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ISSN 1413-4969Publicação Trimestral

Ano XIII – Nº 2Abr./Maio/Jun. 2004

Brasília, DF

SumárioCarta da Agricultura

Plano Agrícola e Pecuário 2004/2005 ............................ 3

Comércio internacional de produtos agrícolas:Alca e OMC ................................................................ 17G. Edward Schuh

A evolução do complexo sojae a questão da transgenia ............................................. 26Sávio Rafael Pereira

Os impactos da Reforma Tributáriano setor agropecuário .................................................. 33Antônio Ernesto de SalvoGetúlio Pernambuco

Agricultura e transição ................................................. 41Sérgio Lafayette de Moraes

Fatores que induzem os ajustamentos dos produtores ... 53Maurinho Luiz dos Santos

Borracha natural:perspectivas para a safra 2004/05 ................................. 56Paulo Morceli

Tecnologia e resultado econômicodos produtores de açafrão em Mara Rosa, GO .............. 68Cássio Roberto Silva NoronhaNatan Fontoura da SilvaJosé Ferreira de Noronha

O pólo de fruticultura irrigadado norte e noroeste fluminense .................................... 78Antônio Salazar P. Brandão

Ponto de VistaDesafios do agronegócio: capital e conhecimento ........ 87Leonardo Vilela

Conselho editorialEliseu Alves (Presidente)

Carlos Nayro CoelhoElísio ContiniHélio Tollini

Antônio Jorge de OliveiraRegis Alimandro

Andres Troncoso VilasMauro Zanatta

Secretaria-geralRegina Vaz

Coordenadoria editorialMarlene de Araújo

Supervisão editorialEdson Junqueira Leite

Lucilene Maria de Andrade

Revisão de textoFrancimary de M. e Silva

Revisão de referênciasDauí Antunes Corrêa

Projeto gráfico e capaCarlos Eduardo Felice Barbeiro

Editoração eletrônicaCarlos Batalha

Foto da capaFeliciano de Araújo

Impressão e acabamentoEmbrapa Informação Tecnológica

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 20043

O Plano Agrícola e Pecuário 2004/05representa o reconhecimento do governo dopresidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre aimportância da agricultura e do agronegóciopara o País.

Em que pese a natural escassez derecursos e a multiplicidade das demandas dasociedade brasileira, a agricultura comercialterá R$ 39,45 bilhões, um aumento de 45%.

O Plano, ora lançado, é ambicioso nosresultados pretendidos e nas políticas definidas.É também parte importante da agenda dereformas econômicas conduzidas pelo governobrasileiro.

As medidas de política governamentaltrazem avanços em duas frentes: oaperfeiçoamento dos instrumentos tradicionais decrédito e comercialização e a abertura de umajanela para o novo, por meio de uma bateria demecanismos capazes de revolucionar ofinanciamento de toda a cadeia produtiva doagronegócio no horizonte próximo.

Renovadas as esperanças e arregaçadasas mangas, o governo confia que o Brasil baterána safra 2004/05 novos recordes na produçãode alimentos e na exportação do agronegócio,fruto da ação incansável e empreendedora dosprodutores, empresários e trabalhadores rurais.

Objetivos• Permitir novos aumentos da produção, por

meio de ganhos de produtividade e de incor-

Plano Agrícola e Pecuário2004/2005

Car

ta d

a A

gric

ultu

ra

poração de áreas de modo ambientalmentesustentável, possibilitando mais e melhoresalimentos aos brasileiros e crescimento naexportação e no saldo comercial do agronegócio.

• Potencializar o processo de crescimentoeconômico do País, promovendo a interiorizaçãodo desenvolvimento e ampliando as oportuni-dades de inclusão social por meio do aumentoda renda e do emprego, no campo e na cidade.

• Alavancar a modernização e a competiti-vidade do agronegócio, financiando maciça-mente o investimento produtivo e a melhoriada infra-estrutura no meio rural.

• Inserir, cada vez mais, a agropecuáriae o agronegócio nos mercados financeiro e decapitais, atraindo novos investidores utilizando-se mecanismos inéditos de financiamento,comercialização e seguro, e reduzindo os custose os riscos das atividades.

Crédito rural para a agriculturacomercial: R$ 39,45 bilhões

O governo está ampliando significativa-mente a oferta de crédito rural, a maior parte, ajuros fixos e favorecidos. Na safra 2003/04, foramprogramados R$ 27,15 bilhões (25,3% sobre aanterior) para a agricultura comercial,gerenciada pelo Ministério da Agricultura,Pecuária e Abastecimento – Mapa.

Agora o governo federal está progra-mando um aumento de 45% no crédito aosegmento, para R$ 39,45 bilhões (Tabela 1).A expansão será relevante no crédito de custeio

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 4

e comercialização – aumento de 34% –, masainda muito mais expressiva no investimento.Serão R$ 10,7 bilhões de recursos, um aumentode 86% sobre o programado para a safra 2003/04.

Crédito de custeio e comercialização

Serão R$ 28,75 bilhões, 34% acima doprevisto para a safra 2003/04. As taxas de jurosanuais permanecem inalteradas em 8,75% e9,5% (recursos do Funcafé), exceto para oProger Rural, que passa de 7,25% para 8%.

Crédito de investimento

Nunca se ofertou tanto dinheiro para oinvestimento no campo. Serão R$ 10,7 bilhões,sendo R$ 8,6 bilhões nos programas deinvestimento do Mapa, com recursos do SistemaBanco Nacional do Desenvolvimento Econômico

e Social – BNDES. Os Fundos Constitucionais doCentro-Oeste, Norte e Nordeste terão umacontribuição relevante, com R$ 2 bilhões. MaisR$ 100 milhões, oriundos do Fundo de Amparoao Trabalhador – FAT –, serão aplicados noPrograma de Geração de Emprego e Renda –Proger Rural.

Novos aprimoramentos e ampliação deitens financiáveis e do volume de recursos estãosendo feitos em todas as linhas de investimentodos programas Mapa e BNDES:

• Moderfrota: o total de recursos passou deR$ 2 bilhões, em 2003/04, para R$ 5,5 bilhões,em 2004/05. Diante dessa forte elevação dovolume de recursos, a linha Finame Especial (maiscara para o produtor) não mais atenderáfinanciamentos de máquinas e equipamentospelo Moderfrota.

• O Moderagro – renovação de pastageme recuperação de solos – terá aumento de 50%

Tabela 1. Crédito rural: programação de recursos para a safra 2004/05 (R$ milhões).

Custeio e comercialização

Juros controladosRecursos obrigatórios - MCR 6-2 (8,75% a.a)Poupança Rural - MCR 6-4 (8,75% a.a)Proger Rural (8,0% a.a)Funcafé (9,5% a.a)

Juros livresPoupança Rural - MCR 6-4Recursos Livres (demais bancos)Banco do Brasil - Aval de CPRBB - FAT Agroindústria (até Selic)

Investimento

ModerfrotaFiname Agrícola EspecialProger Rural (8,0 % a.a)Demais Programas BNDESFundos Constitucionais

Total Agricultura Empresarial (1 + 2)

Fonte de recursos e programas Programação inicialSafra 2003/04

Fonte: Mapa/SPA e Ministério da Fazenda.

21.400

16.40011.0003.900

700800

5.0003.0001.0001.000

-

5.750

2.000500250

2.0001.000

27.150

Programação inicialSafra 2004/05

28.750

17.00011.5004.500

7001.000

11.0505.7502.3002.0001.000

10.700

5.500500100

2.6002.000

39.450

Variação(%)

34,3

7,94,5

15,4-

25,0

121,091,7

130,0100,0

-

86,1

175,0-

(60,0)30,0

100,0

45,3

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 20045

no valor total programado, passando paraR$ 600 milhões.

• No Moderinfra – irrigação e armazena-gem na propriedade rural – o total de recursosalocados passa de R$ 500 milhões paraR$ 700 milhões, em 2004/05. Foi aumentadode R$ 400 mil para R$ 600 mil o limite a sertomado por produtor individual. Outra decisãoimportante é que grupos de produtores poderãofinanciar até R$ 1,8 milhão para a construçãode armazéns coletivos.

• Os investimentos das cooperativas(Prodecoop) terão R$ 550 milhões, emcomparação aos R$ 450 milhões alocados nasafra passada. O limite de financiamento deR$ 20 milhões por cooperativa poderá serincrementado em até 100%, quando os recursosadicionais forem destinados a empreendimentosem outras Unidades da Federação.

• O Prodeagro – que financia investimentosem criações de pequenos e médios animais, mel,flores e aqüicultura e que, nesta safra, incorporaráo Proleite – terá forte aumento de dotaçãoorçamentária, passando de R$ 60 milhões paraR$ 200 milhões em 2004/05.

• O Prodefruta terá orçamento de R$ 200milhões para aplicar na produção de frutas,como uva, caju, maçã e cacau.

• A produção comercial de florestas e arecomposição de reserva legal (Propflora)receberão R$ 50 milhões.

Armazenagem prioritária

Por meio de linha de crédito da FinameEspecial do BNDES, serão financiadosinvestimentos pelas empresas prestadoras deserviços de armazenagem, além do programade armazenagem na fazenda. Assim, seráampliada, ainda mais, a capacidade estática dearmazenagem no País.

As taxas de juros, prazos e demaiscondições dos financiamentos permaneceminalterados em relação à safra 2003/04, excetono Moderinfra, onde os empréstimos até R$ 400

mil serão feitos a 8,75% e, acima desse valor, a10,75% ao ano (Tabela 2).

Para o governo, o investimento susten-tável no agronegócio significa mais emprego,aumento de eficiência, diminuição de perdas,aumento de escala e redução de custo.Significa mais qualidade e competitividade.

Mudanças estruturais no crédito rural

As principais fontes de recursos para ochamado Sistema Nacional de Crédito Rural –SNCR – são os depósitos à vista dos bancos e acaderneta de poupança rural, que representamcerca de 80% da oferta de crédito rural decusteio e comercialização. Por conta da taxade juros vigente na economia, essas fontes estãocrescendo muito abaixo do ritmo da agrope-cuária, fazendo com que o cobertor do créditoseja cada vez mais curto. Como não dá paraatender às necessidades de todos os setoresinteressados nos recursos do SNCR, o governoredefiniu prioridades e decidiu:

a) Aumentar de 40% para 50% do saldodos depósitos da caderneta de poupança rurala parcela de aplicação obrigatória em créditorural pelo Banco do Brasil. A exigibilidade doBB crescerá 5 pontos percentuais a cada ano,até atingir 65% em 2007. Adicionalmente, osbancos cooperativos Bancoob e Bansicrediestão autorizados a captar depósitos decaderneta de poupança rural, devendo aplicar65% do saldo em crédito rural (decisão doConselho Monetário Nacional – CMN –, emmarço/04).

b) Limitar a R$ 10 milhões o montante decrédito de comercialização a ser tomado poragroindústrias nas modalidades de Empréstimodo Governo Federal (EGF), Nota PromissóriaRural (NPR) e Duplicata Rural (DR).

c) Eliminar o financiamento da compra deCédula de Produto Rural (CPR) pelas agroindústrias.

d) Manter o limite de adiantamento decrédito por tomador (máximo de recurso quecada produtor pode levantar a taxa de jurocontrolada junto ao SNCR) vigente na safra

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 6

Investimentos fixos esemifixosrelacionados comimplantação oumelhoramento deespécies frutíferas.

Correção de solos,adubação verde,consevação de solos,recuperação depastagens esistematização devárzeas.

Investimentos fixos esemifixosrelacionados comfloricultura,ovinocapricultura,aqüicultura,apicultura,suinocultura,avicultura esericicultura epecuária leiteira.

Investimentos fixos esemifixosdirecionados àagricultura irrigada eà instalação emodernização dearmazéns naspropriedades rurais.

Investimentos fixos esemifixos destinadosà estruturascooperativas visandoà agregação de valorà produçãoagropecuária.

Investimentos fixos esemifixos destinadosao plantio produçãocomercial deflorestas erecomposição dereserva legal.

Tabela 2. Programas de investimento para a safra 2004/05 (R$ milhões).

Continua...

Descrição

Profruta,Prodevinho,Procaju eProcacau

Prosolo,Propastos eSisvárzea

Prodecap,Prodemel,Prodeflor eAqüicultura

Proazem eProirriga

Prodecoop

Propflora

Programadosafra

2003/04

240

600

60

500

450

50

200

900

200

700

550

50

Orçamentosafra

2004/05

Limite de créditopor operação

(R$ mil)

200

200

150

Até 400

Acima de400 e

até 600

20.000(2)

150

Taxa dejuros

(% a.a.)

8,75

8,75

8,75

8,75

10,75

10,75

8,75

Prazomáximo

anos8

5

5

8

12

12

Principais itensfinanciáveis

Prodefruta

Moderagro

Prodeagro

Moderinfra(1)

Prodecoop

Propflora

Programa

Fonte: Mapa-SPA e MF

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 20047

Proleite

Subtotal

Modefrota

PROGER-Invest.

FinameAgricolaEspecial

Fundosconstitucionais

Total

Proleite

Moderfrota

Proger-Invest.

FinameAgricolaEspecial

100

2.000

2.000

250

500

1.000

5.750

DescriçãoProgramado

safra2003/04

Orçamentosafra

2004/05

Limite de créditopor operação

(R$ mil)

Taxa dejuros

(% a.a.)

Prazomáximo

anos

Principais itensfinanciáveisPrograma

Tabela 2. Continuação

Incorporadoao

Prodeagro

2.600

5.500

100

500

2.000

Sem limite(3)

56

300 (algunssetores) e

demais semlimite

9,75(4)

12,75

7,25

12,75

56

8

5

Máquinas eequipamentosdestinados àpecuária leiteira.

Tratores agrícolas,implementosassociados,colheitadeiras eequipamentos parabeneficiamento docafé.

Investimentos fixose semifixosdestinados àpequenosprodutores.

Máquinas eequipamentos,inclusive parabeneficiamento dealgodão, de frutas,sementes,pescados, entreoutros, exceto ositens financiáveis no Moderfrota.

2003/04, exceto para a cana-de-açúcar, quepassa de R$ 60 mil para R$ 100 mil (Tabela 3).

e) Autorizar os bancos a concederaumento de 30% no limite de adiantamentopara todas as lavouras, para os produtoresafetados pela seca e pelo fenômeno Catarina,localizados nos municípios dos Estados de MatoGrosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e RioGrande do Sul, conforme disposto na Portaria 110

(de 13/05/2004), dos ministérios da Fazenda e doDesenvolvimento Agrário.

f) Proceder fortes ajustes de simplificaçãonas operações de crédito rural, especialmenteno EGF.

As medidas acima aumentarão o tamanhodo cobertor do crédito e permitirão colocardebaixo dele um número maior de produtores ecooperativas.

(1) Moderinfa: na contratação o limite máximo é de R$ 1,8 milhão e a taxa de juros será definida em função dos limites individuais.(2) Pode ser ampliado em até 100%, desde que o adicional seja em empreendimento de cooperativa em outras Unidades da Federação.(3) Exceto café, cujo limite é de R$ 20 mil.(4) Renda bruta anual até R$ 150 mil.Fontes: Mapa - SPA, MF e BNDES

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 8

Tabela 3. Limite de crédito de recursos controlados por produtor (R$ mil).

(1) O limite do milho independente dos financiamento obtidos em outras culturas.Para as operações do EGF o limite é sempre o de sequeiro, mesmo quando se trata de produtosoriundos de cultivos irrigados.Limite adicional de 30%, para todos os produtos, para produtores dos municípios afetados pelo climana safra 2004/05 (conforme Portaria 110 dos ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento Agrário).Fonte: SPA-Mapa.

Safra 2004/05

500200200400140100200400200200400200150200400200400

90

60

Safra 2003/04

500200200400140

60200400200200400200150200400200400

90

60

Safra 2002/03

400150150300100

60150300150150250200150150300150300

60

60

Novos instrumentos para acompetitividade do agronegócio

No plano estratégico do governo, acompetitividade do agronegócio depende depolíticas e ações em 3 C’s: Capital, Comer-cialização e Condução ao Mercado (Fig. 1).

No Capital, estão os mecanismos paraatrair poupança interna e externa para aplicaçãona produção, processamento e comerciali-zação, ou seja, em toda a cadeia dos produtosdo agronegócio. Um dos grandes gargalos daagropecuária é a Comercialização: aprimoraros mecanismos do mercado físico é fundamentalpara alavancar as operações nos mercadosfuturos, em bolsas. Da mesma forma, é críticomelhorar a Condução ao Mercado por meio deinvestimentos na infra-estrutura e, especial-mente, de avanços nas condições de armaze-

nagem e circulação das mercadorias e depapéis delas representativos.

A partir desse entendimento, o governodesenvolveu, em estreita interação com o setorprivado, uma série de novos instrumentos,adiante apresentados.

AlgodãoAmendoimArroz de sequeiroArroz irrigadoCaféCana-de-açúcarFeijão sequeiroFeijão irrigadoFruticulturaMandiocaMilhoSoja (CO, N, sul do MA, PI e BA)Soja (demais regiões)Sorgo sequeiroSorgo irrigadoTrigo sequeiroTrigo irrigadoPecuária leiteiraInvestimento, demaiscusteios e comercialização

Cultura /produto

Fig. 1. Agronegócio: novos instrumentos para acompetitividade.Fonte: SPA-Mapa

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 20049

O Certificado de Recebíveis doAgronegócio – CRA – destina-se a atrair apoupança interna para o agronegócio.Adicionalmente, o governo está desenvolvendoum outro instrumento destinado a captarpoupança de investidores estrangeiros por meiode um commercial paper ou equivalente,provisoriamente denominado Letra deComércio Agrícola – LCA. No decorrer do ano-safra 2004/05, também serão lançadas as basespara a organização dos Fundos de Investimentono Agronegócio – FIAs.

O governo está tomando as seguintesmedidas legais: publicação de decretos deregulamentação da Lei do Seguro Rural e decriação do Comitê Técnico Interministerial paraacompanhamento e reformulação do Programade Garantia da Atividade Agropecuária –Proagro; edição de Medida Provisória para ainstituição do Certificado de DepósitoAgropecuário – CDA – e do Warrant Agrope-cuário – WA –, e para a permissão de subvençãoeconômica para o lançamento de contratos deopção de venda pelo setor privado; eautorização pelo Conselho Monetário Nacionalpara o lançamento de contratos de opção decompra de estoques públicos.

Certificado de Recebíveisdo Agronegócio – CRA

É um título de crédito de livre negociaçãoque poderá ser emitido por pessoas jurídicas doagronegócio (cooperativas, indústrias deinsumos, indústrias de processamento, armazena-dores, exportadores, etc.), instituições financei-ras e empresas de securitização de direitoscreditórios.

O CRA terá como lastro uma variedadede recebíveis, entre eles: certificados dedepósito, notas promissórias, duplicatas,contratos e, especialmente, Cédula de ProdutoRural – CPR. A empresa emissora do CRApoderá levantar recursos junto a investidoresno mercado financeiro, que estão ávidos por

oportunidades de diversificação de suascarteiras, na esteira da esperada redução dataxa básica de juros da economia (Selic).

A regulamentação do CRA será por meiode Medida Provisória.

Certificado de Depósito Agropecuário – CDA– e Warrant Agropecuário – WA

O CDA é um título de créditorepresentativo de promessa de entrega deproduto agropecuário depositado em armazém.O WA é um título de crédito que confere direitode penhor sobre o produto descrito no CDAcorrespondente. Ambos os títulos são unidos eemitidos simultaneamente pelo depositário(o armazenador), a pedido do depositante.

As duas partes – o depositante (o produtorrural, por exemplo) e o armazenador –negociarão as garantias (seguro, aval bancárioe outras). Após a emissão, CDA e WA serãoregistrados e custodiados em entidadeautorizada pelo Banco Central e negociadoseletronicamente.

O CDA e o WA serão uma nova moedapara os produtores rurais. O produtor poderávender o CDA como se estivesse vendendo oproduto ou levantar um empréstimo com o WA.Nesse caso, seria registrado um ônus (warrant)sobre o produto na forma de um penhor, tudoregistrado de modo eletrônico.

Não há incidência de impostos (como oICMS) a cada negociação secundária dostítulos, ou seja, a tributação somente ocorrerána etapa final de consumo. Essa é uma grandevantagem, pois, na comercialização física, atributação se dá em todas as etapas dacirculação da mercadoria.

A dupla CDA-WA trará mais liquidez paraa comercialização, pois novos agenteseconômicos (principalmente investidores)passarão a disputar os produtos agropecuárioscom os tradicionais compradores. Essademanda adicional dará maior sustentação aospreços, notadamente no período de safra.

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 10

A regulamentação do CDA-WA estásendo feita por meio de Medida Provisória. Nummomento posterior, o Governo lançará umsistema de certificação de armazéns, ampliandoainda mais a sua credibilidade e a segurançapara os investidores.

Regulamentação da Lei do SeguroRural e reformulação do Propago

A Lei 10.823, de dezembro de 2003,autorizou o Tesouro Nacional a concedersubvenção econômica ao prêmio do segurorural e criou o Comitê Gestor Interministerialdo Seguro Rural.

Com a regulamentação da Lei, o governoestá agora cumprindo mais uma etapa para queo Brasil comece a criar uma grande indústriade seguro rural, diminuindo o risco dosprodutores e do agronegócio, em geral.

Para que o seguro rural entre efetivamenteno ar, restam ainda duas etapas: a definição daestrutura de gestão (inclusive os aspectosoperacionais de pagamento da subvenção,monitoramento, fiscalização e controle); e adefinição dos aspectos técnicos (tamanho dasubvenção, produtos e regiões prioritárias, entreoutros).

O Comitê Técnico Interministerial doProagro será composto por representantes dosministérios da Fazenda, Agricultura eDesenvolvimento Agrário, e do Banco Centraldo Brasil. Esse comitê terá competência parapropor políticas e diretrizes para reestruturaçãodo Proagro, incluindo questões financeiras,patrimoniais, administrativas, atuariais eestatísticas, bem como complementariedadecom as demais ações públicas voltadas à gestãode riscos agrícolas.

Integra o PAP 2004/05 a publicação dedecretos que regulamentam a Lei 10.823/2003e criam as condições para a reformulação doProagro.

Contrato de opção de venda deproduto agrícola pelo setor privado

Da mesma forma que os contratos deopção de venda lançados pelo governo, aOpção Privada tem o objetivo de garantir umarenda adequada para os produtores rurais.A principal diferença é que o lançamento seráfeito por organizações privadas, interessadasem evitar as fortes flutuações dos preços demercado que comprometem a sua compe-titividade numa visão de médio prazo.

Para viabilizar a operação, o governoleiloará para os lançadores da opção um prêmiode risco, expresso em valor monetário, quepoderá ser usado para cobrir a eventualdiferença entre o preço de mercado e o preçode exercício da opção privada, nos casos emque o produtor e a cooperativa entregarem oproduto para a empresa privada.

A Opção Privada aumentará a eficiênciano uso dos recursos de suporte à comer-cialização agrícola que o governo disponibilizapor meio do orçamento das Operações Oficiaisde Crédito – OOC.

Está sendo editada uma Medida Provi-sória alterando a Lei 8.427, permitindo que oPoder Público faça a equalização de preços noscontratos de opção lançados pelo setor privado.

Contrato de opção decompra dos estoques públicos

Mecanismo para viabilizar a venda dosestoques do governo, com entrega futura, apreço definido. A operação é feita por meio deleilão, ficando o comprador do contrato,mediante pagamento de prêmio, com o direitode adquirir produto dos estoques do governo,de acordo com os parâmetros do arremate.

O Conselho Monetário Nacional jáautorizou a utilização desse mecanismo.

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 200411

Instrumentos tradicionaisde apoio à comercializaçãoe à garantia de renda

Além dos já citados instrumentos inéditos,o PAP 2004/05 contempla a manutenção deinstrumentos tradicionais de apoio àcomercialização e garantia de renda, tendo amaioria deles passado por mudanças eaprimoramentos para aumentar a eficiênciaoperacional.

Aquisição do Governo Federal – AGF

Mecanismo que permite ao governofederal adquirir produto agrícola de produtorrural ou cooperativa ao valor do preço mínimode garantia, quando o preço de mercado ficaabaixo do preço mínimo. De acordo com adisponibilidade orçamentária, o Mapa, por meioda Companhia Nacional de Abastecimento –Conab –, pode também adquirir produtos apreços de mercado, independentemente dopreço mínimo, para atender a agriculturafamiliar e para a formação de estoquesestratégicos.

Empréstimo do Governo Federal – EGF

Financiamento concedido a produtores,cooperativas e agroindústrias para permitir aestocagem do produto e viabilizar uma melhordistribuição da oferta ao longo do ano.Mudanças implementadas:

• Simplificação do EGF pela eliminaçãode entraves burocráticos, facilitando asoperações entre os bancos e os tomadores derecursos.

• Exigência de penhor da mercadoriafinanciada nas operações de EGF sempossibilidade de substituição de garantias(exceto em casos definidos), de modo a resgataro papel do EGF como instrumento incentivadorda efetiva estocagem do produto agrícola,especialmente no período de colheita.

Linha Especial de Créditoà Comercialização – LEC

Criada em 2003 para apoiar a comerciali-zação agrícola, tem operação similar ao EGF. NaLEC, o preço base para o financiamento de esto-cagem é desvinculado do preço mínimo e maispróximo ao de mercado. Os produtos elegíveispara a LEC são definidos pelos ministérios daAgricultura e da Fazenda. Atualmente, os produtoscontemplados são milho, sorgo, trigo e café.

Contrato de Opção de Venda

Título negociado pelo governo queassume o compromisso de adquirir deprodutores rurais e cooperativas a quantidadede produto vinculado ao contrato de opção, noseu vencimento e a um determinado preço(chamado preço de exercício). É lançado pormeio de leilão público, mediante um prêmio, epermite indicar aos agentes do mercado umaexpectativa de preços futuros. Representa umseguro de preços aos produtores e cooperativase uma forma moderna de intervenção dogoverno no mercado.

Recompra ou repasse decontrato de opção de venda

São mecanismos de subvenção econô-mica, por meio de leilões, que desoneram ogoverno da obrigatoriedade de receber produtooriundo de contratos de opção de vendapreviamente lançados, sem prejuízo dosinteresses dos seus detentores (produtores ecooperativas). A Recompra ocorre quando ogoverno não tem interesse em receber o produtoe é feita em leilão de reversão dos contratos deopção. O Repasse está associado ao abas-tecimento de uma determinada região.O arrematante em leilão de Repasse assume,nesse caso, as obrigações do governo com osdetentores dos contratos de opção. Em ambosos casos, o governo assume a subvenção,equivalente à diferença entre o preço deexercício da opção e o preço de mercado.

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 12

Prêmio e Valor deEscoamento de Produto – PEP e VEP

O PEP é um instrumento que permitegarantir ao produtor e à cooperativa o preçomínimo, sem que haja necessidade de ogoverno adquirir o produto. Por meio dopagamento da diferença entre o preço mínimoe o preço de mercado, o governo complementao abastecimento em regiões deficitárias a partirde estoques privados.

A mesma finalidade de abastecimento podeser feita utilizando-se o Valor de Escoamento deProduto – VEP. Nesse caso, o produto é origináriode estoque público.

Célula do Produto Rural – CRP

Título criado em 1994 para viabilizar aoprodutor a comercialização antecipada da suasafra, permitindo, assim, obter recursos paracustear a implantação das lavouras. Pode seremitida por produtores ou cooperativas erepresenta uma promessa de entrega, no futuro,do produto vinculado à cédula. Em janeiro de2000, foi criada a CPR – Financeira que, comoo próprio nome diz, tem liquidação financeira,não havendo a possibilidade de entrega físicada mercadoria.

O PAP 2004/05 cancelou a autorização,anteriormente existente, dos bancos parafinanciarem, com recursos da exigibilidadebancária, a aquisição de CPR pelas indústriasinteressadas em adquirir antecipadamenteproduto agrícola. Dessa forma, mais recursosserão aplicados diretamente para os produtoresrurais.

As CPRs com aval bancário e as chamadas“CPRs de gaveta” (comumente utilizadas comoinstrumento de garantia nas transações comagricultores, feitas por indústrias de insumos,revendedores, indústrias de processamento etradings) serão importantes lastros dos CRAs,mencionados no subtítulo: Certificado derecebíveis do agronegócio – CRA.

Notas Promissórias eDuplicatas Rurais – NPR e DR

As operações de desconto de NPR e DRpermitem ao setor de processamento dematérias-primas agropecuárias levantarrecursos de crédito rural para efetuar opagamento das compras feitas aos produtores.

Conforme mencionado anteriormente, ovalor máximo das operações por parte deagroindústrias – antes ilimitado agora é deR$ 10 milhões, com prazo de pagamento de até120 dias.

Preços mínimos de garantia

No passado, os preços mínimos erampraticamente o único instrumento de suporte àrenda do produtor, levando o governo a efetuarcompras e manter estoques de quase 20 milhõesde toneladas de grãos. De 1996 para cá, foramcriados novos mecanismos, como contratos deopção de venda, PEP e VEP. Essa é uma formade intervenção no mercado hands free, menoscustosa para a sociedade.

Para a safra 2004/05, procedeu-sesomente a correção dos preços mínimos dosseguintes produtos regionais: castanha-do-pará,castanha-de caju, juta e malva e sisal (Tabelas4, 5 e 6).

O governo incluiu na PGPM, para efeitode EGF, a borracha natural para produtores ecooperativas e autorizou a concessão de EGFpara indústrias e cooperativas beneficiadorasde casulo de seda.

Apoio à economia cafeeiraPara o ano-safra 2004/05, além do acesso

dos produtores às diversas linhas de crédito, jáestão definidas as seguintes medidas de apoio,que totalizam R$ 1,7 bilhão:

• Prorrogação para 2005 de dívidas decafeicultores com o Funcafé no valor de R$ 500milhões.

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 200413

Algodão em plumaS,SE,CO e BA sulN e NE (exceto sul da BA)

Arroz longo fino em cascaS, SE, NE e CO (exceto MT)N e MT

Arroz longo em cascaS, SE, NE e CO (exceto MT)MT e TON (exceto TO)

Cera de carnaúbaNE

MandiocaFarinha de mandioca - S, SE e COFarinha de mandioca - N e NEFécula de mandioca - S, SE e COGoma / Polvilho - N e NE

FeijãoS, SE, CO e BA sulN e NE (exceto sul da BA)

Feijão maçacarN e NE

Juta / Malva embonecadaBrasil

Juta / Malva prensadaBrasil

Mamona em bagaN, NE, GO, MT, MG e SP

MilhoS, SE, BA sul, sul do MA e do PIGO, MS e DFMT, AC e RON (exceto AC e RO) e NE (excetosul da BA, sul do MA e do PI)

SisalBA, PB e RN

SorgoS, SE, CO e sul da BAN e NE (exceto sul da BA)

Preço mínimo básicoProduto

Tabela 4. Preços mínimos - Safras de verão e de produtos regionais 2004/05 e do Norte e Nordeste 2005 –Produtos amparados por AGF e EGF (R$ / unidade).

Variação %

-

--

---

-

----

--

-

6,25

7,53

-

---

-

8,97

--

Unidade

15 kg

50 kg60 kg

60 kg60 kg60 kg

kg

50 kg50 kg

kgkg

60 kg60 kg

60 kg

kg

kg

60 kg

60 kg60 kg60 kg

60 kg

kg

60 kg60 kg

Tipo 41.4 SLMCod. 35

Tipo 1-58/10Tipo2-55/13

Tipo 3-39/41Tipo 3-39/41Tipo 3-39/41

Tipo 3 e 4

Fina T3Único2-B

Classificada

Tipo 3Tipo 3

Tipo 3

Tipo 2

Tipo 2

Único

ÚnicoÚnicoÚnico

Único

SLG

ÚnicoTipo1,2 e 3

Tipo/ClasseBásico 2003/04

44,60

20,0020,70

11,1310,7510,12

2,90

15,0017,00

0,440,44

47,0047,00

30,00

0,80

0,93

30,30

13,5013,0011,00

16,00

0,78

9,4511,20

2004/05

44,60

20,0020,70

11,1310,7510,12

2,90

15,0017,00

0,440,44

47,0047,00

30,00

0,85

1,00

30,30

13,5013,0011,00

16,00

0,85

9,4511,20

Início deVigência

fev. / 05(1)

jun. / 05

fev. / 05(2)

fev. / 05(2)

fev. / 05fev. / 05

fev. / 05(3)

ago. / 04

jan. / 05fev. / 05jan. / 05fev. / 05

nov. / 04jan. / 05

jan. / 05

fev. / 05

fev. / 05

jul. / 04

fev. / 05(4)

fev. / 05(4)

fev. / 05(4)

jun. / 05(5)

ago. / 04

fev. / 05jun./ 05

(1) Centro-Oeste e MG: abril / 2005..(2) Áreas irrigadas das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste: Set./2004; MS, PR, SC e SP: jan./05.(3) Exceto RR cuja operação inicia-se em set / 04.(4) SC e RS: jan./05.(5) Sul do Maranhão, Sul do Piauí e Tocantins: fev / 05.Fontes: Mapa - SPA e MF.

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 14

Algodão em caroçoS, SE, CO, e BA sulN e NE (exceto sul do BA)

Alho - S, SE, CO e NE

Amendoim - S, SE, CO e NE

Borracha natural Brasil

Caroço de algodãoS, SE, CO e BA sulN e NE (exceto sul da BA)

Castanha de caju - N e NE

Casulo e seda - PR e SP

Castanha-do-pará com casca - N

Castanha-do-pará beneficiada - N

Girassol - S, SE e CO

Guaraná - N, NE e CO

LeiteS e SEDF, NS e GON e MTNE

Milho pipoca - S, SE CO e BA sul

Pó cerífero - NE

MandiocaRaiz - S, SE e CORaiz - N e NE

SojaS, SE, CO e RondôniaN e NE (exceto Rondônia)

Preço mínimo básicoProduto

Tabela 5. Preços mínimos - Safras de verão e de produtos regionais 2004/05 e do Norte eNordeste 2005 - Produtos amparados por EGF (R$ / unidade)

(1) Centro-Oeste e MG: abril / 2005.Fontes: Mapa- SPA e MF.

Unidade

15 kg15 kg

kg

25kg

kg

15kg15kg

kg

kg

h/L

kg

60kg

kg

LLLL

kg

kg

tt

60kg60kg

13,4013,40

1,76

16,10

-

2,372,37

0,90

3,80

35,00

1,80

17,61

5,00

0,380,360,330,38

0,44

2,90

54,0060,00

14,0013,00

2003/04 Variação %

-

-

-

-

--

2,22

-

2,86

5,56

-

-

----

-

-

--

--

Início devigência

fev./05(1)

jun./05

ago./04

dez./04

fev./05

fev./05(1)

jun./05

jun./04

set./04

jan./05

jan./06

nov./04

ago./04

out./04out./04dez./04mar./05

fev./05

ago./04

jan./05fev./05

fev./05fev./05

2004/05

13,4013,40

1,76

16,10

1,00

2,372,37

0,92

3,80

36,00

1,90

17,61

5,00

0,380,360,330,38

0,44

2,90

54,0060,00

14,0013,00

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 200415

Algodão

Amendoim

Arroz longo finoArroz longo

Feijão

Feijão macaçar

Girassol

Juta / Malva

Milho híbrido

Milho variedade

Soja

Sorgo híbrido

Sorgo variedade

Sementefiscalizada

Produto

Tabela 6. Preços mínimos para sementes - Safras de verão e de produtos regionais 2004/05 e do Norte eNordeste 2005 (R$/kg líquido).

Grão /caroço

0,15620,1562

0,6439

0,40000,1855

0,78350,7835

0,5000

0,2935

-

0,22490,21660,18340,2667

0,22490,21660,18340,2667

0,2333

0,15740,1867

0,15740,1867

Início devigência

(1) Sul do Maranhão, sul do Piauí e Tocantins: Fev / 2005.Fontes: Mapa - SPA e MF.

S, SE, CO e BA sulN e NE (exceto BA sul)

S, SE, CO e NE

BrasilBrasil

S, SE, CO e BA sulN e NE (exceto BA sul)

N e NE

S, SE, CO

Brasil

S, SE, BA sul,sul do MA e PIGO, MS e DFMT, AC e RO

N (exceto AC e RO) e NE(exceto BA sul,sul do MA e PI)

S, SE, BA sul, sul do MA edo PI

GO, MS e DFMT, AC e RO

N (exceto AC e RO) e NE(exceto sul da BA ,sul do MA e do PI)

Brasil

S, SE, CO e BA sulN e NE (exceto BA sul)

S, SE, CO e BA sulN e NE (exceto BA sul)

UF’s / Regiõesamparadas

2003/04 2004/05

Semente básica,registrada ecertificada

0,15620,1562

0,6439

0,40000,1855

0,78350,7835

0,5000

0,2935

-

0,22490,21660,18340,2667

0,22490,21660,18340,2667

0,2333

0,15740,1867

0,15740,1867

0,65170,7914

2,0468

0,77200,5120

1,32491,4235

0,8382

8,4885

3,7440

1,34301,44511,38651,3212

0,72870,78410,75230,7964

0,4971

1,16181,0538

0,56460,6277

0,65170,7914

2,0468

0,77200,5120

1,32491,4235

0,8382

8,4885

3,9780

1,34301,44511,38651,3212

0,72870,78410,75230,7964

0,4971

1,16181,0538

0,56460,6277

0,68920,8504

2,4064

0,83240,5460

1,49521,6621

0,9137

9,9767

-

1,38601,49141,43091,3635

0,76930,82780,79420,8516

0,5367

1,19011,0869

0,58810,6645

0,68920,8504

2,4064

0,83240,5460

1,49521,6621

0,9137

9,9767

-

1,38601,49141,43091,3635

0,76930,82780,79420,8516

0,5367

1,19011,0869

0,58810,6645

fev./05jun./05

dez./04

fev./05fev./05

nov./04jan./05

jan./05

nov./04

fev./05

fev./05fev./05fev./05

jun./05(1)

fev./05fev./05fev./05

jun./05(1)

fev./05

fev./05jun./05

fev./05jun./05

2003/04 2004/05 2003/04 2004/05

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 16

• Financiamento de colheita e estocagem– R$ 500 milhões.

• Operações de LEC e de EGF – R$ 250milhões.

• Operações com CPR – R$ 450 milhões.

O suporte governamental à comercializa-ção da safra 2004/05 contempla ainda:

• Linha especial de R$ 300 milhões decrédito para financiamento da estocagem decafé, a taxa de juros de 9,5% ao ano, com prazode pagamento de até 180 dias e vencimentomáximo em 31/03/05. A linha permitirá aestocagem de 2 milhões de sacas de café.

• Lançamento de contratos privados deopções de venda de 2 milhões de sacas de café.

Medidas para o setor sucro-alcooleiro

Em 2004, o governo federal já assegurouR$ 500 milhões para o programa de estocagemde álcool, com recursos da Contribuição deIntervenção no Domínio Econômico – CIDE –, ajuros de 11,5% ao ano. Adicionalmente,encaminhará ao Congresso Nacional Projeto deLei propondo a ampliação dessa dotação emR$ 500 milhões, uma vez que está sendo esperadoum novo aumento da produção na atual safra.

O limite de financiamento de custeio para oprodutor de cana-de-açúcar, conforme mencio-nado,passa de R$ 60 mil para R$ 100 mil na safra 2004/05.

Medidas de apoio aosprodutores afetados pela estiageme pelo fenômeno catarina

Além do aumento do limite de financiamento,os produtores localizados nos municípios afetadospela estiagem e pelo fenômeno Catarina (Portaria110, de 13/5/2004, dos ministérios da Fazenda edo Desen-volvimento Agrário) serão beneficiadospelas seguintes medidas:

• Renegociação dos débitos de custeio, casoa caso, conforme previsto nas normas vigentesdo Manual de Crédito Rural (MCR 2-6-9).

• Aumento dos recursos para a safra deinverno: o Banco do Brasil disponibilizou R$ 130milhões para financiar os produtores quetiveram perdas na safra de verão em função daestiagem. Com isso, os recursos alocados paraa safra de inverno totalizam R$ 650 milhões,contra R$ 584 milhões da safra anterior.

• Prorrogação, mediante análise, caso acaso, das parcelas de investimento vencidas ouvincendas em 2004 dos programas deinvestimento Mapa/BNDES.

• Vendas de Balcão: o governo poderálançar mão desse mecanismo, disponibilizandoprodutos existentes em seus estoques para aslocalidades e produtores que, em função da estia-gem, tenham o seu abastecimento comprometido.

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 200417

1 O trabalho foi apresentado num seminário do Ministério da Agricultura, em 2002.2 Regent Professor of International Economic Policy, University of Minnesota e Professor of International Trade and Investiment Policy, University’s HumphreyInstitute of Public Affairs, Minneapolis

Num importante período, após a SegundaGuerra Mundial, o Brasil seguiu uma políticade industrialização de substituição deimportação (ISI), na qual se assentava a políticade desenvolvimento econômico. A política desubstituição de exportação favoreceu a indústriacom elevados níveis de proteção, e, ao mesmotempo, discriminou severamente a agricultura,pela via das políticas de comércio inter-nacional. Por um longo período, a taxa decâmbio permaneceu sobrevalorizada, impon-do, assim, um imposto de exportação implícitode caráter geral, mas o qual incidiu maispronunciadamente sobre agricultura, em funçãodo maior valor de suas exportações, comparadocom as da indústria e de seu potencialexportador. Ainda, o Brasil estabeleceu umgrande número de taxas de exportaçãoexplícitas e confiscos sobre as exportaçõesagrícolas, limitando fortemente o acesso dosagricultores aos mercados externos. Aquelaposição conflitava com a grande maioria dasmedidas protecionistas do tempo, e, ainda,excluía delas os produtos industriais queobedeciam outras regras que favoreciam asexportações dos mesmos.

Na década de 60, ficou claro queaquelas políticas produziram efeitos contráriosaos esperados como um meio de gerar

crescimento e desenvolvimento econômico,assentado numa ampla base. Enquanto houveum crescimento rápido do setor industrial, omesmo não foi verdadeiro, no que diz respeitoao emprego. Ainda, como conseqüência dasmedidas protecionistas, emergiu um setorindustrial ineficiente que não se tornou capaz decompetir, em escala internacional, e uma políticade desenvolvimento econômico, limitada quantoao impacto na economia brasileira.

No final da década de 60, começou-sea liberalizar as políticas de taxa de câmbio ede comércio, e, gradualmente, adicionou-se àpolítica de substituição de exportações dopassado políticas que visavam estimular asexportações. A taxa de câmbio se aproximoudo equilíbrio, a proteção da indústria decresceue as taxas explícitas de exportação sobreprodutos agrícolas (incluindo-se confiscos eembargos) foram eliminadas. A política cambialprocurou sustentar o poder de compra paritárioda moeda brasileira, por meio de desvalorizaçõessucessivas, em bases randômicas, baseadas nastaxas de inflação relativas dos Estados Unidos,Europa e Brasil.

As mudanças da política comercial ecambial posicionaram o Brasil de modo que eletirou vantagens de uma substancial desvalori-zação implícita de sua moeda, como conse-qüência do decréscimo real do valor do dólar

Comércio internacionalde produtos agrícolasAlca e OMC1

G. Edward Schuh2

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 18

americano, no decorrer da década de 70. Éverdade que houve duas desvalorizaçõesdiscretas do dólar nesse período, mas em adiçãoa esse importante fato, o dólar declinou de valorreal, quase que continuamente, na década.Como a moeda brasileira estava amarrada aodólar naquele período, ela sofreu umadesvalorização, em termos reais, relativamentea outros países. E o Brasil experimentou, noperíodo, uma das mais rápidas taxas dedesenvolvimento econômico, comparadas comqualquer outro país, alimentadas, pelo menosem parte, pelo crescimento das exportações,nelas incluindo-se os produtos agrícolas. Aquelaexperiência é uma lição sobre quão importanteé a contribuição do comércio mais livre.

O desastre, contudo, espreitava naesquina. Como resposta a um grande aumento(quatro vezes) do preço do petróleo, pelaOrganização dos Países Exportadores dePetróleo – Opec – no final de 1979, o valor dodólar entrou, virtualmente, em queda livre,fazendo com que Paul Volcker, o presidente doU. S. Federal Reserve Board, retornasseimediatamente ao seu país, de uma conferênciade fim de ano, na Europa, para impor umadraconiana mudança na política monetáriaamericana. E, assim, o Federal Reserve, oBanco Central americano, parou de imprimirmoeda para financiar o déficit muito elevadodo Tesouro. Houve, como conseqüência, umarápida elevação da taxa de juros, de valoresreais negativos de 4% a 6%, para valores reaispositivos, acima de 20%. E o dólar apreciou-sena mesma toada.

O Brasil, como a maioria dos paísesdesenvolvidos, sofreu dois castigos: teve querefinanciar uma grande dívida internacional,em condições muito desfavoráveis, e com adesvalorização do dólar muito mais recursos na-cionais foram empregados para comprar um dólar.

Em detalhes, o Brasil teve que refinanciarsua grande dívida internacional, que cresceu,rapidamente, nas décadas anteriores. Aqueledébito estava em títulos de curto prazo, em

empréstimo, muitos deles pagavam taxas dejuros negativas. De repente, o débito teve queser financiado a taxas de juros reais muito maisaltas. Esse problema inflou-se pelo fato de amoeda brasileira ter perdido poder de comprarelativa à americana, o que significava que oBrasil tinha que abrir mãos de mais recursosdomésticos para adquirir os dólares necessáriospara pagar a dívida internacional.

Cerca de quinze anos de caos econômicose seguiu, o que não foi surpresa, considerando-se o tamanho da dívida externa e o choquecausado pela mudança de política monetáriados Estados Unidos. Em 1995, a economiacomeçou a se estabilizar depois do fracassode diversos planos heterodoxos. A moedabrasileira foi novamente amarrada ao dólar,suportada por uma política monetária e fiscalrelativamente neutra. A inabilidade de eliminaro grande déficit das contas nacionais e deestabilizar os preços domésticos causaram asobrevalorização do real. E, em 1999, o realfoi, novamente, desvalorizado. Permitiu-se,então, o real flutuar, política que permaneceuaté agora.

Essa visão geral sobre a experiência epolíticas econômica brasileiras tem o papel dedemonstrar os enormes choques que osformuladores de política, do Brasil e dos EstadosUnidos, impuseram à economia brasileira, e,especialmente, a sua agricultura. Essa maneirade analisar é muito pertinente, porque muitosbrasileiros desacreditam da habilidade do Paísde competir nos mercados externos. Conside-rando-se a grande instabilidade da políticaeconômica brasileira nesse longo período equanto as políticas domésticas que limitaram oacesso dos produtos ao mercado externo, nãoé de se maravilhar que a performance dasexportações brasileiras não tenha podido sernada mais que regular, numa base contínua. Emvez de questionar a capacidade de competirdo país, os brasileiros devem maravilhar-se dasua habilidade de exportar tão bem como ofizeram, numa situação tão adversa.

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Habilidade de competirno mercado externo

Fatores importantes

A habilidade de competir no mercadoexterno é o mais importante fator que determinaa capacidade de o Brasil integrar-se à economiainternacional, em nível global, na OrganizaçãoMundial do Comércio – OMC –, ou em níveisregionais, como na Área de Livre Comércio dasAméricas – Alca – e no Mercado Comum do ConeSul – Mercosul. Os fatores que influenciam o poderde competir devem modelar a estratégia deintegração e negociação, bem como os termos,pelos quais ela é aceitável.

Existem poucas dúvidas sobre a habilidadede o Brasil competir nos mercados internacionais.Ele tem se saído muito bem nesse aspecto. Háalguns anos, os Estados Unidos dominavam omercado internacional de soja. Hoje, o Brasilocupa metade desse mercado. Há alguns anos,os Estados Unidos eram os senhores do mercadode suco de laranja congelado. Hoje, o Brasil é oprincipal exportador desse produto. Semelhan-temente, o Brasil se apoderou de importante partedo mercado de frangos, e avança rapidamentesobre o mercado internacional de bife.

Taxa de câmbio

O valor do real, no mercado internacionalde câmbio, é o fator mais importante que afeta acapacidade de competição da agricultura.A importância da taxa de câmbio nessa questãotem raízes no fato de que distorções da mesmaequivalham às distorções do comércio. Uma taxade câmbio sobrevalorizada corresponde a umimposto sobre as exportações e a um subsídio dasimportações. Já uma taxa de câmbio subvalo-rizada produz efeitos opostos: correspondem a umsubsídio das exportações e a um imposto sobreas importações.

A despeito da importância das distorçõesdo câmbio em moldar a competitividade

internacional de um país, a taxa de câmbioafeta a competitividade, mesmo que o mercadode câmbio não esteja distorcido. Por exemplo,uma moeda que emerge forte, como conse-qüência de forte influxo de capital, pode resultarna Dutch Disease, a qual limita as exportaçõese facilita as importações. Da mesma forma, umamoeda fraca, que ocorre como conseqüênciade o país experimentar grande saída de capital,pode melhorar a capacidade de o país competirinternacionalmente.

A interação entre a taxa de câmbio e asdistorções do comércio tende ser muito forte. Umamoeda forte ou sobrevalorizada tende induzirmedidas protecionistas, por causa do subsídioimplícito que facilita as importações. Semelhan-temente, fortes medidas protecionistas induzemtaxa de câmbio sobrevalorizada. O câmbio devalor próximo àquele de equilíbrio, naturalmente,reduz o incentivo ao protecionismo.

É possível verificar que o Brasil optou poruma estratégia de aumentar sua capacidade decompetir internacionalmente. Há várias medidasem andamento, e a opção pelo câmbio flexível éa mais significante delas. O câmbio flexível cuidade colocar o País em condições de responder,rapidamente, às mudanças do mercado de capitale do comércio internacional, e permite reter asvantagens competitivas já obtidas. É claro que agovernabilidade do País é extremamenteimportante, considerando-se quão sensível é omercado de capital.

Na época, a crise da Argentina repre-sentou um choque muito forte para o mercadode câmbio brasileiro. A grande desvalorizaçãodo peso argentino teve que ser absorvida pelomercado de câmbio brasileiro. Essa desvalori-zação fará a Argentina mais competitiva naque-les produtos em que os dois países competem,ceteribus paribus.

Finalmente, o fortalecimento do dólar, queocorreu na década passada, tem reduzidosubstancialmente a capacidade da agriculturaamericana de competir nos mercados interna-cionais. Mais recentemente, o dólar tem apreciadoem relação ao yen e ao euro. Sugere-se que os

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Estados Unidos vão ficar mais competitivos nomercado internacional.

Em parte, a sugestão é má colocada.Na base de uma ponderação em função dovolume do comércio, o declínio do dólar é muitomodesto, cerca de 1%. A questão é o queocorreu com o valor relativo do dólar relativoao real. Sem uma pesquisa mais detalhada, édifícil dizer, em termos relativos ao dólar ou aoutras moedas relevantes à competiçãobrasileira, se o real apreciou ou desvalorizou.

Mesmo sem a ajuda de mais pesquisaempírica, pode-se ter alguma confiança emafirmar que a Argentina se torne maiscompetitiva em relação ao Brasil do que foi numpassado recente. Mas, convém ressaltar que,num ambiente de taxa de câmbio flexível, essetipo de previsão incorre em muitas incertezas.Por isso, negociações objetivas exigem umabase empírica muito melhor do que a que oBrasil dispõe, e investimentos em pesquisa nessecampo têm taxa de retorno muito elevada.

Produtividade

A produtividade dos recursos de umanação é, geralmente, discutida em pé deigualdade com a taxa de câmbio. São esses doisfatores, sobre os quais o país tem controle, quemais influenciam quão competitivo o Brasil éno mercado internacional. Na verdade, é aprodutividade total dos fatores que conta,embora, muitas vezes ingenuamente, adiscussão gira em torno de alguma medida deprodutividade parcial, como a produtividade dotrabalho para o setor industrial e a da terra paraa agricultura.

Os custos comparativos são função, emgrande medida, da produtividade, e eles sãocríticos para determinar o poder de competiçãodo País. A importância da produtividade pode sercontrastada contra a visão popular ingênua queafirma serem as diferenças de salário determi-nantes da compe-titividade. Protecionistas dosEstados Unidos, por exemplo, mostram-sepreocupados sobre os “50-cents” (salário do

terceiro mundo), como uma desvantagem paraaquele país, porque os seus trabalhadoresrecebem salários muito mais elevados.A questão fundamental em tais comparações éo custo dos serviços do trabalho, e não ossalários, e os custos são, ao mesmo tempo,influenciados pelo preço por unidade de serviçoe pela produtividade.

A questão, do ponto de vista geral, é maisbem discutida em termos de uma novatecnologia de produção. A nova tecnologia podeser viesada em relação aos recursos queeconomiza, e, assim, ter impacto diferenciadosobre as produtividades parciais, mas a funçãode produção é, raramente, completamenteseparável. E, no caso de a função de produçãonão ser separável, a tendenciosidade dependede que nível de insumos se analisa, e, por isto,não se pode alcançar uma conclusão geral.

Dois fatores são de especial importânciapara se discutir a situação tecnológica do Brasil.Em primeiro lugar, o Brasil tem uma capacidademuito forte de gerar tecnologia de produçãopara o setor agrícola, e a Embrapa se destacacomo uma instituição nacional, de respeitointernacional. Ainda há competências regionais,como o Instituto Agronômico de Campinas, asuniversidades e o setor privado. O desen-volvimento da pesquisa do setor privado, emparte, é o resultado de uma política aberta dedireitos de propriedade intelectual. Essaimpressionante competência em ciênciasagrárias tornou o Brasil capaz de produzir umacorrente de novas tecnologias que garantem umelevado nível de competitividade no mercadointernacional.

O segundo fator é que as descobertastornaram possível aprender como usar os solostropicais, como os cerrados. Pesquisadores daEmbrapa não só descobriram como usar essessolos muito efetivamente, com elevadaprodutividade, mas, também, desenvolveramcultivares de soja e milho que aumentaramsignificantemente a capacidade de o Brasilcompetir nos mercados internacionais. Vastasáreas desses solos já são cultivadas, mas há,

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ainda, alguns milhões de hectares de terraadicional que podem ser explorados. O poten-cial de o Brasil competir no mercado internacio-nal de produtos agrícolas é, portanto, muitogrande, quando se debruça sobre o novomilênio.

A revolução tecnológica da agriculturabrasileira é ainda mais geral e ampla eultrapassa os limites das tecnologias quedesenvolveram os cerrados. A nova tecnologia,por exemplo, de gado de corte do Centro-Oeste,é impressionante. Em adição à tecnologia depastagens melhoradas, que aumentam aprodutividade da terra, destaca-se o cruzamentodo zebu com raças européias, a transferênciade embriões, a inseminação artificial e aalimentação no período seco do ano, de baixocusto, que resultam em animais de cortevigorosos que podem ser abatidos com 18 mesesde idade, um imenso ganho de produtividade,quando comparado com o passado recente.

Há, ainda, uma questão de competi-tividade internacional de grande relevância nomomento. Tudo indica que há uma mudançaimportante nas vantagens comparativas emevolução na economia internacional. A mudançaé no setor manufatureiro da agricultura e nospaíses desenvolvidos em comparação com aque-les em desenvolvimento, e, nesse respeito, hámuitas oportunidades para o Brasil.

No período que se seguiu a SegundaGuerra Mundial, os países em desenvolvimento,em linhas gerais, tinham vantagens compara-tivas na agricultura e aqueles desenvolvidos naindústria. As evidências se acumulam paramostrar que esse fundamento de vantagemcomparativa está mudando, em grande parteem razão do novo padrão de investimentos. Ospaíses em desenvolvimento vêm investindo emeducação de forma crescente e contínua, eesses investimentos têm grande importânciapara criar uma força de trabalho adaptada àmanufatura. Em conseqüência, a produtividadedo trabalho dos mesmos cresce relativamenteà dos países desenvolvidos. Muitos países emdesenvolvimento, e não é o caso do Brasil, têm

investido pouco em pesquisa agrícola,aumentando o fosso tecnológico em relação aosdesenvolvidos, enquanto estes têm sustentadoos aportes de recursos para as ciências agrárias.

O resultado dessa confluência detendências é que os países em desenvolvimentoestão desenvolvendo vantagem comparativa naindústria intensiva em trabalho, e os paísesdesenvolvidos tornam-se mais competitivos naagricultura, embora os elevados subsídios tendama ofuscar a conclusão, mas não quando seconsideram comparações, no tempo, dentro domesmo patamar de proteção. O que não deixa deser uma virada de cabeça para baixo, do mundo.Mas, muita pesquisa precisa ser feita para melhorestudar essas transformações.

Para o Brasil essas transformações são muitoimportantes. Naquelas partes do mundo emdesenvolvimento, nas quais se falha em investirem pesquisa agrícola, e a população e a rendapercapita disponível crescem a taxas maiselevadas, a produção agrícola crescerá, poten-cialmente, menos que a demanda. Do ponto devista de estratégia de política econômica, é saberse os países desenvolvidos têm a capacidade deresponder à demanda crescente, dado queconstituem uma pequena parcela da produçãoagrícola mundial. Nesse sentido, o Brasil tem umaoportunidade fantástica. Basta que o Brasilcontinue investindo em pesquisa agrícola edesenvolva políticas de exportação e de câmbioracionais que possam tirar grandes vantagens domercado internacional.

É verdade que se precisa aprofundar aanálise desses pontos, rigorosamente, do ponto devista teórico e empírico, para melhor destrincharas linhas gerais e detalhar as especificidades.

Políticas agrícolase de comércio de outros países

O Brasil, como outros países emdesenvolvimento, sofre as conseqüências dapolítica agrícola e de comércio de outros países.Em anos recentes, as políticas da UniãoEuropéia e dos Estados Unidos têm sido muito

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importantes. Nesses dois grupos de países,forças políticas empurraram os preços para umnível bem acima daquele capaz de igualar ademanda e a oferta. O excesso de produçãoacumulada é, então, eliminado por intermédiode programas como ajuda alimentar para ospaíses em desenvolvimento, programasdomésticos de distribuição de alimentos esubsídios de exportação implícitos e explícitos.

Os subsídios dos Estados Unidos e Europadiferem substancialmente. A União Européiatende a usar subsídios explícitos às exportações,enquanto os Estados Unidos usam subsídiosimplícitos às exportações, que são muito maisperniciosos, inerentes a pagamentos aosprodutores, como um meio direto de subsidiá-los. No entanto, a União Européia e os EstadosUnidos convergem, quanto à política desubsídio às exportações, sendo que a UniãoEuropéia está se movendo rapidamente paraarranjos de pagamentos aos produtores.Pagamentos aos produtores, na medida em quesão estabelecidos bem acima do nível deequilíbrio, tendem a fazer a oferta crescer acimados níveis que os preços eficientes induzem.A não ser que haja um piso para os preços,obviamente garantido pelo governo, os preçosvão declinar. A racionalidade econômica paraessas políticas é que a maior oferta que chegaaos mercados força os preços para baixodaquele nível que, normalmente, teriaacontecido. E os consumidores se beneficiam,assim, dos subsídios aos produtores.

O problema com essas políticas é queelas constituem um subsídio implícito àsexportações. Os preços mais baixos domercado interno ajudam o País a competir, comvantagens, no mercado externo. Para umaeconomia do tamanho dos Estados Unidos econsiderando-se a importância de suas exporta-ções, o impacto do subsídio pode ser muitosignificante. Os produtores dos países emdesenvolvimento pagam um preço muito altopor causa desses subsídios implícitos, porqueparte do mercado internacional lhes é tomado.

Os países em desenvolvimento estãomuito preocupados com a política agrícola

recente dos Estados Unidos, como cristalizada noFarm Bill. O dispêndio adicional projetadopreocupa, não somente porque os preçosinternacionais declinarão, mas sobretudo porquea queda será enorme nos mercados para os quaisos países em desenvolvimento exportam.

Embora a recente legislação apresente-secomo capaz de distorcer o comércio, uma palavraacauteladora merece ser dita. A legislação éexpressa de tal modo que os dispêndios sejamlimitados pelas restrições imposta pela rodada denegociações do Uruguai. As restrições esta-belecem um limite real para os gastos, e, por isso,devem ajudar a reduzir as conseqüênciasnegativas do Farm Bill.

Existe outra importante característica dapolítica do comércio internacional, que é aimportância do programa de ajuda alimentar.Essa assistência econômica vem se tornandopoliticamente importante no mundo desenvol-vido e ainda mais significante, quando os preçosdomésticos declinam nos países exportadores.A ajuda alimentar tem-se tornado cada vezmais importante, como um componente daajuda internacional dos países desenvolvidos.

A despeito do esforço de reduzir o impactoda ajuda alimentar nos mercados, é difícil deixarde classificar esse tipo de ajuda pelo querealmente é – dumping legalmente justificado.A “ qualidade” do dumping piorou significante-mente pela monetização da ajuda. Ela envolvevender os produtos diretamente nos mercados, eos resultados da venda são usados para sustentaras políticas de desenvolvimento dos governosbeneficiados. Como resultado, os preços dosprodutos declinam nos mercados locais, o que épéssimo para os agricultores.

Esse tipo de ajuda não necessita ter osefeitos negativos aludidos, por que os produtospodem ser introduzidos sem ter efeitos tãodepressivos sobre os preços domésticos. Arestrição política, contudo, é que as organiza-ções não-governamentais – ONGs – sealimentam da monetização. Elas, para seupróprio benefício, encorajam a monetização, etem sido bem sucedidas nesse aspecto.

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A fim de concluir esta seção, é precisodestacar que os preços dos produtos agrícolasdevem subir com a liberalização do comérciomundial. A experiência do setor industrial é quea liberalização do comércio resultou na quedados preços. No caso da agricultura, o resultadoserá o oposto, por causa da imensa distorçãoque as políticas agrícolas americanas e daUnião Européia trouxeram.

A participação, em blocos,de comércios regionais

A participação, em blocos, de comérciosregionais pode ter um efeito significante sobre acapacidade de o País competir internacio-nalmente. O bloco regional de interesse imediatopara o Brasil é o Mercosul, do qual fazem parte oBrasil, a Argentina, o Paraguai e o Uruguai.

É ainda uma questão aberta qual será oimpacto do Mercosul na competitividade do Brasilno mercado internacional. Ao contrário da Áreade Livre Comércio dos Países da América do Norte– Nafta –, os países do Mercosul fizeram cresceras barreiras contra os não-membros, enquanto asreduziram dentro do bloco. Como conseqüência,cresceu o comércio dentro do bloco. O acordo,portanto, parece criar comércio. Ao mesmotempo, o acordo redireciona o comércio. Assim ocrescimento do comércio não é de acordo comas vantagens comparativas, o que sugere quecomércio adicional não seja eficiente do pontode vista econômico.

Políticas econômicas domésticas têm sidomanipuladas desde o estabelecimento doMercosul, em resposta a pressões internas.Ainda, as distorções do mercado de câmbio, emprimeiro lugar do Brasil e depois da Argentina,distorceram grosseiramente os fluxos docomércio. Separar o joio do trigo, quanto àmagnitude e à direção das distorções, precisaser prioritário nas estratégias das negociaçõesinternacionais, e muita pesquisa precisa ser feitapara entender o efeito sobre a competitividade,em termos globais, dos países membros doMercosul.

Especialização internacional

Quando é permitida uma divisão setorial eespecialização do trabalho, o comérciointernacional pode ser uma poderosa fonte decrescimento. A adequada divisão e especializaçãodo trabalho é entre os setores, e não em relaçãoaos membros da força de trabalho, como em AdamSmith. Essa divisão e especialização da força detrabalho eliminam as restrições ao crescimentoeconômica do tamanho do mercado. Ao contrário,no mercado internacional não há limites para ocrescimento econômico, uma idéia iluminadorae motivadora.

No caso do Brasil, a especialização ébastante avançada. No caso do Estado de SãoPaulo, cerca de cinco produtos respondem 80%de suas exportações agrícolas. Certamente,trata-se de uma forte especialização, e ganhossubstanciais de eficiência estão em curso ou jáforam realizados.

A estratégia de negociaçãoO Brasil necessita de aprimorar sua

capacidade negociadora, embora já tenha dadoimportantes passos nessa direção. O País temtalentos para desenvolver uma excelentecapacidade para negociar na OMC e na Alca.Mas, os talentos estão dispersos no imensoterritório e em muitas instituições. Meiosprecisam ser encontrados para juntar os talentose dar-lhes condições para, numa colaboraçãoefetiva e eficiente, fortalecer a capacidadenegociadora do País. A Embrapa pode ancoraresses talentos, sem fazer seus quadroscrescerem, apenas criando condições para otrabalho da equipe.

O ponto principal a ser enfatizado é criaruma capacidade analítica para dar apoio efetivoao Ministro da Agricultura, quando negocia osinteresses do Brasil e de sua agricultura. Outrospaíses têm desenvolvido grande competênciano intuito de realizar pesquisa analítico-empírica para substanciar suas negociações, emcomparação com os quais o Brasil seamesquinha, não porque não tenha talentos,

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mas por não ter se interessado em juntá-los,numa agenda-trabalho adequada, e ampará-lossob o guarda chuva de uma organização comoa Embrapa.

Amparado por uma competência analítica,o Brasil deve liderar as negociações em nível daOMC e da Alca. No passado, a liderança foiexercida pelos Estados Unidos, a fim de promovera liberalização do comércio. Os níveis de proteçãodos Estados Unidos são agora tão baixos que essepaís tem pouco a ganhar com níveis ainda maioresde liberalização. Ainda mais, sua dependênciano comércio internacional cresceu substancial-mente no decorrer dos anos, de modo que setornou mais protecionista em anos recentes.

Parte do protecionismo americano éconseqüência da sobrevalorização do dólar, aqual corresponde à cerca de 50%, nos últimosquatro anos. A tendência do valor do dólar,certamente, exercerá um papel importante notipo de liderança daquele país nas negociaçõesinternacionais.

A chave para desenvolver uma estratégiade negociação efetiva é entender asoportunidades e as restrições da economiainternacional. O Brasil deve ser capaz de tirarvantagens das pesquisas dos Estados Unidossobre o comércio internacional. É uma questãode revisão de literatura, na maioria dos casos.É melhor separar a revisão em dois relatórios,um sobre as oportunidades e o outro sobre asrestrições.

A etapa seguinte deve identificar osbenefícios potenciais e custos específicos dasmedidas possíveis de liberalização docomércio. A análise deve-se restringir àsmelhores oportunidades, e darão base científica,tanto teórica como empírica, para o esforço denegociação. Os custos das medidas são tãoimportantes quanto os seus benefícios, porquesão fundamentais para identificar o apoio e aoposição às propostas.

Por último, o Ministério da Agricultura ea Embrapa devem liderar a mobilização detalentos para o estudo das questões do comércio

internacional. Em curto prazo, é preciso mobilizarcerca de doze economistas agrícolas e deformação em economia, dedicados ao comérciointernacional, e lhes dar o suporte necessário. Elespodem reunir-se periodicamente, sob o comandode uma agenda bem focalizada, levando-se emconta as interações com o Itamarati.

As negociações para serem produtivasrequerem a participação efetiva do setor privado.Um comitê assessor técnico (CAT) deve serestabelecido para dar suporte aos negociadorese às negociações. O CAT deve interagir com ogrupo de especialistas, numa base regular. O setorprivado traz conhecimentos particularizados ecríticos que são de sua exclusividade.

Agenda de pesquisaA preparação e a implementação de uma

estratégia de negociação requerem substanciosaadição ao estoque de conhecimento, no que serefere aos níveis de produtividade, à dinâmica daagricultura e aos fatores que influenciam aprodutividade. Limita-se à agenda de pesquisa,deixando-se de lado a metodologia e osprocedimentos necessários à sua implementação.

1. São necessários dados sobre o valorreal das principais moedas dos países com osquais o Brasil mantém comércio. Os dadosdevem ser usados para testar hipóteses sobredistorções do comércio e sobre os fatores queafetam as taxas de câmbio.

2. É importante ter dados sobre astendências da produtividade da agriculturabrasileira relativa aos países competidores. Umdos usos deles é entender as vantagenscomparativas da agricultura ante a indústria.

3. É essencial analisar os efeitos da recentelegislação americana e européia sobre acompetitividade da agricultura brasileira. Oalcance que tem os programas que afetam osprodutos da agricultura americana de constituírem-se num subsídio implícito às exportações e vultodeles. Esse conhecimento é muito valioso.

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4. Analisar cuidadosamente até queponto o Mercosul cria comércio ou o distorce.Os resultados dessa análise, no que tange àintegração do comércio, são muito importantespara melhor se conhecer como a habilidadebrasileira de competir internacionalmente éinfluenciada pelo Mercosul.

5. É preciso conhecer melhor como seespecializa a agricultura brasileira e em quegrau, para se entender as tendências decrescimento da mesma. Da mesma forma,dados sobre o grau de especialização dos

parceiros comerciais brasileiros são importantespara se entender as tendências das produtividadesde suas agriculturas e o padrão de comércio queemergirá.

6. Informações sobre os movimentos deliberação do comércio são de enormerelevância para se desenvolver a estratégiabrasileira de liberação do comércio. A análisedas informações deve ser organizada em tornode movimentos específicos e objetivarconhecer os seus benefícios e custos.

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A evolução docomplexo soja e aquestão da transgenia

Em primeiro lugar é preciso definir ochamado complexo soja: refere-se fundamen-talmente aos produtos da lavoura e doprocessamento primário da soja: grão, farelo eóleo, commodities na acepção mais pura dapalavra. São mercadorias fortemente homo-gêneas, quase sem nenhuma diferenciação portipos ou classificações, como é o caso do café, doalgodão, do arroz e até mesmo do petróleo.Padronização mais perfeita talvez só existe namoeda ou no ouro. Isto se reflete no fato de que ascotações dadas pelos negócios realizados na Bolsade Chicago são balizadoras dos preços nosmercados físicos de todo o mundo, havendo rarasocasiões em que diferenças de preços não reflitamapenas a situação de logística e tarifária/tributáriaentre os diversos países (Fig. 1).

Na safra de 2003/04, o mundo deveráproduzir 200 milhões de toneladas de soja em grão,se for agregado 15% desse valor à produção defarelo e óleo, e, ao mesmo tempo, for consideradoum preço atual de US$ 6,7/bushel, chega-se-á aum valor bruto da produção mundial do setor deUS$ 56,6 bilhões. Excetuando-se o uso do grãode soja para semeadura e uma pequena quanti-dade para a produção de insumos sofisticados paraa indústria alimentícia, principalmente proteínatexturizada e/ou concentrada e produtos daculinária asiática, mais de 95% do produto édestinado ao processamento pela indústria para aprodução de óleo e farelo.

Do total de óleos vegetais consumidos nomundo, o de soja responde com 31%, havendo,portanto, uma ampla possibilidade de substituição.

Sávio Rafael Pereira1

1 Coordenador-geral do Deagro – Mapa/SPA.

Fig. 1. Preços de soja (US$/60 kg).Fonte: http://www.CELERES .com.br/prod-inf.phd

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Seu uso se concentra basicamente como óleode cozinha e como gordura hidrogenada paraindústria alimentícia em geral. No caso dosfarelos, a situação é diferente, já que o de sojaresponde por 70% do consumo mundial. O teorprotéico do farelo de soja, com 44% até 49%de proteína, o coloca como um produto quaseque insubstituível do ponto de vista daconversão para a produção de proteína animal.

A produção e o consumo mundial dosprodutos do complexo soja expandem-se de formaacentuada entre as safras 93/94 e 2003/04, emque a produção mundial de soja cresce a umataxa anual de 5,5% e o consumo de farelo a umataxa também de 5,5% ao ano. O crescimento daoferta do grão se concentrou nos três principaisprodutores mundiais: 32,5% ou 3,9% ao ano nosEstados Unidos, 142,9% ou 9,3% ao ano no Brasile 198,3% ou 11,5% ao ano na Argentina (Tabela1).

Observa-se na Argentina, que teve umaparidade fixa com o dólar em praticamente todaa década de 90 e ao mesmo tempo enfrentou ospiores preços da soja entre 1998 e 2001 nomercado internacional, um crescimento acentu-ado após 1997, a uma incrível taxa de 17% aoano, exatamente quando se iniciou o plantio detransgênicos. Os Estados Unidos, que mantiverampraticamente estagnada sua área de plantio desoja entre o final da década de 70 e meados dadécada de 90, voltaram a crescer, ocupando áreade milho e trigo, após a Lei Agrícola de 1996, oque coincidiu também com o início do plantio dostransgênicos. Evidentemente que os EstadosUnidos têm uma clara limitação para seucrescimento, uma vez que praticamente toda

Tabela 1. Produção mundial de soja (milhões t).

Fonte: http://www.fas.usda.gov/psd/complete-files/default.asp http://www.fas.usda.gov/psd/complete-tables/oil-table11-184.html

Part. %

43%21%11%13%12%

100%

1993/94

34%30%18%

8%10%

100%

2003/04

Part. %

50,924,712,415,314,5

117,8

1993/94

67,260,037,016,219,8

200,2

2003/04

Estados UnidosBrasilArgentinaChinaOutrosTotal

País

área agricultável do país já está ocupada desdeos anos 40, havendo apenas uma troca deprodução entre milho, trigo e soja. No caso doBrasil, a forte expansão no mesmo período estárelacionada à desoneração tributária da LeiKandir, após 1997, a uma forte racionalizaçãoe profissionalização do produtor e sua capitali-zação nos últimos três anos.

Eventos climáticos negativos, de totaldomínio público, aconteceram na área deprodução dos Estados Unidos em quatro dasúltimas cinco safras. Nesse período, de uma safratotal esperada em 400 milhões de toneladas,colheram-se 368 milhões de toneladas, o quesignificou uma perda de 32 milhões de toneladasnas últimas cinco safras. Obviamente que taiseventos climáticos negativos, principalmente aseca, tiveram impacto negativo na produtividadeda lavoura americana. Na Argentina e no Brasil,ao contrário dos Estados Unidos, o crescimentoda produtividade foi expressivo nas últimas dezsafras.Se for tomada a média de produtividade dasúltimas cinco safras em relação à média das cincoanteriores tem-se: crescimento de 16,5% no paísplatino e 14,5% nas lavouras brasileiras. Em ambosos países, na safra de 2002/03 obteve-se o recordede produtividade, 2.818 kg/ha no Brasil e 2817kg/ha na Argentina. Assim, os fatos indicam quenão se pode relacionar ganhos ou perdas deprodutividade com o uso de sementes transgê-nicas, uma vez que a o país vizinho e os EstadosUnidos observaram tendências opostas e ambossão usuários das referidas sementes.

Especificamente no caso do Brasil, o RioGrande do Sul, em virtude de eventos climáticos

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negativos, estrutura da produção e também porrazões técnicas, sempre deixou a desejar emtermos de produtividade em comparação como restante do País. Na década de 80, o RioGrande do Sul apresentou uma produtividademédia de 1.453 kg/ha comparada com a médiade 2.023 kg/ha do Mato Grosso. Entretanto,durante a década de 90, em razão de menorocorrência de eventos climáticos negativos eprincipalmente da mudança na estruturaprodutiva e da eficiência técnica da lavouragaúcha, a produtividade no Rio Grande do Sul,em apenas um ano, se situou abaixo de 1.500kg/ha e, pela primeira vez, superou os 2.000kg/ha. Em 2001, o estado atingiu o seu recordede produtividade até então com 2.395 kg/ha, eem 2003 atingiu sua mais alta produtividade nahistória da cultura no estado, 2.680kg/ha. Secomparar a produtividade média dos anos 80com a de 2003 no Rio Grande do Sul, vê-seque o crescimento foi de 84%, já no MatoGrosso este percentual atinge 44%. Ou seja,quando se fala em acentuado crescimento daprodutividade da soja, no Brasil, nos últimosanos, esse fato, contrariamente ao que se temdivulgado, se deve mais ao Rio Grande do Suldo que ao Centro-Oeste.

O fator fundamental para expansão daprodução e do consumo de soja na últimadécada está ligado aos estímulos da demanda:a conversão da proteína vegetal em animal,basicamente através da produção avícola(frango) e suína, foi o fenômeno que permitiu asgrandes populações espalhadas pelo mundo,principalmente nos países da Ásia, aumentar o

consumo de carne. O crescimento econômicoda economia asiática explica boa parte docrescimento do consumo do farelo e óleo desoja. A China que consumia 5,1 milhões detoneladas de farelo em 1993/94 deveráconsumir 21,5 milhões de toneladas em 2003/04, com um crescimento de 321,3% ou 15,4%ao ano no período mencionado. O Brasilconheceu sua mudança de hábito alimentarcom a revolução do frango. A Europa eliminouparte de sua dispendiosa safra de soja, girassole canola e as substituiu por importações docomplexo soja. Nos Estados Unidos, maiorprodutor, processador e consumidor mundial desoja, o consumo de carne, nos últimos dois anos,cresceu inacreditáveis 40% (Revista Veja,01.10.2003) e o consumo de farelo de soja queera de 22 milhões de toneladas em 1993/94atingirá em 2003/04 29 milhões de toneladas(Tabela 2).

Assim, enquanto a produção mundial desoja cresceu 70,0% entre 93/94 e 2003/04, aprodução de trigo caiu 1,5%, a de arroz cresceu9,7%, a de milho 27,8% e a de forrageiros comoum todo 10,3%. Na verdade, o crescimento daprodução de milho como grão foi em parteconseqüência da destinação de parte da áreaantes cultivada para o produto como forragem,devido ao aumento na demanda para compo-sição de ração em mistura com o farelo de soja(Tabela 3).

Os fluxos comerciais do complexo sojano mercado internacional e as possíveisalterações dos mesmos nas últimas dez safrasestão inteiramente ligados a fatores de oferta,

Tabela 2. Consumo mundial de farelo de soja (milhões t).

Fonte: http://www.fas.usda.gov/psd/complete-tables/oil-tables2-24.html

Estados UnidosAmerica LatinaUnião EuropéiaÁsiaChinaOutrosTotal

País

2,17 %6,67 %3,35 %9,55 %

15,47 %7,17 %5,52 %

Cresc. %anual

22,99,7

22,716,9

5,18,5

80,7

1993/94

28,418,532,142,121,517,0

138,1

2003/04

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Tabela 3. Produção mundial de grãos (milhões t).

Fonte: http://www.fas.usda.gov/psd

SojaMilhoTrigoArrozForrageiros

País

117,8476,4558,1354,9798,6

1993/94

200,2609,0549,5389,3881,6

2003/04

70,00 %27,80 %-1,50 %9,70 %

16,30 %

Cresc. %

demanda, logística e estrutura tarifária/fiscal dosprincipais países envolvidos. No lado da oferta,já mencionado, o espetacular crescimento doBrasil e da Argentina, e do lado da demanda ocrescimento do consumo nas principais regiões,inclusive os supostamente mercados saturadosdos Estados Unidos e União Européia, masprincipalmente nos países da Ásia.

O crescimento na oferta brasileira serefletiu principalmente nas exportações de grão,em detrimento do farelo e óleo: a Lei Kandir, aestrutura fiscal brasileira e a política deimportações da China tiveram papel funda-mental no crescimento das exportações damatéria-prima. Assim, do crescimento de 28,8milhões de toneladas na produção do País desdea safra 95/96, 18 milhões foram paraexportação. O restante se destinou ao aumentono esmagamento pela indústria, paraatendimento do aumento do consumo internode farelo e óleo e pequeno aumento nasexportações desses produtos.

No caso da Argentina, ao contrário doBrasil, do aumento de 23 milhões de toneladasna sua produção, desde a safra 95/96, 15milhões de toneladas foram para o esmaga-mento da indústria e posterior exportação comofarelo ou óleo. Assim, a Argentina se tornou omaior exportador mundial dos dois subprodutos,uma vez que seu consumo interno é muitopequeno. A diferença do Brasil é que no paísplatino a estrutura tributária dificulta asexportações do grão facilitando as exportaçõesdo farelo e óleo.

Nos Estados Unidos, do aumento de 10milhões de toneladas na produção de grãodesde a safra 95/96, 6 milhões de toneladas se

destinaram ao esmagamento da indústria paraatender o aumento no consumo interno de fareloe óleo, e os restantes 4 milhões se destinaramao mercado chinês, que em 1995 praticamentenão importava nada de soja.

Dessa forma, pelo lado da oferta, asmudanças no marketing share do Brasil,Argentina e Estados Unidos, no mercadointernacional da soja grão, se devem a fatoresde logística ou tarifários/tributários, nãopodendo ser relacionadas ao uso de sementesgeneticamente modificadas (se relação houverela é muito positiva no caso da Argentina, comomencionado anteriormente).

Pelo lado da demanda, o consumo defarelo de soja no suposto mercado saturado daUnião Européia cresceu 45% nos últimos dezanos, ou 3,87% ao ano. Esse crescimento serefletiu inteiramente nas importações de grão efarelo de soja, já que as importações do primeiroaumentaram em 5,2 milhões de toneladas e dosegundo em pouco mais de 4 milhões detoneladas Todo o aumento nas importações desoja em grão nesse período pela UniãoEuropéia foi atendido pelo Brasil, que naverdade até ocupou parte das vendas ame-ricanas e argentinas, já que as exportaçõesbrasileiras para o referido mercado saíram de3,2 milhões de toneladas para 9,2 milhões detoneladas. A redução das exportações ameri-canas para a União Européia, como já foi dito,é explicada por duas razões: maior consumonos Estados Unidos e maior demanda na China,que do ponto logístico é melhor atendida pelosamericanos do que pelos sul-americanos.Entretanto, o crescimento nas importações defarelo pelos europeus foi inteiramente suprido

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pelos argentinos, que aumentaram em mais de5 milhões de toneladas suas vendas na UniãoEuropéia. A razão, já também mencionada, é apolítica tributária interna da Argentina quebeneficia as exportações dos subprodutos dasoja. Assim, a diminuição da participação nomercado europeu pelos Estados Unidos nãopode ser relacionada ao plantio de transgênicos,por que a Argentina é o maior usuário dessasemente ( Tabelas 4 e 5).

A China se tornou o maior importadormundial de soja grão. O País que praticamentenão importou nada em 1993, em 2003 importou

19 milhões de toneladas. Suas compras externasestão bem distribuídas entre Estados Unidos,Brasil e Argentina. O maior crescimento dasvendas brasileiras no mercado chinês nosúltimos dois anos está relacionada à maiordisponibilidade do produto brasileiro, queexportou em 2002 4,1 milhões de toneladascomparadas a 4,3 milhões vendidas pelosamericanos. A China não importa farelo, poistem uma política de favorecimento à indústriainstalada no País. Mas se considerar a Ásia comoum todo, suas importações de farelo aumen-taram em 6 milhões de toneladas nos últimosdez anos (Tabelas 4 e 5).

Tabela 4. Exportações de soja em grão (jan./dez. – 1.000 t).

Estados Unidos4.0773.3654.0313.8043.7533.5103.7853.6283.5893.767

Japão

7.6956.7878.6198.3308.3527.7717.0417.1076.4865.910

União Européia

19.51118.12622.99225.96026.37520.70124.09027.19228.93427.433

China Outros Total

9833

1991.4951.5251.3341.8935.2315.4364.382

7.6417.941

10.14312.33112.745

8.08611.37111.22613.42313.374

1993199419951996199719981999200020012002

Ano

Brasil617780321358559524364530768712

3.1923.7753.0583.0235.7946.1676.5866.4979.7019.196

4.1905.3673.4933.6478.3409.2878.917

11.51715.67515.970

35--

52440941621

1.8193.1924.143

346812114214

1.5471.6561.3462.6712.0151.919

1993199419951996199719981999200020012002

Argentina

154

11

302627172225

1.9291.7041.9491.596

3491.0831.057

451705

1.176

2.4282.9422.5262.056

4902.8643.0654.1237.2116.112

--

105213

-408

1.0352.8254.8692.835

4891.184

471246111

1.347946830

1.6152.076

1993199419951996199719981999200020012002

Fonte: http://www.oilword.biz/app.php

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Tabela 5. Exportações de farelo de soja (jan./dez. – 1.000 t).

Estados Unidos--

247226263266209219278116

Japão

--

1.399936

1.8471.537

673507691493

União Européia

--

5.8905.8606.9948.0356.6346.2807.1416.546

Outros Total

--

4.2444.6994.8846.2335.7525.5546.1715.938

1993199419951996199719981999200020012002

Ano

Brasil--

114167324393388133

9161

--

8.8486.6986.0726.9237.0917.3159.2129.366

--

11.56311.22610.01310.78010.9119.527

11.28912.517

--

2.6014.3313.6183.4643.4322.0791.9863.090

1993199419951996199719981999200020012002

Argentina

--

779843

7-7--

--

4.3854.1143.8906.4318.4397.8478.2179.591

--

6.8878.3508.142

11.55913.08812.93114.42516.525

--

2.4254.1384.2095.1214.6485.0776.2086.934

1993199419951996199719981999200020012002

Fonte: http://www.oilword.biz/app.php

Pelo lado da demanda é relevante observarque no Japão não se observou crescimento nassuas compras externas de soja, que se mantémem torno de 5 milhões de toneladas nos últimosdez anos. Desse total, o País usa 4 milhões paraprocessamento e produção de farelo e óleo, e ooutro 1 milhão é dirigido ao mercado especial paraalimentação humana (queijos, molhos e outrasiguarias na culinária asiática). É um mercadoexigente onde os americanos respondem por 80%de suas necessidades, por razões também delogística (Tabelas 4 e 5).

Finalmente, sobre o mercado interna-cional, é importante mencionar que os preçostomados no porto de Rotterdam, principal praçade referência na Europa, não mostram qualquerpreferência pela soja brasileira ou americana:

Preços da soja em Rotterdam US$/t

BrasilEstados Unidos

Out./01 –set./02

291243

200289

Out./02 –set./03

242200

Out./2003

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ConclusõesMito I: A produtividade da lavoura de soja

nos Estados Unidos vem apresentando tendên-cia de queda, por causa do uso de sementestransgênicas.

Fato: A queda na produtividade da lavou-ra, observada nas últimas cinco safras, deve-seclaramente a eventos climáticos. No ano de 2003,os americanos pederam 13 milhões de toneladasde soja em relação a sua estimativa inicial decolheita de 80 milhões de toneladas. A Bolsa deChicago reflete todos os dias esse fato no seupregão e é do conhecimento de todo o mercado.É o conhecido mercado climático.

Mito II: O crescimento da produtividadeno Brasil nos últimos anos deve-se ao fato de oPaís não cultivar sementes transgênicas,principalmente no Centro-Oeste.

Fato: O crescimento da produtividade noBrasil ao longo da década de 90 foi observadoem todas as regiões, isso ocorreu em razão damaior racionalização e eficiência técnica doprodutor. O Estado do Rio Grande do Sul, ondesabidamente se planta uma razoável parcelade sua lavoura com sementes transgênicas, é oque apresenta maior crescimento da produti-vidade nos últimos anos.

Mito III: O mercado internacional estárecusando a soja transgênica e está dando prefe-rência à soja brasileira.

Fato: As alterações no fluxo comercial docomplexo soja nos últimos dez anos refletem as

diversas situações de logística, estrutura deprodução e tributação/tarifária vividas pelosprincipais ofertantes e demandantes do produto.O Brasil aumentou suas exportações de grão, paraa Europa, da mesma forma como a Argentinaaumentou as de farelo. O Japão continua sendoum importador fundamentalmente dos EstadosUnidos. A China é importadora quase queigualmente aos Estados Unidos, Brasil e Argentina.

Mito IV: O mercado internacional pagamais pela soja não transgênica.

Fato: Existem nichos de mercado paraprodutos sofisticados à base de soja, comoproteína texturizada/concentrada, alimentoschamados naturais, queijos e outros que emmuitos casos exigem uma soja exclusiva emtermos de coloração, limpeza, teor protéico, àsvezes produtos orgânicos e outros, mas essesnão têm representatividade no comércio dasoja. Como dissemos, o produto em 95% da suaprodução é destinada ao farelo e óleo e aí nãoexistem diferenças de preços. É o que mostra oproduto disponível em Rotterdam, de origemamericana ou brasileira.

Mito V: Os países estão banindo oconsumo de soja transgênica.

Fato: Não existem proibições ao comér-cioou consumo de soja transgênica na UniãoEuropéia, no Japão, na China, na Índia, nos EstadosUnidos e na Argentina. Entre os principais partici-pantes deste mercado no mundo, somente o Brasilmantém sua proibição.

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Os impactos daReforma Tributáriano setor agropecuário

IntroduçãoNão importa o nome – vamos chamá-lo

de Zé. Era fazendeirinho, este que hoje se querchamar pedantemente – proprietário familiar.Matou o seu capado, como fazia de tempos emtempos, separou a parte que precisava para asdespesas, mas o diabo do porco era grande esobrou uma banda. Chamou o vizinho quehavia ajudado no destrinchar e cuidadosamenteajaezou a metade excedente com o paletóvelho que já não lhe servia, encimado por umlargo e desmanchado chapéu de palha. Comcuidado, acomodaram o espantalho no bancodo carona da camionete de carroceria demadeira, amarrando tudo direitinho. E lá se foiele para atravessar, de tardinha, a ponte doParaúna, zelosamente guardada pelo fiscal dareceita estadual, na sua imperial guarita.

Cioso da missão de evitar prejuízos aoerário, nosso sentinela iluminou com a lamparinaa caçamba vazia e liberou a passagem.

Lá se foi o Zé, para entregar a carga noaçougue do compadre, o que asseguraria reforçovalioso na receita do mês.

O vizinho veio a pé, para assistir e,eventualmente, ajudar, se tivesse havidoproblema com o fiscal, mas não conseguiufurtar-se a um papo.

– E aí, tudo bem?

– Bom, meio frio, né? Este mundo estámesmo mudado. Não é que acabou de passaraqui uma Ford velha com um sujeito que nuncavi na vida tão parecido com um porco!

A isto, chegamos num regime tributáriocomplicado como o nosso. O contribuinte buscacaminhos que o livrem do custo e da buro-cracia. O tamanho da informalidade nos diver-sos setores da vida econômica mostra que épreciso mudar.

Simplificar, ampliar a base dos que pagam.Equilibrar a carga.

Razões que ecoaram na sociedade eacabaram justificando sucessivas tentativas doExecutivo de alterar a Constituição. O projetodo Executivo vem sendo objeto de acerbadascríticas que, em síntese, o responsabilizam poruma elevação da carga tributária, ao mesmotempo em que atende pouco às causas básicasque cumpria corrigir.

O Conselho Superior de Agricultura ePecuária do Brasil – Rural Brasil3, sob aliderança da Confederação da Agricultura ePecuária do Brasil – CNA –, tem participadoativamente dessas discussões. Apóia posiçõesde alcance geral, ao lado das demais confede-rações, buscando, ao mesmo tempo, alterações

Antônio Ernesto de Salvo1

Getúlio Pernambuco2

1 Engenheiro agrônomo, fazendeiro, presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA – e do Conselho Superior de Agricultura e Pecuáriado Brasil – Rural Brasil.2 Economista, chefe do Departamento Econômico da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA.3 O Rural Brasil é constituído pela Associação Brasileira de Criadores – ABC –, Associação Brasileira dos Criadores de Zebu – ABCZ –, Associação Brasileirados Produtores de Algodão – Abrapa –, Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA –, Conselho Nacional do Café – CNC –, Organização dasCooperativas Brasileiras – OCB –, Sociedade Rural Brasileira – SRB – e pela União Brasileira de Avicultura – UBA.

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naquilo que precisa ser aperfeiçoado na áreaespecífica do agronegócio.

A Proposta de Emenda Constitucional(PEC) que altera o Sistema Tributário Nacional,conforme aprovada na Câmara dos Deputados,aumentava a carga fiscal do setor, elevando ocusto de produção e reduzindo a nossacompetitividade no comércio internacional.O texto encaminhado pelo Executivo insere aprogressividade do imposto em todos os tributos,sinalizando uma tendência de aumentar a cargatributária, cujo indicador é mensurado pelarelação entre o valor dos tributos arrecadadose o Produto Interno Bruto (PIB), que mede atransferência de renda do setor privado parafinanciar os gastos dos governos federal,estaduais e municipais.

Em 2003, a carga tributária foi de 36,11%.Estudo do Instituto Brasileiro de PlanejamentoTributário – IBPT – aferiu que no primeiro trimes-tre de 2004, a carga tributária já atingiu 40,01do PIB (Amaral & Olenike, 2004). O setoragropecuário será profundamente afetado emdecorrência das mudanças introduzidas noImposto sobre Operações Relativas à Circulaçãode Mercadorias e sobre Prestações de Serviçosde Transporte Interestadual e Intermunicipal ede Comunicações (ICMS); na contribuição parao Programa de Integração Social (PIS), em vigordesde a minirreforma do ano passado e naContribuição para o Financiamento daSeguridade Social (Cofins), para torná-la nãocumulativa.

A proposta do poder Executivo, aprovadana Câmara, incorpora a teoria da tributaçãoótima, que visa unicamente otimizar a arreca-dação governamental. A maximização dareceita tributária conduz à conhecida regra do“inverso das elasticidades”, pela qual asalíquotas dos tributos são inversamenteproporcionais à elasticidade-preço da demandado bem. Dessa forma, para aumentar a suaarrecadação, o governo fixará alíquotasmaiores para os bens essenciais de primeiranecessidade e alíquotas menores para oschamados bens de luxo. Essa forma de taxação

á altamente regressiva, não procura conciliarcritérios de eficiência econômica com eqüidadedistributiva.

As mudanças do ICMSO ICMS é o principal imposto estadual e

o segundo maior imposto em termos dearrecadação no País, se forem considerados ostributos federais. Conforme se pode verificar naTabela 1, o ICMS participa com 27,5% dostributos arrecadados. Em face da suaimportância, qualquer modificação na legis-lação do ICMS tem grandes implicações nosnegócios e no planejamento tributário dosagentes econômicos. Basta dizer que essetributo é que tem determinado a localização dosprincipais investimentos em agronegócio no País.

Vigora, atualmente, o Convênio ICMS100/97, que reduz a base de cálculo do impostonas operações interestaduais, em 60% para osagroquímicos, sementes e produtos veterináriose, em 30%, na base de cálculo para farelos,tortas de soja e canola, além do milho para aalimentação animal. Com a reforma tributária,esse convênio não poderá ser prorrogado pelodisposto na alínea a, do inciso I, do Artigo 90,do Ato das Disposições Transitórias da Consti-tuição, que autoriza a manutenção do incentivopelo prazo do ato concessório. No caso doConvênio ICMS 100/97, a vigência é até 30 deabril de 2005, vedada a sua prorrogação porforça do inciso II, desse mesmo artigo. Valeressaltar que, além desse tratamento concedidopara reduzir o impacto do ICMS no comérciointerestadual, diversos estados concedemisenção nas operações internas, dispensando orecolhimento do imposto.

Há dúvidas sobre como ficará a tribu-tação do ICMS, caso seja vedada a prorrogaçãodo Convênio ICMS 100/97. Pela reformatributária, as únicas alíquotas de ICMS referidassão de 4%, para efeito de determi-nação daparcela do imposto devida ao estado de origem;sendo que a alíquota máxima é de 25%. Pelo

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 200435

Tabela 1. Arrecadação tributária - período 2000 a 2002. Principais tributos - valores correntes.

Imposto sobre a rendaICMSConfinsCPMFIPICSLL - Cont. social sobre lucro líquidoPIS / PASEPImposto de importaçãoIOF - Imp. sobre operações financeirasITR - Imp. territorial ruralTotal

Participaçãodo tributo

(%)

Elaboração: CNA / Decon.Fonte: Banco Central do Brasil (2003).

Tributos

R$ Milhões

Anos

28,7 %27,5 %17,5 %

6,8 %6,6 %4,5 %4,3 %2,7 %1,3 %0,1 %

100,0 %

2001

64.908,094.309,346.364,017.197,019.456,0

9.366,011.396,09.087,03.585,0

228,0275.896,3

56.397,082.314,639.903,014.545,018.839,0

9.278,010.043,0

8.510,03.127,0

267,0243.223,6

2000 2002

85.802,082.314,652.266,020,368,019.798,013.363,012.870,0

7.970,04.023,0

245,0299.019,6

prazo de três anos, os estados poderãoestabelecer adicional de até cinco pontospercentuais, para até quatro mercadorias eserviços, desde que não supere as alíquotasvigentes na data de promulgação da emendaconstitucional. Com essa exceção, de carátertransitório, o inciso V do artigo 155 estipula queas alíquotas uniformes, de forma permanente,em todo o território nacional, serão no máximocinco. Os estudos que quantificaram asalíquotas necessárias para impedir a reduçãoda arrecadação tributária dos estados indicamque as alíquotas serão, além das já mencio-nadas, de 12%, 15% e 18%.

Atualmente, a existência de 28 legisla-ções de ICMS, sendo 27 nos estados e no DistritoFederal e uma lei federal, possibilita tratamentoespecífico para diversos produtos, o que permitea isenção e redução da base de cálculo devários insumos e produtos agrícolas nacomercialização interna dos estados. Umalegislação federal para o ICMS inviabiliza essetratamento, já que a regra será unificada paratodos os entes federativos. Tal fato implica,necessariamente, em aumento da carga fiscal,motivado principalmente pela nova regra dedistribuição da arrecadação do ICMS.

Estados exportadores líquidos, cuja baseeconômica está alicerçada na agropecuária,

tenderão a uma redução na arrecadação. Pelanova regra, no caso de uma venda interestadualno valor de R$ 1.000,00, realizada por MatoGrosso para São Paulo, o fisco de Mato Grossoficará com R$ 40,00 e o de São Paulo com R$80,00, para uma alíquota do ICMS de 12%. Paraque não ocorra perda de arrecadação nosestados produtores, por conta dessa nova regrade distribuição da arrecadação – quatro pontospercentuais na origem –, a alíquota tenderá aser maior, para a formação de um fundo que,segundo a Proposta de Emenda Constitucional(PEC), irá compensar eventuais prejuízos. Cabeobservar, no entanto, que não está prevista naPEC uma contribuição maior para o fundo pelosestados que aumentarem a sua arrecadação.

A isenção do ICMS, conforme previsto naalínea b, do inciso VII, do artigo 155, seráconcedida apenas aos gêneros alimentícios deprimeira necessidade e medicamentos de usohumano, a serem definidos em lei comple-mentar.Dessa forma, inegavelmente, haverá aumento decarga tributária para os insumos que atualmentesão diferidos no comércio intra-estadual. Ademais,por força da alínea b, do inciso V, do artigo 155,alimentos e medicamentos de uso humano queestiverem fora da lista da lei complementar paraisenção serão gravados com a menor alíquotado ICMS, podendo estender essa menor alíquota

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às mercadorias, bens e serviços definidos pelocolegiado dos representantes dos estados eDistrito Federal.

Atualmente, a alíquota cheia do ICMSpara os insumos agropecuários é de 12% nocomércio interestadual, excetuando-se acomercialização do Sul e Sudeste, a exceçãodo Espírito Santo, Norte, Nordeste, Centro-Oestee o Espírito Santo, que são gravadas com aalíquota de 7%. Não existindo mais essaalíquota, nem a redução da base de cálculo,esse comércio será gravado pela segunda maioralíquota, provavelmente de 12%, já que a de4% destina-se a alimentos de primeiranecessidade e medicamentos humanos. Maisuma vez, haverá aumento da carga fiscal nocomércio interestadual. Mesmo se algunsinsumos se enquadrarem na menor alíquota de4%, pelo colegiado – que será o novo Confaz– haverá aumento da carga fiscal. Com oConvênio ICMS 100/97, a menor alíquota efetivano comércio interestadual é 2,8% (alíquota de7% com redução da base de cálculo de 60%).A majoração da alíquota do ICMS com a Cofinselevará nominalmente as alíquotas combinadasem 378,7%, conforme mostra a Fig. 1.

Considerando a nova alíquota de 7,6%,proposta para a Cofins, foram simulados os

aumentos dos custos variáveis de produção,que são o desembolso dos produtores noscusteios das lavouras. A combinação da novarealidade do ICMS com o PIS e a Cofinsaumentará os custos de produção nospercentuais demonstrados na Tabela 2, queoscilam de um mínimo de 5,1%, para o café,até 15,9%, para a batata.

Nesta avaliação dos impactos causados poresses aumentos de custos, os percentuais estãosubestimados, pois apenas foram considerados osreflexos dos aumentos dos preços dos fertilizantes,defensivos e sementes, mantendo-se constante ocusto dos demais insumos. O aumento de cargafiscal para a pecuária bovina de leite e de corteé considerável, já que o custo variável deprodução deverá aumentar 11,65% e 7%,respectivamente (Tabelas 3 e 4). Haverá acrésci-mo dos dispêndios dos pecuaristas com suple-mento mineral, vacinas, medicamentos, adubose calcário utilizado para a formação do pasto.

O aumento dos preços dos insumosA reforma tributária vai gerar aumento

no custo da produção agrícola, com perda decompetitividade para os agricultores. O grandevencedor dessa reforma tributária será o

Fig. 1. Reforma tributária – aumento da carga fiscal sobre insumos, operações internas – conforme relatórioaprovado na Câmara.Fonte:CNA/Decon

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Tabela 2. Impacto da reforma tributária no custo variável da produção agrícola. Despesas com insumospara cada R$ 100,00 de custos variável.

FertilizantesDefensivosSementesOutrosTotalAumento docusto variável

Fontes primárias dos custos: (1) SEAB / Deral, custos de manutenção da cultura; (2) a (4) SEAB / Deral - Custo variável para o Estado do Paraná. Cálculo dos impactos daReforma Tributária: CNA / Decon; (5) Considerando os impactos da Reforma Constitucional, da minirreforma (PIS) e elevação da Cofins na mesma produção que o PIS.Fonte: PARANÁ (2003).

Insumos

Milho(4)

Despesapré-

reformaR$

Despesapós-

reforma(5)

R$

30,9414,2212,3542,49

100,00

-

38,0417,4915,1942,49

113,21

13,2 %

Feijão safradas águas(3)

7,668,21

14,4969,64

100,00

-

9,4210,0917,8269,64

106,97

7,0 %

Despesapré-

reformaR$

Despesapós-

reforma(5)

R$

Batata lisa safradas águas(2)

19,1725,2524,9430,63

100,00

-

23,5831,0530,6730,63

115,93

15,9 %

Despesapré-

reformaR$

Despesapós-

reforma(5)

R$

Café em cocoadensado(1)

Despesapré-

reformaR$

15,906,21

(1)77,88

100,00

-

Despesapós-

reforma(5)

R$

19,567,64

-77,88

105,08

5,1 %

governo, que terá um aumento de 488,6% naarrecadação conjunta do PIS, Cofins e ICMSincidentes na comercialização de fertilizantese defensivos. A arrecadação tributária, noperíodo pré-reforma, é estimada em R$ 815milhões anuais. Com a reforma, a arrecadaçãopotencial será de R$ 4,8 bilhões, conformemostra a Tabela 5. Esse valor será deduzido do

Tabela 3. Impacto da reforma tributária no custovariável na pecuária bovina de leite. Despesas cominsumos para cada R$ 100,00 de custo variável(1).

RaçãoVacinas emedicamentosSal mineralInsumos parapastagem evolumosoOutrosTotal

Aumento do custo variável(1) Considerando os impactos da Reforma Constitucional, da minirreforma (PIS)e elevação da Cofins na mesma proporção que o PIS.Cálculo dos impactos da reforma tributária: CNA / Decon.Fonte: Embrapa Gado de Leite (2003).Custo para o sistema de leite mestiço à pasto, para produção de 586 litros deleite / dia.

Insumos

Bovinocultura de leite

Despesapré-reforma

R$

38,01

2,301,79

8,6249,28

100,00

Despesapós-reforma(1)

R$

46,74

2,832,20

10,6049,28

111,65

11,6%

Tabela 4. Impacto da reforma tributária no custovariável na pecuária bovina de corte. Despesas cominsumos para cada R$ 100,00 de custo variável(1).

SuplementomineralVacinas emedicamentosInsumos parapastageme volumosoOutrosTotal

Aumento do custo variável(1) Considerando os impactos da Reforma Constitucional, da minirreforma (PIS)e elevação da Cofins na mesma proporção que o PIS.Cálculo dos impactos da reforma tributária: CNA / Decon.Fonte dos custos primários de produção: Embrapa Gado de Leite (2003), custopara o sistema de leite mestiço à pasto, para produção de 586 litros de leite / dia.Fonte: Indicadores Pecuários (2003).

Insumos

Bovinocultura de corte

Despesapré-reforma

R$

18,67

5,37

6,2869,68

100,00

Despesapós-reforma(1)

R$

22,96

6,60

7,7269,68

106,96

7,0 %

Produto Interno Bruto da agricultura, causandoredução de 5,5% no PIB agrícola, apenas porconta do aumento do custo dos fertilizantes edos defensivos. Tal percentual representa quaseoito vezes o crescimento do PIB do País,projetado para 2003.

A reforma tributária dificulta a recu-peraçãodos créditos para 90% dos produtores rurais,

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pessoas físicas, impossibilitados pela ausência deescrituração fiscal eficiente. Mesmo para aquelesque mantenham um controle contábil eficiente, odisposto na alínea b, do inciso II, do artigo 155,dispõe que a isenção e não-incidência acarretarána anulação dos créditos relativos às operaçõesanteriores, a não ser que a lei complementarestabeleça créditos para as situações queespecifica.

Mesmo que consiga a utilização doscréditos nas operações anteriores do ICMS, aagropecuária enfrentará situações em que acumulatividade se tornará rotina. Assim, osprodutores pagarão mais tributos do quedeveriam, devido à concorrência entre osmercados. Os produtores não têm como fixar opreço da sua mercadoria e, no caso dascommodities, as cotações são determinadas embolsas internacionais. O preço ao produtor seráaquele deduzido de todas as despesas e tributos.Dessa forma, aumento de tributo implica emredução dos preços recebidos pelos produtorese aumento de preço na ponta, para o consumidorfinal.

O ICMS tributa o produto em todas asfases da produção podendo, com rarasexceções, utilizar os créditos da etapa anterior.Com esse procedimento, pretende-se tributar ovalor agregado em cada etapa produtiva.Porém, o pagamento do tributo, em todas asfases, necessita de maior disponibilidade de

capital de giro, o que aumenta o custo finan-ceiro para os setores produtivos, principalmentenum ambiente de elevada taxa de juro. Ademais,é preciso mencionar que a tributação sobre valoragregado configura a bitributação. Se for analisadopela ótica da renda do produtor, o valor agregadoao produto tem a finalidade de remunerar osfatores de produção no processo produtivo, quesão os salários, aluguéis, lucro, juros, itens que játributados de alguma forma.

Caso os insumos agropecuários não tenhamo mesmo tratamento do produto final, o efeito serácontrário ao esperado para a questão dosalimentos. Em vez de reduzir o custo dosalimentos, poderá aumentá-lo, pois os insumosutilizados no processo produtivo não têm, no textoaprovado pela Câmara, nenhum tratamentoisonômico com o produto final. Dessa forma, aisenção de tributação nos alimentos, apenas nafase de venda ao consumidor final, para-doxalmente, punirá o produtor, que não poderáser ressarcido ou compensado pelos impostoscontidos nos insumos, refletindo-se na elevaçãodos preços dos alimentos.

A ação do Rural BrasilO relatório da reforma tributária, apro-

vada na Câmara dos Deputados, imputava umaelevação significativa da carga tributária parao setor agropecuário. Apenas nas despesas com

Tabela 5. Aumento das despesas dos produtores com aquisição de fertilizantes e defensivos com areforma tributária, conforme relatório da Câmara dos Deputados.

Fertilizantes(3)

Defensivos(4)

Total(1) Considerando inserção do ICMS na comercialização dentro do Estado.(2) Considerando que o ICMS de 12% e Cofins de 7,6%, cálculo por dentro.(3) Associação Naciona para Difusão de Adubos - Anda.(4) Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola - Sindag.Elaboração: CNA / Decon.

Insumos

2.722,52.075,14.797,6

Despesa dosagricultores na aquiçãode insumo no período

pré-reformaR$ milhões

9.840,07.500,0

17.340,0

462,5352,5815,0

Despesa total dosagricultores na

aquisição de insumosno período pós-reforma

R$ milhões

12.100,09.222,6

21.322,6

23,0 %23,0 %23,0 %

Aumentopercentual dadespesa dosprodutores na

compra deinsumos

Despesa comimpostos - R$

milhões

Noperíodo

pré-reforma(1)

Noperíodo

pós-reforma(2)

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fertilizantes e agroquímicos, os produtores ruraisteriam um aumento de 23% nas despesas comesses insumos. A decisiva participação doConselho Superior de Agricultura e Pecuária doBrasil – Rural Brasil, sob a liderança da Confede-ração da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA–, junto ao Senado Federal mudou esse quadroinicial. Com essa medida, os produtores deixarãode gastar R$ 3,9 bilhões, a mais, com o pagamentode impostos na compra desses insumos.

Foram acatadas pelo relator da reformatributária, senador Romero Jucá, as seguintesmodificações, que trazem impactos positivos parao setor agropecuário:

•Adoção de menor alíquota ou isenção dacobrança do ICMS sobre os insumos agrícolas ematerial reprodutivo destinado ao melhoramentogenético animal – Esse dispositivo impediu oaumento da tributação desses produtos,propiciando uma economia para os produtoresrurais da ordem de R$ 3,9 bilhões apenas nascompras de fertilizantes e agroquímicos. Casocontrário, o custo para os produtores poderiaaumentar cerca de 23%, considerando a provávelsegunda menor alíquota do ICMS de 12% e anova Cofins de 7,6%, fixada pela Lei nº 10.833,de 29/12/2003. Assim, passa a ser definitivo otratamento estabelecido pelo Convênio ICMS100/97 a esses produtos, que vigora até 30/04/2005. O tratamento preferencial para osinsumos agropecuários, por tempo indeter-minado, alcança todos os produtores rurais pelaredução da carga tributária, que diminui o seucusto de compra.

•Inclusão de tratamento diferenciado aosprodutores rurais, pessoas físicas e jurídicas, emrelação ao ICMS, a serem definidos em LeiComplementar – Esse dispositivo visa simpli-ficar e reduzir a carga tributária do imposto, aexemplo do que ocorre com as microempresase empresas de pequeno porte. Embora aproposta da CNA fosse de inclusão dessetratamento no artigo 179 da ConstituiçãoFederal, para proporcionar tratamento diferen-ciado em relação aos tributos federais, estaduaise municipais, a sua inclusão apenas em relação

ao ICMS já traz ganhos significativos aosprodutores, tendo em vista que a Constituiçãodispensa tratamento especial apenas àsmicroempresas e empresas de pequeno porte.

•Constitucionalização da não incidênciado ITR (Imposto Territorial Rural) sobre asflorestas e demais formas de vegetação natural,consideradas de preservação permanente, asáreas cobertas por florestas nativas, primitivasou regeneradas, as comprovadamente imprestá-veis para quaisquer explorações agrícolas,pecuárias, granjeiras, aqüícolas ou florestais,bem como aquelas sob restrição normativa decaráter ambiental – Com esse tratamento, acarga tributária do ITR será reduzida peladesoneração de custo tributário aos produtoresrurais. Infelizmente, continua no texto aprogressividade desse imposto, já duplamenteprogressivo. Sua alíquota aumenta em funçãodo tamanho da propriedade e da redução doGrau de Utilização da Terra (GUT).

Os pontos considerados pendentes detratamento adequado para o setor rural na reformatributária, são:

•Desonerar as máquinas e implementosagrícolas do ICMS e do IPI – Quanto ao ICMS,informações do Senado indicam a possibilidadede acolhimento pelo relator da matéria dasugestão de tributar máquinas e implementoscom a menor alíquota prevista pelo texto dareforma, de 4%. Atualmente, a alíquota aplicadasobre máquinas e implementos é de 5,6%, porforça do Convênio ICMS nº 52/91. Com aeventual implementação da alíquota de 4%, osprodutores poderão economizar R$ 32 milhõesnas aquisições de tratores e colheitadeiras, casoseja cumprida a meta orçamentária deR$ 2 bilhões nos financiamentos previstos peloModerfrota para a safra 2003/2004.

•Isentar da tributação as importações deinsumos agropecuários e suas matérias-primas– É o caso das importações de matérias-primasde fertilizantes, que representam cerca de 60%do consumo interno. As importações são gravadascom imposto de importação e ICMS. Conforme otexto aprovado na Câmara, não modificado no

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Senado, novos tributos passarão a incidir sobre asimportações, que são o PIS, com alíquota de1,65%, a Cofins, com 7,6% de alíquota, e aContribuição Social de Intervenção no DomínioEconômico – Cide.

ConclusãoA reforma tributária está sendo apelidada,

pelos especialistas, de remendo tributário, já quenão considera propostas mais arrojadas demodificação dos tributos existentes no País.O aumento das alíquotas do PIS/Pasep elevou aarrecadação do governo em mais de 21%, nosnove meses de 2003, comparado a igual períododo ano anterior. Dessa forma, a calibragem daalíquota precisa ser revista. Certamente, o mesmoocorrerá com a Cofins, fixada em 7,6%. Essespercentuais aumentaram a carga tributária do País.

As contribuições sociais, por seremtributos indiretos, são altamente regressivas,aumentando a concentração de renda. Nessasituação, quem tem renda mais baixa, paga amaior parcela do tributo.

A reforma tributária foi aprovada de formafatiada. A Emenda Constitucional nº 42, de 19 dedezembro de 2003, aprovou a parte queinteressava imediatamente ao governo: desvin-culação das receitas tributárias; prorrogação daCPMF; incidência das contribuições sociaissobre as importações de bens e serviços; e aprogressividade dos tributos.

Dessa forma, chegamos ao mesmoregime tributário citado no início. O contribuintebusca caminhos que o livrem do custo e daburocracia. O tamanho da informalidade nosdiversos setores da vida econômica prova que épreciso mudar.

ReferênciasAMARAL, G. L.; OLENIKE, J. E. Carga Tributária Brasileira 1ºtrimestre de 2004. Instituto Brasileiro de PlanejamentoTributário. www.ibpt.com.br>.Acesso em 2004.

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório Anual. Brasília, 2003.

INDICADORES PECUÁRIOS. São Paulo: Confederação daAgricultura e Pecuária do Brasil, 2003.

PARANÁ. Secretaria daAgricultura e do Abastecimento.Departamento de Economia Rural. Estimativa de custo deprodução. www.pr.gov.br. Acesso em 2003.

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Agriculturae transição1

A formulação de políticas públicas parao agronegócio, neste momento de mudança nocomando político da Nação, com a ascensãode uma nova concepção de Estado, dá especialrelevo à seguinte questão: A transição3 que aagricultura espera combina com o que éesperado da agricultura pela Transição4? Aogestor e, mais ainda, ao estrategista públicos éexigida uma profunda capacidade de perce-pção das nuanças e sutilezas dessa colocação.

Em termos históricos, o processo defundação e consolidação de um EstadoNacional sempre esteve ligado, no mínimo, àcapacidade de ele assegurar a paz interna eexterna, a estabilidade dos contratos e asegurança alimentar. Esse último conceito, adepender do país – do seu estoque de recursosnaturais e de sua capacidade econômica –, estáquase sempre ancorado na produção interna,somente em alguns poucos, na importação deprodutos.

Partindo desse quadro inicial, este textose ocupará, então, dos aspectos que influen-ciam, às vezes condicionam, a produção e oabastecimento, destacando setorialmente os

fundamentos necessários, e suficientes, para sechegar à resposta àquela pergunta inicial. Alémdisso, como subproduto, propiciará omapeamento dos assuntos que desafiarão agovernança5 do núcleo administrativo do novogoverno, nos próximos anos.

O desafioToma-se por óbvio, portanto, que, no caso

brasileiro, a Transição espera do setor rural umaprodução agropecuária farta e de qualidade,concernente com as potencialidades do País.Na prática, são grandes os desafios para sealcançar tal nível de produção e abastecimentointerno, concomitante com a justa remuneraçãodos produtores. A absoluta prevalência, até aqui,de políticas (monetárias, cambiais, etc.)dirigidas ao controle de preços sobre aquelasde manutenção da renda agrícola tem sido arazão maior dos graves problemas atravessadosno campo.

O grande, e primeiro, anseio daslideranças rurais é que os novos tomadores dedecisão conscietizem-se de que aquela

Sérgio Lafayette de Moraes2

1As opiniões contidas no texto são de exclusiva responsabilidade do autor e não refletem, necessariamente, o posicionamento do Ministério da Agricultura,Pecuária e Abastecimento sobre os temas.2 Gestor Governamental do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento.3 O termo passa a ser compreendido como as mudanças legais e estruturais de responsabilidade do setor público, que são demandadas pelo setor privadorural.4Neste artigo, passa a ser compreendido como o conjunto dos agentes políticos do novo governo, ou seja, a cúpula que detém legitimidade para tomar asdecisões estratégicas do Estado.5 Capacidade de catalisar os esforços do setor privado e, sobretudo, conduzir o aparelho do Estado rumo à consecução dos desafios perseguidos.Definição, aproximada, trazida da Ciência Política.

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desproporção está na gênese do distancia-mento da agricultura que consegue baixar seuscustos, sobreviver, competir e ser benchmarkinginternacional e a outra, incapaz de tal façanha.Mais ainda, que o roteiro dado, até aqui, àagricultura de consumo interno (arroz, feijão,leite, milho de pequena escala, etc.) tornou-aexangue. Decorre disso que, apesar daagricultura de exportação semear riqueza portodos os cantos do País, ela não conseguearrastar consigo essa outra parte, muito menos,a agricultura familiar e os assentados.

Ilustra bem a situação o fato6 de que nos 8anos do Plano Real – medidos de 30 de junho de1994 a 28 de junho de 2002 –, a inflação medidapelo IPC-Fipe acumulou aumento de 103,19%,enquanto o custo médio da cesta básica aumentou47,07%. O descompasso, medido pelos índicesde reajuste dos itens de custo dos produtores e deseus produtos de venda, realimenta o processode “seleção natural” – tecnológico, gerencial eeconômico –, responsável por agravar o êxodorural, o desemprego e a concentração produtiva.

O nó fundiárioO encaminhamento de solução, para a

questão da renda dos produtores de abasteci-mento interno, não importa se pequenos, médiosou grandes, é uma prioridade atual e urgente.Quando se sabe que esse problema constitui-se,também, em barreira à futura inclusão social eeconômica dos milhões de agricultores familiares,dos assentados e dos que ainda serão, o quadrotorna-se dramático. A esse respeito, a FundaçãoGetúlio Vargas e a Embrapa (Alves, Lopes &Contini, 1999) divulgaram um estudo (2001) noqual concluem que, mantidos os atuais níveis deremuneração da agricultura, 80% dos estabele-cimentos agrícolas brasileiros desaparecerão nospróximos anos, pelo fato de produzirem rendamensal inferior a um salário mínimo. É gente quesai, levando junto tradição agrícola e habilidadesprodutivas.

Essa relação de causalidade (rendainsuficiente/êxodo) deve merecer atençãoredobrada, a fim de que os resultados de políticafundiária sejam mais efetivos e menosparadoxais. A gestão passada investiu emreforma agrária, no período de 1995 a 2001,R$ 13,3 bilhões (Incra,2004), contabilizourecordes em famílias assentadas e em hectaresdistribuídos. Ao se fazer a análise do aspectomacro, no entanto, pode-se dizer que “amontanha(R$ bilhões) pariu um rato”. Segundoo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística– IBGE–, no período de 1996 a 1999, cerca de4,2 milhões de pessoas abandonaram o campo,mais do que o dobro de famílias assentadas pelogoverno no mesmo espaço de tempo:1,8 milhão7. É gente que entra, geralmente, compouco conhecimento produtivo e assistênciatécnica deficiente.

CréditoMenos trabalho terá a Transição em

relação à política creditícia. No anos recentes,notadamente na gestão do ministro PratiniMoraes, avanços importantes foram feitos:o aumento do volume de recursos8, o usocrescente de taxas de juro fixas, a criação e oaprimoramento de mais de uma dezena deprogramas de investimentos, corrigindo umantigo vício de se privilegiar a aplicação emcusteio, o direcionamento de recursos parainstrumentos de comercialização maismodernos, como o PEP, os contratos de poçãoe, ainda, o incentivo a mecanismos privadosde mercado futuro. Por isso, não se questiona acompetência e credibilidade do Ministério daAgricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa– e do Ministério do Desenvolvimento – MDA–, na formatação de programas e ações depolítica agrícola, já que os principais gargalosestão além do seu campo decisório.

6 Pesquisa da Fundação Procom-SP em convênio com o Dieese (2002).7 Comparação (4,2 x 1,8) estabelecida em artigo de Simone Mateos (/2001).8 Hoje, em torno de R$ 25 bilhões (em ascensão), apesar de terem sido (valores já atualizados) R$ 51,7 em 1975.

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O estrangulamento importante, naquestão do crédito, dá-se no relacionamento dosprodutores com os órgãos repassadores derecursos. Os bancos, por questão de segurançae rentabilidade, direcionam a maior parte desuas disponibilidades à aplicação em títulospúblicos. O restante é rateado entre outrasformas de investimentos, com rendimentos, quevão de um teto de 150%, ou mais, no chequeespecial, a um mínimo de 3% a 8% nos recursosdirigidos à agropecuária. Logicamente, nadefesa tenaz de sua lucratividade, as agênciascriam inúmeros empecilhos à liberação docrédito, que é o insumo mais importante daagricultura. É, pois, natural que se tenhapopularizado, no meio agrícola, a máxima deque “a maior praga do campo é o bancooficial9”.

Há certas revoluções no funcionamento,e mesmo na estrutura, do aparelho do Estadoque, somente a duras penas, se tornam factíveis,outras parecem ganhar esse status pela simplesdeterminação política dos dirigentes. A firmeintenção do presidente Luiz Inácio Lula da Silvaem democratizar o crédito, em convergênciacom a experiência cooperativa internacionaldo ministro Roberto Rodrigues, indica alibertação definitiva do cooperativismo decrédito das amarras normativas do ConselhoMonetário Nacional – CMN – e Banco Centraldo Brasil – Bacen. O fortalecimento daquelasinstituições proporcionará mais concorrência,menos burocracia e a extensão do atendimentoao público hoje excluído, desafogando osistema atual.

O fecho de ouro, nesse tema, será dado coma aprovação do projeto de lei do seguro agrícola10

e a inclusão da dotação orçamentária, referenteao subsídio ao prêmio, na lei orçamentária anual.A operacionalização do seguro desobstruirá acaptação de recursos nas operações de mercado

9 Essa crença deve-se também à atuação pouco transparente dos bancos no endividamento rural. Para completa compreensão, ver artigo de José CordeiroAraújo (2000).10 Tramitando na Câmara sob a denominação: PL 7.214/2002.11 Apesar da obrigação legal de aplicar 25% dos depósitos à vista em operações rurais – exigibilidades –, alguns bancos preferem ter os recursos imobilizadosno Bacen, sem remuneração, a emprestá-los.

futuro e, também, com os bancos, pois lhes darásegurança quanto ao recebimento dosempréstimos concedidos. O Brasil é o único, entreas grandes nações produtoras, que não conta comseguro rural. O Proagro, que é caro, restritogeograficamente e a poucas culturas, que cobresomente os recursos emprestados pelos bancos,e não o prejuízo dos produtores, está longe daconcepção de seguro renda (preço x quantidade,em verdade seguro faturamento), requerido pelaslideranças rurais.

No dia-a-dia, as experiências de políticasde crédito mais bem-sucedidas são aquelas emque o papel dos bancos como fonte, ou mesmorepassadores de recursos é minimizado11.O Moderfrota, programa de investimento paraa modernização da frota de tratores e imple-mentos, é o melhor e mais recente exemplo.Em três anos, já foram aplicados mais de R$ 5 bi-lhões, a juros fixos de 8,75% e 10,75% ao ano,equalizados pelo Tesouro. Esses recursos sãooriundos dos bancos das próprias montadoras, que,neste caso, dão menor importância ao ganhofinanceiro que a consumação da venda, alémde o próprio produto transacionado ser aceitocomo garantia da operação. Será pelareplicação dessas experiências – Moderfrota –,como também pelo aumento dos emprés-timoscooperativos, pela implantação do seguro rural,que será consolidado um novo ciclo virtuosode mais crédito, mais tecnologia, produtividadee renda no campo.

Comércio exteriorAo longo dos últimos 20 anos, chamados

décadas perdidas, o agronegócio emergiucomo o grande motor da economia brasileira,evitando, de certo modo, um colapso maior. Pormeio da exploração dos mesmos 40 milhões deha e investimento intensivo em tecnologia,dobrou a quantidade de grãos produzidos,

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responde pelo emprego de 20% da populaçãoeconomicamente ativa, pela formação de 27%do PIB e, ainda, é o único setor superavitárioda balança comercial, com saldo anualpróximo de US$ 20 bilhões. Mesmo assim,inclusive se considerado o efeito benéfico daadoção das políticas de crédito – vistasanteriormente –, o grande salto somente serádado com a conquista de uma posiçãointernacional12, condizente com o nossopotencial produtivo.

Para esse embate, espera-se que aTransição busque fortalecer as alianças internas,com os representantes do agribusiness, asexternas, com os países agroexportadores doGrupo de Cairns, ou mesmo com as ditas“baleias” mundiais: China, Índia e Rússia, empontos específicos. O poderio econômico a serenfrentado é desnudado pelo relatório MarketAccess for Developing Countries Exports13

(Acesso ao Mercado para Exportações de Paísesem Desenvolvimento) no qual o FundoMonetário Internacional – FMI – e o BancoMundial reconhecem, a contragosto, que oprotecionismo dos ricos vem aumentando, adespeito dos acordos de liberalizaçãoassumidos na OMC (1995) . Em recente relató-rio, a Organização para a Cooperação e Desen-volvimento Econômico – OCDE – dá númerosa esse fato: o valor médio dos subsídios totaisconcedidos a seus países, no período de 1986a 1988 – pré rodada Uruguai do GATT – foi deUS$ 298,4 bilhões; já no período de 1998 a 2000– pós compromissos Organização Mundial doComércio – OMC –, o valor chegou a US$ 340bilhões, um acréscimo de 14%. (Beraldo, 2004).

A solidez dos mecanismos de proteçãocomercial, nos países desenvolvidos, é fruto dearticulados lobbies agrícolas, detentores degrande capacidade de mobilização e deperpetuação política. Desse modo, o governobrasileiro e o setor privado necessitam

identificar, em cada país e para cada produto,aliados capazes de contrabalançar a pressãoprotecionista. Na União Européia, por exemplo,o uso recorrente de altíssimas tarifas deimportação faz com que os consumidores,grandes prejudicados, sejam nossos potenciaisparceiros. Outros, podem ser aqueles países que,relativamente, mais contribuem para Políticaagrícola Comum – PAC –, como a Alemanha,Inglaterra, etc, e pouco dependem daagricultura. Já, nos EUA, o peso dos subsídios àprodução recai sobre orçamento, o que torna odescontentamento mais difuso, incorporadopelos contribuintes. Permanecem viáveis,porém, parcerias pontuais, entre as quaispodemos citar o interesse das gigantes debebidas (Coca-cola, Pepsi e outras) na quedadas barreira ao açúcar.

De todas as práticas protecionistas, ossubsídios às exportações, predominantes naUnião Européia, são os mais danosos, poisdeslocam as exportações competitivas emterceiros países. Serão os menos defensáveisdurante as negociações do novo acordoagrícola da OMC. No caso do Acesso aMercados, necessita-se cortar tarifas, eliminarseus picos (tarifários), elevar as quotas e dartransparência à sua administração. Permanece,ainda, o problema das barreiras não-tarifárias,abusivamente utilizadas sob pretextossanitários, trabalhistas, ambientais, de direitosanti-dumping, e outros exóticos, como oconceito da multifuncionalidade, que englobaaspectos paisagísticos, de bem-estar animal, etc.Quanto ao quesito Apoio Interno, trata-se daproteção comercial mais difícil de ser atacada,pois envolve fatores (que podem ser)relacionados à soberania de cada país. Noentanto, há necessidade do seu disciplinamento,para que, pelo menos, não induzam a produçãode excedentes exportáveis.

12 A participação brasileira no comércio agrícola mundial gira em torno de pífios 3%.13 FMI- www.imf.org/external/np/madc/eng/042701.pdf.

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Por fim, há que se ter sempre claro omotivo da batalha que se trava, em torno daagricultura, frente à constatação de que elaemprega pouco e representa parcela muitopequena no PIB e nas exportações dos paísesricos. A causa (Tollini, 1999) seria o efeito doesperado acréscimo na população mundial,circunscrito particularmente aos países emdesenvolvimento. Projeta-se para os próximos20 anos 2 bilhões14 de pessoas a mais, o querepresentará um fantástico mercado consu-midor e se tornará um poderoso propulsor dodesenvolvimento das nações provedoras dealimentos. O ricos, mesmo à custa de proteçãoe subsídio, desejam manter sua atual capaci-dade produtiva e parcela de mercado, a fim denão perderem o ingresso neste futuro banquete.A disputa é travada de olho no mercado dofuturo, mesmo ciente de que a eliminação dasbarreiras do comércio agrícola proporcionariaao Brasil, desde já, um aumento anual deUS$ 10 bilhões em suas exportações.

Feito esse diagnóstico, que é mais oumenos consensual, sobra-nos algumas interro-gações: O quanto a busca do equilíbrio nasrelações comerciais, entre ricos e pobres, ficacomprometida pelos precedentes criados nainvasão do Iraque? Organismos colegiados,como a OMC, continuarão relevantes, ou tudo sedecidirá, bilateralmente, pela força das partes?

Meio ambiente e legislaçãoA mesma visão de futuro e capacidade de

montar alianças, alcançadas no comércio exterior,o setor agropecuário deseja ver aplicadas àquestão ambiental. O posicionamento oficial, emrelação a temas como a reformulação do códigoflorestal, transgênicos, uso das águas, constru-ção de infra-estrutura hidroviária (e outros), alémde traçar as diretrizes, deverá ser pautado peladescentralização e accountability15, nunca pela

tutela ou o engessamento normativo. Essesprincípios são depreendidos da própria Consti-tuição Brasileira (Brasil, 1988), que dá podereslegislativos concorrentes aos estados e à União,e poderes administrativos a todos eles e maisaos municípios, impondo ao tratamento dessetema o espírito de abertura e de diálogo. Vistoisso, a condução dos debates deve privilegiara razão e a ciência em detrimento do dogmatis-mo, pautar-se pela ponderação, pelo ideal dadivisão eqüitativa dos benefícios, como tambémdos custos da conservação ambiental.

A definição dos percentuais de reservalegal, na reformulação do código florestal (Leinº 4.771 de 1965), é um desses pontos sensíveis.O impasse se instalou quando o ex-presidenteda República Fernando Henrique Cardosoaumentou, por medida provisória (MP 1956-49),os percentuais que vigiam, até então. Aplaudidopelas Ongs ambientalistas e por grande parteda imprensa internacional, prometeu, ainda,vetar o texto do projeto de lei de conversão,aprovado em Comissão do Congresso Nacional,caso ele fosse à sanção. A controvérsia foi talque acabou por ocultar avanços importantes dotexto da Comissão. Um deles é o fortalecimentodo federalismo, ao repassar aos estados o poderde definir – com mais acurácia que a União –a vocação produtiva ou conservacionista desuas regiões (obedecidos certos limites).Avança, também, ao subordinar a definição dosíndices de reserva legal às recomendações doZoneamento Ecológico Econômico – ZEE –,elaborado sob metodologia técnico-científicaadequada. Outros progressos são a criação dosCertificados de Reserva Florestal – CRF –,negociáveis entre detentores e não detentoresde reserva, a instituição de programas defomento à recomposição florestal e de bônusde conservação, “reconhecendo” que aretirada compulsória de terras do processoprodutivo (quase) equipara-as aos benspúblicos16, responsabilidade do Estado.

14 A população atual é de aproximadamente 6 bilhões de pessoas, portanto, em 20 anos, será 25% maior.15 Sem tradução exata, que em Ciência Política se pode entender como a capacidade de “fiscalização” das ações do Estado, ou das delegadas por ele, e tambémde responsabilização dos possíveis desvios.16 Nos Estados Unidos, que de certo modo adotam essa filosofia, a nova farm bill prevê investimentos de US$ 1,8 bilhão em programas de conservação,assemelhados a esses que foram propostos.

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A adoção de instrumentos mais atuais,inspirados no mercado, está coerente com aprática brasileira no âmbito internacional, hajavista que o Mecanismo de DesenvolvimentoLimpo – MDL – a principal ferramenta doProtocolo de Kyoto17, surgiu a partir de propostabrasileira. Trata-se da criação de um fundo, quefinanciará projetos nos países não industria-lizados, com recursos provenientes da taxaçãodos desenvolvidos. Isso será viabilizado pelainstituição dos Certificados de EmissõesReduzidas – CER (nova commodity) com liqui-dez internacional. Segundo avaliação do BancoCentral – Bacen, esses CER poderão dar origem,no mercado interno, a investimentos de atéUS$ 60 bilhões, após as medidas entrarem emvigor. Essa projeção funda-se em constatações,como a de que a redução de uma tonelada decarvão por meio de novas tecnologias18 custaUS$ 580 no Japão, US$ 270 na UE e US$ 180 nosEstados Unidos, enquanto sua retirada por meiode projetos florestais custa entre US$ 2 e US$ 9.

A Confederação da Agricultura ePecuária do Brasil – CNA19, a respeito dosíndices de reserva e baseando-se em dadosoficiais, divulga números interessantes sobre aRegião Amazônica. Segundo o estudo AVerdade sobre as Mudanças no Código Florestal(Confederação da Agricultura e Pecuária doBrasil, 2004), apenas 25,6% de todas as terrassão privadas, o que dá sustentação para aafirmação de que, mesmo mantidos ospercentuais de reserva anteriores, 50% nasáreas florestais (hoje 80%), no máximo 12,8%(metade daqueles 25,6%) da região poderiamter sua vegetação substituída por outras culturas,ou de outra forma, 87,2% da Amazônia Legaljá estariam protegidos (Tabela 1). Diz, também,que o aumento de 20% para 35% da reserva,nos cerrados dessa região, representa a

imobilização adicional de 10 milhões de ha, oequivalentes a uma renúncia de R$ 7,6 bilhõesao ano, em Valor Bruto de Produção – VBP – desoja. Por esses números, antevêem-se asimplicações de qualquer decisão que aTransição venha a tomar.

Relativamente à questão da água, oproblema é menor que o do Código Florestal.A Lei nº 9.433/97 (Brasil, 1997) estabeleceuconceitos valiosos, como a fixação da baciahidrográfica como unidade de planejamento, agestão descentralizada, por meio dos comitêsde bacia e suas agências e a aplicação dosrecursos cobrados, prioritariamente, na baciaonde foram gerados. A cobrança da água jáestava prevista no antigo Código das Águas, de1934, portanto, a nova lei só veio atualizá-la.Há, entretanto, o temor de que as alíquotas, deinício, baixas sejam sucessivamente majoradas(vide os exemplos da Cofins, CPMF, e outras),elevando os custos20 e estrangulando aprodução, ou seja, um desvirtuamento do viéspreservacionista (conceito poluidor-pagador,usário-pagador) para outro, meramentearrecadatório. Essa desconfiança é aguçadapela normatização dada à cobrança das águasdos rios federais, na qual os recursosarrecadados são convertidos em receitas daAgência Nacional de Águas – ANA21 – edestinados, portanto, à Conta Única do Tesouro.

Outra preocupação, específica daagropecuária, é com sua representação noscomitês de bacia, nos quais (no Estado de SãoPaulo) ocupa 3% dos acentos, enquanto as Ongsocupam de 10% a 14% e os órgão públicos, emtorno de 70%. O fato de as decisões dos comitêsassim constituídos poderem ser tomadaspraticamente à revelia do setor, acrescido daincapacidade de influenciá-las, na aplicaçãodos recursos arrecadados, explicam o pouco

17 Compromisso internacional, que entrará em vigor após a adesão da Rússia, prevista para 2003, e prevê que, entre 2008 e 2012, os países poluentes reduzirãoem 5,2% suas emissões de CO2, com base em 1990.18 Gazeta Mercantil, editorial, pág. A2, em 25/3/02, citando estudo encomendado pela BM&F.19 Órgão que congrega os proprietários rurais.20 Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (2002), a metodologia aprovada pelo CNRH elevará os custos da produção de feijão, de 5 a 17%,e o preço de comercialização de arroz do RS em 12%.21 Art. 20, da lei 9.984/2000: “constituem receitas da ANA: (...) os recursos decorrentes da cobrança pelo uso de água de corpos hídricos de domínio da União(...)” (Brasil, 2000).

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Tabela 1. Áreas legalmente protegidas (terras indígenas e unidades de conservação), terras devolutas eárea ocupada por imóveis rurais particulares nos estados que compõem a Amazônia Legal.

ACAMAPPA(2)

RORRMTTO(2)

Totais

Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, (2004).

UF

30,97,8

12,324,224,010,652,662,325,6

Imóveisrurais

39,653,766,243,924,417,833,421,242,1

Terras da União,pública, arrecadadas

pelo Incra e outras(em %)

30,338,521,831,951,571,414,016,632,3

Áreas indígenas+ unidades deconservação

(em %)

Superfícieterritorial (emmilhões de ha)

15,4156,8

14,2124,7

23,822,590,727,8

S=475,9

entusiasmo das lideranças com a novanormatização e sua pequena confiança noretorno dos “impostos”, na forma de obras, aoslocais onde foram arrecadados.

Em outro ponto da questão ambiental,podemos dizer que o debate sobre ostransgênicos vai ganhando feições maisracionais. Diante do fato consumado dasupersafra de Soja-RR, o governo, pela ediçãoda MP 113, reconheceu (na prática) suasegurança, pois é evidente que um produto nãopode ser seguro por um ano e, na ausência defato novo, não o ser no próximo (Brasil, 2003).Essa decisão, ainda que por vias transversas,dá crédito à CTNBio, órgão multidisciplinarformado por cientistas e técnicos, inclusiveambientalistas, e “referenda” parecer daOrganização Mundial da Saúde (World HealthOrganization, 2004), que atesta não haverevidência de dano desse produto ao ambiente,à saúde humana ou animal. Por fim, é tambémo reconhecimento de uma verdade empíricairrefutável: países como os Estados Unidos e aArgentina já utilizam esse produto há anos, semque nenhum problema tenha sido detectado. Háque se resguardar, contudo, o direito doconsumidor à plena informação e liberdade deescolha, por meio de uma eficiente e confiávelrotulagem.

Deve-se registrar a inutilidade dastentativas de conter o avanço da ciência,

porque novos produtos da biotecnologia, mais“amigáveis” e úteis ao consumidor, passarão aser, muito em breve, até exigidos pelapopulação. Nesse ambiente, o argumento doPrincípio da Precaução, invocado pelosopositores dos transgênicos, continuará válido,de modo a forçar o aprofundamento dos testes,caso a caso, sem a pretensão de que sejaatingida a verdade absoluta, o risco zero, algoevidentemente impossível. O que parece ficarclaro nesse episódio todo é que a ciência deveficar a cargo dos cientistas, o dogma, dosreligiosos, e a política a cargo da sociedade,para que, por meio de seus representantes, asquestões sejam decididas de forma racional,sem paixões, e visando ao bem comum.

Coordenaçãoinstitucional do agronegócio

A efetiva implantação do ConselhoNacional do Agronegócio – Consagro –, pela qualo atual ministro vem lutando, desde o início dasdiscussões do Fórum Nacional da Agricultura, em1996, significará um novo marco para aeconomia brasileira de base rural. É verdadeque a agricultura dá a largada com bastanteatraso, em relação a outros setores, poiscolegiados deliberativos, como o Conselho

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Nacional do Meio Ambiente – Conama – e oConselho Nacional de Recursos Hídricos –CNRH –, há muito, já se impuseram como loccidas discussões, em seus respectivos campostemáticos. Mas é desejo das lideranças que esseconselho ocupe, rapidamente, o espaçoapropriado à importância do agribusiness navida nacional, repercutindo, em Brasília, osproblemas mais urgentes da agropecuária e daagroindústria, especialmente, nos dos agentesmais distantes do centro decisório. Para que o“Aparelho do Estado” não se desconecte darealidade, é fundamental esse tipo de feedback.

Um caso emblemático do alheamento daburocracia, especificamente, em relação às“diferentes agriculturas” existentes no Brasil,ocorreu no episódio da MP 6622, em que sepropunha tributar a produção agropecuária(faturamento) como se fosse salário (rendalíquida), o que representaria um confisco(Carvalho, 2002) de R$ 12 bilhões, sem dúvidaum desastre. Essa medida passou incólumepelos formuladores setoriais de política, quemonocordicamente só falavam, e raciocinavam,em termos da “agricultura da soja”, e suaexcepcional (e temporária) rentabilidade.Felizmente, depois de razoável pressão dasentidades de classe, o governo reconheceu oerro e revogou o dispositivo. O contrário,igualmente danoso, também ocorre, quando éreconhecida a penúria de certos segmentos e,nas entrelinhas dos discursos, há a sugestão parao abandono da atividade ou a migração, orapara a fruticultura, ora para a soja, ou outrasculturas, numa atitude simplista e escapatória.O Conselho, nesses casos, funcionará como umexcelente antídoto.

Outro ponto, potencialmente fértil, paraa atuação do Consagro é no auxílio àorganização das cadeias produtivas, comomediador nos focos de tensão. Pode-se citar oexemplo da cadeia da carne bovina, que a

despeito dos avanços em sanidade e no comércioexterior, em que fatura US$1 bilhão por ano emexportações, não consegue viabilizar aimplementação de um sistema de tipificação decarcaças, mesmo havendo até portaria do Mapatratando do assunto. Essa lacuna, ao submeter osprodutores pecuaristas à arbitrariedade dosfrigoríficos, põe em risco a sustentabilidade dacadeia e os resultados já alcançados. Outro tema,dentre muitos ainda, refere-se ao registro dosprodutos fitossanitários, cuja legislação éexcessivamente restritiva, tornando o processo deregistro caro e demorado. Dessa forma, enquantonossas fronteiras permanecem abertas à entradade produtos, a entrada dos insumos que osproduzem é restringida, o que acaba por seconstituir em verdadeira barreira à concorrênciae ao ajustamento dos preços internos aos dosnossos concorrentes.

Desse modo, a efetiva atuação doConsagro satisfaz as expectativas da Transiçãoe, também, aquelas dos representantes doagronegócio, nelas incluídas as consultas, osdebates e as proposições em torno dasmudanças constitucionais em discussão.Na Reforma Tributária, que está na ordem dodia, poderá ter papel fundamental naharmonização das demandas sobre a cumula-tividade dos impostos, a desafetação da cestabásica, a manutenção da não-tributação dasexportações agrícolas, e em muitos outros.Serve como inspiração o exemplo do Estado doMato Grosso, que isentou o algodão em 75%da alíquota do ICMS e, em 3 anos, se tornou omaior produtor nacional, passando de 50 milpara 600 mil ha, impulsionando a geração deempregos e triplicando a arrecadação tributária.

Do combate a fome à rendamínima – um esboço de proposta

As demandas da agricultura brasileira estãofundamentalmente ligadas à insuficiência de renda

22 Medida Provisória 66, art. 12: “Fica sujeita à incidência do imposto de renda na fonte, em conformidade com a tabela progressiva aplicável e como antecipaçãodo imposto devido na declaração de ajuste anual da pessoa física beneficiária, os valores pagos pelas pessoas jurídicas mencionadas no § 5º do art. 3,decorrentes da (...)”. (Brasil, 2002).

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da atividade agropecuária. Essa carência, contudo,não é tão acentuada a ponto de levar a populaçãorural à fome absoluta, exceto nas áreas tradicio-nalmente castigadas pela seca. O Programa FomeZero, por esse raciocínio e conforme seu propósitoinicial, terá maior aplicação nas áreas urbanasque nas rurais. Portanto, nessas últimas, há anecessidade de políticas mais elaboradas,direcionadas ao crescimento e à estabilização darenda, em superação àquelas de caráter maisemergencial, logo, mais assistencialistas.

Para responder a esse desafio, a propostaé a instituição de um programa-piloto, asseme-lhado a uma “Renda Mínima Setorial”, usando-se um produto do agronegócio que satisfaça,simultaneamente, às seguintes características:seja produzido em todo território nacional,preponderantemente nas pequenas propri-edades, grande absorvedor de mão-de-obra,ingrediente destacado da dieta brasileira,passível de agregação de valor e que possuadinâmico mercado internacional, para oescoamento de eventuais excedentes. Alémdisso, dada a restrição fiscal, a justificação paraa adoção desse tipo de programa necessita quea percepção da crise seja incontestável, etambém seja indiscutível a capacidade dessaintervenção produzir os efeitos, com rapidez eeficácia, naquelas áreas selecionadas.

Algumas características da cadeia do leiteparecem fazer dela o protótipo ideal para se testara idéia. A produção ocorre de norte a sul, emaproximadamente 1,2 milhão de propriedades, dasquais 70% tiram até 50 L por dia (pequenaprodução), proporcionando emprego a mais de3,2 milhões de pessoas23 – mais que a produçãode cana, café e soja –, movimentando no comércioexterior em torno de 30 bilhões de L ao ano, ou50% mais que toda a produção do Brasil. Apesardo “encanto” desses números, o outro lado damoeda pode ser visualizado pelo abandono daatividade, explicitado na estimativa24 de que,

de 1997 para cá, 33% daqueles que sededicavam à produção já deixaram o negócio,forçados pelos baixos preços25 praticados. Essaperda de dinamismo, nas tradicionais baciasleiteiras do Centro-Sul, está originando umfenômeno novo, ainda não estudado e pouconoticiado, que é o das centenas de fazendas-sem-morador, propriedades de 10 a 200 ha quedeixam de ter sustentação econômica ecapacidade empregadora, sendo destinadasgeralmente ao aluguel de pastagens, nas regiõessem vocação agrícola.

A caracterização dessa crise pode serreforçada pela citação de Moraes (2002, p. 4)

“sob o ângulo patronal o setor sempre serviude ‘escape’ para as crises do campo, poiscomo ainda admite diversos estágiostecnológicos (do rudimentar ao maistecnificado), e assim, a produção sobcondições pobres ou adversas (de solo eclima), assumiu o ônus de receber osdeserdados de outros setores. Explicandomelhor, aqueles produtores, grandes oupequenos, que na agricultura perderam acorrida tecnológica, cultural e econômica dasúltimas décadas (contados em milhões) sempretiveram no leite a última chance de recomeço.Negar-lhes competitividade é jogá-los nosbraços dos pouco constantes e insuficientesprogramas assistenciais do Estado brasileiro.Um trade-off em termos de política pública seinstala: ou mais intervenção e menosassistencialismo, ou vice-versa”

Essa última chance de recomeço derivada constatação de que “uma vaca é a unidadeprodutiva mais barata que existe, ao alcancede qualquer indivíduo26”. Sendo assim, mesmonas crises, é possível que ocorra aumento daprodução, pois há sempre alguém compelido aproduzir, menos pela rentabilidade, mais porfalta de opção econômica.

Apresentados os pressupostos e as justifi-cativas, lançamos a primeira versão daquilo quepossa vir a ser um exercício de brainstorming

23 Número de propriedades, volumes e emprego (Cerri 2002).24 Mônica Scaramuzzo (2001) , citando números da Universidade Federal de Viçosa.25 Em Goiás, entre os anos de 1994 e 2000, o preço do leite subiu 23%, ao passo que a inflação bateu em 100% (IGP).26 É como ensina Sávio Pereira, economista, técnico da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento, e argutoconhecedor da matéria.

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coletivo, que vise à formatação de um novomodelo de política, adequado à realidade ruralbrasileira, coerente com os objetivos do FomeZero e, ainda, promotor do fortalecimento dacapacidade produtiva e da distribuição darenda. A proposta inicial é a instituição de umaRenda Mínima para os produtores de leite, comprodução diária de até x L (por exemplo, 100L), pela fixação de um preço mínimodiferenciado, superior ao vigente, restrito aosque hoje estão na atividade, mais os benefi-ciários do Pronaf que assim desejarem.Ressalte-se, antes de mais nada, que esta não éuma política para o setor leiteiro, mas umapolítica de transferência de renda, de inclusãoeconômica e social, que se utiliza do setor doleite. Também não é conflitante com as açõese os programas de qualidade, produtividade esanidade, hoje em curso. Esses, inclusive,podem vir a se constituir em pré-requisitos àadesão ao programa.

Dos muitos obstáculos a serem superados,podemos antecipar alguns: o primeiro deles é oda provável superprodução e conseqüente quedade preços, que exigiria ações indutoras dedemanda, tanto internas (Fome Zero) comoexternas (fomento das exportações). Outro, maisardiloso, será impedir que esse programa sejausado para internalizar leite do Mercosul às nossasexpensas. Outro, ainda, que a formatação nãodeixe dúvidas quanto à caracterização “caixaverde”, segundo as normas da OMC. Quanto aosproblemas intrínsecos dos programas de rendamínima, temos a complexidade na gestão, queseria minorada caso pudesse não haver discrimi-nação entre pequenos ou grandes produtores, soba alegação de a atividade ser altamente geradorade emprego, mesmo nas grandes propriedades.O viés desestimulador do empreendedorismo,também comum, não existirá nesse caso. O queresta, realmente, é a questão da (in)suficiênciados recursos, cuja saída pode ser inicialmente acriação de projetos-piloto, a serem expandidos.

O viés propositivo deste tópico emperra apartir daqui, pois adentra na atual, inflamada eainda não resolvida discussão sobre focalização/universalização das políticas sociais. De acordocom a vertente predominante, os projetos-pilotopodem ser multiplicados pelo País, até, utili-zando outros produtos da dieta básica (arroz,feijão, etc.), ou, de outra maneira, podem serrestringidos a regiões de pobreza extrema, aprodutos locais (leite de cabra, mandioca, etc.),ou ainda usados, de forma pontual, naemancipação de assentamentos e consolidaçãode núcleos de agricultura familiar. De certomodo, retornamos ao início deste texto, ondese discute as conseqüências da priorização,pelo governo, de certas políticas sobre outras.Sendo assim, deixamos ao leitor duasindagações finais: a adoção de uma política derenda mínima poderia compensar os efeitossociais adversos das diretrizes macroeco-nômicas, ainda, restritivas? Ela seria suficientepara minimizar, ou reverter, o resultado dosprocessos – não só nossos, mas mundiais27 – deurbanização e concentração produtiva?

Conclusão – o imagináriopopular e o agronegócio

A resposta à tese do texto, sobre acompatibilidade entre o que a Transição desejada agricultura – produção farta e barata – e o quea agricultura deseja da transição – o conjunto deações setoriais, visto anteriormente – pode serelaborada de forma tão diversa quanto forem asconvicções daqueles que a formularão. Noentanto, cremos que, nesse tipo de “confronto”,as partes tendem a convergir para um ponto deacomodação, impelidas pela força doentendimento que a sociedade vai formando arespeito do assunto. Visto isso, como forma deantever o cenário para o qual se caminha, tãovalioso quanto analisar as deman-das, de lado alado, é perscrutar o imaginário coletivo, já queele pode ser determinante no resultado final.

27 De acordo com o Censo Agrícola Francês, o número de unidades produtoras daquele país caiu de 1,24 milhão (1980) para menos de 670 mil (2000), com oaumento do seu tamanho médio e diminuição do uso de mão-de-obra. Delfin Neto (2002).

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O agronegócio, nesse sentido, vemconseguindo o feito formidável, o de reverter aimagem secular que o vinculava ao atraso, àpobreza, em outra, de modernidade e prospe-ridade. Essa nova condição pode ser facilmentecaptada pelo instrumental28 usado em marketinge propaganda, porém a amplitude dessamudança, cuja noção é fundamental para seconhecer a intensidade e a direção em quecaminha o senso comum, não pode ser captada,por não haver série histórica que sirva acomparações. Logo, as evidências empíricasfuncionam como o único meio de registro dessatransformação, seja no núcleo do Estado, sejano seio da sociedade.

Em relação ao primeiro, pode-se dizer,então, que o surgimento do preconceito contrao setor rural confunde-se com a própriaafirmação Estado brasileiro. A elite política eburocrática dos períodos iniciais, emboramantivesse vínculos com a oligarquia rural,conduzia-se pela idéia (e difundia-a) de que oprogresso estava ligado somente ao urbano –comércio e indústria –, conseqüência de suaformação européia, ainda muito marcada peloressentimento, daquele continente, com seupassado feudal/rural. Essa postura aindagarantia aos bacharéis um distanciamentoestratégico em relação àquela oligarquia. Hoje,essa mesma estrutura político-administrativa,majoritariamente urbana, empenha-se em queparcela de seus quadros adquira fluência nosassuntos do agribusiness, valorizando a especia-lização acadêmica, a inserção internacional,a experiência negociadora29, e outros conheci-mentos da área, em clara superação ao compor-tamento que antes vigia.

Quanto à valoração do agronegócio pelasociedade, ela pode ser evidenciada com oauxílio, intencionalmente caricatural30, de

algumas analogias: a imagem do homem docampo, que há algumas décadas era sintetizadapela figura pejorativa do Jeca Tatu, hoje, cremospoder simbolizá-la no simpaticíssimo perso-nagem Nerso da Capitinga; a imagem dofazendeiro, que confundia-se com a do Senhorde Engenho, agora, parece tender ao moderno, equase afável, Rei do Gado; a presença maciça,nos documentários, das queimadas na Amazô-nia, dos danos ambientais das hidrovias, dasmonoculturas e outras cederam lugar àsreportagens sobre o turismo ecológico, sobreas possibilidades da produção orgânica, ouainda, sobre o extraordinário “mundo novo´´ denossas fronteiras agrícolas.

Enfim, parece haver uma confluência defatos favoráveis ao encontro das expectativas dosetor produtivo e da Transição. O amadure-cimento do debate e a conscientização sobre aimportância da cadeia agroindustrial e docomplexo de serviços ligados a ela descortinamnovos horizontes e tornam factíveis arranjosestruturais, antes, improváveis. À poeira dahistória, ficam maluquices várias, como ascaçadas ao boi no pasto, os planos econômicos,que embaralham regras e impõem perdas, entreplantio e colheita, e muitas outras. O campobrasileiro segue produzindo as boas notícias, aque já nos acostumamos. Essa é a verdadeiratransição31, que o Brasil espera e faz.

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28 Trata-se das pesquisas Top of Mind, em que os entrevistados revelam qual o primeiro pensamento lhes vem à mente, ao ouvirem determinada palavra ouexpressão.29 Com o esclarecimento da opinião pública e a capacitação dos recursos humanos, a agricultura finalmente deixou de ser a moeda de troca nas negociaçõesinternacionais.30 Socorremo-nos do universo televisivo, pois ele é, para o bem e para o mal, espelho bastante representativo do mosaico social brasileiro.31 E o final desta transição, para gáudio da agropecuária, será proclamado em horário nobre, com o anúncio do homem-do-tempo: “Para amanhã, tempo bomem todo o Brasil. Teremos chuva mansa e constante em todo o país”. O último contra-senso terá sido eliminado, que é, nesta imensa nação agrícola, chamar aprevalência do sol e calor de tempo bom.

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Fatores que induzemos ajustamentosdos produtores1

ResumoO trabalho procura mostrar a importân-

cia das interações da oferta e da demanda napobreza rural. Destaca que a industrializaçãocria uma interação de oferta e demanda maisfavorável aos pequenos produtores, além detrazer outros benefícios importantes, que sãomais bem conhecidos. Mostra que as imper-feições de mercado são péssimas para toda aagricultura e fatais para os pequenos produtores.

Demanda e ofertaOs pequenos agricultores, que predomi-

nantemente produzem produtos básicos da cestade consumidores mais pobres, defrontam-se comuma curva de demanda relativamente inelástica,um mercado imperfeito de produtos e de insumose sua oferta é relativamente inelástica. Essascondições adversas agravam-se à medida que aelasticidade renda desses produtos tende adiminuir com o crescimento da renda dosconsumidores, e, com isso, medidas distributivastêm efeito semelhante.

Quais são os efeitos das elasticidadespreço e renda? Os preços dos alimentos básicossão mais instáveis, e essa instabilidade dospreços transmite-se rapidamente para a renda,

deixando as famílias muito inseguras e predispostasa migrarem. Quando a oferta cresce maisrapidamente que a demanda, a renda líquida cai,e o nível de renda deixa de ser competitivo como do meio urbano. No meio rural, se nada for feito,os pequenos produtores dificilmente sairão dapobreza e indigência, e é natural que optem porviver nas cidades (Alves et al. , 2000).

Assim, torna-se necessário o estabele-cimento de uma estratégia que possibilite umdesenvolvimento auto-sustentado dos pequenosagricultores, produtores de produtos básicos, seo objetivo for mantê-los como produtores.

Os produtos básicos in natura apre-sentam demanda relativamente inelástica.A inelasticidade-preço da demanda gerainstabilidade de renda, e pode reduzir a rendalíquida, quando a oferta cresce mais que ademanda (Teixeira, 1984).

Já a demanda de produtos agropecuáriosprocessados e industrializados é mais elásticaque a de produtos in natura, e, em virtude doefeito substituição, torna a demanda de produtosagropecuários in natura mais elástica, ceterisparibus.

A oferta dos pequenos agricultores éinelástica, em comparação com os grandesprodutores de produtos básicos. Como razões,

Maurinho Luiz dos Santos2

1 O artigo está baseado na tese de doutorado do autor (Santos, 1993).2 Professor do Departamento de Economia Rural da Universidade Federal de Viçosa.

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aduzem-se as seguintes: condições topográficasadversas, natureza do estoque de tecnologia,escassez relativa de capital, imperfeições demercados de produtos e de insumos e condiçõesambientais adversas.

Os ajustamentos requeridos em virtudedas mudanças nas relações de preços fator/fatorou produto/produto, ou fator/produto são difíceisde serem feitos pelos pequenos agricultores,pelo menos no curto prazo. Os grandes produ-tores de alimentos básicos,entretanto, têmflexibilidade de ajustamento maior, o que tornaa sua oferta mais elástica. A maior flexibilidadede ajustamento decorre do volume de recursosque comandam, de condições topográficas maisfavoráveis, da facilidade de acesso à tecnologiae de não serem tão penalizados pelas imperfeiçõesde mercados de produtos e de insumos.

A maior inelasticidade da oferta dospequenos agricultores coloca-os em situaçãode desvantagem em relação aos grandesprodutores. Os grandes produtores de produtosbásicos têm grande influência na definição daoferta global de alimentos básicos, e, assim, arenda líquida dos pequenos agricultoresdepende, em larga medida, do comportamentodos mais aquinhoados. Quando os preços dosalimentos da cesta básica crescem, os maioresprodutores aumentam sua fatia de mercado.Se eles caem, a renda líquida dos pequenosagricultores pode ficar tão baixa, no nível dapobreza absoluta. E aí o estímulo à migraçãose agiganta.

No Brasil de hoje, a produção se ajustarapidamente às mudanças de oferta e demanda,e, assim, a fatia de mercado dos grandes epequenos produtores e a direção geralfavorecem à grande produção.

Os produtos agropecuários in natura,em geral, apresentam elasticidade-rendarelativamente mais baixa que a elasticidade-renda dos produtos agropecuários processadose industrializados. Isto significa que os consu-midores com maiores rendas desejam mais osprodutos processados e industrializados, o quese reflete diretamente nos mercados.

Assim, por exemplo, à medida que a rendaaumenta, os consumidores tendem a consumirmais alimentos processados e industrializados doque alimentos in natura, o que implica, pelo efeitosubstituição, numa redução da demanda dosprodutos in natura.

Os pequenos produtores de produtosbásicos ficam, assim, em desvantagem, porquenão se apropriam dos valores adicionados doprocessamento e da industrialização.

A organização da produção é competitiva,e ela é comercializada em mercados imperfeitos.Ainda, a compra dos insumos realiza-se nummercado quase sempre oligopolista. Essa situaçãode desequilíbrio de poder de mercado, quedesfavorece a agricultura, afeta a renda líquidado agricultor e mais negativamente a dospequenos produtores.

AgroindustrializaçãoAssim, o desenvolvimento de agroindús-

trias e de indústrias de processamento deprodutos agropecuários tem importânciafundamental, em virtude de vários fatores,dentre os quais se sobressaem:

• Os investimentos nas agroindústriasdinamizam o complexo agrícola e o desenvol-vimento econômico em geral, e o seu efeito ésomente menor que o da indústria petrolífera.

• A agroindústria exige menores investi-mentos e menos poupança relativa para provocaro mesmo efeito na economia, em termos de rendae de emprego.

• A agroindústria tem grande impacto naprodutividade, porque localiza adequadamentea produção, melhora a qualidade do produto,melhora as decisões econômicas, eleva ademanda de insumos agropecuários, principal-mente dos denominados insumos modernos,promove a pesquisa e a redireciona aosinteresses dos agricultores.

• As agroindústrias caracterizam-se porum perfil tecnológico relativamente simples erequerem a importação marginal de know-how,bem como de matéria-prima.

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• As agroindústrias, pela própria natureza,localizam-se em torno das áreas de produção,o que reduz o custo de transferência de mão-de-obra liberada do campo. Ao mesmo tempofixam mão-de-obra no seu habitat e reduzem ofluxo migratório para os grandes centros urbanos.

• Os pequenos agricultores têm a possibi-lidade de utilização do excedente de mão-de-obra familiar no seu habitat, e, deste modo, têmfonte de renda adicional.

• Pela agroindustrialização, a demandade produtos básicos fica mais elástica, e, porisso, os pequenos produtores podem sebeneficiar mais do progresso.

• As agroindústrias induzem a permanênciada poupança gerada pelos agricultores nas regiõesque vivem.

ConclusõesO ajustamento mais óbvio é a migração

rural urbana, quando a renda dos pequenosprodutores perde o poder de competição comaquela das cidades. Mas, o que se quer éencontrar uma solução no meio rural, semdesprezar a força de atração da urbis, semprepresente nas economias industrializadas.

O ajustamento da oferta é muitoimportante. Deve-se realizar na direção dos

produtos industrializados e dos exportáveis.A tecnologia moderna é crucial, por isso éimportante remover as principais restrições deacesso à mesma pelos pequenos produtores.Entre muitas, sobressaem-se a falta deconhecimento de extensão rural e de crédito,considerando-se taxas de juros, montantes eprazos adequados.

É importante criar o poder de mercadopara os pequenos produtores, e destacam-se ascooperativas e outras formas de organização.

Os mercados serão cada vez maisexigentes em qualidade. O acesso dospequenos produtores às agroindústrias é umaexigência prioritária. Mas, além disso, precisamter acesso à tecnologia de produção compatívelcom a demanda moderna.

A agroindústria, além dos efeitos clássicos,promove o crescimento da elastici-dade rendados produtos básicos, com forte efeito sobre aestabilidade e a renda líquida dos pequenosagricultores.

ReferênciasALVES, E.; LOPES, M.; CONTINI, E.. O empobrecimento daagricultura brasileira. Revista de Política Agrícola, Brasília,Ano 8, n. 3, jul./ago./ set.. 1999.

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IntroduçãoA Hevea Brasiliensis, planta originária da

Região Amazônica, encontrada naturalmentenas matas dos Estados do Acre, Amazonas,Rondônia, Pará e em áreas vizinhas ao Brasil,no Peru e na Bolívia, produz a borracha natural,que, dadas as suas características físico-químicas (elasticidade, resistência ao desgaste,impermeabilidade a líquidos e gases, isolanteelétrico, plasticidade, etc.) a indústria químicaainda não foi capaz de produzir um substitutoapropriado. Existe, sim, a borracha sintética,produto originário da indústria petroquímica elargamente utilizado, puro ou misturado, naprodução de muitos artefatos, mas que nãoatende integralmente às necessidades dedeterminadas aplicações onde as característicasdo produto natural são imprescindíveis.

A borracha foi usada, primeiramente,como impermeabilizante de botas e mochilasdo exército português, porém, logo foramdescobertos outros usos, elevando de formasubstancial o interesse pelo produto. Em 1839,segundo Dean, já existia um comércio ativo doproduto brasileiro com a Inglaterra. O interesseera tanto que foram feitos vários estudosbotânicos por aquele país, culminando comHenry Wickham ter levado, em 1876,aproximadamente 70 mil sementes deseringueira para a Inglaterra. As cerca de 2.700mudas obtidas foram plantadas, em caráterexperimental, no Ceilão, atual Sri-Lanka,

colônia inglesa do sudeste asiático onde, tendoencontrado condições ideais, desenvolveu-sede tal forma que transformou a região na maiorprodutora e exportadora de borracha do mundo.Além de desbancar o Brasil como maiorprodutor, passou a dificultar seriamente acapacidade competitiva da borracha brasileira,em razão da diferença do sistema deexploração. No Brasil prevalecia o extrativismono meio de uma floresta inóspita, enquanto que láeram extraídas de áreas racionalmente cultivadas.

A cadeia produtiva da borracha, no Brasil,tomando por base a seringueira, tem trêssegmentos distintos, conforme é mostrado naFig. 1: a atividade rural com a produçãoextrativista e de cultivo, as indústrias de benefi-ciamento e a indústria consumidora final.O extrativismo é praticado na Região Norte, localde origem da planta, enquanto a heveiculturaestá presente nos Estados da Bahia, do EspíritoSanto, de Goiás, do Maranhão, de Minas Gerais,do Mato Grosso do Sul, de Mato Grosso, doPará, de Pernambuco, do Paraná, de Rondôniae de São Paulo. As indústrias de beneficiamentoestão instaladas em dez estados e as indústriasde consumo final em 16 estados.

Panorama internacionalA produção mundial de borracha para o

ano de 2004, como mostra a Fig. 2, está

Borracha naturalPerspectiva para asafra de 2004/05

Paulo Morceli1

1 Economista, técnico de planejamento da Companhia Nacional de Abastecimento – Conab. [email protected]

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estimada em 8,3 milhões de toneladas, e oprincipal produtor continua sendo a Tailândia,com 2,9 milhões de toneladas, ou seja, 35,15%do total. Em seguida vem a Indonésia com aprodução prevista em 1,9 milhão de toneladase a Malásia com 1 milhão. É importanteobservar que este último país tem apresentadoredução na produção em razão de os seusseringais estarem em fase de renovação e,também, muitos heveicultores estão deixandoa atividade e dedicando-se ao plantio de palma,atualmente mais rentável.

É importante observar que mais de 90%de toda a produção mundial está concentradanos países da Ásia (Tailândia, Indonésia,Malásia, Índia, China, Vietnã e outros de menorexpressão), e não existe a possibilidade de sereverter este quadro em médio prazo. Doisfatores foram decisivos para que isso aconte-

cesse: os investimentos feitos, especialmente pelaInglaterra, na adaptação da Hevea Brasiliensis aoclima da região e os investimentos econômicosna exploração do látex. Atualmente já aparecemalguns focos importantes de produção nos paísesafricanos banhados pelo Oceano Atlântico, taiscomo Libéria, Camarões e Nigéria. Em 2004, oBrasil deverá alcançar a nona posição comoprodutor mundial, devendo contribuir com apenas100 mil toneladas, ou seja, 1,36% da previsão deprodução total mundial.

Estima-se que o consumo chegará, em2004, a 8,2 milhões de toneladas. Os principaisusuários são mostrados na Fig. 3. O consumona China vem crescendo de forma excepcionalnos últimos anos, pois passou de 852 miltoneladas, no ano de 1999, para a previsão de1.595 mil toneladas em 2004, com incrementode 87,21% no período. Dois fatos explicam oque está acontecendo: o aumento do consumode borracha na fabricação de pneus (para usointerno e exportação) e na produção de artefatosde borracha, especialmente pequenosbrinquedos vendidos em lojas de R$ 1,99.

Os Estados Unidos, que era o maiorconsumidor, posição perdida para a China a partirde 2001, vem mantendo a demanda em torno de1,1 milhão de toneladas por ano, pois sua indústriaatende a mercados estabilizados com poucavariação no consumo de matéria-prima. Em geral,com exceção da China, nos demais paísesconsumidores a demanda tem crescido a taxas

Fig. 1. Setores envolvidos na produção, beneficiamentoe consumo da borracha natural.

Fig. 2. Produção deborracha natural nosprincipais países, emmilhões de toneladas.Fonte:IRGS Rubber StatisticalBulletin vol. 58, nº 7, october2003. Elaboração: Conab(*)estimativa(**) Prévisão Conab.

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pequenas. Na projeção para o ano sob análise,foi estimado o incremento do consumo em 3,94%.É importante observar que de modo geral osprincipais produtores não são consumidoresimportantes, de forma que existe um importantecomércio internacional dessa matéria-prima.

Cerca de 70% de toda borracha naturalconsumida no mundo é destinada à produção depneus para as mais diversas aplicações.A maioria das empresas pneumáticas é constituídade grandes conglomerados econômicos que têmpoder de pressão na formulação dos preços decompra da matéria-prima. Entretanto, os paísesprodutores dependem da comercialização delátex, pois são economias subdesenvolvidas ouem desenvolvimento, e qualquer fonte de rendaé muito importante não podendo ser desprezada.Esse fato faz com que os preços, na maioria doscasos, fiquem ao sabor das políticas doscompradores e não dos vendedores, resultando,quase sempre, no aviltamento dos preços.

Para romper com essa situação, emdezembro de 2001 a Tailândia, a Indonésia e aMalásia, os maiores produtores mundiais, firmaramum acordo para a formação do InternationalTripartite Rubber Cooperation – ITRC –, com afinalidade de reduzir a produção em 4% e asexportações em 10%. Na evolução do acordo,em 06/10/2003, foi assinado em Bali, capital daTailândia, o International Rubber ConsortiumLimited – IRCo –, com o fito de controlar osestoques, o comércio e os preços da borracha,podendo aderir a essa instituição o Vietnã, a Índiae o Sri-Lanka. O capital da entidade foi fixado emUS$ 225 milhões e o valor de cada país-membrofoi calculado com base na sua produção, cabendoà Tailândia o valor de US$ 100 milhões, à Indo-nésia US$ 75 milhões e à Malásia US$ 50 milhões.

Conforme pode ser visto na Fig. 4 a medidafoi acertada, pois a partir de então os preçosiniciaram um importante processo de reação,tendo atingido a melhor cotação na semana de

Fig. 3. Principais paísesconsumidores deborracha natural, emmilhões de toneladas.Fonte: Rubber Statistical Bulletin Vol.57, nº 7, April 2003.Elaboração: Conab(*)Estimativa e (**) Previsão Conab.

Fig. 4. Standard MalaysianRubber nº 10 - SRM-10.

Cotações médias semanais,em US$¢/kg.

Fonte: Malaysian Rubber Board. Cálculodas médias e elaboração: Conab/Sugof -

Dados de 02/01/2000 a 06/12/2002.

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17 a 21/06/2002 com a média de US$¢ 87,16/kg.A seguir sobreveio um período de pequenasreduções e elevações e, no final do ano, aborracha estava cotada em US$¢ 87,75/kg naMalaysian Rubber Board. A cotação média daprimeira semana de 2003 foi de US$¢ 88,39/kg,subindo até US$¢ 94,72/kg na semana de 17 a21/03/2003, sofrendo algumas reduções, atéatingir o pico de baixa de US$¢ 84,43/kg, noperíodo de 30/04 a 04/05/2003, voltando a subirnovamente e chegando ao valor expressivo deUS$¢ 144,96/kg, na primeira semana denovembro do ano passado, se mantendo comperíodos de queda e elevações, de modo quena última semana de fevereiro de 2004 atingiuUS$¢ 127,27 por quilo. Nos dois últimos mesesda série, as cotações na MRB passaram deUS$¢ 134,35 por quilograma de SMR-10 paraUS$¢ 128,94, portanto redução de 4,03% emtão pouco tempo, mas que não chega apreocupar, pois está em sintonia com avolatilidade dos preços do produto em umabolsa internacional.

Como é um produto de ciclo longo, em quea primeira colheita ocorre só entre o sexto e ooitavo ano após o plantio e se estende por cercade 30 anos, não são as condições de oferta edemanda que produzem as variações de preçoscom tanta intensidade, mas sim fatores externosao ambiente de produção. Recentemente, nosanos de 1996 e 1997, a crise asiática, queprovocou um grande desastre econômico nosprincipais países produtores, foi a responsávelpela desvalorização das moedas locais e perdadas cotações da borracha produzida nessespaíses. Com a recuperação dessas economiase com os resultados do acordo anteriormentereferido, os preços vêm se firmando de formabastante intensa. Assim, em 10 de março de 2004o IRCo resolveu fixar o preço mínimo para a vendada borracha, padrão SMR-10, por US$ 1.10 o quilona exportação ao mercado mundial.

Panorama nacionalDa segunda metade do século 19 até a

segunda década do século 20, a borracha

natural proporcionou e sustentou um dos maisimportantes ciclos de desenvolvimento doBrasil, o Ciclo da Borracha. Nesse período,grandes empresas e bancos instalaram-se emManaus, AM e Belém, PA para operarem comesse produto. A produção amazônica cresceuano após ano e em 1912 o Brasil exportou42.286 t de borracha seca ao preço de 380 librasesterlinas por tonelada (o maior preço foi obtidoem 1910 com 655 libras esterlinas por toneladaquando foram exportadas 38.547 t).

O interesse despertado pelo produto,principalmente em razão dos fatos marcantescomo as descobertas do tecido impermeável ebolas elásticas por Handcock, em 1815, davulcanização por Charles Goodyear, em 1839,do pneumático e câmara de ar por R.W.Thomson,em 1845, dentre tantos outros, fez com que muitosespecialistas estudassem a borracha comgrande interesse. Ocorreram fatos menosnobres como é o caso do contrabando de cercade 70 mil sementes feito pelo inglês HenryWickhan que as plantou no Kew Garden emLondres, das quais 2.397 germinaram, e 1.900foram mandadas ao Ceilão (atual Sri Lanka),algumas para a Malásia e duas para o Centrode Pesquisa de Culturas Tropicais em Java(Indonésia). Conforme pode ser verificado, naFig. 5, a faixa entre os Trópicos de Câncer e deCapricórnio é apropriada para a exploraçãointensiva da seringueira, daí o bom desenvol-vimento que tem acontecido nessas regiões.

Os dirigentes brasileiros demoram muitopara tomar qualquer decisão, visando ampliara capacidade de produção do Brasil e, emmuitos casos, de forma equivocada. A primeirainiciativa foi de Henry Ford que, preocupadocom o controle do abastecimento dessa impor-tante matéria-prima para componentes de seuscarros, adquiriu uma fazenda no Pará, no finaldos anos 20, do século passado, onde foramplantadas 70 milhões de mudas numa área deum milhão de hectares, tendo como meta aprodução de 300 mil toneladas anuais deborracha natural, cerca de metade do consumomundial, à época. Entretanto por problemasfitossanitários, o projeto não logrou êxito e mais

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tarde foi abandonado, amargando pesadosprejuízos.

Os japoneses, ao tomarem a Malásia naSegunda Guerra Mundial, interromperam ofornecimento de 95% da borracha naturalexportada e trouxeram grandes dificuldadespara os países aliados. Os Estados Unidos,principal afetado, adotaram várias medidas,algumas internas como: a redução da veloci-dade dos carros para apenas 35 milhas por hora,para reduzir o desgaste de pneus; a reciclagemde toda borracha existente; a convocação detodas as indústrias químicas e profissionais daárea para buscarem um substituto para oproduto natural, etc.

O Brasil, que ainda possuía suas árvores,e que apenas estava com o sistema produtivodesarticulado, foi chamado a colaborar comesse esforço. Assim, em março de 1942 foiassinado o “Acordo de Washington” que tinhacomo objetivo básico estimular ao máximo aprodução da borracha amazônica, paraaumentar o excedente exportável para osEstados Unidos. Nessa época ocorreu o grande

incentivo para que brasileiros de outras regiõesfossem para a Amazônia e daí surgiu o termo“soldado da borracha”. Inicia-se, então, o perí-odo em que o setor passa a ser controlado pelogoverno, através da Carteira de Exportação eImportação do Banco do Brasil S/A., bem comoé criada a Superintendência de Abastecimentodo Vale Amazônico – Sava –, com o objetivode assegurar o suprimento regular de gênerosaos seringais. Entretanto, todo esse esforço foiesquecido logo após o fim do conflito e aprodução voltou a decair, ficando os “soldadosda borracha” e todo o sistema produtivonovamente relegado ao abandono.

Com a chegada das indústrias automo-bilísticas, no governo JK, inicia-se o período deprodução menor que o consumo e, em 1951, oBrasil é obrigado a importar 400 t de borracha, aopreço de US$ 1,250.00 por tonelada, para atenderà indústria local. A partir de então, foram feitasvárias tentativas para aumentar a produçãobrasileira, sendo que a mais importante foi oPrograma de Incentivo à Produção de BorrachaVegetal – Probor – que, em suas três versões,

Fig. 5. Região apta para o desenvolvimento da seringueira.

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contratou a plantação de 208.315 ha, tendo sidoplantados, tão somente, 132.811 ha. Por terem sidoconcentrados os investimentos na RegiãoAmazônica, os resultados obtidos foram muitoaquém das expectativas, pelos mais diversosmotivos, desde dificuldades próprias da região,como ataque de pragas e doenças, até o mau usodos recursos públicos.

Por puro acaso, em 1915, foram plantadasalgumas mudas na fazenda do Cel. JoséProcópio de Araújo Ferraz, no Estado de SãoPaulo, que se desenvolveram muito bem. Assim,a despeito da reação contrária dos represe-ntantes do extrativismo brasileiro, foram repas-sadas sementes para o Instituto Agronômico deCampinas – IAC –, cujas plantas atingiram aidade adulta por volta de 1950. Em 1956, aoassumir o governo de São Paulo, Jânio Quadrosdeu maior atenção à seringueira, tendo sidocriado o Serviço de Expansão da Seringueira –SES – e o Fundo de Fomento à Cultura daSeringueira, de modo que, em 1957, já havia cercade 40 viveiros de produção de mudas no estado.

Dessa forma, os altos e baixos das políticasdo setor produziram o resultado mostrado pelosdados da Fundação Instituto Brasileiro deGeografia e Estatística – IBGE – nas Tabelas 1 e2, onde, em 1990 o Brasil produziu 24.284 t delátex coagulado, com 60% de DRC, num total de63.641 ha, tendo passado, em 2002, a produçãopara 146.464 t, com o crescimento de 503,13%,numa área de 103.100 ha, com aumento deapenas 62,00%. Isso ocorreu graças à mudançado sistema de produção de borracha no Brasil,que se concentrou na heveicultura nas chamadaszonas de escape, ou seja, regiões aptas para oplantio da Hevea, mas não suscetíveis ao mal-das-folhas, e, ainda, pelo uso de clones maisprodutivos e resistentes, muitas vezes importadosdo sudeste Asiático.

Essas duas tabelas mostram essa mudança:em 1990 a Região Norte participava com 9,25%do látex produzido em 4,67% da área e o Estadode São Paulo participava com 31,66% daprodução, em apenas 5,84% da área total, comclones resistentes e produtivos. Os dados do anode 2002 mostram que a Região Norte detinha

apenas 2,83% da produção e 7,35% da área,enquanto São Paulo produziu 50,53% do látexcom 31,67% da área plantada, mostrando osignificativo crescimento da heveiculturacomparativamente à produção extrativista.

Deve-se ressaltar, ainda, que dentro doespírito de plantar a seringueira nos locais ondecorre menor risco de ataques de pragas edoenças, são produtores importantes os Estadosde Mato Grosso com a produção, segundodados do IBGE de 2002, de 20,29% do total doBrasil, a Bahia com 11,41%, o Espírito Santocom 4,92% e Minas Gerais com 4,74%.Segundo dados constantes no Cadastro deAgentes, geridos pela Companhia Nacional deAbastecimento – Conab –, existem 7.050produtores de borracha, 73 indústrias debeneficiamento e 476 indústrias consumidorasfinais, e São Paulo concentra o maior númerode agentes dos três segmentos.

A Fig. 6. indica que o Brasil é importadortradicional de borracha, fato este que vemacontecendo desde 1951, e a Fig. 7 mostra osdiferentes tipos de borracha que foramimportados, no período de 1992 a 2003, com apredominância pelas compras da matéria-primaprensada ou granulada, utilizada pela indústriade pneumáticos. Até 1998, tendo em vista umacerta estabilidade no consumo e na produçãointerna, as importações também eram mantidascom relativa constância. A partir de então, oconsumo começa a crescer de forma acentuada,levada pelo aumento da produção interna, o queé muito importante, de modo que se conclui queo aumento no consumo deu-se em razão da maioroferta interna de matéria-prima.

Entretanto, apesar de ser uma constataçãoevidente não é de todo verdadeira. O principalmotivador para o crescimento do consumo deborracha pela indústria está relacionado aofornecimento da matéria-prima a preçoscompatíveis com os que eram praticados nomercado internacional. Como foi visto naFig. 4 os preços internacionais, em razão dascrises asiáticas, estiveram em patamares muitobaixos (a média de 1997 foi de US$¢ 46,16/kg

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3.28

3

5.

555

1.78

3

800

5

40 -

1.

597 -

8

35

15.

216

6

15 - - - -

104 - -

1

4.49

7

21.

443

2

23

4.

504 -

1

6.71

6

- - - -

21.

069 -

2

0.98

8

8

1 -

1996

7

0.07

8

3.

370

730

846

2

8 -

1.

572 -

194

1

6.75

4

7

95 - - - -

1

69 - -

15.

790

2

5.53

0

1.

118

4.32

9 -

20.

083

3

5

35 - -

2

4.38

9 -

24.

154

235 -

1997

7

1.63

1

3.6

01

8

99

9

78

28 -

921 -

775

2

1.19

9

1.

244 - - - -

468 - -

1

9.48

7

29.

138

1.22

8

4.

717 -

2

3.19

3

1

58

1

58 - -

17.

535

177

1

7.12

3

2

35 -

1998

8

5.84

1

3.

946

537

602

2

8 -

1.

974 -

805

2

6.84

2

1.

244 - - - -

429 - -

2

5.16

9

32.

852

1.70

9

5.

169 -

2

5.97

4

2

30

2

30 - -

21.

971

202

1

9.56

3

2.

206 -

1999

8

7.86

0

3.5

05

1

93

6

22

28 -

1

.857 -

805

2

3.03

3

1.2

44 - - - -

80 - -

2

1.70

9

34.

942

1

.705

5

.518 -

2

7.71

9

2

61

2

61 - -

26.

119

399

2

3.47

0

2.2

50 -

2000

9

6.58

7

3.3

41

2

19

9

32

28 -

1.94

7 -

2

15

28.

385

1.26

4 - - - -

3

53 - -

26.

768

3

6.36

9

1.

936

5.89

0 -

28.

543

218

218 - -

2

8.27

4

5

11

26.

198

1.56

5 -

2001

100

.554

4.06

9

3

77

4

74

2

8 -

2.

400 -

790

3

3.59

9

1.

285 - - - -

431 - -

3

1.88

3

37.

480

2.19

5

5.

921

21

2

9.34

3

2

64

2

64 - -

25.

142

516

2

3.00

7

1.

619 -

2002

103

.100

7

.577

2.03

1

1.

388

2

8 -

3.

380 -

750

2

9.03

6

1.

325 - - - -

436 - -

2

7.27

5

40.

669

2.10

3

5.

895

2

0

32.

651

296

296 - -

2

5.52

2

5

19

23.

065

1.93

8 -

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 64

e de 1998 foi de US$¢ 30,84/kg), tornando aprodução interna gravosa, levando osprodutores (heveicultores e extrativistas) a nãofazerem o “corte” das árvores e a indústriaconsumidora a não investir no aumento de seuparque produtivo.

Dessa forma, para minimizar esseproblema foi editada a Lei nº 9.479, em 12/08/1997, onde o governo federal comprometeu-se adar uma subvenção máxima de R$ 0,90 por quilode borracha beneficiada do padrão GranuladoEscuro Brasileiro, tipo 1 (GEB-1), adquirida pelaindústria, sendo que para os demais produtos eracalculada com base nas suas especificações eseguindo o padrão fixado na Portaria MF nº 187,de 29/06/1995. A subvenção era paga em 100%,nos primeiros quatro anos, e reduzida em 20% acada ano até o seu oitavo ano de execução.

Em termos operacionais, o pagamento se davada seguinte forma: pela Portaria, anteriormentecitada, foram fixados os valores do GEB-1 emR$ 2,58 por quilo e os correspondentes para osdemais produtos. Mensalmente, o Ministério daAgricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa– calculava, tomando-se por base as cotaçõesda borracha no mercado internacional, o valorcorrespondente à importação do SMR-10,chamado de preço de referência do governofederal. Se esse preço ficasse abaixo do valorfixado pela Portaria, a indústria de beneficiamentose candidatava a receber o valor correspondenteà diferença, comprovada através de provasdocumentais.

A Fig. 8 mostra os efeitos da aplicação dasubvenção no período de julho/2000 a 28/02/2004. Vê-se que o GEB-1 estava sendo vendido

Fig. 6. Produção,importação e consumobrasileiros, de 1989 a2004, em mil toneladas.Fontes: Abiarb, Anip, IBGE, Secex eConab - Elaboração: Conab / Sugof (*)

Previsão.

Fig. 7. Importações brasileiras,por tipo de produto,

em mil toneladas.Fonte: MDIC / Secex. Elaboração: Conab

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 200465

pelas beneficiadoras, no início da série, porR$ 1,36/kg, teve uma leve correção, atingindo aR$ 1,58 em fevereiro de 2002. Com a elevaçãodos preços no mercado internacional, em junhode 2002 o industrial brasileiro passou a comprar aborracha no mercado interno por R$ 1,92/kg,iniciando um processo de elevação constante dospreços, de modo que em agosto de 2002 o preçode referência do governo já estava emR$ 2,75 por kg, ou seja, acima do “gatilho” e,portanto, terminando a necessidade do pagamentoda subvenção. A seguir houve um período deredução nas cotações, em razão das desvalo-rizações das moedas da Tailândia e da Malásia, eo preço pago às usinas chegou a R$ 2,89, em julhode 2003, mas recuperou novamente atingindo opico de máximo das cotações, em dezembro de2003, com R$ 3,95 por kg, havendo novas quedas,de modo que, em fevereiro de 2004, a média foicalculada em R$ 3,80.

Com relação aos preços ao produtor,tomando por base as cotações praticadas em SãoPaulo, segundo dados da Federação da Agriculturado Estado de São Paulo – Faesp –, em julho de2000 o coágulo era vendido por R$ 0,81 por quilo,tendo sofrido reduções, de modo que em setembrode 2001 estava cotado por R$ 0,76, já inclusa asubvenção econômica. Com a elevação dascotações internacionais, com reflexo nos preçosdo GEB-1, os beneficiadores passaram aremunerar melhor a matéria-prima e o coágulovirgem com 53% de DRC passou a sercomercializado, em abril de 2003, a R$ 1,26/kg.

Entretanto, esses preços não tiveram muitasustentação e, em julho de 2003, com o avançoda coleta de látex, já estava sendo cotado porR$ 1,01 por quilo, mas recuperou em seguida e,em novembro de 2003, já era praticado a R$ 1,31por quilo, aproximadamente.

A Tabela 3 mostra os valores e asquantidades envolvidas com o pagamento dasubvenção no período de 1997 a 2002. No total foramenvolvidas 439,4 mil toneladas de borracha, com aaplicação de 370,5 milhões de reais. Restam aindapara serem pagos R$ 11.746.374,67, correspon-dendo a 18.358.606 kg de produto que estão emanálise em função de auditorias executadaspela Conab nos últimos meses. A aplicação dasubvenção econômica foi muito importante parao setor, pois permitiu que a borracha nacionaladquirisse competitividade em relação aoproduto importado provocando aumento naprodução, no primeiro momento, e, logo aseguir, investimentos no plantio de novosseringais.

Tendo em vista os fundamentos apontados,tudo indica que as cotações do SMR-10 na MRBcontinuaram com os movimentos típicos de umacommodity, com elevações e retrações, mascertamente ficarão em patamares superioresàqueles que eram praticados anteriormente àcriação do Acordo, especialmente depois de tersido fixado o preço mínimo de venda. Assim, nãoexiste qualquer possibilidade de o governo federalvoltar a pagar subvenção econômica para esteproduto. Considerando as condições atuais, o

Fig. 8. Preçospraticados no mercado

brasileiro, em R$/kg.

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mercado está remunerando bem a produção doheveicultor. Entretanto, a situação não melhoroupara o seringueiro (extrativista), pois mesmo comos preços atuais médios de R$ 1,78 por quilo decoágulo virgem prensado, com 85% de DRC noAcre, já incluso a subvenção estadual, comoprodução mensal é muito baixa (cerca de 50 kgpor mês por extrativista) não conseguindo gerarrenda para se manter na atividade.

As boas condições de mercado estãosendo responsáveis por um maior número deimplantações de heveicultura em praticamentetodos os estados que compõem a chamadaregião de escape. Como exemplo, cita-se ocaso do Estado de São Paulo, onde foram vendidas

cerca de 5 milhões de mudas nos últimos três anos.Existem atualmente mais de cem viveirosproduzindo mudas de qualidade, e o stado tem ameta de plantio de 8 mil hectares por ano nospróximos quinze anos, de modo que devemalcançar 120 mil ha de seringueira no fim desseperíodo.

A Tabela 4 mostra o suprimento deborracha natural no período de 1992 a 2003 euma projeção para 2004. Pode-se ver que noperíodo após a implantação do Programa deSubvenção Econômica, a participação daprodução brasileira na oferta total de matéria-prima para o setor consumidor vem-se mantendoem níveis superiores àqueles observados antes

Tabela 3. Programa de subvenção econômica da borracha natural – quantidades e valores despendidosanualmente, por fonte.

199719981999200020012002(1)

Total

Fonte e elaboração: Conab.(1)Dados em fechamento.

AnoValor (R$)

Total

Quant. (kg)

17.526.42063.000.00086.546.58187.849.09088.108.83996.328.411

439.359.341

15.591.239,2056.700.000,0077.534.628,3278.087.435,4976.299.303,5866.331.306,83370.543.913,42

Leilão

Quant. (kg) Valor (R$)

17.526.420-

40.821,13242.595.92740.377.75141.676.595182.997.825

15.591.239,20-

36.381.723,7937.304.024,9333.569.903,5824.365.506,83147.212.398,33

-63.000.00045.725.44945.253.16347.731.08854.651.816256.361.516

Orçamento

Quant. (kg) Valor (R$)

-56.700.000,0041.152.904,5340.783.410,5642.729.400,0041.965.800,00223.331.515,09

Tabela 4. Oferta e demanda brasileiras, em toneladas e percentuais.

1992199319941995199619971998199920002001200220032004(1)

(1)Projeção Conab.Fonte:Sociedade Rural Brasileira.

AnoVariação (R$)

Consumo

Quant. (kg)

119.144145.674132.288154.755146.425125.476183.692192.039234.964224.573249.399266.000290.000

-22,27-9,1916,98-5,3814,3146,40

4,5422,35-4,4211,056,669,02

Produção

Quant. (kg) Variação (R$)

30.71240.66344.61744.29753.43858.40063.00086.54687.84988.10895.94096.500

100.000

-32,40

9,72-0,7220,64

9,297,88

37,371,510,298,890,583,63

88.432105.011

87.671110.458

92.98767.076

120.692105.493147.115136.465153.459169.500190.000

Importação

Quant. (kg) Variação (R$)

-18,75

-16,5125,99

-15,82-27,8779,93

-12,5939,45-7,2412,4510,4512,09

RelaçãoProdução/Consumo

25,7827,9133,7328,6236,5046,5434,3045,0737,3939,2338,4736,2834,48

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dessa política. É importante notar, também, que osetor vem elevando o consumo de formaimportante, tendo passado, durante o período dasérie, de 119.144 t para 266.000 t em 2003, o queresulta num crescimento da ordem de 123,26%no período de 12 anos, ou uma taxa média de6,62% ao ano.

ConclusãoA produção mundial de borracha deverá

crescer 3,82% em 2004, enquanto o aumento doconsumo deverá ser de 3,06%. É estimando queneste ano haverá um leve aumento no estoquede passagem, entre 50 e 100 mil toneladas. Coma política de produção, exportação e formaçãode preços que foi implantada pelos maioresprodutores mundiais é remota a possibilidade deque a borracha venha a ser comercializada nofuturo com preços deprimidos, como era o casoaté meados de 2002. É importante notar queexistem alguns fatores que podem modificar atendência mundial em longo prazo, como, porexemplo, o perfil de crescimento do consumo daChina e da Índia, ou a política de substituição deseringueiras no sudeste asiático, mas que denenhuma forma afeta o mercado em curto prazo.

O Brasil, onde a seringueira é nativa e jáfoi o único e depois o principal exportador deborracha bruta do mundo, é, desde 1951,participante constante nas importações mundiais.Atualmente a produção brasileira é de pouco maisde 1% do total produzido no mundo. Todavia, oPaís é responsável por 3,48% do consumo mundial,daí sua importância. Deve-se ressaltar, ainda, queas perspectivas indicam que a produção devecontinuar crescendo para atender à demandainterna e à exportação, especialmente em atendi-mento à indústria automobilística.

A análise das condições atuais de mercadoindica que as perspectivas de preços são boas,não havendo possibilidade de que o mercadointerno venha a ser grave. Os preços interna-cionais devem manter-se sustentados pela políticade controle dos principais produtores e os custosde nacionalização encarregarão de tornar odiferencial de preços ainda mais vantajoso parao mercado interno.

Dessa forma, o investimento em novasplantações traduz-se em uma boa opção deinvestimento, especialmente para os agricultoresque estão localizados próximos das regiõesconsumidoras ou que tem boa logística deescoamento. Seria igualmente importante que acadeia produtiva desenvolvesse condições parabeneficiar-se com agregação de valor à produção,como, por exemplo, o uso do Mecanismo deDesenvolvimento Limpo (MDL), do Protocolo deKyoto e o uso racional da madeira nas plantaçõesque estão sendo renovadas.

Com relação ao extrativismo, o governofederal, por meio dos ministérios do MeioAmbiente, Desenvolvimento Agrário e daAgricultura, Pecuária e Abastecimento, devedesenvolver projetos visando a integração daexploração do látex com outras atividades deextração não madeireira na Região Amazônica,como forma de manter em produção essaimportante atividade e elevar o nível de empregode mão-de-obra, bem como proteger a floresta daregião, evitando o roubo de plantas e animais poroutros países. Outro ponto muito importante seriadesenvolver ou implantar tecnologias de produçãoe beneficiamento do látex, de modo a agregarvalor ao produto dessa atividade e, com isso,aumentar a renda o extrativista.

O Plano da Safra 2004/05, que está emdiscussão nos ministérios da Agricultura,Fazenda e Planejamento, traz algumas inova-ções em termos de instrumentos de apoio aosetor produtivo, especialmente no momento dacomercialização. A Conab está propondo ainclusão da borracha na Política de Garantiade Preços Mínimos (PGPM), com aquisiçõespara o produto da Região Amazônica efinanciamentos com juros controlados para aprodução da região de cultivo. Além dissopropõe-se que sejam feitos esforços para facilitara implantação de novos seringais, buscarincentivos no Mecanismo de DesenvolvimentoLimpo – MDL –, da Organização das NaçõesUnidas – ONU –, sejam buscados incentivosna política brasileira de reflorestamento, sejamaplicados recursos no desenvolvimento ouaclimatação de clones mais produtivos eresistentes, etc.

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Tecnologia e resultadoeconômico dosprodutores de açafrãoem Mara Rosa, GO1

ResumoO principal objetivo desta pesquisa foi

descrever as características sociais e tecnológicasdos produtores de açafrão, de Mara Rosa, GO, eanalisar sua performance econômica durante asafra 2001/2002. Setenta produtores foramentrevistados, por meio de um questionáriopreviamente testado. Os resultados mostram quepredomina na região o sistema de produçãotipicamente familiar, usando baixo nível detecnologia e práticas tradicionais de produção.Como conseqüência, a produtividade da terra ébaixa e o resultado econômico ainda depende dadiversificação do sistema de produção. Mas oaçafrão ainda é a principal cultura. Ele representacerca de 46% da renda total da família. A rendafora da propriedade representa 14%, 18% e 38%da renda familiar dos proprietários, meeiros earrendatários, respectivamente. O acesso ainformações de mercado é muito limitado,principalmente pela falta de organização. Isto sereflete no baixo poder de barganha dos produtoresno mercado. Portanto, a principal conclusão podeser resumida como a necessidade premente deorganização e melhoria na tecnologia em geral.

Palavras-chave: Agricultura familiar,açafrão, Curcuma longa, tecnologia, rendafamiliar, Mara Rosa, GO.

IntroduçãoO açafrão-da-índia (Curcuma longa L.) é

uma planta herbácea da família Zingiberaceaeque possui a curcumina, um corante naturalmuito usado pela indústria alimentícia eminúmeros produtos (Takahashi & Yabiku, 1992).É uma das 70 espécies do gênero Curcuma. Suadistribuição abrange a Índia, China, Formosa,Indonésia, Java, Filipinas, Caribe, Norte daAustrália e América do Sul (Mathai, 1979). NoBrasil recebe vários nomes: açafrão-da-índia,açafrão, açafrão-da-terra, batatinha-amarela,gengibre-dourado, terra-merita, raiz-de-açafrão.(Martins & Rusig, 1992).

A região de Mara Rosa tornou-se o maiorpólo de produção dessa espécie, por motivoshistóricos. Lá, a planta crescia quase nativa desdea sua introdução pelos garimpeiros. Nos anos 60,um comerciante de cortiça começou aintermediar açafrão para empresas de corantesde São Paulo e, desde então, implantaram-secultivos comerciais em Mara Rosa. Atualmente,a facilidade de adquirir material para plantio éuma vantagem competitiva da região. Outravantagem é o uso de tecnologias simples delimpeza, cozimento e secagem nas propriedades.Mesmo se tais práticas deixam a desejar quantoao cuidado com a qualidade do produto final,

Cássio Roberto Silva Noronha1

Natan Fontoura da Silva2

José Ferreira de Noronha3

1 Parte da dissertação de mestrado em agronomia do primeiro autor, defendida na Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos da Universidade Federal deGoiás – UFG –, Caixa Postal 131, CEP 74.001-970 Goiânia, GO.2 Pós-graduando da Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos da UFG, Caixa Postal 131, CEP 74.001-970 Goiânia, GO.3 Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos da UFG, Caixa Postal 131, CEP 74.001-970 Goiânia, GO.

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 200469

elas ainda permitem obter um produto de baixocusto (Marinozzi, 2002).

A produção ocorre em estabelecimentostípicos da agricultura familiar, daí suaimportância social na geração de emprego erenda das famílias. Dentre os principaisproblemas enfrentados pelos produtoresdestacam-se, a baixa qualidade do produto, asdificuldades de acesso a informações técnicase de mercado. Esses problemas resultam eminstabilidade do preço do produto no município.

Segundo os autores Guanziroli (1996) eMarques & Noronha (1998), a agriculturafamiliar pode ser definida a partir de trêscaracterísticas centrais:

• A gestão da unidade produtiva e osinvestimentos nela realizados são feitos porindivíduos que mantêm entre si um laço desangue ou de casamento.

• A maior parte do trabalho é igualmentefornecida pelos membros da família.

• Os meios de produção pertencem àfamília, e é em seu âmbito que se realiza suatransferência, em caso de falecimento dosresponsáveis pela unidade produtiva.

Neste trabalho, o objetivo foi estudar operfil social, tecnológico e econômico da culturado açafrão no Município de Mara Rosa, GO.

Material e métodosOs dados desta pesquisa foram coletados

por entrevista individual, com 70 produtores,utilizando-se um questionário, no mês de julhode 2002. Foram retiradas 60 amostras simplesde solo, na profundidade de zero a vintecentímetros nas propriedades visitadas, paracomplementar a caracterização do perfiltecnológico dos produtores.

Na análise econômica, foram utilizadosos conceitos de custo, margem bruta e margemlíquida. Custo significa a compensação que osdonos dos fatores de produção devem receberpara que continuem utilizando esses fatores naprodução. As estimativas de custos auxiliam o

agricultor na escolha das culturas, criações edas práticas a serem utilizadas (Hoffmann et al.,1992). O custo total de produção pode serclassificado em fixos e variáveis. Custos fixossão aqueles que não variam com a quantidadeproduzida (depreciação dos bens duráveis,juros sobre capital empatado, imposto territorialrural, seguros, etc.). Destes, apenas adepreciação foi utilizada neste trabalho. Custosvariáveis são aqueles que dependem e variamcom o nível de produção da empresa (adubos,combustível, etc.). Todos os custos variáveisobservados na safra 2001/2002 foram incluídosnas análises.

A renda bruta (RB) é a soma dos valoresdos produtos prontos para venda. É o valor quefoi obtido como resultado do processo deprodução realizado na empresa durante um ano.A renda líquida (RL) é o resultado da subtraçãodas despesas (D) da renda bruta, podendoreceber denominações diferentes dependendodos itens de despesas que são subtraídos darenda bruta. Normalmente dá-se o nome demargem bruta (MB) à renda líquida obtidaquando se retiram da renda bruta os custosvariáveis. A margem líquida (ML) é o resultadoda subtração dos custos fixos (depreciação,seguro e juros) e variáveis da RB.

Os testes estatísticos de F e de t deStudent, com 5% de probabilidade, como critériode significância estatística, foram usados paratestar a hipótese de igualdade entre as médiasdas variáveis analisadas. O teste F foi usadopara testar a significância das diferenças entreas variâncias das subamostras (categorias deprodutores) antes da aplicação do teste t,seguindo recomendação de Snedecor &Cochran (1969).

Resultados e discussão

Perfil da família e da propriedade

Com poucas exceções, os produtores deMara Rosa têm como principal atividade o cultivode açafrão, a base de sua economia. Culturascomo milho, feijão, arroz e fruticultura aparecemapenas como fonte de renda suplementar.

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O mesmo ocorre com a pecuária de leite, a criaçãode galinhas e porcos que, esporadicamente, sãovendidos. Alguns obtêm, também, renda advindade fontes externas à propriedade.

Mais de 70% dos produtores do sexomasculino apresentam idade entre 31 e 60 anos.Cerca de 64% das mulheres estão abaixo de 45anos. Seus filhos, na sua maioria, têm até 20 anosde idade. Os homens e as mulheres, em suamaioria (mais de 70%), só estudaram até a 5a sériedo ensino fundamental. Para as crianças, esteíndice é de 78% até o momento, e 14%completaram o 1º grau. Esses dados são parecidoscom os do Sebrae-Proder (Diagnóstico..., 2000),onde apenas 57,2% da faixa de escolaridadeobrigatória, entre os 7 e 14 anos de idade, domunicípio, são alfabetizados, média esta muitobaixa quando comparada à média de 81,4% noEstado de Goiás e 77,3% no Brasil. Entre osindivíduos acima de 15 anos, 70% sãoalfabetizados em Mara Rosa enquanto no Estadode Goiás chegam a 82,3% e no Brasil a 80,6%.

Dos 70 produtores visitados, 88,6% sãocasados, 7,1 % solteiros e 4,3% não responderamà pergunta. Na média os produtores entrevistadospossuem apenas dois filhos. Mas a freqüência dasque não possuem filhos chega a 28,57% daamostra.

Cerca de 66% das famílias apresentammais de 50% dos membros envolvidos com acultura do açafrão. Nota-se que essa freqüênciase refere a toda a safra. Mas sabe-se que a maiorparte das operações realizadas é feita só porpessoas da família, exceto durante a colheita,quando predomina a mão-de-obra de fora dafamília. Resultado semelhante foi obtido porMarinozzi (2002).

A área plantada fica distante daresidência fixa do produtor. Por isso, durante acolheita, a família constrói uma estruturarudimentar, barracão, onde passam a morar atéfindar a colheita e o beneficiamento do açafrão

daquela safra. O tamanho da propriedade variamuito. Encontram-se propriedades de até 100ha, assim como pequenas propriedades demenos de 1 ha produzindo açafrão.

Quanto à propriedade da terra, observou-se que 74% dos entrevistados são proprietáriosdas terras onde plantam açafrão, enquanto osoutros 26% estão divididos entre arrendatáriose meeiros.

A benfeitoria de maior freqüência entre osprodutores é o galpão que aparece em 72,86%das propriedades, seguido da cisterna (60%), fossaséptica (42,86%) e curral (41,43%). A energiaelétrica está presente em 52,86 % das residênciasdos produtores de açafrão, mas apenas 17,14%possuem telefone na propriedade. A bicicleta, ocavalo e a carroça são os principais veículosutilizados na cultura do açafrão em Mara Rosa, oque mostra o baixo poder de investimento namecanização da cultura. Marinozzi (2002) sugereque a capacidade de investimento na cultura épraticamente nula para alguns dos produtores deaçafrão de Mara Rosa. No entanto, mais de 91%dos produtores possuem residência própria, emsua maioria na propriedade produtora de açafrão.

As máquinas e os implementos são muitopoucos. Mais de 80% dos produtores nãopossuem veículos motorizados. Nas pequenasáreas de plantio, muitas vezes ocorre oempréstimo de equipamentos, como arado egrade. Cultivador, carpideira e arado de traçãoanimal são os implementos mais encontrados,mesmo assim a freqüência dos produtores queos possuem na propriedade não chega a 30%.Cerca de 1/3 dos produtores usam sulcadoremprestado, e outro 1/3 a grade niveladoraalugada.

Apenas a pastagem natural e a reservanatural foram encontradas em mais de 70% daspropriedades. Outras atividades, como arroz,milho, mandioca, etc. são encontradas emmenos de 1/3 das propriedades (Tabela 1).

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Perfil tecnológicoA área plantada com açafrão, pelos

produtores de Mara Rosa, tem como seu maiorfator limitante a mão-de-obra para a colheita,principalmente pelo fato de a cultura caracterizar-se por baixo nível de mecanização. As áreascultivadas são pequenas em todas as categoriasde produtores, independentemente da idade dacultura. Todos os produtores meeiros apresentaramaçafrão de dois anos; metade deles com até 1 hae a outra metade entre 1 e 2 ha plantados. Naclasse de área até 2 ha (açafrão de dois anos),encontraram-se 60% dos arrendatários e 54% dosprodutores proprietários. Portanto, essas duascategorias apresentaram açafrão em outras faixasde tamanho, mas sempre com freqüência abaixode 50%.

A presença de 70% dos produtoresproprietários e 75% dos arrendatários comlavouras de até um ano, e 50% dos meeiros,sugere que as duas primeiras categorias são asprincipais responsáveis pela renovação delavouras. Os dados permitem identificar,também, que os meeiros não têm interesse (ounão têm condições) para cultivar lavouras comáreas acima de 2 ha nem com ciclos diferentesde dois anos. O preço é outro parâmetroimportante utilizado pelos produtores paraestabelecer a área plantada de açafrão.

O pH do solo nas propriedades encontra-se em níveis de baixo a médio, portantopróximos ao valor mínimo necessário, (5,8),

indicado por Silva (2001). Segundo o autor, osolo para plantio de açafrão deve apresentartextura intermediária, areno-argiloso ouargiloso, com boa drenagem, não compactado,pH entre 5,8 e 6,8 e com boa fertilidade naturalpara que se obtenha melhores produções. Oaçafrão, cultivado em solo de cerrado pobre emmatéria orgânica, apresenta menor crescimentoda parte aérea, rizomas pequenos e baixaprodutividade. Nesses solos, os resultados depesquisa têm mostrado que a adubação mineralcom NPK não é suficiente para alcançar boaprodutividade, como aquelas obtidas em soloscom elevado teor de matéria orgânica e defertilidade natural (Silva, 2001).

Os resultados das análises de solo dessapesquisa mostram áreas de boa fertilidadenatural, principalmente quanto à matériaorgânica. Cerca de 95,24% dos solosencontram-se na faixa de médio a alto valorreferencial (1,5% a 3,0% de matéria orgânica),principalmente nas áreas novas, abertas para ocultivo de açafrão. Em geral, pode-se concluirque os solos onde se realiza o plantio do açafrãopossuem alta fertilidade natural.

A época mais adequada para o plantio doaçafrão, no Brasil, é de outubro a dezembrocoincidindo com o início do período chuvoso(Cecílio Filho, 1996). Na prática, é isso que ocorrena região de Mara Rosa e a colheita normalmenteé realizada no período seco, de junho a setembrodo ano seguinte ou depois de dois anos. Algunsprodutores separam parte da produção paraplantio da safra seguinte, principalmente nas áreasde plantio de até 0,5 ha. Outros produtoresdestinam toda a produção ao mercado por nãodispor de condições para o armazenamento dorizoma-semente ou por simples falta deplanejamento do plantio da safra seguinte.

O espaçamento de plantio varia muitoentre os produtores (Tabela 2) e geralmente sãomenores do que aqueles indicados nasrecomendações técnicas. Alguns plantam osrizomas em uma linha contínua, encostando umrizoma ao outro na linha de plantio, outrosutilizam até 20 cm entre os rizomas e 30 cm

Tabela 1. Freqüência de produtores segundo o usoda terra, Mara Rosa, GO. Safra 2001/2002.

ArrozMilhoPastagem naturalCapineiraCana forrageiraFruticulturaMandiocaReserva florestalAçafrão

Descriçãoda cultura

192351

223

76

5070

Freqüência

Absoluta Relativa (%)

27,1432,8672,86

2,8632,8610,00

8,5771,43

100,00

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entre as linhas de plantio. O espaçamento maisutilizado foi de até 5 cm entre plantas e de 10 a40 cm entre linhas. Segundo Cecílio Filho(1996), o melhor espaçamento de plantio é de30 cm entre plantas e de 70 cm entre linhas.Silva, 2001, recomenda espaçamento de 15 cmentre plantas e de 60 a 80 cm entre linhas. EmMara Rosa não há um padrão de espaçamentobem definido para a cultura do açafrão.

As áreas escolhidas para o plantio do açafrãoficam próximas aos cursos de água, principalmentepela alta fertilidade natural dos solos do local e pelanecessidade de abastecimento de água por partedas famílias durante a colheita. As famíliasconstroem pequenas cabanas rudimentares, aolado da lavoura, onde se estabelecem porperíodos de até quatro meses, no período dacolheita, exceto quando a lavoura fica próximada residência.

A cultura do açafrão necessita de solos deboa qualidade físico-química. Segundo Silva,2001, experimentos realizados com açafrão têmmostrado que, em solos previamente corrigidos ecom fertilidade de média a alta, essa culturaresponde pouco ou nada às adubações. Assim,em solos com boa fertilidade natural ou após outrasculturas bem adubadas, pode-se dispensar aadubação ou fazer uma adubação leve paragarantir apenas a reposição dos nutrientesretirados pela cultura.

Em Mara Rosa, quase todas as propriedadesvisitadas, com cultura do açafrão, foram instaladaspela primeira vez após a abertura da área. Há

casos em que a área foi arrendada pelo proprietárioem troca apenas da abertura e limpeza da áreade plantio após a colheita do açafrão. Essecomportamento foi observado, também, entre osprodutores familiares da cultura do sorgo-vassourano Estado de São Paulo ( Farias et al., 2000).

Os tratos culturais são muito simples e nãofoi observado o uso de adubação e tratamentosfitossanitários. O único trato cultural é a capinaque, normalmente em número de três, é feitadurante a safra para eliminar ou diminuir acompetição com plantas invasoras.

Sabendo-se, pela prática, que a matériaorgânica e a fertilidade do solo são de grande valiapara qualquer cultura, os produtores procuramáreas de alta fertilidade e concentração de matériaorgânica, como as baixadas próximas aos cursosde água. Eliminam, assim, a necessidade de seadicionar matéria orgânica e fazer adubaçãoquímica, ambos de alto custo. Entre os 70produtores entrevistados, apenas um confirmou aaplicação de esterco de gado na área da culturade açafrão, mas sem especificar a quantidadeutilizada.

A colheita dá-se em épocas diferentes noBrasil e na Índia, o que indica uma boaoportunidade no mercado internacional. Em MaraRosa, a colheita é toda realizada manualmente,com o auxílio de enxadas pelos própriosprodutores. É a atividade mais desgastante edemorada da cultura. O produtor e toda a suafamília participam desse processo. Quase sempreé utilizado o fogo para a limpeza do terreno e

Até 56 a 10

11 a 1516 a 2021 a 25Total

Espaçamentoentre plantas

(cm)

Tabela 2. Freqüência dos produtores segundo classes de espaçamento no plantio do açafrão, Mara Rosa, GO.Safra 2001/2002.

Espaçamento entre linhas

Total %

28,018,06,04,01,0

57,0

49,1231,5810,53

7,021,75

100,00

2113

530

42

10 a 40 cm

36,8422,81

8,775,260,00

73,68

Nº %

71 a 100 cm

%Nº

0,02,00,00,00,02,0

0,003,510,000,000,003,51

41 a 70 cm

%Nº

7,03,01,01,01,0

13,0

12,285,261,751,751,75

22,81

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eliminação da palha seca do açafrão antes dacolheita. A touceira é removida do solo e osrizomas ficam expostos. Logo em seguida, osmesmos são destacados e separados em rizomasdedo e em rizomas mãe, sendo empilhados emmontes no próprio campo e beneficiados no local.

Após a colheita, no beneficiamento, oaçafrão passa por um processo de limpezadenominado brunimento, em que restos dosistema radicular e os resíduos de solo sãoremovidos por atrito com uma malha de ferroque reveste um tambor (ou tonel de madeira)giratório. Em alguns casos, os rizomas aindapassam pelo processo de polimento que é umaoutra etapa de limpeza, em que a fricçãoremove mais substâncias aderidas, assim comoa película protetora dos rizomas. Após esseprocesso, os rizomas podem ser conduzidos deduas maneiras. Fatiados e secados ao sol oucozidos (inteiros) antes de serem levados ao solpara secar.

Quando inteiros são levados ao cozimentoem estrutura simples de barro denominada deforno de cozimento. Os rizomas são acondi-cionados em balaios artesanais, imersos na águaem ebulição, em panelas de ferro, por mais oumenos de 5 a 10 minutos. Alguns produtoresadicionam à água de cozimento dos rizomasbissulfeto de sódio para concentrar o principioativo (curcumina) responsável pela coloração doaçafrão.

Quando fatiados, são cortados à mão, empequenos pedaços, com o auxílio de um fatiador,e em seguida são expostos ao sol para secar.

Na maioria das propriedades, o açafrãoé beneficiado no campo, no próprio local dalavoura. Levado a secar em lonas de plásticoou postos diretamente no solo, o processo podevariar de 30 a 45 dias, quando os rizomasperdem 80% de seu peso. Dez quilogramas derizomas recém-colhidos rendem cerca de doisquilogramas de rizomas secos (relação de 5:1).Quando o armazenamento ocorre com rizomasfrescos recém-colhidos, os mesmos são

amontoados no chão ou em cima de lonas, nocampo, e cobertos para evitar o apodrecimentoprovocado pela água da chuva. Quandoarmazenados secos, são tomados mais cuidadosem relação ao acondicionamento para evitar areidratação dos rizomas. Marinozzi (2002)encontrou a maioria dos produtores utilizandoo processo de fatiamento manual e secagemao sol sobre lona de plástico.

As condições de armazenamento estãolonge das ideais, e grande parte da produção éperdida nessa fase. Nos últimos anos surgiu umaespécie de caruncho, que se alimenta dosrizomas secos em um processo semelhante aodo caruncho do milho, prejudicando a quali-dade do produto e aumentando as perdas.

A produtividade obtida depende do tipode cultivo do açafrão, se é de ano ou de doisanos. A produtividade média obtida em MaraRosa, segundo Silva (2001), para rizomasfrescos foi de 10 t/ha na cultura de um ano ede 20 t/ha na de dois anos.

Nesta pesquisa encontrou-se produtividadede açafrão seco de até 12 t/ha, mas a maioria dosprodutores relatou produtividades na faixa de 0,5a 4,0 t/ha. A média da amostra ficou em 2,3 t/hade rizomas secos (Tabela 3), valor próximo a 3,2t/ha encontrado por Milhomem & Teixeira (1999).Em termos de rizomas verdes, a produtividademédia foi 11,4 t/ha (Tabela 4), muito abaixo dosníveis citados por Cecílio Filho (1996), que obteve24,6 t/ha de rizomas verdes em seus experi-mentos, sob condições de espaçamento eadubação ideais. Aspectos como qualidade derizomas-sementes, tipo de solo, espaçamentos deplantio e tratos culturais são fundamentais para aobtenção de produtividades mais altas. Assim, aadoção de manejo e práticas no cultivo do açafrãoinadequados, como observado neste trabalho,resultam em produtividades baixas.

De acordo com Milhomem & Teixeira(1999), a proporção de rendimento de rizomasfrescos e seco fica em torno de 4,5:1 a 5,0:1para açafrão de dois anos.

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 2004 74

Resultado econômicoA composição da renda familiar (RF) dos

produtores de açafrão foi decomposta em rendaagrícola, renda da atividade pecuária, renda deoutras atividades na propriedade e renda fora dapropriedade. A renda agrícola representa 53,40%,46,77% e 46,38% da renda familiar total para osproprietários, arrendatários e meeiros, e a rendada atividade pecuária, 29,94%, 33,01% e 20,58%da RF, respectivamente (Tabela 5). A participaçãodo açafrão na renda da família é muito semelhantenas três categorias, variando ao redor de 46% darenda familiar.

Nota-se que, para os meeiros, as fontesde renda fora da propriedade representam quase1/3 do total da renda familiar. O que é explicadopelo fato de não serem proprietários de terra, eprecisarem de fontes alternativas de renda, quebuscam fora da propriedade. A aposentadoriarepresenta cerca de 30% da renda familiar,nessa categoria de produtores, perdendo apenaspara a participação da renda do açafrão. Valedestacar que a renda fora da propriedade émuito importante, mesmo na categoriaproprietário e arrendatário, com 14,24% e18,29% da RF, respectivamente.

Na agricultura em geral, os produtoresnão têm qualquer poder de barganha junto aocomprador, ficando sujeitos ao preço oferecido.Portanto, é de pouca relevância prática,principalmente para decisões de curto prazo,calcular o custo total de produção. O que nãopode acontecer em safras consecutivas é queo produtor esteja vendendo seu produto a preçoabaixo do custo variável de produção, poisevidenciaria ineficiência econômica no sentidode que estariam gastando mais do que recebemnaquela safra.

Para atender a essa preocupação, foramcalculados os custos varáveis e também o custoda depreciação dos bens de capital (máquinas,implementos, equipamentos e veículos)utilizados na produção de açafrão, bem comoo custo variável médio (Tabela 6).

Os resultados obtidos permitem algumasobservações interessantes. As três categorias deprodutores apresentam custos variáveis bempróximos, principalmente os grupos deproprietários e arrendatários. Não houvediferença significativa entre as médias dessesdois grupos, ao nível de 5% de probabilidade,pelo teste t de Student.

Diferenças bem maiores entre os gruposde produtores são observadas na receita total,o que se reflete na margem líquida. O custovariável médio é praticamente igual entreproprietários e arrendatários (R$ 0,50/kg), porémbem maior para o grupo dos meeiros (R$ 0,86/kg).Todos os grupos venderam o produto a preço

Não colheramAté 500

501 a 1.0001.001 a 2.0002.001 a 3.0003.001 a 4.0004.001 a 5.000

Acima de 5.000Total

Produtividade(kg/ha) seco

Freqüência

84

141611845

70

Absoluta

11,435,71

20,0022,8615,7111,435,717,14

100,00

Tabela 3. Freqüência de produtores em faixas deprodutividade de açafrão seco, Mara Rosa, GO. Safra2001/2002.

Relativa (%)

Não colheramAté 1.000

1.001 a 2.0002.001 a 3.0003.001 a 4.0004.001 a 5.0005.001 a 10.000

10.001 a 20.00020.001 a 30.000Acima de 30.000

Total

Produtividade(kg/ha) fresco

Freqüência

80161

101619

63

70

Absoluta

11,430,001,438,571,43

14,2922,8627,14

8,574,29

100,00

Tabela 4. Freqüência de produtores em faixas deprodutividade de açafrão fresco (verde), Mara Rosa,GO. Safra 2001/2002.

Relativa (%)

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Ano XIII - Nº 2 - Abr./Maio/Jun. 200475

Tabela 5. Componentes da renda bruta e líquida das famílias da amostra, Mara Rosa, GO. Safra 2001/2002.

Renda agrícolaArrozMilhoAçafrãoOutras rendas agrícolasRenda da pecuáriaLeiteOvosAnimaisOutras rendas da pecuáriaOutras rendasAluguel de pastoAluguel de máquinasRenda fora propriedadeAposentadoriaPensãoBolsa escolaAuxílio financeiro familiarSalário (emprego)Receita total da família

Fontes

a, b, c – Valores seguidos de letras iguais, na mesma linha, não possuem diferença significativa ao nível de 5% de probabilidade pelo teste “t” de Student.

Meeiro

%R$

2.981,00b52,0020,00

2.909,00b0,00

1.322,800,000,00

1.322,80a0,000,000,000,00

2.124,001.920,00c

0,0060,00

144,000,00

6.427,80

46,380,810,31

45,260,00

20,580,000,00

20,580,000,000,000,00

33,0429,87

0,000,932,240,00

100,00

Arrendatário

R$ %

4.769,64a0,000,00

4.769,64a0,00

3.366,361.072,64

0,003.311,82a

54,550,000,000,00

2.061,82b436,36b218,18109,09

43,641.254,5511.270,45

46,770,000,00

46,770,00

33,019,520,00

29,380,480,000,000,00

18,293,871,940,970,39

11,13100,00

6.525,25a600,05

23,395.793,86a

107,953.658,591.300,65

3,053.648,27a

7,27109,84

35,5274,32

1.925,68818,18a

49,0946,59

199,09812,73

13.520,01

Proprietário

R$ %

53,404,910,19

47,420,88

29,949,620,02

26,980,050,810,260,55

14,246,050,360,341,476,01

100,00

Tabela 6. Composição média do custo de produção e rentabilidade do açafrão beneficiado, Mara Rosa, GO.Safra 2001/2002.

Custos variáveis (R$/ano)ServiçosLimpeza e nível do terrenoAraçãoGradagemAração e gradagemSulcamentoPlantioCapinaColheitaFatiamentoCozimentoSecagemEmbalagemInsumosSementes compradasSementes produzidasDepreciação (R$/ano)CV mais depreciação (R$/ano)Receita total (R$/ano)Margem bruta (R$/ano)Margem líquida (R$/ano)Custo variável médio (R$/kg)Preço médio recebido (R$/kg)

Item

a, b, c – Valores seguidos de letras iguais, na mesma linha, não possuem diferença significativa ao nível de 5% de probabilidade pelo teste “t” de Student.

Meeiro

%R$

2.496,76a1.521,76

288,0055,2043,20

0,0048,0096,00

311,36476,00108,00

38,0058,00

0,00975,00b138,00873,00

40,06b2.536,822.909,00b

412,24c372,18c

0,86b0,89a

98,4259,9911,352,181,700,001,893,78

12,2718,76

4,261,502,290,00

38,435,44

32,992,00

100,00100,00

----

Arrendatário

R$ %

3.204,20a2.425,82

230,00203,55

40,9127,27

103,64103,64311,36

1.156,3762,7358,18

128,180,00

778,38a290,91487,47693,00a

3.897,204.769,64a1.565,43b

872,44b0,51a0,85a

82,2262,25

5,905,221,050,702,662,667,99

29,671,611,493,290,00

19,977,46

12,5119,47

100,00100,00

----

2.807,13a 2.067,13

124,4884,6161,9744,3275,31

140,82411,57756,61

74,0067,39

223,332,73

740,00a107,50632,50558,56a

3.365,685.793,86a2.986,74a2.428,18a

0,50a0,99a

Proprietário

R$ %

83,4061,42

3,702,511,841,322,244,18

12,2322,48

2,202,006,640,08

21,993,19

18,7916,00

100,00100,00

----

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maior do que o custo variável médio. Portanto,há uma certa margem para pagar os custos fixosde produção. Esse resíduo precisa ser suficientepara cobrir o custo fixo total, para que o produtorpossa permanecer no mercado no longo prazo.Isso quer dizer que essa pequena margemprecisa cobrir os custos do capital empatadona produção, os juros sobre esse mesmo capitale possíveis custos financeiros, a mão-de-obrafamiliar não remunerada e a administração dosnegócios.

Alguns dos itens que compõem os custosvariáveis devem ser observados com cuidado. Oscustos com limpeza e nivelamento do terreno, porexemplo, são maiores para os meeiros do que paraarrendatários ou proprietários. Fato explicado porgeralmente os meeiros realizarem parcerias paraabertura de novas áreas em troca do faturamento,dividido em partes iguais, da cultura a serimplantada. Mas mesmo assim o meeiro possuium custo variável total, menor do que os demaisprodutores.

A comercialização do açafrão de MaraRosa é quase toda realizada por atravessadores,ou faisqueiros, que compram os produtos atémesmo no campo. Boa parte da produção(46,34%) é comercializada com os rizomascozidos inteiros ou, (31,18%) fatiados secos. Emalguns casos, o açafrão é pré-processado, lavado,moído ou apenas selecionado antes de ser vendidoaos grandes centros consumidores.

Cerca de 80% do açafrão de Mara Rosa éescoado para o Estado de São Paulo paraindústrias alimentícias e de corante. O restantefica em Goiás, ou vai para Minas Gerais, DistritoFederal ou outros estados para abastecerminiindústrias de temperos, atacadistas evarejistas. Marinozzi (2002) destaca a importânciado conhecimento de mercados alternativos tantopara comerciantes como para produtores nointuito de assegurarem as vendas quando asindústrias de São Paulo não compram na região.Normalmente o produtor fica sabendo do preçode venda do produto que ele produziu pelocomprador ou por vizinhos. Fato que pode estarrelacionado a características sociais, como aausência de rede elétrica na propriedade, baixo

nível de escolaridade dos produtores rurais,limitando seu acesso aos meios de comunicaçãocomo TV, computadores (internet) e até mesmorádio.

A produção de açafrão de Mara Rosaapresenta características semelhantes às de umgrande assentamento de reforma agrária. Porisso, é importante observar a posição do Institutode Terras do Estado de São Paulo – Itesp – (1998p. 9), quando afirma que

“a forma de organizar a produção e

comercialização é um fator relevante para o

bom desempenho dos assentamentos. Há

diversas experiências coletivas na produção

agrícola, no uso de equipamentos ou no

momento de comercializar. Incentivos pelos

vários mediadores e mesmo por iniciativas

próprias, entre os assentados, a formarem:

cooperativas, associações ou grupos

informais.”

A possibilidade da instalação de umaindústria de processamento de açafrão noMunicípio de Mara Rosa tem levado os produtoresa pensarem em uma forma de se unirem. Todavia,é importante salientar que a instalação de umaindústria de processamento por si só não resolveráos problemas de desinformação, qualidade finaldo açafrão produzido e valor de venda dos seusprodutos. Há muita coisa a ser feita para melhoraro rendimento técnico do sistema produtivo. Apesquisa pode desenvolver tecnologia apropriadaàs condições de Mara Rosa e sua aplicação. Aorientação técnica profissional aos produtorespode elevar os índices de produtividade,qualidade final do seu produto e a rentabilidadeda cultura.

As características de qualidade, como:teor de umidade, microbiológico, curcumina,granulometria, cor, odor, sabor, aspecto físico,óleo essencial, etc., devem ser buscadas. Omercado consumidor está cada vez maisexigente em relação à qualidade dos alimentosconsumidos. E padrões de qualidade vêm sendodiscutidos e elaborados pelas indústrias e omercado consumidor.

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ConclusõesA produção de açafrão no Município de

Mara Rosa, GO ocorre em propriedadestipicamente familiares. O número de meeiros earrendatários varia muito de um ano para o outroo que provoca grande variação na produção,prejudica relações comerciais estáveis e,acrescido da falta de apoio financeiro, técnicoou comercial, por parte do poder público,dificulta o desempenho econômico da maioriados pequenos produtores de açafrão.

A tecnologia utilizada na cultura deaçafrão é tradicional. Os recursos mecânicos etecnológicos ficam limitados ao maquinário depreparo do solo, que, em geral, são emprestadosou alugados, e o beneficiamento é feito comequipamentos rudimentares na sua maioriaconstruídos pelos próprios produtores deaçafrão.

As propriedades são diversificadas, mashá uma grande dependência da cultura deaçafrão, que representa quase metade (46%) dareceita total dos produtores. A categoria à qualo produtor pertence, meeiro, arrendatário ouproprietário, não afeta o custo total de produção.O preço médio recebido por quilograma deaçafrão foi maior que o custo variável médiorecebido por quilograma, na safra 2001/2002.Indicando que os produtores têm condições desobreviver na atividade no curto prazo, massobra pouco para pagar os demais custos einvestir na cultura.

O associativismo é condição necessáriapara o sucesso dos produtores de açafrão, masprecisa ser acompanhado de parcerias comempresas ou instituições para o desenvolvimentode novas tecnologias de produção ou daadaptação das já existentes.

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IntroduçãoA migração rural urbana é um dos

principais fatores de crescimento das cidadesbrasileiras. O desemprego no setor urbano e aescassez de recursos para a realização deinvestimentos em saneamento, saúde, educaçãoe moradia fazem com que a migração provoquedeterioração da qualidade de vida de todos osmoradores das cidades, e não permita que ospróprios migrantes sejam recebidos de formadigna.

A Federação das Indústrias do Estado do Riode Janeiro – Firjan –, com o intuito de contribuirpara o desenvolvimento do estado, encomendouestudos que identificassem potencialidades(Batista, 1998; FGV, 1998; Campo; 1998 e 1999;Agrar 2003) e indicassem ações estratégicas parasua concretização. Esses estudos deram origema iniciativas específicas para fomentar cadeiasprodutivas em regiões selecionadas, tais como:moda íntima, na região serrana; rochas e pedrasornamentais, na região noroeste; pólo de altatecnologia, em Petrópolis; a floricultura, emdiversas regiões; e a fruticultura irrigada nasregiões norte e noroeste. Esses projetosestruturantes têm a característica comum de criarempregos, gerar rendas, usar as infra-estruturasfísicas, científicas e tecnológicas existentes no Riode Janeiro e explorar as potencialidades locais.

Este artigo faz uma resenha da implantaçãoe do desenvolvimento do pólo de fruticulturairrigada. São mostrados os fundamentos dasintervenções realizadas, os avanços obtidos, osdesafios à frente, bem como as lições contidasneste processo.

AntecedentesEm 1997, o Sistema Firjan, em parceria com

o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e PequenasEmpresas – Sebrae-RJ –, encomendou à FundaçãoGetúlio Vargas estudo para identificar aspotencialidades do Estado do Rio de Janeiro. Essetrabalho confirmou a vocação agroindustrial dasregiões norte e noroeste do estado. Posteriormente,estudos voltados especificamente para aquelasregiões mostraram a viabilidade da fruticulturairrigada (Campo, 1998 e 1999) como atividadecomplementar àquelas já praticadas na região.

A região norte corresponde à parte de corcinza-escuro no mapa ilustrativo do Estado do Riode Janeiro (Fig. 1). Os municípios pertencentes àregião estão numerados no mapa e na listagem aseguir para facilitar sua identificação: CardosoMoreira (1), Campos dos Goytacazes (2), SãoFrancisco do Itabapoana (3), São João da Barra(4), Quissamã (5), Conceição de Macabu (6),Carapebus (7), Macaé (8) e São Fidélis (9).

1 Agradeço os comentários de Ignez Vargas, Luiz Eduardo Crespo, Ronaldo Nogueira Martins e Sonia Benedicto França, a uma versão anterior.2 Coordenador do Grupo Executivo de Agroindústria do Sistema Firjan, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ.

O pólo defruticultura irrigadano norte e noroestefluminense1

Antônio Salazar P. Brandão2

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Campos dos Goytacazes é a maior cidade daregião e compreende a maior parcela daatividade agroindustrial, sendo destaque àindústria açucareira. Diversas usinas foramconstruídas durante o período em que aprodução de álcool foi subsidiada peloProálcool, tendo a área plantada com cana-de-açúcar se elevado para 195 mil hectares, em1990. Com a retirada dos subsídios, em virtudeda baixa produtividade ocasionada pelos baixosíndices pluviométricos e pelo regime irregularde chuvas, a atividade entrou em declínio, e,por isto, muitas das usinas então construídasforam desativadas. A área plantada com cana-de-açúcar reduziu-se de 24%, entre 1990 e2002, enquanto no Brasil ela cresceuaproximadamente 17%. Como conseqüência,observa-se, no momento, que a capacidadeinstalada da indústria açucareira, em atividade,é bastante superior à produção de cana. Esseprocesso deu origem ao fortalecimento dapecuária leiteira e de corte tradicionais, porém,com alguns nichos expressivos de elevadaprodutividade.

A região noroeste corresponde à parte decor cinza-claro do mapa. Os municípiospertencentes à região estão numerados nomapa e na listagem, que se segue, para facilitar

sua identificação: Varre Sai (1), Porciúncula (2),Natividade (3), Bom Jesus do Itabapoana (4),Itaperuna (5), Italva (6), Laje do Muriaé (7),Miracema (8), Santo Antonio de Pádua (9), SãoJosé de Ubá (10), Cambuci (11), Itaocara (12) eAperibé (13). Essa região passou por diversosciclos de produção, tais como: o do café, o doarroz e de outras culturas que, posteriormente,perderam a atratividade para os produtoreslocais. Com isso sofreu um processo deesvaziamento que, entre outras coisas, reduziusua população de 305.066 habitantes, em 1940,para 292.377, em 2000. O declínio acentuadoocorreu entre 1940 e 1980, ano a partir do quala população voltou a crescer. Atualmente asatividades agropecuárias predominantes são apecuária leiteira tradicional, de baixaprodutividade, e a pecuária de corte tradicionale também de baixa produtividade. As demaisatividades têm característica de subsistência,gerando poucos empregos e vendas depequenas quantidades. Há entretanto duasexceções a mencionar: a) o Município de SãoJosé de Ubá, com vendas expressivas detomate, mas apresentando produtos dequalidade heterogênea, produzidos em regimede sequeiro, sem tirar proveito da tecnologiaexistente; b) o Município de Santo Antônio dePádua e alguns municípios vizinhos produzem

Fig. 1. Mapa ilustrativo doEstado do Rio de Janeiro.

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quantidades significativas de olerícolas, combaixo padrão de qualidade, pouca diversidadee produção em regime de sequeiro.

A fruticultura irrigada, com sua viabilidadedocumentada nos estudos citados, é uma dasatividades que mostrou potencial para dinamizara agroindústria regional. Por suas característicastécnicas, pode ser praticada em pequenas áreas,permitindo aos produtores complementar ediversificar atividades tradicionais, ao invés desubstituí-las.

Ao mesmo tempo, um processo gradual deimplantação permite melhor absorção pelosprodutores dos custos associados à falta deconhecimento da tecnologia e dos mercados, bemcomo diluem no tempo as dificuldades associadasà escassez de capital. As lideranças locais eestaduais perceberam claramente esse potenciale a complementaridade com o restante daprodução agropecuária, passando a incentivar efomentar sua implantação.

O potencial da região para a fruticulturafundamenta-se nos seguintes fatores (Campo,1998 e 1999):

•Condições edafoclimáticas adequadaspara a produção de frutas tropicais, tais comoabacaxi, maracujá, coco, goiaba, manga,mamão, banana e anonáceas.

•Índices pluviométricos baixos, porémoferta de água abundante, em função dosdiversos rios perenes que cortam a região.

•Existência de infra-estrutura – estradas,telecomunicações, energia – compatível coma logística eficiente para entrega de insumos eo envio de produtos, tanto no mercado internoquanto no mercado externo.

•Apoio qualificado de pesquisa naregião, via universidades e institutos depesquisa regionais, estaduais e federais.

•Proximidade dos principais mercadosnacionais, tais como Rio de Janeiro, São Paulo,Belo Horizonte e Vitória.

•Facilidade de acesso ao mercadoexterno, pelos portos de Sepetiba, do Rio de

Janeiro, e de Vitória, bem como pelo aeroportodo Rio de Janeiro.

Estimou-se (Campo, 1998 e 1999) que asregiões norte e noroeste do estado dispõem deaproximadamente 220 mil hectares apropriadospara a fruticultura, que podem ser destinadosàquelas culturas sem diminuir a produçãocorrente, particularmente, do principal produto,a cana-de-açúcar. Essa área potencial equipara-se à que está em produção no Chile, país quetem se destacado como importante exportadorde frutas de clima temperado, com vendasexternas de cerca de US$ 1,6 bilhão.

O papel das instituiçõesO passo inicial do envolvimento do Sistema

Firjan foi dado, quando houve a contratação dosestudos mencionados anteriormente. Seusresultados foram divulgados amplamente, além deserem apresentados a altos executivos dosgovernos federal, estaduais e municipais, bemcomo ao setor privado.

Em janeiro de 1999, o Sistema Firjan, oSebrae-RJ e a Federação da Agricultura do Estadodo Rio de Janeiro criaram o Grupo Executivo deFruticultura, com a missão de atrair investimentos;sensibilizar e disseminar informações; e contribuirpara a articulação das diversas instituiçõesenvolvidas na implantação do pólo.

Os apoios institucionais ao projeto foramse ampliando e se consolidando. O governoestadual, empossado em 1999, incluiu odesenvolvimento da fruticultura como parte deseu programa de ação. Nesse mesmo ano, ogoverno federal criou financiamento específico,com condições semelhantes às do ProgramaNordeste Competitivo, através do Programa deFruticultura do Norte e Noroeste do Rio deJaneiro, do Banco Nacional de Desenvolvi-mento Econômico e Social – BNDES. Diversasprefeituras apoiaram a implantação do pólodentro dos limites de seus recursos einstrumentos, sendo que algumas destinaramparte dos royalties do petróleo para promovera atividade.

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Menção especial deve ser feita ao Sebrae-RJ, que fez parceria com o Sistema Firjan, desdeo primeiro momento, participando na contrataçãode estudos, na criação do Grupo Executivo deFruticultura e disponibilizando seus produtos eserviços para aplicação no pólo.

As ações do Grupo Executivo deFruticultura têm características típicas defomento, tais como realização de encontros emissões no Brasil e no exterior para divulgar oprojeto, promoção de eventos de negócios edisseminação de informações relativas aomercado de frutas e tecnologias disponíveis eoutras. Os encontros de fruticultura que serealizam a cada dois anos, em Campos dosGoytacazes, têm tido público de mais de 2 milpessoas, e comparecem empresas de toda acadeia produtiva, bem como executivos dossetores público e privado, produtores e técnicosde todo o País.

DesempenhoDe início, deve-se observar que a

fruticultura na região norte fluminense não éatividade inteiramente nova. O município deSão Francisco do Itabapoana produz frutas,principalmente abacaxi e maracujá, já háalgum tempo, porém, utilizando tecnologiarudimentar e em regime de sequeiro.

Os dados da Tabela 1 mostram a evoluçãoda área plantada com abacaxi, coco, goiaba emaracujá, frutas que mais se destacaram naimplantação do pólo. Os dados referentes àmanga são apresentados para evidenciar queeste cultivo ainda é pouco disseminado, masque dá mostras de crescimento e deverá vir aocupar uma área bastante expressiva no pólo.

A área total plantada mostrou uma pequenatendência de crescimento durante o período quevai de 1990 até 1998, com variações de naturezacíclica de ano para ano. A partir de 1999 há umanítida tendência positiva: a taxa anual decrescimento é 24% entre 1998 e 2002, fato queculmina com a notável expansão de 45% entre2001 e 2002.

É importante observar ainda o seguinte:

•A expansão de área ocorreu tanto naregião norte quanto na região noroeste, aindaque o número de hectares plantados na regiãonoroeste seja pequeno (os dados não mostradosna tabela).

• Os produtos que obtiveram maiorestaxas médias anuais de crescimento, duranteesse período, foram o coco e o abacaxi, com30% e 27%, respectivamente.

• A taxa de crescimento da goiaba foitambém muito expressiva, 26% ao ano.

•O maracujá, que é uma culturatradicional na região, apresentou uma taxa decrescimento anual de 15%.

Tabela 1. Área plantada, em hectares, no norte e noroeste fluminense.

Fonte: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – e Pesquisa Agrícola Municipal – PAM.

Total

2.0021.8432.0592.3522.4002.2602.5332.3432.2612.3412.5583.6375.284

Maracujá

1.4241.3521.4911.4711.0351.3381.3321.002

810750960622

1.419

Manga

801515

---

384143393373

107

Goiaba

139

1322305263677678

127146193

Coco

61228407656

175345447535671882

1.263

Abacaxi

479455512819

1.259814925888885939767

1.9142.302

1990199119921993199419951996199719981999200020012002

Anos

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Para efeitos de comparação, ressalta-seque a área plantada com cana-de-açúcarpermaneceu praticamente constante entre 1998e 2002, em torno de 150 mil hectares, nas duasregiões, o que caracteriza o comportamentodiferenciado da produção de frutas.

Outro aspecto importante do desempenhoda cadeia produtiva foi a instalação de umagrande empresa de processamento de polpa demaracujá e abacaxi. Essa empresa, Bela JoanaSucos e Frutas Ltda., pertencente ao GrupoMPE, tem capacidade de esmagamento deaproximadamente 300 toneladas por dia eproduz, no momento, polpa de abacaxi emaracujá e compota de abacaxi. Observou-setambém a expansão e a modernização depequenas e médias empresas processadorasque já operavam na região, como é o caso daSão João da Barra Indústrias Alimentícias Ltda.,produtora do suco de maracujá Imbamara, e daSanta Paz Indústria e Comércio Ltda., produtorado suco de maracujá Niágara. Essas duasempresas, em conjunto, têm uma capacidadede processamento que é pouco inferior à BelaJoana, (Informe do Pólo de Fruticultura do nortee noroeste fluminense).

Um outro fato marcante da consolidaçãoe expansão desse pólo é o novo investimentodo Grupo MPE, em associação com o GrupoPortuguês Refrigor, em uma nova unidadeindustrial para a produção de sucos prontos parabeber (Informe do Pólo de Fruticultura do nortee noroeste fluminense). Essa unidade irá venderdiversos tipos de sucos de frutas tropicais etemperadas. Estes últimos serão produzidos apartir de polpas trazidas de outras regiões oumesmo de outros países.

Menciona-se, ainda, a envasadora deágua-de-coco Quissamã, pequena empresafundada em 2001, no município de mesmonome e que pertence à cooperativa local(Informe do Pólo de Fruticultura do norte enoroeste fluminense). Esse município é umgrande produtor de coco e abacaxi e temlocalização privilegiada para vender coco naregião dos lagos e na cidade do Rio de Janeiro.

O principal mercado para os frutosproduzidos na região são as indústrias locais,sendo a Bela Joana a maior delas. Essa empresavem realizando compras também nos estadosvizinhos, principalmente no Espírito Santo, peladificuldade de adquirir localmente volume defrutas suficiente para ocupar sua capacidade.Isso ocorre porque a produção local é relati-vamente pequena e também porque outrasempresas da região e da vizinhança competempor essas frutas.

As pequenas indústrias colocam suaprodução majoritariamente no mercadodoméstico. A Bela Joana exporta praticamentetoda a produção para a Europa, Austrália,Argentina e outros países. Paralelamente,iniciam-se as exportações de frutas frescas,sendo que o Município de Quissamã é pioneirona venda de coco e abacaxi para a Europa.

Os volumes de produção ainda sãopequenos para exportações, em grande escala.Nota-se entretanto preocupação de obter padrãode qualidade compatível com as exigênciasinternacionais. São dignos de nota os esforços paraimplantação da produção integrada de frutas. Osempresários locais, com apoio de diversasinstituições públicas e privadas, estão contratandoum projeto para a elaboração dos procedimentosnecessários para a certificação da produçãointegrada de abacaxi, procedimentos esses queposteriormente poderão ser usados em outrasregiões do Brasil.

Financiamentos e tecnologiaO principal programa de financiamento

para os produtores foi criado pelo governoestadual em 2000, e recebeu a denominaçãode Programa Moeda Verde/Frutificar. Suasprincipais características são:

•Recursos provenientes do orçamento doestado.

•Administração dos recursos pelo Bancodo Brasil, que faz análise de crédito dostomadores e o acompanhamento dos contratos.

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•A análise da viabilidade técnica eeconômica do projeto é feita por um grupocriado pelo governo do estado com essafinalidade.

•Limite superior dos empréstimos porCPF: R$ 150 mil até 2002 e R$ 60 mil a partir deentão.

•Nenhuma exigência de aporte derecursos próprios no projeto.

•Prazo total do financiamento de cincoanos, e prazo de carência determinado pelociclo da cultura.

•Taxa de juro, fixa de 2% ao ano.

•Os equipamentos financiados são aúnica garantia real exigida do tomador. Paraque se qualifique para o crédito o produtor temque mostrar o contrato de garantia de venda desua produção para uma empresa integradoracredenciada pelo governo.

•Nos contratos aceitos pelo governo háum preço mínimo fixado, e o compradorcredenciado se compromete a adquirir 100%da produção do produtor. Este, por sua vez, secompromete a vender 50% de sua produçãopara a empresa.

Até o final de 2002 foram aportados recursosda ordem de R$ 30 milhões (ver entrevista doSecretário de Agricultura, Abastecimento, Pescae Desenvolvimento do Interior, no Informe doPólo de Fruticultura do Norte/Noroeste do Riode Janeiro, Ano 3, No 5, julho de 2003) para oprograma. Em função do elevado subsídio dataxa de juro, o programa atraiu muitos mutuáriose foi um dos principais fatores subjacentes àexpansão recente da área plantada.

A descontinuidade administrativa, ocorridacom a mudança de governo em abril de 2002,aliada à restrição de recursos, enfrentada pelogoverno do estado, e o surgimento de problemasoperacionais diminuíram a velocidade doprograma em 2003.

Os problemas operacionais foramdeterminados principalmente pela falta desintonia entre os cronogramas técnico e político,

o que provocou a falta de mudas e atrasos naelaboração e entrega de projetos de irrigação.Posteriormente, verificou-se que alguns lotes demudas não tinham qualidade compatível comos níveis de produtividade esperados.

Esses são problemas difíceis de evitar, ea falta de sintonia entre cronograma técnico ecronograma político é fato comum em implanta-ção de projetos, com participação de governos.Uma vez detectadas as dificuldades, o governodo estado tem se esforçado para corrigi-las emanter o dinamismo que esse programa deu àimplantação do pólo de fruticultura.

Há também o Programa de Fruticultura parao norte e noroeste do Rio de Janeiro, criado em1999 pelo BNDES, que é usado, principalmente,mas não unicamente, pelo setor empresarial etem condições financeiras favorecidas emrelação a outras operações do banco: prazomáximo de 10 anos; taxa de juros de 1%acrescida da TJLP e mais spread quando aoperação é realizada por agente financeiro. ABela Joana Sucos e Frutas Ltda. e a nova unidadeindustrial resultante da associação entre osgrupos MPE e Refrigor usaram, para suaimplantação, recursos desse programa, viaoperações diretas com o BNDES. Algumasoperações de menor vulto foram realizadaspelos agentes financeiros e por pequenosprodutores, para implantar seus pomares.

As dificuldades iniciais relatadas acimamotivaram iniciativas por parte de outrosagentes. Um fato marcante foi a implantaçãodo viveiro de mudas certificadas pelaDelegacia Federal do Ministério da Agricultura,no Rio de Janeiro, na Fazenda Santo Antão,localizada no Município de Cambuci, com recur-sos do Prófruta. O viveiro já está produzindo evendendo. A escassez de muda deixa de serfator limitante da expansão como demonstra osucesso inicial dessa iniciativa do Ministério daAgricultura, Pecuária e Abastecimento.

Outros apoios tecnológicos para o projetoincluem a implantação de unidades deobservação pela Embrapa Transferência deTecnologia, apoio da Embrapa Agroindústria de

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Alimentos, para a implantação da envasadora deágua-de-coco Quissamã, com a atuação dosespecialistas locais e a presença crescente deconsultores de outras regiões do País, quetrazem sua experiência e conhecimento paradentro do pólo. Os especialistas locais são, emsua maioria, pertencentes aos quadros daempresa de pesquisa do governo do estado,Pesagro; da Emater–RJ; da UniversidadeEstadual do Norte Fluminense; da Fundação deDesenvolvimento do Norte Fluminense; e doSebrae-RJ. Os encontros bienais de fruticultura,promovidos pelo Sistema Firjan, têm sidoinstrumentais, uma vez que neles se fazempresentes agentes da cadeia produtiva ligadosaos processos pré e pós-colheita, comoprodutores de mudas, de fertilizantes, deequipamentos de irrigação, de embalagens, deprodutos da cadeia de frio e outros.

Um outro componente do apoio tecnológicoé o fato de que o grupo MPE, além da unidadeindustrial, produz frutas para alimentar a indústriae também para vender no mercado de frutasfrescas. Esses pomares, que utilizam a melhortecnologia disponível, servem como fonte dedemonstração para os produtores.

É necessário ressaltar-se que, nos próximosanos, deverão ser implantados os procedimentospara a Produção Integrada de Frutas,principalmente, para abacaxi e maracujá, pelosprodutores que estiverem interessados no mercadointernacional ou mesmo que venham a fornecerpara indústrias exportadoras de sucos e polpas.Para o abacaxi, o Rio de Janeiro está se candida-tando junto ao Ministério da Agricultura, Pecuáriae Abastecimento para elaborar os procedimentos,e para o maracujá, as empresas da região estãoem contato com a equipe que está elaborandotais procedimentos para uma cooperação.

MercadoA maior parte da produção de maracujá do

pólo destina-se a duas agroindústrias, a Bela Joanae a São João da Barra Indústrias Alimentícias Ltda.Há nitidamente competição entre esses compra-

dores, o que indica crescimento do mercado. Nãoobstante, os preços recebidos pelos produtores sãolimitados pelas margens dessas empresas que,ademais, não têm condição de influenciar ospreços de venda de seus produtos.

A situação do abacaxi é distinta porque omercado da fruta fresca é maior do que o domaracujá. A única processadora na região, a BelaJoana, encontra competição forte de um mercadoque paga preços mais altos.

A maior parte da produção de coco évendida no mercado de frutas frescas.A envasadora de água-de-coco Quissamãapresenta crescimento de suas vendas, porém, omercado para esse produto congelado ou resfriadoé pequeno, pois o produto resfriado tem poucadurabilidade e o produto congelado, com durabi-lidade um pouco maior, apresenta inconvenientespara os consumidores.

O mercado de goiaba é pequeno.Os produtores colocam sua produção na formatradicional, ou seja, uma parcela no mercado defrutas frescas e uma parcela para produtores dedoces da região e regiões vizinhas. Com osinvestimentos que vêm sendo feitos na melhoriados pomares, principalmente pela introdução deirrigação, a produtividade e a produção irãocrescer e a ampliação do mercado será neces-sária. A região tem um escritório da associaçãobrasileira dos produtores de goiaba, Goiabrás, eparticipa da promoção do Guatchup, novoproduto com potencial para ampliar substan-cialmente o mercado dessa fruta.

O calcanhar de aquiles da implantação deum pólo de fruticultura é o mercado. Os preçosde frutas frescas são sempre melhores do que ospagos pela indústria. Entretanto, grandescompradores, como supermercados e distribu-idores, exigem volume, regularidade de oferta,diversidade de produtos e qualidade. Poucos sãoos produtores que têm condições de atender atodos esses requisitos, indivi-dualmente. Alémdisso, os compradores normalmente são grandesempresas com poder de influenciar preços, tantona venda quanto na compra, o que deixa a maiorparte dos produtores em situação de inferioridadenas negociações.

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As agroindústrias, entretanto, operamcom margens mais baixas e não têm poder dedeterminar preços de venda, o que coloca umteto baixo para os preços pagos aos produtores.Não obstante, elas precisam da matéria primalocal, o que garante o mercado. Mesmo nessesegmento, os produtores que têm maioresvolumes de produto, regularidade de oferta epadrão de qualidade elevado são mais bemvindos do que os demais.

A principal empresa âncora do pólo defruticultura do norte e noroeste fluminense éuma agroindústria processadora de maracujá eabacaxi. Através da garantia de compra daprodução ela contribuiu de maneira decisivapara a expansão da área plantada na região.Não obstante, as relações entre os produtorese a indústria não fogem ao figurino do queacontece em outros lugares, havendo umacontínua tensão em relação a preços e outrasfacetas das relações comerciais. Mas éimportante ressaltar que se há problemas coma indústria, os problemas seriam muito maioressem ela.

A solução para esse conflito clássico entreprodutores e indústria não é fácil, como indicamas experiências das indústrias açucareira, desuco de laranja, de laticínios e outras. Umcaminho para reduzi-los é a diversificação declientes, principalmente, pela conquista domercado de frutas frescas. Mas, para tersucesso, os produtores precisam se organizarpara comercializar de maneira mais eficaz aprodução e atender às exigências dos principaiscompradores. Notar também que a exportaçãode frutas tem exigências pesadas de volume eregularidade, e as exigências de qualidade sãoainda maiores, como comprovam os esforçosdo Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento para a implantação da ProduçãoIntegrada de Frutas em todo o Brasil.

Conclusões e perspectivasA implantação da fruticultura irrigada nas

regiões norte e noroeste do Rio de Janeiro é uma

experiência até o momento bem sucedida,ainda que persistam problemas e dificuldadespara os produtores. As principais lições desseprocesso podem ser resumidas como se segue:

•A elaboração de estudos técnicos foi umfator fundamental para dar segurança tantopara as instituições promotoras do pólo comotambém para os empreendedores.

•A participação de instituições privadasfortes e de prestígio, como o Sistema Firjan, oSebrae e outras, conferiu credibilidade à iniciativae, principalmente, transmitiu para a maioria dospotenciais investidores uma mensagem decompromisso com a continuidade do projeto.

•A parceria entre os setores público eprivado acelerou o processo de implantação dopólo, principalmente, porque cada um dessesagentes tem formas e instrumentos de apoiodistintos e quando atuam em conjunto provocamum efeito final maior do que a soma das partes.

•É importante que em suas respectivasações as entidades envolvidas na promoção dopólo tenham consciência exata dos pontos fortese das limitações das demais, bem como dasdiferentes formas de recompensa esperadas porcada uma delas.

•O mercado é o principal desafio a servencido para a implantação de um projetodesse tipo, quando a tecnologia é relativamentebem conhecida.

•A agroindústria é decisiva para garantir acompra. A redução das tensões nessas relaçõescomerciais poderá beneficiar a todos, porém, asdificuldades são grandes e a experiência mostraque são duradouras. Mas, mesmo com relaçõescomerciais tensas, a agroindústria reduz riscos,garantindo a colocação da produção.

•A formação de associações, cooperativase outras formas de associativismo é decisiva paraa conquista do mercado de frutas frescas. Seuprincipal papel é profissionalizar a comercia-lização e garantir volume de produto, regularidadee diversidade de oferta, bem como a qualidadedo produto.

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•As restrições financeiras determinam, emgrande medida, a velocidade de implantação. NoRio de Janeiro, o início do processo se deu de formarelativamente rápida em vista do crédito barato,via programa Moeda Verde/Frutificar.

•A entrada no negócio somente deveráocorrer se a lucratividade é boa, independen-temente das condições de financiamento. Apesarde óbvio, esse fato tem que ser demonstrado paraos fruticultores potenciais para que sejamconvencidos a analisar se as condições de suasrespectivas propriedades são compatíveis com aimplantação de uma fruticultura, com níveltecnológico exigido para ser competitiva.

•O baixo nível educacional e os hábitosculturais tradicionais constituem-se num dosgrandes entraves para uma expansão maisrápida da fruticultura nas regiões norte enoroeste fluminense.

Uma avaliação dos impactos econômicose sociais do desempenho do pólo de fruticulturasomente poderá ser realizada com levantamentosde dados junto aos produtores. Os dados agregadosexistentes não permitem que desçamos a detalhesem relação aos efeitos sobre renda, sobre acriação de oportunidades de trabalho diretas eindiretas e outros indicadores convencionais.As informações qualitativas existentes, asinformações sobre expansão da área plantada,observações casuais e parâmetros já estabele-cidos em projetos semelhantes indicam queefetivamente essa experiência teve um bomcomeço. As condições objetivas de solo, clima,infra-estrutura, o crescimento previsto da demandapor frutas e a proximidade dos principais mercadosindicam que as perspectivas de longo prazotambém são boas. Mas a continuidade das açõesde fomento é importante para a plena realizaçãodo potencial. É preciso manter o foco nos pontos

que demandam maior atenção: baixa capacidadeadministrativa dos produtores, desconhecimentodo mercado e da tecnologia, baixo nível decapitalização e incapacidade para avaliar custosdo associativismo e os benefícios que ele podetrazer.

Em função dos resultados positivosalcançados na fruticultura, iniciativas para apoiaroutros segmentos da atividade agroindustrial estãosendo adotadas pelo Sistema Firjan, como é o casoda indústria de base florestal, da floricultura e dacana-de-açúcar. A escolha desses segmentos édeterminada fundamentalmente pelos recursosnaturais do estado, pelo potencial dos mercadosexterno e interno, pela capacidade para criarempregos e renda no interior, pelo aproveitamentoda excelente logística de exportação e do elevadonível de conhecimento tecnológico disponível nasuniversidades e centros de pesquisa aquilocalizados.

ReferênciasAGRAR. Oportunidades de Investimento em Flores e PlantasOrnamentais no Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro,2003.

Batista, Eliezer. Infra-Estrutura de Longo Alcance para oDesenvolvimento Sustentado. Firjan, Rio de Janeiro, 1998.

Bonelli, Régis. Impactos econômicos e sociais de longo prazoda expansão agropecuária no Brasil: revisão invisível e inclusãosocial. Anais do Seminário sobre os Impactos da MudançaTecnológica do Setor Agropecuário na Economia Brasileira.Embrapa, Brasília, maio de 2001.

Companhia de Promoção Agrícola (CAMPO). Estudo deViabilidade para um Pólo Agroindustrial para a Região NorteFluminense. Brasília, 1998.

Companhia de Promoção Agrícola (CAMPO). PóloAgroindustrial Associado à Fruticultura Irrigada na RegiãoNoroeste Fluminense. Brasília, 1999.

Fundação Getulio Vargas. Potencialidades Econômicas eCompetitividade. Sistema Firjan e Sebrae-RJ, Rio de Janeiro,1998.

Informe do Pólo de Fruticultura do Norte / Noroeste do Rio de

Janeiro, Firjan e Sebrae-RJ, Rio de Janeiro, 2001, 2002 e 2003.

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A Comissão de Agricultura, Pecuária,Abastecimento e Desenvolvimento Rural –CAPADR – discute os grandes problemas doagronegócio para entendê-los corretamente epropor soluções no âmbito do Congresso eviabilizá-los no executivo.

Na batalha por uma política agrícola quebeneficie o agronegócio, a comissão queraumentar a renda do homem do campo, comestabilidade, abastecer os mercados interno eexterno, a preços competitivos, e ampliar asexportações, com produtos de qualidade,produzidos com uma tecnologia amiga do meioambiente.

O debate é a principal arma para resolveressas questões. Deve ser um debate críticoindependente, cooperativo com o executivo, como fim de buscar soluções que atendam aosinteresses da sociedade, e também deve serousado e destemido, quando as circunstânciasindicarem que o agronegócio é preterido em favorde interesses menos nobres. E não poderia serdiferente, pois o setor gera 33% do PIB brasileiro,37% do emprego e 42% de todas as nossasexportações.

O agronegócio abriga a produção agrope-cuária, da mais tecnificada à mais tradicional, daagricultura familiar à de grande porte, a indústriaque produz insumos e processa alimentos, os

serviços e comércio afins. Tudo isso representaR$ 508 bilhões. O mais que suficiente para ter oagronegócio como a mais importante prioridadedas nossas políticas públicas. Ou seja, a prioridadenúmero 1. O seu desenvolvimento é fundamentalpara equacionar o problema da nossa dívidaexterna, dinamizar a indústria, gerar empregose contribuir para que os alimentos cheguem àmesa de todos os brasileiros.

Sem ser exaustivo, detenho-me em algunsdos desafios que estão às portas. Mas, poretapas. O foco deste texto é sobre as ações dogoverno que dizem respeito à ciência e àtecnologia.

1. Qualidade de alimento e proteçãocontra as pragas e doenças. Quem quisercrescer com estabilidade tem que ofertar, nosmercados interno e externo, alimentos deacordo com os padrões mundialmente aceitos.O país que não fizer isso, não terá condiçõesde ser um grande exportador. Igualmenteimportante é proteger a agricultura contra ainvasão de pragas e doenças provenientes deoutros países.

Estamos avançando. Sabemos fazer. Mas,o orçamento do governo federal, efetivamentedisponível, é ainda ridículo. Temos de descon-tigenciar o orçamento e aumentá-lo e, assim, darcondições ao Ministério da Agricultura Pecuária

1 (PP-GO). Presidente da Comissão de Agricultura da Câmara e ex-secretário de Agricultura de Goiás (1999-2001).

Desafios do agronegócioCapital e conhecimento Leonardo Vilela1

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e Abastecimento – Mapa – de prover serviçosde elevada competência em defesa vegetal eanimal.

2. A Embrapa está por trás das conquistasrecentes de nossa agricultura. Mas ela lutacontra um orçamento, efetivamente disponível,que não lhe permite renovar o quadro depessoal, investir em laboratórios e realizaradequadamente sua agenda de pesquisa. Ela émotivo de orgulho de todos os brasileiros e temnome respeitado no mundo inteiro. Mas estáamarrada quanto à execução do orçamento,captação de recursos e administração depessoal.

Ainda, o método de escolha de suadiretoria executiva abre espaço para ingerênciada má política. Esse método precisa serurgentemente mudado, e a comissão quepresido tem enorme responsabilidade. Proponhoà comissão que estude as alternativas que ospaíses de maior experiência com a democraciarepresentativa acumularam, para que possamosapresentar sua proposta de mudança, a qualdeve-se cristalizar numa lei.

3. Em 1948, a extensão rural estabeleceu-se no Brasil e paulatinamente substituiu o antigoserviço de fomento do Mapa. O modelo baseou-se em organizações estaduais, hoje asEmateres. Em 1956, foi estabelecida aAssociação Brasileira de Crédito e AssistênciaRural – Abcar – para coordenar o sistemaestadual e articulá-lo com o governo federal,visando, entre outras coisas, à captação egestão de recursos da União. Em 1974, a Abcarfoi extinta e surgiu, no seu lugar, a Embrater, do

governo federal, assemelhada à Embrapa,quanto à organização, mas com os mesmospropósitos da Abcar, qual seja o de financiar ecoordenar o sistema estadual das Emateres.

O governo Collor extinguiu a Embrater,em 1991. Com sua extinção, o governo federalperdeu a capacidade de coordenação daextensão rural, e os estados estão seguindorumos diferentes. Muitos deles fundiram asorganizações de extensão e pesquisa. OMinistério de Desenvolvimento e ReformaAgrária, hoje, recria a extensão rural, com opropósito de atender à agricultura familiar, masdesconectada das organizações estaduais.

Ora, o progresso de um agricultordepende de capital e conhecimento. Naagricultura familiar, o capital é crítico, e seprocura resolver o problema pelo crédito rural.Mas, a falta de conhecimento é fatal: é aprincipal razão do insucesso e da inadimplência.A agricultura comercial resolve o seu problemade conhecimento pela extensão particular, pelainternet e pela moderna comunicação.

Todos sabem, no entanto, que aagricultura familiar não tem meios para pagaresses custos. Reconhece-se que o modelo dopassado de extensão rural não atende aostempos atuais, mas os remendos em curso sãopiores ainda. Por isso, nós parlamentaresestamos atentos, discutindo e estudandoprofundamente o assunto.

Vamos aproveitar o espaço que nos foiaberto pela Revista de Política Agrícola do Mapapara debater os problemas do agronegócio.Demos, apenas, o primeiro passo.