revista universo ipa 8

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REVISTA do curso de Jornalismo do Centro Universitário Metodista do IPA Ano 4 | Edição 8 | Dezembro de 2009 | www.metodistadosul.edu.br/universoipa Relíquias da vida Tesouros da Riachuelo página 20 Caminho dos Antiquários página 24 Escuro, tela grande e cinema alternativo página 6 Mistura que deu certo página 44

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Nesta edição, a Revista Universo IPA inova e, ao transitar no âmbito cultural, revela os diferentes olhares dos alunos do segundo semestre de Jornalismo sobre a cultura em Porto Alegre. A proposta de uma edição temática foi construída em conjunto com os alunos da disciplina de Projeto Experimental II, que também propuseram e definiram as pautas de cada reportagem. Temos como resultado reportagens que apresentam a vida cultural da capital gaúcha, projetos para a área, peculiaridades, curiosidades e novidades. Histórias reais foram apuradas, reconstituídas e ocupam as páginas desta edição, produzida no espaço acadêmico, com o objetivo de concretizar-se como um lugar de experimentação do fazer jornalístico.

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Page 1: Revista Universo IPA 8

REVISTA do curso de Jornalismo do Centro Universitário Metodista do IPAAno 4 | Edição 8 | Dezembro de 2009 | www.metodistadosul.edu.br/universoipa

Relíquias da vida

Tesouros daRiachuelo

página 20

Caminhodos Antiquáriospágina 24

Escuro, tela grande ecinema alternativo

página 6

Misturaque deu certo

página 44

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IPA - INSTITUTO PORTO ALEGRE DA IGREJA METODISTACONSELHO SUPERIOR DE ADMINISTRAÇÃO - CONSAD

PRESIDENTE

Wilson Roberto Zuccherato

VICE-PRESIDENTE

Rosilene Gomes da Silva Rodrigues

SECRETÁRIO

Rui Sergio Santos Simões

CONSELHEIROS

Augusto Campos de Rezende

Clóvis de Oliveira Paradela

Eric de Oliveira Santos

Henrique de Mesquita Barbosa Corrêa

Maria Flávia Kovalski

Nelly Azevedo Matolla

Nelson Fer

Paulo Roberto Lima Bruhn

Saulo de Tarso Cerqueira Baptista

REITOR

Norberto da Cunha Garin

COORD. DE COMUNICAÇÃO E MARKETING

Denise Avancini Alves

Esta revista foi impressa em papel Reciclatocomo parte do programa de consumo consciente

dos recursos naturais e colabora, assim,com a redução dos danos ambientais.

REVISTA ELABORADA PELOS ESTUDANTES DO2º SEMESTRE DO CURSO DE JORNALISMO IPA

COORDENADORA DE CURSO

Mariceia Benetti

PROFESSSORES(AS)Everton Terres Cardoso

e Michele Limeira

EDITORA-CHEFE

Michele Limeira

DIAGRAMAÇÃO

Turmas do 2º semestre noturno do curso de Jornalismo IPA

REVISÃO

Lisete Ghiggi e Michele Limeira

CRIAÇÃO DE CAPA

Carlos Tiburski

AJOR - AGÊNCIA EXPERIMENTAL DE JORNALISMO IPA

SUPERVISORA DA AJOR

Profa. Lisete Ghiggi

ARTE-FINAL

Carlos Tiburski

CONTATO

Rua Dr. Lauro de Oliveira, 71 - Rio Branco - POA/RS

51 3316.1269 | [email protected]

IMPRESSÃO

Gráfica Odisséia (300 exemplares)

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Carta aoleitor

Sumário

ENTREVISTA | Um humorista pra lá de gaudério .......................................... 4

CINEMA | Escuro, tela grande e cinema alternativo .................................. 6

TEATRO | A arte viva ................................................................................................................................................ 10

TEATRO | Cooperação para fazer teatro ........................................................................ 12

LUGARES | História e cultura gaúchano Centro de Porto Alegre ............................................................................ 13

LUGARES | Patrimônio preservadono Solar dos Câmara .................................................................................................. 14

LUGARES | Usina do bem ............................................................................................................................ 16

LUGARES | Viva Porto Alegre, viva o Centro ...................................................... 18

LUGARES | Tesouros da Riachuelo ........................................................................................... 20

COMPORTAMENTO | Porto Alegre e as relíquias da vida .......... 24

COMPORTAMENTO | Reabilitação através da cultura ...................... 26

COMPORTAMENTO | França mon amour .................................................................. 28

COMPORTAMENTO | Brasil, um povo cordial ..................................................... 30

INVESTIMENTO | A nova Igreja da Conceição ............................................... 32

INVESTIMENTO | A reforma do Auditório Araújo Viana ............ 34

INVESTIMENTO | Multipalco da capital ....................................................................... 35

MÚSICA | O caminho mais rápido para o sucesso ................................. 36

MÚSICA | Reiventando a música .................................................................................................. 38

MÚSICA | Cultura e lazer no mesmo lugar ............................................................. 40

MÚSICA | Em busca do ritmo perfeito ............................................................................ 42

VOLUNTARIADO | Contação de históriascomo inclusão social ..................................................................... 43

LITERATURA | Mistura que deu certo .............................................................................. 44

RESENHA | Dúvida que o filme não deixa ............................................................... 46

Caros leitores,A maneira de viver de um determinado grupo

social, seus hábitos, sua história, suas obras de arte,

seus costumes, tradições, constituem a cultura de um

povo. A cultura é um aspecto da vida social rico em

informações com potencial jornalístico e de interesse

público.

Nesta edição, a Revista Universo IPA inova e, ao

transitar no âmbito cultural, revela os diferentes olha-

res dos alunos do segundo semestre de Jornalismo

sobre a cultura em Porto Alegre. A proposta de uma

edição temática foi construída em conjunto com os

alunos da disciplina de Projeto Experimental II, que

também propuseram e defi niram as pautas de cada

reportagem. Temos como resultado reportagens que

apresentam a vida cultural da capital gaúcha, projetos

para a área, peculiaridades, curiosidades e novidades.

Histórias reais foram apuradas, reconstituídas e ocu-

pam as páginas desta edição, produzida no espaço

acadêmico, com o objetivo de concretizar-se como um

lugar de experimentação do fazer jornalístico.

Um passeio pelos antiquários instalados no cen-

tro de Porto Alegre é capaz de encantar. Cada objeto

guarda em si histórias peculiares e desconhecidas

apreciadas por colecionadores dos mais diversos luga-

res que buscam nas antiguidades um jeito de manter

viva a história. São estas experiências que são conta-

das na matéria de capa desta edição. Somam-se a

esta reportagens as opções que Porto Alegre oferece

para quem busca salas de cinema que fogem do con-

vencional e oferecem diferenciais tanto em termos de

títulos quanto em espaço físico. O leitor ainda poderá

circular pela “rua dos livros”, um dos logradouros do

centro da capital onde se concentram livrarias, sebos

e bibliotecas, tornando-se um verdadeiro convite à

leitura. Além destas três grandes reportagens, outras

tantas complementam a edição, cada uma delas abor-

dando aspectos específi cos da cultura.

Expomos nas páginas a seguir o trabalho de um

grupo de alunos que, seduzido pelas pautas, percor-

reu lugares, dialogou com as fontes, investigou e

transformou as informações em textos jornalísticos

para serem apreciados por todos!

Boa leitura.

Michele Limeira

Professora Responsável

Projeto Experimental II

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MAURICIO FREITAS

Nascido em Porto Alegre, Jair Kobe teve muitas experiências antes de ser humorista. Cursou três faculdades, sem concluir nenhuma delas. Já fez de tudo na vida. Chegou a ser ‘sacoleiro’ e, há alguns anos, foi até fotógrafo profissional. Após passar por tantas profissões, Kobe se orgulha de completar oito anos da carreira humorística.Conhecido por muitos como “Guri de Uruguaiana”, o humorista conversou com a reportagem da Universo IPA contando detalhes sobre o início da carreira – que completou oito anos em 2009 – e fez uma análise do humor gaúcho e nacional.

Universo IPA - Como começou a tua carreira humorística?

Jair Kobe - Oficialmente, eu me tornei humorista em outubro de 2001. Mas, claro, fiz 50 anos agora e nestes 42 anos sempre tive o lado do humor muito presente em função da minha família, do meu pai e dos meus ir-mãos. É todo mundo muito engraçadinho lá em casa. Quando eu fiz outras coisas na vida, comecei a criar esquetes de vários persona-gens. Quando me dei conta, tinha vários per-sonagens. Havia um gaúcho, um baiano, um mágico que falava castelhano e uma dupla sertaneja que era uma paródia. Todas tinham uma caracterização. Nesse momento, procurei o Flávio Bicca, uma pessoa muito ligada ao teatro gaúcho, e ele me ajudou a organizar esse monte de personagens num evento só. Foi aí que, em outubro de 2001, surgiu o es-petáculo “Seriamente Cômico”, no Teatro do Ipê, porque o Flávio cuidava da pauta de lá, e isso facilitou a minha ida ao local. Mas antes da estreia, fiquei três meses sozinho no Ipê, ensaiando com ele, na tentativa de organi-zar esse ‘fio condutor’ para que, no mesmo espetáculo, o artista fosse para a Bahia, São Paulo, Uruguaiana e Iugoslávia, onde ele se transformava no mágico.

Universo IPA - Qual é a diferença de fazer humor no rádio, na TV e no teatro?

Jair Kobe - É bem diferente, mas tudo tem o mesmo objetivo, a gente vai se adequando e com o tempo vai aprendendo a fazer, vai tendo

Um humorista pra lá de gaudério

preferências. Na TV, eu comecei fazendo ‘tiro curto’, de dois minutos e meio, três minutos ao vivo, no Bom Dia Rio Grande. Isso me deu um pique muito bom e foi um baita exercício. No rádio, tu começas a adquirir a ‘manha’ com o passar do tempo. A cada entrevista, percebes o que funciona melhor. No início tu vais com ‘cola’ para a rádio. Podes levar um livro de fra-ses geniais, de piadas prontas pra ter a sacada na hora e poder ‘colar’. Depois, com o tempo, o repertório fica firme e as coisas acontecem naturalmente. É como no teatro. Quanto mais espetáculos tu fazes, mais vais pegar a tranqui-lidade quanto ao texto, o que dá condições de improvisar.

Universo IPA - O improviso na peça é importante?

Jair Kobe - O improviso é importante desde que tu tenhas o conteúdo, o texto. Não podes subir no palco só na base do improviso. Ficaria um humor irresponsá-vel. Porque a platéia está na expectativa e é preciso fazer graça. E se não deu certo o teu improviso, como é que fica? Não podes frustrar essa expectativa. Se tu tiveres o con-teúdo, sabes para onde ir caso o improviso não dê certo também sabes que vais fazer rir e que vai funcionar. Eu adoro isso, des-de que tu tenhas o conhecimento do que estás fazendo.

André Guimarães Antunes/Divulgação

“Seriamente Cômico” será o novo DVD ao vivo de Jair Kobe

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Universo IPA - Qual dessas linguagens te agrada mais?

Jair Kobe - O teatro em primeiro lugar, a TV em segundo e o rádio em terceiro.

Universo IPA - Por que esta ordem?Jair Kobe - Bem, analisando, eu tenho

bastante intimidade com o teatro porque faço mais de 20 espetáculos por mês, desde 2005, e isso traz cada vez mais tranquilidade no palco. Também faço bastante TV e, por isso, fica em 2º lugar e, em 3º, o rádio porque é o que eu menos faço. Já tive um programa mais fixo na Rádio Rural, o Buenas Tardes Tchê, mas de qualquer forma é essa a proporção.

Universo IPA - Na tua visão, o que é feito de certo e errado no humor Brasil?

Jair Kobe - Não tenho essa soberania para determinar o que é certo ou errado. É questão de gosto. Existem programas que estão há 15, 20 anos no ar fazendo sucesso nas grandes redes de televisão que não são, por exemplo, o gosto do povo gaúcho. São programas nacionais sustentados pelo po-vo do centro-oeste e norte do país. Eles são programas com um tipo de humor mais po-pularesco que, me parece, não agrada tanto ao público gaúcho. Não é ser elitista, mas o povo gaúcho tem outra referência de humor em relação ao povo cearense, por exemplo. Lá, o humor tem um apelo popular infinitamente maior do que o nosso. Lá é aquela coisa mais caricata, o homem vestido de mulher, enfim. Não que não exista aqui ou que não funcione. Lá é uma cultura de referência nacional. Existe uma rua cheia de bares só com humoristas, o que faz com que surjam mais humoristas. No momento que tu temos um número muito maior de pessoas se apresentando, vamos ter coisas melhores aparecendo e, logicamente, vão ter outras ruins também. Por isso eu não sei dizer no humor o que é certo ou errado. A pessoa que faz humor sem preocupação, mais apelativo em palavras e mais pesado tem um público que vai ao espetáculo para assistir isso. Acho que cada um tem o seu espaço. Alguns têm um humor mais pastelão, mais escrachado e, também, tem o seu público. Enfim, cada um tem o seu público.

Universo IPA - Qual é o caminho para alguém que queira ‘viver de humor’?

Jair Kobe - Acredito que, como na música, tu podes ser o intérprete ou o autor. São coisas separadas que podem andar juntas. Lógico que se tiveres como ser o autor e ainda ‘cantar bem’, vais ser tudo de bom. A música é inédita e tu tens a execução que é o cara cantando bem. Tu és ‘completo’. Se és humorista e tens o texto

próprio, facilita porque vais ter o ineditismo do texto. Isso já é o grande barato. Mas tu po-des ser só o intérprete e trabalhar com piadas prontas. O cantor Emílio Santiago, por exem-plo, canta super bem. Ele só precisa escolher o repertório ideal para voz dele e ele vai ser um sucesso, mesmo sem compor nada. No humor, acho que funciona assim também. Hoje em dia tem o stand up (um espetáculo de humor executado por apenas um comediante) onde tu podes contar uma história sem nenhuma caricaturialização. Tu podes criar uma esquete com um personagem. Aí quando tiveres al-gumas esquetes podes montar um show de teatro com 15 minutos de texto. Podes come-çar também com pocket shows em bares. Hoje em dia são inúmeras as possibilidades, e isso é muito bacana.

Universo IPA - Como tu vês a manifes-tação humorística no RS?

Jair Kobe - Eu acho que ainda está tímida. Não está como poderia, pelo potencial do Rio Grande do Sul. Porque existe uma caracterís-tica muito forte daquela coisa do gaúcho ser mais engraçado, mais brincalhão. De qualquer forma, acho que ainda não está no momento, como de Curitiba para cima, onde aparecem muitos humoristas nesse formato de stand up. O Rio Grande do Sul ainda está carente neste formato. Está surgindo pouca gente, mas acho que é uma questão de tempo. Em seguida, va-mos nos surpreender com vários humoristas, até porque hoje o humor leva mais pessoas ao teatro do que o drama e outros gêneros e, por isso, existe um olhar diferente para esse segmento.

Luis Antonio Guerreiro/Divulgação

Guri de Uruguaina é o primeiro personagem de Jair a ter um espetáculo exclusivo no teatro

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Escuro, tela grande e cinema alternativo

LUAN PIRES

Orçamentos milionários, atores conheci-dos globalmente e produções exibidas em superestreias mundiais. Se você acha que ci-nema se resume a isso, está na hora de rever seus conceitos. Na direção oposta, existem sa-las que priorizam outro tipo de programação. São espaços que apostam na exibição de filmes menos conhecidos pelo grande público, e que têm como objetivo tornarem-se uma alternati-va ao dominante cinema hollywoodiano.

Existe muito debate sobre o que é o cine-ma alternativo. Segundo o diretor e roteirista de sucessos como ‘3 Efes’ e ‘Sal de Prata’, Carlos Gerbase, o cinema alternativo seria tanto uma diferenciação econômica e de processo de re-alização, quanto uma diferenciação estética e artística. Para o professor do Curso de Cinema da PUC-RS, “alternativo é aquilo que se opõe ao modelo hegemônico”.

Já o programador da sala de cinema do Santander Cultural, Glênio Póvoas, prefere di-rigir o foco não propriamente aos filmes, mas

às salas que os exibem. “As salas não mostram filmes alternativos, mas elas são salas alterna-tivas”, diz ele.

Porto Alegre possui em torno de 20 salas de cinema de caráter alternativo. Algumas com perfil mais clássico, como a PF Gastal, e outras mais direcionadas ao cinema alternativo con-temporâneo, como o Cine Santander. Há tam-bém salas com uma longa tradição, a exemplo da Cinemateca Paulo Amorim, localizada na Casa de Cultura Mário Quintana. Outras se des-tacam na cena cultural de Porto Alegre como o

Na DIREÇÃO oposta das salas de CINEMA comerciais, espaços FOCAMa programação em outro tipo de PRODUÇÃO cinematográfica.São as chamadas salas de cinema ALTERNATIVO

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Defi nido pelo programador Carlos Schmidt como ÚNI-

CO, o Guion Cinemas é um local tradicional da cena Cultural

de Porto Alegre. Localizado no Shopping Nova Olaria, é com-

posto por duas salas que têm como objetivo tornarem-se

um ambiente aconchegante e pessoal para o público.

Recentemente, o espaço entre as poltronas das salas foi

aumentado em dois metros, evitando os desagradáveis chu-

tes no espaldar das cadeiras pelo espectador de trás. Tam-

bém são disponibilizados pufes para os descansos dos pés.

Outro diferencial do Guion é que é proibido entrar com

alimentos e após 15 minutos passados do início do fi lme.

“Desde o começo sempre nos preocupou a transformação

das salas de cinema em um ambiente gastronômico, que

interfere e perturba a tranquilidade de quem quer assistir”,

disse Schmidt.

A programação do Guion prioriza fi lmes que são uma

alternativa ao cinema dominante, o norte-americano.

“Existem muitos olhares no mundo que merecem e devem

ser apresentados”, afi rmou Schmidt, ressaltando que priori-

za o bom cinema. “O que oferecemos é cinema de qualidade,

independente de suas colorações políticas, sexuais, ou de

nacionalidade”.

“O Guion é único”

Guion Cinemas, que já trouxe personalidades importantes às suas dependências.

É notável a importância desses espaços para a capital Gaúcha como um todo. O pro-gramador da sala PF Gastal, Marcus Melo, res-salta essa importância. “Determinados filmes devem ser exibidos de tanto em tanto tem-po, para que outras gerações tenham acesso a eles. Compete às salas alternativas organizar mostras para esse fim, propiciando que novas gerações vejam tais filmes, formando assim, novos públicos”.

Entretanto, como lembra o programador da sala de cinema do Santander Cultural, hoje esse papel está se modificando e, cada vez mais, é o clima de ‘sala de cinema’ que deve atrair o espectador. “O papel das salas alterna-tivas está mudando em função dos vídeos e DVDs. O sujeito pode organizar um ciclo dos cineastas em sua casa, é só ir à locadora, alu-gar os vídeos ou DVDs e ver em casa. Agora, o que caracteriza o nosso diferencial é que na sala de cinema tem o ritual, a sala escura, um ambiente sem interrupção.”

O circuito de cinema alternativo tem fôle-go próprio e, como no cinema comercial, essas salas costumam ir atrás de cinematografias in-teressantes e de novidades para o seu tipo de público. Além do cinema francês, preferência entre os programadores dessas salas e do pú-

blico que as frequenta, estão surgindo filmes vindos de países que muitos julgariam nem produzir cinema.

Na opinião de Póvoas, da sala do Cine San-tander, o cinema iraniano atualmente pode ser destacado. Para o programador do Guion Cinemas, não há uma tendência majoritária, mas os filmes alemães, japoneses, romenos e outros menos conhecidos, como os produzi-dos no Uruguai e Portugal, ganham destaque na cinematografia internacional.

Muitos podem perguntar o que aconteceria

se tais filmes alternativos recebessem na mídia a mesma atenção dos filmes comerciais, com o in-vestimento adequado em publicidade e outros recursos de divulgação. Na opinião de Marcus, da PF Gastal, “se as armas fossem as mesmas, o público também poderia ser mais atraído pra esse tipo de cinema”. Ele cita como exemplo o apelo comercial de alguns filmes brasileiros, como ‘Os Normais’, que se refletiu no excelente desempenho nas bilheterias.

De fato, a importância de um cinema di-ferenciado, que crie opções para o público, é

Carlos Gerbase, diretor e roteirista de filmes de destaque, como ‘3 Efes’ e ‘Sal de Prata’

Luan Pires

Carlos Schmidt

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essencial para qualquer cena cultural. O con-ceituado cineasta Carlos Gerbase, destaca a necessidade de opções e novas linguagens no cinema: “Sem diversidade, não há evolu-ção. Isso é uma lei biológica. Se tudo é igual, a seleção não vai adiante”. Gerbase cita exem-plos de filmes que, em determinadas épocas, revolucionaram a linguagem cinematográfi-ca. Um deles é ‘O cão andaluz’, filme lançado em 1928, dirigido e escrito por Luis Buñuel e Salvador Dalí. Segundo Gerbase, a obra é um marco do cinema surrealista, na qual os seus diretores exploram o inconsciente humano, numa sequência de cenas oníricas, incluindo o célebre momento em que um homem corta, com uma navalha, o olho de uma mulher. “Esse filme, rompeu completamente os padrões e modelos do cinema convencional. Ali era o novo surgindo com uma força incrível”, explica o cineasta.

O cinema de arte pode causar estranheza a quem só está acostumado com filmes tradicio-nais, que apresentam um personagem herói-co, uma história linear, com final feliz ou triste. Gerbase lembra outro bom exemplo, mais con-temporâneo, o filme ‘Anticristo’, do polêmico diretor Lars Von Trier. “Nesse filme, a pessoa verá um plano de relação sexual bastante explícito, um clitóris sendo cortado... Trier faz questão de

incomodar as pessoas, ou seja, coloca no filme coisas que vão mesmo chocar.”

O interessante dos filmes de caráter alter-nativo é que seu próprio público nunca sabe o que vem pela frente, podendo se chocar, ficar intrigado, gostar ou odiar. Gerbase men-ciona outro exemplo de cinematografia com uma proposta que pode não ser bem aceita ou entendida por alguns. “Tem o filme ‘Irrever-sível’, que é todo contado de trás pra frente. A primeira cena, na verdade é a última, e a última é a primeira. Muita gente na terceira cena vai sair fora, mas quem entende a proposta e o que está acontecendo, senta e curte”.

Sobrevivênciadas salas

Conseguir manter-se num cenário mar-cado pela crise, e com um público segmen-tando, é um exercício de planejamento para essas salas. No caso da sala PF Gastal, ela é subsidiada pela prefeitura e ligada à Secre-taria Municipal da Cultura. O valor das en-tradas pode variar de dois a quatro reais. É por esse fato que seu programador, Marcus Melo, afirma: “Se dependesse da bilheteira, não sobreviveríamos”.

Já o Cine Santander, conforme conta Gle-

nio Povoas, “É uma sala cultural patrocinada pelo Santander. A gente cobra ingresso por-que a entrada gratuita acaba desqualificando o espaço. A ideia é conseguir manter a sala, mas o foco não é o lucro”.

Apesar de ter um público fiel, Schmidt, programador das salas de cinema do Guion, alerta sobre as dificuldades para sobrevivência desses espaços, devido a benefícios como a meia-entrada, que, segundo o programador, não atinge seu objetivo. “Tivemos muitas inter-ferências na nossa atividade, como a obrigato-riedade da meia [entrada], que, atualmente, fez nosso faturamento cair para a metade. Inde-pendente do benefício que esta lei oportunista possa ter concedido, o certo é que quem já ia ao cinema, agora vai pagando a metade. A ideia de que o público aumentaria é falsa. O certo é que já não estamos mais conseguindo pagar as contas e, quem poderia pagar, está pagando menos”.

Schmidt também faz uma crítica à exibi-ção obrigatória de filmes nacionais em cada sala de cinema por um determinado tempo. “Como não há ninguém interessado neles, em 95% das vezes, subsidiamos estas exibições que acabam por provocar um prejuízo sem nenhuma contrapartida do governo. Pelo con-trário, ainda pagamos imposto sobre 100% da

A sala de cinema no Santander Cultural está localizada

dentro de um cofre e dispõe do mesmo projetor da Cinema-

teca Brasileira de SP. Caracteriza-se por apresentar ativida-

des interativas com o público, como sessões de debate sobre

os fi lmes exibidos. Não é a toa que Póvoas, programador da

sala, ao escolher uma palavra para defi ni-la, optou por IN-

TEGRAÇÃO.

Também considerada “alternativa”, apresenta fi lmes

que são opção a quem quer algo diferente do dominante

cinema blockbuster (arrasa-quarteirão), que são produções

hollywoodianas.

Além de fi lmes alternativos, o cine Santander foca-se

no cinema contemporâneo e em atividades com interação

do público, como o Cine Divã, o Cine Club e o Le Rendez-vous

Cinéma que promovem, cada um ao seu estilo, debates so-

bre os fi lmes exibidos.

Como acontece em outras salas alternativas, o Cine

Santander tem um público fixo e assíduo que, mesmo

pequeno, “a gente reconhece na plateia, formada por es-

tudantes e por pessoas da terceira idade.”

Na opinião de Póvoas, o cinema deve ser considerado

como excelente material para discussão e refl exão. É nessa

ideia que a sala de cinema do Santander aposta para atrair

cada vez mais público. “O objetivo é criar sempre uma refl e-

xão sobre o tema. Não deixar que o fi lme acabe quando a

pessoa vai embora. Essa tem sido a nossa política”, afi rma o

programador.

“Nós apostamosna integração”

René Cabrales

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“Nossa sala tem charme”Localizada no térreo da Casa de Cultura Mario Quinta-

na, a cinemateca Paulo Amorim reúne três salas de cinema:

Paulo Amorim, Eduardo Hirtz e Norberto Lubisco.

É um tradicional ponto de encontro para os apreciado-

res de fi lmes alternativos em Porto Alegre. Segundo o pro-

gramador da Cinemateca, Marco Antonio Seadi, o espaço

tem como diferencial o “charme” entranhado no prédio da

Casa de Cultura. “As outras salas não têm o charme daqui.

Aqui tem aquela coisa de ser do Mario Quintana, da poesia

dele, tudo isso está entranhado na sala”.

Segundo Seadi, a escolha por uma programação dife-

renciada da se deve ao perfi l cultural da CCMQ. “Aqui é um

centro Cultural, da tutela do governo do estado. Por isso,

optou-se por fi lmes mais cultos, em que as pessoas pensam

mais, em que as histórias tenham mais conteúdo”. As salas

da Cinemateca contam também com mostras, que podem

ser de fi lmes italianos, franceses entre outros. O espaço é

frequentado por um público diferenciado, que pode variar de

uma “garotada” de 16 anos até senhores de 80.

Acervo Paulo Amorim

“A palavra que nos identifica é diversidade”A sala de cinema PF Gastal, que presta homenagem ao

jornalista Paulo Fontoura Gastal, importante crítico de cine-

ma gaúcho, localiza-se no terceiro andar da Usina do Gasô-

metro. Com programação voltada para cinematografi as

clássicas, algumas da época do cinema mudo dos anos 30 e

40, cativa um público específi co, apreciador de fi lmes que

são verdadeiras obras de arte.

Na PF Gastal, segundo afi rma seu programador, o que

chama atenção são as mostras e os ciclos temáticos: “Nós

trabalhamos com fi lmes clássicos, já há tempo fora de cir-

culação. Temos perfi l mais radical nessa história de fi lme

alternativo. Não nos pautamos só pelo mercado das distri-

buidoras”.

A PF, como é carinhosamente chamada a sala, é defi -

nida pelo seu programador como um espaço que prioriza a

diversidade. “É obrigação do circuito alternativo dar espaço

para todas as cinematografi as”, destaca.

Lourdes Kras

renda, quando que, para os cinemas não ficam mais do que 50%”, observa o programador.

Trabalho deprogramador

Cada programador precisa ‘correr atrás’ dos filmes que deseja exibir em suas salas de cinema. Às vezes, esse processo pode ser mais complicado do que parece ao público.

“É muito difícil conseguir os filmes. As pessoas pedem ‘quero tal mostra’, mas não imaginam a dificuldade. Tem todo um sistema por trás, de direto de uso”, explica o programador do Cine Santander.

O processo começa quando as distribui-doras de filmes compram o direito de exibição e começam a agenciá-los. No Brasil, conforme nos conta o programador da PF, existem em torno de cinco distribuidoras atuantes que in-

vestem na área de cinema alternativo, todas localizadas no eixo Rio - São Paulo. “Algumas dessas distribuidoras não trabalham com fil-mes americanos”, conta Melo.

Para o programador da Cinemateca, Marco Antonio Seadi, o processo todo é um comércio. “Eu vou onde tem os filmes que eu acho que o público vai gostar, que vai dar bilheteria e que eu ache adequado. Vou atrás desses filmes sempre procurando uma negociação”.

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PATRÍCIA DA SILVA

Envolvendo arte e magia, as estátuas vivas dão um toque de beleza às ruas de Porto Alegre. Elas deixam um clima inusitado no ar. É a arte viva que encanta, mostrando o lado humano do artista. Dos mistérios sobre sua origem até sua presença nas grandes cidades, conheça um pouco da história de dois artistas de rua, Marcos Bahrone, que representa Wiliam Shakespeare, e Abraham Ponce, o anjo das ruas. Com trajetórias diferentes, têmem comum a experiênciade representar personagensem vias públicas ou parquesda capital gaúcha.

Vida de estátua não é fácil. O artista Abraham Ponce enfeita as ruas e usa o es-paço para divulgar seu trabalho. Apesar de render, o ganha pão está mesmo nos even-tos para os quais é contratado. Ele comenta que se considera capacitado como qualquer outro ser humano e que chegou a estudar,

mas não quis continuar. O interesse pela arte surgiu há cerca de doze anos, quando perdeu uma sobrinha que teria quatro anos na época. Ele comenta que a última foto que ela tirou foi vestida de palhaço. Então decidiu que ia fazer feliz as crianças do mundo, mas ainda não sabia como. Primeiro, ele queria fazer um palhaço, mas percebeu que não tinha o dom. Depois, Abraham Ponce começou a atuar como artista de rua. O objetivo era tirar um sorriso de uma criança. “Eu gosto e curto cada momento, o sorriso de criança é impa-gável, não há nenhum dinheiro que pague um sorriso”, diz Ponce.

Já para o artista Marcos Bahrone, a ne-cessidade foi a origem de tudo. Ele conta que foi convidado por um secretário de Turismo para trabalhar numa praia. Chegando lá, com a esposa e dois filhos, não encontrou nada do que lhe foi prometido. Foi quando sua esposa, que é atriz, lhe deu a ideia de fazer estátua viva, pois ela há algum tempo já havia trabalhado como artista de rua. A companheira incentivou Bahrone a recitar poesias. Nesse momento que deu início à profissão, na qual continua até hoje com orgulho e determinação.

Marcos conta que dependendo do lugar, se o público já conhece o seu trabalho, o rendi-mento pode aumentar, como no caso do Brick da Redenção, onde recebe em média R$ 150,00 a 200,00 em uma jornada de seis a oito horas de trabalho. Em outros locais não chega a R$ 100,00 por dia. O artista trabalha também na praça da Alfândega e no Gasômetro.

‘Meu trabalhonão é só

ficar parado’

O artista Abraham Ponce, 37 anos, que nas-ceu na Argentina, em Cordova, explica que considera seu trabalho uma arte inspirada na vida real. Um exemplo é a origem do anjo, per-sonagem interpretado por ele, atualmente. “Em 2001, quando aconteceu o atentado de 11 de Setembro, nos Estados Unidos, compus o per-sonagem, porque nessa época todo o mundo desejava a paz”, explica.

Segundo ele, cabe ao público enxergar a estátua viva com imaginação, como se, em volta do personagem, existisse um quadro imaginário e que se movesse a todo instante. Ponce fala que o seu primeiro trabalho foi co-mo palhaço, mas que já trabalhava no teatro de palco. O artista lembra que representou um negro e que as pessoas pensavam que era um “preto velho”. “Algumas tinham medo, mas outras não”, recorda. Ele percebeu que nesse momento as pessoas não sabiam o que era estátua viva.

Durante os onze anos que o artista trabalha na rua Andradas, criou outros personagens, mas até agora o de maior aceitação e sucesso é o anjo. “Todos gostam de anjo, por não ferir a religião de ninguém e por ser um personagem neutro”, justifica.

“Meu trabalho não é só ficar parado”, res-salta Abraham Ponce, para explicar que o seu ofício exige não só concentração, mas também

A arte viva

Incentivado a atuar para driblar dificuldades

Fotos: Patrícia da Silva

O artista de rua Marcos Barone interage com a plateia ao declamar poesias de Shakespeare

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o que transmitir para o público, que tem que usar a imaginação.

O artista Abraham Ponce trabalha de duas a três horas por dia e esclarece que sobrevive com que faz, como todo cidadão comum. “Tiro meu sustento da minha arte, porque tem dias que tiro menos e dias que rende mais, eu não vivo do que tiro nas ruas, eu vivo dos eventos que eu faço”, observa.

Wiliam Shakespeare

Marcos Bahrone, nome artístico do porta-legrense Marcos da Silva, 37 anos, trabalha há quatro anos como estátua viva e há dez anos faz teatro. Formado em cinema e televisão, Bahrone revela que é a primeira estátua a falar no mundo. Já produzido, fica esperando o pú-blico e as pessoas que são atraídas pela estátua viva, que se aproximam aos poucos para pres-tigiar Wiliam Shakespeare, seu personagem da tarde ensolarada de domingo no Parque da Redenção, em Por-to Alegre. Quando o público coloca R$ 0,25 (o valor cobrado por recitar poesias e sonetos de Shakes-peare) na urna, Bahrone começa a interagir com a pla-teia ali formada.

Ele conta que tudo começou com a paixão por Wiliam Shakespeare, cujas poesias e cita-ções levaram o artista a fazer performances de estátua viva, recitando a obra dessa lenda da literatura. “Escolhi esse personagem devido à peça, pela forma como ele se portava diante de toda a sociedade da época e pelo que ele falava na época, que, até hoje, nos traz muitas reflexões sobre o dia-a- dia”, diz Marcos Bahro-ne. O artista também ressalta que já agregou poesias de Castro Alves, Olavo Bilac e Álvares de Azevedo, considerados por ele, mestres da literatura.

Bahrone ainda trabalha com eventos, quando chamado por sua agência. Apresen-ta-se com sua companhia de teatro Cavalo de

Tróia, levando o que chama de “teatro de co-municação” para escolas. Marcos explica que a proposta é didática e pedagógica. Mas o que gera mais lucros para Marcos Bahrone é o tra-balho nas ruas como estátua viva.

Preconceito

“Algumas pessoas têm preconceito, algu-mas não entendem meu trabalho. Tem gente que acha que eu estou ganhando muito di-nheiro, não dão o valor ao meu trabalho. Ou-tras acham pouco o que eu cobro por poesia, existem as duas faces da moeda”, diz Marcos Bahrone, revelando as reações que percebe ao atuar.

Abraham Ponce trabalha com o público de diferentes níveis sociais e acredita que para a maioria o preconceito não existe. O artista trabalha entregando frases de vários autores do mundo de algum livro para as pessoas com o intuito de incentivar a leitura. “Tu passas uma

arte para a pessoa que lê um trecho de algum livro”, diz Ponce.

A professora de Estética e História da Arte da Faculda-de de Filosofia, da PUCRS, Beatriz Dor-fman, 52, acredita

que não existem preconceitos com os artistas de ruas. Ela justifica o entendimento ao exaltar que a sociedade valoriza o que é bonito, e que, se está bonito e bem feito, as pessoas vão parar para olhar e valorizar. “O problema é quando uma coisa é mal feita, então perde o valor, é só uma imitação”, pondera a professora.

Dorfman explica que, na Europa, grandes artistas fazem performances no meio da rua e que, depois, isso começa a ser copiado e perde a qualidade artística. Portanto, acaba desgas-tando uma imagem de algo que poderia ser bom e rico. Dorfman afirma que, na atual socie-dade, as estátuas vivas não são tão valorizadas como mereceriam. Ela ressalta que, na Europa, existem vários artistas de rua, feiras e festivais

que têm melhor organização por serem im-pulsionados por algum tipo de valorização por parte da sociedade. Mas, no Brasil, a professora não vê percebe a mesma valorização.

A professora acredita que as estátuas vi-vas “têm um potencial muito grande para ser explorado”. Comenta que já viu performances muito boas desses artistas, mas que já viu tam-bém, por exemplo, o arremedo de um menino que estava todo pintado de prateado no meio da rua. Ela faz a comparação, indicando que existem extremos de qualidade, que não há como generalizar.

O inícioExistem algumas hipóteses sobre o início da arte das estátuas vivas. Uma delas é de que estaria ligada à origem

do teatro grego. No teatro, enquanto os atores trocavam de fi gurino, havia um quadro, uma moldura, um ator que

fi cava em cena parado, parecendo uma estátua, esperando os atores retornarem. Outra hipótese é que na Grécia,

para os atores se tornarem mais visíveis, eram usados sapatos de plataforma, túnicas compridas e máscaras para

chamar a atenção do público. Por fi carem às vezes parados por vários minutos também representavam estátuas.

Iniciou-se, então, na Europa, a era das estátuas vivas como se conhece hoje, pessoas que se produziam como réplicas

nas ruas chamando a atenção de todos.

Fonte: consulta aos sites www.10aniversario.jfnregedoura.com e www.paumalouca.com.br

“As pessoas gostam dos artistas de rua, porque muita gente que passa por aqui não tem

dinheiro para ir ao teatro,pois são muito caros”

Abraham Ponce

O artista de rua Abraham Ponce se apresenta na rua dos Andradas,centro de Porto Alegre

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Abraham Ponce inspirou-sena vida real para criar o anjo

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DANIELA LUZARDO

Em Porto Alegre, um exemplo que se des-taca e sobrevive no meio artístico é o Grupo Oigalê. “A nossa ideia é fazer um trabalho co-operativado, ou seja, cada um fazer o que sa-be, cada um fazer um pouco de cada coisa”, explica o ator e fundador do grupo, Hamilton Leite. O resultado está na satisfação dos artistas que integram o Oigalê. “Para mim ela significa tudo. Pode não ser o tudo, mas para mim, ela é minha vida”, diz o ator Di Machado, 26 anos, o mais recente membro do grupo.

Os artistas reconhecem as vantagens do grupo e acreditam que o trabalho em equi-pe ameniza as dificuldades. Formada há 10 anos, a Oigalê é avaliada pelos artistas como um projeto satisfatório, pois cada um traz um pouco do que sabe. Todos entram com a arte, o conhecimento e experiência adquirida em seu processo de crescimento.

Para os atores do grupo Oigalê, o trabalho que realizam estimula o público a apreciar a cultura. Os artistas afirmam que quando um grupo sai às ruas ou sobe em um palco, de certa forma, transforma a vida das pessoas que assis-tem ao espetáculo. “O bom é que nós vamos onde as pessoas estão. Por exemplo, estamos nos apresentando na esquina democrática e as pessoas passam por lá para pagar uma conta e param. De alguma forma nós chamamos a atenção delas. É um universo totalmente para-

lelo. É uma outra ótica no contexto cotidiano”, exemplifica a atriz Janaína Melo.

A atenção do público é o principal estímulo aos artistas.“Adoro estar em cena, dando este presente para o público e sendo presentea-do pelos olhares. Não tem preço”, define Di Machado.“É isso o que mais me motiva. Gosto de contar histórias, isso me encanta muito”, argumenta o ator , prometendo investir cada vez mais na carreira. Uma tendência hoje é a exigência de o ator atuar em diferentes frentes na arte. É que Di Machado chama de “multiar-tista”. “Tu tens que saber atuar, tens que ter uma noção musical para poder cantar e tocar, saber produzir”, comenta.

Dificuldades

A falta de investimentos e atenção dos go-vernos ainda é motivo de preocupação para os atores. Di machado avalia que a má distri-buição dos recursos destinados para a cultura desvaloriza o trabalho do artista. “ O que me incomoda é essa pouca valorização que se dá à cultura por parte do estado”, complementa Janaína Melo. Janaína diz que apelar para pa-trocínios de empresas privadas é a alternativa encontrada pelos grupos.

Soluções

Algumas das soluções apontadas pelos ato-

res é que se deve fazer um planejamento cultural e aprimorar o mapeamento dos grupos que exis-tem no Rio Grande do Sul. Esse mapeamento já foi realizado pelo Sindicato dos Artista, porém os grupos mais recentes ficaram de fora dessa con-tagem. “O único auxílio que temos para recorrer é a Funarte (Fundo Nacional da Arte)”, diz ele.

Investir naqueles artistas que estão come-çando é a sugestão dada pela atriz Janaína. “Para quem já é reconhecido é muito fácil. O difícil é para quem está começando e não tem oportunidade”, observa. Ela aproveita para fa-zer um pedido: uma melhor administração do dinheiro para que sejam encaminhados mais fundos para a cultura.

O coordenador de artes cênicas da Secre-taria Municipal da Cultura, Breno Kettzer Saul, explica que “o auxílio que a Secretaria pode dispor a esses artistas é a locação de salas pa-ra apresentação de espetáculos por um valor simbólico, custo que não cobre a manuten-ção do espaço, porém, facilita a divulgação do trabalho dos grupos”. “O lucro dos ingressos é totalmente dos atores”, complementa.

Kettzer diz conhecer as críticas feitas pelos profissionais da área em relação à má ou ne-nhuma distribuição de renda para arte, tendo os atores que recorrer a patrocínio de empresas particulares. Mas o que esclarece o responsável é que o poder público tem recursos escassos e o papel da Secretaria da Cultura é promover à cul-tura na comunidade e não subsidiar artistas.

Cooperação para fazer teatroARTISTAS se unem em grupos para dar continuidade ao SONHO de fazer teatro. Essa é a ALTERNATIVA encontrada por profissionais parasuperar DIFICULDADES como a falta de INCENTIVO governamental

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BRUNA MELLO

Os museus são lugares que guardam pensamentos, sentimentos e histórias. Esses lugares fazem as pessoas sonhar, imaginar cores, formas e sons. Os museus são pontes, portas e janelas que ligam e desligam mundos, tempos, culturas e diferentes pessoas. Eles estão abertos para quem deseja conhecer histórias, exposições, músicas e grandes nomes.

Em um dos mais belos e históricos prédios localizados no centro de Porto Alegre está o Memorial do Rio Grande do Sul. O antigo pré-dio dos Correios, que fica na Praça da Alfânde-ga, foi restaurado em 1998 para receber todo o arquivo histórico do Estado.

O Memorial surgiu com a ideia de res-gatar a história e a cultura gaúchas, mas a instituição também está aberta para outras

manifestações culturais, garante o escritor e diretor do Memorial, Voltaire Schilling (em 2009). O Memorial tem uma estrutura moder-na, com grandes painéis de gravuras, lado a lado, para que os visitantes possam ter uma visão panorâmica dos principais momentos da história do RS. Nesses painéis estão a história de Getúlio Vargas, Elis Regina, a Guerra dos Farrapos e outras. Além da mostra, o Museu expõe livros, mapas, fotografias e depoimen-tos que, de alguma forma, marcaram época e entraram para a história. “A ideia é tornar a visita interessante e diferente, como se os visitantes estivessem em galerias de arte”, afir-ma Schilling. O Memorial recebe estudantes e turistas diariamente. O objetivo da instituição é mostrar toda a história do Estado de forma cronológica através de painéis, vídeos, fotos, livros e documentos antigos.

Uma das instituições culturais mais novas, o Memorial atrai as pessoas pelo fato de ter arquivado documentos históricos importantes. Segundo o professor de história, Lucas Olivei-ra, esse é o diferencial do Memorial, o que faz

com que ele seja diferente dos outros espaços culturais da cidade.

Para o Estado, esse espaço tem uma grande importância: a cultura dos gaúchos está exposta de uma forma atrativa para ser apreciada dentro de um prédio, construído em 1910, que já faz parte da história do RS. “A cidade de Porto Alegre ganhou muito com a preservação de um edifício que tem arqui-tetura eclética, mas ao mesmo tempo tam-bém uma arquitetura Barroca Alemão”, afirma o professor Oliveira. O Diretor do Memorial fala que o espaço foi criado para promover a história dos gaúchos e exposições cultu-rais. Ele ressalta que é relevante à cidade ter um belo acervo. “É importante preservar es-se acervo, pois aqui dentro têm histórias de muitas pessoas e de um povo guerreiro”, diz Schilling. Quem passar pelo arquivo histórico vai se sentir como se estivesse voltando ao passado. “O objetivo do Memorial é fazer com que as pessoas apreciem a nossa história e que saiam pelo menos sabendo um pouco dela”, diz Schilling.

História e cultura gaúchano Centro de Porto Alegre

O Memorial do Rio Grande do Sul ocupa um dos mais belos prédios que circundam a Praça da Alfândega e guarda a história do Estado

Bruna Mello

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GUILHERME KEPLER

Construída há quase dois séculos, a residência da família dos Câmara resiste às ações do tempo. A arquitetura, a fachada, os móveis e alguns utensílios permanecem inalterados, graças ao cuidado e às técnicas de conservação usadas hoje para manter o patrimônio histórico do local.

A centenária casa dos Câmara, localizada no centro de Porto Alegre, é hoje um dos locais da capital onde ocorrem diferentes atividades culturais. Seu espaço, resgatado há quase 20 anos, mostra o contraste entre contemporâ-neo e o antigo. Situado na antiga Rua Formosa, atualmente Duque de Caxias, a casa discreta e antiga esconde atrás de seus muros os seus 190 anos de existência. É considerado o prédio mais antigo de Porto Alegre. Junto à casa estão os jardins, espaços que também têm recebido um cuidado especial de preservação, pois foram tombados pelo patrimônio histórico cultural.

Atualmente, o espaço está sob os cuidados do Legislativo gaúcho. O diretor de Relações Públicas e Atividades Culturais da Assembleia Legislativa, Luiz Carlos Barbosa, destaca a im-portância de se aproveitar e valorizar este belo espaço. “A Assembleia Legislativa busca pro-porcionar o acesso à cultura para a população porto-alegrense e promove diversos tipos de atividades”, afirma. A principal delas é o sarau que acontece semanalmente há 16 anos.

O sarau

A marca registrada do Solar dos Câmara é o sarau que acontece desde a reabertura da casa, há 16 anos. É uma atividade permanente que inclui shows artísticos e musicais, todas as quartas- feiras, às 18h30, com entrada franca, na sala José Lewgoy, espaço que homenageia o ator gaúcho homônimo.

O evento cultural é a referência do So-lar dos Câmara. Em 2007 recebeu o Prêmio Açorianos de música por Honra ao Mérito que é concedido pela Secretaria de Cultura de Porto Alegre.

Segundo o Barbosa, o sarau tem uma pla-

teia cativa, os moradores das proximidades do centro de Porto Alegre, onde se localiza o Solar. Barbosa revela que foi um espectador e fez par-te do público alvo dos anos 70 do teatro Dante Barone, um ponto cultural da cidade. Passados quase 40 anos ele ainda se considera um es-pectador. Hoje, como diretor, é responsável por organizar e promover atividades culturais que resgatam momentos culturais perdidos ao longo dos anos.

No intuito de resgatar a cultura e propiciar entretenimento de qualidade para o público, no mês de outubro de 2009, o Sarau contou com a presença de vários músicos, entre eles o cantor

Júlio Reny e os Irish Boys, que interpretaram músicas de Roberto Carlos, ao estilo MPB.

Moradora do centro da capital e proximi-dade do Solar dos Câmaras, a médica Adais Cunha, revela que faz parte desta história. Ela participou da reinauguração do Solar, que teve como festividade um coquetel e apresenta-ções musicais. A frequentadora ressalta tam-bém a adequação do espaço para eventos, e lembra que participou de apresentações de cantos e lançamento do livro da vereadora Clênia Maranhão.

O sarau intercala os gêneros musicais re-gional, MPB, samba, músicas sul americanas,

Fotos: Guilherme Kepler

Patrimônio preservado no Solar dos Câmara

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Casa localizada na Rua Duque de Caxias preserva 190 anos de história

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ritmos que o Rio Grande do Sul incorporou dos países do Prata, como o chamamé e o tango.

Para o baixista e integrante do grupo Irish Boys, Guilherme Wurch, tocar em um sarau tem um significado especial, por se tratar de um público diferente dos demais, que percebe o espetáculo de uma forma diferente ao aliar a música à cultura.

Um dos critérios da administração, ao pro-gramar os espetáculos, é incluir atividades de todos os gêneros, visando agradar ao diversi-ficado público que compõe a plateia.

Além da música

O Solar dos Câmara, além de ser utilizado como uma casa cultural, é a sede do Depar-tamento de Relações Públicas e Atividades Culturais da Assembleia Legislativa. Está di-vidido em seções, entre elas, a biblioteca e o memorial do parlamento. Nos próximos meses abrigará outros setores como o de recepção e informação e um que trata das premiações concedidas pelo Parlamento

gaúcho, prêmios como o de responsabilidade social, Lila Ripoll, de poesias, e de cinema, uma parceria com o Festival de Cinema de Gramado. Os espaços da casa são aproveita-dos para atividades próprias da Assembleia, também são cedidos eventualmente para lançamentos de livros, para reuniões políti-cas ou culturais.

Mensalmente no Solar há exposições fo-tográficas na sala J.B. Scalco. Espaço que ho-menageia o renomado fotógrafo gaúcho que participou da reportagem que denunciou o sequestro de dois militantes políticos uru-guaios, Lilian Felibert e Gobercindo Dias, em 1978. Há também exposições de fotografias que são permanentes; outras são apresenta-das ao público mensalmente, sendo elas de profissionais reconhecidos e iniciantes que expõem seu trabalho.

Outra atividade cultural do Solar são as visitas guiadas, para o público da cidade, principalmente de escolas, além de turistas do interior, de outros estados e, com alguma frenquencia, de outros países. Também existe um setor que faz reservas de espaço, com profissionais que auxiliam e atendem estes turistas. Para essas visitas a Assembleia estipu-lou um número de três grupos de 60 pessoas por apresentação para não ferir a estrutura física da casa, com a intenção de preservar o patrimônio conservado pela Assembleia Le-gislativa, ambiente significativo no cenário da cultura porto-alegrense.

Visitas guiadas são frequentes no Solar: na foto alunos da Escola Estadual Guararapes,da cidade de Arroio do Meio, interior do RS

Após restauração,sala de jantar recebeutraços neoclássicos e alguns adereços renovados

A históriaA casa que hoje é palco de muitas atividades

teve o seu último morador em 1975, que foi Arman-

do Câmara, herdeiro da família Câmara. Após sua

morte, de 1975 a 1982, o prédio fi cou fechado e com

o tempo foi se deteriorando. Em 1981, a Assembleia

Legislativa resolveu adquiri-lo e começou o processo

de recuperação do ambiente. Em 1988, fi nalmente

começou a obra de restauração, que revitalizou as

estruturas arquitetônicas. Aliado a isto, o espaço

passou por um processo de reciclagem, ou seja, pro-

curou manter sua arquitetura antiga tanto interna

como externa. Desde então, preparou o ambiente

para promover e abordar atividades culturais con-

temporâneas. Em 1993, a casa reabre como um de-

partamento de cultura que funciona até hoje.

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LUCAS AZEVEDO

Partindo para a apresentação do lugar, no térreo, é possível encontrar uma das funcioná-rias mais antigas da “casa”. Trata-se de Celina Cabrales, coordenadora do espaço Usina do Papel. O espaço, inaugurado em 1992, tem como missão ser referência para a cidade no âmbito da reciclagem de papel. Ali são elabo-rados projetos sociais, de patrimônio histórico e visitas guiadas. A Usina do Papel atua junto à Fundação de Atendimento Sócio-Educati-vo (Fase) e ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). Cabrales explica que são oferecidos cursos de formação de multiplicadores. “O que significa isso: são pessoas ou instituições que querem montar algum projeto nesta linha e, consequentemente, aprender a utilizar o papel de uma maneira menos erronea”, esclarece.

A Usina do Papel tem equipamentos co-mo prensas hidráulicas, varais, liquidificador industrial, baldes e bacias, que estão sob os cuidados da Secretaria Municipal da Cultura (SMC), uma das mantenedoras da Usina do Gasômetro. O resultado da reciclagem são trabalhos que muitas vezes têm como tema

ilustrar fatos contemporâneos.Além da Usina do Papel, no térreo estão a

Galeria Iberê Camargo e o Memorial da Usina. Isso sem contar a recepção e a Galeria dos Ar-cos, que é dedicada exclusivamente para mos-tras fotográficas.

Visitada por muitos e adorada por todos, o centro é local de encontro entre as pessoas, de diversas idades, raças, escolaridades e ci-dades. A operadora de caixa, Ariane Aretusa Medina Maciel, gosta tanto do local que diz se sentir em casa: “Adoro o Gasômetro, pois é um centro cultural diversificado. Frequento semanalmente a Usina, e é um maior barato. Aqui, me sinto em casa”, conta. Para a funcio-nária Celina, a diversidade da Usina é o fator que mais atrai o público: “Aqui na Usina tem bastante espaço para as pessoas participa-rem. Têm atividades, é muito aberta, voltada à inclusão social. Aqui é um centro cultural que tem muita coisa para mostrar para quem está passando”.

Segundo andar

Logo acima, no segundo andar, está loca-

lizado o Bar Usina Café. É um espaço bem de-corado, com boa climatização, dedicados para aqueles que adoram fazer um bom happy-hour e, é claro, namorar. No local, são servidos lan-ches e bebidas, com valor bem convidativo.

Pode-se dizer, também, que a Usina gos-ta de fazer homenagens. É o caso da sala Elis Regina. Com 745 metros quadrados, a sala

Usina do bemFotos: Lucas A

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Bar Usina Café: local é ideal para quem quer fazer um bom happy hour

Sala de cinema, espaço para eventos, feiras e exposições, terraço com vistapara o Guaíba. Você deve estar se perguntando: “Que lugar é esse”?Este é o Centro Cultural Usina do Gasômetro, um dos pontos culturaisde Porto Alegre. Inaugurada no final da década de 1920, a Usina do Gasômetro,como é conhecida, está situada no coração de Porto Alegre, mais precisamente,na avenida João Goulart, 551. O local é administrado pela prefeiturade Porto Alegre e tem seis andares disponíveis para a cultura. L

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faz menção a uma das maiores cantoras do estado e, por que não, do país. Políticos tam-bém entraram no rol dos celebrados. Julieta Battistioli, primeira vereadora de Porto Alegre, também “ganhou” uma sala, em referência ao seu nome. Com capacidade para 250 pessoas, o espaço é o palco de eventos, seminários e conferências.

Terceiro andar

No terceiro andar, seguindo a linha das ho-menagens, está a sala de cinema P.F Gastal, que leva o nome de um importante crítico de cinema, editor do caderno de cultura do Correio do Povo nos tempos de supremacia do jornal e jornalista. Segundo o programador da sala, Marcus Mello, Paulo Fontoura Gastal foi muito importante para o cinema Sul-Rio-grandense: “Foi ele (P.F Gastal) quem criou o festival de cinema de Gramado, por exemplo. Ele criou também o clube de cinema de Porto Alegre, então, por isso que a sala tem o nome dele, em uma homenagem ao trabalho que ele fez pelo cinema aqui no Rio Grande do Sul”, comenta.

A respeito da programação, ele define co-mo perfil cultural, pois é uma sala diferente das existentes em shopping center. Ou seja, o lucro não está em primeiro lugar. Em razão desse perfil, são exibidos no local filmes alter-nativos, brasileiros e estrangeiros. Ele afirma, no entanto, que o público para esse tipo de programação tem sido cada vez menor. A sa-la completou 10 anos de atividade em 25 de maio deste ano.

Mello considera que o decréscimo no nú-

mero de visitantes à sala se deve à migração do cinema para os shoppings: “As salas de perfis semelhantes do centro da cidade, como o cine bancários, a da Casa de Cultura Mário Quinta-na e o Cine Santander, têm sentido uma dimi-nuição de público nos últimos anos em razão disso”. Com valores bem atrativos, há semanas em que são liberadas sessões para o público. De acordo com o programador, o público fiel da sala P.F Gastal é de estudantes e de pessoas interessadas nesse tipo de cinema.

Outros andares

O quarto andar está reservado a uma das melhores vistas da cidade. Com uma área de 403 metros quadrados, possui um terraço ex-tenso, de onde é possível enxergar boa parte do Guaíba e também o centro da cidade. O au-xiliar de fiscal, Maurício Müller Rodrigues, relata que é fã da arte e considera que o terraço é um lugar relaxante: “Acho bem legal aqui. Talvez um dos fatores que me faz vir aqui constan-temente seja esse. Olha só, tem vista melhor que essa? É um local onde também podemos relaxar, sem esquecer, é claro, do que tem lá dentro”, descreve.

O quinto andar conta com a Galeria Lu-nara. Inaugurada em 26 de junho de 2001, a sala homenageia um dos primeiros homens a implantar a fotografia no local. Trata-se de Lu-ís Nascimento Ramos. Há disponível também uma sala para ensaios e dois espaços multiuso, com capacidade para 40 lugares.

A parte administrativa, incluindo salas de direção, o Núcleo de Serviços Gerais e as co-ordenações, compõem o sexto andar.

Chaminé

Construída em 1937, a famosa chaminé te-ve como principal tarefa absorver e “direcionar” as nuvens de fuligem provocadas em razão da queima do carvão. Ela foi criada em decorrên-cia das reclamações dos moradores.

Usina do Gasômetro: o porquê deste nome

Volta do gasômetro: ai está a síntese do nome Usina do Gasômetro. Partindo para uma explicação mais abrangente, a Usina recebeu esta nomeação pois o prédio onde hoje está ubiquado o complexo, foi erguido na chamada Praia do Arsenal, nas proximidades da rua Pan-taleão Telles – atual Washington Luiz -, e como havia uma outra edificação existente desde 1874, a então Usina de Gás, o Gasômetro, a história explica que, o perímetro entre as ruas Pantaleão e General Salustiano era chamado de “volta do gasômetro”.

Por isso que aquela que todos conhecem hoje como Usina do Gasômetro acabou rece-bendo esta denominação.

Fonte: Site da Secretaria Municipal da Cultura

História Sendo uma das primeiras edifi cações em con-

creto armado do Rio Grande do Sul, no ano de 1928,

surgia a Usina do Gasômetro. Com o projeto originá-

rio vindo da Inglaterra, assim como todas as máqui-

nas e materiais, o dia 11 de novembro daquele ano

entrou para a história da cidade de Porto Alegre.

Com 81 anos de existência completados em 2009,

sua importância histórica é inegável.

Projetada para fornecer energia elétrica à base

de carvão mineral para a capital dos gaúchos, ela

guarneceu e vigorizou Porto Alegre de 1928 a 1974,

quando então foi desativada. Com a desativação do

prédio, a ideia inicial era de demolição do edifício,

pois havia um projeto que visava a construção de

uma avenida no local, mas uma mobilização da so-

ciedade impediu tal ato.

Por fi m, em 1989, a prefeitura indicou o prédio

como espaço cultural do trabalho e, a partir de 1991,

seus 18 mil metros quadrados de área total foram

abertos à população.

Boa parte do Guaíba pode ser observado no terraço existente na Usina do Gasômetro

Funciona de terças-feiras a domingos. Tem três ses-

sões diárias: 15h, 17h e 19h. Valores dos ingressos:

R$ 6, R$ 3 meia entrada. Capacidade: 118 lugares.

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Sala PF Gastal

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VivaPorto Alegre,viva o Centro

NICOLE DORNELES OLIVEIRA

O gerente do programa Cidade Integrada e coordenador do Projeto, Glênio Bohrer explica que “esse é um processo que acontece em me-nor ou maior grau em quase todas as cidades, principalmente as latino-americanas”. Segundo ele, o objetivo do Programa é ter obras de me-lhoria, atrair a população, ter maior qualidade e fazer com que esse espaço histórico tenha uma condição adequada, porque é um cartão de visita da cidade em geral.

Investimentos

O Projeto preocupa-se com espaços aber-tos e de patrimônio, dedica-se à recuperação de espaços públicos e praças, reurbanização de ruas e programas culturais. Segundo o coorde-nador, a Praça Conde de Porto Alegre e a Praça Revolução Farroupilha já foram recuperadas. O Largo Edgar Koetz, próximo da Rodoviária, foi todo cercado e a vegetação foi tratada. Obras já foram iniciadas na Praça da Alfândega, da Matriz e Praça XV.

Bohrer avalia que a obra do Centro Popular de Compras (camelódromo) é um dos principais resultados do projeto até o momento. “Resolveu uma questão histórica no local, além de desobs-truir as vias, deu um clima muito favorável para

os próprios comerciantes na parte econômica de reinvestirem na área central”, comenta. Outra reforma prevista é a do Cine Imperial, que será transformado num centro cultural, com investi-mentos de R$ 20 milhões da Caixa Federal.

Parcerias

O Viva o Centro conta com a parceria de empresas privadas (RBS, Trensurb e Aracruz, são exemplos), de quase todas as secretarias, de departamentos do município e do governo federal. O Viva o Centro possui um site próprio (www.portoalegre.rs.gov.br/vivaocentro) para divulgação de seus eventos. Lá, pode-se encon-trar toda a programação cultural, acesso a links de casas culturais e museus, toda a história de praças e ruas do Centro, fotografias, andamento de obras, entre outros. “Para a divulgação do projeto, a SPM tem a participação dos meios de comunicação como os jornais e a televisão, que tem anunciado os eventos mais importan-tes da ação”, afirma o coordenador. Há ainda a divulgação feita pelos canais da Prefeitura.

Conhecer o centro

As ações do Projeto estendem-se também ao setor cultural. “Têm as caminhadas do Viva o Centro a Pé, o Caminho dos Antiquários e o

Ponte de Pedra foi a primeira parada

Entrada para o Pão dos Pobres

Caminhada até a Ponte de Pedra

Travessa dos Venezianos

Rua Lopo Gonçalves

Porto Alegre é uma das maiores cidades do Brasil, conta com uma população de 1,42 milhões de habitantes (IBGE-2007) e assim como outras grandes cidades da América Latina, a área central tem sofrido um processo de decadência por ser antigo e concorrer com outros pólos de atração. Mesmo que hajam ataques constantes e mazelas, o centro precisa de uma boa estruturação e qualificação para que possa representar a cidade. Projetos como o Viva o Centro nascem com a intenção de dar uma cara nova ao bairro. Criado em 2005, no atual governo municipal, a proposta é uma ação gerenciada pela Secretaria do Planejamento Municipal (SPM) e objetiva a reabilitação do centro histórico do município.

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Fotos: Nicole Dorneles Oliveira

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Caminho do Livro”, comenta Liane Klain, coorde-nadora do Projeto Viva o Centro a Pé. Esse projeto surge justamente para atrair público e está sendo gerenciado pelas Secretarias de Planejamento (SPM) e de Cultura (SCM). Até o final deste ano, a Secretaria de Turismo (STM) fará parte deste projeto. O Gabinete da Primeira Dama do Muni-cípio e a Companhia Carris Porto-Alegrense de transporte público também apoiam a ideia.

O Viva o Centro a Pé foi criado no final de 2006. As primeiras caminhadas foram feitas por um guia de turismo e aconteciam uma vez por mês. “Como a demanda era muito grande nós começamos a fazer duas vezes por mês”, expli-ca a coordenadora. Hoje em dia, as caminhadas são orientadas por professores universitários, estudiosos em história, arquitetura e artes. En-tre eles, estão Luís Augusto Fischer, Cláudio Calovi Pereira e Charles Monteiro.

Os itinerários variam de acordo com o pro-fessor que irá guiá-lo. A caminhada feita por Luiz Merino de Xavier, em agosto de 2009, por exemplo, iniciou pelo Caminho dos Antiquá-rios, passou pelas ruas Fernando Machado e Duque de Caxias, depois visitou a Pinacoteca Ruben Berta e finalizou no Arquivo Público do Estado do RS. Conforme explica Liane, existem roteiros mais procurados. Dentre eles, está a antiga fábrica da Brahma. “Nós fomos uma úni-ca vez. O shopping Total nos ofereceu para entrar nos túneis da antiga Cervejaria, eram cerca de 300 pessoas participando”, lembra. Caminhadas que incluem algo diferente, como cemitérios ou roteiros feitos à noite, também chamam bastante a atenção de público. “As que saem um pouco do padrão são as que as pessoas procuram”, completa.

Para participar, o público deve se inscrever através do e-mail [email protected]. Cada participante deve fazer a doação de um quilo de alimento não perecível. Essas doações são destinadas a creches, asilos ou à Fundação de Assistência Social e Cidadania (FASC). “A gente tem um cronograma e vai seguindo-o de acordo com a necessidade das instituições”, esclarece Liane.

As caminhadas acontecem de março a novembro, com uma média de 100 pessoas, duração de aproximadamente duas horas e são indicadas para todas as pessoas. “Crianças que acompanham os pais, adoram. Há pessoas idosas, adolescentes, alunos de faculdades de arquitetura, é bem variado o público”, conta a coordenadora.

Referência

O Projeto é bem visto pela imprensa. Liane Klain comenta que seguidamente há publi-cações em jornais e televisões sobre as cami-

nhadas. “O Jornal do Almoço da RBS já acom-panhou uma caminhada inteira; o Rota 36 da TVCom já participou de mais de uma; a Zero Hora publicou páginas e páginas de matéria. Eu tenho um book com todas as publicações que saíram na mídia”. Foi através da Zero Hora que Liane ficou sabendo que o Projeto Viva o Centro a Pé está sendo copiado em Salvador e no Rio de Janeiro.

Na cidade catarinense de Blumenau, o pro-jeto é visto como atividade extracurricular na Universidade Regional. O professor universitá-rio, João Francisco Noll, organizou um grupo de 33 estudantes de arquitetura para vir a Porto Alegre e conhecer especialmente a ação das caminhadas. “Em Blumenau, ações como essa não existem, apenas são feitas por ônibus, o que interessa e atrai muito pouco. Caminhadas são muito mais atraentes”.

A professora aposentada, Cristina Cristo-foline, 61 anos, moradora de Florianópolis, de tempo em tempo vem à capital porto-alegren-se para visitar a filha e, juntas, acompanham as caminhadas. Cristina já participou três vezes, incluindo a caminhada noturna: “É uma mara-vilha! Floripa deveria ter essas ações também, existe estrutura pra isso lá”.

Resultadosdos projetos

“Projetos como o Viva o Centro levam anos para apresentar efeitos contundentes. É um processo quase que permanente”, avalia Glênio Bohrer. O coordenador complementa ainda que “hoje já se tem uma visão diferente da que se tinha seis ou sete anos atrás, quando as pessoas só tinham opiniões negativas do centro da cidade”. Ele exemplifica que o patri-mônio do Centro já está praticamente todo tombado e que o Porto tem estrutura nun-ca tida antes. “Com o final das obras na Praça XV, Praça da Matriz e Praça da Alfândega, os principais espaços públicos do bairro estarão recuperados”, finaliza Bohrer. O Viva o Centro

a Pé, supera as expectativas da coordenadora, que não pretende acabar com o projeto tão cedo: “Enquanto eu estiver aqui na Prefeitura, o projeto vai continuar e, quando eu sair, espero que a própria população queira dar continui-dade as caminhadas”.

Conheça um dos

roteiros do Viva

o Centro a PéOrientador: Paulo Cesa

Roteiro: Cidade Baixa

Saída - Totem do Caminho dos Antiquá-rios: situado na Praça Daltro Filho, entre as ruas De-

métrio Ribeiro, Coronel Genuíno e Marechal Floriano,

o coração do Centro Histórico de Porto Alegre.

Ponte de Pedra: situada no local denomina-

do Largo dos Açorianos, foi criada em 1825. Antiga-

mente cruzava o Arroio Dilúvio e era a única ligação

entre as chácaras do sul e o centro da cidade.

Instituto Pão dos Pobres: fundado em 1895

pelo Cônego José Marcelino de Souza Bitencourt,

após a guerra do Paraguai e a Revolução Federalista.

Em 1916, o Pão dos Pobres foi assumido pelo Insti-

tuto dos Irmãos das Escolas Cristãs (Lassalistas).

Rua Vereador Dilamar Machado: antigo

leito do Arroio Dilúvio.

Museu de Porto Alegre Joaquim José Feli-zardo: antigo Solar Lopo Gonçalves. Prédio histórico,

construído entre 1845 e 1855, numa chácara com fun-

dos à Rua da Margem (atual João Alfredo), para servir

como residência da família de Lopo Gonçalves Bastos.

Rua Lopo Gonçalves: apresenta um conjunto

de casas iguais, pequenas e bastante coloridas.

Travessa dos Venezianos: chama atenção

por conter uma série de 17 casas populares tomba-

das pelo município.

Rua General Lima e Silva e visitação a Ola-ria: a caminhada termina com a visitação a Olaria,

considerada pelo orientador “uma estrutura atuali-

zada e que não deve ser deixada de visitar”.

A Caminhada ‘Viva o Centro a Pé’ inicia no Totem do Caminho dos Antiquários

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Tesouros da RiachueloSaiba por que uma das MAIS ANTIGAS RUAS dePorto Alegre ficou CONHECIDA como a ‘RUA DO LIVRO’

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Ao longo de décadas, uma das mais tra-dicionais ruas da capital vem se consolidando como uma verdadeira referência para quem quer encontrar livros, principalmente por causa do trecho entre a avenida Borges de Medeiros e a rua General Câmara. Para começar, é lá que está a Biblioteca Pública do Estado que, atu-almente em reformas, teve seu atendimento transferido para a Casa de Cultura Mário Quin-tana. Mas, uma coisa é certa: são as livrarias que estabeleceram a identidade de um dos mais antigos logradouros da cidade.

“A Riachuelo era chamada, principalmente nas décadas de 80 e 90, como a rua do livro, pois nessa época todas as livrarias se loca-lizavam basicamente nesta rua”, comenta o vendedor José Mayer, que trabalha na Livra-ria e Editora Vozes, há 43 anos instalada na Riachuelo.

A fama de “rua do livro” ultrapassa as fron-teiras de Porto Alegre. “A Riachuelo na verdade é uma referência não só em Porto Alegre, mas na região metropolitana. Eu mesmo lembro que, quando tinha loja em Gravataí e não tinha o livro procurado pelas pessoas, elas diziam: então eu vou à Riachuelo e busco”, conta Regis Dias, proprietário, junto com mais dois sócios, da Livraria Solaris, que vende não só livros no-vos, mas também livros usados. Aliás, esse é o tipo de livraria mais característico da Riachuelo, os popularmente chamados ‘sebos’.

Um lugar para sefazer descobertas

Sebo, de acordo com o livro “Guia dos sebos do Brasil”, de Jorge Brito, tornou-se a forma vulgarizada de designar a livraria onde se vendem livros usados e raros. A explicação mais aceita para a origem da palavra diz que durante o tempo em que ainda não havia luz elétrica, costumava-se ler à luz de velas, feitas de sebo e, no decorrer da leitura, a vela derretia e engordurava os livros. Consequentemente,

as livrarias ganharam esse nome por vender livros ensebados, usados.

Na variedade dos sebos é possível encon-trar de tudo. Desde aquele livro tão difícil de adquirir na prateleira da loja de shopping, de-vido ao preço, até aquele livro que já não se encontram reedições. Nos sebos, o livro usado com o mesmo título de um novo custa meta-de do valor, às vezes pode custar até menos. Entre os livros esgotados, as relíquias ou cha-mados livros raros podem ultrapassar a casa dos três dígitos.

Além de contribuir para a democratização do acesso ao livro, os sebos acabam desenvol-vendo uma importante função de preserva-ção. Ninguém imagina como aquele livro na estante do sebo lá chegou. O novo dono não sabe o caminho percorrido pelo livro compra-do. Muitos chegam em péssimo estado, o que leva as livrarias a realizar um trabalho de restau-ração nas obras. “Muito material que poderia estar descartado ou queimado - por incrível que pareça ainda têm pessoas que queimam livros - ou até em recicladoras de papel, estão aqui. Poderiam estar lá, mas eles estão aqui e continuam sendo preservados”, salienta o livreiro Regis Dias.

Seja concentrando economia, variedade e preservação, os sebos ainda têm em comum a paixão de seus donos pelos livros. Dias, por exemplo, conta que sempre foi um consu-midor apaixonado por livros, desde a época em que morava em Curitiba e era bancário. Historiador de formação, ele buscava muitas vezes obras da década de 30 ou 40. Pois é, já se sabe onde ele foi encontrá-las. De tan-to frequentar os sebos, resolveu mudar de profissão após ouvir uma sugestão do pró-prio dono da livraria que frequentava: “Com o que tu já comprastes de mim tu abres um sebo tranquilamente”. Após voltar para o Rio Grande do Sul, abriu um sebo em Gravataí. Atualmente, ele é um dos três proprietários da Livraria Solaris.

ADRIANO DOS SANTOS

Com certeza você já deve ter passado por ela. Se não, já deveter ouvido falar. Essa é uma via com muita história para contar. Mas, acima de tudo, é uma rua que tem expressão própria e características específicas, atribuídas tanto pelas variadasmarcas que a sociedade lhe impõe, quanto por seus espaços e atividades típicas. Uma rua de livros, um tesouro localizadono centro de Porto Alegre. Assim é a Riachuelo. Ela pode até abrigar restaurantes, lanchonetes, supermercados,enfim, diversos segmentos comerciais, mas toda vez que precisade livro, o porto-alegrense já sabe a resposta: vai na Riachuelo!É lá que ele poderá ter acesso a mais de 600 mil obras,à disposição em bibliotecas, editoras e livrarias.

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Fotos: Adriano dos Santos

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Relíquias

“De 1929 a 1934”

“É um Getúlio Vargas autografado, é um livro sobre

discursos do Getúlio Vargas autografado pelo pró-

prio. Esse que está aqui conosco veio inclusive de

outro país, ele veio do Uruguai”, conta Regis Dias,

proprietário da Livraria Solaris.

“Nobiliário Sul Riograndense”. O livro de Mário Teixeira de Carvalho é de 1937 e,

segundo Guilherme Matzenbacher, proprietário da

Livraria Mosaico, “só existem atualmente três

exemplares à venda no Brasil”.

“Recebo inclusive pessoas com 50 ou 60 anos que estão

aprendendo a ler e que se apaixonam pela leitura. Às

vezes, sequer têm condições econômicas favoráveis, mas compram no saldo um livro baratinho porque gostam”

Regis Dias, livreiro

Garimpando tesouros

Entre as peculiaridades da Riachuelo, Dias aponta a diversidade do público consumidor. “Quando comecei a trabalhar com livrarias, há seis anos, eu pensava que atenderia dois pú-blicos: o jovem procurando livro pra escola e o idoso que tem tempo. Hoje posso dizer que eu me enganei, pois atendo leitores de todas as idades, todos os perfis econômicos e sociais e de todos os níveis de instrução”, declara o livreiro, que ainda diz: “Recebo pessoas com 50 ou 60 anos que estão aprendendo a ler e que se apaixonam pela leitura. Às vezes, se-quer têm condições econômicas favoráveis, mas compram no saldo um livro baratinho porque gostam”.

A diversidade de público também é apon-tada por Ivo Alberto Almansa, proprietário do sebo mais antigo da rua, a Martins Livreiro. “Te-mos uma clientela que vai desde um engraxate ou um colecionador de gibi até desembarga-dores, juízes, pesquisadores, artistas do centro do país que vêm procurar livros, enfim, de todas as áreas”, comenta. A livraria, que tem 55 anos e um acervo estimado em 70 mil livros, está na Riachuelo desde 1965. Proprietário desde 1982, Almansa conta como começou sua história como livreiro: “Trabalhava com engenharia e

devido a um recesso na época eu comprei do meu sogro a livraria e estou até hoje”. Do antigo dono, o fundador, a livraria permanece com o nome, ‘Martins’, o sobrenome da família.

É nesta livraria que o aposentado Flávio Figueiró, de 62 anos, vasculha em busca de história do Rio Grande do Sul e do Brasil, obras que coleciona. O ex-bancário mora em Santo Ângelo e, sempre que vem a Porto Alegre, dá uma passadinha nos sebos da Riachuelo para garimpar. “Não bebo. Não fumo. Então eu vivo muito na leitura”, afirma o aposentado que tem cerca de 4,8 mil livros. “O que me interessa é a história dos livros”, acrescenta.

Mas nem só de livros vive uma rua de livro. É o que exemplifica a metroviária Ana Teixeira, 51 anos, que gosta muito de artesanato, razão pela qual começou a frequentar os sebos da Riachuelo, há dois anos. É lá que Ana, cuja es-pecialidade é o tricô, senta e passa horas procu-rando seu tesouro, revistas de artesanato anti-gas. “Eu venho sempre para procurar revistas de artesanato antigas pois são bem melhores que as atuais, elas têm trabalhos mais elaborados. Hoje o artesanato está ficando muito simples, por isso eu venho garimpar aqui”, conta. Na coleção de Ana existem cerca de 80 revistas, quase todas de artesanato. Sentada em um banquinho em frente às estantes do sebo, ela

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conta que uma das razões de frequentar as livrarias da Riachuelo é a própria concentração delas: “Quanto mais próximas são as livrarias umas das outras, é melhor para o consumidor pois ele não precisa se deslocar tanto”.

Pólo cultural

Mas o que poderia explicar a concentração de livrarias na Riachuelo? Morador há mais de 40 anos da rua do livro, o professor aposen-tado, Gervásio Rodrigo Neves, presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul (IHGRS), localizado na Riachuelo, afirma que a relação da rua com os livros vai muito além das livrarias.

“Eu diria que a responsável pelo fato de nesse trecho da Riachuelo se concentrarem tantas livrarias foi a presença da Biblioteca Pú-blica, que no passado tinha uma função social muito superior à atual. No passado, a Biblioteca Pública funcionava à noite, aos sábados, manhã e tarde e também aos domingos pela manhã. Dava uma oportunidade maior à população para utilizar a biblioteca”, recorda.

Neves salienta que não é só uma rua que tem muitas livrarias, mas tem muitos livros e diferentes formas de organizá-los. Para ele, em primeiro lugar, a Riachuelo é uma rua riquíssi-ma em bibliotecas: “Existe hoje ou em determi-

nado momento esteve aqui na Riachuelo, a Bi-blioteca do Instituto Cultural Norte Americano, a Biblioteca do Tribunal do Estado (desde 1998 passou a se localizar na Borges de Medeiros) e a Biblioteca do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul”.

O professor menciona ainda as bibliotecas

particulares que, embora não estejam à dispo-sição do público, revelam como a cultura do livro já está enraizada na Riachuelo: “Eu olho de vez em quando pela minha janela e vejo uma porção de vizinhos que têm bonitas bibliote-cas particulares. Eu diria que essa rua deve ter uma densidade impressionante de bibliotecas”. Para ele, “isso é algo que no mundo moderno não existe mais, pois os apartamentos são tão apertados que não existe mais espaço para as bibliotecas”. O que destaca, segundo ele, as características de pólo cultural da Riachuelo.

“É raríssimo encontrar uma área da cidade tão especializada em livros como esse trecho da Riachuelo. Eu não conheço exemplo em que seja possível encontrar tal densidade de atividades ligadas ao livro como nesse trecho, que na verdade vai da Borges à General Câ-mara”, completa Neves.

“Eu olho de vez em quando pela minha janela e vejo uma porção de vizinhos

que têm bonitas bibliotecas particulares. Eu diria que essa rua deve ter uma densidade

impressionante de bibliotecas”

Gervásio Rodrigo Neves, morador da

Riachuelo e presidente do

Instituto Histórico e Geográfico

do Rio Grande do Sul (IHGRS)

A metroviária Ana Teixeira garimpa revistas antigas de artesanato, nos sebos da Riachuelo

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O COMÉRCIO de antiguidades ganha maior RECONHECIMENTO em Porto Alegre com feiras CULTURAIS e com o “Caminho dos Antiquários”, grande referência nacional que atrai COLECIONADORES apaixonados por relíquias MATHEUS PANNEBECKER

“Não existe futuro sem a preservação da memória”. Dessa forma, a colecionadora Regi-na Becker expressa a filosofia de que, ao estar no meio de antiguidades, pode-se resgatar o passado. Assim como Regina, várias pessoas colecionam objetos antigos e fazem disso um hobby. É uma parcela da sociedade que acredi-ta que esses objetos são mais do que “coisas”, são peças singulares e que possuem diferen-cial, encontradas em lojas especializadas em objetos antigos, os chamados antiquários. Em Porto Alegre, a grande referência no assunto é o “Caminho dos Antiquários”, um trecho da capital gaúcha onde se concentra o maior número de lojas desse ramo.

De segunda a sábado, o “Caminho dos

Antiquários” atende ao público que procu-ra por antiguidades. É um trecho do centro histórico de Porto Alegre, localizado num triângulo formado pela praça do Capitólio, a praça Marquesa de Sevigné e o viaduto da Borges de Medeiros. A arquitetura é típica do início do século passado e lá se concentram vinte lojas de antiguidades, além de butiques, estacionamentos, cafés e restaurantes que au-mentam a áurea cultural do lugar.

Inspirado em outras feiras espalhadas ao redor do mundo, como a de San Telmo, em Buenos Aires, El Rastro, em Madrid, e Pulgas, em Paris, o “Caminho dos Antiquários” segue o exemplo cultural e realiza uma mistura de antiguidades e artes em geral. O processo de

formação do “Caminho” começou em 1985, com o primeiro antiquário que se estabele-ceu na zona, cujo nome era “O Antiquário ao Belchior” (encerrou suas atividades em 1997). Logo surgiram outras lojas do ramo e assim começou a nascer a zona comercial do “Ca-minho”. Com o reconhecimento cultural que crescia cada vez mais, o local chamou a aten-ção da prefeitura e, finalmente, foi reconheci-da legalmente, no dia 26 de agosto de 2006, quando o prefeito José Fogaça sancionou a lei número 9.943, que oficializou o “Caminho dos Antiquários”.

O “Caminho dos Antiquários”, além de estar sempre em atividade durante a semana, realiza uma feira de antiguidades nos fins-de-sema-

Porto Alegre e as relíquias da vida

Fotos: Matheus Pannebecker

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na. Todos os sábados, das 10h até às 16h, os lojistas colocam nas ruas e nas calçadas seus objetos antigos para venda. Mais do que isso, ainda encontram-se nesse pequeno evento cultural alguns artesãos e artistas plásticos ex-pondo suas habilidades. Outro destaque é o passeio gratuito pelo Centro Histórico de Porto Alegre, orientado por um professor de História ou Arquitetura. Ocorre sempre no segundo e no último sábado de cada mês, de março a novembro, com ponto de encontro no totem do “Caminho dos Antiquários”.

Colecionar épraticar a paixão

Regina Becker, porto-alegrense, 51 anos, diz que a paixão por antiguidades começou a surgir logo na infância, quando arrumava e restaurava o que havia no lar de seus avós. “Desde muito nova sempre me senti atraí-da por coisas que tinham uma história de vida, que passaram por gerações, como se elas tivessem também uma alma e algo para contar”, lembra a colecionadora. Dona de um acervo de copos coloridos, móveis, quadros, utensílios de cozinha e objetos em forma de gatos, ela transmite empolgação toda vez que fala no assunto. Comenta, também, que basta uma peça tocar forte em sua emoção, que uma relação entre ela e o objeto já se estabelece. Para ela, a interação entre com-prador e objeto é muito mais do que uma mera prática comercial.

O vendedor Paulo Nippel, do “Mercado Negro Antiquários”, concorda com Regina, ao caracterizar o público de antiguidades como interessado por cultura e que procura qualidade. Nippel, que está no ramo há vinte anos, classifica Porto Alegre como uma cida-de muito rica na diversidade de antiquários: “Porto Alegre é um núcleo significativo no Brasil. Temos um número considerável de anti-quários. Inclusive, o Caminho dos Antiquários, que é um grupo muito unido e já reconhecido nacionalmente”.

Daniel Andrade, outro vendedor e entu-siasta da profissão, comenta que, além de a capital gaúcha ser uma referência nacional, ainda possui um público interessado, que está sempre investigando peças novas. Para An-drade, nos dias de hoje, não existe época para se vender antiguidades e os compradores es-tão sempre à procura. “Antes, no inverno, era quando aconteciam as melhores vendas. Mas, hoje em dia, está diferente, não tem época definida. Nós conseguimos ver isso pela Re-denção, por exemplo. Mesmo sendo feriado ou chovendo, sempre tem gente comprando”, comenta o vendedor. O Brique da Redenção,

inclusive, foi o catalisador da paixão de Andra-de por antiguidades. Ele conta que, quando residia em Florianópolis, costumava vir a Porto Alegre e comprar objetos na Redenção, até que percebeu que poderia ganhar dinheiro com essa prática.

O comércio deantiguidades

Vários vendedores indicam que a maioria das peças presentes em suas respectivas lojas é comprada de particulares, ou seja, pessoas que procuram as lojas para venderem seus objetos. Para Daniel Andrade, o público ain-da é a maior fonte para se conseguir anti-guidades. Ele comenta que é procurado por diversos públicos, desde pessoas que estão vendendo objetos para arrecadar dinheiro até aos que querem se livrar de objetos de algum falecido. Nippel diz que, no início, os antiquários dependiam muito do marketing, do “boca-a-boca” e, também, de anúncios. Ho-je, ele indica que essas ferramentas não são mais tão necessárias, uma vez que as pessoas sabem onde procurar e conhecem as fontes de confiança. Paulo Nippel afirma que, com o advento da internet, o ramo de antiguida-des se aperfeiçoou: “Agora estamos fazendo anúncios para internet. Nós temos um site bem visitado, fazemos bastante vendas pelo site. As pessoas compram muito pela internet”. O “Caminho dos Antiquários” também já se estendeu para o mundo virtual, possuindo, até mesmo, uma comunidade no Orkut.

Compradores estão sempre percorrendo feiras e lojas em busca de novidades. O cole-cionador Fábio Silveira Lucas diz que é uma busca interminável e que, até mesmo quando viaja, sempre vai a lugares que tenham lojas do ramo. Lucas é dono de várias coleções, en-tre elas, sete vitrines com vidros e porcelanas. Para ele, todo bom colecionador está sem-pre procurando e comprando. “Colecionar é e sempre será um bom investimento. Todo bom colecionador está sempre procurando e sempre comprando”, comenta Lucas.

A mesma opinião é compartilhada por Arthur Firpo Bevilaqua, colecionador de peças antigas e tradicionalistas, entre elas arreios, pilchas e pratarias. “Não existe época para es-se comércio. O necessário é ter uma reserva financeira destinada para isso e esperar apa-recer. Em muitas vezes, nós procuramos por algo e não conseguimos achar. Daí, quando menos se espera, aparece”, aconselha Bevila-qua, que é admirador da beleza dos detalhes das antiguidades.

As antiguidades, portanto, ganham novo significado quando analisadas dentro desse mundo que é pouco conhecido pela socieda-de. Compradores e vendedores passam para os leigos uma nova visão: a de que comprar antiguidades é comprar arte. Elas não são objetos mofados ou meramente parte do passado, são dignas de apreciação e de re-conhecimento. O “Caminho dos Antiquários” cumpre o seu papel nessa jornada, ao reco-nhecer a importâncias de objetos de valor pessoal, social e artístico.

O brique da Redenção é ponto de encontro de colecionadores nos fins-de-semana

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PAULA BARCELLOS

Algumas pessoas encontram na cultura uma opção de lazer, outras a encaram como um auxílio no tratamento de alguma doença. Experiências em centros de reabilitação para dependentes químicos de Porto Alegre reve-lam o quanto é benéfica a cultura no auxílio ao tratamento e recuperação dos pacientes. A terapia ocupacional, que faz uso da cultura, tem se mostrado bastante eficaz para a resso-

cialização e cura dos internos.Segundo o interno do Centro de Reabilita-

ção Vita, há 8 meses, Devis Ferreira, “o segredo é manter-se ocupado”. O Vita adota o método da cura através da terapia ocupacional, sem remédios. De acordo com o diretor de discipli-na, Jorge Antônio Castro, eles “não substituem uma droga pela outra”. Toda essa terapia conta com o auxílio e supervisão da assistente social Rosane Schneider. Ela explica que os internos têm acesso à biblioteca, sala de audiovisual,

marcenaria, cabanha, palestras, entre outros. Além disso, o Vita organiza, juntamente com os internos, eventos culturais em datas come-morativas como a Semana Farroupilha, Páscoa, Natal e Carnaval.

Adotando igualmente a terapia ocupacio-nal, a Clínica de Reabilitação Santa Catarina, inaugurada em 1994, atende também ao pú-blico geriátrico e divide os internos por grupos de condições físicas e emocionais, afinidade e grau de dependência. A partir de então, re-alizam as atividades, como explica a geren-te administrativa e professora de educação física, Caroline Leandro de Lima. Os internos têm acesso à palestras culturais, atividades com música, teatro, pintura, artesanato, leitura de textos, jogos, gincanas, questionários e grupos de culinária.

Lima diz que estas atividades são capa-zes de diminuir a agressividade, a ansiedade, a revolta e a indignação dos internos. Cristian Douglas Sicorra Moreira esteve em reabilita-ção por três meses, e hoje trabalha na unidade psiquiátrica como ‘cuidador’. Moreira destaca o grupo de auto-ajuda e conta que as atividades realizadas no centro foram fundamentais para sua ressocialização e reinserção na sociedade, dando a ele “uma vida como qualquer ser hu-mano merece ter”. A gerente conta que pode perceber que, após o início da realização das Seu Hélio, ex-interno do Centro Vita, hoje é responsável pela biblioteca

Fotos: Paula Barcellos

Reabilitação através da cultura

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atividades culturais, houve uma mudança sig-nificativa no comportamento e no humor do internos, além da melhora na relação familiar em dias de visita, criação de novos grupos de amigos e expectativas positivas.

O diretor administrativo e vice-presidente do Centro Vita, Giovani Brasil Silva de Souza, explica que a comunidade, situada ao redor do centro, é carente e, por isso, além de auxiliar na reabilitação dos dependentes químicos com a terapia ocupacional, o Vita disponibiliza cursos de informática e de corte e costura para as pes-soas da comunidade que tenham interesse.“Eu costumo dizer, que além de ajudar a turma da droga, nós ainda tiramos aqueles futuros ladrões da rua”, diz Souza.

O papel da terapia ocupacional

Os centros de reabilitação têm obtido re-sultados satisfatórios através da terapia ocu-pacional e atividades culturais que desenvol-vem. De acordo com Jorge Antônio Castro, o índice de recuperação tem crescido e hoje atinge 70% dos internos. Ele observa que o Vita tem a meta de aumentar esse número e observa que o uso da terapia ocupacio-nal é uma medida inovadora, uma vez que, antes da existência desse recurso, as clínicas

dispunham de tratamento através de medi-cação. Segundo as terapeutas ocupacionais Dani Peruzzolo, coordenadora do curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário Metodista (IPA), e Claudia Scolari, terapeuta da sala de recursos e clínicas do IPA, no Hos-pital Parque Belém, a terapia ocupacional tra-balha com as áreas de desempenho e com habilidades.

De acordo com a coordenadora do curso de Terapia Ocupacional, “no caso de depen-dência química, a Terapia Ocupacional auxilia na criação de uma nova organização de rotina e desenvolvimento de atividades que ajudam na inserção social, no trabalho, na família e na sociedade”. Peruzzolo avalia que as atividades culturais desempenham papel importante no tratamento de dependentes químicos. E jus-tifica que, após o entendimento do ciclo da

doença, as atividades culturais são utilizadas para que os internos possam novamente ser inseridos à sociedade de maneira que tenham a capacidade de criar novos grupos e desenvol-ver atividades de rotina como qualquer um.

“Um grande número de dependentes químicos têm diminuído ou irão diminuir su-as perspectivas sociais e de trabalho. Muitas pessoas usam as substâncias químicas como ‘muletas’ para suportarem os problemas que a vida lhes traz. Seja por posição social, por perspectivas de trabalho ou de estudos”, ana-lisa Scolari. A professora explica que a Terapia Ocupacional possui técnicas que avaliam as áreas de desempenho ocupacional e ajudam os sujeitos a encontrarem ou produzirem re-cursos pessoais para construírem seus próprios caminhos, sem os subterfúgios de produtos químicos.

O que é a terapia ocupacionalO conceito inscrito na Federação Mundial de Terapia Ocupacional diz que se trata de um campo de conhecimen-

to e de intervenção em saúde, educação e na esfera social, reunindo tecnologias orientadas para a emancipação e

autonomia das pessoas que, por razões ligadas a problemática específi ca, físicas, sensoriais, mentais, psicológicas

e/ou sociais, apresentam difi culdade na inserção e participação na vida social.

No processo de reabilitação de dependentes químicos, utiliza-se a abordagem ‘Cognitiva Comportamental’ pa-

ra ajudar na mudança das rotinas e enfrentamento de situações. Os atendimentos aos pacientes podem ser em

grupo ou individual.

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RAFAELA HENRIQUE

No ano de 2005 foi consagrada a presença do Brasil na França, ocasião em que centenas de eventos musicais, literários e culturais foram acionados pelo ministério da cultura para apre-sentar ao público francês a diversidade artística do país tropical. Em 2009 foi a vez da França se fazer presente no Brasil. O Ministério da Cultura Francês promoveu para as principais capitais dos Estados brasileiros diversas manifestações culturais e artísticas. Nas linhas a seguir começa um passeio entre Brasil e França, países que têm muito em comum.

Segundo o escritor e diretor do Memorial do Rio Grande do Sul, Voltaire Shilling, desde o começo Brasil e França se cruzam através da herança herdada pelos portugueses aos bra-

sileiros, tornando a admiração e o amor pelas coisas francesas um verdadeiro fascínio. Para Shilling, a França, cujo único interesse era a extração de pau-brasil em meados de 1500, antes mesmo de o Brasil existir, trouxe em sua bagagem encantamentos que o Brasil desco-brirá mais há frente.

A relação desses dois países se deu des-de as primeiras colonizações, aprofundando-se de um modo mais intenso com a chegada da Missão Artística Francesa, em 1816, particular-mente da elite intelectual, estendendo-se até o século XX, conforme explica Voltaire Shilling.

O escritor e conhecedor da história francesa no Brasil comenta que “a cultura Francesa foi cada vez mais se difundindo no Brasil por todas as áreas, seguindo uma cronologia mesclando história a cultura e de forma indireta, já que os

francese se renderam ao “bom selvagem” en-quanto que os brasileiros quiseram reproduzir os gostos e costumes parisienses”. Para o Francês e Diretor da Aliança Francesa de Porto Alegre, Cristophe Benest, o Brasil é um país de sonho e o “jeitinho brasileiro” encanta e contribui para essa relação positiva entre os dois países.

A influência francesa é vista em boa parte do Brasil, mas a cidade do Rio de Janeiro é sem dúvida um dos principais berços dessa herança, afirma Voltaire. Um exemplo é tão conhecido carnaval carioca. O escritor conta que essa relação deu-se através do talento de um pintor chamado Baptiste Debret, que mu-nido de pincéis, registrou em imagens vivas as mais diversas cenas da vida cotidiana do Brasil colonial, e encantou Dom João VI que gostava de coordenar marchas e os desfiles

França

O Ano da França em Porto Alegre

ABRIL A AGOSTORefl exio - A Imagem Contemporânea

A Exposição reuniu nomes da fotografi a fran-

cesa – como Valérie Jouve, Patrick Tosani, Suzanne

Lafont, Eric Rondepierre e Catherine Rebois, no San-

tander Cultural.

Seminário Malraux - profi ssionais de artes,

economia, cultura, política e arquitetura realizaram

um bate papo sobre a relação do Brasil com a França,

no Santander Cultural.

ABRIL A NOVEMBROCiclo de palestras sobre Pensamento Francês e

Cultura Brasileira, na PUCRS.

MAIO A NOVEMBROO que é a França: Mostra de Cinema Francês, no

Santander Cultural.

JUNHODédale, de Pierre Coulibeuf, fi lme inspirado na

obra do artista Iberê Camargo, foi exibido Fundação

Iberê Camargo.

JULHO A SETEMBROUm Século de Arte na França (1860-1960), no

Museu de Arte do RS.

NOVEMBROBienal do Mercosul - Pavilhão especial com

obras de artistas franceses contemporâneos, no Cais

do Porto.

55° Feira do Livro - seis intelectuais france-

ses, como Michael Maff esoli, marcaram presença.

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Um século deArte na França

no MARGS

Os dois andares do Museu de Arte do Rio Gran-

de do Sul fi caram recheados de arte, com 140 pin-

turas do realismo francês. Trabalhos de ícones da

arte mundial como Courbet, Monet, Van Gogh, De-

gas, Renoir, Cézanne, Balthus, Millet, Dérain, Miró,

Dalí e Manet integraram a exposição Arte na França

1860 -1960: O Realismo.

O francês Eric Corne foi o curador da mostra que

também apresentou trabalhos de artistas brasilei-

ros como Cândido Portinari, Almeida Junior, Iberê

Camargo, Lasar Segall e Guignard, reforçando a ideia

de diálogos entre diferentes autores e valorizando

em especial as aproximações entre franceses e bra-

sileiros que estudaram em Paris.

O evento reuniu 135 mil visitantes da região sul

e de países vizinhos, de todas as classes e faixas etá-

rias, a exemplo do que acontece em museus de ou-

tros países, superando todas as expectativas. Quem

compareceu ao evento, além de encher os olhos com

as obras expostas, colaborou doando alimentos não

perecíveis que somaram no fi nal 70 toneladas para

distribuição.

reais cívicos da época. Segundo Shilling, Dom JoãoVI contratou o pintor para produzir os fi-gurinos desses eventos. “Debret, com sua arte apresentada nos desfiles, e Dom João VI, com o estilo apresentado nos eventos reais, se tor-nam, mais tarde, modelos para as escolas de samba”, registra.

Comemorações para revitalizar a imagem

francesa no Brasil

O francês e diretor da Aliança Francesa de Porto Alegre, Cristophe Benest, diz que a ce-lebração do ano da França no Brasil contribui para modernizar a imagem da França no país. Conforme ele, a imagem que se tem da França no Brasil parou nos anos 70, época de grandes

pensadores como Lacan e Foucault, e de artistas como Edith Piaff. O francês ainda ressalta que a “a França é mais que a Champs Elysées”.

Cristophe Benest mora no Brasil há 3 anos e representa a Aliança, autorizada oficialmente pela Alliance Française de Paris a utilizar sua marca, e que pertence a uma vasta rede que compreende hoje 1135 comitês distribuídos em 138 países nos cinco continentes.

A mostra “Arte na França 1860-1960: O Rea-lismo” que reúne grandes mestres do realismo francês, no Museu de Arte Rio Grande do Sul, marcou as comemorações oficiais do Ano na França no Brasil, em Porto Alegre. Além disso, a 55ª Feira do Livro de Porto Alegre teve como país homenageado a França. O evento contou com nomes de autores franceses, pretendendo ser uma verdadeira Revolução Francesa para

abrir o pensamento dos visitantes que com-parecerem ao vento

Um dos mais esperados eventos foi a vin-da do presidente do Comissariado Francês do Ano da França no Brasil, YvesSaint-Geours, a São Paulo. Ele participou, no dia 2 de outubro, da abertura da Semana Franco-Brasileira das Formações Superiores, sobre as Formações e Profissões do Futuro. O evento contou com a participação de mais de 70 universidades francesas e teve como objetivo fortalecer a cooperação acadêmica entre França e Brasil. Além de São Paulo, o evento passou pelo Rio de Janeiro e por Belo Horizonte.

O Ano da França no Brasil encerrou em 15 de novembro e a reta final foi recheada de shows de música, espetáculos de dança e exposições.

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Fotos: Divulgação

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RAFAEL SOUZA

A cordialidade é uma característica do brasi-leiro que tem prós e contras, conforme analisam conhecedores do assunto. Na visão do professor do Centro Universitário Metodista IPA e mestre em Sociologia, João Paulo Aço, 46 anos, “isso vem da própria formação sócio-cultural brasi-leira”. Aço diz que se criou no Brasil uma socie-dade patriarcal estável, sob o ponto de vista da unidade familiar e patrimonial. “Essa sociedade foi capaz de se mostrar transigente sob o ponto de vista das relações entre raças”, avalia.

O estudante de Ciências Sociais do 6° semestre da UFRGS, Eduardo Vieira Mattos, comenta que a cordialidade brasileira ficou famosa devido aos estudos feitos pelo his-toriador Sérgio Buarque de Holanda, no livro ‘Raízes do Brasil’. Aço fala que o autor trouxe à baila o termo ‘homem cordial’ que “em linhas gerais, buscava designar a tendência do bra-sileiro de se guiar por princípios familiares e afetivos, mesmo no trato de que deveriam exigir posturas mais impessoais”.

Mattos explica que “a cordialidade referi-da nos estudos feitos sobre a criação do Brasil

não é a gentileza nem a simpatia do brasileiro. Cordialidade vem do latim e quer dizer, eti-mologicamente, ‘do coração’. Então o autor quer dizer que a cordialidade caracteriza o agir impulsivamente, mais com o coração do que com a razão”. O sociólogo Aço observa que “a cordialidade traz à luz dilemas sociais que até agora não foram superados pela so-ciedade brasileira”. E explica: “Se tomarmos o aspecto da afetividade, do sentimentalismo, da hospitalidade e do caráter relacional do povo brasileiro, podemos dizer que esse é um valor muito caro a todos nós”.

Brasil, um povo cordial

O BRASILEIRO é conhecido pela sua CORDIALIDADE, diferentementede OUTROS POVOS que são considerados frios e CALCULISTAS

Fotos: Leandro Monks

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Do ponto de vistada psicologia

O estudante do 6° semestre de Psicologia da PUCRS, Gustavo Garcia Moll, acredita que o brasileiro é assim devido à cultura de maior pro-ximidade com as pessoas, expressa através de “um certo companheirismo”. “O Brasil é um país de grande miscigenação, devido aos diversos grupos de imigrantes, vindos dos mais variados pontos do mundo, cada um com sua própria ba-gagem cultural e costumes próprios. Com o cor-rer do tempo, estes povos tiveram que se adaptar uns aos outros, coexistir e, inevitavelmente, se misturar”, analisa. Para Moll, o Brasil ganha com essa característica. As vantagens, segundo ele, estão na “conquista da simpatia do povo de fora, principalmente, aqueles que são originários de países com culturas mais individualistas e menos coletivistas que a nossa. Ganha esse ‘calor’, essa animação que pode ser encontrada em tantos costumes e brilha principalmente durante o mundialmente conhecido Carnaval”.

André Luiz Moreno da Silva, que está cur-sando o 8° semestre de Psicologia na USP, em Ribeirão Preto, concorda que é uma caracte-rística que contribui para a nação brasileira, pela junção de várias raízes e culturas diferen-tes. “Isso facilita a relação com a diversidade”, explica. Porém, do ponto de vista do futuro psicólogo, ser nação com povos tão diferentes pode atrapalhar devido aos vários pontos de vista, o que gera dificuldades na tomada de decisões, já que o Brasil tem muitos interesses que devem ser conciliados.

Silva considera a relação cultura-popula-ção como dialética e dialógica. “É explícito que existe uma influência no modo de ser do indiví-duo brasileiro causada pela cultura. Porém, esse indivíduo também modifica a cultura em que vive, não sendo apenas refém de atos e costu-mes meramente estabelecidos”, explica.

Comparação comoutros povos

O povo brasileiro é considerado um po-vo muito acolhedor, já o de outros países é visto como frio e de alguma forma não deixa

qualquer pessoa se aproximar. Mattos comenta que esses outros países, além da cultura dife-rente, têm uma “combinação de fenômenos que gera um produto que não é intencional e, por isso, podem acabar não sendo cordiais, dependendo de alguns fatores”. Para o profes-sor de Sociologia, João Aço, “cada sociedade tem suas próprias peculiaridades culturais”. As circunstâncias de formação econômico-social capitalista implicaram mudanças e adaptações muito próprias e peculiares em cada povo. “Sob o aspecto da miscigenação de povos e trocas culturais, o Brasil é a expressão criativa da miscigenação populacional e tem ‘a cara do futuro’, talvez outras nações possam olhar nossa experiência histórica como um modelo de convivência relacional e tolerância entre diversidades de culturas. Entretanto, os aspec-tos de nossa histórica desigualdade social e dissimulação dos conflitos sociais precisam ser superados”, afirma Aço.

Nem sempre é assim...

A cordialidade do brasileiro pode não ser intencional e sim advir da cultura passada de geração em geração, que influenciou os brasileiros. Sem essa intenção, nem todos se consideram cordiais e nem consideram o povo brasileiro um povo acolhedor. Walter Teixeira Depauli, estudante de Direito do 6° semestre da PUCRS, analisa que para ser uma pessoa cordial é necessário autosatisfação, mas com todas as dificuldades que os brasi-leiros enfrentam é impossível ser cordial num ambiente em que prevalece a lei do mais forte e do mais esperto, em que os limites entre os agentes da lei e a bandidagem são tênues. Depauli não se considera uma pessoa cordial. “No transcorrer dos dias tento ser o mais cordial possível, entretanto com a falta de educação das pessoas fica difícil manter essa postura”.

Outra característica do povo brasileiro é o conhecido ‘jeitinho’, um modo de agir

usado para driblar normas e convenções sociais, diferente da cordialidade. Para o pro-

fessor de sociologia do IPA, ‘jeitinho brasileiro’, a ‘malandragem’, aprofunda aspectos da

dualidade entre o mundo da Rua e o mundo da Casa”. O estudante Mattos complemen-

ta falando que o “jeitinho” brasileiro vem justamente das leis que não são cumpridas. O

sociólogo Aço diz que “formalmente aceitamos e criamos leis que dizem que todos são

iguais perante a elas mas, na prática, quando assumimos certas posições de mando,

fazemos juízos de valor baseados em critérios afetivos e às vezes familiares”. “As leis são

fracas porque não são cumpridas”, comenta o estudante. Aço também concorda com a

ideia de que o jeitinho brasileiro é fruto de impunição: “É uma forma criativa de justifi -

carmos nossas pequenas transgressões ou uma forma de nos esquivarmos da respon-

sabilidade por determinado ato que por princípio está errado”.

É próprio do brasileiro manter relações cordiais e de proximidade com o outro

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Jeitinho brasileiro

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A nova Igreja da Conceição EDISON FEIJÓ

Fotos: Edison Feijó

O templo histórico da Igreja Nossa Se-nhora da Conceição, localizado na avenida Independência, é um dos mais antigos da capital e passa por um processo de restau-ração. Edificado em 1880, é uma das poucas igrejas que mantém suas características origi-nais. Segundo o pároco da Igreja, Luiz Inácio, a capela metropolitana, por ser um patrimônio histórico e artístico da capital, “passa por um restauro de grande necessidade, pois é um dos principais pontos turísticos de Porto Alegre e representa toda uma vida e característica de um período da história da comunidade e da expressão de fé”.

O pároco explica que a restauração está ocorrendo porque a Igreja foi tombada co-mo patrimônio histórico pela administração

pública. O páraco ressalta que a restauração vai “manter e preservar o patrimônio artísti-co, arquitetônico, histórico, edificado por ge-rações passadas, e que representa toda uma vida e característica de um período da história da comunidade e da expressão da fé. Por isso a necessidade de manter suas características originais”.

A restauração conta com o apoio do pára-co e de fies. Indira Bauer, 44 anos, que costuma frequentar a Igreja, destaca a importância de obra e reforça que a restauração deve preservar o patrimônio que é ponto turístico de Porto Alegre, por ser uma das capelas mais antigas. O padre Luiz Inácio estimulou a restauração porque acredita que “este é o grande resgate de valores da igreja perante à comunidade,

aos costumes e à história”. Ele ressalta que a restauração é urgente e

visa a impedir a ação nefasta das infiltrações, cupins, riscos de incêndio devido à precarie-dade da rede elétrica. “São ações que podem levar a perda, em breve, de um tão valioso patrimônio histórico”, observa. Segundo o fiel Bruno Cabral, a perda do templo histórico seria lastimável, pois para ele o templo é um refúgio, um local onde a paz impera.

Para fieis que frequentam a igreja, como Bruna Jochims, 52, Bruno Cabral, 57, Gabriela Siqueira, 39, e Indira Bauer, 44, a restauração é de extrema importância, por ser um patri-mônio histórico de Porto Alegre e deve de ser conservado. Também observam que haverá melhorias, dentre estas, que o templo sagrado U

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Restauração para recuperar valores

Segundo o páraco Luiz Inácio, a restauração recupera os seguintes valores:Valor arquitetônico: expressos na modulação das aberturas, janelas e portas; nas paredes ciclópicas do seu

sub-solo e das paredes portantes; na decoração neo-barroca de suas talhas, oratórios e nichos.

Valor evocativo: faz parte da memória visual da cidade de Porto Alegre. Sua construção foi iniciada com a

abertura da Rua da Brigadeira (Conceição) até o Caminho do Meio (Osvaldo Aranha), com a instalação da Praça Dom

Sebastião, com a instalação do Hospital Benefi cência Portuguesa e no seu entorno estavam a Santa Casa e o Hospital

São Francisco da Santa Casa.

Valor ambiental: a Igreja Conceição é parte integrante da paisagem urbana e visual do Centro Histórico de

Porto Alegre, faz conjunto arquitetônico e urbanístico com a Benefi cência Portuguesa, Colégio Rosário (berço da

PUC-RS), Complexo Hospitalar da Santa Casa e Conjunto Histórico da UFRGS.

Valor de acessibilidade e uso: está implantada junto a uma das mais importantes e movimentadas avenidas

de Porto Alegre. É acessada diariamente por muitas pessoas, fi éis e turistas. Os cultos diários têm expressiva a parti-

cipação;

Valor de conservação e sustentabilidade: a Igreja restaurada e conservada tornar-se-á um patrimônio

para Porto Alegre e para o Brasil.

Valor de antiguidade: considera-se a real identifi cação com o passado, haja vista sua edifi cação para a his-

tória e cultura da cidade e do EStado, porque remete às edifi cações do período do Império. É considerada umas das

mais remotas edifi cações religiosas de Porto Alegre e do RS.

As obras de restauração incluem as fachadas e os bens da Igreja Nossa Senhora da Conceição

se tornará mais cômodo para a comunidade da Igreja, fazendo com que a capela cresça. Frequentadores da Igreja, eles afirmam que os transtornos causados pelas obras não atrapa-lham.

O arquiteto Analino Zorzi ,47, responsável pela obra, explica que as principais restaura-ções estão na edificação, iniciando pela co-bertura e revestimentos externos. Diz também que serão restauradas as esquadrias internas e externas e todos os bens integrados, o altar mor, as talhas, os douramentos, as pavimenta-ções. Estão previstas, ainda, as reformulações e instalações das instalações elétricas, termi-nando a restauração com a pintura interna e externa da Igreja. “Os cuidados estão sendo redobrados, tendo em vista o valor dos bens culturais patrimoniais que estão recebendo intervenção. Também com o objetivo de não descaracterizá-los, mas acrescer-lhes valor atra-vés de técnicas de preservação”, comenta. O arquiteto ressalta que a maior preocupação que se tem é com as obras em madeira, mas que em todas as intervenções os cuidados sempre são dobrados.

A previsão de término da obra, segundo o pároco e o arquiteto, é dezembro de 2010. As empresas Gerdau, Oi e Bradesco Seguros, através da Lei de Incentivo à Cultura, estão custeando a obra.

Visando o bem da comunidade, o pároco ressalta aos fieis a importância e os benefí-cios da restauração da Igreja Nossa Senhora da Conceição.

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RENATA MARIMON

Palco de shows de João Gilberto, Caetano Veloso, Cássia Eller, espaço de manifestações políticas, assembleias e palestras de personalidades renomadas como o Nobel de Literatura José Saramago, o Auditório Araújo Vianna faz parte da história de Porto Alegre. Símbolo da efervescência cultural da capital gaúcha, o local encontra-se fechado desde 2005, em clima de total abandono, já virou abrigo para andarilhos e animais que ocupam o espaço cultural.

Para o secretário de Cultura do municí-pio Sergius Gonzaga, o investimento é muito alto para a reforma, algo em torno de R$ 7 a 10 milhões, porém a prefeitura não dispõe desse dinheiro e, se tivesse, dificilmente daria prioridade para a obra. “É um valor muito alto para uma única obra, onde o principal foco é a apresentação de shows. Se dispusesse desse dinheiro, investiria na periferia, em bibliotecas ou em alternativas mais aproveitáveis cultural-mente”, analisa. Entretanto, uma parceria pú-blico-privada vai garantir a reforma, que ainda não tem data para iniciar.

A interdição ocorreu em 2005. Em 2002, a lona que fazia a cobertura do auditório era incapaz de vedar a acústica interna, o som ecoava por todo o bairro Bom Fim e sua es-

trutura já estava abalada. Então, em 2005, a Secretaria de Cultura pediu um laudo técnico para a Secretaria de Obras e Viação (Smov). Segundo laudo técnico da Smov, a cober-tura perdeu sua validade ainda em julho de 2002, apresentava altos riscos de segurança. Por intempéries do tempo, chuva, vento e o desgaste natural, os cabos de aço podiam se romper e causar grave acidente. A prefeitura optou por interditar o Auditório.

A reforma

Em fevereiro de 2007, através de uma par-ceria público-privado, foi aberta uma licitação oferecendo a qualquer empresa três quartos, ou seja, a utilização de 75% das datas anuais do auditório por um período limite de dez anos. A empresa Opus Promoções venceu a licitação em maio de 2007.

O custo da revitalização do Auditório foi orçado inicialmente em R$ 7 milhões. Porém, a Opus percebeu algumas necessidades não previstas no projeto original, como ampliação do palco e instalação de câmeras de vídeo para segurança externa, que elevaram o custo do projeto para mais de R$ 10 milhões.

A construção do Auditório em 1964 foi as-sinada pelos dos arquitetos Moacyr Moojen Marques e Carlos Maximiliano Fayet. “É somen-te eles que estão autorizados a realizar essa obra, como Fayet faleceu no ano passado, o responsável pelas modificações está a cargo do arquiteto Moacyr Moojen Marques”, explicou o próprio arquiteto. De acordo com Moojen,

dentre as mudanças está a nova cobertura. Ao invés de uma lona provisória, haverá uma definitiva, construída com material rijo e per-manente. O auditório terá portões que permi-tem o fechamento em toda a periferia, o que conterá as emissões sonoras de seu interior. Terá climatização artificial, novas poltronas, piso acarpetado, dentre outras melhorias.

O secretário Sérgius Gonzaga esclarece que uma das maiores preocupações está em conseguir fazer a vedação total do som. Por isso Moonjen e sua equipe contrataram um pro-fessor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul especialmente para desenvolver testes em laboratórios para que efetivamente haja vedação total, para que quem passe pelo o entorno não ouça o ruído.

Para o arquiteto Moonjen, “a duração do novo telhado será indeterminada, dependen-do exclusivamente da manutenção e de no-vas técnicas construtivas. Será algo como um novo teatro para três mil espectadores senta-dos, proporcionando infinitas possibilidades de espetáculos, inclusive cinema”. O secretá-rio de Cultura acredita que o novo auditório será uma referência cultural, um ícone arqui-tetônico. “Aquilo que aparentemente era um elefante branco para a prefeitura se converte em algo especial. No acordo a prefeitura vai poder usar 70 dias durante 10 anos. Foi feita uma enquete com 70% de aprovação para a reforma”, justifica.

De acordo com o secretário, “o proje-to contempla o entorno imediato, já que é acompanhado dos projetos de paisagismo e comunicação visual. A segurança do local será feita por uma empresa terceirizada”. Gonzaga acredita que a reforma irá desencadear futuras parcerias-público privado, como criar um esta-cionamento subterrâneo, embaixo do ginásio de futebol Ramiro Solto. “Resolveria o problema de estacionamento principalmente aos finais de semana, quando o parque costuma receber

A reforma doAuditório Araújo Viana

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Multipalco da capital

Fernanda Guardiola

FERNANDA GUARDIOLA

Quem pensa que o Complexo Cultural Multipalco está pronto, se engana, pois ain-da virão mais e mais novidades, o projeto está apenas começando. As reformas vão continuar por algum tempo. Diversas obras estão previstas. O projeto Multipalco, junto com o Theatro São Pedro, pretende formar o maior complexo cultural da América La-tina. O espaço para construção é de 20 mil metros quadrados.

A criadora do projeto, Eva Sopher, atual Presidente da Fundação Theatro São Pedro desde 1975, conta que em 1985 começou o sonho de construir o Multipalco. De acordo com a idealizadora, foram anos de luta e esforço para conseguir lotes e começar a construção, após muita insistência foram liberados 10 lotes ao lado do Theatro, pa-ra que ali fosse implantado o complexo. E isso era só o começo de uma batalha que durou 18 anos.

A ideia do projeto foi de Dona Eva, como é conhecida. “A luta foi difícil e em diversos momentos pensei em desistir e jogar tudo para o alto”, recorda. A constru-ção do Multipalcocomeçou em março de 2003, mas foi no final do ano seguinte que foram construídas paredes de concreto. E em 2007 surgiu o primeiro prédio de seis andares. A previsão de conclusão do proje-to era para 2008, mas por alguns problemas

a inauguração foi adiada, e agora não tem data prevista.

Parte do projeto já foi inaugurada, o espaço Vonpar. Localizado na parte superior do Multipalco, o espaço surge como uma alternativa de cultural e la-zer da cidade. É constituído de concha acústica, ocupará a área mais visível do complexo e resgata a história ao reto-mar a concha acústica próxima ao tea-tro, como no primeiro Auditório Araújo Vianna, existente até o final dos anos 50 ao lado da Praça da Matriz. “Desde o início tive esta ideia de construir uma nova concha acústica em respeito à me-mória da cultura da cidade”, declara Eva Sopher. O espaço tem também um palco aberto de 20 metros quadrados para performances alternativas e apresenta-ções musicais.

Os novos projetos serão realizados pela Associação Amigos do Theatro São Pedro. Há equipamentos previstos que serão lan-çados à medida em que ficarem prontos. Os prazos dependem da entrada de re-cursos, que têm origem em amigos e pa-trocinadores, todos com suas logomarcas expostas na praça e no site do Multipalco. Para 2010, as novidades estão na melhoria das condições de trabalho dos operadores da casa e dos espetáculos, além da plena utilização dos equipamentos inaugurados em 2009.

diversos visitantes. Além de ligar diretamente o estacionamento ao Araújo Viana com total segurança e conforto”, projeta

Uma outra novidade anunciada por um dos sócios da empresa Opus Promoções, Car-los Konrath, é que “o Auditório Araújo Vianna também passará a ser local de inclusão so-cial, com a transformação da Sala Radamés Gnattali em um espaço multiuso, onde será oferecida capacitação cultural através de ofici-nas, workshops, cursos muitas vezes gratuitos”. Também está prevista a construção do Acervo do Auditório Araújo Vianna, a fim de resgatar e preservar a história musical e a importância cultural da casa.

A Opus tem 18 meses para concluir a obra, mas acredita que terminará em até 12 meses. A expectativa do secretário é estar com as portas do Araújo Viana abertas ainda em 2010.

Os espetáculos já confirmados no local são a apresentação da Banda Municipal de Porto Alegre, com concertos aos domingos, para o público jovem, de música popular, bos-sa nova, samba, tropicalismo. A entrada será franca ou a doação de um quilo de alimento. O Porto Alegre em Cena, o Festival de Inverno e o Porto Alegre 24 horas de cultura também devem ocupar o espaço. A vontade do secre-tário seria trazer para a abertura do local um show da banda Fito Páez, com a Banda Grea-test. Para Gonzaga, “seria o tipo de espetáculo para mais de uma noite, devido à demanda do público”.

A história

O porto-alegrense José de Araújo Viana (1872-1916) foi um dos fundadores do Insti-tuto de Belas Artes, em 1908. O instituto deu origem à Escola de Belas Artes, hoje integrada à UFRGS. Ao conjunto foi dado o nome de Auditório Araújo Viana, que permaneceu na praça da Matriz, junto ao Theatro São Pedro, até meados do século 20, quando o local foi cedido para a construção do prédio da Assem-bleia Legislativa. O auditório, com o mesmo nome, foi transferido para o Parque Farroupi-lha, junto à Avenida Osvaldo Aranha, onde se encontra até hoje.

Inaugurado em 12 de março de 1964, com capacidade para 4,5 mil pessoas, o projeto é dos arquitetos Moacyr Moojen Marques e Car-los Maximiliano Fayet. A partir de década de 70, o Araújo Vianna consagrou-se como espaço para apresentação de espetáculos de MPB. Em 1997, o Parque Farroupilha foi tombado como Patrimônio Histórico e Cultural do Município. Como parte integrante do Parque, o auditório passou a ter sua preservação garantida.

Fonte: Secretaria da Cultura de Porto Alegre

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ANDREY CIDADE

Que a internet veio para ajudar, já se sabe, mas, e à música, o que ela pode proporcionar? Com a rede mundial é fato que uma música atravessa fronteiras e vai aonde os próprios compositores, cantores e intérpretes não ima-ginariam que ela pudesse chegar. Há mais de 10 anos, a internet dava seus primeiros passos no Brasil. As salas de bate-papo eram os prin-cipais recursos de entretenimento. Mesmo na-quela época, não era exagero imaginar que ela poderia ajudar no processo de divulgação de qualquer pessoa que quisesse simplesmente mostrar o seu trabalho.

O baixista da banda Tópaz, Alexandre Ni-ckel, também conhecido como Fly, acompa-nhou o desenvolvimento da internet ao longo dos anos e acredita na eficácia que ela pode trazer. Fly reconhece os benefícios da internet, observados desde quando começou a atuar na banda, há 11 anos, como compositor e principal membro a utilizá-la como meio de divulgação. “A internet é usada para divulgar um eventual show, uma música nova para do-wnload, algo que a banda usa muito segui-damente pelo site de relacionamento Twitter”, exemplifica. Mesmo com todo o benefício que ela pode trazer, na opinião dele, “nada supera o auxílio de uma exploração do ‘produto’ em mídias tradicionais como rádio e TV”.Fly acre-dita também que a interatividade é a melhor das faces da internet, e sempre achou que as bandas deveriam aprender a explorar mais isso.

“A Tópaz lançou uma promoção chamada ‘Fiz pra Tópaz’. O indivíduo mandava uma música sua, gravada toscamente em casa, e a gente escolhia a mais legal e gravava uma versão”. Na época, a canção escolhida foi “Eu Planejei”, que logo foi lançada como single da banda.

Foi uma promoção que a banda gastou exatos R$ 200, tendo recebido mais de 30 músi-cas. Logo após o lançamento, foi produzido um clipe com imagens enviadas de fãs cantando ela. “Com esse vídeo, conseguimos inserção em diversos meios de comunicação que nor-malmente são complicados de conseguir e o laço com os fãs ficou bem mais forte. Agrega-mos um público enorme com uma ação super simples e de baixo custo”, avalia Fly.

E pra quem opta por cantar em inglês? Ve-mos nas grandes mídias que bandas nacionais que escolhem seguir esse caminho não têm tanta repercussão, mas uma banda gaúcha que tem tido nos últimos anos destaque na inter-net, mesmo cantando apenas em inglês, é a No News Found. O vocalista da banda, Guto Ga-elzer, acredita que o mercado é sim pequeno, e que na sua opinião depende de cada banda analisar o que vale a pena. “Angra e Sepultura são exemplos que estão vivos. Cansei de Ser Sexy só faz sucesso lá fora. Mas depende de nós músicos fazer com que esses exemplos aumentem e não se restrinjam a apenas es-ses três”, analisa. Uma prova desse eventual reconhecimento é que atualmente a banda foi chamada para abrir o show do Forfun, que ocorreu em setembro na capital gaúcha.

Divisor de águas

Assim como costumam dizer que o DVD substituiu a fita cassete, o download gratuito de músicas é seguidamente citado como suces-sor do CD. A nova realidade, que surge com a internet, torna ainda mais difícil ganhar a vida através da música. “Não dá para cobrar pela música, ninguém mais quer pagar por ela. Mas o que fazer? Desistir de ter uma banda? Fechar

O caminho

mais rápido para osucesso

Fotos: Andrey Cidade

Alexandre Nickel, baixista e um dosprincipais compositores da Tópaz, é umdos músicos que recentemente mais utilizaa internet como ferramenta de divulgação

Divulgação

Banda Fused é a atual campeã de downloads do site TramaVirtual,e um dos grandes destaques do cenário musical brasileiro

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as gravadoras? Não! O que as gravadoras co-meçam a perceber é que a forma de ganhar dinheiro com música não é vendendo ela em si. Ela cada vez mais começa a ser liberada de graça e os artistas e produtores ganharão com shows, itens personalizados como camisetas, bottons, entre outros”, explica Guto.

Um bom exemplo de site que tem tido grande destaque nos últimos anos e aberto diversas portas para novos artistas é o “Trama Virtual”. A página dá uma pequena remunera-ção às bandas conforme os downloads que são feitos de forma gratuita, mediante um cadastro. A banda campeã de downloads em 2008 é de Porto Alegre, a Fused, apontada como uma das grandes apostas da nova cena musical brasi-leira. A banda teve seu início em meados de 2007, e nesse curto espaço de tempo conse-guiu alcançar uma projeção nacional, muito pelo repentino sucesso que a internet propor-cionou. A Fused já colhe os frutos do trabalho, tendo a música ‘Canal de Cabo Frio’ entre uma das mais pedidas da Rádio Atlântida-RS.

O baixista da banda, Daniel Medina, conhe-cido como Rino, afirma que ter alcançado o pri-meiro lugar do site TramaVirtual foi importante para as pretensões do grupo. “A banda deve muito aos fãs, foram eles quem nos deram a oportunidade de sermos campeões de down-loads ano passado, e hoje ouvir nossa música na rádio é muito gratificante. Havia gente de todo o país que vinha falar conosco, elogiando o trabalho, e claro que com isso novas portas se abriram.”

A internet é fundamental para qualquer artista. Atualmente há mil maneiras de dispo-nibilizar não apenas a música, mas também no-vidades, informações e eventuais promoções, funcionando também como uma espécie de

diário pessoal do seu artista favorito. “Quase que todo dia a banda posta no orkut, fotolog, twitter. Até mesmo o MSN serve para dimi-nuir a distância e aproximar os fãs da banda, eles gostam disso, e retribuem essa atenção lotando nossas apresentações, por exemplo”, explica Rino.

Da garagempara os palcos

Em um mercado tão competitivo como o musical, toda banda nova procura alcançar seu espaço entre artistas já consagrados. Com a Vert 360° não é diferente. Recentemente, par-ticipou do “Etapa Chance”, festival organizado pelo jornal Diário Gaúcho, em outubro, no Bar Opinião. Por meio de uma votação realizada na página da web do próprio jornal, o público escolheria quais seriam as bandas selecionadas a participar do festival. O evento ainda contou com o show de encerramento da banda Fresno. Um dia antes, a Vert 360° ainda havia tocado no palco principal do Pepsi On Stage, dividin-do espaço com artistas já consagrados como Charlie Brown Jr. e Cine. Questionado sobre a obrigatoriedade de uma gravadora, o guitar-rista da banda, Lucas Benz acredita que uma

banda, acima de tudo, é formada por amigos que se reúnem pelo simples prazer de fazer um som, diminuindo assim, a importância de uma gravadora por trás. “Com o tempo tudo vai ficando um pouco mais sério, e a internet é um facilitador para isso. Antes, uma banda para ser conhecida tinha que correr muito mais, mandar material para gravadoras, rádios, pes-soas influentes e torcer para que alguém de lá gostasse; hoje até em casa podemos gravar músicas, botar na internet e divulgar“, comen-ta Lucas.

A banda no News Found, mesmo com canções apenas em inglês, tem seu espaço e divide o palco com grandes artistas

Links da internet para curtir o som das bandas

TÓPAZMyspace: http://www.myspace.com/bandatopaz

Fotolog: http://www.fotolog.com.br/bandatopaz

NO NEWS FOUNDMyspace: http://myspace.com/nnfrock

TramaVirtual: http://www.nonewsfound.com

FUSEDMyspace:http://www.myspace.com/bandafused

VERT 360°+Myspace: http://www.myspace.com/vert360

Trama: http://www.tramavirtual.com.br/vert360

Fused exibe ao públicovários de seus sucessos

que levaram a banda a estarentre uma das mais pedidas

na Rádio Atlântida-RS

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A ebulição de bandas cover é grande. Elas chamam atenção pelo figurino ousado, seguindo fielmente os seus ídolos, ou pela melodia que lembra o grupo original. É dessa forma que os fãs podem estar um pouco mais perto dos artistas que admiram.

Dentre as bandas que são mais copiadas no mundo estão Rolling Stones, Kiss, The Beatles, entre outras. Em Porto Alegre, são famosas ban-das covers como Rola Stones (cover de Rolling Stones), The Beatles Fan Club Band (cover de Be-atles) e Parasite Kiss (cover do Kiss). Entretanto, os grupos ganham espaço no mercado, como é o caso da Bigger Band.

Formada em 2003, a Bigger Band, que

antes se chamava Tosco Stones, se destaca e marca presença todos os meses no Revolution Bar (bar noturno de Porto Alegre), com direito a bandas convidadas que contribuem com o espetáculo. Eles resolveram formar uma banda cover porque todos gostavam muito de Stones. Para o vocalista Pablo Pinto, a pai-xão pelo Rolling Stones o levou a entrar numa banda cover: “Eu sou louco por Stones e sur-giu a oportunidade de eu expressar isso”. O guitarrista Eduardo Scaravaglione completa: “O que falou mais forte na hora de formar uma banda foi a vontade de tocar as músi-cas que a gente sempre ouviu, que sempre gostamos, da maior banda de rock de todos os tempos”.

Conhecido como Edu, ele conta que “ser cover é uma oportunidade de mostrar para o

público o trabalho do artista que tu admiras”. Segundo o guitarrista, atuar como cover é re-criar a música. “Sempre que tiro uma música tento entender o processo criativo dela através da análise da harmonia e da sequência de no-tas, é como se a música fosse recriada”, explica. Além de tudo, diz que o trabalho é uma coisa prazerosa. “A descoberta do processo criativo da música faz com que o fato de tocar a música dos outros não seja mecânico, de pura cópia. Nessa ótica o trabalho que poderia ser árduo, mecânico, acaba se tornando um grande pra-zer”, afirma.

Muitos dos fãs das bandas, às vezes, es-peram que o cover seja parecido o máximo possível com a banda original. O caso da Bigger Band é outro. O vocalista Pablo Pinto conta: “Não somos parecidos com o Stones”. E ainda

Reiventando a música

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ALESSANDRA RODRIGUES

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A banda homenageadaA Rolling Stones iniciou as suas atividades em 1962, tocando o seu rock legitimamente britânico. A banda for-

mada por Brian Jones, Mick Jagger, Keith Richards, Bill Wyman e Charlie Watts, fez muito sucesso nos anos 60 e conti-

nua até hoje sendo uma banda muldialmente conhecida e importante, aliás não existe nenhuma pessoa que nunca,

pelo menos uma vez, tenha ouvido falar dos Rolling Stones.

Dentro os hits mais conhecidos do grupo musical estão Satisfaction (I Can’t Get No), Honky Tonk Women, Jumpin’

Jack Flash, It’s Only Rock ‘n’ Roll entre outras. Os álbuns que mais fi zeram sucesso foram “Let It Bleed”, “It’s Only Rock ‘n’

Roll”, “Flashpoint”, “Beggars Banquet”, entre outros.

Eduardo Scaravaglione é umdos guitarristas da Bigger Band.

Ele e Marciano formam uma dupla que é o diferencial da banda

Fotos: Alessandra Rodrigues

ressalta: “musicalmente tentamos ser fieis ao máximo”. O grupo é formado por integrantes viciados em Stones, e que têm a consciência de que não parecem em nada com a banda original, fisicamente, pelo menos, e que a pe-gada deles é o musical. Tentam transmitir para os espectadores a emoção de escutar as mú-sicas da banda.

A formação

O grupo, formado por Moa (bateria), Mar-ciano (guitarras), Eduardo (guitarras), Rafael (baixo) e Pablo (vocal) vem crescendo ao longo dos anos e amadurecendo musicalmente. De todas as formações que a Bigger Band já teve somente o guitarrista Eduardo Scaravaglione permanece . Em 2006, o grupo trocou de nome e passou a se chamar Bigger Band, em homena-gem ao mais recente álbum do Rolling Stones, “Bigger Bang”, que foi lançado em 2005.

Mas até chegar nesta composição a banda já passou por mais de três formações. Os inte-grantes que restaram começaram a selecionar um vocalista através do site de relacionamento Orkut, o que rendeu histórias hilárias. Eduardo conta que “uma vez o segundo vocalista, de-pois de entrar na banda e fazer vários ensaios durante algumas semanas, no dia do show, o cara não apareceu”.

O público

Para alguns dos fãs que são assíduos aos shows da Bigger Band é um ponto muito positi-vo o grupo não parecer com a banda original. “Querer parecer com os outros é intrinseca-mente burro”, comenta o estudante Leandro de Los Santos, 28 anos. Já para os estudan-tes Pedro Carvalho, 23, e Felipe Branco, 22, a banda tem muitas coisas em comum com a original. “A energia e a atitude deles corres-pondem com a que os Stones sempre tiveram”, enfatiza Pedro.

O filósofo Daniel Perderzolli, 28, também concorda com os amigos no que diz respeito à energia da banda, que é parecida com a do grupo original, e comenta: “eles não se “fan-tasiam” de Mick Jagger e companhia, o que é muito bom”.

A performance do grupo é uma das coi-sas que chama atenção. Dentre elas, a pre-sença de palco dos músicos é um detalhe especial que fica por conta dos guitarristas Marciano e Eduardo, que no decorrer do show descem do palco e tocam junto aos fãs. O estudante Felipe diz que a Bigger Band é bem animada e constata que “o detalhe especial fica por conta dos guitarristas tocando no meio da galera”.

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Nada melhor do que aproveitar o horário de verão com um encontro entre amigos des-frutar de uma de uma atividade de recreação e se possível ainda ter acesso a algo diferente, inovador. Na cidade de Porto Alegre, estabele-cimentos estão se remodelando e aperfeiço-ando para levar aos cidadãos cultura, lazer e diversão. Das mais diferentes maneiras e com as mais diversas opções os locais dividem-se entre proporcionar: cursos, lançamentos de livros, revistas, exposição de fotos, discussão de textos e palestras.

Na capital do Rio Grande do Sul, é possível encontrar lugares como o Complexo Master, Studio Clio com seu Banquete Cultural e o Oci-

dente, que promove debates sobre textos.O Complexo Master, situado na rua Venân-

cio Aires e aberto há menos de três meses, é um misto de pub, local de shows, estúdio musical e pista de dança. No local acontece uma mescla de atividades, lançamento de revistas, livros e eventos em geral envolvendo a cultura. O “pico” tem uma essência underground, defende as raízes do skateboard, e nas exposições de fotos e vídeos pode-se observar skatistas fazendo suas manobras.

O Complexo, na verdade, começou como um estúdio musical, com uma qualidade de gravação e padrão de expressão internacio-nal. O local projeta criar um selo musical, a

fim de fazer a produção e lançamento de cd’s das bandas que tenham uma certa afinidade com o local.

Segundo o gerente do Complexo Mas-ter, Augusto Avello, “o público-alvo do local é aquele formador de opinião, jornalistas, músicos, publicitários, pessoal que aprecia a arte, compra quadros, que estão abertos para novos conceitos.” O gerente também destaca as parcerias com bandas, que têm sido um grande sucesso, porque viabilizam a gravação ao vivo de CD, o que acaba tra-zendo um determinado público que gosta das bandas.

Perto do Complexo Master, na rua José

Cultura e lazer no mesmo lugarA EFERVESCÊNCIA cultural porto-alegrense apresenta várias OPÇÕESpara reunir os AMIGOS em ambiente que oferecem ENTRETENIMENTO

ANDREI BELMONTE HAIGERT

Com 10 anos de tradição, o Sarau Elétrico é uma opção às terças-feiras na noite da capital gaúcha

Sarau Elétrico/Divulgação

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do Patrocínio, existe o Studio Clio, fundado em 2005. A casa traz para os porto-alegren-ses uma programação multidisciplinar, cursos nas mais diversas áreas: filosofia, história das artes, ciências humanas, roteiro de cinema, pro-dução cultural, além de receber concertos no palco equipado com uma tela de cinema e um piano.

O curador da casa, Thiago Ferraz, conta que o carro-chefe do estabelecimento é o “Almoço Cultural”, onde são apresentados dois temas por mês e o Banquete é um pou-co mais elaborado. “Os convidados chegam aqui, são recepcionados com um coquetel, assistem uma conferência sobre o tema, de aproximadamente uma hora. Depois vem o banquete, entrada, prato principal e sobre-mesa. Sempre realizado por um chefe de renome que desenvolve um cardápio em cima de uma pesquisa”, explica. Destacam-se ainda as Oficinas de Literatura, sendo que uma das últimas resultou em algo curioso e interessante. “Um romance coletivo é um romance escrito há várias mãos, cada aluno escreveu um capítulo. Vai ser lançado na jor-nada de Literatura, em Passo Fundo, e se cha-mará o Apolinário e o Esmé, e tem como cenário a cidade de Porto Alegre”, conta o curador.

Na já tradicional e consagrada casa noturna de Porto Alegre, o Ocidente, acontece há dez anos o Sarau Elétrico, criado pela jornalista Kátia Suman.

A atividade mescla a discussão de assun-tos e textos, com uma canja musical e um

apoio denominado pelo evento como “etílico”. A demons-tração de incentivo e dedicação à cau-sa cultural vem da

idealizadora do projeto. “Fizemos por pura diversão e prazer em compartilhar textos e autores que gostamos. Desde o início fazemos

sem patrocínio, pagamos o som, os músicos, o bilheteiro e se sobrar algum saímos com um ‘troquinho’”, disse Kátia. A jornalista explica a estratégia de divulgação faz perdurar o su-cesso de dez anos: “Não temos um esquema profissional de divulgação, digo, com mídia e tal. É só um mailling que eu mando e uma notinha no roteiro da Zero Hora”. O Sarau Elé-trico acontece às terças-feiras e o custo é de R$10,00. O Ocidente está localizado na rua Oswaldo Aranha.

O Complexo Master alia o pub da casa com música e arte

Eclético, o Studio Clio oferece programação multidisciplinar

Fotos: Andrei Belmonte Haigert

“Fizemos por pura diversão e prazer em compartilhar textos

e autores que gostamos”

STUDIO CLIOEndereço: José do Patrocínio

O quê: Banquete Cultural

Quando: durante a semana, e aos sábados

Valor: Almoço Cultural: R$ 45,00

Banquete Cultural: R$ 120,00

Site: www.studioclio.com.br

COMPLEXO MASTEREndereço: Praça Garibaldi nº 46

O quê: shows, exposições, eventos culturais,

lançamentos de revistas e livros

Quando: de segunda à sábado

Valor: variam entre R$ 5,00 e R$ 15,00

Site: www.complexomaster.com

OCIDENTEEndereço: João Teles esquina Oswaldo Aranha

O quê: Sarau Elétrico

Quando: terças-feiras

Valor: R$ 10,00

Site: www.saraueletrico.com.br

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Em busca do ritmo perfeito DIEGO PERELLÓ

Nascida nos anos 70, com o advento da “Dance Music” e dos conjuntos musicais que usavam elementos sintéticos em suas músicas, a música eletrônica vem sofrendo alterações desde então e hoje se apresenta em várias vertentes, em diversos estilos e direcionadas a um determinado tipo de público e ocasião.

Quando se fala em música eletrônica, lem-bra-se das famosas raves, em que se toca psy trance e músicas mais rápidas, ou das famosas pool partys americanas, que são festas com a duração das raves, onde tocam músicas de variadas vertentes. Mas a ideia de música ele-trônica é também relacionada a vertentes vol-tadas a um certo tipo de público. Um exemplo é o estilo de música eletrônica denominado “Tribal House”, muito apreciado pelo público GLS, ou então, o Psy Trance (“Full On”), voltado a pessoas que optam por festas mais “bomba-das”. No Psy as músicas são produzidas para serem tocadas ao vivo, não têm a intenção de tornarem-se hits de rádios ou de festas que não sejam específicas desse gênero. Uma prova disso é a reação do público quando a música é tocada.

Em Porto Alegre, isso é bem marcado pelo público que frequenta determinadas casas no-turnas. Exemplos são as casas noturnas que to-cam Tribal e Pop (Cine Theatro, Refúgiu’s - vide fo-to acima-, Vitraux e outras), que se caracterizam por ser voltadas para o público GLS, ou mais alternativo. Já o Kimik, República de Madras e festas ao ar livre (Raves) primam por ritmos vertentes do Trance, do House (excetuando o Tribal) e ritmos como o Funk e o Rap.

Segundo a promotora de eventos Marilise Oriondes, 25, “há certas músicas que, mesmo sendo eletrônicas, não fecham com o estilo do público. É a mesma coisa que tocar um Full On em uma festa GLS”. A aceitação do público é fundamental para traçar um perfil de estilo de músicas para um determinado público. Já a Dj Leticia Sartoretto (Dj Letty), residente da Refúgiu’s Mega Danceteria, acha que “o perfil do público não é traçado pelo estilo de música. O estabelecimento é quem determina o estilo de música que vai tocar, atraindo ou não o público alvo dessas produções”.

Mas não é só o clássico House ou o co-nhecido Psy que caracteriza uma música co-mo sendo eletrônica. A Dj Denise Barcellos, 27, defende que tudo que não se enquadra em música acústica é música eletrônica, e exem-plifica: “Funk. Pop. Hip Hop. Inclusive alguns ti-

pos de rock que são normalmente tocados nas baladas, como por exemplo no Beco, no Cord e no extinto Club NEO”.

E quem pensa que música eletrônica se resume a contratar um DJ para tocar e um aparelho profissional de som está muito en-ganado. O “tunt tunt” está presente em todos os cantos: em carros, festas particulares, em que se coloca um set mixado de um DJ preferido e se dança até os pés fazerem calos. E mais: absolutamente tudo pode ser transformado em música eletrônica, em forma de Remix, que são tocados na maioria das baladas.

Para o promoter Alexandre Lima, 20, ain-da hoje há preconceito com relação à música eletrônica remixada, que acontece, na maio-ria dos casos, por parte dos fãs de um certo artista que defendem as origens da música, e explica: “É muito difícil que um verdadeiro fã de Madonna goste de um remix, seja qual for o estilo de música para qual for transformada”. Por isso, são feitas festas, como a DDP (Deeper Dirty Pop), que priorizam as músicas originais, ao passo que em festas mais seletivas e em bo-ates destinadas à cena eletrônica, como o Cine Theatro, as festas de um determinado artista são feitas tocando apenas versões editadas. Importa é que em todos os lugares a música eletrônica está presente.

Diego Perelló

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MAURÍCIO HUBNER

Você já contou uma história para o seu filho? Para algumas pessoas essa pratica foi levada adiante e transformou-se numa ação social voluntária voltada para crianças e jovens, particularmente, aqueles em situação de vul-nerabilidade social ou portadores de necessi-dades especiais. Assim surgiu a ONG Cataven-tus. Formada por voluntários contadores de histórias, que atendem escolas, praças, asilos e feiras, visa transformar-se numa entidade de referência nacional no incentivo à leitura e na inclusão social e cultural.

O início se deu como o projeto “Conte ou-tra vez”, quando alguns participantes da ação tiveram o desejo de continuar contando his-tórias, por vontade própria, e com a finalidade de inserir crianças e jovens na leitura, conforme explica a contadora de histórias Jussara Oviedo Hübner. Ela entrou na ONG após fazer um curso sobre voluntariado no SESC, o que despertou a vontade de prosseguir contando histórias. Jussara diz que o diferencial da ONG é a me-todologia inovadora na contação de histórias e compreensão profunda da exclusão social, pois a Cataventus conhece suas causas, efeitos e sabe as formas de reversão.

Dentre os diversos projetos que a ONG apresenta está o que ensina as crianças e os jovens a contarem histórias. Um dos mais novos contadores de histórias é Matheus Ávila, 7 anos, neto da contadora Jussara. Ele começou a participar da ONG acompanha-do da sua avó. Hoje, Matheus também conta histórias e é um grande exemplo de como a contação de histórias pela Cataventus in-centiva à leitura.

Segundo Jussara, a proposta a deixa en-cantada e realizada por ver a evolução de um menino ou uma menina que chega das ruas, acanhado e cheio de problemas familiares a fazer parte do grupo ativamente contando histórias para outras pessoas. Atualmente a ação desenvolve projetos como “Roda de histórias”, que promove o acesso e o inte-resse pela leitura, trabalhado em escolas públicas, privadas, hospitais e instituições de apoio a crianças e jovens, Portadores de Necessidades Especiais e a idosos. Já o pro-

jeto ”Te liga na história” esclarece, informa e auxilia o público em áreas de prevenção por meio de histórias. É voltado a crianças, adolescentes e adultos. Com o objetivo de popularizar a dramatização de contos atu-ais, lendas e fábulas, o projeto “Uma viagem pelas histórias” é apresentado em escolas de ensino fundamental, públicas, privadas e em comunidades.

Uma das ações que mais realiza Jussara é a “AgitAção”. O projeto é trabalhado em escolas e em comunidades carentes. “Contribui para a formação de uma nova e real consciência,

que abranja a integridade ecológica, a justiça social, a valorização da educação e da saúde, e a defesa dos direitos de todos os seres vivos, facilitando ao homem interagir adequadamen-te com seu meio ambiente para a conservação da vida no planeta, incluindo a sua própria e a de seus semelhantes”, explica Jussara.

São destes projetos que Jussara tira mo-tivação para cada vez contar mais histórias. “Quando eu termino um dia em que contei muitas histórias, vejo a alegria e a empolgação das crianças o que me dá mais vontade de contar da próxima vez”, afirma.

Contação de histórias como

inclusão social

Um dos projetos da ONG Cataventus ensina jovens a contar histórias

Fotos: Maurício Hubner

Voluntários da Cataventus dramatizam contos, lendas e fábulas

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ELISÂNGELA VEIGA

Crônicas, contos, histórias próprias e inventadas. Consequências de abordagens sobre assuntos do cotidiano que, a princípio são jornalísticos, mas, no decorrer do texto, invadem o campo literário e, mais adiante, as páginas dos livros. As obras têm como autores, jornalistas, que, além de exercerem o papel de mediadores de informações, usam a criatividade para transformar notícias em histórias contadas em livros, crônicas e contos. Praticam o chamado jornalismo literário, um campo de atuação rico a ser explorado.

Um simples fato corriqueiro dá origem a histórias criativas abordadas de uma forma mais literária do que jornalística. Alguns pro-fissionais da área, como os jornalistas gaúchos David Coimbra e Juremir Machado da Silva, fazem do jornalismo e da literatura uma com-binação perfeita, harmonizando realidade com ficção de forma surpreendente.

Uma notícia, uma reportagem ou um fato real, que são destacados de uma maneira di-ferenciada quando retratados num texto com perfil literário ou, simplesmente, uma história inventada, dão ênfase ao trabalho de David Coimbra, 47 anos, jornalista, colunista e diretor executivo de Esportes da Zero Hora. David se apropria de histórias reais na hora de escrever os seus contos e livros. “Escrevemos melhor sobre aquilo que conhecemos. Quando se tem uma experiência qualquer em alguma área, tu vais escrever melhor sobre aquilo, pois tu sabes descrever melhor aquela determinada situação”, explica.

Juremir Machado da Silva, 47 anos, profes-sor do curso de Jornalismo, coordenador do programa de Pós- Graduação em Comunica-ção da PUCRS e colunista do Correio do Povo também é adepto ao uso de histórias da vida

real. Ele afirma que “elas são o ponto de partida na hora de elaborar um texto”.

Em comum os dois têm prazer de escrever textos, crônicas, livros e de emocionar os leito-res. Eles escrevem e o retorno é a recompensa para o autor: ‘’ Eu me interesso em saber se o meu leitor gostou daquilo que leu, se o texto de fato o emocionou de alguma forma, achou engraçado, deu um sorriso, sentiu prazer quan-do leu”, diz David Coimbra.

Agindo mais com a emoção do que com a razão na hora de escrever, um texto literário jornalístico causa efeito de entretenimento

para aquele que o lê. É assim que pensam os jornalistas que optaram por este estilo. “Não acredito que quero transmitir uma mensagem , o que quero é distrair as pessoas, provocar, encantar, emocionar, digo que é menos racio-nal e mais emocional tocar as pessoas com o que escrevo”, comenta Juremir.

O espaço dado à crônica

Jornalismo e literatura andam lado a lado no cotidiano, um está ligado ao outro. Um fato real pode ser abordado de uma forma mais

Mistura que deu certo

Elisângela Veiga

O new jornalismO jornalista e escritor norte-americano Thomas Kennerly Wolfe é considerado um dos precursores do “new jor-

nalismo” ( movimento jornalístico criado nos anos 60 e 70). Nele, jornalistas experimentaram diversas técnicas lite-

rárias com as tradicionais ideias da imparcialidade do jornalismo. A atitude ousada e inovadora causou forte impac-

to. Tom Wolfe misturou a realidade e a precisão do jornalismo com a fi cção e a leveza da literatura.

No Brasil, o jornalista, escritor e professor Edvaldo Pereira Lima segue os passos de Wolfe. Ele aderiu também ao

uso do “Novo jornalismo”, quebrando os tabus da formalidade jornalística e adicionando a leveza da literatura no

contexto da realidade do jornalismo.

Fonte: entrevista concedida pelo pesquisador Edvaldo Pereira Lima ao webjornal Balaio de Notícias, em 2003.

Juremir Machado, escritor que harmoniza jornalismo com literatura em sua obras

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Juremir Machado

Ela nem medisse adeus

Editora: Sulina, 2003.

Meu guriEditora: L&pm, 2008.

David Coimbra

Algumas obras literária quando escrito em um livro, não per-dendo a sua essência de realidade, mas sendo retratado de um modo expandido, com mais detalhes, minuciosamente abordado. O inver-so, ou seja, a literatura no jornalismo, também é possível, conforme entende Juremir Machado. Ele cita como exemplo a crônica, que no jorna-lismo “é literatura, porém presa à atualidade”. A diferença para o texto publicado em livro é a validade da informação. “A crônica no jornalis-mo envelhece, é uma espécie de reação a um comentário sobre o que está acontecendo. Às vezes o leitor compreende, amanhã continua entendendo, porque está atual, mas daqui a um mês não estará mais. É uma literatura de circunstância”, diz Juremir.

Como relata David Coimbra, ele acredi-ta que uma matéria jornalística requer mais seriedade e precisão dos fatos, tem que ser impessoal e tentar tirar o personagem, o pro-tagonismo da matéria, pois está se contando alguma coisa que se presenciou: “Isso que é o mais importante numa matéria jornalís-tica, pois ela precisa ser independente da minha opinião, do meu sentimento, tenho que tentar fazer com que isso seja o mais distante possível, buscando isenção, não existe a imparcialidade, mas a isenção tu tens que buscar”, explica. Em comparação com o texto em que predomina a literatura, o jornalista diz que é possível usar mais ironia, frases provocativas, sendo assim, o escritor tem a liberdade de criação, de livre expressão, podendo expor seus sentimentos e ideias acima de tudo.

No seu entendimento, a crônica é uma mistura de jornalismo e literatura. “Fica exa-tamente nesta fronteira, escrevo uma crônica que é ficção mesmo, então uso uma cunha da realidade, e faço um texto literário, dando as características a ela. É uma coisa bem pessoal. Têm pessoas que enxergam a crônica como um comentário escrito. Eu já tento fazer di-ferente, tento puxar mais pela forma do que pelo conteúdo, quero que o leitor se embale pelo texto”, comenta.

A reação nas redações

Atualmente, os veículos jornalísticos a -brem pouco espaço para a literatura, como ressalta Juremir. “Os veículos, principalmente os impressos, estão cada vez menores, estão mais enxutos. Os leitores do dia-a-dia não têm tempo. O espaço para a literatura foi di-minuindo, mas ainda quase todos os jornais têm cronistas, vários desses fazem literatura, porém mais impactante, provocativa e opina-tiva, tentando pegar sempre um gancho com a realidade”, explica.

Segundo David Coimbra, o jornalismo e o jornalista são naturalmente preconceituo-sos, “pois ambos estão lidando com fatos do dia-a-dia, então, cada um tende a achar que a sua área é a mais importante de todas”. Ele exemplifica: “o pessoal do Esporte da Zero Hora, por exemplo, acha que são eles os mais lidos; o do Segundo Caderno acha que lá é que tem cultura. Ou seja, cada área tem o seu mundo e defende o seu ponto de vista, o seu nicho. Não se pode, necessariamente, denominar isto como preconceito”.

O atual jornalismo literário no Rio Grande do Sul tem passado por um ‘momento mor-no’, como avalia Juremir: “o jornalismo literário aqui enfrenta algumas dificuldades, pois não há muito espaço, pelo menos agora existem os blogs, as novas tecnologias, os novos espaços. É bem provável que nos próximos tempos seja praticado na internet. Teria que acompanhar mais de perto esse tipo de trabalho, não dá para dizer que tem alguma novidade, uma criatividade à flor da pele”.

Para David, “tem gente que se aventura um pouco, e existem pessoas que de repente fa-zem algumas incursões, um jornalismo literário, está tudo muito disseminado, então não existe uma “escola” para isso aqui no sul”.

Visões de uma certa Europa

Editora: EDIPUCRS, 1998.

A mulherdo centroavanteEditora: Artes e Ofícios, 1999.

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Luan Pires

Realidade e ficção são as principais características das obras de David Coimbra

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Dúvida que o filme não deixa

A chamada publicitária para o filme Dúvida já indica que “verdades absolutas não existem”. Debater a temática de Dúvida torna-se inte-ressante , pois rende uma boa roda de discus-são. É ainda mais interessante quando assistido na companhia de alguém. É provável que se passará um bom tempo debatendo o tema do filme. A conversa demora a chegar ao fim. Dúvida, dirigido por John Patrick Schanley, é cinema de arte, filme para discussão e hoje algo muito raro de se encontrar. Um longa, daqueles que há muito tempo não se via. É um filme que propõe pensamentos e opiniões divergentes. A trama é construída em poucos cenários, o necessário para mostrar um clima gélido e sombrio é o ambiente que a situa-ção requer, assim, faz acreditar nos conflitos expostos na tela.

O elenco de Dúvida é o que tem de melhor. Os atores selecionados dão tom teatral para o filme. Trata-se de um rol de artistas muito bem apurado. Merecem todos menção hon-rosa, Aloysius Beauvier desperta atenção, é me-morável e tem mais certeza da história. Meryl Streep apresenta uma personagem interessan-te. Philip S. Hoffman tem um desempenho per-feito. Amy Adams e Viola Davis, deixam várias

marcas. Eles são simplesmente espetaculares. Contribuem para o roteiro da trama que segue um caminho exemplar. Além disso, o texto per-mite o desenvolvimento da história de forma tranquila com diálogos impecáveis.

Dúvida sugere que o espectador faça uma escolha sobre quem merece a sua confiança. Traz poucos conflitos e faltam situações ten-sas entre os personagens. Da forma como se apresenta, em diálogos, muito se parece com uma peça teatral. Quem vê o filme, imagina mais situações e, estas, poderiam alterar o rumo dos personagens na trama. A hipótese fica por conta do espectador, que pensa, usa a mente em busca de outras possibilidades para esta história.

O filme mostra uma freira chamada Aloy-sius que acusa o padre Flynn de molestar um jovem aluno numa escola católica. A situação complica, pois ele é o única aluno negro. Ain-da, em uma cena da atriz Viola Davis , sabe-se que o menino apanha do pai por razões não esclarecidas. Isto indica uma provável homos-sexualidade do garoto, que ainda sofria nas mãos de meninos em outra escola. As freiras descobrem que o garoto bebeu vinho no al-tar e ficou a sós com o vigário e isso complica

de vez a vida do padre. Este, ao aceitar sair da cidade, de certa forma, admitiu a culpa, por não lutar para provar a sua inocência.

O filme MOSTRA ao espectador a DIFÍCIL relação da MORAL e religião

Merlyl Streep (irmã Aloysius Beavier);Philip S. Hofmann (padre Bredan Flyn) e Amy Adams (irmã James)

ROMEU LAUXEN

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Fotos: Divulgação

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