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Rio de Janeiro, 12 de dezembro de 2016 ISSN: 2446-7014 • Número 46 CONSELHO EDITORIAL SUMÁRIO Os textos contidos nesse Boletim são de responsabilidade única dos membros do Grupo, não retratando a opinião oficial da Escola de Guerra Naval nem da Marinha. Venezuela: a crise político-institucional ultrapassa a fronteira (Pag. 2) Soberania: o custo da reaproximação geopolítica entre Estados Unidos e Argentina (Pag. 2) A questão migratória na Era Trump (Pag.3) Perspectivas para uma África menos injusta (Pag. 3) Segurança marítima: transbordamentos de problemas terrestres no Golfo da Guiné (Pag. 4) Esboço de uma ordem democrática: o processo de Justiça de Transição na Tunísia (Pag. 5) Eleições na Europa Centro-Oriental: aumento da influência russa? (Pag. 5) Itália: será Roma o novo foco de instabilidade da União Europeia? (Pag. 6) As incertezas do futuro da Ucrânia no governo Donald Trump (Pag. 7) O novo chefe do Exército paquistanês e as expectativas para 2017 (Pag. 7) Trinta anos de silêncio interrompidos (Pag. 8) Crise na política externa sul-coreana (Pag. 8) Malásia e o seu poder de barganha com as grandes potências (Pag.9) Noruega e a lacuna GIUK (Pag. 9 ) Artigos selecionados e notícias de Defesa (Pag. 10) Editor Responsável Leonardo Faria de Mattos (EGN) Editor Científico Francisco Eduardo Alves de Almeida (EGN) Editores Adjuntos Felipe Augusto Rodolfo Medeiros (EGN) Jéssica Germano de Lima Silva (EGN) Noele de Freitas Peigo (FACAMP) Pesquisadores do Núcleo de Avaliação da Conjuntura Adriana Escosteguy Medronho (PUC - Rio) André Figueiredo Nunes (UFRJ) Ariane Dinalli Francisco (Universität Osnabrück) Beatriz Mendes Garcia Ferreira (UFRJ) Carlos Henrique Ferreira da Silva Júnior (UFRJ) Daniel Santos Kosinski (UFRJ) Dominique Marques de Souza (UFRJ) Eliza Carvalho Camara Araujo (UERJ) Ely Pereira da Silva Júnior (UERJ) Franco Aguiar de Alencastro Guimarães (PUC - Rio) Gabriela Mendes Cardim (UFRJ) Gabriela da Conceição Ribeiro da Costa (UERJ) Gabriele Marina Molina Hernandez (UFF) Jéssica de Freitas e Gonzaga da Silva (EGN) Jéssica Pires Barbosa Barreto (UERJ) João Victor Marques Cardoso (UFF) José Gabriel de Melo Pires (UFRJ) Lais de Mello Rüdiger (UFRJ) Larissa Marques da Costa (UFRJ) Louise Marie Hurel Silva Dias (PUC - Rio) Luciane Noronha Moreira de Oliveira (EGN) Luma Teixeira Dias (UFRJ) Marcelle Siqueira Santos (UERJ) Marcelle Torres Alves Okuno (IBMEC) Matheus Souza Galves Mendes (UFRJ) Pedro Allemand Mancebo Silva (UFRJ) Pedro Emiliano Kilson Ferreira (UFF) Pedro Mendes Martins (UERJ) Philipe Alexandre Junqueira (UERJ) Rebeca Vitória Alves Leite (UFRJ) Stefany Lucchesi Simões (UNESP) Taynara Rodrigues Custódio (UFRJ) Thaïs Abygaëlle Dedeo (UFRJ) Thayná Fernandes Alves Ribeiro (UFRJ) Vinícius de Almeida Costa (EGN) Vinicius Guimarães Reis Gonçalves (UFRJ) Vivian de Mattos Marciano (UFRJ) Viviane Helena Silva da Rocha (UERJ) BOLETIM GEOCORRENTE O Boletim Geocorrente é uma publicação quinzenal vinculada ao Núcleo de Avaliação da Conjuntura (NAC), do Centro de Estudos Político-Estratégicos (CEPE) da Marinha. O NAC possui o objetivo de acompanhar a Conjuntura Internacional sob o olhar teórico da Geopolítica, a fim de ampliar o conhecimento por meio da elaboração deste boletim, além de outros produtos que porventura venham a ser demandados pelo Estado-Maior da Armada. Para isso, o grupo de pesquisa ligado ao Boletim conta com integrantes de diversas áreas de conhecimento, cuja pluralidade de formações e experiências proporciona uma análise ampla de contextos e cenários geopolíticos e, portanto, um melhor entendimento dos problemas correntes internacionais. Assim, procura-se identificar os elementos agravantes, motivadores e contribuintes para a escalada de conflitos e crises em andamento, bem como, seus desdobramentos. NORMAS DE PUBLICAÇÃO Esse Boletim tem como objetivo publicar artigos curtos tratando de assuntos da atualidade e, eventualmente, de determinados temas de caráter geral sobre dez macrorregiões do Globo, a saber: América do Sul; América do Norte e Central; África Subsaariana; Oriente Médio e Norte da África; Europa; Rússia e ex-URSS; Sul da Ásia; Leste Asiático; Sudeste Asiático e Oceania; Ártico e Antártica. Ainda, algumas edições contam com a seção “Temas Especiais”, voltada a artigos que abordam assuntos não relacionados, especificamente, a uma das regiões supracitadas. Para publicar nesse Boletim, faz-se necessário que o autor seja pesquisador do Grupo de Geopolítica Corrente, do Núcleo de Avaliação da Conjuntura do CEPE e submeta seu artigo contendo, no máximo, 350 palavras ao processo avaliativo. A avaliação é feita por pares, sem que os revisores tenham acesso ao nome do autor (blind peer review). Ao fim desse processo, o autor será notificado via e-mail de que seu artigo foi aceito (ou não) e que aguardará a primeira oportunidade de impressão. CORRESPONDÊNCIA Escola de Guerra Naval – Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha. Av. Pasteur, 480 - Praia Vermelha – Urca - CEP 22290-255 - Rio de Janeiro/RJ - Brasil (21) 2546-9394 E-mail: [email protected]. Aos cuidados do Editor Responsável do Boletim Geocorrente.

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Rio de Janeiro, 12 de dezembro de 2016 ISSN: 2446-7014 • Número 46

CONSELHO EDITORIAL

SUMÁRIO

Os textos contidos nesse Boletim são de responsabilidade única dos membros do Grupo, não retratando a opinião oficial da Escola de Guerra Naval nem da Marinha.

Venezuela: a crise político-institucional ultrapassa a fronteira (Pag. 2)Soberania: o custo da reaproximação geopolítica entre Estados Unidos e Argentina (Pag. 2)A questão migratória na Era Trump (Pag.3)Perspectivas para uma África menos injusta (Pag. 3)Segurança marítima: transbordamentos de problemas terrestres no Golfo da Guiné (Pag. 4)Esboço de uma ordem democrática: o processo de Justiça de Transição na Tunísia (Pag. 5)Eleições na Europa Centro-Oriental: aumento da influência russa? (Pag. 5)Itália: será Roma o novo foco de instabilidade da União Europeia? (Pag. 6)

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As incertezas do futuro da Ucrânia no governo Donald Trump (Pag. 7)O novo chefe do Exército paquistanês e as expectativas para 2017 (Pag. 7) Trinta anos de silêncio interrompidos (Pag. 8)Crise na política externa sul-coreana (Pag. 8)Malásia e o seu poder de barganha com as grandes potências (Pag.9)Noruega e a lacuna GIUK (Pag. 9 ) Artigos selecionados e notícias de Defesa (Pag. 10)

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Editor ResponsávelLeonardo Faria de Mattos (EGN)

Editor CientíficoFrancisco Eduardo Alves de Almeida (EGN)

Editores AdjuntosFelipe Augusto Rodolfo Medeiros (EGN)Jéssica Germano de Lima Silva (EGN)

Noele de Freitas Peigo (FACAMP) Pesquisadores do Núcleo de Avaliação da Conjuntura

Adriana Escosteguy Medronho (PUC - Rio)André Figueiredo Nunes (UFRJ)

Ariane Dinalli Francisco (Universität Osnabrück)Beatriz Mendes Garcia Ferreira (UFRJ)

Carlos Henrique Ferreira da Silva Júnior (UFRJ)Daniel Santos Kosinski (UFRJ)

Dominique Marques de Souza (UFRJ)Eliza Carvalho Camara Araujo (UERJ)

Ely Pereira da Silva Júnior (UERJ)Franco Aguiar de Alencastro Guimarães (PUC - Rio)

Gabriela Mendes Cardim (UFRJ)Gabriela da Conceição Ribeiro da Costa (UERJ)

Gabriele Marina Molina Hernandez (UFF)Jéssica de Freitas e Gonzaga da Silva (EGN)

Jéssica Pires Barbosa Barreto (UERJ)João Victor Marques Cardoso (UFF)José Gabriel de Melo Pires (UFRJ)

Lais de Mello Rüdiger (UFRJ)Larissa Marques da Costa (UFRJ)

Louise Marie Hurel Silva Dias (PUC - Rio) Luciane Noronha Moreira de Oliveira (EGN)

Luma Teixeira Dias (UFRJ)Marcelle Siqueira Santos (UERJ)

Marcelle Torres Alves Okuno (IBMEC)Matheus Souza Galves Mendes (UFRJ)Pedro Allemand Mancebo Silva (UFRJ)Pedro Emiliano Kilson Ferreira (UFF)

Pedro Mendes Martins (UERJ) Philipe Alexandre Junqueira (UERJ) Rebeca Vitória Alves Leite (UFRJ)Stefany Lucchesi Simões (UNESP)

Taynara Rodrigues Custódio (UFRJ) Thaïs Abygaëlle Dedeo (UFRJ)

Thayná Fernandes Alves Ribeiro (UFRJ)Vinícius de Almeida Costa (EGN)

Vinicius Guimarães Reis Gonçalves (UFRJ)Vivian de Mattos Marciano (UFRJ)

Viviane Helena Silva da Rocha (UERJ)

BOLETIM GEOCORRENTEO Boletim Geocorrente é uma publicação quinzenal vinculada ao Núcleo de Avaliação da Conjuntura (NAC), do Centro de Estudos Político-Estratégicos (CEPE) da Marinha. O NAC possui o objetivo de acompanhar a Conjuntura Internacional sob o olhar teórico da Geopolítica, a fim de ampliar o conhecimento por meio da elaboração deste boletim, além de outros produtos que porventura venham a ser demandados pelo Estado-Maior da Armada.Para isso, o grupo de pesquisa ligado ao Boletim conta com integrantes de diversas áreas de conhecimento, cuja pluralidade de formações e experiências proporciona uma análise ampla de contextos e cenários geopolíticos e, portanto, um melhor entendimento dos problemas correntes internacionais. Assim, procura-se identificar os elementos agravantes, motivadores e contribuintes para a escalada de conflitos e crises em andamento, bem como, seus desdobramentos.

NORMAS DE PUBLICAÇÃOEsse Boletim tem como objetivo publicar artigos curtos tratando de assuntos da atualidade e, eventualmente, de determinados temas de caráter geral sobre dez macrorregiões do Globo, a saber: América do Sul; América do Norte e Central; África Subsaariana; Oriente Médio e Norte da África; Europa; Rússia e ex-URSS; Sul da Ásia; Leste Asiático; Sudeste Asiático e Oceania; Ártico e Antártica. Ainda, algumas edições contam com a seção “Temas Especiais”, voltada a artigos que abordam assuntos não relacionados, especificamente, a uma das regiões supracitadas.Para publicar nesse Boletim, faz-se necessário que o autor seja pesquisador do Grupo de Geopolítica Corrente, do Núcleo de Avaliação da Conjuntura do CEPE e submeta seu artigo contendo, no máximo, 350 palavras ao processo avaliativo. A avaliação é feita por pares, sem que os revisores tenham acesso ao nome do autor (blind peer review). Ao fim desse processo, o autor será notificado via e-mail de que seu artigo foi aceito (ou não) e que aguardará a primeira oportunidade de impressão.

CORRESPONDÊNCIAEscola de Guerra Naval – Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha. Av. Pasteur, 480 - Praia Vermelha – Urca - CEP 22290-255 - Rio de Janeiro/RJ - Brasil (21) 2546-9394E-mail: [email protected] cuidados do Editor Responsável do Boletim Geocorrente.

América do Sul

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Venezuela: a crise político-institucional ultrapassa a fronteira Por: Adriana Medronho A crise institucional venezuelana (como exposto no Boletim 35), que opõe fundamentalmente Executivo e Legislativo, chegou a seu auge nessa primeira semana de dezembro, quando a Mesa de Unidade Democrática (MUD) não se apresentou para a terceira mesa de diálogo, cujo objetivo é a busca de acordo para a saída da crise com o governo. A acusação do não cumprimento do acordo – que tem por pontos principais a antecipação das eleições ou reativação do referendo revogatório, liberação de presos políticos, criação de corredor humanitário para o envio de suprimentos à população e nomeação de novas autoridades eleitorais – pelo Presidente Maduro estagnou as negociações. A instabilidade política e econômica que assola o país já transborda fronteiras: no último dia 3, os membros fundadores do Mercosul suspenderam a adesão venezuelana ao bloco dado o não cumprimento das condicionalidades político-econômicas (notadamente, acerca do tema de respeito aos Direitos Humanos) impostas à sua continuação, que expiraram este mês. Após a suspensão, por Maduro, do processo de convocação do referendo revogatório encetado em maio pela Assembleia Nacional, seguida da discussão acerca da legitimidade desta em promover um julgamento das responsabilidades políticas do presidente (competência constitucional do Judiciário venezuelano), manifestações foram convocadas pela oposição nos últimos meses em todo o país, acrescendo ao clima de instabilidade. Frente à declaração do julgamento e ameaças de denúncia ao Tribunal Penal Internacional (TPI), o governo aceitou dar início em novembro às mesas de diálogo com o Parlamento, mediadas pelo Vaticano e pela União de Nações Sul-Americanas (UNASUL), para que uma saída à crise institucional pudesse ser encontrada de maneira pacífica. Entretanto, um ano após a vitória eleitoral da oposição no Parlamento, o bloqueio político do Executivo segue afirmando sua defesa contra um golpe parlamentar. Ambas as frentes desacertam, seja pelo não cumprimento das estabelecidas rodadas seja pelo esvaziamento das mesmas, dado que a instabilidade material do país retroalimenta a crise político-institucional. No curto prazo, a priorização de medidas com vistas ao abastecimento de medicamentos e alimentos à população é fundamental à continuação do processo para que, ademais, este possa atender às diversas demandas por diálogo entre os poderes.

Soberania: o custo da reaproximação geopolítica entre Estados Unidos e Argentina Por: Luma Dias Na disputa geopolítica não é novidade que o interesse em determinadas regiões seja justificado com argumentos questionáveis. É o caso da ocupação de territórios estratégicos com o objetivo de fomentar “pesquisas científicas’’ ou “combate ao narcotráfico”, por exemplo. É dessa forma que oficiais norte-americanos explicam a construção de duas bases na América do Sul: a primeira na região da tríplice fronteira que divide Argentina, Paraguai e Brasil; a outra em Ushuaia, na região da Tierra del Fuego. No entanto, investiga-se que os reais objetivos possam estar ligados a fatores mais preocupantes. As relações da Argentina com os EUA no âmbito da Defesa e Segurança foram relativamente abaladas durante o período Kirchner (2003-2015), posto que o projeto desse governo deu prioridade ao estreitamento das relações com os vizinhos sul-americanos e com a China. Com outro direcionamento político, o atual Presidente Mauricio Macri dá sentido à sua promessa de campanha, que garantia a retomada da cooperação com os EUA. Enquanto a prevenção do tráfico de drogas e do terrorismo também constam entre as motivações alegadas pelos norte-americanos, um olhar mais crítico permite observar que é justamente em Misiones,

América do Sul

Foto: El País

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um dos territórios almejados para a construção das referidas bases, onde se localiza o Aquífero Guarani, uma das fontes de água mais valiosas do mundo. Segundo alguns analistas argentinos, uma ocupação de caráter muito restritivo poderia até afetar, no futuro, o acesso das tribos indígenas à água potável, o que representaria um constrangimento à soberania argentina. A explicação para a outra base, em Ushuaia, seria a facilitação do apoio logístico às pesquisas científicas norte-americanas na Antártica, em especial à estação científica de Palmer, localizada na Península Antártica. Embora as justificativas para a presença estadunidense nas duas regiões possam parecer razoáveis, é preciso acompanhar e ver se realmente são apenas essas as intenções norte-americanas.

Perspectivas para uma África menos injusta Por: João Victor Marques Entre 2001 e 2014, o continente africano vivenciou um extraordinário crescimento econômico, atingindo mais de 5%, acima da média global. Comparado aos anos de 1980 e 1990, considerados “décadas perdidas”, cujo crescimento foi cerca de 2%, a África presenciou nos últimos quinze anos um momento de euforia, impulsionado pelo ciclo das commodities em alta e pelo estreitamento de parcerias em investimento e comércio com países emergentes, especialmente a China. Ainda que essa tendência tenha se moderado, como observado em 2015 e 2016, devido à baixa das commodities, à crise dos emergentes e ao desaquecimento chinês, o aumento da demanda doméstica e as melhores condições de oferta têm mantido o crescimento africano. Resta questionar a sustentabilidade desse processo, considerado estruturalmente precário, e observar os desafios ao desenvolvimento e à integração dos Estados subsaarianos. A África apresenta o maior ônus social do mundo: possui 14% da população mundial, mas também 44% da que vive com menos de US$ 1,90 por dia. Mesmo com a redução proporcional da pobreza projetada até 2030, o número absoluto deve aumentar em razão do acelerado crescimento demográfico. Segundo

A questão migratória na Era Trump Por: Marcelle Santos Após as urnas norte-americanas revelarem a vitória de Donald Trump, um tema em especial passou a ser amplamente debatido: a migração. Durante sua campanha, o candidato pronunciou-se sobre expandir a segurança das fronteiras e também deportar, de imediato, de 2 a 3 milhões de imigrantes que já vivem nos Estados Unidos. A despeito de todo o alarde ocorrido na campanha do republicano, destaca-se que o número de imigrantes presentes no país não é tão expressivo quanto já foi. A década de 1990 ficou marcada como um período em que um grande número de imigrantes deslocou-se para os Estados Unidos em busca de melhores condições de vida, contudo, após a crise de 2008, esse número tendeu a estabilizar. Em 2015, com a relativa melhora na economia, o número de imigrantes nos EUA teve significativo aumento. Os fatos elencados evidenciam que o boom de migrações ocorreu em um período anterior, contudo, em 2015, a quantidade de mexicanos ingressantes foi deveras elevada. Estes permanecem sendo a maioria dos imigrantes ilegais, embora, nos últimos anos, o número de saídas tenha superado o de entradas. Ademais, a recente obtenção dos documentos necessários pelos nacionais do México, que já habitavam nos Estados Unidos, contribuiu para o crescimento da taxa imigrantes vivendo legalmente no país. Nos últimos anos, os imigrantes advindos da América Central são os que mais têm entrado em Washington D.C, impulsionados pelo aumento da violência em países como El Salvador, Honduras e Guatemala. Além dos latino-americanos, muitos asiáticos e africanos também emigraram, principalmente indianos e africanos de países da região subsaariana. Mesmo com todas as declarações, Trump terá que governar junto com os outros Poderes. Entretanto, ele pode revogar unilateralmente proteções contra deportação criadas por Obama, como o Deffered Action for Childhood Arrivals (programa de Ação Deferida para Chegada de Crianças), entre outros. A melhora da economia em relação à crise de 2008 e as propostas de Trump de aumentar as obras de infraestrutura no país podem atrair mais imigrantes, visto que aumentarão as oportunidades de emprego. Por outro lado, a imagem que Trump tem passado pode afastá-los, em razão de estarem receosos das medidas que o presidente irá adotar em sua gestão.

África Subsaariana

América do Norte e Central

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dados do Institute for Security Studies (ISS), em 2030, a África terá 20% da população e 65% da pobreza global. Possivelmente, esse é o maior desafio africano, e os caminhos para superá-lo são muitos, interdependentes e complexos. Nesse sentido, o crescimento econômico deve ser acompanhado de um maior acesso à educação e à saúde, de estímulos à igualdade de gênero, da geração de emprego e da melhoria da governança. Pesa, portanto, a necessidade de se formular uma África mais inclusiva e pensada para dentro, isto é, o rompimento da excessiva dependência dos mercados externos e o estímulo ao comércio e à integração interafricana,

considerada muito aquém dos demais continentes. Um cenário promissor para 2017 seria expandir a melhoria da governança, restrita atualmente a poucos países, como Seychelles, Cabo Verde, Botsuana, África do Sul e Namíbia. São imperativas as reformas estruturais e regulatórias para expandir o comércio com países emergentes e o de natureza interafricana. Para tal, soluções africanas como a Nova Parceria para o Desenvolvimento da África (NEPAD, sigla em inglês), criada em 2001 e incorporada à União Africana como seu programa legítimo, procuram facilitar e coordenar projetos de

desenvolvimento, bem como mobilizar recursos e coordenar pesquisas nos principais eixos: capital humano; industrialização, ciência, tecnologia e inovação; integração regional, infraestrutura e comércio; e, recursos naturais, governança e segurança alimentar. Sabe-se que o desenvolvimento é o caminho mais adequado à justiça social e à segurança humana.

Segurança marítima: transbordamentos de problemas terrestres no Golfo da Guiné Por: Vivian Mattos

Muito se tem falado sobre o aumento da insegurança marítima no Golfo da Guiné, o que de fato vem ocorrendo. Porém, em muitos casos, como o nigeriano, a origem do problema não é abordada, dificultando a resolução da temática de segurança marítima na África Ocidental. Problemas como o aumento de sequestros de navios e tripulantes, pirataria e roubo armado, tráfico de drogas e ataques contra plataformas petrolíferas são questões securitárias enfrentadas pelos países do Golfo da Guiné. Entretanto, tais questões não têm gênese no ambiente marítimo, mas, sim, no ambiente terrestre. A região vive um grande paradoxo, pois, apesar do exorbitante potencial energético apresentado, questões sociais como a miséria e o analfabetismo saltam aos olhos de qualquer observador. Além dessas, ainda se apresentam problemas políticos, como a falta de alternância de poder, os altos índices de corrupção e a não redistribuição das riquezas proporcionadas pelo petróleo. O grande questionamento presente nesse cenário é: por que a região do Golfo da Guiné se tornou um ambiente marítimo tão inseguro? A resposta não parece estar no Atlântico Sul e sim na porção terrestre de cada país membro do Golfo. Os problemas terrestres de ordem política, econômica (não diversificação na economia), social, ambiental, entre outros, transbordam para o ambiente marítimo, externalizando problemas de segurança interna no espaço marítimo, onde se encontram, justamente, as maiores riquezas desses Estados. Assim sendo, a não assistência dos governos a suas populações provoca uma espécie de contra movimento de certos grupos, com a finalidade de obterem recursos para a sua subsistência ou de difundirem a existência de problemas em determinadas regiões exploradoras de petróleo. Um dos casos mais emblemáticos, já mencionados em boletins anteriores, está na Nigéria, mais precisamente na região do Delta do Níger, onde os “Vingadores” atuam como uma espécie de militância contra a indústria de óleo e gás. Dessa forma, a solução para os problemas marítimos não deve ser concentrada apenas no esforço militar para a contenção dos crimes supracitados, mas devem-se realizar esforços internos para mitigar os problemas sociais de modo que as populações envolvidas não recorram a práticas criminosas para garantir sua sobrevivência.

África Subsaariana

Foto: Foreignpolicyblogs.com

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Eleições na Europa Centro-Oriental: aumento da influência russa? Por: Daniel Kosinski No último mês de novembro, dois resultados eleitorais e uma manobra parlamentar ocorridos em países da Europa Centro-Oriental alçaram ao governo candidatos e partidos abertamente favoráveis à maior aproximação com a Rússia: na Bulgária, Rumen Radev, antigo comandante da Aeronáutica, venceu as eleições presidenciais no dia 14, declarando-se favorável ao “bom diálogo” com os presidentes dos Estados Unidos e, também, da Rússia. Na Estônia, o Parlamento aprovou voto de não-confiança contra o gabinete do até então incumbente Partido da Reforma, criando condições para a formação de nova coalizão de governo liderada pelo Partido de Centro. Vale ressaltar que este é um histórico representante da minoria russa e favorável ao incremento das relações com a Rússia, país que consome a maior parte das exportações estonianas. Por sua vez, na Moldávia, o candidato socialista Igor Dodon, também favorável à aproximação com aquele país, saiu vitorioso das eleições presidenciais realizadas no último dia 13. Importantes minorias de língua e cultura russas compõem parcela significativa das populações da Estônia e Moldávia, países que fizeram parte da União Soviética por quase meio século. Na Estônia, os cidadãos de origem russa somam 25% da população, enquanto na Moldávia eles compõem 10%. Destaque-se, ainda, que parte desta última compõe, sob proteção da Rússia, a chamada República da Transnístria, independente de fato, embora não de jure, do governo central. Já a Bulgária é um tradicional aliado – e ocasionalmente, satélite – russo nos Bálcãs desde o final do século XIX. Dentre as razões que podem ser apontadas para esses resultados, ressalta-se a insatisfação popular com o ritmo e/ou os resultados da integração dos países da região às instituições ocidentais, como a União Europeia e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Esse é o caso, em especial, da Bulgária,

Europa

Esboço de uma ordem democrática: o processo de Justiça de Transição na Tunísia Por: Pedro Kilson No pós-insurreições de 2011, o cenário político tunisino exibiu diversas facetas que consolidaram um aspecto de estabilidade política. Nesse sentido, a implementação de um processo de Justiça de Transição no país deve ser analisada por sua centralidade na consolidação de uma ordem democrática após a queda do Presidente Ben Ali, em 2011. Justiça Transicional é um conceito que surgiu nos anos 1980, atrelado aos Direitos Humanos e ao Direito Penal Internacional, com o propósito de desvelar abusos estatais e garantir o direito à verdade a vítimas e à sociedade. No caso tunisino, estabeleceram-se procedimentos criminais e Comissões da Verdade, direcionadas não somente ao regime de Ben Ali, mas a um período de 68 anos que atinge seu antecessor, Habib Bourguiba. A elaboração de uma Assembleia Nacional Constituinte assegurou a adoção de uma nova Constituição, estabelecendo um complexo de leis direcionado à Justiça de Transição, o Comitê da Verdade e Dignidade, bem como eleições livres e democráticas. Convencionalmente, almeja-se o aspecto corretivo, não puramente punitivo, abrangendo desde o indivíduo até a sociedade, ademais de englobar objetivos tais quais: reconciliação, unidade nacional, justiça social, construção de um efetivo Estado de Direito e restauração da confiança nas instituições estatais. Antes mesmo de deixar o poder, em 13 de janeiro de 2011, Ben Ali pavimentou o caminho para a implementação de uma Justiça de Transição, prometendo a consolidação de três comissões. Houve, portanto, na Tunísia, a criação do Ministério de Direitos Humanos e Justiça Transicional, seguida da materialização do programa Diálogo Nacional, apoiado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e configurando o rascunho para as leis no âmbito da Justiça de Transição, adotadas em dezembro de 2013. Nesse sentido, recomendações foram delineadas segundo as reivindicações aclamadas durante as insurreições. Assim, estabeleceram-se reparações às famílias dos considerados “mártires” dos movimentos. As dificuldades relacionadas à implementação e enfoque da Justiça de Transição na Tunísia estão intimamente relacionadas às fissuras políticas entre grupos seculares e islamistas. Importantes vulnerabilidades econômicas e geopolíticas, ainda presentes, inviabilizam a plena busca pela memória e reparação, configurando grande obstáculo para o avanço democrático no país, talvez o único que conseguiu emergir da chamada Primavera Árabe com algum êxito na direção democrática.

Oriente Médio e Norte da África

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Europa

que permanece sendo o país mais pobre do bloco europeu. Não obstante, deve também ser considerada a permanência e recrudescimento da influência russa sobre a Europa Centro-Oriental, embora seja prudente ressaltar que uma eventual aproximação desses países com a Rússia não necessariamente implicará o afastamento ou esfriamento das suas relações com governos e instituições do Ocidente.

Itália: será Roma o novo foco de instabilidade da União Europeia? Por: Thaïs Dedeo Apesar de suas potencialidades econômicas, demográficas e geográficas, o peso da Itália na política externa europeia é reduzido por uma série de fatores: a Itália não tem armas nucleares nem assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, sua credibilidade internacional sempre tem sido prejudicada pela instabilidade crônica dos governos e é classificada como pequena em relação às grandes potências europeias. Portanto, a Itália nunca foi capaz de impor suas ideias na cena europeia, devido ao eixo franco-alemão que domina a União Europeia (UE) e pelo caráter paradoxal de sua política externa europeísta, mas eurocética. A dívida pública italiana chegou ao recorde de 133% do PIB do país, o que está muito acima do limite de 60% imposto pelo pacto de estabilidade da UE. Assim, o primeiro-ministro, de centro-esquerda, Matteo Renzi propôs um referendo para reforma constitucional. Entretanto, o “não” ganhou, um resultado que terá consequências políticas e econômicas significativas para a Itália e também para o futuro do euro, começando pela renúncia de Renzi. A reforma pretendia conceder maior poder à Câmara dos Deputados, além de o Senado se tornar um órgão que representaria as autoridades locais, mantendo algum poder legislativo em domínios essenciais como a reforma constitucional e a ratificação de tratados da UE. Além disso, daria ao Estado mais poder frente às autoridades locais, o que fez a reforma ser vista como um projeto autoritário. Alguns supõem que a Itália será a próxima a deixar a UE, ainda que sua manutenção no bloco tenha sido vista pelos italianos como um meio de mitigar a corrupção e o provincianismo da classe política italiana pelas restrições e obrigações externas. Um forte declínio econômico do país na ausência de uma ação reformista poderá limitar a Itália a um tipo de marginalização que pode ser negativa e também prejudicial à UE. A Itália é a terceira economia da zona do euro, possui empresas de excelência em diversos setores industriais e um papel central na grave crise migratória. Portanto, uma instabilidade sem previsão de resolução e a possível ascensão do partido populista Movimento Cinco Estrelas podem tornar Roma o próximo centro de instabilidade na UE.

Rússia e ex-URSSAs incertezas do futuro da Ucrânia no governo Donald Trump Por: Pedro Martins No dia 24 de novembro, ocorreu a cúpula União Europeia-Ucrânia na cidade belga de Bruxelas. O encontro focou nas reformas implementadas pela Ucrânia, bem como na demonstração de apoio do bloco europeu a estas, simbolizada pela decisão da isenção de vistos para o país. Na ocasião, o Presidente ucraniano Petro Poroshenko convidou os líderes europeus para a próxima cúpula, a ser realizada em 2017, em Kiev. Apesar de a notícia indicar um cenário otimista para o projeto ucraniano de adesão à União Europeia, o prognóstico da entrada da Ucrânia no bloco não mudou muito desde a assinatura dos acordos de Minsk 2. Pode-se atribuir essa “estagnação” do projeto ucraniano aos danos que o conflito com a Rússia e as reformas exigidas por Bruxelas fizeram à economia, bem como a problemática da corrupção no país. Contam ainda como obstáculo as dificuldades de Kiev e Moscou em implementar as reformas dos acordos de Minsk 2. Do lado ucraniano, o Parlamento não aprova a reforma constitucional e o status especial das províncias de Donetsk e Luhansk. Do lado russo, o reconhecimento e restauração das fronteiras ucranianas são vistas com resistência. Por fim, existe a incerteza de como o recém-eleito presidente americano Donald Trump irá agir em sua política externa e de defesa, sobretudo no tocante à questão da OTAN e da Ucrânia. Se o Presidente Trump mantiver os posicionamentos de candidato, pode haver uma maior aproximação com a Rússia, o que, teoricamente, pode levar a uma redução da posição dos EUA na OTAN e um menor apoio ao governo ucraniano. Nesse sentido, apesar de a isenção de visto para a Ucrânia ser uma relativa vitória e um passo importante

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O novo chefe do Exército paquistanês e as expectativas para 2017 Por: Rebeca Leite No dia 29 de novembro, o primeiro-ministro do Paquistão empossou o tenente-general Qamar Javed Bajwa como o novo chefe do Estado-Maior do Exército. Bajwa substituirá Raheel Sharif e encontrará desafios domésticos e também externos, como as questões relacionadas à Caxemira. Internamente, o novo chefe enfrentará os movimentos separatistas, principalmente na província do Baluchistão (ver Boletim 44) e também uma crescente movimentação dos grupos terroristas baseados no país. No âmbito externo, a posse de Bajwa acontece em um momento em que as relações entre Paquistão e Índia estão sob estresse prolongado desde o ataque à base do Exército indiano em Uri, na Caxemira administrada pela Índia (ver Boletim 42). O general é creditado por ter vasta experiência na questão e ao longo da Linha de Controle (LoC) e espera-se que esta experiência possa revelar-se inestimável à medida que as tensões na fronteira se acirram. Isso porque, logo após a cerimônia de posse, ao ser perguntado sobre a situação ao longo da LoC, Bajwa afirmou: “tudo ficará bem em um futuro próximo”. Entretanto, apesar de seu envolvimento extensivo com a Caxemira, considera o extremismo uma ameaça maior para o país do que a própria Índia. Assim, a postura do novo chefe tem sido avaliada como conciliadora, de forma a buscar um equilíbrio tanto na campanha contra os grupos militantes quanto nas tensões com a Índia ao longo da fronteira. Contudo, a sucessão pode não trazer uma grande mudança nas políticas imediatamente, mas pode implementar boas relações com os demais vizinhos de forma a contornar o isolamento que vive hoje o Estado paquistanês. Dessa forma, dado o cenário hostil e o papel do Exército nas questões de segurança, defesa e política externa, é indispensável acompanhar os próximos passos do novo general, que certamente delineará os rumos do Paquistão pelos próximos três anos de mandato.

para sua adesão à União Europeia, as dificuldades de Kiev e Moscou em implementar os acordos de Minsk 2 e as incertezas quanto às políticas externa e de defesa norte-americanas dificultam esse processo.

Trinta anos de silêncio interrompidos Por: Philipe Alexandre O futuro presidente dos EUA, Donald Trump, conversou com a recém-eleita presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, por cerca de 10 minutos no último dia 2. Essa conversa, entre um chefe estadunidense e um líder taiwanês, foi a primeira a ocorrer desde 1979, quando os EUA reconheceram a “China continental” como a legítima representante da China. Segundo o republicano, o telefonema partiu pessoalmente da presidente para o parabenizar pela vitória. “Interessante como os EUA vendem bilhões de dólares em equipamentos militares a Taiwan, mas eu não posso aceitar um telefonema de congratulações”, twittou Trump. Entretanto, analistas alertam para os danos que tal ação pode causar nas relações entre Washington D.C. e Pequim. O impasse entre a China e Taiwan vem desde o fim da Guerra Civil, quando os chamados “Nacionalistas” fugiram dos “Comunistas” para a ilha em 1949. Taipei, desde então, alega ser a representante chinesa legítima; todavia, Pequim considera a ilha como parte de seu território – inclusive ameaçando diversas vezes reintegrá-la por via militar. A situação piorou depois que Tsai venceu as eleições em janeiro. Embora tenha prometido “manter o status quo” nas relações com Pequim, a presidente elegeu-se com promessas de maior autonomia para a ilha pelo partido pró-independência (ver o Boletim 27). Pequim logo respondeu com irritação ao telefonema, afirmando que podem deteriorar-se as já complicadas relações com os EUA: “Há apenas uma única China no mundo, e Taiwan é parte inseparável do território chinês. O governo da República Popular é o único com legitimidade para representar a China”. Além disso, o comunicado ainda recomendou aos EUA que tratem a questão com “cautela” para evitar “solavancos inúteis” nas relações entre ambos.

Leste Asiático

Sul da Ásia

Foto: C.tribune.com.pk

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Leste AsiáticoCrise na política externa sul-coreana Por: Ely Pereira Atualmente, a política sul-coreana enfrenta uma intensa crise que teve seu início no final de outubro, quando a Presidente Park Geun-hye foi acusada de corrupção após se envolver em um esquema de tráfico de influência. Segundo investigações, uma amiga próxima de Park possuía acesso a documentos sigilosos do governo e também teria extorquido dezenas de milhões de dólares das maiores empresas do país com o conhecimento da presidente. Desde então, uma série de manifestações populares reuniram milhões de cidadãos nas principais cidades do país, que pediam pelo impeachment da presidente. A insatisfação da opinião pública em relação ao governo refletiu diretamente sobre importantes decisões tomadas no âmbito da política externa, com críticas ao acordo para implementação do sistema de defesa THAAD – assinado em julho com os Estados Unidos – e o GSOMIA – pacto assinado recentemente com o Japão, que prevê o compartilhamento de inteligência militar entre os dois países para conter a Coreia do Norte. No último dia 9, o Parlamento sul-coreano aprovou o processo de destituição da presidente, que terá o posto assumido pelo Primeiro-Ministro Hwang Kyo-ahn até que o processo seja votado pelo Tribunal Constitucional. Pesquisas recentes apontam que, caso o processo seja legitimado, candidatos do Partido Minjoo e do Partido Popular – ambos da oposição e que apresentam visões contrárias aos acordos assinados por Park – são os que possuem maiores chances de assumir o cargo em uma nova eleição. Tal mudança não representaria apenas certo declínio nas relações do país com os Estados Unidos, que apresentaram um notável avanço no governo atual, como também produziria uma reaproximação com a China, que se mostrou profundamente descontente com o THAAD. Ademais, a postura mais rígida frente à Coreia do Norte também poderia ser revista, o que diminuiria as sanções aplicadas contra o país e abriria maior espaço para novas negociações. Contudo, esta é apenas uma das muitas possibilidades a que se deve atentar frente a uma mudança no cenário sul-coreano.

Malásia e o seu poder de barganha com as grandes potências Por: Larissa Marques A Malásia é a terceira economia do Sudeste Asiático e ocupa a 29ª posição na economia global, fazendo fronteiras marítimas com a Indonésia, Vietnã e as Filipinas e ligada a Cingapura por uma ponte. O país está entre os maiores produtores mundiais de estanho e borracha e é um grande exportador de recursos naturais, agrícolas e petróleo, comercializados internacionalmente devido à rota adjacente ao Estreito de Malaca, uma das vias marítimas mais importantes no comércio global, por onde passa 40% do comércio do mundo. A Malásia torna-se, assim, um player importante na região. A política externa do país é oficialmente baseada no princípio da neutralidade e em manter

relações pacíficas com todos os países, aproveitando-se da sua posição geoestratégica para barganhar proventos dos dois grandes atores que disputam a influência no Mar da China Meridional, Estados Unidos e China. Entretanto, pode-se perceber que nos últimos tempos tem ocorrido um realinhamento com a China, desequilibrando ainda mais a balança de influência dos EUA naquela região. A principal causa do afastamento se deve à ação civil do Departamento de Justiça dos EUA para recuperar mais de US$ 1 bilhão em ativos que seriam desviados do fundo estadual 1Malaysia Development Berhad (1MDB). O governo da Malásia também ficou indignado com a suspeita de financiamento dos EUA para grupos

Os EUA possuem como um dos objetivos de sua política externa para a Ásia impedir uma invasão à ilha por parte de Pequim. Mas, objetivando manter um bom relacionamento com o Partido Comunista, Washington D.C. sempre agiu com cautela nessa questão, nunca havendo um contato direto entre os líderes – o que foi modificado com o telefonema. Sendo assim, é evidente que as incertezas acerca do governo Trump podem depreciar as relações sempre delicadas entre as duas grandes potências.

Oceania e Sudeste Asiático

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Ártico e AntárticaNoruega e a lacuna GIUK Por: Pedro Allemand A Noruega decidiu adquirir cinco aviões-patrulha P8A - Poseidon, utilizados principalmente para esforço de inteligência e com a capacidade de lançamento de boias radiossônicas para monitoramento de atividade submarina. O Ministro da Defesa norueguês declarou que a introdução desses aviões é crucial para a manutenção da liderança norueguesa em questões estratégicas no Ártico. Vale notar que esse modelo de avião também está previsto para ser utilizado no caso de reabertura da base aeronaval estadunidense de Keflavik, na Islândia. A decisão pela compra do avião vem na esteira de uma série de exercícios militares russos, dois dos quais utilizaram bases próximas ao Mar de Barents, bem como uma reorganização da defesa norueguesa voltada, novamente, para o apoio à OTAN no Ártico e na contenção russa. Para além desses fatores, a posição estratégica da Noruega e sua capacidade de controlar a passagem por meio da posse do Arquipélago de Svalbard também nos auxiliam a compreender a motivação dessa decisão. A aquisição de instrumentos que permitam o acúmulo de consciência situacional e sua instrumentalização no Ártico é fundamental tanto para a segurança nacional norueguesa quanto, no plano internacional, para a atuação da OTAN. Outro fator que atravessa essa questão relaciona-se com o controle das linhas de comunicação marítimas e, especificamente, da Passagem GIUK. Essa passagem marítima é constituída por Groenlândia, Islândia e Reino Unido, sendo o principal gargalo geopolítico do Atlântico Norte, além de configurar praticamente a única saída possível para o desdobramento das unidades navais russas sediadas em Severomorsk, inclusive seus submarinos balísticos. Quando a Noruega completar a compra e colocar os cinco P8A em operação, a OTAN terá dado um importante passo não só para o controle do chokepoint constituído pela Passagem GIUK, como também da região de Barents e do Mar da Noruega, consolidando o controle sobre as linhas de comunicação marítima do Atlântico Norte e dos acessos às rotas marítimas do Ártico.

da sociedade civil interessados em desestabilizar o governo Razak. Em contrapartida, na recente visita do líder malaio a Pequim, 14 acordos de cooperação foram assinados, incluindo projetos de modernização ferroviária e de petróleo e gás na Malásia Oriental. Outro acordo foi na área da Defesa, prevendo a compra de quatro navios de patrulha costeira a serem construídos pelos chineses. Visto que China e Malásia concordaram em resolver disputas marítimas pela via diplomática, seria possível afirmar que a cooperação de defesa naval entre eles vai direcionar maior estabilidade para o Mar da China Meridional? Só o tempo dirá, pois, para garantir o seu poder de barganha, a Malásia afirma que seu país quer manter bons laços tanto com os Estados Unidos quanto com a China.

Foto: Google.com

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