registros dos seus pais biológicos. Ela foi deixada lá com horas de vida por um homem que afirmou tê-la encontrado em um beco.Josh permaneceu em silêncio, a cabeça a mil. As respostas a muitas perguntas começavam a se fazer mais claras, e Josh sabia que estava perto de resolver o resto.- Josh, mais uma surpresa - anunciou Aaron. - Danielle e Alon nasceram no mesmo dia.- Como assim?- Danielle foi levada para a agência de adoções no dia vinte e oito de maio de 1977. Nossos registros mostram que ele nasceu no mesmo dia, do mesmo ano.- Seriam gêmeos? - indagou Josh.- Aí já é um grande salto. Obviamente os dois não foram as únicas crianças a nascerem em Israel naquele dia. Ainda assim, é algo a levar em conta.- Quem é o pai de Alon?- Seu nome é Alexander Paul, um homem de negócios bem- sucedido, com excelentes conexões internacionais. Sua família mora aqui desde a criação do moderno Estado de Israel. Afirmam que sua presença no país tem mais de cem anos.

Lamentavelmente, não temos a certidão de nascimento do sr. Paul. Tudo o que realmente sabemos a respeito dele é o que consta de sua biografia, segundo a qual, tanto ele quanto a família são judeus não praticantes ou seculares como, aliás, a maioria de nossa população.- Conheci Alexander Paul logo que cheguei. Gasta um bocado do seu tempo na IAA, ao que parece.- Ele é um grande benfeitor do museu de Jerusalém, mas vem nos ver sempre que quer tratamento VIP. Gosta de ser bem informado.A cabeça de Josh girava com tanta informação nova. Ele sabia que aquilo tudo fechava de algum modo, mas o significado ainda lhe fugia.- Você vai interrogar Paul? - perguntou.- Nosso pessoal vai vê-lo ainda nesta manhã, um pouco mais tarde.- E a troca dos reféns?- Vou descobrir um modo de ganhar tempo até amanhã de tarde — respondeu Aaron. — Se a sua dica a respeito da basílica for exata, não teremos que lidar com uma troca de reféns. Mas se formos mesmo em frente com isso, você ficará fora de perigo.- Como assim?- Não fará a entrega do pergaminho falso.Josh levantou a mão para interromper a conversa.- Não quero que ninguém tome meu lugar. Não posso, em sã consciência, permitir que alguém, homem ou mulher, arrisque a vida. Já aconteceu demais este tipo de coisa. Os Guardiões querem

que eu faça a entrega do pergaminho, e se alguma pessoa a fará, esta pessoa sou eu.Aaron observou cuidadosamente Josh com uma expressão que este não conseguiu interpretar.- Discutiremos isto depois, se for necessário. Minha esperança é que ninguém tenha de fazer a entrega.- Vamos para a basílica então.- Ainda não. Deixe o meu pessoal investigar primeiro.Josh sentiu o sangue começar a ferver.- Nada mais de espera, Aaron. Não posso ficar aqui sem fazer nada enquanto os Guardiões têm Danielle.- Você não está à toa. Vai comigo à IAA. Nesse meio-tempo, mandaremos um destacamento avançado à basílica. Se houver alguma coisa para encontrar, acredite em mim, eles encontrarão.Josh sabia que havia lógica nas palavras de Aaron.Por que então o deixavam tão inquieto?

Capítulo 62

NO QUARTEL-GENERAL DOS GUARDIÕES EM NAZARÉ, O MESTRE ESperou a chegada do padre André, ansioso por conversar com seu prisioneiro. Precisava daqueles momentos de entretenimento a fim de manter o espírito afiado.- Olá, padre - disse o Mestre quando André entrou na sala escoltado por dois guardas enormes. - Espero que esteja disposto a um pequeno debate.

Padre André franziu a testa e sua boca curvou-se num ricto de zombaria. Podia estar morrendo de medo, mas ainda tinha espírito combativo.- Que tipo de debate?- Que tal religião? - perguntou o Mestre, inclinando-se para a frente. - Mal posso esperar vê-lo defendendo suas crenças. Está com medo? Se preferir guardar silêncio, sempre posso matá-lo.- Grande escolha - debochou André. - Você vai me matar de qualquer maneira, não vai?O Mestre encolheu os ombros, zombando do padre.- Tornemos o processo mais interessante, certo? Eu lhe darei uma chance para salvar sua vida. Tudo o que tem a fazer é ganhar o debate.- O que acontecerá então?- Pouparei sua vida e o soltarei, é claro. Se perder, pode deixar que garanto como receberá a extrema-unção... Mas se não aceitar...Padre André o interrompeu, sem precisar ouvir mais.- Tenho liberdade para falar o que penso sem censura da sua parte?O Mestre endireitou-se na cadeira, deleitado por ver que o padre mordia a isca.- Você pode dizer o que quiser que eu, sendo um religioso, manterei minha palavra.- Você tem um entendimento distorcido de religião - acusou André.O Mestre deu de ombros.- Não vamos perder tempo com ninharias quando podemos ter uma discussão mais animada.

André deu uma risada sem alegria.- Não quero debater com você.- Por que... Porque está com medo de perder?- Não, porque você é maluco.- É mais que evidente — retrucou o Mestre - que você não compreende o meu ponto de vista. Com que facilidade deve dormir à noite, aquecido pelas cobertas de suas platitudes morais. Você me chama de maluco, de fanático, de insano, e isso é tudo o que enxerga porque a verdade é complexa demais para a sua perspectiva religiosa de bondade. Sou genial e sou também generoso.André franziu o cenho.- Eu jamais chamaria você de generoso.- Fiz mais bem para o mundo do que você jamais sonhou dar.André riu.O mestre ferveu de raiva.- Não zombe de mim ou eu o mato agora mesmo.O sangue fugiu do rosto de André.- Se você não é louco, por que então faz as coisas que faz?- Eu faço o trabalho de Deus - disse o Mestre. - Tudo o que faço é para o aperfeiçoamento da humanidade.André ficou boquiaberto e o Mestre deu uma risada.- Vejo que você não me compreende. Sim, eu manipulo um grupo de homens cujos cérebros não são seu maior trunfo. Eles servem a um propósito e têm um papel a desempenhar. - O Mestre

levantou-se e circulou em torno de André. - Meu compromisso é com a verdade, uma verdade que tem sido distorcida pelas mentiras daqueles que escreveram a Bíblia e a usaram para seus próprios objetivos.André estremeceu de raiva enquanto o Mestre continuava calmamente.- Meu trabalho é destruir não só o mal que existe no mundo, como também a maior causa desse mal, o falso deus do Velho Testamento - o Demiurgo - que criou nosso planeta depois de cair da graça do verdadeiro Deus Criador.- O Deus do Velho Testamento é falso? - retorquiu André, cinicamente. - Duvido muito.Mas o Mestre não se deixou impressionar.- Você foi submetido a uma lavagem cerebral pela Igreja Católica - disse, sacudindo a mão para afastar a ignorância do oponente.- Quer dizer então que você faz o mal em nome do verdadeiro Deus?- Eu não faço o mal. Faço o que é necessário para glorificar a Deus e derrotar as forças que controlam a humanidade. — Dentro da máscara de serpente, o Mestre sentiu os olhos lacrimosos. Raramente tinha a oportunidade de discutir sua missão com um homem de tanto estudo quanto André e retornou ao debate com toda a força de suas convicções. - Eu faço o que é certo - ele ber-rou. - E você, o que é que você faz? Sou eu quem será recompensado pelo Deus Criador e seu filho, Jesus Cristo. Sou eu também que sofre pelo bem da verdade.

- O que é a verdade? - perguntou André, intrigado com o horror do que estava ouvindo.O Mestre deu um passo na direção do sacerdote.- Padre, você é verdadeiramente um homem de fé. E engraçado, não é, como é possível ser instruído e ignorante ao mesmo tempo? Ainda assim, você não deve ser culpado pelas suas crenças limitadas. Como amante da humanidade igual a você, eu o respeito o suficiente para lhe revelar a verdade que você busca: Jesus não era um homem, mas sim um ser exclusivamente espiritual que veio à Terra para salvar o mundo. Nunca morreu na cruz porque Cristo não era de carne e osso. Era um ser inteiramente espiritual.- Já li algo a respeito em alguns exemplares da literatura gnóstica - disse André. - Mas como isso justifica o ódio e a violência?- Nós incorporamos alguns ensinamentos gnósticos, mas nós não somos gnósticos. Diga-me uma coisa, padre André, você acredita que o Novo Testamento conta todas as histórias de Paulo?- Tenho certeza absoluta.O mestre sacudiu a cabeça tristemente.- Você está tão equivocado. Pois nem todas as cartas de Paulo foram incluídas.- O que faz de você uma autoridade? - perguntou padre André asperamente. - Você e o seu grupo são uma desgraça.- Cale-se! - gritou o Mestre, começando a ficar impaciente. - Estou tentando ajudar e, no entanto, você insiste em permanecer ignorante. Nós somos os únicos cristãos verdadeiros. Seria bom que

você conhecesse a história de sua Igreja querida, mas herética. Durante quatrocentos anos nós sobrevivemos fazendo de conta que éramos católicos devotos. Praticávamos nossas crenças em segredo a fim de escapar à sentença imposta a outros que se opunham à religião falaz da classe dirigente. Seitas como o catarismo não foram tão afortunadas. Seus integrantes agonizaram nas fogueiras... tudo em nome do seu deus de compaixão. Mas chegou o tempo em que não podíamos mais ser condescendentes com a imoralidade dos papas. No princípio tínhamos olhado para o outro lado. A maior parte dos papas da Idade Média, contudo, era mais interessada em política e no poder que em questões espirituais e por isso nós rompemos, nos escondemos e demos prosseguimento à tradição que tinha nos sustentado por mais de dois mil anos.- Se você é tão religioso - desafiou padre André - por que então mata e odeia?O Mestre suspirou. Aquelas lições corretivas podiam ser fatigantes. - Nós matamos apenas aqueles que não crêem. Imaginei que você seria capaz de deduzir isso sozinho.- Mas, de acordo com as suas crenças, os incrédulos somam mais de 99,99 por cento do mundo!- Quando nosso Senhor retornar - explicou o Mestre ele dominará toda a humanidade e não haverá mais incréus.André riu.

- E como você tenciona converter os hindus, budistas, muçulmanos, judeus e verdadeiros cristãos que não acreditam no que você acredita?Através da máscara o Mestre fixou o olhar no renomado sacerdote.- Eles se convertem ou morrem - exclamou, sarcasticamente.Padre André ergueu ambos os braços.- Então você está fadado ao fracasso. O homem deve usufruir do livre-arbítrio. Como arqueólogo, eu tenho procurado a vida inteira o Jesus histórico. Como estudei também a história de outras culturas, no entanto, vim a me convencer de que todos os homens são meus irmãos.O Mestre não tinha estômago para aquele tipo de pensamento.- Você pensaria de modo diferente, padre, se soubesse o que aconteceu no Concílio de Jerusalém no ano de 49 d.C.- Esclareça-me - concedeu André, como se tivesse alternativa.- Quando Paulo se encontrou com Tiago, irmão de Jesus, e com Pedro, seu discípulo favorito, concordou que seus convertidos seguiriam as leis alimentares judaicas. Mas ao contrário, começou o processo de afastamento do judaísmo, a religião que Tiago e Pedro ainda praticavam. Jesus, você sabe, não foi o fundador do cristianismo, e sim o Bem-aventurado Paulo, nosso primeiro Mestre.André arregalou os olhos.- São Paulo foi seu primeiro Mestre? Impossível.

- No ano de 70 d.C., antes que o primeiro evangelho fosse escrito e Paulo martirizado, foi-nos confiado um documento que Barnabé, companheiro de Paulo, tinha guardado consigo. Esse documento detalhava a obra de Paulo e continha segredos do que realmente transpirou no Concílio de Jerusalém de 49. Conservamos esse trabalho em segredo durante séculos.André mais uma vez duvidou. Estava começando a ficar aborrecido.- Duvido seriamente da existência desse documento.- Ora, claro que ele existe - assegurou o Mestre. - Está guardado em local seguro.- Prove - desafiou André, e o Mestre gargalhou cuidadosamente.- Não tenho motivo para provar nada a você - disse ele. - Isto é, a menos que esteja considerando a possibilidade de converter-se.André recusou-se a reconhecer a insinuação.- São Paulo jamais teria feito parte da sua seita - disse, desafiador.- Pode acreditar em mim. Paulo é o nosso líder honorário, o pai espiritual de nossa linhagem. Embora pareça ter sido judeu, na verdade Paulo foi um cristão gnóstico. Seus ensinamentos se-cretos nos foram revelados por Marcião de Sinope, nosso primeiro Mestre oficial.André precisou de um minuto para absorver aquilo.- Marcião foi expulso da Igreja como herético no segundo século.

- Ele foi um verdadeiro pupilo de Paulo — corrigiu o Mestre. - Marcião foi excomungado porque sabia a verdadeira natureza do nosso Senhor e os Doze Discípulos originais.Mas André não ia deixar passar barato.- Marcião não nasceu senão vinte anos depois da morte de Paulo.- Verdade - concordou o Mestre, sem se interessar em discutir por causa de detalhes - mas se apossou de todos os escritos originais de Paulo, a maioria dos quais tão secretos que nunca tinham sido vistos por ninguém. - Foi Marcião quem viu a verdade da vida de Paulo e a mensagem. Durante duzentos anos, os marcionitas vicejaram como uma das primeiras seitas cristãs, mas depois do Concílio de Nicéia, em 325 da Era Comum, onde a verdade do cristianismo foi distorcida, eles foram declarados heréticos pela nova Igreja Católica. Marcião, contudo, tinha suas próprias escrituras sagradas, que nós guardamos desde aquele tempo. São os documentos sagrados dos Guardiões, que profetizam o retorno de Jesus e sua nova missão na Terra.Padre André hesitou, o olhar sombrio.- Por que está me contando isso? - perguntou.- Porque não pode me prejudicar. Eu o respeito, padre, de verdade, mas não tenho alternativa senão matá-lo.O Mestre exultou com o medo que viu no rosto do padre. Será que ele tinha verdadeiramente acreditado que lhe daria a chance de conquistar sua liberdade?

- Você sempre tem uma alternativa - disse André, a voz trêmula. - Agora, por exemplo, se você optar por me matar, irei me unir a Deus no Céu. Você, por outro lado, será condenado juntamente com o Diabo no Inferno.O Mestre chegou a sentir uma vertigem de tanta satisfação.- Ora, padre, é ódio isso que estou percebendo em sua voz?André limitou-se a fitá-lo com um sorriso triste.- Não, meu irmão, é piedade da sua alma perdida.Amargurado, o Mestre deu a conversa por encerrada. A discussão deixara de ser divertida. Fez um gesto e o padre foi seguro por um dos seus fiéis servos.Momentos depois que André foi arrastado para fora da sala, o Mestre ouviu um grito angustiado e depois outro e mais outro que cessou abruptamente. Os homens sabiam que não deviam matar padre André. Qualquer coisa menos que isso, contudo, o Mestre deixava por conta deles.

Capítulo 63

JOSH ACOMODOU-SE NO ESCRITÓRIO DE AARON SEM SABER AO CERTO o que iam fazer ali. Seus pensamentos insistiam em se fixar na basílica, imaginando o que os homens de Aaron encontrariam em sua investigação.

- A propósito, estou com o seu laptop - disse Aaron casualmente ao se sentar. — Pode levá-lo quando sair.A notícia surpreendeu Josh.- Onde foi que o encontraram?Aaron dirigiu-lhe um olhar de lado.- Ele não foi exatamente encontrado.- Foram vocês que o roubaram?- Claro. Foi necessário. Você pensava mesmo que nossos agentes de segurança são tão idiotas quanto o Boaz? Examinei seus arquivos - como falei, era uma precaução necessária - e vi que o pergaminho tinha sido fotografado. Cheguei a pensar em deletar tudo, mas decidi que você já conquistara nossa confiança.Josh não tinha certeza se poderia dizer o mesmo a respeito de Aaron.- Você fez o que tinha que fazer — comentou, irritado.- Não se zangue. Além do mais, agora que esclarecemos esta questão, você pode verdadeiramente se considerar parte de nossa equipe.- Não faço parte da equipe de ninguém - retrucou Josh, laconicamente. - Vamos deixar isto bem claro. No entanto, estamos atrás da mesma coisa. E se eu puder ajudar, vou ajudar.O telefone tocou e foi Aaron quem atendeu. Era da mesa telefônica da IAA. — A ligação que você estava esperando está na linha três.Aaron agradeceu à telefonista, acionou o viva-voz e disse:

- Shalom.- Já tomou sua decisão? - a voz era distorcida, como se estivesse sendo processada eletronicamente.- Que decisão?- Não me venha com tapeações se não quiser que eu desligue... Aí nunca mais verá os reféns vivos.- Não estou querendo tapear ninguém - apressou-se a refutar Aaron. - Trocaremos o pergaminho pelos reféns amanhã ao pôr-do-sol.- Nossa oferta é para hoje e apenas hoje. Se decidir não aceitar, as mortes dos reféns estarão em suas mãos.- Queremos trocar o pergaminho pelos reféns. Só precisamos de mais tempo.- Não há necessidade de mais tempo! Vocês têm o pergaminho e eu os reféns. Não há o que esperar.- Preciso de mais tempo para lidar com as autoridades - insistiu Aaron, tentando ganhar tempo. - A coisa não é tão fácil assim como parece.- Decidir salvar vidas a mim parece bastante fácil. Como um gesto de boa vontade, contudo, farei uma contraproposta. Trocaremos um refém amanhã. Se determinarmos que o pergaminho é autêntico, os outros serão devolvidos na quarta-feira.A intuição de Josh entrou em ação.- Quais são os nomes dos reféns em poder de vocês?- Você sabe — disse a voz do outro lado da linha.

- Não haverá troca - ameaçou Josh, sabendo que sua proposição era arriscada - a menos que você nos dê os nomes dos reféns.Houve um momento de silêncio.- Eis os nomes: Danielle Ben Daniel, padre André Billet e Jonathan Levi.O seqüestrador tinha cometido um erro palmar e foi preciso Josh usar toda sua força de vontade para não dar um grito. A rápida troca de olhares com Aaron lhe disse que o agente se sentia como ele.- Podemos aceitar sua proposta - disse Aaron, mas primeiro preciso consultar alguns de meus colegas.- Você tem sessenta minutos — disse a voz, e Aaron desligou o telefone.- Eles não sabem que já tomamos conhecimento da morte de Jonathan - disse Josh.- Lembre-se - advertiu Aaron - de que estamos apenas especulando que as cinzas que encontramos eram de Jonathan com base na descoberta do carro dele. O homem não disse nada a respeito de Alon. Talvez as cinzas sejam dele.Aaron tinha razão. Seria possível que o seqüestrador estivesse reconhecendo que matara Alon?Um dos homens de Aaron entrou correndo na sala.- A ligação foi feita de um celular. Verificamos com a companhia telefônica e o número pertence a Jonathan. A chamada foi feita de um local a três quilômetros do centro de Nazaré.

- Muito obrigado - agradeceu Aaron, dispensando seu auxiliar.Josh tentou acrescentar aquela informação mais recente às que já tinha conhecimento. - O que isso significa?- Significa que estamos apertando o cerco.Em exatamente uma hora o telefone tocou de novo. Aaron e Josh trocaram um olhar por cima da mesa. Com um gesto de cabeça, Aaron pegou o aparelho, ativando o viva-voz.- Qual é a resposta? - exigiu a voz.- Tenho outra pergunta.- Chega de perguntas! Responda agora ou os reféns morrem imediatamente.Aaron olhou para Josh e depois novamente para o telefone.- Concordamos em fazer a troca amanhã ao pôr-do-sol.- Então siga precisamente estas instruções. Cohan vai realizar a troca e entregar o rolo. Quando o tivermos em nossas mãos, encaminharemos vocês para os reféns. Faça com que Cohan esteja nas ruínas do Teatro Romano de Séforis às 7:30. E lembre-se, nada de truques senão os reféns morrem. Não traga nenhum dos seus homens. Você pode acompanhar Cohan, mas ele terá que nos entregar o rolo sozinho. Teremos homens dispostos em toda a área para nos assegurar de que você estará seguindo nossas instruções. Fui bastante claro?- Perfeitamente claro - respondeu Aaron.

Quando o telefonema foi encerrado, ele não parou para falar com Josh. Foi logo ligando para seus agentes em Nazaré a fim de colocá-los a par dos acontecimentos.- Nossos homens cobrem toda a área - disse ele quando terminou. - Numa questão de minutos teremos um dos nossos helicópteros de vigilância sobrevoando as ruínas romanas. Ainda acho difícil que a troca dos reféns realmente venha a ocorrer, mas, neste caso, será nos nossos termos.

CAPÍTULO 64

O TEATRO ESTAVA ESCURO, VAZIO E QUIETO, SILENCIOSO A NÃO SER pelas vozes murmuradas de duas figuras envoltas em mantos negros.- Você aprendeu minhas lições muito bem, meu filho - a voz do Mestre estava carregada de emoção agora que finalmente estavam a sós. - Você se tornou tudo aquilo que eu esperava e um dia me sucederá como o próximo Mestre da nossa linhagem. Estamos destinados a salvar o mundo, mas para fazê-lo temos que desempenhar nossa missão no maior sigilo possível. O fardo por vezes será pesado e você poderá sentir-se sozinho no mundo, sem ninguém que saiba sua verdadeira identidade. Mas, será estimulado, como eu fui, por saber que seu filho um dia prosseguirá com a

nossa missão a partir do ponto em que você e eu a deixarmos. Quando ele atingir a maioridade, você lhe ministrará os ensinamentos sagrados da mesma forma como fiz com você.- Mestre, cumprirei meus votos e nunca contarei a ninguém o nosso segredo. Você soube me ensinar bem. Quando chegar a ocasião, eu o tornarei orgulhoso. Já terminamos os preparativos para amanhã?- Já. Muito poucas coisas são tão satisfatórias quanto uma farsa magistral. Amanhã à noite depois da troca, planejei uma enorme festa. Hoje começamos cedo quando, então, você criará seu herdeiro.- Estou satisfeito com a sua escolha - disse o homem mais jovem, sentindo-se cada vez mais excitado. — Mas ela cederá?- Ela estará pronta para você, meu filho - disse o Mestre. — As drogas garantirão.

Capítulo 65

ERA QUASE IMPOSSÍVEL RELAXAR, MAS JOSH PRECISAVA DO ACESSO À sabedoria obtido exclusivamente pela meditação. Esta talvez fosse a última oportunidade por longo tempo - possivelmente para sempre. Josh obrigou-se a se concentrar e começou:Ribbono shel Olam.Ribbono shel Olam.Ribbono shel Olam.Ele viu faixas vermelhas, verdes, azuis e púrpuras e quis ir mais fundo, descer a um lugar onde

nunca estivera. Atravessou uma barreira, ajudado, sem dúvida, pelas palavras que lhe haviam sido dadas. Era ali que as lembranças de suas vidas passadas viviam. Não se tratava de um sonho, uma visão, ou um delírio.Aquilo era real.Josh viu os eventos mais importantes da vida de cinco pessoas que soube instintivamente serem seus ancestrais. Viu o rabino Hillel, no ano 6, ensinando a um jovem Yehoshua ben Yosef a amar o próximo como a si próprio. Experimentou a morte corajosa do rabino Akiba no ano 135. Viu Judah ben-Bava, conhecido como Judah o Príncipe, editando uma parte do Mishnah no ano de 193. Ouviu a voz de Rashi debatendo o Talmud e a Torá no ano 1085. Observou o rabino Isaac Luria discutindo os mistérios da Cabala já no ano de 1569.Josh era ligado a todos aqueles grandes homens. O sangue deles corria em suas veias. Mas por que estaria vendo aquilo agora?Ele emergiu da meditação e retornou à consciência do mundo "real". Em vez de uma revelação só obtivera mais indagações. Como acadêmico e alguém sempre em busca da sabedoria, estudara todos aqueles homens com alguma minúcia. Mas duvidava de que aquele fato histórico fosse ajudá-lo no conflito que tinha diante de si.Durante a meditação, aquilo com que se ligara com mais intensidade fora a essência de seus ancestrais - aquilo que alguns poderiam chamar

da vibração deles ou sua assinatura espiritual. Josh sentiu que esta energia poderia ajudá-lo quando finalmente enfrentasse seus adversários. Decidiu rezar. Embora a oração nunca tivesse sido uma parte significativa da sua vida, ele agora sentiu instintivamente seu valor, como nunca antes sentira.Escolheu um salmo que sabia de cor:

Nossos dias são como a relva,Nós crescemos como as flores que murchamE morrem quando o vento frio passaSobre elas, e, no entanto o Seu amor por aquelesQue o veneram é eterno.Deus, sua justiça se estende sobre todas as gerações.Que esta geração possa finalmente conhecer a pazE possam todos os povos se unirem como um só.

Com o espírito fortalecido, Josh avaliou o perigo que tinha diante de si. Não acreditava que Aaron fosse capaz de imaginar uma alternativa viável para a troca dos reféns. Tampouco acreditava que os homens de Aaron encontrassem o esconderijo dos Guardiões em Nazaré com a rapidez necessária.Tomado por súbita certeza, ele percebeu que apenas uma pessoa poderia solapar a força dos Guardiões e salvar Danielle. E que esse homem era o descendente do rabino Hillel, do rabino

Akiba, de Judah o Príncipe, Rashi e do rabino Isaac Luria.Josh levantou-se. Chegara a hora de agir.

Capítulo 66

A CLARIDADE DE UM ÚNICO SPOTLIGHT ATRAVESSAVA A ESCURIDÃO, iluminando o altar e enchendo o espaço em torno com um clarão sobrenatural. O Mestre podia sentir a antecipação no ar da sala. Ele, também, sentia a excitação causada pela aproximação do ritual iminente. Aquele momento acontecia apenas uma vez em cada geração. Se tudo saísse bem, seu neto estava prestes a ser gerado.O Mestre caminhou vagarosamente até o palco e fixou o olhar nos seus Escolhidos.- Nesta grande noite celebramos a continuação da nossa linhagem. Logo vocês testemunharão o mais sagrado dos ritos. Peço que controlem seus instintos animais e convertam o fogo libidinoso. Muitos de vocês já me mostraram que são fracos neste sentido, mas imploro que aprendam com o recente desafio e voltem suas energias ao espírito mais elevado da nossa causa. Vocês me serviram bem e agora serão recompensados. Experimentarão o renascimento da nossa seita. Oremos para que o Senhor nos abençoe com um herdeiro.Os Doze Escolhidos se ergueram e rezaram em uníssono.

Os médicos tinham dito ao Mestre que a ocasião era apropriada. Seus instintos lhe diziam o mesmo. Aqueles imbecis da IAA pensaram que sairiam ganhando, mas não podiam saber que seus adiamentos serviriam a um propósito maior. O Mestre rezou em silêncio, agradecendo a Deus pela graça inesperada da ocasião perfeita. Não teriam interferência.Um segundo homem apareceu, trajando um manto branco e com o rosto escondido atrás de uma máscara de serpente. Houve uma agitação no auditório; nunca antes os Guardiões tinham visto outra pessoa usando a máscara sagrada do Mestre. A tensão aumentou e o Mestre começou a temer que a audiência ficasse entusiasmada demais e se deixasse empolgar pelo desejo carnal. Diversos deles já tinham sido punidos por abordarem ousadamente Danielle do lado de fora do aposento do chuveiro. Hoje eles não podiam ultrapassar a linha. O Mestre não permitiria que nada profanasse o momento.O homem mascarado aguardou no altar o aparecimento de sua companheira. Momentos mais tarde surgiu uma linda mulher, escoltada por dois Guardiões, um de cada lado, que a levaram ao altar. Quando eles lhe removeram o manto branco, os Escolhidos deixaram escapar um suspiro coletivo. Nem mesmo uns hematomas feios podiam diminuir sua radiante beleza.Quando descobriu a verdadeira identidade da mulher alguns dias antes, o Mestre parou para avaliar suas intenções. Por um breve instante,

seus impulsos humanos entraram em conflito com o seu senso de missão. Mas logo ele percebeu como era perfeita - e pura - aquela oportunidade. A própria eternidade parecia estar conspirando pelo sucesso deles.Quando ela foi posicionada em frente ao altar, os Guardiões que tinham conduzido Danielle recuaram para longe do seu corpo nu. Ao fazê-lo, contudo, ela desabou no chão. Alguma coisa estava terrivelmente errada.O Mestre adiantou-se rapidamente e tentou revivê-la.- Seus idiotas! - berrou, furioso. - Eu disse para que a sedassem, não para deixá-la inconsciente. A menos que ela desempenhe a sua parte, não pode haver ritual! Vocês pagarão por isso com suas vidas.

Capítulo 67

JOSH COLOCOU NA SUA BOLSA AS DUAS PISTOLAS SEMI-AUTOMÁTICAS que tinha comprado. Esperava não precisar usá-las, mas estava preparado para isso, caso fosse necessário.Estava se dirigindo para a porta quando o telefone tocou.- Tenho uma grande notícia - disse ele. - Encontramos o esconderijo dos Guardiões.

Josh não ficou surpreso, embora preferisse ter ficado. Não precisou perguntar a Aaron como fizera a descoberta.Durante a última hora, a impressão que ele tinha é que estava pensando com uma nova clareza, com a qual viera também a capacidade de perceber padrões que tinham lhe escapado antes. Estava esperando aquele telefonema.- Notícia muito boa - disse ele. - Quer dizer então que não haverá troca de reféns amanhã de noite?- Nunca me senti à vontade com a idéia da troca. Agora podemos esquecer. Formulei um novo plano. Enquanto os Guardiões vão para Séforis a fim de esperar a troca, atacamos seu quartel-general e capturamos seu líder.Josh permaneceu em silêncio. Não estava interessado no esquema de Aaron; tinha seu próprio plano, embora nele Aaron fosse desempenhar uma parte significativa.- Alô, Josh, você esta me ouvindo?- Eu estava admirando a sua esperteza - mentiu Josh. — Como é o seu plano mais recente?- Pego você amanhã às três horas e vamos para Nazaré - disse Aaron. - Teremos que estar lá antes de 6:30.- E se eu me encontrar com você em frente à Basílica da Anunciação às 6 horas? - contrapôs Josh.- Eu quero que você vá comigo. No caminho, discutiremos alguns detalhes importantes.Josh tentou manter a voz absolutamente neutra.

- Não vai funcionar para mim. Vou passar por alguns pontos espirituais na estrada para Nazaré e preferia ficar sozinho.- Mas...- Aaron - ele interrompeu você sabia que Nazaré significa guardião em hebraico e em árabe?- Claro que sabia - respondeu Aaron. Ele suspirou e acrescentou, relutante: - Tudo bem, me encontro com você na frente da basílica amanhã às seis horas da tarde. Vá bem armado. Não tenho nenhuma arma e estou contando com você para me proteger.Com isto, Josh desligou e deu uma olhada no relógio. Eram 5:30. Tinha trinta minutos para chegar ao seu destino. Pegou as malas e partiu para a Cidade Antiga.Precisou de menos de quinze minutos para caminhar os mil e quinhentos metros que o separava do Portão de Jaffa. Dirigiu-se para o Bairro Cristão e encontrou a loja de suvenires A Espada de Deus que servia de entrada para o antigo esconderijo dos Guardiões.- Trabalho com a segurança israelense - disse Josh à mulher da caixa. - Preciso inspecionar os aposentos lá embaixo.- Os padres não se encontram lá — disse ela. — As únicas pessoas que estiveram lá hoje foram os policiais.- Vou descer de qualquer maneira. Qual é a hora limite que você pode fechar a loja?A mulher consultou o relógio da parede.- Mais vinte minutos.

- Eu a vejo antes disso.Josh pegou a lanterna e desceu a escada. Uma vez lá embaixo, deslocou-se rapidamente até a porta que dava para os túneis que corriam debaixo da Cidade Velha.A passagem era fria e escura. Josh percorreu uma longa distância pelo túnel principal e entrou em uma das passagens menores, que levava à grande laje de pedra que bloqueara seu caminho da última vez. Não havia compreendido então o que havia do outro lado. Agora precisava demonstrar respeito e prestar sua homenagem.Quando chegou à pedra antiga, pôs um quipá na cabeça, caiu de joelhos e recitou o Kaddish, a tradicional prece judaica pelos mortos. Enquanto pronunciava as palavras, sentiu-se vencido pela emoção gerada pelo significado do ato, mas houve também um efeito mais profundo - uma difusa sensação de paz e fé que parecia invadi-lo por completo a cada palavra.- Que Deus se lembre do seu servo Yehoshua ben Yosef - concluiu Josh, beijando a pedra. - Que bons atos e a caridade possam ser realizados em seu nome.

Capítulo 68

DIRIGINDO SEU RANGE ROVER ALUGADO, JOSH SEGUIU PARA CAFARnaum, conhecida também como a cidade de São Pedro, na margem norte do Mar da Galiléia.

Ainda não tinha andado vinte quilômetros quando notou uma Mercedes branca o seguindo. Tinha visto um automóvel parecido quando saíra de Jerusalém. Saiu da estrada e deixou que passasse.Após alguns minutos, retomou a viagem para descobrir que pouco tempo depois voltava a segui-lo. Aquilo só podia ser dos Guardiões ou do pessoal de Aaron. Não se preocupou. Tinha duas pistolas semi-automáticas carregadas. Se corresse perigo, podia disparar doze tiros em menos de três segundos.Seus pensamentos voltaram-se para Danielle. Embora eles não tivessem estado muito tempo juntos, sentia-se ligado a ela de um modo que não era capaz de explicar, como se a ligação entre eles transcendesse os limites de tempo e espaço. Ansiava por falar com ela, abraçá-la, fundir de novo os seus corpos. Queria lhe dizer tudo o que significava para ele, como ela mudara sua vida permanentemente, só esperava ainda ter chance para isso.Josh atravessou a planície costeira entre Tel Aviv e Haifa. A mesma trilha seguida por exército após exército através dos séculos ao marcharem rumo norte vindos do Egito ou para o sul, saindo do Eufrates. A despeito de sua história longa e sangrenta, Josh preferia aquela estrada à mais direta, mas consideravelmente mais perigosa que atravessava a Margem Ocidental.Quando ele chegou a Haifa, o carro branco tinha desaparecido.

Josh decidiu passar a noite em Haifa. Hospedou-se no hotel Don Carmel, no centro da cidade, usando o nome de John Coughlin, seu inimigo nos tempos da Universidade da Pensilvânia.Foi mais um gesto de precaução do que qualquer outra coisa, já que ele sabia muito bem que, se os Guardiões queriam achá-lo, eles o achariam. Mas o nome lhe veio à cabeça no instante em que entrava no hotel, e Josh não se deu o trabalho de pensar a respeito. Engraçado, mas depois de tudo por que tinha passado nos últimos dias, ele de repente sentia uma certa afeição pelo sujeito. Josh percebeu que sentia alívio por ter ultrapassado o ressentimento e o orgulho ferido de antes. Há coisas mais importantes na vida que egos feridos. Pensou de novo em Danielle e no perigo que ambos corriam. Sentiu-se feliz por ter feito aquela espécie de peregrinação e torceu para que ela lhe desse a força de que necessitava.Haifa ficava situada em cima de uma elevação voltada para uma baía, e por esta razão há quem a chame de São Francisco do Mediterrâneo. O hotel proporcionava vistas impressionantes da cidade e da baía com o seu mar de azul profundo lá embaixo. Josh, contudo, tinha outras coisas em mente. Da janela do quarto, procurou o Mercedes branco ou algum tipo suspeito, mas, após estudar a região por diversos minutos, concluiu que estava seguro e foi para cama dormir aquela que podia muito bem ser a última noite de sua vida.Na manhã seguinte, Josh acordou às seis horas da manhã e foi correr. Em seguida, fechou a conta do

hotel e começou a vencer o curto trajeto até o Santuário Bahai, que abria às nove.Ao sair do hotel, notou que o Mercedes branco o seguia de novo. Tinha que ser a segurança israelense. Os Guardiões teriam ido pegá-lo na noite anterior.Josh sabia que precisava se preparar espiritualmente para o que o aguardava. Estacionou e deteve-se um pouco para contemplar a magnífica cúpula dourada do santuário, bem como seus jardins magníficos. Só depois entrou. Era ali que estavam enterrados os restos mortais do fundador da religião, Bahá'u'lláh. Josh fez outra oração, desta vez procurando absorver a energia da tolerância e da unidade que caracterizavam os alicerces da fé Bahá'í. Antes do dia anterior, ele não rezava desde que seus pais tinham morrido na queda do avião, mas agora encontrou um profundo conforto na prece.

Israel sedia mais de 20 mil sítios de antiguidades de todos os tamanhos e períodos, cada um deles protegido pela lei que regulava o assunto e cuja execução competia à IAA. Mas Josh não tinha tempo a perder. Sua agenda era específica e, no entanto, não era fruto de cálculos cuidadosos ou de estratégia bem planejada. Os Guardiões não eram facilmente previsíveis ou contidos por um código moral aparente, o que significava que sua mente seria de pouca utilidade enquanto se preparava para o confronto que determinaria seu destino. Em vez da mente, Josh deixou-se levar

pela intuição, confiando que o conduziria para o bem supremo.Ao deixar o santuário, Josh consultou o relógio. Em pouco mais de oito horas iria se encontrar com Aaron. Dirigiu trinta quilômetros até o Megiddo, o local onde, segundo o Livro da Revelação, haverá a batalha final entre as forças do Bem e do Mal. Uma vez em Megiddo, ele foi ao monte do Armagedom, um dos maiores e mais impressionantes sítios arqueológicos em Israel.Em cada ponto, Josh meditou e rezou, abrindo-se para a sabedoria ou a energia que pudesse receber. Rendeu-se ao caminho que tinha diante de si e, quando seu medo se dissipou, sentiu sua determinação expandir-se e passar a conter uma nova consciência. Reconciliando-se com a verdadeira natureza do seu desafio, ele libertou-se do que ainda lhe restava de uma vida de dúvidas.Gostaria de ter tempo para explorar as ruínas mais completamente, a fim de se ajustar à sua nova perspectiva, mas o tempo estava se esgotando. Tinha que ir a Cafarnaum. Só que o percurso foi mais longo do que esperara e, quando chegou à margem norte do Mar da Galiléia, já era quase 1:30. Ele foi direto à magnífica ruína românica que, segundo alguns arqueólogos, foi construída em cima de uma sinagoga mais antiga onde Jesus pregara e rezara.As paredes antigas podiam ser vistas recortadas contra o céu muito azul. Josh imaginou como teria sido dois mil anos antes. Teria Jesus realmente orado ali? Josh sentia alguma coisa, mas não podia

dizer se era uma ligação com o divino ou se fruto do seu anseio. Caiu de joelhos e rezou a mais sagrada das orações judaicas, a Shema.Escuta, oh Israel, Adonai é nosso Deus, Adonai é Um.Quando terminou, percebeu que o céu tinha escurecido bem em cima da sua cabeça, no local onde um dia fora o teto da sinagoga. Ouviu o estrondo da trovoada e de repente o ar ficou eletrizado. Anunciada por um raio, a chuva começou a cair. Encharcado até os ossos, Josh correu para o Range Rover.Quando chegou no estacionamento, localizou de novo o carro branco e, desta vez, conseguiu ver os homens em seu interior. Segurança de Israel. Sorriu para eles, mas continuou correndo para o seu carro - dispunha de menos de quatro horas, tempo bastante apenas para visitar a tumba do rabino Moshe Ben Maimônides - ou, simplesmente, Rambam.O túmulo caiado de Maimônides ficava em uma colina com vista para o Mar da Galiléia. Josh sentia especial afinidade com o homem que atravessara os reinos da ciência e do espírito com perícia e sabedoria, tornando-se não apenas físico e filósofo, como também a maior autoridade religiosa hebraica da Idade Média. Josh considerou sua própria posição, aparentemente esquizofrê-nica com suas posições dissociadas. Poderia alcançar um dia um elegante equilíbrio entre as duas visões do mundo que adotava? Ele rezou

para ser agraciado com uma visão unificada no confronto próximo.Ao abrir os olhos, Josh viu que tinha menos de duas horas e meia para cobrir o percurso que o levaria a Nazaré e se encontrar com Aaron. Concentrou-se em uma única coisa - sua missão.

Capítulo 69

NAZARÉ ERA UMA CIDADE DIFÍCIL PARA SE ANDAR. A AVENIDA PERIMETRAL que lhe dava acesso era cheia de sinais e indicações confusas, todas apontando em direções diferentes como sendo da mesma locação. Josh teve a impressão de estar andando em círculos, mas finalmente chegou a um estacionamento a poucas quadras da Basílica da Anunciação. Dispunha de noventa minutos até a hora do en-contro com Aaron.Antes de saltar do carro, vestiu um colete à prova de balas e pegou as duas pistolas, que escondeu sob as pernas das calças. Decidiu explorar a área em torno da igreja. Notou que o Mercedes branco tinha parado no mesmo estacionamento, só que desta vez estava vazio. Sua intuição entrou novamente em cena e ele olhou em torno para ver onde os homens poderiam ter ido. No outro lado do estacionamento, havia um edifício comercial de três andares que dava a impressão de ter sido construído na década de 1950. Na frente, um pequeno cartaz dizia: "Deus Enterprises." Josh pas-sou uns dez minutos andando em torno do prédio,

espiando de diversos ângulos, querendo descobrir se estava acontecendo alguma coisa lá dentro. Não viu ninguém entrando ou saindo do lugar, e já estava prestes a seguir para a basílica quando dois homens imensos de terno escuro se aproximaram pelos fundos e entraram no edifício usando a porta dos fundos. O jeito deles andarem pareceu-lhe estranhamente familiar. Seriam Guardiões? Josh deu uma última olhada no prédio e saiu, convicto de que voltaria.Percorreu a pé a pequena distância na rua Casa Nova até a entrada da Basílica da Anunciação, que ficava no centro da parte mais antiga da cidade. Checou a área, mas nada lhe pareceu suspeito. Não viu nenhum segurança, mas achou que deviam estar por ali, escondidos em algum lugar. Pelo menos, era o que esperava.Diferentemente dos outros locais sagrados que visitara, Josh não sentiu nenhuma conexão emocional com a basílica em si. Achou estranho, mas sua intuição só lhe dizia que alguma coisa não estava certa com aquele lugar. Não foi aqui que aconteceu, pensou.Ao completar a volta e se deter por um instante na frente da igreja, achou que todo o lugar parecia exageradamente quieto, como nos momentos que antecedem um terremoto. Josh consultou o relógio. Hora de se encontrar com Aaron.Ele permaneceu do lado de fora da basílica por diversos minutos até que Aaron chegou, flanqueado pelos dois grandalhões de terno preto que ele vira antes entrando nos escritórios da

Deus Enterprises. Sua presença ali disse a Josh tudo o que precisava saber. Até aquele instante ainda tinha esperança de que estivesse enganado a respeito de Aaron. Era um desapontamento, mas não fazia mal. Aaron podia levá-lo aonde precisava ir.- Então, cavalheiro - disse Josh casualmente -, qual é o plano para hoje?Aaron apontou para o prédio de três andares.- Ali é o esconderijo dos Guardiões - disse. - Mas meus homens informaram que todos os membros estão nas ruínas romanas de Séforis, esperando para fazer a troca dos reféns. O líder não foi localizado. Achamos que deva estar no prédio. Vamos pegá-lo enquanto não se encontra protegido.Josh assentiu. Não queria falar muito, com medo de que sua voz o traísse.Aaron bateu no seu coldre de ombro.- Você está armado?Josh tentou mostrar-se surpreso com a pergunta.- Não. Deveria estar?- Não. Melhor que não esteja. As pessoas que não estão acostumadas a atirar tendem a se ferir em situações como esta.Os dois se encaminharam para a porta da frente do edifício e entraram. Aaron cruzou em silêncio o saguão e abriu uma porta de aço. Dentro era um elevador. Aaron estendeu a mão para um painel na parede e digitou um código de oito algarismos. A porta do elevador se abriu.

- Você descobriu uma porção de coisas sobre este prédio - disse Josh, com o que esperou que passasse por admiração.Aaron acionou o botão e o elevador começou a descer. Olhou para Josh com uma expressão de superioridade e bastante desprezo.- A inteligência de Israel é a melhor do mundo.- E você enche de orgulho seu país, Aaron.Aaron pareceu desconcertado com o comentário, mas não teve tempo de insistir. A porta do elevador se abriu para revelar um homem de manto negro e máscara de serpente. Josh soube na mesma hora que se tratava do Mestre.- Sr. Cohan - disse o Mestre em tom de sarcasmo -, a que devemos o prazer de sua visita?Josh sabia que tinha que manter a calma. Os próximos minutos determinariam tudo.- Estava ansioso por conhecê-lo - disse Josh, sem se dar por achado.- E eu a você - respondeu o Mestre, olhando para Aaron. - Ele está armado?- Acho que ele se assusta com armas.- Reviste-o assim mesmo.Os valentões revistaram Josh e encontraram as duas 9 milímetros presas uma em cada perna. Depois rasgaram sua camisa e tiraram o colete à prova de balas.O Mestre lançou um olhar de desaprovação a Aaron.- Você não é pago para cometer erros de amador. Pelo seu bem, espero que este seja o último.

- Eu conheço esse cara! - protestou Aaron, disfarçando sua humilhação com uma bravata. — Sabia que ele não seria capaz de apagar ninguém mesmo que tivesse uma arma.- Você não passa de um idiota - o Mestre bateu com o dorso da mão no rosto de Aaron, arrancando-lhe sangue com o anel incrustado de pedras.Josh lutou para permanecer calmo. Antecipara o pior, e o que antecipara estava se concretizando. Viu Aaron esfregar o lábio ferido.- O que ganhou com isto, Aaron? - perguntou. - O que ganhou para me trair?Aaron deu uma risadinha enquanto olhava o sangue na mão.- Você é um bom sujeito, Josh. Mas o dinheiro fala mais alto, meu amigo.- Não funcionou assim tão bem para Fishman - lembrou Josh.Uma súbita expressão de pânico apareceu no rosto de Aaronquando o significado das palavras de Josh foi totalmente absorvido. Tentou disfarçar forçando uma risada, mas ela saiu alta demais, atrasada demais.- Silêncio - disse o Mestre, levantando a mão. Fez um gesto e um dos seus capangas abriu um buraco na cabeça de Aaron, fazendo o sangue respingar na fina decoração do escritório.Josh sabia que o único modo de sobreviver era conter suas emoções e faculdades mentais. Sempre soubera que o Mestre era impiedoso, mas

vê-lo matar com tal indiferença fez com que per-cebesse a verdadeira dimensão do problema.- Fui benevolente com Aaron e o matei rapidamente - disse o Mestre, fixando os olhos em Josh. - Você não terá a mesma sorte.Um dos capangas a soldo do Mestre agarrou Josh por trás e ele sentiu um golpe súbito na nuca. No instante seguinte, tudo ficou preto.

Capítulo 70

QUANDO JOSH ACORDOU, VIU QUE ESTAVA EM UM APOSENTO ESCURO, escassamente iluminado por uma vela. Foi só quando ouviu a espada sendo desembainhada é que percebeu que não estava sozinho.- Deixem-nos - ordenou o Mestre, a espada reluzindo à luz tremeluzente da vela. Os bandidos obedeceram, deixando finalmente Josh sozinho com seu inimigo.- Seus amigos arqueólogos nos causaram muitos problemas - disse o Mestre. - Teriam usado o manuscrito para destruir a nossa religião, mas, em vez disso, fui eu que os destruí.Josh ficou furioso ante a insana argumentação do fanático.- Eles mal tinham começado a tradução - contestou. - Nenhum deles conhecia o conteúdo do manuscrito.O Mestre adiantou-se, erguendo o queixo de Josh com a ponta chata da espada.

- Mas você sabe o que ele diz, não sabe?Josh não sentiu necessidade de mentir.- Diz coisas que você nem sequer teria como começar a entender.O Mestre deu uma risada.- Você sabe que é uma completa falsificação, não sabe?- As palavras registradas no pergaminho são de Yehoshua ben Yosef, conhecido hoje em dia como Jesus de Nazaré.- Quanta ingenuidade - o Mestre circulou vagarosamente.— São as palavras de um herético numa melancólica tentativa para invalidar a única e verdadeira religião.O Mestre acionou um interruptor na parede e um projetor subitamente iluminou o aposento.- Isto é o que acontece a heréticos, sr. Cohan.Josh recuou. Atrás do altar, pendurado de cabeça para baixo em uma cruz, estava padre André, crucificado como são Pedro. Danielle, envolta em um manto branco, jazia imóvel no chão com os olhos fechados. Como não viu sangue, Josh rezou para que estivesse apenas inconsciente. Então ele ouviu o silvar vindo de um serpentário que ficava em cima do altar e, horrorizado, notou que era uma típica serpente de Israel, a víbora serrilhada, tida como uma das mais venenosas do mundo.- Você é um demônio - disse Josh, enojado.- Não é verdade - corrigiu o Mestre. - Na verdade, sou exatamente o contrário. Uma pena que você não estará mais vivo quando o resto do mundo

descobrir isso. Você sabe, na realidade, eu tinha algumas reservas a respeito do padre André. Sua tenacidade era admirável. Mas quando ele se tornou por demais compreensivo em relação aos incrédulos, selou seu destino.Josh obrigou-se a olhar para o padre crucificado. Precisava tirar vantagem da raiva que sentia ante aquela atrocidade. Era necessário canalizar sua fúria, seu amor por Danielle e sua fé recém-encontrada em alguma coisa que pudesse usar para sobrepujar o Mestre.O Mestre brandiu de novo a espada, cegando-o com a luz brilhante refletida na lâmina. Instintivamente, Josh cobriu os olhos.O Mestre deu uma gargalhada estrepitosa.- Brilhante demais para você, Josh? Peço-lhe desculpas. Certamente não quero bloquear sua visão. A propósito, aquela víbora lá é para você. Um presente especial para um homem especial. A picada em si não é tão ruim, mas, uma vez que ela mergulhe as presas na sua carne, suas horas de agonia terão início.Enquanto o Mestre falava, Josh teve a impressão de ver Danielle ficando tensa. Estava viva, com certeza, mas estaria consciente? Sabendo que ia ficar vulnerável a um ataque, Josh fechou os olhos. Precisava de ajuda. Precisava ver o pergaminho. Sabia que havia algo lá para ele, se conseguisse captar.Ribbono shel Olam.

Josh deixou seus pensamentos se dispersarem. O Mestre desapareceu de sua vista, da mesma forma que padre André e até mesmo Danielle.Ribbono shel Olam.O pergaminho emergiu diante dos olhos de sua mente. Josh esperou ver algo de novo, mas foi atraído para a última passagem que traduzira.Tenham cuidado, pois essas forças poderão ter a face da virtude. Essa face não passa de um disfarce. É uma máscara até mesmo para o próprio demônio.O reconhecimento atingiu Josh com uma força tremenda. Sabia agora algo a respeito do assassino selvagem à sua frente - um segredo até mesmo para o próprio demônio. Finalmente tinha uma vantagem. Por ironia, a informação lhe fora dada por Aaron, o recém-assassinado cúmplice do Mestre.- Está rezando, Josh? - escarneceu o Mestre.Josh abriu os olhos e encarou de frente o homem mascarado.- Conheço todos os seus segredos - disse.O Mestre deu uma risada.- Você não conhece nenhum dos meus segredos.Josh adiantou-se um passo.- Sei a respeito do Concílio de Jerusalém.A atenção do Mestre foi despertada.- É impossível.- Impossível coisa nenhuma. Seria possível inclusive dizer que estive lá.- Você não sabe nada.

Josh adiantou-se mais ainda, sua certeza aumentando à medida que o desconforto do Mestre cedeu caminho ao alarme.- Sei mais a seu respeito do que você - disse. — Você afirma que odeia os judeus.- Mais do que qualquer coisa no mundo. São piores do que os porcos que se recusam a comer.- E, no entanto, você mesmo é judeu - Josh desfechou seu golpe.O Mestre esticou o corpo.- Ridículo! - exclamou, levantando a espada. - Já estou farto de ouvir suas mentiras.- Você realmente não sabe, não é mesmo? - disse Josh, dando mais ênfase à revelação. - Seu pai nunca lhe contou, mas é claro que não contaria. Seu aniversário é no dia 30 de setembro, certo? Você nasceu em Dachau, no ano de 1943. Seus verdadeiros pais foram mortos pelos nazistas... Por serem judeus.O Mestre parou a menos de meio metro de Josh, espada ainda desembainhada.- Pura mentira.Josh manteve sua posição.- O comandante do campo de concentração era um membro dos Guardiões. Ele sabia que seu pai adotivo era estéril e que precisava desesperadamente de um herdeiro do sexo masculino. E tomou as providências para contrabandear um bebê para Israel.- Você errou a vocação - zombou o Mestre. - Definitivamente devia ter sido romancista.

Josh inclinou-se na direção do demônio, sem recuar.- Uma agência judia ajudou a colocar a criança com o que pensava ser uma família de judeus ricos. Mas os Paul não eram judeus, eram, Alexander?Atônito, o Mestre deu um passo de lado e Josh tirou vantagem do momento para arrancar-lhe a máscara. Os olhos perturbados de Alexander Paul fixaram-se nos dele.Paul soltou um urro desumano e começou a brandir a espada loucamente no ar. Josh atirou-se nas pernas do homem, derrubando a ambos, ao mesmo tempo que a espada rolava ruidosamente no chão. Josh deu-lhe um soco no rosto e imobilizou o homem aturdido com todo o peso do seu corpo.- Sei tudo sobre seu grupo religioso - disse Josh, olhar fixo no rosto do mal. - Quando seus seguidores fugiram do esconderijo de Jerusalém, deixaram para trás uma Bíblia. Soube que vocês eram marcionitas no momento em que vi que ela continha apenas os escritos de Lucas e Paulo. Mas os marcionitas desapareceram no 4o século, não foi? Sua seita não passava de uma perversão, um bando de aproveitadores parasitas patéticos.Paul esperneou ferozmente a fim de desalojar Josh, que foi jogado de lado. Sabia que o louco ia querer pegar a espada e não perderia tempo em usá-la. Tinha que chegar lá primeiro. Conseguiu ficar de joelhos, mas, quando olhou na direção em que a espada caíra, não encontrou nada.

Paul pôs-se de pé com um salto e girou na direção de Josh, mas estava desarmado. Os olhares dos dois homens se cruzaram num instante de surpresa, antes que Josh mais uma vez visse a lâmina reluzente da espada cortar o ar por trás do seu adversário.Reagindo à expressão do rosto de Josh, Paul virou-se. Mas foi tarde demais - o arco traçado pela espada encontrou seu alvo, decapitando o Mestre.No mesmo instante em que o corpo sem vida tombou com um barulho surdo, Danielle largou a espada e, com o coração mais aberto que ele imaginara fosse possível, Josh correu para ela.Neste momento preciso, contudo, a porta abriu-se e tanto Danielle quanto Josh viraram-se na direção do som. Um dos homens de Paul avançou correndo. Viu o corpo do seu líder e levantou a arma. Josh correu para derrubá-lo, agarrando-lhe as pernas, mas o assassino disparou em Danielle, atingindo-a em cheio no peito. Segundos mais tarde foi a vez de ele próprio tombar, atingido por um tiro que veio da porta. Uma equipe de segurança invadiu a sala, abaixando as armas assim que viram que Josh era a única pessoa de pé.Ele correu para junto de Danielle. Ela quase não tinha pulso, e seu olhar começava a ficar vidrado.Não a leve, ele rezou, por favor, não a leve. Eu preciso muito mais dela do que Você.Josh pôs as mãos no lugar por onde a bala entrara e rezou ainda com mais fervor. Não podia perdê-

la. O tempo pareceu parar enquanto ele mantinha as mãos no lugar do orifício da bala. Por fim, ele abriu os olhos e fitou a mulher que amava. Danielle tinha os olhos fechados agora, mas o sangramento diminuíra.A segurança já tinha requisitado assistência médica. Josh permaneceu ao lado de Danielle, segurando sua mão, até que os paramédicos chegaram. Enquanto se comunicavam com o helicóptero pelo rádio, ele esquadrinhou a sala, agora apinhada, reconhecendo um dos seguranças que estavam no carro branco. Ele imaginara que o carro fosse do pessoal de Aaron, mas evidentemente não era o caso. Um momento mais tarde, Giuseppe e Goner apareceram correndo na porta. Ficaram observando enquanto Danielle era colocada em uma maca.- Sinto muito, Josh - disse Giuseppe.O paramédicos começaram a empurrar a maca de Danielle na direção da porta.- Vou com ela - disse Josh, deslocando-se na mesma direção.- Temos um segundo helicóptero que seguirá o do salvamento — disse Giuseppe. — Por que não vem conosco? Temos muito que conversar.Josh sacudiu a cabeça.- Não a deixarei.Goner foi conferenciar com os paramédicos e retornou momentos depois.- Ela está em condição crítica, mas estável. Não sei explicar, mas parece que a hemorragia parou antes mesmo que começassem a tratar dela. Por

enquanto, pode-se considerar Danielle fora de perigo.- Vou com ela de qualquer maneira - insistiu Josh, impaciente.- O pessoal médico não tem lugar extra no helicóptero deles. Pedem para que os encontremos no hospital.Relutante, Josh concordou, enquanto Danielle foi levada embora. Ele abaixou a cabeça e contemplou o sangue - sangue de Danielle - que tinha nas mãos.

Capítulo 71

JOSH, GIUSEPPE E GONER SEGUIRAM EM UM HELICÓPTERO DA SEGUrança de Israel para o Hospital Hadassah, em Jerusalém. O helicóptero de Danielle seguiu apenas alguns minutos antes deles. Josh procurou no céu, mas não viu nada.- Como foi que vocês nos encontraram? - perguntou Josh, tendo que gritar para se fazer ouvir sobre o barulho dos rotores do aparelho e tentando não se deixar consumir de preocupação.- Tínhamos homens vigiando você e Aaron, além de termos nossos próprios homens no caso - disse Giuseppe. - Sabíamos que uma hora um ou todos iriam descobrir alguma coisa.Josh virou-se para os outros homens.

- Meu instinto me dizia que Aaron não prestava, mas não tive certeza senão ontem.- Ele está sob investigação há mais de um ano — informou Giuseppe. - Sabíamos que estava bancando o agente duplo e aceitava suborno, e o ajudamos a assumir uma situação nos Guardiões porque tínhamos razão de acreditar que ele acabaria nos conduzindo até eles.- Se não tivesse sido assassinado hoje, iria passar um período enorme na cadeia.O celular de Giuseppe tocou. Ele ouviu por alguns momentos e fechou-o com um estalo.- Era um de nossos agentes com mais detalhes da cena. Antes de os encontrarmos, nós nos envolvemos em uma troca de tiros em outra parte do esconderijo. Oito dos Guardiões foram mortos e três severamente feridos.- Algum relatório sobre os nossos homens? - quis saber Goner.- Dois feridos, mas não seriamente - respondeu Giuseppe, antes de virar-se para Josh. - Pegamos o grupo de surpresa. Estavam vestindo os mantos e somente dois tiveram tempo de atirar.- Por que então foi tão grande o número de mortos entre eles? - perguntou Josh.- Eles estavam indo pegar suas armas. Nós os pegamos antes que pudessem puxar o gatilho. Um deles correu, o homem que alvejou Danielle. Mas, como você sabe, nós o matamos também...- Espere um minuto - interrompeu Josh. - Vocês pegaram onze dos Doze Escolhidos e Danielle matou o líder, Alexander Paul. Isto quer dizer que

ainda há um Guardião por aí. Ou fugiu ou não estava presente.Goner sacudiu a cabeça.- Foi impossível alguém fugir. Nós cercamos o prédio.Josh pensou por um momento e teve um lampejo.- Alon foi um dos mortos?Giuseppe olhou para seu telefone celular como se esperasse que dele viesse a resposta.- Ainda vou confirmar, mas não acho que ele estivesse lá.Josh assentiu.- Claro. Paul era esperto o bastante para manter seu filho em segurança para o caso de algo dar errado. Acho que ele não era tão convicto assim de ser invencível.- Se Alon não estava entre os mortos ou capturados, começaremos uma perseguição a ele imediatamente. - Pela janela, Giuseppe contemplou a terra passando embaixo deles. - Sabemos agora quem dava todas as informações aos Guardiões.- Sim - concordou Josh. - Jonathan, Aaron, Alon e Moshe.- Moshe? - Tanto Goner quanto Giuseppe ficaram chocados.- Moshe involuntariamente passava informações aos outros três. Não fazia parte dos planos dos Guardiões, mas quase os ajudou a realizá-los.- É espantoso: metade da sua equipe de arqueólogos direta ou indiretamente trabalhou

para destruir o pergaminho e ainda assim não tiveram êxito.Josh cerrou os olhos por alguns segundos.- Na maioria das vezes os bandidos saem perdendo.- Não encontramos Jonathan - disse Goner.- Encontraram sim - contrapôs Josh. - Encontraram as cinzas dele.Giuseppe balançou a cabeça pensativamente.- Conte como foi que descobriu a informação sobre o passado do Mestre.- Ironicamente, tive ajuda do Aaron. Segui o rastro de alguns dos documentos que ele me trouxe até uma agência judaica que se encarregava das adoções na Palestina de 1943. Eles mantinham registros meticulosos. Apenas um dos bebês veio de Dachau."Os nazistas tratavam as crianças e bebês judeus como os adultos: eles os matavam. Este, contudo, foi supostamente contrabandeado do campo de concentração porque os pais desejavam que fosse criado na Palestina. O único modo que um bebê poderia sair do campo era com permissão do comandante. Os Guardiões e os nazistas partilhavam pontos de vista semelhantes. Meu palpite é de que o comandante fosse ligado aos Guardiões de algum modo."- Mas por que dar um bebê judeu ao pai de Alexander Paul?- Ele devia saber que o pai de Paul espionava para os nazistas na Palestina e queria adotar uma criança. Provavelmente deleitou-se com a ironia

da oportunidade. Veja bem, ele colocou uma criança judia em um lar supostamente judeu sabendo que seria educado de forma a odiar seu próprio povo. Há muitos precedentes, claro. Alguns dos piores anti-semitas da história foram judeus, inclusive o fundador dos Guardiões, ou judeus que não sabiam serem judeus, como o Mestre.- Uma vez que descobri que os Paul tinham adotado o bebê, foi fácil traçar a história da família. Tornaram-se judeus convertidos imediatamente após a Declaração de Balfour, em 1917. Sentiram os perigosos ventos da mudança e acharam melhor, tanto politicamente quanto para sua missão, usar o subterfúgio de serem judeus.- Você devia trabalhar para o Mossad - disse Goner, mas Josh não respondeu.O telefone de Giuseppe tocou de novo.- Alon está desaparecido — informou, depois de desligar. - Não consta da relação de mortos ou feridos.Josh já havia presumido isto.- Considero Alon extremamente perigoso. É provável que já saiba o que ocorreu no esconderijo. Há outros Guardiões além dos Doze Escolhidos. Alon deve ser interrompido antes que tenha uma chance de reorganizar o grupo.Quando o helicóptero começou a descer na direção do terraço do hospital, Josh viu Danielle sendo retirada do aparelho por uma equipe de médicos em seus jalecos brancos.

Fique comigo, Danielle, pensou ele, falando com ela silenciosamente em sua cabeça. Fique comigo, por favor.Giuseppe passou a mão pelo ombro do arqueólogo.- Josh, você deveria estar satisfeito com o que realizou no dia de hoje.- Satisfeito? Acho que não. Antes de mais nada, se eu não tivesse encontrado o manuscrito, Michael, padre André e o reverendo Barnaby ainda estariam vivos. Eles eram boas pessoas.- Estão com Deus agora - disse Giuseppe. - E, de certo modo, ajudaram você a destruir os Guardiões.- Nem todos os Guardiões foram destruídos, Giuseppe - retrucou Josh, abatido. - Garanto a você como voltarão.

Capítulo 72

GIUSEPPE RETORNOU AO QG A FIM DE BUSCAR DOCUMENTOS, AO passo que Josh e Goner entraram correndo na emergência do Hadassah. Goner aproximou-se de uma enfermeira, mostrou sua identidade e ela dirigiu-se aos dois homens com um sussurro.- Seu estado é crítico - foi o que disse a enfermeira. — Normalmente ninguém seria autorizado a vê-la.Goner começou a dizer alguma coisa e a enfermeira levantou uma das mãos. - Mas isto obviamente é uma questão de segurança nacional.

Danielle se encontra no quarto nove. Mandarei que uma enfermeira os acompanhe.Josh foi rezando silenciosamente à medida que avançava pelo corredor. Tentou fazer com que seu coração sentisse a presença de Danielle, a fim de ter uma idéia de como estava se saindo naquela luta. Tudo que conseguiu foi uma levíssima sensação: Danielle ainda estava viva, mas por um fio.Quando entraram no quarto, Josh viu os médicos cercando a inconsciente Danielle, trabalhando freneticamente.- O que está acontecendo? - perguntou Josh, abrindo passagem à força para se colocar no meio dos médicos.- Quem é você? - perguntou um deles irritado. - Chamem a segurança!Goner exibiu sua identidade de novo e o médico assentiu, claramente irritado com a interrupção.- Preciso estar perto dela — disse Josh.Mas o médico o puxou para longe da cama de Danielle.- Você não pode se aproximar agora. Estamos tentando salvar a vida desta mulher.- Conte-me o que está acontecendo.Ele olhou para trás, avaliando a situação, e viu que o resto da equipe médica tinha tudo sob controle. Aí então se virou outra vez para Josh. Parecia relutante em transmitir qualquer informação, mas finalmente cedeu.

- Ela perdeu muito sangue e seus sinais vitais estão extremamente baixos. Havia mais hemorragias internas do que nossos paramédicos perceberam. Estamos com dificuldades para fazer cessar as hemorragias.Josh adiantou-se para o lado da cama.- Posso ajudar.O médico agarrou Josh pelo ombro e obrigou-o a se virar.- Olha, você não devia nem estar aqui. Estamos fazendo o melhor de que somos capazes. Você deve esperar no saguão até que tenhamos algo a relatar.Josh sacudiu-se para se livrar das mãos do médico.- Eu disse que posso ajudar.Em seguida ele empurrou dois médicos para um lado e segurou a mão de Danielle. Outro médico adiantou-se para tentar detê-lo, mas Goner se meteu.- Deixe o homem fazer o que ele precisa fazer.- A mulher está em condições extremamente críticas - disse o segundo médico, uma veia latejando na testa. - Ele está nos impedindo de ajudá-la.Goner não cedeu.- Pode ser que ele seja sua única chance.Josh tentou bloquear toda a conversa e distração. Fechou os olhos e, mergulhando fundo no seu inconsciente, começou a visualizar o interior do corpo de Danielle. Tinha feito cessar uma hemorragia lá no esconderijo dos Guardiões, mas

não fora o bastante. Viu que havia sangramento em seu peito e intestinos.Sabia que aquela seria sua única oportunidade de salvar Danielle. Aprofundou mais ainda o nível de sua meditação, abrindo- se para a energia curativa do Um universal. Em sua mente, ele projetou uma luz branca nos ferimentos de Danielle, banhando com seu brilho curativo a carne ferida e os órgãos internos. Sentiu que as mãos ficavam quentes enquanto as mantinha sobre o seu grande amor e foi só quando a luz começou a perder, sozinha, a intensidade que as retirou para que ela fosse examinada de novo. Seus ferimentos internos tinham cicatrizado.- Não é possível! - exclamou um dos médicos quando Josh retornou do seu estado de meditação. - O pulso e a pressão começam a voltar ao normal.- Ela vai ficar bem agora? — quis saber Goner.- Eu... Eu acredito que sim - a expressão do médico era de total incredulidade.- Não perguntei a você - disse Goner. - Estava perguntando a ele. - Goner fitou Josh diretamente nos olhos.Josh lançou um olhar de agradecimento a Goner e depois se voltou para Danielle.- Ela vai ficar bem.Goner hesitou, mas depois murmurou.- Josh, posso ter uma palavrinha com você no saguão?Quando Josh finalmente conseguiu desviar a atenção de Danielle, viu que a expressão de Goner não podia ser mais séria.

- Só um momento - disse. - Quando ela abrir os olhos quero ser a primeira pessoa que verá.

Capítulo 73

GONER E JOSH SENTARAM NO SAGUÃO DESERTO E SILENCIOSO DO Hospital Hadassah. Nas primeiras horas da manhã, sem ninguém por perto a correr de um lado para outro, o lugar parecia sinistro e agourento.- Um truque e tanto que você fez lá dentro - disse Goner.Josh não soube o que dizer.- Os médicos vão querer fazer algumas perguntas.- Pois terão que procurar as respostas em outra parte - confessou Josh. - Acho que sei de onde vem isso, mas estaria mentindo se afirmasse que posso explicar o que acontece.- Tem alguma coisa a ver com o manuscrito?Josh contemplou as mãos, desejando poder oferecer uma explicação simples.- Alguma coisa, sim. E muito mais a ver com algo muitíssimo maior. Estou começando a compreender agora.Goner levantou-se e deu um tapinha no braço de Josh.- Bem, vamos ter que imaginar algo oficial para constar no arquivo. E melhor eu falar com aqueles médicos e me assegurar de que a notícia não se espalhará. Depois vou para casa tentar dormir um pouco. Você devia fazer o mesmo.- Meu lugar é no quarto de Danielle. Por todos os tipos de razão.- Quer que eu fique com você?

- Não precisa. Eu me viro sozinho.Goner levantou a mão e Josh estendeu a própria para apertar a de Goner. Só aí ele viu que estava lhe entregando uma pistola.- Pode ser que você ainda precise disso.Josh embolsou a arma e agradeceu.Depois que Goner foi embora, Josh voltou para o CTI. O quarto estava consideravelmente mais vazio e apenas uma das enfermeiras originais permanecia. Ela verificava as marcações de diversos monitores e transmitia as respectivas leituras para um médico que Josh ainda não vira. Mas reconheceu imediatamente os olhos azuis atrás da máscara cirúrgica.- Enfermeira, ajude aqui - o médico estava dizendo na hora em que Josh entrou. - Vamos levar a paciente para o quarto. - Ele virou-se e notou Josh.- Quem é você?- Estou com ela.O médico sacudiu a cabeça.- Não esta noite.Josh deu um passo na direção dele. Quebraria seu pescoço se fosse preciso.- Ele pode - interveio a enfermeira. - Acho que é noivo dela. Foi liberado pela Segurança.O médico resmungou, mas cedeu.Você não tem escolha e sabe disso, seu filho-da-mãe, pensou Josh.Empurraram o leito de Danielle para um quarto particular grande e que cheirava à líquidos de limpeza e medicamentos.

- Depois de instalá-la confortavelmente - disse o médico -, por favor, deixe-nos a sós.Ela assentiu, completou seu trabalho e deixou os dois homens sozinhos com Danielle. Josh torceu para que ela permanecesse inconsciente por um espaço de tempo que permitisse não ver o que estava por acontecer. Ela já passara por problemas demais.Assim que a porta foi fechada, o médico desistiu de todos os fingimentos e encarou Josh com óbvio desdém.- Pare de fingimentos, Josh. Você sabe muito bem quem eu sou.- Claro - respondeu Josh, conservando a voz firme apesar de tudo. - Estava esperando por você, Alon.- Por sua causa, meu pai está morto.- Seu pai foi o culpado da própria morte.- Você percebe, é claro - contrapôs Alon - que ele só está morto em sua forma física. Seu espírito continua poderoso como sempre.Josh não duvidava que isto fosse verdade.- Vamos tratar de um plano de existência de cada vez.Alon arrancou a máscara cirúrgica.- Você é tão pretensioso. Mas essa sensação de falsa superioridade moral será a sua ruína.- Seu pai fracassou, Alon. Os Guardiões falharam. Reconheça, e pode ser que consiga evitar a danação eterna.Alon deu uma gargalhada.- Quem poderia adivinhar que você é tão engraçado, Josh? Deixa que eu lhe diga o que

realmente vai acontecer. Primeiro, vou acabar com essa sua vidinha menor. Depois vou levar Danielle - minha irmã - para longe daqui, e honrar a memória do meu pai. Quando ela estiver mais forte, produziremos um herdeiro e, depois que ela tiver cumprido sua tarefa como um vaso, eu a mandarei ao seu encontro, OK?Alon avançou contra Josh empunhando uma faca cirúrgica comprida. O movimento foi tão rápido que Josh quase não conseguiu se desviar. Alon tentou de novo e Josh abaixou-se e desferiu um soco na têmpora de Alon. Este, que evidentemente não esperava por aquilo, tombou de joelhos enquanto a faca caiu com estrépito no chão.Josh aproveitou para sacar a arma que Goner lhe dera. Não tinha certeza se seria capaz de usá-la, mas Alon não precisava saber disso.- Acabou, Alon.Mas o rosto do homem adquiriu uma expressão selvagem quando ele soltou um grito inumano e pôs-se de pé. Josh não teve outra escolha senão atirar. Por uma fração de segundo, Alon ainda o fi-tou com uma expressão de pura perversidade no olhar e desabou.Josh ajoelhou-se junto do homem caído. Ainda respirava.- Você não sabe contra quem você está lutando - murmurou o filho do Mestre, com a voz rascante, o sangue jorrando do lado do pescoço. - Você é um homem contra um exército mais poderoso que imagina.

Mas Josh não estava ouvindo o que Alon dizia. Estendeu as mãos e as manteve sobre o moribundo. Rezou para que ele pudesse se desfazer de sua amargura, para que a luz curativa pudesse limpar o ódio que sujava a alma deles dois. Mas era tarde demais. Alon inspirou ruidosamente uma última vez e morreu.

Capítulo 74

A POLÍCIA FOI A PRIMEIRA A CHEGAR. MINUTOS MAIS TARDE GONER E Giuseppe chegavam, na companhia de Moshe, que foi diretamente para a cabeceira da filha. Beijou-lhe a testa e segurou sua mão, depois olhou para Josh.- Eu soube o que você fez aqui hoje.Josh contemplou o rosto de Danielle, tão tranqüilo, tão perfeito. E só foi capaz de sorrir. Moshe sorriu também, os olhos marejados de lágrimas.- Devo-lhe um pedido de desculpas, Josh. Disse que você não estava à altura de minha filha, eu estava errado.Josh sentiu o coração amolecer. As últimas horas tinham sido um verdadeiro turbilhão.Giuseppe fez um sinal chamando Josh para um canto do quarto.- Não sei como foi que Alon passou pela nossa segurança - disse.- Meu palpite é que ele não passou. Chegou aqui antes que seus homens tivessem assumido. Nessa hora devia haver apenas um detector de metais.

Ele chegou desarmado e foi entrando. Você o conheceu: ele era brilhante, manipulador e determinado, exatamente como o pai.- Eu cuido da polícia - disse Giuseppe -, mas eles vão querer mais tarde uma descrição completa do que houve.A porta abriu-se de novo e um policial uniformizado entrou, seguido por três funcionários do hospital com uma maca. Ergueram o corpo de Alon e o levaram embora, ficando um dos homens para trás a fim de limpar o sangue empoçado no linóleo cheio de arranhões.Josh ainda não podia acreditar que tivesse usado a arma. Não tivera escolha, claro, mas assim mesmo aquilo o deixara abalado.Não haveria mesmo um outro jeito? Haveria alguma parte dele que desejara fazer aquilo? Josh reviveu mentalmente a cena — o disparo, sua hesitação ao estender as mãos sobre o ferimento. Por que a energia curativa não fluíra? Será que no momento oportuno alguma parte do seu ser teria se recusado a ajudar? Ou o dano causado pela bala teria sido demasiado? Josh não tinha respostas e por isso expulsou as perguntas da mente.Pegou a mão de Moshe e, delicadamente, puxou-o para longe da cabeceira de Danielle.— Eu sei que Danielle foi adotada - murmurou.Moshe ficou lívido.— Por favor... Não conte a ela. Danielle não sabe de nada.

— Não contarei. Fica entre nós dois. Mas quando ela melhorar, você deveria lhe dizer - Josh respirou fundo. - Tem outra coisa...Mas a atenção de Moshe tinha retornado à Danielle.— Hem? - ele perguntou, olhando para trás, como se quisesse verificar se ela ainda estava deitada.Josh percebeu que nenhum bem adviria se ele lhe contasse quem a filha era de verdade. Limitou-se a dar um tapinha nas costas dele e dizer, simplesmente:— Nada.Em seguida virou-se para Giuseppe e Goner.— Preciso falar com vocês.— Quer ir tomar um café?— Não, obrigado. Preciso ficar aqui com a Danielle.Giuseppe assentiu e conduziu Josh para o pé da cama.— Os Guardiões são mais poderosos que eu pensava - disse Josh. - Imaginei que se matássemos o Mestre e destruíssemos os Doze Escolhidos, estaríamos livres deles. Percebo agora que eu estava errado. Dois mil anos é tempo mais que suficiente para construir uma organização poderosa, especialmente quando o combustível que mantém o fogo aceso é o ódio do fanatismo.— Você tem razão - concordou Giuseppe. - Nossos relatórios apresentam uma estimativa de três mil membros em mais de vinte países. Os asseclas do Mestre não passavam de uma tropa de choque, mas alguns dos membros da seita são homens de

influência e poder. A maioria está na Europa Ocidental e nos Estados Unidos, não em Israel. Eles olham para Israel do mesmo modo que os católicos olham para Roma. Não dedicamos a eles a atenção que mereciam porque desde 1948 vêm mantendo muita discrição e não nos causaram problemas. Isso mudou quando você descobriu o pergaminho.— O pergaminho - repetiu Josh, esfregando a testa. - Eu sei. Tem tanto a oferecer, mas o preço foi considerável, não foi?— Tudo isto teria emergido de qualquer maneira um dia - assegurou Goner. - O pergaminho só funcionou como agente catalisador.— Mas você tem razão quanto ao preço - interveio Giuseppe. - Por isso mesmo decidimos não autorizar sua publicação.A notícia deixou Josh atônito.— Por quê?— Não é a ocasião adequada. O governo avaliou a situação com cuidado e o clima aqui já está politicamente carregado demais. O pergaminho é demasiadamente controverso...Josh não acreditou.— Pois aquele rolo de pergaminho, aos cuidados do Museu de Israel, poderia ser uma fantástica atração turística. Mesmo que não fosse autenticado, poderia ser apresentado como as possíveis palavras de Jesus. Veja só o mundo de gente que visita o Sudário de Turim, mesmo depois dos testes de carbono 14 terem provado que é uma fraude.

— Pode ser que um dia nós o liberemos. Mas você mesmo o definiu bem: é demasiadamente explosivo. E ainda há muitas coisas que não sabemos a respeito dele. Sabemos que o pergaminho é autêntico, mas terá sido realmente escrito por Jesus? Joseph era um nome comum dois mil anos atrás, e inúmeros deles podem ter tido filhos chamados Joshua. E possível que centenas de homens chamados Yehoshua ben Yosef vivessem e escrevessem naquele tempo.Josh aproximou-se mais dele.— O manuscrito foi escrito por Jesus de Nazaré. Sei disso. Olhe só para o texto. Algumas das histórias são similares às do Novo Testamento, e as que não são têm o mesmo espírito.— Não discordo de você - contrapôs Giuseppe -, mas há partes dele que podem atrair atenção negativa. Nosso país é muito sensível à opinião mundial. Não temos escolha senão usar muita discrição numa hora destas.Josh ainda não estava pronto para ceder.— O pergaminho é puro; é a fonte original. O mundo tem direito a tomar conhecimento de sua mensagem. Precisamos dela mais que nunca. Além do mais, Jesus foi traído 2.000 anos atrás. Merece finalmente ser ouvido.A expressão de Giuseppe tinha um quê de culpa.— Josh - disse ele, mudando de assunto -, mesmo que o governo não tivesse decidido impedir a liberação do pergaminho, eu queria lhe fazer algumas perguntas a respeito dele.— O que é que você quer saber?

— Eu não li o manuscrito - murmurou Giuseppe - mas há muita especulação a respeito dele entre as agências envolvidas. Suspeitamos que você seja a única pessoa que traduziu o texto inteiro.— Traduzi a maior parte.— Então, como acha que os diferentes grupos reagirão ao que diz no pergaminho?Josh considerou a pergunta por um momento. Queria poder pensar que as pessoas seriam capazes de enxergar além de seus próprios dogmas e ver a mensagem de união contida no manuscrito, mas sabia que isso seria querer demais.— Não se pode prever com segurança nenhuma reação - disse. - Depende daquilo em que as pessoas acreditam.— Que tipo de reação você espera?— Se o manuscrito for autenticado como obra de Jesus certamente fará com que os teólogos reavaliem sua posição. Há pontos comuns no texto com a imagem de Jesus que os cristãos progres-sistas já formaram. No entanto, pode ser perturbador para os fundamentalistas e tradicionalistas por não validar a divindade de Je-sus ou a maneira literal como interpretam o Novo Testamento. A mensagem do manuscrito repercutiria por toda a cristandade e acenderia numerosos debates entre estudiosos da religião, clérigos e pessoas religiosas em geral.— E o nosso povo, como você imagina que reagiria? - indagou Giuseppe.— As pessoas que não forem praticantes...

— Como a maioria dos israelenses.— Vão achar ao mesmo tempo irônico e satisfatório.— Satisfatório?- Jesus demonstra grande preocupação e amor pelo seu povo... os judeus.— Seria surpreendente, depois que tantos de nós fomos mortos em nome dele - disse Goner, olhos arregalados.— Esta é a parte irônica — explicou Josh. - Jesus nunca matou ninguém. Pessoas que tinham seus próprios desígnios reescreveram partes do Novo Testamento tendo em vista esses desígnios. Sempre há indivíduos e governos que procuram bodes expiatórios quando não conseguem resolver seus problemas. Veja só o caso dos Guardiões.Giuseppe virou o rosto e deixou seu olhar perder-se na distância. Josh só podia tentar adivinhar o que se passava na sua cabeça. Um dia aquela discussão seria mais do que simples especulações. Um dia o mundo todo veria o pergaminho. Era importante demais para permanecer em segredo.Danielle ainda dormia e Moshe aproximou-se deles para participar da conversa.— Vou encontrar um modo para convencer vocês todos de que o autor do manuscrito é Jesus - disse Josh.Moshe pôs a mão no ombro dele e apertou carinhosamente.— Faça isso, Josh. Muitos de nós adorariam acreditar. Mas não tenho certeza se isso

modificaria nossa decisão de não publicar o manuscrito.Josh fechou a cara.— Veremos - disse. Fez uma pequena pausa para avaliar os homens que o rodeavam. - O que é que vocês sabem a respeito de São Paulo?Giuseppe e Goner deram de ombros, mas Moshe disse que lera muito a respeito dele.— Você sabia - perguntou Josh a ele - que no ano de 49 da Era comum, Tiago, irmão de Jesus, e Pedro, seu discípulo favorito, se encontraram com Paulo? Claro que Tiago e Pedro conheciam Jesus pessoalmente; Paulo não. Isso ocorreu vinte anos depois da morte de Jesus. Tiago e Pedro eram responsáveis pela seita de Jerusalém que seguia os ensinamentos de Jesus, muito embora con-tinuassem a seguir os preceitos do judaísmo. Segundo a história, a reunião terminou com uma solução de compromisso em que Paulo concordou em abdicar da circuncisão desde que mantivesse os costumes alimentares judaicos quando pregando e convertendo os gentios.— Mas a história é escrita pelos vencedores. Os seguidores de Jesus em Jerusalém detestavam Paulo e tinham boa razão. Ele nunca seguiu o que combinara; ao contrário, prosseguiu agindo de acordo com suas idéias, que não eram as mesmas dos discípulos de Jerusalém. O cristianismo nasceu no mesmo ano, logo após o Concílio de Jerusalém.— Por que nos conta isso agora? - quis saber Moshe.

— Tenho pensado nesses acontecimentos desde que eu... me encontrei com Alon. Ele disse algo sobre como os Guardiões eram determinados que me levou de volta a Paulo.Josh notou que Danielle começava a querer se sentar.— Cavalheiros, por favor, podem nos deixar a sós?

Capítulo 75

O ROSTO DE DANIELLE ESTAVA PÁLIDO E SUA VOZ FRACA, MAS QUANDO seus olhos se abriram, tinham o mesmo brilho de sempre.— Sonhei que você estava aqui - disse ela, e Josh mal pôde crer em como se sentiu feliz por ter atendido ao sonho dela.— Acho que isso faz de mim o homem de seus sonhos - disse ele, com um sorriso enlevado. Danielle riu, mas seus ferimentos eram muito recentes e o movimento causou dor. Estava com tubos e sensores por toda parte e Josh não queria machucá-la, mas precisava desesperadamente abraçá-la. Sentou-se ao seu lado na cama e envolveu-a o mais delicadamente que pôde com seus braços, beijando-a de leve no rosto. Quando recuou, seu rosto estava molhado, embora Danielle não parecesse ter chorado.Ele a beijou no nariz e depois, com mais cuidado ainda, nos lábios.— Sempre acreditei que viveríamos este momento.

Danielle tocou ternamente nos lábios dele.— Eu também me obriguei a acreditar na mesma coisa. Houve dias.... - Ela fechou os olhos e não foi preciso muita imaginação para que ele soubesse o que pensava. - Mas eu continuei acreditando.— Ninguém pode machucar você agora. O Mestre e os Doze Escolhidos estão mortos.— Era Alexander Paul - disse Danielle, como se estivesse se lembrando agora após longo tempo.— Era.— Ele sempre pareceu ser um bom homem.Uma sombra toldou a fisionomia de Josh.— Dizem que o demônio usa muitos disfarces.Danielle ficou um segundo calada, parecendo perdida em seus pensamentos.— Fui eu... Fui eu que o matei?Josh pensou na culpa que sentira por ter matado Alon e perguntou-se se deveria poupar Danielle de sofrimento similar.— Com uma espada - acrescentou ela. - Aquilo foi real, não foi?Josh acariciou-lhe a mão, beijou-a e encostou-a no seu rosto.— Foi real sim. Na verdade, você foi extraordinária.— Como vim parar aqui?— Um dos capangas de Paul atirou em você. Mas está morto agora. Um agente de segurança o abateu.— Todos os outros estão bem? Meu pai?

— Seu pai está ótimo, mas alguns dos outros não tiveram tanta sorte. Paul fez uma porção de coisas terríveis.Danielle respirou fundo e procurou se sentar, mas a tentativa foi além de suas forças e ela caiu deitada de novo.— Falamos sobre isso depois, quando você se recuperar. Neste exato momento você só precisa saber duas coisas. A primeira é que vai se recuperar inteiramente.Uma expressão de imenso alívio iluminou seu rosto.— Qual é a segunda?— Que de acordo com meus planos nós vamos ficar velhinhos juntos.Ela sorriu, travessa.— É uma promessa?— É definitivamente uma promessa.Enquanto a segurava bem juntinho de si, Josh pôde sentir o ritmo sincopado de seus corações passar aos poucos a bater em uníssono. Ele sabia que a história dos dois estava apenas começando e que era muito provável que viesse a ter muitos desvios inesperados pela frente; mas faria tudo que pudesse para manter a promessa.

Capítulo 76

DANIELLE CAÍRA OUTRA VEZ EM SONO PROFUNDO, MAS JOSH CONtinuou sentado na cadeira ao lado da cama. Pela primeira vez em semanas não tinha um

objetivo claro. Os Guardiões estavam longe de terem sido derrotados e ele sabia instintivamente que seu caminho se encontraria de novo com o deles; no momento, porém, aquele era o único lugar em que queria estar.Sabendo que Danielle certamente levaria horas adormecida, Josh fechou os olhos e começou a meditar. Invocando as imagens armazenadas em sua memória, começou a ler. Agora que a ameaça iminente passara, descobriu que a tradução surgia pronta quase que instantaneamente:

A existência do mal no mundo só pode ser atribuída à humanidade. Enquanto declarar guerras, o homem será um selvagem, pois a guerra é um ato selvagem que bloqueia a luz. Dia virá em que haverá justiça neste mundo injusto. Quando todas as pessoas utilizarem seu potencial, o impossível acontecerá.A escuridão e o mal serão derrotados e a luz governará o mundo. A luz brilhará sobre todas as gerações de homens e mulheres que levarem vidas de amor e retidão. Eles conhecerão seu destino e se encontrarão com Deus.Isaías diz que haverá um servo agonizante, mas eu vejo um povo que sofre. Tenho visões assustadoras do meu povo sendo perseguido e a um passo da destruição. Os servos agonizantes são o meu povo. Meu pior temor é vir a ser envolvido diretamente na calamidade do meu povo, embora a maior das tragédias que se

abaterão sobre ele esteja distante centenas de milhares de dias.Depois da grande destruição, vejo seitas de gentios ainda por nascerem, batalhando umas contra outras e trazendo a destruição ao mundo. Combaterão até a morte massacrando muitos em nome dos seus deuses. Quando os humanos enfrentarem a pior hora, a hora da aniquilação, quando ninguém mais conseguir respirar, uma luz aparecerá. Essa luz banhará os adversários com amor e compreensão e a tolerância predominará.O Messias um dia virá, mas não virá do modo como as pessoas esperam. A profecia foi cumprida? Há paz na Terra? Homens e mulheres irmanados reinarão sobre a Terra? Ainda não aconteceu. Mas nada receai, pois esse dia che-gará. Haverá muita dor e sofrimento, e muito sangue correrá de agora até lá, mas o bem existente nos homens vencerá o mal.Quando o homem estiver à beira do precipício, quando o fim dos dias parecer mais próximo que nunca, aí então meu sangue aparecerá. Ele anunciará esperança para a humanidade. Será abençoado com poderes que o mundo jamais viu. E, no entanto, assim poderão ser as suas gerações futuras. Ele mostrará o caminho. Só então o meu trabalho será completado. Selei este rolo de pergaminho com o meu próprio sangue como testamento de minhas palavras.Quem quer que encontre este pergaminho deve ajudar a entregar a mensagem que ele contém. Em dois mil anos, no dia em que a lua cobrir o sol por mais tempo e o mundo ficar na escuridão,

uma batalha colossal terá início. Jamais terá havido tanto fogo e a maioria não sobreviverá. O desastre deve ser evitado antes que a centelha acenda o fogo que calcine a terra e disperse as almas de toda humanidade.

Josh começou a sair do transe, mas, pela primeira vez, sentiu que o caminho de volta para a consciência estava bloqueado. Havia algo mais que precisava ver — algo relacionado à mensagem que aparecia nas passagens finais do manuscrito.Como se outro poder tivesse assumido temporariamente o controle, ele sentiu que mergulhava cada vez mais no seu inconsciente. Lá ele viu um conjunto de números, os mesmos que decodificara no início da tradução do manuscrito:

155778

Os números esmaeceram e ele retomou sua consciência normal. Como sempre, sentiu-se leve logo que emergia da meditação. Os números, contudo, permaneceram fixos na sua memória, 155778. Tinha pensado antes no significado deles. Agora, contudo, entendeu que eram diretamente relacionados com a mensagem final de Jesus no pergaminho - a previsão de um conflito dois mil anos depois de sua morte, conflito esse que destruiria a maior parte do mundo. Será que aqueles algarismos formavam uma data? Neste caso, não faziam sentido.

A menos que fosse no calendário judaico - o calendário que Jesus teria usado. 155778.Josh pensou de novo na profecia do manuscrito de que a batalha final ocorreria no dia mais escuro da Terra. Mas seria uma charada? Neste caso, o que significaria? Considerando-se o significado literal de suas palavras, Jesus poderia estar se referindo a um eclipse; Josh sabia, porque já estudara isso, que o mais longo eclipse lunar do século XXI ocorreria a 27 de julho de 2018.No calendário judaico essa data corresponderia a Av 15, 5778, 155778.Era esta a mensagem que Josh necessitava ouvir. Nesse dia, a menos que a queda livre da humanidade na direção de sua própria destruição fosse, de algum modo, interrompida, a maior catástrofe da história humana teria lugar.Daqui a pouco mais de uma década.

Quem quer que encontre este pergaminho deve ajudar a entregar a mensagem que ele contém.O tempo descuidado de Josh sem uma missão, tinha durado menos que uma hora. Não tinha idéia de qual seria seu primeiro passo, mas sabia o que tinha de fazer.Danielle mexeu-se na cama, mudou um pouquinho de lugar e voltou a se acomodar.Eu lhe prometi um futuro, pensou ele. Talvez não seja pacífico, mas será nosso.

Capítulo 77

JOSH COLOCOU SEUS PERTENCES DENTRO DO JIPE ALUGADO E RUMOU de volta para o deserto. Danielle fizera significativo progresso nos últimos dias - o bastante para que ele lhe proporcionasse o tempo de que tanto necessitava para se acertar novamente com o pai. Havia algo que Josh precisava fazer, algo que percebera assim que lera as passagem finais do manuscrito. Tinha três pontos para demonstrar em apenas dois dias.Bem no fundo dos subterrâneos da Cidade Antiga, Josh retornou ao túnel que visitara antes. Sozinho, arrastou-se a uns trezentos metros de profundidade pela passagem sombria que ia dar no seu destino, não muito longe da entrada secreta da igreja do Santo Sepulcro. Parou ao lado da tumba onde rezara a Kaddish pelo mais famoso mártir da história e usou toda sua força para tentar deslocar a laje. A pedra nem se abalou. Empregou todo seu peso e vontade na empreitada, mas ainda assim nada conseguiu.Frustrado e sem fôlego, sentou-se no chão frio para pensar, as costas de encontro à pedra imensa. Do ponto onde se encontrava notou mais uma vez a pequena abertura entre a laje e o chão. Pegou uma pequena pá na mochila e começou a escavar em torno dessa abertura. A impressão que tinha era de que a pedra irradiava uma energia de tristeza que envolveu Josh e cortou seu coração. Instintivamente, começou a cavar mais fundo, banhado de suor, aplicando toda a determinação

que pôde reunir. Até que o solo duro começou a ceder e em questão de vinte minutos ele terminou uma pequena entrada.Virou-se para o espaço recém-criado. Seu coração batia com força e a adrenalina fluindo. Sabia que precisava entrar ali, mas não sabia ao certo o que iria encontrar.Estava escuro como breu lá dentro. Josh entrou e simplesmente deixou-se estar parado, sentindo a presença do espaço. Podia afirmar que era pequeno e úmido. Quieto ali na escuridão, sentiu a ressonância de eventos ocorridos há longo tempo. Sabia que era ali o lugar.Mas quando pegou a lanterna e acendeu, vasculhando com o facho de luz a câmara, descobriu que estava vazia. O que esperara encontrar - fantasmas? Despojos humanos? Sabia que não ia encontrar nada desse tipo, e mesmo assim sentiu uma pontada de desapontamento.Deslocou a luz da lanterna outra vez pela câmara, procurando qualquer tipo de sinal em torno da sepultura sagrada. Inacreditavelmente, foi o que encontrou. O facho da lanterna moveu-se por cima de uma prancha de madeira antiga que jazia no chão. Quando a virou, viu que tinha uma gravação em aramaico que dizia: Rei dos Judeus.Ao seu lado havia dois pregos enferrujados. Com uma crosta de sangue.

Josh subiu a estrada sinuosa que levava ao cume das montanhas da Judéia, cerca de 700 metros

acima do nível do mar. De lá de cima podia ver quase toda Jerusalém espalhada diante dele. Era uma cidade notável, mas que vira muito sangue e sofrimento. Melancolicamente, reconheceu que ela continuaria a ver ambas as coisas na década seguinte. Assim fora previsto e ele seria parte dela, e, com otimismo, parte também da solução do problema.Josh contemplou o deserto da Judéia lá embaixo. Sentia a presença daqueles que tinham estado ali em mais de três mil anos. Onde Davi e Salomão tinham morado, os profetas caminhado e Jesus meditara e orara por quarenta dias e quarenta noites.Fechou os olhos e convidou aqueles espíritos a visitá-lo.Um, um, um...Talvez eles tivessem estado ali o tempo todo. Josh deixou as vozes ressoarem em seus ouvidos, sabendo que precisaria delas agora, mais do que nunca em sua vida. E ali, na perfeição daquele momento, sentiu a textura do solo sob seus pés - as pedrinhas trituradas e a superfície irregular da terra árida. Sua missão tinha acabado de começar.

Nota do Autor

O Pergaminho Secreto é UMA MISTURA DE FICÇÃO E ESPECULAÇÃO histórica baseadas em milhares de horas de pesquisa e fatos.

O pergaminho em si é uma especulação histórica. É minha criação, construído a partir de uma síntese de pontos de vista e opiniões sobre o Jesus histórico, sustentada por inúmeros dos principais especialistas em Bíblia.Com exceção dos esconderijos dos Guardiões, todos os locais mencionados no livro são verdadeiros. Muitos deles encontram-se entre os lugares mais sagrados do mundo.As descrições de figuras históricas como Pôncio Pilatos, Marcion, Constantino etc. são, tanto quanto possa afirmar com base em minhas pesquisas e meu conhecimento, precisas.O retrato de são Paulo é especulação histórica, também baseada em extensa pesquisa.Os eventos históricos descritos são factuais, com a exceção do Concílio de Jerusalém, que também é uma especulação histórica.Os Guardiões são baseados em uma seita cristã que existiu por duzentos anos. Este romance presume que o grupo ainda exista, o que, tanto quanto posso afirmar, não passa de ficção. Certas idéias e métodos do grupo são similares às idéias e métodos de algumas seitas de fanáticos nos dias de hoje. Estas seitas utilizam diferentes nomes, mas o ódio e a intolerância que pregam são os mesmos.A Direção de Antiguidades de Israel (Israel Antiquities Authority) é uma das principais organizações mundiais em descobertas arqueológicas bíblicas. Todos os personagens da

IAA aqui retratados são ficcionais e não se baseiam em pessoas reais.O Museu de Arqueologia e Antropologia da Universidade da Pensilvânia, na cidade de Filadélfia, é um dos melhores museus educacionais dos Estados Unidos. Todos os personagens associados ao museu são ficcionais e não se baseiam em pessoas reais.A pesquisa para escrever O pergaminho secreto tomou-me dois anos. Envolveu mais de 75 livros, dezenas de entrevistas e uma ampla variedade de outros materiais de referência. Uma descrição mais extensa da pesquisa feita para este livro pode ser encontrada em www.TheSecretScroll.com.

Agradecimentos

O Pergaminho Secreto FOI A EXPERIÊNCIA DA MINHA VIDA. ESCREvê-lo foi, ao mesmo tempo, uma atividade alegre e dolorosa, mas principalmente divertida, à medida que minha história e meus personagens ganhavam vida e aconteciam coisas que nunca serei capaz de explicar.A jornada de um escritor é solitária, mas tive sorte por ter pessoas com quem podia conversar e que me ajudaram com os componentes essenciais da primeira versão. Seguem-se os nomes de muitas dessas pessoas que muito me inspiraram nessa aventura de quatro anos que me levou a O pergaminho secreto. Minha irmã Ilene Rose, por

deixar que eu lesse para ela o que tinha escrito a cada dia durante o tempo em que trabalhei no primeiro rascunho. Foi minha primeira leitora e uma de minhas duas musas. Jeff Gelb, um amigo querido, mente brilhante e escritor talentoso, esteve sempre disposto a me ajudar, e sua inspiração e conselhos me ajudaram imensamente. Jeff foi minha segunda musa. Todos os dias, enquanto eu escrevia o primeiro rascunho ouvia as fitas de Stephen King on Writing, o que me ajudou e inspirou durante todo o processo de redação.Mike Garrett e Leonard Tourney também foram muitíssimo úteis como primeiros leitores. Uma lenda viva do setor editorial, Lou Aronica, gostou do livro o bastante para tornar-se meu editor e amigo, e Courtney Arnold, talentosa e inteligente, me ajudou com a versão final. Quero agradecer também amigos e livreiros que me ajudaram com sua inspiração e comentários positivos. Mais uma vez, meu muito obrigado a todas as pessoas acima citadas.Jason, meu filho mais velho, também esteve sempre à minha disposição para me apoiar. Ele e sua linda mulher, Maris, acabam de me abençoar com Maya, minha primeira neta.Agradecimentos especiais a Lori, o amor da minha vida, que se colocou do meu lado, me encorajou, leu a maior parte das versões que escrevi e meu deu uma importante contribuição com suas opiniões. Tanto ela quanto meu filho Max tiveram que me agüentar por quatro anos, quando

desapareci no escritório setenta horas por semana, obcecado em escrever O pergaminho secreto vinte e quatro horas, sete dias por semana. Amo vocês.Durante a publicação do livro, trabalhei com algumas pessoas excepcionais: Margot Atwell, Erin Smith, Meryl Moss, Skye Herzog, Todd Stevens, MJ Rose, Steve O'Keefe, Robert Aulicino, Thomas Krafft, Don Goldberg, Cevin Bryerman, Joe Murray e Jenn Risko. Obrigado.A meus leitores, agradeço terem escolhido ler O pergaminho secreto.