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FACULDADE ESTÁCIO DE NATAL DIREÇÃO ACADÊMICA CURSO DE DIREITO DJAHY FERREIRA LIMA CONSTITUIÇÃO E CONSTITUCIONALISMO – UMA BREVE HISTÓRIA

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FACULDADE ESTÁCIO DE NATAL

DIREÇÃO ACADÊMICA

CURSO DE DIREITO

DJAHY FERREIRA LIMA

CONSTITUIÇÃO E CONSTITUCIONALISMO – UMA BREVE HISTÓRIA

NATAL - RNDEZ/2013

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DJAHY FERREIRA LIMA

CONSTITUIÇÃO E CONSTITUCIONALISMO – UMA BREVE HISTÓRIA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade Estácio de Natal, como requisito básico necessário à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Profº. Esp. Djamiro Ferreira Acipreste Sobrinho

NATAL-RNDEZ/2013

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L732c Lima, Djahy Ferreira. Constituição e constitucionalismo: uma breve história/ /Djahy

Ferreira Lima- Natal, 2013. 78 f.

Trabalho monográfico (Graduação em Direito) – Faculdade Estácio de Natal.

Bibliografia: f. 74 - 78

1. Constituição 2. Constitucionalidade 3. Constituição, História

CDD 341.2

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FACULDADE ESTÁCIO DE NATALDIREÇÃO ACADÊMICA

CURSO DE DIREITO

TERMO DE APROVAÇÃO

CONSTITUIÇÃO E CONSTITUCIONALISMO: UMA BREVE HISTÓRIA

DJAHY FERREIRA LIMA

PARECER DA BANCA

Monografia submetida à Banca Examinadora do Curso de Direito da Faculdade Estácio de Natal e aprovado como requisito para conclusão do Curso de Direito.

Natal, 10 de dezembro de 2013.

BANCA EXAMINADORA

Profº. Esp. Djamiro Ferreira Acipreste SobrinhoOrientador – Faculdade Estácio de Natal

Profº. Esp. Alberto Knobbe BusquetsExaminador – Faculdade Estácio de Natal

Profª. Esp. Janiny Karla Pereira da CâmaraExaminadora – Faculdade Estácio de Natal

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Dedico esta monografia a Deus, minha mãe, meu pai “in memoriam”, minha esposa e incentivadora, meus filhos, meus irmãos, tio (a)s, amigo (a)s e mestre (a)s.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, o criador.

À professora Dra. Margarida Maria Knobbe pela dedicação e esmero no

ensino da disciplina Monografia Jurídica I e II.

Ao professor Esp. Djamiro Ferreira Alcipestre Sobrinho pela inestimável

orientação na elaboração do presente trabalho.

Aos mestres pela transmissão dos valorosos conhecimentos necessários

para a vida e para o exercício da profissão jurídica;

À banca examinadora, por ter aceitado o convite de participar da minha

apresentação e pelas contribuições.

À minha família, especialmente à minha esposa e aos meus filhos pela

compreensão e estímulo.

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RESUMO

Este trabalho tem o propósito de oferecer um sobrevoo panorâmico sobre a história do constitucionalismo no tempo e no espaço. Analisa os aspectos históricos que funcionaram como demarcadores para a modelagem do constitucionalismo na Inglaterra, na França e nos Estados Unidos da América e seus derivativos no resto do mundo e, mais especificamente, no Brasil. No que se refere ao constitucionalismo brasileiro, procurou-se utilizar como instrumento dessa revisão histórica, as mais diversas cartas constitucionais brasileiras que se iniciou com a Constituição imperial de 1824 e se prolongou até a Constituição de 1988, ora em vigor. Vinculados aos aspectos da materialidade constitucional estão os fatores históricos circundantes de outra natureza, mas que igualmente exerceram influências determinantes, tais como os fatos sociais, econômicos, políticos, jurídicos etc. As obras de Dallari (2010) e Sarmento (2010) se constituíram nas vigas centrais que dão sustentação a este trabalho. Por oportuno, enfocamos o neoconstitucionalismo que representa a dinamicidade natural do direito do pós-guerra que caminha pari passu com a sociedade. Destarte, podemos concluir que as constituições e, principalmente, o constitucionalismo são frutos dos preponderantes fatores reais do poder, circunstanciados pela história.

Palavras-chave: Constituição. Constitucionalismo. História do constitucionalismo brasileiro. Constituições brasileiras.

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ABSTRACT

This work is intended to offer a scenic flight over the history of constitutionalism in time and space. Analyzes the historical aspects that functioned as paths for the modeling of constitutionalism in England, in France and in the United States of America and its derivatives in the rest of the world. As regards the Brazilian constitutionalism, we tried to use as an instrument of this historical review, the most diverse Brazilian constitutional letters that began with the imperial Constitution of 1824 and lasted until the Constitution of 1988, now in force. Linked to aspects of materiality are historical factors surrounding constitutional of a different nature, but which also exerted decisive influence, such as the social, economic, political facts, legal etc. The works of Dallari (2010) and Sarmento (2010) constituted Central beams that give support to this work. By timely, we focused on the neoconstitucionalismo that represents the natural dynamism of the postwar law who walks pari passu with the society. Thus, we can conclude that the constitutions and, mainly, the constitutionalism are fruits of real factors of power, Slovakia's detailed history.

Keywords: Constitution. Constitutionalism. History of constitutionalism. Brazilian Constitutions.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................092 CONSTITUCIONALISMO NA HISTÓRIA..............................................................112.1 CONSTITUCIONALISMO NA ANTIGUIDADE....................................................14

2.2 CONSTITUCIONALISMO MEDIEVAL.................................................................17

2.3 CONSTITUCIONALISMO MODERNO................................................................21

3 MODELOS DE CONSTITUCIONALISMO.............................................................263.1 CONSTITUCIONALISMO INGLÊS......................................................................26

3.2 CONSTITUCIONALISMO FRANCÊS..................................................................28

3.3 CONSTITUCIONALISMO AMERICANO.............................................................31

4 CONSTITUCIONALISMO NO BRASIL..................................................................335 CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS.........................................................................435.1 CONSTITUIÇÃO DE 1824...................................................................................43

5.2 CONSTITUIÇÃO DE 1891...................................................................................45

5.3 CONSTITUIÇÃO DE 1934...................................................................................48

5.4 CONSTITUIÇÃO DE 1937...................................................................................50

5.5 CONSTITUIÇÃO DE 1946...................................................................................52

5.6 CONSTITUIÇÃO DE 1967...................................................................................54

5.7 CONSTITUIÇÃO DE 1969...................................................................................56

5.8 CONSTITUIÇÃO DE 1988...................................................................................57

5.8.1 Antecedentes..................................................................................................585.8.2 Elaboração......................................................................................................595.8.3 Promulgação...................................................................................................616 NEOCONSTITUCIONALISMO...............................................................................677 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................71REFERÊNCIAS.........................................................................................................74

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1 INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho monográfico é contribuir para a construção de um

caminho racional que possibilite uma melhor compreensão da formação e evolução

das constituições e do constitucionalismo no mundo ocidental e, mais

detalhadamente, no Brasil. Procuramos traçar um panorama histórico geral,

contemplando as experiências que vão da antiguidade à contemporaneidade.

O constitucionalismo do mundo ocidental foi formulado a partir dos modelos

inglês, francês e americano. Essas matrizes constitucionais serviram de paradigma

para o resto do mundo. Podemos destacar como fatores emblemáticos dessas

matrizes: a Revolução Gloriosa (1688 a 1689), na Inglaterra; a Revolução Americana

(1775 a 1783), na América do Norte e a Revolução Francesa (1789), na França.

O presente trabalho procura evidenciar que esses modelos constitucionais

não foram adotados em sua forma pura. Cada Estado adotou o seu modelo

constitucional específico, em consonância com as suas próprias peculiaridades

geográficas, históricas, consuetudinárias etc.

A formação do constitucionalismo não se deu de forma linear, mas curvilínea,

fruto de avanços e recuos na história. Não há fator que por si só seja determinante

para a construção do constitucionalismo de um povo.

Distingue-se, neste trabalho, constituição de constitucionalismo. A

constituição é a expressão material do constitucionalismo, e representa a ordem

jurídica formulada pelo conjunto dos fatores reais do poder.

Sem deixar de mencionar as evidentes influências sociais e econômicas,

procura-se traduzir as mais variadas contribuições de natureza ideológica, a

exemplo das filosóficas, sociológicas e jurídicas que se consolidaram através dos

tempos e por processos complexos de acumulação de fatos sociais, sempre por

influência das forças políticas determinantes em cada momento.

Este trabalho também procura demonstrar que a ideia de constituição não

está cingida apenas aos textos escritos e legislados, mas se expressa por formas

das mais variadas e se propagam pela via de contratos sociais explícitos e

implícitos, que por sua vez se desdobram em subcontratos. Não obstante, é preciso

compreender que os processos de formação do poder político são complexos, e que

as forças do poder, apesar de preponderantes, muitas vezes, não podem impor, de

forma absoluta e ilimitada, as suas condições. Por conseguinte, terão que negociar,

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na medida do possível, pois necessitam das camadas sociais da base para que

estas lhes possam dar sustentação.

Os fatores determinantes do constitucionalismo brasileiro serão aqui

elencados, visto que identificá-los e analisá-los é imposição da pergunta de

pesquisa. As ideias e as correntes filosóficas que despertaram, sensibilizaram e

impulsionaram a espécie humana na busca da cidadania não serão aqui olvidadas.

Constituição e constitucionalismo, apesar da inegável origem remota, serão

analisados com maior minudência, apenas, quanto aos seus aspectos formais e sob

o enfoque do Estado moderno.

Para concretizar este trabalho foi realizada ampla pesquisa bibliográfica,

procurando sempre contextualizar os fatos jurídicos no tempo e no espaço e o

pensamento filosófico, sociológico e político predominante em cada etapa da

história. Foi de grande valia a contribuição de revistas de publicação periódica e

trabalhos diversos em formato eletrônico buscados em sítios estacionados na

internet.

As obras de Dallari (2010) e Sarmento (2010) das quais nos servimos, se

constituíram nas vigas centrais que dão sustentação a este trabalho.

Este trabalho monográfico está dividido em sete capítulos: o capítulo dois

trata do constitucionalismo na história (Antiguidade, Idade Média e Moderna); O três

trata dos modelos constitucionais inglês, francês e americano que serviram de

paradigma para todos os outros modelos; o quarto é dedicado ao constitucionalismo

brasileiro; No quinto é feita uma análise rápida de cada uma das oito constituições

da história do Brasil, procurando identificar e descrever os principais institutos

constitucionais característicos de cada uma dessas cartas. O sexto capítulo trata do

neoconstitucionalismo, a nova concepção do constitucionalismo do pós Segunda

Guerra Mundial, que vem se firmando cada vez mais na contemporaneidade.

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2 CONSTITUCIONALISMO NA HISTÓRIA

A história e o direito têm algo em comum: o homem. (CASTRO, 2008, p. 3).

O homem é considerado o grande protagonista da sua própria história, ao construir,

como grande produtor de cultura, a sua trajetória no tempo. O direito, assim como

outros construtos, é um autêntico produto cultural que se destina a viabilizar sua

existência em harmonia com os seus semelhantes. O direito, como expressão da

vida e da convivência, é uma realidade universal, portanto, não há como deixar de

repetir o brocado latino: “ubi societas ib jus”, “ubi jus ib societas” (onde houver

sociedade haverá direito, onde houver direito haverá sociedade). O filósofo grego

Aristóteles já ensinava que o homem é, naturalmente, um ser gregário para atender

às suas necessidades fundamentais, pois não sobreviveria isolado.

Para o professor português Marcelo Caetano (2003, p.1):

Cada indivíduo ao nascer é herdeiro de toda uma civilização e de uma cultura legadas pelas gerações anteriores que lhe proporcionam a utilização gratuita de uma quantidade de bens, de instrumentos e de noções que norteiam a sua conduta por um sistema já experimentado de princípios, de convenções e de normas.

O homem não é uma ilha, mas um arquipélago social, econômico, ambiental e

de costumes, portanto necessita utilizar-se de alguma forma de organização social e

política. E essa forma de organização, seja ela simples ou complexa, exige

instrumentos adequados que possibilitem o exercício das suas funções sociais e

políticas. Um desses instrumentos é a constituição ou a carta política.

Para resgatar o trajeto evolutivo das constituições e do constitucionalismo

nada mais fidedigno que a recorrência à história, procurando-se, sempre,

compreender as peculiaridades contextuais que marcaram os acontecimentos e as

idiossincrasias inerentes aos agentes protagonistas.

Os fatos históricos muitas vezes assumem caráter demarcatório do tempo por

resultarem de rupturas tão profundas que assumem um caráter determinante de

alterações paradigmáticas que resultam numa nova ordem social, econômica e

política. É evidente que essas mudanças de forte conteúdo axiológico venham a se

incorporar, por orientação das forças reais do poder, às novas constituições,

espraiando-se, consequentemente, na nova ordem jurídica.

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Essas mudanças determinantes de alterações significativas de paradigmas e

que demarcam o tempo se identificam com aquilo que o sociólogo italiano Domenico

De Masi, professor de Sociologia do Trabalho da Universidade La Sapienza, em

Roma, denomina de “mudança de época”.

Conforme De Masi (2000, p. 23):

Em determinados momentos, temos a sensação de que se trata de uma mudança de época. Porém, não é apenas um fator da História que muda, mas é todo o paradigma – com base no qual os homens vivem – que se altera. Isso acontece quando três inovações diferentes coincidem: novas fontes energéticas, novas divisões do trabalho e novas divisões do poder. Se somente um desses fatores se alterasse, viveríamos uma inovação, mas, se todos eles mudassem simultaneamente, aconteceria um salto de época.

Nos casos de ocorrência de variações significativas, que venham a

caracterizar mudanças de época, que Domenico De Masi também chama de “salto

tríplice”, invariavelmente, ocorreriam mudanças, também significativas, nas

estruturas sociais e políticas com óbvios reflexos de natureza constitucional.

Decerto que não há como estudar a evolução da ideia de constitucionalismo

de forma isolada dos elementos que conformam toda e qualquer experiência da

sociedade humana. O estudo do constitucionalismo requer, essencialmente, um

diálogo transdisciplinar, visto que envolve uma harmonia do direito constitucional

com tantas outras áreas de conhecimento, tais como a Ciência Política, a Economia,

a Filosofia, a História, a Antropologia e a Sociologia.

É preciso destacar a especial contribuição da Filosofia para o estudo do

constitucionalismo e do direito em geral. Não há de se falar em Filosofia do Direito,

visto que, o que efetivamente há é a própria Filosofia aplicada ao Direito.

Reconhecemos que, no mundo contemporâneo, dominado pela revolução da

informação rápida e virtual, a importância da Filosofia e do seu ensino se

apequenaram para os incautos. Muitos não fazem questão de deixar transparecer o

seu menosprezo, chegando ao ponto de conceituar a Filosofia como “uma ciência

com a qual e sem a qual o mundo permanece tal e qual”. No direito, os princípios

são buscados pela Filosofia, que, quando positivados, passam a fazer parte da

Ciência do Direito. Gonzaga (2010, p. 13) trata dessa nova geração da era

cibernética, que ele chama de “geração high tech”: São pessoas muito mais informadas que as gerações precedentes. Percebo, porém, que uma parte significativa desses informados high tech não tenham a necessária formação humanística; são muito informados, mas

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poucos formados, já que falta o entrelaçamento filosófico necessário para a compreensão das complexidades do mundo e do homem contemporâneo.

Elencamos como marcos fundamentais da história do constitucionalismo

moderno: a Revolução Gloriosa (1688 a 1689), na Inglaterra; a Revolução

Americana (1775 a 1783) na América do Norte e a Revolução Francesa (1789), na

França. Também merecem destaque no que se refere à contribuição para o

constitucionalismo os mais diversos movimentos filosóficos e culturais, tais como o

humanismo renascentista, que teve início na península itálica, centro do ativo

comércio mediterrâneo e onde o capital mercantil registrou grande desenvolvimento;

o racionalismo cartesiano e o iluminismo (também denominado ilustração ou

Filosofia das Luzes) etc.

Importante também destacar, os papeis das igrejas católica, anglicana,

luterana, calvinista, puritana ou presbiteriana etc. Em 1891, o papa Leão XIII,

promulgou a encíclica Rerum Novarum, em que expunha o pensamento social da

Igreja, reconhecendo o direito à propriedade e rejeitando a teoria marxista. A

encíclica condenava a ganância capitalista e a exploração desumana do trabalho.

Leão XIII propunha aos empregadores que reconhecessem os direitos fundamentais

do empregado, tais como a limitação das horas de trabalho, o descanso semanal e o

estabelecimento de salários dignos.

Constituição e constitucionalismo são ideias distintas. Conforme Bulos (2011,

p. 64), constitucionalismo é palavra recente revestida numa ideia remota. Sua

concepção reporta-se a Platão que já preconizava a ideia de um Estado

Constitucional concebido no primado da lei como garantia aos governados, e é na

constituição – lei das leis por excelência – que se exterioriza a ideia de

constitucionalismo.

No entendimento de Dallari (2010, p. 347): O constitucionalismo é o movimento social implantado e desenvolvido através da história, tendo recebido contribuição de elementos resultantes das elaborações de teorias políticas e jurídicas, sendo um instrumento fundamental para implantação de sociedades humanistas e democráticas. O constitucionalismo não foi o resultado de uma proposição teórica abstratamente formulada, mas resultou do reconhecimento de peculiaridades da pessoa humana, de necessidades e aspirações comuns a toda a humanidade, percebidos e explicitados, gradativamente, a partir de situações concretas.

Para Barroso (2010, p. 5):

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Constitucionalismo significa, em essência, limitação do poder e supremacia da lei (Estado de direito, rule of the law, Rechtsstaat). O nome sugere, de modo explícito, a existência de uma Constituição, mas a associação nem sempre é necessária ou verdadeira.

Canotilho citado por Tavares (2010, p. 23), adverte que não há um único

constitucionalismo, mas vários, como o constitucionalismo do modelo inglês, o de

matriz norte-americana e o de referência francesa, por exemplo. O mestre português

prefere falar em diversos movimentos constitucionais – já aqui adotando a ideia de

que o constitucionalismo é um movimento político, social e cultural – com “corações

nacionais”, o que lhe permite construir uma noção comum mínima para o termo

‘constitucionalismo’.

Apesar de conceitos distintos, constituição e constitucionalismo se encontram

intimamente entrelaçados, pois na constituição estão as bases materiais que

imprimem a orientação para a formação do constitucionalismo, cujo conceito é muito

mais elástico. Para Ferdinand Lassalle (1825-1864), em sua essência, a

Constituição representa a vontade das forças reais do poder. Assim sendo, infere-se

que as forças reais do poder ao determinarem a constituição influem, igualmente, no

constitucionalismo. As ideias de Lassalle forem expostas em 1863, numa

conferência realizada em Berlim, capital e importante centro cultural e industrial da

Prússia, e serviu de base para sua obra que foi editada e traduzida para o português

com o título de A Essência da Constituição.

2.1 CONSTITUCIONALISMO NA ANTIGUIDADE

Os hebreus, conforme Karl Loewenstein, citado por Bulos (2011, p. 66), foram

os primeiros a viverem a experiência de movimento constitucionalista de que se tem

registro. Por imposição da Bíblia, estabeleceram limites ao poder político do Estado

teocrático. Caberiam aos profetas, dotados de legitimidade popular, fiscalizar e punir

os atos dos governantes que ultrapassassem os limites bíblicos.

Para os hebreus, leigo e divino interagem de tal modo que pecado e crime se

confundem, pois a lei tinha inspiração de Deus. Ir contra a vontade da lei era o

mesmo que ir contra o próprio Deus, portanto só Deus tem o poder e criar, modificar

ou revogar a lei. Os chefes religiosos podem até interpretá-la para adaptá-la à

evolução social, entretanto, não podem modificá-la.

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A Grécia, berço da civilização ocidental, não se destacou exatamente pela

grandeza do seu Direito, mas fundamentalmente pela participação dos cidadãos na

vida política.

Os gregos, com a filosofia, inauguraram uma nova etapa para a humanidade,

em que o pensamento descobre a si próprio, liberta-se das amarras da religião e dita

as leis a si mesmo.

Dessa época datam importantes contribuições no terreno da filosofia política,

que são indispensáveis para a afirmação da ideia do constitucionalismo: a valoração

antropocêntrica do ser humano como centro da sociedade política (Sócrates); o

primado da legalidade como garantia dos governados (Platão); a separação dos

poderes e a utilização do bem comum para definição das formas puras de governo

(Aristóteles).

Na Grécia não havia a figura do juiz togado. As divergências eram submetidas

ao rei, que atuava prioritariamente como conciliador e a defesa das partes era feita

por elas próprias ou por cidadão de elevado conceito. Bagnoli e outros (2009, p. 52)

consideram inadequado o emprego da expressão “direito grego”, já que quase “em

todo o período de sua existência, com exceção de Alexandre, não houve na Grécia

uma unidade política e jurídica que viabilizasse essa singularidade”.

No entanto, não se pode negar a valorosa contribuição dos gregos para a

formação do constitucionalismo, principalmente no que se refere aos legados da

filosofia e da democracia. A máxima de Protágoras (480 a.C. – 410 a.C): “o homem

é a medida de todas as coisas”, é emblemática desse legado. O jusnaturalismo da

antiguidade, presente em Platão, e incidentalmente em Aristóteles, foi elaborado na

cultura grega, principalmente pelos estoicos, para quem toda a natureza era

governada por uma lei universal, racional e imanente.

A Grécia brindou a humanidade com um regime político absolutamente

constitucional: a democracia constitucional que o processo de helenização se

encarregou de promover a expansão. A liberdade no pensamento grego decorria da

sua visão organicista e cingia-se ao direito de participação do cidadão nas

deliberações das assembleias da cidade-Estado, num processo de democracia

direta, que ocorriam em praça pública.

Em texto clássico, Foustel de Coulanges (apud SARMENTO, 2012, p. 89)

afirma:

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Ser uma das características da Cidade Antiga – a referência é tanto à Grécia como a Roma – a ausência de liberdade individual diante da onipotência do Estado. Não se cogitava na proteção de direitos individuais contra os governantes, pois se partia da premissa de que as pessoas deveriam servir à comunidade política, não podendo lhes antepor direitos de qualquer natureza.

Roma estava repleta de advogados importantes, apesar de haver poucos

filósofos jurídicos, no entanto, inquestionavelmente, é considerada o berço do direito

ocidental.

O direito romano caracteriza-se pelo formalismo, rigor e exatidão. Em Roma,

embora não houvesse constituições escritas, são observadas formas seminais do

constitucionalismo por meio da valorização do parlamento que impunham algumas

limitações ao poder dos governantes. O que eles criaram deu-nos a possibilidade de

hoje estarmos habitando países que se intitulam “Estado de Direito”. Como um todo,

o direito romano é o conjunto de normas vigentes em Roma, da sua fundação no

sec. VIII a.C. até Justiniano no sec. VI d.C.”

A Lei das Doze Tábuas (450 a.C.), seja ela considerada uma carta de

princípios, um código, ou mesmo um corpo de leis, é um dos principais legados do

Direito romano e foi muito importante para a vida em sociedade, constituindo-se em

poderoso instrumento limitador da hegemonia e do arbítrio dos poderosos.

Conforme Funari (2001, p.83):

As Doze Tábuas não chegaram completas até nós, mas possuímos fragmentos como os seguintes: “quem tiver confessado uma dívida, terá trinta dias para pagá-la”; “quando um contrato é firmado, suas cláusulas são vinculantes, devendo ser cumpridas”; “se um patrão frauda um cliente, que seja amaldiçoado”.

Impende entranhar os caminhos históricos do direito aos das constituições e

do constitucionalismo, e os romanos foram os construtores do que se pode chamar

de direito ocidental. Verificando os códigos civis dos mais diversos países do mundo

ocidental, iremos verificar que boa parte deles foram elaborados tomando-se como

modelo o Juris Corpus Civilis, a recodificação do direito romano que se encontrava

disperso, apesar de ter havido alguns outros códigos como o Gregoriano, o

Hermogeniano e o Teodosiano. O Juris Corpus Civilis surgiu em Constantinopla,

capital do Império Romano do Ocidente (ou império bizantino), por iniciativa do

Imperador Justiniano, a partir do ano de 529 d.C., e resultou no mais famoso e

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tradicional código do mundo. É constituído de quatro partes: Código (Codex),

Digesto (ou Pandectas), Institutos e Novelas.

Conforme Roque (2007, p. 61): Se analisarmos nosso Código Civil, tanto o atual como o antigo, notaremos que ele tem a mesma estrutura, a mesma distribuição que os demais códigos. Consta de vários livros: Parte Geral, Direito das Obrigações, Direito dos Contratos, Direito das Coisas, Direito de Família, Direito das Sucessões.

No entendimento de Correia (2010, p. 66), a história do Direito Nacional

encontra o seu ponto de partida ainda no Império Romano, quando a Península

Ibérica foi submetida ao domínio deste povo (aproximadamente em 146 a.C.),

notadamente com a efetivação de profundas modificações do Corpus Juris Civilis,

organizado no século VI, por Justiniano, imperador romano do oriente.

Conforme Correia (2010, p.66):Esse momento jurídico só veio a ser conhecido na Europa depois das grandes invasões. Por volta de 1080, Irnésio e seus discípulos foram os primeiros a estudar o Corpos Juris em Bolonha, e o ensino desses mestres repercutiu em todo o continente europeu. Estudiosos de todas as nações afluíram para Bolonha desejando conhecer a obra de Justiniano, que transmitia aos prósperos o tesouro da ciência do direito, tal como haviam concebido os jurisconsultos romanos através de elaboração secular. A influência da Escola de Bolonha foi, como podemos imaginar, enorme, e, através dos séculos determinou o caráter e as grandes linhas do Direito Moderno, cujo ponto culminante foi o aparecimento dos chamados Códigos Civis, dentre os quais o Código Civil Brasileiro.

No entanto, é preciso deixar claro que, o constitucionalismo, da forma como o

concebemos atualmente, teve a sua origem na Inglaterra, no período medieval.

2.2 CONSTITUCIONALISMO MEDIEVAL

O período histórico da Europa denominado de Idade Média se estendeu do

século V até o século XV d.C., ou seja, da queda do Império Romano do Ocidente

até a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos, em 1453, e se caracterizou

pelo amplo pluralismo político.

A Idade Média nasceu da união do que restou do Império Romano, mais os

povos germânicos que invadiram a Europa romana, mais a Igreja Católica que

sobreviveu à queda do Império e se fortaleceu durante o período medieval. O Direito

medieval não poderia ser composto por outros elementos senão os descritos acima.

Nenhuma instituição detinha o monopólio do uso legítimo da força, da produção de

normas e da prestação jurisdicional. O poder se fragmentara em diversas

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instituições tais como a igreja católica, os reis, os senhores feudais, as cidades e as

corporações de ofício, sem que houvesse qualquer divisão clara de competências

entre elas, nem uma supremacia inconteste de qualquer uma delas. A religião cristã

foi reconhecida oficialmente pelo imperador Constantino, em 313, com a publicação

do Edito de Milão.

O direito dos povos germânicos (vândalos, visigodos, ostrogodos, francos

etc.) era basicamente consuetudinário, e como o termo germânico engloba uma

série de povos com costumes semelhantes, porém não iguais, é forçoso falar em

direitos germânicos, pois cada tribo tinha sua própria tradição.

Por volta do século V d.C., já estão postas e consolidadas as sínteses

estruturais básicas que darão sustentação a um novo tempo que se inicia e a um

novo mundo no qual a igreja católica tudo organiza e produz. Para atingir seus

objetivos, esta passa a ser produtora de um imaginário social que lhe garante o real

domínio, tanto ideológico, quanto político e jurídico.

Para Nunes (2009, p. 55):

A Igreja copia o modelo estrutural do Estado Romano, com as modificações necessárias para sua eficácia social na emergente rede de relações que cresciam. A Igreja pode ser responsabilizada pela influência prolongada do sistema romano de pensamento predominando na arte e na intelectualidade da época, mesmo com a vigorosa novidade da cosmovisão bárbara.

Portugal e Espanha, como não poderiam deixar de ser, acompanharam a

evolução jurídica do continente. Conforme Correia (2010, p.69), antes da fundação

da monarquia lusitana, em 1140, os territórios portugueses dependiam do Reino de

Leão, aplicando-se em Portugal o Fuero Juzgo ou Lei dos Visigodos. Correia (2010,

p.69) acrescenta: No século XVI, o Rei Afonso X de Castela ordenou a compilação dos Direitos Romanos e Canônicos de juristas formados pelas universidades hispânicas, dentre as quais Salamanca. O obra é conhecida por Ley de las Siete Partidas (1260), talvez pelo fato de cada uma das setes partes começar por uma das letras do prenome do rei: A-L-F-O-N-S-O.

Em Portugal, como decorrência da necessidade de consolidar sua

independência, mediante legislação própria, vieram as Ordenações em substituição

das Sete Partidas.

No magistério de Ferreira Filho (2012, p. 30): Elementos que se vão combinar na ideia de Constituição escrita podem ser identificados, de um lado, nos pactos e nos florais ou cartas de franquia e

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contratos de colonização; de outro, nas doutrinas contratualistas medievais e na das leis fundamentais do Reino, formuladas pelos legistas.

O constitucionalismo, no entanto, como movimento jurídico, político e cultural,

só adquiriu consistência no fim do século XVIII, com o fortalecimento de certos

princípios que passaram a ser adotados pela maioria dos Estados, sob a forma de

declarações de direitos e garantias fundamentais. No entanto, como nos ensina o

Professor João Trindade Cavalcante Filho (2012, p. 2) a história do

constitucionalismo medieval é, basicamente, a história do movimento constitucional

na Inglaterra. Conforme o referido professor, a doutrina tradicional defende que o

fenômeno constitucional surgiu com o advento da Magna Charta Libertatum, imposta

ao Rei João Sem-Terra em 1215, na Inglaterra. Essa, que foi a primeira declaração

formal de direitos, positivou vários aspectos daqueles que hoje são considerados

direitos fundamentais até hoje existentes no Direito Constitucional, como o habeas

corpus, o tribunal do júri, a inviolabilidade dos bens particulares, a anterioridade

tributária, o devido processo legal, etc.

No entanto, Carl Smith, também citado por Cavalcante Filho (2012, p.1),

entende que a Carta Magna não pode ser considerada a primeira constituição, visto

que não era direcionada para todos, mas apenas para uma elite formada por barões

feudais anglo-saxônicos. Por conseguinte, defende a Bill of Rights (Inglaterra,

1688/1689) como a primeira constituição, uma vez que previa direitos

indistintamente para todos os cidadãos e não para uma classe deles. No mesmo

sentido, Noblet (apud SILVA, 2011, p.152):Longe de ser a Carta das liberdades nacionais, é, sobretudo, uma carta feudal, feita para proteger os privilégios dos barões e os direitos dos homens livres. Ora, os homens livres, nesse tempo, ainda eram tão poucos, que podiam contar-se, e nada de novo se fazia a favor dos que não eram livres.

Todavia, apesar da existência de controvérsias, há de se reconhecer que a

Magna Carta se constituiu em um tradicional símbolo do constitucionalismo.

Comentando as afirmações acima, sobre a Magna Carta, Silva (2011, p.152)

completa:Essa observação de Noblet é verdadeira, mas não exclui o fato de que ela se tornasse um símbolo das liberdades públicas, nela consubstanciando-se o esquema básico do desenvolvimento constitucional inglês e servindo de base a que juristas, especialmente Edward Coke com seus comentários, extraíssem dela os fundamentos da ordem jurídica democrática do povo inglês.

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É preciso compreender que a Carta Magna foi apenas o marco inicial de um

processo em evolução. Dallari (2010, p. 31) complementa:

Na realidade, as peculiaridades da Constituição inglesa não foram estabelecidas de um momento para outro, tendo-se afirmado gradativamente, através de um longo processo histórico em que se registram momentos de maior clareza e outros de aparente eliminação do direito em favor da força. Como resultado desse processo foram sendo acumulados costumes, instituições, leis e decisões sobre conflitos de direitos, elementos que, no seu conjunto, compunham a ideia de constituição da sociedade. Esse conjunto, reconhecido pelos que tinham o poder de decidir e acatado pelo povo, foi sendo aceito como um sistema de regras legais superiores, costumeiras em sua maioria, mas parcialmente escritas. Assim se chegou à Constituição jurídica, que nos seus primórdios foi quase que exclusivamente costumeira.

No fim da idade média a Europa passou por profundas mudanças – o

renascimento, que se iniciou no século XIV e se estendeu até o século XVII. O

movimento renascentista que começou pela península ibérica, terminou por

contagiar toda a Europa.

Nas pesquisas bibliográficas que fiz com o intuito de colher subsídios para

este trabalho não encontrei, senão vagas referências, ligação mais forte entre o

renascimento e o constitucionalismo. No entanto, quero crer, que se negligenciou

em não se estabelecer as sólidas influências que o renascimento exerceu sobre o

constitucionalismo.

O renascimento representou um retorno às formas artísticas da antiguidade

clássica ou greco-romana, ao mesmo tempo em que exaltava o humanismo e o

racionalismo. O homem foi o centro das preocupações renascentistas. No “Homem

Vitruviano”, Leonardo da Vinci retratou a sua concepção da perfeição humana,

associando-a ao centro do universo.

Abandonou-se o teocentrismo, onde tudo girava em torno do divino e a

influência da religião se sobrepunha, pelo antropocentrismo, onde o ser humano

passou a ser a obra mais perfeita do Criador, com capacidade para compreender,

modificar e até dominar toda a natureza. O humanismo se tornará, a partir de então,

referência para muitos dos pensadores, inclusive, os iluministas do século XVIII.

Sem dúvidas que o direito romano e até o direito canônico incorporaram muito dos

ensinamentos humanísticos que eclodiram do renascimento. O renascimento se

irradiou sob variadas vertentes, tais como a científica, a artística (pintura, escultura e

literatura).

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O desenvolvimento do comércio na península itálica foi marcante nessa

época, e favoreceu o crescimento da produção artística e intelectual de muitas

regiões como Veneza, Florença e Gênova. As grandes conquistas culturais tiveram

o apoio de famílias italianas como os Médici (Florença), os Sforza (Milão), os Este

(Ferrara), os Gonzaga (Mântua), os Dogos (Veneza), além do Papado (Roma).

As constituições brasileiras não se referem nominalmente ao humanismo. Na

opinião do ministro aposentado do STF Carlos Ayres Britto, nem precisam, bastando

que falem de democracia para que o humanismo esteja automaticamente normado.

Sobre o humanismo, Britto (2009, p. 20) diz: O desenrolar do tempo tem situado o gênero humano no centro do universo. Da proclamação de que ‘o homem é a medida de todas as coisas’ (Protágoras) ao ‘cogito’ de René Descartes, passando pela máxima teológica de que todos nós fomos feitos à imagem e semelhança de deus, o certo é que a pessoa humana passou a ser vista como portadora de uma dignidade inata. Por isso que titular do ‘inalienável’ direito de se assumir tal como é: um microcosmo. Devendo-se-lhe assegurar todas as condições de busca da felicidade terrena.

O processo histórico que desaguou na etapa subsequente do

constitucionalismo, tem como característica a luta pela liberdade e contra o

absolutismo do Antigo Regime, que foi marcado pelo capitalismo comercial (política

mercantilista), pelo sistema colonial e pelo Absolutismo Monárquico que tem a sua

origem na idade média, quando começaram a ressurgir o comércio, o monetarismo e

a busca por centralização política que embora tenha modificado a estrutura

fragmentada do poder feudal, não a eliminou por completo. O absolutismo, em

qualquer de suas formas, prevê a concentração do exercício do poder. O

Constitucionalismo, pelo contrário, prevê que esse exercício seja partilhado.

2.3 CONSTITUCIONALISMO MODERNO

As grandes contribuições e os acontecimentos que mais influenciaram no

moderno constitucionalismo decorreram da Revolução Gloriosa, também conhecida

por “Revolução sem sangue” por ter transcorrido de forma pacífica, ocorrida na

Inglaterra entre 1688 e 1689; a Revolução Americana ocorrida entre 1775 e 1783,

que foi a revolta das colônias inglesas na América do Norte e resultou na

independência destas, que vieram a se constituir nos Estados Unidos da América; e

a Revolução Francesa de 1789, que recebeu influência das ideias iluministas e da

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Revolução Americana, que é considerada um marco divisório na história, dando

início à idade contemporânea.

O ambiente histórico no qual insurgiu esses acontecimentos era dominado

pelo absolutismo monárquico que predominou em quase toda a Europa nos séculos

XVI a XVIII e que se personificou na figura emblemática do rei francês Luís XIV, o rei

sol, a quem se atribui a frase “L’Etat c’est moi” (O estado sou eu). O absolutismo

monárquico se caracterizou pela centralização do poder político nas mãos do

monarca; pela burocracia estatal que proporcionou a uniformidade das leis, dos

impostos e da moeda; pela existência de um exército permanente; e, pela

delimitação das fronteiras nacionais. Na Inglaterra, o absolutismo está simbolizado

na figura emblemática do rei Henrique VIII, da dinastia Tudor. Fundador do

anglicanismo, ele rompeu com a Igreja católica, assumindo, assim, o controle das

propriedades eclesiásticas na Inglaterra. Conforme Schwanitz (2007, p. 74): “Na

Inglaterra, as crianças aprendem na escola a sequência das seis esposas de

Henrique VIII por meio da seguinte fórmula: divorciada, decapitada, morta /

divorciada, decapitada, sobrevivente”. No entanto, o absolutismo inglês era frágil se

comparado aos dos países do continente (França, Espanha, Portugal).

No fim da idade média, a Europa saía do regime feudal que era politica, social

e economicamente descentralizado. A fragmentação política se constituía num grave

obstáculo ao desenvolvimento das forças econômicas emergentes, pois cada feudo

tinha suas próprias regras jurídicas, sua própria moeda, seu sistema de pesos e

medidas. Toda essa situação impedia a expansão do comércio e reduzia

sobremaneira os limites dos mercados. Era necessário, portanto, a criação e o

fortalecimento dos Estados nacionais. Essa situação se deu, principalmente, pela

expressiva contribuição da burguesia que se interessava por um Estado forte e

capaz de organizar a sociedade da época, propiciando condições favoráveis ao

desenvolvimento comercial, com estabilidade jurídica e institucional.

O absolutismo também contou com o suporte teórico dos grandes pensadores

políticos, tais como Nicolau Maquiavel (1469-1527), pensador italiano do

Renascimento, que em sua obra “O Príncipe”, escrita em 1533, empregou o termo

“Estado” e propagou a secularização do poder.

Várias teorias procuram explicar a origem do Estado, dentre as quais se

destacam as teorias contratualistas.

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Para Gonzaga (2010, p. 69): O contratualismo consiste, basicamente, na concepção de que os homens em um Estado de Natureza (sem organização Estatal), que é alterado por um Estado Político ou Civil por meio de um Contrato Social, surgido por opção dos participantes. Os conteúdos do Estado de Natureza, do Contrato Social e do Estado Político variam conforme o entendimento de cada pensador.

Outro importante pensador que muito contribuiu para o constitucionalismo foi

Thomas Hobbes (1588-1679), filósofo inglês, que explanou sobre a natureza

humana enfatizando o aspecto contratual do poder. No entendimento desse filósofo,

o contato social somente pode consistir numa doação total e incondicionada de cada

um ao soberano. Em sua obra Leviatã (o título refere-se ao monstro bíblico, citado

no “livro de Jó”, que governava o caos primitivo), o filósofo comparava o Estado a

um monstro todo-poderoso, criado para acabar com a anarquia, pois nas sociedades

primitivas o homem era o lobo do próprio homem. Para Hobbes, vivendo em

constantes guerras e matanças, o homem tem procurado garantir a sua própria

sobrevivência num mundo de recursos escassos e é justamente essa escassez de

recursos que faz com que os homens sejam conflituosos; que faz com que a

agressividade aflore em cada um, e, consequentemente, exploda num desequilíbrio

que, somente a violência, individualmente, poderia resolver. Só haveria uma

solução para por fim à brutalidade: entregar o poder a um só homem, o rei, que

governaria a sociedade, eliminando a desordem e dando segurança a todos. Essa é

a teoria do contrato social como origem do poder do governante.

É importante que se registre a contribuição de Jean Bodin (1529-1596),

filósofo e jurista francês, para quem o poder do rei é perpétuo e absoluto; e de

Jacques Bousseut (1627-1704), bispo e teólogo francês, contemporâneo de Luís

XIV, que na obra “A Política tirada da Sagrada Escritura”, defende a teoria do Direito

divino dos reis, justificando que Deus delegava o poder político ao monarca,

conferindo-lhe autoridade incontestável e ilimitada.

Essa concepção político-teológica sustentava a origem divina do poder. Os

governantes eram considerados representantes de Deus na terra, escolhidos e

investidos diretamente pela própria divindade. Referindo-se à Teoria da

Irresponsabilidade do Estado Absolutista, acrescenta Alexandre Mazza (2012, p.

290): “Por isso, eventuais prejuízos causados pelo Estado deveriam ser atribuídos à

providência divina e, se Deus não erra, o atributo da inerrância se estendia aos

governantes nomeados por Ele”.

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Sobre o absolutismo, (DALARI, 2010, p. 67) faz as seguintes considerações: O absolutismo é referido por muitos autores como a marca definidora de um período histórico em que o poder foi obtido e exercido sem qualquer regra limitadora, sem controle de espécie alguma e, em última análise, sem legitimidade jurídica. Outros preferem identificar o absolutismo como sendo um modelo de poder político, sem identificação de um período histórico, no qual o governante impõe arbitrariamente sua vontade, sem possibilidade de contestação. Na realidade, são essas as características do poder político no absolutismo, não se podendo negar, a partir do conhecimento dos fatos, que numa determinada fase da história da humanidade foi marcante a presença dessa espécie de poder.

Conforme Dallari (2010, p.119), nos Estados Unidos da América o

constitucionalismo ganhou maior importância que na França, pois naquele país a

Constituição elaborada em 1787 substituiu o tratado que, após a Declaração de

Independência de 1776, havia estabelecido a união das antigas colônias numa

confederação. A Constituição era a garantia da preservação da unidade, e isso lhe

dava um significado político e uma importância extraordinária que ela não teve na

França.

A par disso, mas também como reflexo da recente conquista da

independência, ouve a preocupação de impedir que, como observou Thomas

Jefferson (apud DALLARI, 2010, p. 119), “tendo-se livrado do absolutismo inglês,

sucumbissem a um absolutismo local”.

Na Europa, o reconhecimento do valor jurídico das constituições se deu com

mais vagar que na América, pois naquele continente o absolutismo se aferrava no

poder e resistia aos tentáculos do liberalismo que se insurgia através do iluminismo

e enfatizava a supremacia da lei e do parlamento, o que, nas palavras de Branco

(2012, p. 44), terminou por ensombrecer o prestígio da constituição como norma

vinculante.

A monarquia absolutista utilizava em seu proveito das explicações de caráter

religioso quanto à origem do poder real, externadas pelo jurista e filósofo francês

Jean Bodin (1529-1596) e reforçadas pelo bispo francês Jacques Bossuet (1627-1704).

Quanto a Bodin (MENDES & BRANCO, 2012, p. 44):Em 1576, Bodin publica, em Paris, os “Seis Livros da República” e teoriza sobre o poder absoluto do soberano – o rei. Para o autor esse é perpétuo e absoluto. É perpétuo porque não pode ser revogado. E não pode ser porque não deriva de um outro poder, não é fruto de uma delegação, mas é originário. O poder é absoluto no sentido de não estar submetido nem a controle nem a contrapeso por parte de outros poderes. Para Bodin, o poder é absoluto, porque cabe ao rei dispor de assuntos da soberania, como legislar, declarar a guerra e firmar a paz, decidir em última instância as controvérsias entre os súditos, nomear magistrados e tributar.

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Sobre as ideias de Boussuet, Cotrin (1997, p.128) acrescenta:

O rei era um homem predestinado por Deus para assumir o trono e governar toda a sociedade. Por isso, não precisava justificar suas atitudes. Somente Deus poderia julgá-las. Bousset criou uma frase que se tornaria verdadeiro lema do Estado absolutista: Um rei, uma fé, uma lei.

Conforme Barroso (2010, p. 368), no início do constitucionalismo moderno, na Europa, a constituição era vista como uma Carta Política que servia de referência para as relações entre o Estado e o Cidadão, ao passo que o Código Civil era o documento jurídico que regia as relações entre particulares e frequentemente mencionado como a “Constituição do direito privado”.

Sobre a questão, Marmelstein (2011, p. 448) acrescenta:A ascensão do constitucionalismo surge, então, como uma alternativa ao modelo clássico da separação de poderes, numa tentativa de dificultar o desrespeito de valores básicos por um grupo majoritário que ocasionalmente conquiste o poder político. Buscando inspiração no modelo norte-americano dos “freios e contrapesos” (“checks and balances”), onde a guarda da constituição é uma atividade exercida, em última instância, por órgãos judiciais, houve um movimento de fortalecimento da crença na normatividade constitucional e na ideia de controle jurisdicional de constitucionalidade.

Assim sendo, fica evidente que o constitucionalismo impõe-se como

mecanismo de estabilização e equilíbrio das forças reais do poder, de forma que

estas atuem na medida certa dos limites da participação constitucionalmente

estabelecida.

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3 MODELOS DE CONSTITUCIONALISMO

São três os modelos clássicos de constitucionalismo: o inglês, o francês e o

americano. Trataremos, resumidamente, de cada um deles.

3.1 CONSTITUCIONALISMO INGLÊS

Não se pode afirmar com certeza da existência do absolutismo na Inglaterra,

pois desde o final da Idade Média, o poder do soberano vinha sofrendo limitações

por determinados costumes e pactos estamentais, entre os quais o mais conhecido

que é a Magna Carta, de 1215, mas tornada definitiva em 1225. A Marga Carta,

imposta ao rei João Sem Terra, não é de natureza constitucional, pois está longe de

ser uma Carta das liberdades nacionais. É, sobretudo, uma carta feudal feita para

proteger os privilégios dos barões e os direitos dos homens livres.

Caetano (2003, p.46) acrescenta: A Magna Carta foi confirmada pelos sucessores de João Sem Terra. Escrita em latim, poucos conheciam o seu exato teor e apenas no século XVI é que veio a ser traduzida para o inglês: conquista das classes privilegiadas, eram os homens cultos que a invocavam e que dela extraíam o seu conteúdo político.

No entanto, a Magna Carta se constitui num marco da história da Inglaterra, e

mais especificamente do constitucionalismo inglês, por deflagrar um processo que

viria a desaguar na criação do Parlamento Britânico. Do parlamento saíram diversas

leis importantes, tais como a Petition of Rights, de 1628, o Habeas Corpus Act, de

1679, a Bill of Rights, de 1689 e o Act of Settlement, de 1701, que impondo limites à

Coroa e transferindo poder ao Parlamento, garantem importantes liberdades para os

súditos ingleses.

Apesar dos intermitentes movimentos revolucionários, desenvolveu-se na

Inglaterra um longo, lento e progressivo processo de construção de instituições

constitucionais que determinaram um modelo político-jurídico e que contemplava o

Poder Real, a aristocracia e os comuns. Esse modelo misto, único em sua época,

inspirado no ideal da ética aristotélica do medius in virtus (meio termo), era um

sistema de governo misto que não se identificava com os modelos tradicionais, ou

seja: monarquias absolutas, repúblicas aristocráticas, nem, tampouco regimes

puramente democráticos como o já experimentado na Grécia antiga.

Conforme Branco (2012, p. 51), “A supremacia do Parlamento não se concilia

com a ideia de supremacia da Constituição. Essa concepção incontrastável do

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Parlamento debita o valor efetivo da Constituição, que não se encontra, nesse

contexto, protegida conta o Legislativo”.

Para Luigi Ferrajoli (apud BARROSO, 2010, p.41): “a transformação do

Estado absoluto em Estado de direito acontece juntamente com a transformação do

súdito em cidadão, é dizer, em sujeito titular de direitos já não apenas ‘naturais’, mas

‘constitucionais’ em face do Estado, que a eles fica vinculado”.

Daw Olivier (apud DALLARI, 2010, p.181) afirma: Não nega a existência de uma constituição inglesa, mas acha importante deixar claro que nunca foi aprovada pelo Parlamento uma lei denominada “Constituição”. Por tal razão, afirma ele, é muito conveniente fazer a distinção entre “Constituição com C maiúsculo”, como é o caso da Constituição dos Estados Unidos, e “constituição com c minúsculo” que é, segundo ele, o que se tem na Inglaterra.

Uma ideia central do constitucionalismo inglês é a de respeito às tradições

constitucionais. A Inglaterra permanece um país sem Constituição escrita e sem

códigos. Sarmento (2012, p. 94) destaca que “surgiu na Inglaterra o documento que

talvez possa ser considerado como a primeira Constituição escrita: o instrument of

Government, outorgado por Oliver Cromwell, em 1653, na fase republicana da

Revolução Inglesa, tendo vigorado por quatro anos”.

Para Dallari (2010, p.183) a opinião de Alexis de Toqueville (1805-1859),

pensador político, historiador e escritor francês, levada ao pé da letra veio reforçar a

ideia de que a Inglaterra não era dotada de uma Constituição: Toqueville, defensor das ideias liberais tomou como modelos Estados Unidos, a França e demais países que, também buscando a garantia da liberdade, haviam adotado uma Constituição escrita. Em sua concepção, a Constituição deveria ser escrita, que consagrasse um sistema liberal. Como a Inglaterra não tinha uma lei dessa natureza, sua conclusão foi que a Inglaterra não tinha Constituição, e por isso foi repetido por vários autores, que tomaram a afirmação em sentido literal e foram influenciados pelo prestígio intelectual de Toqueville.

Na Inglaterra, desenvolveu-se o princípio constitucional da soberania do

Parlamento, segundo o qual o Poder Legislativo pode editar norma com qualquer

conteúdo. Não há a possibilidade de invalidação das suas decisões por outro órgão.

Daí decorre o caráter flexível da Constituição britânica, que pode ser alterada pela

mesma fórmula como são editadas as leis.

O século marcante na definição do modelo constitucional inglês foi o XVII,

caracterizado pelas fortes tensões entre a Coroa e o Parlamento e por diversas

reviravoltas políticas, que culminaram na Revolução Gloriosa de 1688, a qual depôs

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a monarquia dos Stuarts. Aquela revolução assentou o princípio da supremacia

política do Parlamento inglês, em um regime pautado ao respeito aos direitos

individuais.

Conforme Dallari (2010, p. 188): A construção desse modelo, que os constitucionalistas ingleses chamam de “Modelo de Westminster”, foi gradativa, iniciando-se, praticamente no século XIII, na sequência da promulgação da Magna Carta, e tendo o seu ponto culminante nos anos de 1688 e 1689, com o movimento de profunda renovação política que os ingleses denominam de “Revolução Gloriosa”, quando se consolidam a supremacia do Parlamento em relação ao rei e a superioridade da Câmara dos Comuns sobre a Câmara dos Lordes. É o momento em que, embora sem uma declaração formal e tendo de passar por várias etapas antes de atingir a configuração atual, a burguesia, por meio dos seus representantes na Câmara dos Comuns, assume, praticamente, o governo da Inglaterra. Em 1999, por decisão do Parlamento, ficou estabelecido que ninguém mais será membro da Câmara dos Lordes por hereditariedade.

Common Law é o nome que se dá ao sistema jurídico elaborado na Inglaterra

a partir do século XII, embasada nas decisões das jurisdições reais. Conforme

Maciel e Aguiar (2007, p.115), o common law é um direito jurisprudencial (judge-

made-law), enquanto a jurisprudência apenas desempenhou papel secundário na

formação e evolução dos direitos romanistas.

3.2 CONSTITUCIONALISMO FRANCÊS

Começou a se propagar na França do século XVIII a ideia de que era possível

opor-se às tiranias e vencê-las, dissipando, assim, as trevas da ignorância com as

luzes da razão. Escritores franceses da época, chamados indistintamente de

filósofos, empreenderam uma verdadeira revolução intelectual na história do

pensamento moderno. Esses filósofos, inimigos da intolerância, defendiam, acima

de tudo, a liberdade e suas ideias se alinhavam com a primazia da razão, na busca

da felicidade humana. Defendiam o progresso, buscando uma explicação racional

para tudo e rejeitavam as viciadas tradições.

O iluminismo representou a culminação de um processo que se iniciou no

renascimento quando a razão se impôs como método e culminou como a fonte de

inspiração para o movimento revolucionário mais importante da história moderna.

A Revolução Francesa de 1789 foi, incontestavelmente, um marco na história

da humanidade porque se constitui num verdadeiro rompimento com o passado, e

contém todos os requisitos fundamentais que caracterizam aquilo que o sociólogo

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italiano Domenico De Masi chama de “salto de época”. A Revolução Francesa foi o

grande marco do constitucionalismo francês e com a sua eclosão o

constitucionalismo ganha foros de evidência e espalha-se pelo continente europeu.

Os revolucionários franceses não tinham apenas a intenção de modificar

pontualmente o Antigo Regime, mas de formar um novo Estado e uma nova

sociedade, erigida sob o ideário iluminista da igualdade, da liberdade e da

fraternidade.

Para Sarmento (2012, p.96), tais valores estavam bem sintetizados na

Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, cuja definição de

Constituição estabelecida no seu art. 16, bem expressava o pensamento liberal:

“Toda sociedade, na qual a garantia dos direitos não é assegurada, nem a

separação dos poderes determinada, não tem Constituição”.

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 era a afirmação

dos valores morais da revolução, pois nela estavam contidos o caráter de norma

superior e os fundamentos básicos de uma nova organização política; daí o motivo

que levou a Assembleia Nacional francesa a decidir imprimir uma coloração toda

especial, ao inserir essa declaração como preâmbulo da primeira Constituição da

França, de 1791. Destarte, temos neste fato o traço mais original que vem a se

constituir no ponto caracterizador do modelo de Constituição francesa, isto é, a

adoção de uma declaração de direitos como parte integrante da Constituição.

Conforme Dallari (2010, p. 200):

A adoção da ideia de Constituição como fundamento filosófico e político da organização social, como perspectiva universal e idealizada com base nos valores fundamentais da pessoa humana, indo muito além da busca de solução para problemas locais e imediatos, foi a contribuição, extremamente importante, dada pela França ao constitucionalismo.

Certamente a Revolução Americana, que acabara de ocorrer, foi um marco

importante na crise do Antigo Regime europeu, não só porque rompeu com a

unidade do sistema colonial, mas também pelo fato de existir entre os

revolucionários uma cumplicidade ideológica, que se alimentava do

compartilhamento das ideias dos filósofos iluministas franceses.

Conforme Dallari (2010, p. 208):

Vários dos líderes da Assembleia francesa tinham conhecimento dos principais documentos da revolução americana, e dentre estes ressalta,

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como um passo fundamental rumo à independência e ao estabelecimento de diretrizes para a organização do novo Estado, a Declaração de Direitos aprovada pela Assembleia da colônia de Virgínia, em 12 de janeiro de 1776. É oportuno lembrar que, Thomas Jefferson, um dos principais autores da Declaração de Independência das colônias inglesas da América, era embaixador dos Estados Unidos na França quando a Assembleia Nacional francesa discutia a adoção do constitucionalismo, e certamente suas informações tiveram grande peso na orientação dos membros da Assembleia. Note-se, entretanto, que, ao criar a Constituição escrita, em 1787, os líderes americanos não incluíram nela uma Declaração de Direitos, o que só iriam fazer em dezembro de 1791, quando foram aprovadas as dez primeiras emendas à Constituição.

Apesar da Constituição Americana de 1787, por uma série de circunstâncias

históricas, preceder à francesa, foi na França onde os libertadores americanos

buscaram a inspiração filosófica e as diretrizes para a implantação de uma

sociedade livre e igualitária, pois, naquela época, os Estados Unidos ainda estavam

praticamente ausentes das relações internacionais que se desenvolviam entre as

nações europeias. Acrescente-se que, ao contrário da França, epicentro do

iluminismo, não havia nos Estrados Unidos grandes filósofos políticos que pudessem

influenciar com suas ideias os teóricos e políticos de outras partes do mundo.

Para a maioria dos autores, a França teve quinze constituições. A primeira

delas, de duração efêmera, teve como fonte de inspiração o constitucionalismo

inglês, que somente veio a firmar-se na doutrina francesa por ocasião da edição do

Esprit des Lois, de Montesquieu, em 1748. E em todas elas os franceses incluíram

Declarações de Direitos. Nas Constituições de 1946 e 1958, a Declaração de

Direitos de 1789 foi expressamente adotada como Preâmbulo da Constituição.

Jacques Robert (apud SILVA, 2010, p. 157/158) enumera três caracteres

fundamentais da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão: a) intelectualismo, porque a afirmação de direitos imprescritíveis do homem e a restauração de um poder legítimo, baseado no consentimento popular, foi uma operação de ordem puramente intelectual que se desenrolaria no plano unicamente das ideias; é que, para os homens de 1789, a Declaração dos direitos era antes de tudo um documento filosófico e jurídico que deveria anunciar a chegada de uma sociedade ideal; b) mundialismo, no sentido de que os princípios enunciados no texto da Declaração pretendem um valor geral que ultrapassa os indivíduos do país, para alcançar valor universal. c) individualismo, porque só consagra as liberdades dos indivíduos, não menciona a liberdade de associação nem a liberdade de reunião; preocupa-se com defender o indivíduo contra o Estado.

Receptária da influência iluminista, a exemplo do contratualismo democrático

baseado na soberania da vontade geral defendida por Rousseau; e da afirmação da

separação dos poderes como técnica jurídico-política de contenção do arbítrio do

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Barão de Montesquieu; a Constituição francesa de 1791 foi a primeira carta escrita

da França e de toda a Europa.

3.3 CONSTITUCIONALISMO AMERICANO

A história do constitucionalismo americano está atrelada à história da

colonização e da luta pela independência política das colônias inglesas na América.

As treze colônias inglesas da América, que mais tarde vieram formar os Estados

Unidos, formaram-se a partir do século XVII.

Conforme Barroso (2010, p. 15):

A primeira colônia foi Virgínia, fundada em 1606, por uma companhia de comércio internacional. Massachusets foi colonizada pelos puritanos, que vieram no navio Mayflower e desejavam criar uma comunidade regida por seus valores religiosos. Para Maryland foram os católicos, então perseguidos na Inglaterra, e na Pensilvânia estabeleceram-se os quakers. Na Geórgia instalaram-se súditos endividados, que vieram recomeçar a vida no novo mundo. Diferentemente do que ocorria com as colônias dos demais países europeus, que exportavam suas próprias vicissitudes: absolutismo, centralismo burocrático e intolerância religiosa.

Para Silva (2010, p. 153), a primeira declaração de direitos fundamentais, em

sentido moderno, foi a Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia, que era

uma das treze colônias inglesas na América. Essa declaração de 12.01.1776

precede à Declaração de Independência dos Estados Unidos.

Conforme Silva (2010, p. 153): A Declaração de Virgínia se preocupa com a estrutura de um governo democrático, com um sistema de limitação de poderes. Os textos ingleses apenas tiveram por finalidade limitar o poder do rei, proteger o indivíduo contra a arbitrariedade do rei e firmar a supremacia do Parlamento. As declarações de direitos, iniciadas com a de Virgínia, importam em limitações do poder estatal, inspiradas na crença na existência de direitos naturais e imprescritíveis do homem.

No entendimento de Silva (2010, p. 153), a Declaração de Virgínia e a de

outras ex-colônias inglesas na América são mais concretas, preocupadas com a

situação particular que afligia aquelas comunidades, enquanto a Declaração

francesa de 1789 é mais abstrata, mais universalizante.

A afirmação do constitucionalismo nos Estados Unidos se deu com a Carta

Americana de 1787. Sintética, com apenas sete artigos e vinte e sete

emendas, a Constituição norte-americana introduziu, em substituição à

confederação de Estados Soberanos, o federalismo como forma de Estado.

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Influenciados pelo pensamento de Montesquieu, sistematizador da teoria da

separação do poder (que se pode resumir na frase: “o poder deve limitar o poder”),

os constituintes americanos, reunidos na Filadélfia em 1787, rejeitaram o modelo

parlamentarista que vigia na Inglaterra e estabeleceram o presidencialismo como

forma de governo.

A forma presidencialista foi criada nos Estados Unidos para limitar o poder do

governo e garantir a liberdade dos cidadãos, introduzindo a separação total do

legislativo, executivo e judiciário através de um sistema de pesos e contrapesos no

qual cada poder fiscaliza os demais, sem que haja predomínio de nenhum deles.

O modelo presidencialista americano surgiu de forma espontânea. Não foi

fruto de uma elaboração teórica, tampouco de lenta evolução histórica, como

ocorrera com o parlamentarismo. Atualmente, o modelo presidencialista é adotado,

sob as mais variadas formas, em diversos países.

O chefe do Executivo, o presidente e o vice-presidente da República são

eleitos em eleição indireta. O poder legislativo, eleito diretamente, é bicameral,

composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado; e o Poder Judiciário, tendo a

Suprema Corte como órgão de cúpula, incumbido de zelar pela supremacia da

Constituição através do controle de constitucionalidade das leis e dos atos

normativos.

A história do constitucionalismo americano é contada pelas decisões da

Suprema Corte, órgão supremo do Poder Judiciário, composto por nove membros

(justices). Por isso a Constituição americana teve a plasticidade necessária para se

adaptar a novas realidades.

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4 CONSTITUCIONALISMO NO BRASIL

As revoluções gloriosa, americana e francesa, inspiradas nos ideais de

igualdade e legalidade contrárias ao absolutismo, à época tão em voga, reavivou o

espírito liberal e democrático tão presentes no Estado constitucional.

A constituição é a carta política que representa a identidade de um país e põe

à mostra a sua organização, os elementos constitutivos do poder e a forma

articulada de atuação com o propósito de integrar todo um povo no objetivo precípuo

de promover o bem comum.

Ao chegar à terra brasilis, Cabral encontrou um continente habitado por

selvagens (bons selvagens, como diria Rousseau). Estes ainda se encontravam no

estágio paleolítico, pois buscavam a sua subsistência no extrativismo vegetal, na

caça e na pesca. Sob o aspecto civilizatório, estavam os habitantes desse imenso

continente, completamente distantes e dissociados do que se poderia chamar de

mundo civilizado. Viviam nus, eram nômades e praticavam apenas formas

rudimentares e incipientes de agricultura ou qualquer outra forma de acumulação de

riqueza necessários para a sua fixação à terra.

O escrivão da frota portuguesa, Pero Vaz de Caminha, em carta dirigida ao rei

de Portugal, D. Manuel, assim descreve o habitante da terra que acabara de ser

descoberta:

A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Não fazem o menor caso de encobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso tem tanta inocência como em mostrar o rosto. (...) Eles não lavram nem criam. Não há aqui boi nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha, nem qualquer outra alimária, que costumada seja ao viver dos homens. (...) Neste dia, enquanto ali andaram, dançaram e bailaram sempre com os nossos, ao som dum tamboril dos nossos, em maneira que são muito mais nossos amigos que nós seus. (ROCHA, s./d., p. 10).

A penetração do colonizador não se fez de forma abrupta e ostensiva. A

relação com o bom e inocente selvagem se deu de forma gradativa e planejada,

procurando aquele conquistar a simpatia deste, presenteando-o com quinquilharias.

Só mais tarde, com o avanço do projeto colonizador da metrópole é que o nativo

passa a oferecer resistência.

O colonizador português, com a vantagem avassaladora do seu estágio

civilizatório que implicava em elaborada forma de organização social e política

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instrumentalizada pela navegação marítima atuava concomitantemente em várias

partes do território, tratando de impor o domínio total. Os jesuítas trabalharam a

implementação do modus vivendi do dominador: a educação, a cultura, a religião, a

moral, a ética e o direito português.

J C de Oliveira Torres (apud SOUZA JÚNIOR, 2002, p.18) lembra que o Brasil

registra o caso mais típico de anterioridade do Estado à comunidade, numa

formação diametralmente oposta à dos Estados Unidos. Tendo a Coroa Portuguesa

conseguido um chão na América para povoar e civilizar, após a tentativa privatista

das Capitanias Hereditárias, decidiu-se por uma alternativa nitidamente pública:

criou-se um governo-geral, implantando-se uma filial do Estado português. Para

Souza Júnior (2002, p.18), desde o desembarque de Tomé de Souza, em 1549,

tivemos já o Estado, com sua máquina completa, sem que tivéssemos, ainda, um

território definido, nem um povo a ser governado.

Com os colonizadores também vieram os flagelos da administração pública.

Conforme Brito informa (2012, p. 49), não sem motivo, desde o século XVII, o padre

jesuíta Antônio Vieira já denunciava os colonizadores, espanhol e português, com

estas corajosas palavras: “os governadores chegam pobres às Índias ricas e saem

ricos das Índias pobres” (referindo-se às Índias Ocidentais, nome dado à América

por Cristóvão Colombo, que acreditava ter atingido a Ásia).

Um aspecto de suma importância para a formação do constitucionalismo

brasileiro diz respeito à construção da identidade nacional, ou seja, a definição do

que é ser brasileiro. A grande preocupação dos políticos e estudiosos com a

cidadania brasileira passou a ser pautada, mais objetivamente, logo após a família

real portuguesa ter aportado no Rio de Janeiro. Conforme Dolhnikoff (s./a., p.14): “A

construção de um Estado nacional no Brasil do século XIX seguiu os modelos

oferecidos por Europa e Estados Unidos”.

No século XIX, diversos estudiosos, entre os quais José Bonifácio e Francisco

Adolfo Varnhagen e indianistas como José de Alencar e Gonçalves de Magalhães

destacaram-se no período. José Bonifácio de Andrade e Silva (1763-1838) é um

bom exemplo da extensa linhagem de intérpretes oitocentistas. Apesar de ter

nascido em Santos, José Bonifácio, membro da burocracia lusitana, era um

mineralogista reconhecido na Europa e ávido leitor dos pensadores ilustrados.

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Homem de ciências e letras, em 1819, aos 56 anos de idade retorna ao Brasil após

uma longa estada no velho continente, dando início, no ano seguinte, a uma

brilhante carreira política. Para ele a solução da identidade era a mestiçagem,

apesar do desafio de unificar grupos aparentemente inconciliáveis: negros, brancos

e mestiços; escravos, livres e índios. Para Bonifácio era preciso criar uma nova

“raça” com um repertório cultural comum, que servisse de substrato para a nova

identidade nacional. A Solução era a mestiçagem.

Em “Projetos para o Brasil”, Bonifácio (1998, p. 372) ensina como liquidar as

diferenças raciais e ao mesmo tempo civilizar índios e negros por meio da mistura

sanguínea e cultural com os brancos:

Daqui, porém, não se deve concluir que seja impossível converter estes bárbaros em homens civilizados: mudadas as circunstâncias, mudam-se os costumes. (...) A facilidade de os domesticar era tão conhecida pelos missionários, que o Padre Nóbrega, segundo refere o Vieira, dizia por experiência, que com música, e harmonia de vozes se atrevia a trazer a si todos os gentios da América. Os jesuítas conheceram que com presentes, promessas e razões claras, e sãs expendidas por homens práticos na sua língua podiam fazer dos índios bárbaros o que deles quisessem. Com um evangelho em uma mão e com presentes, paciência e bom modo na outra tudo deles conseguiam. Com efeito, o homem primitivo nem é bom, nem é mau, naturalmente, é um mero autômato, cujas molas podem ser postas em ação pelo exemplo, educação e benefícios.

No entanto, o projeto de José de Bonifácio não se concretiza. No artigo Os

primeiros intérpretes da então jovem nação, Miriam Dolhnikoff explica as causas do

fracasso do projeto bonifaciano: “A mestiçagem com fulcro na nacionalidade

afrontava um dos elementos básicos sobre o qual se constituíra a identidade da

própria elite: sua cor branca. A identidade nacional deveria refletir a identidade

branca da elite que construía o país”.

Entre as vozes que prescreviam uma nacionalidade exclusivamente branca,

estava a de Francisco Adolfo Varnhagen (1816-1878). Formado em Lisboa, dedicou-

se ao estudo da história do Brasil. Sua mais importante obra foi publicada em 1857,

com o título de História Geral do Brasil. Para Varnhagen nacionalidade era sinônimo

de civilização, e esta era atributo apenas dos brancos europeizados.

Até 1808, antes da chegada da família real portuguesa, em decorrência da

invasão napoleônica ao Estado Português, o Brasil colônia limitava-se a acatar as

determinações do colonizador. A ordem jurídica se constituía nas Ordenações do

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Reino, que eram compilações das leis vigentes em Portugal: Ordenações Afonsinas

(D. Afonso V, 1480), Manuelinas (D. Manoel I, 1520), Filipinas (D. Felipe III, 1603).

Respondendo ao fracasso das capitanias hereditárias, o governo português

realizou a centralização da administração colonial com a criação do governo-geral,

em 1548. Surge então o Regimento de 17 de dezembro de 1548.

Sobre o Regimento, considera Ives Gandra da Silva Martins Filho (1999, p. 3):

Pode-se dizer que o Regimento de 17 de dezembro de 1548 (integrado por 41 artigos e 7 suplementares), com o qual o primeiro Governador-Geral do Brasil chegou à nossa terra para administrá-la e promover seu desenvolvimento, foi como que a "Primeira Constituição Brasileira", organizando, sob o império da lei, a vida na colônia. Seguem os Regimentos de 1612, de Gaspar de Souza e o de 1763, editado para a administração dos Vice-Reis.

A importância do Regimento dos primórdios da colonização é ressaltada por

José Afonso da Silva (2010, p.70): “Foram eles, pois, cartas organizatórias do

regime colonial, que conferiam ao governador-geral poderes atinentes ao “governo

político” e “governo militar” da colônia”.

Em 1808, a família real portuguesa e toda a corte aportaram no Brasil.

Poucos anos depois, em 1815, o Brasil passa a integrar e sediar o Reino Unido,

conjuntamente com Portugal e Algarve. Em decorrência da Revolução do Porto e

pressionado para retornar pelos nobres portugueses, D. João VI volta para Portugal

em 1821, deixando à frente do governo, na qualidade de príncipe regente, o seu filho

primogênito, D. Pedro.

Até a chegada da corte portuguesa, Portugal procurava restringir as

informações que chegavam à colônia, assim como limitava a saída de informações

sobre a colônia. Tudo o que se sabia sobre o Brasil era o que Portugal queria

comunicar, ou seja, quase nada. Conforme Porta (1997, p. 15), não podiam entrar

no Brasil publicações estrangeiras (livros, jornais etc.); circulava apenas aquelas que

a própria metrópole enviava, pois a imprensa e a publicação de livros na própria

colônia também eram proibidas.

Em 1808, o único jornal que se imprimia no Rio de Janeiro era a Gazeta do

Rio de Janeiro, que circulou entre setembro de 1808 a dezembro de 1822. Impressa

na recém-inaugurada Imprensa Régia, a Gazeta era uma mera reedição da Gazeta

de Lisboa. Conforme Lustosa (2006, p. 125), a grande influência sobre o jornalismo

político que se faria aqui no período da independência viria de Londres, desde 1808,

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através do Correio Braziliense, de Hipólito da Costa. “Liberado de qualquer censura,

o jornal criticava abertamente aspectos da política portuguesa relativas ao Brasil”.

Em 1816, ano do casamento de D. Pedro I com a arquiduquesa austríaca D.

Leopoldina, filha do Imperador da Áustria, chega ao Rio de Janeiro a Missão

Artística Francesa, constituída de pintores e artífices. Sob a chefia do engenheiro

Joachim Lebreton, desembarcaram no Brasil os pintores franceses Jean-Baptiste

Debret e Nicolas Taunay, o escultor Auguste Taunay, o arquiteto Grandjean de

Montigni e o músico Sigismund Neukomm, entre outros.

A vinda da Missão Francesa para o Brasil foi uma estratégia de D. João: uma

convergência de interesses. Para Schwarcz (2008, p. 13) havia, de um lado, artistas

formadas pela Academia de Artes Francesa, inesperadamente desempregadas, e,

de outro, uma corte estacionada nos trópicos, longe da Europa e carente de uma

representação oficial.

Com a criação da Academia de Belas Artes, a Missão Francesa se tornou a

responsável pela introdução do Neoclassicismo e do Academicismo, apesar da

resistência encontrada na tradição barroca firmemente enraizada no Brasil.

Os portugueses haviam construído um enorme país dotado de unidade

territorial, linguística, cultural e religiosa. Importante destacar o papel da Igreja

Católica como aliada da casa de Bragança que em momentos de relativa

instabilidade, orientava a opinião pública, reunindo os indivíduos e o corpo social em

torno de numa ideologia cristã, face à carência de uma ideologia da nação.

Esses acontecimentos contribuíram para intensificar os movimentos pela

independência, o que veio a ocorreu em 1822, de forma especialíssima, ou seja,

negociada, pois o poder transmudou-se pacificamente, de pai para filho, mantendo-

se a monarquia e a casa de Bragança, diferentemente do que se poderia esperar

diante de uma separação de alargada monta. Ganha, de certa forma, o Brasil que

não só evitou o derramamento de sangue, como teve preservada a sua unidade

territorial, aproveitando de sobra, todo o sistema jurídico português que foi sendo

adaptado e, mais à frente, substituído em vagar gradação.

À independência do Brasil, segue-se um projeto de constituição. A

Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil inaugurou os seus

trabalhos em 3 de maio de 1823. Na noite daquele dia, D. Pedro I reiterou a

polêmica frase pronunciada na coroação: “Aceitarei e defenderei a Constituição, se

for digna do Brasil e de mim”. O anteprojeto da Constituição elaborado por Antônio

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Carlos de Andrada foi apresentado em setembro do mesmo ano. Continha 272

artigos de forte inspiração iluminista, sustentado nos princípios do liberalismo

econômico e da soberania nacional.

Após a independência a rivalidade entre brasileiros e portugueses se

intensificou. A burguesia portuguesa (comerciantes) pretendia a volta do Pacto

Colonial enquanto que a aristocracia rural brasileira não admitia a volta à situação de

colônia. Dois grupos se destacam entre os anticolonialistas: o de José de Bonifácio,

mais conservador, que acreditava na preservação do vínculo Brasil-Portugal, com a

autonomia da ex-colônia e o grupo de Gonçalves Lêdo, radical e republicano, que

representava os interesses do meio urbano mais intelectualizado e de uma classe

média ainda em formação.

O texto do anteprojeto previa um poder executivo forte, porém exercido pelo

ministério. São resguardados os privilégios da aristocracia, pois o voto não seria

universal, e sim censitário, ou seja, só as pessoas da elite tinham direito de votar.

Para votar em deputado, o eleitor deveria ter um rendimento anual equivalente a 150

alqueires de mandioca; para votar em senador, 250 alqueires. Para candidatar-se,

sua renda deveria ser de 500 e 1.000 alqueires, respectivamente.

Sobre o anteprojeto de Antônio Carlos, comenta Koshiba (2003, p. 218):

O anteprojeto era também antiabsolutista. Procurou-se, nesse ponto, limitar ao máximo o poder de D. Pedro I e valorizar, em contrapartida, a representação nacional. Para isso o anteprojeto declarava a indissolubilidade da Câmara, o veto apenas suspensivo do imperador e o controle das forças armadas pelo Parlamento, e não pelo imperador. Assim, a essência do poder ficava nas mãos do Legislativo.

Os idealizadores do anteprojeto estavam preocupados na prevenção contra

as ameaças da recolonização, do regime absolutista e do radicalismo das camadas

populares. Por conseguinte, com o intuito de afastar a massa popular, o anteprojeto

estabeleceu a eleição em dois graus, de forma que só a aristocracia rural pudesse

eleger os seus representantes. Conforme Koshiba (2003, p. 218), a capacidade

eleitoral foi condicionada à renda, não em dinheiro, mas com base em uma

mercadoria de consumo corrente: a farinha de mandioca. Daí o nome “Constituição

da Mandioca” dada pelo povo.

Ainda segundo Koshiba (2003, p. 218):

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Havia uma razão para essa forma peculiar de medida e renda: excluíam-se, ao mesmo tempo, as camadas populares e os comerciantes portugueses. As primeiras porque não apresentavam rendas suficientes e os segundos porque, por serem comerciantes, tinham a renda expressa em dinheiro e não em alqueires de farinha de mandioca, como era necessário. De um só golpe, o partido português e os radicais estavam afastados da vida política.

O ambiente político nessa fase de elaboração da constituição do Brasil

independente expressava claramente uma verdadeira disputa de interesses entre as

principais forças reais do poder: o conhecido como partido brasileiro, constituído

pela elite fundiária e escravocrata e que foi a responsável pelo anteprojeto da

referida constituição da mandioca, cujas características eram a defesa da limitação

do poder imperial (antiabsolutista) e a discriminação dos portugueses (antilusitana);

e o denominado partido português, constituído dos ricos comerciantes portugueses e

dos altos funcionários públicos que defendiam interesses contrários.

O ambiente social no Rio de Janeiro é caracterizado pela forte presença

negra e escrava. Conforme Lustosa (2006, p. 54), “Ela aparece nas imagens que

Debret, Rugendas, Ender e tantos outros produziram e davam aos estrangeiros a

sensação de estarem em algum lugar da África”. Bueno (2003, p. 264) informa que

“cerca de 4,5 milhões de negros foram trazidos da África para o Brasil ao longo de

quatro séculos de tráfico”.

Em 1823 D. Pedro dissolveu a Assembleia Constituinte e, no ano seguinte,

impôs o seu próprio projeto, que veio a se tornar a nossa primeira e mais duradoura

de todas as constituições brasileiras. Dom Pedro I prometeu dar ao país uma

Constituição duas vezes mais liberal do que a que estava sendo feita.

Sobre a Constituição outorgada por D. Pedro, Lustosa (2006, p. 175)

acrescenta: De fato, segundo Macaulay, ele proporcionou uma carta invulgar sob a qual o Brasil salvaguardou por mais de 65 anos os direitos básicos dos cidadãos de maneira melhor do que qualquer outra nação do hemisfério ocidental, com a possível exceção dos Estados Unidos.

Para Tobias Monteiro (apud LUSTOSA, 2006, p.173), D. Pedro, “no fundo era

um déspota liberal que queria outorgar por suas próprias mãos a liberdade, mas que

não admitia partilhar essa magnanimidade com outro poder".

Para efeito didático, podemos dividir a história do constitucionalismo brasileiro

em dois períodos: o monárquico, que, de fato, se inicia com a chegada da família

real no Brasil, em 1808, e, se formaliza com a outorga da Constituição do Império de

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1824; e o republicano que contempla o período que se inicia com a proclamação da

República, em 15 de novembro de 1889 até os dias atuais.

Sob o enfoque do modelo ou da matriz constitucional utilizada pelo Brasil

durante a sua evolução histórico-constitucional, Bonavides (2010, p. 361) enfatiza a

existência de três fases distintas do constitucionalismo brasileiro:

Quem se propuser a uma análise, em profundidade, da evolução constitucional do Brasil não terá dificuldade em distinguir três fases históricas perfeitamente identificáveis em relação aos valores políticos, jurídicos e ideológicos que tiveram influxo preponderante na obra de caracterização formal das instituições: a primeira, vinculada aos modelos constitucionais francês e inglês do século XIX; a segunda, representando já, uma ruptura atada ao modelo norte-americano e, finalmente, a terceira, em curso, em que se percebe, com toda a evidência, a presença de traços fundamentais presos ao constitucionalismo alemão do corrente século.

No entanto, o processo de construção de Constituição do Brasil Imperial

produziu grande desgaste para a figura do Imperador Dom Pedro I. Em todo o país

crescia uma insatisfação decorrente. A imprensa livre, que, ultimamente, vinha se

multiplicando, o condenava abertamente, o que repercutia na sua reputação.

Desprovido de habilidades políticas, portanto, terminou por abdicar, em 7 de abril de

1831, em favor do seu filho D. Pedro de Alcântara, de apenas cinco anos e idade.

Segue-se o período regencial (1831 – 1835), o mais instável de toda a história

política do Brasil, que terminou por antecipar a maioridade de D. Pedro de Alcântara,

que prestou juramento constitucional em 23 de junho de 1840, com apenas 14 anos

de idade. O ato Institucional de 1834 foi um instrumento de conciliação entre as

diferentes forças políticas divididas entre liberais e conservadores. Conforme

Angelozzi (2009, p. 84), “apesar de todos pertencerem à aristocracia rural, dividiam-

se entre os que queriam a centralização do poder e os que propunham a

descentralização desse mesmo poder”.

Começa o Segundo Reinado. A Constituição de 1824 não recebeu emendas

durante o reinado de D. Pedro II. A Constituição do Império mostrou-se estável e

duradoura. O Brasil neste período foi se afirmando como nação soberana,

fortalecendo suas instituições sociais, políticas e econômicas.

O café foi o produto que impulsionou o Brasil no período de 1800 a 1930.

Introduzido no Brasil provavelmente em 1760, o café foi plantado, inicialmente para

atender ao consumo doméstico e para o embelezamento de jardins. Encontrando

condições geográficas, o café avançou pela Baixada Fluminense, Vale do Paraíba

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(fluminense e paulista), Zona da Mata de Minas, Espírito Santo até o oeste paulista.

A expansão da lavoura foi favorecida pela liberação da mão-de-obra ociosa

proveniente da mineração.

Havia no Império um movimento crescente que clamava pela abolição, sem

falar na pressão da Inglaterra para transformar escravos em consumidores. Com o

fim da escravatura à vista, surge a preocupação com a substituição da mão de obra

escrava e a alternativa é a importação de mão de obra europeia.

Sobre a questão da substituição da mão-de-obra escrava, o então deputado

Prudente de Morais (apud BUENO, 2003, p. 266) assim se manifesta:Em São Paulo a questão principal não é a da liberdade do escravo. A questão séria é a da substituição do trabalho. E desde que o governo cure seriamente de empregar meios que facilitem a aquisição de braços livres, os paulistas estarão satisfeitos e abrirão mão dos escravos, mesmo sem indenização, porque a verdadeira indenização está na facilidade de obter trabalhadores livres.

Em 1847, o senador Vergueiro foi pioneiro ao importar colonos alemães da

Prússia, adotando o sistema de parceria ou de “meia” nos cafezais de sua fazenda

em Limeira (SP). Entre 1887 e 1888, uma série de acordos e convênios assinados

entre o Brasil e alguns países europeus.

Bueno (2003, p. 266), relata como se deu o início da “grande imigração”:Em dois anos, 150 mil trabalhadores chegaram ao Brasil, quase todos italianos embarcados em Gênova e desembarcados em Santos. Na maioria eram camponeses pobres vindos da Lombardia e da Calábria e zonas rurais da Itália. Vinham com toda a família amontoados como bestas de carga em navios sujos. Chagavam em Santos e eram enviados para Hospedaria dos Imigrantes em São Paulo. De certa forma, o local funcionava como funcionara, no Rio, o mercado de Valongo: os imigrantes eram ‘examinados’ pelos fazendeiros; e os escolhidos discutiam as condições sob os quais seriam contratados – trato nunca respeitados pelo empregador.

Conforme Bueno (2003, p. 264): De 1886 a 1914, quase três milhões de estrangeiros vieram para o Brasil na tentativa de ‘fazer a América’. Depois de portugueses e africanos, foram os italianos aqueles que chegaram em maior número ao Brasil: 1,6 milhões em mais de cem anos (921 mil apenas entre 1886 e 1900). O segundo maior contingente veio da Espanha (694 mil em um século). Os alemães vêm a seguir, com 250 mil. Os japoneses ocupam o quarto lugar com 229 mil imigrantes.

Em 1º de maio de 1888, a Princesa Isabel sancionou a Lei Áurea que aboliu

a escravidão no Brasil. Esse fator foi decisivo para a queda do Império, pois levou os

senhores de escravos a se colocaram frontalmente contra o Império.

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Os militares se aproximaram dos republicanos históricos. Dessa aliança

resultou o golpe de Estado que derrubou a monarquia, sem que se disparasse um

só tiro. Em verdade, conforme esclarece Bueno (2003, p. 230), foram apenas dois

disparos, que ninguém escutou.

O fato é que, no confuso alvorecer de 15 de novembro de 1989, o ministro

Ouro Preto foi preso e todo o ministério derrubado. “Ninguém teve a coragem de

falar em república”, anotou Bueno (2003, p. 230).

Conforme Carvalho (1987, p. 42): O fim do Império e o início da República foi uma época caracterizada por grande movimentação de ideias, em geral, importadas da Europa. Na maioria das vezes eram ideias mal absolvidas ou absolvidas de modo parcial e seletivo, resultando em grande confusão ideológica. Liberalismo, positivismo, socialismo, anarquismo misturavam-se e combinavam-se das maneiras mais esdrúxulas na boca e na pena das pessoas mais inesperadas.

Constituição de 1891 é a Constituição que introduz a República no Brasil. O

período que abrange o governo dos dois primeiros presidentes, os Marechais

Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, ficou conhecido por “República da Espada”

(1891-1894). Este período foi importante para a consolidação da nova forma de

governo, bem como para a transição do centralismo imperial para o federalismo

republicano.

Segue-se o segundo período republicano denominado de “República

Oligárquica” (1894-1930). Neste período o poder estava centralizado nas mãos da

burguesia cafeeira, que estava basicamente concentrada nos Estados de São Paulo

e de Minas Gerais.

Ao contrário dos senhores de engenho do período colonial, os cafeicultores

não permaneciam a maior parte do tempo em suas fazendas. Geralmente possuíam

confortáveis mansões nas cidades, onde usufruíam as comodidades dos serviços

públicos, da vida social e da agitação política. As suas fazendas cafeeiras eram

administradas por gerentes, encarregados da produção, do pessoal e, certamente,

dos lucros. Os cafeicultores exerciam grande influência política nas suas regiões. No

nordeste destaca-se a figura do “coronel”, chefe político com grande influência nas

suas respectivas regiões.

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5 CONSTITUIÇÕES BRASILEIRASDa Constituição do Brasil Império (1824) até a vigente Constituição Cidadã

(1988), contam-se oito. Elas representam a evolução formal e a história do

constitucionalismo brasileiro contada em artigos. Será feita uma resumida

abordagem dessas constituições.

5.1 CONSTITUIÇÃO DE 1824

O Estado brasileiro nasceu sob a égide do constitucionalismo. Outorgada em

25 de março de 1824, a Constituição Política do Império do Brasil, primeira

constituição formal do país, sofreu grande influência da Constituição francesa de

1814. Na visão de Sarmento (2010, p. 8), a Constituição do Império corresponde a

uma fórmula de compromisso entre o liberalismo conservador, cujos traços se

revelam na garantia de um amplo elenco de direitos individuais (art. 179), e o

absolutismo, que tem o seu ápice no Poder Moderador (arts. 98 a 101), que, em

verdade, era uma verdadeira deturpação das teorias de Benjamin Constant.

Para Souza Júnior (2002, p.30):

Instituindo o Poder Moderador, os redatores tinham em mente a lição de Benjamim Constant para a reconstitucionalização francesa de 1814, um poder neutro, ou seja, partidária e regionalmente imparcial, capaz de solucionar os inevitáveis conflitos entre os poderes, contemplando, assim, uma grave lacuna deixada por Montesquieu, em sua forma de separação dos poderes.

A Constituição Imperial do Brasil, no entender de Bonavides (2010, p. 363), foi

a única Constituição do mundo, salvo notícia em contrário, que explicitamente

perfilhou a repartição tetradimensional de poderes.

A Constituição Imperial instituiu a forma unitária de Estado, privilegiando a

centralização político-administrativa, dividindo o território brasileiro em Províncias,

administradas por um “presidente”, nomeado pelo imperador e exonerado ad nutum.

Instituiu a forma monárquica de governo e consagrou a religião católica como oficial

do Império (Estado confessional), e desse modo só os católicos apostólicos romanos

podiam ser eleitos para os cargos oficiais, apesar de assegurar a outras religiões a

prática de cultos domésticos e particulares, condicionadas a não edificação de

templos.

A Constituição imperial brasileira de 1824, sopesadas alguns aspectos

restritivos, se destaca internacionalmente e sai à frente quanto aos aspectos da

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garantia constitucional, ou seja, de assegurar efetividade aos direitos fundamentais

através de um conjunto de meios e recursos jurídicos. Em verdade, a Constituição

brasileira era mais evoluída que o povo a que se destinava. O jurista italiano

Biscaretti de Rufia equivocadamente atribui o mérito à Constituição Belga de 1831.

Sobre o equívoco de Rufia, aduz Silva (2010, p.167):

Cumpre, no entanto observar que Biscaretti de Rufia não conhece a Constituição do Império do Brasil, de 1824, se não verificaria que a primazia da subjetivação e a positivação dos direitos do homem não cabem à Constituição belga, mas a ela (Constituição brasileira de 1824), que os enuncia, com as garantias pertinentes, em seu art. 179, cujo caput é bem característico, quando declara que a inviolabilidade dos Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual e a prosperidade, e é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte. (segue-se o rol de direitos em 35 incisos).

Tratando-se do estudo jurídico do constitucionalismo e das constituições

brasileiras, evoca-se o surgimento do ensino do direito no Brasil, principalmente do

direito constitucional, que se beneficiou da lição de mestres cuja formação se deu

numa Europa que acabara de passar por transformações radicais.

Já em 11 de agosto de 1827, foi convertido em lei o projeto que criava, em

São Paulo e Olinda, as primeiras faculdades de direito do Brasil, dando início ao

processo de formação da elite intelectual brasileira. Na época, as ideias iluministas

reluziam no ocidente e empolgavam os jovens abastados que compunham a elite na

colônia portuguesa, a grande maioria egressa da faculdade de direito de Coimbra,

mas também de Londres e Paris. O estudo do direito constitucional foi o caminho

natural para a formação política e jurídica de um povo que aspira liberdade. José

Antônio Pimenta Bueno (1803-1878), o Marquês de São Vicente, foi o mais

abalizado estudioso e comentarista da Constituição do Império do Brasil.

Para Bonavides (2010, p. 35):

As primeiras obras de Direito Constitucional de caráter geral no país, se prendiam ordinariamente à explicação do Direito Positivo exarado na Lei Magna. A obra básica precursora nessa direção foi o célebre compêndio de cunho didático publicado em 1857 por José Antonio Pimenta Bueno, o Marquês de São Vicente, e intitulado Direito Público Brasileiro e Análise da Constituição do Império. Em suas páginas educaram-se politicamente várias gerações.

Quanto ao Direito Constitucional, afirma Bonavides (2010, p. 35):

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Em relação a toda a Ciência do Direito, toma ele o lugar de hegemonia que ontem coube ao Direito Civil. O Direito Constitucional da sociedade de massas e do Estado intervencionista do século XX cada vez mais se aparta da teoria pura do Direito e se acerca da Ciência Política.

Reforçando esse entendimento Bonavides (apud BARROSO, 2010, p. 369):

A primeira parte da frase (“Ontem os Códigos; hoje as Constituições”) foi pronunciada por Paulo Bonavides, ao receber a medalha Teixeira de Freitas, no Instituto dos Advogados Brasileiros, em 1998. O complemento foi feito por Eros Grau, ao receber a mesma medalha, em 2003, em discurso publicado em avulso pelo IAB: “Ontem os Códigos; hoje as Constituições”. A Revancha da Grécia sobre Roma, tal como se deu em outro plano, na evolução do direito de propriedade, antes justificado pela origem, hoje legitimado pelos fins: a propriedade que não cumpre sua função social não merece proteção jurídica qualquer.

Durante o período regencial, em 12 de agosto de 1834, dez anos depois, foi

aprovada a única alteração no texto constitucional da monarquia, o denominado Ato

Adicional. Implantou-se, pela primeira vez, o sistema parlamentarista de governo,

que vigorou de 1847 a 1889. O sistema parlamentarista brasileiro era inovador,

apesar de, em tese, inspirar-se no modelo inglês, mas, em muito, dele se

diferenciava. Na Inglaterra o monarca tem uma função meramente decorativa,

ficando as principais decisões a cargo do primeiro ministro.

No Brasil, o Imperador, em cujas mãos se cumulavam, tanto formal como

efetivamente, os poderes Executivo e Moderador, tinha total liberdade para escolher

e destituir os ministros. Por ser considerado sui generis, o modelo brasileiro de

parlamentarismo ficou conhecido por “parlamentarismo às avessas”. No entanto, a

Constituição do Império foi a mais estável e duradoura das constituições brasileiras:

65 anos.

5.2 CONSTITUIÇÃO DE 1891

Em vários momentos, o ideal republicano aflorou entre os brasileiros. Desde a

Colônia (Guerra dos Mascates, Conjuração Baiana e Inconfidência Mineira) ao

Império (Confederação do Equador, Sabinada, Guerra dos Farrapos e Praieira). A

Guerra do Paraguai criara um sentimento de unidade e de espírito de corporação

entre os militares, cuja mentalidade era a de que eles eram os únicos capazes de

corrigir os vícios da organização social e política do país. Jovens oficiais assimilaram

a ideia mística de salvação nacional, da construção de um governo forte e

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incorruptível o que os aproximou dos políticos republicanos, inclusive os

revolucionários.

Era grande a movimentação de ideias, em geral importadas da Europa, que

inquietavam a sociedade brasileira daquela época de fim do Império e início da

República. Em sua maioria, eram ideias mal assimiladas ou absolvidas de modo

parcial e seletivo, gerando comumente grande confusão ideológica. Liberalismo,

positivismo, socialismo e anarquismo misturavam-se e combinavam-se das

maneiras mais esdrúxulas na boca e na pena das pessoas mais inesperadas.

O partido republicano era favorável a uma transição pacífica da monarquia

para República, preferencialmente com a morte do Imperador D. Pedro II.

O Brasil era a única monarquia na América. O movimento republicano vinha

gradativamente se fortalecendo. Em 1870, foi publicado o “Manifesto Republicano”

no jornal A República, impresso pelo Clube Republicano, no Rio de Janeiro. Os

episódios envolvendo a questão religiosa e militar contribuíram para exacerbar os

ânimos republicanos, mas a crise da escravidão foi o fator preponderante para a

desestabilização da monarquia, contribuindo decisivamente para o seu fim. Após a

assinatura da lei áurea, em 1888, proclamando a abolição, os senhores de escravos

se colocaram frontalmente contra o Império.

Foram os militares, sob o comando de Deodoro da Fonseca, que promoveram

o movimento que resultou na proclamação da República. Neste movimento não

houve participação popular. O povo não passou de mero expectador atônito dos

acontecimentos de novembro de 1889. Sobre a participação popular no episódio,

Carvalho (1987, p. 9): Em frase que se tornou famosa, Aristides Lobo, o propagandista da República, manifestou seu desapontamento com a maneira pela qual foi proclamado o novo regime. Segundo ele, o povo, que pelo ideário republicano deveria ter sido protagonista dos acontecimentos, assistira a tudo bestializado, sem compreender o que se passava, julgando ver talvez uma parada militar.

Conforme Carvalho (1987, p. 9), outra frase que ficou famosa foi a de Louis

Couty, sábio francês que há muito residia no Brasil, ao analisar a situação

sociopolítica da população do país: “O Brasil não tem povo”.

É evidente que as observações de Couty são exageradas. Conforme

Carvalho (1987, p. 10): Tal visão é quase uma volta à dicotomia clássica estabelecida por Santo Agostinho entre um Estado governado por pecadores, baseado na repressão, e a Cidade de Deus, a sociedade dos santos, sustentada no

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amor e na cooperação. Nessa perspectiva, a inexistência da cidadania é simplesmente atribuída ao Estado. Essa visão dualista, como todas as dicotomias é insatisfatória, aplicadas ao fenômeno social, pois os dois lados da moeda são partes do um mesmo todo.

Portanto, conclui Carvalho (1987, p. 10/11), “o maniqueísmo inviabiliza

mesmo qualquer noção de cidadania, pois ou se aceita o Estado como um mal

necessário, à maneira agostiniana, ou se o nega totalmente, à maneira anarquista”.

Proclamada a República, foi editado, com força constitucional, o Decreto nº 1,

de 15 de novembro de 1889, que funcionou como Constituição provisória para

vigorar até a elaboração de nova constituição. Rui Barbosa foi o revisor do

anteprojeto de Constituição de 1889, elaborado por uma comissão de juristas

designados pelo Decreto nº 29, de 3 de dezembro de 1889. O Senador baiano foi

também o Relator da Constituição de 1981. Conforme Sarmento (2010, p.20), com a

sua influência Rui Barbosa vem conferir à primeira Constituição Republicana a sua

fisionomia definitiva, fazendo impor o seu pensamento quase que integralmente em

face da constituinte, mesmo diante de outras correntes de pensamento, como o

positivismo, que tinha grande força na sociedade brasileira.

Com o advento da República, altera-se o eixo no qual gravitam os valores e

princípios da organização formal do poder, deslocando-se do velho continente

europeu para os Estados Unidos da América. Profundo admirador do modelo norte-

americano, Rui Barbosa promoveu significativas alterações, incorporando no seu

texto a teoria liberal na sua pureza ao importar dos Estados Unidos as instituições e

os valores jurídicos do liberalismo. Diferente do modelo sintético americano, o Brasil

adotou uma constituição analítica.

A Constituição de 1891 foi a Constituição da chamada República Velha.

Consagrou a forma de Estado Federal, em substituição ao unitarismo,

transformando as províncias em Estados federados; o sistema de governo

presidencialista e a forma de governo republicana, em substituição à monarquia.

Sob a influência de Montesquieu, previu a organização tripartite das funções

do poder em executiva, legislativa e judiciária (independentes e harmônicos entre si),

rompendo, assim, com a divisão quadripartida que contemplava o Poder Moderador

inspirada por Benjamin Constant, vigente no Império.

A função legislativa era exercida pelo Congresso Nacional, formado pela

Câmara dos Deputados e Senado Federal.

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Com capital na cidade do Rio de Janeiro, o país passou a denominar-se

“República dos Estados Unidos do Brasil”. Constitucionalizou o afastamento do

Estado da religião, afirmando sua condição de Estado laico, ou seja, sem uma

religião oficial, deixando, inclusive, de inserir no preâmbulo a expressão “sob a

proteção de Deus”.

No entanto, a Constituição Republicana de 1891 não promoveu as mudanças

esperadas quanto a uma maior participação das camadas mais pobres da população

brasileira nos destinos da nação. Conforme Carvalho (1987, p. 44): No Império como na República, foram excluídos os pobres (seja pela renda, seja pela exigência da alfabetização), os mendigos, as mulheres, os menores de idade, as praças de pré, os membros de ordens religiosas. Ficava fora da sociedade política a grande maioria da população. A Exclusão dos analfabetos pela Constituição republicana era particularmente discriminatória, pois ao mesmo tempo se retrava a obrigação do governo de fornecer instrução primária, que constava do texto imperial.

A constituição republicana de 1891 perfilhou por cerca de quarenta anos um constitucionalismo de raízes norte-americanas. Em 1926, recebeu a sua única revisão.

5.3 CONSTITUIÇÃO DE 1934

Desde 11 de novembro de 1930 o país estava sob administração de um

governo provisório que havia revogado a carta de 1891. Vigorava com força

constitucional, o Decreto-lei nº. 19.398, de 11 de novembro de 1930. De acordo com

o art. 1º do referido Decreto-lei, o Governo Provisório de Getúlio Vargas exercia

“discricionariamente, em toda a sua plenitude, as funções e atribuições, não só do

Poder Executivo, mas também do Poder Legislativo, até que, eleita a Assembleia

Constituinte, estabeleça esta a reorganização constitucional do país”. O mesmo

Decreto dá confirmação à dissolução do Congresso, das Assembleias Legislativas e

Câmaras Municipais de todo o país, atribuindo ao Governo Provisório o poder de

designar interventores nos Estrados (art. 11). Foram suspensas as garantias

constitucionais, excluindo-se do Poder Judiciário à apreciação dos atos do Governo

Provisório e dos interventores federais (art. 5º).

A Constituição de 1934 da República dos Estados Unidos do Brasil, a mais

efêmera das constituições brasileiras, foi uma consequência direta da Revolução

Constitucionalista de 1932, ação armada da Força Pública de São Paulo contra o

Exército Brasileiro na defesa do clamor da população daquela província por uma

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nova carta constitucional. Os revolucionários paulistas foram derrotados nas armas,

mas triunfaram no objetivo, visto que o Governo Provisório não teve condições

políticas de seguir adiando a entrega de uma constituição que, em verdade, era

requerida por todos os brasileiros.

Em 16 de julho de 1934, foi promulgada pela Assembleia Nacional Constituinte,

a Constituição de 1934, incorporando as aspirações da Revolução de 1930,

conforme indicação no próprio preâmbulo: "para organizar um regime democrático

que assegure à Nação, a unidade, a liberdade, a justiça e o bem-estar social e

econômico". Incorporou-se ao texto constitucional muitas das mudanças sociais,

econômicas e políticas pelas quais o Brasil vinha atravessando, com destaque para

a introdução de uma ordem econômica e social.

A segunda constituição republicana reformulou profundamente a organização

da República Velha, mas vigeu por muito pouco tempo, praticamente por um ano.

Influenciada pela crise do liberalismo econômico de 1929, no seio do capitalismo

americano, e inspirada na Constituição alemã de Weimar, de 1919, a Constituição

de 1934 passou a incorporar os direitos sociais, chamados de segunda geração,

numa perspectiva de um Estado social de direito.

A Constituição de 1934 fez brotar no constitucionalismo brasileiro a semente de

um modelo de Estado social de inspiração alemã do século XX, introduzindo novas

matérias constitucionais, entre as quais: a subordinação do direito de propriedade ao

interesse social ou coletivo; a ordem econômica e social; a instituição da justiça do

trabalho; o ensino primário, gratuito e obrigatório; o salário mínimo; as férias anuais

do trabalhador obrigatoriamente remuneradas; a indenização ao trabalhador

dispensado sem justa causa; o amparo à maternidade e à infância; o socorro às

famílias de prole numerosa; a colocação da família; da educação e da cultura

debaixo da proteção especial do Estado.

Foram mantidos alguns princípios fundamentais, como a República, a

Federação, a tripartição de Poderes, o presidencialismo e o regime representativo. O

país continuou laico, mas foi amenizado o sentimento antirreligioso, ao inserir a

previsão de “Deus” no preâmbulo; ao admitir o casamento religioso com efeitos civis,

se o rito não contrariar a ordem pública e os bons costumes e a admitir, em caráter

facultativo, a educação religiosa nas escolas públicas.

Inovou o texto constitucional ao introduzir o bicameralismo desigual, também

chamado pela doutrina de unicameralismo imperfeito, ao estabelecer que o Poder

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Legislativo é exercido pela Câmara dos Deputados com a colaboração do Senado

Federal, colocando este último na função de mero colaborador. Rompe-se o sistema

bicameral rígido ou paritário, no qual as duas casas exerciam funções básicas

idênticas.

A Constituição de 1934 implantou as Justiças do Trabalho e Eleitoral,

constitucionalizando o voto feminino e o voto secreto (também conhecido como

australiano), ambos já legalmente previstos no Código Eleitoral de 1932.

5.4 CONSTITUIÇÃO DE 1937

A Constituição de 1934 estabelecia que, após sua promulgação, o presidente

da República seria eleito, de forma indireta, pelos membros da Assembleia

Constituinte e Getúlio Vargas foi eleito para governar de 1934 a 1938.

A situação internacional estava bastante conturbada. A Europa estava em

crise com o avanço de governos totalitários de direita, como o nazismo na Alemanha

e o fascismo na Itália, além do movimento totalitário da esquerda stalinista na União

Soviética. Essa situação se refletia no Brasil por meio do antagonismo existente

entre integralistas e aliancistas.

Plínio Salgado, Miguel Reale e outros intelectuais e políticos lançaram um

manifesto à nação, contendo os princípios do integralismo. Era uma espécie de fac-

símile das ideias nazifascistas. Assim foi criada a Ação Integralista Brasileira (AIB),

organização política que se expandiu pelo país, conquistando a simpatia de muitos

empresários, boa parte da classe média, do clero e dos oficiais das forças armadas.

Os integralistas defendiam o combate ao comunismo, o nacionalismo exacerbado, o

Estado todo-poderoso, a disciplina e a hierarquia dentro da sociedade, a censura às

atividades artísticas e a entrega do poder a um único chefe integralista.

O principal grupo político contrário ao integralismo era a Aliança Nacional

Libertadora (ANL). Os aliancistas se reuniam em grupos de várias tendências:

comunistas (principal corrente), anarquistas e sociais-democratas. Sob a liderança

de Luís Carlos Prestes, faziam oposição ao fascismo e ao imperialismo; defendiam a

nacionalização das empresas estrangeiras; o não pagamento da dívida externa

estrangeira; a realização de reforma agrária, distribuindo terras aos trabalhadores do

campo e o combate ao latifúndio.

Temendo a expansão dos aliancistas, cujas ideias vinham repercutindo

nacionalmente, o governo Vargas decretou, em junho de 1935, o fechamento da

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sede da ANL. O Chefe de Polícia de Vargas, Filinto Müller, acusava o movimento de

ser controlado por “perigosos comunistas” e financiados por estrangeiros. Em

novembro de 1935, eclodiu a Intentona Comunista, uma tentativa de golpe militar em

Natal, Recife e Rio de Janeiro. Os golpistas, que não contavam com o apoio popular,

foram prontamente dominados pelas forças governamentais.

A Intentona Comunista contribuiu para que o governo Vargas se tornasse

ainda mais autoritário. Em fins de setembro de 1937, o governo noticiou que o

serviço secreto do Exército havia descoberto um poderoso plano, denominado Plano

Cohen, para destruir o regime democrático. No entanto, as justificativas não tinham

lastro na realidade, nem o Brasil encontrava-se na iminência de uma guerra civil,

nem sob a ameaça de tomada de poder pelos comunistas. As agitações por que

passava o país podiam ser enfrentadas sem o rompimento da ordem constitucional.

Todavia, sem esta ruptura, Vargas não teria como manter-se à frente do governo.

Tal constatação serviu de pretexto para Getúlio Vargas endurecer o regime e iniciar

uma etapa na história do país denominada de “Estado Novo”.

Em 10 de novembro de 1937, Vargas, em nome do combate ao perigo

comunista, ordenou o cerco militar ao Congresso.

Conforme Sarmento (2010, p.37), para redigir o projeto de Constituição,

Vargas designou o seu ministro da Justiça (ex-educação), o jurista Francisco

Campos (1891-1968), conhecido como “Chico Ciência”. Campos era um intelectual

brilhante, da inteira confiança do presidente, mas de forte inclinação autoritária, que

muitas vêzes chegavam a tangenciar o fascismo, esboçou a Constituição que é

considerada a mais autoritária que o Brasil já teve. Decretada em 10 de novembro

de 1937, transformava o presidente constitucional em ditador.

No entendimento de Sarmento (2010, p. 39), “a Constituição de 1937 previu

um modelo de Estado autoritário e corporativista”. As suas principais influências

foram a Constituição da Polônia de 1935 (fato que valeu à Carta de 37 o apelido de

“Polaca”) e a Constituição portuguesa de 1933, que vigorou durante o Estado Novo

português, de orientação Salazarista.

As principais características da Constituição de 1937 são: a manutenção da

República como forma de governo; a forma de Estado que continuou federalista,

embora na prática, as autonomias estaduais fossem reduzidas, com os Estados

governados por interventores que, por sua vez, nomeavam vereadores e prefeitos.

Do preâmbulo retira-se a invocação da “proteção de Deus”. É mantida a fórmula

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tripartida de Montesquieu, mas, na prática, o Legislativo e o Judiciário foram

esvaziados.

O Poder Executivo, representado pelo Presidente da República, nos termos

do art. 73, era a autoridade suprema do Estado que seria eleita de forma indireta

para um mandato de seis anos. O Presidente da República coordenava a atividade

dos órgãos representativos de grau superior; dirigia a política interna e externa;

promovia e orientava a política legislativa de interesse nacional e superintendia a

administração do País.

O Senado deixou de existir durante o Estado Novo. O Poder Legislativo seria

exercido pelo Parlamento Nacional com a colaboração do Conselho da Economia

Nacional e do Presidente da República. O Parlamento Nacional era composto por

duas Câmaras: a Câmara dos Deputados e o Conselho Nacional.

Foi decretado estado de emergência no país, por tempo indeterminado (art.

186) o que implicou na suspensão de inúmeras garantias constitucionais. No art.

170, ficou estabelecido que durante o estado de emergência ou o estado de guerra,

os atos praticados em virtude deles não poderiam ser conhecidos por qualquer Juiz

ou Tribunal. Não houve previsão do mandado de segurança nem ação popular.

5.5 CONSTITUIÇÃO DE 1946

A Segunda Guerra Mundial foi palco de cenários deploráveis e de uma

carnificina sem par. O Brasil esteve presente no cenário de embate em favor dos

aliados (Grã-Bretanha, França, Estados Unidos, União Soviética) contra o Eixo

(Alemanha, Itália e Japão). Em 1943, foi criada a FEB – Força Expedicionária

Brasileira e, no ano seguinte, partiram para o front as tropas brasileiras.

Terminada a guerra com a vitória das forças aliadas, surge em todo o mundo

uma onda (re)democratizante e (re)constitucionalizante. Vários estados elaboraram

constituições que, ainda hoje, são referências mundiais, como a Itália (1947), a

Alemanha (1948). Segundo Afonso Arinos de Melo Franco (apud SARMENTO,

2010, p.48): “entre 1946 e 1949, dezesseis países de fora das Américas editaram

novas constituições. Em nosso continente foram doze, entre textos novos ou

mudanças substanciais”.

As novas constituições ou mudanças constitucionais que se processaram

mundo afora, consideraram que era preciso precaver-se, constitucionalmente, para

que não se repetisse as atrocidades da segunda guerra, fazendo constar

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explicitamente do texto das constituições dos países, direitos e garantias

fundamentais do ser humano.

A Constituição brasileira de 1946 veio a reboque dessa onda mundial

(re)democratizante e (re)constitucionalizante e buscou conciliar liberalismo e

democracia com Estado Social. Em 1948, foi aprovada na Assembleia Geral da

Organização das Nações Unidas (ONU) a Declaração Universal dos Direitos

Humanos. Esta declaração simboliza a luta universal contra a opressão e a

discriminação e defende a igualdade e a dignidade das pessoas. Reconhece que os

direitos humanos e as liberdades fundamentais devem ser aplicados a cada cidadão

do planeta.

Precionado pela opinião pública e sentindo a onda liberal que tomava conta do

país, Getúlio Vargas procurou liderar a abertura democrática, fixando prazo para as

eleições presidenciais. Concedeu anistia ampla a todos os condenados políticos;

liberou os comunistas presos, entre os quais Luís Carlos Prestes; e, permitiu a volta

dos exilados ao país.

Em 1945, o presidente Getúlio Vargas incentivou um movimento político pela

sua permanência, denominado “Queremismo”, cuja expressão se originava do

slogan "Queremos Getúlio" e se traduzia no adiamento das eleições presidenciais,

com o lançamento da sua candidatura e a convocação da uma Assembléia Nacional

Constituinte. No entanto, nesse contexto de transição, o meio político já avaliava um

esgotamento político do governo Vargas.

Em 29 de outubro de 1945, a pressão militar obrigou Getúlio a abandonar o

poder. Chega ao fim o Estado Novo.

A Constituição de 1946 foi promulgada em 18 de setembro de 1946. Era a

redemocratização do país, inspirada nos ideais da Constituição de 1891 e nas ideias

sociais da Constituição de 1934.

As principais características da Constituição de 1946 são: o Rio de Janeiro

continua sendo a capital da União; foi restabelecida a clássica organização tripartida

dos podres de Montesquieu; criou-se, novamente, o cargo de vice-presidente da

república, extinto nas Constituições de 1934 e 1937; o país segue laico, apesar da

expressa menção de “Deus” no preâmbulo; pluralidade de partidos políticos; O

Poder Executivo retoma à normalidade democrática, sendo o Presidente da

República eleito diretamente para mandato de cinco anos; O Poder Legislativo

passa a ser exercido pelo Congresso Nacional, que se compunha da Câmara dos

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Deputados e do Senado Federal, retomando o bicameralismo paritário; o Judiciário

retoma sua condição de normalidade e o mandado de segurança e a ação popular

são restabelecidos.

5.6 CONSTITUIÇÃO DE 1967

Em 31 de março de 1964, um movimento militar depôs o presidente

constitucional João Goulart. A Presidência da República foi assumida por Ranieri

Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados.

Os militares constituíram o Supremo Comando da Revolução que baixou, em

09 de abril de 1964, o Ato Institucional nº 1 de autoria de Francisco Campos (o

mesmo que redigiu a Constituição de 1937), que dava ao executivo federal, durante

seis meses, poderes para cassar mandatos de parlamentares; suspender direitos

políticos de quaisquer cidadãos; modificar a Constituição; e decretar o estado de

sítio sem aprovação do Congresso.

No preâmbulo, o Ato Institucional apresentava-se como emanação do poder

constituinte originário, proveniente da “revolução vitoriosa”. Ele não buscava

validade na Constituição de 1946. No fundo, era apenas uma concessão dos

militares, protagonistas da “revolução vitoriosa”, que a Constituição de 1946

continuaria a valer naquilo que não contrastasse com o Ato Institucional editado.

Sarmento (2010, p. 58), seleciona e reproduz algumas passagens

representativas do referido preâmbulo:

A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constitucional. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma (...). Nela se contém a força normativa, inerente ao Poder Constituinte. Ela edita normas jurídicas, sem que nisto seja limitada pela normatividade anterior à sua vitória. Os chefes da revolução vitoriosa, graças à ação das Forças Armadas e ao apoio inequívoco da Nação, representam o povo e em seu nome exercem o Poder Constituinte, de que o povo é o único titular.

E continua Sarmento (2010, p. 59):

Para demonstrar que não pretendemos radicalizar o processo revolucionário, decidimos manter a Constituição de 1946, limitando-nos a modificá-la, apenas na parte relativa aos poderes do Presidente da República, a fim de que este possa cumprir a missão de restaurar no Brasil a ordem econômica e financeira e tomar urgentes medidas destinadas a drenar o bolsão comunista, cuja purulência já se havia infiltrado, não só na cúpula do governo, como nas suas dependências administrativas.

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No segundo dia em que vigorava o AI nº 1, o Congresso Nacional, sob pressão

militar, foi reunido e elegeu para Presidência da República o então Chefe do Estado-

maior do Exército, General Humberto de Alencar Castelo Branco, que assumiu em

15 de abril.

Embora a Constituição de 1946 continuasse existindo formalmente, o país

passou a ser governado pelos Atos Institucionais e Complementares, que, com forte

ênfase na segurança nacional, concentraram o poder no âmbito do Presidente da

República, esvaziando os Estados e Municípios. Os Atos Institucionais eram um

mecanismo para manter na legalidade o domínio dos militares, pois sem esse

mecanismo, a Constituição de 1946 tornaria inexecutável o regime militar.

Durante o governo Costa e Silva, apesar da repressão policial violenta, as

manifestações contra a ditadura militar cresceram significativamente. Em passeata,

os estudantes saíram às ruas; operários organizaram greves contra o arrocho

salarial; políticos faziam discursos contra as imposições do governo; nas paróquias,

os padres progressistas pregavam contra a fome do povo e a tortura contra presos

políticos.

A gota d’água foi a decisão da Câmara dos Deputados que se negou a

conceder licença para que o deputado Márcio Moreira Alves fosse processado por

um discurso no dia 2 de setembro de 1968, em que convocava um boicote às

paradas militares da Semana da Pátria e solicitava às jovens brasileiras que não

namorassem oficiais do Exército. O governo militar reagiu furiosamente.

Redigido pelo ministro da justiça Luís Antônio da Gama e Silva, em 13 de

dezembro de 1968, foi baixado o mais violento de todos os atos institucionais - o AI

nº 5 - que se manteve em vigor até sua revogação em 17 de outubro de 1978. Neste

mesmo dia o Congresso Nacional foi fechado.

O AI-5 determinou a suspensão do habeas corpus (proteção ao indivíduo

contra a violência do Estado) para os crimes políticos contra a segurança nacional, a

ordem econômica e social e a economia popular, excluindo da apreciação do

judiciário os atos praticados pelo governo com base no AI-5.

Conferiu ao Presidente da República poderes ditatoriais para: decretar o

recesso do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras de

Vereadores, que só voltariam a funcionar quando convocadas, transferindo toda a

atividade legislativa para o Poder Executivo (art.2º, caput e § 1º); intervir livremente

nos Estados e Municípios, sem as limitações previstas na Constituição (art.3º);

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suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de dez anos, assim

como a cassação de mandatos políticos eletivos federais, estaduais ou municipais

(art. 4º); proibir as atividades ou manifestação sobre assuntos políticos para aqueles

que tivessem o mandato cassado, inclusive com restrições de locomoção (art. 5º);

demitir, remover, aposentar ou colocar em disponibilidade magistrados, servidores

ou empregados públicos, bem como a demissão, reforma ou transferência para

reserva de funcionários públicos (art. 6º); suspender as liberdades de reunião e de

associação e instituir a censura (art. 9); baixar leis em todas as esferas (federal,

estadual e municipal), vetar a eleição de candidatos indesejáveis nos sindicatos e

demitir sumariamente funcionários públicos civis e militares.

Utilizando-se do AI-5 como instrumento de caça às bruxas, o governo militar

abriu um amplo ciclo de cassações de mandatos eletivos e promoveu um verdadeiro

expurgo de funcionários públicos, atingindo notadamente o corpo docente das

universidades. Três ministros do STF foram cassados e outros dois deixaram a

Corte em solidariedade aos colegas.

5.7 CONSTITUIÇÃO DE 1969

Não há consenso se o que se denomina Constituição de 1969 é, apenas, a

emenda nº 1 à Constituição de 1967. Majoritariamente, prevalece a primeira

concepção, não apenas pela extensão das mudanças introduzidas, mas pelo seu

fundamento de validade.

Conforme Sarmento (2010, p. 71):

É que as Emendas como emanação de um poder constituinte derivado, têm o seu fundamento na própria Constituição que modificam. Porém, a assim chamada Emenda nº 1 não foi outorgada com fundamento na Constituição de 1967, mas sim com base no suposto poder constituinte originário da “revolução vitoriosa” que se corporificava, mas não se exauria, nos atos institucionais editados pelos militares.

Silva (2010, p. 87) também defende a tese de nova Constituição:

Teórica e tecnicamente, não se tratou de emenda, mas de nova constituição. A emenda só serviu como mecanismo de outorga, uma vez que verdadeiramente se promulgou texto integralmente reformulado, a começar pela denominação que se lhe deu: Constituição da República Federativa do Brasil, enquanto a de 1967 se chamava apenas Constituição do Brasil.

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Em agosto de 1969, o presidente Costa e Silva sofreu uma trombose e foi

temporariamente declarado impedido de exercer a Presidência pelo AI 12. O Alto

Comando das Forças Armadas não permitiu que o vice, Pedro Aleixo, um civil,

assumisse porque este havia se recusado a assinar o AI-5. Uma Junta Militar

formada pelos ministros do Exército, General Aurélio de Lira Tavares; da Marinha,

Almirante Augusto Hadmacker; e da Aeronáutica, Brigadeiro Márcio de Souza Melo,

assumiu a função presidencial.

Em 17 de outubro de 1969, foi decretada a Emenda Constitucional nº 1,

também conhecida como "Constituição de 1969". Ao contrário de outras emendas

constitucionais que normalmente só destacam as alterações textuais efetuadas,

essa trazia todo o texto constitucional da Carta de 1967, desde seu primeiro artigo,

mesmo os trechos não alterados, institucionalizando todos os atos do regime militar.

5.8 CONSTITUIÇÃO DE 1988

5.8.1 AntecedentesO governo de Garrastazu Médice (1969-1974) foi o mais duro e repressivo de

todo o período de ditadura militar. No entanto, durante o seu governo o país obteve

altos índices de crescimento econômico, que a propaganda oficial chamou de

“milagre brasileiro”.

Comandado pelo então Ministro da Fazenda, Antônio Delfim Neto, o

desenvolvimento brasileiro foi impulsionado por uma conjuntura internacional

favorável de abundância de capitais. O governo brasileiro tomou um volume

significativo de empréstimos em bancos estrangeiros e aplicou no desenvolvimento

de inúmeros projetos importantes para o país. No entanto, conflitos no oriente médio

promoveram uma reviravolta nos preços do petróleo dando início a uma escalada de

dificuldades para a economia brasileira, cujo crescimento estava alicerçado no

endividamento externo.

O aumento internacional do preço do petróleo pesava significativamente na

balança comercial, a dívida externa foi crescendo de forma assustadora e a inflação

iniciou uma escala crescente, dando origem a uma longa e amarga crise econômica

e retirando do governo militar os seus principais argumentos para manter-se no

poder.

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O próximo presidente, Ernesto Geisel (1907-1996), cujo mandato se iniciou

em 1974 e se estendeu até 1979, assumiu prometendo retomar o crescimento e

restabelecer a democracia. Compreendendo a situação, tratou de promover,

conforme suas palavras, um processo gradual, lento e seguro de abertura

democrática.

Os militares estavam divididos em três grupos distintos: os da Legalidade, que

eram contra o golpe; os da Sorbonne, cujo maior representante era o General

Castelo Branco; e os da Linha Dura, que entraram no poder depois de 1968 e

impuseram o AI-5, cujo maior representante era o general Costa e Silva e, em sua

maioria, eram de patentes médias. Os da Sorbonne representavam a elite intelectual

dos militares, a maioria foi estudar na Universidade de Sorbonne, em Paris, e tinham

altas patentes. Eles governaram até 1968, e depois voltaram ao poder para fazer a

reabertura do regime.

O último dos generais-presidentes foi João Baptista Figueiredo (1918-1999),

cujo mandato se iniciou em 1979 e se estendeu até 1985, assumiu o compromisso

de dar sequência ao processo de abertura política iniciada por seu antecessor.

Derrotada a emenda das diretas, a escolha do novo presidente, portanto, se daria de

forma indireta, pelo Colégio Eleitoral.

Nesse tempo, a sociedade civil brasileira se tornava muito mais articulada e

reivindicatória. Capitaneada por instituições como OAB, ABI, CNBB e o novo

sindicalismo que se formara no país, essas sociedades, com o respaldo dos meios

de comunicação social e de ampla parcela da população, passaram a exigir a

redemocratização nacional.

Um pouco antes, o partido do governo se divide, surgindo a Frente Liberal,

liderada pelo mineiro Aureliano Chaves, vice-presidente da República, que se aliou à

aposição para lançar a candidatura de Tancredo Neves, do PMDB, para presidente,

e de José Sarney, do PDS, para vice-presidente, que foram vencedores nas eleições

indiretas, derrotando Paulo Maluf.

Doze horas antes da posse, Tancredo Neves hospitalizou-se, vindo a falecer

em 21 de abril de 1985. O vice-presidente no exercício da Presidência, José Sarney,

assume de forma plena o comando da Nação e toma as medidas para fazer cumprir

o compromisso gravado no manifesto de lançamento da Aliança Democrática,

intitulado “Compromisso com a Nação”. Logo em seguida, foi enviada ao Congresso

Nacional a Proposta de Emenda Constitucional nº 43, prevendo a atribuição de

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poderes constituintes ao Congresso Nacional que se reuniria em 1º de fevereiro de

1987.

No entendimento de SILVA (2010, p. 89) não foi uma Assembleia Nacional

Constituinte o que se convocou, pois ao convocar os membros da Câmara dos

Deputados e do Senado Federal, a rigor o que se fez foi convocar um Congresso

Constituinte.

5.8.2 ElaboraçãoO presidente Sarney, por meio do Decreto nº 91.450, de 18 de julho de 1985,

criou uma Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, sob a presidência de

Afonso Arinos de Mello Franco, que ficou encarregada de elaborar o anteprojeto de

Constituição. A Comissão, mais conhecida pelo nome do seu presidente “Afonso

Arinos”, era constituída de cinquenta membros, entre os quais, juristas e estudiosos

das mais diversas áreas e com inclinações ideológicas heterogêneas. Da Comissão

saiu um texto prolixo, com 436 artigos no corpo permanente e 36 nas disposições

transitórias, mas de teor avançado e democrático e que adotava o regime

parlamentarista de governo.

Conforme Sarmento (2010, p. 82): Seu conteúdo deve ter desagradado ao presidente Sarney, sobretudo pela opção parlamentarista, que decidiu não enviá-lo à Constituinte, para que servisse de base para os seus trabalhos, encaminhando-o ao Ministério da Justiça, onde foi arquivado.

Embora o Anteprojeto da Comissão Afonso Arinos, que recebeu ampla

divulgação, não tenha sido formalmente adotado no processo de elaboração da

Constituição de 1988, foi grande a sua influência sobre o trabalho dos constituintes.

Em seu discurso, na promulgação da Constituição de 1988, o Presidente da

Assembleia Nacional Constituinte, Deputados Ulysses Guimarães fala das

dificuldades, mas também do caráter democrático que ensejou o trabalho dos

constituintes:Foi de audácia inovadora a arquitetura da Constituinte, recusando anteprojeto forâneo ou de elaboração interna. O enorme esforço é dimensionado pelas 61.020 emendas, além de 122 emendas populares, algumas com mais de 1 milhão de assinaturas, que foram apresentadas, publicadas, distribuídas, relatadas e votadas, no longo trajeto das subcomissões à redação final. A participação foi também pela presença, pois diariamente cerca de 10 mil postulantes franquearam, livremente, as 11 entradas do enorme complexo arquitetônico do Parlamento, na procura dos gabinetes, comissões, galeria e salões.

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Em artigo em que analisa os vinte anos de vigência da Constituição de 1988,

Bulos descreve o esforço extraordinário e o clima de apoteose cívica que envolveu o

ambiente do Congresso Constituinte, marcado pelo torvelinho de interesses de

variadíssima gama que resultou num projeto inicial de 551 artigos.

Conforme Bulos, na constituinte predominava:

I - o corporativismo, dos grupos que manipulavam recursos;

II - o ideal socialista, daqueles que queriam fazer justiça social sem liberdade

econômica;

III - o estatismo, dos que acreditavam que a sociedade não poderia prescindir

de tutela;

IV - o paternalismo, daqueles que queriam que o governo tudo lhes

prodigalizasse, sem a necessidade do trabalho e do esforço próprio;

V - o assistencialismo, dos que supunham que a palavra escrita se

converteria, de um súbito, em benefícios imediatos; e

VI - o fiscalismo, dos despreocupados com a sobrecarga tributária.

Sarmento (2010, p. 100) relata que às vésperas do segundo turno de votação,

ocorreu um incidente constitucional. Em 26 de julho de 1988, o Presidente José

Sarney convoca cadeia nacional de rádio e televisão para criticar a constituição em

elaboração. Nas palavras do presidente “há o receio de que alguns dos seus artigos

desencorajem a produção, afastem capitais, sejam adversos à iniciativa privada e

terminem por induzir ao ócio e a improdutividade. (...) Os brasileiros receiam que a

Constituição torne o país ingovernável”.

Ainda conforme o relato de Sarmento (2010, p. 100), a resposta do Presidente

da Assembleia Nacional Constituinte não tardou. No dia seguinte, valendo-se da

prerrogativa assegurada pelo Regimento, Ulysses Guimarães também convoca

cadeia nacional de rádio e televisão, para proferir célebre discurso intitulado “A

Constituição Cidadã”, em que verbera: “A governabilidade está no social. A fome, a

miséria, a ignorância, a doença inassistida são ingovernáveis. A justiça social é a

negação do governo e a condenação do governo. (...) Repito, esta será a

Constituição Cidadã”.

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Em 14 de setembro de 2008, vinte anos depois da promulgação da

Constituição Cidadã, o senador José Sarney (PMDB-AP), em entrevista concedida a

Teresa Cardoso da Agência, reafirma o que dissera em rede nacional: “A inclusão

de todas as reivindicações corporativas tornou o país ingovernável, fazendo da

Constituição Federal algo mais grave do que um Frankenstein”.

5.8.3 PromulgaçãoEm 5 de outubro de 1988, quarta feira, às 16:00 horas, a nova constituição foi

promulgada pelo presidente da Câmara, Ulisses Guimarães, que em seu discurso a

multiqualificou de Constituição Coragem; Constituição Cidadã; Constituição

Federativa; Constituição Representativa e Participativa; Constituição do Governo

síntese Executivo-Legislativo e Constituição Fiscalizadora. Abaixo, trecho da sua

fala:Pela Constituição, os cidadãos são poderosos e vigilantes agentes da fiscalização, através do mandado de segurança coletivo; do direito de receber informações dos órgãos públicos; da prerrogativa de petição aos poderes públicos, em defesa de direitos contra ilegalidade ou abuso de poder; da obtenção de certidões para defesa de direitos; da obtenção de certidões para defesa de direitos; da ação popular, que pode ser proposta por qualquer cidadão, para anular ato lesivo ao patrimônio público, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico, isento de custas judiciais; da fiscalização das contas dos Municípios por parte do contribuinte; podem peticionar, reclamar, representar ou apresentar queixas junto às comissões das Casas do Congresso Nacional; qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato são partes legítimas e poderão denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União, do Estado ou do Município. A gratuidade facilita a efetividade dessa fiscalização.

A Constituição da República Federativa do Brasil está estruturada em um

preâmbulo, uma parte dogmática e permanente com 245 artigos, distribuídos em

nove títulos e o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), com 73

artigos. Ao todo são cerca de 200 dispositivos que dependiam de leis futuras,

complementares ou ordinárias.

Os nove títulos são os seguintes:

Título I — Princípios Fundamentais (arts. 1º ao 4º): elenca os fundamentos

sob os quais se constitui a República Federativa do Brasil;

Título II — Direitos e Garantias Fundamentais (arts. 5º ao 17): elenca os

direitos e garantias fundamentais, dividindo-os em cinco grupos: individuais,

coletivos, sociais, da nacionalidade e políticos;

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Título III — Organização do Estado (arts. 18 ao 43): define a organização

político-administrativa, as atribuições dos entes da Federação ( União, Estados,

Distrito Fedral e Municípios); as situações excepcionais de intervenção nos entes

federativos; a administração pública e os servidores públicos civis e militares; e, as

regiões e sua integração geográfica, econômica e social;

Título IV — Organização dos Poderes (arts. 44 a 135): define a organização e

atribuições de cada Poder (Executivo, Legislativo e Judiciário), e seus agentes; os

processos legislativos, inclusive os que emendam a própria Constituição;

Título V — Defesa do Estado e das Instituições (arts. 136 a 144): trata do

Estado de Defesa, Estado de Sítio, das Forças Armadas e da Segurança Pública;

Título VI — Tributação e Orçamento (arts. 145 a 169): estabelece limitações

ao poder de tributar do Estado; organiza o sistema tributário, especificando os tipos

de tributos e a competência para criá-los; define a repartição das receitas e

estabelece normas para a elaboração do orçamento público;

Título VII — Ordem Econômica e Financeira (arts. 170 a 192): regula a

atividade econômica e financeira, bem como as normas de política urbana, agrícola,

fundiária e de reforma agrária, versando, ainda, sobre o Sistema Financeiro

Nacional;

Título VIII — Ordem Social (arts. 193 a 232): trata de temas caros para o bom

convívio e desenvolvimento social da cidadania, a saber: seguridade social;

educação, cultura e desporto; comunicação social, meio ambiente, família, criança,

adolescente e idoso; populações indígenas;

Título IX — Disposições Gerais (arts. 234 [o artigo 233 foi revogado] ao 250):

trata de disposições esparsas versando sobre temas variados e que não foram

inseridas em outros títulos, em geral por tratarem de assuntos muito específicos.

Conforme Silva (2010, p. 90):

É a Constituição Cidadã, na Expressão de Ulisses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte que a produziu, porque teve ampla participação popular em sua elaboração e especialmente porque se volta decididamente para a plena realização da cidadania.

No entanto, há uma mácula que desprestigia a constituição cidadã. Dentre os

72 senadores da Assembleia Nacional Constituinte, 23 eram chamados de

“biônicos”, porque haviam sido eleitos, indiretamente, nas eleições de 1982.

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Dispositivo da ADCT da Constituição de 1988 previu consulta plebicistária

para 7 de setembro de 1993, vindo a ser antecipada para 21 de abril do mesmo ano,

na qual se confirmou a manutenção da república constitucional e do sistema

presidecialista de governo.

O Brasil já havia realizado um único preblicito em sua história: Em 1961, com

a renúncia do presidente Jânio Quadros, que deveria assumir o cargo era João

Goulart, muito identificado com as ideais de esquerda, o que preocupava os setores

mais conservadores e tradicionais do país, como empresários, militares e

proprietários rurais. Para reduzir os poderes de Goulart, foi implantado através de

uma emenda constitucional o sistema parlamentarista no Brasil, onde as decisões

eram feitas pelo Congresso Nacional. Em 6 de janeiro 1963 ocorreu o primeiro

plebiscito republicano do Brasil, para decidir se o povo queria manter o sistema de

governo parlamentarista. O povo prefiriu a volta do Presidencialismo.

Foi mantida a forma federativa de Estado, com sensível ampliação da

autonomia administrativa e financeira dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios. Foi criado o Estado de Tocantins (art. 13 ACDT), e os Territórios

Federais de Roraima e do Amapá foram transformados em Estados Federados (art.

14 do ADCT). O Território Federal de Fernando de Noronha foi extinto, sendo a sua

área reincorporada ao Estado de Pernambuco (art. 15 do ADCT).

Dispositivo transitório também determinou revisão constitucional após cinco

anos da promulgação da Constituição de 1988, sendo o Congresso nacional

revestido do poder constituinte derivado revisor, cuja seção inaugual dos trabalhos

se deu em 07 de outubro de 1993. Após 237 dias de trabalho, seis emendas foram

aprovadas como Emenda Constitucional de Revisão.

Os fundamentos da República brasileira vêm estampados no Título I da

Constituição Federal, exteriorizando-se por meio dos seguintes princípios: Princípio

Republicano e Princípio do Estado Democrático (art. 1º, caput); Princípio da

Soberania (art. 1º, I); Princípio da Cidadania (art. 1º, II); Princípio da dignidade da

pessoa humana (art. 1º, III); Princípio do valor do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º,

IV); Princípio do pluralismo político (art. 1º, V); Princípio representativo (art. 1º,

parágrafo único); Princípio da separação de Poderes (art. 2º).

No art. 3º, estão relacionados os objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil: (I) Constituir uma sociedade livre, justa e solidária; (II) Garantir

o desenvolvimento nacional; (III) Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as

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desigualdades sociais e regionais; e (IV) Promover o bem de todos, de origem, raça,

sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

A Constituição de 1988 promoveu uma inversão topológica na ordem de

disposição do texto constitucional que se apresenta como reveladora da eleição de

algumas prioridades, a exemplo de algumas constituições europeias do pós-guerra.

Para Sarmento (2010, p. 104):

Se as constituições brasileiras anteriores iniciavam pela estrutura do Estado, e só depois passavam aos direitos fundamentais, a Constituição de 1988 faz o contrário: consagra inicialmente os direitos e garantias fundamentais – no segundo título – logo depois daquele dedicado aos princípios fundamentais – só voltando-se depois disso à disciplina da organização estatal.

Nas palavras de Bonavides (2010, p. 375): “Os direitos fundamentais são o

oxigênio das Constituições democráticas”. O sistema de direitos constitucionais é o

ponto alto da Constituição de 1988. Ao lado de um amplo e generoso elenco de

direitos civis e políticos se soma um conjunto de direitos sociais – tanto trabalhistas

como prestacionais em sentido estrito, agregando também direitos de 3ª geração,

como o direito ao patrimônio cultural (arts. 215 e 216) e ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado (art. 225). É consagrador o testemunho da ONU de que

nenhuma outra Carta no mundo tenha dedicado mais espaço ao meio ambiente. O

caput do artigo 225 é emblemático do especial zelo do constituinte para com o meio

ambiente: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de

uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder

Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e

futuras gerações”.

No mesmo entendimento das constituições anteriores, a de 1988 não

pretende ser exaustiva na enumeração de direitos fundamentais, admitindo haver

outros direitos além dos enumerados, direitos estes implícitos. Conforme Ferreira

Filho (2012, p. 324): tais direitos, como defluem do § 2º do art. 5 º, seriam

“decorrentes do regime e dos princípios, dentre estes especialmente o da dignidade

da pessoa humana, que a Constituição adota”.

Conforme vimos, a Constituição de 1988 optou por não incluir a dignidade da

pessoa humana entre os direitos fundamentais, inseridos no rol do art. 5º. Como se

sabe, a opção constitucional brasileira, quanto à dignidade da pessoa humana foi

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por considerá-la, expressamente, um dos fundamentos da República Federativa do

Brasil, consignando-a no inciso III do art. 1º.

O filósofo que mais contribuiu para a delimitação do conceito da dignidade da

pessoa humana foi Immanuel Kant ao definir o homem como fim em si mesmo e não

como meio ou instrumento de outrem.

É clássico o texto de Immanuel Kant (apud TAVARES, 2009, p. 554):O homem, e duma maneira geral, todo o ser racional, existe como um fim em si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Pelo contrário, em todas as suas ações, tanto nas que se dirigem a ele mesmo como as que se dirigem a outros seres racionais, ele tem sempre de ser considerado simultaneamente como um fim.

Além dos direitos à seguridade social (saúde, previdência e assistência

sociais), à educação e à cultura, a Constituição de 1988 também procurou proteger

os sujeitos em situação de vulnerabilidade, instituindo normas voltadas à defesa de

grupos como mulheres, consumidores, crianças e adolescentes, idosos, indígenas,

afrodescendentes, pessoas com deficiências e presidiários. No entanto, não resta

apenas enumerar direitos. É preciso efetivá-los. Para melhor ilustração da

necessidade de efetivação dos direitos fundamentais, reproduzimos o que nos conta

Veyne e Duby (2009, p.69):Certo dia o imperador Adriano, homem refinado, enfiou o estilete no olho de um dos seus escravos secretários e o cegou; em seguida chamou o escravo e perguntou-lhe que presente preferia, em compensação pelo que acontecera; a vítima não respondeu; o imperador repetiu a pergunta e acrescentou que o escravo teria tudo que quisesse. A resposta foi: “Só quero o meu olho”.

Conforme Bulos (2011, p. 713), a constituição de 1988 consagrou os

seguintes instrumentos de tutela das liberdades públicas postos ao dispor dos

indivíduos e das coletividades para provocar a intervenção das autoridades

competentes, com vistas à defesa de um direito lesado ou ameaçado de lesão por

ilegalidade ou abuso de poder: direito de petição (art. 5º, XXXIV, a); direito de

certidão (art. 5º, XXXIV, b); habeas corpus (art. 5º, LXVIII); mandado de segurança

(art. 5º, LXIX); mandado de segurança coletivo (art. 5º, LXX); mandado de injunção

(art. 5º, LXXI); habeas data (art. 5º, LXXII); e ação popular (art. 5º, LXXIII).

Conforme Silva (2010, p. 67): A Constituição de 1988 ampliou o núcleo

explicitamente imodificável na via de emenda, definindo no art. 60, § 4º, que não

será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: a forma

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federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos

Poderes; os direitos e garantias individuais.

A ordem econômica e financeira está distribuída em princípios gerais da

atividade econômica (arts. 170 a 181); política urbana (arts. 182 e 183); política

agrícola, fundiária e a reforma agrária (arts. 184 a 191); e o sistema financeiro

nacional (art. 192). A Constituição de 1988 privilegiou uma economia de mercado de

cunho capitalista, valorizando a liberdade de exercício da atividade econômica (art.

170, parágrafo único), a propriedade privada (art. 170, II) e a livre concorrência. Por

outro lado, tratou o constituinte de tingir esse sistema com preocupações com a

justiça social, tais como a valorização do trabalho, a função social da propriedade e

a dignidade da pessoa humana.

Sarmento (2010, p. 108):

A Constituição expressa adesão ao regime capitalista, rejeitando o modelo de economia planificada e de apropriação coletiva dos meios de produção. Porém o capitalismo que resulta do texto constitucional não é o do laissez-faire e do Estado absenteísta, mas uma fórmula intermediária, que aposta na força empreendedora e criativa da iniciativa privada, mas não foge à sua responsabilidade de discipliná-la e limitá-la, não só no interesse do próprio mercado, como também no da promoção da igualdade material e da justiça social. A Constituição prevê amplos espaços para a regulação estatal, mas a intervenção direta nesta seara foi limitada pelo constituinte aos casos “quando necessária aos imperativos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo”, conforme definido em lei (art. 173).

A Constituição do Brasil, de 1988, define a opção por um sistema, o sistema

capitalista, um modelo econômico de bem-estar, desenhado nos arts. 1º e 3º, até o

quanto enunciado no seu art. 170. De acordo com Eros Grau (2003, p. 37): “A

substituição do modelo de economia de bem-estar consagrado na Constituição de

1988 por outro neoliberal, não poderá ser efetivada sem a prévia alteração dos

preceitos contidos nos arts. 1º, 3º e 170”.

No panorama do constitucionalismo contemporâneo, não se tem notícia de

alguma Constituição mais emendada e remendada do que a nossa: setenta e cinco

emendas (até o fechamento deste trabalho) mais seis de revisão.

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6 NEOCONSTITUCIONALISMO

Na Europa, prevalecia até a Segunda Guerra Mundial uma cultura

essencialmente legicêntrica, que tratava a lei editada pelo parlamento como fonte

principal (quase como fonte exclusiva) do Direito, e não atribuía força normativa às

Constituições.

As atrocidades da guerra deixaram evidente que o velho constitucionalismo

europeu caracterizado pelo culto ao legislador e pelo fetiche à lei mostrou-se

incapaz de evitar o surgimento de regimes totalitários responsáveis por sistemáticas

violações a direitos fundamentais. Os direitos fundamentais valiam apenas na

medida em que fossem protegidos por leis, e não envolviam, em geral, garantias

contra o arbítrio e o descaso das maiorias políticas instaladas nos parlamentos.

Conforme Julius-Campuzano (2009, p. 9): O século XX foi testemunha de catástrofes colossais, de enormes cataclismos responsáveis pela modificação nas bases morais da civilização, emocionada pelo impressionante cenário de ódio e guerra, de destruição e morte que o funesto apogeu nazista desencadeou. Assim, não foi ao acaso, a reação que o pensamento e a cultura jurídica europeia experimentaram depois do fatal desastre. Não seria afortunado nem verdadeiro atribuir às transformações que o Estado de Direito sofreria, nos anos imediatamente subsequentes à Segunda Guerra Mundial a uma causal coincidência cronológica, por considerá-lo fruto de uma eventualidade puramente conjuntural.

Após a Segunda Guerra, ainda sob as ruínas do velho continente, nasce um

movimento, denominado “neoconstitucionalismo”, ou, segundo outros,

“constitucionalismo pós-moderno”, ou mesmo, “pós-positivismo”, que procura

reconstruir as bases do Direito Constitucional e passa a desenvolver uma nova

perspectiva em relação ao constitucionalismo. Esses novos marcos normativos,

somados à necessidade de superação de um passado recente de horrores, exigiram

uma nova postura na aplicação e interpretação do direito constitucional.

As mudanças que surgem encontram arrimo no grande princípio norteador do

direito do pós-guerra: o princípio da dignidade da pessoa humana.

Conforme Britto (2012, p.27):

O princípio jurídico da dignidade da pessoa humana decola do pressuposto de que todo ser humano é um microcosmo. Um universo em si mesmo. Um ser absolutamente único, na medida em que, se é parte de um todo, é também um todo à parte; isto é, se toda pessoa natural é parte de algo (o corpo social), é ao mesmo tempo um algo à parte.

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No decorrer da história podemos constatar que, entre avanços e recuos, o

constitucionalismo se fortaleceu na direção do Estado de direito. É o que se pode

concluir da observação de Britto (2012, p.23):É o que pode designar por constitucionalismo cumulativo. Um constitucionalismo crescentemente superavitário, como se dá com a ciência e a cultura, a ponto de autorizar a ilação de que, graças a ele, o Estado de Direito termina por desembocar num Estado de Direitos. O que não significa uma generalizada situação de afrouxamento dos deveres e responsabilidades de cada indivíduo para com o próprio Estado e a sociedade civil. As duas bem podem conviver na mais perfeita harmonia.

Para Sarmento (2010, p. 220):

De acordo com a nova hermenêutica, a interpretação jurídica não pode ser compreendida a partir da visão esquemática cartesiana, que parte da separação absoluta entre sujeito e objeto, uma vez que, no ato de interpretar, o olhar do sujeito que interpreta participa necessariamente da própria construção do objeto interpretado.

Assim sendo, o direito constitucional com o decorrer do tempo vem sofrendo

mudanças profundas, adotando novos paradigmas tanto na teoria jurídica quanto na

prática dos tribunais, mostrando-se susceptíveis às mudanças comportamentais da

sociedade que ocorrem numa velocidade cada vez mais acelerada. Cresce a

transparência. Somos o único país do mundo a transmitir pela TV, ao vivo, os

julgamentos da Corte Constitucional ao vivo: é a força do neoconstitucionalismo.

Mas, o que é neoconstitucionalismo?

Conforme Bulos (2011, p. 80):

Neoconstitucionalismo, constitucionalismo pós-positivista ou constitucionalismo neopositivo é um viés teórico no campo do Direito Constitucional, que aglutina tendências e teses dos mais variados matizes. Designa a evolução de certos aspectos provenientes da cultura institucional. É, portanto, o constitucionalismo contemporâneo com outro nome. E nada mais.

A doutrina ainda não absorveu, por completo, o novo conceito. Sarmento

(2010, p. 234), esclarece que “há quem aplauda entusiasticamente estas mudanças,

e quem as critique com veemência. Contudo, não há como negar a magnitude das

alterações que vêm se desenrolando por debaixo dos nossos olhos”.

Ainda, conforme Sarmento (2010, p. 233):

Estas mudanças, que se desenvolvem sob a égide da Constituição de 88, envolvem vários fenômenos diferentes, mas reciprocamente implicados, que podem ser assim sintetizados: a) reconhecimento da força normativa dos princípios jurídicos e valorização de sua importância no processo de aplicação do direito; b) rejeição ao formalismo e recurso mais frequente a

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métodos ou “estilos” mais abertos de raciocínio jurídico: ponderação, tópica, teorias da argumentação etc.; c) constitucionalização do Direito, com a irradiação das normas e valores constitucionais, sobretudo os relacionados aos direitos fundamentais, para todos os ramos do ordenamento; d) reaproximação entre o Direito e a Moral com a penetração cada vez maior da Filosofia nos debates jurídicos; e, e) judicialização da política e das relações sociais com um significativo deslocamento de poder da esfera do Legislativo e do Executivo para o poder Judiciário.

No Brasil, o reconhecimento da força normativa da constituição só foi possível

após a Constituição de 1988, ampliando assim o espectro da norma constitucional

que passou a ter uma interpretação ampliada, reforçando, assim, a força política do

poder judiciário, a partir de então.

Sobre o assunto Sarmento (2010, p. 241) aduz:

Ao reconhecer a força normativa de princípios revestidos de elevada carga axiológica, como a dignidade da pessoa humana, igualdade, Estado Democrático do Direito e solidariedade social, o neoconstitucionalismo abre as portas do direito para o debate moral. É certo que aqui reside uma das maiores divergências internas nas fileiras do neoconstitucionalismo.

O Supremo Tribunal Federal, de forma mais visível que os demais órgãos,

tem contribuído para moldar continuamente o seu próprio desenho institucional.

Conforme Barroso & Mendonça (2012, p. 1/2), em artigo que contempla a

retrospectiva da atuação do STF em 2011: O caráter abrangente e a textura aberta da Constituição de 1988 potencializam a judicialização de quase todos os temas centrais da política e das relações sociais, colocando o STF na permanente iminência de ser provocado a dar a última palavra sobre quase tudo.

Outro aspecto relevante da Constituição de 1988 é o controle da

constitucionalidade. Para Bulos (2011, p. 199) o modelo de controle da

constitucionalidade implantado pela Carta de 1998 é um dos mais avançados do

mundo, principalmente em matéria de fiscalização concentrada.

Em feliz síntese, Inocêncio Mártires Coelho (2008, p. 127) ensina que esse

novo constitucionalismo marca-se pelos seguintes aspectos: “a) mais Constituição

do que leis; b) mais juízes do que legisladores; c) mais princípios do que regras; d)

mais ponderação do que subsunção; e) mais concretização do que interpretação”.

Conforme podemos concluir, o porvir do constitucionalismo se afigura como

portador de um papel destacado na orientação de um direito que não está

necessariamente atrelado a uma legislação paralisante. O método cartesiano não se

afirmará como único para atingir o azimute. A lente, como instrumento, não será

aquela de ver para perto, tampouco a de ver para longe, mas uma multifocal

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geradora de uma imagem harmônica, completa e transparente, que destina para o

homem uma solução que se coaduna com a sua qualidade de ser humano,

lastreada no princípio da sua dignidade. No entanto, para atingir esse desiderato é

importante que o julgador seja um humanista, um democrata, um republicano, pois,

como afirma o Ministro Ayres Brito (2012, p. 52): “Não pode haver humanismo sem

humanistas; República sem republicanos; democracia sem democratas”.

O Estado está a serviço da pessoa e não esta a serviço dele. Conforme

informa Mendonça (2009, p. 207): “está escrito na fachada do edifício-sede do Poder

Executivo alemão: ‘O Estado existe para as pessoas e não as pessoas para o

Estado’ (der Staat ist für die Menschen und nicht die Menschen für den Staat), uma

afirmação que não é de nenhum político alemão, mas do genial físico judeu-alemão

Albert Einstein”.

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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após tratarmos da história das constituições e do constitucionalismo do Brasil

e do mundo, desde a antiguidade até a contemporaneidade, procuramos nos

concentrar no constitucionalismo brasileiro, identificando as influências

determinantes que no decorrer da história se fizeram presentes, ao tempo em que

procuramos responder à questão de pesquisa: Quais os fatores econômicos, sociais

e políticos que foram determinantes para a formação do constitucionalismo

brasileiro?

O modelo de constitucionalismo adotado, vigente no mundo ocidental se

espelha no paradigma representado pelas três matrizes básicas: inglesa, francesa e

americana. O constitucionalismo brasileiro não é um modelo puro, mas híbrido dos

três modelos, com, evidentemente, a incorporação da influência exercida pelos

aspectos peculiares que estão atrelados no decorrer da sua história.

O Brasil de 1500 a 1808 esteve completamente isolado. Os portugueses eram

protagonistas de todas as relações e o Brasil era apenas, aos olhos do mundo, uma

terra exótica, habitada por selvagens, cuja economia estava baseada na

monocultura de produtos agrícolas, cuja mão de obra era escrava. O Brasil era uma

colônia de exploração, que não podia produzir manufaturados, mesmos os mais

singelos, para não se livrar da dependência de Portugal, que exercia o monopólio da

produção e do comércio.

O processo de exploração se iniciou pelo litoral, com a extração do pau-brasil,

passando pela introdução da lavoura de cana para produção de açúcar, que era

uma especiaria rara na Europa do início dos tempos modernos. A unidade principal

da produção de açúcar era o engenho, daí porque, toda a propriedade passou a ser

chamada de engenho. A mão de obra utilizada nos engenhos era escrava e de

origem africana.

A descoberta de ouro ampliou e deslocou a população para o interior. A

agropecuária também seguiu essa lógica.

No entanto, a consciência de uma cidadania só começa a despertar mais

fortemente, quando o “homo economicus” se viu espoliado pela Metrópole que

exorbitava na sua ânsia de arrecadação: daí a insurreição mineira.

Laurentino Gomes (2007, p. 125) reforça a tese da intenção portuguesa em

manter o Brasil fechado para o mundo:

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Pela ordem de prisão emitida em julho de 1800 contra o barrão, naturalista e geógrafo, Alexander Von Humboldt, que na época percorria a região amazônica em busca de novas espécies da fauna e da flora. Ignorando o valor científico da expedição, o governo português considerou sua presença prejudicial aos interesses da Coroa pelas ideias perigosas que ele poderia disseminar na colônia.

A partir da vinda da família real portuguesa para o Brasil, em 1808, a

população passou a ter um contato mais aproximado com o mundo civilizado, com a

monarquia e com a corte. Só então, começa a surgir na população, uma consciência

do que somos e do que poderemos ser. As fofocas da corte, a imprensa nascente, a

missão artística francesa e a científica austríaca, a irradiação das ideias iluministas e

dos ensinamentos proporcionados pela experiência da revolução francesa, tão

recente, apimentaram as relações sociais e ampliaram o entendimento dos valores

liberais, da função do Estado, dos direitos e das obrigações.

A chegada da família real produziu uma revolução no Rio de Janeiro. O

saneamento, a saúde, a arquitetura, a cultura, as artes, os costumes, tudo mudou

para melhor, pelo menos para a elite branca que frequentava a Corte. Muitas foram

as obras e reformas urbanistas, no Rio de Janeiro: teatro, jardim botânico, museu,

imprensa, escolas médico-cirúrgicas e de engenharia, novas praças, novas ruas etc.

Conforme Gomes (2007, p. 166): “Entre 1808 e 1822 a área da cidade

triplicou com a criação de novos bairros e freguesias. A população cresceu 30%

nesse período, mas o número de escravos triplicou”.

Ponto culminante na escalada do status político da colônia foi sua

transformação, em 16 de dezembro de 1815, à condição de Reino Unido a Portugal

e Algarves, e o Rio de Janeiro à sede oficial da Coroa. Conforme Gomes (2007, p.

218): Havia dois objetivos na medida: o primeiro era homenagear os brasileiros que o haviam acolhido em 1808. O outro era reforçar o papel da monarquia nas negociações do Congresso de Viena, no qual as potências vitoriosas na guerra contra Napoleão discutiam o futuro da Europa. Com a elevação do Brasil a Reino Unido de Portugal, a Corte do Rio de Janeiro ganhava direito de voz e voto no congresso, embora estivesse a milhares de quilômetros de Lisboa, a sede até então reconhecida pelos demais governos europeus.

Lima (1996, p. 689) faz um balanço da passagem de D. João VI pelo país: “D.

João VI veio criar e realmente fundou na América um império, pois merece bem

assim ser classificado o ter dado foros de nacionalidade a uma imensa colônia

amorfa. (...) Deixara, contudo, o Brasil maior do que o encontrara”.

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Até a independência, em 1822 a ordem jurídica vigente na Colônia era a da

Metrópole: as Ordenações Filipinas. Com a constituição de 1824, iniciamos o

processo histórico que desaguou no constitucionalismo brasileiro. A partir daí fomos

construindo uma ordem jurídica própria com base na Constituição de 1824. Em 1830

é sancionado o Código Criminal que vigorou de 1931 a 1891. Em 1832, vem o

Código de Processo Criminal. Em 1850, surge o Código Comercial. O Código Civil

só veio em 1916, adotando, sob a influência da Revolução Francesa, os valores do

Estado Liberal.

A história do constitucionalismo brasileiro pode ser extraída das constituições

brasileiras que se sucederam a partir da Constituição imperial até a Constituição

Cidadã de 1988. É evidente que estas Constituições são frutos dos determinantes

fatores reais do poder, influenciados pelas circunstâncias sociais, econômicas e

políticas pontuadas no tempo.

O constitucionalismo brasileiro não é uma construção pronta e acabada, será

sempre um produto semielaborado. A própria constituição brasileira de 1988 vem

procurando se ajustar, por meio de emendas constitucionais, a um modelo que seja

o mais representativo do ideário do seu povo.

A nossa Carta ainda não atingiu a maioridade constitucional. Acaba de

completar, apenas, 25 anos, o tempo de uma geração, mas representa a esperança

do futuro de uma Nação que se constituiu num Estado Democrático de Direito,

fundamentado na soberania; na cidadania; na dignidade da pessoa humana; nos

valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e no pluralismo político.

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