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ISSN 012-7751 REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL R. Tribunal de Contas do Distrito Federal, 31 jan./dez. 2005

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ISSN 012-7751

REVISTA DO TRIBUNAL DE CONTASDO DISTRITO FEDERAL

R. Tribunal de Contas do Distrito Federal, 31 jan./dez. 2005

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REVISTA EDITADA PELA SEÇÃO DE DOCUMENTAÇÃOSUPERVISÃOConselheiro Antônio Renato Alves RainhaCOORDENAÇÃOVânia de Fátima Pereira(Chefe da Seção de Documentação)ORGANIZAÇÃOLilia Márcia Pereira Vidigal de Oliveira(Bibliotecária)REVISÃOCarmen Regina Oliveira de Souza Cremasco(Bibliotecária)

Toda correspondência deve ser dirigida a esta Seção -TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL - 70070-500 - SEÇÃO DE DOCUMENTAÇÃO - Praça do Buriti - Ed Costae Silva - Brasília-DF - [email protected]

Revista do Tribunal de Contas do Distrito Federal, nº 1 - 1975 - Brasília, Seção de Documentação, 2005.

CDU 336.126.55(81)(05)

ISSN 012-7751

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TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL

COMPOSIÇÃO DE 2005

ConselheirosManoel Paulo de Andrade Neto - PresidenteAntônio Renato Alves Rainha - Vice-PresidenteRonaldo Costa CoutoMarli VinhadeliJorge CaetanoJorge Ulisses Jacoby FernandesPaulo César de Ávila e Silva

AuditorJosé Roberto de Paiva Martins

Ministério PúblicoCláudia Fernanda de Oliveira Pereira - Procuradora-Geral em ExercícioMárcia Ferreira Cunha FariasDemóstenes Tres AlbuquerqueInácio Magalhães Filho

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Sumário

DOUTRINA

JORGE ULISSES JACOBY FERNANDESCompetência do Tribunal de Contas para apreciar ato de demissão deempregados ...................................................................................................... 9Controle das licitações pelo Tribunal de Contas ................................... 15

FLÁVIO SÁTIRO FERNANDESO ideal municipalista no pensamento e na ação de Oswaldo Trigueirode Albuquerque Melo .................................................................................. 35

JOSÉ RIBAMAR CALDAS FURTADOOs restos a pagar de final de mandato ..................................................... 49A transparência na gestão fiscal ................................................................. 57

IVAN BARBOSA RIGOLINExclusividade nos contratos é condição que precisa ser expressamenteestabelecida .................................................................................................... 63

CARLOS ANTONIO PEREIRA DA SILVAA concessão de medidas cautelares no processo de conhecimento ....69

MAURÍCIO NUNES MOREIRAA naturea jurídica do princípio da eficiência ........................................... 75

WALTER AZEVEDO DA SILVADez mandamentos do Controle Externo ................................................ 87

VOTOS

MARLI VINADELIAumento de despesa com pessoal - Lei de Responsabilidade Fiscal -art. 59 .............................................................................................................. 91

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Estudo sobre a impenhorabilidade de bens de empresa pública ..... 117Exame de regularidade de termo de parceria objetivando odesenvolvimento de programas sócio educativos, através do esporte edo lazer, no Distrito Federal e Entorno ............................................... 123Parcelamento irregular de área rural pública ........................................ 149Uniformização de procedimentos - Iincorporação de vantagensdecorrentes de cargos/funções comissionados exercidos na esfera distritalpelos servidores efetivos dos órgãos do complexo administrativo doDistrito Federal .......................................................................................... 161

PARECER

MARCIA FERREIRA CUNHA FARIASContrato de locação de sistema de impressão a laser - Irregularidades175Inconstitucionalidade da Lei nº 2.715/2001 ........................................ 193Missão no exterior - Pagamento indevido a título de indenização detransporte e outras vantagens ................................................................. 201Pagamento de faturas emitidas por entidades da Administração Públi-ca, que exercem o monopólio de serviços públicos essenciais, emboranão se encontrem em situação regular com o INSS, o FGTS e a FazendaDistrital ....................................................................................................... 227Relatório de Eficiência e Eficácia de Gestão........................................ 231

INÁCIO MAGALHÃES FILHOConcessão de aposentadoria, pensão ou reforma - Redução deproventos.................................................................................................... 241

JULIANO RICARDO DE VASCONCELLOS COSTA COUTOContratação de serviços terceirizados para substituição deservidores ................................................................................................... 249

LUZIA OLINDA BASTOS CAVALCANTE DE ALENCARAposentadoria ............................................................................................ 255

RODRIGO SIMÕES FREJATConvênio para consignação em folha e pagamento de remuneração/proventos .................................................................................................... 263

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DOUTRINA

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R.Tribunal de Contas do Distrito Federal, 31 : 9-13, jan./dez. 2005 9

COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE CONTAS PARA APRECIAR

ATO DE DEMISSÃO DE EMPREGADOS

Jorge Ulisses Jacoby FernandesConselheiro do TCDF

Tema de particular interesse do Tribunal de Contas, a demissão deempregados deve compreender que o Estado-empregador, ao descer de suaposição de regulador solitário da relação institucional com os servidorespúblicos - os que são regidos por normas estatuárias -, ombreando-se comos empregadores privados, de modo algum, pode deixar de observar, nagestão de sua força laborativa, o extenso conjunto de direitos e deveresinerentes a essa particular relação jurídica. Serve-se, no exercício daautoridade, de poderes potestativos próprios da órbita privada. Discute-se,entre esses poderes, se subsiste a faculdade de demitir imotivadamente seusempregados, com o singelo pagamento das parcelas rescisórias devidas.

Não é difícil encontrar quem defenda, com base em tal análise, aincompetência do órgão controlador para exame desses atos.

Esse argumento, sem dúvida, nasce de uma apreciação apressada esuperficial do texto constitucional. A admissão de pessoal, decerto, integraescopo próprio da atividade fiscalizadora do Tribunal. Parece-nos que aConstituição Federal explicitou especificamente essa atribuição para certificar,entre outros, a aplicação de seu art. 37, II, que veda a assunção de cargo ouemprego público sem concurso.

E neste ponto disciplinou que o julgamento pelo Tribunal visa ao registro,pelo qual a Corte põe formalmente o seu endosso à admissão, certifica a suavalidade e consolida a relação funcional do servidor com o Estado.

Em relação à demissão de servidores, o enfoque a ser dado, em suabase jurídica, é outro, a ser cotejado com a competência genérica do órgãode controle externo.

Em linha de princípio, considera-se que a rescisão contratual doempregado público, regido pela Consolidação das Leis do Trabalho, com opagamento de verbas rescisórias, é um ato de despesa, sujeito, a par da

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apreciação da legalidade, também ao cotejo entre os princípios daeconomicidade e legitimidade.

Tal apreciação, sem dúvida, está contida na previsão dos artigos 70,caput, e 71, II, da Constituição Federal, que impõem ao Tribunal de Contasa fiscalização dos gestores da res publicae em suas diversas facetas: contábil,financeira, orçamentária, operacional, e patrimonial, em relação às quais ademissão de servidores exerce séria influência.

Resta, no particular, verificar se a Corte, ao apreciar atos de demissão,está limitada aos seus aspectos formais ou, diversamente, poderá mergulharem sua essência e negar-lhes validade em seu arcabouço substancial.

O aperfeiçoamento teórico do tema deve partir da avaliação danatureza jurídica do ato potestativo de demissão, que envolve também avontade simples do administrador para a consecução do interesse públicona prática de tais atos, distinguindo-o do empregador privado, do qual seexige justificação do ato. Abrange, assim, a validação da motivação interiordo gestor para a realização de atos administrativos, ainda que se trate demotivação não exteriorizada.

Nesse passo surge a necessidade de se identificar se tais atos podemser classificados como meramente discricionários, ou sofrem limitações deordem normativa. Se a discricionariedade for a regra pertinente ao caso,então o Tribunal encontrar-se-á limitado à aferição da forma do ato e outroslimites impostos pela lei. Se outra for a constatação, então a competênciapara a apreciação estará configurada em sua plenitude.

Para tanto, é preciso avançar com alguma profundidade sobre oconceito de discricionariedade administrativa, inclusive no que se refere àsua consolidação histórica, nos últimos duzentos anos.

De fato, a noção de poder discricionário como inerente à política degestão estatal surgiu nos idos da Revolução Francesa de 1789,simultaneamente ao nascimento da noção moderna de Estado de Direito.Juridicamente, houve a transição do Estado monarquista e centralizador -L’État c’est moi - para o Estado de Direito.

O Estado descentralizado, ou Estado-Gestor, que hodiernamenteposiciona-se como um termômetro, e ao mesmo tempo, como válvula daatividade social, não poderia ser privado de um quociente mínimo deautonomia da vontade, vale dizer, de escolha entre caminhos alternativosque levem à satisfação do interesse público.

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Sem o poder discricionário não existiriam as políticas deadministração e gestão pública, mas apenas um Estado meramente executorda ordem normativa, um mecanismo fixo de engrenagens imutáveis.

Dir-se-á que o poder discricionário está limitado à lei. Tal afirmaçãoé incompleta e poderia ser melhor explicitada da seguinte forma: o poderdiscricionário está adstrito à lei, mas o administrador é obrigado a elegerentre várias alternativas aquela que tenha melhor fundamento no interessemaior da sociedade.

O interesse público, portanto, funciona como redutor do nível deliberdade discricionária do gestor público.

Seria sobremaneira incoerente imaginar a administração submetidaaos princípios da moralidade e eficiência, sem o correspondente controle desua validade, que pode ser feito tanto pelo judiciário como pelo Tribunal deContas. Este último com capital importância, por razões várias: pode agirde ofício, no exercício da atividade fiscalizadora; tem competência paraapreciar a legitimidade e economicidade dos atos administrativos, o queimplica na apreciação do mérito do ato, e pode responsabilizar os dirigentespela má gestão da coisa pública.

Como decorrência de toda a exposição, fácil concluir que adiscricionariedade relativa a atos de demissão de servidores públicos, aindaque sob a tutela das normas consolidadas, é mínima. A motivação, comorequisito insuperável, deverá estar explicitada de forma bastanteconvincente. Não poderia ser de outra maneira. Se admitíssemosargumentos de pouca relevância para justificar atos de tão severarepercussão social, estaríamos a desintegrar o princípio da proporcionalidade,princípio este de estatura constitucional.

Nesse sentido, é preciso negar a possibilidade de o dirigente deempresa pública, cujos servidores estão sujeitos ao regime da Consolidaçãodas Leis do Trabalho, demitir imotivadamente servidores constantes deseu quadro de pessoal.

No mesmo compasso, vem à colação antigo entendimento do DASP,contido no Parecer nº 739/80, que, em síntese, proclama que a dispensade servidor regido pela CLT deverá ter como substrato motivação deinteresse público.

Sem prejuízo da subjetividade do que se inscreve na área dochamado princípio da discricionariedade existente no Direito

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Administrativo, o agente público, na condição de representante do Estado,como administrador da coisa pública, só pode fazer aquilo que estiverautorizado por lei a praticar, entendendo-se aqui a palavra lei em seu sentidomais amplo. A Consolidação das Leis do Trabalho é uma imposição deorigem estatal; foi decretada com a finalidade de impor a vontade do Estado,circunstância que, conseqüentemente, por ser imposta, substitui a vontadee os critérios individuais do representante do Estado, que fica obrigado adar fiel e cabal cumprimento aos mandamentos instituídos na lei; porconseguinte, não tem o mesmo autoridade para se impor de forma diferentedo ordenamento jurídico instituído pelo Estado.

Assim, ainda que possa parecer ‘seja lícito, ao empregador, dispensaro empregado desde que observe as disposições contidas na Consolidaçãodas Leis do Trabalho’, fazemos notar que a força que autoriza um ato dessanatureza é a que dimana da lei, que, por delinear seus elementos essenciais econdicionar seu próprio conteúdo como ato do Estado, não se sujeita aoscritérios individuais da vontade ou capricho de seus representantes.

Por outro lado, o excelso Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MSnº 21.845/DF, decidiu que o ato de dispensa, praticado por autoridadepública, está também sujeito ao requisito da motivação, como se vê noseguinte excerto, extraído do voto do Ministro Néri da Silveira:

A dispensa do servidor público, regido pela CLT, não se podedar da mesma forma que a dispensa do empregado privado. É queos atos da Administração Pública hão de ser sempre motivados, nãopodem ser sem causa. Pelo princípio da legalidade que preside àatividade da Administração Pública a esta não cabe praticar atos aindaque no exercício de poder discricionário que impliquem expressõesde arbítrio na sua atividade.

Assim, pronunciou-se a Advocacia-Geral da União:Servidor celetista admitido por concurso. Dispensa imotivada.

Ilegalidade da Portaria nº 306, de 30/09/80. Servidor admitido porconcurso, conquanto regido pela Consolidação das Leis do Trabalho,não pode ser dispensado discricionariamente, sem motivação. Ato nulo,a configurar abuso de poder. Reintegração do interessado no emprego.

Seguia a mesma linha o antigo Tribunal Federal de Recursos,acrescentando que a demissão só é admissível se fundada em interesse público.

Não estamos certamente suscitando a estabilidade para servidoresceletistas optantes pelo sistema do FGTS. Ao contrário, deve-se reconhecera inexistência de estabilidade ou direito a emprego.

O que existe e deve ser proclamada, independentemente de governosou períodos, e ainda que com efeitos ex nunc, é a restrição ao poder

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discricionário, que onera o contribuinte com substancial acréscimo na multado FGTS, entre outros consectários da demissão imotivada.

É, desse modo, legítima a demissão por fechamento de empresa ouestabelecimento, como no caso da SAB, Sociedade de Abastecimento deBrasília, um supermercado estatal. É ilegítima a demissão quando, porexemplo, sucedida de outra admissão para o mesmo cargo.

Com base nas exposições realizadas, podem-se afirmar agora asseguintes assertivas:

o ato de dispensa do servidor público regido pela Consolidaçãodas Leis do Trabalho é ato administrativo, não meramentediscricionário, necessariamente motivado, sujeito aos princípiosbasilares da Administração Pública: legalidade, impessoalidade,moralidade, publicidade e eficiência; a referida dispensa é também um ato de gestão, sujeito à avaliaçãosob o prisma da legalidade, da legitimidade e da economicidade; também se configura em ato de despesa, vez que implica opagamento de verbas rescisórias.

Constituídas tais premissas, é possível reafirmar, com redobrado vigor,a competência do Tribunal de Contas para apreciar os atos dessa natureza.

A apreciação dos critérios de demissão, portanto, integra a competênciaconstitucional das Cortes de Contas, por implicar em despesa no pagamentode verbas resilíveis, sujeita-se ao crivo do controle externo sob os prismasda legalidade, da economicidade e da legitimidade, bem como deveatender ao indispensável requisito da motivação, fundada em interessepúblico relevante.

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CONTROLE DAS LICITAÇÕES PELO

TRIBUNAL DE CONTAS

Jorge Ulisses Jacoby FernandesConselheiro do TCDF

Uma nova perspectiva na nobre missão dos Tribunais de Contasvem se desvendando no controle das licitações públicas, capaz de permitirnão só o controle da legalidade, quanto da legitimidade e da economicidadedos atos de gestão; capaz de revelar que os Tribunais de Contas podemmuito mais do que efetivar o controle da despesa em favor do erário, masimpor-se definitivamente como instrumento para proteção da ordemjurídica, inclusive em favor do particular contratado pela AdministraçãoPública. Uma ação do Tribunal de Contas capaz de, a um só tempo, controlara corrupção e a mal versação dos recursos públicos, resgatar a boa fé nasrelações entre particulares e os gestores públicos, reduzir o volume dedemandas judiciais, satisfazendo o interesse da sociedade de ver os recursospúblicos bem aplicados.

Para justificar essa nova perspectiva e compreendê-la no modo eâmbito jurídico devido, mostra-se conveniente estudá-la dividindo em cincotemas, conforme segue.

1. Sustação de atos da licitação

O poder de sustar ato, no modelo delineado pela ConstituiçãoFederal, foi permitido a órgãos não integrantes do Poder Judiciário, dedois modos distintos. Ao Poder Legislativo foi atribuída a competência desustar atos normativos que exorbitem do poder regulamentar ou dos limitesda delegação legislativa.1

Conquanto tenha atribuído ao Poder Legislativo competência parasustar atos decorrentes do poder normativo, o constituinte não lhe

1 BRASIL. Constituição Federal. Brasília : Senado, 1988. Art. 49, inc. V.

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2 Ibid., art. 71, inc. X.3 Ibid., art. 75.4 Ibid., art. 5°, inc. XXXV.5 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, daConstituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dáoutras providências. DOU, 22 jun. 1993.

outorgoupoderes para sustar atos individuais e concretos, originariamente.Preferiu atribuir essa competência ao Tribunal de Contas.2

Ao definir essa competência, no entanto, impôs um inter para satisfazero sistema de checks and balances, ou limitações recíprocas de poderes.

Desse modo exigiu que:a) o Tribunal de Contas tenha impugnado o ato;b) a Administração Pública, ciente da impugnação, não tenha atendido

a ordem da sustação;c) diante da recusa, o Tribunal de Contas suste diretamente o ato;d) após ordenar a sustação, o Tribunal de Contas comunique a decisão

à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal.Sendo o processo licitatório uma série ordenada de atos, qualquer

um deles pode ser sustado pelo Tribunal de Contas. Essa competência éoriginária da Corte de Contas, dispensa a participação de qualquer órgãodos demais poderes e não pode ser exercida originariamente por qualquerdeles de ofício. Como se trata de competência originária e constitucional,estendida a todos os Tribunais de Contas das unidades federadas,3 o PoderLegislativo comunicado da decisão não tem o poder de rever o ato desustação. Somente pode fazê-lo o Poder Judiciário, nos limites da amplarevisibilidade judicial dos atos frente à Lei,4 e ainda assim somente podeagir mediante provocação.

2. Exame dos editais pelo Tribunal de Contas

A Lei de Licitações e Contratos5 estabeleceu que ao Tribunal de Contascompete o controle das despesas decorrentes dos contratos e demais instrumentosregidos por essa Lei, sem prejuízo do sistema de controle interno.

Essa competência, definida em nível infraconstitucional se insere noamplo espectro de competências que decorrem da própria ConstituiçãoFederal, quando permite o controle das despesas tanto em termos de contasanuais, como especiais, ou a aplicação de recursos públicos em geral.

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A divulgação do edital, como ato isolado de divulgação, tem porprincipal conseqüência dar início à fase externa do processo licitatório,assegurando daí em diante o direito público subjetivo de todos quantoparticipem da licitação ao fiel cumprimento da Lei.6 Somente com apublicação que revela a concretização do interesse de contratar, é que oTribunal de Contas pode solicitar para exame o edital.

2.1. Prazo para solicitar editais para exame

Há duas e distintas conseqüências segundo o tempo que o Tribunalde Contas fizer a solicitação. Se o edital for solicitado para exame até o diaútil imediatamente anterior à data de recebimento das propostas, os órgãosficam obrigados a adoção das medidas corretivas pertinentes que, em funçãodesse exame, lhes forem determinadas. O cumprimento da determinação écompulsório e pode implicar em reabertura do prazo para elaboração daspropostas, total ou parcialmente.7

Se o edital, contudo, for solicitado para exame após essa data, a normanão esclarece se haverá obrigação de corrigir o edital. Há uma explicaçãológica e jurídica para a não definição pela Lei. É que entre a data derecebimento das propostas, normalmente seguida da abertura e julgamento,poderá ter-se firmado direito subjetivo de terceiro, licitante-vencedor, quenesse caso pode comparecer para a defesa do ato convocatório. Recebida aproposta, terceiro estará envolvido na relação, fato que implica napossibilidade de firmar-se o contraditório, restringindo a unilateral forçacogente para adaptar o edital à Lei.

2.2. Exame de editais

No Brasil vigorou até a Constituição Federal de 1967 o sistema doregistro prévio, obrigando-se até então o prévio exame da despesa pelo Tribunalde Contas e o registro da mesma, antes do pagamento. Com a abolição dosistema, o controle das despesas passou a ser posterior. Desse modo não é

6BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Consti-tuição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outrasprovidências. DOU, 22 jun. 1993. Art. 4°.7 Ibid., art. 21, § 4°.

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8 Nesse sentido, a Súmula n° 78 do TCU, publicada no DOU de 16 dez. 1976.9 Lei n° 8.666/93, op. cit., art. 38, parágrafo único.10 Expressão que se atribui ao Ministro Carlos Velloso, empregada no I Congresso Nacional dosProcuradores do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas, realizado em Brasília.

possível impor ao Tribunal de Contas ou mesmo este órgão pretender quepara a validade da licitação seja previamente examinado o edital.8

Pela Lei de Licitações e Contratos o exame e a aprovação do editalcompetem ao órgão jurídico da respectiva Administração Pública.9

2.3. Solicitação para exame

Também definiu a norma que o Tribunal de Contas deve solicitarpara exame, não cabendo portanto a ordem genérica para remeter todos oseditais. Há que ser um a um, cada vez que ocorrer a publicação. Afinal, éconsabido que o controle que se faz por transcrição e remessa de documentosaos órgãos de controle está, felizmente, com seus dias contados. Primeiro,porque quem transcreve ou copia a informação fica com o poder deapresentar informações fidedignas ou não e, por corolário, a ação de controlepermanece nas mãos do controlado; segundo, por princípio que chegou aser colocado em Lei, não cabe ao órgão controlador impor obrigações aocontrolado, criar novas tarefas ou deveres, sob pena de inverter as proposiçõeslógicas estruturantes do serviço passando a atividade fim trabalhar para aatividade meio, no caso o controle.

3. Direito de representar ao Tribunal de Contas

Interessante verificar que ao consagrar expressamente essa competênciapara controlar a despesa e examinar editais, o legislador definiu contornosmais acentuados para o exercício, não só resguardando a ação ex-officio daprópria Corte de Contas, mas apontando no sentido do controle social. Foimais longe, mostrou que o Tribunal de Contas pode se efetivar como “Casa deEsperança”10 permitindo que o próprio licitante que teve um direito seu lesadoou ameaçado recorra também a essa Corte, diretamente, sem a necessidadeda intervenção de advogados, em mais um exercício do jus postulandi.

Atribuiu a competência para representar ao Tribunal de Contas a:a) qualquer licitante;b) qualquer contratado;

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c) qualquer pessoa física; e ainda ad) qualquer pessoa jurídica.Essa representação guarda peculiaridades, segundo o agente que

pretende exercitá-la.De fato, quando se trata de licitante a própria norma impôs uma

restrição ao direito de representar que está inserido no art. 41 da Lei n°8.666/93 e facilmente se percebe pela leitura do final dos §§ 1° e 2°,quando ao regular o direito de impugnar ao cidadão ressalva que estepermanece com o direito de representar ao Tribunal de Contas, na formado respectivo art. 113.

Diferentemente, porém, dispôs em relação ao licitante definindo quese esse não representa à Administração Pública sobre irregularidades noedital, no prazo definido em Lei, decai do direito de representar perante oTribunal de Contas.

Essa assertiva faz florescer um postulado importante na relaçãojurídica que o licitante entretém com a Administração Pública: o vetusto,mas não menos atualíssimo princípio da boa fé, ou no seu matiz processual:lealdade processual.

Se é verdade que o edital é lei entre as partes, elaborado pelaAdministração Pública, não é menos verdade que se encontra sujeito a umatípico controle da legalidade: antes de vincular a Administração Pública eo próprio licitante o edital sujeita-se a possibilidade de ser impugnadopelos licitantes e, ainda, revogado ou anulado pela Administração. Decorridoesse prazo estabelecido pela Lei, presume-se o consentimento de todos osenvolvidos no processo licitatório a subjugarem-se à regra particular docertame, assumindo pois a condição de lei entre as partes.11

Se o licitante decidir representar após ter caído o direito, competeaos Tribunais de Contas declarar a preclusão do direito de representar,sem prejuízo de eventual exame ex-officio. Certamente, contrariaria a Lei e

11 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Cons-tituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outrasprovidências. DOU, Poder Executivo, Brasília, 22 jun. 1993. Art. 41. A Administração não podedescumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada.(...) § 2º Decairá do direito de impugnar os termos do edital de licitação perante a Administraçãoo licitante que não o fizer até o segundo dia útil que anteceder a abertura dos envelopes dehabilitação em concorrência, a abertura dos envelopes com as propostas em convite, tomada depreços ou concurso, ou a realização de leilão, as falhas ou irregularidades que viciariam esseedital, hipótese em que tal comunicação não terá efeito de recurso.

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12 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo n° TC-275.039/1996-0. Decisão n° 328/1996- Plenário. No mesmo sentido: Processo n° TC-275.077/1996-9. Decisão n° 405/1996 - Plenário.13 DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. 4ª Turma Cível, AC e REO n°19980110172126. DJ 27 ago. 2003. No mesmo sentido: STJ. RMS n° 15.051. DJ 18 nov. 2002.14 No início do século, ao tempo do registro prévio, os contratos eram “julgados” pelo Tribunalda União: Decreto nº 2.511, de 20 de dezembro de 1911. Regula a Tomada de Contas ao Governopelo Congresso Nacional. Coleção de Leis do Brasil. 1911. v. 001. p. 00080. c.1. Art. 5º.

o princípio da lealdade processual acolher representação de licitante quetendo tempo para fazê-lo de modo a maximizar os esforços daAdministração e a redução de custos para as partes do processo licitatório,extemporaneamente pretende obviar a própria licitação.12 Daí também infere-se a razoabilidade jurídica dos acórdãos e sentenças que dão maior amplitudedo que a expressamente decorrente de interpretação literal e vêementendendo que também ocorre decadência judicial do direito de discutirnorma do edital após decorrido o prazo legal para impugnação.13

Importa notar que muitas vezes ocorre de o licitante a pretexto deinsurgir-se contra determinada conduta da comissão de licitação discutirregra de edital. Portanto, imprescindível a cautela: ao receber a representaçãodeve-se considerar exatamente o objetivo do licitante e impor um limite àmatéria em discussão: no curso do processo licitatório, após decorrido oprazo de impugnação, não mais se discute a legalidade das regras do edital;é possível, no entanto, discutir a aderência da conduta dos membros dacomissão de licitação à regra posta.

Incentivando o controle social, e diversamente do exposto em relaçãoao licitante, a Lei de Licitações e Contratos não estabeleceu restriçõestemporais ao cidadão para representar ao Tribunal de Contas; poderá fazê-lo a qualquer tempo.

4. Sustação de Contratos Administrativos pelos Tribunais de Contas

Diversamente dos poderes que concedeu aos Tribunais de Contas,em relação a atos administrativos em geral, o constituinte, ao tratar decontratos, definiu14 uma sistemática que envolve essas Cortes, o PoderLegislativo e o Poder Executivo, numa efetiva aplicação da teoria de freios econtrapesos “cheks and balances”.

Sustar um contrato significa retirar-lhe a eficácia, a produção dos efeitosfinanceiros pagamento, por exemplo - e executivos, - realização do objeto.

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O inciso X e §§ 1º e 2º do art. 71, da Constituição Federal, aoreferir-se a sustação admitiu, implicitamente, que a mesma tivesse naturezacautelar ou definitiva.

Terá natureza meramente cautelar, quando determinada no curso deum processo visando resguardar o patrimônio publico; natureza decisóriadefinitiva quando for anunciado pelo Tribunal de Contas, com arecomendação para adotar as medidas legais, genericamente, ou implicarem providencias incompatíveis com a continuidade do contrato.

Tecnicamente, nesse último caso, estará o Tribunal de Contasdeterminando a autoridade administrativa que anule o contrato. Na funçãode controle externo é possível determinar à autoridade que adote asprovidências “visando ao exato cumprimento da Lei”, expressão essa comumno âmbito das recomendações dos Tribunais de Contas.

Assim, embora tecnicamente a recomendação para sustação em caráterdefinitivo não seja adequada é possível entender que a competênciaconstitucional para sustar assuma tal conotação, hipótese em que terá porcorolário lógico a anulação ou rescisão.

Ao receber a comunicação para sustar o contrato, cabe a autoridadeadministrativa optar pela medida que melhor se harmonize com o interessepúblico. Divergindo da decisão, poderá impetrar recurso perante o próprioTribunal ou iniciar a ação judicial pertinente.

Concordando, verificará se a sustação deverá ter natureza cautelar,corrigindo/sanando o contrato, ou definitiva, rescindindo ou anulando-o.

O Tribunal de Contas não pode sustar contrato, mas lhe é implícito opoder de determinar a Administração que o faça.

O ordenamento jurídico brasileiro, formado pela Constituição e liçõesdo Supremo Tribunal Federal, com extrema parcimônia, harmonizou oprimado do respeito ao ato jurídico perfeito com a secular discussão acercados efeitos do ato ilegal, admitindo a competência do controle externo parabuscar inicialmente que a própria administração suste o contrato, observando-se, é claro, a legislação pertinente. Note-se que determinar a sustação não éimpor diretamente a rescisão, mas apenas ato cautelar impeditivo daconsumação da despesa ou do fato gerador de pagamento (execução). Aautoridade que recebe a comunicação é que avalia os efeitos da sustação navida do contrato.

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15 Quando a nulidade é da licitação, essa induz à do contrato, e também deve ser garantido odireito de ampla defesa e do contraditório, conforme art. 49, caput e §§ 2º e 3º da Lei nº 8.666/93.

Essa comunicação se faz, como regra, após o atendimento do princípiodo contraditório. Embora inexista dispositivo a respeito, parece ser essa aúnica possibilidade, porque a sustação do contrato afetará obrigaçõescontraídas perante terceiros, muitas vezes não jurisdicionados aos Tribunaisde Contas, com os inerentes consectários. Entre esses, cabe apenas lembrarque, na atualidade, a anulação do contrato e até a sua rescisão, mesmo queseja por motivo de interesse público, obrigam a Administração Pública aobservar o princípio do contraditório e da ampla defesa.15

Muito se tem debatido se o Tribunal de Contas deve originariamenteassegurar o contraditório ao contratado, conforme o caso, ou se esse devercompete apenas ao órgão jurisdicionado que recebe a determinação parasustar, anular ou rescindir o contrato.

Após o advento da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, com maisênfase, parece prevalecer o primeiro entendimento, ou seja, deve o próprioTribunal assegurar a ampla e o contraditório. Desse modo, se analisa ocontrato, havendo indícios que possam levar a nulidade, deve o contratadotambém ser chamado ao processo, pela Corte de Contas.

Nesse sentido é o entendimento do Supremo Tribunal Federal,sintetizado na seguinte ementa:

EMENTA: I. Tribunal de Contas: competência: contratosadministrativos (CF, art. 71, IX e §§ 1º e 2º) O Tribunal de Contas daUnião - embora não tenha poder para anular ou sustar contratosadministrativos - tem competência, conforme o art. 71, IX, paradeterminar à autoridade administrativa que promova a anulação docontrato e, se for o caso, da licitação de que se originou. II. Tribunalde Contas: processo de representação fundado em invalidade decontrato administrativo: incidência das garantias do devido processolegal e do contraditório e ampla defesa, que impõem assegurar aosinteressados, a começar do particular contratante, a ciência de suainstauração e as intervenções cabíveis. Decisão pelo TCU de umprocesso de representação, de que resultou injunção a autarquia paraanular licitação e o contrato já celebrado e em começo de execuçãocom a licitante vencedora, sem que a essa sequer se desse ciência desua instauração: nulidade. Os mais elementares corolários da garantiaconstitucional do contraditório e da ampla defesa são a ciência dada aointeressado da instauração do processo e a oportunidade de se manifestar e

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produzir ou requerer a produção de provas; de outro lado, se se impõe agarantia do devido processo legal aos procedimentos administrativos comuns,a fortiori, é irrecusável que a ela há de submeter-se o desempenho de todas asfunções de controle do Tribunal de Contas, de colorido quase - jurisdicional.A incidência imediata das garantias constitucionais referidas dispensariamprevisão legal expressa de audiência dos interessados; de qualquer modo, nadaexclui os procedimentos do Tribunal de Contas da aplicação subsidiária da leigeral de processo administrativo federal (Lei nº 9.784/99), que assegura aosadministrados, entre outros, o direito a “ter ciência da tramitação dos processosadministrativos em que tenha a condição de interessado, ter vista dos autos(art. 3º, II), formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, osquais serão objeto de consideração pelo órgão competente”. A oportunidadede defesa assegurada ao interessado há de ser prévia a decisão, não lhe suprindoa falta a admissibilidade de recurso, mormente quando o único admissível é ode reexame pelo mesmo plenário do TCU, de que emanou a decisão.16

Não se deve olvidar, que há entendimento, em linha mais ortodoxa,no sentido de que atos absolutamente nulos prescindem de ampla defesa.17

O entendimento mais consentâneo com o novo ordenamento jurídico,porém, é o retratado no acórdão transcrito, fato que deve obrigar os Tribunaisde Contas a revisão de alguns procedimentos. De fato, a jurisprudênciareferida como mais ortodoxa não analisou a competência do Tribunal deContas, nem se contextualizou ao tema contratos e ao advento da Lei nº9.784/99, como faz o processo cuja ementa de acórdão foi transcrita.

Se a Administração Pública não atender a recomendação, o Tribunalde Contas não tem poder para sustar diretamente.

Entre a determinação do Tribunal de Contas e a promulgação dodecreto legislativo que susta o contrato, está a administração obrigada adeixar de executar ou pagar o contrato?

Certamente não, porque a decisão do Tribunal de Contas não évinculativa neste caso. Somente o decreto legislativo é que obriga o agentepúblico. Nessa linha de entendimento também é o escólio de Eros RobertoGrau.18

16 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MS 23550/DF. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília,04 de abril de 2001. DJ, 31 out. 2001. p. 00006.17 Ibid. RE 224283/SP. Relator: Ministra Ellen Grace. Brasília, setembro de 2001. DJ, 11 out. 2001.18 GRAU, Eros Roberto. Tribunal de Contas - Decisao - Eficácia. Parecer. Revista de DireitoAdministrativo. v. 210. out./dez. 1997. p. 351-356.

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19 Considerando ilegal a sustação direta pelo Poder Legislativo, sem a participação do Tribunalde Contas São Paulo. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Administrativo. Apelação nº008.825.5/1-SP. Relator: Desembargador Antônio Villen. São Paulo, 20 de janeiro de 1998.20 SUNDFELD, Carlos Ari. Pode o Legislativo sustar contrato administrativo (CF, art. 71, § 1º)sem a prévia decretação da ilegalidade pelo Tribunal de Contas?

Diante da recusa da Administração Pública, o Tribunal de Contasdeverá comunicar a recalcitrância ao Poder Legislativo, o qual passará adeter a prerrogativa de sustar o contrato.

Efetivamente, a competência para sustar contratos não integra oelenco daquelas definidas para o Poder Legislativo na Constituição Federal.Tem, porém, o direito-dever de exercê-la tão somente, após a recusa doórgão que recebe a recomendação do Tribunal de Contas. Não tem, dessemodo, competência originária para o exame de contratos, nem podeprescindir do formal exame técnico do Tribunal de Contas, nem a mesmasubsistirá se não houver recusa. Confirma-se aí, mais uma vez, que oTribunal de Contas não é órgão auxiliar do Poder Legislativo, mas,autônomo, na dicção do Supremo Tribunal Federal, e auxilia a função decontrole no Congresso Nacional.19

Ensina Carlos da Ari Sundfeld, com a argumentação lógica que o destaca:A fiscalização da regularidade dos contratos administrativos

é tarefa do Tribunal de Contas a quem compete - de modo exclusivo- determinar, ao órgão ou entidade, a adoção de providencias para aregularização da despesa. Somente após o esgotamento da ação daCorte de Contas, com a caracterização da ilegalidade não corrigida,é que o legislativo poderá agir, sustando o contrato irregular.20

Lembra, a propósito, que José Afonso da Silva obtempera ser essecontrole de natureza política, mas sujeito a prévia apreciação técnico-administrativa do Tribunal de Contas.

O ato de sustação pelo Poder Legislativo independe de nova e préviacomunicação, porque essa já foi feita pelo Tribunal de Contas e não acatadapela Administração Pública.

Por esse motivo, ao solicitar a sustação ao Poder Legislativo deve oTribunal de Contas remeter cópia da correspondência que foi enviadaanteriormente à Administração Pública, recomendando a sustação docontrato, posto que é um dos requisitos indispensáveis ao exercício dacompetência daquele.

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Quanto ao não atendimento da recomendação de sustação, poderáesse ser provado:

- pela manifestação escrita da autoridade requerida;- pela pratica de atos incompatíveis com o acatamento;- por provas coligidas pela inspeção ordenada pelo Tribunal de

Contas; ou- pela simples afirmação do Tribunal de Contas ao Poder Legislativo.21

Simultaneamente ao ato de sustação, cabe ao Poder Legislativo“solicitar, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis”.

A Constituição Federal coloca em seqüência a comunicação dirigidapelo Tribunal de Contas ao Poder Legislativo, visando sustar o contrato, asolicitação desse ao Poder Executivo para adoção de medidas cabíveis. Quemedidas serão estas? Seriam as de sustação? Óbvio que não, vez que, pelopróprio sentido lógico, descabem repeti-las.

Considerando que o Poder Legislativo e o Poder Judiciário tambémpodem firmar contratos administrativos, como explicar que a ConstituiçãoFederal tenha se referido a solicitação de medidas cabíveis apenas ao PoderExecutivo? A primeira vista, a restrição ao Poder Executivo parece indicarque o Tribunal de Contas só estaria cuidando de não atendimento dadeterminação pelo Poder Executivo. Ora, se pode haver recalcitrância porparte do executivo, também poderá ocorrer por parte dos demais poderes.Ademais, a expressão medidas cabíveis, aqui requeridas, não se refere àsustação do contrato pelo jurisdicionado, pois a norma superou essa etapa eagora cuida do não atendimento.

As “medidas cabíveis” aqui referidas, e o fato de serem dirigidas apenasao Poder Executivo, decorrem de que, embora os três poderes e os órgãosautônomos como o Ministério Público e o Tribunal de Contas possam firmarcontrato, fazem-no em nome do ente da esfera de governo a que se vinculam.

Assim, o Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, o faz em nomeda União, pessoa jurídica correspondente; a Assembléia Legislativa deum Estado, em nome desse; a Secretaria de Obras de um Município, emnome do Município.

21 Consultar FERNANDES. Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil. Jurisdição eCompetência. Fórum. 2003. Subtítulo 17.3.2.2.3., Capítulo II, sobre a prova de fatos negativos.

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Por isso, é indispensável que, por meio do órgão jurídico encarregadoda representação judicial da unidade, a entidade jurídica esteja apta a adotaras medidas complementares, como a prestação de contas do contrato, asações de indenização, o arresto de bens, a assunção da obra no estado emque se encontra.

Acresce ainda que embora os três poderes e órgãos autônomostenham competência para gerir recursos, as medidas cabíveis para defesa daFazenda são titularizadas stricto senso no Poder Executivo.

O Poder Legislativo tem o prazo improrrogável de noventa dias paraefetivar o ato de sustação e solicitar as medidas cabíveis simultaneamente.

O prazo, exageradamente longo, especialmente se estiver subjacentegrave lesão às finanças públicas - fato que justificaria o ato extremo dasustação -, não é em verdade, na prática, de apenas 90 dias, vez que sãocontados na forma do regimento interno das casas parlamentares. Contudoesse entendimento, não é o mais correto, vez que o destinatário do prazo éo Tribunal de Contas. Assim, embora aceitável em outros casos que o prazoseja contado na forma regimental, neste, especificamente, não prevaleceaquela regra contando-se o prazo dia a dia, tendo por termo inicial, dies aquo, a data de recebimento pelo respectivo poder.

Decorrido esse prazo sem deliberação, o Tribunal de Contasdecidirá a respeito.

Com esse comando, a norma desloca para o Tribunal de Contas acompetência para sustar o contrato, talvez muito tardiamente, numa tentativade estabelecer um sistema de freios e contrapesos.

Decidirá a respeito da sustação - que o Poder Legislativo não decidiu -e também das medidas que cabiam ao Poder Executivo adotar e não adotou.

É implícita a competência do Poder Legislativo para examinar aimpugnação.

E, se o Poder Legislativo decidir que o contrato não padece dosvícios apontados pelo Tribunal de Contas? Neste caso, a competênciado Tribunal de Contas para sustar não é reestabelecida porque oconstituinte só permitiu o retorno da competência diante da omissão,fruição in albis do prazo.

A sustação deve submeter-se ao princípio da legalidade.É evidente que o exercício da competência não se pode concretizar

com a ofensa às demais garantias do ordenamento jurídico.

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Assim, a sustação cautelar ou definitiva não pode afetar a garantiaconstitucional do equilíbrio econômico-financeiro que tem como termo aquo, ou seja, inicial, o da data da proposta.22 Tal garantia só não prospera seprovado que a conduta dolosa do contratado consistiu na elevação arbitráriados preços.23

Se a sustação tiver natureza cautelar e implicar o retardamento daexecução, o ato que altera o prazo dever ser justificado e publicado;24 seimplicar em desmobilização, o pagamento do custo correspondente para ocontratado, nos termos previstos no edital,25 se tiver natureza definitiva, asgarantias do art. 78, incs. XIV e XV e 79, da Lei nº 8.666/93.

Dada a complexidade de que se reveste a sustação de contrato e seusefeitos na órbita jurídica e econômica, o exercício dessa competência deveser concretizado com extrema parcimônia, avaliando-se os efeitos decorrentespara o erário e a sociedade.

5. Efeitos do exame pelo Tribunal de Contas

Um dos instrumentos jurídicos mais comuns para provocar o examejudicial dos atos administrativos é o mandado de segurança. É consabidoque para a concessão de liminar nessa ação, além dos pressupostosprocessuais de ordinário, exige-se adicionalmente: a razoabilidade jurídicana pretensão deduzida e o perigo de que a demora na prestação jurisdicionalfaça perecer ou tornar extremamente oneroso o próprio direito, comumentetraduzidos nas expressões fumus boni juris e periculum in mora. Se o Tribunalde Contas examinou o edital, o procedimento licitatório ou o contrato,considerando qualquer deles regular, certamente elimina-se um dospressupostos do mandado de segurança e até mesmo da concessão da liminar:o fumus boni juris. Isso porque o Tribunal de Contas ao proceder ao examevai muito além da legalidade: examina ainda a legitimidade e aeconomicidade, controles esses muitas vezes interditos ao exame judicial.26

22 BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Senado, 1988. Art. 37, inc. XXI.23 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, daConstituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública edá outras providências. DOU., 22 jun. 1993. Art. 96, inc. I.24 Ibid. Art. 40 inc. X c/c art. 78, inc. XVI.25 Ibid., art. 8º.26 Nesse sentido: Tribunal Regional Federal/1ª Região. AI 96.0112689-9/DF. DJ 04 jun.1996.

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27 BRASIL. Constituição Federal. Brasília : Senado, 1988. Art. 85, inc. VI.28 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil: Jurisdição e Competência. BeloHorizonte: Fórum, 2003, p. 45.

6. Princípios e diretrizes vetoriais da ação do controle sobre licitação

O tema licitação e contrato é bastante complexo. A norma reguladora,conquanto considerada inegavelmente um avanço como instrumento datransparência na gestão pública, possui mais de quinhentos dispositivos,se computados artigos, §§ e incisos, com deficiência na organização dasregras; os servidores públicos guiam-se por doutrinadores que aindadivergem em pontos substanciais; a jurisprudência do Poder Judiciário nãoé bem compreendida e a do Tribunal de Contas, ainda que abundante, nãoconsegue certa uniformidade nem mesmo atinge a todos os setores queoperam a norma. Some-se a isso a inexplicável e sistemática incompetênciana gestão da liberação das cotas financeiras do orçamento que concentra aentrega de recursos no final do exercício, sem que ninguém faça cumprir aConstituição Federal que considera tal ato como crime de responsabilidade.27

Por todos esses motivos, a atuação do controle deve impor-se comcerta parcimônia, admitindo-se à luz do princípio da aderência à diretrizes enormas que o gestor público acolha entre diversas teses juridicamenterazoáveis a que melhor agasalhe o interesse público.

6.1. Princípio da aderência a diretrizes e normas

Um dos princípios vetoriais da ação do controle é o da aderência adiretrizes e normas.28

Esse preceito norteia a ação dos agentes de controle de modo a buscaro fiel cumprimento das diretrizes de políticas públicas e acatamento de leise normas em geral.

Muitas vezes, o agente de controle é tentado a substituir-se aoadministrador, confundindo o desempenho de sua função. Ora, é bemprovável que um agente de controle seja capaz de encontrar solução melhordo que a que foi aplicada, até porque tem a vantagem de chegar após o fato,aferindo as causas e conseqüências da decisão.

Novamente aqui, há estreita correlação entre gerir e controlar, coroláriodo princípio da segregação das funções.

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Quando busca o fiel cumprimento das normas e diretrizes, o órgãode controle também tolera, por dever de lógica, um conjunto deinterpretações consideradas, juridicamente, razoáveis e ações que não tiveramo rendimento ótimo, por terem sofrido os efeitos de fatores razoavelmenteimprevistos.

A jurisprudência do Tribunal de Contas da União, órgão que constituio paradigma federal de controle, é, pois, nesse sentido:

a) tese inaugurada com brilhante voto do Ministro Ivan Luz sustentaque quando o Administrador age com base em parecer jurídicobem fundamentado, que adota tese juridicamente razoável, emprincípio, não pode ser condenado;29

b) a liberdade de gestão não está fora da ação do controle, que deveguiar-se também pelo princípio da razoabilidade. Em relação, porexemplo, a acordo judicial, submetido a exame do TCU, concluiu esteque ficou demostrada a pouca possibilidade de êxito, ensejando, pois,julgamento pela regularidade. Asseverou, no caso, o relator que aavaliação jurídica, realizada à época, apontava reduzidas possibilidadesde sucesso dos recursos interpostos pela Companhia, em virtude dedecisões pretéritas similares, prolatadas pelo Poder Judiciário;30

c) mesmo quando se trata de parecer encomendado pela AdministraçãoPública, os órgãos de controle procedem ao exame da tese sustentada,em respeito à possibilidade de interpretações divergentes. Por outrolado, os órgãos de controle não estão obrigados a acolher a tese,mesmo que subscrita por nomes de expressão;31

29 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº TC-25.707/82-5. Relator: Ministro IvanLuz. Brasília, DF, 11 de fevereiro de 1998. DOU, 19 jun. 1984. seção 1. p. 8791; Consulteainda CAMMAROSANO, Márcio. Da Responsabilidade de autoridades governamentais poratos que expedem tendo por suporte pareceres do judiciário. Informativo de Licitações e Contratos,Curitiba, v. 37, a. IV. mar. 1997. p. 228-230.30 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº TC-279.300/93-0. Acórdão nº 8/98.Relator: Ministro José Antonio Barreto de Macedo. Brasília, 11 de fevereiro de 1998. DOU,25 fev. 1998. seção 1, p. 45.31 Interessante notar que, neste caso, deveria subsistir o dever de verificar se foram atendidosos requisitos gerais de contratação de pareceristas, estabelecido na Lei de Licitações. É deverindeclinável dos órgãos de controle também verificar esse fato, que na maioria das vezes nãoapresenta singularidade para justificar a contratação de notórios especialistas. TCU. Processonº TC-625.127/95-1. Ata nº 58. Relator: Ministro Iram Saraiva. Brasília, 06 de dezembro de1995. DOU, 28 dez. 1995. seção 1, p. 2249.

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d) o Tribunal de Contas da União tem por regra não penalizar oagente quando adota, em questão ainda não definida em suajurisprudência, tese juridicamente razoável.32

6.2. Princípio da ampla defesa e do contraditório

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 assegura aos litigantes emprocesso judicial ou administrativo, e aos acusados em geral o contraditórioe a ampla defesa, com os meios e recursos e eles inerentes.33

O princípio do contraditório, comumente resumido na antiga parêmialatina - audiatur et altera pars -, consiste na obrigação, do Juiz, em razão doseu dever de imparcialidade, de ouvir a outra parte do processo sobre asalegações deduzidas por uma parte. Também é chamado de principio daaudiência bilateral.

Esse axioma dá sustentação a teoria geral do processo, e suainobservância acarreta a nulidade do ato, ressalvadas as exceçõesexpressamente admitidas em lei, como a medida liminar sem oitiva da parteadversa, que, por isso mesmo, constitui-se em instrumento restrito.

Com o descortino superior que lhe é peculiar, obtempera o Dr. JoãoBonifácio Cabral Jr. que, no Direito Comparado, em especial na doutrinaalemã, subjazem ao direito de defesa três outros direitos, quais sejam:

6.2.1. Direito de informação

Pelo qual se garante que o interessado, num processo administrativo,por exemplo, tenha acesso, a todas as informações relativas ao andamentoe aos atos do processo.34

32 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº TC-002.521/95-1. Decisão n°326/95. Relator: Ministro Homero Santos. Brasília, 12 de julho de 1995. DOU, 01 ago.1995. seção 1. p. 11513.33 BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Senado, 1988. Art. 5º, inc. LV.34 Controvérsias existem sobre a possibilidade de vistas fora do Tribunal de Contas pelo interessadoou seu advogado, regularmente constituído. Em sentido afirmativo: Supremo Tribunal Federal.Mandado de Segurança nº 22.314-6. Relator: Ministro Octávio Gallotti. Brasília, 05 de setembrode 1996. DJ, 07 fev. de 1997. p.01340 e Tribunal de Contas do Distrito Federal. Processo nº750/97-B. Relator: Conselheiro-Auditor Osvaldo Rodrigues de Souza. Brasília, 22 de abril de1997. DODF, 29 mar. 1997. p. 3033-3039.

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6.2.2. Direito de manifestação

Pelo qual se garante o direito do interessado de manifestar-se oralmenteou peticionando por escrito no processo.

Nos processos de auditoria é tradição que se reflete nas normasconceder ao auditado a oportunidade de discutir os achados de auditoria.35

A operacionalização da discussão se dá, inicialmente, pelo uso daNota de Auditoria contendo os pontos a serem analisados e esclarecidospelo auditado. Estes esclarecimentos devem ser prestados, igualmente,por escrito, sendo, no entanto, passível de discussão entre as partes, comvistas a obtenção de uma maior compreensão, de ambos, acerca dasquestões colocadas.

Ao fim da discussão, deve a equipe de auditoria ter em mãos osesclarecimentos prestados, formalmente, pela auditada acerca dos pontosimportantes a serem contemplados no relatório final.

6.2.3. Direito de ver suas razões consideradas

Vale dizer: no caso de uma auditoria, o Tribunal não está vinculadoa acatar como procedentes as razões de defesa; todavia, está obrigado, sobpena de nulidade, a considerar as razões de defesa, enfrentando-as, querpara acatá-las, quer, principalmente, quando for o caso, para mostrar,fundamentalmente na prova colhida na instrução, a improcedência ouinconsistência das mesmas.

Desafio relevante consiste em avaliar como os princípios da epígrafeafetam os diversos tipos de processos que estão submetidos ao plexo decompetência dos tribunais de contas.

O tema desafia a inteligência porque exige profundo conhecimentoda natureza das diversas funções que essas Cortes exercem e como, quandoe em favor de quem devem ser concretizados tais princípios.

35 Achados de auditoria são os desvios significativos identificados ao se comparar situaçõesreais com um critério de auditoria previamente definido. Estão pautados em fatos, atos ouinformações significativos, observados durante determinada auditoria. Para que os achadossejam considerados como tal as evidências ou provas de auditoria devem ser irrefutáveis eobjetivas, de modo a servirem de fundamento às conclusões do analista. In: Manual de AuditoriaIntegrada - Versão I. p. 33/42.

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6.3. Diretriz da definição de responsabilidade

A própria Lei definiu algumas responsabilidades que a jurisprudênciavem pouco a pouco reafirmando:

a) a responsabilidade por examinar e aprovar o edital é doórgão jurídico;

b) a responsabilidade por conduzir a licitação é da comissão de licitação,mas é permitido aos respectivos membros ressalvarem seuentendimento quando não concordarem com o dos demais membros,hipótese em que só responderão nos limites dos atos que praticarem;

c) compete a comissão de licitação verificar a compatibilidade dospreços das propostas36 com o preço praticado no âmbito daAdministração Pública;37

d) o ato de homologar a licitação, implica na verificação da correção dasetapas precedentes e atribui para o homologador a responsabilidadesolidária em relação a todos os atos homologados.

7. Conclusões

Sinteticamente, apresentam-se as seguintes conclusões, coligidas norumo da jurisprudência anotada.

Sobre licitação:

1a) o Tribunal de Contas pode sustar se não atendido, a execução doato licitatório quando impugnado;

2a) o Poder Legislativo não possui poder para sustar o ato licitatório,mas pode sustar o ato normativo que lhe dá suporte, como ocorre com aconcessão ou permissão de serviço público;

3a) o Tribunal de Contas pode solicitar edital para exame, mas não seexige aprovação prévia do Tribunal de Contas para a validade do ato.

36 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, daConstituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública edá outras providências. DOU, 22 jun. 1993. Art. 43, inc. IV.37 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, daConstituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública edá outras providências. DOU, 22 jun. 1993. Art. 15, inc. V.

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4a) o Tribunal de Contas pode ordenar a correção de edital e, nestecaso, os órgãos ficam obrigados a adotar as medidas corretivas determinadas;

5ª) a impugnação do ato pode decorrer de representação de licitante,contratado ou pessoa física ou jurídica e, independentemente dessa iniciativaos Tribunais de Contas podem solicitar para exame editais de licitação.

6a) a representação ao Tribunal de Contas deve ser fundamentada,indicando a irregularidade na aplicação desta Lei, mas o Tribunal de Contasnão fica adstrito aos motivos alegados;

7ª) para os Tribunais de Contas há uma faculdade de pedirdeterminado edital para exame. Não há previsão legal para determinar aremessa dos editais aos Tribunais de Contas; norma com esse teor fere oprincípio elementar de que a área fim (no caso, licitadora) não deve trabalharpara a área meio (no caso, controladora) e restaura o regime do registroprévio abolido pela Constituição de 1967. O Tribunal de Contas podepedir seja remetido determinado edital, mas falece competência parageneralizar a remessa.

8a) o fato do Tribunal de Contas solicitar edital para exame, não implicaa suspensão imediata do certame. Se o Tribunal de Contas não deliberaexpressamente a respeito, fica ao prudente arbítrio da autoridadeadministrativa suspender o certame para aguardar a decisão do Tribunal deContas ou não;

9a) qualquer cidadão é parte legítima para impugnar edital delicitação e, independente do exercício desse direito, pode representar aoTribunal de Contas.

10ª) o licitante que não impugna o edital tempestivamente perante aprópria administração, decai do direito de praticar esse ato perante aAdministração Pública e ficará prejudicado o exercício da faculdade previstano art. 113 da Lei nº 8.666/93.

Sobre contratos:

1ª) o efeito de sustação de um contrato pode implicar em medidapara o acatamento à Lei ou a rescisão, dependendo do caso concreto;

2ª) é necessário que o Tribunal de Contas, antes de sustar o contratodetermine ao órgão que adote diretamente as providências;

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3ª) o Poder Legislativo não detém essa competência de susutação.Passa a ter a competência somente diante da recalcitrância do gestor;

4ª) a competência do Poder Legislativo é transitória perdurando apenas90 dias; se não exercida, volta ao Tribunal de Contas que passará a deter acompetência plena para a sustação;

5ª) o Poder Legislativo pode no prazo de 90 dias discordar da decisãodo Tribunal de Contas e considerar regular o contrato, hipótese em que acompetência não é restituída ao Tribunal de Contas;

6ª) conforme assentou o Supremo Tribunal Federal, a deliberação doTribunal, ordenando à Administração a anulação, rescisão ou outra medidacarece da garantia da ampla defesa e do contraditório ao contratado.

Essas novas dimensões das competências do Poder Legislativo edo Tribunal de Contas revelam expressões do controle social exercitadospor órgãos idealizados pelo Constituinte para servir com eficácia eeficiência à sociedade.

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O IDEAL MUNICIPALISTA NO PENSAMENTO E NA AÇÃO DE

OSWALDO TRIGUEIRO DE ALBUQUERQUE MELO*

Flávio Sátiro FernandesConselheiro do Tribunal de Contas do Estado da Paraiba

Honra-me participar deste evento que o Centro Universitário de JoãoPessoa realiza, sob a inspiração do Professor José Octávio de Arruda Melo,com vistas a assinalar a passagem, este ano, do centenário de nascimento deOswaldo Trigueiro de Albuquerque Melo, com isso propiciando a suaparticipação, como instituição educativa que é, nas homenagens que se fazemà pessoa do inesquecível homem público que, como se sabe, foi um brasileiroque ilustrou a vida pública nacional, como Advogado, Político, Prefeito daCapital paraibana, Deputado Federal, Embaixador, Procurador Geral daRepública, Ministro e Presidente do Supremo Tribunal Federal, além demembro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). De 1946 a 1950 ele governoua Paraíba. Não digo que ele foi Governador, pois assim fazendo apenas lhedaria um título que pouco expressa a respeito de sua obra administrativa.Ele foi um administrador do qual se pode dizer que efetivamente governoua Paraíba. São poucos os nossos governantes dos quais se pode falar assim.E Oswaldo Trigueiro o fez com operosidade, sabedoria e honestidade.

Outras qualidades morais e intelectuais fizeram dele um nomerespeitável e admirável, também como escritor, historiador e causeur, quese podia ouvir com agrado e se pode ler com deleite. Conhecedor profundoda história paraibana na República Velha, deixou obra importante para oconhecimento daquela quadra da política estadual, intitulada, precisamente,“A Paraíba na Primeira República”. Ernani Sátyro, seu companheiro e amigo,que tinha também profundo conhecimento da história política do nossoEstado naquele período, disse-me, certa vez, que em tal matéria só respeitava

* Palestra proferida em 19 de maio de 2005, no “Seminário Política e Constituição”, realizadopelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ), nas comemorações do centenário de nasci-mento do Ministro Oswaldo Trigueiro de Albuquerque Melo.

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uma pessoa – Oswaldo Trigueiro. Como escritor, deixou o eminenteparaibano uma série de perfis histórico-literários, sobre vários brasileiros eparaibanos de suas relações ou do seu conhecimento. A leitura dessas páginasé não só importante como agradável, pelo estilo do autor e sua escorreitalinguagem. Por vezes um fio de ironia atravessa suas páginas. Isso me fazlembrar um cidadão que residiu por muito tempo em Patos e que costumavadizer: “Oswaldo Trigueiro é um sujeito jocoso”. Só muito tempo depoisvim compreender o significado e a extensão desse seu julgamento.

O saudoso filho de Alagoa Grande também pertenceu, com muita justiçae para grande desvanecimento de seus confrades, à Academia Paraibana deLetras, ocupando a cadeira que tem como patrono Epitácio Pessoa, que foi,aliás, um de seus perfilados no livro “A política do meu tempo”.

Ocupante de elevados cargos da República, em seus três poderes,Oswaldo Trigueiro não se mantinha em um pedestal e à distância dos seusamigos e dos seus conterrâneos. Ao contrário, cultivava a amizade sincera enão deixava de levar uma palavra de apoio e de estímulo aos mais moços.Senti isso e disso fui beneficiário, quando, em 1985, lancei meu livro HistóriaConstitucional da Paraíba. Sendo ele um dos personagens dessa história,mandei-lhe um exemplar, com breve dedicatória. Dias depois, recebi deleuma atenciosa missiva, datada de 5 de março de 1986, na qual o nossoilustre patrício manifestou a sua opinião sobre o trabalho. Peço licença edesculpas aos que me ouvem para ler uma passagem daquela carta. A citaçãoengrandece mais a ele do que a mim, pela mostra de simplicidade e dedespojamento que ele dá, preocupando-se em manifestar o seu pensamentosobre o trabalho de um modesto escriba provinciano.

Escreveu Oswaldo Trigueiro:Achei excelente esse seu livro e, sobretudo, muito bem

documentado. Sobre a deposição do primeiro Governador, VenâncioNeiva, a sua reconstituição é a melhor. Esse ponto sempre me pareceutanto ou quanto obscuro. Quando escrevi, de longe, A PARAÍBANA PRIMEIRA REPÚLICA, tive grande dificuldade em resumir oepisódio, com a possível fidelidade. Agora, bastará reler a parte inicialdo seu segundo capítulo.E prossegue:

O seu trabalho está escrito com a sobriedade própria dos bonsestudos históricos. É sério, objetivo e impessoal. Mas não esconde asimpatia com que se refere ao movimento democrático que, em 1947,

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me levou ao governo do Estado. É o que desejo agradecer, comomodesto participante daquele movimento.

Foi esse o Oswaldo Trigueiro que conheci, com sua sabedoria, suahonestidade, sua correção, sua simplicidade.

Uma das facetas mais marcantes e expressivas da personalidade e daatuação de Oswaldo Trigueiro é, sem dúvida, a de jurista. Digo uma dasfacetas porque são muitos os ângulos dos quais se pode observar suapersonalidade, sua inteligência, sua dedicação aos estudos. Na brilhantepalestra proferida neste mesmo Seminário, o Professor José Octávio deArruda Mello realçou a importância de Oswaldo Trigueiro como cultor dodireito e da história, além, evidentemente, da política, em cuja searaenveredou, alçando-se a cargos relevantes, como os de Prefeito da Capital,Governador do nosso Estado e Deputado Federal.

Cinjo-me, no entanto, à sua condição de jurista, pois quero, nessamesma condição ressaltar uma área em que ele atuou e que, creio, não foiainda lembrada nas diferentes promoções que se vêm fazendo em torno docentenário do seu nascimento.

Bacharelou-se ele, como sabem todos, aos dezenove anos, pela gloriosaFaculdade de Direito do Recife, integrando a turma de 1924, da qual faziamparte outros paraibanos, a exemplo de Ábdon Soares de Miranda, ÁlvaroGaudêncio de Queiroz, Antônio dos Santos Coelho, Argemiro de Figueiredo,Graciano Gonçalves de Medeiros, José Lins do Rego e José Marques daSilva Mariz. Turma rica, como se vê, em valores morais e intelectuais, pois,além do próprio Oswaldo Trigueiro, dela constavam dois nomes que seprojetariam no cenário nacional: um, na política, Argemiro de Figueiredo;outro, nas letras, José Lins do Rego.

Na área jurídica exerceu Oswaldo Trigueiro importantes cargos. Noinício da carreira, foi Promotor Público em Minas Gerais. Deixando essafunção rumou para o Rio de Janeiro, onde se dedicou à prática da advocacia.Um breve interregno o afasta do mister de advogado, para exercer o cargode Prefeito da Capital paraibana, a convite de seu amigo e colega de turma,Argemiro de Figueiredo, que governava a Paraíba. Demorando-se pouconesse cargo, retornou ao Rio de Janeiro, retomando suas atividades deadvogado. Integrou o Clube dos Advogados e compôs o conselho dirigenteda Ordem dos Advogados do Brasil, na condição de Secretário Geral.Tempos depois viria a ser Procurador Geral da República, Ministro do

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Tribunal Superior Eleitoral e, por fim, Ministro e Presidente do SupremoTribunal Federal.

Quero, aqui, restringir-me a um ramo do direito a que OswaldoTrigueiro se dedicou, qual seja, o direito municipal. Ele foi, sem dúvida, umestudioso do Município e um apaixonado pela causa municipalista. Tantoassim é que participou do IBAM – Instituto Brasileiro de AdministraçãoMunicipal, entidade dedicada ao estudo do Município e ao assessoramentode nossas comunas, nos diferentes aspectos de seu funcionamento.

São inúmeras as manifestações de preocupação de Oswaldo Trigueirocom o municipalismo, detendo-se no estudo do objeto do direito municipal,apontando seus problemas e buscando soluções para suas dificuldades.

Em três de suas obras, pôde Oswaldo Trigueiro tratar das questõesatinentes ao governo local: “O Regime dos Estados na União Americana”,“Problemas do Governo Democrático” e “Direito Constitucional Estadual”.No exercício do cargo de Governador do Estado, pôde empreender açõesque significaram a concretização de muitas das idéias e propostas queapresentou em diferentes ocasiões.

No trabalho “O Regime dos Estados na União Americana”, elaboradocomo dissertação para obtenção do título de Master em Ciência Política,nos Estados Unidos, estão inseridos dois capítulos intitulados O governolocal e O governo das cidades, nos quais essa instituição é abordada segundoas normas da legislação norte-americana, dando-nos uma visão profundado municipalismo naquele país.

Observa, de início, Oswaldo Trigueiro que o sistema de divisão eorganização das entidades de governo local é, basicamente, o do Governolocal inglês, adaptado às condições ambientais e modificadas pelaspeculiaridades do meio americano.

Os territórios dos Estados são divididos em áreas dotadas deorganização administrativa para fins de governo local.

Tais entidades são denominadas de County e correspondem aoMunicípio brasileiro. Os primeiros counties foram criados ainda no tempocolonial, quando se dividiu a Virgínia em oito circunscrições com o nomede counties ou shires.

Ao tempo em que Oswaldo Trigueiro escreveu sua dissertação, haviacerca de três mil counties, salientando o autor ser essa divisão básica oúnico traço uniforme em todo o país no tocante à organização do governo

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local. No que tange ao número, à área, à população média, à forma de governoe, principalmente, ao processo de sua subdivisão em entidades menores edistritos administrativos, os counties diferem de Estados para Estados.

Como no Brasil, o número de counties em cada Estado não éproporcional à área nem à população deste, variando muito os counties notocante a esses dois aspectos.

Eles se subdividem em entidades políticas semi-autônomas ou emdistritos administrativos de fins determinados. Em dois Estados – NewEngland e New York – os counties se subdividiam em towns; em dezesseisEstados do Centro-Norte, eles estavam subdivididos em distritosmeramente administrativos.

É de ressaltar que as áreas urbanas – cidades, vilas e boroughs – sãodotadas de governo próprio, de caráter autônomo. Porém, situadas dentrodos counties, essas áreas estão submetidas à jurisdição destes, em tudo queconcerne à sua competência administrativa.

As cidades americanas, por sua vez, são corporações de direito público,organizadas de acordo com a legislação de cada Estado, gozando de largaautonomia no que se refere à constituição de seu governo e no trato dosinteresses locais. Mas esse regime – salienta Oswaldo Trigueiro – não asafasta da autoridade do governo central do Estado e da jurisdição do county,no que diz respeito à esfera de competência de cada um.

O território do county está, portanto, geralmente, dividido em áreasurbanas e rurais. Embora as áreas urbanas sejam parte dos counties, estãosubmetidas a regra especial, largamente autônomas. As áreas rurais, porsua vez, ora são submetidas diretamente ao county, ora são subdivididasem entidades menores, dotadas de governo próprio, se bem que defunções rudimentares.

O county é, assim, a unidade geográfica divisionária do Estado e acidade é a área urbana submetida a regime especial. Vale salientar, porém,que há counties completamente rurais, não se encontrando nenhuma cidadeem seus limites. Há, por outro lado, counties em cujo território se achamsediadas dezenas de cidades e vilas. É o caso do county de Los Angeles, queabrangia, à época, nada menos de quarenta e cinco cidades autônomas.

O county é uma mera criação do Estado – diz Oswaldo Trigueiro – éuma mera criação de poder do Estado, que lhe delega a execução dedeterminados encargos. Embora não possua prerrogativas próprias de

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autonomia, na prática, contudo, a autonomia do county está mais ou menosassegurada pela força da tradição anglo-saxônica do self-government, e poralgumas garantias atribuídas ao seu regime legal, variando de Estado paraEstado sua forma de governo e sua esfera de competência.

Existem, como informa o autor, quatro tipos de county ,subordinados a diferentes formas de governo: a) o county do Sul e doOeste, que é a única entidade política de governo local e é governado porpequenos boards; b) o county de New England, inteiramente destituídode importância política e administrativa, ofuscado que é pelas townsautônomas; c) o county dividido em townships e governado por delegadosdestes; d) o county dividido em townships de expressão extremamenterudimentar e governado por boards de comissários.

Ao county cabem duas classes de atribuições: a) funções de carátergeral e de interesse do Estado, exercidas por delegação destes; b) funçõesadministrativas referentes a interesses e problemas meramente locais.

Entre as primeiras: a) execução dos serviços auxiliares da justiça; b) adireção do processo e do serviço eleitoral; c) a manutenção da ordem pública;d) o lançamento e a arrecadação de tributos fiscais; e) a execução dos serviçosde registros públicos. Ressalta Oswaldo Trigueiro, ainda, entre tais funçõesa de educação primária.

Entre as funções administrativas referentes a interesses e problemasmeramente locais: a) a manutenção de instituições de assistência à pobreza;b) a criação de escolas rurais; c) a construção e conservação de estradas ecaminhos vicinais. Com o correr do tempo, outras funções se juntaram aessas: hospitais, bibliotecas, parques rurais, serviços de saúde pública,conservação do solo, controle das inundações.

Observa Oswaldo Trigueiro, como características da organização dogoverno do county, duas circunstâncias principais: a) ausência de um agenteexecutivo individual, para a direção dos negócios administrativos e b) ausênciade integração dos vários serviços públicos.

Dedica-se Oswaldo Trigueiro, também, a um estudo abreviadodas towns e das townsships, circunscrições em que, por vezes, sesubdividem os counties.

Lembra, também, que em nenhum país a autonomia local deitou raízesmais profundas, assertiva da qual ouso discordar, como adiante falarei.Segundo ele, a tradição de governo próprio, a ausência de controle da parte

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do Estado, a vitalidade da vida política no seio das comunidades, deram aomunicipalismo americano uma força incontrastável e um papel da mais altaimportância no mecanismo das instituições.

Está claro – diz ele – que o governo local não é um governoindependente, desde que sua esfera de ações está limitada pela Constituiçãoe pelas leis estaduais, e seus atos estão sujeitos à revisão do poder judiciário.Mas, no que diz respeito ao controle administrativo ou ação direta do governodo Estado, as entidades municipais americanas são, de fato e de direito,integralmente autônomas.

Revela Oswaldo Trigueiro, no entanto, a tendência existente, no sentidode estabelecer certas formas de controle administrativo do Estado, comomeio de coibir os males decorrentes do excesso de autonomia. E cita comoexpedientes tentados ou adotados: a) a exigência de apresentação de relatóriosadministrativos; b) assistência técnica por parte do Estado; c) inspeçãoestadual dos serviços delegados aos governos locais, principalmente nocampo da educação e da saúde pública; d) subvenção em dinheiro paraserviços de cooperação, sob controle do Estado.

Observa, ainda, que esses expedientes são de caráter facultativo, uns,e tímidos e de alcance limitado, outros, adiantando, porém, que em algunsEstados já se permite uma ação mais direta sobre a administração municipal,a exemplo do poder do Governador de afastar de suas funções titulares decargos locais eletivos, à vista de acusações formais acompanhadas de provas.O autor diz que a medida é de alta violência para a mentalidade americanae, por isso mesmo, de aplicação muito rara. Outro setor em que se tentavauma supervisão mais efetiva seria o financeiro. No Estado de Indianna umacomissão foi criada para rever impostos e lançamentos dos governos locais,assim como controlar empréstimos que não poderiam ser superiores a cincomil dólares. No Estado do Novo México comissão foi instituída com poderesde rever e aprovar os orçamentos do governo local. No Estado da Carolinado Norte comissão idêntica foi criada para exercer efetivo controle sobre osempréstimos das cidades e dos counties, com poderes não só para reduzir oseu quantum como para decidir de sua oportunidade. E mais: tal comissãopoderia nomear interventor para gerir as finanças de qualquer governo localem manifesta insolvência.

O entendimento de Oswaldo Trigueiro é no sentido de que taismedidas já representam alguma coisa mas que ainda estão bem longe daquilo

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que os erros e males reclamam, em decorrência da falta de autoridade doGoverno estadual no campo da administração municipal.

Observa o saudoso paraibano que a organização do governo localamericano é o resultado de uma lenta formação histórica, sem obediência asistemas ou planos, inspirada unicamente na tradição e na experimentaçãoimposta pela necessidade de atender a novos problemas e novas condições.Disso tudo resultou – segundo Lancaster, citado pelo autor, uma situaçãocaracterizada “pelo inadequacy das unidades tradicionais, do ponto de vista desua área, da população, dos recursos fiscais e da organização interna do trabalho”.

Trigueiro chama, ainda, a atenção para “a diversidade absurda dediferentes governos municipais”. Se reside em área urbana – observa – ocidadão americano está sujeito ao governo da cidade, do county, do distritoescolar e muitas vezes de outros distritos administrativos, cada qual comsuas exigências fiscais. Se mora no campo, está sujeito ao governo do county,do township, do distrito escolar e de outros distritos, com a mesma dispersãode funções e a mesma multiplicidade de obrigações fiscais.

A solução do problema, segundo o autor, estaria em instituir umsistema mais racional e mais simples de divisão do território do Estado emunidades administrativas. Um tratadista, segundo ele, assim resumiu asmedidas a serem adotadas: a) criação de unidades de governo rural maioresem área do que as atuais; b) extinção de toda superposição de governosdiferentes sobre a mesma área; c) transferência para o Estado das funções eserviços de interesse geral.

Em alguns Estados, informa Oswaldo Trigueiro, providências nessesentido já foram tomadas. Na Virgínia, por exemplo, já se permitia, emdeterminados casos, a fusão dos governos do county e da cidade.

Diz, ainda, que no tocante à organização do governo local, as críticasnão são menos procedentes, nem menos numerosa. Os governosmunicipais – observa - são, sobretudo, agrupamento de funcionárioseletivos, no geral independentes uns dos outros e os serviços são dirigidospor boards autônomos, gerando tudo isso a dispersão de autoridade, adescoordenação funcional, a ausência de um chefe de executivo responsávele a morosidade, o caráter perdulário, negligência e ineficiência de correntesde conselhos numerosos.

A solução estaria em: a) criação de conselhos menores, para o governodos counties; b) extinção dos funcionários eletivos; c) controle estadual sobre

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a vida financeira, criação de um agente executivo do tipo do manager, jáexistente em numerosas cidades.

Tocante a estas, depois de algumas considerações sobre a origem dascidades norte-americanas, Oswaldo Trigueiro diz que, em meados do séculoXIX, como uma reação aos excessos da interferência legislativa na vidamunicipal, começou-se a pleitear que as cartas das cidades deviam ser obradelas próprias e não simples concessões das Assembléias estaduais. Já em1875, informa, a nova Constituição de Missouri prescrevia que qualquercidade, com população superior a cem mil habitantes, podia elaborar umaCarta para seu próprio governo. Quatro anos depois a Califórnia adotavaprocedimento semelhante. Em 1889, Washington outorgava esse poder aqualquer cidade de mais de vinte mil habitantes. Posteriormente outrosEstados aderiram à inovação.

Esse sistema, chamado de home rule, foi a extensão, segundo algunsautores, do federalismo ao campo municipal: assim como, dentro da União,os Estados gozam de autonomia bastante para organizar suas instituições, ascidades devem ser igualmente emancipadas do Estado, no que diz respeito àorganização de seus próprios governos. A equiparação, adverte OswaldoTrigueiro, não é verdadeira, pois a home rule não resulta de um direito inerenteàs entidades municipais, mas de simples concessão do Estado, que poderá,em teoria ao menos, revogá-la ou suprimi-la, à revelia do consentimento local.

Em todo caso, porém, a expressão home rule traduz-se por “governodoméstico” querendo significar o governo ditado pelas normas elaboradaspelo próprio ente. As cidades norte-americanas, portanto, gozam dessafaculdade de reger-se pelas normas por elas próprias elaboradas, as quaisconstituem a home rule.

Quanto à forma de governo das cidades, Oswaldo Trigueiro esclareceque, tradicionalmente, a forma de governo das cidades é aquela em que opoder é dividido entre um conselho legislativo e um agente executivo – omayor, eleitos por sufrágio popular. Outra forma de governo municipal éaquela em que o poder legislativo e o poder executivo estão concentradosem um só órgão – a comissão. Um terceiro modelo é o que adota a existênciade um city-manager, um executivo ou gerente dos negócios administrativos,nomeado pelo conselho em conjunto com o mayor.

Oswaldo Trigueiro menciona, também, o governo das vilas, o qualconstitui uma cópia simplificada do governo das cidades. O poder político

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é investido em um conselho de eleição popular, com atribuições legislativase a direção administrativa é confiada a um agente executivo, cuja designaçãooficial é diferentemente fixada nos vários estados. Adianta o autor que asfunções administrativas das vilas são naturalmente mais modestas que asdas cidades, e são exercidas com menor grau de autonomia.

Finalmente Oswaldo Trigueiro aborda a questão das regiõesmetropolitanas, entendendo-a como “a grande cidade e todas as localidadessatélites que vivem à sua sombra, e dependem de sua vida econômica”.

E observa:As áreas metropolitanas são, dessa forma, grandes

aglomerações urbanas e concentrações industriais que constituem,na realidade, unidades do ponto de vista social e econômico, emborano meio da maior diversidade de composição política. O fato de,sobre uma mesma área metropolitana, distribuírem-se numerososgovernos locais independentes, e descoordenados entre si, definepor si só toda a complexidade da administração pública em relaçãocom o problema. Embora ligados e fundidos num só aglomeradourbano, as cidades e vilas conservam, muitas vezes, seus limites egoverno próprios, em tal grau de confusão que transformam as áreasmetropolitanas em autênticas babéis de governo local.

Muitas das considerações mais amplas feitas no livro “O Regime dosEstados na União Americana” estão contidas no capítulo intitulado “Governoe administração das cidades americanas”, que consta da coletânea de artigos epalestras publicadas sob o título Problemas do Governo Democrático.

Muitas das informações e observações feitas pelo autor nas duas obrasantes aqui citadas, devem ser vistas com cautela, quanto à sua atualidade,vez que foram escritas há mais de sessenta anos e, conseqüentemente,somente um estudo in-loco e um conhecimento da bibliografiacontemporânea, poderiam ensejar o conhecimento exato do quadro quehoje se delineia naquele país tocante ao poder local e ao seu exercício.

Valem, contudo, as referências que aqui faço ao pensamento e àsobservações de Oswaldo Trigueiro sobre a matéria, para demonstrar a formaconscienciosa, cuidadosa e primorosa, como ele se dedicou ao conhecimentodo municipalismo norte-americano.

Outra obra em que Oswaldo Trigueiro se entrega ao estudo domunicipalismo, desta feita em sua versão brasileira é “DireitoConstitucional Estadual”, que veio a lume em 1980, pela Editora Forense.

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Em tal obra, todo um capítulo é dedicado ao Município brasileiro, desdesuas origens, na época colonial, regido pelas Ordenações Manuelinas epelas Ordenações Filipinas.

O autor faz um relato da evolução do municipalismo pátrio emsucessivas fases da vida política e institucional do Brasil, até a vigência daConstituição de 1967, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº1, tecendo breves considerações sobre as Câmaras Municipais, os Prefeitos,a competência tributária, as regiões metropolitanas.

Não alcança, porém, o livro a fase que podemos considerar áurea domunicipalismo brasileiro, que é a fase coeva, quando os Municípios brasileirossão considerados entes federativos, dotados de autonomia e regidos pelasLeis Orgânicas Municipais que são, segundo o espírito da Constituição emvigor, verdadeiras constituições municipais. Elas representam, sem dúvida,as home rule de que nos fala Oswaldo Trigueiro ao estudar oconstitucionalismo norte-americano.

As ligações de Oswaldo Trigueiro com o Municipalismo não tiveramsede apenas na sua bibliografia, nas suas palestras, nas suas conversas. Elasse manifestaram igualmente no seu governo, à frente do qual pôde exercitaruma prática municipalista, quando, por exemplo, enviou à AssembléiaLegislativa do Estado o anteprojeto da Lei Orgânica dos Municípios, com oqual ensejou àquela Casa o estudo, o debate e a decisão sobre a organizaçãode nossas comunas.

Também lhe coube enviar ao Poder Legislativo paraibano anteprojetode lei estabelecendo a divisão administrativa e judiciária do Estado,compreendendo 41 Municípios, 41 Comarcas e 177 Distritos.

Ainda como Governador, manifestou cuidado e preocupações com acausa dos Municípios paraibanos, conforme deixa expresso em suasmensagens à Assembléia Legislativa do Estado. No primeiro dessesdocumentos, quando ainda não se restaurara, plenamente, autonomiamunicipal em nosso país, informa:

Uma das primeiras providências do governo constitucionalempossado a 06 de março foi a de preencher os cargos de Prefeitosde todos os municípios, os quais se achavam vagos por exoneraçãodos respectivos titulares ainda na administração anterior.

A Secretaria do Interior expediu instruções aos novosprefeitos, dando-lhes a necessária orientação sobre o modo comodeve ser conduzido o governo municipal, nesta fase de transição

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para o regime de autonomia, recomendando-lhes que,inicialmente,procedessem ao exame e balanço da situação financeira.

Pelos relatórios enviados, verificou-se que todos os municípios,com exceção do de Mamanguape, se acham endividados e em condiçõesde sérias dificuldades para a execução de seus encargos orçamentários.

E adiante:As recomendações reiteradas pelo Governo aos responsáveis

pela administração dos Municípios são no sentido de uma políticade severa economia e compressão de despesas, com o fim depromover-se a imprescindível restauração financeira e de facilitar-sea pesada tarefa dos prefeitos a serem eleitos em outubro próximo.

Em outra mensagem, lida quando da abertura dos trabalhoslegislativos, em 1º de junho de 1949, diz que

É pensamento do Governo criar no Estado, de acordo com apermissão constitucional, um órgão incumbido de prestar assistênciatécnica aos municípios, quando solicitada, a qual consistirá na orientaçãodos Prefeitos e Câmaras Municipais, sobre assuntos relativos àadministração pública, à padronização orçamentária, à organizaçãodos serviços, à elaboração de planos de obras públicas e, finalmente,ao estudo dos problemas de interesse municipal ou regional.

Finalmente cabe relembrar como foi dito antes, que OswaldoTrigueiro de Albuquerque integrou o Instituto Brasileiro de AdministraçãoMunicipal (IBAM), o que demonstra, mais uma vez, o seu envolvimentocom a causa municipalista.

A conclusão que eu, particularmente, extraio das páginas de OswaldoTrigueiro é, curiosamente, diversa da que ele proclamou, ao dizer, em relaçãoao municipalismo norte-americano, que “em nenhum país a autonomia localdeitou raízes mais profundas”. Eu digo, ao contrário, que em nenhum outropaís o municipalismo arraigou-se tanto quanto no Brasil, haja vista aimportância que já no período anterior à Independência as nossas CâmarasMunicipais alcançaram, participando, ativamente, da vida política da Colônia.Essa importância era tão significativa que, ao outorgar a Carta do Império,e visando à legitimação da outorga, o Imperador Pedro I, convocou asCâmaras Municipais a se manifestarem sobre a Constituição dada por ele aoEstado nascente. Além disso, diferentemente do que ocorre naquele País,onde o disciplinamento do governo local é deixado, inteiramente, aos Estados,através de suas Constituições e leis ordinárias, entre nós, o Município sempretem sido objeto de tratamento mais prestigioso, ou seja, as próprias

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Constituições Imperial e Republicanas definiram, cada uma a seu modo, aslinhas mestras do governo local, dando-lhe inclusive, a partir da de 1936,garantias para preservação de sua autonomia.

Em que pese as inconstâncias do nosso ordenamento político einstitucional, fazendo depender a autonomia municipal do humor políticodos nossos regimes, o ideal municipalista, entre nós, tem buscado sempre ofortalecimento das nossas comunas, através do crescimento de suaautonomia. E se, por vezes, o sistema democrático claudica, abrindo umhiato na vida autonômica de nossos Municípios, quando a democracia serestaura o Município ressurge mais forte e com a sua autonomia ampliada.

Assim se deu em 1934, em 1946 e, sobretudo, em 1988, com aConstituição Cidadã. Foi esta que deu aos Municípios o poder de elaborarsua própria organização através de Lei Orgânica Municipal, que é a suaconstituição ou, na expressão americana, a sua home rule. Foi a Constituiçãoatual que deu, também, aos Municípios a condição de ente integrante daFederação brasileira, concretizando aquilo que era pleiteado pelosmunicipalistas e pelos estudiosos do direito municipal, Hely Lopes Meirellesà frente, o qual criticava a timidez dos nossos constituintes que não tinhama coragem de proclamar essa verdade que ressaltava diante dos fatos e dasevidências da vida institucional do país. É ainda sob a égide da Carta Políticaem vigor que os Municípios vêm recebendo a cada dia mais encargos, o querevela sua importância no quadro federativo brasileiro, embora, a par dissose vejam crescer os problemas que os afligem, ditados pela escassez derecursos e pela ação deletéria de maus administradores. Tais problemas,porém, como outros que existem, não decorrem, como é fácil ver, domunicipalismo em si, mas de fatores a ele estranhos.

Chegado a este ponto, cabe-me, apenas, dizer que espero me terdesincumbido a contento da missão que me foi solicitado desempenhar,neste Seminário com que o Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ)comemora o centenário de nascimento de Oswaldo Trigueiro de AlbuquerqueMelo e agradeço a paciência com que todos me ouviram.

Muito obrigado.

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OS RESTOS A PAGAR DE FINAL DE MANDATO

José de Ribamar Caldas FurtadoConselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão

Desde a implantação no País do denominado regime de Gestão FiscalResponsável, uma questão tem atormentado os intérpretes da Lei deResponsabilidade Fiscal - LRF (Lei Complementar nº 101/00), bem comodo Código Penal, com as alterações da Lei nº 10.028/00. Afinal, o gestorpúblico, no último ano do mandato diante da existência de despesaempenhada e liquidada, mas sem suficiente provisão de caixa para pagá-la,se inscrever tal empenho em restos a pagar, cometerá infração em face daLRF? Incorrerá ou não, em crime contra as finanças públicas?

O ponto de partida para a compreensão do problema é o exame daconcepção dessas duas leis. O projeto de lei complementar, que resultouna LRF, previa duas regras com o objetivo de garantir o equilíbrio entrereceitas e despesas públicas:

a) impedia a inscrição de despesa em restos a pagar sem reservanecessária de disponibilidade de caixa;

b) vedava, no último ano do mandato, que se contraísse obrigaçãode despesa que não pudesse ser paga dentro do exercício financeiro.

Por outro lado, o Projeto de Lei nº 621/99, que originou a Lei nº10.028/00, trazia a tipificação de três condutas relacionadas com o déficitnas contas públicas:

a) inscrever em restos a pagar despesa que excedesse limiteestabelecido em lei;

b) contrair obrigação, no último ano do mandato ou legislatura,cuja despesa não pudesse ser paga no mesmo exercício financeiro;

c) deixar de promover o cancelamento do montante de restos a pagarinscrito em valor superior ao permitido em lei.

Estava, assim, idealizado o cerco contra o desequilíbrio fiscal. Sucede que o art. 31, § 2º, do projeto de lei complementar, o qual

estabelecia que, no encerramento do exercício financeiro, o montante das

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inscrições em restos a pagar ficaria limitado, em relação a cada um dosPoderes, de cada ente da Federação, ao valor resultante da soma do saldo dadisponibilidade financeira do respectivo Poder, existente no último dia útildo exercício, foi substancialmente alterado no Poder Legislativo. O textorelativo à matéria aprovado no Congresso Nacional estabelecia (art. 41, I),em resumo, que seriam inscritos em restos a pagar todas as despesaslegalmente empenhadas e liquidadas, mas não pagas no exercício, ficandocondicionadas à existência de suficiente contrapartida de disponibilidade decaixa apenas as despesas empenhadas e não liquidadas (§ 2º).

Levado o texto à sanção presidencial, o art. 41 foi vetado sob oargumento de que:

o sentido original da introdução de uma regra para Restos aPagar era promover o equilíbrio entre as aspirações da sociedade eos recursos que esta coloca à disposição do governo, evitando déficitsimoderados e reiterados. Neste intuito, os Restos a Pagar deveriamficar limitados às disponibilidades de caixa como forma de nãotransferir despesa de um exercício para outro sem a correspondentefonte de despesa. A redação final do dispositivo, no entanto, nãomanteve esse sentido original que se assentava na restrição básica decontrapartida entre a disponibilidade financeira e a autorizaçãoorçamentária. O dispositivo permite, primeiro, inscrever em Restosa Pagar várias despesas para, apenas depois, condicionar a inscriçãodas demais à existência de recursos em caixa. Tal prática fere oprincípio do equilíbrio fiscal, pois faz com que sejam assumidoscompromissos sem a disponibilidade financeira necessária para saldá-los, cria transtornos para a execução do orçamento e, finalmente,ocasiona o crescimento de Restos a Pagar que eqüivale, em termosfinanceiros, a crescimento de dívida pública. (transcrito do original).

Registre-se que o veto presidencial foi mantido no Poder Legislativo.Sobreviveu o art. 42 da LRF vedando ao gestor público, nos últimos

dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que nãopossa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serempagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixapara este efeito. Cabe assinalar que, no projeto original, tal proibição seestendia a todo o exercício financeiro referente ao último ano do mandato(art. 31, §4º).

Desse modo, a Seção VI – Dos Restos a Pagar – do Capítulo VII daLRF ficou apenas com art. 42, já que o art. 41, que disciplinava a inscriçãoem restos a pagar, foi vetado.

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Entretanto, a Lei nº 10.028/00 foi aprovada, e o Congresso Nacionalnão retirou as restrições referentes à inscrição em restos a pagar sem suficienteprovisão de caixa presentes no projeto de lei encaminhado pelo PoderExecutivo. Desse modo, o Código Penal passou a contar com o art. 359-B,que proíbe que se ordene ou autorize a inscrição em restos a pagar, dedespesa que não tenha sido previamente empenhada ou que exceda limiteestabelecido em lei, e com o art. 359-F, que pune o fato de se deixar deordenar, de autorizar ou de promover o cancelamento do montante de restosa pagar inscrito em valor superior ao permitido em lei.

O problema reside no fato de o Código Penal ter condicionado aeficácia dos arts. 359-B e 359-F à existência de limite estabelecido emlei. Resulta, então, a dúvida: pode-se extrair do ordenamento jurídicobrasileiro esse valor permitido em lei? Está-se, nesse caso, diante denorma penal em branco?

Tratando-se de aplicação de Direito Penal, existe o apego ao empregoliteral da lei. Daí pode-se argumentar que, se a LRF não trouxe expressamenteesse limite fixado – pelos motivos acima relatados –, os arts. 359-B e 359-Fdo Código Penal não podem incidir, estando com sua eficácia suspensa atéque lei determine literalmente esse valor.

No entanto, não se pode negar que a inscrição em restos a pagar, semcobertura financeira, afronta o princípio do equilíbrio orçamentário, que foio grande mote da LRF e está espraiado em todo o seu texto.

Logo no art. 1º, § 1º, da LRF, que fixa o conceito de responsabilidadena gestão fiscal, constata-se que o novo regime pressupõe a ação planejadae transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes deafetar o equilíbrio das contas públicas. Além disso, estabelece que a lei dediretrizes orçamentárias disporá sobre o equilíbrio entre receitas e despesas(LRF, art. 4º, I, a). Ainda em favor do equilíbrio fiscal, fixa regras rígidaspara as previsões de receita (art. 12), restringe a concessão de renúncia dereceita (art. 14), e disciplina a geração de novas despesas (arts. 15, 16, 17,21, 24). Como se vê, a LRF está sempre voltada a combater o déficit público.

Agora cabe uma análise apurada nos termos do art. 42 presente naLRF. Lá está dito que é vedado ao agente público, nos últimos doisquadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possaser paga integralmente dentro dele. Pergunta-se então: em que momento sepode considerar consumado o ato de contrair obrigação de despesa? Acredita-

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se que tal ato só estará perfeito e acabado quando ocorrer a liquidação dadespesa,vale dizer, quando acontecer a verificação do direito adquirido pelocredor, na forma do art. 63 da Lei nº 4.320/64. No decorrer das fases anteriores– licitação, contrato e empenho –, o poder público pode desistir do dispêndio,em face do princípio da supremacia do interesse público. Isso produziria,para efeitos criminais, a denominada desistência voluntária (Código Penal, art.15). Assim sendo, é bastante improvável que uma despesa pública seja liquidadaaté abril de um ano para ser paga no exercício subseqüente - principalmentese tratando de fim de mandato -, hipótese em que se escaparia do prazo dedois quadrimestres previstos no artigo acima mencionado.

Portanto, vê-se que, nesse dispositivo, a lei tenta impedir o déficitfiscal na sua origem, ou seja, na ocasião do aparecimento da obrigaçãolíquida, certa e exigível que não pode ser paga até o final do mandato.Nesse sentido, J. Teixeira Machado Jr. e Heraldo da Costa Reis, comentandoo art. 42 da LRF, observam que “em realidade é uma questão deprogramação de caixa, cujo objetivo é o de manter os seus níveis comsuficiência para atender a essas obrigações”1. Nessa programação, serãoconsiderados, na determinação da disponibilidade de caixa, os encargos edespesas compromissadas a pagar até o final do exercício (LRF, art. 42,parágrafo único).

É importante lembrar que os recursos legalmente vinculados àfinalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objetode sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer oingresso (LRF, art. 8º, parágrafo único). Por isso, a disponibilidade de caixaconstará, na escrituração das contas públicas, de registro próprio, de modoque os recursos vinculados a órgão, fundo ou despesa obrigatória fiquemidentificados e lançados de forma individualizada (LRF, art. 50, I).

Como corolário, tem-se que os fluxos financeiros elaborados até ofinal do exercício, para efeito de se apurar a capacidade de pagamentonecessária para que se possa contrair novas obrigações de despesa, dentrodos oito últimos meses do mandato, devem ser feitos isoladamente, ou seja,um para cada natureza de recurso, sendo que os saldos deles não se podemcompensar. Diga-se, ainda, que essa programação financeira deve ser feita

1 MACHADO JR., José Teixeira, REIS, Heraldo da Costa. A Lei 4.320 comentada. 30. ed. Rio deJaneiro: IBAM, 2000/2001, p. 137.

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por cada um dos Poderes e órgãos referidos no art. 20 da LRF. Eis oplanejamento exigido pelo regime de Gestão Fiscal Responsável.

Ressalte-se a relação de causa e efeito entre o ato de contrair obrigaçãode despesa que não possa ser paga e a inscrição em restos a pagar semsuficiente provisão de caixa. Pode-se até falar em excesso de zelo do projetooriginal a LRF para com o equilíbrio fiscal quando se pretendia considerarcomo infração duas situações intrinsecamente correlacionadas, quais sejam,contrair obrigação de despesa sem previsão de pagamento (causa) e inscreverem restos a pagar sem a correspondente reserva financeira (efeito).

A relação da conduta descrita no art. 42 com a má inscrição em restosa pagar está expressa na própria LRF, quando coloca tal artigo na Seção VIdo Capítulo VII – DA DÍVIDA E DO ENDIVIDAMENTO – intituladaDOS RESTOS A PAGAR.

Desse modo, pode-se dizer que os elementos históricos presentes naformulação da LRF, bem como sua interpretação lógico-sistemática,conduzem à idéia de que não é possível o gestor público, nos últimos doisquadrimestres do seu mandato, inscrever despesas em restos a pagar semsuficiente provisão de caixa. Aliás, a aceitação de tal prática negaria toda afinalidade da LRF.

Bom, se não é possível inscrever despesas em restos a pagar nessascondições, como ficaria a situação do fornecedor de bens ou serviços que,de boa fé - mas nessa situação -, negociou com o ente da Federação? Nahipótese de persistir o interesse do poder público ou o direito do credor, adespesa será regularmente orçada e empenhada no exercício subseqüente àconta da rubrica DESPESAS DE EXERCÍCIOS ANTERIORES (Lei nº4.320/64, art. 37). Desse modo, fica preservado o equilíbrio nas contaspúblicas. Assim, a LRF quer também que aqueles que contratam com ogoverno atuem como fiscais da aplicação do dinheiro público no último anodo mandato do governante. Nessa época, por força do período eleitoral, apropensão a gastos imoderados tende a crescer.

Na prática, não será possível a aplicação simultânea dos arts. 359-B,359-C e 359-F do Código Penal contra o mesmo agente (hipótese quepoderia ocorrer no caso de Prefeito reeleito, por exemplo). Isso porque ascondutas descritas em tais dispositivos são dependentes umas das outras,representando verdadeiro encadeamento de fatos. Nesse caso, aplica-se asanção mais grave. É o princípio da consunção.

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Pelo exposto, entende-se que o operador do direito pode, por váriosargumentos de interpretação da LRF, concluir que os termos do art. 42 daLRF servem para indicar o valor permitido em lei, a que se referem os arts.359-B e 359-F do Código Penal.

Como se não bastasse toda essa complicação, a Secretaria do TesouroNacional (STN) editou a Portaria nº 447, de 13 de setembro de 2002, emque define regra segundo a qual, por ocasião do encerramento de cadaexercício, o beneficiário de transferência intergovernamental, observandoo roteiro contábil contido no quadro anexo à citada portaria, devecontabilizar os Restos a Pagar registrados pela União – relativos a tributosjá arrecadados e que comporão transferências constitucionais no anoseguinte - como RESTOS A RECEBER (ATIVO FINANCEIRO) emcontrapartida a TRANSFERÊNCIAS INTERGOVERNAMENTAIS(RECEITAS). O neologismo RESTOS A RECEBER desafia o regime decaixa imposto para a contabilização das receitas públicas, segundo o art.35, I, da Lei nº 4.320/64.

Em conseqüência, no final do ano de 2004, a Gerência de Apoio àsRelações Federativas (GEARF), pertencente à Coordenação-Geral deOperações de Crédito de Estados e Municípios (COPEM), integrante daSecretaria do Tesouro Nacional (STN), emitiu um comunicado, que nãotem número nem data, segundo o qual:

com vistas ao cumprimento do disposto na Portaria nº 447,de 13 de setembro de 2002, publicada no DOU de 18/09/2002,informamos que o repasse dos Fundos de Participação a ser creditadono dia 10 de janeiro de 2005 deverá ser contabilizado como receitaorçamentária do exercício de 2004 (grifou-se).

O fato curioso é que o mesmo órgão da STN, intitulado COPEM,através do Boletim – Ano VIII, nº 12, p.1, de dezembro de 2003, assinala que:

com vistas ao cumprimento do disposto na Portaria nº 447,de 13 de setembro de 2002-DOU de 18/09/2002, informamos queo repasse dos Fundos de Participação creditado no dia 09 de janeiro de 2004deverá ser contabilizado como receita do exercício de 2004”(grifou-se).

Como se depreende, a COPEM repete os termos nas duasinformações, mas utiliza critérios diferentes e contraditórios.

Pode-se concluir que, pelo conjunto da obra, a posição da COPEM/STN afronta expressamente dois dispositivos da Lei nº 4.320/64. O art. 34diz que o exercício financeiro coincidirá com o ano civil (1º de janeiro a 31

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de dezembro). Mas, para aquele órgão, o ano de 2004 teve 366 dias para osMunicípios empenharem despesas e 376 dias para arrecadarem receitas. Oart. 35, I, determina que pertencem ao exercício financeiro as receitas nelearrecadadas (regime de caixa). Aquele órgão, porém, informa aos Municípiosque devem contabilizar o repasse dos Fundos de Participação creditado nodia 10 de janeiro de 2005 como receita orçamentária de 2004, tendo comocontrapartida uma tal conta RESTOS A RECEBER (sic), supostamenteconstante do ATIVO FINANCEIRO. Esse registro contábil só faz sentidoquando se trata do regime de competência, segundo o qual as receitas sãocontabilizadas não em função da arrecadação, mas do fato gerador.

Pior que os arroubos da COPEM/STN, foi o estardalhaço promovidopelas Federações de Municípios de todo o País que, confundindo osdenominados valores a receber com disponibilidade de caixa, orientaram osPrefeitos, com mandato em 2004, a inscrever empenhos em restos a pagaraté o limite dos repasses das transferências constitucionais a seremcreditados no dia 10 de janeiro de 2005.

Espera-se que os Tribunais de Contas, órgãos responsáveis pelo controleexterno das contas públicas, e o Ministério Público, como fiscal da lei, tomemprovidências no sentido de rechaçar os malsinados atos da COPEM/STN.

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A TRANSPARÊNCIA NA GESTÃO FISCAL

José de Ribamar Caldas FurtadoConselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão

Com a edição, em maio de 2000, da Lei Complementar nº 101/00 –intitulada de Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – o Brasil passou aexperimentar um novo regime de administração dos recursos públicos,denominado de Gestão Fiscal Responsável, que está assentado em três pilares:o planejamento, a transparência e o controle das contas públicas.

Como instrumento para se chegar ao equilíbrio das contas públicas,que na realidade foi o grande mote da Lei de Responsabilidade Fiscal, onovo regime impõe o planejamento na gestão dos recursos públicos. Aliás,é incrível que neste País se tenha que publicar uma lei para exigir oplanejamento na administração pública. Afinal, os idealizadores da EscolaCientífica da Administração -Taylor e Fayol -, no Século XIX, já apregoavamo planejamento como etapa primeira e necessária para uma boa administração.

Prescrever também, por via de lei, a transparência nas contas públicasé algo que deveria ser desnecessário. O dever de prestar contas de formatransparente é da própria natureza do ato de administrar recursos alheios.Por essa, e por outras razões, pode-se dizer que a LRF trata do óbvio.

O terceiro pilar é o controle das contas públicas, que deve ser efetuadoem várias instâncias: pelo Tribunal de Contas, Ministério Público, PoderLegislativo, Controle Interno e pela sociedade organizada. Enfim, por todosos cidadãos e de forma contínua.

Ninguém, neste País, pode negar a origem alienígena da Lei deResponsabilidade Fiscal. Entretanto, não se pode colocar o pagamento dadívida externa e o controle das contas públicas em pólos antagônicos.Ressalte-se, inclusive, que as questões a serem resolvidas com os credoresinternacionais do Brasil devem ser tratadas no âmbito da Política Econômicae do Direito Internacional e não do Direito Financeiro.

Em se tratando de controle social da administração pública, é noTexto Constitucional que se encontram seus fundamentos. São vários osdispositivos espraiados na Constituição Federal que fomentam a iniciativa

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popular. Logo no caput do art. 1º, o exercício da cidadania é apontadocomo uma das bases do Estado Democrático de Direito que constitui aRepública Federativa do Brasil. O parágrafo único desse artigo expressaque todo poder emana do povo, que o exerce diretamente ou por meio derepresentantes eleitos.

Além disso, consta que a soberania popular será exercida medianteiniciativa popular (art. 14, III). No âmbito municipal, é possível a iniciativapopular de projetos de lei de interesse específico do Município, da cidade oude bairros, através de manifestação de, pelo menos, cinco por cento doeleitorado (art. 29, XIII). O princípio da publicidade é fixado como elementoda administração pública brasileira. Ficaram também consagrados os direitosde petição contra ilegalidade ou abuso de poder (art. 5º, XXXIV), o direitode receber dos órgãos públicos informações de interesse particular, ou deinteresse coletivo ou geral (art. 5º, XXXIV, a). Determina o § 3º do art. 31que as contas dos Municípios ficarão 60 (sessenta) dias, anualmente, àdisposição de qualquer contribuinte, para exame e apreciação, o qual poderáquestionar-lhes a legitimidade. É facultado a qualquer cidadão o direito dedenunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas (art.74, § 2º), bem como propor ação popular que vise a anular ato lesivo aopatrimônio público (art. 5º, inciso LXXIII).

No plano infraconstitucional, o Estatuto das Cidades (Lei nº10.257/01), art. 4º, III, f, fixa a gestão orçamentária participativa comoinstrumento da política urbana.

Não foi à toa que o controle social da administração pública mereceuas bênçãos do Papa João Paulo II. Apregoa o Sumo Pontífice que “a Igrejaencara com simpatia o sistema da democracia, enquanto assegura aparticipação dos cidadãos nas opções políticas e garante aos governados apossibilidade quer de escolher e controlar os próprios governantes, quer deos substituir pacificamente, quando tal se torne oportuno” (JOÃO PAULOII. Centesimus annus. 46. Internet: http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_01051991_ centesimus-annus_po.html – 29/11/2004).

Pode-se dizer, enfim, que o controle do cidadão sobre os gastos públicosderiva do próprio Direito Natural. Ressalte-se que a Declaração dos Direitosdo Homem e do Cidadão de 1789, art. 15, definiu que a sociedade tem odireito de pedir contas a todo agente público de sua administração.

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Não obstante, o tema transparência fiscal só ganhou importância noPaís com a publicação na LRF. A Lei dedica a Seção I do Capítulo IX aoassunto (arts. 48 e 49) e já no art. 1º, § 1º, preceitua que a responsabilidadena gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente em que se previnemriscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio nas contas públicas.

Os instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais deve serdada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público(Internet), estão elencados no art. 48, caput: o plano plurianual, a lei dediretrizes orçamentárias, a lei orçamentária anual, as prestações de contas eo respectivo parecer prévio, o relatório resumido da execução orçamentáriae o relatório de gestão fiscal.

O plano plurianual (PPA), aprovado formalmente através de lei editadano primeiro ano do mandato do Chefe do Executivo, consubstancia oplanejamento de longo prazo elaborado pela administração pública para osinvestimentos a serem realizados nos próximos quatro anos. A lei de diretrizesorçamentárias (LDO), que tramita na Casa Legislativa no primeiro semestrede cada ano, tem a função de orientar a elaboração da lei orçamentária anual,dispondo sobre as metas e prioridades da administração pública e elegendoos investimentos que serão executados no exercício financeiro subseqüente.A lei orçamentária anual (LOA), que deve guardar conformidade com oPPA e com a LDO, tramita no Poder Legislativo no segundo semestre decada ano, estima a receita e fixa a despesa para o ano seguinte. É o projetoorçamentário do Poder Público a ser executado no exercício financeirovindouro. O relatório resumido da execução orçamentária, que por força daConstituição Federal, art. 165, § 3º, deve ser publicado até trinta dias após oencerramento de cada bimestre, representa um levantamento parcial do quejá foi executado do projeto orçamentário para o ano em curso, ou seja,espelha as receitas arrecadadas e despesas incorridas até o bimestre a que serefere. O relatório de gestão fiscal, que deve ser publicadoquadrimestralmente pelos titulares dos Poderes e órgãos públicos, é criaçãoda LRF e serve de instrumento de controle dos limites de gastos, impostospela mencionada lei, no que tange à despesa com pessoal, endividamentopúblico e concessão de garantias.

Um marco importante da LRF foi a institucionalização do chamadoorçamento participativo. O parágrafo único do art. 48 dispõe que atransparência será assegurada mediante incentivo à participação popular e

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realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e dediscussão do PPA, da LDO e da LOA. A Lei quer que tal experiência,praticada apenas em alguns municípios brasileiros, em face da ideologia dopartido político à frente do Poder Executivo, se estenda a todos.

Se a participação popular na elaboração dos projetos orçamentáriosestá albergada na nova ordem jurídica, a LRF vai além quando determinaque até o final dos meses de maio, setembro e fevereiro, o Poder Executivodemonstrará e avaliará o cumprimento das metas de receita, despesa emontante da dívida pública de cada quadrimestre, em audiência pública nacomissão de orçamento da Casa Legislativa (art. 9º, § 4o). É a possibilidadedo acompanhamento direto pelo povo da execução do orçamento.

Quanto à indicação das prestações de contas e o respectivo parecerprévio como instrumento de transparência da gestão fiscal, dispõe a LRFque as contas apresentadas pelo Chefe do Poder Executivo ficarãodisponíveis, durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e noórgão técnico responsável pela sua elaboração, para consulta e apreciaçãopelos cidadãos e instituições da sociedade (LRF, art. 49). Essa vontade daLRF vai ao encontro da Constituição Federal, art. 31, § 3º, acima mencionado.

Sabe-se que, na tramitação da LRF no Congresso Nacional, o aspectomais difícil de ser negociado foi exatamente o que diz respeito à transparênciafiscal. Se foi assim na concepção da lei, tem sido também dessa forma noseu cumprimento. Os gestores públicos resistem ao ter que obedecer ao art.49 da LRF. Mas, por quê? Por que será que os gestores públicos, salvoexceções, insistem em esconder suas contas? Pode-se até ser romântico,mas não se precisa ser ingênuo a ponto de se olvidar o alto grau de corrupçãoque assola as administrações públicas brasileiras. Diz-se correntemente que,em matéria de gestão de recursos públicos, onde há segredo, há malversação.Mas também não se pode esquecer que há nesse processo uma forte barreiracultural a ser transposta. O gestor público brasileiro não está acostumadoao procedimento de expor suas contas, por isso administra sem estruturaadequada, com falta de planejamento e de organização.

É importante frisar que a defesa da prática da transparência fiscal sedá não do método pelo método, mas por se acreditar que funcionará comoagente de transformação social. O Brasil convive com dois índicesconstrangedores. De um lado ocupa o 59º lugar no ranking de corrupção doano de 2004, segundo a ONG Transparência Internacional. Ao mesmo

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tempo fica em 72º na lista do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH),elaborada, em 2004, pelo Programa das Nações Unidas para oDesenvolvimento (PNUD). Assim, cabe uma reflexão: a coexistência dessasduas realidades é mera coincidência? Ou será que existe correlação entre ambas?

No Maranhão, essa dura constatação está sensibilizando asinstituições que devem atuar na fiscalização da aplicação dos recursospúblicos. O Ministério Público Estadual e o Tribunal de Contas estãodesenvolvendo uma ação conjunta com vistas a dar efetividade aosupracitado art. 49 da LRF. É o programa CONTAS NA MÃO, que é umtrabalho educativo e preventivo, tendo como alvo a conscientização dacoletividade de que é preciso uma maior aproximação dos cidadãos com aadministração pública, através do exercício da transparência fiscal. Esseprograma – que já mereceu adesões importantes, como a da Federação dosMunicípios do Estado do Maranhão (FAMEM), do Conselho deContabilidade, do Sindicato dos Contabilistas e do Sindicato da Empresasde Serviços Contábeis – está realizando seminários em vários municípiosmaranhenses. O programa promete, ainda, capacitar pessoas para o examedas contas públicas.

Acredita-se, enfim, que a transparência na gestão fiscal, caso se torneefetiva, será veículo capaz de revolucionar a administração pública brasileira,produzindo efeitos na melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro.

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EXCLUSIVIDADE NOS CONTRATOS É CONDIÇÃO

QUE PRECISA SER EXPRESSAMENTE ESTABELECIDA

Ivan Barbosa Rigolin

Exclusividade. Necessária previsão expressa. A regrada exclusividade quanto à prestação do serviço objeto do contrato– em favor do contratado e cerceando poder do contratante -,constituindo exceção à regra nas contratações, ou está prevista deforma declarada, expressa e inequívoca, ou simplesmente inexiste.

I - Fomos recentemente consultados acerca de uma questãoenvolvendo um contrato de aplicações financeiras, celebrado em 2004 entreum banco oficial federal e um fundo de previdência de servidores públicosde um Município paulista, sobre se, naquele contrato, existe garantia deexclusividade na prestação do serviço objeto, em favor do banco contratado,ou se, de outro modo, está livre o fundo contratante para aplicar suasdisponibilidades financeiras em outras instituições, ou em outras espéciesde aplicação, por deliberação de sua diretoria.

A exclusividade foi alegada pelo banco contratado em seu favor,enquanto que ao contratante, diante do texto do contrato, pareceu estranhaaquela invocação.

II – É a seguinte a redação das duas cláusulas, do referido contrato entreo banco oficial e o fundo municipal de previdência, que aqui interessa focar:

CLÁUSULA PRIMEIRA – DO OBJETO1.1 – Constitui objeto do presente contrato o estabelecimento

de regime de realização e recebimento de depósitos correspondentesàs disponibilidades financeiras de natureza previdenciária doCONTRATANTE.

(...)CLÁUSULA TERCEIRA – DAS OBRIGAÇÕES DACONTRATANTE

3.1 Depositar junto à CONTRATADA as disponibilidadesfinanceiras relativas a seus compromissos previdenciários, definindoo portifólio de aplicações dos recursos em observância às orientaçõestécnicas disponibilizadas pela CONTRATADA.

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Do contrato apenas isso se transcreve, pois que nada mais interessaao que fora indagado.

Tenha-se sempre presente que os fundamentos legais do contrato,que é a Lei federal nº 9.717, de 27 de novembro de 1.998, assim como osatos infralegais mencionados em outras cláusulas, em momento algum sequertangenciam alguma condição de exclusividade da prestação dos serviços,nos eventuais contratos entre institutos locais de previdência e instituiçõesfinanceiras oficiais. Se, portanto, exclusividade existir na avença será emface destes transcritos dispositivos, e de nenhum além disso.

III – Em princípio quando se contrata algum serviço a alguém, sempreque mais de um prestador tiver condição material de prestar o mesmo serviço,ou de executar o mesmo objeto para o mesmo contratante na mesma ocasiãoe concomitantemente com o primeiro contratado, essa simultânea execuçãoé tanto lógica quanto permitida.

Se por exemplo for contratada a pintura de uma parte de um edifícioa uma empresa, sempre poderá ser contratada a pintura de outra parte aoutra empresa, a qual poderá executar sua parte simultaneamente com aprimeira sem qualquer embaraço ou dificuldade de nenhuma natureza, sejajurídica, seja operacional. Em outro exemplo, a limpeza de áreas urbanas,ou a coleta de lixo doméstico, ou a vigilância de unidades públicas, ou amanutenção de diversos equipamentos, tudo isso pode ser contratadosimultaneamente a diversas pessoas, cada qual com uma parte do totalpossível objeto, sem nada a estranhar ou a causar espécie, pois que taisobjetos de serviços, cada qual sendo essencialmente divisível, permitem suadesembaraçada e muito natural repartição entre mais de um prestador.

Observe-se que até aqui somente se falou de serviços, dado que emse tratando de compra de bens fica evidente a total divisibilidade de quasequalquer particular objeto.

IV – Pode entretanto acontecer que por qualquer motivo interesse àspartes estabelecer cláusula de exclusividade na prestação ou na execuçãodo objeto, em dados contratos. Por uma ou por outra razão pode sereconomicamente necessária, ou extremamente aconselhável, ou tecnicamenterecomendável, a prestação do serviço-objeto com caráter de exclusividade,de modo a garantir recíprocas vantagens às partes: ao contratado evitar porvezes predatória concorrência na prestação, de modo a poder compensar-sedo pesado investimento que por vezes precisa realizar, e ao contratante

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assegurar-se de que o único contratado realiza bom trabalho, passível demelhor controle, maior uniformidade na prestação e maior eficiência que sedividido por diversos executores.

A exclusividade na prestação de algum serviço, desse modo, semprepode ser contratada entre as partes em favor da que presta o serviço, eisso uma vez procedido impede que o contratante contrate a terceiro,estranho ao pacto, o mesmo serviço outorgado com exclusividade aoseu primeiro contratado.

É usual e freqüente cláusula assim ser estabelecida, por exemplos,em contratos de patrocínio, de divulgação publicitária, de transmissõestelevisivas e radiofônicas, de empresariato artístico, de corretagem de imóveis,ou ainda de outros diversos objetos em que a outorga exclusiva representaum imenso diferencial econômico e mesmo qualitativo da prestação.

V - Em face disso, e compreensivelmente, costuma ser bastantedispendiosa a contratação da exclusividade, por razões as mais evidentesde “canalização” forçada de trabalhos que desse modo produzirão umresultado econômico tal que jamais seria produzido em não existindoreferida exclusividade.

Mas desde já, e sempre, reste claro: exclusividade é uma característicaque pela sua imperiosa relevância, absoluta e de preponderância máximasobre outras eventuais cláusulas correntias nos contratos, há necessariamentede estar explícita e declarada com todas as letras, de modo cristalino etransparente, com destaque e indisfarçada, no texto da avença – ou deoutro modo exclusividade ali simplesmente não existirá, nem poderá jamaisser invocada para efeito algum.

VI – Compreende-se porque a exclusividade há de ser expressa noscontratos, pena de inexistir: constituindo uma exceção à regra da prestaçãoque foi contratada como objeto, como exceção que é precisa estar declaradacom explicitude e escrita com todas as letras, ou de outro modo as partescontratantes fatalmente recairão na regra geral da não-exclusividade, ou sejaa da possibilidade de o contratante celebrar outros contratos, com outraspessoas, dotados do mesmo objeto que consta do contrato em causa,exatamente porque sem a expressa reserva da prestação exclusiva nenhumapretensão a exclusividade, em favor de ninguém, pode ser argüida ou invocada.

A regra geral entre partes contratantes de serviços é que se o serviço-objeto for prestado pelo contratado deverá ser pago pelo contratante nas

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condições do contrato, porém isso jamais, em tempo algum, está a significarque apenas o contratado poderá prestar aquele mesmo serviço, se nãoconstou explícita a cláusula de exclusividade na prestação. Vale dizer, omesmo contratante poderá vir a regularmente pactuar o mesmo serviço -com quem quiser, quantas vezes quiser e ao tempo que for - sem qualquerrestrição, limitação, constrição ou condicionamento ao primeiro contrato,se desse não figura a cláusula da prestação com exclusividade.

Assim é com relação a qualquer espécie de contrato, e a qualquercompromisso entre quaisquer partes, dentre pessoas físicas ou jurídicas, equanto as últimas quer sejam de direito público, quer sejam de direito privado:inexistindo previsão expressa, jamais se cogitará da existência de qualquerexclusividade acerca da prestação do objeto, sob alegação alguma, ao pretextoque for ou debaixo de qualquer argumentação imaginável.

Esse é o direito, e não apenas no Brasil.VII – A pouca jurisprudência sobre o muito particular tema de que é

imprescindível a expressa previsão de exclusividade, para que essa condiçãoexista em contratos, é enfática nesse exato sentido até aqui defendido.

Elencam-se, por essa razão, dois acórdãos que o demonstram:a) do e. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Apelação Cível

nº 241.895-2, rel. Debath Cardoso, julgado em 20/10/94:CONTRATO – Representação comercial – Rescisão com base

na quebra da exclusividade – Inadmissibilidade – Ausência de provado alegado – Inexistência, ademais, de cláusula contratual atribuindoexclusividade ao autor. (....)

Não ficaram demonstradas a exclusividade e, obviamente, orompimento unilateral de contrato por parte da ré.

Além de o apelante não ter demonstrado a aludida exclusividade,cumpre salientar que o parágrafo único do artigo 31 da Lei nº 4.888de 1985 veda, expressamente, presunção no tocante a mesma. E, nahipótese, constata-se inexistir cláusula expressa atribuindoqualquer tipo de exclusividade ao autor. (Grifos nossos), e

b) Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, AC nº 95.056-2-SP,16ª Câmara Cível, não conhecido por votação unânime, rel. Des. NelsonSchiesari, julgado em 18/9/85, in RJTJESP 97/252 e segs.

4. Do conjunto probante, evidenciou-se a justiça da soluçãoalcançada na r. sentença de fls. 509 e segs. Com efeito, não resultouprovada a pretendida exclusividade da representação na área emque operava o autor. Nem se há de negar que operava ele, sozinho,

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perante numerosos clientes da empresa que representava. Esta circunstâncianão implica, porém, necessariamente na exclusividade pretendida. Acomeçar pelo contrato escrito, que silencia a respeito, quando seria naturale lógico que devesse dispor sobre a matéria caso fosse ela objeto da avença.Nem as testemunhas ouvidas e as declarações particulares juntadas têm talvirtude. (....)

Logo, não cabe a mera presunção, senão prova plena.Nesse sentido, improcede o apelo do autor.

Ainda que escassa, a jurisprudência estadual é estreme de dúvida oude hesitação, em favor da tese de que sem previsão expressa e claramentedeclarada, será inadmissível qualquer pretensão à exclusividade na prestaçãodo serviço-objeto, porque exceções precisam sempre estar expressas, ousimplesmente não existem em favor de ninguém.

VIII – E no caso presente, uma vez inexistindo exclusividade naprestação do objeto, para que finalidade, então, teria sido celebrado ocontrato, se fica livre o fundo municipal contratante para realizar outrasaplicações financeiras fora do banco federal contratado? Qual seria afinalo propósito desta específica avença, se não existe exclusividade na prestaçãodo serviço contratado?

A resposta é simples: para assegurar ao contratante as orientaçõestécnicas do banco contratado, como tradicional instituição oficial brasileiraque é, quanto aos valores depositados, orientações essas sabidamente segurase confiáveis como o são quaisquer norteamentos para investimentosefetuados pelo banco oficial.

Isso, somente por si, já se configura muito conveniente a fundospúblicos de previdência, como é neste caso o contratante, sobretudo em sesabendo de quão temerárias são as contratações de bancos privados quepagam altos interesses, maiores que os usuais do mercado e co isso tentadores,mas que não asseguram sequer o dia seguinte.

Em não sendo contratado o presente objeto ao banco oficial em questão– ainda que sem caráter de exclusividade -, ficaria privado o fundo municipalcontratante daquelas seguras e desejáveis orientações quanto a investimentos,conforme o previsto na cl. 3.1 do contrato, e esse constitui o único propósitodo contrato celebrado, que plenamente, e só em si, já justifica a celebração.

De mais a mais, não parece nada aconselhável a algum fundo públicoa garantir exclusividade a entidade alguma na prestação de serviços deaplicações financeiras de suas disponibilidades, a uma porque não pode

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vislumbrar a exata razão de ordem pública para tanto,e a duas porque énecessário reservar, ao ente público gestor de dinheiro destinado a prestaçõesprevidenciárias, a possibilidade de ocasionais inversões em outros ativosque não investimentos financeiros, como sempre, e com grande margem desegurança, poder-lhe-á convir.

IX - A conclusão, vistas as considerações tecidas e a pouca jurisprudênciaque, apertadamente, é pertinente ao tema da exclusividade em contratos, é ade que o contrato mantido entre o fundo de previdência municipal e o bancofederal oficial, do qual não consta qualquer cláusula, previsão ou ressalva deexclusividade, não atribui ao banco contratado nenhum direito deexclusividade quanto ao objeto, ou seja o de receber com exclusividade odepósito de todas as disponibilidades financeiras do contratante.

Não existindo tal exclusividade, mantém-se portanto livre edesimpedido o fundo contratante para aplicar onde bem entenda, além deno banco contratado, suas disponibilidades financeiras.

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A CONCESSÃO DE MEDIDAS CAUTELARES

NO PROCESSO DE CONHECIMENTO

Carlos Antonio Pereira da Silva Analista de Finanças e Controle Externo do TCDF

A partir do momento que o Estado tomou a si o dever da prestaçãojurisdicional, ao vedar a autotutela, surge como determinante a obrigaçãoem apreciar lesão ou ameaça a direito, como princípio constitucional.

Entretanto, a demanda pelo reconhecimento de um direito requer otempo que nem sempre se ajusta à situação jurídica da lide.

Nesse contexto, o ideal de justiça viria a ser a imediata punição dofaltoso como também a pronta realização do direito, se negado ou violado.Mas, nem sempre tal providencia pode ser realizada de imediato, porque otitular do direito negado, ameaçado ou já violado precisa de tempo parademonstrá-lo, escolher entre as várias faculdades que a norma lhe possaoferecer, e, assim, uma entre as várias opções, dos caminhos a percorrer.De outro lado, o réu deve ser citado, e dispor de tempo para preparar asua defesa. Incidentes processuais ocorrerem, com gastos de tempo,dilatando a chegada da decisão. Têm-se a coleta de prova, os atos quecompõem o devido procedimento até que se chegue ao momento apoteóticoda sentença do mérito.

Exarada a sentença, tem-se em seguida a fase recursal. Depois dela éque terá lugar a execução, com forma de ação autônoma. Além disso, enquantodura o processo, variados eventos podem acontecer às pessoas que com elese ligam ou às coisas sobre que versa. Podem ser alienadas, oneradas,desviadas, ocultadas, danificadas, destruídas ou simplesmente perecer.

E quando chegasse a hora de atuar o processo no mundo exterior,de saltar a decisão do bojo dos autos para se fazer lá fora a efetivação, derealização, talvez já não mais houvesse como e onde se exercer o que ojulgado acertou e determinou.

Para obviar aos males que o tempo traz ao processo, instaurado nareforma de 1973, surge o processo cautelar, mediante medidas cautelares,

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como instrumento para proteger essa situação de modo a que a sentençano processo principal possa atuar eficazmente sobre lide.

O sistema processual vigente preconiza por uma sistemáticarompedora com o sincretismo do Código de 1939. A partir da grande reformade 1973 torna-se exigível abordar o processo civil com cientificidade e rigortécnico de linguagem jurídica, para enriquecê-lo ainda mais e não, ao contrário,promover o sincretismo abolido.

Para isso os institutos e seus procedimentos devem restar claros ecom atuação eficiente de modo a realizar os fins sociais da lei, mediante osinstrumentos processuais adequados. Essas situações norteiam o devidoprocesso legal.

A sistemática adotada pelo Código atual reivindica segregação defunções processuais para se alcançar pretensões distintas, mediante atuaçãode processo de conhecimento, de execução e o cautelar. As exceções devemser mantidas na forma expressa em lei, como tem sido feito atualmente.Mas, tal tecnicismo não é capaz de restringir as funções dos magistrados, aocontrário ampliá-las, porque não há norma que substitua a inteligência humana.

O processo cautelar tem exercido, no âmbito do processo civil, umpapel relevante de equilíbrio na situação jurídica entre as partes que procuramo judiciário para a solução de seus conflitos. Nessa função, vem promovendovigorosamente a proteção processual da lide principal, fazendo valer sobreas partes providências temporárias de sua regulação, sobrepondo-se ao direitomaterial interveniente.

Nesse mister, a medida cautelar é prestação jurisdicional própria doprocesso cautelar, constante do Título único do Livro III do CPC. Nasistemática adotada pelo CPC não é possível a medida cautelar que nãofosse no âmbito do processo cautelar, haja vista não se aplicar as normas doprocesso cautelar ao processo de conhecimento. O objetivo dessa medida éassegurar o resultado útil em outro processo, o do processo principal.

De outro lado, a mini reforma processual de 1994 introduziu oinstituto da antecipação de tutela, nos termos da nova redação dada ao art.273 do CPC. O objetivo dessa medida á antecipar, total ou parcialmente,os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, portanto, a ser adotada nopróprio processo e não em outro.

A introdução do instituto da medida cautelar na reforma de 1973 e oda antecipação de tutela na reforma de 1994 constituiu um avanço no direito

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processual. Entretanto, na análise de situações concretas, tem-se verificadoobstáculos para uma clara distinção ao se buscar o enquadramento daprovidência judicial em um ou outro instituto.

Com o advento da Lei nº 10.444/02, acrescentou-se o § 7º ao art. 273do CPC para permitir o deferimento de medida cautelar no processo deconhecimento. Tal modificação legislativa tomou, inicialmente, feições derompimento com a sistemática até então adotada pelo Código, uma vez quea medida cautelar é instituto do processo cautelar, não se admitindo inserirseu procedimento ao processo de conhecimento.

Entretanto, inaugurou a Lei nº 10.444/02, da mesma forma, apossibilidade de requerer a providência cautelar, a título de antecipação detutela. Entendida aquela como sendo de natureza cautelar exarada no bojodo processo de conhecimento, nos casos e nas formas estabelecidas emlei, guardando afinidade com a medida cautelar, mas que com elanão se confunde.

Estamos tratando da antecipação de tutela no processo deconhecimento, que nomeou o deferimento do juiz, impropriamente, demedida cautelar, uma vez que esta é prestação própria do processo cautelar,prevista no Título único do Livro III do CPC.

Anteriormente a esta mini reforma, diante de circunstância que exigissea proteção do bem jurídico em disputa, duvidosa era a distinção entre asmedidas cabíveis, se de antecipação de tutela, em sede de processo deconhecimento, ou de medida cautelar, em sede de processo cautelar.

O pedido de sustação de protesto foi exemplo real de divergência emdecisões judiciais. Se pedida em sede de processo cautelar poderia redundarem extinção do feito sem julgamento do mérito, por entender comoadiantamento de direito material e, portanto, ser o caso de pedido deantecipação de tutela e, como tal, deveria ser pedida em sede do processoprincipal de conhecimento.

Além disso, entende-se inconciliável o pedido de prestação cautelarem processo principal de conhecimento, à luz do art. 292 do CPC e de suasistemática. De outro modo, o requerimento de antecipação de tutela dedireito material em processo cautelar é razão para o indeferimento da inicial.Não foram poucos os pedidos negados de antecipação de tutela para sustarprotesto de títulos, sob a alegação de se tratar de medida cautelar, medida aser requerida em sede de processo cautelar.

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Para melhor conciliar o disposto no art. 273 do CPC com asistemática dotada até então, cumpre entendê-lo como meio de prevenir aparte em face de dano decorrente da demora na prestação jurisdicional.

O art. 273 do CPC, caracterizador da antecipação de tutela, indica apossibilidade de antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutelapretendida na inicial, ou seja, do pedido.

Neste caso, compreenda-se como tal, os efeitos do que adviria deuma sentença pela procedência do pedido. Oportuno lembrar que a sentençatem como resultado efeitos diversos.

Tais efeitos podem ser mais ou menos amplos. Antecipa-se, assim,algo que a sentença contém, mas, não a sua totalidade; a antecipação detutela não pode ser exauriente. O § 2º, do art. 273, do CPC, veda a antecipaçãode tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimentoantecipado. A antecipação de tutela não se confunde com o julgamentoantecipado da lide, nos termos do art. 330 do CPC, quando não hárnecessidade de provas.

A antecipação de efeitos mais amplos aproxima-se da antecipação detutela e os menos amplos da cautelar. Da primeira são exemplos aspossessórias, da segunda o depósito da coisa litigiosa.

Em face das dificuldades em distinguir antecipação de tutela de medidacautelar, processualista de renome vem pleiteando a unificação de taismedidas, por considerá-las espécie do mesmo gênero que estão a gerarinúmeras divergências na sua identificação e aplicação na lide. Não são rarosos casos de dúvida fundada sobre os pedidos, se consistem em tutelaantecipada ou tutela cautelar.

A recente modificação operada pela Lei nº 10.444, de 7 de maio de2002, veio ao encontro deste entendimento para permitir, com fulcro no §7º, que acrescentou ao art. 273, do Código de Processo Civil, a concessãode medida cautelar quando o autor requerer providência cautelar a título deantecipação de tutela.

Andou bem a reforma nesse mister, permitindo seja adequada apretensão efetivamente requerida à correta classificação da medida, evitandoindeferimentos desnecessários e improdutivos da inicial.

Não se tratou de aplicar procedimentos cautelares em processo deconhecimento, mas, de autorizar providência cautelar no bojo do processoprincipal, dispensando a necessidade de processo cautelar autônomo.

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Entretanto, tal concessão não desautoriza seja instaurado processo cautelarantecedente ou incidental ao curso do processo principal. O direito ao abriruma porta não significa que tenha fechado as demais.

Dessa forma o Processo Civil galgou um patamar a mais em suafunção primordial no sistema jurídico brasileiro, mediante a adoção dafungibilidade de pedidos na requisição de medida protetiva do direito e doprocesso. Esse é o entendimento do STJ no julgamento do Resp. nº 351.766.

O comando expresso no novo dispositivo restou cristalino,prestigiando, como se disse, o princípio da fungibilidade dos pedidos, emque pese alguns autores entenderem que a mesma clareza não ocorreu àsituação inversa: possibilidade do deferimento da antecipação de tutela,quando requerida a título de providência cautelar.

A resposta para tal questionamento encontra-se no caput e incisos doart. 273 do CPC; a tutela cautelar não pode ser concedida fora das condiçõesali estabelecidas, não importando o nome que de dê ao pleito. Importa anatureza jurídica da demanda, se não atender aos requisitos da antecipaçãode tutela, esta não deve ser deferida.

De toda a forma, não restou afastada a aplicação do devido processocautelar nos casos que se caracterizem como tal. O deferimento da medidacautelar nos casos previstos no § 7º, do art. 273 do Código, deve ser exaradaem sede de decisão interlocutória nos autos do próprio processo e não emoutro como se tem para a medida cautelar do processo cautelar.

Assim, fica afastada, também, a exigibilidade de instauração deprocesso cautelar para a concessão de medida cautelar, por conta de pedidoda providência cautelar requerida incidentalmente em processo deconhecimento a título de antecipação de tutela.

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A NATUREA JURÍDICA DO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA

Maurício Nunes MoreiraAnalista de Finanças e Controle Externo do TCDF

1. Introdução

No período entre 1930 e 1960, o Estado foi responsável pelodesenvolvimento econômico e social brasileiro. Nesses anos, assistiu-se auma fase de prosperidade econômica em escala mundial e nacional. A partirda década iniciada em 1970, face ao processo de globalização e ao seucrescimento, o Estado, inclusive o brasileiro, entrou em crise e foi consideradocomo o principal responsável pela redução das taxas de crescimentoeconômico, da elevação das taxas de inflação que se verificava em todo omundo. O ressurgimento do liberalismo, agora identificado comoneoliberalismo, e as reformas econômicas orientadas para o mercado forama resposta para tal crise.

Conquanto fosse esse o pensamento predominante nos chamadospaíses desenvolvidos, que já vinham adotando o modelo neoliberal desde oinício da década iniciada no ano de 1980, a agenda da sociedade brasileiranesse período privilegiava o aspecto político. Tanto que, em 1988, uma novaConstituição Federal foi promulgada. Sobre ela, muitos chegaram a afirmarque nascera velha, porque elaborada na contramão dos fatos históricos quese sucediam no final do século XX. Esses fatos sinalizavam que o mundoocidental estava experimentando profundas transformações no campopolítico e, sobretudo, no campo econômico. O formato de Estado que emergedesse contexto histórico revela-se contrário ao modelo do Estado de Bem-Estar social. Todavia, foi este modelo de Estado que restou consagrado notexto original da Constituição de 1988.

O processo de reforma ao qual a Constituição de 1988 tem sidosubmetida nos dezesseis anos de sua existência de certa forma busca adaptá-la à vigente ordem econômica mundial. Tal é o caso da Emenda no 19/1998.O modelo de Estado nela projetado afasta-se do Estado provedor das carências

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do cidadão e assume a feição de um Estado de serviço, que tem o cidadãocomo cliente. Não é por outra razão que o capítulo da Administração Pública,que é o instrumento de que dispõe o Estado para pôr em curso as opçõespolíticas do Governo, segundo Hely Lopes Meirelles (1995, p. 61), começasob o signo do princípio da eficiência a partir dessa emenda constitucional.

A assunção desse princípio à condição expressa de princípioconstitucional firmou-se na tese de que a Administração Pública brasileiradeve revelar-se apta para os tempos atuais, que exige um aparelho estatalque responda com celeridade e eficácia às demandas da sociedade e que,concomitantemente, revele-se de baixo custo e desburocratizado.

Com efeito, essa mudança de enfoque da Administração Públicabrasileira reflete o deslocamento do Estado Social para o Estado Neoliberal.É o que se depreende do pensamento de Bueno (2000, p. 342-363), expostonestes termos:

É possível extrair o conteúdo da eficiência da cláusula doEstado Social. Neste caso, este princípio maior já traria consigo osideais de economicidade e celeridade, especialmente em questões dedireitos fundamentais. Mas, ao lado desta leitura ampla, e sem excluí-la, a Constituição traz alguns dispositivos específicos, referentes àidéia de eficiência da Administração Pública, aqui entendida comoboa qualidade dos serviços, satisfação dos cidadãos e economicidadeno emprego dos recursos públicos. Isto sem mencionar os princípiosda legalidade, igualdade e razoabilidade.

(...)O que parece é que apesar de alguns aspectos seus como

celeridade e economicidade já existirem no ordenamento,possibilitando por si só o controle da Administração, o princípioda eficiência aplicado à Administração Pública tomou maior relevono momento histórico da chamada crise do Estado. Foi quandoo princípio teve seu conteúdo alargado e passou a ser de interesseo seu estudo sistemático dentro do ordenamento. Sua explicitaçãono texto constitucional decorreu do ideal político de “reformado Estado” e da implementação da chamada “administração gerencial”.

A doutrina que se desenvolve no campo do Direito Administrativotem buscado interpretar o princípio da eficiência administrativa. A tarefatornou-se mais instigante, porquanto a Constituição há de ser interpretadade forma sistemática. Neste contexto tal princípio deve ser compatívelcom os princípios da legalidade e da impessoalidade, por exemplo. Esse esforço

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de buscar o real sentido do princípio da eficiência administrativa tornou-se tarefa ingente e desafiadora em face da Reforma Constitucional de 1998.

Não se pode olvidar que essa Reforma Constitucional foi presididapor paradigma neoliberal, concebido no seio da globalização econômica,que marcou a última década do século XX. Em razão de ter o princípio daeficiência alcançado notoriedade constitucional neste contexto, ele passou areceber variegadas interpretações no que diz respeito à sua ontologia,extensão e relevância.

Sendo a eficiência conceito notoriamente de cunho econômico, discute-se no âmbito da doutrina se é possível dar-lhe características jurídicas.

Sem pretensão de ser exaustivo, o presente trabalho busca trazeralgumas contribuições à discussão, na expectativa de que sirvam de subsídiosà visualização das implicações do princípio da eficiência no cotidiano daAdministração Pública brasileira.

2. A natureza jurídica do princípio da eficiência

Embora o termo “eficiência” já figurasse de forma explícita na própriaConstituição de 1988, no inciso II do seu artigo 74, e houvesse referêncialegal e jurisprudencial sobre ele antes da entrada em vigor da Emenda no

19/98, só a partir do advento dessa emenda constitucional que o princípioda eficiência passou a ser debatido com mais vigor pela doutrina. Diferentesinterpretações têm sido dadas a esse princípio. Alguns autores negam arelevância da assunção explícita da eficiência como princípio constitucional,em razão dos motivos que deram ensejo a essa ascensão e em decorrênciade sua difícil caracterização jurídica. Uns dizem tratar-se de princípio deconteúdo eminentemente econômico, porque na sua concepção há a idéiade relação custo-benefício; outros negam essa assertiva.

Então, qual é a natureza jurídica do princípio da eficiência?

2.1. Argumentos contrários à juridicidade do princípio da eficiência

Afonso da Silva (2002, p. 651) opõe-se à idéia de que “eficiência” sejaum conceito jurídico; ao revés, entende tratar-se de conceito econômico.Eis o que assevera a respeito desse assunto:

Eficiência não é um conceito jurídico, mas econômico; não qualificanormas; qualifica atividades. Numa idéia muito geral, eficiência significa

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fazer acontecer com racionalidade, o que implica medir os custos que a satisfaçãodas necessidades públicas importam em relação ao grau de utilidade alcançado.Assim, o princípio da eficiência, introduzido agora no art. 37 daConstituição pela EC-19/98, orienta a atividade administrativa no sentidode conseguir os melhores resultados com os meios escassos de que se dispõee a menor custo. Rege-se, pois, pela regra da consecução do maior benefíciocom o menor custo possível. Portanto, o princípio da eficiência administrativatem como conteúdo a relação meios e resultados.

Lopes (1998, p. 108) assere a respeito do princípio em questãoque jamais será ele princípio da Administração Pública, mas sempre terásido a própria finalidade da Administração Pública. E completaassinalando o seguinte:

Inicialmente cabe referir que eficiência, ao contrário do quesão capazes de supor os próceres do Pode Executivo federal, jamaisserá princípio da Administração Pública, mas sempre terá sido –salvo se deixou de ser em recente gestão pública – finalidade da mesmaAdministração Pública. Nada é eficiente por princípio, mas porconseqüência, e não será razoável imaginar que a Administração,simplesmente para atender a lei, será doravante eficiente, se persistira miserável remuneração de grande contingente de seus membros,se as injunções polícitas, o nepotismo desavergonhado e a entregade funções do alto escalão a pessoas inescrupulosas ou de manifestaincompetência não tiver um paradeiro.

Trata-se de princípio retórico imaginado e ousadolegislativamente pelo constituinte reformador, sem qualquer critérioe sem nenhuma relevância jurídica no apêndice ao elenco dos princípiosconstitucionais já consagrados sobre Administração Pública.

Pereira Júnior (1999, p. 44) registra que seria legítimo suspeitar que apresença do princípio da eficiência no texto constitucional cumpre propósitoideológico. Anota, ainda, que o arrolamento da eficiência entre os princípiosreitores da atividade administrativa estatal só pode ser compreendido comouma figura de reforço de linguagem para enfatizar o que é inerente àAdministração Pública. E acrescenta:

Se o chamamento ao texto constitucional do princípio da eficiênciaalmejasse situá-lo na categoria de norma, a Emenda 19 laboraria em errogrosseiro. A utilidade dos princípios está, precisamente, em serem mais doque normas. Pairam acima delas. Orientam os rumos do sistema jurídico ea produção das normas que o tornam operante. Presidem todo o trabalhode hermenêutica do sistema e de suas normas. Não devem ser rebaixados àcategoria de norma, pois que, então, deixam de ser princípios. Na linguagem

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que poderia ser a dos navegadores dos grandes descobrimentos dos séculosXV e XVI – deixariam de ser estrelas para serem mapas.

Ante tantas advertências sobre como não deve ser entendida a presençado princípio da eficiência na Administração Pública, seria legítimo suspeitar-se de que sua inserção no texto constitucional cumpre propósito ideológico,ajurídico, o que não o desqualifica para figurar na Constituição – que é antesdocumento político do que jurídico -, contudo deve alertar o intérprete paraoutras possíveis inferências

Compartilhando desse pensamento, Bandeira de Mello (1999, p.75) considera que o princípio da eficiência é juridicamente fluido e dedifícil controle no campo do Direito, razão por que “mais parece umsimples adorno agregado ao art. 37 ou o extravasamento de uma aspiraçãodos que buliram no texto”.

Moreira (2000, p. 320-341) também entende despropositada a inserçãodo princípio da eficiência no rol daqueles constantes do caput do art. 37 daConstituição. É que a emenda constitucional que viabilizou tal fato pretendeuoutorgar à Administração Pública uma máxima não-jurídica, típica daadministração e economia, que se referem basicamente ao desempenho deentes privados. E ajunta:

Para tais Ciências, o conceito do termo “eficiência” pertenceà relação entre trabalho, tempo, investimento e resultado lucrativoobtido em determinada ação empresarial; é o vínculo entre custos eproduto final. Pretendeu-se a inserção de conceitos e objetivosabsolutamente diversos daqueles essenciais à Administração Pública,num Estado Democrático de Direito.

Consideramos que não há crítica positiva a ser feita, no âmbitoestritamente político-jurídico. É um despropósito a transposição deparâmetro da administração gerencial privada competitiva, elevando-o, sem mais, à condição de princípio constitucional daAdministração Pública.

Conforme já mencionado, não se trata de princípio jurídico, muitomenos poderia ser alçado à condição de norma constitucional. Sua inserçãogerará nenhuma novidade ou benefício concreto. O controle da eficiêncianão parte de norma genérica e abstrata de conduta, desprovida demandamento legal. Ao contrário, exige configuração precisa e minuciosa,mediante pautas de comportamento predefinidas – que estabeleçamnormativamente o alcance de específicos resultados, a utilização de recursoscertos e as conseqüências jurídicas daí derivadas. Caso contrário, inexistiráa “relação” definidora da eficiência.

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2.2. Argumentos a favor à juridicidade do princípio da eficiência

Modesto (2000, p. 67) põe-se contrário ao entendimento daqueles querecusam reconhecer a validade jurídica do princípio da eficiência. E argumenta:

Pode-se polemizar sobre se o princípio da eficiência é “novo”ou antigo; se é uma exigência inerente ao Estado de Direito Socialou se foi entronizado artificialmente no ordenamento constitucionalbrasileiro pela Emenda Constitucional no 19/98; se esse princípiopodia ser reconhecido no diploma constitucional de 1988 ou se foi oresultado do avanço de alguma ideologia liberal no direitoconstitucional brasileiro. Pode-se discutir se essa exigência deeficiência produzirá ou não efeitos concretos imediatos ou ainda sesua compreensão deve ser diferenciada em relação aos conteúdosque lhe são dados por outras disciplinas no rol das ciências humanas.Pode-se indagar se as referências a este princípio no ordenamentojurídico de outros países, revelado pelo direito comparado, ao apelarpara signos semelhantes, auxilia ou não na compreensão do alcancedo princípio da eficiência no direito brasileiro. Mas não se pode, emqualquer caso, recusar a positividade, a operatividade e a validadejurídica do princípio da eficiência sob o argumento de que o seuconceito foi tradicionalmente desenvolvido pela sociologia e pelasciências econômicas. Todos sabemos que os princípios jurídicos sãonormas, prescrições, dirigem-se a incidir sobre a realidade, referindosempre algum conteúdo impositivo.

O termo eficiência não é privativo de nenhuma ciência; é umtermo da língua natural, apropriado pelo legislador em sua acepçãocomum ou com sentido técnico próprio. São os juristas, como agentesativos no processo de construção do sentido dos signos jurídicos,os responsáveis diretos pela exploração do conteúdo jurídico desseprincípio no contexto do ordenamento normativo nacional.

Nessa linha de entendimento favorável à juridicidade do princípioda eficiência, Gabardo (2002) assevera que, devido à influência dateorização econômica de Valfrido Pareto, formulador do conceito deeficiência de Pareto, a eficiência dificilmente consegue se livrar das amarrasdo economicista. Trata-se de evidente equívoco, por duas razões. Primeiro,porque a etimologia do termo “eficiência” é independente de qualquerconotação intrinsicamente econômica. Segundo, porque, ainda que fosseum conceito exclusivamente econômico, perderia tal significação ao serabsorvido e condicionado pela ordem jurídica. Para Gabardo (2002, p.91), a eficiência assume, na dimensão do Direito, uma caracterização

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particular, por esse motivo coloca-se contrário aos entendimentos de quea eficiência não é princípio jurídico. Neste contexto registra:

Não é possível concordar, portanto, com Egon Bockmann Moreira,quando afirma que a eficiência não é princípio jurídico, “muito menospoderia ser alçado à condição de norma constitucional”. Até porque seriaquestionável se existe algum princípio que nasce como eminentementejurídico, ontologicamente considerado. Por exemplo, o princípiodemocrático tem clara essência política; o princípio da moralidade, essênciaética; e, notadamente, o princípio da justiça nasce como um instrumentode tutela privada (caráter social). No âmago da questão, talvez somentesobrasse o princípio da legalidade. Sendo assim, não parece plausível oargumento de que eficiência é um ente metajurídico, como os outrosprincípios também não o são.

Moraes (2002, p. 314-323) alinha-se entre aqueles que admitemjuridicidade ao princípio da eficiência, porquanto entende que, ostentandotal princípio a expressa condição de “norma constitucional”, afastado está oclássico defeito do Poder Judiciário em analisar a eficiência da administraçãoe que reforça a possibilidade de o Ministério Público, com base em suafunção constitucional de zelar pelo efetivo respeito dos poderes públicos edos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição,promover as medidas necessárias, judicial e extrajudicial, a sua garantia.

2.3. Argumentos adicionais a favor da juridicidade do princípio daeficiência

Não se pode negar que os argumentos a favor ou contra à juridicidadedo princípio da eficiência revelam-se razoáveis, o que torna árdua a tarefa defiliação justificada a uma ou outra corrente. Todavia, a despeito de desafiadoraessa empreitada, tem-se por mais consentânea a corrente que sustenta ajuridicidade do princípio em causa pelos argumentos a seguir expendidos.

Como se sabe, a chamada era moderna irrompeu-se com o adventodo Iluminismo, movimento que representou o apogeu de um processo detransformação da percepção do homem sobre a sua própria existência.Consoante Arruda e Piletti (2000), tal mudança começou no Renascimento,quando a razão se impôs como método de conhecimento do mundo, tendoalcançado, no século XVII, aspecto essencialmente crítico. Naquela fase dahistória da humanidade, a razão passou a ser empregada para a compreensãodo próprio indivíduo e de seu contexto social. O antropocentrismo e o

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individualismo renascentistas, que estimulavam a investigação científica,conduziram à gradativa separação entre o campo da fé e o da razão, o quetrouxe profundas alterações no modo de pensar e, conseqüentemente, nomodo de agir do homem de então. Consoante Grenz (1997), típico dessanova visão de mundo era o pensamento de Francis Bacon, segundo o qualos homens podiam dominar a natureza se descobrissem os segredos dela.Supunham, então, os iluministas que o conhecimento era racional porqueexato e objetivo.

Sustentada nos postulados do ser pensante e do universo mecanicista,a modernidade pretendeu construir um mundo sobre bases estritamenteracionais. Neste contexto propôs ao pensamento jurídico um modelo teóricocom pretensão de resolver os conflitos sociais, mediante sentenças judiciais,por inferências silogísticas. O esquema ofertado por esse modelo paraequacionar as lides estaria assim representado:

A norma legal - premissa maiorO fato judicializado - premissa menorA sentença - conclusãoObjetivando ordenar a conduta humana em sociedade, o direito

concebido a partir do pensamento da modernidade valora os fatos da vidae, por meio da norma jurídica, eleva à condição de fatos jurídico aquelesconsiderados relevantes para a relação entre as pessoas. Então, dado umconflito, busca-se enquadrá-lo na norma legal aplicável à espécie. Realizadaa operação, sai o veredicto: “fulano tem razão porque assim diz a norma”.

Assim, o direito gerado pelo modo de pensar da modernidadepretendeu ordenar a conduta humana a partir de um sistema, supostamenteracional, que contém em sua estrutura a descrição de fato relevante para orelacionamento interpessoal, e por isso mesmo elevado à categoria de fatojurídico. A descrição desse fato opera-se mediante a chamada norma jurídica.

Mas o que caracteriza a norma jurídica?Atentando para a advertência de Ferraz Jr (2003, p. 100-101), de que

a questão sobre o que seja a norma jurídica não é dogmática, mas zetética,visto ser uma questão aberta, típica da filosofia jurídica, importa aqui trazera lume algumas breves impressões doutrinárias sobre tal tema.

Para Mello (1994, p. 19-32), a norma jurídica constitui “uma proposiçãopor intermédio da qual se estabelece que, ocorrendo determinado fato ouconjunto de fatos (= suporte fático) a ele devem ser atribuídas certas

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conseqüências no plano do relacionamento intersubjetivo (= efeitos jurídicos)”.O ilustre jurista alagoano pondera, entretanto, que o problema da estruturalógica da norma jurídica longe está de ser tema simples; ao revés, para ele, oassunto tem sido objeto de profundas divergências na doutrina, que sintetizaem duas correntes principais: a sancionista e a não-sancionista. A primeiracorrente (sancionista), sob influência de Hans Kelsen, sustenta que a normajurídica é sempre redutível a uma proposição hipotética, na qual se prevê umfato, que se liga a uma conseqüência. De acordo com essa linha de raciocínio,toda norma jurídica contém a previsão genérica de um fato e a indicação deque, ocorrendo um comportamento que se enquadre nesse enunciado, deveráadvir uma conseqüência, que equivale sempre a uma sanção. Para os sancionistas,a coação constitui elemento essencial da norma jurídica. Daí por que, para tallinha doutrinária, as “proposições jurídicas que não especifiquem uma sançãopara o caso de serem infringidas são proposições incompletas, imperfeitas ousimplesmente preceitos auxiliares”. De forma contrária, a segunda concepçãodoutrinária (não-sancionista) sustenta que a norma jurídica é uma proposiçãocompleta quando, apenas, contém a descrição do suporte fático e da prescriçãodo preceito a ele correspondente. Para esta corrente, é irrelevante se a normajurídica prevê ou não uma sanção para o caso de ser transgredida. Fundamentalé a menção ao suporte fático ou ao preceito.

Não se alinhando à concepção formalista kelseniana, vale dizer, asancionista, Reale (1993) assinala que, o que caracteriza uma norma jurídica,“é o fato de ser uma estrutura proposicional enunciativa de uma forma deorganização ou de conduta, que deve ser seguida de maneira objetiva eobrigatória”. Este tem sido o entendimento prevalecente.

Essas considerações sobre a estrutura lógica da norma jurídica vêmà baila em decorrência da estrutura discursiva dos princípios do direito,que não enuncia a sanção cabível ocorrendo um comportamento que oscontrarie. Pela linha de raciocínio da posição doutrinária sancionista, osprincípios do direito não seriam normas jurídicas, vez que lhes falta oelemento que diz respeito à coação. Pelo entendimento doutrinário não-sancionista, tais princípios podem ser considerados como normas jurídicas,visto que reproduzem a estrutura peculiar dessas normas.

O assunto em foco foi enfrentado por Eros Grau (2000), quepropugna no sentido de que os princípios do direito, tanto os positivadosquanto os que não ostentam tal condição, são norma jurídica.

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Portanto, sob a perspectiva da estrutura lógica da norma jurídicaconcebida a partir do pensamento da modernidade, os princípios do direito,e em particular o princípio da eficiência, positivado nos termos do art. 37,caput, da Constituição Federal, com a Emenda no 19, são normas jurídicas.

Mas aqui cabe trazer, ainda, uma outra visão a respeito da juridicidadedo princípio da eficiência, que ocorre no bojo da dimensão que os princípiosvêm alcançando no constitucionalismo contemporâneo. Para Patrícia Baptista(2003, p. 83-84), a necessidade de superação do positivismo normativistaprovocou o retorno do Direito às questões da ética e da moral, tendo osprincípios alcançado posição de destaque no direito constitucional hodierno.E neste contexto consignou a ilustre professora fluminense:

A reinserção do discurso dos valores no Direito não importou,todavia, em um retorno puro e simples ao jusnaturalismo clássico,que procurava em critérios abstratos de justiça e moral a razão últimadas normas jurídicas. Uma ciência do Direito que se pretenda pautarunicamente sobre valores apresenta tantas dificuldades defundamentação e de legitimação quanto aquela que seja amparadaem teses puramente positivistas. Por isso, o novo constitucionalismo,afastando-se tanto do modelo positivista da jurisprudência dosconceitos , como do concebido pela jurisprudência dos valores, foibuscar o seu fundamento de validade nos princípios.

Para a jurisprudência dos princípios, os princípios se qualificamcomo “critérios de valoração imanentes à ordem jurídica” ou como“núcleos de condensação de valores”. Não são, portanto, merarepresentação de valores transcendentes situados fora doordenamento jurídico. Ao contrário, incorporam somente aquelesvalores eleitos através de processos históricos ou racionais e que, apartir daí, passam a ser encontráveis, explícita ou implicitamente,dentro do próprio ordenamento. Os princípios são, assim, o direitopressuposto, “um ius exterior à lex”. Em suma, a teoria dos princípiospermite a inserção de um substrato ético-moral no Direito (elementojusnaturalista) sem comprometer a unidade sistemática deste(elemento positivista).

Vê-se, então, que, com essa mudança de paradigma, que renega avisão do positivismo normativista, os princípios do direito são consideradoscomo normas jurídicas.

Com base nesses argumentos, entende-se assistir razão à correnteque sustenta a juridicidade do princípio constitucional da eficiência.

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3. Conclusão

Aqui, os argumentos da corrente que sustenta o caráter jurídico doprincípio da eficiência são considerados mais adequados ao sistema do direitopositivo pátrio.

Entretanto, não se nega possuir tal princípio conteúdo eminentementeeconômico, porque na sua concepção há a idéia de relação de custo xbenefício. Não se pode, também, ignorar a advertência de Di Pietro (2000),que consigna que a “eficiência é princípio que se soma aos demais princípiosimpostos à Administração, não podendo sobrepor-se a nenhum deles,especialmente ao da legalidade, sob pena de sérios riscos à segurança jurídicae ao próprio Estado de Direito”.

Essa advertência é de todo procedente. A Constituição, em seu artigo1o, dispõe que o Estado brasileiro é um Estado Democrático de Direito. Apartir daí tem-se que a atividade administrativa passa a dever obediência àlei e ao interesse público. A relação que se estabelece entre a AdministraçãoPública e a lei é muito diferente daquela existente entre o particular e a lei. Éque, enquanto o particular pode fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, aAdministração só pode fazer aquilo que a lei permite. De um lado, umarelação que se funda na autonomia da vontade; de outro, uma relação que sefirma no vínculo de subsunção ao interesse público.

Entretanto, a questão suscitada nessa advertência situa-se no campoda aplicabilidade do princípio, que não descaracteriza a juridicidade doprincípio da eficiência.

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DEZ MANDAMENTOS DO CONTROLE EXTERNO

Walter Azevedo da SilvaAnalista de Finanças e Controle Externo do TCDF

A constante lida e a observação cotidiana das decisões do Tribunalde Contas permite-nos extrair, da realidade concreta do seu ofícioconstitucional, uma certa unidade de ação e coerente submissão dos casosconcretos à lei.

Por essa razão, é possível retirar, do exercício de sua atividade, umateia de princípios perfeitamente sincronizados com as exigências da sociedadee a realidade do nosso tempo, revelando elevado grau de pragmatismo quesomente a experiência permitiria agregar.

Adiante, estão relatados alguns desses princípios que, sem a pretensãode serem verdadeiros mandamentos, fornecem uma pista razoavelmentesegura para a formação e compreensão do pensamento vigente nos órgãoscentrais de controle externo. Ei-los:

1 - O Tribunal de Contas deve reduzir ao mínimo a interferênciado controle externo na atividade administrativa dos órgãos a elesubmetidos; (princípio da não interferência)2 - O Tribunal de Contas não possui prevalência hierárquica sobreos órgãos a ele submetidos, mas detém competênciasconstitucionalmente definidas que impõem o atendimento àsdemandas do órgão controlador; (princípio da reserva de competência)3 - O órgão de controle externo deve primar pela coerência desuas decisões, evitando confundir os jurisdicionados; (princípioda uniformidade das decisões)4 - O TC não se submete às decisões do Judiciário, mas coordenaa sua aplicação de acordo com os limites de sua competência;(princípio da independência do Controle)5 - O TC deve aquilatar o custo de seus processos internos emfunção do montante de recursos envolvidos e a relevância dasmatérias colocadas sob sua apreciação; (princípio da economicidade)

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6 - o Tribunal de Contas deve decidir de modo célere, na medidado possível, de molde a não impedir o regular uso docontraditório e da ampla defesa e permitir a rápida correção dosdesvios detectados; (princípio da tempestividade)7 - o Tribunal de Contas deve conceder aos agentes a elesubmetidos todas as condições necessárias ao atendimento desuas decisões, inclusive no que se refere à concessão de prazos;(princípio da razoabilidade das decisões)8 - O Tribunal de Contas, em suas decisões, estabelece os limitesde ação do administrador, mas não o substitui no exercício dagestão; (princípio da segregação de funções)9 - o Tribunal de Contas deve flexibilizar a rigidez na aplicação dasnormas processuais sempre que o interesse público o exigir;(princípio do informalismo moderado)10 - o Tribunal de Contas deve sempre observar as condiçõesestruturais dos órgãos a ele submetidos, de molde a conciliar asexigências normativas com a realidade administrativa. (princípioda realidade administrativa)

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VOTOS

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AUMENTO DE DESPESA COM PESSOAL - LEI DE

RESPONSABILIDADE FISCAL - ART. 59

Marli VinhadeliConselheira do TCDF

Representação Conjunta nº 01/01 - 2ª ICE/5ª ICE,referendada pela CICE. Representação MPJTCDF nº 08/01 - JU.Aumento de despesa com pessoal. Lei de Responsabilidade Fiscal,art. 59. Alerta aos chefes dos Poderes Executivo e Legislativo.

VOTO DE VISTA

Tendo em conta os termos da Representação Conjunta nº 01/2001 -Divisão de Auditoria/2ª ICE e Divisão de Contas do Governador/5ª ICE,anuída pela CICE - Comissão de Inspetores de Controle Externo, e daRepresentação nº 08/2001 - JU, da lavra do então Procurador Geral doMPJTCDF, hoje Cons. Jacoby Fernandes, este Tribunal de Contas proferiu aDecisão nº 7.144/01, de 30/10/2001 (fl. 38), por meio da qual solicitou aoSr. Secretário de Governo do DF que apresentasse a documentaçãoprobatória do cumprimento dos critérios estabelecidos nos artigos 15, 16,17, 21, 24 e 71 da Lei Complementar nº 101/00 - LRF, em face da edição deleis distritais que resultavam no aumento da despesa com pessoal do Governodo Distrito Federal.

2. Após prorrogações de prazo concedidas pela Corte, referidaautoridade encaminhou o Ofício nº 196/2002, de 07/06/2002 (fls. 63/77),mediante o qual informou as razões de interesse público que levaram àedição das normas questionadas, com ênfase na reestruturação administrativaentão implementada pelo GDF.

3. No que se refere à obediência aos preceitos da Lei deResponsabilidade Fiscal, alegou inicialmente que a LRF ainda carecia de“efetividade plena”, visto que, até aquela data, as entidades públicas detodas as regiões do Brasil encontravam-se em processo de adaptação à novarealidade normativa.

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4. Comentou que essa fase de adaptação, inclusive, vinha sendoressaltada por integrantes das próprias Cortes de Contas, em inúmerosseminários e encontros realizados em todo o território nacional, sendo quediversas normas da LRF eram objeto de ações diretas deinconstitucionalidade, que aguardavam manifestação conclusiva do STF.

5. Diante disso, argumentou que ainda merecia maior reflexão oproblema da responsabilidade de integrantes do Poder Executivo em virtudeda edição de diplomas legislativos causadores de aumento de gastos.

6. Nada obstante o que designou “precariedade da eficáciasocial e jurídica da LRF”, asseverou que o Distrito Federal tem buscadocumpri-la com rigor, incorporando os modernos mecanismos deequilíbrio fiscal estabelecidos.

7. Assim, informou que “os gastos resultantes de novasprevisões legais tem sido precedidos de ampla compensação fiscaldecorrente de aumento de receita, mensalmente verificado pelos órgãoscompetentes”, incremento esse resultante “de uma política de intensificaçãodos programas de cobrança de débitos e dos legítimos incentivos fiscaisimplantados pelo atual Governo”.

8. Ressaltou, ademais, que paralelamente à implementação denovas políticas fiscais, o GDF, buscando “obedecer os requisitos legaisestipulados notadamente pelos artigos 16 e 17 da LRF”, “tem levado emconsideração os impactos financeiros no momento da implementação denovas exigências legais”, conforme tabelas que encaminhou anexas (fls.78/81), as quais teriam sido “confeccionadas tempestivamente”.

9. Por fim, concluiu afirmando que:a completa submissão aos rigores da Lei de Responsabilidade

Fiscal é imperativo inafastável do qual o Governo do Distrito Federal,que tem buscado ultrapassar barreiras de natureza cultural epragmática, a fim de conscientizar cidadãos e agentes públicos danecessidade de se manter o equilíbrio econômico-financeiro doEstado, com passo inicial à consecução de transformações embenefício de toda a coletividade.

10. Em seguida, juntaram-se aos autos os seguintes expedientes:• Ofício nº 319/2002-PG, de 01/07/2002 (fl. 82), em que a Procuradora

Geral do MPJTCDF comunica a concessão, pelo e. TJDFT, de liminarna ADI nº 2001002006536-8, que trata da inconstitucionalidade daLei nº 2.718/01, questionada mediante Decisão nº 7.144/01, cujo

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cumprimento ora se examina. Cumpre esclarecer que a inconstitucionalidadealegada não se reporta a qualquer dispositivo da LRF, mas, sim, à criaçãode benefício para integrantes de carreiras de instituições cuja manutençãoé de competência da União, nos termos do art. 21, XIV, da CRFB;

• Ofício nº 26/2003 - CF, de 14/02/2003 (fl. 94) solicitando o exame denovas leis, assemelhadas às indicadas na Decisão nº 7.144/01.11. Em instrução datada de 18.10.2004, os integrantes da CICE

concluíram que a resposta encaminhada pelo Secretário de Governo do DFnão logrou atender a determinação constante da Decisão nº 7.144/01, poisnão contemplou a documentação probatória do efetivo cumprimento doscritérios estabelecidos na LRF. Eis, em síntese, os seus argumentos

Não obstante a complexidade e a abrangência da LRF terensejado aprofundados debates entre as entidades públicas do país, énotório que seus dispositivos têm aplicabilidade imediata a partir desua edição, ainda que sejam objeto de ações diretas deinconstitucionalidade perante o STF, visto que seus efeitoseventualmente só podem vir a ser suspensos com a efetiva manifestaçãodaquela Suprema Corte.

Quanto a esse aspecto, cabe ainda ressaltar que, entre as ADInsem tramitação no STF acerca da LRF (2238-5, 2241-5, 2250-4, 2256-3, 2261-0 e 2324-1), apenas a de número 2238-5 trata de dispositivosenvolvidos na matéria abordada nestes autos, sendo que, em julgamentoproferido em 9.5.2002, foi indeferida concessão de liminarrelativamente aos artigos 15, 17 e 24 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Embora atentos à questão de que a eficácia de um textonormativo condiciona-se também à sua adequação à realidade sociale aos valores vigentes na sociedade, entendemos que o processo deadaptação da Administração Pública a essa nova realidadeadministrativa será tão mais breve e sereno quanto for o esforço dosgovernos em atender plenamente todos os seus dispositivos e dasentidades de controle em incitar essa postura.

No que pertine à alegação quanto à responsabilidade dos agentespúblicos em virtude da edição de atos legislativos que impõem aumentode gastos, cumpre esclarecer que não cabe dúvida quanto a esse aspectono caso específico tratado nestes autos, uma vez que os normativosabordados versam sobre matéria cuja iniciativa de lei é privativa doChefe do Executivo, nos termos do § 1º do art. 71 da Lei Orgânica doDistrito Federal, in verbis:

Tomando como paradigma o procedimento adotado naesfera federal, tem-se que as previsões de aumento de gastos com

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pessoal são antecipadamente consideradas quando da confecçãodo Demonstrativo da Margem de Expansão das DespesasObrigatórias de Caráter Continuado, integrante da lei de diretrizesorçamentárias - LDO, conforme evidencia a seguinte transcriçãoda LDO/2005 da União:

(...)Ressalte-se que a LDO/2005-União estipula, ainda, em seu

art. 85, que as autorizações para concessões de quaisquer vantagens,aumentos de remuneração, criação de cargos, empregos e funções,alterações de estrutura de carreiras, bem como admissões oucontratações de pessoal a qualquer título condicionam-se à suadiscriminação, em anexo específico da lei orçamentária anual, oqual conterá a quantificação e o valor das admissões ou contratações,bem como o valor referente às demais alterações propostas.

A esse respeito, quando da análise da LDO/2003 distrital(Processo nº 1.495/02), alertou-se às Secretarias de Fazenda e dePlanejamento que a previsão genérica de aumento de despesa compessoal constante do artigo 42 da LDO/2003, Lei nº 3.042/02,contraria o disposto no inciso II do § 1º do artigo 169 da ConstituiçãoFederal, devendo-se corrigir a falha, a partir da LDO referente aoexercício de 2004, exigindo a elaboração de quadro anexo à LOA/2004 contendo, por órgão e Poder, a especificação e quantificaçãodas despesas com pessoal autorizadas a sofrerem acréscimo, nosmoldes já trabalhados pela esfera federal, especialmente mediante oart. 77 da Lei federal nº 10.524/02, art. 16 da Lei federal nº 10.640/03e respectivo Quadro. Em razão de a referida Decisão ter sido exaradaapós a publicação da LDO/2004, reiterou-se, por meio da Decisãonº 2.421/2004, os termos do alerta, para cumprimento a partir daLDO/2005.

Por fim, retomando a documentação em análise, ojurisdicionado apresenta tabelas de valores que acredita demonstraros impactos financeiros no momento da implementação daslegislações indicadas na Decisão nº 7144/2001.

Referidas tabelas, individualizadas por cada lei questionada,limitam-se a demonstrar, de forma pouco clara, valores referentes,na maioria dos casos, ao período de agosto de 2001 a março de2002, sem discriminação da natureza desses montantes (despesaempenhada, despesa liquidada ou outra classificação). Para algumasleis, são indicados apenas valores referentes a “diferenças” entredeterminados períodos (por exemplo, janeiro/2002 e dezembro/2001, março/2002 e julho/2001), inexistindo explicações sobre aque esses montantes se referem.

(...)

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Observe-se, mais uma vez, que, quanto às Leis nºs 2.622, 2.675,2.733 e 2.734 e à Lei Complementar nº 403, todas constantes da Decisãodesta Corte, não há qualquer referência no Ofício encaminhado peloSecretário de Governo.

12. A Comissão de Inspetores de Controle Externo prossegue suaanálise buscando interpretar os dispositivos da LRF indicados na Decisãonº 7.144/01, findando por concluir que a aprovação de atos que resultemaumento de despesas com pessoal está condicionada ao cumprimento dasseguintes condições:

a. autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169,§ 1º, II da Constituição Federal);

b. existência de prévia dotação orçamentária ( art. 169, § 1º, I daConstituição Federal);

c. não vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias(art. 37, XIII da Constituição Federal);

d. atendimento do limite legal de despesas com inativos (art. 21, inc.II da LRF), com interpretação dada na ADIN nº 2238-5;

e. estimativa de impacto orçamentário-financeiro no exercício emque entrar em vigor e nos dois seguintes (art. 16, inc. I, e art.24 da LRF);

f. declaração do ordenador de despesa quanto à adequação orçamentáriae financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com oplano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias (art. 16,inc. II, da LRF);

g. demonstração da origem dos recursos para seu custeio (art. 17, §1º, e art. 24 da LRF);

h. comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará asmetas de resultados previstas no anexo de metas fiscais da Lei deDiretrizes Orçamentárias (art. 17, § 2º, e art. 24 da LRF);

i. compensação dos efeitos financeiros, nos períodos seguintes, peloaumento permanente de receita ou pela redução permanente dedespesas (art. 17, § 2º, e art. 24 da LRF);

j. expedição do ato anteriormente aos últimos cento e oitenta dias domandato do titular do respectivo Poder ou órgão (art. 21, parágrafoúnico da LRF);

k. despesas com pessoal inferiores a 95% do respectivo limite de gastos(art. 22, parágrafo único da LRF).

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13. Esclarece que, conforme entendimento esposado na instruçãodo Processo nº 569/2003, fundado no escólio dos Mestres Ivan BarbosaRigolin e Diogo de Figueiredo Neto, a expressão “ato”, grafada no caput doart. 21 da LRF, alcança os atos legislativos em exame nos presentes autos.

14. Corroborando, mais uma vez, a tese defendida no Processo nº569/2003, os Inspetores de Controle Externo admitem que a conseqüênciado descumprimento dos arts. 16, 17, 21 e 24 da LRF é a nulidade do ato quedeu causa ao aumento de despesa com pessoal, a teor do disposto no art. 15e no caput do art. 21 daquela norma, que se materializa pelainconstitucionalidade reflexa das leis em apreciação. Sendo assim, esteTribunal, ao apreciar a matéria na via difusa, amparado na Súmula STF nº347/63, pode, conforme sua conhecida jurisprudência, negar validade aosatos decorrentes de tais leis.

15. Diante disso, propõem ao e. Plenário:I - tomar conhecimento do Ofício nº 196/2002, do Exmo. Sr. Secretário de

Governo, e da documentação que o acompanha (fls. 63/81); do Ofícionº 319/2002-PG, da Exma. Sra. Procuradora-Geral do MinistérioPúblico junto ao TCDF (fl. 82), e do Ofício nº 26/2003-CF, da Exma.Sra. Procuradora Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira (fl. 94);

II - considerar que as informações prestadas a esta Corte pelo Exmo. Sr.Secretário de Governo (fls. 63/81) não atendem a determinaçãoconstante da Decisão nº 7144/2001, tendo em vista que nãocontemplam a documentação comprobatória do cumprimento doscritérios estabelecidos pelos arts. 16, 17, 21 e 24 da Lei Complementarnº 101/2000 - LRF, conforme tratado no item III deste despacho;

III - determinar ao Exmo. Sr. Secretário de Governo que, em 60 (sessenta)dias, apresente as razões de justificativa pelo não atendimento dosrequisitos exigidos pelos arts. 16, 17, 21 e 24 da LRF, no que pertine àedição das Leis nºs 2.622 e 2.623 de 2000, 2.675, 2.707, 2.720, 2.732,2.733, 2.734, 2.737, 2.738, 2.743, 2.756, 2.757 e 2.758 de 2001 e da LeiComplementar nº 395/2001;

IV - alertar ao Poder Executivo e à Câmara Legislativa do Distrito Federalque a edição de atos que provoquem aumento de despesa compessoal condiciona-se à prévia comprovação do atendimento dasseguintes exigências:

(...)V - autorizar a remessa de cópia deste despacho ao Exmo. Sr. Secretário

de Governo, para que possa subsidiar o atendimento da diligênciaacima proposta;

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VI - enviar cópia desta instrução à 1ª, 2ª e 3ª Inspetorias para, no âmbito de suascompetências, darem seguimento ao acompanhamento da edição de atos deque resultem aumentos de gastos com pessoal.

16. Os autos foram ao MPJTCDF que, em parecer da ProcuradoraCláudia Fernanda, a par de considerar que o corpo técnico deu “uma aula arespeito da LRF”, apresentou as seguintes considerações:

(...)14. Os autos vieram ao MP para parecer que irá concordar,

sem maiores delongas, com o trabalho do corpo técnico não semantes lamentar que os fatos refiram-se ao ano de 2001, data em vigorda respeitadíssima LRF. Estamos em 2004!

15. A defasagem da análise e o controle tardio militamcontra o TCDF. Já se disse que o resgate das Cortes de Contas sedeu com a edição da multicitada lei complementar, numreconhecimento, inequívoco, da relevância das atividades prestadaspelos Tribunais de Contas. Quase todos, então, já se aparelharampara o controle tempestivo e efetivo da gestão fiscal.

16. É constrangedor, em 2004, renovarmos solicitação deinformações à Secretaria de Governo a respeito do cumprimento daLRF, leis essas que datam de pelo menos quatro, três, anos atrás.

17. O alerta que se sugere também já deveria ter sidofeito incontinente.

18. Não há, em que pese tudo o que se expôs, ainda,qualquer sugestão de prazo para atendimento. Viu-se, neste mesmoprocesso, que entre a determinação do TCDF (leia-se idênticadeterminação em seus efeitos à que dois anos após se renova) e o seuatendimento, pela Secretaria de Governo, mediaram oito meses!

19. Registre-se, por oportuno, que as informações dojurisdicionado são de junho de 2002, mas os autos só foram instruídosem outubro de 2004, data bem próxima ao recesso desta Corte e dasférias coletivas. Já há vários Conselheiros que não estão recebendoprocessos em seus gabinetes. Assim, se esse processo for julgado,ainda este ano, qualquer providência ficará para 2005, ao retornodas atividades da Casa.

20. Quanto tempo mais esperaremos para que o TCDFconclua a questão definitivamente: houve ofensa ou não aos imperativosda LRF; possível existência de crime e improbidade; nulidade, etc.

21. Felizmente, a hipótese não poderá ser alcançada, demodo algum, pela decadência a que alude a Lei de ProcessoAdministrativo, mas vá lá, estamos falando de vantagens econômicasconstituídas há mais de cinco anos!

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22. E o que mais aflige é imaginar que além das leis juntadas peloparquet a fls. 93, há o reconhecimento dramático de que outras leis análogas“podem” existir, já que o levantamento a respeito alcança apenas até marçode 2003 (Anexo I), sem que haja qualquer providência ou sugestão a essasreferentes.

23. Fica claro que a prática da análise dessas questõesprecisa mudar.

24. Sabemos todos do volume de trabalho que assola ascompetentes inspetorias, mas o TCDF terá que arrumar meios de seaparelhar para exercer o controle.

25. Nesse sentido, quanto às leis que esses autos analisam,o MPC/DF opina que seja o processo considerado, de fato, prioritárioe urgente, fixando-se o prazo fatal de 30 (trinta) dias improrrogáveis,para que a Secretaria de Governo apresente seus esclarecimentos. Poroportuno, da chegada das informações, deve a Corte fixar, desde já,que a análise pelo competente Corpo Técnico deva dar-se em nãomais também que 30 (trinta) dias improrrogáveis, de sorte que o TCDFdecida, sem demora, a questão.

26. Correlatamente, sejam autuados, por exercício, processosespecíficos para análises de leis análogas relativas ao exercício de 2002(fazendo-se a ressalva da específica discussão quanto ao períodoeleitoral); 2003 e 2004, hipótese em que devem ser buscadas imediatasinformações, com prazos fatais de exatos 30 (trinta) dias e análises emigual período. A expectativa é de que no 1º semestre de 2005 o TCDFconsiga concluir a análise da LRF em face dessas leis concessivas devantagens pessoais.

27. Paralelamente, para 2005, seja estudada metodologiaque procure a análise imediata da lei, tão logo promulgada, a fim denão se repetir o que ocorreu no presente exercício.

28. Com esses acréscimos, o MPC/DF concorda comas sugestões do Corpo Técnico a fls. 136/138.

17. O insigne Relator dos autos, Cons. Ávila e Silva, apresentouvoto lavrado nos seguintes termos:

Os autores da Representação Conjunta nº 01/01 manifestampreocupação no sentido de que a edição das leis que mencionampossam ‘contribuir para aumentar a despesa com pessoal doComplexo Administrativo Distrital’. Em razão disso, sugerem queseja encaminhada ‘a documentação comprobatória do cumprimentodos critérios estabelecidos pelos art. 15, 16, 17, 21 e 24, todos daLei Complementar nº 101/2000, tendo em conta o princípio daresponsabilidade fiscal previsto no art. 1.º desta lei.’

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Por seu turno, o autor da Representação nº 08/01, mais ponderado,pugna para que o Tribunal possa ‘verificar se as despesas criadas atendemaos dispositivos: art. 169, § 1.º, CF/88 (reproduzido pelo art. 157 da LODF)e arts. 21 e 71 da Lei Complementar nº 101/00 – LRF’.

No entanto, conforme se extrai do conteúdo da Decisão nº 7.144/01, restou vencedora a sugestão constante dos autores da RepresentaçãoConjunta nº 01/01.

Antes de adentrar à intimidade das informações prestadas peloSecretário de Governo do Distrito Federal, cumpre examinar, dentreoutros, os arts. 15, 16, 17, 21 e 24 da LRF, visto que fazem parte dadecisão em destaque. Esses dispositivos trazem a seguinte redação:

(...)Todos os diplomas legais indicados na Representação

Conjunta nº 01/01 dizem respeito a gastos com pessoal, exceto aLei Complementar nº 395/01, que dispõe sobre a organização daProcuradoria Geral do Distrito Federal. Tudo está a indicar que apreocupação dos autores da representação está voltada para afiscalização do processo legislativo, em um típico controle político,senão vejamos.

(...)Extrai-se dos argumentos expendidos pelos autores da

Representação que os tribunais de contas estariam, com o adventoda LRF, investidos da competência de fiscalizar o processo legislativo,desde o envio de um projeto de lei até à atuação do processodeliberativo do Poder Legislativo.

(...)Cobra relevo, portanto, encontrar respostas para as seguintes

perguntas: a LRF conferiu novas atribuições aos tribunais de contas?Qual o sentido que se deve conceder à expressão ‘novas atribuições’?a LRF concedeu aos tribunais de contas competência para afiscalização do processo legislativo?

É bem de ver que a LRF conferiu atribuições aos Tribunaisde Contas. Dentre elas, as dispostas no art. 59, cujo caput é deseguinte teor:

Art. 59. O Poder Legislativo, diretamente ou com oauxílio dos Tribunais de Contas, e o sistema de controle internode cada Poder e do Ministério Público, fiscalizarão ocumprimento das normas desta Lei Complementar, com ênfaseno que se refere a (...).

Estaria o dispositivo acima transcrito dispondo a fiscalizaçãoda produção legislativa? Vejamos.

O art. 1.º da LRF está vazado nos seguintes termos:

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Art. 1.º Esta Lei Complementar estabelece normas definanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestãofiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição’(o destaque é nosso).

A LRF, conforme preceitua o dispositivo que vem de sertranscrito, está voltada para a responsabilidade na gestão fiscal.Então, essa lei complementar não se volta para a produção de leisespecificamente, mas sim para a gestão fiscal, que não é outra coisasenão a observância das leis já estabelecidas, em atenção aoprincípio da legalidade, que vincula os atos praticados pelaAdministração Pública.

Tanto está voltada para o compartimento da gestão fiscal enão para o da produção de leis, que o art. 9º, § 3º, da LRF, estampaa seguinte redação:

Art. 9º Se verificada, ao final de um bimestre, que a realizaçãoda receita poderá não comportar o cumprimento das metas deresultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de MetasFiscais, os Poderes e o Ministério Público promoverão, por atopróprio e nos montantes necessários, nos trinta dias subseqüentes,limitação de empenho e movimentação financeira, segundo oscritérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.

(...)§ 3.º No caso de os Poderes Legislativo e Judiciário e o

Ministério Público não promoverem a limitação no prazoestabelecido no caput, é o Poder Executivo autorizado a limitaros valores financeiros segundo os critérios fixados pela lei dediretrizes orçamentárias.

Os dispositivos acima transcritos estabelecem doismecanismos de gestão fiscal. Um levado a efeito pelo próprio Poderou pelo Ministério Público que, conforme o caso, não estejaatendendo as metas de resultado (art. 9º, caput) e outro realizadopelo Poder Executivo, caso o Poder ou o Ministério Públicoresponsável pela desatenção à norma não tenha efetivado a correçãopor meio de ato próprio (§ 3º).

Esses e outros dispositivos da LRF deixam claro que a atuaçãodo Controle Externo está afeta à fiscalização do ato administrativo enão a do processo legislativo, que culmina com a edição lei.

As competências dos tribunais de contas têm seu nascedourona Constituição Federal. Dentre elas, merecem destaque, em razãoda matéria aqui tratada, aquelas de que tratam os incisos I, II e IV,do art. 71 da CF. Ademais o caput do art. 70 da CF estabelece que afiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional epatrimonial será exercida mediante controle externo. Esse mesmo

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leque de atuação das Cortes de Contas vê-se reproduzido no incisoIV do art. 71 da CF. Sob esse ponto de vista, a gestão fiscal, naforma disciplinada pela LRF, já estava ao alcance da atuaçãofiscalizadora do controle externo, por força dos dispositivosconstitucionais antes referidos. Então, sob essa ótica, não há novasatribuições conferidas às Cortes de Contas em face da edição da LRF.

Nesse contexto, a expressão ‘novas atribuições outorgadaspela LRF aos tribunais de contas’, cunhada pelos autores daRepresentação Conjunta n.º 01/01, não pode ter o sentido decompetência nova ainda não prevista no texto constitucional. Pode,apenas, ter o sentido de observância dos novos parâmetros, limitese medidas estabelecidos pela LRF para a gestão fiscal pública.

Conquanto se trate de diploma legal controvertido, a LRF,quanto à sua natureza, não encontra disputas substantivas. Trata-sede matéria cuja natureza é de direito financeiro. Ora, conforme dito,a fiscalização financeira da gestão fiscal pública é matéria que,constitucionalmente, já se encontra ao alcance do controle externo.

Daí por que não parece razoável fazer uso do art. 59 da LRF,ao argumento de que esse dispositivo dispõe sobre as novasatribuições das Cortes de Contas, e, assim, pretender fiscalizar oprocesso legislativo, como pretendem os autores da RepresentaçãoConjunta nº 01/01 e o órgão ministerial.

Um projeto de lei não é um expediente que, em si, crie umadespesa. Fere os princípios da harmonia e da independência entreos Poderes da República levantar obstáculos para que o órgão ouPoder legitimado para iniciar o processo legislativo possa exercersuas atribuições.

Tudo está a indicar que refoge à competência dos tribunaisde contas a edição de decisões que bloqueie a elaboração de projetode lei em razão da suposta inobservância de parâmetros estabelecidospela LRF. Em igual medida, parece despropositado que as Cortes deContas, por suas decisões, queira vincular o voto dos parlamentaresem relação a determinado projeto de lei. Mesmo porque, como já sedisse, a LRF está voltada para a gestão fiscal e não para a produçãode leis. É que a observância dos limites impostos pela LRF só hão deser verificados na gestão fiscal caso existam leis para a prática dosatos administrativos de gestão fiscal, posto que o gestor público estávinculado, dentre outros, ao princípio da legalidade. Então, a LRFestá voltada para a prática dos atos administrativos fundamentadosem leis já existentes e não em aspectos prévios de produção dosdiplomas legais, sob pena ferir o princípio sensível da harmonia eindependência entre os Poderes.

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Pensar de forma diversa, é não fazer distinção entre atoadministrativo, ato legislativo e ato jurisdicional, ou, dito de outraforma, processo administrativo, processo legislativo e processojurisdicional. O processo legislativo é um conjunto de atos que visama criação de normas. Esses atos compreendem: iniciativa legislativa,votação, sanção, veto, promulgação e publicação.

No sistema constitucional brasileiro, a iniciativa das leis estáafeta aos membros do Poder Legislativo, ao Presidente da República,ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao MinistérioPúblico, ao Tribunal de Contas, à iniciativa popular. Vê-se, pois, quea competência de iniciativa de leis, observada a disciplinaconstitucional, é do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do PoderExecutivo, do Ministério Público e da Sociedade. Contudo, ondequer que se origine o exercício dessa competência, trata-se de iníciodo processo legislativo. Portanto, quando o Supremo TribunalFederal, órgão de cúpula do Poder Judiciário, iniciar processolegislativo, enviando para o Congresso Nacional projeto de lei sobrematéria cuja iniciativa lhe compete, não está a produzir ato pertencenteao universo do processo jurisdicional, mas sim ato que se enquadrano campo do processo legislativo. Em igual medida o PoderExecutivo. Quando o Chefe do Poder Executivo, usando deprerrogativa constitucional, encaminha projeto de lei ao PoderLegislativo, está praticando um ato próprio do processo legislativo enão um ato do processo administrativo.

O que está sob a jurisdição do controle externo são os atosadministrativos, pertencentes que são ao processo administrativo.Caso se entenda de forma diversa, há de se concluir também, porlógica de raciocínio, que aos Tribunais de Contas compete àfiscalização de todos os atos que compõem o processo legislativo:iniciativa legislativa, votação, sanção, veto, promulgação e publicação.Não apenas isto. Podendo os Tribunais de Contas imiscuírem-se noprocesso legislativo, também, por lógica de raciocínio, estão sob ajurisdição do controle externo os atos jurisdicionais.

Penso que aos Tribunais de Contas compete à fiscalizaçãodos atos administrativos, quer sejam eles praticados pelo PoderExecutivo, pelo Poder Judiciário, pelo poder Legislativo ou peloMinistério Público.

No caso que aqui se examina, os autores da RepresentaçãoConjunta nº 01/01 e o representante do órgão ministerial pugnampela atuação do controle externo na elaboração do projeto de lei,matéria esta típica do processo legislativo.

(...)

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O art. 1º da LRF dispõe que ela “estabelece normas de finançaspúblicas.” Matéria de direito financeiro, que é o caso da LRF, estáenquadrada no âmbito da competência concorrente para legislar (art.24, I, CF). Em casos que tais, dispõe o § 1º do art. 24 da CF que no“âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais”.

Dos dispositivos constitucionais indicados no parágrafoanterior, sobressai um tema tormentoso, que não tem encontradoharmonia tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Trata-se deestabelecer o conceito do que sejam normas gerais. Ou, dito de formamais específica: o que é norma geral no âmbito da LRF? Não pretendoaqui exaurir a discussão desse controvertido tema. Contudo, abordouma questão dele decorrente.

Reconhecendo que a matéria pertence à competência legislativaconcorrente, pode a autoridade pública deixar de aplicar dispositivoque entenda inconstitucional ou que não possa ser catalogado comonorma geral?

A esse respeito, o então Ministro do STF, Moreira Alves, aoproferir voto vencedor na Representação nº 980 – SP, assim se houve,dentre outras considerações, da seguinte forma:

Não tenho dúvida de filiar-me à corrente que sustenta quepode o Chefe do Poder Executivo deixar de cumprir –assumindoos riscos daí decorrentes– lei que se lhe afigure inconstitucional.A opção entre cumprir a Constituição ou desrespeitá-la para darcumprimento a lei inconstitucional é concedida ao particular paraa defesa do seu interesse privado. Não o será ao Chefe de um dosPoderes do Estado para a defesa, não do seu interesse particular,mas da supremacia da Constituição que estrutura o próprioEstado? Acolho, pois, a fundamentação –que, em largos traços,expus– dos que têm entendimento igual.

Veja-se, pois, que, submetido aos riscos dessa modalidade dedecisão, pode o Chefe do Poder Executivo deixar de dar cumprimentoa determinado dispositivo da LRF por entender que se trata de matérianão arrolada como norma geral.

No caso que aqui se examina, presta-se a discussão do temapertinente a normas gerais para tornar evidente, com mais esteargumento, que não está ao alcance dos tribunais de contas afiscalização da elaboração de projeto de lei.

Trago também à ponderação o caso específico das leisquestionadas. Os autores da Representação Conjunta nº 01/01alinham 14 (quatorze) normas distritais. Dessas, duas foram editadasno ano 2000 e as demais no ano de 2001.

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No § 2º da Representação Conjunta nº 01/01, diz-se que,com o advento da LRF, ‘requisitos devem ser observados para acriação, expansão ou aperfeiçoamento da ação governamentalque acarretem aumento de despesa e para os atos que criaremou aumentarem despesas obrigatórias de caráter continuado’(grifo nosso).

O destaque na transcrição supra serve para indicar que aexpressão se encontra no art. 16 da LRF. O § 1.º do art. 1.º da LRFestabelece que a ‘responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a açãoplanejada (...)’. Por sua vez, o Capítulo II, que desse planejamento,apresenta a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a Lei deOrçamento Anual (LOA) e o Plano Plurianual (PPA) comoinstrumento dessa ação planejada. Sob esse ponto de vista, portanto,o art. 16 da LRF, ao dispor sobre a criação, expansão ouaperfeiçoamento de ação governamental, não estaria disciplinandotoda e qualquer despesa, visto que os requisitos de que tratam os incisos eparágrafos do art. 16 da LRF já teriam sido observados por ocasião daLOA, LDO e PPA.

É este ensinamento que também se colhe de CarlosMaurício Figueiredo e outros, que ao examinarem o art. 16 da LRFassim lecionam:

O disposto nesse artigo coaduna-se com o planejamento econseqüente equilíbrio fiscal buscado pela LRF. Não se estáestipulando regras para toda e qualquer despesa efetuada peloEstado. Uma vez que aquelas já consignadas na lei orçamentárianão se submetem aos novos requisitos impostos pelo dispositivosob análise.

Na verdade, entendemos que trata-se da obrigação dedemonstrar o impacto orçamentário-financeiro (inciso I) e acompatibilidade com o plano plurianual e com a LDO (incisoII), apenas para aumento de despesas advindas da criação,expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental. Assimentendidas aquelas derivadas das alterações orçamentárias. Nalição do Prof. Heraldo da Costa Reis, estas alterações sematerializam através dos créditos adicionais ou do remanejamento,da transposição e da transferência, que são instrumentosestabelecidos pelo artigo 167, VI, da CF.

Careceria de razoabilidade exigir a análise do impactoorçamentário-financeiro para despesas com dotação já aprovadasno orçamento, posto que esse impacto já foi analisado durante afase de elaboração do orçamento, estando ínsito a essa fase oaspecto do planejamento (Comentários à Lei de ResponsabilidadeFiscal. 2ª ed. Revista dos Tribunais, 2001, p. 110/111).

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Essa mesma compreensão é ostentada por Pedro Lino que,sobre o art. 16 da LRF, ensina:

(...). E referem-se aos programas especiais de trabalho ouàqueles que não estiverem especificados ou discriminados nasLDO e LOA (...).

É claro; não tem qualquer sentido que dado programa, commetas claramente definidas, com investimentos inteiramentediscriminados na LOA segundo os projetos de obras e outrasaplicações, ou seja, inteiramente submetido –e aprovado– aocontrole político, já dentro do planejamento pretendido pela Lei,deva ser objeto de limitações; desfigurar-se-ia, inteiramente, osentido do próprio conceito de orçamento-programa. Entretanto,tal situação, para fins de controle, deve ser indicada no ato decriação do programa.

A aplicação do dispositivo, portanto, parece dirigir-se,inquestionavelmente, àquela segunda situação do inciso I do § 1ºdo artigo em comento, qual a despesa autorizada por créditogenérico. Aí sim, nesse caso, e apenas nesse caso, o atoadministrativo que implique criação, expansão ou aperfeiçoamentode ação governamental deve subordinar-se às exigências dos doisprimeiros incisos (Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal.Atlas, 2001, p. 69).

Nessa perspectiva, então, não há razão para requerer oencaminhamento da documentação referente aos requisitos de quetrata o art. 16 da LRF. É que, no caso das leis levantadas pelos autoresda Representação Conjunta nº 01/01, as exigências constantes doart. 16 da LRF já foram observadas por ocasião da elaboração doLOA, LDO e PPA. Agora, depois de editada a lei, devem-se fiscalizaros atos administrativos que lhe dão eficácia.

Pede-se também a documentação referente ao cumprimentodos critérios estabelecidos no art. 17 da LRF. A mesma interpretaçãoconferida ao art. 16 presta-se também para o art. 17. No caso destedispositivo, contudo, a situação é ainda mais explícita em razão dodisposto no seu § 2º. Nesse dispositivo, diz-se que ‘o ato seráacompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentadanão afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referidono § 1º do art. 4º’.

O § 1º do art. 4.º da LRF está assim disposto:Art. 4.º (...)§ 1º Integrará o projeto de lei de diretrizes orçamentárias

Anexo de Metas Fiscais, em que serão estabelecidas metas anuais,em valores correntes e constantes, relativas a receitas, despesas,resultados nominal e primário e montante da dívida pública, parao exercício a que se referirem e para os dois seguintes.

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Veja-se que o dispositivo se preocupa em que o gestor público,na atividade de implementação ou da despesa, observe os parâmetrosestabelecidos nos instrumento da ação planejada do Governo, a saber:LOA, PPA, LDO.

A LRF não está voltada para a produção de leis que hão dedar efetividade ao quanto estabelecido na LOA, PPA e LDO. Pugna,e isto de forma insistente, que os parâmetros e limites postos naLRF devem ser observados quando da implementação da despesapública. Tanto assim que há mecanismos legais de gerência fiscal,tais como a compensação, a limitação de empenho e a suspensãode repasses.

O art. 71 da LRF deixa claro que a principal vocação dessediploma legal é com a gestão fiscal e não com a produção de leis. Eisos seus termos:

Art. 71. Ressalvada a hipótese do inciso X do art. 37 daConstituição, até o término do terceiro exercício financeiroseguinte à entrada em vigor desta Lei Complementar, a despesatotal com pessoal dos Poderes e órgãos referidos no art. 20 nãoultrapassará, em percentual da receita corrente líquida, a despesaverificada no exercício imediatamente anterior, acrescida de até10% (dez por cento), se esta for inferior ao limite definido naforma do art. 20.

Veja-se que a LRF estabeleceu um período de acomodaçãode três anos, deixando evidente que está voltada para gestão fiscal.

Sobre a gestão fiscal com gasto de pessoal, extraio do RelatórioAnalítico e Parecer Prévio sobre as Contas do Governador do DistritoFederal, exercício de 2001, o seguinte:

Observa-se, assim, que as razões entre as despesas líquidasde pessoal e a Receita Corrente Líquida distrital, para o Executivo,a Câmara Legislativa e o Tribunal de Contas do DF, enquadram-se dentro dos limites preconizados pela LRF e LDO/2001(Relatório Analítico, exercício 2001, p. 79).

Quanto ao ano de 2002, o pronunciamento deste Tribunalquanto aos gastos com pessoal foi de seguinte teor:

O cumprimento dos limites de gastos com pessoal definidosna LRF e na LDO/2002 foi verificado nas análises relativas aosRelatórios de Gestão Fiscal.

(...)De acordo com o Relatório sobre as Contas do Governo

relativo ao exercício de 2001 e os dados acima apresentados, asdespesas com pessoal do Poder Executivo cresceram dentro doslimites (1%). Quanto ao Poder Legislativo e seus órgãos, asdespesas de pessoal diminuíram relativamente à RCL’ (RelatórioAnalítico, exercício 2002, p. 88).

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Finalmente, quanto ao exercício de 2003, disse-se que ‘osdemonstrativos da gestão fiscal do Poder Executivo e da Câmara Legislativado Distrito Federal expressam, em linhas gerais, o cumprimento dasexigências da Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000’ (RelatórioAnalítico, exercício de 2003, p. 381).

Constata-se, então, que o Poder Executivo distrital, a CâmaraLegislativa do DF e este Tribunal, nos exercícios de 2001, 2002 e2003, atenderam as exigências, requisitos e limites estabelecidos naLRF no respeitante a gastos com pessoal. Quer isto significar que osbenefícios remuneratórios de que tratam as leis relacionadas naRepresentação Conjunta nº 01/01 foram objeto de exame por esteTribunal e se constatou a sua harmonia com os ditames da LRF.

Por tudo isso, ainda que se entenda que as informaçõesprestadas pelo Secretário de Governo do Distrito Federal nãoatenderam o disposto na Decisão nº 7.144/01; e ainda que não seconcorde com a interpretação de dispositivos da LRF expendida nopresente voto. Mesmo assim, perde-se o objeto o prosseguimentodo feito, visto que este Tribunal já decidiu no sentido de que, nosexercícios de 2000, 2001 e 2002, não houve, por parte do PoderExecutivo, desobediência aos limites com gastos de pessoalestabelecidos na LRF. Por isso mesmo, não se pode dizer que as leisaqui em destaque desatenderam o disposto no art. 21 da LRF, vistoque este Tribunal não pugnou pela anulação de nenhum ato dedespesa com pessoal, mesmo porque todas as despesas com pessoal,nos exercícios referidos, atenderam a LRF.

De todo o exposto, lamentando dissentir do entendimentoesposado pela nossa unidade técnica e pelo órgão ministerial quantoao entendimento dos artigos da LRF, indicados na RepresentaçãoConjunta nº 01/01, VOTO no sentido de que o egrégio Plenário:a) tome conhecimento do Ofício nº 196/2002, do Excelentíssimo

Senhor Secretário de Governo, e da documentação que oacompanha; do Ofício nº 319/2002-PG, da ExcelentíssimaSenhora Procuradora Geral do Ministério Público junto aoTCDF; e do Ofício nº 26/2003-CF, da Excelentíssima SenhoraProcuradora Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira;

b) considere que as informações prestadas a esta Corte peloExcelentíssimo Senhor Secretário de Governo não atendem adeterminação constante da Decisão nº 7.144/01;

c) reconheça a perda do objeto do presente processo, tendo emvista que este Tribunal, em relação aos exercícios de 2001, 2002e 2003, decidiu no sentido de que o Poder Executivo desenvolveua sua gestão fiscal em perfeita harmonia com a Lei Complementarnº 101/2000, no que diz respeito a gastos com pessoal;

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d) firme entendimento de que a Lei Complementar nº 101/2000não cuida da produção legislativa, mas sim da gestão fiscal, aícompreendidos os atos administrativos e não os atos legislativos;

e) dê ciência dessa decisão ao Secretár io de Governo doDistrito Federal;

f) determine o arquivamento dos autos.18. Levado a Plenário em Sessão de 07/04/2005, pedi vista dos

autos para melhor me inteirar da matéria, de estreita correlação com a tratadanos Processos nos 837/02 e 569/03, de meu relato, conforme Decisões nos

1.855/04 e 3.330/03, respectivamente.19. Não tenho dúvidas de que a Lei de Responsabilidade Fiscal

trouxe novos contornos à fiscalização atribuída aos Tribunais de Contaspela Constituição da República (arts. 70 e 71).

20. Estabeleceu, certamente, a LRF, um novo “olhar” sobre a gestãoe as contas públicas, que passam a ser avaliadas pelos Tribunais de Contasnão apenas com as lentes da legalidade, da legitimidade e da economicidade,mas, também, da gestão fiscal responsável. A publicidade adquiriu novomatiz: a transparência.

21. Assim é que o artigo 59 da LRF estabelece que:Art. 59. O Poder Legislativo, diretamente ou com o auxílio

dos Tribunais de Contas, e o sistema de controle interno de cadaPoder e do Ministério Público, fiscalizarão o cumprimento dasnormas desta Lei Complementar, com ênfase no que se refere a:

I - atingimento das metas estabelecidas na lei de diretrizesorçamentárias;

II - limites e condições para realização de operações de créditoe inscrição em Restos a Pagar;

III - medidas adotadas para o retorno da despesa total compessoal ao respectivo limite, nos termos dos arts. 22 e 23;

IV - providências tomadas, conforme o disposto no art. 31,para recondução dos montantes das dívidas consolidada e mobiliáriaaos respectivos limites;

V - destinação de recursos obtidos com a alienação de ativos,tendo em vista as restrições constitucionais e as desta LeiComplementar;

VI - cumprimento do limite de gastos totais dos legislativosmunicipais, quando houver.

§ 1º Os Tribunais de Contas alertarão os Poderes ou órgãosreferidos no art. 20 quando constatarem:

I - a possibilidade de ocorrência das situações previstas noinciso II do art. 4o e no art. 9º;

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II - que o montante da despesa total com pessoal ultrapassou90% (noventa por cento) do limite;

III - que os montantes das dívidas consolidada e mobiliária,das operações de crédito e da concessão de garantia se encontramacima de 90% (noventa por cento) dos respectivos limites;

IV - que os gastos com inativos e pensionistas se encontramacima do limite definido em lei;

V - fatos que comprometam os custos ou os resultados dosprogramas ou indícios de irregularidades na gestão orçamentária.

§ 2º Compete ainda aos Tribunais de Contas verificar oscálculos dos limites da despesa total com pessoal de cada Poder eórgão referido no art. 20. (destaquei).

22. Muito embora a LRF tenha dado ênfase a determinadosaspectos da fiscalização, esta abrange o cumprimento de todas as suasnormas, voltadas que estão para a prevenção de riscos e à correção de desvioscapazes de afetar o equilíbrio das contas públicas. Vale dizer que as situaçõesenfatizadas no artigo 59 da LRF têm natureza exemplificativa e não exauremas hipóteses de fiscalização das Cortes de Contas.

23. Exatamente para evitar o desequilíbrio fiscal, a LRF criouregras e condições que devem ser cumpridas pelo gestor públicopreviamente à criação ou aumento de despesas - de pessoal especialmente- e à renúncia de receitas.

24. Entre essas precauções estão as previstas nos artigos da LRFindicados na Decisão TCDF nº 7.144/01, cujo cumprimento ora se examina,excetuando-se o art. 71, pelas razões já expostas pelo órgão instrutivo.

25. Portanto, a prudência fiscal, que é princípio norteador da gestãofiscal responsável, deve ser exercitada pelo gestor público previamente, nafase de planejamento da despesa ou da renúncia de receita, no momento datomada de decisão. Daí a importância que a lei confere aos instrumentos deplanejamento e orçamentação, notadamente à Lei de DiretrizesOrçamentárias.

26. Sabe-se que existem atos de gestão que devem necessariamenteser precedidos de lei, sejam de renúncia de receitas (CRFB art. 150, § 6º)ou de criação de despesas (CRFB arts. 37, X e XIX, e 61, § 1º, II, a, porexemplo). Por certo que esses atos estão submetidos às precauçõesestabelecidas na LRF, sejam as do artigo 14 ou as do art. 17 dessa leicomplementar, respectivamente.

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27. Ora, se esses atos de gestão dependem de lei que os autorize,cabe ao gestor público detentor da prerrogativa de iniciar o processolegislativo o dever de adotar as precauções estabelecidas na Lei deResponsabilidade Fiscal, que claramente as atribui ao proponente da renúnciade receita (LRF, art. 14, I) ou da criação da despesa de caráter continuado(LRF, art. 17, § 4º).

28. Note-se que o § 5º do art. 17 da LRF estabelece que a despesaobrigatória de caráter continuado, conceito no qual se inserem as despesascom pessoal, “não será executada antes da implementação das medidasreferidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar”.Vale dizer que as precauções estabelecidas na lei devem se materializar nãono momento da execução da despesa, mas previamente ao momento desua criação.

29. Não há falar, portanto, em “fiscalização do processolegislativo” ou em “exame preventivo difuso de constitucionalidade”, oque, de fato, data máxima venia, seriam procedimentos impensáveis paraos Tribunais de Contas.

30. Mas é poder-dever dessas Cortes, a teor do disposto no caputdo art. 59 da LRF, e à luz de suas atribuições constitucionais, verificar se oproponente da lei que autoriza criação ou aumento de despesa, como é ocaso dos autos - despesa de pessoal - adotou as medidas de prudência que aprópria LRF estabeleceu como condição prévia de validade do ato, seja ele“administrativo” ou “legislativo”.

31. Essas medidas de precaução não determinam o processolegislativo, mas, sim, a prudência e a responsabilidade do gestor fiscal - dochefe do Poder ou órgão submetido aos ditames da LRF. Mas, em se tratandode ato legislativo, é importante que a comprovação do efetivo cumprimentodas condições prévias estabelecidas na LRF acompanhem o projeto de leiou a mensagem de seu proponente, para conhecimento da sociedade e dosórgãos de controle indicados no caput do art. 59 e para efetivação de outrodestacado princípio da LRF, a transparência.

32. A gestão fiscal, portanto, estará em desacordo com a LRF se,no momento em que o gestor público toma a decisão de criar ou aumentardespesa com pessoal, não adota as medidas de prudência estabelecidasnaquela norma, e lhes dá publicidade.

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33. Não se trata, repito, de fiscalizar o processo legislativo - nadaobstante o disposto no art. 6º da LC distrital nº 13/961, pois refoge dascompetências das Cortes de Contas, mas, sim, de fiscalizar, de avaliar em suainteireza, o ato de gestão fiscal que, no caso da criação de despesa com pessoal,por força constitucional, necessita de prévia autorização legislativa.

34. É a própria Lei de Responsabilidade Fiscal que indica o caminhoa ser trilhado pela fiscalização dos Tribunais de Contas, dando ênfase a umaatuação preventiva e orientadora, a teor do disposto no § 1º do seu artigo592, de natureza, repito, exemplificativa.

35. Ora, se nas situações de risco enfatizadas nesse dispositivo,deve o Tribunal atuar alertando os Chefes dos Poderes ou órgãos para queadotem as medidas tendentes à correção dos desvios que podem levar aodesequilíbrio fiscal, outra não deve ser a postura pretendida pela LRF quandoconstatados outros desvios ou situações de risco, ressalvadas, por óbvio, ascondutas indicadas na Lei nº 10.028/00, cuja gravidade foi reconhecidapelo legislador a ponto de ali tipificá-las como crimes e infraçõesadministrativas passíveis de pena de reclusão e multa, respectivamente.

36. Sobre a atuação dos Tribunais frente as infrações à Lei deResponsabilidade Fiscal, reporto-me às seguintes considerações expendidaspelo Insigne Conselheiro Hélio Saul Mileski, do TCE/RS, em artigo publicadono periódico Interesse Público (nº 15 - 2002 - p. 67):

(...)Assim, as conseqüências jurídicas que advêm da gestão fiscal

não recaem sobre o Ordenador de Despesas, mas, sim sobre o GestorFiscal, que, nos termos da Lei Complementar nº 101/2000, tem

1 art. 6º. A elaboração das leis obedecerá ao processo legislativo previsto na Lei Orgânica, nestaLei Complementar e no Regimento Interno da Câmara Legislativa, levando-se em conta:I - a necessidade social e o ideário de justiça;II - os princípios jurídicos consagrados pelos diversos ramos do Direito;III - a legislação existente, obedecendo-se, conforme a espécie de lei:a) à Constituição Federal e à Lei Orgânica e suas emendas;b) às leis complementares e ordinárias da União que disponham sobre normas gerais para seremobedecidas pelos Estados, Distrito Federal e Municípios;c) às leis complementares do Distrito Federal;d) às leis ordinárias do Distrito Federal que contenham normas gerais;IV - o histórico das leis ou de seus dispositivos que versem sobre o assunto abordado na nova lei;V - a transição do regime jurídico da lei velha para o da lei nova.2 “§1º Os Tribunais de Contas alertarão os Poderes ou órgãos referidos no art. 20 quandoconstatarem:......”

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responsabilidade concentrada nos dirigentes máximos dos Poderes,Ministério Público e Tribunal de Contas - ... - com avaliação deacompanhamento da gestão fiscal por meio de relatórios bimestrais(art. 52) e quadrimestrais (art. 54), efetuado pelo órgão de controleExterno - Tribunal de Contas -, que realizará alertas aos gestoresfiscais, quando constatar a ultrapassagem de limites de gastos compessoal e de endividamento, inexistência do demonstrativo exigidono inciso II do § 2º do art. 4º ou haver a necessidade de limitação deempenho e movimentação financeira prevista no art. 9º.

Ao final do exercício financeiro, por meio do processo deprestação de contas a que se submetem os gestores fiscais (art. 56),será avaliada a gestão fiscal correspondente, mediante a emissão deparecer prévio conclusivo do Tribunal de Contas (art. 57), relativoao atendimento dos alertas realizado no curso do exercício financeiroe quanto ao cumprimento de todas as demais normas contidas naLei de Responsabilidade Fiscal, tendo em conta os objetivos defiscalização postos no seu art. 59.

Verificado o desatendimento aos alertas efetuados; bemcomo o desatendimento aos limites e condições estipulados paraos gastos totais com pessoal e para o endividamento público; olançamento de despesas em Restos a Pagar, de forma contrária à lei;ou qualquer outra violação à Lei de Responsabilidade Fiscal, oTribunal de Contas emitirá parecer prévio conclusivo pelodesatentimento à Lei Complementar nº 101/2000, mas sem aplicarqualquer penalidade ou sanção.

Tratando-se a Lei Complementar nº 101/2000 de uma lei deacompanhamento da gestão fiscal, no sentido de prevenir riscos ecorrigir desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, ocontrole tem por função evitar acontecimentos que produzam riscose desvios dessa natureza, tendo em vista o seu caráter potetivo aoequilíbrio fiscal.

Por essa razão, o acompanhamento não possui efeito punitivo,motivo por que o controle não sanciona, mas sim produz alertaexigindo ações corretivas para os desvios constatados, nos prazosdeterminados. Assim, para o exercício de um controle deacompanhamento, o cumprimento dos prazos de entrega dosRelatórios e Prestações de Contas torna-se de vital importância, bemcomo o cumprimento das medidas corretivas determinadas, sob penade ficar inviabilizada a prevenção propugnada pela lei. Pode-seentender que essa foi a situação que serviu de orientação para oestabelecimento de uma severa multa para o gestor fiscal quedescumprisse tais prazos (art. 5º da Lei nº 10.028, de 19.10.2000.Multa de 30% dos vencimentos anuais do agente que lhe der causa).

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(...)Contudo, embora haja tão somente a sobredita penalidade

administrativa na órbita de competência do Tribunal de Contas, as demaisviolações da Lei de Responsabilidade Fiscal não restam isentas de sanção. Muitopelo contrário, o gestor fiscal que deixar de dar cumprimento aos regramentosda Lei Complementar nº 101/2000, nos termos de seu art. 73, sujeita-se apenalidades muito mais severas que as de natureza administrativa, porenvolverem sanções criminais: ...

Diante dessas circunstâncias peculiares de valoração jurídicados atos de gestão fiscal, verifica-se que o novo ordenamento legalintroduzido pela Lei Federal nº 10.028/00, consoante os novos tipospenais que agrega à legislação penal (...), não tolera oscomportamentos contrários à Lei de Responsabilidade Fiscal ...

Como em matéria criminal a denúncia ou a proposta da açãoprincipal está inserida na competência do Ministério Público, comjulgamento pelo Poder Judiciário, quando o Tribunal de Contas, noexercício do controle externo, emitir parecer prévio conclusivo sobrea prestação de contas do gestor fiscal e verificar o descumprimentodas normas da Lei de Responsabilidade Fiscal, deverá encaminharao Ministério Público os elementos e os documentos da suaconstatação, no sentido de ser proposta a ação penal cabível, comvista à aplicação da sanção criminal pertinente ao fato.

37. Deflui dos autos que o GDF não exercitou a prudência fiscalao promover os atos de gestão que resultaram na edição das leis em evidência,os quais criaram/aumentaram a despesa com pessoal. Ao menos não logrouêxito em demonstrar que adotou as precauções exigidas pela LRF. Emboranão tenha dado causa a desequilíbrio, laborou em desacordo com a gestãofiscal prudente e responsável pretendida pela norma, a qual pressupõe açãoplanejada e transparente, em que se previnem riscos capazes de afetar oequilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de condições noque tange à geração de despesas com pessoal (LRF, art. 1º).

38. De qualquer sorte, não posso deixar de reconhecer, como fezo nobre Relator, a perda de objeto dos presentes autos, que cuidam de normaseditadas em 2000 e 2001, que criaram despesas que não impactaram oequilíbrio fiscal dos exercícios subseqüentes, tendo o Tribunal, inclusive,reconhecido a regularidade da gestão fiscal do Poder Executivo e da CâmaraLegislativa do Distrito Federal nos exercícios de 2000 a 2003.

39. Importa ressaltar o compromisso externado pelo Sr. Secretáriode Governo de “completa submissão aos rigores da Lei de Responsabilidade

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Fiscal”, bem assim a informação constante da instrução da CICE, fl. 114,que já foram promovidos aprimoramentos na LDO Distrital referente aoexercício de 2004 (Lei nº 3.179/03), embora ainda haja o que corrigir(conforme se extrai do segundo parágrafo de fl. 107).

40. Feitas essas considerações, concordo com o alerta propostopela CICE no item IV das sugestões de fls. 136/138, exceto quanto aocontido na alínea f, tendo em vista que o § 1º do art. 17 da Lei deResponsabilidade Fiscal se reporta apenas à exigência prevista no inciso Ido art. 16 dessa norma.

41. No mais, entendo que a Corte deve recomendar aos gestoresfiscais que, em homenagem ao princípio da prudência e da transparênciafiscal, adotem medidas no sentido de que os elementos que comprovem oefetivo cumprimento das condições prévias estabelecidas na LRF para acriação ou aumento de gastos com pessoal, passem a acompanhar o projetode lei ou resolução, ou a mensagem de seu proponente, para conhecimentoda sociedade e dos órgãos de controle indicados no caput do art. 59 da LeiComplementar nº 101/00.

Isto posto, voto por que o Plenário:I - tome conhecimento do Ofício nº 196/2002, do Exmo. Sr.

Secretário de Governo, e da documentação que o acompanha(fls. 63/81); do Ofício nº 319/2002-PG, da Exma. Sra.Procuradora-Geral do Ministério Público junto ao TCDF(f l . 82), e do Ofício nº 26/2003-CF, da Exma. Sra.Procuradora Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira (fl. 94);

II - considere que as informações prestadas a esta Corte pelo Exmo.Sr. Secretário de Governo (fls. 63/81) não atendem adeterminação constante da Decisão nº 7.144/2001, disso dando-lhe conhecimento;

III - com fundamento no artigo 59 da Lei Complementar nº 101/2000 e à vista dos princípios da prudência e da responsabilidadefiscal, alerte os Chefes do Poder Executivo e da CâmaraLegislativa do Distrito Federal para a necessidade de serverificado, previamente à adoção de medidas que impliquemcriação ou aumento de despesa com pessoal, o atendimentodas seguintes exigências:

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a) autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias(art. 169, § 1º, II da Constituição Federal);

b) existência de prévia dotação orçamentária ( art. 169, § 1º, Ida Constituição Federal);

c) não vinculação ou equiparação de quaisquer espéciesremuneratórias (art. 37, XIII da Constituição Federal);

d) atendimento do limite legal de despesas com inativos (art. 21,inc. II da LRF), com interpretação dada na ADIN nº 2238-5;

e) estimativa de impacto orçamentário-financeiro no exercícioem que entrar em vigor e nos dois seguintes (art. 16, inc. I;17, § 1º; e art. 24 da LRF);

f) demonstração da origem dos recursos para seu custeio (art.17, § 1º , e art. 24 da LRF);

g) comprovação de que a despesa criada ou aumentada nãoafetará as metas de resultados previstas no anexo de metasfiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 17, § 2º, eart. 24 da LRF);

h) compensação dos efeitos financeiros, nos períodos seguintes,pelo aumento permanente de receita ou pela reduçãopermanente de despesas (art. 17, § 2º, e art. 24 da LRF);

i) expedição do ato anteriormente aos últimos cento e oitentadias do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão( art. 21, parágrafo único da LRF);

j) despesas com pessoal inferiores a 95% do respectivo limitede gastos (art. 22, parágrafo único da LRF);

k) recomende aos referidos gestores fiscais que, à luz do princípioda transparência fiscal, adotem medidas tendentes a que acomprovação do efetivo cumprimento das condições préviasindicadas no item anterior, para a criação ou aumento de gastoscom pessoal, passem a acompanhar o projeto de lei ouresolução, ou a mensagem de seu proponente, paraconhecimento da sociedade e dos órgãos de controle indicadosno caput do art. 59 da Lei Complementar nº 101/00;

l) autorize o encaminhamento, às autoridades antes indicadas,bem assim ao Sr. Secretário de Governo, em conjunto com

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a decisão que vier a ser adotada, de cópia dos relatórios,votos, pareceres e instruções que a precederam;

m) determine às Inspetorias de Controle Externo que atribuamnatureza prioritária, nos termos do art. 110 do RI/TCDF,à verificação do efetivo cumprimento das disposições dositens III e IV supra.

Processo nº 1.129/2001*

* Ver Decisão nº 1.633/2005

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ESTUDO SOBRE A IMPENHORABILIDADE DE BENS DE

EMPRESA PÚBLICA

Marli VinhadeliConselheira do TCDF

Apartado constituído pela 3ª ICE, em atendimento ao itemVI da Decisão nº 2.288/04, proferida no Processo nº 4.767/94.Estudo sobre a impenhorabilidade de bens de empresa pública.Relator original: Conselheiro Jacoby Fernandes, temporariamenteafastado do exercício do seu cargo. Remessa deste processo, nomomento oportuno, ao relator original (fl. 103). Determinações.

RELATÓRIO

Dando cumprimento ao item VI da Decisão nº 2.288/04, adotada noProcesso nº 4.767/94, a 3ª Inspetoria de Controle Externo apresenta estudosobre a impenhorabilidade dos bens de empresa pública, tecendo considerações,ainda, a respeito das penhoras realizadas no âmbito do Distrito Federal esobre as diferenças verificadas entre preços avaliados e preços arrematados.

O estudo apresentado, merecedor dos maiores encômios, trazreferências doutrinárias e indica a jurisprudência relacionada com a distinçãoentre empresas públicas que exercem atividade econômica e empresaspúblicas prestadoras de serviços públicos, concluindo que os bens destastêm natureza pública e, portanto, possuem o atributo da impenhorabilidade.Assim, suas dívidas devem estar submetidas ao regime estatuído pelo artigo100 da CRFB (precatórios).

Diante disso, conclui a Inspetoria que o Tribunal deve manifestarentendimento de que as empresas públicas distritais, prestadoras de serviçopúblico, devem adotar as medidas judiciais cabíveis para a liberação dopatrimônio público sob sua titularidade eventualmente penhorado.

No tocante às disparidades entre os preços de avaliação e arremataçãode bens públicos penhorados, salienta que a perda patrimonial causada aoerário, de índole dolosa ou culposa, configura ato de improbidade, nos

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termos da Lei nº 8.429/92, devendo os jurisdicionados reportarem asocorrências ao MPDFT, sem prejuízo da instauração de TCE e demaismedidas administrativas.

Ao final, sugere que o Tribunal:I. tome conhecimento do presente estudo;II. considere distintas, entre si, a empresa estatal prestadora de serviço

público e a empresa estatal que exerce atividade econômica, sejaempresa pública ou sociedade de economia mista, e que a primeiraconsiste em entidade pública de natureza autárquica (RecursoExtraordinário n° 220.906-9/DF e n° 407.099-5/RS – SupremoTribunal Federal – STF);

III. considere que os bens integrantes do patrimônio de empresa estatalou de outra entidade estatal ou paraestatal prestadora de serviço públicotêm natureza pública e, como atributos, impenhorabilidade,imprescritibilidade e não-oneração (Recurso Extraordinário n°220.906-9/DF e n° 407.099-5/RS – STF);

IV. em conseqüência, manifeste entendimento de que o responsável pelaempresa estatal ou outra entidade estatal ou paraestatal distritalprestadora de serviço público, cujos bens tenham sido penhoradostem o dever de adotar as medidas judiciais cabíveis para liberação dopatrimônio público;

V. alerte aos titulares das jurisdicionadas desta Corte que deve ser adotadoo procedimento de remessa, ao Ministério Público do Distrito Federale Territórios, de documento que comprove a existência de alienaçãode bem público distrital por preço inferior ao de avaliação, para que severifique sua conformidade à Lei Federal n° 8.429/1992, sem prejuízoda instauração de tomada de contas especial e das demais medidaslegais cabíveis, informando ao TCDF em 30 dias;

VI. comunique à Câmara Legislativa, ao Governo do Distrito Federal, àProcuradoria Geral do Distrito Federal e às empresas estatais distritaiso teor desta Decisão, bem como seus fundamentos (cópia da instruçãoe do relatório);

VII. determine às entidades públicas distritais que verifiquem se talentendimento a elas se aplica e, se for o caso, adotem as providênciasnecessárias à implementação do entendimento ora emanado; e

VIII. autorize o retorno dos presentes autos à 3ª ICE para que adote asprovidências cabíveis.

O Ministério Público que atua junto a este Tribunal, em parecer desua Procuradora Geral, opina pela adoção das providências indicadas peloórgão instrutivo, acrescentando a necessidade de determinação aosjurisdicionados para que informem ao Tribunal, tempestivamente, as

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penhoras de bens distritais estabelecidas pelo Poder Judiciário, indicandoos motivos e a natureza do débito executado, bem como as providências,judiciais e administrativas adotadas pelo administrador público paraenfrentamento da questão.

Eis uma síntese de suas conclusões:11. No que pertine às empresas distritais, em especial

TERRACAP e NOVACAP, convém salientar que o fato de prestaremserviço público e, em tese, estarem protegidas da expropriação dosbens próprios, não isenta os respectivos administradores daresponsabilização por gestão temerária, mesmo porque, conformenoticiado pela Instrução, a Justiça do Trabalho local tem determinadoa alienação do patrimônio das referidas empresas para liquidação dedébitos oriundos de conflitos laborais.

12. Acerca da diferença a menor resultante daarrematação de bem estatal colocado em leilão por preço inferiorao de avaliação, convém salientar que a questão, stricto sensu, foge àcompetência do Tribunal, visto que o prejuízo causado aopatrimônio público, nesse caso, decorrerá, tão-somente, documprimento de decisão judicial.

13. No entanto, como ressaltou a Instrução, as eventuaisfraudes ou abusos constatados pelos jurisdicionados no processo deexecução ou adjudicação de bens públicos deverão ser reportadosao MPDFT, bem como às Corregedorias dos Tribunais responsáveispela promoção da hasta pública.

14. Na visão do Ministério Público, cabe à Corte deContas avaliar os atos de gestão que provocaram ou provocarão adissipação do patrimônio público pela via judicial, atuandopreventivamente, quando possível, ou coercitivamente, quandonecessário. Destarte, sempre que o Poder Judiciário determinar apenhora de bem público distrital, independentemente da naturezado ente estatal executado, tal fato deverá ser reportado ao Tribunal,para exame e adoção das providências necessárias em relação aocorrespondente ordenador de despesa.

Os autos vieram ao meu Gabinete por despacho Presidencial, devendoretornar ao Relator original em momento oportuno.

É o relatório.

VOTO

Acolho o estudo apresentado e o adoto como parte integrante dopresente voto.

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A tese da impenhorabilidade dos bens das empresas públicasprestadoras de serviços públicos está, ao meu ver, suficientemente bemassentada na doutrina e na jurisprudência pátrias.

No campo doutrinário, além das referências apresentadas no estudoda 3ª ICE, reporto-me também ao escol de Geraldo Ataliba1, Celso AntônioBandeira de Mello2; Eros Roberto Grau3, Alice Maria Gonzales Borges4 eMaria Sylvia Zanella di Pietro5. Desta última, tomo por empréstimo osseguintes ensinamentos acerca da natureza jurídica dos bens das entidadesda administração indireta:

(...)Com relação às entidades da administração indireta com

personalidade de direito privado, grande parte presta serviçospúblicos; desse modo, a mesma razão que levou o legislador aimprimir regime jurídico publicístico aos bens de uso especial,pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno, tornando-os inalienáveis, imprescritíveis, insuscetíveis de uso capião e de direitosreais, justifica a adoção de idêntico regime para os bens de entidadesda Administração Indireta afetados à realização de serviço público.

É precisamente essa afetação que fundamenta aindisponibilidade desses bens, com todos os demais corolários.

Com relação às autarquias e fundações públicas, essa conclusãoque já era aceita pacificamente, ficou fora de dúvida com o novo códigocivil. Mas ela é também aplicável às entidades de direito privado,com relação aos seus bens afetados à prestação de serviço público.

É sabido que a Administração pública está sujeita a uma sériede princípios , dentre os quais o da continuidade dos serviçospúblicos. Se fosse possível às entidades da Administração Indireta,mesmo empresas públicas, sociedades de economia mista econcessionárias de serviços públicos, alienar livremente esses bens,ou se os mesmos pudessem ser penhorados, hipotecados, adquiridospor usucapião, haveria uma interrupção do serviço público. E o

1 Patrimônio Administrativo - Empresas Estatais Delegadas de Serviços Públicos - Regime deSeus Bens - Execução de suas Dívidas. Revista Trimestral de Direito Público nº 7; p. 21.2 Impenhorabilidade dos Bens das Empresas Estatais exercentes de Atividades Públicas. RTDPnº 31; p. 19.3 Execução contra Estatais Prestadoras de Serviços Públicos. RTDP nº 7; p.97.4 Impenhorabilidade de bens. Sociedade de economia mista concessionária de serviçosportuários. Bens afetados à prestação de serviços públicos. Revista Diálogo Jurídico nº 10.Disponível na Internet: <http:\\www.direitopublico.com.br>. Acesso em 22/02/2005.5 Direito Administrativo. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 397.

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serviço é considerado público precisamente porque atende às necessidadesessenciais da coletividade. Daí a impossibilidade de sua paralisação e daí asua submissão a regime jurídico publicístico. (os destaques são do original)

No campo da jurisprudência, o STF já enraizou o entendimento daimpenhorabilidade, nos termos dos acórdãos proferidos nos RE 220906,RE 220907 e RE 407099, já indicados pela instrução e MP.

Com relação à possibilidade de existirem bens alienados por preçosinferiores aos de avaliação, concordo com a Procuradora Geral no sentidode que o possível prejuízo causado ao patrimônio público resultouexclusivamente do cumprimento de decisão judicial, sendo que:

eventuais fraudes ou abusos constatados pelos jurisdicionadosno processo de execução ou adjudicação de bens públicos deverãoser reportados ao MPDFT, bem como às Corregedorias dos Tribunaisresponsáveis pela promoção da hasta pública.

Por oportuno, convém consignar que, na forma prevista no termo dedistribuição de fl. 103, estes autos deverão ser remetidos, no momentooportuno, ao relator original, ilustre Conselheiro JACOBY FERNANDES.

Assim, pondo-me de acordo as sugestões da instrução, com alterações,e tendo em conta o parecer do Ministério Público, voto por que o Plenário:

I - tome conhecimento do estudo apresentado em atendimentoao item VI da Decisão nº 2.288/04, considerando cumpridatal determinação;

II - considerando que os bens integrantes do patrimônio dasempresas estatais prestadoras de serviço público têm naturezapública e, por conseqüência, como atributos, entre outros, aimpenhorabilidade, (REs 220.906-DF; 220.907/RO e 407.099-RS – STF), determine aos dirigentes das empresas estatais doDistrito Federal, prestadoras de serviço público e possuidorasde bens penhorados, que adotem, sob pena de responsabilidade,as medidas possíveis a não-oneração do patrimônio público;

III - determine, ainda, aos dirigentes das empresas estatais distritaisque, doravante, informem a este Tribunal de Contas, no prazode até trinta dias da decretação, as penhoras de bens distritaisestabelecidas pelo Poder Judiciário, indicando os motivos e anatureza do débito executado, bem como as providências judiciaise administrativas adotadas para efeito da análise da gestão;

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IV - comunique à Câmara Legislativa, ao Governo do DistritoFederal, à Procuradoria Geral do Distrito Federal e àsempresas estatais distritais o teor desta Decisão,encaminhando-lhes cópia da instrução, do Parecer doMPJTCDF e do Relatório/Voto da Relatora.

Processo nº 1.539/2004*

* Ver Decisão nº 808/2005

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EXAME DE REGULARIDADE DE TERMO DE PARCERIA

OBJETIVANDO O DESENVOLVIMENTO DE PROGRAMAS

SÓCIO EDUCATIVOS, ATRAVÉS DO ESPORTE E DO LAZER,NO DISTRITO FEDERAL E ENTORNO

Marli VinhadeliConselheira do TCDF

Representação nº 03/2003 - MF. Contratação, pela Secretariade Esporte e Lazer, de Organização da Sociedade Civil de InteressePúblico (OSCIP), para execução do “Projeto Solidário Amigo daGente”. Lei nº 9.790/99. Termo de Parceria. Inexigibilidade deLicitação. Ausência dos elementos de informação previstos no artigo26 da Lei nº 8.666/93. Considerações sobre a matéria. Inspeção.Decisão nº 6.359/03: aplicação do artigo 41, § 2º, da LC nº 01/94;e audiência. Rejeição das razões de justificativas. Dispensa daaplicação de multa. Determinação para adoção de medidas tendentesao exato cumprimento da Lei (LC nº 01/94, art. 45).

RELATÓRIO

Na última apreciação destes autos, o Tribunal proferiu a Decisão nº6.359/03 (fl. 75), lavrada nos seguintes termos:

I - tomar conhecimento:a) da Representação nº 06/2003 - MF e do Ofício nº 291/2003 - PG;b) do Termo de Parceria celebrado entre o Distrito Federal, por

meio da Secretaria de Esporte e Lazer, e a Organização daSociedade Civil de Interesse Social - OSCIP Cruzeiro do Sul;

c) dos resultados da inspeção realizada pela 2ª ICE;II - com fundamento do artigo 41, § 2º, da Lei Complementar nº

01/94, autorizar o encaminhamento, à Secretaria de Esporte eLazer do Distrito Federal, de cópia do Relatório de Inspeção nº2.0145.03, do Parecer do Ministério Público e do presenterelatório/voto, determinando-lhe que, no prazo de 30 (trinta)dias, contados nos termos do artigo 31 da LC nº 01/94, adote asmedidas saneadoras das impropriedades e faltas identificadas ou,querendo, apresente as justificativas e esclarecimentos pertinentes,que devem vir acompanhados de todos os documentos de prova;

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III - determinar o encaminhamento dos documentos mencionados no itemanterior à Organização da Sociedade Civil de Interesse Público denominada“Cruzeiro do Sul” para que, no prazo de 30 (trinta) dias, caso queira, apresenteas considerações que entender pertinentes;

IV - com base no artigo 182, § 5º, do RI/TCDF, autorize, também, aaudiência do Sr. Secretário de Esporte e Lazer, subscritor do Termode Parceria em questão, para, no mesmo prazo, apresentar suas razõesde justificativas pela celebração do referido ajuste medianteinexigibilidade de licitação, sem apresentação dos elementos exigidosno artigo 26 da Lei nº 8.666/93;

V - determine às 1ª, 2ª e 3ª Inspetorias de Controle Externo que realizemlevantamento acerca da existência de situações similares à retratadanos presentes autos, autorizando, desde já, a realização de inspeções,se necessário; e

VI - restitua os autos à 2ª ICE, para as providências pertinentes e para osfins indicados no parágrafo 24 do presente relatório/voto, atribuindoa este feito tramitação prioritária (OI 133/03 - Gab-JF).

2. Para melhor compreensão da matéria, permito-me transcrevero voto que proferi naquela oportunidade:

9. Cuidam os autos, em essência, do exame daregularidade do Termo de Parceria celebrado entre o DistritoFederal, por meio da Secretaria de Esporte e Lazer, e a Organizaçãoda Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIP denominadaCruzeiro do Sul, com o objetivo de “desenvolver programas sócioeducativos, através do esporte e do lazer, no Distrito Federal eEntorno, que se realizará por meio do estabelecimento de cooperaçãoentre as partes” (fls. 28/37 - anexo).

10. A qualificação de pessoa jurídica de direito privado,sem fins lucrativos, como Organização da Sociedade Civil de InteressePúblico - OSCIP está disciplinada na Lei federal nº 9.790, de 23 demarço de 1999. Segundo esta norma, a qualificação é ato vinculadoao cumprimento das exigências e requisitos nela estabelecidos, e decompetência do Ministério da Justiça.

11. A OSCIP Cruzeiro do Sul encontra-se regularmentequalificada como tal pelo Ministério da Justiça, conforme faz provao documento acostado à fl. 22 do volume anexo a estes autos.

12. Conforme artigo 9º da Lei federal nº 9.790, de 23 demarço de 1999, Termo de Parceria é ‘o instrumento passível de serfirmado entre o Poder Público e as entidades qualificadas comoOrganizações da Sociedade Civil de Interesse Público destinado àformação de vínculo de cooperação entre as partes, para o fomentoe a execução das atividades de interesse público previstas no art. 3º destaLei’, quais sejam:

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I - promoção da assistência social;II - promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio

histórico e artístico;III - promoção gratuita da educação, observando-se a forma

complementar de participação das organizações de que trata esta Lei;IV - promoção gratuita da saúde, observando-se a forma

complementar de participação das organizações de que trata esta Lei;V - promoção da segurança alimentar e nutricional;VI - defesa, preservação e conservação do meio ambiente e

promoção do desenvolvimento sustentável;VII - promoção do voluntariado;VIII - promoção do desenvolvimento econômico e social e

combate à pobreza;IX - experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-

produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio,emprego e crédito;

X - promoção de direitos estabelecidos, construção de novosdireitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar;

XI - promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitoshumanos, da democracia e de outros valores universais;

XII - estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologiasalternativas, produção e divulgação de informações econhecimentos técnicos e científicos que digam respeito àsatividades mencionadas neste artigo.

13. A formalização dos Termos de Parceria deve obedecerao disposto no artigo 10 da Lei nº 9.790/99, verbis:

Art. 10. O Termo de Parceria firmado de comum acordo entreo Poder Público e as Organizações da Sociedade Civil de InteressePúblico discriminará direitos, responsabilidades e obrigações daspartes signatárias.

§ 1º A celebração do Termo de Parceria será precedida de consultaaos Conselhos de Políticas Públicas das áreas correspondentesde atuação existentes, nos respectivos níveis de governo.

§ 2º São cláusulas essenciais do Termo de Parceria:I - a do objeto, que conterá a especificação do programa de

trabalho proposto pela Organização da Sociedade Civil deInteresse Público;

II - a de estipulação das metas e dos resultados a serematingidos e os respectivos prazos de execução ou cronograma;

III - a de previsão expressa dos critérios objetivos deavaliação de desempenho a serem utilizados, medianteindicadores de resultado;

IV - a de previsão de receitas e despesas a serem realizadasem seu cumprimento, estipulando item por item as categorias

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contábeis usadas pela organização e o detalhamento dasremunerações e benefícios de pessoal a serem pagos, com recursosoriundos ou vinculados ao Termo de Parceria, a seus diretores,empregados e consultores;

V - a que estabelece as obrigações da Sociedade Civil deInteresse Público, entre as quais a de apresentar ao Poder Público,ao término de cada exercício, relatório sobre a execução do objetodo Termo de Parceria, contendo comparativo específico das metaspropostas com os resultados alcançados, acompanhado deprestação de contas dos gastos e receitas efetivamente realizados,independente das previsões mencionadas no inciso IV;

VI - a de publicação, na imprensa oficial do Município, doEstado ou da União, conforme o alcance das atividades celebradasentre o órgão parceiro e a Organização da Sociedade Civil deInteresse Público, de extrato do Termo de Parceria e dedemonstrativo da sua execução física e financeira, conformemodelo simplificado estabelecido no regulamento desta Lei,contendo os dados principais da documentação obrigatória doinciso V, sob pena de não liberação dos recursos previstos noTermo de Parceria.

14. O Termo de Parceria em apreciação simplesmentereporta-se ao Programa de Trabalho proposto pela OSCIP que, noentanto, não consta dos autos, prejudicando exame mais detalhadopor parte desta Corte de Contas.

15. No que se refere aos critérios de seleção da OSCIPparceira, a lei federal silencia. Essa omissão, no entanto, no GovernoFederal, foi sanada pelo Decreto regulamentador nº 3.100/99, nosseguintes termos:

Art. 23. A escolha da Organização da Sociedade Civil deInteresse Público, para a celebração do Termo de Parceria, poderáser feita por meio de publicação de edital de concursos deprojetos pelo órgão estatal parceiro para obtenção de bens eserviços e para a realização de atividades, eventos, consultorias,cooperação técnica e assessoria.

Parágrafo único. Instaurado o processo de seleção porconcurso, é vedado ao Poder Público celebrar Termo de Parceriapara o mesmo objeto, fora do concurso iniciado.

Art. 24. Para a realização de concurso, o órgão estatal parceirodeverá preparar, com clareza, objetividade e detalhamento, aespecificação técnica do bem, do projeto, da obra ou do serviçoa ser obtido ou realizado por meio do Termo de Parceria.

Art. 25. Do edital do concurso deverá constar, no mínimo,informações sobre:

I - prazos, condições e forma de apresentação das propostas;

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II - especificações técnicas do objeto do Termo de Parceria;III - critérios de seleção e julgamento das propostas;IV - datas para apresentação de propostas;V - local de apresentação de propostas;VI - datas do julgamento e data provável de celebração do

Termo de Parceria; eVII - valor máximo a ser desembolsado.Art. 26. A Organização da Sociedade Civil de Interesse

Público deverá apresentar seu projeto técnico e o detalhamentodos custos a serem realizados na sua implementação ao órgãoestatal parceiro.

Art. 27. Na seleção e no julgamento dos projetos, levar-se-ãoem conta:

I - o mérito intrínseco e adequação ao edital do projetoapresentado;

II - a capacidade técnica e operacional da candidata;III - a adequação entre os meios sugeridos, seus custos,

cronogramas e resultados;IV - o ajustamento da proposta às especificações técnicas;V - a regularidade jurídica e institucional da Organização

da Sociedade Civil de Interesse Público; eVI - a análise dos documentos referidos no art. 11, § 2º,

deste Decreto.Art. 28. Obedecidos aos princípios da administração pública,

são inaceitáveis como critério de seleção, de desqualificaçãoou pontuação:

I - o local do domicílio da Organização da Sociedade Civil deInteresse Público ou a exigência de experiência de trabalho daorganização no local de domicílio do órgão parceiro estatal;

II - a obrigatoriedade de consórcio ou associação comentidades sediadas na localidade onde deverá ser celebrado oTermo de Parceria;

III - o volume de contrapartida ou qualquer outro benefíciooferecido pela organização da Sociedade Civil de Interesse Público.

Art. 29. O julgamento será realizado sobre o conjunto daspropostas das Organizações da Sociedade Civil de InteressePúblico, não sendo aceitos como critérios de julgamento osaspectos jurídicos, administrativos, técnicos ou operacionais nãoestipulados no edital do concurso.

Art. 30. O órgão estatal parceiro designará a comissãojulgadora do concurso, que será composta, no mínimo, por ummembro do Poder Executivo, um especialista no tema doconcurso e um membro do Conselho de Política Pública da áreade competência, quando houver.

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§ 1º O trabalho dessa comissão não será remunerado.§ 2º O órgão estatal deverá instruir a comissão julgadora sobre a

pontuação pertinente a cada item da proposta ou projeto e zelará paraque a identificação da organização proponente seja omitida.

§ 3º A comissão pode solicitar ao órgão estatal parceiroinformações adicionais sobre os projetos.

§ 4º A comissão classificará as propostas das Organizaçõesda Sociedade Civil de Interesse Público obedecidos aos critériosestabelecidos neste Decreto e no edital.

Art. 31. Após o julgamento definitivo das propostas, acomissão apresentará, na presença dos concorrentes, os resultadosde seu trabalho, indicando os aprovados.

§ 1º O órgão estatal parceiro:I - não examinará recursos administrativos contra as decisões

da comissão julgadora;II - não poderá anular ou suspender administrativamente o

resultado do concurso nem celebrar outros Termos de Parceria,com o mesmo objeto, sem antes finalizar o processo iniciadopelo concurso.

§ 2º Após o anúncio público do resultado do concurso, oórgão estatal parceiro o homologará, sendo imediata a celebraçãodos Termos de Parceria pela ordem de classificação dos aprovados.

16. Ainda que se possa apor críticas ao procedimentoestabelecido pelo decreto federal, não se pode negar que previuprocedimento formal de seleção, onde se busca a proposta maisvantajosa para o Poder Público, baseada em critérios técnicos dejulgamento, preservados os princípios da isonomia e daimpessoalidade.

17. No entanto, o decreto não se aplica ao DF que, dessaforma, encontra-se jungido à norma geral estabelecida pela Lei nº8.666/93, por força do artigo 22, XXVII, da Constituição Federal:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas

as modalidades, para as administrações públicas diretas,autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federale Municípios, obedecido o disposto no artigo 37 XXI, e para asempresas públicas e sociedades de economia mista, nos termosdo art. 173, § 1º, III;

18. A respeito da necessidade de licitação para contrataçãomediante Termo de Parceria, Marçal Justem Filho é taxativo1:

1 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 9. ed. São Paulo:Dialética, 2002, p 37.

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(...). É obrigatória a adoção de procedimento licitatório pararealização de contrato de gestão ou do termo de parceria. Não éfacultado à Administração escolher, sem prévio procedimentolicitatório, uma determinada organização da sociedade civil pararealizar um ‘termo de parceria’ e, a partir daí, atribuir-lhe recursospara contratações as mais diversas não subordinadas à licitação.Isto seria a porta aberta para a fraude e a destruição da regraconstitucional da obrigatoriedade da licitação. Bastaria a própriaAdministração produzir o nascimento de uma ‘organização’,submetida a seu estrito controle, e dela se valer para realizar todotipo de contratação sem prévia licitação.

19. Em recente trabalho apresentado no II SimpósioTécnico do Instituto Ruy Barbosa, Adailton Feitosa Filho e FredericoJorge Gouveia de Melo, ambos Auditores do Tribunal de Contas doEstado de Pernambuco, alertam para a possibilidade do terceiro setorser “capturado” e que instrumentos criados para modernizar o Estadoacabem por perpetuar o patrimonialismo2, se não forem observadosos princípios da administração pública, em especial o da impessoalidade.

20. É do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco aseguinte decisão sobre o tema:

DECISÃO TC Nº 0544/02PROCESSO TC Nº 0200880-4 – CONSULTA FORMULADAPOR JOSÉ MARCOS DE LIMA, DEPUTADO ESTADUALDA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA.RELATOR: AUDITOR LUIZ ARCOVERDE CAVALCANTIFILHO, CONSELHEIRO EM EXERCÍCIO.Decidiu o Tribunal de Contas do Estado, à unanimidade, emsessão ordinária realizada no dia 08 de maio de 2002, responderao consulente nos seguintes termos:1. Os Municípios podem celebrar Termo de Parceria, nos termosdos artigos 9º a 15 da Lei Federal nº 9.790/99, de 23 de marçode 1999, com Organizações da Sociedade Civil de InteressePúblico, qualificadas na forma dos artigos 1º a 8º da Lei, destinadoà formação de vínculo de cooperação entre as partes, para ofomento e a execução das atividades de interesse público previstasno artigo 3º desta mesma lei.2. Por se tratar de um instrumento congênere aosconvênios, acordos e ajustes celebrados por órgão daAdministração, aplicam-se ao Termo de Parceria, no que

2 FEITOSA FILHO, Adailton e MELO, Frederico Jorge Gouveia de. Reflexões sobre autilização das Cooperativas de Trabalho e das Organizações da Sociedade Civil de InteressePúblico como instrumentos de clientelismo. In: Simpósio Técnico - Instituto Ruy Barbosa,2., 3 a 5 Julho de 2003.

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couber, as disposições da Lei de Licitações, Lei nº 8.666/93,conforme estabelece o artigo 116 do referido diploma.3. O objetivo da Lei nº 9.790/99 é instituir parceria entre o PoderPúblico e uma organização não governamental qualificada, sobcertas condições, a prestar atividade de interesse público mediantefomento. Tem atuação na área de serviços públicos não exclusivosdo Estado. Trata-se, portanto, de um instrumento que permitetão-somente a cooperação, a colaboração da OSCIP com o entepúblico. Não pode haver a transferência completa de um serviçoque incumbe ao Poder Público. Não pode haver remuneraçãopor serviços prestados, sob pena de caracterizar um contrato enão um Termo de Parceria. O incentivo, na modalidade defomento, é prestado sob a forma de auxílio ou subvenção. Por setratar de transferência de recursos públicos, a OSCIP obriga-se aprestar contas não só ao ente repassador da verba, mas tambémao Tribunal de Contas, por força do artigo 70, Parágrafo Único,da Constituição Federal. A utilização do Termo de Parceria comuma OSCIP com o fim de burlar o princípio constitucional doconcurso público sujeita o responsável à punição, nos termos doartigo 37, § 2º, da Constituição Federal.

21. Diante dessas considerações, concordo com a instruçãoe com o parecer do Ministério Público no que concerne à necessidadede solicitar esclarecimentos e justificativas a respeito da contrataçãoem tela, mediante inexigibilidade de licitação, especialmente em razãoda ausência dos elementos de informação previstos no artigo 26 daLei nº 8.666/93 e de Programa de Trabalho que contemple osrequisitos estabelecidos no artigo 10 da Lei nº 9.790/99.

22. A presente fase, no que se refere aos resultados dainspeção, é a de aplicação do § 2º do artigo 41 da Lei Complementarnº 01/94, conforme vem decidindo a Corte, cabendo, portanto,comunicar à autoridade competente os resultados alcançados, paraas medidas saneadoras das impropriedades e faltas identificadas, oupara prestar os esclarecimentos pertinentes, haja vista o inafastávelprincípio do contraditório.

23. A adoção dessa providência, em princípio, não excluia necessidade de, desde logo, ser autorizada, como quer o MinistérioPúblico, a audiência do responsável pelas irregularidades observadasnos autos, para efeito de aplicação de multa pecuniária individual,conforme, inclusive, precedente estabelecido mediante Decisão nº3.677/03 (Processo nº 1621/02). Ambos os procedimentosconsubstanciam a fase do contraditório e ampla defesa.

24. Por fim, não creio que seja o momento de tratar dosdemais ajustes celebrados pelo GDF. Não existem elementos nos

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autos, apenas notícias. Há que se promover autos específicos para tanto,autorizando-se, desde já, a realização de inspeção, se necessário.

3. Em atenção ao item II da Decisão nº 6.359/03, o Sr. Secretáriode Estado de Esporte e Lazer do Distrito Federal encaminhou o expedientede fls. 94/105. Em resposta à audiência determinada por meio do item IV, oSr. Agrício Braga, ex-Secretário, apresentou suas razões de justificativas (fls.82/93). A OSCIP Cruzeiro do Sul não se manifestou nos autos (item III).

4. As razões de justificativas apresentadas pelo ex-Secretário,signatário do Termo de Parceria, e os esclarecimentos encaminhados peloatual Secretário, em decorrência do disposto no art. 41, § 2º, da LeiComplementar nº 01/94, são de idêntico teor e foram bem sintetizadaspelo douto Ministério Público, nos seguintes termos:

3. Em acatamento à deliberação plenária aludida, o ex-Secretário, Senhor Agrício Braga Filho, em síntese, esclareceu (fls.82 a 93):

• a celebração do Termo de Parceria entre a Secretaria de Esporte eLazer - SEL e a OSCIP Cruzeiro do Sul tem sua gênese no anode 2002, ano em que o Projeto Amigo da Gente era gerido pelaprópria SEL com a contratação direta de coordenadores emonitores para a realização e execução do ajuste firmado com oMinistério dos Esportes;

• em janeiro de 2003, enviou à douta Procuradoria Geral do DistritoFederal o processo originário nº 020.003.165/2001, que trata doreferido Termo de Parceria, oportunidade em que ponderou:

a) em virtude das constantes determinações do órgão decontrole interno do GDF e dos de controle externo Tribunalde Contas do DF e Tribunal de Contas da União, acerca daadoção de medidas regulamentares da contratação e seleçãode pessoal do Projeto Amigo da Gente, submetia à análise eparecer daquele órgão, quanto à viabilidade de celebração doajuste, a Minuta do Termo de Parceria a ser firmado com aOSCIP Cruzeiro do Sul;b) o Projeto Amigo da Gente integra o Programa EsporteSolidário do Ministério dos Esportes, que firmou convêniocom a SEL (Distrito Federal) para atender aproximadamente15.000 (quinze mil) crianças e adolescentes, na faixa etária de07 a 17 anos em todo o Distrito Federal. É um projeto degrande envergadura social;c)a questão da contratação desses monitores deu-se, desde oprincípio da execução do projeto, quando o mesmo ainda eraconhecido como projeto Candanguinho, de forma precária ebastante singela. Medidas cautelares e concretas foram levadas a

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efeito no sentido de se buscar uma solução que atendesse,plena e eficazmente, o direito dos monitores e o resguardodo interesse público na observância dos princípios dalegalidade, moralidade, impessoalidade que regem aAdministração Pública;d) assim, em 04/10/2001, mediante expediente, foi solicitadaorientação da PRG/DF orientação acerca da forma legal decumprir dispositivos do Termo de Convênio firmado entre aSEL-DF e o Ministério de Esportes e Turismo para aimplementação do Projeto Amigo da Gente e, especialmente,a melhor maneira de se processar e efetivar a contratação deprofissionais, monitores do projeto;e)a resposta, mediante o Parecer nº 213/2001-PROCAD,sugeria a contratação de entidade, uma organização social, damesma esfera de governo, por meio de Contrato de Gestão,em que ficassem os encargos trabalhistas e previdenciários soba responsabilidade da entidade contratada e não do DistritoFederal. No Distrito Federal atuava o Instituto Candango deSolidariedade, cuja contratação foi descartada porque cobravataxa de administração de 5%, o que reduzia drasticamente oquantitativo de crianças e adolescentes a serem atendidos;f) outra sugestão da PRG/DF foi no sentido da contrataçãode serviços, mediante procedimento licitatório, o queconfigurava grande dificuldade, pois a licitação seria dirigidapara determinada categoria profissional, podendo gerarrecursos administrativos e, possivelmente, judiciais pelainobservância dos princípios da igualdade e da isonomia;g) consultado, o Ministério Público do Trabalho orientou quea SEL fosse buscar a experiência aplicada com sucesso peloMinistério da Saúde na contratação dos agentes de saúde. Aexperiência apontava para a contratação de uma OSCIP;h) em razão de parcerias bem sucedidas firmadas com váriasentidades privadas e sem fins lucrativos, na execução deprojetos e programas voltados ao esporte e lazer é quesubmetera à PRG/DF o Termo de Parceria, com o objetivode regularizar, de uma vez por todas, a situação do ProjetoAmigo da Gente;

• naquela oportunidade, o ICS enfrentava problemas de ordemjurídica que desaconselhavam a celebração de contrato de gestãocom o mesmo, além de que cobrava taxa de administração de5%, enquanto a taxa de administração a ser cobrada pela OSCIPera de 3%;

• em fevereiro de 2003, expediu ofício à Presidência do Conselhode Assistência Social do DF, nos termos do disposto no § 1º doartigo 10 da Lei nº 9.790/99, formulando consulta acerca do

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futuro ajuste, obtendo resposta de que poderia assinar o Termode Parceria em comento;

• ainda em fevereiro de 2003, fora informado pela Diretoria de ApoioOperacional acerca da disponibilidade de recursos financeiros;

• a inexigibilidade de licitação, como fundamento legal para acelebração de Termo de Parceria com as OSCIPs, não é matériapacífica na doutrina; constitui uma novidade. Para uma correntedoutrinária, defendida por Odete Medauar, por exemplo, havendovários particulares pleiteando o objeto do ajuste, torna-senecessária a licitação, para que possa a Administração escolher aproposta que seja mais favorável ao interesse público;

• para outra corrente, defendida por autores como Marcos Villela,mesmo que o ajuste seja firmado com particulares, havendomanifestação de vontade convergente a um fim comum, talconvergência de interesse singulariza o objeto, o que impede a licitação;

• no presente caso, como no caso de convênio, não haveriapossibilidades de licitar, pela singularidade do objeto, somado aofato de que convênio não é contrato. Inclusive, a Lei nº 8.666/93aplica-se aos convênios somente quando cabível e, conforme aredação do art. 2º do diploma legal citado, suas disposições sãoaplicadas, regra geral, aos contratos;

• tecnicamente poder-se-ia dizer que o Termo de Parceria é umhíbrido entre o contrato e o convênio, tendo característica deambos, mas distinguindo-se, também, de ambos. Uma dascaracterísticas que herda dos convênios é exatamente a falta deonerosidade dos contratos, por formar um vínculo de cooperação;

• o artigo 23 do Decreto nº 3.100/99, que regulamentou a Lei nº9.790/99, facultou a escolha de OSCIP para a celebração deTermo de Parceria por meio de licitação na modalidade deconcurso de projetos. Dispôs acerca de uma possibilidade, deuma opção. O Procedimento licitatório, em princípio, é previstopara casos nos quais o relacionamento jurídico implica posturase interesses conflitantes. Parcerias são resultados de interessescomuns e não conflitantes; e

• a questão é delicada e controvertida. Assim, ficava no aguardo demelhor orientação e luz do e. Plenário para esse tormentoso enovel assunto.

4. A Secretaria de Estado de Esporte e Lazer do DistritoFederal - SEL, na pessoa do seu Titular, Senhor Weber de AzevedoMagalhães, às fls. 94 a 105, limitou-se a transmitir as informaçõesque lhe foram prestadas pelo anterior Secretário, ou seja transcreveuas justificativas oferecidas pelo Senhor Agrício Braga Filho. E finalizasolicitando do e. Tribunal orientação quanto às medidas quedevam ser adotadas tendo em vista a importância que o Projeto

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Amigo da Gente representa para esta Secretaria e para quasecinco mil crianças carentes que por ele são assistidas, além,claro, de tratar-se de um bem sucedido programa de governocujo mote principal é promover a Inclusão social tão necessáriaem nosso país. Não informou acerca de qualquer medida saneadoradas impropriedades e faltas apontadas no relatório de inspeção quelhe foi encaminhado.

5. O órgão instrutivo apresentou as seguintes consideraçõesa respeito:

Instituto ainda novo no cenário jurídico pátrio, não se encontraconsolidado, tanto na doutrina quanto na jurisprudência,posicionamento acerca dos Termos de Parceria.

Por certo, tem-se que tal instituto é similar, embora não idêntico,aos Contratos de Gestão, passíveis de assinatura com OrganizaçõesSociais. Ambos decorrem de acordos de colaboração entre o Estadoe as entidades integrantes do denominado Terceiro Setor.

Ponto central em discussão, nos presentes autos, consiste naobrigatoriedade ou não de se realizar certame licitatório previamenteà firmatura dos Termos de Parceria. O artigo 23 do Decreto 3100/99não impõe tal procedimento: “ A escolha poderá ser feita por meiode publicação de edital de concursos de projetos ...” (grifamos).Assim, em tese, torna-se admissível a firmatura de Termo de Parceria,mesmo sem prévia licitação.

Cumpre, pois, verificar, in concreto, a natureza do ajustefirmado entre o Distrito Federal, por intermédio da Secretaria deEsporte e Lazer - SEL, e a OSCIP Cruzeiro do Sul.

Invocam os justificantes a presença de interesse comum aosacordantes, o que caracterizaria ajuste na forma de convênio. Porconseguinte, estaria afastada a obrigatoriedade de licitar, afeta aoscontratos propriamente ditos.

Em compulsa aos autos, observa-se abordagem anterior desseaspecto. Em fevereiro de 2003, previamente à assinatura do Termode Parceria, alertou a Procuradoria-Geral do DF:

Ocorre que pelo estudo dos presentes autos, não há quaisquerelementos que fundamentem a celebração do Termo de Parceria,com dispensa ou inexigibilidade de licitação.

Quanto à justificativa para a não realização de licitação, amesma resta prejudicada pela fragilidade da fundamentação quenão encontra respaldo legal nas regras de exceção estabelecidaspelos arts. 24 e 25 da Lei nº 8.666/93. (fls. 46/47*3).

3 *Refere-se ao Anexo

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No mesmo sentido, manifestação da Assessoria do Conselhode Assistência Social, a qual, ressalve-se, não foi ratificada pelaPresidência daquele colegiado:

e. Com a assinatura do Termo de Parceria diretamente com aOSCIP Cruzeiro do Sul, temos dúvida quanto à observância doprincípio constitucional de isonomia e de seleção da proposta maisvantajosa para a Administração em conformidade com os princípiosbásicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, daigualdade, da publicidade, da probidade administrativa, davinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivoe dos que lhes são correlatos (Art. 3º da Lei nº 8.666/93) (Fl. 66*).

Não obstante os argumentos ora esposados pelos justificantes,entendemos que o ajuste firmado com a OSCIP Cruzeiro do Sul,embora denominado Termo de Parceria, configura-se, em verdade,contrato administrativo, sobretudo, pela onerosidade, decorrente decobrança de taxa de administração por parte da contratada. Importasalientar que no exercício de 2003, a partir da firmatura da parceria(31/03/2003), foi empenhado e pago à OSCIP Cruzeiro do Sul omontante de R$ 2.419.999,70.4

Opinamos que haveria interesse comum se a referida OSCIPexecutasse, previamente à assinatura do ajuste, os serviçosdemandados pela Secretaria e na amplitude demandada pelo projeto.Nesse caso, estaria presente a convergência de interesses; ou seja,buscaria o Poder Público utilizar-se dos recursos e da estrutura daentidade, com vistas à consecução de objeto de interesse do Estado.Esta parece ser a mens legis. Nesse sentido, o ensinamento de MariaSylvia Zanella de Pietro:

Uma vez qualificada pelo Poder Público, a entidade passa areceber algum tipo de auxílio por parte do Estado, dentro daatividade de fomento. Só que a organização da sociedade civilde interesse público, se comparada com a organização social, estámais bem estruturada e impõe requisitos mais rígidos para aobtenção da qualificação.5

Contudo, a estrutura prévia da OSCIP Cruzeiro do Sul nãofoi mencionada pelos justificantes, tampouco encontra-sedocumentada nos autos. Admite-se que a entidade já executasse, dealguma forma, ou em menor escala, atividade de interesse público.Porém, cabe ressaltar que o projeto se estende a praticamente todasas cidades do Distrito Federal. Por isso, fazia-se necessária significativaforça de trabalho: 55 supervisores, 200 monitores, 10 agentes

4 Informação obtida no Sistema Informatizado de Controle Externo - SISCOEX - Fls. 108/111.5 Direito Administrativo. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2003.

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administrativos, 25 auxiliares de serviço (Fl. 38*).. Não se tem acomprovação ou mesmo notícia de que a OSCIP Cruzeiro do Suldispusesse de tais recursos, anteriormente à contratação.

Dessa forma, com vistas ao cumprimento do princípioconstitucional da licitação, e aos demais a ele conexos (impessoalidade,isonomia), caberia à Secretaria de Esporte e Lazer auscultar aexistência de outros interessados em prestar os serviços demandadospela Administração. Somente após constatada a inexistência oudesinteresse de potenciais parceiras, admitir-se-ia a contratação direta.Ou seja, o fato de se contratar determinada OSCIP não significa,necessariamente a inaplicabilidade da Lei nº 8.666/93.

A esse respeito, reportamo-nos a orientação prestada peloCorpo de Consultores da Consultoria Zênite, que sintetiza a questão:

6. O termo de parceria, nos termos da Lei nº 9.790/99,será firmado entre o Poder Público (‘qualquer entidade públicada mesma área de sua atuação’) e OSCIP. Se presentes osrequisitos da Lei nº 9.790/99, como regra, para que se firmemesses termos de parceria, a licitação não será obrigatória, pois,na verdade, esse termo de parceria em muito se assemelhacom um convênio. De qualquer forma, para a Administraçãocontratar com as OSCIPs (contrato administrativo, e não convênioou termo de parceria), deve antes, como regra, realizar licitação.

7. Enfim, o procedimento prévio para a contrataçãoseria a realização de licitação, nos termos da Lei nº 8.666/93. Caso o termo a ser pactuado seja o convênio ou termo deparceria, a licitação será necessária.6 ( Fl. 114).

Em suma, entendemos que os argumentos prestados pelosjustificantes não são capazes de sustentar a regularidade dacontratação direta realizada pela Secretaria de Esporte e Lazer.

A propósito, verifica-se, no tocante ao Item II da Decisão 1

nº 6.359/2003, a remessa de farta documentação à Jurisdicionada,para a adoção de medidas saneadoras ou apresentação de justificativas.O titular da Pasta, Sr. Weber Magalhães, pronunciou-se apenas quantoà contratação direta. Restaram, pois, não abordados os demais pontoserguidos na Instrução, transcritos no § 6º desta Informação.

Considerando ser, em nosso entendimento, irregular acontratação direta, opinamos que deva ser determinado ao dirigentedo órgão que, nos termos do art. 45 da Lei Complementar nº 01/94,adote as providências necessárias ao exato cumprimento da Lei, noque se refere à observância do princípio constitucional da licitação,

6 Informativo de Licitações e Contratos. Ano IX, nº 101, jul. 2002, p. 608

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afastável somente após comprovada a inexistência ou desinteresse deeventuais parceiros.

No tocante ao Sr. Agrício Braga, responsável pela assinaturado Termo de Parceria, entendemos que as controvérsias atinentes aonovel instituto do termo de parceria podem justificar a falha verificada.Dessa forma, não se sugere a apenação da referida autoridade.

6. A Procuradora Geral Dra. Márcia Farias emitiu Parecer nº318/04-MF, lavrado nos seguintes termos:

9. No entendimento deste órgão do Ministério Público,não há por que proceder qualquer reparos às ponderações econclusões expendidas no parecer de fls. 46 a 51. Todavia, considerapertinente tecer algumas considerações adicionais, em virtude dadeliberação contida no item IV da Decisão nº 6.359/2003,relativamente à instrução de um processo de inexigibilidade delicitação e às justificativas ofertadas pela Secretaria de Estado deEsporte e Lazer e pelo Senhor Agrício Braga Filho.

10. Como já observado, as justificativas em comentosão equivalentes. Os justificantes não ofereceram os elementosexigidos no artigo 26, especificamente aqueles de que tratam osincisos II e III do parágrafo único do artigo 26 da Lei nº 8.666/93.Embora tenham declarado experiência na formação de parceriasbem sucedidas com entidades privadas e sem fins lucrativos (fl.86), os justificantes não esclareceram a razão da escolha da OSCIPCruzeiro do Sul para a execução do Projeto Amigo da Gente;porque a proposta dessa entidade seria a mais vantajosa para oPoder Público celebrar o Termo de Parceria. Da mesma forma,não foi explicado por que o valor do Termo deveria ser de R$2.419.999,70 (fl. 123).

11. Em conformidade com cópias do processo originárionº 020.003.165/2001, que trata do Termo de Parceria celebrado entreo Distrito Federal, com a interveniência da Secretaria de Estado deEsporte e Lazer, e a OSCIP Cruzeiro do Sul, compondo o Anexodo Processo nº 932/2003, a Douta Procuradoria Geral do DistritoFederal, no Parecer nº 213/2001-PROCAD (fl. 19 do Anexo), emresposta à consulta formulada pela SEL, concluiu:

o parecer é no sentido do retorno dos autos ao órgãoconsulente, para o cumprimento da Cláusula Segunda, “g”, doConvênio, a fim de que sejam observadas as disposições da Leinº 8.666/93 para a contratação de pessoal para prestação deserviços na consecução do “Projeto Amigos da Gente”,relacionado com o Termo de Convênio celebrado.

12. A alínea “g” do item 2 da Cláusula Segunda doConvênio celebrado entre o Instituto Nacional de Desenvolvimento

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do Desporto - INDESP, Autarquia Federal vinculada ao Ministériodo Esporte e Turismo e o Distrito Federal (fls. 01 a 12 do Anexo),estatui como obrigações do CONVENENTE:

observar, na contratação de serviços ou aquisição de bensvinculados à execução do objeto deste Convênio, osprocedimentos licitatórios de que trata a Lei nº 8.666/93,inclusive os procedimentos ali definidos para os casos dedispensa e/ou inexigibilidade de licitação e as disposiçõesrelativas a contratos (fls. 02/03 do Anexo).

13. No mesmo sentido, é a resposta oferecida pela DoutaPRG/DF à nova consulta realizada pela SEL, em fevereiro de 2003,no Parecer nº 022/2003-PROCAD (fls. 39 a 48 do Anexo), cujaconclusão é a que segue:

opinamos pela inviabilidade da celebração, em face dadescaracterização do Termo de Parceria, sugerindo o retorno dosautos ao órgão de origem para o devido conhecimento eprovidências pertinentes.

14. A Assessoria do Conselho de Assistência Social doDistrito, em apreciação de consulta formulada pela SEL, ressaltou queo Termo de Parceria, de acordo com a Lei nº 8.666/93, caracteriza-se como contrato da Administração Pública por tratar de ‘acordo devontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigaçõesrecíprocas’. Dessa forma, manifestou dúvida se a assinatura do Termode Parceria diretamente com a OSCIP Cruzeiro Sul ocorreria com aobservância do princípio constitucional de isonomia e da seleção daproposta mais vantajosa para a Administração em conformidadecom os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, damoralidade, da igualdade, da publicidade, da probidadeadministrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, dojulgamento objetivo e dos que lhes são correlatos (fls. 65/66 doAnexo). Apesar disso, a digna Presidente do CAS respondeu à SEL quenão estava autorizada a opinar naquela fase, cabendo-lhe aguardar tão-somente a fase de execução do objeto do Termo de Parceria, quandoteria amparo legal para proceder o acompanhamento e a fiscalização daimplementação do mesmo (fl. 67/68 do Anexo).

15. Certamente caberia ao CAS pronunciar-se acerca doTermo de Parceria, conforme dispõe:

§ 1º do art. 10 da Lei nº 9.790/99: A celebração do Termo deParceria será precedida de consulta aos Conselhos de PolíticasPúblicas das áreas correspondentes de atuação existentes, nosrespectivos níveis de governo.

16. Conquanto o Termo de Parceria instituído pelo artigo9º da Lei nº 9.790/99 destine-se à formação de vínculo de cooperação

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entre o Poder Público e as entidades qualificadas como OSCIP,objetiva o fomento e a execução das atividades de interesse público.Atividades essas especificadas no art. 3º e que, segundo o parágrafoúnico do mesmo artigo sejam áreas de atuação anterior da OSCIP,com recursos próprios. Não há comprovação nos autos da experiênciada OSCIP Cruzeiro do Sul na execução dos serviços objeto da parceriaformada com a SEL. Como comprovar a inviabilidade competição deoutras OSCIPs na formação de vínculo com o Poder Público?

17. Não obstante o vínculo de cooperação a ser formadocom o Poder Público, o Termo de Parceria não se confunde comconvênio. O Termo de Parceria é um instituto com regras própriase muito específicas, de que trata a Lei nº 9.790/99. Além doprograma de trabalho proposto pela OSCIP, o Termo de Parceriahá de conter em suas cláusulas essenciais (art. 10, § 2º), a estipulaçãodas metas e dos resultados a serem atingidos e os respectivos prazosde execução ou cronograma; e a previsão expressa dos critériosobjetivos de avaliação de desempenho a serem utilizados, medianteindicadores de resultado.

18. Na ausência de definição dessas metas, desses critériosde avaliação de desempenho e dos indicadores de resultado, pois oPrograma de Trabalho do Termo de Parceria não foi acostado aosautos, como atestar que a contratação dos serviços objeto da parceriaem comento não guarda consonância com as contratações ilegais depessoal verificadas nos ajustes firmados com o Instituto Candangode Solidariedade, situação assinalada na Representação nº 06/2003-MF (fl. 02)?

19. Sendo assim, as justificativas em comento não podemprosperar. O Termo de Pareceria em questão não poderia ter sidocelebrado com fundamento no artigo 25 da Lei nº 8.666/93.

20. De convir, porém, que a matéria tratada nos autos aindaé nova e bastante complexa. Com o advento da Lei nº 9.790/99, oínclito Tribunal de Contas da União - TCU criou Grupo de Trabalhocom a finalidade de realizar estudos a fim de verificar o alcance dasdisposições da Lei das Organizações da Sociedade Civil de InteressePúblico - OSCIP nas atividades de controle de sua competência,consoante o Processo nº 014.334/1999-2.

21. Das conclusões expendidas naqueles estudos, valedestacar excerto das sugestões de aperfeiçoamento do texto doDecreto Federal nº 3.100/99, que regulamentou a Lei nº 9.790/99,formuladas aos órgãos competentes do Poder Executivo Federal,acolhidas pelo e. Plenário na Decisão nº 931/1999:

Texto atual:

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Art. 10. (...).............................omissis.........................§ 3º O Conselho de Política Pública terá prazo de trinta dias, contado

a partir da data de recebimento da consulta, para se manifestar sobre oTermo de Parceria, cabendo ao órgão estatal responsável, em últimainstância, a decisão final sobre a celebração do respectivo Termo deParceria.

§ 4º O extrato do Termo de Parceria (...)”Texto sugerido:

Art. 10. (...)..............................omissis........................§ 3º O Conselho de Política Pública terá prazo de trinta dias,

contado a partir da data de recebimento da consulta, para semanifestar sobre o Termo de Parceria, cabendo ao órgão estatalresponsável, em última instância, a decisão final sobre a celebraçãodo respectivo Termo de Parceria.

§ 4º Em caso de celebração de Termo de Parceria emdesacordo com a manifestação do Conselho de Política Pública,ou na ausência dessa manifestação, o órgão estatal responsáveldeverá emitir justificativa circunstanciada para a decisão adotada.

§ 5º O extrato do Termo de Parceria (...)Comentário:

O texto original do parágrafo terceiro do art. 10 prejudica aefetividade do controle social conferido ao Conselho de PolíticaPública. Esse problema seria atenuado caso o órgão estatalresponsável justificasse adequadamente eventuais decisõescontrárias à manifestação do Conselho ou quando este se omitisse.Outra situação possível é a incapacidade operacional ou a faltade interesse do colegiado para apreciar todos os Termos deParceria. A título de exemplo, citamos que, em trabalho realizadoem 1998, constatamos que o Conselho Nacional de Saúde nãolograva desempenhar todos os papéis de controle e formulaçãode políticas públicas que lhe cabiam na área de saneamento, poissua agenda priorizava outras questões.’

..............................................................................................................Texto original:

art. 23. A escolha da Organização da Sociedade Civil de InteressePúblico, para a celebração do Termo de Parceria, poderá ser feitapor meio de edital de concursos de projetos pelo órgão estatalparceiro para obtenção de bens e serviços e para a realização deatividades, eventos, consultorias, cooperação técnica e assessoria.Texto sugerido:

Art. 23. A escolha da Organização da Sociedade Civil deInteresse Público, para a celebração do Termo de Parceria, deveráser feita por meio de edital de concursos de projetos pelo órgão

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estatal parceiro, sempre que os valores a serem repassados peloórgão estatal atinja o limite de R$ ........Comentário:

A utilização da palavra ‘poderá’ torna o texto original meramenterecomendatório, deixando à discricionariedade do administrador adecisão de optar ou não pelo concurso. Considerando que oconcurso exige trâmites burocráticos que podem onerar a eficiênciado processo de seleção para os Termos de Parceria, infere-se que asua mera sugestão, no corpo do Decreto, será pouco efetiva. Cabelembrar que a realização do concurso busca a isonomia notratamento das OSCIPs e a melhor eficiência na realização do objetopactuado. A título de racionalização, poderia ser estabelecidoum limite de valor a partir do qual seria obrigatório o concurso.Tal valor seria calculado a partir da relação custo benefício para asOSCIPs participarem do certame. Outra questão a destacar é queos tipos de objetos enumerados no texto original parecemconfrontar-se com a finalidade legal dos Termos de Parceria.Segundo o art. 8º do Decreto, a parceria deve objetivar o fomentoe a execução das atividades de interesse público previstas no art.3º, da Lei nº 9.790/99. Aquele artigo enumera as finalidadesprecípuas das OSCIPs, não englobando, conforme parece, ofornecimento de bens ou serviços de assessoria, consultoria,promoção de eventos, nem atividades de cooperação técnica. Aocorrência comum desses objetos nos convênios atuais (cursos,seminários, aquisição de serviços etc.) suscita a questão do possíveluso do convênio como fuga ao processo de licitação. Ainda nessesentido, poderiam ser incluídas no Decreto as seguintes vedaçõesaos Termos de Parceria e/ou às OSCIPs: terceirização de atividadesmeio no Setor Público; utilização de instalações públicas pararealização dos serviços contratados; aquisição de bens e serviçospara uso pela Administração Pública.’

22. Impende, noticiar, que o Poder Público pretendeestabelecer vínculo jurídico de cooperação com entidades privadas paraa implantação ou gestão de serviços, empreendimentos e atividadesde interesse público, em conformidade com projeto de lei que tramitana Câmara dos Deputados, instituindo normas gerais para licitação econtratação de parceria público-privada. Na Câmara Legislativa doDistrito Federal também tramita projeto de lei com esse objeto. Noentanto, a finalidade dessa parceria público-privada não se conformacom a parceria buscada com as OSCIPs.

23. Diante do exposto, em acordo parcial com o diligentecorpo técnico, opina o Ministério Público por que o e. Tribunal:a) determine à Secretaria de Estado de Esporte e Lazer, nos termos

do artigo 45 da Lei Complementar nº 01/94, adote as providências

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necessárias ao exato cumprimento da Lei, no que tange à realizaçãode procedimento licitatório para a contratação de entidades para aexecução do Projeto Amigo da Gente;

b) aplique a multa prevista no artigo 57, III, da Lei Complementarnº 01/94 ao Senhor Agrício Braga Filho pela prática de atoadministrativo ilegítimo.

7. É o relatório.

VOTO

8. As diretrizes teóricas que entendo devam balizar o exame determos de parceria celebrados por órgãos e entidades da Administração Públicacom Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIPs foramlançadas no voto que proferi em Sessão de 19.11.03, anteriormente transcrito.

9. Assim, considerando que há omissão, há lacuna na norma geralde regência, Lei federal nº 9.790/99, no que se refere à forma de seleção daOSCIP com a qual será celebrado Termo de Parceria; considerando que oDecreto federal nº 3.100/99 não tem aplicação no âmbito do Distrito Federal;considerando que o artigo 116 da Lei nº 8.666/93 estabelece que asdisposições desse Estatuto aplicam-se, no que couber, aos convênios,acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãose entidades da Administração; é de se concluir que essa escolha deve serfeita mediante licitação, ou procedimento formal de sua dispensa ouinexigibilidade (art. 26 da Lei nº 8.666/93).

10. Como a Lei nº 8.666/93 aplica-se, no que couber, certamentedeverão ser relativizados os seus dispositivos ao caso concreto da celebraçãode termo de parceria. No entanto, não se pode afastar a necessidade derealização de procedimento formal de seleção, que esteja fundado em critériostécnicos e objetivos de julgamento; que estabeleça condições justas dehabilitação técnica e econômica para salvaguardar o Poder Público e garantira continuidade da prestação dos serviços à comunidade; que propicie a buscada proposta mais vantajosa; enfim, que observe os princípios constitucionaisda Administração Pública, em especial os da moralidade, da isonomia, daimpessoalidade, e da publicidade.

11. Interessante observar, ad argumentandum tantum, que a minuta doprojeto de lei que provavelmente virá alterar ou substituir a Lei 8.666/937

7 Ver minuta no sitio www.comprasnet.gov.br.

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estabelece que a contratação de OSCIP deverá ser feita mediante “consulta”,que, segundo aquela minuta8 , é “modalidade de procedimento de contratação”.

8 Art. 1º Esta Lei institui normas gerais sobre licitações e demais procedimentos de contratação,que devem ser observadas no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal edos Municípios.(...)Art. 8º São modalidades de licitação:I - Convocação Geral;II - Pregão;III - Cotação Permanente;IV - Leilão de Bens; eV - Seleção Extraordinária;§ 1º Quando não for possível a seleção do contratado mediante a comparação objetiva daspropostas oferecidas pelos interessados, nos termos previstos nesta Lei, a contratação deveocorrer mediante procedimento de Consulta ou de Justificação.(...)Art. 17. Consulta é a modalidade de procedimento de contratação em que o julgamento daspropostas é feito por Júri, com ponderação entre o custo e o benefício de cada proposta, podendoconsiderar a capacitação das participantes, conforme critérios fixados no instrumento convocatório.(...)Art. 18. A Administração deve realizar o procedimento de Consulta para:(...)III - contratações especiais, assim definidas no art. 21.(...)Art. 21. São casos de contratação especial:(...)III - a contratação de organizações sociais e organizações da sociedade civil de interessepúblico, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades con-templadas no contrato de gestão ou termo de parceria.(...)Art. 22. A Consulta destina-se aos previamente convidados pela Administração, em númeromínimo de 3 (três), cuja escolha deve ser amplamente justificada e recair sobre pessoas denotória capacidade no campo de sua especialidade, inclusive com indicação dos elementos de-monstrativos de sua qualificação técnica e, quando relevante para o objeto, econômico-financeira.(...)§ 1º Para adjudicação do objeto ao autor da melhor proposta, a Administração deve ter recebi-do, no mínimo, duas propostas válidas.§ 2º Não atingido o número mínimo definido no parágrafo anterior, outro procedimento deConsulta deve ser iniciado, salvo se a Administração justificar a impossibilidade de atingi-lo.§ 3º O disposto no § 2º não impede a Administração de desistir da contratação.(...)Art. 23. A Administração pode promover Consulta aberta a todos os interessados que atendamàs exigências de habilitação definidas no instrumento convocatório, com observância das nor-mas previstas nesta Lei.(...)Art. 25. A Administração deve justificar toda contratação em que a disputa se mostra desnecessária,inviável ou inconveniente.

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12. No caso concreto, o que verifico é que a firmatura do Termode Parceria com a OSCIP Cruzeiro do Sul não observou qualquerprocedimento formal de seleção. Tampouco foi acompanhada de justificativasobre sua dispensa ou inexigibilidade, que pudesse amparar a escolha dacontratada e o valor ajustado.

13. Em relação ao valor a ser transferido para a OSCIP, adotou-seo procedimento de remuneração mediante taxa de administração, que, ameu ver, é ilegal e antieconômico. Ilegal porque não encontra previsão naLei nº 9.790/99 ou na Lei nº 8.666/93. Antieconômico porque não estabelecequalquer vínculo com os custos diretos ou indiretos incorridos pela entidadepara execução dos serviços que são objeto do termo de parceria. Além disso,não se coaduna com as características do ajuste, que pressupõe a colaboração,o fomento a entidade sem fim lucrativo.

14. Note-se, ainda, que a Lei nº 9.790/99 estabelece, em seu artigo10, § 2º, inciso IV, que é cláusula essencial do termo de parceria:

a previsão de receitas e despesas a serem realizadas em seucumprimento, estipulando item por item as categorias contábeis utilizadaspela organização e o detalhamento das remunerações e benefícios depessoal a serem pagos, com recursos oriundos ou vinculados ao termode parceria, a seus diretores, empregados e consultores.

15. A apuração dos custos diretos e indiretos relacionados àexecução dos serviços objeto do termo de parceria, incluindo a remuneraçãodos diretores da OSCIP, é simples. Há, nos autos, uma apuração de custos(fls. 56/60 do anexo), inclusive com cronograma mensal de desembolso.No entanto, recolhe-se taxa de administração mensal, no montante de 3%,sem detalhar a que se destinam esses recursos.

16. O Termo de Parceria em apreciação, celebrado entre a Secretariade Esporte e Lazer e a OSCIP Cruzeiro do Sul, padece, ademais, das seguintes

(...)Art. 29. Do procedimento de Justificação deve constar:I - caracterização da situação de desnecessidade, inviabilidade ou inconveniência de disputa;II - dispositivo legal aplicável;III - razão da escolha da contratada;IV - demonstração dos critérios adotados para definição do preço e de eventuais contraprestações,condições e compromissos exigidos da contratada;V – demonstração de que o prazo de vigência do contrato ou a quantidade adquirida é oindispensável ao atendimento no caso da situação emergencial; eVI - minuta do instrumento de contratação, quando houver.

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irregularidades, tendo em vista as cláusulas obrigatórias indicadas no § 2ºdo art. 10 da Lei nº 9.790/99:

• não está acompanhando de Programa de Trabalho, contendo odetalhamento do seu objeto, elemento esse que também não foiencaminhado pela Secretaria ou pelo justificante (inciso I).Esperava-se que esse Programa de Trabalho suprisse as demaisomissões verificadas no ajuste, quais sejam:

• não estipula metas e resultados a serem atingidos e os respectivosprazos de execução ou cronograma (inciso II). Como dito, hácronograma mensal de desembolso de recursos e, ainda, quadroque indica quantas crianças são atendidas. Mas não se de definemmetas de atendimento, que devem ser alcançadas pela OSCIPem determinado prazo. O desembolso mensal é, inclusive, estável.Não está relacionado com metas ou resultados. Lembre-se que ofundamento desse tipo de parceria é a busca da eficiência naprestação de serviços públicos;

• não há previsão expressa dos critérios objetivos de avaliação dedesempenho a serem utilizados, mediante indicadores de resultado(inciso III).

17. Em assim sendo, em conformidade com a instrução e oMinistério Público, também entendo que esta Corte de Contas, nos termosdo artigo 45 da Lei Complementar nº 01/94, deve determinar à Secretariade Esporte e Lazer do Distrito Federal que adote as medidas necessárias aoexato cumprimento da lei, no que tange à realização de licitação paracelebração de termo de parceria, ou de procedimento formal de dispensa ouinexigibilidade, o que, nos presentes autos, não restou comprovado.

18. Para evitar a descontinuidade dos serviços assistenciais, quebeneficiam, segundo a Secretaria, centenas de crianças carentes, creio que oTribunal poderá admitir, em caráter excepcional, o prosseguimento dacontratação atual até que se ultimem os procedimentos antes indicados, quedevem ser iniciados imediatamente, e desde que se suspenda o pagamentode taxa de administração, determinando-se que a transferência dos recursospúblicos deve se ater ao exato montante dos custos diretos e indiretosincorridos para a execução específica do objeto do Termo de Parceria.

19. Isto posto, há necessidade de que seja apurado o quanto foipago a maior a título de taxa de administração, nos termos da Resolução -TCDF nº 102/98, promovendo-se a recomposição do erário.

20. No mais, creio que deve a Secretaria de Esporte e Lazer seralertada no sentido de que a adoção das medidas saneadoras indicadas pelo

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Tribunal não afasta a necessidade e o dever de serem apresentadas asprestações de contas dos recursos repassados para a OSCIP, nos termos dalegislação vigente, em especial o art. 70 da Constituição da República c/cos artigos 4º, inciso VII, da Lei nº 9.790/999 e 1º, inciso II, alínea d, da LeiComplementar nº 01/9410.

21. Quanto à aplicação de multa ao subscritor do Termo de Parceriaeivado de irregularidades, entendo que pode ser dispensada, ante osargumentos expostos pela instrução.

Feitas essas considerações, voto por que o Plenário, considerando aomissão, a lacuna existente na norma geral de regência, Lei federal nº 9.790/99, no que se refere à forma de seleção da OSCIP com a qual será celebradoTermo de Parceria; considerando que o Decreto federal nº 3.100/99 não temaplicação no âmbito do Distrito Federal; considerando que não se pode afastara necessidade de realização de procedimento seletivo, que esteja fundado emcritérios técnicos e objetivos de julgamento, que estabeleça condições justasde habilitação técnica e econômica para salvaguardar o Poder Público e garantira continuidade da prestação dos serviços à comunidade, que propicie a buscada proposta mais vantajosa, e, enfim, que observe os princípios constitucionaisda Administração Pública, em especial os da moralidade, da isonomia, daimpessoalidade, e da publicidade; considerando, ainda, que o artigo 116 daLei nº 8.666/93 estabelece que as disposições deste Estatuto aplicam-se, noque couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentoscongêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração;considerando, em conclusão, que a seleção da OSCIP deve ser feita mediante

9 Art. 4º. Atendido o disposto no art. 3º, exige-se, ainda, para qualificarem-se como Organizaçõesda Sociedade Civil de Interesse Público, que as pessoas jurídicas interessadas sejam regidas porestatutos cujas normas expressamente disponham sobre:(...)VII - as normas de prestação de contas a serem observadas pela entidade, que determinarão, nomínimo:(...)d) a prestação de contas de todos os recursos e bens de origem pública recebidos pelas Organizações... será feita conforme determina o parágrafo único do art. 70 da Constituição Federal.10 Art. 1º . Ao Tribunal de Contas do Distrito Federal ..... compete:(...)I - julgar as contas:(...)d) dos dirigentes de entidades dotadas de personalidade jurídica de direito privado que recebamcontribuições, subvenções, auxílios e assemelhados, até o limite do patrimônio transferido.

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licitação, ou procedimento formal de sua dispensa ou inexigibilidade (art.26 da Lei nº 8.666/93):

I - tome conhecimento das razões de justificativa apresentadas pelosSrs. Weber de Azevedo Magalhães, atual Secretário de Esporte eLazer, e Agrício Braga Filho, ex-titular da Pasta, em atendimentoaos itens II e IV da Decisão nº 6.359/2003, respectivamente,para considerá-las insuficientes para afastar as irregularidadesevidenciadas na celebração do Termo de Parceria em exame,deixando de aplicar a multa prevista no art. 57, II e III, da LeiComplementar nº 01/94, por tratar-se de matéria nova, que aindanão havia sido objeto de deliberação plenária;

II - considere irregular o Termo de Parceria celebrado entre aSecretaria de Esporte e Lazer do Distrito Federal e a OSCIPCruzeiro do Sul, em razão das seguintes ocorrências:a) ausência de licitação, ou procedimento formal de sua dispensa

ou inexigibilidade (CF, art. 37, caput e inciso XXI, c/c Leinº 8.666/93, arts. 2º, 26 e 116);

b) remuneração mediante pagamento de taxa de administração,prática que, além de ser incompatível com a natureza dosajustes e não encontrar respaldo na legislação de regência,se revela antieconômica, uma vez que desvincula o valormensal contratualmente estabelecido de qualquer critérioobjetivo de apuração dos custos diretos e indiretos incorridospela Instituição privada, sem fins lucrativos, conformeprevisto, inclusive, no art. 10, § 2º, IV, da Lei nº 9.790/99;

c) ausência de elementos essenciais previstos na Lei nº 9.790/99, art. 10, § 2º, quais sejam: 1) programa de trabalho contendoo detalhamento do objeto pactuado (inciso I); metas eresultados a serem atingidos e os respectivos prazos deexecução (inciso II); critérios objetivos de avaliação a seremutilizados, mediante indicadores de resultado (inciso III);

III - com fundamento no artigo 71, IX, da Constituição da Repúblicac/c o artigo 45 da Lei Complementar distrital nº 01/94, determineà Secretaria de Esporte e Lazer do Distrito Federal que:a) adote, imediatamente, as medidas necessárias ao exato

cumprimento da lei, consistente na realização de licitação,

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ou procedimento formal de sua dispensa ou inexigibilidade,se for o caso, devidamente motivado e justificado (Lei nº8.666/93, art. 26), admitindo-se, dessa forma, em caráterexcepcionalíssimo, para evitar a descontinuidade dosserviços assistenciais, que beneficiam, segundo consta dosautos, milhares de crianças carentes (fl. 62 do volume anexoaos presentes autos), o prosseguimento do termo em vigor,apenas até que seja ultimada a providência antes indicada, edesde que seja suspenso o pagamento da taxa deadministração, devendo a transferência de recursos públicosater-se ao exato montante dos custos diretos e indiretosincorridos para a execução específica do objeto pactuado;

b) promova, na forma e prazos estabelecidos na ResoluçãoTCDF nº 102/98, a apuração do possível prejuízodecorrente do pagamento indevido de taxa de administração,providenciando a recomposição do erário distrital;

IV - alerte à Secretaria de Esporte e Lazer que a adoção das medidassaneadoras indicadas pelo Tribunal não afasta a necessidade eo dever de serem apresentadas as prestações de contas dosrecursos repassados para a OSCIP, nos termos da legislaçãovigente, em especial o art. 70 da Constituição da República c/c os artigos 4º, inciso VII, da Lei nº 9.790/99 e 1º, inciso II,alínea d, da Lei Complementar nº 01/94; e

V - restitua os autos à Inspetoria própria, autorizando, desde logo,a realização de inspeção, se necessária, para oacompanhamento das medidas a serem implementadas pelaSecretaria de Esporte e Lazer.

Processo nº 932/2003*

* Ver Decisão nº 2.885/2004

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PARCELAMENTO IRREGULAR DE ÁREA RURAL

PÚBLICA

Marli VinhadeliConselheira do TCDF

Representação baseada no art. 5º da Lei Complementardistrital nº 678/02. Possível omissão de agentes públicos em facede parcelamento irregular de área rural pública na RegiãoAdministrativa do Riacho Fundo. Inspeção. Constatação deparcelamento irregular. Audiências. Determinações.

RELATÓRIO

O Fiscal de Atividades Urbanas e responsável pela fiscalização daColônia Agrícola Sucupira, Riacho Fundo II, desde abril de 2004, ofereceuRepresentação a este Tribunal de Contas, com fundamento no artigo 5º daLei Complementar nº 678/021, relatando possível omissão de agente públicofrente a parcelamento irregular ocorrido naquela área.

Afirmou o Representante que, nada obstante a irregularidade doparcelamento ocorrido, não encontrou qualquer registro de ato, seja interdiçãoou multa, que caracterizasse aplicação efetiva da referida Lei Complementarnº 678/02, desde sua publicação em 27/12/2002 até o dia 09/01/2004,período em que o servidor, matrícula nº 24959-9, foi Chefe do Núcleo deFiscalização de Obras, Edificações e Urbanismo do Riacho Fundo II.

Após inspeção, autorizada por despacho presidencial, nos termos doartigo 121, II, do RI/TCDF (fl. 10), o órgão de apoio técnico desta Corte deContas apresentou as seguintes constatações:

1 Lei nº 678, de 7 de dezembro de 2002: dispõe sobre as sanções administrativas corresponden-tes à prática de atos que dêem início ou efetivem parcelamento no solo do Distrito Federal, semautorização do Poder Público.Art. 5º Diante da comprovada omissão das autoridades competentes na observância dos precei-tos desta Lei e sem prejuízo da iniciativa popular, o agente público encarregado da fiscalizaçãotem o dever de representar ao Tribunal de Contas do Distrito Federal.

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• a Colônia Agrícola de Sucupira teve sua criação autorizada pela Resoluçãonº 173, aprovada na Sessão de 27 de outubro de 1999, do ConselhoDeliberativo da Fundação Zoobotânica do Distrito Federal, com 169,1313hectares, parcelados em 50 (cinqüenta) chácaras;

• por força do Decreto nº 20.976/2000, a extinta Fundação Zoobotânicado Distrito Federal teve suas atribuições e competências integradas àSecretaria de Agricultura do Distrito Federal, fls. 109/110;

• o Secretário de Estado de Agricultura e Abastecimento, no Processo nº0030.004.795/2000, com base no Relatório elaborado pela Comissãoencarregada de apurar possíveis irregularidades na instrução dosProcessos nº 073.001.614/99 (Resolução nº 152 da extinta FundaçãoZoobotânica, referente à Área Isolada Papuda II), nº 073.006.287/90(Resolução nº 173 da extinta Fundação Zoobotânica, referente àColônia Agrícola de Sucupira), nº 073.002.009/99 (Resolução nº 217da extinta Fundação Zoobotânica, referente à Região do Park Way) enº 073.002.069/99 (Resolução nº 218 da extinta FundaçãoZoobotânica, referente ao Núcleo Rural Santa Maria), todosconcernentes à concessão de área rural, reconheceu a nulidade dasdecisões do Conselho Deliberativo da Fundação Zoobotânica,tomadas pelas Resoluções nos 152, 173, 217 e 218 com efeitos ex-tunc,determinando, outrossim, a imediata desocupação dos lotes ocupadosirregularmente2;

• além das chácaras de nos 05, 07, 09, 13, 14, 16, 17 e 18, mencionadasem relatório da Administração Regional obtido em inspeção,também os lotes de nos. 11, 15, 19 e 20 estão em avançado estadode parcelamento irregular, fls. 69/81. Já as chácaras de nos 23, 27e 29 apresentam suspeita de início de parcelamento irregular, fls.84/86, 89, 91;

• parcelamento irregular é crime previsto na Lei nº 6.766/79. Alémdisso ocorreu parcelamento da área rural de propriedade doDistrito Federal, definida no Plano Diretor de OrdenamentoTerritorial do Distrito Federal (art. 25, § 1º, alínea III da LC nº17/97) como Zona Rural de Uso Controlado, submetida aoregime de concessão de uso, fato que de per si caracteriza crimee dá ensejo a rescisão unilateral dessas concessões;

• a Administração Regional informou que, em razão da irregularidadedos parcelamentos, não houve concessão de alvarás de construçãopara as edificações lá existentes. Nada obstante, a fiscalizaçãorestou obstacularizada pelas seguintes razões:• parte da área (Chácaras 31, 34, 36, 38, 38 B, 40, 40 A, e 42)

pertence à União, sendo que o Gerente Regional doPatrimônio da União no Distrito Federal, mediante Ofício 11/04/

2 Processo nº 720/2000, Anexo I, fls. 187 e 189/238.

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SEONE/GRPU/DF, recomendou ao Administrador Regional doRiacho Fundo que qualquer operação a ser efetuada nas terras dedomínio da União deveria ser previamente autorizada por aquelaGerência Regional fl. 66;

• o órgão de fiscalização, antes sob a estrutura da AdministraçãoRegional, passou a integrar a Secretaria de Estado deFiscalização de Atividades Urbanas – SEFAU;

• os chacareiros, divididos em dois grupos, buscaram proteçãopossessória no Poder Judiciário;• o primeiro grupo ajuizou ação de Interdito Proibitório,

distribuída à 4ª Vara de Fazenda Pública do DF, Processonº 2002.01.1.114157-8, em que foi concedida liminar, masainda não houve sentença de mérito, fls. 31 e 118/122. Nestecaso, permanece, pois, a proteção possessória obtida pelosocupantes no sentido de que “a ré se abstivesse de adotarquaisquer medidas tendentes à desocupação dos imóveisdos autores”;

• o segundo grupo manejou ação de manutenção de posse,distribuído à 6ª Vara da Fazenda Pública do DF, Processo nº2002.01.1.114194-7, cuja liminar inicialmente concedida foicassada, tendo, contudo, sido mantido seus efeitos por meio deAgravo de Instrumento, AGI 2002.00.2.009727-2, fl. 31. Nomérito, os ocupantes irregulares tiveram negado seu pleito pordeserção. Interpuseram, então, Agravo Regimental, a quetambém foi negado provimento, fls. 124/128. Esse processoencontra-se, inclusive, em vias de ser arquivado, fl. 123. Dessaforma, não há mais proteção judicial a obstar que o PoderPúblico exerça seu poder de polícia sobre as construçõesirregulares erigidas nos lotes que estavam inicialmenteprotegidos pela possessória supracitada.

As conclusões do órgão instrutivo encontram-se lavradas nosseguintes termos:

Feitas essas considerações, tem-se, em síntese, que todas aschácaras do Núcleo Rural de Sucupira estão em situação deirregularidade em virtude da nulidade da Resolução nº 173 da extintaFundação Zoobotânica que outorgava a concessão de uso dessaschácaras, sendo que algumas delas, a irregularidade está agravadapelo vício do parcelamento irregular de sua área.

Cabe aqui ressaltar que o parcelamento irregular do soloverificado nas chácaras nos 05, 07, 09, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19 e20 conta com a complacência estatal, vez que a CAESB instalouhidrômetros em vários dos lotes irregulares, fls. 17/18.

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Nesse contexto, o órgão responsável pelas áreas rurais do DistritoFederal, no caso a Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento –SAPA, juntamente com a Secretaria de Estado de Fiscalização de AtividadesUrbanas – SEFAU, por meio da SIV-SOLO, deve, o mais rápido possível,estancar o parcelamento irregular de solo rural que se verifica de formacrescente nas chácaras de nos 05, 07, 09, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19 e 20,tomando as medidas necessárias para restabelecer o status quo ante,procedendo, se o caso indicar, à demolição das edificações construídas,aliás, como tem sido feito na área rural de águas claras, ressalvado, é claro, oslotes que estiverem protegidos por ação de Interdito Proibitório, distribuídoà 4ª Vara de Fazenda Pública do DF, Processo nº 2002.01.1.114157-8, queconcedeu liminar, mas que ainda não teve julgamento de mérito, fls. 118/123 e 129/133.

Neste último caso, faz-se urgente a ação estatal para estancaro crescente estado de parcelamento de solo lá verificado. É que, comopode ser observado no mapa da Colônia Agrícola do Sucupira, osloteamentos irregulares estão avançando em direção ao córrego doRiacho Fundo, localizado na Bacia do Lago Paranoá. Caso esseprocesso de loteamento irregular não seja estancado imediatamente,pode comprometer a qualidade desse manancial, fls. 25 e 94.

Cabe aqui ressaltar que há, inclusive, anúncios de venda delotes irregularmente parcelados e casas irregularmente edificadastanto no próprio local dos lotes e edificações quanto em classificadosde jornal local, fls. 74, 88 e 174.

Quanto à liminar concedida no Processo nº 2002.01.1.114157-8, a TERRACAP pode, se ainda não o fez, promover o recursoadequado para cassá-la, a exemplo do que foi feito no Processo nº2002.01.1.114194-7.

É que no já citado Processo nº 720/20003, no que tange aoloteamento irregular verificado na Colônia Agrícola do Sucupira, tem-se notícia que a TERRACAP apenas ajuizou ação reivindicatória noque concerne à chácara nº 16, quando se sabe que há parcelamentoirregular de solo nas chácaras de nos 05, 07, 09, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19 e 20.

Ademais, não se tem notícia de outras reivindicatóriasajuizadas pela TERRACAP, quando se sabe que há mácula deirregularidade sobre todas as chácaras dessa colônia agrícola, vezque as concessões de uso outorgadas pela Resolução nº 173 da extintaFundação Zoobotânica foram anuladas por decisão do Secretário deAgricultura e Abastecimento.

3 Processo nº 720/2000, Anexo III, fls. 101/108, Ação Reivindicatória nº 2003.01.1.048123-3.

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O loteamento que se verifica nas chácaras de nos 05, 07, 09, 11, 13,14, 15, 16, 17, 18, 19 e 20 da Colônia Agrícola de Sucupira, viola o PlanoDiretor de Ordenamento Territorial – PDOT, LC nº 17/97, nos arts. 25, §1º, III c/c § 2º, I e 26.

Além disso, esse parcelamento irregular consubstancia os crimesprevistos nos arts. 50 e 51 da Lei nº 6.766/79.

Dessa forma, deve ser informado o Ministério Público doDistrito Federal e Territórios acerca do parcelamento irregular desolo que ocorre na área rural do Riacho Fundo para que tome asmedidas que achar cabíveis.

Quanto à alegação de omissão na fiscalização em face doparcelamento irregular de solo que se verifica na área ruraldo Riacho Fundo, aduzida pelo o Fiscal de AtividadesUrbanas do Riacho Findo I, contra o então Chefe do Serviço deFiscalização da Zona Rural do Riacho Fundo, temos que, aprincípio, procede em parte.

Em primeiro lugar, deve-se ressaltar que a Regional do RiachoFundo relata que “A Fiscalização desta Administração mantém-se vigilante, sempre atuando na área (cópias das notificações eembargos anexas, docs. 04 a 15)”, fl. 31. (grifo nosso).

Além disso, a representação fala em omissão no período dedezembro de 2002 até 09/01/2004, antes de o representado ter sidoafastado do cargo.

Nesse período, entretanto, verificamos que algumas açõesforam tomadas pelo representado, como, p.ex., autos de embargo eofício encaminhado à DRFOP, fls. 51/54 e 58.

Ademais disso, entre junho de 2000 e outubro de 2002, váriasações foram tomadas, tais como notificações, autos de embargo erelatórios de ação, aparentemente durante a chefia do representado,fls. 34/50 e 55/57.

Não obstante, essas ações não foram suficientes, tendo emvista o avançado estado de parcelamento irregular que se verifica emalguns lotes, identificados em parágrafos anteriores, da ColôniaAgrícola de Sucupira.

É bem verdade que os ocupantes buscaram proteçãopossessória no Judiciário, tendo êxito em alguns casos, o que, decerto modo, deve ter dificultado o poder de polícia da administração.

Há, ainda, a correspondência da União, equivocadamenteinterpretada pela Administração Regional do Riacho Fundo, poisdelimitava as chácaras pertencentes à União e as pertencentes àTerracap, sendo que estas últimas não dependem de autorização préviada União para as ações de demolição, como quis dar a entender aresposta da Administração Regional à Nota de Inspeção nº 001/2004

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deste corpo técnico, exceto, é claro, os lotes sob proteção possessória, fl.23, 63 e 66.

Além disso, o parcelamento irregular do solo rural da ColôniaAgrícola do Sucupira continua a ocorrer até os dias de hoje, como foicomprovado in loco pela equipe de inspeção desta Casa, ou seja, já sob afiscalização do autor desta representação.

Dessa forma, devem ser ouvidos o representado acerca de sua alegadaomissão enquanto esteve à frente do Núcleo de Fiscalização do RiachoFundo, mas também o representante, responsável pela fiscalização daColônia Agrícola de Sucupira, tendo em vista o avanço dos parcelamentosirregulares continuarem a ocorrer até os dias atuais, ou seja, quando aresponsabilidade pela fiscalização ficou ao seu encargo.

Cabe, ainda, frisar que embora a situação de irregularidade naconcessão de uso da área rural da Colônia Agrícola de Sucupira tenha sidotratada até agora no Processo nº 720/2000, a inspeção levada a efeito nestesautos, para averiguar o parcelamento irregular de solo lá verificada, emmuito ultrapassou as informações lá colhidas, inclusive porque aqueleprocesso trata apenas da irregularidade da concessão de uso daquela e deoutras áreas no Distrito Federal, enquanto o objeto deste Processo tornou-se mais amplo, o que nos leva a indagar se não será mais efetivo para estaCorte que a situação específica da Colônia Agrícola de Sucupira, incluindoa irregularidade na concessão e o parcelamento irregular do solo ficasse soba responsabilidade desta 1ª ICE, até porqueocorre na área rural do RiachoFundo, Jurisdicionada desta Inspetoria.

Por fim, não há por que persistir o caráter sigiloso atribuídoinicialmente ao processo, a uma porque o parcelamento irregularque ocorre na área rural do Riacho Fundo, como demonstrado emparágrafos anteriores, é de conhecimento da Administração doDistrito Federal, a duas porque o parcelamento irregular lá verificadoconstitui crime previsto na Lei nº 6.766/79, não devendo esta Cortecolocar óbice à divulgação deste fato.Em parecer do Procurador Inácio Magalhães Filho, o Ministério

Público manifestou-se pelo acolhimento das sugestões da instrução.Os autos vieram ao meu Gabinete em razão do afastamento

legal do relator original.É o relatório.

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VOTO

Em princípio, na forma que vinha atuando a Corte, o presente casose enquadrava na medida preconizada no 41, § 2º, da Lei Complementar nº01/94, com vistas ao encaminhamento prévio do resultado da inspeçãoaos órgãos incumbidos do saneamento das falhas verificadas. Entretanto,convém assinalar o novel entendimento do Plenário com relação ao citadodispositivo, por meio da Decisão nº 70/2005 (Processo nº 2.532/04), nosentido “de que a aplicação do disposto no art. 41, § 2º, da Lei Complementarnº 01/94 enseja a deliberação do Tribunal, sobre o mérito das sugestõesapresentadas em relatório de auditoria ou inspeção, previamente à remessaao órgão ou entidade auditado;”.

Isto posto, verifiquei que mediante Decisão nº 2.899/04, o Tribunaldeterminou o arquivamento do Processo nº 1.862/03, autuado para examinara constitucionalidade da Lei Complementar distrital nº 678, de 27 dedezembro de 2002. Reconheceu, assim, a aplicabilidade das normas exaradaspela referida LC, de repercussão na atuação desta Corte de Contas.

Eis alguns dispositivos de interesse do Tribunal de Contas constantesda referida LC nº 678/02:

Art. 1° Constitui infração administrativa, independente desanções penais e/ou cíveis, iniciar, dar continuidade, ou efetuarloteamento no solo do Distrito Federal sem autorização do órgãodistrital competente, ficando o infrator sujeito a multa de 10% (dezpor cento) do valor do imóvel.

(...)§ 3° Sendo o imóvel de propriedade da TERRACAP, a

multa cominada ao infrator será de 20% (vinte por cento) sobreo valor do imóvel.

(...)§ 5° Se o infrator for servidor público da administração direta

ou indireta do Distrito Federal a ação constitui falta grave, sujeita àdemissão, a bem do serviço público.

Art. 2° Incorre nas mesmas penas previstas no artigo anteriora autoridade distrital que:

I - autorizar o parcelamento do solo sem a observânciadas exigências legais ou em desacordo com as recomendaçõestécnicas pertinentes;

II - deixar de aplicar as sanções previstas nesta Lei;

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III - deixar de adotar as providências cabíveis previstas nalegislação para impedir a continuidade de parcelamento com indíciosde irregularidades;

IV - não promover a interdição do parcelamento irregular do solo,quando constatada a irregularidade;

V - dificultar, impedir, retardar ou inibir, por qualquer meio, a açãofiscalizatória dos agentes públicos competentes;

VI - relevar sanção aplicável por descumprimento aospreceitos desta Lei.

(...)Art. 4° As sanções serão aplicadas:(...)IV - no caso do art. 2°, pelo Tribunal de Contas do

Distrito Federal.Art. 5° Diante da comprovada omissão das autoridades

competentes na observância dos preceitos desta Lei e sem prejuízo dainiciativa popular, o agente público encarregado da fiscalização tem odever de representar ao Tribunal de Contas do Distrito Federal.

§ 1° É nulo, por desvio de finalidade, o ato administrativoque, motivado exclusivamente pela subscrição da representação previstaneste artigo, afastar o servidor público de suas funções fiscalizadorasou removê-lo para órgão diverso de onde exerce suas funções.

§ 2° A representação manifestamente infundada sujeita oservidor responsável às sanções previstas no Regime Jurídico aele aplicável.

Art. 6° Diante de indícios de irregularidade no parcelamentodo solo, veiculados pela imprensa, contidos em representação oucomunicados formalmente, o Tribunal de Contas do Distrito Federalabrirá procedimento específico para acompanhamento e verificaçãodo cumprimento das disposições desta Lei.

Art. 7° Serão obrigatoriamente publicados no Diário Oficialdo Distrito Federal, para conhecimento da população, do Tribunalde Contas do Distrito Federal, do Ministério Público do DistritoFederal e Territórios e da Câmara Legislativa do Distrito Federal,os atos administrativos que reconhecerem a existência deparcelamento irregular.

§ 1° O ato administrativo a ser publicado no Diário Oficialdo Distrito Federal deverá conter pelo menos os elementosnecessários à identificação do parcelamento irregular, os motivosda declaração de irregularidade e as medidas adotadas pelasautoridades competentes.

§ 2° O descumprimento do disposto neste artigo sujeita oresponsável à multa a ser aplicada pelo Tribunal de Contas do

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Distrito Federal nas mesmas condições do art. 57 da Lei Complementar n°01, de 09 de maio de 1994.

(...)Diante disso, os servidores indicados pelo órgão instrutivo podem

ser enquadrados nos incisos III e IV do art. 2º da LC nº 678/02, conformeapurado em inspeção, devendo a Corte solicitar à TERRACAP laudo deavaliação das chácaras irregularmente parceladas, para efeito da aplicaçãoda multa prevista no § 3º do art. 1º, haja vista o disposto no art. 4º, IV.

É preciso verificar, ademais, se foi publicado o ato administrativo aque se refere o art. 7º da norma supra transcrita.

No mais, diante da evidência de irregularidade, concordo com oencaminhamento de cópia dos autos ao MPDFT, sem prejuízo doprosseguimento da apuração de responsabilidades no âmbito deste Tribunalde Contas.

Convém consignar que, na forma prevista no termo de distribuiçãode fl. 208, estes autos deverão ser remetidos, no momento oportuno, aorelator original, ilustre Conselheiro Jacoby Fernandes.

Feitas essas considerações, alicerçada nos elementos trazidos à colaçãopela equipe de apoio técnico, mediante inspeção, ponho-me de acordo coma instrução e com o Ministério Público, com acréscimos que faço, e votopor que o Plenário:

I – tome conhecimento:a) os resultados da presente inspeção;b) da diligência saneadora nº 11/2004-DS-1ªICE, fl. 134;c) dos Ofícios nos. 558 e 591/2004 – GAB/RA-XVII e 89/2004/

DAO, fls. 22/23, 97/98, 135, e documentos que osacompanham, fls. 24/69, 99/108, 136/173;

d) demais documentos de fls. 109/117, 129/133, 174;II – determine:

a) à Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimentojuntamente com a Secretaria de Estado de Fiscalização deAtividades Urbanas – SEFAU, por meio da SIV-SOLO, quepromovam, o mais rápido possível, o estancamento doparcelamento irregular de solo rural que se verifica de formacrescente nas chácaras de nos. 05, 07, 09, 11, 13, 14, 15, 16, 17,

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18, 19 e 20, tomando as medidas necessárias para restabelecero status quo ante, ressalvado os lotes porventura protegidospor medida judicial, a exemplo da Ação de InterditoProibitório distribuída à 4ª Vara de Fazenda Pública doDF, Processo nº 2002.01.1.114157-8, caso ainda não tenhasido julgado o mérito da questão, encaminhando aoTribunal, no prazo de 60 (sessenta) dias relatóriocircunstanciado das medidas adotadas, acompanhado dacorrespondente documentação probatória;

b) tendo em vista possível ocorrência da omissão capituladanos incisos III e IV do art. 2º da Lei Complementar nº678/02, que sujeita os responsáveis à multa prevista no §3º do art. 1º da mesma norma, a audiência das pessoasindicadas nos itens II.c.1 e II.c.2 das sugestões da instrução,fls. 187, para, no prazo de trinta dias, apresentarem suasrazões de justificativas;

c) à TERRACAP que:c.1) caso ainda não o tenha feito, promova o recurso cabível para

cassar a liminar concedida no Processo nº 2002.01.1.114157-8, como, aliás, ocorreu no Processo nº 2002.01.1.114194-7;

c.2) promova as ações reivindicatórias que se fizerem necessáriasem virtude da anulação das concessões de uso feita pelaResolução nº 173 da extinta Fundação Zoobotânica;

c.3) encaminhe a esta Corte, no prazo de 30 (trinta) dias, laudode avaliação das chácaras irregularmente parceladas naColônia Agrícola de Sucupira;

III – autorize:a) o encaminhamento de cópia dos autos ao Ministério Público

do Distrito Federal e Territórios, sem prejuízo doprosseguimento das apurações de responsabilidade noâmbito deste TCDF;

b) o encaminhamento, juntamente com a decisão que vier a seradotada, de cópia da instrução, do parecer do MinistérioPúblico e do presente relatório/voto à TERRACAP e às

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Secretarias de Estado de Agricultura, Pecuária eAbastecimento e de Fiscalização de Atividades Urbanas parasubsidiar o cumprimento das diligências estabelecidas, bemassim para as pessoas chamadas em audiência;

c) a comunicação ao autor da Representação que deu origemaos presentes autos;

d) seja retirado o caráter sigiloso dos autos, na forma do § 1º doart. 54 da LC nº 01/94;

e) que a situação específica da Colônia Agrícola passe a serconduzida no presente feito, disso dando ciência às 2ª e 3ª ICE’S;

f) o retorno dos autos à 1ª ICE para as providências de sua alçadae para que verifique se foi efetuada a publicação referida noart. 7º da Lei Complementar nº 678/02.

Processo nº 1.225/2004*

*Ver Decisão nº 2.406/2005

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UNIFORMIZAÇÃO DE PROCEDIMENTOS -INCORPORAÇÃO DE VANTAGENS DECORRENTES DE

CARGOS/FUNÇÕES COMISSIONADOS EXERCIDOS NA

ESFERA DISTRITAL PELOS SERVIDORES EFETIVOS

DOS ÓRGÃOS DO COMPLEXO ADMINISTRATIVO DO

DISTRITO FEDERAL

Representação nº 02/04- GAB 4ª ICE, acerca doprocedimento de incorporação de cargos/funções exercidos porservidores da esfera distrital, no âmbito dos órgãos do PoderExecutivo, CLDF e TCDF. Cargo efetivamente exercido. Matériasuscitada no Processo nº 8139/96. Precedentes judiciais. Instruçãoe MP: entendimento de que a incorporação, integralização esubstituição de parcelas se dê com base no cargo efetivamenteexercido, respeitada a legislação que rege a matéria. Concordância.Pedido de Vista (PG Márcia Farias): transformação em VPNI.Manutenção do voto anterior.

RELATÓRIO

Cuidam os autos da Representação nº 002/2004-GAB/4ªICE, elaborada nos termos do art. 39, inciso VIII, da Resolução TCDFnº 10/86, mediante a qual a ilustre titular daquela unidade técnica solicitaa uniformização de procedimentos acerca da incorporação de vantagensdecorrentes de cargos/funções comissionados exercidos na esfera distritalpelos servidores efetivos dos órgãos do complexo administrativo doDistrito Federal.

2. Argumenta que a incorporação pelo exercício de cargos/funçõesem órgãos distintos daquele no qual o servidor detém cargo efetivo contempladuas hipóteses: a) quando exercido em Unidade distinta da Federação, aindana vigência da Lei nº 1.711/52 no DF; b) quando exercido em diferentesunidades do próprio DF (Poderes Executivo, Legislativo e TCDF).

3. A respeito da incorporação de cargos/funções de outraUnidade da Federação, a signatária da representação retrata a evoluçãodo entendimento do Tribunal sobre a matéria (Decisões nº 7.172/93,

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1 Decisão nº 3.366/04:... IV - firmar o entendimento de que: a) o marco estabelecido na Decisão nº 13.170/95(09/12/93) deve ser observado na realização do novo procedimento previsto na Decisão nº4.626/03 (incorporação do cargo ou função em comissão que efetivamente tenha sido exercidopelo servidor, com caráter de vantagem pessoal, sujeita tão-somente aos reajustes geraisconcedidos aos servidores do Distrito Federal); b) nos casos de incorporação, integralização esubstituição de parcelas posteriores a 09/12/93, a transformação das parcelas (originadas doexercício de cargos em comissão/funções de confiança na esfera federal) em VPNI deve retroagira essa data, embora a percepção dos valores a elas correspondentes só ocorra a contar da vigênciada revisão; V - dispensar o ressarcimento ao erário das quantias porventura recebidas a mais porestar caracterizado o erro de interpretação de norma previsto na Súmula nº 79-TCDF; VI - darciência às jurisdicionadas do entendimento firmado nos autos em exame.

1.3170/95, 5.194/96, 3.395/99, 2.000/03, 4.626/03. Por fim, esclareceque o entendimento foi pacificado, nos termos da Decisão nº 3.366/041

(Processo nº 1.437/81), restando esclarecidos o critério e a forma daincorporação dos cargos/funções exercidos.

4. A mesma representante observa que a controvérsia se instalou,ao se tentar compatibilizar os vetores constitucionais da autonomia político-administrativa do DF (princípio federativo) e as garantias do direito adquiridoe da irredutibilidade salarial.

5. Em seguida, deixando bem delineada a distinção entre as duashipóteses aventadas no parágrafo segundo, transcreve trecho do Voto deVista por mim apresentado no Processo nº 8.139/96, que trata de exercício,por servidor do Poder Executivo, de cargo em comissão da estrutura daCLDF, in verbis:

14. O presente caso envolve a incorporação de quintos decargo exercido na Câmara Legislativa do DF, no período de 03/05/91a 31.12.94 (fl. 07-apenso), por servidor do Poder Executivo distrital,na proporção de 4/5 do CL-14 (fls 92, 94 e 114-apenso). Ponho-mea discutir específica questão, em que pese constar da Decisão nº7.172/93, pioneira sobre a correlação de cargos, e do voto condutordo atual entendimento sobre o tema (Decisão nº 4.626/03), quesua abrangência se estenderia aos cargos/funções exercidos pelosservidores do Executivo, quando cedidos ao Legislativo Distrital.

... omissis ...17. A Lei federal nº 8.911/94, regulamentando o art. 62 da

Lei nº 8.112/90, além de instituir os chamados “quintos”, disciplinoua forma de tratamento a ser dado aos cargos comissionados exercidosfora do âmbito do Poder Executivo federal, verbis:

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Art. 10. É devida aos servidores efetivos da União, das autarquias edas fundações públicas, regidos pela Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de1990, cedidos, por afastamento, para exercício em órgão ou entidade domesmo Poder ou de outro Poder da União, a incorporação de quintosdecorrentes do exercício de cargo em comissão e de função de direção,chefia e assessoramento.

§ 1º A incorporação das parcelas remuneratórias, autorizadaneste artigo, será efetivada com base no nível do cargo emcomissão ou função de direção, chefia e assessoramentoequivalente no Poder cedente do funcionário.

§ 2º Será admitida a conversão dos quintos incorporados, porparcelas equivalentes, nas seguintes situações:

I - quando ocorrer transformação do cargo ou funçãooriginária da incorporação efetivada; ou

II - quando acontecer mudança de cargo efetivo, medianteprovimento efetivo, para Poder distinto do originário daincorporação efetuada.

§ 3º A conversão prevista no parágrafo anterior não se aplicaao servidor aposentado que tenha passado para a inatividade coma incorporação de quintos efetivada. (grifei)

18. Considerando o entendimento dado à época peloSupremo Tribunal Federal, no sentido de que não poderia haverrecepção automática de legislação federal, sob pena de ferir de mortea autonomia do DF, a CLDF legislou no sentido de recepcionar aLei federal nº 8.911, de 11/07/94, já utilizada na prática no âmbitodistrital, reconhecendo os critérios estabelecidos na redação originaldo citado diploma legal a contar de sua edição (art. 6º da Lei nº1004/96). Dispôs, ainda, o legislador distrital que: “Art 11 - Odisposto nesta Lei aplica-se, no que couber, aos servidores cedidospara a Câmara Legislativa do Distrito Federal e para o Tribunal deContas do Distrito Federal, respeitada a reciprocidade. (grifei).

19. Como se pode observar, pelo demonstrativo extraídodo Diário da Câmara Legislativa de 09/08/96 (pg. 12), a CLDFaplica, para fins de incorporação de quintos, o cargo de origem doPoder Executivo distrital, mais precisamente, naquele caso, “2/10(dois décimos) do DF-07 do GDF e 2/10 (dois décimos) do DF-08do GDF”. Referida concessão de aposentadoria está sendo apreciadano Processo nº 7.445/96, aguardando, pelo que se tem notícia, apacificação sobre o instituto da correlação de cargos.

20. Reciprocamente, nos presentes autos, o servidor obtevea concessão, pela Secretaria de Educação, de incorporação na proporçãode 4/5 (8/10) do CL-14 e 1/5 (2/10) do DF-11 (fls 92, 94 e 114-apenso).

21. Em termos distritais, a Lei nº 1.004/96 veio regular odisposto no artigo 62 da Lei nº 8.112/90 (Leis DF nºs 197/91 e

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211/91 e Resolução nº 035/91-CLDF), e como tal foi aplicada no âmbitodo Executivo, CLDF e nesse Tribunal de Contas.

... omissis ...23. Nesse sentido, concluo que a equivalência de cargos

erigida pelo art. 10 da Lei federal nº 8.911/94, recepcionada nostermos do art. 6º da Lei nº 1.004/96, que regulou, em termos distritais,a incorporação de cargo/função prevista no art. 62 da Lei nº 8.112/90 (Lei DF 197/91, 211/91 e Resolução CLDF nº 035/91), éfundamento legal para as concessões do gênero, salvo aplicaçãoefetiva da reciprocidade aventada pelo art. 11 da citada norma distrital,até o advento da Lei DF nº 1.864/98 (art. 4º) que extinguiu o benefício.

24. Em sendo assim, diferenciando a hipótese dos autosdo entendimento aplicável à incorporação de cargo/função da esferafederal, admitida enquanto vigorava a Lei nº 1.711/52 no DF (Decisãonº 4.626/03), e considerando que tanto a Secretaria de Educação nopresente processo (incorporação do CL-14) quanto a CLDF(incorporação do DF-07 e DF-08 do GDF) primaram pela obediênciaao Regime Jurídico Único e ao princípio da reciprocidade estatuídopelo art. 11 da Lei nº 1004, de 09/01/96, considero satisfatoriamenteresolvida a questão na forma levada a efeito pela Administração,constante do ato de aposentadoria, de 25/01/96, e do abono provisório(fls. 22/27, 103 e 114-apenso). (destacou-se)

6. Em conclusão, assevera que não se confundem a hipótese deincorporação de cargo/função de confiança exercido na Administração Direta,Autárquica e Fundacional do DF, bem como na Câmara Legislativa e Tribunalde Contas, com o exercício das mesmas funções em outra Unidade daFederação, assunto este último tratado nas Decisões nºs 4.626/03 e 3366/04.Conforme afirma “não há porque cogitar em preservação da autonomiapolítico-administrativa, o que é imprescindível em se tratando de entefederativo diverso do DF. Respaldado também, consoante demonstrado nojudicioso voto de vista retrocitado, o aspecto da legalidade, uma vez que alegislação de regência é clara nesse sentido”.

7. Traz, em reforço à tese esposada na representação, entendimentodo Tribunal de Justiça do DF (v.g. MSG nº 7348/97 - Desembargador LécioRezende2 , MSG nº 1999.002000865-4 - Desembargador Estevam Maia3 )

2 ( ... ) A incorporação de vantagem em razão do exercício de um cargo ou função em comissão, devedar-se em razão do cargo ou função que exerce ou tenha exercido o servidor.Se um servidor exerce cargo ou função em comissão no Executivo, esse cargo ou função temuma denominação, atribuições e remuneração próprios, e é com base no seu exercício queserá estabelecida a incorporação.O que não pode o Executivo é intervir no Legislativo, como o fez, por Decreto, para ditar

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8. No mesmo sentido, colaciona entendimento do SupremoTribunal Federal (MS 22736-24 e 22735/DF5).

normas, estabelecendo analogia onde esta não é possível, muito menos pretendendo equipararcargos e funções comissionados, com nomenclaturas, atribuições e formas de remuneraçãoque não encontram correspondência com aqueles destinados ao atendimento dos Órgãosdo Executivo.Assim, a vantagem dos denominados ‘quintos’ ou ‘décimos’ é incorporada conforme ocargo ou função comissionados que o servidor venha a exercer, no Órgão pertencente aoPoder para o qual foi convocado a servir.( ... ).Além disso, tem a Impetrante o direito de incorporar a vantagem, e de substituí-la, segundo onível de cada cargo ou função comissionados que exerça, desde que satisfeitos os requisitoslegais. (grifou-se)3 ( ... )O direito à incorporação da vantagem cogitada foi obtido pelo impetrante de acordo com atabela da Estrutura Administrativa da Câmara Legislativa, de sorte que, incorporado ao seupatrimônio, não mais poderia ser suprimida, tanto mais por norma ilegal, inidônea.E mais. Consoante a regra inscrita no art. 62 da Lei 8.112/90, aplicável aos servidores distritaispor força do disposto no art. 5º da Lei 197, de 1991, a gratificação incorporável se relaciona,diretamente, com exercício da função gratificada, inexistindo lei que determine correlaçãoentre as diversas esferas de poder.Logo, pretender-se que os cargos da estrutura do Poder Legislativo devam corresponder aos daestrutura do Poder Executivo, é o mesmo que invadir a competência exclusiva daquele, o quenão se mostra admissível, pena de ofensa ao art. 60, inciso V, da Lei Orgânica do DistritoFederal.” (grifou-se).4 CÂMARA DOS DEPUTADOS. RESOLUÇÃO Nº 70/94, 7º, PARÁGRAFO ÚNICO.SERVIDOR AFASTADO PARA SERVIR EM OUTROS ÓRGÃOS E ENTES DAADMINISTRAÇÃO FEDERAL, ONDE EXERCEU FUNÇÕES COMISSIONADAS.PRETENDIDA INCORPORAÇÃO DOS “QUINTOS”, HOJE “DÉCIMOS”; COM BASENA REMUNERAÇÃO DE FUNÇÕES EQUIVALENTES CONSTANTES DO QUADRODE PESSOAL DA CASA LEGISLATIVAPretensão que não tem respaldo nas leis disciplinadores da espécie, onde prevê que a referida vantagemfuncional será calculada sobre a remuneração da função comissionada efetivamente exercida,como disposto na Lei nº 8.112/90, art. 62, 2º, na Lei nº 8.911/94, art. 3º e na MP nº 1.480-28/97, art.1º, normas insuscetíveis de ser modificadas por meio de resolução legislativa. Mandado de segurançaindeferido” MS 22735/DF, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 06/02/98“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. QUINTOS OUDÉCIMOS: INCORPORAÇÃO. SERVIDOR DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. LEI Nº8.112/90, ART. 62; LEI Nº 8.911/94, ART. 3º; MP Nº 1.480-28/97, ART. 1º.1 - Servidor afastado para servir em outros órgãos, onde exerceu funções comissionada: pretensãode incorporação dos ‘quintos ou décimos’, com base na remuneração de funções equivalentes doquadro de pessoal da Câmara: pretensão que não encontra amparo na lei: a mencionada vantagemfuncional deverá ser calculada sobre a remuneração da função comissionada efetivamente exercida:Lei nº 8.112/90, art. 62; Lei nº 8.911/94, art. 3º; MP nº 1.480-28/97, art. 1º.2 - Precedente do STF: MS 22.735-DF, Galvão, Plenário, 24/09/97.3 - Mandado de Segurança indeferido (MS 22736-2, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ06/02/98)(Grifos são do original)

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9. Conforme afirma:... sendo os cargos/funções comissionados exercidos no

mesmo âmbito governamental, a incorporação da vantagem“quintos” ou “décimos” por esse exercício deve se dar em razão docargo/função efet ivamente exercido, despicienda a suatransformação em Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada-VPNI. É o que deflui do voto lavrado pela insigne ConselheiraMarli Vinhadeli e da jurisprudência ora apresentada.

10. Registra, por último, que a presente representação não enfocoua incorporação das vantagens quintos/décimos em razão do exercício deemprego em comissão na Administração Indireta, tolerada pelo Tribunalaté 19/01/95 (Decisão Normativa nº 01, de 31/05/95), pois o assunto estásendo analisado na Representação oferecida pelo Ministério Público, deautoria do Procurador Inácio Magalhães Filho (Processo nº 2.535/04), aindasem decisão de mérito.

11. Nestes termos sugere que o Tribunal, ao tomar conhecimentoda Representação em tela, estabeleça entendimento no sentido de que aincorporação, integralização e substituição de parcelas decorrentes doexercício de cargos/funções comissionadas na Administração Direta,Autárquica e Fundacional do DF, bem como na CLDF e no TCDF se dêcom base no valor do cargo/função efetivamente exercido pelo servidor,respeitada a legislação que rege a matéria. Adicionalmente, pugna peladispensa de ressarcimento ao erário das quantias porventura pagas a maior,tendo em conta configurar-se erro de interpretação da norma (Enunciadode Súmula TCDF nº 79), autorizando-se o arquivamento dos autos.

5 Como se vê, pois, só existe autorização legal para que seja incorporada à remuneração doservidor a importância equivalente à fração da gratificação do cargo ou função PARA OQUAL FOI DESIGNADO OU NOMEADO e, não, de gratificação de cargo ou função paraa qual NÃO foi designado ou nomeado.Ora, o que o Impetrante pretende, inequivocamente, é ver incorporada, à sua remuneração,importância equivalente a fração de gratificação de cargo ou função para a qual NÃO foi,jamais, designado ou nomeado (...).Quer, em verdade, que se opere a TRANSFORMAÇÃO da gratificação incorporada, de sor-te a que o seu importe passe a corresponder não mais àquele estabelecido para o cargo oufunção para o qual FOI, efetivamente, designado ou nomeado, mas sim, àquele previsto paracargos ou funções que pretende lhes sejam ASSEMELHADOS, mas para os quais nunca foidesignado ou nomeado.O princípio da LEGALIDADE, a que a Administração Pública se sujeita, por força do dispostono art. 37, caput, da Constituição Federal, impede seja acolhida a pretensão do Impetrante”(grifo do original).

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12. O Ministério Público, representado pelo Procurador InácioMagalhães Filho, endossa as conclusões ofertadas pela instrução, argumentando:

5. Afirma a Inspetoria que, quando da análise daincorporação de vantagens de outra esfera de governo, havia anecessidade de se compatibilizar os vetores constitucionais daautonomia político-administrativa do Distrito Federal (princípiofederativo), pelo lado da Administração, com as garantias do direitoadquirido, por parte dos servidores.

6. Entretanto, no caso ora apreciado, não há que falar empreservar a autonomia distrital, eis que os cargos/funções não sãoderivados de outra esfera governamental. Assim posiciona-se a Inspetoria:

... omissis ...7. Esse órgão ministerial sempre teve a preocupação de

harmonizar o entendimento da Corte sobre o tema. Tanto assim,que ofereceu a Representação nº 006/04, com o fito de amparar aincorporação de vantagens advindas da Administração Indireta. Nocaso presente, mister se faz preservar os dois eixos principais queculminaram com posição ora adotada pela Corte, no que tange aessa matéria: preservar a autonomia política do Distrito Federal(corolário natural do princípio federativo), ao mesmo tempo em queconsidere o direito adquirido pelos servidores (preceito também deestatura constitucional).

8. No que tange à primeira condição, não há que falarem qualquer perda de autonomia, porquanto os cargos/funções aserem incorporados não refogem da órbita distrital. Não há conflitocom qualquer outro ente federado. Não há, pois, desrespeito aoprincípio federativo. Assim, realmente, não há necessidade detransformação das parcelas de “quintos/décimos” em VantagemPessoal Nominalmente Identificada - VPNI, eis que os cargos/funções a serem incorporados pertencem à estrutura do DistritoFederal, não ocorrendo hipótese de intromissão alienígena naadministração de tais cargos ou funções.

9. Quanto ao segundo critério, o direito do servidor estarápreservado, no momento em que a incorporação se dê com base novalor do cargo/função efetivamente exercido. Tal posicionamentoencontra, inclusive, guarida no entendimento do Supremo TribunalFederal, conforme mencionado pela Inspetoria.”.

13. Na Sessão de 29/03/05, apresentei voto pela adoção dosprocedimentos aventados pela instrução e Ministério Público, ocasião emque pediu vista dos autos a Procuradora-Geral Márcia Farias (Decisão nº897/05, fl. 31).

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14. Mediante Parecer nº 241/05-MF (fls. 32/36), a nobreProcuradora-Geral expõe seu entendimento nos seguintes termos:

11. Registro, inicialmente, que o trabalho feito por todosno processo é impecável. Sem embargo, não tenho a interpretaçãoabordada como a única possível.

12. Com efeito, a incorporação do valor do cargo ou funçãoem comissão efetivamente exercido é perfeitamente plausível àespécie, tal qual para cargos/funções de outra esfera de governo. Damesma forma, aquiesço à conclusão de que não há falar em perda deautonomia do ente federativo, uma vez que os cargos/funçõesincorporados encontram-se no âmbito distrital.

13. Por outro lado, além do aspecto da preservação daautonomia político-administrativa, suscitado no feito como basemestra para a incorporação naqueles moldes, outros vetoresconstitucionais deverão orientar a solução da controvérsia.

14. Nesse particular, ressai atentar que um Poder não deve,a princípio, onerar outro. Seria o caso, por exemplo, de o Executivoser compelido a remanejar recursos orçamentários específicos aopagamento de vantagens incorporadas por seus servidores peloexercício de cargos comissionados no âmbito do Legislativo, emvirtude de este último, exercendo suas prerrogativas institucionais,haver promovido alterações na estrutura constitutiva dos aludidoscargos. Assim como há autonomia do ente federado, há independênciaentre os poderes constituídos, inclusive financeira/orçamentária.

15. Mister considerar em rápida digressão que, no Estadode Direito, prevalece a ótica segundo a qual, não obstanteconstitucionais, inexistem princípios absolutos. A doutrina majoritáriaperfilha entendimento no sentido de que se deve, em cada caso, buscarharmonizá-los, para se encontrar a melhor solução, vicejando semprea razoabilidade e a proporcionalidade da medida. Nessa linha, ésempre valiosa a lição de Carlos Maximiliano, no sentido de que“não se encontra um princípio isolado em ciência alguma; acha-seem conexão íntima com outros”.6

16. Noutro aspecto, vejo com certa reserva a jurisprudênciaapontada pela 4ª ICE como a indicar precisamente a posição por elaabraçada. Observe-se, a propósito, que o trecho mencionado peloparecer do Dr. Jacoby Fernandes, à fl. 5, permite chegar a conclusãocontrária (em realidade, o tema versado no mandamus citado refere-se a hipótese ocorrida no âmbito federal, entre poderes diversos).

6 Hermenêutica e Aplicação do Direito . 18. ed. Revista Forense, p. 128.

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17. Dessa forma, o que não se admitiria na espécie seria aintervenção de um Poder em outro, tal qual, por exemplo, o que severificaria com a equiparação/correlação de cargos ou funçõescomissionados entre órgãos/entidades de poderes distintos, comobem se pode extrair do entendimento consignado na açãomandamental mencionada à fl. 8 (MSG nº 7348/97 - TJDFT).

18. Decerto, a orientação que se pretende propugnar comoalternativa não comporta esse procedimento. Ao revés, empenha-seem preservar o exato valor incorporado originalmente, como vantagempessoal, atendidos os requisitos legais então vigentes, conformeentendimento já externado por este órgão ministerial em diversasoportunidades. Nada obstante, a atualização da vantagem incorporada,esta sim, estaria imune às alterações supervenientes engendradas poratos normativos do Poder para o qual encontrava-se cedido ourequisitado o servidor beneficiário, a qual sujeitar-se-ia aos reajustessalariais, de caráter geral, definidos pelo DF para seus servidores.

19. O critério tal qual acima informado harmoniza-se como preconizado pela Decisão nº 4.626/03, denotando-se, a meu sentir,mais justo, razoável e consentâneo com o propósito da legislação deregência aplicável no âmbito do Poder Executivo distrital, CLDF edo Tribunal de Contas (Lei DF nº 1.004/96, regulando o dispostono art. 62 da Lei nº 8.112/90), traduzido, vale dizer, na preservaçãodo quantum financeiro incorporado. Sua incidência, enfim, mereceser considerada na hipótese vertente, tanto em observância aoprincípio da separação de poderes quanto ao da legalidade.

20. São essas as breves considerações que havia aexpender em colaboração ao debate da matéria que, a despeito detodos os pronunciamentos convergentes constantes do feito, nãome parece inconteste.

É o parecer15. É o relatório.

VOTO

16. Na Sessão de 29/03/05, registrei que o entendimentoconsubstanciado na Decisão nº 3.366/04, está a merecer novos exames emfunção da Representação nº 001/05, de autoria do Consº. Jorge Caetano(Processo nº 7.679/05), especificamente visando à aplicação das Decisõesnºs 2.000/03, 4.626/03 e 3.366/04, no que concerne à fixação da data de09/12/93 e ao atendimento do que dispõe a Lei nº 1.004/96 (Decisões nºs320/05, 322/05 e 333/05).

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17. Frise-se que a incorporação de cargo/função da esfera federalrestringe-se a períodos anteriores à entrada em vigor da Lei nº 8.112/90, noque couber, no DF (art. 5º da Lei DF nº 197/91).

18. Independente do que vier a ser decidido no retrocitadoProcesso nº 7.679/05, certo é que nenhuma ingerência terá sobre aincorporação de quintos/décimos de cargos em comissão distritais, previstaaté sua extinção pela Lei nº 1.864/987, de que trata a presente representação.Neste caso, não há se falar da aplicação do princípio federativo e daconseqüente autonomia político-administrativa do DF, razões que dãosuporte à conversão em VPNI dos quintos/décimos incorporados de cargosem comissão oriundos de outra Unidade da Federação.

19. Ademais, conforme consignei no exame do Processo nº 8.139/96,citado pela instrução, a legislação de regência (Leis nºs 6.732/79, 1.004/96e 1.864/98), não discrimina o exercício de cargos/funções, por parte deservidor efetivo distrital, quando desempenhando suas funções no âmbitodos órgãos públicos do DF, seja Poder Executivo, Legislativo ou TCDF.

20. Assim é que a equivalência de cargos erigida pelo art. 10 da Leifederal nº 8.911/948, recepcionada nos termos do art. 6º da Lei nº 1.004/96,que regulou, em termos distritais, a incorporação de cargo/função prevista noart. 62 da Lei nº 8.112/90 (Leis DF nºs 197/91 e 211/91, e Resolução CLDFnº 035/91), é fundamento legal para as concessões do gênero, salvo aplicaçãoefetiva da reciprocidade aventada pelo art. 11 da citada norma distrital, atéo advento da Lei DF nº 1.864/98 (art. 4º9) que extinguiu o benefício.

7 Art. 3º É vedada ao servidor a incorporação de gratificação de função de direção, chefia,assessoramento, assistência ou cargo em comissão por ocasião da aposentadoria.Parágrafo único. Excetuam-se do disposto no caput as gratificações ou funções incorporadas àremuneração do servidor em data anterior à vigência desta Lei.Art. 4º Fica extinta a incorporação de décimos à remuneração dos servidores pelo exercício decargo em comissão no âmbito do Distrito Federal.8 Art. 10. É devida aos servidores efetivos da União, das autarquias e das fundações públicas,regidos pela Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, cedidos, por afastamento, para exercícioem órgão ou entidade do mesmo Poder ou de outro Poder da União, a incorporação de quintosdecorrentes do exercício de cargo em comissão e de função de direção, chefia e assessoramento.§ 1º A incorporação das parcelas remuneratórias, autorizada neste artigo, será efetivada combase no nível do cargo em comissão ou função de direção, chefia e assessoramento equivalenteno Poder cedente do funcionário.§ 2º Será admitida a conversão dos quintos incorporados, por parcelas equivalentes, nas seguin-tes situações:I - quando ocorrer transformação do cargo ou função originária da incorporação efetivada; ouII - quando acontecer mudança de cargo efetivo, mediante provimento efetivo, para Poderdistinto do originário da incorporação efetuada.

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21. Ou seja, respeitada a reciprocidade (art. 11 da Lei nº 1.004/9610), aplica-se o mesmo procedimento de incorporação de quintos/décimos dos cargos em comissão que compõem a estrutura do órgão deorigem do servidor.

22. Como ainda afirmado no Processo nº 8.139/96, conformetranscrição produzida no parágrafo quinto do presente relatório/voto, tantoa Secretaria de Educação (08/10 do CL-14/CLDF) quanto a CLDF (02/10do DF-07/GDF e 2/10 do DF-08/GDF, Processo nº 7.445/96) observamtal requisito de reciprocidade.

23. O aspecto da independência dos Poderes constituídos distritais,suscitado pela nobre Procuradora-Geral, não tem o condão, a meu ver, desuperar os dispositivos legais antes citados, ainda mais quando se constataque referidas normas foram de iniciativa regular do Executivo e aprovadaspelo Legislativo distrital.

24. A solução de se converter em VPNI as parcelas de quintos/décimos incorporados pelos servidores distritais deve ser reservada àssituações não abrangidas pela legislação pertinente, tais como as matériastratadas nos Processos nºs 7.679/05 (quintos/décimos de outra Unidade daFederação) e 2535/04 (quintos/décimos decorrentes de emprego em comissãoda Administração indireta distrital, tolerada até 19/01/95, pela DecisãoNormativa nº 01/95), sendo esta a finalidade da representação em foco.

25. Por oportuno, reitero medida tendente a comunicar oentendimento da decisão que vier a ser proferida aos demais órgãosenvolvidos, mais precisamente à Secretaria de Gestão Administrativa, comoórgão central do sistema de pessoal do Poder Executivo, bem assim àCLDF e à DGA desta Casa.

Nessas condições, tendo em conta a instrução e o parecer doProcurador Inácio Magalhães Filho, com as pequenas alterações de formaque faço, VOTO por que o Plenário:

9 Art. 4º Fica extinta a incorporação de décimos à remuneração dos servidores pelo exercíciode cargo em comissão no âmbito do Distrito Federal.Parágrafo único. Ficam mantidos os décimos incorporados até data anterior à da publicaçãodesta Lei.10 Art 11 - O disposto nesta Lei aplica-se, no que couber, aos servidores cedidos para a CâmaraLegislativa do Distrito Federal e para o Tribunal de Contas do Distrito Federal, respeitada areciprocidade. (grifei).

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I - tome conhecimento da Representação nº 02/2004-GAB/4ª ICE;

II - decida que a incorporação, integralização e substituição deparcelas decorrentes do exercício de cargos/funçõescomissionados exercidos na Administração Direta, Autárquicae Fundacional no âmbito do Poder Executivo do DistritoFederal, bem como na Câmara Legislativa e no Tribunal deContas do Distrito Federal se dê com base no valor do cargo/função que efetivamente tenha sido exercido pelo servidor,respeitada a legislação que rege a matéria (artigos 10, caput,da Lei federal nº 8.911/94, 6º,caput, e 11 da Lei nº 1.004/96e 4º da Lei nº 1.864/98), sem conferir à referida parcela ocaráter de Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada -VPNI (na forma vislumbrada pela Decisão nº 3.366/04 -Processo nº 1.437/81);

III - dispense, por estar caracterizado erro de interpretação de normaprevisto no Enunciado de Súmula nº 79-TCDF, o ressarcimentoao erário das quantias porventura recebidas a maior pelosservidores envolvidos;

IV - dê ciência da decisão que vier a ser proferida à Presidência daCâmara Legislativa do DF, à Secretaria de Gestão Administrativae à Diretoria-Geral de Administração desta Casa; e

V - autorize o arquivamento dos autos.

Processo nº 2.974/2004*

* Ver Decisão nº 1.565/2005

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PARECER

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CONTRATO DE LOCAÇÃO DE SISTEMA DE

IMPRESSÃO A LASER - IRREGULARIDADES

Márcia Ferreira Cunha FariasProcuradora do Ministério Público Junto ao TCDF

Contrato nº 01/2003. CODEPLAN x CTIS. Contrataçãode serviços de locação de sistema de impressão a laser, marca XeroxDP 92C, com fulcro no caput do artigo 25 da Lei nº 8666/93.Irregularidades constatadas. Justificativas improcedentes. Porrealização de procedimento de inspeção para saneamento dos autos.

Versam os autos sobre exame de regularidade do Contrato nº001/2003, firmado entre a Companhia de Desenvolvimento do PlanaltoCentral (CODEPLAN) e a empresa CTIS Informática Ltda., destinado àlocação de sistema de impressão à laser, marca Xerox, com fulcro nocaput do artigo 25 da Lei nº 8.666/93. Foram locadas pela jurisdicionada,por meio deste ajuste, 4 impressoras digitais Xerox DP 92C, conformeproposta de fls. 31 a 34, pelo prazo de 12 meses, por um custo totalestimado em R$ 3.709.560,00.

2. O Contrato foi objeto de análise na Informação nº 064/2003(fls. 156 a 170) do corpo técnico, concluindo-se, naquela ocasião, não restarcomprovada a inviabilidade de licitação e a vantagem financeira da locaçãofrente à possibilidade de aquisição dos equipamentos. Em conseqüência, oe. Tribunal, em 21/10/2003, de acordo com o voto do Relator, tendo emconta a instrução e o parecer do Ministério Público, exarou a Decisão nº5.713/03 (fl. 178), nos seguintes termos:

Decisão nº 5.713/03:II. determinar à jurisdicionada que, no prazo de 30 (trinta) dias,

apresente justificativas pelas seguintes irregularidades verificadasna mencionada contratação:

a) ausência dos elementos necessários à elaboração do projetobásico (art. 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666/93);

b) ausência de estudos que indiquem que a locação se afiguroumais vantajosa para a Administração em detrimento da aquisição

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ou do leasing, ferindo o princípio constitucional daeconomicidade (caput do art. 37 da Constituição Federal);

c) ausência de justificativa do fornecedor e, consequentemente, infraçãoao princípio da licitação (arts. 2º e 26, parágrafo único, inciso II, daLei nº 8.666/93);

d) insuficiência da justificativa do preço, tendo em conta acomparação com apenas uma contratação singular, bem assimdevido à ausência de estimativa da demanda para o sistemadestinado a atender a Secretaria de Educação do DF (art. 26,parágrafo único, inciso III, da Lei nº 8.666/93);

e) locação dos equipamentos de impressão com fornecimento dematerial, contrariando entendimento desta Corte, consoantetermos da Decisão nº 8.967/1997; III. autorizar: a) o envio dainstrução à CODEPLAN como forma de subsidiar asdiligências determinadas;

3. A diligência foi cumprida pelos expedientes de fls. 180 a 191,com os anexos às fls. 192 a 213. O órgão técnico trouxe suas consideraçõesacerca das justificativas às fls. 225 a 244.

II - DAS ANÁLISES DAS JUSTIFICATIVAS

4. A seguir, trago, sinteticamente, os argumentos de cada parte,segregados por item da Decisão supra, seguidos dos comentários doMinistério Público:

a) ausência dos elementos necessários à elaboração do projeto básico(art. 6º, inciso IX, da Lei nº 8.666/93);

Jurisdicionada

5. Da leitura do dispositivo abaixo transcrito (fl. 182), entendereferir-se apenas a obras e serviços de engenharia, não sendo o projeto básicoexigível para locação de equipamentos de informática.

Art. 6º (...)IX - Projeto Básico - conjunto de elementos necessários e

suficientes, com nível de precisão adequado, para caracterizar aobra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto dalicitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicospreliminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado

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tratamento do impacto ambiental do empreendimento, e que possibilitea avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo deexecução, devendo conter os seguintes elementos:

a) desenvolvimento da solução escolhida de forma a fornecervisão global da obra e identificar todos os seus elementosconstitutivos com clareza; (grifo do original)

6. O documento juntado aos autos, fls. 6 e 7, denominado comoProjeto Básico, caracteriza-se como mero complemento, não se revestindoda forma desenhada pelo dispositivo legal em tela, que entende não aplicávelpara o caso concreto.

Órgão Técnico

7. O órgão técnico traz doutrina sobre o tema, afastando ainterpretação restritiva defendida pela jurisdicionada. Observa ser a definiçãode serviço objeto do artigo 6º da Lei nº 8.666/93, em seu inciso II:

II - Serviço - toda atividade destinada a obter determinadautilidade de interesse para a Administração, tais como: demolição,conserto, instalação, montagem, operação, conservação, reparação,adaptação, manutenção, transporte, locação de bens, publicidade,seguro ou trabalhos técnico-profissionais;

8. Em conseqüência, conclui ser a interpretação de serviços,trazida pela própria norma, mais ampla e aplicável ao caso em exame.

9. No entanto, revendo o documento às fls. 6 e 7, intitulado ProjetoBásico, embora reconheça ser o conteúdo mera descrição do equipamentofornecido pela CTIS, ainda assim o aceita, excepcionalmente, em razão daexistência física do alegado documento, apondo recomendação preventivapara cumprimento do dispositivo legal em análise.

Ministério Público

10. De estranhar a nova interpretação feita pela Codeplan quantoà obrigatoriedade do projeto básico apenas para obras, pois, além dosargumentos colocados pelo órgão técnico, observa o Parquet que ajurisdicionada vem elaborando projeto básico para serviços de naturezasdiversas, conforme editais de licitação analisados nos Processos nºs2.234/00, 1.385/98 e 2.325/99 (fls. 258 a 261), tendo o e. Tribunalatestado sua regularidade.

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11. Quanto ao documento presente às fls. 6 e 7, não há como aceitá-lo como projeto básico, por tratar-se de mera descrição do equipamentofornecido pela CTIS. Não traz sequer um elemento em conformidade com odisposto no inciso IX do artigo 6º da Lei nº 8.666/93. A simples existênciafísica do documento não garante sua regularidade, motivo pelo qual concluio Ministério Público pela improcedência das justificativas apresentadas.

b) ausência de estudos que indiquem que a locação se afigurou maisvantajosa para a Administração em detrimento da aquisição ou doleasing, ferindo o princípio constitucional da economicidade (“caput”do art. 37 da Constituição Federal);

Jurisdicionada

12. Após discorrer acerca do diferencial tecnológico doequipamento contratado, lembra os estudos apresentados às fls. 91 a 94,alegando como sendo o demandado pela c. Corte.

13. Argumenta que a contratação em tela revelou-se mais vantajosaque a firmada pelo Poder Legislativo Federal em equipamento idêntico.Acrescenta que as opções de leasing e de aquisição não são atrativas, porimplicar custo adicional de manutenção e reposição de peças, além de estaro equipamento submetido a rápida obsolescência tecnológica.

Órgão Técnico

14. Ratifica as conclusões da 1ª Instrução (fls. 156 a 170) quanto àprecariedade do estudo apresentado pela Codeplan às fls. 89 a 98, observandoter a mesma deixado de promover pesquisa mais ampla de mercado paracomprovar a existência de licitantes e ofertas mais vantajosas.

15. Lembra que a Instrução anterior (§§ 48 a 50 – fl. 168) informouter a jurisdicionada promovido, em data pretérita a esta contratação porinexigibilidade, a Concorrência nº 01/2002, com o mesmo objeto, nos termosdo Processo nº 527/00, o que pressupõe existência de proponentes. Emrazão de irregularidades diversas, a Concorrência nº 01/2002 não teveprosseguimento, passando a Codeplan a contratar seguidamente, poremergência, a empresa Xerox (Processo nº 875/02).

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16. O órgão técnico conclui pela improcedência das alegaçõesapresentadas.

Ministério Público

17. Com razão o órgão técnico. O único estudo apresentado pelaCodeplan (fls. 89 a 98) não é de viabilidade econômica para escolha damelhor opção (aquisição, leasing ou locação). Não estão presentes cálculosde viabilidade econômica ou análise de custo-benefício, não havendo comoconstruir parâmetros de comparação entre as alternativas.

18. A TIR (Taxa Interna de Retorno), o VPL (Valor Presente Líquido)e o “payback” são instrumentos tradicionais de avaliação de desempenhooperacional fornecidos pela Administração Financeira. Possibilitam aoadministrador perspectiva para avaliação da viabilidade de projetos e negóciosda organização na perspectiva das finanças. Os procedimentos de cálculosdestes métodos são fundamentados na matemática financeira e deveriam tersido ponderados pelo Administrador neste caso concreto.

19. Sobre o tema, cabe lembrar ter a Codeplan defendido a utilizaçãode tais técnicas em Estudo utilizado para justificar a política de locação deequipamentos de informática pela Administração ao invés da aquisição. OEstudo foi elaborado pelo Dr. Demetrius Torres Guiot, cujo excertotranscrevo a seguir:

... a prática tem se mostrado temerária quanto à utilização deapenas um indicador para a mensuração da viabilidade econômica,determinando que a partir da interseção de resultados dos diversosmecanismos de análise – VPL, TIR e Payback – deve-se procedercom análise adequada, para a sustentação do processo de tomada dedecisão final quanto à viabilidade do projeto analisado.

(...)Utilizamos para proceder com a análise econômica, o conceito

mais amplo de VPL (Valor Presente Líquido) ou NPV (Net PresentValue) – que se constitui na ferramenta padrão para análiseeconômico-financeira de projetos, além de se mostrar como aprincipal técnica do processo de Orçamento de Capital, que lastreiaa as decisões de investimento para o planejamento estratégico dasorganizações modernas.

Tecnicamente, ao encontrarmos um VPL do fluxo de caixaanalisado, encontramos sua precificação atual. O importante é queo VPL nos demonstra o valor atual do fluxo de receitas e despesa

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proposto, sendo o VPL amplamente utilizado como medida decomparação entre projetos.

No caso específico da análise entre as opções de Locação eAquisição, o que se pretende obter é a opção mais vantajosa,representada por aquela que demonstrar o menor VPL. (grifosdo original)

20. De ressaltar que o Dr. Demetrius Torres Guiot é Administrador,Mestrando em Gestão Financeira, com especialização em engenhariaeconômica, Professor titular das cadeiras de Matemática Financeira eFinanças Aplicadas, além de Coordenador da Diretoria de Pós-Graduaçãoe Extensão na Área de Finanças da UPIS. Participa deste feito por meio deexpediente juntado às fls. 224, onde assina como Assessor de Contratos eConvênios da Codeplan, informando a existência de outras empresas capazesde prestar o serviço objeto deste Contrato.

21. Portanto, como colocado pelo órgão técnico, são improcedentesas justificativas apresentadas.

c) ausência de justificativa do fornecedor e, conseqüentemente,infração ao princípio da licitação (arts. 2º e 26, parágrafo único, incisoII, da Lei nº 8.666/93);

Jurisdicionada

22. Socorre-se alegando novamente o diferencial tecnológico doequipamento, cuja locação realizou-se com o fabricante, por intermédio deseu único e exclusivo representante comercial no Distrito Federal, a CTIS.Informa ser a Xerox o único fabricante desse sistema de impressão, consoantedocumento de fl. 52.

23. Entende plenamente satisfeitos os requisitos para o cumprimentodo artigo 25 da Lei nº 8.666/93, sendo a escolha fundada na solução tecnológicaadotada pelo Administrador, no exercício de seu poder discricionário.

Órgão Técnico

24. Reitera posicionamento já constante dos autos de que a ausênciade ampla pesquisa de mercado impossibilita a justificativa da escolha dofornecedor. Cita a doutrina de Marçal Justen Filho para ratificar talposicionamento (fls. 238 e 239).

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25. Pelas razões aduzidas, conclui não ter a jurisdicionadaapresentado justificativas procedentes nesse quesito.

Ministério Público

26. Concorda o Ministério Público com as conclusões do órgãotécnico. No entanto, faz-se necessário o acréscimo de dois pontos.

27. O primeiro, atinente à contratação direta com o fabricante, pormeio de seu único e exclusivo representante comercial no DF, conformealegado pela Codeplan (fl. 187), verbis:

...além das demais justificativas do fornecedor: direto dofabricante, através de seu único e exclusivo representantecomercial no DF. (grifos do original)

28. Tal informação é suportada por documento de exclusividadede comercialização do equipamento à fl. 13, de 14/01/2003, que,estranhamente, concede à CTIS para participação dessa única contratação:

Em resposta a vossa solicitação, datada de 14 de janeirocorrente, declaramos que esta empresa - Xerox Comércio e IndústriaLtda. – não possui interesse em apresentar proposta para locação doequipamento solicitado, motivo pelo qual cede a CTIS InformáticaLtda. A exclusividade de comercialização da impressora eletrônicaDP92C, única e exclusivamente para a participação nestadispensa de licitação por inexigibilidade. (grifo nosso)

29. Às fls. 95 a 100, consta proposta direta da Xerox à Câmarados Deputados, com validade até 30/01/2003, para aquisição ou locaçãodo mesmo equipamento. Ademais, em data pretérita, a Xeroxcomercializou equipamento análogo (publicadora digital docutech 135)diretamente com a Polícia Civil do DF (Processo nº 2.729/97), com aFundação Educacional (Processo nº 3.547/99) e com a própria Codeplan(Processo nº 3.560/98).

30. Portanto, nos termos dos documentos contidos nos autos, aocontrário do que afirmou a jurisdicionada, a CTIS não detém a exclusividadede comercialização da referida máquina no Distrito Federal.

31. O segundo ponto, refere-se à afirmação da jurisdicionada (fl.203) de que o Tribunal de Contas da União (TCU), em dez/2000, contratouserviços de locação de sistemas de impressão Xerox, por inexigibilidade delicitação (extrato à fl. 212):

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Cabe observar que o Tribunal de Contas da União-TCU,através do Termo de Contrato nº 66/2000, contratou os serviçosde locação de sistemas de impressão Xerox, por inexigibilidadede licitação, em 21/12/2000, conforme cópia do extrato do contratopublicado no DO nº 245-E.

32. Compulsando atentamente o referido extrato de contrato,verifica-se tratar-se de locação de 2 (duas) publicadoras digitais Docutech.No caso em exame, o objeto da locação é a impressora eletrônica Docuprint92-C, equipamento diverso ao do TCU.

33. O Processo nº 3.560/98 tratou da contratação, porinexigibilidade de licitação, da publicadora Docutech pela Codeplan -Contrato nº 012/98 - considerando regular o procedimento, por meio daDecisão nº 4.295/01 (fl. 126), de acordo com o voto do ExcelentíssimoRelator (fls. 120 a 123), Conselheiro Manoel de Andrade, tendo em conta ospareceres convergentes emitidos pelo órgão técnico e por este Parquet.

34. Nesse contexto, o precedente alegado pela jurisdicionada nãose presta para justificar a atual contratação.

d) insuficiência da justificativa do preço, tendo em conta a comparaçãocom apenas uma contratação singular, bem assim devido à ausência deestimativa da demanda para o sistema destinado a atender a Secretariade Educação do DF (art. 26, parágrafo único, inciso III, da Lei nº 8.666/93);

Jurisdicionada

35. Reitera as justificativas apresentadas no item “b”, por entendê-las semelhantes.

36. À fl. 89 consta afirmação da Codeplan de que o preço desua contratação foi 14,62% menor do que o da proposta da Câmarados Deputados:

... Já o preço de locação do sistema ficou menor 14,62%(quatorze vírgula sessenta e dois por cento) em relação ao preçoapresentado à Câmara. (grifo do original)

37. Cita ensinamento do Excelentíssimo Conselheiro Jorge UlissesJacoby Fernandes (fl. 189) consignando como possível parâmetro dejustificativa de preço o praticado com outros órgãos para serviço idênticoou assemelhado.

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Órgão Técnico

38. O órgão técnico esclarece que os elementos contidos nos autosnão são suficientes para justificar o preço contratado e que ausência deestimativa da demanda, para o sistema destinado a atender a Secretaria deEducação, não foi justificada, sendo os expedientes apontados às fls. 101 e118 insuficientes.

39. No entanto, tendo em conta não ter-se caracterizado prejuízoao erário, solicita relevar a irregularidade.

Ministério Público

40. Nenhuma informação nova foi acrescentada pela jurisdicionadaem relação à fase anterior. Mesmo a única comparação de preço apresentadanão pode ser considerada válida, pois feita com uma proposta decontratação (ver fls. 95 a 100), sendo o real preço contratado pela Câmarados Deputados desconhecido. Ademais, não há qualquer indicativo da origemde tal informação, se informado pela própria Câmara ou se proveniente deprocesso de outro órgão público.

41. Como bem lembrado pela jurisdicionada ao trazer a doutrinaacima citada, o preço deve ser parametrizado em relação ao praticado poroutros órgãos para serviço idêntico, ou seja, é imprescindível a comparaçãocom mais de uma referência e nos mesmos parâmetros. Como se demonstraráabaixo, para encerrar a questão, a comparação foi feita com base emparâmetros inapropriados.

42. A economia alegada pela Codeplan, de 14,62% em relação àproposta feita à Câmara dos Deputados, foi calculada com base no valoratribuído à franquia, sem considerar o preço do milheiro excedente e ademanda de cada órgão. Os valores a serem comparados constam às fls. 46e 97/99 e podem ser resumidos de acordo com a tabela a seguir

43. Para comparação do preço por milheiro excedente énecessário colocá-los sobre os mesmos parâmetros, ou seja, devemos incluir

Órgão Franquia Mensal (em milheiros)

Preço Mensal Preço por Milheiro Excedente

Codeplan 400 R$ 68.950,00 R$ 111,10 Câmara dos Deputados 400 R$ 79.032,07 R$ 59,04

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os valores dos insumos (toner) ao preço ofertado à Câmara dos Deputados(fl. 97), visto que o da Codeplan já os inclui (fl. 46):

- para cada milheiro impresso, tendo em conta a cobertura do papelde 1,5% para a tinta colorida e 5% para preto e branco (ver fl. 97):

- Toner Preto a 5% de cobertura = R$ 0,008189/impressão (fl. 98);- Toner Color a 5% de cobertura = R$ 0,03415/impressão (fl. 98);- Toner Color a 1,5% de cobertura = (0,03415/5) x 1,5 = R$ 0,010245/impressão- Portanto, para 1 (um) milheiro:- Custo Toner/milheiro = 1000 x (0,008189 + 0,010245) = R$ 18,43/milheiroPreço por milheiro excedente da Câmara dos Deputados = 59,04 +18,43 = R$ 77,47

44. Como o preço varia em função da demanda, antes de qualquercomparação, é necessário fixá-la para calcularmos o respectivo preço. Paratanto, consideraremos três demandas mensais por equipamento:

1) 400 milheiros – demanda considerada pela Codeplan para atingir aeconomia de 14,62%;2) 900 milheiros– produção do equipamento em funcionamento 20dias por mês, em único turno de 8 horas por dia a 92 ppm (fl. 48); e3) 1766 milheiros – produção do equipamento em funcionamento 20dias por mês, em dois turnos de 8 horas por dia a 92 ppm (fl. 48).45. Pela tabela, temos que, para demandas superiores a 400

milheiros, o preço obedece à seguinte fórmula:PT = PM + PE x (D – 400), onde:PT – preço total;PM – preço mensal franqueado;PE – preço por milheiro excedente;D – demanda mensal em milheiros.Ex.: Preço para a Codeplan para 900 milheirosPT = 68.950 + 111,10 x (900 – 400) = 124.500 ou R$ 124.500,0046. Com os dados acima podemos elaborar a seguinte tabela para

comparação de preços:- Preço Total Mensal em função da Quantidade Demandada:

Demanda (milheiros)Órgão 400 900 1766Codeplan (A) R$ 68.950,00 R$ 124.500,00 R$ 220.712,60Câmara dosDeputados (B)

R$ 79.032,07 R$ 117.767,07 R$ 184.856,09

A-B - R$ 10.082,07 R$ 6.732,93 R$ 35.856,51Diferença (A/B) 14,62 % - 5,41 % - 16,25 %

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47. Da tabela acima, podemos tirar as seguintes conclusões:1) Para 400 milheiros – preço da Codeplan como melhor

alternativa, com economia de R$ 10.082,07 e diferençapercentual de 14,62%;

2) Para 900 milheiros – melhor alternativa a da Câmara dosDeputados, com economia percentual de 5,41% e absoluta, deR$ 6.732,93 em relação ao preço da Codeplan; e

3) Para 1766 milheiros – preço da Câmara dos Deputados comomelhor alternativa, com economia percentual de 16,25% eabsoluta, de R$ 35.856,51 em relação ao preço da Codeplan.

48. Portanto, como demonstrado, o preço do serviço varia em funçãoda demanda prevista, não havendo como aceitar o cálculo realizado pelaCodeplan, baseado apenas no valor da franquia, cujo resultado apontoueconomia sobre a proposta da Câmara dos Deputados.

49. É importante salientar que, para a exata comparação de preços,os cálculos devem ser realizados tendo em conta uma curva de demanda,ou seja, levando em consideração a necessidade de serviços ao longo dotempo, pois o número de máquinas poderá ser dimensionado para atenderpico de demanda em determinado período (é o caso de folha de pagamento).Tal informação não consta dos autos.

50. A falta de prejuízo ao erário, alegado pelo órgão técnico, nãotem o condão de elidir as transgressões legais aqui tratadas, sob pena deprejudicar o exercício do controle externo. Como visto, não há qualquerreferência válida de preço, cuja exigência é prévia por imposição legal,justamente para garantir a regularidade e a economicidade do procedimento.Não há falar em relevar irregularidade que impossibilita a correta prestaçãode contas em contratação de tamanho relevo e materialidade (R$3.709.560,00).

51. Pelo acima exposto, considera o Ministério Públicoimprocedentes as justificativas apresentadas.

e) locação dos equipamentos de impressão com fornecimento dematerial, contrariando entendimento desta Corte, consoante termosda Decisão nº 8.967/1997;

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Jurisdicionada

52. Informa ser o toner parte integrante da operacionalização doequipamento, sem o qual não é possível seu funcionamento. Afirma não setratar de fornecimento casado “mas sim da forma de indicação da cobrançado insumo utilizado na produção dos serviços, na operacionalização dosequipamentos, por força de questões tributárias disciplinadas por órgãofederal, ou seja, INSS” (fl. 190), impondo que o insumo toner seja faturadoem separado da Nota Fiscal de Serviços, em Nota Fiscal de Venda, paracorreto recolhimento da parcela referente à previdência social (Ordem deServiço nº 209/99).

Órgão Técnico

53. Entende que as justificativas apresentadas pela Codeplan nãodemonstram a necessidade da compra direta do toner da Xerox ou ainviabilidade de aquisição de outro fornecedor. Acosta às fls. 220 a 223 asDecisões nºs 7.378/01, 3.161/01, 6.132/00 e 8.967/97, apontandoentendimento da c. Corte no sentido de que as locações de máquinascopiadoras e o fornecimento de seus insumos básicos (cilindro, toner,revelador, papel de impressão, etc.) devem ser licitados separadamente,ressalvados os casos em que houver motivos de natureza técnica oueconômica, devidamente comprovados, capazes de justificar o procedimento.Observa que as Decisões nºs 7.378/01, 3.161/01 e 6.132/00 são de plenoconhecimento da jurisdicionada, tendo o e. Tribunal determinado à mesmaa adoção de licitação em separado.

Ministério Público

54. Tendo em conta a jurisprudência citada, com explícitadeterminação à Codeplan para que adotasse as cautelas devidas, concordao Ministério Público com o órgão técnico, pela improcedência dasjustificativas apresentadas.

55. Por todo o exposto, quanto aos itens “II a” a “II e” da Decisãonº 5.713/03, o órgão técnico considerou improcedentes as justificativasapresentadas pela Codeplan, relevando, em caráter excepcional, as

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irregularidades atinentes aos itens “II a” e “II e”. O Ministério Público,pelas razões aduzidas, não vê como relevar as falhas cometidas, opinandopor serem considerados improcedentes os arrazoados da jurisdicionada.

III – Do Valor do Prejuízo

56. O e. Tribunal, por meio da Decisão nº 2.517/02, de25/06/2002, determinou aos órgãos e entidades do GDF a análise préviade economicidade das opções de locação e aquisição de equipamentos deinformática, verbis:

Decisão nº 2.517/02:(...)II) determinar aos órgãos e entidades do GDF que, antes de

contratarem ou renovarem ajustes já em andamento, tendo por objetoa locação de equipamentos de informática, realizem estudos técnicosque demonstrem ser a locação mais vantajosa que a aquisição, no queconcerne aos princípios da eficiência e da economicidade, inseridosno caput do art. 37 da CF, com a redação dada pela EC nº 19/98;

57. Também a Decisão nº 4.295/01 – Processo nº 3.560/98 – queanalisou a regularidade do Contrato nº 12/98 entre a Codeplan e a Xerox -recomendou ao órgão técnico atentar para a economicidade de locações depublicadoras digitais Xerox DT-135.

58. Há nos autos elementos suficientes para apontar ou nãopresença de prejuízo ao erário decorrente da opção adotada. São eles:

– Período a ser analisado = 12 meses (cláusula segunda do Contrato- fl. 133)

– Valor da locação = R$ 68.950,00/mês (fls. 46)Condições: - franquia mensal = 400 milheiros/mês;

- preço por milheiro excedente = R$ 111,10;- manutenção incluída no preço de locação;

– Valor unitário à vista do sistema de impressão DP 92C = R$785.240,39 (fl. 95)

Condições: - garantia de 12 meses;- franquia mensal de 200 milheiros/mês;- preço da manutenção por milheiro excedente à

franquia = R$ 41,87;

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- custo de manutenção coberto pela garantia, até aquantia franqueada;

– Insumos necessários além da franquia na opção aquisição (ver § 43deste Parecer):

- Toner Preto a 5% de cobertura = R$ 0,008189/impressão;- Toner Color a 1,5% de cobertura = (0,03415/5) x 1,5 = R$0,010245/impressão

– Depreciação = 20% a.a. – equipamento de informática (fl. 72);59. Como taxa de desconto, utilizaremos a Selic, que reflete o custo

médio de captação de recursos pelo setor público. Em 2003, a Selic acumuladafoi de 23,33% ou 1,76% a.m. (fl. 249). Cabe observar que o MinistérioPúblico utilizará a taxa Selic como ilustração, por ser mais adequada à análisecomparativa entre as opções no aspecto financeiro. Para o cálculo do realvalor do prejuízo, deve-se obedecer a Portaria nº 212/02, que impõe o INPCcomo indexador.

60. Para a demanda, utilizaremos aquela prevista na CláusulaOitava do Contrato (fl. 135), 400 milheiros/mês da franquia mais 900milheiros/ano/máquina adicionais, perfazendo 475 milheiros/mês/máquina. Também a demanda é ilustrativa, devendo ser utilizada a demandareal, que não consta dos autos.

61. Tendo em conta a demanda fixada de 475 milheiros/mês/máquina, teremos as seguintes despesas mensais:

- Locação- Valor referente a 400 milheiros = R$ 68.950,00- Valor referente a 75 milheiros excedentes = 75 x R$ 110,10 =R$ 8.332,50- Total = 68.950,00 + 8.332,50 = R$ 77.282,50

- Aquisição- Valor referente a 275 milheiros excedentes = 275 x R$ 41,87

= R$ 11.514,25- Valor ds Insumos (toner) = 275 x (8,189 + 10,245) = R$ 5.069,35- Depreciação mensal do equipamento = 0,20 x R$ 785.240,39/

12 = R$ 13.087,34Total = 11.514,25 + 5.069,35 + 13.087,34 = R$ 29.670,94

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62. Com os custos mensais expostos, podemos elaborar o fluxode caixa e calcular seu valor atual:

63. Portanto, tendo em conta os dados e pressupostosindicados, o prejuízo decorrente da incorreta escolha da opção de locação,frente à opção de aquisição, foi de R$ 519.928,58, perfazendo, para as 4(quatro) máquinas, o valor de R$ 2.079.714,32.

64. No entanto, frise-se, o prejuízo foi calculado com base emdemanda planejada (475 milheiros/mês/máquina) e taxa de descontoalternativo (ver § 59 deste parecer). Para estimar-se seu real valor é necessáriolevantar, mediante inspeção, a demanda real ocorrida, motivo pelo qual opinao Ministério Público, preliminarmente, por inspeção. Por ocasião desseprocedimento de fiscalização, também seria de bom alvitre a obtenção dafranquia mensal da opção de aquisição, já que a informação presente à fl. 95(200 milheiros/mês) é conflitante com o item material de consumo à fl. 99(400 milheiros/mês).

65. Sobre a metodologia de cálculo, o Tribunal de Contas da União,de forma análoga, estimou o prejuízo decorrente de locação antieconômicade equipamentos de informática, em detrimento à opção de aquisição. Trata-se do Processo TC-008.551/2003-8 – Acórdão nº 1.656/2003-TCU-PLENÁRIO (fls. 250 a 257).

Especificações Mês Locação (A) Aquisição (B) (A-B)

Valor Atual

Pagamentos

1123456789

101112

843.941,7077.282,5077.282,5077.282,5077.282,5077.282,5077.282,5077.282,5077.282,5077.282,5077.282,5077.282,5077.282,50

324.013.1129.670,9429.670,9429.670,9429.670,9429.670,9429.670,9429.670,9429.670,9429.670,9429.670,9429.670,9429.670,94

519.928,5847.611,5647.611,5647.611,5647.611,5647.611,5647.611,5647.611,5647.611,5647.611,5647.611,5647.611,5647.611,56

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66. Por fim, não pode o Ministério Público deixar de registrar aforma desrespeitosa de tratamento contida na cópia de expediente acostadoàs fls. 192 a 211, de lavra do Chefe de Desenvolvimento de Mercado daCodeplan, nos seguintes excertos destacados:

- Fl. 206: QUANTO À INFORMAÇÃO Nº 064/2003 – Analistade Controle Externo Luís de Sousa Moura Filho:Como Administrador Público, não poderia deixar de comentar oconteúdo da Informação (na verdade trata-se de umadesinformação) proferida pelo Analista acima citado ... (grifonosso)

- Fl. 209: De forma tendenciosa e atabalhoada, o Analista deFinanças e Controle Externo, Luís de Souza Moura Filho, ... (grifonosso)

- Fl. 210: Nesse item, o analista demonstra claramente que suaanálise passou longe da seriedade. (destaque nosso)

67. Pelo que se infere do citado expediente, tais expressõesdecorreram do constante no parágrafo 39 - fl. 165 – da Instrução doAnalista, verbis:

29. Aquilo que foi chamado de Projeto Básico,documento de fl. 06/07, contém as mesmas características, se nãouma transcrição, do equipamento proposto, consoante observa-sena oferta da CTIS, fl. 48/49 (grifo nosso)

68. Por ocasião da elaboração do Parecer nº 1.365/03-MF (fls. 174e 175), não percebeu o Parquet a expressão “aquilo” utilizada na Informação.Também não chamou a atenção do Excelentíssimo Relator e do e. Plenário.Agora, revendo toda a Instrução, não parece ter a expressão teor ofensivo,quando lida no contexto dos demais parágrafos. De toda a sorte, o Relatóriodo Analista possui elevado teor técnico, não identificando o MinistérioPúblico qualquer outra expressão que possa constituir possível ofensa. Querparecer ter o Sr. Chefe de Desenvolvimento de Mercado da Codeplaninterpretado mal a referida Instrução.

69. É o caso de excluir dos autos as expressões injuriosas, nostermos do artigo 15 do Código de Processo Civil:

Art. 15. É defeso às partes e seus advogados empregarexpressões injuriosas nos escritos apresentados no processo, cabendoao juiz, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las.

70. Em face do exposto, em harmonia parcial com as conclusões esugestões do órgão instrutivo, opina o Ministério Público por que o e. Tribunal:

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a) tome conhecimento dos documentos acostados aos autos;b) considere improcedentes as justificativas apresentadas pela

Codeplan em atendimento ao item II da Decisão nº 5.713/03;c) autorize a 1ª ICE a realizar inspeção para ratificação dos dados

levantados e da metodologia utilizada neste parecer, além daobtenção da demanda real de serviços e outros elementos quejulgar necessário à correta estimativa do prejuízo envolvido;

d) sobreste a audiência dos responsáveis apontados na Instrução,por racionalidade processual, tendo em conta a apuraçãoprevista no item anterior;

e) em razão da ordem de grandeza dos valores envolvidos e dosfortes indícios quanto à ocorrência de prejuízos mensaiscrescentes no decorrer do tempo, à medida da execução dosserviços contratados, delibere pela chancela de urgência paratramitação destes autos;

f) à vista do constante das justificativas sob exame e nos termosdo artigo 15 do Código de Processo Civil, determine sejamriscadas dos autos as seguintes expressões destacadas:

Fl. 206: Como Administrador Público, não poderia deixar decomentar o conteúdo da Informação (na verdade trata-se de umadesinformação) proferida pelo Analista acima citado ...

Fl. 209: De forma tendenciosa e atabalhoada, o Analistade Finanças e Controle Externo, ...

Fl. 210: Nesse item, o analista demonstra claramente quesua análise passou longe da seriedade.

g) autorize o retorno dos autos à 1ª ICE para as providênciasde estilo.

É o parecer.

Processo nº 782/03Parecer nº 461/2004*

*Ver Decisão nº 3.268/2004

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INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI Nº 2.715/2001

Márcia Ferreira Cunha FariasProcuradora do Ministério Público Junto ao TCDF

Representação nº 09/2001 do Ministério Público, da lavrado ex Procurador-Geral Jorge Ulisses Jacoby Fernandes.Transposição de servidores das Carreiras Administração Pública eAssistência Pública em Serviços Sociais para a Carreira Apoio àsAtividades Jurídicas. Decisão nº 3.506/2003. Ilegalidade dos atosde apostilamento. Pedido de Reexame. Indeferimento. Embargosde Declaração. Não-provimento.

Retornam ao Ministério Público os autos da epígrafe que tratam daRepresentação nº 09/2001 (fl. 1/4), oferecida em 31/10/01 pelo entãoProcurador-Geral do Ministério Público de Contas e atual Conselheiro destac. Corte, Dr. Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, versando sobre ainconstitucionalidade dos artigos 8º e 9º da Lei nº 2.715, de 1º de junho de2001, que organizou a Carreira Apoio às Atividades Jurídicas, do Quadrode Pessoal do Distrito Federal.

2. Nos termos da Decisão nº 3.506/03 (fl. 130/131), prolatadana Sessão Ordinária nº 3.762, de 15/0703, o Tribunal decidiu:

(...) III - considerar que não guardam conformidade como art. 37, II, da Constituição Federal nem com o art. 19, II, daLei Orgânica do Distrito Federal, os arts. 8º e 9º, da Lei – DF nº2.715, de 01/06/01, os quais integraram na Carreira Apoio àsAtividades Jurídicas, sem aprovação em prévio concurso público,servidores originários das Carreiras Administração Pública doDistrito Federal e Assistência Pública em Serviços Sociais lotadosna Procuradoria-Geral do Distrito Federal até 30 de abril de 2001;IV - com base na Súmula nº 347 - S.T.F., considerar ilegais osatos de apostilamento praticados pela Procuradoria-Geral doDistrito Federal e pela Secretaria de Gestão Administrativa doDistrito Federal, em decorrência daquela norma, tendo em contaas movimentações de pessoal dos seguintes servidores ativos/inativos/pensionistas, bem como, eventualmente, de outrasporventura efetuadas: (...)

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3. A c. Corte, na S.O. nº 3.797, de 18/11/03 (fl. 223), negouprovimento ao Pedido de Reexame (fl. 136/148, com anexos de fls. 149/182) interposto pelo Exmº Sr. Procurador-Geral do Distrito Federal contrao mencionado decisum.

4. Examinam-se, na oportunidade, Embargos de Declaração (fl.234/242) impetrados por aquela autoridade, os quais foram conhecidos naCorte por intermédio da Decisão Liminar nº 13/2003 (fl. 246), ad referendumdo e. Plenário.

II

5. Respeitante ao mérito do recurso, a Instrução faz osseguintes registros:

04. No recurso em epígrafe, ressaltou o recorrente que aquestão inicialmente veiculada nos presentes autos diz respeito aoinstituto da transposição frente ao postulado constitucional doconcurso público e teve por objeto de análise os artigos 8º e 9º daLei local n.º 2.715/2001. Apontou que, na análise da matéria, queculminou com impugnação dos referidos dispositivos legais, esta Cortedeixou de considerar a abordagem histórica e concreta da situaçãodos servidores abrangidos pela norma impugnada, abordagem estacontida no pedido de reexame anteriormente apresentado.

05. Trata-se, segundo o embargante, das questões relativas àevolução histórica da Carreira Apoio às Atividades Jurídicas, que temorigem na Lei nº 43/89, tendo passado por modificações decorrentesde uma série de leis, até a edição da Lei nº 2.715/01, que autorizou astransposições impugnadas pela Corte. Defende o recorrente que astransposições de que cuidam os presentes autos correspondem a umaproblemática de caráter singular e que é passível de consolidação.

06. Segundo o embargante, “os servidores mencionados naDecisão nº 3.506/2003-TCDF prestaram o mesmo concursopúblico, para o mesmo cargo, e sempre desempenharam as mesmasatribuições que os demais integrantes da Carreira não alcançadospelo mesmo infortúnio.” E acrescentou que “essa seria a principaltese a ser reexaminada, porquanto se caracteriza como antítesebásica à veiculada pelo Ministério Público e acolhida pelo Tribunalde Contas até então.” (Sublinhou-se).

07. Reproduzindo grande parte das considerações constantesdo Pedido de Reexame de fls. 136/148, o recorrente apresentaquestões relativas à tese acima referida e requer desta Corte oacolhimento dos presentes embargos, conferindo-lhes efeitos

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infringentes, para considerar que o caso em comento não se subsume aocaso de transposição, na sua concepção clássica, e que não implica, porconseguinte, afronta ao princípio do concurso público insculpido no art.37, II, da Constituição Federal.

08. Acerca do requerido efeito infringente, deve-se observarque a doutrina e jurisprudência pátrias apenas admitem embargosdeclaratórios com efeitos infringentes quando for o caso decometimento de erro material essencial ou diante da necessidade demodificação da decisão em face de omissão ou contradição. Essenão parece ser o caso da decisão hostilizada.

09. Quanto à análise específica dos servidores oriundos domesmo certame (edital nº 173/91-IDR) e que ostentam situaçõesfuncionais diferenciadas por terem ocorrido “distorções nos atossubsequentes de nomeação e posse de alguns deles em total violaçãoao princípio da isonomia”, deve-se discordar do recorrente quanto àomissão da Corte em abordar o tema. Em verdade, o que houve foi,de um lado, a insistência por parte da jurisdicionada em defender asrecentes transposições operadas pela Lei local nº 2.715/2001 e, deoutro, a manutenção no âmbito do TCDF do entendimento pelainconstitucionalidade do ato, seguindo o parecer do MinistérioPúblico de Contas.

10. Já na instrução de fls. 82/100, quando foi analisada aresposta da PRG/DF e da Secretaria de Gestão Administrativa acercadas impugnadas transposições, emitiu-se a seguinte opinião acercada prática, pela Administração, de dar provimento em cargo distintoou pertencente a outra carreira, de servidores oriundos de umcertame específico:

48. O fato de no passado - mesmo após 05/10/88 - aadministração haver operado provimento por servidores aprovadosem concurso para cargo distinto ou até componente de outra carreira,ou de servidores aprovados em concurso nenhum, de haver realizadoascensões, transposições e outros absurdos amplamente conhecidosde todos não significa que o que aconteceu foi legitimado ou o queestá acontecendo ou acontecerá em matéria de admissões irregularesdeve ser legitimado. O que acontece de irregular na prática, apesarde muitas vezes não ser censurado, não pode servir de paradigmapara que as irregularidades futuras sejam favorecidas por um“princípio da igualdade às avessas”.

49. Não é o certo que deve subordinar-se ao errado porqueo errado - na prática - possa ter vindo primeiro ou se tornadocostume antigo. O errado continua errado e deve subordinar-seao certo, que no caso é a obediência aos arts. 37, II, daConstituição Federal e 19, II, da LODF.

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11. Na análise do Pedido de Reexame, a Corte examinou minuciosamenteas questões levantadas pelo recorrente, não havendo se omitido quanto aoenfrentamento da matéria relativa aos provimentos originários dosservidores oriundos do certame regulado pelo Edital n.º 173/90-IDR. Apenaso Tribunal não a considerou relevante para modificar a decisão recorrida,mantendo seu posicionamento quanto à inconstitucionalidade dastransposições.

12. Nesses termos, e respeitadas as argumentações expostasnos presentes embargos, entendemos que a solução a que chegou oegrégio Plenário na decisão embargada não está a merecer integraçãoou qualquer reparo.

6. O órgão técnico prossegue afirmando que, “aparentemente”,não foram enfrentados os temas alegados pelo embargante, salientando, noentanto, que “as questões envolvendo as nomeações de servidores oriundosdo mesmo certame público (Edital 173/91) e que tiveram desfecho etratamento variados, inclusive no âmbito desta Corte, não constitui elementoargumentativo capaz de elidir a inconstitucionalidade advinda com astransposições examinadas” (sic).

7. Sobre as considerações do recorrente acerca do provérbio “umerro não justifica outro”, consignado no Parecer do Ministério Público nº1.417/03-MF, acostado à fl. 199/206, aduz que “em qualquer Corte queexamine ou julgue questões jurídicas, é permitida a evolução no entendimentoacerca de certas questões, fato que não autoriza rever decisões anterioresembasadas em entendimento diverso”.

8. Ao final, sugere que o e. Plenário negue provimento aosEmbargos de Declaração em comento, dando ciência do teor da decisãoque vier a ser adotada ao recorrente, ao Governador do Distrito Federal, aoPresidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal e à Secretária de GestãoAdministrativa do Distrito Federal.

III

9. O Parquet, em harmonia com a douta Inspetoria, entende queos argumentos oferecidos pelo embargante são insuficientes para reformara Decisão nº 3.506/03, sendo descabidos, portanto, os efeitos infringentesrequeridos na peça recursal. Demais disso, como bem salientou o corpoinstrutivo, as alegações apresentadas, em sua grande maioria, já constavamdo Pedido de Reexame interposto contra o mencionado decisum.

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10. Não obstante, algumas considerações merecem ser repisadas.O ilustre Procurador-Geral do Distrito Federal afirma que a transposição,“sob ponto de vista clássico e genérico”, caracteriza-se pelo “acesso a cargopúblico sem prévia aprovação em concurso”. Tal assertiva, decertoverdadeira, deve, contudo, ser complementada, considerando aimpossibilidade jurídica da transformação do cargo originário em outro,sem aprovação anterior em certame regular.

11. Os artigos 8º e 9º da Lei nº 2.715/01 não tratam dereenquadramento, remanejamento, recolocação ou qualquer outra medidaadministrativa destinada a ajustar o posicionamento funcional dos integrantesda Carreira Apoio às Atividades Jurídicas. Conforme já relatado no Parecernº 1.417/03-MF (fl. 199/206), os inquinados dispositivos, tão-somente,privilegiaram servidores de Carreiras diversas, alçados aos quadros daPRG/DF mediante parâmetros meramente circunstanciais, in casu, lotaçãoe exercício em determinada data.

12. Vale ressaltar, novamente, que os integrantes das CarreirasAdministração Pública e Assistência Pública em Serviços Sociais,“aproveitados” na forma da Lei nº 2.715/01, obtiveram expressivosaumentos salariais, superiores a 60%, simplesmente porque estavam no lugare momento certos.

13. O embargante, rememorando os termos do Pedido deReexame de fl. 136/148, assevera que os artigos 8º e 9º da Lei nº2.715/01 vieram reparar discrepâncias no provimento de servidores queprestaram o concurso público regulado pelo Edital nº 173/91-IDR,publicado no DODF de 05/09/91. Ora, se os dispositivos impugnadospossuíam animus corrigendi, foram, infelizmente, mal redigidos, já que nãoestabeleceram critérios objetivos, voltados à solução do alegado problema.Ao contrário, simplesmente beneficiaram todos os servidores das CarreirasAdministração Pública e Assistência Pública em Serviços Sociais, lotadose em exercício na PRG/DF até 30/04/2001, mesmo aqueles admitidosantes ou depois do prazo de validade do mencionado certame, inclusiveaposentados e pensionistas.

14. Releva observar que os atacados preceitos da Lei nº 2.715/01reproduzem, na essência, o artigo 5º da Lei nº 430/93, de 07/04/93, quefacultou aos servidores ocupantes de cargo efetivo, dos Quadros de Pessoaldo Distrito Federal, Órgãos Relativamente Autônomos, Autarquias e

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Fundações, lotados e em exercício na PRG/DF na respectiva data depublicação, a transposição para a Carreira Apoio às Atividades Jurídicas.

15. Note-se que a ilustre Procuradora do MPC/DF, Drª CláudiaFernanda de Oliveira Pereira, por intermédio da Representação nº 12/93-CF,argüiu a inconstitucionalidade do mencionado dispositivo. No exame doProcesso nº 6.214/93, instaurado em face da aludida Representação, o e.Plenário, na S.O. nº 3.287, de 14/10/97, proferiu a Decisão nº 6.918/97 (verbis):

O Tribunal, de acordo com o voto do Relator, decidiu: a) mantero entendimento de acolher, sem restrições, as transposiçõesfundamentadas em leis publicadas até 23.04.93 (Decisão no Proc.4.851/96, com a modificação introduzida pelos Procs. nºs 2.076/89 e2.732/89); b) considerar ilegais as transposições fundadas em leispublicadas após 23/04/93, com exceção das utilizadas comoinstrumento de aplicação de Plano de Classificação de Cargos,consistindo no deslocamento de todos antigos cargos da antiga carreirapara novos cargos de uma nova carreira, com atribuições correlatas;c) determinar, em conseqüência, a aplicação às transposições do art.5º da Lei nº 430, de 07/04/93, do entendimento a que se refere a letra“a”, desta Decisão; d) ordenar o arquivamento dos autos. Decidiu,ainda, mandar publicar, em anexo à ata, o referido voto.

16. Posteriormente, a c. Corte, tendo em conta outras deliberaçõesde mesma natureza, resolveu sumular o entendimento consagrado naapreciação daqueles autos. Assim, na S.O. nº 3.407, de 13/04/99, aprovouo Enunciado nº 82, das Súmulas de Jurisprudência do TCDF:

As transposições realizadas até 23.04.93, data da publicaçãodo Acórdão proferido pelo STF na ADIN n.º 837-4, são passíveisde registro, ressalvadas as que estejam sub judice

17. Portanto, as transposições para a Carreira Apoio às AtividadeJurídicas, ainda que admissíveis sob o pálio da Lei nº 430/93, não encontramrespaldo legal, doutrinário ou jurisprudencial à luz da Lei nº 2.715/01.

18. O defendente afirma que “as considerações sufragas pela 4ªICE e pelo Ministério Público afastam o ponto nodal do debate medianteafirmações e provérbios despidos de qualquer substância de ordem jurídica,sem fundamentos, o que os equipara, na verdade, a uma completa omissão”.Data venia, o Parquet somente não aprofundou a discussão jurídica da matériaporque o Pedido de Reexame, interposto contra a Decisão nº 3.506/2003(fl. 130), não inovou em relação à legalidade dos dispositivos impugnados,limitando-se à considerações principiológicas e factuais.

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19. Não obstante, ao Ministério Público não faltam argumentosjurídicos bastantes para nulificar os artigos 8º e 9º da Lei nº 2.715/01. Omelhor deles procede do excelso Supremo Tribunal Federal que, na sessãode julgamento de 24/09/03, aprovou a Súmula nº 685, vazada nos seguintestermos (verbis):

É INCONSTITUCIONAL TODA MODALIDADE DEPROVIMENTO QUE PROPICIE AO SERVIDOR INVESTIR-SE, SEMPRÉVIA APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO DESTINADOAO SEU PROVIMENTO, EM CARGO QUE NÃO INTEGRA ACARREIRA NA QUAL ANTERIORMENTE INVESTIDO.

20. Demais disso, ao afirmar que “um erro não justifica outro”, oórgão ministerial não quis apenas registrar a possibilidade de evolução doentendimento sobre determinado tema, como salientou a 4ª ICE nainformação de fl. 251/256. Até porque, em se tratando das transposiçõesocorridas no serviço público distrital, o Parquet não compartilha da orientaçãofixada pelo e. Tribunal, conforme ampla manifestação, em diversasoportunidades. Quis destacar, sim, que as eventuais impropriedadesporventura cometidas nos provimentos originários do concurso públicoregulado pelo Edital nº 173/91 não tem o condão de avalizar, dez anosdepois, transposições ilegais, fundadas na Lei nº 2.715/01.

21. Ante o exposto, o Ministério Público, de acordo com aInspetoria, opina pelo não-provimento dos Embargos de Declaraçãooferecidos pelo Exmº Sr. Procurador-Geral do Distrito Federal.

É o parecer.

Processo n° 828/2001Parecer n° 190/2004*

*Ver Decisão n°2.409/2004

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MISSÃO NO EXTERIOR

PAGAMENTO INDEVIDO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO DE

TRANSPORTE E OUTRAS VANTAGENS

Márcia Ferreira Cunha FariasProcuradora do Ministério Público Junto ao TCDF

Tomada de Contas Especial (TCE) instaurada pela PolíciaMilitar do Distrito Federal (PMDF) com o fito de apurarresponsabilidade por prejuízo decorrente de pagamento indevidoefetuado a título de indenização de transporte e outras vantagenspor missão no exterior. Questionamento a respeito do montanteapurado pela CTCE, em face das quantias pagas a título de ajudasde custo. Diligência. Cumprimento. Instrução, ratificandopronunciamento anterior, pugna pela citação dos responsáveis paraapresentação de razões de defesa ou recolhimento do débito.Informação complementar de Diretor. Reflexos nos débitosapurados. Necessidade de recalcular o montante a restituir.Diretrizes acerca da remuneração devida a policiais militares distritaisem missão no exterior. Outras determinações. Parecer do MinistérioPúblico convergente, em parte, com a Unidade Técnica. Ajustesquanto às orientações expendidas.

Retorna ao Ministério Público o presente feito de Tomada deContas Especial (TCE) instaurada pela Polícia Militar do Distrito Federal(PMDF) para apurar responsabilidade por prejuízo decorrente depagamento indevido realizado a policiais militares a título de indenizaçãode transporte e outras vantagens, em virtude de participação emmissão no exterior.

2. Foram arrolados 4 policiais militares como responsáveis, abaixodiscriminados com os respectivos débitos, por recebimento indevido deindenização de transporte de familiares, bagagens e veículos, além depercepção a maior de remuneração, por ocasião de missão em El Salvador,no período de 1999 a 2001. Em síntese, os policiais perceberam tal vantagemsem efetivar o transporte de familiares e bagagens declarado.

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3. A Comissão de Tomada de Contas Especial (fls. 361/362–apenso), o órgão de controle interno (fls. 367/373–apenso) e o corpo técnico(fls. 34/40) atribuíram responsabilidade aos policiais militares nominadosno quadro anterior, pelo respectivo valor do débito.

4. O órgão técnico sugeriu, nos termos do inciso II do artigo 13da LC nº 01/94, a citação dos servidores para apresentação de defesa ourecolhimento do débito apurado.

5. No entanto, observando que os valores pagos a título de ajudade custo ao agente “A” (R$ 20.244,60 na ida e R$ 48.524,80 no retorno –tabela à fl. 278-apenso) pareciam excessivos (mesmo considerando a variaçãocambial de 43,77% no período) e, a princípio, desconforme com a legislação1,o Ministério Público opinou, preliminarmente, por diligência à PMDF paraobtenção de elementos detalhados utilizados para o cálculo da aludidaindenização aos policiais militares responsabilizados nestes autos2.

6. Nessa linha, exarou o e. Tribunal a Decisão nº 3.060/03 (fl. 51).7. A par do expediente encaminhado pela Corporação (fl. 382-

apenso), onde se verifica que o critério de cálculo dos vencimentos no exteriorfoi alterado por força de orientação contida no Parecer nº 007/2001-4ª SPR/PRG-DF, o órgão instrutivo (fls. 62/63) entende esclarecida a diferença entreos pagamentos questionados, razão pela qual ratifica a proposição de fl. 40.

8. Em face dos questionamentos levantados pelo Parquet, o Sr.Diretor da Divisão de Contas da 1ª ICE expôs circunstanciada análise arespeito da remuneração dos policiais militares distritais no exterior, natentativa de equacionar as dúvidas que recaem sobre o valor do débito,

1 Art 89 da Lei nº 5.619/70. É concedida ajuda de custo idêntica à da ida, paga em moedaestrangeira, ao policial militar que regressar ao País por término de missão oficial de duraçãosuperior a 6 (seis) meses.2 Parecer nº 583/03-MF (fls. 41/47).

Cópia da tabela à fl. 39 da Informação nº 096/2003

NOME DO AGENTE VALORORIGINAL

VALORATUALIZADOATÉ JAN/2002

VALORATUALIZADOATÉ JAN/2003

FRANCISCO CARLOS NUNES MAYNARDE 92.269,18 101.680,48 114.441,56FLÁVIO LÚCIO DE CAMARGO 87.788,09 96.742,48 108.883,66

FRANCISCO OLIVEIRA DE PINHO 97.359,17 107.289,81 120.754,68

EDIVALDO DOS SANTOS DE FARIAS 93.165,04 102.667,87 115.552,69

TOTAL 370.581,48 408.380,79 459.632,59

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mercê da bem elaborada informação complementar de fls. 126/157, cujasíntese adiante se apresenta.

9. Ressalta, inicialmente, não haver reparos às conclusõesexternadas à fl. 63, porquanto constatada nos autos a existência depagamentos indevidos aos militares indicados nesta TCE, mostrando-secabível, pois, a citação.

10. Acerca da ajuda de custo sacada em favor dos aludidos policiais,em especial, quanto à forma como se processou (duas remunerações na idae duas no retorno), concluiu, ao descortinar a legislação pertinente à hipótese(art. 40 da Lei nº 5.619/70), ser incorreto o procedimento, porquantoderivado do emprego das disposições da Lei nº 8.237/91, exclusivamentedestinada aos militares das Forças Armadas, a qual foi considerada peladouta Procuradoria Geral do DF inaplicável em âmbito local por haverlegislação específica a respeito.

11. No respeitante à diferença, em termos absolutos, entre a ajudade custo paga na ida e a devida no retorno, compreendeu essencial,primeiramente, assentar entendimento quanto ao conceito de soldo noexterior, parâmetro para a fixação daquela parcela indenizatória e em tornodo qual giraria toda a controvérsia dos autos.

12. Nesse passo, ponderou acerca das orientações normativasencaminhadas à jurisdicionada pela d. PRG/DF, cujo escopo voltava-se adefinir a legislação aplicável à remuneração dos integrantes daquelaCorporação Militar na ativa em serviço no estrangeiro, as quais, na visão doórgão técnico, mereceriam temperamento, na medida em que implicariamprejuízo aos cofres públicos, considerando-se o contexto remuneratório noexterior praticado pela área federal.

13. Seguindo, ao esmiuçar sobremaneira o repositório de remotasnormas concernentes à questão, cuja literalidade, caso aplicável, conduziriaa absurdos inaceitáveis quanto à remuneração no exterior da PMDF e, viareflexa, a vultosos prejuízos ao erário, entendeu que a solução do dilemademandaria imediata atuação dos órgãos de controle. Dessa forma, apósprofundo esforço interpretativo e à luz da razoabilidade, sobretudo, logroualcançar fórmula tendente à correta fixação do valor do soldo no exterior.

14. Julgando superado o ponto nodal, o Sr. Diretor enfrentou, naseqüência, questão respeitante aos limites remuneratórios no exterioraplicáveis àquela Corporação, além da correlata sistemática de pagamento

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no âmbito das FFAA. Nessa seara, ao retratar, em exemplos numéricos, aaplicação da norma de uso local frente à federal, evidenciando que um policialmilitar perceberia remuneração muito acima da devida a miliciano demesma patente da União ou, até mesmo, a um Ministro no exercício docargo de Embaixador do Brasil fora do país, pondera que:

alguma medida excepcional e transitória deva ser adotada pelaCorte de Contas, com fulcro no seu poder normativo previsto no art.3º da Lei Complementar nº 01/94, no sentido de estancar estaverdadeira ‘hemorragia’ de recursos públicos, alertando o Executivolocal para a gravidade da situação ora detectada nestes autos, concitando-o a editar, em regime de urgência, decreto regulamentador quediscipline a remuneração no exterior dos integrantes das CorporaçõesMilitares do Distrito Federal, haja vista a delegação de competênciaque recebeu para tal por meio do art. 18 da Lei nº 10.486/02.

15. Noutro aspecto, ao finalizar, considera desarrazoado pleitear-se a repetição do que fora despendido a título de remuneração no exterior,porquanto respaldado o pagamento em orientação jurídico-normativa daPRG/DF, bem como ao argumento de que imperaria, em relação ao tema,verdadeira desordem legislativa, quase equivalente à anomia.

16. Sob esse prisma, o diligente Diretor formulou, com endossodo titular da 1ª ICE, as seguintes sugestões:

I - tomar conhecimento do Ofício nº 7.766/folha (fls.411-apenso) eanexos (382/410) para, no mérito, considerar insuficientementeatendida a diligência determinada pela Decisão nº 3.060/2003;

II - em conseqüência, determinar à PMDF que, no prazo de 30 (trinta)dias, recalcule os valores de débito imputados aos militaresmencionados às fls. 351/354 do processo nº 054.001.986/2001,considerando que foram pagas, a título de ajuda de custo, 2(duas)remunerações na ida e 2(duas) remunerações na volta, quando ocorreto seriam 2(dois) soldos na ida e dois soldos na volta, nostermos do art. 40, II, da Lei nº 5.619/70, vigente à época;

III - esclarecer à jurisdicionada que a lei vigente à época do pagamentodas ajudas de custo era a Lei nº 5.619/70 e que o entendimentode que o art. 2º da Lei nº 7.961/89 afastaria a incidência da Leinº 5.619/70 e permitiria a aplicação da Lei nº 8.237/91 é detodo descabido, porquanto o aludido preceito apenas determinavaque fossem reajustados os vencimentos dos servidores militaresdo Distrito Federal na mesma data e percentual dos militares dasForças Armadas, não tendo estabelecido a adoção da mesmaestrutura remuneratória dos militares federais, além disso, referidodispositivo fora expressamente revogado pela MP nº 2131/00;

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IV - esclarecer, também, que o art. 7º da Lei nº 7.412/85 fora declaradoinconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, quando dojulgamento da Representação de Inconstitucionalidade nº 1.475-4/DF, ocorrido em 11/05/88 e publicado no DJ em 01/07/88;

V - alertar à Corporação que o entendimento consignado no item IIIanterior já havia sido levado ao seu conhecimento por meio doParecer nº 015/2001/PROPE/PRG, constando também doParecer nº 007/2001 – 4ª SPR/PRG, o que torna injustificáveisos pagamentos indevidos realizados após data de conhecimentodesses pareceres;

VI - alertar, ainda, à jurisdicionada que o Tribunal considerará ilegaleventuais remunerações no exterior pagas com esteio nasdisposições legais referidas nos itens III e IV, bem assim comarrimo nas disposições literais do art. 6º do Decreto nº 2.638/74, com a redação alterada pelo Decreto nº 6.065/81, porquantoo soldo no exterior calculado com base nesses dispositivos resultaem valor manifestamente ofensivo aos princípios da moralidade,proporcionalidade e razoabilidade;

VII - determinar à PMDF, até que sobrevenha regulamentação distritaldisciplinando a matéria, que a remuneração dos policiais militaresem serviço no exterior deverá jungir-se aos ditames seguintes, sobpena de responsabilidade pessoal do Comandante-Geral e Diretorde Pessoal pelos valores indevidos que forem pagos em excesso:

a) a norma remuneratória aplicável aos policiais militares doDistrito Federal em missão no exterior, até o advento daLei nº 10.486/2002, é a Lei nº 5.619/70, sendo inaplicáveisà PMDF as Leis nº 8.237/91 e 9.367/96, que se dirigiamapenas aos militares das Forças Armadas e que foramrevogadas pela MP nº 2.131/00;

b) as parcelas que compõem a remuneração no exterior dospoliciais militares são: soldo, gratificação de tempo deserviço no exterior, gratificação de função policial militarno exterior, indenização de representação no exterior esalário-família no exterior, sendo inaplicáveis àremuneração no exterior quaisquer outras gratificações ouindenizações, até que sobrevenha a edição de legislaçãoespecífica sobre o assunto;

c) que o valor do soldo do policial militar no exterior deveráser igual à décima parte do produto do respectivo índiceconstante da Tabela II (Escalonamento Vertical), Anexo Ida Lei nº 10.486/2002, pelo fator constante 26 (vinte eseis), somada à correção desse mesmo valor, dada emfunção do índice de correção definido e alterado,

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periodicamente, pelo Ministério das Relações Exteriores, istoé, soldo = (ITEVx26)/10 + IC% (ITEVx26)/10, onde ITEVé o índice da tabela de escalonamento vertical e IC é o índice decorreção definido pelo MRE;

d) que a gratificação de função policial militar no exteriordeve ser calculada consoante os percentuais do soldodefinidos pelo art. 9º do Decreto nº 2.638/74, alteradopelo Decreto nº 11.029/88;

e) que a indenização de representação no exterior deve sercalculada multiplicando–se o índice de indenização derepresentação correspondente ao cargo (anexo III, Decretonº 2.638/74) pelo fator de conversão de localidades (anexoIV, do mesmo decreto);

f) que a gratificação de tempo de serviço no exterior deve sercalculada em percentual sobre o soldo, correspondente atantas quotas de 5%, quantos forem os qüinqüênios deefetivo serviço prestado, nos termos do art. 8º do Decretonº 2.638/74;

g) que o salário-família no exterior deve ser calculado empercentual sobre a indenização de representação no exterior,na forma estabelecida pelo art. 29 do Decreto nº 2.638/74;

h) que as eventuais diárias, transportes e ajudas de custo pagasao militar em missão no exterior deverão levar em conta aestrutura remuneratória definida nos itens anteriores e osparâmetros fixados pelos incisos IX, X e XI, respectivamente,do art. 3º da Lei nº 10.486/02, devendo ainda o militarcomprovar a efetiva realização das despesas efetuadas, dadoo caráter indenizatório desses direitos pecuniários;

i) será considerado ofensa ao princípio da moralidade e graveinfração à norma legal o ato do militar que requerer osdireitos pecuniários citados na alínea anterior e nãocomprovar a efetiva ocorrência das despesas pelas quaisfora indenizado;

VIII - dispensar, excepcionalmente, o ressarcimento dos valores pretéritos,pagos apenas a título de parcela remuneratória (não incluídasnestas as indenizações), em decorrência de divergência de cálculo,tendo em conta que respaldaram-se em orientação jurídico-normativa fornecida pela PRG/DF e a complexa interpretaçãoda legislação que rege a matéria;

IX - determinar à PMDF e ao CBMDF, em caráter provisório, até quesobrevenha legislação distrital disciplinando o assunto, que aremuneração dos seus militares em serviço no exterior, a partirda ciência dessa decisão, não poderá ser, sob qualquer pretexto,

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superior à remuneração que seria paga ao militar das ForçasArmadas de posto ou graduação equivalente nas mesmascondições, nos termos da Lei nº 5.809/72 e Decreto nº 71.733/73 com suas alterações, sob pena de responsabilidade pessoaldo Comandante-Geral e Diretor de Pessoal pelos valoresindevidos que forem pagos em excesso;

X - informar ao Exmº Governador do Distrito Federal que a atuallegislação que rege a remuneração dos policiais militares emserviço no exterior, quando aplicada em sua literalidade, produzpatamares irrazoáveis de remuneração mensal, o que já foidenunciado no âmbito do Parecer nº 007/2001 – 4ª SPR/PRG, eque a disciplina de remuneração fixada por este mesmo parecer,embora tenha trazido os números para valores mais realísticos,ainda permite que os policiais militares no exterior sejamremunerados em condições bem superiores aos militares dasForças Armadas de mesmo posto ou graduação;

XI - em conseqüência, recomendar ao Chefe do Poder Executivo localque, usando da delegação de competência que lhe fora conferidapelo art. 18 da Lei nº 10.486/02, edite, em caráter de urgência,decreto regulamentador que discipline a remuneração dosmilitares das Corporações do Distrito Federal, quando em serviçono exterior, a fim de que se corrijam as distorções ora denunciadas.

17. O fato objeto da presente TCE foi, inicialmente, veiculado pelaimprensa (fls. 27/28-apenso), repercutindo de tal forma que desencadeoureações por parte de órgãos diversos, como Corregedoria-Geral da União(fl. 26-apenso), Ministério da Fazenda (fl. 25-apenso), Secretaria de Fazendae Planejamento do Distrito Federal (fl. 23-apenso) e Ministério Público doDistrito Federal e Territórios (fls. 20/21-apenso), solicitando providênciasimediatas. Entre as conseqüências do ocorrido está o desconto, no repassefinanceiro da União ao Distrito Federal, de montante igual ao valor doprejuízo apurado (fl. 130 do anexo).

18. Mais grave que o elevado prejuízo ao erário distrital é a máculacausada à imagem da Administração Pública, e pior, a um órgão que devezelar pelos mais altos princípios éticos e morais, pois a ele compete asegurança pública.

19. No tocante à indenização de transporte, salientou-se, empronunciamento anterior nestes autos (fls. 41/47)3, que as falhas na concessão

3 Parecer nº 583/03-MF.

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de tal verba pela PMDF já haviam sido objeto de constatação pelo e.Tribunal em trabalho de auditoria (Processo nº 2.860/97). À vista deirregularidades, como declarações inverídicas, falsificação e/ou uso dedocumentos falsificados por outrem, abuso de confiança ou boa-fé einobservância de lei, regulamento ou instrução, depreendia-se não só estareminstitucionalizadas naquela Corporação, como ainda haver indícios deesquema organizado para cometimento de tais ocorrências.

20. As graves deficiências verificadas naquela auditoria, apósapreciação plenária, culminaram na Decisão nº 1.967/99, de 13/04/99,exarada nos seguintes termos:

I - tomar conhecimento da Informação n° 38/98, da Divisão deAuditoria da 1ª Inspetoria de Controle Externo, versando sobreauditoria nas ajudas de custo e indenizações de transporteconcedidas no exercício de 1996 pela Polícia Militar do DF;

II - determinar à Polícia Militar do Distrito Federal que comuniqueao Tribunal, no prazo de 30 (trinta) dias, a adoção de providênciascom os objetivos seguintes:a) criar mecanismos rígidos de controle visando acabar com os

abusos verificados na concessão e pagamento de indenizaçãode transporte;

b) proceder as investigações cabíveis, com relação a indícios deque a mudança de domicílio prometida na documentação deindenização de transporte em razão de passagem para ainatividade não se concretizou e no intuito de comprová-la,sobre os policiais militares identificados no relatório deauditoria (matrículas no parágrafo 51, item II, “b”);

c) determinar as providências saneadoras adequadas a cada caso;d) seguir os ditames da Lei n° 5.619, de 03/11/70, com os

acréscimos da Lei n° 7.609, de 06/07/87, e as alterações dasLeis nºs 7.961, de 21/12/89, e 8.852, de 04/02/94,notadamente acerca dos acompanhantes do policial-militarbeneficiado com a indenização de transporte, evitando inclusãode empregado doméstico ou dependente não autorizado;

e) informar o andamento ou desfecho da sindicância n° 129/98,mencionada em seu ofício n° 360/SEC, de 30/04/98;

III - determinar à Secretaria de Segurança Pública que, em face do quedispõe o artigo 153 do Regimento Interno do TCDF (Resoluçãon° 38, de 30/10/90), instaure tomada de contas especial, na formada Resolução TCDF n° 102, de 15/07/98 (DODF de 20/07/98),com a finalidade de apurar a extensão das irregularidades ocorridasna concessão de indenização de transporte na PMDF durante os

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exercícios compreendidos entre 1994 e 1998, de modo aquantificar os prejuízos verificados;

IV - representar ao Exmo. Sr. Governador do Distrito Federal quantoà conveniência de propor aos poderes competentes da União,com base nos artigos 21, inciso XIV, e 61, parágrafo 1º, incisoII, alínea “c”, da Constituição Federal, as medidas cabíveis comrelação ao desvirtuamento da aplicação aos militares locaistransferidos para a inatividade da indenização de transporteintroduzida pela Lei federal n° 7.609, de 06/07/87, conformefoi verificado em auditoria;

V - determinar a remessa de cópias das fls. 147 a 180 do relatório deauditoria aos senhores Governador do Distrito Federal,Comandante-Geral da Polícia Militar do DF e ao Ministério PúblicoMilitar (artigo 185 do Regimento Interno do TCDF);

VI - sobrestar o julgamento das tomadas de contas anuais da PolíciaMilitar do DF, referentes aos exercícios de 1994 a 1998, até aconclusão da tomada de contas especial mencionada no item IIIdesta decisão. Decidiu, mais, mandar publicar, em anexo à presenteata, o Relatório/Voto do Relator (Anexo I). (grifou-se)

21. Posteriormente, em auditoria operacional realizada no anode 1999 (Processo nº 3.542/98), foi constatada a situação de penúria porque passava a PMDF, com escassez de recursos para o custeio de suasfinalidades básicas, tendo-se evidenciado, como uma das causas doproblema, o excesso de verbas destinadas a indenização de transporte,diárias e ajuda de custo.

22. Em decorrência, pertinente ao caso, o e. Tribunal exarou aseguinte recomendação por meio da Decisão nº 3.066/01, de 09/05/01:

VII - recomendar ao Governador do Distrito Federal, ao Secretáriode Segurança Pública e ao Comandante Geral da PMDF que,em atenção aos princípios da eficiência, da eficácia, daeconomicidade e da razoabilidade, devem nortear as ações doadministrador público, objetivando ampliar o atendimento naárea de segurança pública:c) estime os recursos orçamentários e financeiros disponibilizados à

PMDF, que se mostram insuficientes para a manutenção einvestimentos da corporação, reavaliando os critériosestabelecidos para a fixação dos valores repassados pelaUnião/GDF e a melhor apropriação de recursos,reexaminando leis desvirtuadas, como a que concedeindenização de transporte aos policiais que passarem àinatividade, além de ajustar atos ou gestões, objetivando a

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boa aplicação dos recursos disponíveis, a fim de evitar excessoscom indenização de transporte, diárias e ajuda de custo,especialmente em razão do seu uso como forma indireta deproporcionar vantagens pecuniárias compensatórias aos policiais-militares;

d) considere a precária situação dos equipamentos e das instalaçõesda PMDF;

23. Ainda em relação ao tema, merece relevo recente trabalho deauditoria de regularidade realizado em 2003 junto à PMDF, no qual elencou-se, dentre os objetivos específicos, a aferição da conformidade das despesasrealizadas com diárias, auxílio-transporte e ajuda de custo. Dos resultadosconsubstanciados no Relatório de Auditoria nº 02/2004 - Processo nº1.292/03 –, extrai-se, a respeito, a ocorrência de recebimentos indevidos deindenização de transporte e ajuda de custo por militares designados para missãoem El Salvador, com mudança de sede (entre os quais, frise-se, alguns arroladosna presente TCE), posto que os respectivos dependentes não se instalaram nodestino, mas, tão-somente, por lá estiveram em curtíssimo prazo. Constatou-se, na prática, desvio de finalidade na concessão dos direitos pecuniários adredecitados, atentatória, portanto, ao princípio da legalidade.

24. A irregularidade mencionada ensejou da equipe de auditoriaproposição no sentido de cientificar o Comandante-Geral da Corporação arespeito, além de demandar a citação dos militares beneficiados com vistasao ressarcimento dos dispêndios em questão.

25. Mediante a Decisão nº 1.318/04, o e. Tribunal autorizou;o encaminhamento de cópia do citado Relatório de Auditoria

à Polícia Militar do Distrito Federal, nos termos do art. 41, § 2º, daLei Complementar nº 01/94 e do § 4º do art. 2º da EmendaRegimental nº 01, de 02/07/98, com a redação dada pela EmendaRegimental nº 04, de 09/12/99, para que apresente, no prazo de 30(trinta) dias, esclarecimentos a respeito das irregularidades apontadas,e adote as medidas saneadoras cabíveis.

26. Conforme tais constatações, este tipo de fraude alastrou-se detal forma naquela entidade que passou a representar perda significativa derecursos em relação a seu orçamento total. Como visto nesta TCE, mesmoos procedimentos de fiscalização da c. Corte de Contas não foram suficientespara inibir a infração, o que é lamentável. Portanto, neste caso concreto,deve-se aplicar de forma rigorosa as penalidades legais cabíveis, não sendoaceitável, na espécie, invocar-se atuação pedagógica.

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27. A falta de aplicação dos valores percebidos pelos militares nafinalidade específica declarada (transporte de familiares e bagagens), dado ocaráter indenizatório do benefício e nas circunstâncias descritas, constitui graveirregularidade a ser penalizada com a aplicação das multas previstas nos artigos56 e 57, incisos II, III e IV, da LC nº 01/94, em suas mais altas gradações.

28. Tecidas essas considerações, discorre-se, adiante, sobre asquestões aduzidas na cota complementar subscrita pelo Sr. Diretor da Divisãode Contas da 1ª ICE, às fls. 126/157, ainda que se compreenda não constituireste feito a via adequada para debate sobre matéria de tamanha complexidadee importância. A quaestio iuris ali ventilada diz respeito à retribuição devidaao policial-militar na ativa em serviço no estrangeiro, sinteticamente retratadalinhas transatas.

29. Conquanto bastante aprofundada e didática a análise procedidapela unidade técnica, a qual, com certeza, ampliou o campo de visão sobreintrincado assunto, sobressai necessário neste momento refletir mais quantoao tema, sobretudo por encerrar legislação editada ainda sob os auspíciosde norma fundamental anterior.

30. O estudo preambular empreendido pelo d. Diretor pôs-se aelucidar a exata acepção do componente remuneratório denominado soldono exterior, sem o qual restaria dificultada a aferição da regularidade dasquantias pagas a militares arrolados na presente TCE a título de ajuda decusto por missão no exterior.

31. Nesse particular aspecto, procurou formular entendimentodiverso do externado pela PRG/DF (Parecer nº 007/2001 – 4ª SPR – fls.388/406-apenso) que, a seu juízo, implicaria potencial prejuízo aos cofrespúblicos, porquanto não levaria em conta as supervenientes alterações queocorreram na relação de proporcionalidade de remuneração existente entreos diversos postos/graduações, retratada na Tabela de EscalonamentoVertical - TEV.

32. Referido parecer afastara, por atentatória aos princípios darazoabilidade e moralidade, a incidência do art. 6º do Decreto nº 2.638/74,com a redação dada pelo Decreto nº 6.065/814 (determinava a aplicação denova TEV estabelecida pelo Decreto-lei nº 1.463/76, cujos índices,contrastados com os originais fixados na Lei nº 5.619/70, encontravam-se

4 Cópias às fls. 65/80.

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multiplicados por 10). Manteriam-se, assim, inalterados os índices da TEVinformados em anexo ao Decreto nº 2.638/74.

33. Esquadrinhando o ordenamento jurídico que campeia a matéria,granjeou, de fato, o órgão técnico deduzir o conceito colimado (§ 29, fl.141), que lograria, a seu juízo, não-só contornar o teratológico equívocoproporcionado pelo Decreto nº 6.065/81, como também teria o condão derespeitar as posteriores alterações pertinentes à relação de proporcionalidadeadrede referida (a mais recente, proporcionada pela Lei nº 10.486/02).

34. Da parte deste órgão do Ministério Público, no entanto, pareceque a questão merece interpretação distinta da formulada tanto pelo órgãotécnico, quanto do entendimento perfilhado pela PRG/DF, este, contudo,apenas em relação à forma de cálculo do soldo, vez que não há retoque àsponderações do douto órgão jurídico quanto a conservar-se a plenaaplicabilidade dos preceitos originais do Decreto nº 2.638/74, a despeitodas sucessivas alterações promovidas na TEV5 inicialmente fixada, comoinformado, pela Lei nº 5.619/70, posto que distinção há, sem dúvida, entreremuneração no exterior e a paga no país, como adiante poderá ser observado.

35. A respeito do que depreendeu a equipe técnica, apesar delouvável o esforço empreendido, compreende-se que as modificações namencionada TEV visavam (e ainda visam), em regra, corrigir distorçõesobservadas na remuneração dos militares no país, mais sujeita a variaçõesao longo do tempo que a retribuição no exterior, não se prestando, pois, aemendar a tabela correspondente a essa última espécie estipendial. Há,ademais, o reconhecimento desse aspecto pelo próprio corpo técnico,mediante a seguinte passagem:

23. Além disso, é fácil verificar que os reajustes de soldono exterior sempre foram feitos mediante alteração do fator constantemultiplicador do índice da TEV, nunca via Tabela de EscalonamentoVertical, até porque referida tabela não se presta a isso, pois tem porfinalidade fixar a relação de proporcionalidade de remuneração quedeve existir entre os diversos postos, estando menos sujeita avariações ao longo do tempo, sendo os reajustes nominais decorrentesde perda de poder aquisitivo da moeda supridos pela correção dofator constante multiplicador do índice. Desse modo, reajustam-seos soldos, preservando-se a proporcionalidade e a política deremuneração da Corporação, que fixa os diversos patamares

5 Decretos-lei nº 1.463/76 e nº 1.860/81 e Leis nº 7.961/89 e nº 10.486/02

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remuneratórios que devem ser percorridos pelo militar ao longo dacarreira – eis aí a razão de existência da Tabela de EscalonamentoVertical (TEV).

36. No tocante ao entendimento da d. PRG acerca do conceito desoldo no exterior, verificado às fls. 392/393-apenso6, torna-se necessárioexaminar a legislação correspondente.

37. A respeito, observa-se que a definição dessa parcela básica éextraída de dispositivos do Decreto nº 2.638/74, com as alteraçõesprocessadas pelos Decretos nº 6.065/81 e 11.029/88, no seguinte sentido:

Art. 3º - Considera-se vencimento, no Exterior, o soldo dopolicial militar, acrescido das gratificações previstas neste Decreto edo coeficiente de correção, incidente sobre estes valores, estabelecidopara cada país fixado anualmente pela Secretaria de Planejamento daPresidência da República.

Art. 6º - O soldo no Exterior do policial militar é pago deacordo com a tabela de Escalonamento Vertical, aprovada peloDecreto-Lei nº 1.463, de 29 de abril de 1976, com a alteração previstano Decreto-Lei nº 1.860, de 18 de fevereiro de 1981.

Art. 7º - O valor do soldo do policial militar no Exteriorserá constituído em moeda padrão, utilizada nas transaçõesfinanceiras internacionais do Governo Brasileiro, resultante dosíndices da Tabela de Escalonamento Vertical, de que trata oartigo anterior, pela constante 26 (vinte e seis). (grifei)

38. Percebe-se desses dispositivos que o valor do soldo, este, frise-se, distinto do que venha a ser vencimento, resulta tão-somente do produtodo índice correspondente da TEV pela constante informada, no caso, fixadaem 26. Não há, ao menos pelos preceitos transcritos, qualquer outroacréscimo em relação à parcela básica.

39. De outra parte, o artigo 3º retro define claramente a concepçãode vencimento, em cujo valor verifica-se agregado o coeficiente de correçãoincidente sobre o somatório de soldo e gratificações.

40. Sob esse prisma, percebe-se ter havido, por parte da d.Procuradoria, interpretação um tanto equivocada dos conceitos coligidos,ao estabelecer que a parcela de soldo, isoladamente considerada, estaria

6 (...) o cálculo do soldo do policial militar no Exterior se procede da seguinte forma: índice daTabela de Escalonamento Vertical (TEVE) constante no anexo do Decreto-Lei nº 1860/81 –multiplicado pela constante 26 (vinte e seis) e somando-se com o coeficiente de correçãofixado pela Secretaria de Planejamento da Presidência da República.

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acrescida do mencionado coeficiente, o que, à toda evidência, não se revelaplausível. Portanto, à luz dos conceitos extraídos do mencionado decretoregulamentador, soldo e vencimento têm, cada qual, significados totalmentedistintos e bem delineados, não sendo conceptível, na espécie, formularinteligência outra e mais elástica para a parcela básica da retribuição noexterior, a qual serve de parâmetro para a fixação da maior parte das demaisvantagens estipendiárias.

41. No que concerne às restantes conclusões e sugestõesapresentadas no relatório complementar, em que se traçam diretrizes relativasà retribuição dos integrantes da PMDF no exterior7, recomendável, emprimeiro lugar, expor, com desvelo, o repositório de normas que guardamconexão com o assunto para, então, poder-se firmar convicção a respeito.

42. Historicamente, em termos remuneratórios, os militares doDistrito Federal sempre estiveram atrelados à legislação reservada aosparadigmas da União. Assim foi com o Código de Vencimentos dos Militaresdas FFAA de 1964 (Lei nº 4.328, de 30/04/64), mandado-lhes aplicar, noque coubesse, por força do artigo 8º do Decreto-lei nº 315, de 13.03.678,mantido posteriormente pelo Decreto-lei nº 792, de 27/08/699, em face donovo CVM federal (Decreto-lei nº 728, de 06/08/69).

43. Com o advento da Lei nº 5.619, de 03/11/70, dispôs-se, enfim,de regras voltadas precipuamente aos policiais militares do Distrito Federal.Seus termos, em linhas gerais, não se dissociaram daqueles propagados pelo

7 Ressalte-se que a Lei nº 10.486, de 04.07.02, ao tratar da remuneração dos militares do DistritoFederal em missão especial no exterior, assim estabeleceu:Art. 18. O militar em missão especial no exterior terá sua remuneração calculada em moedaestrangeira, durante o período compreendido entre as datas de saída e retorno ao territórionacional, conforme dispuser regulamentação a ser baixada pelo Governo do Distrito Federal.Parágrafo único. Enquanto não houver regulamentação, serão aplicadas as normasvigentes em 5 de setembro de 2001.8 Art. 8º Aplicam-se aos militares da Polícia Militar e Corpo de Bombeiros do Distrito Federal(PMDF e CBDF) as disposições da Lei 4.328 de 30 de abril de 1964 (Código de Vencimentosdos Militares) em tudo o que couber e até que a lei especial venha a regular seus vencimentos,devendo ser consignados no Orçamento da União em anexo próprio, as dotações destinadas aoseu pagamento, inclusive inativos, bem como pensões deixadas aos seus beneficiários.9 Art. 1º Fica suprimido o artigo 8º do Decreto-lei número 315, de 13 de março de 1967.Art. 2º Fica assegurada ao pessoal da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros do DistritoFederal (PMDF e CBDF), pago pelos cofres do Distrito Federal, a observância das disposições,que lhe eram aplicáveis, da Lei nº 4.328, de 30 de abril de 1964, revogada pelo Decreto-lei nº728, de 4 de agosto de 1969, até que Lei Especial venha regular seus vencimentos.

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antigo Código de 1969 das FFAA, sobretudo se observado o disciplinamentooutorgado à situação do militar da ativa em serviço no estrangeiro, vislumbrando-se ajustes, tão-somente, quanto às peculiaridades que lhes são intrínsecas.

44. Na parte que interessa ao presente estudo, referida lei prescrevia:Art. 86. O policial militar no exterior, em missão que assegure

o pagamento em moeda estrangeira, percebe os vencimentos a quefaz jus pelo Título II desta Lei, podendo ser os mesmos acrescidosde uma indenização especial de representação exterior, a ser fixada,se for o caso, pelo Governo do Distrito Federal.

§ 1º A indenização de representação exterior tem por fimassegurar em moeda estrangeira níveis de vencimentoscompatíveis com as missões e garantir a sua estabilidade em facedas variações cambiais.

§ 2º O Governo do Distrito Federal fixará, através de Decreto,a tabela de vencimentos dos policiais militares, em moeda estrangeira,constituída na forma deste artigo, observado o que prescreve o §4º do artigo 13 da Constituição.

Título IIArt. 3º Vencimentos são o quantitativo mensal em dinheiro

devido ao policial militar em serviço ativo e compreendem o soldo eas gratificações.

Art. 4º - Soldo é a parte básica dos vencimentos inerentes aooficial ou praça policial militar da ativa.

Art. 12. Gratificações são as partes dos vencimentos atribuídosao policial militar como estímulo por atividades profissionais econdições de desempenho peculiares, bem como pelo tempo depermanência em serviço.

Art. 13. O policial militar, pelo efetivo exercício de suasfunções, fará jus às gratificações seguintes:

1) Gratificação de tempo de serviço;2) Gratificação de função policial militar.

45. Por sua vez, o art. 13, § 4º, da Constituição Federal de 1967(com a redação informada pelo Ato Complementar nº 40, de 30/12/6810),ao qual se reporta o § 2º do artigo 86 supra transcrito, estatuía:

Art. 13 – omissis§ 4º - As polícias militares, instituídas para a manutenção da

ordem e segurança interna nos Estados, nos Territórios e no Distrito

10 Na forma do art. 3º do Ato Institucional nº 6, de 01/02/69, foram ratificadas as Emendasnº Constitucionais feitas por Atos Complementares subseqüentes ao Ato Institucional nº05, de 13/12/68.

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Federal, e os corpos de bombeiros militares são considerados forçasauxiliares reserva do Exército, não podendo os respectivosintegrantes perceber retribuição superior à fixada para ocorrespondente posto ou graduação do Exército, absorvidas porocasião dos futuros aumentos, as diferenças a mais, acaso existentes.

46. Complementando esse comando constitucional, o Decreto-lei nº 667, de 02/07/69, prescreveu, verbis:

Art. 24. Os direitos, vencimentos, vantagens e regalias do pessoal,em serviço ativo ou na inatividade, das Polícias Militares constarão delegislação especial de cada Unidade da Federação, não sendo permitidascondições superiores às que, por lei ou regulamento, forem atribuídas aopessoal das Forças Armadas. No tocante a cabos e soldados, será permitidaexceção no que se refere a vencimentos e vantagens bem como à idade-limite para permanência no serviço ativo.

47. Ocorre que as regras exaradas no Código de 1969 pertinentes àmatéria não foram reproduzidas pela subseqüente Lei de Remuneração dasFFAA (Lei nº 5.787, de 27/06/72), o que se justificaria, logo depois, com aedição, pelo Executivo federal, da Lei nº 5.809, de 10/10/72, que deliberouespecificamente sobre retribuição e direitos do pessoal civil e militar emserviço da União no exterior, advindo, assim, reflexos significativos sobre oparâmetro até então adotado pelas Corporações Militares locais.

48. Essa última norma - cujos preceitos e respectivo regulamento(Decreto nº 71.733, de 16/01/73) ainda hoje regulam a matéria no âmbitodaquele Poder, consoante demonstrado pelo órgão técnico às fls. 110/125- estabeleceu, em relação aos militares, que a retribuição no exterior11

constituir-se-ia, afora outros direitos pecuniários, das seguintes parcelasmensais fixas: soldo, gratificação por tempo de serviço e indenização derepresentação, além de um auxílio-familiar, acaso devido.

49. A partir daí, tinha-se, ao menos para os militares federais, umaclara distinção entre retribuição no exterior e remuneração no país,comportando esta última, apenas a título de esclarecimento, a seguinte

11 Art. 8º (Lei nº 5.809/72) A retribuição no exterior é constituída de:I – Retribuição Básica: (...) Soldo no Exterior, para o militar;II – Gratificação: Gratificação no Exterior por Tempo de Serviço;III – Indenizações: a) Indenização de Representação no Exterior; b) Auxílio-Familiar; c) Ajudade Custo de Exterior; d) Diárias no Exterior; e e) Auxílio-Funeral no Exterior;IV – décimo terceiro salário com base na retribuição integral;V – acréscimo de 1/3 (um terço) da retribuição na remuneração do mês em que gozar férias. (OBS.: os doisúltimos incisos acrescidos pela Lei nº 7.795, de 10.07.89)

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composição, em face das parcelas fixas: soldo; gratificações de tempo deserviço, de habilitação militar12, de serviço ativo, de localidade especial; eindenizações de representação, moradia e compensação orgânica; bemcomo de salário-família, se de direito.

50. A par das normas em realce, da conjuntura sócio-política emque despontaram no mundo jurídico e atentando para a cristalina evidênciade serem distintas as composições de vencimentos no país e noexterior, impõem-se neste ponto as seguintes indagações: a) Seria crívelimaginar que a União possibilitaria manter, nos vencimentos de policial militardistrital no exterior, vantagem (no caso, a gratificação de função policialmilitar) que não mais compunha a correspondente retribuição de seusmembros, em descompasso com as restrições adrede informadas? b) Haveriaplausibilidade em se conceber a Lei nº 5.619/70 isoladamente, ao revés decompreendê-la sob o contexto histórico e o sistema jurídico-normativo nosquais inserida, a despeito de seu cunho especial?

51. Em resposta, inicialmente, à segunda indagação, é quaseconsenso na doutrina ser a interpretação literal, meramente gramatical, amais pobre de todas as exegeses. Nada obstante seja, na gradação tradicional,o primeiro na ordem metódica, é cada vez mais crescente a desvalia por essevetusto processo, incomparavelmente inferior, por exemplo, ao lógico-sistemático, de cujo emprego busca-se, por meio do estudo das normas emsi, ou em conjunto, presentes no mesmo repositório ou em leis diversas,mas referentes ao mesmo objeto, deduzir a interpretação mais consentânea.

52. Com efeito, afinando-se com tal entendimento ecompreendendo ainda que o Direito é um todo orgânico, não sendo lícitoapreciar-lhe uma parte isolada, com indiferença pelo acordo com as demais,presume-se insuficiente e precária a exegese literal dos preceitos da Lei nº5.619/70. Sobressai, pois, interpretá-la em harmonia com o ordenamentojurídico contemporâneo à sua edição.

53. Releva notar que a norma suso citada, tomada hojeirrestritamente na parte que disciplina a retribuição no estrangeiro, desbordao seu alcance e conduz a hipóteses (como ilustrado às fls. 145/149) lesivasao erário público, que escapam à razoabilidade/proporcionalidade e à

12 Equivalente à parcela Gratificação de Função Militar estabelecida no Código de 1969, sobnova nomenclatura.

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moralidade, princípios fundamentais de Direito, dos quais não se podeapartar, sob qualquer pretexto, a Administração Pública.

54. Só para argumentar, ainda que se busque sustentar que oimpugnado procedimento estaria, há muito, sendo pacificamente adotadosob o império da legalidade, evidenciando a tentativa de lhe tornar perene,é notório que um valor ou princípio não se permite impor às expensas dasupressão de outro.

55. Sob esse prisma, inexorável inferir que os vencimentos devidosaos policiais militares do DF, quando em missão no exterior, encontravam-se também subsumidos às regras restritivas anteriormente transcritas, adespeito da existência ou não de disciplinamento cristalino a respeito.

56. E mesmo sob a égide do atual ordenamento constitucional, naótica deste órgão ministerial, subsistem ainda tais condicionantes, vez quenão se pode olvidar a manutenção do fundo de direito no qual se assentam,vale dizer, a exclusiva competência atribuída à União relativamente à matériaem apreço, ex vi do artigo 21, inciso XIV, da Constituição Federal13. Aforaisso, saliente-se, promanam da mesma fonte (União) os recursos financeirospara custeio tanto das Corporações Militares do Distrito Federal (ainda quepor meio de transferência obrigatória) como das FFAA, convindo tambémrelembrar que o legislador ordinário, ao editar a Lei nº 10.486/02, revogatóriada Lei nº 5.619/70, guardou silêncio em relação ao tema, estabelecendo, deoutra parte, em seu art. 18, parágrafo único: “Enquanto não houverregulamentação, serão aplicadas as normas vigentes em 5 de setembrode 2001.”

57. À luz do exposto, portanto, afigura-se plausível interpretarrestritivamente o texto da Lei nº 5.619/70, no respeitante à matéria emdestaque, e, assim, deduzir que a parcela gratificação de função policial militar,desde a edição da Lei nº 5.809/72, padeceria de alicerce jurídico para se lhecompreender como componente remuneratória dos vencimentos devidosao militar distrital pelo exercício de missão no exterior, malgrado o

13 Art. 21. Compete à União: (...) XIV - organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e ocorpo de bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira aoDistrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio. (redaçãodada pela EC nº 19/98).Compete privativamente à União legislar sobre vencimentos dos membros das polícias civil emilitar do Distrito Federal. (Súmula nº 647 da jurisprudência do e. Supremo Tribunal Federal)

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entendimento contrário assentado pela douta PRG/DF, ex vi do Parecer nº007/2001-4ª SPR.

58. Contudo, poder-se-ia ainda perquirir se seria exeqüível ao TCDFdeliberar, no âmbito de seu poder normativo albergado no artigo 3º da LeiComplementar nº 01/94, com vistas a obstar a outorga da aludida vantagem,ante o critério interpretativo apresentado neste parecer. Na visão do Parquet,essa dúvida desvanece ante os ensinamentos do festejado mestre CarlosMaximiliano14, que leciona:

Embora seja verdadeira a máxima atribuída ao apóstolo SãoPaulo – a letra mata, o espírito vivifica -, nem por isso é menoscerto caber ao juiz afastar-se das expressões claras da lei, somentequando ficar evidenciado ser isso indispensável para atingir averdade em sua plenitude. O abandono da fórmula explícita constituium perigo para a certeza do Direito, a segurança jurídica; por isso é sójustificável em face de mal maior, comprovado: o de uma soluçãocontrária ao espírito dos dispositivos, examinados em conjunto.(sem destaques no original)

59. Decerto, acolhida a tese ora sustentada, lograr-se-ía alcançarpatamares razoáveis de remuneração no exterior para os integrantes daPMDF, mais condizentes com a realidade verificada em âmbito federal, aqual, não se pode olvidar, ainda constitui parâmetro para as corporaçõesmilitares distritais.

60. Se números realmente impressionam (e isso é notório), observe-se que, com lastro nos exemplos indicados às fls. 145/149, um Coronel PMperceberia, nas condições ali informadas e em face do entendimentoprecedentemente consignado (excluindo-se a gratificação de função policial militare ante o conceito legal de soldo no exterior), remuneração bruta de U$7.325,0015, enquanto seu símile federal, nas mesmas circunstâncias,perceberia U$ 7.657,65. Nada mais justo e razoável, portanto.

61. Outro ponto a merecer apreço pertine à sugestão do Sr. Diretorno sentido de:

deliberar sobre a conveniência de determinar à PMDF e aoCBMDF que a remuneração de seus servidores no exterior, a partirda ciência dessa decisão, não poderá ser, sob qualquer pretexto,

14 In Hermenêutica e aplicação do Direito .19ª ed. Rio de Janeiro : Forense; 2003; p. 91).15 Vencimentos = Soldo + GTSEx + CC x (Soldo+GTSEx) + IREx + Salário-Família = 100x26+ 25% x (2600) + 110% x (2600 + 650) + 100x4 + 25% x (400) = U$ 7325,00.

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superior à remuneração que seria paga ao militar das Forças Armadasde posto ou graduação equivalente nas mesmas condições, sob penade responsabilidade pessoal do Comandante-Geral e Diretor dePessoal pelo montante indevido que for pago em excesso. (§ 47 - fl.150; item IX – fls. 156/157).

62. Nesse aspecto, sob a ótica deste órgão do Ministério Público,não seria de todo desarrazoada a orientação acima. Sem embargo, compreender-se-ia melhor a leitura de tal diretriz consonante com o preconizado no artigo9º da Lei nº 5.809/72, dispositivo que, a despeito de regular matéria emâmbito federal, de forma integrativa, permite-se perfeitamente invocar nahipótese, considerando que a Lei nº 5.619/70 é silente a respeito e haverextrema identidade quanto aos aspectos que permeiam o pagamento noexterior das Forças Armadas e das Forças Auxiliares distritais. Estabelecereferido preceito, verbis:

Art. 9º. A soma dos valores da retribuição básica e daindenização de representação no exterior percebida por qualquerservidor, salvo os Embaixadores Chefes de Missão Diplomáticabrasileira junto a organismos internacionais, não pode ultrapassar90% (noventa por cento) da importância que, a igual título, éatribuída ao Chefe de Missão Diplomática brasileira acreditadojunto ao governo do país em que o servidor estiver em serviçono exterior. (grifei)

63. De se observar que, sabiamente, o legislador considerou obstadoo alcance dessa medida em relação à gratificação por tempo de serviço,vantagem pecuniária de natureza pessoal que, no ordenamento pátrio, nãose subsume aos efeitos de regra limitativa estipendial, entendimento há muitocorroborado também pela doutrina e pela jurisprudência.

64. Assim, apenas as parcelas soldo e indenização de representaçãono exterior devidas aos militares locais seriam consideradas para efeito decotejo (e eventual glosa) com idênticas vantagens percebidas por Chefe deMissão Diplomática brasileira no exterior, nos moldes da Lei nº 5.809/72.

65. Ponderados então todos esses aspectos, sobreleva notar que aintricada matéria reclama a imediata atuação da e. Corte de Contas, a quem,no âmbito de sua missão institucional de controle externo, cumpre zelar pelaboa e regular aplicação dos recursos públicos. Ademais, parece indene dedúvida não convir ao Tribunal quedar-se inerte a respeito, no aguardo docorrespondente equacionamento legislativo, por certo, de imprevisto provimento.

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66. Traçam-se, assim, a seguir, diretivas para a adequação dosvalores pagos a título de remuneração no exterior pela Polícia Militar doDF, com vistas à deliberação pelo e. Plenário, se assim acordar, a par daquelasjá declinadas pelo órgão instrutivo nos itens VII e IX, às fls. 154/157, naforma seguinte:

• até o advento de novel critério normativo especial a respeito,continuam aplicáveis aos policiais militares do Distrito Federaldesignados para missão no exterior as normas remuneratóriasestabelecidas no Título V da Lei nº 5.619/70, as quais devem sercompreendidas em conjunto com os ajustes a seguir informados;

• os vencimentos no exterior, calculados de acordo com o art. 3ºdo Decreto nº 2.638, de 31/05/74, alterado pelo Decreto nº6.605, de 14/07/81, compõem-se das seguintes parcelas fixas:soldo no exterior, gratificação de tempo de serviço no exterior,coeficiente de correção (incidente sobre a soma das parcelasprecedentes e definido e alterado, periodicamente, pelo Ministériodas Relações Exteriores) e indenização de representação noexterior, além de salário-família, acaso devido, consoanteinterpretação conjunta dos artigos 21, inciso XIV, da ConstituiçãoFederal (com a redação dada pela Emenda Constitucional nº19/98), 24 do Decreto-lei nº 667, de 02/07/69, 86, § 2º, da Leinº 5.619, de 03/11/70, e 8º da Lei nº 5.809, de 10/10/72;

• o valor do soldo no exterior do policial militar corresponde aoproduto do respectivo índice constante da Tabela deEscalonamento Vertical, Anexo I do Decreto nº 2.638, de31/05/74, pelo fator constante 26 (vinte e seis) fixado peloDecreto nº 11.029, de 01/03/88;

• a gratificação de tempo de serviço no exterior deve ser calculadaem percentual sobre o soldo, correspondente a tantas quotas de5% (cinco por cento), quantos forem os qüinqüênios de efetivoserviço prestado, nos termos do art. 8º do Decreto nº 2.638/74;

• a indenização de representação no exterior deve ser calculadamultiplicando-se o índice de escalonamento vertical derepresentação correspondente ao cargo (Anexo III, Decreto nº2.638/74) pelo fator de conversão de localidades (Anexo IV domesmo decreto), nos termos do art. 13 do Decreto nº 2.638/74;

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• o salário-família no exterior deve ser calculado em percentualsobre a indenização de representação no exterior, na formaestabelecida pelo art. 29 do Decreto nº 2.638/74;

• eventuais diárias, transportes e ajudas de custo devidas ao militarem missão no exterior deverão levar em conta a estruturaremuneratória definida nos itens anteriores e os parâmetrosfixados, por seu turno, pelos incisos IX, X e XI, respectivamente,do art. 3º da Lei nº 10.486/02, derrogatória da Lei nº 5.619/70,devendo ainda o militar comprovar a efetiva realização dasdespesas efetuadas, dado o caráter indenizatório desses direitospecuniários, não se olvidando do dever de prestar contas a queestá obrigado todo aquele que utiliza recursos públicos, conformeexigido no parágrafo único do artigo 70 da Constituição Federal;

• considerar-se-á ofensivo ao princípio da moralidade e graveinfração à norma legal o ato do militar que requerer os direitospecuniários citados no item anterior e não comprovar a efetivaocorrência das despesas pelas quais fora indenizado; e

• a soma dos valores das parcelas soldo no exterior e indenizaçãode representação no exterior percebida por policial militar emmissão no estrangeiro não poderá ser, sob qualquer pretexto,superior a 90% (noventa por cento) da importância que, a igualtítulo, é atribuída ao Chefe de Missão Diplomática brasileiraacreditado junto ao governo do país em que o militar estiverem serviço no exterior, em conformidade com o artigo 9º daLei nº 5.809, de 10/10/72, sob pena de responsabilidade pessoaldo Comandante-Geral e Diretor de Pessoal pelos valoresindevidos que forem pagos em excesso.

67. De todo modo, conquanto requeira a questão em realce adequadaorientação normativa nos moldes suso alvitrados, as apurações levadas a efeitonesta TCE prescindem da mencionada prestação jurisdicional, à exceção daprovidência formulada pelo órgão técnico no item II, à fl. 153. Entende oParquet que, para atendimento dessa medida, demanda observância a acepçãolegal de soldo no exterior na forma aqui consignada, em detrimento doconceito articulado pela d. PRG (Parecer nº 007/2001-4ª SPR), porquantoapartado da literal dicção estabelecida a respeito no Decreto nº 2.638/74.

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68. Por sua vez, as diretivas declinadas linhas transatas supririamdo necessário balizamento, tão-somente, as hipóteses vindouras, nãosobrevindo, porém, para alcançar situações já consolidadas, em obediênciaao princípio da irretroatividade. Ademais, o questionamento preliminarsuscitado por este órgão, respeitante ao montante do débito relativo às ajudasde custo pagas, encontra-se devidamente aclarado nos autos.

69. Nesse sentido, caso o e. Plenário compreenda necessária maiorevolução sobre o aventado tema remuneratório, apesar dospronunciamentos já reproduzidos no feito, e opte por não deliberar quantoao mérito nesta assentada, recomendável a constituição de autos apartadoscom esse específico escopo, por racionalidade processual, o quepossibilitaria, ainda que tardiamente, granjear celeridade e objetividade nacondução da presente TCE.

70. Demandam ainda reflexão as ponderações do Sr. Diretor (§§48/49 – fls. 150/151; item VIII - fl. 156) tendentes a desobrigar os militaresarrolados nesta TCE de proceder ao ressarcimento do montante despendidoa título de remuneração no exterior, ao argumento de que estaria o pagamentorespaldado em orientação jurídico-normativa da PRG/DF e que imperaria,em relação ao tema, verdadeira desordem legislativa.

71. Em que pese não esclarecida pelo i. Analista a origem doquestionado pagamento, procede este, em realidade, de diferença deremunerações (no país e no exterior) auferidas pelos responsabilizados nosmeses de saída e de retorno de missão no estrangeiro, conforme apuraçõesrealizadas pela CTCE, consubstanciadas às fls. 282/344-apenso.

72. Na espécie, evidenciou-se, em relação a cada um dos casos aliretratados, pagamento concomitante e integral de ambas as retribuições, aorevés do procedimento correto, consistente na observância de remuneração,dentro do mês, ao tempo de permanência no país e no exterior, o que, semmaiores delongas, conduz à insubsistência dos fundamentos nos quais seassenta a proposta aduzida pelo órgão técnico. Obrigam-se, portanto, aquelesmilitares à repetição do indébito.

73. Por derradeiro, ao tempo em que se finalizava o presente parecer,ingressou na Corte pedido formulado pelo representante legal do Ten CelQOPM Flávio Lúcio de Camargo, um dos arrolados nesta TCE, solicitandoa obtenção junto a este Tribunal de certidão verbo ad verbum, relativa aatos/fatos entranhados nestes autos, para defesa de direitos e interesses de

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seu outorgante, em face de demanda judicial manejada pelo d. MinistérioPúblico do Distrito Federal e Territórios (fls. 159/164).

74. Destarte, foram os autos restituídos à Unidade Técnica daCasa com vistas ao exame da questão reclamada, do qual resultou aDecisão nº 2.262/04 (fl. 174), vindo então o feito novamente ao Parquetpara pronunciamento.

75. Em face do exposto, em parcial acordo com a d. Inspetoria, oMinistério Público é de parecer que o e. Plenário adote as seguintes sugestões:

a) encaminhe o processo apenso à Polícia Militar do DistritoFederal para possibilitar o cumprimento da diligência noticiadano item II de fl. 153, esclarecendo à jurisdicionada que oatendimento à medida demanda observância à acepção legalde soldo no exterior, na forma disciplinada no Decreto nº2.638/74, ou seja, corresponde, tão-somente, ao produto doíndice constante da Tabela de Escalonamento Vertical (AnexoI do referido decreto), pelo fator constante 26 (vinte e seis)fixado pelo Decreto nº 11.029, de 01/03/88;

b) delibere quanto ao estabelecimento de orientação normativa aser repassada àquela Corporação Militar, relativamente àlegislação aplicável e à respectiva remuneração devida a seusintegrantes quando em serviço no estrangeiro, ponderando-seas diretrizes declinadas neste parecer (parágrafo 66) e asespecificadas pelo órgão técnico nos itens VII e IX (fls. 153/157), ou, se assim entender, pronuncie-se acerca da constituiçãode autos apartados para tal escopo, conforme sugestão indicadano parágrafo 69 retro;

c) acolha as demais providências alvitradas na InformaçãoComplementar de Diretor às fls. 153/157, exceto a constantedo item VIII, convindo ainda aditar, no tocante à recomendaçãoendereçada ao Exmº Sr. Governador do DF (item XI), quenão se insere entre as prerrogativas do poder regulamentaroutorgado pela Lei nº 10.486/02 restringir ou ampliar os direitosnela fixados ou nas que com a matéria guardem correlação;

d) solicite informações da jurisdicionada acerca da instauração econclusão de sindicância ordenada pelo Comandante-Geral da

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Corporação quando da homologação do IPM, conformedespacho à fl. 86 do Processo nº 054.001.986/01; e

e) autorize o retorno dos autos à 1ª ICE para as providênciasde estilo.

76. Ao ensejo, deseja-se externar escusas pela retenção do feitoalém do prazo regimental, tendo em vista a complexidade que campeia aquestão suscitada em cota aditiva pelo órgão técnico, a demandar acuidadee diligência na sua apreciação.

É o parecer.

Processo nº 1.393/2001Parecer nº 352/2004*

*Ver Decisão nº 5.349/2004

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PAGAMENTO DE FATURAS EMITIDAS POR ENTIDADES DA

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, QUE EXERCEM OMONOPÓLIO DE SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS,

EMBORA NÃO SE ENCONTREM EM

SITUAÇÃO REGULAR COM O INSS, O FGTS E A FAZENDA DISTRITAL

Márcia Ferreira Cunha FariasProcuradora do Ministério Público Junto ao TCDF

Consulta. CLDF indaga acerca da possibilidade decontratação e pagamento a entidades da Administração Públicadetentoras do monopólio de serviços públicos de caráter essencial,mas em situação irregular perante o INSS, o FGTS e a FazendaDistrital. Necessidade de continuidade dos serviços. Inviabilidadeda licitação. Obrigatoriedade de contratação e, por conseqüência,do pagamento.

Tratam os autos de Consulta formulada pela Câmara Legislativa doDistrito Federal - CLDF sobre a viabilidade de pagamento de faturas emitidaspor entidades da Administração Pública, que exercem o monopólio deserviços públicos essenciais, citando como exemplo a Companhia deSaneamento de Brasília - CAESB e a Companhia Energética de Brasília -CEB, embora as mesmas não se encontrem em situação regular com oINSS, o FGTS e a Fazenda Distrital (fl. 01 e seguintes).

2. A iniciativa da CLDF tem inspiração no entendimento firmadopelo ínclito Tribunal de Contas da União, mediante a Decisão nº 431/1997-Plenário, exarada no Processo nº TC 004.389/96-4, em resposta a consultada mesma natureza elaborada pela Secretaria de Controle Interno do SuperiorTribunal de Justiça (fls. 02 a 10).

3. Com o exame da matéria, às fls. 11 a 17, o corpo técnico, comespeque em excerto do voto condutor da referida decisão, relativamente aoconceito de serviços públicos essenciais, expresso por doutrinadoresrenomados, concluiu:

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18. Em análise consulta formulada pela CLDF versando sobre apossibilidade de contratação e pagamento de entidades da administraçãopública em débito para com o INSS, o FGTS e a fazenda distrital.

19. Referida consulta não preenche todos os requisitos deadmissibilidade estabelecidos no art. 194 do RI/TCDF, vez queausente parecer técnico-jurídico de que trata o § 1º daquele dispositivo.Entende-se, contudo, que tal deficiência pode ser relevada,considerando que a consulente fez anexar Acórdão do eg. TCU noqual se debateu a tese, acompanhado das peças em que se fundourespectivo posicionamento.

20. No mérito, diante do exposto anteriormente, entende-sepossível a contratação e pagamento a pessoas jurídicas em débitopara com o INSS, o FGTS e a fazenda distrital, desde que os atosrespectivos sejam previamente justificados e autorizados pela maisalta autoridade do órgão ou entidade e sejam observados,simultaneamente, os seguintes requisitos:

a) a entidade que se pretende contratar deve ser detentora demonopólio na prestação de serviços públicos ou nofornecimento de bens;

b) tais serviços, ou bens, devem ter caráter essencial,imprescindíveis à condução normal das atividades do órgãoou entidade interessados, sempre com vistas ao atendimentodo interesse público.

c ) a contratação deve ser o único meio para solucionar oproblema, de forma que o administrador, ao fundamentarsua decisão, deve demonstrar de forma inequívoca que nãodispunha de outra opção.

4. De destacar no voto condutor da Decisão nº 431/1997-Plenário, a abordagem, segundo a qual a norma regente - § 3º do art. 195da Constituição Federal, art. 47 da Lei nº 8.212/91, com a redação dadapela Lei nº 9.032/95, art. 27 da Lei nº 8.036/90, art. 2º da Lei nº 9.012/95, arts 27, 29 e 55 da Lei nº 8.666/93 - exige dos licitantes ou contratadosa comprovação de regular situação junto ao INSS e ao FGTS, “não só nafase de habilitação, mas também durante toda a execução do contrato”.Tais dispositivos não distinguem empresas particulares dos entes estatais.E no Voto é ressaltado:

12. De fato, não há ressalva, quanto à obrigação supra, emnenhum dos diplomas legais citados, à contratação de empresasestatais por parte da Administração, nem mesmo daquelas detentorasde monopólio, concessionárias de serviços públicos ditos essenciais.

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5. Dessa forma, é que o Relator reportou-se ao conceito doutrináriode serviços públicos essenciais para asserir que são “exercidos exclusivamentepela Administração, diretamente ou mediante concessão a empresas estatais,detentoras de monopólio”, visando atender às necessidades da coletividade edos indivíduos, de forma ininterrupta. Sendo assim, não poderiam os órgãosda Administração ser proibidos de contratar empresas estatais prestadorasdesses serviços, sob regime de monopólio, inadimplentes com o INSS e oFGTS, pois inexistiria até a possibilidade de contratar-se terceiros. E arrematou:

25. Se lícito será contratar as respectivas empresas, pelasmesmas razões deverá a Administração realizar o pagamento pelosserviços já prestados. Isso em respeito, inclusive, ao princípio queproíbe o enriquecimento sem causa por parte da Administração.

26. A conclusão que se impõe, por conseguinte, aoresponder à presente Consulta, é de que é lícita a contratação deempresas estatais fornecedoras de serviço público essencial sobregime de monopólio, ainda que inadimplente com o INSS e o FGTS,desde que expressamente autorizada pela autoridade máxima doórgão judicial e embasada com as devidas justificativas.

6. Nesse sentido, o e. TCU, mediante a Decisão nº 431/1997-Plenário, dentre outras proposições, atendeu à consulente:

2. responder ao responsável que as empresas estataisprestadoras de serviço público essencial sob regime de monopólio, aindaque inadimplentes junto ao INSS e ao FGTS, poderão ser contratadaspela Administração Pública, ou, se já prestados os serviços, poderãoreceber o respectivo pagamento, desde que com autorização prévia daautoridade máxima do órgão, acompanhada das devidas justificativas.

3. informar, ainda, ao consulente que, diante da hipóteseacima, a Administração deve exigir da contratada a regularização de suasituação, informando, inclusive, o INSS e o FGTS a respeito dos fatos.

7. No entendimento deste órgão do Ministério Público, a inclusão,na Consulta da CLDF, da Fazenda Distrital não altera o conteúdo da análiseora comentada. De convir, porém, que o posicionamento do e. Plenáriodeverá restringir-se às contratações de serviços públicos essenciais, excluindo-se situações de fornecimento de bens.

8. Diante do exposto, em acordo parcial com o diligente corpotécnico, opina o Ministério Público por que o e. Tribunal adote as sugestõesda Instrução de fl. 17, com alterações no item II, alíneas “a” e “b”, paraexcluir expressões relativas a fornecimento de bens, e incluir o item III,quanto à exigência de regularização da situação, como segue:

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II - ......omissis......a) a entidade que se pretende contratar deve ser detentora de

monopólio na prestação de serviços públicos;b) tais serviços devem ter caráter essencial, imprescindíveis à

condução normal das atividades do órgão ou entidadeinteressados, sempre com vistas ao atendimento do interessepúblico;

(...)III - alertar à consulente que, diante dessa hipótese, a

Administração deve exigir da contratada a regularização de suasituação fiscal, informando, inclusive, o INSS, o FGTS e o órgãocompetente da Fazenda Distrital a respeito dos fatos;

É o parecer.

Processo nº 321/2004Parecer nº 424/2004*

*Ver Decisão nº 3.046/2004

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RELATÓRIO DE EFICIÊNCIA E EFICÁCIA DE GESTÃO

Márcia Ferreira Cunha FariasvProcuradora do Ministério Público Junto ao TCDF

Relatório de Eficiência e Eficácia de Gestão. Pedidoformulado pela Corregedoria-Geral do DF para que a c. Corte deContas dispense a apresentação do Relatório, componente dadocumentação de TCAs e PCAs de órgãos e entidades distritais,nas contas de 2001 e de 2002. Pelo acolhimento com acréscimo.

Iniciam-se os autos com expediente assinado pela ExcelentíssimaSecretária de Estado Corregedora-Geral do Distrito Federal, Dra. Anadyrde Mendonça Rodrigues, enviando à c. Corte de Contas consideraçõesda Controladoria da Corregedoria-Geral para requerer (fls. 01 e seguintes),em síntese, que seja relevada a ausência do Relatório de Eficiência eEficácia de Gestão relativo às Tomadas e Prestações de Contas Anuaisde 2001 e 2002, exigido no artigo 140, incisos VII e VIII, do RI/TCDF,assim como para que aludido documento possa constituir item específicodo relatório de auditoria.

2. Em manifestação de fls. 14 a 27, a Comissão Permanente dosInspetores de Controle Externo - CICE – informa ter a c. Corteacompanhado de perto a evolução da questão posta, fixando prazoselastecidos em razão da complexidade da matéria.

3. Não obstante o longo tempo decorrido, o resultado alcançadonão se mostrou satisfatório, não tendo o relatório de eficiência e eficáciaevoluído do estágio inicial em que se encontrava. Conforma-se a Comissãocom o tímido resultado, sugerindo a dispensa de apresentação do referidorelatório nas contas referentes aos exercícios de 2001 e 2002, passando a serobrigatório a partir de 2003.

4. Por mais de dez anos vem a c. Corte de Contas acompanhandoseguidos fracassos em produzir planejamento governamental e medição deprodutividade no Governo do Distrito Federal. Nesse período, não houveevolução digna de nota. No entanto, deixou o Tribunal de exercer medidaspunitivas por reconhecer a complexidade da matéria posta. Nessa linha,

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caminharam os Processos nºs 5.838/96, 1.786/97, 6.593/96 e 3.664/96, todosjá arquivados.

5. Da leitura daqueles autos, infere-se como causa da inércia daresolução do problema dois pontos fundamentais:

a) falta de cultura, no setor público, de administração por medidade desempenho;

b) planejamento efetivo e controle de desempenho podem constituirentraves aos executores em suas gestões, pois limitam aflexibilidade no uso de recursos.

6. Cabe registrar ter a Administração anunciado as mais diversasprovidências no sentido de satisfazer as constantes demandas do Tribunalpela realização de controle de desempenho, entre as quais, destacam-se osdiversos sistemas informatizados tidos como solução ao problema: SICON(Sistema de Controle Interno), SIPLAN (Sistema de Informação para oPlanejamento) e SAG (Sistema de Acompanhamento Governamental). Emcomum a todos, a falta de aderência à realidade existente. Sobre o tema,ensina Eliseu Martins1:

A ‘Importação’ de Sistemas de CustosCom tudo o que foi mencionado, quase é dispensável voltar-

se ao comentário relativo ao perigo da ‘importação’ de Sistemas deCustos. Mas, como o assunto é importante, tornaremos a ele.

O uso indiscriminado de ‘Pacotes’ de Sistemas, já premoldadose desenhados, pode, na maioria das vezes, provocar extraordináriosinsucessos.

O que um vizinho necessita em termos de informações não énecessariamente o que o outro precisa, e o que para um funcionoubem talvez não seja um bom remédio para o outro.

O fato de um Sistema estar funcionando satisfatoriamentenum concorrente não implica que ele tenha sucesso no outro, já queo grau de sofisticação em termos de estrutura administrativa,qualidade do pessoal e educação pode ser diferente.

Se problemas dessa natureza existem quando se faz o transladode Sistemas de uma para a outra empresa dentro do próprio país,imagine-se quando se fazem importações no sentido restrito dapalavra. Muitas vezes trata-se de modelos desenhados para locaisonde a ênfase é o controle da Mão-de-obra, talvez extremamentecara lá; já que talvez tenhamos maiores problemas com matéria-prima

1 MARTINS, Eliseu. Contabilidade de Custos . São Paulo : Atlas, 1996, p. 380.

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do que naquele item, é fácil de se imaginar o desastre que virá do seu usoindiscriminado, sem adaptações.

7. Ao ver do Ministério Público, o controle de desempenho é oúltimo degrau de um longo caminho ainda não percorrido pela AdministraçãoPública brasileira. Antes, como pré-requisito, necessário faz-se odesenvolvimento de dois outros sistemas fundamentais, o de custos e o deavaliação de programas.

8. O sistema de avaliação de programas é assunto novo e vemganhando importância em razão da necessidade de prestar contas à populaçãodo que vêm sendo realizado com o dinheiro público. No entanto, de concreto,enfrenta a Administração Pública dificuldades para redução da subjetividadedessa avaliação, dada a inexistência de parâmetros de comparação e incipienteaplicação de métodos quantitativos no setor público.

9. Quanto ao sistema de custos, também não encontra paradigmano setor público. No entanto, por basear-se em registros contábeis, pode seraplicável. Sem conhecimento de seus custos, é impossível à Administraçãomedir seu desempenho, uma vez que este é igual ao quociente entre oresultado alcançado e o custo expendido. Nesse quesito, encontra-se aAdministração em estágio inicial.

10. Importante ressaltar que o sistema de custos deve sempre serdesenvolvido tendo como meta a otimização de resultados, sob pena de semontar uma estrutura meramente burocrática sem agregação de utilidadeao processo. O custo por si só nada diz; é preciso que componha um indicadorcapaz de orientar o gestor para melhorar resultados e atingir objetivos.

11. Intimamente atrelado ao custo está o orçamento. É curioso, naAdministração Pública, a existência de uma estrutura de orçamentação sema presença de um sistema de custos. Como pode um órgão prever recursospara custeio de sua frota de veículos sem conhecimento de seu custooperacional? Como contemplar no orçamento uma nova ação ou programasem estimativa de custo? Como saber se determinado programa ou ação degoverno é caro ou barato?

12. Tais perguntas, essenciais ao gerenciamento e ao cumprimentodo princípio constitucional da economicidade, só podem ser respondidascom o pleno conhecimento dos custos envolvidos.

13. Também a elaboração do orçamento sofre com a ausência deum sistema de custos, sendo atualmente confeccionado pelo valor histórico,

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com mera repetição dos valores gastos nas rubricas orçamentárias ano aano. Inviabiliza-se, com isso, seu uso como ferramenta de controle e dedecisão, as duas mais importantes tarefas da contabilidade de custos. Sobreo tema cita-se, novamente, Eliseu Martins2:

... a Contabilidade de Custos tem duas funções relevantes: noauxílio ao Controle e na ajuda às tomadas de decisões. No que dizrespeito ao Controle, sua mais importante missão é fornecer dadospara o estabelecimento de padrões, orçamento e outras formas deprevisão e, num estágio imediatamente seguinte, acompanhar oefetivamente acontecido para comparação com os valoresanteriormente definidos.

No que tange à Decisão, seu papel reveste-se de sumaimportância, pois consiste na alimentação de informações sobrevalores relevantes que dizem respeito às conseqüências de curto elongo prazo ...

14. De ressaltar ter a contabilidade de custos tradicional evoluídopara o custeio baseado em atividades, cuja premissa básica é: partir do gastototal, suportada pelo consumidor, até chegar aos processos específicosrelevantes, ao passo que o modelo tradicional impunha a composição daspartes para obtenção do custo total. O custeio por atividade permite melhorvisão sistêmica sobre todo o processo, por partir do global para as partesmais relevantes, permitindo maior controle sobre os resultados. Comodivulgador e defensor do sistema de custos por custeio baseado em atividades,principalmente na área de serviços, conveniente citar o professor e consultorPeter F. Drucker3:

Podemos ter ido mais longe no reprojeto tanto da empresa comodas informações no mais tradicional dos nossos sistemas: a contabilidade.De fato, muitas empresas já passaram da contabilidade de custostradicional para o custeio baseado em atividades. Este representa, aomesmo tempo, um conceito diferente do processo da empresa, emespecial para os fabricantes, e maneiras diferentes de medição.

A contabilidade de custos tradicional, desenvolvida pelaGeneral Motors há sessenta anos, postula que o custo total defabricação é a soma dos custos das operações individuais. Porém, ocusto que importa para a competitividade e a lucratividade é o doprocesso total, e é isto que o novo custeio baseados em atividades registra

2 MARTINS, Eliseu. Contabilidade de Custos. São Paulo : Atlas, 1996, p. 22.3 DRUCKER, Peter Ferdinand. Administrando em Tempos de Grandes Mudanças. São Paulo: Pioneira,1996, p. 76 e 77.

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e torna gerenciável. Sua premissa básica é que a fabricação é umprocesso integrado que se inicia quando suprimentos, matérias-primas e partes chegam à plataforma de carga da fábrica e continuamesmo depois do produto acabado chegar ao usuário final. Oatendimento ainda é um custo do processo e também a instalação,mesmo que o cliente pagar.

A contabilidade de custo tradicional mede quanto custa fazeralguma coisa, por exemplo tornear a rosca de um parafuso. O custeiobaseado em atividades também registra o custo de não fazer, como ocusto de uma máquina parada, da espera por uma máquina parada, daespera por parte de uma ferramenta, de estoques esperando embarquee do retrabalho ou rejeição de uma peça defeituosa. Os custos de nãose fazer, que a contabilidade de custos não pode registrar, comfreqüência igualam e em alguns casos excedem os custos de fazer.Portanto, o custeio baseado em atividades não só nos dá um controlede custos muito melhor, mas também o controle de resultados.

A contabilidade de custos tradicional assume que uma certaoperação – por exemplo, o tratamento térmico – precisa ser feita, eno local em que é feita agora. O custeio baseado em atividadespergunta: Ela precisa ser feita ? Em caso positivo, onde é melhorfaze-la? O custeio baseado em atividades integra atividadesanteriormente separadas – análises de valor e de processos,gerenciamento da qualidade e custeio numa única análise.

Usando esta abordagem, o custeio baseado em atividades podereduzir de forma substancial os custos de fabricação – em algunscasos, em até mais de um terço. Porém, é provável que seu maiorimpacto seja em serviços. Na maior parte das empresas de fabricação,a contabilidade de custos é inadequada. Mas as indústrias de serviços– bancos, varejo, hospitais, escolas, jornais e estações de rádio etelevisão – praticamente não contam com informações sobre custos.

O custeio baseado em atividades nos mostra por que acontabilidade de custos não funcionou para empresas de serviços.Não é porque as técnicas sejam erradas, mas porque a contabilidadede custos tradicional faz as hipóteses erradas. As empresas de serviçosnão podem partir dos custos das operações individuais como asempresas de fabricação. Elas precisam partir da hipótese de queexistem apenas um custo: o do sistema total. E este é um custo fixoao longo de qualquer período. A famosa distinção entre custos fixose variáveis, na qual se baseia a contabilidade de custos tradicional,não faz muito sentido em serviços.

15. É necessário asseverar que a otimização de resultados vemassumindo diferentes “roupagens” e “modismos” ao longo do tempo, tendo

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em conta a evolução dos processos produtivos e tecnologias. As histórias desucesso são transformadas em receitas e em sistemas informatizados compromessas milagrosas, para se transformarem em seguidos fracassos que, porsua vez, realimentam novas “roupagens” e “modismos”. Dessa forma, críticasa sistemas tradicionais normalmente são parciais e recorrentes. No entanto, ocerto é que cada caso deve ser estudado individualmente e minuciosamente,com a finalidade de dosar a aplicação da ferramenta correta na medida certa.

16. Outras preciosas ferramentas, utilizadas para otimização douso de recursos, não podem ser aplicadas ao setor público por falta do sistemade custos. É o caso da programação linear para o caso de fatores vários derestrição de recursos ou da análise de regressão, para os custos variáveis.Conforme se infere, é amplo o campo a ser percorrido pela AdministraçãoPúbica ante o potencial das ferramentas existentes.

17. O estágio em que se encontra a Administração Pública distritalé bastante distante do necessário para a construção das bases para a produçãode medidas de desempenho. Mesmo a tradicional orçamentação pelos valoreshistóricos vem degradando ao longo do tempo, a ponto de faltar recursosaos órgãos públicos para pagamento de despesas rotineiras e essenciais aoseu funcionamento.

18. No Processo nº 931/03, por exemplo, apurou-se que, naSecretaria de Gestão Administrativa, despesas rotineiras e essenciais aoórgão foram contingenciadas por falta de recursos (§ 11 do Relatório deInspeção nº 2.0100.04):

11.Conforme se depreende, as despesas realizadas,desprovidas de empenho, decorreram, em sua maioria, de Contratos,cujos objetos dizem respeito a serviços essenciais à manutenção dasatividades da SGA, tais como: vigilância, conservação e limpeza,serviços especializados em informática etc. Ou seja, trata-se dedispêndios cujos processamentos não poderiam ter sido cancelados,já que as prestações dos serviços não foram interrompidas e, na maiorparte das vezes, os valores já eram previamente conhecidos.

19. Como despesas essenciais e rotineiras puderam sofrercontingenciamento, em afronta ao arcabouço legal existente, num órgãoresponsável por formulação de políticas de planejamento,administração e coordenação?

20. O fato acima ocorreu de forma generalizada pelos diversosórgãos do Poder Executivo distrital, conforme noticia o Processo nº

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513/03, resultando em déficit financeiro constatado de, no mínimo, R$ 100,78milhões com concomitante presença de dotação orçamentária de R$ 1,20 bilhão,apurados no exercício de 2002. Configura o ocorrido grave irregularidadeque rebaixou o orçamento elaborado naquele ano a mera peça de ficção.

21. No entanto, vem tentando a c. Corte, por meio das auditoriasoperacionais e acompanhamento pela 5ª Inspetoria de Controle Externo,implementar cultura de planejamento nos órgãos jurisdicionados. Comoexemplo, cito os Processos nºs 488/02 e 3.542/98.

22. No Processo nº 488/02, a 5ª ICE, a exemplo de anos anteriores,alerta repetidamente a Secretaria de Fazenda quanto à necessidade deaperfeiçoamento do acompanhamento da execução das receitas e despesas,ante às constantes distorções entre o previsto e o realizado.

23. No Processo nº 3.542/98, a 1ª ICE, em auditoria operacionalna Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), diagnosticou inúmerasdeficiências de planejamento e execução necessárias ao corretofuncionamento daquela Corporação. Destaca-se o cálculo do custooperacional de viaturas policiais, realizado como forma de indicar àjurisdicionada o valor necessário ao seu custeio anual. A estimativa foirealizada como forma de fazer incluir no orçamento recursos necessários esuficientes ao pleno funcionamento da frota de veículos da Corporação. Naocasião, a equipe de auditoria constatou cerca de 485 viaturas policiais, dasquais metade estavam paradas por falta de manutenção adequada.

24. Inobstante a atuação da c. Corte nos processos acima, nenhumresultado concreto foi colhido até o momento.

25. Talvez uma mudança de postura do controle externo sejamais eficaz no tratamento do tema. Nesses termos, oportuna a reflexãode Peter F. Drucker4:

Numa situação de desordem, a primeira reação é sempre fazeraquilo que o vice-presidente Gore e seus associados estão fazendo:remendar. Nunca dá certo. O próximo passo é recorrer aos cortes.A admin i s t ração pega um facão e sa i dando go lpesindiscriminadamente. É isso que tanto os republicanos e aadministração Clinton se propõe a fazer agora. Nos últimos quinzeanos, todas as grandes empresas americanas fizeram isso, entre elasa IBM, a Sears e a GM. Cada uma anunciou antes que a demissão de

4 DRUCKER, Peter Ferdinand. Administrando em Tempos de Grandes Mudanças. São Paulo:Pioneira, 1996, p. 189 a 191.

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10.000, 20.000 ou mesmo 50.000 pessoas iria levar a umareformulação imediata. É claro que um ano depois nada haviaacontecido, e a empresa demitia outros 10.000, 20.000 ou 50.000 –mais uma vez, sem resultados. Na maioria dos casos, os cortes depessoal mostraram ser aquilo contra o que os cirurgiões por séculostanto alertaram: ‘amputação antes do diagnóstico’. O resultadosempre é uma incapacitação.

Mas houve algumas organizações – grandes empresas (a GE,por exemplo) e grandes hospitais (como o Beth Israel, em Boston) –que, em silêncio, sem alarde, se reformularam, repensando a si mesmas.Elas não começaram pelos cortes e sabiam que iniciar pela reduçãode gastos não seria o caminho para conseguir o controle dos custos.O ponto de partida é identificar as atividades que são produtivas,que devem ser fortalecidas, promovidas e expandidas. Toda agência,política, atividade e programa devem ser confrontados com as seguintesperguntas: ‘Qual é a sua missão?’ ‘Ela ainda é a missão correta?’ ‘Istoainda vale a pena ser feito?’ ‘Se já não estivéssemos fazendo isto, nóscomeçaríamos a fazer agora?’ Este questionamento tem sido feito comfreqüência em todos os tipos de organizações – empresas, hospitais,igrejas e até governos municipais – e sabemos que funciona.

A resposta global quase nunca é: ‘Isto está ótimo como está;vamos continuar assim’. Em muitas áreas, a resposta à pergunta é:‘Sim, começaríamos de novo, mas com algumas mudanças.Aprendemos algumas coisas’.

Um exemplo é a Administração de Segurança e SaúdeOcupacional (OSHA) criada em 1970. A segurança no local detrabalho é a missão correta da OSHA. Mas a segurança no local detrabalho não melhorou muito nos Estados Unidos nesses 25 anos.Pode até haver um pouco menos de ferimentos incapacitadores agorado que em 1960 e 1970, e também a força de trabalho cresceusobremaneira durante esses anos. Porém, considerando-se a passagemconstante da força de trabalho altamente inseguros para seguros(por exemplo, da mineração de carvão a grandes profundidades àmineração de superfície e especialmente a passagem de empregosna manufatura, inerentemente perigosos, para funções em escritóriose de serviços, inerentemente seguras), a segurança no local detrabalho pode até ter se deteriorado a partir de 1970. Um resultadodestes normalmente significa que estivemos realizando a tarefa certada maneira errada. No caso da OSHA, até entendemos o problema.Ela opera a partir da hipótese que um ambiente inseguro é a causaprincipal de acidentes. Portanto, tenta fazer o impossível: criar umuniverso isento de riscos. A eliminação dos riscos é a coisa certa aser feita. Mas ela é apenas uma parte da segurança, e provavelmente

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a menor. De fato, por si só ela não consegue quase nada. A maneiraeficaz para produzir segurança é eliminar o comportamentoinseguro. A definição da OSHA para acidente – ‘quando alguémsai ferido’ – é inadequada. Para haver uma redução nos acidentes, adefinição tem que ser ‘uma violação das regras de comportamentoseguro, quer ou não alguém saia ferido’. Esta é a definição sobre aqual os Estados Unidos cuidam de seus submarinos nucleares.Qualquer um de seus tripulantes, do comandante ao marinheiromenos graduado, é punido pela menor violação das regras decomportamento seguro, mesmo que ninguém saia ferido. Emconseqüência disso, os submarinos nucleares têm um recorde desegurança inigualado por qualquer fábrica ou instalação militar domundo; contudo, é difícil imaginar um ambiente mais inseguro queum submarino nuclear repleto de pessoas.

26. Uma iniciativa que merece aplausos vem sendo tomada pelaCompanhia de Saneamento do Distrito Federal (Caesb). Trata-se de sistemade metas e desempenho elaborado por sua Controladoria-Geral edesenvolvido em parceria com o Setor de Contabilidade.

27. Por meio da extração de dados do sistema contábil e de relatóriosproduzidos por outros setores daquela empresa, a Controladoria alimentaum sistema que produz uma série de indicadores que possibilitamacompanhar o desempenho das mais diversas áreas. Um exemplo é o sistemade controle de veículos, que está sendo desenvolvido para otimizar ogerenciamento da frota da empresa.

28. Embora em implantação, os controles foram e estão sendodesenvolvidos inseridos no conceito de utilidade para a empresa. Cadainformação extraída busca preencher uma lacuna existente para otimizar oprocesso como um todo e para o atingir metas da Companhia.

29. Como elemento catalisador, a Controladoria está diretamentesubordinada ao Presidente da Caesb e à diretoria, como órgão de staff, fatoessencial para superar a inércia natural que acompanha mudanças.

30. Ao ver do Ministério Público, o sistema em desenvolvimentopela Caesb possui potencial como paradigma à Administração Pública. Nessesentido, merece a iniciativa melhor avaliação pela c. Corte de Contas, atuandocom foco em sua função pedagógica, como órgão colaborador do processode implantação do sistema de desempenho nos órgãos públicos distritais.

31. Ante o exposto, esperando ter contribuído para o processodecisório, em harmonia parcial com as conclusões do órgão técnico, opina o

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Ministério Público por que o e. Tribunal adote as sugestões da Instruçãode fls. 26 e 27.

É o parecer.

Processo nº 394/2004Parecer nº 244/2004*

*Ver Decisão nº 2.115/2004

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CONCESSÃO DE APOSENTADORIA, PENSÃO OU REFORMA

REDUÇÃO DE PROVENTOS

Inácio Magalhães FilhoProcurador do Ministério Público junto ao TCDF

Estudos Especiais. Uniformização de entendimento, nestaCorte de Contas, acerca da obrigatoriedade de audiência prévia dointeressado nos processos que suscitem ilegalidade de concessãode aposentadoria, pensão ou reforma, resultando redução deproventos. Análise dos princípios do contraditório e da ampla defesa.Inspetoria posiciona-se pela incompatibilidade de defesa prévia emsede de processos de concessões. Princípios atendidos pelainterposição de pedido de reexame. Necessidade de audiência préviasomente em caso de revisão de concessões já consideradas legaispelo Tribunal. Sugestão ao Plenário. Ministério Público aquiesce àssugestões, com adendo.

Consistem os autos em estudos realizados pela 4ª Inspetoria deControle Externo, em cumprimento ao disposto na Decisão nº 2.713/04(fl. 01), objetivando uniformizar o entendimento da Corte sobre aobrigatoriedade de audiência prévia do interessado nos processos deconcessão de aposentadoria, reforma ou pensão, antes da prolação de decisãodo Tribunal que resulte em redução de proventos ou em ilegalidade.

Das considerações da 4ª Inspetoria

2. Aduz a Inspetoria que procedeu à vasta pesquisajurisprudencial sobre o tema, em diversas cortes judiciais. Entretanto,ancorou o estudo na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, emvirtude de sua proeminência para análise do tema, que é de viésnitidamente constitucional.

3. A 4ª ICE identifica no Excelso Pretório duas correntesdistintas: uma, considerando que as decisões do Tribunal de Contas daUnião, que cancelam pagamentos unilateralmente do interessado,desrespeitam os princípios do contraditório e da ampla defesa; outra, que

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entende que a dita Corte, no exercício do controle externo, não está jungidaa um processo contraditório ou constestatório.

4. O corpo instrutivo abraça a segunda corrente, pelos motivosque serão a seguir relacionados. Para que não se torne enfadonha a leituradas considerações expendidas pela zelosa Inspetoria, permitiu-se trazer àbaila aquilo que, pensa-se, forma a matriz da tese defendida.

5. Em um primeiro prisma de observação, o órgão técnicoverifica que se deve sobrelevar a existência de oportunidade de defesa emmomento posterior ao da decisão, seja proveniente do Tribunal de Contasda União ou do Tribunal de Contas do Distrito Federal. Para tanto, comoexemplo no âmbito distrital, faculta-se ao interessado a interposição depedido de reexame (artigo 188, II, a e 189 do RI/TCDF, combinado como artigo 47 da LC nº 01/94), com efeito suspensivo. Assim, entende quetal recurso garante a oportunidade de defesa em processos de concessões,sem que haja prejuízo ao interessado.

6. Assevera a Inspetoria que se admitir a defesa préviajuntamente com a possibilidade de reexame posterior da decisão é criarum excesso de intervenção dos interessados que fatalmente servirá àprocrastinação dos processos (...).

7. Caminhando em sua análise, a 4ª ICE faz distinção entreprocessos de registro de aposentadoria e os processos de revisão deaposentadorias já registradas pelo Tribunal de Contas. Neste último caso,não há como divorciar-se da imperiosa observância do contraditório e ampladefesa. Entrementes, nos casos de concessões ainda pendentes de registro,entende aquela Inspetoria não ser razoável cogitar-se da obediência doscitados princípios. Basilar o pronunciamento, neste ponto, do MinistroSepúlveda Pertence (RE nº 163301-AM):

Há pelo menos dois tipos inconfundíveis de pretensão, quenão admitiriam o tratamento unitário que lhes dispensou o acórdão:de um lado, a que, grosso modo, a decisão enfrentou e acolheu, istoé, a daqueles que se voltavam contra a revisão do registro de suasaposentadorias, já ordenado pelo Tribunal de Contas, no exercíciode sua função constitucional, de outro, os que viram desfeitos peloTribunal, enquanto detentor de poderes de auto-gestão administrativa,os atos de aposentadoria ainda não levados a registro....

8. Volvendo a atenção para o texto constitucional, o corpoinstrutivo analisa o enunciado que explicita os princípios do contraditório e

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da ampla defesa (art. 5º, LV). Em seu pensar, somente os processos emque se pressupõem litígio ou contencioso são passíveis de aplicaçãodaqueles princípios.

9. Assim, assevera, processos de caráter administrativo, comoé o caso do inquérito policial, não comportam oportunidade de defesaou contraditório.

10. Ainda combatendo a tese contrária, o órgão técnico fazreferência à já clássica teoria do ato complexo, segundo a qual o ato deaposentadoria exsurge complexo, somente se aperfeiçoando com o registroperante a Corte de Contas (segundo relato do Ministro Marco Aurélio, noRE nº 195861). Assinala a Inspetoria que os processos de aposentadorias,pensões ou reformas nada mais são que procedimentos não contenciosos eque seria impensável abrir oportunidade para defender um ato administrativoque se sabe precário, inacabado.

11. Dessarte, permitir-se defesa prévia implicaria nova oitiva doórgão instrutivo e do Ministério Público o que, somada à possibilidade deoferecimento de recurso com efeito suspensivo, eternizariam os trâmites deum processo, atuando, assim, contra a celeridade e a segurança jurídica.

12. A propósito do efeito suspensivo do recurso administrativo,reitera a Inspetoria a consideração de que, pendente decisão em citadorecurso, não há que falar, inclusive, em impetração de mandado de segurança,eis que não estaria presente o direito líquido e certo, a teor do disposto noartigo 5º,I, da Lei nº 1.533/51.

13. Apresentados de forma sintética os argumentos da digna 4ªInspetoria, cumpre realçar suas conclusões à Corte:

I - a defesa prévia é incompatível com os processos de registro deaposentadorias, reformas e pensões;

II - o pedido de reexame, porque tem efeito suspensivo, atende plenamenteà garantia de contraditório e ampla defesa, em se tratando deprocessos de natureza não contenciosa como são os processos deregistro de atos concessórios;

III - diversamente, os processos de concessões já considerados legais peloTribunal de Contas poderão ser revistos tão-somente após a audiênciaprévia do interessado;

IV - nas Decisões pela ilegalidade, diligência ou legalidade, com correçãoposterior, que representem qualquer espécie de prejuízo aointeressado ou redução dos proventos/vencimentos, o Tribunalpoderá determinar a inclusão de um item adicional à Decisão no

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sentido de cientificar o interessado sobre a possibilidade de oferecerpedido de reexame, com efeito suspensivo da Decisão, no prazo de30 (trinta) dias, contados da ciência da mesma, na forma doRegimento Interno, aprovado pela Resolução nº 38/90.

14. O Ministério Público, a par de comungar com boa parte dasidéias defendidas pela Inspetoria, entende ser oportuno esmiuçar asquestões levantadas.

15. Em um primeiro instante, quer parecer a esse órgão ministerialque as duas posições levantadas pela Inspetoria, no que tange à necessidadeou não da observância do contraditório e da ampla defesa, existentes noSupremo Tribunal Federal, antes de serem excludentes, devem tertratamento que busque integração. Para esse Parquet sempre será necessáriaa obediência aos citados princípios, eis que derivados da própriaConstituição. Entretanto, mister se faz identificar o instrumento pelo qualse presta tal obediência. Veja-se.

Do contraditório e da ampla defesa

16. As garantias constitucionais do contraditório e ampla defesasão indissociáveis, caminhando paralelamente no processo administrativoou judicial. Estão, também, intimamente ligadas ao princípio do devidoprocesso legal (due process of law), pois não há como se falar em devidoprocesso legal sem a outorga da plenitude de defesa (direito de defesa técnica,direito à publicidade dos atos processuais, direito à citação, direito à produçãode provas, direito de recurso, direito de contestação etc.).

17. Por ampla defesa, deve-se entender o direito que é dado aoindivíduo de trazer ao processo, administrativo ou judicial, todos os elementosde prova licitamente obtidos para provar a verdade, ou até mesmo de omitir-se ou calar-se, se entender devido. Por sua vez, pelo princípio do contraditório,tem o indivíduo de tomar conhecimento e contraditar tudo o que é levadopela parte adversa ao processo.

A utilização dos princípios no processo de concessão

18. No caso de processos que envolvam concessões deaposentadorias, pensões ou reformas, cabe analisar como o contraditório ea ampla defesa devem ser obedecidos.

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19. A atuação do Tribunal de Contas pode ser considerada bifásica:uma, quanto recomenda apenas saneamento do processo; outra, quando, defato, esmiúda o mérito.

20. Nessa arbitrariamente chamada primeira fase, não há que falarrealmente em defesa prévia, assim como posiciona-se a Inspetoria, ancoradaem uma vertente do Supremo Tribunal Federal. Contudo, não se pode chegarao extremo de soçobrar os princípios constitucionais.

21. Ocorre que em fase de saneamento, ainda não há defesa a serfeita, eis que os autos ainda não estão conclusos para análise do mérito.Antes, o julgador-relator determina que aos autos sejam carreadosdocumentos/explicações que irão subsidiar a tomada de decisão. Assim,postular defesa prévia nessa fase não faz sentido, porque o defendente sequersabe se sua pretensão ( a concessão requerida) logrará o êxito esperado.Veja-se, a propósito, o artigo 197, § 4º, do Regimento Interno desse Tribunal,in verbis: “§ 4º Saneado o processo, será a matéria submetida à apreciação doPlenário, para decisão do mérito” (grifou-se).

22. Por outro lado, mesmo nesse caso não se deve abandonar ocontraditório ou a ampla defesa. Em realidade, esses princípios estariamsendo obedecidos desde que, ao determinar diligência, o interessado fossecientificado daquilo que ainda sente-se ausência nos autos. Note-se que aaudiência da jurisdicionada é imperativa. De fato, cientificando-se ointeressado, este poderá, de própria mão, suprir as carências do processo,sem que isso, repise-se, signifique defesa, porquanto o mérito ainda nãofoi verificado.

23. Tal sistemática, a de cientificação compulsória do interessado,garante-lhe o atendimento aos princípios advindos da Carta Magna. Nisso,portanto, difere esse órgão ministerial da Inspetoria. Em realidade, não éque sejam dispensáveis o contraditório e a ampla defesa nos processossujeitos ainda à apreciação do Tribunal. Tais princípios devem, sim, serobservados, mas de forma mitigada.

24. Mutatis mutandis, é o que se observa no processo civil. O juiz,antes de proferir a sentença de mérito, pode, por meio de simples despacho,determinar diligências necessárias à instrução escorreita do processo, semque as partes tenham o direito de interpor recurso. Entretanto, ainda assim,os princípios do contraditório e da ampla defesa são observados, a partir

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do momento em que há a intimação dos interessados, para que façam oudeixem de fazer alguma coisa (artigo 234, do CPC).

25. De notar que a cientificação do interessado nessa fase preliminartorna-se importante, porquanto daí podem advir conseqüências gravosas,que poderiam ser evitadas.

26. Foi com base nessa doutrina, que o Supremo TribunalFederal, no HC 84.009, decidiu que, mesmo durante o inquérito policial,o indiciado tem direito à vista dos autos antes da data designada para asua inquirição.

27. Em suma: na fase de diligências, não há que falar ainda emrecurso ou defesa prévia, mas necessariamente deve-se cientificar ointeressado dos atos e termos dos autos, resguardando, assim, ocontraditório e a ampla defesa.

Do mérito e do recurso com efeito suspensivo

28. Quando se adentra no mérito da concessão em si, ou seja,quando se deve verificar o direito do interessado propriamente dito, torna-se importante verificar a forma de como conceber a observância docontraditório e da ampla defesa.

29. No processo administrativo em geral (art. 61 da Lei nº9.784/99, recepcionada no DF por força da Lei nº 2.834/01), o recursocontempla apenas o efeito devolutivo, só excepcionalmente o efeitosuspensivo. No processo de concessão, a lógica se inverte, pois o efeitosuspensivo é regra (art. 47 - LC nº 01/94). Daí advém a constatação daInspetoria pela desnecessidade de defesa prévia, porquanto, interpondo orecurso, automaticamente cessam-se os efeitos da decisão do Tribunal queimponha ao interessado prejuízos. A utilização de defesa prévia resultariaem mais um recurso, sem previsão legal, portanto, inaceitável.

30. Outra questão que se impõe, quanto à análise do mérito, dizrespeito ao momento em que se dá o ato que causa prejuízo aointeressado. Nas concessões já chanceladas pelo Tribunal, há claranecessidade de audiência prévia do interessado, eis que o ato já estáacabado e completo. Naquelas ainda pendentes de registro, deve-seencarar o pedido de reexame como instrumento adequado à defesadaqueles princípios.

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Do litígio em processos de concessão

31. A digna Inspetoria releva em sua análise que os princípios docontraditório e da ampla defesa não devem ter aplicação imediata, massomente em casos que pressupõem litígio ou contencioso, o que não ocorrecom os processos de aposentadorias, pensões e reformas. Tal assertivamerece, entretanto, cuidados maiores.

32. Na terminologia jurídica, segundo De Plácido e Silva1, lidedesigna a demanda ou a questão forense ou judiciária, em que as partescontendoras procuram mostrar e provar a verdade em razão de seu direito.Ou, na clássica definição de Carnelutti, lide é o conflito de interessesqualificado por uma pretensão resistida ou insatisfeita.

33. Assim, quando a jurisdicionada acolhe a pretensão do servidore o Tribunal a ela opõe-se, afigura-se o litígio, pois a Corte estaria resistindoà pretensão do servidor, causando conflito, conforme o conceito formuladopelo notório processualista.

Da segurança jurídica

34. O princípio da segurança jurídica tem servido como escudopara perpetuação de situações nem sempre condizentes com a legalidade.Tal fato ocorre pela longa tramitação que os processos, não raro, sofrem.

35. Por esse motivo, esse Ministério Público salienta, uma vez mais,a necessidade de cientificar o interessado sobre providências requeridas peloTribunal, no que tange à concessão. Esse procedimento, a par de salvaguardaro direito do servidor de saber o que se passa com seu pedido (daí atendidosos princípios do contraditório e da ampla defesa, com as nuanças apresentadasalhures), possibilitaria esmorecer a tese da segurança jurídica baseada somenteem antigüidade da concessão.

Da conclusão

36. Feitas as considerações acima, o Parquet acolhe as sugestõesapresentadas pela Inspetoria, com o adendo de que a Corte deva, doravante,notificar o servidor/interessado, em decisões que visem ao saneamento dos

1 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 23. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2003, p. .847

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autos, para permitir-lhe suprir as carências do processo, sem que issosignifique apresentação de defesa prévia.

É o parecer.

Processo n° 2.093/2004Parecer n° 660/2004*

*Ver decisão n° 5.232/2004

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CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS TERCEIRIZADOS PARA

SUBSTITUIÇÃO DE SERVIDORES

Juliano Ricardo de Vasconcellos Costa CoutoAssessor Jurídico do TCDF

Aplicação das Resoluções nº 119/2000 e nº 139/2001.Extinção dos cargos de Técnico em Administração Pública B –Reprografia. Contratação dos serviços terceirizados parasubstituição dos servidores. Impossibilidade de extinção de cargoocupado. Inteligência do parágrafo único do art. 3º da Resoluçãonº 119/2000 deste TCDF.

Tratam os presentes autos da Representação nº 83 da Divisão deServiços Gerais, conforme fls. 1 a 3 dos autos. Referida representação teveinício por conta do contido no Plano Setorial de Ação/2003 deste TCDF.Consta ainda dos autos, às fls. 4 a 10, estudo da Seção de Documentação,respaldada pela documentação de fls. 11 a 49, onde há registro dos custosda reprografia, com descrição de diversas situações, entre as quais a deterceirização total dos serviços.

Posteriormente o processo foi enviado à Seção de Cadastro Funcionalque decidiu pelo encaminhamento dos autos à Seção de Legislação de Pessoalpara que analisasse os aspectos legais e doutrinários da proposta.Devidamente analisado o SLP entendeu que diante da:

impossibilidade e inviabilidade de realização de novo concurso(cargos em processo de extinção), juntamente com o fato de haverconsiderável aumento da demanda, implicam a inevitável terceirizaçãodesses serviços, até mesmo pelo princípio da continuidade dosserviços públicos, que não podem ficar aguardando a vacância detodos os cargos de reprografia para ser terceirizada.

A SLP abordou, inclusive, o fato de que os servidores poderiam seraproveitados, após a terceirização, para exercer a fiscalização dos serviçosou até mesmo a execução dos contratos. Conclui que é possível a terceirizaçãodos serviços e sugere a realização de estudos para aproveitamento dos atuaisservidores. A DRH e a DGA caminharam no mesmo sentido.

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É o relatório. Não há dúvida de que o TCDF já declarou que os cargos de Técnico

de Administração Pública – B – Reprografia são desnecessários, nos termosdo Anexo I da Resolução nº 139, de 4 de dezembro de 2001.

Nesse sentido, temos como certo que a declaração de desnecessidadeconjugada com a contratação de mão de obra terceirizada para exercer orespectivo ofício autoriza o Presidente a promover a extinção dosmencionados cargos efetivos, nos termos do art. 3º da Resolução nº 119, de18 de outubro de 2000.

Ocorre que não basta a conjugação dessas duas situações para quese promova a extinção do cargo. Conforme determinação do parágrafo únicodo mencionado art. 3º “os cargos ocupados somente serão objeto de extinçãoapós a respectiva vacância”.

Consta dos autos, fls. 50 e 51, que todos os 6 (seis) cargos dos serviçosde reprografia estão ocupados pelos servidores ali mencionados. Nessesentido, em respeito ao disposto no parágrafo único do art. 3º da Resolução,há que se aguardar a vacância dos cargos para promover sua extinção.

A terceirização dos serviços não encontra nenhum óbice, podendoocorrer de forma que não comprometa a atividade dos atuais servidores atéa vacância de seus cargos. Por conta da manutenção de suas atividades, nãohá que se falar em realização de estudos para aproveitamento dos mesmos,até mesmo porque seus cargos não podem ser extintos enquanto não houvera respectiva vacância.

Não obstante, tendo em vista o já identificado aumento da demandapelos serviços de reprografia e a impossibilidade de criação de novos cargosnessa Seção, deve ser iniciada a terceirização dos serviços até mesmo pornão constituir-se em atividade fim desta Corte de contas. Referidaterceirização deve continuar e aumentar conforme a vacância dos cargos detécnico de reprografia, na proporção de sua necessidade.

Registre-se que essas observações foram efetuadas pela SLP quandode sua manifestação às fls. 79, item 11, registrando que o TCU, de formareiterada, “não admite a terceirização se existir no quadro de pessoal doórgão um único cargo com atribuições idênticas às passíveis de terceirização”.Não há dúvida de que referido entendimento visa a afastar possível desviode função ou até mesmo ociosidade do servidor, cautela que deve ser adotadapor este TCDF.

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Ademais, não há dúvida de que os serviços de reprografia são muitoespecíficos, não havendo que se falar, infelizmente, em aproveitamentoem outro cargo ou função. É esse o entendimento adotado pelo STF, nosentido de que não há a possibilidade de provimento de cargo público sem orespectivo concurso, nem mesmo por meio do aproveitamento, senão vejamos:

ADI 637/MA–Maranhão Relator(a): Min. Sepúlveda PertenceJulgamento: 25/08/2004 Órgão Julgador: Tribunal PlenoDJ DATA-01-10-2004 PP-09 EMENT VOL-02166-01 PP-47REQTE: Procurador-Geral da RepúblicaREQDO: Assembléia Legislativa do Estado do MaranhãoEmenta: 1. Concurso público: não mais restrita a sua exigência

ao primeiro provimento de cargo público, REPUTA-SE OFENSIVADO ART. 37, II, CF, TODA MODALIDADE DE ASCENSÃO DECARGO DE UMA CARREIRA AO DE OUTRA, A EXEMPLODO “APROVEITAMENTO” E “ACESSO” de que cogitam asnormas impugnadas (§§ 1º e 2º do art. 7º do ADCT do Estado doMaranhão, acrescentado pela EC 3/90).

2. Processo legislativo dos Estados-membros: absorçãocompulsória das linhas básicas do modelo constitucional federal - entreelas, as decorrentes das normas de reserva de iniciativa das leis -, dadaa implicação com o princípio fundamental da separação e independênciados Poderes: jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal.

3. Processo legislativo: reserva de iniciativa do Poder Executivopara legislar sobre matéria concernente a servidores públicos daadministração direta, autarquias e fundações públicas.

Votação:Unânime. Resultado: Procedente.

Acórdãos citados: ADI-88 (RTJ-175/387), ADI-89 (RTJ-150/341), ADI-231 (RTJ-144/24), ADI-483, ADI-580;RTJ-115/18, RTJ-115/47, RTJ-124/883.ADI 2689/RN - Rio Grande do Norte Relatora: Min.ELLEN GRACIEJulgamento: 09/10/2003 Órgão Julgador: Tribunal PlenoDJ DATA-21-11-2003 PP-08 EMENT VOL-2133-03 PP-401AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PAR.

3º DO ART. 4º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 233/2002, DOESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. TRANSFERÊNCIAOU APROVEITAMENTO DE FUNCIONÁRIOS DESOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA ESTADUAIS EMLIQUIDAÇÃO PARA CARGOS OU EMPREGOS DEENTIDADES E ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICAESTADUAL. EXIGÊNCIA DO CONCURSO PÚBLICO. ART. 37,

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II DA CF. SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS. NORMAINTRODUZIDA POR EMENDA PARLAMENTAR. INICIATIVA DELEI RESERVADA AO PODER EXECUTIVO. VEDAÇÃO DEEMENDA QUE IMPORTE NO AUMENTO DA DESPESA PREVISTA.

A hipótese em questão não se encontra abarcada pelodisposto no art. 19, caput do ADCT, que só concedeu a estabilidadeexcepcional aos servidores públicos da administração direta,autárquica e das fundações públicas, ficando excluídos, dessa forma,os empregados das sociedades de economia mista. Conformesedimentada jurisprudência deste Supremo Tribunal, a vigenteordem constitucional não mais tolera a transferência ou oAPROVEITAMENTO como formas de investidura que importemno ingresso de cargo ou emprego público sem a devida realizaçãode concurso público de provas ou de provas e títulos. Precedentes:ADI nº 1.350, Rel. Min. Celso de Mello e ADI nº 231, Rel. Min.Moreira Alves. Inconstitucionalidade formal do dispositivoimpugnado, tendo em vista tratar-se de matéria atinente à organizaçãodo regime de pessoal do Estado, ocupando-se de tema de interessede setor específico do funcionalismo estadual, cuja elaboraçãonormativa, sem a iniciativa do Governador, afronta a reservalegislativa àquele atribuída pelo art. 61, § 1º, II, c, da CF. Precedente:ADI nº 805, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. Ação direta deinconstitucionalidade julgada procedente. Votação: unânime.Resu l tado : procedente a Ação Dire ta para dec larar ainconstitucionalidade do § 3º do art. 4º da Lei Complementarnº 233, de 17/04/2002, do Estado do Rio Grande do Norte.

Registre-se ainda que a proibição de aproveitamento de servidorde um cargo em outro não é absoluta, havendo situações em que oinstituto pode ser aplicado, desde que as atribuições dos cargos sejamsemelhantes, vejamos:

ADI 2335/SC-Santa Catarina Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊAJulgamento: 11/06/2003 Órgão Julgador: Tribunal PlenoDJ DATA-19-12-2003 PP-049 EMENT VOL-02137-02 PP-231EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade.

2. Lei Complementar nº 189, de 17 de janeiro de 2000, doEstado de Santa Catarina, que extinguiu os cargos e as carreiras deFiscal de Tributos Estaduais, Fiscal de Mercadorias em Trânsito,Exator e Escrivão de Exatoria, e criou, em substituição, a de AuditorFiscal da Receita Estadual.

3. Aproveitamento dos ocupantes dos cargos extintos nosrecém criados.

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4. Ausência de violação ao princípio constitucional da exigência deconcurso público, haja vista a similitude das atribuições desempenhadaspelos ocupantes dos cargos extintos.

5. Precedentes: ADI 1591, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ de16.6.2000; ADI 2713, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 7.3.2003.

6. Ação julgada improcedenteVotação: por maioria, vencidos os Mins. Maurício Corrêa(Relator) e Carlos Velloso, que julgavam a ação procedente.Resultado: improcedente.REQTE.: Partido Popular Socialista - PPSADVDO.: Moacir Antônio Machado da SilvaREQDO.: Governador do Estado de Santa CatarinaREQDO.: Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina

O aproveitamento dos servidores pode e deve ocorrer dentro dospróprios serviços de reprografia, até mesmo como executores do contratose ou coordenadores das atividades. Não há dúvida também de que referidosservidores podem ser requisitados para trabalhar em outras seções doTCDF, com as atribuições respectivas, mantendo, no entanto, o cargo parao qual foi nomeado.

Por derradeiro, não há óbice para que se efetive a terceirização parcialdos serviços de reprografia, mantendo os atuais servidores naquela Seção.No entanto, tendo em vista o disposto no Parágrafo Único do art. 3º daResolução nº 119/2000 deste TCDF, opina esta Consultoria, com fulcronas razões aqui expendidas, no sentido de que os cargos ocupados, jádeclarados desnecessários, só poderão ser objeto de extinção após suavacância. Nessa oportunidade caberá à Presidência enviar à CLDF orespectivo projeto de Lei, conforme determina o inc. V do art. 4º da LeiOrgânica deste TCDF.

Processo nº 2.167/2003Parecer nº 15/2005

PARECER Nº 15/2005-CJP (Complementação)

Submeto o presente processo à elevada consideração superior daEgrégia Presidência, com a inclusa manifestação desta Consultoria Jurídica,consubstanciada neste Parecer do ilustre Assessor Jurídico, Dr. Juliano

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Ricardo de Vasconcellos Costa Couto, no sentido de que não se vislumbreóbice legal, à terceirização parcial dos serviços de reprografia, mas semdesperdiçar a força de trabalho dos servidores efetivos remanescentes, cujoscargos serão passíveis de extinção com a superveniente vacância. A relotaçãodesses servidores, inclusive para exercer funções diversificadas, dependeráda conveniência administrativa, em cada caso, sendo vedado o desvio dasatribuições inerentes a seus cargos. Logo, implementada a terceirização, opessoal contratado, nos limites do necessário, iria flutuar para mais, a medidaque se vagarem os cargos técnicos remanescentes.

Ao Gabinete da Presidência.

Sebastião Baptista AffonsoConsultor Jurídico do TCDF

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APOSENTADORIA

Luzia Olinda Bastos Cavalcante de Alencar Assessora Jurídica do TCDF

Revisão de proventos com fundamento no art. 190 da Leinº 8.112/90. Impossibilidade. Inteligência das Súmulas 359 do STFe 21 do TCDF. Revogação tácita do citado dispositivo pela EC41/2003. Isenção do imposto de renda mediante apostilamento.

Aprecia-se nos autos o requerimento do ex-servidor deste TribunalAntônio, no qual solicita a integralização de seus estipêndios, em razão de tersido acometido de doença especificada em lei, de acordo com o que estabeleceo art. 190 da Lei nº 8.112/90. Requer, também, a isenção do imposto derenda, diante do permissivo contido no art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713, de22/12/88, com a redação dada pela art. 47, da Lei nº 8.541, de 23/12/92.

2. A Seção de Cadastro Funcional, na Informação nº 345/04(fls.96), registra que o requerente foi aposentado com proventosproporcionais ao tempo de serviço (30/35), no cargo de Técnico deAdministração Pública - B, Classe Especial, Padrão III, mediante a Portarianº 164/93 (fls.13), e que seus proventos foram revistos, posteriormente,pela Portaria nº 195/95 (fls.60), para inclusão da vantagem prevista no art.62, da Lei nº 8.112/90 (quintos).

3. Informa, a SCF que segue junto ao requerimento examesmédicos que comprovam ser o inativo portador de doença especificada em lei.

4. Consta às fls. 99, Laudo Médico elaborado pela Junta MédicaOficial, constituída por profissionais deste Tribunal, que atesta ser o ex-servidor portador de neoplasia maligna.

5. Segue instrução da Seção de Legislação de Pessoal (fls.102/108), informando que o interessado passou para a inatividade com base noart. 41, inciso III, alínea c, da Lei Orgânica do DF c/c o art. 186, inciso III,alínea c, da Lei nº 8.112/90. Assim, estando o mesmo acometido de doençaespecificada em lei, entende que lhe assiste o direito à isenção fiscal previstana legislação específica e a integralização de seus proventos, consoante dispõe

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o art. 190 da Lei nº 8.112/90, que, a seu juízo, continua a vigorar apesar dareforma efetuada na seguridade social do servidor público, levada a cabopelas Emendas Constitucionais nº 20/98 e 41/2003.

6. Quanto ao cálculo dos proventos, considerando que o fatogerador da revisão ocorreu após a edição das citadas Emendas, compreendeo digno signatário que ele estaria, a princípio, subordinado ao que prescreveo art. 40, § 1º, I, e §§ 3º e 17 da Constituição Federal, com a redação dadapela EC nº 41/03, que rezam:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União,dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suasautarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de carátercontributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo entepúblico, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas,observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuariale o disposto neste artigo.

§ 1º Os servidores abrangidos pelo regime de previdência deque trata este artigo serão aposentados, calculados os seus proventosa partir dos valores fixados na forma dos §§ 3º e 17:

I - por invalidez permanente, sendo os proventosproporcionais ao tempo de contribuição, exceto se decorrente deacidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosaou incurável, na forma da lei;

..........................................(omissis)...............................................................§ 3º Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por

ocasião da sua concessão, serão consideradas as remuneraçõesutilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimesde previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei.

........................................(omissis).................................................................§ 17. Todos os valores de remuneração considerados para o

cálculo do benefício previsto no § 3° serão devidamente atualizados,na forma da lei.

7. No entanto, baseado no princípio jurídico do direito adquiridoinsculpido no art. 6º, § 2º da Lei de Introdução ao Código Civil e no art. 3º,caput,da EC nº 41/03, defende a tese de que o ex- servidor faz jus a ter seusnovos proventos calculados na forma da legislação pretérita (integrais), poisadmite que o citado princípio abrange tanto o exercício imediato do direito,quanto aquele que se sujeita a implementação de termo ou condição. Nocaso, esta condição seria o acometimento de doença qualifica em lei, previstono art. 190. Segundo sua teoria, ao se editar um ato de aposentadoria

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proporcional “está sendo constituído, automaticamente, um direitocondicional de integralizar os proventos, em caso do advento de um eventofuturo e incerto referente à aquisição de uma doença qualificada em lei....”.Além disso, registra que se for aplicada a nova fórmula de cálculo dosproventos o inativo será penalizado pela redução de seus estipêndios. Assim,nessa esteira de entendimento conclui pelo deferimento do pedido.

8. No mesmo sentido é o pronunciamento do Diretor da DRHvisto às fls.109/111, no que foi seguido pela ilustrada DGA (Informaçãonº 147/04 – DGA (AP)), que submeteu o assunto à consideração superior.

9. Pelo venerando despacho presidencial de fls. 112, in fine, estaConsultoria é honrada com a vista dos autos, para manifestação a respeitoda matéria nele tratada

10. É o relatório.11. A situação em foco, à primeira vista, nos remete à tese do direito

adquirido, posto que o inativo, aposentado desde 15/07/1993 pelo ato defls.13, registrado pelo Tribunal em 01/02/94, está protegido pelo que dispõeo referido princípio e pela própria Emenda Constitucional nº 41/2003 queresguardou todas as situações constituídas com base na legislação até entãovigente. De fato, a situação jurídica cristalizada no ato que o passou para ainatividade constitui ato jurídico perfeito, consumado segundo as regrasvigentes ao tempo em que se efetuou, estando, portanto, fora do alcancedas novas regras para as aposentadorias trazidas pelas EC nº 20/98 e EC nº41/03, exceto, quanto ao teto de remuneração e ao desconto previdenciário,porque oriundos de normas expressamente direcionadas aos inativos pelaEC nº 41/2003.

12. Ocorre, porém, que o pedido de revisão de proventos emfoco, tem como fato gerador o acometimento do inativo por moléstiaqualificada em lei, já na vigência do novo sistema previdenciário do servidorpúblico, como se observa no Laudo Médico de fls.99, datado de 24/08/2004.Tal revisão implica, além da integralização dos estipêndios, a alteração dalegislação que fundamentou o ato inicial de aposentadoria, constituindo,ao final, novo ato sujeito à apreciação deste Tribunal. Portanto, trata-se denova concessão e como tal deve ser examinada, com base nos preceitosda EC nº 41/2003, observando-se o que estabelecem o Enunciado 359das Súmulas de Jurisprudência do STF e o 21 das Súmulas deste Tribunal,a seguir transcritas:

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Enunciado 359 do STF

Ressalvada a revisão prevista em lei, os proventos da inatividaderegulam-se pela lei vigente ao tempo em que o militar, ou o servidor civil,reuniu os requisitos necessários.

Enunciado 21 do TCDF

Os atos de aposentadoria e os de reforma, bem como os de revisãodos proventos, regem-se pela lei do tempo em que se verificarem ospressupostos da concessão ou da revisão.

13. O princípio tempus regit actum fixado nesses enunciados, quealbergam a essência do princípio do direito adquirido, está também inseridono caput, do art. 3º, da EC 41/03, do seguinte teor:

Art. 3º É assegurada a concessão, a qualquer tempo, deaposentadoria aos servidores públicos, bem como pensão aos seusdependentes, que, até a data de publicação desta Emenda, tenhamcumprido todos os requisitos para obtenção desses benefícios,com base nos critérios da legislação então vigente. (grifamos)

14. Assim, não há como se invocar direito adquirido quanto aoregime jurídico vigente na data da aposentadoria, posto que em consonânciacom aqueles verbetes e a legislação citada, esta garantia é quanto à inativaçãoe não a posteriores revisões no valor dos proventos, salvo aquela que dizrespeito à paridade prevista no art. 40, § 17 da Constituição Federal, naredação dada pela EC nº 41/03.

15. Esta conclusão está de acordo com o entendimento firmadopelo Supremo Tribunal Federal a respeito da matéria, conforme se observanos Acórdãos relativos ao RE nº 159.196-0, publicado no DJ de 22/9/95 (fls.113/121) e ao RE nº 278.718-3, publicado no DJ de 14/6/2002(fls.122/127), cujas ementas rezam:

RE nº 159196-0EMENTA: SERVIDOR ESTADUAL. PROVENTOS.

VINCULACÃO. ENQUADRAMENTO EM NOVO PLANODE CARREIRA. AUSÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO.SUMULA 359. Não pode o servidor invocar a garantia do direitoadquirido para reivindicar a percepção de proventos segundo osistema vigorante ao tempo da inativação. A Sumula 359 tratada reunião dos requisitos necessários para regular os proventosda inatividade, e não de ulteriores revisões do valor do estipêndio.Recurso extraordinário conhecido e provido.

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RE nº 278.718-3EMENTA: - Recurso extraordinário. Revisão de benefício

previdenciário. Decreto 89.312/84 e Lei 8.213/91. Inexistência,no caso, de direito adquirido. - Esta Corte de há muito firmou oentendimento de que o trabalhador tem direito adquirido a,quando aposentar-se, ter os seus proventos calculados emconformidade com a legislação vigente ao tempo em quepreencheu os requisitos para a aposentadoria, o que, no caso,foi respeitado, mas não tem ele direito adquirido ao regimejurídico que foi observado para esse cálculo quando daaposentadoria, o que implica dizer que, mantido o quantum daíresultante, esse regime jurídico pode ser modificado pelalegislação posterior, que, no caso, aliás, como reconhece opróprio recorrente, lhe foi favorável. O que não é admissível,como bem salientou o acórdão recorrido, é pretender beneficiar-se de um sistema híbrido que conjugue os aspectos maisfavoráveis de cada uma dessas legislações. Recursoextraordinário não conhecido.

16. E foi nessa jurisprudência que o Tribunal de Contas da Uniãofundamentou as decisões que consideraram ilegais as integralizações deproventos examinadas nos Procs. nº 002.972/2004-0 (fls. 128/131) e nº002.976/2004-0 (fls.132/135), fundamentadas no art. 182, alínea b, da Leinº 1.711/52 e no art. 190, da Lei nº 8.112/90, respectivamente. Em ambasas concessões, o fato gerador das alterações verificou-se após a ediçãode legislação modificando o regime jurídico dos interessados, passando-os do RJU para o Regime Geral de Previdência. Dessa forma, o TCUentendeu não haver direito à revisão com base na legislação pretérita, porquejá revogada, caso que não se aplica a Súmula 359 do STF, por se tratar derevisão de proventos.

17. O mesmo entendimento cabe ao caso em apreço. O art. 190,da Lei nº 8.112/90, que garantia a integralidade dos proventos nos casos daespécie, em confronto com as novas regras impostas para as aposentadoriapelo art.40, § 1º, inciso I e § 3º da Constituição Federal, na redação dadapela EC nº41/2003 c/c o art. 1º, da Lei nº 10.887, de 18/6/2004, pareceestar derrogado.

18. Consoante se depreende da leitura desses dispositivos, a partirde então, os proventos serão calculados com base nas remuneraçõesutilizadas como referência para as contribuições. Prescreve a lei que, nasaposentadorias decorrentes de invalidez permanente, eles deverão ser

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proporcionais ao tempo efetivamente contribuído; já nas motivadas poracidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ouincurável, deverão observar a forma da lei. Essa fórmula encontra-se descritano art. 1º , da Lei nº 10.887, de 18/6/2004, que dispõe sobre a aplicaçãode disposições da Emenda Constitucional 41, de 19 de dezembro de 2003,altera dispositivos das Leis nº 9.717, de 27 de novembro de 1998, nº 8.213,de 24 de julho de 1991, 9.532, de10 de dezembro de 1997, e dá outrasprovidências, que estabelece:

Art. 1º No cálculo dos proventos de aposentadoria dosservidores titulares de cargo efetivo de qualquer dos Poderes daUnião, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídassuas autarquias e fundações, previsto no § 3º do art. 40 daConstituição Federal e no art. 2º da Emenda Constitucional nº 41,de 19 de dezembro de 2003, será considerada a média aritméticasimples das maiores remunerações, utilizadas como base para ascontribuições do servidor aos regimes de previdência a que estevevinculado, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo operíodo contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde ado início da contribuição, se posterior àquela competência.

§ 1º As remunerações consideradas no cálculo do valor inicialdos proventos terão os seus valores atualizados mês a mês de acordocom a variação integral do índice fixado para a atualização dossalários-de-contribuição considerados no cálculo dos benefícios doregime geral de previdência social.

§ 2º A base de cálculo dos proventos será a remuneração doservidor no cargo efetivo nas competências a partir de julho de 1994em que não tenha havido contribuição para regime próprio.

§ 3º Os valores das remunerações a serem utilizadas no cálculode que trata este artigo serão comprovados mediante documentofornecido pelos órgãos e entidades gestoras dos regimes deprevidência aos quais o servidor esteve vinculado ou por outrodocumento público, na forma do regulamento.

§ 4º Para os fins deste artigo, as remunerações consideradasno cálculo da aposentadoria, atualizadas na forma do § 1º deste artigo,não poderão ser:

I - inferiores ao valor do salário-mínimo;II - superiores ao limite máximo do salário-de-contribuição,

quanto aos meses em que o servidor esteve vinculado ao regimegeral de previdência social.

§ 5º Os proventos, calculados de acordo com o caput desteartigo, por ocasião de sua concessão, não poderão ser inferiores ao

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valor do salário-mínimo nem exceder a remuneração do respectivo servidorno cargo efetivo em que se deu a aposentadoria.

19. Como se vê, apesar de o novo sistema manter a chamada“aposentadoria qualificada”, seus proventos estão sujeitos à regra domencionado dispositivo legal, que até possibilita alcançar a totalidade daremuneração do servidor, desde que satisfeitas aquelas condições. Diantedisso, poder-se-ia afirmar, numa interpretação mais ousada, que o benefícioprevisto no art. 190, da Lei nº 8.112/90 não foi acolhido pela legislação queefetuou a reforma previdenciária no setor público, haja vista ser conflitantecom o caráter contributivo do novo sistema.

20. Por fim, convém registrar, que o Tribunal Regional do Trabalhoda 10ª Região adotou entendimento divergente, consoante se verifica nacópia das Decisões juntadas às fls.136/155, concedendo a servidores daqueleórgão a integralização de proventos de que se cuida, ao argumento de quetendo o interessado se afastado ainda sob a égide do ordenamento precedente,a revisão de proventos da espécie não constitui nova aposentadoria, massimples adequação dos proventos daquela já conquistada no antigo sistemaprevidenciário. Todavia, considerando os precedentes do STF e do TCUaqui apontados, e o cunho administrativo das decisões em foco, ainda sujeitasao crivo do Tribunal de Contas da União para seu aperfeiçoamento, nãoforam consideradas, neste parecer, como referência jurisprudencial.

21. Assim, não sendo possível a integralização dos proventos, elesdevem permanecer inalterados para que não haja prejuízo ao interessado,procedendo-se, apenas, a suspensão do desconto do imposto de renda, deacordo com a autorização contida no art. 6º, inciso XIV, da Lei nº 7.713/88,com a redação do art. 47, da Lei nº 8.541/92, que dispõe:

Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguinterendimentos percebidos por pessoas físicas:

.........................................................................................................................XIV - os proventos de aposentadoria ou reforma, desde que

motivadas por acidente em serviços, e os percebidos pelos portadores demoléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose-múltipla,neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante,cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante,nefropatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante),contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, combase em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenhasido contraída depois da aposentadoria ou reforma;”

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22. Diante do exposto, e lamentando discordar dosposicionamentos anteriores, sugere-se o atendimento parcial do pedido, nosseguintes termos:

1) deferimento da isenção do imposto de renda, na forma autorizadapelo art. 6º, XIV, da Lei nº 7.713, de 22/12/88, com a redação dadapela art. 47, da Lei nº 8.541, de 23/12/92, mediante apostilamento,consoante determina a parte final do Enunciado 48, das Súmulasde Jurisprudência deste Tribunal;

2) pelo indeferimento da integralização dos proventos do inativo, combase no art. 190, da Lei nº 8.112/90, pois considerando o dispostonos Enunciados das Súmulas 359 do STF e 21 deste Tribunal, arevisão de proventos regula-se pelas leis vigentes na data do fatogerador do benefício.

É o parecer, sub censura.

Processo nº 3.720/1993Parecer nº 65/2004

PARECER Nº 65/2004-CJP (Complementação)

Submeto o presente processo à elevada consideração superior, com ainclusa manifestação desta Consultoria Jurídica, consubstanciada nesteParecer da ilustre Assessora Jurídica, Drª. Luzia Olinda Bastos Cavalcantede Alencar, no sentido de deferir-se a isenção doravante do Imposto deRenda na fonte pagadora e indeferir-se a integralização dos proventos, porqueo disposto no art. 190, da Lei nº 8.112/90, tornou-se incompatível com anova sistemática do Plano de Seguridade do Servidor, implantado pelaEmenda Constitucional nº 41 de 2003, que o derrogou.

Ao Gabinete da Presidência.Sebastião Baptista Affonso

Consultor Jurídico do TCDF

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CONVÊNIO PARA CONSIGNAÇÃO EM FOLHA E

PAGAMENTO DE REMUNERAÇÃO/PROVENTOS

Rodrigo Simões FrejatAssessor Jurídico do TCDF

Vêm os autos a esta Consultoria, pelo venerando despachopresidencial de fls. 57, para manifestação acerca do requerimento do Bancodo Brasil (fls. 01), onde pretende celebrar convênio para concessão deempréstimos pessoais aos funcionários do TCDF, mediante débito emconta corrente.

Afirma o requerente que o convênio permitirá o oferecimento de linhasde crédito em condições mais favoráveis do que as hoje existentes no mercado.Para tanto, apresentou três propostas, sendo a primeira (A) para pagamentosde salários e fornecedores por conta de terceiros (fls. 24/26); a segunda (B)para disponibilização de informações relativas a contracheques em terminaisde auto-atendimento e internet, para usuários correntistas do banco (fls.27/29) e a terceira (C) para concessão de empréstimos, financiamentos e/ou arrendamentos mercantis, com pagamento mediante consignação emfolha de pagamento, aos servidores vinculados ao TCDF (fls. 30/35).

Os órgãos instrutivos da Casa manifestaram-se a favor do pagamentode salários, contido na proposta (A), rejeitaram a proposta (B) e acataram aproposta (C), fazendo, no entanto, observações pertinentes, apresentando aminuta de fls. 44/52, que passamos a analisar.

A minuta em questão se apresenta em ordem. Contudo, temos algumasobservações, as quais nos parecem pertinentes, para melhor compreensão.

Inicialmente, de acordo com o Manual de Redação Oficial do TCDF,os parágrafos devem ser indicados pela abreviatura “§”, salvo se houverapenas um, que será designado por “parágrafo único”. Deste modo, deveser alterada a redação constante da minuta.

Quanto ao Título I, o “Parágrafo Terceiro” da Cláusula Quarta,permite que o Tribunal institua taxa ou preço público a ser cobrado doBanco, pelos serviços prestados. Ao TCDF não é dado instituir tributo ou

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preço público. Sugerimos, então, que conste do parágrafo que a Corte podeser ressarcida de eventuais gastos com taxas ou tarifas, cobradas em virtudedo uso de instalações pelo banco.

A Cláusula Sexta prevê que o servidor ou seu sucessor deverácomunicar ao banco, previamente, se ocorrer vacância ou afastamento semremuneração. Existem hipóteses em que não há possibilidade de comunicaçãoprévia, como no caso da sucessão. Sugerimos, portanto, que a Cláusula sejasuprimida, bem assim seu parágrafo único, pois a insuficiência da margemconsignável é calculada pelo próprio TCDF, como consta dos §§ 1º e 2º, daCláusula Quarta.

Já a Cláusula Sétima e seu parágrafo único também devemser suprimidos, pois a representação do TCDF é feita pelos executoresdo Convênio.

Seria conveniente retirar da Cláusula Oitava a previsão de tolerânciadas partes, em razão do princípio da legalidade administrativa.

No Título II, as Cláusulas Décima Segunda e Décima Terceiraafirmam que os servidores do quadro do TCDF terão/manterão contascorrentes para fins de percepção de salário, em contrariedade à CláusulaTerceira, do Título I, que expressamente prevê não ser exigível a aberturade conta corrente.

Seria de cautela suprimir o caput da Cláusula Décima Sexta, pois, casocontrário, o Tribunal estará atraindo para si ações judicias e, no §1º da citadaCláusula, sugerimos retirar a isenção de responsabilidade do Banco, pelomesmo motivo aqui apontado. Quanto ao § 2º, pode ser suprimido, umavez que as normas ali citadas já constam como integrantes do Convênio.

A Cláusula Décima Sétima ficaria com redação mais apropriadaao termo, se constasse que “caberá ao CONVENENTE (Tribunal) aentrega de aviso....”.

Como o convênio é feito entre o TCDF e o Banco do Brasil, édesnecessário constar que a movimentação da conta corrente e acesso aosserviços do Banco se darão de acordo com os critérios e parâmetros deste,como consta da Cláusula Décima Nona, uma vez que o correntista, quandoabre a conta no banco, assina um contrato que já trata do assunto.

É desnecessário o § 2º da Cláusula Vigésima, por já estar implícito no§ 1º, que deve passar a ser o caput da Cláusula, pois inexistente.

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Os §§ 1º e 4º da Cláusula Vigésima Primeira podem ser suprimidos, seacrescentado ao caput da Cláusula a antecedência mínima de 90 (noventa) dias.

O § 2º da citada Cláusula, depois de renumerado, já estará de acordocom a nova redação, enquanto o § 3º, que também deve ser renumerado,trata de assunto afeto, salvo engano, entre o servidor e o Banco, apenas,sendo também desnecessário consta no Convênio a expressa anuência dainstituição bancária.

Feitas essas considerações, lembramos, por oportuno, que o Convêniotem por escopo permitir que o servidor da Corte possa receber o pagamentopor banco conveniado, bem assim contrair empréstimo com desconto porconsignação em folha de pagamento. Deste modo, o instrumento de ajusteé para isso e não constituir direitos ou obrigações para os partícipes, nemtampouco para o servidor.

Finalmente, lembramos que, caso seja levado a termo o Convêniocom o Banco do Brasil, seria conveniente lembrar aos responsáveis pelainstituição que os servidores usuários dos serviços prestados merecemtratamento condizente com o horário de serviço, mormente por se tratar deum posto de atendimento. Ou seja, que o posto e a máquina de auto-atendimento funcionem também durante o período de recesso do Tribunal,quando existe plantão e servidores comparecem ao serviço normalmente.

Opina esta Consultoria Jurídica, portanto, no sentido de apresentar-se em boa ordem a minuta de Convênio, com as alterações aqui sugeridas.

É o parecer.À consideração superior.

Processo nº 1.661/2003P arecer nº 4/2005

PARECER Nº 4/2005-CJP (Complementação)

Submeto o presente processo à elevada consideração superior daEgrégia Presidência, com a inclusa manifestação desta Consultoria Jurídica,consubstanciada neste Parecer do ilustre Assessor Jurídico, Dr. RodrigoSimões Frejat, no sentido de apresentar-se em boa ordem o termo deconvênio sob exame, com as ressalvas apontadas. Instrumentos desta

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natureza se reservam a propiciar facilidades de atendimentos, mas não seprestam a criar ônus extravagantes para o Tribunal. As relações de índoleestritamente bancárias, devem se ater às partes nelas envolvidas, restandoao Tribunal assegurar a impenhorabilidade dos vencimentos. No casoespecífico do Posto de Atendimento do Banco ora conveniado, caberecomendar-lhe a necessidade de manter atendimento normal da sua clientela,sem interrupções que não sejam de caráter geral.

Isto o que nos parece, salvo melhor juízo.Ao Gabinete da Presidência.

Sebastião Baptista AffonsoConsultor Jurídico TCDF