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Roças de Candomblé e Terreiros de Laje: entre a horizontalização e a verticalização Eixo Temático: Cultura, Arte, Memória, Patrimônio Afro-brasileiro e Identidade Negra SILVA, Soni M. R.Nascimento¹ A história de nosso país é profundamente marcada pelos anos de escravidão e mesmo diante da triste condição, a que um ser humano pode ser submetido. O povo negro encontrou na fé um meio de resistência, refazendo laços, mantendo e recriando as tradições, que o período escravagista lhes impôs. Refizeram, mesmo que simbolicamente as suas famílias através da união de seus irmãos na fé, dar noção de família foi a primeira função do candomblé, reconstruindo aquilo que lhes foi tirado estrategicamente para mantê-los frágil diante da escravidão. Foi necessário sobreviver, resistir a todo tipo de perseguição. O Brasil recebeu negros vindos de varias etnias diferentes de África. Eles se reuniram e organizou uma religião que denominaram Candomblé, esta oficialmente surgiu na Bahia no inicio do século XIX, com a chegada dos nagôs, antes disso essa religiosidade estava espalhada por diversas regiões com muita perseguição e pouca visibilidade. Salvador é um dos principais territórios de matriz africana no mundo, não só pela densidade populacional negra, mas também pelos significativos elementos simbólico-culturais. Por volta de fins do século XVIII, os terreiros lugares onde os negros trazidos para o Brasil, exerciam a sua religião, Passam a proliferar por toda cidade, pois o crescimento de centros urbanos se tornava um ambiente propicio para que os negros se reunissem e organizassem experiências religiosas. Periódicos como o “Alabama”, já chamava atenção para o crescimento das “Casas de candomblés” ou terreiros, como passariam a ser conhecidos os lugares onde os negros exerciam a sua fé. Essa relação do candomblé com a cidade pode ser explicada através de situação de escravos que ali vivam, nos

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Roças de Candomblé e Terreiros de Laje: entre a horizontalização e a verticalização Eixo Temático: Cultura, Arte, Memória, Patrimônio Afro-brasileiro e Identidade

Negra

SILVA, Soni M. R.Nascimento¹

A história de nosso país é profundamente marcada pelos anos de

escravidão e mesmo diante da triste condição, a que um ser humano pode ser

submetido. O povo negro encontrou na fé um meio de resistência, refazendo

laços, mantendo e recriando as tradições, que o período escravagista lhes

impôs. Refizeram, mesmo que simbolicamente as suas famílias através da

união de seus irmãos na fé, dar noção de família foi a primeira função do

candomblé, reconstruindo aquilo que lhes foi tirado estrategicamente para

mantê-los frágil diante da escravidão. Foi necessário sobreviver, resistir a todo

tipo de perseguição. O Brasil recebeu negros vindos de varias etnias diferentes

de África. Eles se reuniram e organizou uma religião que denominaram

Candomblé, esta oficialmente surgiu na Bahia no inicio do século XIX, com a

chegada dos nagôs, antes disso essa religiosidade estava espalhada por

diversas regiões com muita perseguição e pouca visibilidade.

Salvador é um dos principais territórios de matriz africana no mundo, não

só pela densidade populacional negra, mas também pelos significativos

elementos simbólico-culturais. Por volta de fins do século XVIII, os terreiros

lugares onde os negros trazidos para o Brasil, exerciam a sua religião, Passam

a proliferar por toda cidade, pois o crescimento de centros urbanos se tornava

um ambiente propicio para que os negros se reunissem e organizassem

experiências religiosas.

Periódicos como o “Alabama”, já chamava atenção para o crescimento

das “Casas de candomblés” ou terreiros, como passariam a ser conhecidos os

lugares onde os negros exerciam a sua fé. Essa relação do candomblé com a

cidade pode ser explicada através de situação de escravos que ali vivam, nos

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centros urbanos havia negros alforriados, escravos de ganho e domésticos que

circulavam com frequência facilitando o estreitamento de laços.

Em fins do século XIX, já é possível se pontuar a existência de alguns

sobrados e casarões coletivos em que negros livres organizavam pontos de

encontro para realização de seus cultos, naquela época além do culto estas

casas, também funcionavam como um espaço de confraternização para

aqueles negros que vinham do meio rural, a procura de emprego e também um

espaço de resistência para manter a crença e a cultura, que os negros

trouxeram quando vieram contra sua vontade para o Brasil em navios

negreiros.

O crescimento dos terreiros dentro das áreas urbanas começa a chamar

atenção também de pesquisadores da época como, Nina Rodrigues, Edson

Carneiro, entre outros. Nina Rodrigues em o Animismo Fetichista, descreve

como era construção do Gantois. ele descreve como era o terreiro fala do papel

do Ogan dentro da casa o poder do pai de santo e sobre os filho de santo e

como a arquitetura do Gantois atua na vida de cada personagem que dali tira

sua força o axé.

Boa parte dos estudos afro-brasileiros problematizaram os terreiros

como espaços horizontais, sendo as vezes confundidos com quilombos por

estarem dentro do mato e pela distância que as casas tinham uma da outra.

Durante todo século XIX e metade do século XX os terreiros sofreram com

perseguições e mudanças, como foi o caso do Candomblé da Barroquinha que

junto com outros negros tiveram que sair, atendendo a uma iniciativa de

reurbanização do centro de Salvador.

O pesquisador Jocélio Teles, ressalta que a visualização espacial das

roças tinha outros significados, As habitações eram mais que construções

físicas, elas possuíam um conteúdo simbólico que se manifestava na própria

elaboração arquitetônica.1

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“E durante fins do século XIX e inicio do século XX os terreiros

foram sendo empurrados cada vez mais para fora do centro,

neste período os terreiros ainda conseguiam manter sua

arquitetura horizontal e havia espaços de mata e rios próprios

para realização de seus rituais que dependem dos elementos da

natureza”. (TELES, Jocélio, Revista VeraCidade – IV – Nº 5 -

10/09).

As perseguições continuam até a década de 70 quando os terreiros para

funcionar precisavam de uma autorização da Delegacia de Jogos e Costumes.

Essa década marca também a expansão do candomblé baiano para os estados

do Sul e Sudeste. Joãozinho da Goméia, implanta seu terreiro na Baixada

Fluminense, Mãe Menininha era aclamada nos versos de Caymmi e na voz de

Gal Costa. Sua fama corre mundo e todos passam a quere conhecer o Gantois

mais as perseguições continuam.

Apesar do Decreto-Lei 1.202, editado pelo então Presidente da

Republica Getúlio Vargas, proibir o embargo sobre o exercício da religião do

candomblé no Brasil, na Bahia a repressão e intolerância continuavam a

liberdade religiosa, só surge a partir do fim da década de 70, com a Lei

Estadual 25.095 de 15/01/1976 que libera os terreiros de terem que pedir

licença policial para praticarem a sua liturgia, nessa época também terrenos

mais baratos , áreas maiores para práticas de rituais e privacidade são fatores

para o aumento de terreiros dentro da cidade de Salvador.

Nas primeiras décadas do século XX, imbuídos no projeto de

urbanização de Salvador, os jornalistas combatiam ferozmente os hábitos da

população, principalmente aqueles acalentados pelos negros, visto pela

modernidade como degradante. Acompanhando os impulsos higienistas da

época, buscava-se “desafricanizar as ruas”2.

O crescimento em áreas como Valeria, Cajazeiras, São Caetano, Lobato

Fazenda Grande do Retiro e San Martin, demonstra que havia a possibilidades

de o povo de santo encontrar ali terrenos extensos em um ambiente

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ecologicamente adequado para os rituais, festas publicas e assentamentos das

entidades.

Os terreiros têm um comprometimento com a questão ambiental como

uma necessidade estratégica da própria sobrevivência de suas práticas. Para

as religiões afro-brasileiras, as plantas são imprescindíveis – “Kosi ewe, kosi

Orixá” . (sem folha, não há Orixá)... Embora boa parte das áreas verdes de

territórios urbanos venha diminuindo ao longo do tempo, em virtude da

especulação imobiliária, são nas áreas de terreiro, que ainda encontramos as

poucas reservas, ainda que estejam em permanente ameaça pela

concentração da população socialmente excluída em bairros populares que

crescem de forma densa e aleatória.( Santiago,Gilmar, site CEAO/UFBA)

Diante do exposto minha pesquisa vai estudar como o a falta de

planejamento urbano, interferiu na mudança da arquitetura dos terreiros de

como o conhecemos, terreiros de “roça” e também como se dá essa relação do

Aiyê (terra) e o Orun (céu) em um terreiro verticalizado.

Partindo do que já foi pesquisado por Nina Rodrigues, e que usou o

terreiro do “Gantois” como modelo e os via como casas simples construídas

dentro do mato, já Edison Carneiro, dizia que os candomblés mais novos já se

encontravam em casa quaisquer e descrevem o seguinte:

“(...)No Gantois, o terreiro funciona num barracão, coberto de

telha, e de paredes de taipa, que fica no centro de uma clareira

ou roçado, sombreado de algumas arvores

frondosas”(RODRIGUES, p 45)

“(...) Os candomblés situam-se no meio do mato, nos

arrabaldes e subúrbios mais afastados da cidade. Em geral

estão localizados em sítios de difícil acesso, como os e

Bernadinho e Aninha , respectivamente no Bate folha e em São

Gonçalo do Retiro(...) Os candomblés mais novos de poucos

anos de existência, já se encontram em casa

quaisquer(...).(CARNEIRO, p 35)”

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Outros pesquisadores como Pierre Verger, Roger Bastides, Raul Lody,

Juana Elbein Santos, que pesquisaram os terreiros do ponto de vista

horizontal, sempre citando que no entorno destes havia espaços de mata, e

conforme observamos hoje, foram perdidos pelas casa de axés mais velhas

para a reurbanização da área da Vasco da Gama, restando como lembrança do

que foram essas áreas, um pouco de vegetação ainda na Casa Branca.

Jussara Rego vai tratar os terreiros do ponto de vista da territorialização

e divide esses espaços em dois sendo um “contínuo”: que é aquele utilizado

nas áreas próprias do terreiro; e “descontínuo”: espaços que são incorporados

ao terreiro a partir da utilização dos mesmos (mar, rios, ruas, etc)3.

Após a abolição, a cidade de Salvador com a ânsia de se modernizar

implantou séries medidas de normatização e segregação social e racial do

espaço urbano. As classes majoritariamente negras foram obrigadas a ocupar

as áreas periféricas da cidade, hoje isso não é muito diferente os bairros

pobres continuam sendo o de maior população negra.

Com o novo viés econômico baseado na indústria do petróleo, a cidade

abiu outros vetores, e um deles foi o miolo urbano que antes abrigara

quilombos e onde havia grandes fazendas e pequenas propriedades rurais,

nessa região foi criado o “maior complexo habitacional da América Latina”6 O

complexo Cajazeiras , no início projetado para ser um bairro-dormitório de

trabalhadores, o que acabou não ocorrendo devida as estratégias de

relacionamento que os novos habitantes desenvolveram ao longo do tempo

para suprir suas necessidades.

“A área do complexo Cajazeiras foi construída de modo a não

permitir outra leitura da história dos negros senão a da

subserviência, da inferioridade e da não-memória (...) entretanto

naquelas pranchetas de desenho arquitetônico as memórias e

marcas do passado de resistência à escravidão e ambientes de

trocas entre os sujeitos e o espaço vivido daquela parte de

Salvador não tiveram lugar.Mas seus moradores encontraram

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múltiplas formas de se opor a isso e se construir enquanto grupo

na cidade”(Barbosa,2009:23).

Em Cajazeiras se encontraram muitos terreiros instalados que pra cá

vieram pelo o que natureza dispunha de maneira farta para a realização de

seus rituais, rios, nascentes, mata e principalmente privacidade. Atualmente

com a questão do crescimento urbano desordenado a situação hoje dos

terreiros é mais complexa, que simplesmente remaneja-los de lugar.

A movimentação das cidades pelo crescimento urbano desorganizado

passou a interferir nos espaços de terreiros, na maioria das vezes lhes tirando

o que tem de mais sagrado que são as matas. As ocupações ilegais ao

surgirem comprimem os terreiros, lhes tirando a área de vegetação e obrigando

os que não conseguem manter seu espaço a se verticalizarem.

A transformação desta arquitetura é mais uma prova da resistência nesses

espaços das religiões de matriz africana que precisam se ressignificar sem

perder a essência que trouxeram de África. Cabe nos desvelar o fator que tem

levado estes terreiros a se verticalizarem e como esse processo altera os

rituais dos terreiros conhecido como “terreiros de laje” em relação aos terreiros

chamados de “roça”, e a partir do que já foi feito no mapeamento dos terreiros

em 2009, catalogar e registrar essa nova arquitetura. Se o urbano tem sido um

fator determinante para essa transformação, duas perguntas precisam ser

respondidas. Se a cidade, enquanto forma de um espaço urbano, possui um

determinado grau de dinamicidade, quais são os processos de transformação

do espaço do terreiro? Como essas mudanças atuam e se configuram?

1. Terreiros de Roça

Os terreiros tradicionais, de “roça”, sempre foram estudados como casas

“quaisquer”, localizado no centro urbano de Salvador, possuem uma

arquitetura horizontal que tem uma relação umbilical com a terra, sendo

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alguns dos mais conhecidos o Gantois, Bogum, Alaketu, que antes tinham

áreas verdes no seu entorno e perderam suas áreas de mata sagrada para a

expansão urbana, destes apenas a casa Branca conseguiu manter sua

vegetação por conta do tombamento. Os terreiros foram perdendo seus

espaços para a urbanização, a cidade que não tinha interesse na época em

manter os negros próximos dos grandes centros e os forçava a recuarem para

o miolo da cidade onde ainda não havia uma infraestrutura.

Terreiro do Bogum

(Fotos: Coleção Lorenzo Dow Turner) 1940

“O parque sagrado do Bogum tinha vida própria. A energia

gerada ali pela presença dos Voduns encantava a quem quer

que o visitasse. A mata Atlântica crescia solta protegida. A fauna

era abundante e as orquídeas reinavam, entre outras flores,

soberbas nos dendezeiros”4

“Conforme relato de Everaldo Duarte os donos da fazenda onde o Bogum

estava instalado faziam pressão para o afastamento da comunidade com

aumento das taxas de arrendamento e ameaças de expulsão(...).

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Diante dessa perspectiva, Runhó não pensa duas vezes e começa a retirar os

assentamentos existentes sob as árvores, o espaço é dessacralizado e começa

ser ocupado por casas populares (...). Por ultimo foram erradicadas as três

gameleiras que continham o assentamento de Lôko (“...) (Duarte, Everaldo

C.p.47-48).”

Restando nesta área que surge com o nome de bairro da Federação, como

lembrança do que foi a área de mata verde do terreiro o Busto de mãe Runhó

que lança um olhar para o horizonte do que antes era o Bogum.

http://ailtonferreira.blogspot.com/2009/11/homenagem-mae-runho.html

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Terreiro do Gantois

http://terreirodogantois.com.br/index.php/o-terreiro/

Tradicional e centenário candomblé da Bahia é oriundo do Ilé Asé Airá Intilè

(Candomblé da Barroquinha). O nome Gantois deve-se ao antigo proprietário

do terreno, o traficante de escravos belga Édouard Gantois, que arrendou as

terras a Maria Júlia da Conceição Nazareth, a fundadora do candomblé do Alto

do Gantois. O espaço numa área alta, cercada por um bosque de difícil acesso,

protegia o local da perseguição policial existente à época.

Estes são exemplos de como eram alguns desses terreiros no início de sua

instalação nos espaços onde se encontram hoje.

2. Terreiros de laje

O governo não consegue ter um controle sobre o processo de urbanização, e

ele acontece de forma descontrolada forçando as cidades a abrigarem um

número maior de pessoas do que a sua capacidade, gerando habitações

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subnormais, os terreiros não têm sido poupados nesse processo, tem suas

áreas de mata verde tomadas, e como as áreas próximas à cidade hoje são

poucas acabam ficando engessados entre a comunidade que vai se formando

ao seu redor.

Resultando no que vemos hoje e chamamos de terreiros de “laje” a

primeira menção dessa nova arquitetura dos terreiros foi feita pelo pesquisador

Jocélio Teles quando do mapeamento dos terreiros em março de 2006 , onde

ele observa:

“Muitos terreiros apresentam uma fachada similar às de casa comuns na

periferia, alguns tendo dois ou três pavimentos, ou localizados em subsolos.”5

Em 2006 as Secretárias da Reparação e da Habitação em parceria com

o Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO/UFBA) executam o Projeto e

Regularização Fundiária dos Terreiros de Candomblés, conduzido pelo

Professor Jocélio Teles, e durante suas pesquisas ele observa um fenômeno

novo nunca antes estudado, ele observa que alguns terreiros encontrados são

e laje e tendo até mais de um pavimento.

Durante o Mapeamento os pesquisadores se surpreendem com a

expressiva quantidade de terreiros existente em Cajazeiras XI, o próprio povo

de santo se refere ao local como sendo um Shopping Center dos terreiros.

E é nesta área que a pesquisa irá se desenvolver estudando a mudança

dessa arquitetura horizontal par uma arquitetura verticalizada a exemplo do

terreiro

Ilê Axé Oxalufã

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Fotos do Terreiro ile Axé Oxalufã, acervo da autora

Este espaço se instala em Cajazeiras de forma horizontal mais com o

crescimento e as ocupações irregulares que vão acontecendo com o passar

dos anos o terreiro perde sua área verde, seus espaços e se vê obrigado a

crescer verticalmente.

Vamos ver como se processa os rituais nessa nova estrutura como a

fogueira de Xangô

No terreiro de “roça” esse ritual se inicia dentro do barracão com o xirê que é

dança dos orixás onde cada um vai sendo chamado a terra pelo som dos

atabaques compondo o xirê, após a chegada de cada Orixá convidado se canta

um musica pedindo permissão ao senhor da terra para que fogueira possa ser

acesa.

Roda de xirê

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Ìbà òrisà

Ìbà Onílè

Onílè mo jubá o

Ìbà òrisà Ìbà Onílè

Onílè mo jubá o

Com esta saudação a Onilê o senhor da terra se faz uma oferenda a

terra para que este Orixá permita sobre o seu templo ser acesa a fogueira.

Cumprido este ritual o anfitrião Xangô convida todos os presentes a irem

para a área de fora do barracão e assistir a fogueira ser acesa e a partir dai

todos os presentes assistem o xirê que acontece envolta da fogueira junto com

os Orixás presente acompanhada do estouro de muitos foguetes.

No terreiro de laje não existe espaço para se queimar a fogueira e este

ritual se ressignificar na apresentação no lugar fogueira o próprio Orixá Xangô

entra no barracão com um alguidar na cabeça contendo algumas pedras dentro

que ardem em fogo representando a fogueira, ele dança no barracão em trono

de uma pilastra.

Outro ritual que se ressignificar neste espaço verticalizado é o Olubajé no

terreiro Oxalufã como não existe espaço dentro da área do terreiro a rua em

frente passa a fazer parte do ritual e naquele momento ela é sacralizada como

extensão do terreiro e todo o ritual do Olubajé conhecido como O banquete do

rei se processa na rua fazendo o que Jussara Rego denominou de espaço

descontinuo, ou seja, o uso de espaços que não são do terreiro, mas que são

utilizados e sacralizados por ele quando este precisa.

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A pesquisa terá o objetivo especifico de catalogar esses terreiros

cadastrando o registro dessa arquitetura, investigar como se processam os

rituais em um terreiro de laje e as suas diferenciações em relação o de roça,

observar como se dá a relação cosmológica dos quartos de santo um em cima

do outro.

Em seu artigo A cidade e o terreiro, André Luiz fala sobre a Lei Federal

nº 1.257 que:

“explicita os principais instrumentos de regulação das cidades nas

dimensões gestoras, orçamentária, territorial, cultural tributária, financeira e

política. Mostrando que uma serie de instrumentos poderiam ser aplicados à

proteção urbanística dos terreiros de candomblé, sobretudo, aqueles que

garantissem a propriedade fundiária e sua inserção numa política gestora

urbana.”6

Os instrumentos que podem dar proteção cultural e urbanística

estendida aos terreiros ainda são muito precários. Órgãos de proteção como

IPAC (instituto do patrimônio artístico e cultural da Bahia , E O IPHAN (Instituto

do Patrimônio Histórico Artístico Nacional), fazem a proteção cultural destes

espaços com instrumentos como Tombamento, projeto de Salvaguarda e

Registro, porém muito tem deixado de ser feito pelo fato destes órgãos não

conhecerem como se processa o acesso dentro dos espaços do território do

terreiro onde a primeira e a última palavra é do orixá, inquice ou vodunci. Este

fato vem deixando muitos terreiros desprotegidos quando existe um processo

de expansão urbana que ocorre de forma desordenada independente do

planejamento que se tenha feito para aquele espaço.

Os terreiros precisam com urgência de visibilidade para serem parte dos

planos diretores da cidade e serem contemplados com a preservação dos

espaços sagrados que não servem só à comunidade de candomblé mas a

todos em redor. A Lei 10.257 pode ser um marco na construção de políticas

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publicas municipais de gestão e regulação urbana.Inicialmente se observa que

a verticalização dos terreiros se dá por conta de um crescimento que foge ao

controle dos órgãos responsáveis. Andre Luiz diz:

“Os terreiros de Candomblé constituem-se elementos determinantes na

formação da identidade da cultura baiana. E neste sentido, os elementos

identitários culturais dos terreiros de Candomblé possuem a mesma

importância dos elementos territorializantes eles são uníssonos e precisam de

proteção simultânea.” 7

Cada vez que um terreiro se verticaliza, fatalmente também o meio

ambiente será afetado, pois significa que suas áreas verdes foram ocupadas, e

também o entorno do axé, os terreiros são protetores naturais do meio

ambiente protegê-los é também proteger o meio ambiente que ainda resta a

cidade.

Notas

1.SANTOS, Jocélio Teles; Candomblé e espaço Urbano na Bahia do século

XIX.

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2 OLIVEIRA, Iris Verena Santos de; Becos, Ladeiras e Encruzilhadas: Andanças do

Povo-de-Santo pela cidade de Salvador(dissertação)

3 REGO, Jussara, Territórios do candomblé: A desterritorialização dos terreiros

de Salvador texto da pós- graduação

4 DUARTE. Everaldo Conceição; Terreiro do Bogum-memórias de uma

comunidade Jeje-Mahi na Bahia

5 TELE, Jocelio, Mapeamento dos Tereiros

6.OLIVEIRA, André Luiz de Araújo , Artigo A cidade e o Terreiro: Proteção

urbanística aos terreiros de candomblé na Bahia pós-estatuto da Cidade.

6.OLIVEIRA, André Luiz de Araújo , Artigo A cidade e o Terreiro: Proteção

urbanística aos terreiros de candomblé na Bahia pós-estatuto da Cidade.

Referencial Teórico

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