retropecto dos marcos legais adotados pela … e biologicas... · wannmacher e ferreira, 2006)....

21
RETROPECTO DOS MARCOS LEGAIS ADOTADOS PELA ANVISA PARA O REGISTRO DE MEDICAMENTOS GENÉRICOS E SIMILARES Marcos Antonio Florentino de Oliveira Leite 1 Izabela Nunes Chinchilla 2 1 Químico. Aluno de Pós-Graduação de Vigilância Sanitária, pela Universidade Católica do Goiás/IFAR. 2 Farmacêutica. Especialista em Análise de Registro de Medicamentos pela Universidade Franciscana - UNIIFRA/RS. Resumo: A regulação de medicamentos no Brasil tem se revelado como uma das grandes preocupações das políticas de governo nas últimas décadas. Visando uma melhoria do acesso aos medicamentos de qualidade por parte da população menos favorecida, instituiu-se a Política Nacional de Medicamentos que culminou com a criação da ANVISA e a regulamentação dos medicamentos genéricos.Os esforços do governo na implantação da nova política apresentaram resultados significativos em relação ao aumento do consumo de medicamentos genéricos no Brasil comparado ao consumo em outros países onde a política do genérico fora implantada a mais tempo, apesar da resistência de alguns setores da sociedade que se sentiram prejudicados diante do estabelecimento da política dos genéricos. A implantação dos medicamentos genéricos trouxe novas regras e inovou nos procedimentos de registro atual de medicamentos no país. Requisitos como testes de equivalência farmacêutica e de bioequivalência passaram a ser exigidos para comprovar a segurança e eficácia de determinados medicamentos. Contudo, devido a estes fatores, já era esperado que os medicamentos similares também tivessem que passar por esses testes para se adequarem as novas exigências do mercado farmacêutico, pois já existiam antes da implementação das novas regras, fato que ocorreu com a publicação da RDC 134/03. Diante da importância que a regulação de medicamentos assume dentro do contexto sanitário brasileiro, o presente estudo leva em consideração estes fatores fazendo um retrospecto dos marcos legais que regulamentam a nova política para o registro de medicamentos genéricos e similares. Palavras-chave: medicamento genérico, medicamento similar, regulação de medicamentos, equivalência farmacêutica, bioequivalência, biodisponibilidade. Abstract: The regulation of medicines in Brazil has proved to be a major concern of government policies in recent decades. Aiming at improving access to quality medicines by the less favored population, instituted the National Drug Policy which culminated in the creation of ANVISA and the regulation of generic .The government efforts in the implementation of the new policy had significant results in relation to the increased consumption of generic drugs in Brazil compared to consumption in other countries where the policy was implemented to generic longer, despite resistance from some sectors of society who felt wronged before the establishment of the policy of generics. The implementation of generics brought innovated new rules and procedures current registration of medicines in the country. Requirements as pharmaceutical equivalence and bioequivalence now be required to prove the safety and efficacy of certain drugs. However, due to these factors, it was expected that similar drugs have to undergo adaptations to suit the changing demands of the pharmaceutical market as it existed prior to the implementation of the new rules, a fact that occurred with the publication of RDC 134/03 . Given the importance of the drug regulation assumes within the Brazilian health context, this study takes into account these factors retrospect legal frameworks governing the new policy for the registration of generic medicines and the like. Keywords: generic, similar drug, drug regulation, pharmaceutical equivalence, bioequivalence, bioavailability.

Upload: vocong

Post on 11-Nov-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

RETROPECTO DOS MARCOS LEGAIS ADOTADOS PELA ANVISA PARA O

REGISTRO DE MEDICAMENTOS GENÉRICOS E SIMILARES

Marcos Antonio Florentino de Oliveira Leite

1

Izabela Nunes Chinchilla2

1Químico. Aluno de Pós-Graduação de Vigilância Sanitária, pela Universidade Católica do Goiás/IFAR.

2Farmacêutica. Especialista em Análise de Registro de Medicamentos pela Universidade Franciscana -

UNIIFRA/RS.

Resumo: A regulação de medicamentos no Brasil tem se revelado como uma das grandes preocupações das

políticas de governo nas últimas décadas. Visando uma melhoria do acesso aos medicamentos de qualidade por

parte da população menos favorecida, instituiu-se a Política Nacional de Medicamentos que culminou com a

criação da ANVISA e a regulamentação dos medicamentos genéricos.Os esforços do governo na implantação da

nova política apresentaram resultados significativos em relação ao aumento do consumo de medicamentos

genéricos no Brasil comparado ao consumo em outros países onde a política do genérico fora implantada a

mais tempo, apesar da resistência de alguns setores da sociedade que se sentiram prejudicados diante do

estabelecimento da política dos genéricos. A implantação dos medicamentos genéricos trouxe novas regras e

inovou nos procedimentos de registro atual de medicamentos no país. Requisitos como testes de equivalência

farmacêutica e de bioequivalência passaram a ser exigidos para comprovar a segurança e eficácia de

determinados medicamentos. Contudo, devido a estes fatores, já era esperado que os medicamentos similares

também tivessem que passar por esses testes para se adequarem as novas exigências do mercado farmacêutico,

pois já existiam antes da implementação das novas regras, fato que ocorreu com a publicação da RDC 134/03.

Diante da importância que a regulação de medicamentos assume dentro do contexto sanitário brasileiro, o

presente estudo leva em consideração estes fatores fazendo um retrospecto dos marcos legais que regulamentam

a nova política para o registro de medicamentos genéricos e similares.

Palavras-chave: medicamento genérico, medicamento similar, regulação de medicamentos, equivalência

farmacêutica, bioequivalência, biodisponibilidade.

Abstract: The regulation of medicines in Brazil has proved to be a major concern of government policies in

recent decades. Aiming at improving access to quality medicines by the less favored population, instituted the

National Drug Policy which culminated in the creation of ANVISA and the regulation of generic .The

government efforts in the implementation of the new policy had significant results in relation to the increased

consumption of generic drugs in Brazil compared to consumption in other countries where the policy was

implemented to generic longer, despite resistance from some sectors of society who felt wronged before the

establishment of the policy of generics. The implementation of generics brought innovated new rules and

procedures current registration of medicines in the country. Requirements as pharmaceutical equivalence and

bioequivalence now be required to prove the safety and efficacy of certain drugs. However, due to these factors,

it was expected that similar drugs have to undergo adaptations to suit the changing demands of the

pharmaceutical market as it existed prior to the implementation of the new rules, a fact that occurred with the

publication of RDC 134/03 . Given the importance of the drug regulation assumes within the Brazilian health

context, this study takes into account these factors retrospect legal frameworks governing the new policy for the

registration of generic medicines and the like.

Keywords: generic, similar drug, drug regulation, pharmaceutical equivalence, bioequivalence, bioavailability.

1 INTRODUÇÃO

A partir de 1999, a regulação de medicamentos no país começou a sofrer

transformações significativas. Por meio da Lei 9.782/99, foi criado o Sistema Nacional de

Vigilância Sanitária (SNVS) e, no interior deste, foi configurada a Agência Nacional de

Vigilância Sanitária (ANVISA), que incorporou as competências da antiga Secretaria de

Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde e assumiu a coordenação de diferentes órgãos e

programas (KORNIS et al.,2008).

Diferentes setores da cadeia de produção da indústria farmacêutica passaram a ser

regulados. Novas classificações regulatórias de medicamentos foram surgindo e muitos

tópicos não abrangidos pela regulação de forma ampla e restrita, tais como: a propaganda de

medicamentos, os estudos de equivalência entre medicamentos, rotulagem, bula, terceirização

das etapas de produção passaram a ter um controle mais rígido das autoridades sanitárias do

país.

A ANVISA assumiu, ainda, o monitoramento de preços de medicamentos e de

produtos para a saúde; as atribuições relativas à regulamentação, controle e fiscalização da

produção de fumígenos; o suporte técnico na concessão de patentes pelo Instituto Nacional de

Propriedade Industrial (INPI) e o controle da propaganda de produtos sujeitos ao regime de

vigilância sanitária (KORNIS et al., 2008 p. 93). Tais atribuições foram regulamentadas pelo

Decreto 3.029/99.

Segundo KORNIS et al.(2008), a ANVISA permitiu avanços importantes no processo

de regulamentação sanitária dos medicamentos e demais insumos terapêuticos através de

dispositivos infralegais, que vêm sendo editados continuamente para fins de melhor regulação

sanitária dos medicamentos e, consequentemente, sua segurança e eficácia.

A ANVISA vem estabelecendo suas atividades através de Resoluções da Diretoria

Colegiada (RDCs). Dentre as mais importantes, podemos citar: a RDC 17/2010 que

regulamenta as Boas Práticas de Fabricação e Controle; RDC 25/2007 que fala sobre a

terceirização das etapas de produção; RDC 71/2009 que aborda sobre a rotulagem; RDC

4/2009 que abrange a farmacovigilância; RDC 47/2009 que estabelece parâmetros para bula;

RDC 134/2003 que estabelece uma adequação para medicamentos similares já registrados;

RDC 55/2005 que aborda o recolhimento de medicamentos; RDC 96/2008 que regula sobre

propaganda de medicamentos.

Atualmente, um dos temas mais importantes abordados pela ANVISA refere-se ao

registro de medicamentos. Um marco representativo foi a criação dos medicamentos

genéricos pela Lei 9.787/99. segundo RUMEL; CHINCHILLA e NEVES (2006):

(...) representou um redirecionamento político do Ministério da Saúde e da ANVISA

que teve como objetivo criar um novo padrão para a qualidade dos “medicamentos

cópia”, mais conhecidos como similares (os únicos existentes até então). (...)

Um outro fator fundamental a ser observado, segundo RUMEL; CHINCHILLA e

NEVES (2006) , foi que para entrar no mercado, os medicamentos genéricos precisam

comprovar sua equivalência com o medicamento eleito como de referência em termos de

eficácia e segurança , tanto com testes in vitro – laboratoriais de equivalência farmacêutica,

como de ensaios clínicos in vivo – de bioequivalência. Além disso, as empresas devem

possuir o Certificado de Boas Práticas de Fabricação e Controle para as linhas de produção ao

requererem os registros.

Porém, após a publicação da Lei dos genéricos, de acordo com RUMEL;

CHINCHILLA e NEVES (2006):

(...)continuaram a conviver no mercado brasileiro medicamentos similares (que não

realizaram teste de equivalência farmacêutica ou de bioequivalência) e os

medicamentos genéricos (que realizaram todos os testes para entrar no mercado).

Segundo RUMEL; CHINCHILLA E NEVES(2006), para regularizar tal situação, a

ANVISA aprovou a RDC 134/03, visando estabelecer um cronograma para que os

medicamentos similares já registrados se adequassem às novas medidas já estabelecidas pela

Lei dos genéricos. Esse cronograma foi gradualmente discutido com a sociedade, levando em

consideração o princípio constitucional da razoabilidade e da saúde como direito de todos e

dever do Estado. Este cronograma será melhor detalhado posteriormente.

Diante dos aspectos mencionados, o presente artigo procurará realizar um retrospecto

das principais medidas regulatórias tomadas pela ANVISA para normatizar o registro de

medicamentos genéricos e similares visando garantir os preceitos de qualidade, segurança e

eficácia.

2 METODOLOGIA

Trata-se de um estudo de caráter documental e retrospectivo de pesquisa bibliográfica,

utilizando como base de dados artigos pesquisados em sites como Scielo, Bireme, além de

livros de áreas como farmacologia e regulamentos relacionados à área de vigilância sanitária.

3 DISCUSSÃO

3.1 Definição de medicamento genérico

Segundo BUENO (2005), a denominação genérica diz respeito ao nome químico do

fármaco ou princípio farmacologicamente ativo. Que pode ser encontrada de duas formas:

Quando aprovada pela ANVISA, é designada pela Denominação Comum Brasileira (DCB),

quando recomendada pela Organização Mundial da Saúde, é designada pela Denominação

Comum Internacional (DCI).

Portanto, definimos medicamento genérico de acordo com a Lei 9.787/99 e a RDC

16/07 como:

medicamento similar a um produto de referência ou inovador, que se pretende ser

com este intercambiável, geralmente produzido após a expiração ou renúncia da

proteção patentária ou de outros direitos de exclusividade, comprovada a sua

eficácia, segurança e qualidade, e designado pela DCB ou, na sua ausência, pela

DCI.

Cabe destacar que medicamento de referência ou inovador é aquele cuja eficácia,

segurança e qualidade tenham sido comprovadas junto a ANVISA através de registro e

comercializado no mercado nacional composto de um fármaco ativo ou mais, sendo este

fármaco objeto de patente ou patente já extinta, por parte da empresa responsável por seu

desenvolvimento e introdução no mercado do país de origem, ou sendo o primeiro

medicamento a descrever um novo mecanismo de ação (RDC 16/07).

3.2 Intercambialidade

A intercambialidade diz respeito à escolha de um medicamento entre dois ou mais

fármacos para os mesmos fins terapêuticos. Atualmente, os fármacos de uso oral e sob

prescrição médica necessitam comprovar sua equivalência terapêutica através de

demonstração de bioequivalência por testes in vivo de biodisponibilidade relativa perante a

ANVISA. Já para aqueles de uso não oral e oral de venda sem prescrição, a equivalência

terapêutica é demonstrada apenas por testes in vitro de equivalência farmacêutica. Após esta

aprovação, os produtos são considerados genéricos intercambiáveis no balcão da farmácia,

contudo, pode esta intercambialidade ser restringida expressamente pelo prescritor se o

mesmo requisitar a não substituição (RUMEL et al., 2006).

Em países que já possuem a política do genérico há bastante tempo, existe uma

garantia de que o genérico é intercambiável com o medicamento inovador por apresentar:

qualidade comprovada (Boas Práticas de Fabricação – BPF) e equivalência terapêutica ao

inovador. Visto que o medicamento inovador, no período de seu desenvolvimento, passa por

testes que avaliam a sua biodisponibilidade e a relação entre essa propriedade e a eficácia e a

segurança do produto (STORPIRTIS et al., 2008).

3.3 Equivalência Farmacêutica, Bioequivalência e a Biodisponibilidade Relativa

Os produtos farmacológicos são considerados equivalentes farmacêuticos se tiverem

os mesmos ingredientes ativos e forem idênticos em potência ou concentração, apresentação e

via de administração. E dois fármacos equivalentes são considerados bioequivalentes quando

as taxas e amplitude da biodisponibilidade do ingrediente ativo em dois produtos não forem

significativamente diferentes sob condições experimentais adequadas (GOODMAN E

GILMAN, 2010). Já a biodisponibilidade relativa refere-se ao quociente da quantidade e

velocidade de princípio ativo que chega à circulação sistêmica a partir da administração

extravascular de um preparado e a quantidade e velocidade de princípio ativo que chega à

circulação sistêmica a partir da administração extravascular de um produto de referência que

contenha o mesmo princípio ativo (RDC 17/07). Esse parâmetro é avaliado, tecnicamente,

por meio de curvas de concentração do fármaco relacionadas ao tempo e obtidas em tecidos

ou líquidos orgânicos. Geralmente, os estudos de biodisponibilidade são realizados com

fármacos nas formas sólidas administradas por via oral, contudo, podem ser estendidos a

outras formas farmacêuticas e vias de administração (FUCHS; WANNMACHER E

FERREIRA, 2006).

Existem inúmeros aspectos que influenciam a biodisponibilidade de um mesmo

princípio ativo. Estes podem englobar diversos fatores: como os ingredientes

farmacocinéticos empregados, processos industriais usados na manufatura, controle de

qualidade, procedimentos de embalagem e estocagem, entre outros (FUCHS;

WANNMACHER E FERREIRA, 2006).

Antigamente, as apresentações do mesmo fármaco fornecido por diferentes fabricantes

e até mesmo, lotes diferentes de um mesmo fabricante diferiam quanto à biodisponibilidade.

Essas discrepâncias eram observadas principalmente entre as preparações orais dos fármacos

pouco solúveis e lentamente absorvidos. Algumas preparações genéricas não conseguiam

reproduzir processos para microdimensionar os fármacos para a absorção inicial: isto ocorria

pelas diferenças na conformação dos cristais, no diâmetro das partículas ou em outras

características físicas dos fármacos, que não eram controladas com rigor na formulação e

produção, afetando a desintegração da preparação e a dissolução dos fármacos, alterando a

taxa e a amplitude de absorção do princípio ativo (GOODMAN E GILMAN, 2010).

Outro aspecto a se considerar é que a biodisponibilidade torna-se decrescente

conforme os preparados se apresentem em forma de solução, emulsão, suspensão, capsula,

comprimido e drágea1 (FUCHS; WANNMACHER E FERREIRA, 2006).

3.4 Pequeno histórico do processo de implementação da Política de Genéricos no Brasil

Segundo STORPIRTIS et al.(2008), a implementação dos genéricos no país passou

por marcos importantes:

Desde 1980 existia a obrigatoriedade de utilização da denominação genérica do

fármaco nas embalagens dos medicamentos de acordo com a DCB além do nome

fantasia ou da marca registrada;

Em 1993, começaram as discussões técnicas sobre os conceitos envolvidos na política

de genéricos com o decreto nº 793/93, que estabelecia obrigatoriedade do uso da DCB

na embalagem dos medicamentos utilizando letras com o tamanho 3 vezes superior às

usadas para o nome comercial. Contudo, ainda não se exigia a comprovação de

equivalência terapêutica para que o produto fosse considerado intercambiável;

Em 14 de maio de 1996, criou-se um ambiente favorável para o desenvolvimento de

uma política de regulação baseada em critérios técnicos e científicos reconhecidos

1 Forma farmacêutica cujo princípio ativo fica envolvido por um revestimento de açúcar e corante.

internacionalmente para medicamentos genéricos através da Lei nº 9.279/96, que

trouxe a regulação de direitos e obrigações relativos à propriedade industrial no país;

Já em 1998, foram estabelecidas as diretrizes e prioridades pela Política Nacional de

Medicamentos, incluindo entre elas a adoção dos genéricos no Brasil;

Com a Lei 9.787 de 10 fevereiro de 1999 , alterou-se a lei 6.360/76 e foi instituído o

medicamento genérico, estabelecendo um prazo de 90 dias para que a ANVISA

regulamentasse os critérios técnicos para o seu registro. Então, a agência criou um

corpo técnico de especialistas brasileiros nas áreas de Farmacotécnica, Controle de

Qualidade e Farmacologia, com o objetivo de elaborar a regulamentação técnica para

o registro de medicamentos genéricos.

3.5 A Política Nacional de Medicamentos

A partir da Constituição Federal de 1988, a saúde passou a ser um direito do cidadão e

um dever do Estado, devendo este garantir à população, através de políticas sociais e

econômicas, o acesso universal e equitativo das ações e serviços de saúde. Outro fato de

relevância foi a criação da Lei Orgânica da Saúde 8.080/90, que lança as bases do SUS

estabelecendo as ações e os serviços de saúde quanto à direção e gestão, contribuições e

atribuições de cada esfera de governo, assegurando a assistência terapêutica integral, dentre

elas, a Assistência Farmacêutica. A partir desse momento viu-se a necessidade de uma

Assistência Farmacêutica que enfatizasse a saúde pública, baseada nos princípios e diretrizes

do SUS (PORTELA et al.,2010).

Diante desse contexto, surge a Política Nacional de Medicamentos (PNM), aprovada

pela Comissão Intergestores do Conselho Nacional de Saúde e instituída pela Portaria

3.916/98. A PNM é considerada segundo OLIVEIRA et al.(2006) como:

(...) o primeiro posicionamento formal e abrangente do governo brasileiro sobre

a questão dos medicamentos no contexto da reforma sanitária. Formulada com base

nas diretrizes da Organização Mundial da Saúde, a PNM expressa as principais

diretrizes para o setor com o propósito de garantir a necessária segurança, eficácia e

qualidade desses produtos, a promoção do uso racional e o acesso da população

àqueles considerados essenciais (...).

A PNM se propôs a priorizar o acesso universal aos medicamentos considerados

essenciais, principalmente àqueles orientados para o atendimento de agravos à saúde da

população. Essa política fundamentou-se na descentralização da gestão e também na

excelência do gerenciamento da assistência farmacêutica e avançou na definição dos recursos

financeiros e na proposição de infraestrutura nas três esferas de governo (KORNIS et

al.,2008).

Dentre as suas diretrizes podemos destacar segundo PORTELA et al.(2010):

Adoção da Relação Nacional de Medicamentos (RENAME) – meio fundamental para

orientar a padronização, quer da prescrição, quer do abastecimento de medicamentos,

principalmente no Âmbito do SUS, constituindo assim, um mecanismo para a redução

dos custos dos produtos;

Regulamentação sanitária de medicamentos: enfatiza, especialmente pelo gestor

federal, as questões relativas ao registro de medicamentos e à autorização para

funcionamento das empresas e estabelecimentos, bem como as restrições e

eliminações de produtos que venham a revelarem-se inadequados ao uso, na

conformidade das informações decorrentes da farmacovigilância;

Promoção da Produção de medicamentos: esforços são concentrados no sentido de que

seja estabelecida uma efetiva articulação das atividades de produção de medicamentos

da RENAME, a cargo dos diferentes segmentos industriais (oficial privado nacional e

transnacional);

Garantia da segurança, eficácia e qualidade de medicamentos: fundamentando-se no

cumprimento da regulamentação sanitária, destacando-se as atividades de inspeção e

fiscalização, com as quais é feita a verificação regular e sistemática.

A criação da ANVISA ,em 1999, se caracteriza como um dos marcos mais

importantes estabelecidos por estas ações da PNM. No que diz respeito à diretriz da

regulamentação sanitária de medicamentos, a ANVISA tornou-se o ente responsável pela

fiscalização do controle de qualidade na fabricação dos mesmos (OLIVEIRA et al.,2006).

Outro fator derivado da PNM, não menos importante, foi a regulamentação da Lei dos

Genéricos, seguindo a diretriz da garantia do acesso da população aos medicamentos

essenciais por um preço reduzido e ao mesmo tempo com suas necessárias segurança e

eficácia, aliado ao princípio da intercambialidade com o medicamento de referência.

3.6 Implantação da política dos genéricos no Brasil

Segundo ARAÚJO et al.(2010), as denominações genéricas tiveram um papel

importante como um dos mecanismos de regulação de preços de medicamentos no Brasil. No

início da década de 90, o uso destas denominações levou a adoção dos medicamentos

genéricos como política econômica e de saúde do governo. O uso da DCB tornou-se

obrigatório para todos os medicamentos e no caso de produtos e insumos farmacêuticos

importados, também tornou-se obrigatório o uso da Nomenclatura Comum do Mercosul

(NCM). Contudo, esta política ganhou efetividade somente em 1999 com a lei dos genéricos.

A partir do final da década de 90, de acordo com KORNIS et al.(2008), foi instituída a

Política Nacional de Medicamentos (PNM) através da Portaria 3.916/9, que tinha como

propósito “garantir a necessidade de segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, a

promoção do seu uso racional e o acesso da população àqueles considerados essenciais”.

Outro aspecto importante a destacar, de acordo com ARAÚJO (et al. 2010), é que esta

política surge dentro de um contexto histórico de falsificação de medicamentos no mercado

nacional, no período de 1998 e 1999. Portanto, nesse momento, existia um apelo muito forte

pela segurança e qualidade de produtos relacionados à saúde por parte da sociedade.

Em sua grande maioria, os genéricos são mais baratos que os medicamentos

inovadores pelo fato de não possuírem custos com o desenvolvimento de moléculas novas e

estudos clínicos necessários (DIAS, 2006).

Devido a este fator, a implantação dos genéricos enfrentou resistência em três níveis

bem definidos do mercado farmacêutico: tanto por parte das indústrias, dos prescritores como

também do comércio nas farmácias.

Durante a implantação dos genéricos, segundo DIAS (2006), a indústria farmacêutica

incentivava os médicos a não substituírem medicamentos de marca por genéricos. Diante

deste fato, a ANVISA editou a Resolução 391/99, que exigia do médico que escrevesse a

próprio punho qualquer restrição de substituição do medicamento prescrito.

Essa resistência não foi observada apenas na indústria, mas também entre os

prescritores. Pois de acordo com DIAS (2006), em uma pequena pesquisa realizada pela

ANVISA na época da implantação dos genéricos, verificou-se que 80% das receitas avaliadas

eram de medicamentos de marca, apesar de 78% dos médicos apresentarem uma avaliação

positiva em relação à qualidade dos genéricos. O resultado revela a importância de ações de

incentivo à prescrição dos genéricos na formação dos futuros médicos, tendo em vista que em

71% dos casos examinados, os consumidores seguiram a orientação prescrita pelo

profissional.

Já no comércio farmacêutico, os genéricos enfrentaram resistência pelo fato de não

gerarem uma margem de lucro expressiva em relação aos medicamentos de marca. Para

recompor esse lucro, as grandes redes de farmácias poderiam compensar com a venda paralela

de produtos de beleza e de higiene. Contudo, pequenas drogarias não teriam condições para

investir em outros produtos. Além disso, havia especulações de que as farmácias e os

fabricantes não estavam preparados para atender a demanda inicial da população por

medicamentos genéricos, como posteriormente veio a se verificar (DIAS, 2006).

Diante dessa resistência por parte das farmácias e drogarias, e tentando regular a oferta

de genéricos, o governo publicou a Resolução 45, em 15 de maio de 2000, que tornava

obrigatória a fixação de uma lista medicamentos genéricos registrados na ANVISA em

farmácias e drogarias. A resolução estipulava um prazo de 30 dias para que os

estabelecimentos cumprissem a medida. Esta resolução foi revogada expressamente pela

Resolução 99, de 22 de novembro de 2000, que obrigava os estabelecimentos a manter uma

lista atualizada, disponibilizada mensalmente pela ANVISA no décimo quinto dia útil do mês,

ou no primeiro dia útil subsequente (DIAS, 2006).

Contudo, esta medida não apresentou o efeito esperado e verificou-se a necessidade de

acompanhar o que era produzido, importado e comercializado para conhecer o problema de

forma mais precisa e tomar medidas mais efetivas. Desta forma, as importadoras e produtoras

de genéricos passaram a ser obrigadas a entregarem os seus balanços mensais de vendas

segundo a Resolução n. 78, de 21 de agosto de 2000 publicada pela ANVISA. Após avaliação

da Agência, constatou-se que havia um descompasso entre a produção e a demanda por

genéricos (DIAS, 2006).

Diante do fato, como forma de abastecer o mercado, o governo lançou uma sequência

de decretos que flexibilizavam as regras de registro em relação aos testes de equivalência

farmacêutica e de bioequivalência para genéricos importados que já fossem registrados no

Canadá, Europa e nos EUA. O primeiro a ser lançado foi o Decreto 3.675/00, que gerou

protestos por parte da indústria nacional que se sentiu prejudicada, visto que a nova medida

permitia que os testes poderiam ser apresentados em até um ano após a concessão do registro

para os laboratórios estrangeiros, na medida que o processo era mais rígido para os

laboratórios nacionais (DIAS, 2006).

Posteriormente, mais decretos foram editados com o propósito de corrigir as distorções

geradas anteriormente, de forma que a medida apresentasse resultados mais expressivos

chegando ao Decreto 3.841/01, que definia o estudo de biequivalência de produtos importados

com o mesmo tratamento daqueles que entrassem por meio do regime normal (DIAS 2006).

Mais decretos de registro especial2 foram editados, sendo o último, o Decreto 4.204 de

24 de abril de 2002 que restringia a concessão somente para genéricos inéditos.

Fazendo uma análise geral, o registro especial de medicamentos genéricos contribuiu

para o aumento da oferta de genéricos no país, dado que os registros aumentaram de forma

significativa entre 2001 e 2002. Apesar da política de governo apresentar falhas iniciais, o

incremento do registro especial serviu como um ajuste para a estabilidade da política de

genéricos no Brasil (DIAS, 2006).

3.7 Regulamentos técnicos editados

Um marco fundamental na implantação dos genéricos no País foi a lei 9.787/99 que

estabeleceu as bases legais dos medicamentos genéricos visando garantir os princípios da

segurança, eficácia, qualidade e a intercambialidade. Portanto, a partir desse momento,

passaram a ser adotados regulamentos técnicos na forma de resoluções que representaram um

importante passo na regulamentação dos medicamentos genéricos no Brasil (ARAÚJO et

al.,2010).

O primeiro regulamento técnico adotado para medicamentos genéricos pela ANVISA

foi a RDC 391/99 que apresentava critérios, condições para registro e controle de qualidade

desses medicamentos, provas de biodisponibilidades de medicamentos em geral, provas de

bioequivalência de medicamentos genéricos, entre outros critérios. A RDC 391 foi revogada

pela RDC 10/01. Ela manteve o mesmo formato da RDC 391, mas suprimiu o conceito de

alternativa farmacêutica e inseriu o de equivalência terapêutica. Também foram adicionados

diversos itens como: critérios para registro e controle de qualidade dos genéricos; registro de

importados; autorização para redução de lotes para medicamentos de alto valor agregado,

entre outros. A RDC 10 foi revogada pela RDC 84 de 19 de março de 2002, que determinou

medidas de pré e pós-registro e os critérios para prescrição e dispensação medicamentos

genéricos (ARAÚJO et al.,2010).

A RDC 84 foi revogada pela RDC 135 de 29 maio de 2003, que seguiu o mesmo

formato da RDC anterior contendo mais detalhes tais como: a apresentação da estabilidade

2 Nome dado à medida mais facilitada para registro de genéricos importados.

das formulações de maior e menor concentração de ativos (apresentação das estabilidades dos

extremos), estudos de estabilidade de longa duração para medicamentos cujo o prazo de

validade excede 24 meses, entre outros.

A RDC 16 de 2 de março de 2007 revogou a RDC 135, e uma das suas novidades foi

a permissão para que contraceptivos orais e hormônios endógenos de uso oral fossem

registrados como genéricos. Além de mudanças na documentação para o registro de

medicamentos genéricos segundo ARAÚJO et al.(2010).

3.8 Resultados da implantação da política genéricos no Brasil

A política de regulamentação dos genéricos no Brasil trouxe grandes avanços para a

área de registro de medicamentos. Algumas exigências que até então eram desconsideradas,

foram incorporadas no processo de registro como a validação da metodologia analítica não

farmacopeica. Além disso, foram inseridos conceitos novos como o de equivalência

farmacêutica e de biodisponibilidade. E ainda, a política dos genéricos, bem como sua

regulamentação, levaram a revisão dos procedimentos para o registro das demais categorias

regulatórias de medicamentos (DIAS, 2006).

Outro aspecto importante foi que a política dos genéricos alterou o perfil de consumo

de medicamentos no Brasil. Segundo o IMS Health (empresa dedicada ao acompanhamento

do mercado farmacêutico global), entre dezembro de 2000 e novembro de 2002, ocorreu uma

grande evolução na participação dos genéricos no mercado brasileiro, reduzindo o consumo

de medicamentos de referência e diminuindo consideravelmente a venda de medicamentos

similares (DIAS, 2006).

As sucessivas correções nas medidas tomadas pelo governo contribuíram

fundamentalmente para a implantação dos genéricos no Brasil: em poucos anos após a criação

da lei dos genéricos , o patamar de vendas de genéricos atingiu níveis que em outros países

demoraram décadas para alcançar. Enquanto o genérico cobria 9,9% das vendas no mercado

do Brasil, em países como a França (2%), Itália (1%), Espanha (1%), Portugal (1%), esses

níveis se apresentavam bem menores, países onde os genéricos foram implantados há muitos

anos (DIAS, 2006).

3.9 Similares: aspectos gerais

Durante o processo de regulamentação de medicamentos no Brasil, os similares

assumem uma característica particular de passarem por um processo de adequação próprio

para essa categoria de medicamento.

Essa denominação surgiu pela primeira vez no país com a Lei nº 6.360/76 que

assegurava o registro de similaridade a outros medicamentos já registrados, atendendo as

normas estabelecidas na mesma lei. Contudo, a definição de medicamento similar surgiu pela

primeira vez com a Resolução Normativa nº 4, de 20 de setembro de 1978, da Câmara

Técnica de Medicamentos do Conselho Nacional de Saúde, como sendo aquele que contenha

a mesma substância terapeuticamente ativa como base de sua fórmula e que possua indicações

e posologia semelhantes a medicamento anteriormente registrado no país (STORPIRTIS et

al., 2008).

Com a criação da Lei 9.787/99, que dispõe sobre o medicamento genérico, algumas

definições da Lei 6.360/76 foram alteradas, inclusive a de medicamento similar.

Com a implantação do medicamento genérico no Brasil, a regras para o registro de

medicamentos similares passaram a ser questionadas. Pois, não poderiam conviver mais no

mercado medicamentos (genéricos) que passavam por testes de segurança e qualidade como

de equivalência farmacêutica e de bioequivalência com medicamentos similares que não

realizavam nenhum destes testes citados (RUMEL; CHINCHILLA E NEVES, 2006).

Com o objetivo de adequar os similares às novas diretrizes do mercado de

medicamentos no país, foram lançadas resoluções pela ANVISA que estabeleciam os novos

critérios para o registro de medicamentos similares.

3.10 Processo de regulamentação técnica de medicamentos similares

A publicação de uma regulamentação técnica para os genéricos impulsionou a criação

de um regulamento que também exigisse a comprovação de equivalência farmacêutica com o

medicamento de referência indicado pela ANVISA para medicamentos similares, tanto para

aqueles com novas solicitações de registro como para aqueles já registrados (STORPIRTIS et

al., 2008).

A regulamentação técnica para registro e adequação dos medicamentos similares

foram discutidas amplamente com a sociedade através de audiências públicas envolvendo os

diversos setores e entidades de classes. Durante o processo, foram realizadas duas consultas

públicas que culminaram na RDC 133/03, que definia o regulamento técnico para

medicamentos similares. Segundo STORPIRTIS et al. (2008), os principais aspectos

abordados nesta resolução foram entre outros:

Indicação do medicamento referência pela ANVISA;

Obrigatoriedade da notificação da produção do lote piloto;

Estudo de estabilidade acelerada e de longa duração;

Equivalência farmacêutica para todos os medicamentos similares e biodisponibilidade

relativa para medicamentos de prescrição médica;

Relatórios completos de produção e controle de qualidade;

Certificado de Boas Práticas de Fabricação e Controle pela ANVISA;

Obrigatoriedade de realização de Controle de Qualidade no Brasil pelo importador

(medicamentos importados).

Na atualidade, a RDC 133/03 foi revogada pela RDC 17/07 que define medicamento

similar como:

aquele que contém o mesmo ou os mesmos princípios ativos, apresenta a mesma

concentração, forma farmacêutica, via de administração, posologia e indicação

terapêutica, e que é equivalente ao medicamento registrado no órgão federal

responsável pela vigilância sanitária, podendo diferir somente em características

relativas ao tamanho e forma do produto, prazo de validade, embalagem, rotulagem,

excipientes e veículo, devendo sempre ser identificado por nome comercial ou

marca.

A RDC 17/07 apresentou algumas alterações em relação à RDC 133/03, acrescentando

mais dois itens à composição do regulamento relativos: à Renovação de registro de

medicamento similar e aos Medicamentos que não serão aceitos como similares. Também

acrescentou as condições para registro de contraceptivos, hormônios endógenos e

imunossupressores nas formas farmacêuticas não isentas de estudo de Biodisponibilidade

Relativa, além de outros aspectos.

Para regularizar a situação dos medicamentos similares que já estavam no mercado, a

ANVISA aprovou a RDC 134/03. Esta resolução estabeleceu um cronograma com prazos

para que os similares comprovassem sua equivalência in vitro (equivalência farmacêutica) e

in vivo (bioequivalência) se adequando às novas regras exigidas para a entrada de

medicamentos no mercado farmacêutico brasileiro.

Estabeleceu-se um prazo de um ano e meio após a publicação da norma (1º de

dezembro de 2004) para que os detentores de registro de medicamentos similares de margem

terapêutica estreita3 apresentassem os testes de biodisponibilidade relativa (RUMEL;

CHINCHILLA E NEVES, 2006). Isto está expresso no artigo 9º da RDC 134:

Art. 9° No prazo de até 1 (um) ano e meio após a publicação desta Resolução, os

detentores de registro de medicamentos similares contendo os princípios ativos

listados abaixo, isolados ou em associações e ainda nas formas de todos os seus sais

e isômeros, devem apresentar os resultados de estudos de biodisponibilidade relativa

no formato proposto (...)

Cabe ressaltar que o termo biodisponibilidade relativa no registro de similares está

sendo utilizado como sinônimo de bioequivalência, contudo, de forma legal, os medicamentos

similares não são intercambiáveis com seus respectivos medicamentos de referência.

Outro aspecto significativo foi que a partir de dezembro de 2004 até dezembro de

2009, todos os medicamentos similares deveriam apresentar os testes de equivalência

farmacêutica na primeira renovação após a publicação da RDC 134/03. Já os medicamentos

considerados como antibióticos, antineoplásicos e antirretrovirais também deveriam

comprovar a biodisponibilidade relativa além da equivalência farmacêutica na primeira

renovação após a publicação da RDC 134/03. Essa exigência se justifica pelo sério risco

sanitário que esses medicamentos podem representar caso não tenham a segurança e a eficácia

esperada. E a partir de dezembro de 2009 até 2014, as demais classes terapêuticas de

medicamentos similares (na segunda renovação após a publicação da RDC134/03) devem

comprovar a sua equivalência in vivo, considerando que estão dispensados de apresentarem

esses tipos de provas os medicamentos em solução, injetáveis, tópicos e os de venda isentos

de prescrição (RUMEL; CHINCHILLA E NEVES, 2006). Posteriormente, apresentamos uma

tabela descrevendo esses períodos de forma mais detalhada.

Portanto, ao final de dez anos, contados a partir de 2004 até 2014, a adequação dos

medicamentos similares estará completa. E a única diferença entre um medicamento genérico

de um medicamento similar será a presença de um nome comercial para os similares,

observando que os genéricos só poderão utilizar a denominação comum brasileira (DCB) ou

na ausência desta, a DCI (Denominação Comum Internacional) como identificação. Outro

aspecto importante seria o respaldo legal dado pela legislação brasileira aos genéricos em

relação à intercambialidade. Uma vez que apenas os medicamentos genéricos podem ser

intercambiados pelo agente de dispensação do medicamento nas drogarias ou farmácias,

3 Aqueles cujo efeito tóxico e o terapêutico em uma dose são muito próximos.

podendo o prescritor restringir a intercambialidade de forma expressa na receita não

autorizando a prática (RUMEL; CHINCHILLA E NEVES, 2006).

A tabela 1 apresenta, de forma mais detalhada, o cronograma de adequação dos

medicamentos similares segundo a RDC 134/03.

Período Medida estipulada pelo

período

Junho/2003- Publicação da RDC 134/2003

1 ano e meio após (1º dez de

2004):

Biodisponibilidade relativa

comprovada por similares de

margem estreita.

Dezembro de 2004 – Dezembro de 2009 (5 anos)

Todos os similares:

Equivalência farmacêutica;

Antibióticos, Anti-retrovirais e

Antineoplásicos:

Equivalência farmacêutica e

bioequivalência.

Dezembro de 2009 – Dezembro de 2014 (5 anos)

Todos os similares:

Equivalência farmacêutica e

Bioequivalência.

Fonte: Rumel; Chinchilla e Neves, 2006.

3.11 Diferenças entre genéricos e similares

Em relação à sua criação, os genéricos e similares possuem diferenças quanto à suas

origens. Os genéricos surgiram com uma definição legal mais estruturada, apresentando um

regulamento técnico desde a sua criação, o que a primeira vista, demonstra uma maior

credibilidade perante a sociedade. Sem contar que para ganharem o mercado nacional,

precisam passar por testes de qualidade, eficácia e segurança exigidos pela legislação desde a

sua origem.

Já os similares apresentam um processo de regulamentação um pouco mais complexo,

pois já existiam antes das novas regras serem editadas para registro de medicamentos.

Adquirem um nome fantasia e uma marca além da DCB.

Até 2014, os similares devem apresentar tanto os testes de equivalência farmacêutica

quanto os testes de biodisponibilidade relativa. Contudo, os genéricos deviam apresentar estes

testes desde a sua criação, ressaltando que a biodisponibilidade constitui-se como um

requisito da bioequivalência e que são considerados sinônimos pela legislação brasileira para

efeitos de adaptação. Depois desta data, genéricos e similares se diferenciarão apenas pela

intercambialidade e pelo nome fantasia utilizado pelos similares.

4 CONCLUSÕES

A criação da ANVISA e o estabelecimento de uma lei que institui o medicamento

genérico representaram um novo marco para a política sanitária do País, seguindo as diretrizes

da Política Nacional de Medicamentos.

O processo de implantação dos medicamentos genéricos trouxe grandes avanços do

ponto de vista sanitário, apesar das dificuldades inicias enfrentadas pelo governo brasileiro

para efetivar esta política frente a setores fortes como o da indústria farmacêutica e das

drogarias. Além disso, o genérico também enfrentou resistência para sua utilização por parte

dos prescritores. A resistência quanto à prescrição do genérico vai além de sua aceitação no

mercado e implica na mudança cultural do nosso País. Cabe ressaltar que os genéricos

possuem uma maior credibilidade, por parte da sociedade, no que diga respeito aos testes

demonstrados no ato do registro quanto a sua segurança e eficácia quando comparado aos

similares.

Os esforços do governo apresentaram resultados significativos em relação ao aumento

do consumo de genéricos, alcançando níveis de países onde o genérico foi implantado há mais

tempo.

A adequação dos similares já registrados quanto a apresentação de estudos in vitro e in

vivo era uma consequência esperada e de fato ocorreu com a publicação da RDC 134/03 que

passou a exigir testes de equivalência farmacêutica e de biodisponibilidade como requisitos

para a renovação do registro de medicamentos similares. Concomitantemente a isto, os

requisitos de registro também foram redesenhados e as comprovações da equivalência

farmacêutica e da bioequivalência passaram a partir de 2003 a serem exigidas no ato do

registro de um similar.

A regulação de medicamentos assume, portanto, um papel de destaque dentro contexto

sanitário brasileiro e das políticas atuais de saúde pública. Sendo uma das prioridades de ação

da ANVISA, contínuas normas referentes ao setor vêm sendo editadas, sejam para estabelecer

novos regulamentos técnicos ou para equalizar as demandas que surgem dentro da sociedade

visando a melhoria da qualidade da saúde da população.

5 REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Loren U. [et al.]. Medicamentos genéricos no Brasil: um panorama histórico e

legislação. Rev Panam Salud Publica 2010; v. 28 n 6 p. 480-492. Encontrado em:

<http://www.scielosp.org/pdf/rpsp/v28n6/v28n6a10.pdf>. Acessado em 27 de dezembro de

2012.

BRASIL. Decreto nº 3.029/1999 – Aprova o Regulamento da Agência Nacional de Vigilância

Sanitária, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3029.htm>. Acessado em 2 de outubro de

2012.

Brasil. Lei 9.782/1999. Define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, cria a Agência

Nacional de Vigilância Sanitária, e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9782.htm>. Acessado em 20 de novembro de

2012.

Brasil. Lei 9.787/1999. Altera a Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispõe sobre a

vigilância sanitária, estabelece o medicamento genérico, dispõe sobre a utilização de nomes

genéricos em produtos farmacêuticos e dá outras providências. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9787.htm>. Acessado em 18 de dezembro de

2012.

Brasil. Resolução 134/2003. Disponível em:

<http://www.febrafar.com.br/upload/up_images/134.pdf>. Acessado em 13 de fevereiro de

2012.

Brasil. Resolução 16/2007. Disponível em:

<http://www.interfarma.org.br/site2/images/Site%20Interfarma/Informacoesdosetor/RE/Regis

tro/2007/RDC%2016-07.pdf>. Acessado em 17 de dezembro de 2012.

Brasil. Resolução 17/2007. Disponível em:

<http://www.interfarma.org.br/site2/images/Site%20Interfarma/Informacoesdosetor/RE/Regis

tro/2007/RDC%2017-07.pdf>. Acessado em 9 de novembro de 2012.

BUENO, Marcia Martini. Implantação, evolução, aspectos técnicos e perspectivas da

regulamentação técnica de biodisponibilidade relativa e bioquivalência de medicamentos

genéricos e similares no Brasil. 2005. Dissertação (Mestrado em Produção e Controle

Farmacêuticos) - Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Universidade de São Paulo, São

Paulo, 2005. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/9/9139/tde-

02022009-101019/>. Acessado em 9 de novembro de 2012.

DIAS, Cláudia R. C.; ROMANO-LIEBER, Nicolina S. Processo da implantação da política

de medicamentos genéricos no Brasil. Cad. Saúde Pública 2006; v. 22 n 8 p. 1661-1669.

Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/csp/v22n8/14.pdf>. Acessado em 10 de janeiro de

2013.

Farmacologia Clínica: fundamentos da terapêutica racional/ Editores: FUCHS, Flávio

Danni; WANNMACHER, Lenita; FERREIRA, Maria Beatriz C.- 3ªed.- Rio de Janeiro:

Guanabara Koogan, 2006. p.46.

GOODMAN E GILMAN: As bases farmacológicas da terapêutica/editor: LAURENCE L.

Bruton, JOHN S.Lazo, KEITH L. Parker; Tradução: Carlos Henrique de Araújo

Cosendey...[et al.] – 11ª ed. – , Porto Alegre: AMGH, 2010, p 6.

KORNIS, George E. M.; BRAGA, Maria H.; ZAIRE, Carla E. F. Os Marcos Legais das

Políticas de Medicamentos no Brasil Contemporâneo (1990-2006). Rev. APS, v.11, n. 1, p.

85-99, jan/mar. 2008.

OLIVEIRA, E. Andrade de; LABRA, Maria E.; BERMUDEZ, Jorge. A produção pública de

medicamentos no Brasil: uma visão geral. Cad. Saúde Pública 2006, v.22 n11 p. 2379-

2389. Encontrado em: <http://www.scielo.br/pdf/csp/v22n11/12.pdf>. Acessado em 4 de

janeiro de 2013.

PORTELA, A.S.; LEAL, A.A.F.; WERNER, R.P.B.; SIMÕES, M.O.S.; MEDEIROS, A.C.D.

Políticas públicas de medicamentos: trajetória e desafios. Revista de Ciências

Farmacêuticas Básica e Aplicada 2010, v. 31 n 1 p. 09-14 ISSN 1808-4532. Disponível em:

<http://serv-bib.fcfar.unesp.br/seer/index.php/Cien_Farm/article/viewFile/930/930>.

Acessado em 4 de janeiro de 2013.

RUMEL, Davi; CHINCHILLA, Izabela Nunes; NEVES, Eugênio R.Z. Aspectos Legislativos

da Regulação de Medicamentos. Revista de Direito Sanitário, São Paulo v.7 n.1/2/3 p. 183-

194, 2006.

RUMEL, Davi; NISHIOKA, Sérgio de Andrade; SANTOS, Adélia Aparecida M.

Intercambialidade de medicamentos: abordagem clínica e do ponto de vista do

consumidor. Revista Saúde Pública 2006. v.40 n5 p. 921-927. Disponível em:

<http://www.scielo.br/pdf/rsp/v40n5/24.pdf>. Acessado em 9 de novembro de 2012.

STORPIRTIS, Sílvia [et al.]. Farmacologia Clínica e Atenção Farmacêutica. Rio de

Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. p.30-33.