ribeiro, w. a semiótica da macumba

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8/19/2019 RIBEIRO, W. A Semiótica Da Macumba http://slidepdf.com/reader/full/ribeiro-w-a-semiotica-da-macumba 1/4  A Semiótica da Macumba sábado, maio 21, 2011 Wilson Roberto Vieira Ferreira 2 comments Os estudos da Semiótica confirmam,se não eficincia, !elo menos a ló"ica lin"u#stica da c$amada %ma"ia sim!ática& ou sim!lesmente %macumba&' a busca de conti"uidade f#sica de comunica(ão entre a ordem sobrenatural e feiticeiros ou )amãs e de ob*etos +ue criem rela(es de semel$an(a entre o des!ac$o e a -#tima.beneficiado/ arado)almente, nas manifesta(es atuais de ma"ia e reli"ião !or meio de m#dias di"itais 3nternet e celulares i$one4 +ue encontraremos mais irracionalidade +ue nas formas arcaicas' como !oss#-el a ma"ia !or meio de al"oritmos cu*a nature5a simbólica, arbitrária e fra"mentada6 7ssa !osta"em se ori"inou em uma +uestão le-antada !or um aluno em uma aula de 7studos da Semiótica na 8ni-ersidade An$embi Morumbi/ 7sta-a a!resentando a tricotomia básica dos si"nos da Semiótica !eirciana de 9$arles Sanders eirce, filósofo, cientista e matemático norte:americano fundador da cincia dos si"nos, a Semiótica4' #ndices, #cones e s#mbolos/ ;escre-ia o #ndice como o si"no mais !rimiti-o !or fa5er !arte, inclusi-e, dos fen<menos naturais a fuma(a como #ndice do fo"o ou o tro-ão como o #ndice do raio4, alm de ser-ir de orienta(ão !ara os animais atra-s do olfato4/ or ser sua !erce!(ão de nature5a intuiti-a, os #ndices tm forte !resen(a nas sociedades c$amadas de %!rimiti-as& onde são intensamente  !ercebidos e se tornam sinali5adores cotidianos mudan(as atmosfricas, ca(a etc/4/ 8m aluno +uestionou se as formas má"icas %macumbas&, %des!ac$os& etc/4 !rimiti-as tambm não seriam formas de a(ão $umana carre"adas de #ndices/ 7ssa +uestão iniciou uma interessante e at di-ertida4, !or assim di5er, %análise semiótica da macumba&/ =o final, uma +uestão' como !oss#-el !ráticas tão indiciais con-i-erem na atualidade em m#dias simbólicas di"itais macumbas, des!ac$os ou sim!atias e at confisses de !ecados on line at as formas seculari5adas de ma"ia como sesses de !sicanálise ou -idncias e tarot !ela 3nternet46 rinci!almente !ara a+ueles +ue não estão familiari5ados com as discusses semióticas, -amos iniciar essa discussão e)!licando mel$or a tricotomia dos si"nos/ ;os #ndices aos s#mbolos ara a Semiótica o >ndice o si"no mais !rimiti-o !or estar +uase +ue colado ao ob*eto de referncia, confundindo:se o si"no com o !ró!rio ob*eto/ O >ndice um si"no +ue a!onta  !ara si mesmo/ %O corte semiótico a diferen(a entre o si"no e a coisa, ma!a e território4 não e-idente ou ainda não se encontra estabili5ado' o #ndice %a fra"ment torn a?a@ from t$e ob*ect& eirce4 sua referncia , !ortanto, autoreferencial, a coisa remetida ou se refere, a ela !ró!ria, sem sair do lu"ar, circularmente/& 9$eiros, !e"adas, im!resses di"itais etc, são como fra"mentos de um ob*eto, !artes des!rendidas de um todo/ A im!ressão di"ital indicia a !resen(a de al"um/ B como se a  !essoa ti-esse dei)ado um fra"mento de si mesmo no local/ Os animais orientam:se no mundo !rinci!almente !or meio dos #ndices !or ser um si"no carre"ado de materialidade/ 7m outras !ala-ras, os #ndices tm um -#nculo de re!resenta(ão !or conti"Cidade/ 3sto +uer di5er +ue são si"nos com um -#nculo f#sico e.ou e)istencial com o ob*eto/

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8/19/2019 RIBEIRO, W. A Semiótica Da Macumba

http://slidepdf.com/reader/full/ribeiro-w-a-semiotica-da-macumba 1/4

 A Semiótica da Macumbasábado, maio 21, 2011 Wilson Roberto Vieira Ferreira 2 comments

Os estudos da Semiótica confirmam,se não eficincia, !elo menos a ló"ica lin"u#stica dac$amada %ma"ia sim!ática& ou sim!lesmente %macumba&' a busca de conti"uidade f#sica de

comunica(ão entre a ordem sobrenatural e feiticeiros ou )amãs e de ob*etos +ue criemrela(es de semel$an(a entre o des!ac$o e a -#tima.beneficiado/ arado)almente, nasmanifesta(es atuais de ma"ia e reli"ião !or meio de m#dias di"itais 3nternet e celularesi$one4 +ue encontraremos mais irracionalidade +ue nas formas arcaicas' como !oss#-el ama"ia !or meio de al"oritmos cu*a nature5a simbólica, arbitrária e fra"mentada6

7ssa !osta"em se ori"inou em uma +uestão le-antada !or um aluno em uma aula de 7studosda Semiótica na 8ni-ersidade An$embi Morumbi/ 7sta-a a!resentando a tricotomia básicados si"nos da Semiótica !eirciana de 9$arles Sanders eirce, filósofo, cientista e matemáticonorte:americano fundador da cincia dos si"nos, a Semiótica4' #ndices, #cones e s#mbolos/;escre-ia o #ndice como o si"no mais !rimiti-o !or fa5er !arte, inclusi-e, dos fen<menos

naturais a fuma(a como #ndice do fo"o ou o tro-ão como o #ndice do raio4, alm de ser-ir deorienta(ão !ara os animais atra-s do olfato4/ or ser sua !erce!(ão de nature5a intuiti-a, os#ndices tm forte !resen(a nas sociedades c$amadas de %!rimiti-as& onde são intensamente

 !ercebidos e se tornam sinali5adores cotidianos mudan(as atmosfricas, ca(a etc/4/ 8maluno +uestionou se as formas má"icas %macumbas&, %des!ac$os& etc/4 !rimiti-as tambmnão seriam formas de a(ão $umana carre"adas de #ndices/

7ssa +uestão iniciou uma interessante e at di-ertida4, !or assim di5er, %análise semiótica damacumba&/ =o final, uma +uestão' como !oss#-el !ráticas tão indiciais con-i-erem naatualidade em m#dias simbólicas di"itais macumbas, des!ac$os ou sim!atias e at confissesde !ecados on line at as formas seculari5adas de ma"ia como sesses de !sicanálise ou-idncias e tarot !ela 3nternet46

rinci!almente !ara a+ueles +ue não estão familiari5ados com as discusses semióticas,-amos iniciar essa discussão e)!licando mel$or a tricotomia dos si"nos/

;os #ndices aos s#mbolos

ara a Semiótica o >ndice o si"no mais !rimiti-o !or estar +uase +ue colado ao ob*eto dereferncia, confundindo:se o si"no com o !ró!rio ob*eto/ O >ndice um si"no +ue a!onta

 !ara si mesmo/ %O corte semiótico a diferen(a entre o si"no e a coisa, ma!a e território4 não e-idente ou ainda não se encontra estabili5ado' o #ndice %a fra"ment torn a?a@ from t$eob*ect& eirce4 sua referncia , !ortanto, autoreferencial, a coisa remetida ou se refere, aela !ró!ria, sem sair do lu"ar, circularmente/&

9$eiros, !e"adas, im!resses di"itais etc, são como fra"mentos de um ob*eto, !artesdes!rendidas de um todo/ A im!ressão di"ital indicia a !resen(a de al"um/ B como se a

 !essoa ti-esse dei)ado um fra"mento de si mesmo no local/ Os animais orientam:se nomundo !rinci!almente !or meio dos #ndices !or ser um si"no carre"ado de materialidade/ 7moutras !ala-ras, os #ndices tm um -#nculo de re!resenta(ão !or conti"Cidade/ 3sto +uer di5er+ue são si"nos com um -#nculo f#sico e.ou e)istencial com o ob*eto/

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A !ró!ria essncia da re!resenta(ão al"uma outra coisa +ue está no lu"ar de outra4 *á se !ercebe no #cone/ 8m desen$o +ue fa(a de uma !essoa +ue !osou !ara mim resulta de uma !ro*e(ão do referente em um material +ue não l$e idntico a carne e o osso da !essoa são !ro*etados !ara a su!erf#cie de um !a!el4/ ;essa maneira os #cones abandonam aconti"Cidade indicial !ara adotarem a similaridade/

7nfim, os s#mbolos, rom!endo com a continuidade a semel$an(a4 e tambm com aconti"Cidade, rea"ru!am todos os si"nos arbitrários !ro!riamente ditos' a imensa maioria dossi"nos lin"C#sticos, a !laca de sinali5a(ão %sentido !roibido& ou Destacionamento !roibidoE, osimbolismo +u#mico ou al"brico, !ortanto, alm da lin"ua"em, o dom#nio dos nmeros em"eral/ Os s#mbolos são os si"nos mais abstratos e distantes do ob*eto/

Os s#mbolos criam uma no-a forma de relacionamento com o mundo, di"ital, descont#nua,abstrata/ B a mani!ula(ão de si"nificantes sem a concre(ão analó"ica dos elementos darealidade/ A e-olu(ão dos #ndices !ara os s#mbolos a !ró!ria e-olu(ão do !articular aouni-ersal/

Os #ndices na %ma"ia sim!ática&

;e forma "eral se !ressu!e +ue toda ma"ia sim!ática !or basear:se no !rinc#!io dasemel$an(a/ 3sso si"nifica +ue a ma"ia uma forma ritual de for(ar !oderes ocultos asatisfa5er a nossa -ontade !or intermdio, !rinci!almente, de !artes de !essoas ou ob*etosdistantes +ue de-erão sofrer a a(ão/ eda(os de rou!as, mec$a de cabelo, marcas de mão naterra, a á"ua do rio onde al"um se ban$ou etc/ são, semioticamente falando, fra"mentos ou#ndices do ob*eto da ma"ia/ O #ndice um si"no +ue a!onta !ara ele mesmo, um si"nosemel$ante ao ob*eto com uma rela(ão f#sica/ or isso o #ndice um !erfeito condutor da%sim!atia& !elo liame f#sico/

Assim como a fuma(a dos c$arutos, cu*a forma fluida se assemel$a aos es!#ritos, o #ndice+ue condu5 o es!#rito "uia ao seu %mula&, isto , ao seu mdium/

Se !ensarmos nos +uatro elementos +ue com!em a ma"ia se"undo a antro!olo"ia deMalino?sG@ e Mircea 7liade a saber, o !ensamento animista, o indi-#duo H feiticeiro, )amãetc/ H a !re!ara(ão e o rito má"ico4 !erceberemos +ue em todos eles estão !resenteso!era(es semióticas indiciais/

Se no !ensamento animista o mundo animado !or for(as sobrenaturais, cada e-ento !ossui

uma rela(ão de conti"uidade com al"um outro e-ento, não restando lu"ar !ara o acaso/ Seal"um torce o ! lo"o de!ois de beber á"ua durante o almo(o, !ode se estabelecer umarela(ão de conti"uidade entre á"ua e o acidente e não beber mais á"ua na refei(ão/ ;essamaneira, o mundo !assa a ser animado !or for(as +ue estabelecem bi5arras conti"uidadesentre fatos a!arentemente aleatórios !rinc#!io má"ico da semel$an(a, ou %sim!atia&4/

Iamãs, feiticeiros ou mdiuns são a+ueles +ue !ossuem dons de estabelecerem rela(es deconti"uidade com es!#ritos ou for(as sobrenaturais/ Formas fluidas fuma(a, cac$a(a, á"ua4são condutores indiciais/ ode !arecer bi5arra tal analo"ia, mas assim como no desen$oanimado onde -emos o ratin$o Jerr@ flutuando no ar ao se"uir o rastro do c$eiro do +uei*o oc$eiro como #ndice +ue condu5irá ao referente4, da mesma forma a fuma(a do c$aruto, os

odores fortes de er-as e incensos são liames f#sicos atra-s dos +uais for(as e entidadesconectam com o indi-#duo +ue mani!ula a ma"ia/

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 =a !re!ara(ão escol$em:se basicamente ob*etos de nature5a indicial "o-ernados !elos !rinc#!ios de conti"uidade e semel$an(a como, !or e)em!lo, os bonecos de -udu +ue buscam se assemel$ar K -#tima ou fotos em macumbas4/ 7mbora a semel$an(a ousimilaridade4 se*a uma caracter#stica do #cone re!resentar um referente !or meio de um

material +ue não l$e semel$ante4, essas icono"rafias de-em ser %rec$eadas& ou refor(adasnecessariamente !or #ndices da -#tima.beneficiado san"ue, un$a, manuscrito etc/4 !ara +uese crie um liame f#sico/

7 finalmente o rito má"ico onde !redominam os elementos de in-oca(ão' cLnticos,instrumentos musicais, dan(as, rou!as, ornamentos etc/ Sons !roferidos das !ró!rias bocasdos !artici!antes !ortanto, formas simbólicas de "ra-a(ão de audio em m#dia di"ital ouanaló"ica, !or e)em!lo, não funcionariam4, formas !lásticas e fluidas/ As ondas sonoras tma mesma nature5a indicial da fuma(a' in-oca(ão !or meio do oferecimento de um canal f#sicono caso, as -ibra(es sonoras4 !ara +ue se estabele(a uma rela(ão semiótica de conti"uidadeentre $umanos e a ordem sobrenatural/

Macumba di"ital6

ortanto, a ma"ia essencialmente indicial, analó"ica/ 7mbora lide com o mundosobrenatural, sua !rática f#sica ao buscar rela(es semióticas conti"uas e de semel$an(a/ O+ue di5er, então, da ma"ia !or meio de m#dias di"itais como a 3nternet como sites +ueoferecem des!ac$os !ara ema"recer e encontrar namorado ou !a"amentos de !romessas online6 Ou de formas reli"iosas como a confissão sem a !resen(a do !adre !or meio de umcelular i$one ou, então, de formas seculari5adas de ma"ia com tarot ou sesses de

 !sicanálise on line6

arado)almente, nessas formas di"itais de ma"ia sim!ática +ue encontramos amanifesta(ão contem!orLnea do sobrenatural na sua forma mais irracional/ or incr#-el +ue

 !ossa !arecer, $á uma ordem racional ou ló"ica na ma"ia sim!ática arcaica atra-s de todoum sistema lin"u#stico de re!resenta(es !or conti"uidade e semel$an(a4/ Ao contrário, nasm#dias di"itais da atualidade +ue encontramos o mais absoluto %non sense& ' como al"oritmossi"nos descont#nuos, arbitrários, sem rela(ão com o mundo sens#-el4 !odem ser -e#culos dein-oca(ão ritual6

or um !onto de -ista semiótico, *amais os si"nos di"itais !odem re!resentar o elemento%sim!ático& da ma"ia/

or e)em!lo' forma seculari5ada de ma"ia, a !sicanálise trabal$a com um elemento indicialim!ortante, a %ransferncia& !or semel$an(a, a rela(ão analista.!aciente -ai re!rodu5ir amesma rela(ão !ais.fil$o da ori"em do trauma4/ 9omo uma media(ão s#"nica !or meio deuma interface tela e al"oritmos4 !ode ser condutor indicial desse elemento %sim!ático&6

O emocional, o es!iritual, o sens#-el ou todos os demais elementos +ue fa5em !arte da ordemdo %oculto& *amais se manifestariam sem os elementos sim!áticos da ma"ia' o rito, ain-oca(ão indicial, a conti"uidade nos elementos de !re!ara(ão da %macumba& etc/

O retorno da ma"ia em m#dias tão tecnolo"i5adas como as di"itais são sintomas da nostal"ia

da !erda da !erce!(ão intuiti-a e sens#-el da realidade/ Mas, ao mesmo tem!o, os al"oritmosimantados de sim!atia são o nosso mecanismo de defesa !aródico ao rirmos de sites como o

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%Macumba On Nine& +ue !romete des!ac$os %deli-er@& !ara +uem tem %!re"ui(a de ir aoterreiro&/