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LER É UM PRAZER Shirley Mijolaro Gorla RESUMO : O presente trabalho aborda questões relativas à leitura no universo escolar. Visa à melhoria da capacidade leitora dos alunos, através da sugestão de estratégias e encaminhamentos metodológicos diversificados, partindo do trabalho com os livros clássicos. Reflete sobre a ação pedagógica necessária aos professores enquanto mediadores do processo ensino-aprendizagem, de acordo com as orientações contidas nas Diretrizes Curriculares do Ensino da Língua Portuguesa do Estado do Paraná. Palavras-chave: leitura – clássico - aluno - professor – conhecimento. ABSTRAC: The present work approaches relative subjects to the reading in the school universe. It seeks to the students' capacity reader's improvement, through the suggestion of strategies and diversified methodological directions, leaving of the work with the classic books. Contemplates about the necessary pedagogic action to the teachers while mediators of the process teaching-learning, in agreement with the orientations contained in the Diretrizes Curriculares of the Teaching of the Portuguese Language of the State of Paraná. Key-words: reading–classic - student - teacher–knowledge . 1. INTRODUÇAO “Ler é viajar pelo mundo sem sair do lugar”. Quantas vezes já e ouviu esta frase, que traduz de maneira quase que exata o que se pode conseguir por meio dos livros. Lugares, paisagens, religiões, povos, costumes, natureza... tudo está nos livros. Pode-se realmente viajar e aprender com os livros. É pela importância primordial da leitura na vida de professores e alunos, que estamos lançando este material, objetivando subsidiar os educadores nos procedimentos pedagógicos relativos à leitura, pois o ato de ler faz parte de todas as sociedades letradas. Pretende-se neste artigo abordar alguns olhares direcionados aos professores, no que se refere ao trato metodológico com a leitura em sala de aula, uma vez que é através da leitura que os alunos conseguem ampliar seus horizontes, suas expectativas, mergulhando em conhecimentos e aprendizagens que lhes serãoindispensáveis na convivência em sociedade. Outro aspecto que aqui será abordado refere-se ao trabalho de leitura com as obras clássicas, por considerar que os clássicos são a base de tudo. A leitura de livros clássicos essenciais para a formação da mocidade passa pelos clássicos. Entende-se por clássicos não apenas os padrões da literatura, artes e cultura da antiguidade greco-romana, mas também o que serve de modelo, que é exemplar, cujo valor foi posto à prova do tempo e continua atual, vigoroso. Por fim, o trabalho remeterá a um breve estudo sobre as Diretrizes Curriculares da Educação em Língua Portuguesa. De acordo com as Diretrizes, o ensino/aprendizagem visa aprimorar os conhecimentos lingüísticos e discursivos dos alunos, para que eles possam compreender os discursos que os cercam e terem condições de interagir com esses discursos. Portanto, as Diretrizes consideram o processo dinâmico e histórico dos agentes na interação verbal, tanto na constituição social da linguagem, quanto dos sujeitos envolvidos nesse processo.

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LER É UM PRAZER

Shirley Mijolaro Gorla

RESUMO: O presente trabalho aborda questões relativas à leitura no universo escolar. Visa à melhoria da capacidade leitora dos alunos, através da sugestão de estratégias e encaminhamentos metodológicos diversificados, partindo do trabalho com os livros clássicos. Reflete sobre a ação pedagógica necessária aos professores enquanto mediadores do processo ensino-aprendizagem, de acordo com as orientações contidas nas Diretrizes Curriculares do Ensino da Língua Portuguesa do Estado do Paraná.

Palavras-chave: leitura – clássico - aluno - professor – conhecimento.

ABSTRAC: The present work approaches relative subjects to the reading in the school universe. It seeks to the students' capacity reader's improvement, through the suggestion of strategies and diversified methodological directions, leaving of the work with the classic books. Contemplates about the necessary pedagogic action to the teachers while mediators of the process teaching-learning, in agreement with the orientations contained in the Diretrizes Curriculares of the Teaching of the Portuguese Language of the State of Paraná.

Key-words: reading–classic - student - teacher–knowledge.

1. INTRODUÇAO

“Ler é viajar pelo mundo sem sair do lugar”. Quantas vezes já e ouviu esta frase, que traduz de maneira quase que exata o que se pode conseguir por meio dos livros. Lugares, paisagens, religiões, povos, costumes, natureza... tudo está nos livros. Pode-se realmente viajar e aprender com os livros. É pela importância primordial da leitura na vida de professores e alunos, que estamos lançando este material, objetivando subsidiar os educadores nos procedimentos pedagógicos relativos à leitura, pois o ato de ler faz parte de todas as sociedades letradas.

Pretende-se neste artigo abordar alguns olhares direcionados aos professores, no que se refere ao trato metodológico com a leitura em sala de aula, uma vez que é através da leitura que os alunos conseguem ampliar seus horizontes, suas expectativas, mergulhando em conhecimentos e aprendizagens que lhes serão indispensáveis na convivência em sociedade.

Outro aspecto que aqui será abordado refere-se ao trabalho de leitura com as obras clássicas, por considerar que os clássicos são a base de tudo. A leitura de livros clássicos essenciais para a formação da mocidade passa pelos clássicos. Entende-se por clássicos não apenas os padrões da literatura, artes e cultura da antiguidade greco-romana, mas também o que serve de modelo, que é exemplar, cujo valor foi posto à prova do tempo e continua atual, vigoroso.

Por fim, o trabalho remeterá a um breve estudo sobre as Diretrizes Curriculares da Educação em Língua Portuguesa. De acordo com as Diretrizes, o ensino/aprendizagem visa aprimorar os conhecimentos lingüísticos e discursivos dos alunos, para que eles possam compreender os discursos que os cercam e terem condições de interagir com esses discursos. Portanto, as Diretrizes consideram o processo dinâmico e histórico dos agentes na interação verbal, tanto na constituição social da linguagem, quanto dos sujeitos envolvidos nesse processo.

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2. DESENVOLVIMENTO

2.1 A leitura no cotidiano escolar

É no dia-a-dia da sala de aula que a leitura, de fato, se torna um instrumento mais

efetivo de difusão da cultura. Mas, a escola na atualidade está convivendo com um crescente número de analfabetismo funcional e os resultados das avaliações educacionais revelam o baixo desempenho do aluno em relação à compreensão dos textos que lê. Os processos de leitura e escrita adotados pela escola nas últimas décadas indicam que a formação de leitores e produtores de textos na escola está precisando ser redimensionada, na medida em que não se promovem práticas sociais significativas com a leitura. Por isso, a sociedade vem recebendo um grande contingente de pessoas que não sabem, nem compreendem o que lêem.

Dados do Saeb indicam que entre os jovens e adultos, considerando-se aqueles que têm mais de 15 anos, cerca de 13%, são analfabetos - ainda que um terço deles já tenha passado pelo Ensino Fundamental. Entre as crianças, mais da metade das que chegam à quarta série não tem apresentado um rendimento adequado em leitura. Quase 30% dessas crianças não sabem ler.

Os resultados das avaliações educacionais revelam o baixo desempenho dos alunos em relação à compreensão dos textos que lê. Em 2003, os jornais e as revistas noticiaram o fracasso da escola brasileira em fazer com que seus alunos se alfabetizassem, aprendendo a ler e a escrever.

As notícias foram a propósito da divulgação dos resultados de duas avaliações das habilidades de leitura de crianças e jovens brasileiros. A primeira é a do Sistema de Avaliação da Educação Básica, o Saeb, desenvolvida pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos Anísio Teixeira (Inep). A segunda é a do Programa Internacional de Avaliação de Estudos (Pisa).1 Participaram do Pisa trinta e dois países, dentre eles Coréia do Sul, Espanha, EUA, Federação Russa, França, México, Portugal e Brasil. Os resultados do Pisa não são bons para os brasileiros. A proficiência em leitura para os estudantes de 15 anos é significativamente inferior à de todos os outros países participantes da avaliação. Isso significa, de acordo com a pesquisa, que os leitores brasileiros não conseguem muito mais do que captar o tema principal de um texto durante a leitura.

Na prova Brasil – uma avaliação de caráter universal que pretende atingir todas as escolas – o teste fez a sua estréia em 2005 em instituições de ensino de áreas urbanas com no mínimo 30 alunos nas classes de 4ª e 8ª séries. Nela, os resultados apontam um cenário longe do ideal, ou seja, numa escala de notas que vão de 125 a 350, as turmas de 4ª séries atingiram um desempenho médio abaixo de 200 pontos – 172,91 em Língua Portuguesa. Na 8ª série, a situação ainda é mais preocupante: os alunos foram tão mal na média que só dominam os conteúdos previstos para os estudantes da 4ª série.

O desempenho de cada escola é apresentado de duas maneiras: pelas médias de desempenho, posicionados na escala e comparados entre si, e pela distribuição dos percentuais de alunos pelos níveis da escala. Assim, na trajetória de um nível ao outro, a localização da média de desempenho permite saber quais habilidades já foram construídas, as que estão em desenvolvimento e aquelas a serem alcançadas.

A média comparada no Brasil foi de 2242; no Paraná 227.15.Em 2007 os resultados foram melhores que em 2005. No Brasil a média foi de 241.63;

no Paraná 252.13. Apresentando este o melhor resultado dentre os demais Estados da federação.

11- O Pisa é divulgado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

2 - Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). MEC, 2006.

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Sabemos que este resultado – embora melhor – está longe de satisfatório. Uma vez que apresenta os níveis de proficiência muito aquém dos países desenvolvidos – já que a média daqueles países é de 6.3 e a do Brasil é de 4.2.

Em 2007, na Escola Estadual Pedro Fecchio - Ensino Fundamental, (séries finais) do município de São Tomé, realizamos uma sondagem no mês de março, em que aplicou-se às quintas-séries a interpretação de uma gravura(quadro), sendo que 52% não atingiram a média 6,0. As sextas-séries interpretaram uma poesia e 64% dos alunos não obtiveram resultados acima da média 6,0. As sétimas-séries interpretaram a letra de uma música e o resultado foi um índice de 62% abaixo de nossas expectativas. As oitavas-séries, um texto narrativo e, nele verificamos que a maioria dos alunos, (cerca de 87%), não conseguiu fazer a interpretação.

A séria crise instalada no cenário educativo brasileiro é o indicativo de que o que foi ensinado nas escolas não foi suficiente para que os alunos conseguissem utilizar a língua nas situações em que esta é necessária, isto é, ler e produzir textos, requisitos básicos para usar a língua em práticas sociais.

Essa crise existente nas escolas do Brasil é preocupante, tanto para os professores de Língua Portuguesa, quanto para a direção escolar, pedagogos, professores de outras disciplinas e autoridades que concebem a educação como imprescindível ao ser humano.

Se perguntarmos a várias pessoas o significado do ato de ler, cada uma, irá traduzir de forma pessoal, pois depende muito da visão de mundo, do meio em que vive, do contexto em que está inserido, da relação que estabeleceu ao longo da vida com o objeto livro, com as pessoas que lhe trouxeram esse objeto e com a forma como lhe chegou. Portanto, o ato de ler tem significados diferentes, para pessoas diferentes.

Para Paulo Freire ler é ler o mundo, compreender o seu contexto, numa relação dinâmica que vincula linguagem e realidade. “Refiro-me a que a leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica a continuidade da leitura daquela”(FREIRE, 1886). Nesta perspectiva, aprender a ler implica entender, desvelar o mundo em que se vive; seria este o primeiro momento do ensinar e aprender a ler.

Para o educador que abraça a concepção Freiriana, a compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e o contexto. Ambos estão intimamente ligados, pois a leitura não começa e não se esgota na decodificação pura da palavra, mas se alonga na inteligência do mundo. Afirma que a leitura é algo imprescindível, pois é através dela que o oprimido sai de sua condição de humilhação e atinge a libertação, isto é, sua humanidade. Freire salienta que a aprendizagem da leitura e alfabetização são atos de educação e educação é um ato fundamentalmente político, cabendo aos educadores e educandos se posicionarem criticamente ao vivenciarem a educação, superando as posturas ingênuas, negando a pretensa neutralidade da educação, sendo sujeitos, solidários nesta tarefa conjunta.

Henri Wallon (1879-1962), afirma que “ler é socializar-se na solidão”. Para o médico, filósofo e psicólogo francês que vivenciou as crises sociais na Europa do século XX, a criança que tem dificuldade de comunicação, a melhor forma de socializar-se é através da leitura. A leitura para a criança acaba sendo uma forma de estar com o outro, de interagir com as pessoas de seu entorno. Isto nos permite entende porque as crianças mais introvertidas, que têm mais dificuldade em relacionarem-se como os colegas de sua idade, sejam os que mais freqüentemente busquem nos livros a possibilidade de estar com o outro, vivendo experiências compartilhadas com outros atores sociais.

Tanto para Freire quanto para Wallon a leitura tem significados importantes, mas diferentes porque cada qual a concebe de um modo específico, dependendo da vivência e da proximidade que cada um teve ao longo de suas vidas com os livros. Isso acontece também com todas as pessoas.

Mais do que métodos e técnicas de motivação para ler, são necessárias providências que se relacionem à história do aluno na sociedade, principalmente em sua família. Não se pode separar a prática da leitura da vida em família e na comunidade. Não é uma questão a ser

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resolvida apenas na escola e pela escola. É no seio familiar que a criança nasce, cresce, aprende a gostar, a conhecer os perigos, a relacionar-se com as pessoas, a receber lições de cidadania, de ética, de valores, a assimilar a cultura de seus pais, avós e do entorno do qual vive. Nesse contexto, desenvolve-se e vai aprendendo a interagir com as pessoas.

O aprendizado recebido na família é importantíssimo para toda a sua vida, poisos ensinamentos que esta lhe fornece ficam, na maioria das vezes, enraizados em nosso interior. Mesmo com todas as transformações que esta sofreu ao longo do desenvolvimento da humanidade e, em especial, nessas últimas décadas, a família continua viva e presente, ainda forte e capaz de mudar os comportamentos, influenciar decisões, transmitir valores e sobretudo cumprir o seu papel de colaboradora nas questões pedagógicas escolares.

Colaborar para que as crianças sejam futuras leitoras, depende muito do papel desempenhado pelos pais. Uma das práticas propostas é a leitura. Ler para elas, especialmente nos anos pré-escolares, pode contribuir para o hábito da leitura. Quando alguém lê histórias para as crianças, elas aprendem bem cedo que as letras da página impressa correspondem às palavras faladas, além de familiarizarem-se com a linguagem dos livros. Os pais que dão esse estímulo aos filhos, podem proporcionar-lhes o gosto pela leitura por toda a vida. Para tanto, é necessário estarem convencidos de que ler é bom e pode dar prazer. Quem, sem estar convencido, ensina alguém?

Para tornar a leitura interessante, não basta ler as palavras em voz alta, mas criar expectativas antes de virar a página de um livro. O proveito maior é quando as crianças participam da leitura. Fazer perguntas relacionadas ao texto lido, ajuda a ampliar a resposta, oferecendo-lhes outras possibilidades sobre a leitura.

Mas, além de proporcionar momentos de leitura no cotidiano familiar, é preciso saber sobre a rotina escolar dos filhos. Esse cuidado é fundamental para que a criança ou o adolescente perceba que a voz da escola está em consonância com a voz da família. E que ambas agem juntas para que o aprendizado seja completo. Por isso, é indispensável que se estabeleça um diálogo entre pais e professores, onde os últimos mantenham os pais informados sobre o que está sendo feito na sala de aula, em relação à leitura (o que está sendo lido, eventos previstos, etc.) e os pais procurem saber sobre a participação ou não dos filhos nas leituras compartilhadas, nas leituras silenciosas ou em voz alta, na busca por livros na biblioteca, além das preferências por gêneros literários e autores.

O que foi dito sobre o papel que a família deve exercer na vida do filho, seria o ideal, o necessário. Porém, sabemos que a realidade é outra. Essa família ideal não faz parte da maioria do universo do povo brasileiro que sente na pele o que é não saber ler, nem escrever ou enchem a lista dos analfabetos funcionais que não dispõem de conhecimentos necessários para auxiliar o filho nas questões relativas ao processo ensino-aprendizagem, e em especial, no incentivo à leitura.

Há muitos fatores que contribuem para esse lastimável quadro de analfabetismo da população brasileira. Falta de política educacional que atenda à demanda existente, ausência de políticas públicas de saúde, habitação, emprego, também contribuem para que esse contingente da população brasileira viva à margem da sociedade não tendo voz nem vez. São os excluídos, os marginalizados. Vivendo nessas condições de precariedade, será que haverá condições de auxiliar os filhos nas atividades escolares?

A realidade onde moro não é muito diferente dos demais lugares, uma vez que nele há muitos pais que não tiveram oportunidade de freqüentar a escola, sabendo traçar e muito mal seu nome. São famílias que trabalham nas plantações de cana-de-açúcar da região, que levantam às três horas da manhã, preparam o almoço para levarem à roça, deixam a comida pronta aos filhos e só retornam à tarde, exaustos da cansativa jornada de trabalho. As mães, especificamente, a tarefa é ainda mais árdua, pois além de exercerem uma jornada de trabalho diurno no campo, desempenham outras em casa executando os afazeres domésticos, como lavar, passar, limpar casa, preparar o jantar (e já o almoço do outro dia). Sobrará tempo para olhar os deveres escolares dos filhos? As mães, que na grande maioria, são semi-analfabetas terão

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condições de corrigir tarefas, auxiliarem na leitura e compreensão de textos, falarem sobre ortografia, gramática, concordância nominal, por exemplo?

Diante das dificuldades vivenciadas pela família é de se esperar que pouco possa contribuir para a melhoria e acompanhamento do processo ensino-aprendizagem, uma vez que, delas foram retiradas o direito à escola, ao conhecimento, enfim a terem uma vida digna como cidadãos garantidos por lei.

Dessa forma, torna a escola a única responsável pelo papel de dar cultura, conhecimentos científicos e aquisição de valores. A escola é a instituição por excelência do saber. É de fundamental importância no desenvolvimento da leitura. Muitas vezes, é através dela que acontece o primeiro contato com o livro, sendo indispensável tornar este momento o mais agradável possível para despertar a curiosidade de conhecer esse mundo mágico e fantástico. Às vezes, a escola é o único lugar onde a criança tem livros à disposição e um ambiente propício à leitura.

Esta tem o papel de auxiliar de maneira fundamental na formação do indivíduo, além de ampliar seus horizontes, suas perspectivas. Um bom livro, muitas vezes, é a melhor companhia que se pode ter. A figura do professor entra aí. É ele que incentivará seus alunos no ato de ler; é ele quem ensinará e despertará o gosto pela leitura e ajudará na superação de dificuldades no ato de ler e entender o texto escrito. Por isso, o professor deve ser um leitor; deve gostar de conhecer; deve ser curioso. Porém essa tarefa não cabe somente ao professor de Língua Portuguesa, mas também aos demais professores, pois o aluno utiliza-se de leitura em todas as disciplinas.

É como afirmam Regina Zilberman e Ezequiel Theodoro da Silva (2005, p.16):

Eis por que se faz necessária a retomada das bases da experiência e das teorias, não numa perspectiva individualizante, mas sob foco interdisciplinar que faculte o exame das articulações e também das contradições existentes. Uma reflexão desse calibre amplia a probabilidade de compreender os pressupostos das ciências da linguagem nas suas respectivas particularidades e relações que estabelecem mutuamente. Do outro lado, leva a analisar o tipo de prática que podem desencadear e/ ou vêm desencadeando no âmbito da atuação do professor que lida com leitura. Noutra formulação, permite entender os resultados metodológicos da aplicação de suas teses à educação brasileira, com conseqüências na ação da escola e na determinação do papel do professor.

A leitura, portanto faz parte de todas as disciplinas porque elas utilizam a linguagem para exercitarem o estudo dos conteúdos. O aluno que aprende a ler e a gostar de ler, que amplia a capacidade de compreender textos cada vez mais complexos, tem mais chance de ter êxito na aprendizagem de diferentes conteúdos, de diferentes campos disciplinares. Todos os professores adotam práticas de leitura e aprimoramento da linguagem, à medida que questionam os alunos, realizam debates, leituras textuais, seminários, argüições, entrevistas e demais atividades relativas à oralidade e a textualidade. Dessa forma, devem fazer correções relativas às questões ortográficas, pontuação, coesão e coerência textual, para que os alunos possam fazer uso adequado da língua padrão, tanto em suas produções, quanto nas leituras que vier a fazê-las.

Quanto mais são ampliados os horizontes, mais possibilidades de visão de mundo, compreensão da realidade, conhecimento. E a ficção, falando de um imaginário, também nos fornece categorias para a compreensão do mundo, explorando possibilidades que a vida cotidiana pode ocultar.

Se, para muitos alunos, a escola acaba sendo a única fonte de contato com o livro, é necessário então estabelecer um compromisso maior com a qualidade e o aproveitamento da leitura como fonte de prazer.

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Como educadores, temos que ler com nossos alunos, para eles e em função deles. É primordial que descubramos, em primeiro lugar, o leitor que somos. Como poderemos passar para o educando o gosto pela leitura se não analisarmos que tipo de leitor nós somos?

Para tanto foi realizada uma sondagem3 com os professores da Escola Estadual Pedro Fecchio – Ensino Fundamental, do município de São Tomé, no mês de maio de 2007. Participaram da consulta vinte e três educadores. Esta tinha como objetivo investigar as preferências sobre o tipo de leitura. Nela constatou-se que a maioria dos professores, afirma ser leitores diários. O gênero literário preferido é o narrativo, com destaques à fábula, crônica e conto. Seguido do gênero lírico (poesia). Verificou-se, porém que somente a metade dos professores pesquisados, faz uso habitual da biblioteca escolar para pesquisas de conteúdos escolares e leituras variadas. Alguns professores (em especial os da área de Língua Portuguesa), afirmam gostar de ler os livros clássicos. Alguns citaram, inclusive, as últimas obras clássicas que haviam lido.

Através da presente pesquisa concluiu-se que os professores preferem leituras rápidas e curtas. Dessa forma, fica mais fácil o trabalho em sala de aula. Fábulas são pequenas narrativas que não dispensam muito tempo para a leitura. Assim como, poesia e conto, sendo possível, portanto iniciar o trabalho em sala e até, dependendo do enfoque e das atividades, concluí-las no mesmo dia (caso sejam aulas geminadas). Outras demoram um tempo maior, dependendo do encaminhamento metodológico, da quantidade de atividades, pesquisas e leituras de outras fábulas que podem ser comparadas com a leitura em questão.

O professor sabendo que tipo de leitor é, pode a partir daí, direcionar o trabalho em sala de aula. Quando lemos aquilo que gostamos, quando fazemos leituras de assuntos e temas que são do nosso agrado, é mais fácil e prazeroso o trabalho pedagógico. Isso não significa que não devamos trabalhar com aquele assunto ou leitura de que não gostamos, pelo contrário, devemos instrumentalizar nossos alunos, com todos os conteúdos que lhes são imprescindíveis no processo de escolarização.

Aos poucos, outros gêneros literários devem ser trabalhados com os alunos no processo ensino aprendizagem. A leitura de contos, em especial os que são curtos, devem ser lidos em sala de aula para que os alunos observem a pontuação, a entonação e a sonoridade e, vá aos poucos, incorporando para si esses elementos que são essenciais no processo de leitura. Livros de aventura e romances também precisam fazer parte do universo de leitura dos alunos. Para tanto, é necessário estar diariamente buscando conhecimentos, lendo e sugerindo leituras adequadas ao perfil do alunado, além de buscar informações que lhe será útil em sala de aula, a fim de que os encaminhamentos metodológicos para as aulas de leitura lhes sejam atrativas.

Paulo Freire denomina o educador de animador de debates e mostra a importância de garantir a fala ao educando, da sua efetiva participação e ainda, reafirma o papel de mediação que deve ser exercido pelo educador. Afirma que a utilização de diferentes linguagens no cotidiano escolar propicia ao educando uma visão de mundo que contribua para a sua transformação.

É preciso estar “ligado” na leitura do mundo e no mundo da leitura de maneira séria e eficaz e de acordo com as emoções sentidas ao vermos um aluno se interessar por um livro que acabara de pegar e folhear, porque ao ler, a pessoa transforma seu modo de ser e de ver o mundo e de interagir com ele.

Mas não só de livros vivem os bons leitores. Eles precisam da diversidade de textos para leituras rápidas. Mas, muitas vezes, o aluno tem um conhecimento restrito do que venha a ser um texto e esse conhecimento às vezes é limitado aos tipos de texto que lhe são apresentados. Então, é preciso apresentar aquilo que muitas vezes está ao alcance dele e ele não presta atenção, como é o caso dos textos do cotidiano como: conta de água, luz, telefone, jornal litúrgico da igreja, imagens fotográficas, bula de remédio, literatura de cordel, cartuns, folders, anúncios, entre outros.

3 - Fonte: Escola Estadual Pedro Fecchio – Ensino Fundamental. São Tomé, 2007.

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Todo texto tem uma intencionalidade, um ponto de vista, um compromisso que pode estar explícito ou não. O conteúdo traz uma mensagem ao leitor, causando-lhe um efeito, ou seja, uma compreensão a respeito daquilo que ainda lhe causava estranheza. Por isso, os textos não são neutros. Trazem traços ideológicos que serão incorporados ou não pelo leitor, dependendo de sua capacidade de pensar criticamente e analisar as mensagens textuais à luz de uma ampla compreensão da realidade.

A leitura de um texto qualquer deve ser prazerosa. Deve aguçar o desejo de conhecer, ampliar e buscar conhecimentos novos. Se o professor fizer o seu papel de sedutor e preparar o ambiente, pode-se ter um verdadeiro trabalho de ensino-aprendizagem. Porém, o professor só seduz, quando ele próprio estiver impregnado dela. Não basta falar em paixão se ela ainda não aconteceu. Quando o professor afirma não ter tempo para leitura, na verdade, é porque a paixão ainda não aconteceu.

Disponibilizar e sugerir leituras aos alunos é uma das tarefas do professor. Através de sondagem realizada no mês de junho de 2007 com trezentos e cinqüenta alunos da mesma instituição onde fora realizada a sondagem com os professores, os mesmos afirmaram ter preferência por livros de aventura e poesia. Dessa forma, previamente o professor pode levá-los à biblioteca para que procedam à escolha das obras. Em sala de aula, o comentário e o parecer do professor é imprescindível. “Qualquer que seja o texto, terminada a sua leitura, é indispensável a discussão em torno dele” (FREIRE, 1986). Por isso, o professor deve enunciar a temática, as questões relativas aos personagens, ao autor, contextualizando o período em que a obra fora escrita. Desse modo, situará o aluno no conteúdo do texto.

Qualquer criança e adolescente que ouve com freqüência histórias lidas incorporam formas e estruturas da língua escrita. Através da leitura assídua, a gramática da língua é incorporada pelo leitor. Por isso a escola precisa reduzir o tempo gasto em exercícios gramaticais e fragmentos de textos e investir, de fato, em leitura extensiva. Formar leitores de obras literárias, onde a experiência de viver é confrontada e enriquecida – assim ampliam e consolidam o conhecimento.

Todo professor tem que ser um leitor entusiasmado para poder transmitir aos alunos a paixão de ler. Ele é o intérprete dessa fala reveladora da literatura ao desvelar os múltiplos caminhos da leitura. Dessa forma, a literatura assume o seu verdadeiro lugar na leitura da escola. Seu papel, enquanto sujeito/agente de mediação do saber, é o de contribuir, decisivamente para que as práticas leitoras estejam voltadas para temáticas de interesse dos alunos. Compete-lhe levar o aluno ao prazer de ver e descobrir o mundo através da leitura. “Um professor precisa gostar de ler, precisa ler muito, precisa envolver-se com o que lê”(LAJOLO, 1997, p.108 ).

Aí deve entrar o professor como um dos maiores incentivadores da formação do aluno-leitor. Seu papel é o de contribuir para que as práticas leitoras estejam voltadas para assuntos atrativos aos alunos. Parece que o caminho deve ser através do seu testemunho de leitor assíduo e crítico onde, através da prática pedagógica tece comentários em relação às leituras que fez e faz.

A escola é um dos espaços de construção social do conhecimento, cabendo-lhe o papel de formar leitores para a vida inteira. O livro deve ser um dos instrumentos por excelência na vida das pessoas. E é na escola que começa o estimulo e a criação de hábitos para a leitura por se constituir num espaço privilegiado para o conhecimento formal.

É ali o lugar de convergência do cognitivo, do social e da expressão pessoal na construção de redes do conhecimento. E a leitura se constitui como uma atividade que propicia a aprendizagem e integração de novas informações aos conhecimentos e experiências anteriores na construção dos significados.

Machado de Assis (1839-1908), desde tenra idade já se dedicava aos livros. O empenho e a seriedade com que ele encarou a leitura podem ser observados em sua biografia. Era um leitor apaixonado e voraz que, aos quinze anos publicou seu primeiro texto escrito – um soneto. E aos dezoito, já era tradutor de francês. Imagina o que viria pra frente... Não é à toa que Harold

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Bloom – um conceituado crítico literário, no livro “Gênio”, escolhe, em vinte séculos, os cem escritores que merecem figurar numa obra com tal título. Da América Latina apenas dois nomes: um deles, o grande Machado de Assis. Para o crítico inglês, Machado é o maior escritor em língua portuguesa de todos os tempos e um dos grandes autores que a humanidade já produziu.

Mas esse genial escritor é chamado de gênio porque conviveu assiduamente com as grandes obras literárias, lendo-as, estudando-as. O leitor se constrói diariamente, continuamente. É isso que se quer dizer. Que a leitura torna-se uma prática obrigatória quando se gosta de ler. Ela nos impulsiona a buscar cada vez mais conhecimentos.

A leitura constitui-se como uma prática imprescindível na vida do escolar. Apesar de ser uma atividade que se realiza individualmente, está inserida num contexto social, envolvendo disposições atitudinais e capacidades que vão desde a decodificação do sistema de escrita até a compreensão e a produção de sentido para o texto lido. Portanto deve capacitar ao aluno à participação ativa nas práticas sociais significativas que contribuem para o seu letramento.

Ler, além da compreensão linear, é fazer inferências. É compreender nas entrelinhas. É saber guiar-se por guias turísticos, manuais de aparelhos eletrodomésticos, mapas, até mergulhar na leitura de um romance ou deleitar-se com um email agradável e rico em conteúdo.

Querendo conhecer a preferência por personagens que marcaram a vida dos alunos da escola em que sou pedagoga, realizamos uma sondagem utilizando como instrumental, um questionário contendo as seguintes questões: personagem que marcara a vida dos estudantes, obra e o porquê da escolha. 361 alunos, no mês de setembro de 2007, participaram desta. A faixa etária dos alunos varia entre 10 a 15 anos. O resultado revelou-nos dados surpreendentes: a personagem mais citada foi Chapeuzinho Vermelho, seguidos de Os três porquinhos e Peter Pan. Dentre os dez personagens classificados por ordem crescente, seis são personagens de histórias clássicas, como Branca de Neve, Pinóquio e o Zezé (O meu pé de laranja lima). Docilidade, pureza, amizade, companheirismo, sofrimento, coragem, ousadia, entre outras, foram respostas dadas pelos alunos, justificando a escolha do personagem.

A partir do resultado da pesquisa optamos por iniciar um trabalho de leitura a partir de livros clássicos.

2.2 O clássico na sala de aula

Ao longo da história da humanidade acumulou-se um imenso e precioso patrimônio de obras valiosíssimas que desvelam a história e se perpetuam, adentrando séculos e séculos afora. É um legado riquíssimo, um tesouro inestimável que herdamos de nossos antepassados, do qual não podemos deixar de conhecer porque os livros trazem conhecimentos e informações importantíssimas ao ser humano. Esse tesouro está guardado nas bibliotecas, nos mosteiros, nos museus.

Por que alguns livros foram proibidos e ainda os são em determinadas culturas? Qual é o poder que os livros têm? Por que será que os livros despertam interesses em tantas pessoas? Por que desperta medo em tanta gente? O que esses livros possuem de mágico ou maléfico que amedronta homens e mulheres, no decorrer da história?

Ao adentrarmos a história vemos claramente que a leitura devia ser para poucas pessoas porque ela é sempre um instrumento de poder e podia ameaçar as pessoas que controlavam os livros, ou seja, eles representavam o conhecimento, o saber, a informação. O conhecimento dos livros era permitido a poucas pessoas.

É o que a obra de ficção “Nome da rosa”- livro de Umberto Eco (1980) retrata. Nela vemos claramente o poder atribuído aos livros. A história passa-se num mosteiro que possui uma imensa biblioteca onde estão guardados obras raríssimas e riquíssimas, códigos preciosos, parte integrante da sabedoria, onde poucos monges têm acesso às publicações sacras e profanas.

Outro exemplo da proibição da leitura encontra-se presente no livro “Fahrenheit 451”, do autor americano Ray Bradbury (1952). A história retrata um futuro hipotético, onde os livros e toda a forma de escrita são proibidos por um regime totalitário, sob o argumento de que faz as pessoas infelizes. Estes, quando encontrados são, sumariamente queimados.

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Romancistas, poetas, filósofos, cientistas também tiveram seus livros queimados, retirados de circulação. A inquisição queimou Giordano Bruno pelos seus escritos. Seus livros foram proibidos de circulação, pela igreja. Rousseau (séc. XVIII), Freud e Vitor Hugo (séc.XIX) e Neruda (séc.XX), são alguns nomes que também tiveram livros proibidos.

Os livros foram, aos poucos, sendo multiplicados e disseminados à população. Dessa forma, esse patrimônio acumulado há milênios, está à disposição das pessoas que buscam cultura, conhecimento, informação através do vasto acervo disponível na humanidade. Há uma infinidade de livros que se tornaram célebres, imortais, imprescindíveis para a disseminação da cultura, da forma de ver, agir e pensar do homem. Esses livros atravessam gerações e ainda permanecem atuais, porque são inesquecíveis, impõem respeito e admiração. São chamados de clássicos.

De acordo com Ana Maria Machado (2002, p.24):

... são livros que conseguem ser eternos e sempre novos. Mas que, ao serem lidos no começo da vida, são fruídos de uma maneira muito especial, porque “a juventude comunica ao ato de ler, como a qualquer outra experiência, um sabor e uma importância particulares”. Ou seja, não há razão para deixar de ler os clássicos desde cedo. Está à nossa disposição, com toda a opulência de seu acervo, a generosidade de sua oferta. Dispensá-los por ignorância seria uma grande perda.

Esse universo a que os livros clássicos nos remetem, aguça nosso imaginário nos tornando protagonistas dessas histórias, pois através delas, realizamos, muitas vezes, nossos sonhos, nossos desejos. Nelas somos heróis, com poderes extraordinários, lutando e defendendo os oprimidos, vencendo o mal, buscando paz, como também, nos identificando com o mal, o vilão, o opressor. Através dessas leituras descobrimos, muitas vezes, em um personagem alguns elementos em que nos reconhecemos plenamente. Estas apresentam-se idênticas a nós mesmos, nos proporcionando ensinamentos, direcionamentos, nos ajudando a entender melhor o sentido de nossas próprias existências. “Os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram (ou mais simplesmente na linguagem ou nos costumes)” (CALVINO, 2005, p. 11).

Daí, ser a leitura dos clássicos algo extremamente importante para nós, porque tanto os clássicos antigos quanto os mais recentes deixaram marcas significativas nas pessoas que os leram. Não podemos falar em clássicos recentes, sem citar o nome do grande educador Paulo Freire. Ele se constitui em referência aos educadores pela sua importância no cenário pedagógico. Tornou-se clássico da educação brasileira. Assim como Ziraldo, Ana Maria Machado, Ruth Rocha e outros são clássicos atuais da Literatura Infanto Juvenil.

Se fizermos uma viagem através dos tempos, veremos que em todas as sociedades, em todos os tempos, há uma riquíssima cultura guardada nos livros. Quando lemos histórias da mitologia grega, fazemos uma volta ao passado. Nele, há a presença dos deuses, personagens mitológicos que encantam os leitores contemporâneos. Monteiro Lobato nos presenteou com uma basta obra adaptada da mitologia grega, quando fez uma ponte entre a Grécia Antiga e o Sítio do Picapau Amarelo. Este gênio da literatura brasileira trouxe Esopo, com suas fábulas encantadoras, Hércules, o Minotauro, Homero com a Ilíada e a Odisséia e outros personagens que habitaram aquele universo.

Mas não é somente nos livros que se encontram personagens clássicos. Eles estão presentes nas esculturas, pinturas, monumentos. Esse importante patrimônio, ainda nos dias de hoje, permanece nas réplicas de fachadas antigas em prédios, bibliotecas, museus, teatros, em propagandas, novelas, comerciais exibidos na televisão, em outdoors espalhados em cidades e rodovias. Foi intensa a influência da cultura greco-romana em nossa sociedade que, nossa linguagem está repleta de referências. Basta pensarmos um pouco e, de repente estamos fazendo alusão aos antepassados. Quando usamos a expressão “presente de grego, narcisismo, complexo de Édipo, calcanhar de Aquiles, olimpíadas, Ícaro, Medusa, Marte, Vênus” e, tantos outros nomes, estamos homenageando o passado.

O clássico está tão presente em nós que na maioria das vezes não somos capazes de perceber. Ao viajarmos adentrando os livros pelo inicio da Idade Média (séc. V), encontramos uma expressão que se faz presente em nosso cotidiano. Trata-se de “fazer uma mesa redonda”. Essa expressão tem história. Basta buscá-la nas Histórias do Rei Artur e os cavaleiros da Távola Redonda. Arthur, para

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poder tratar os seus cavaleiros em pé de igualdade nas suas reuniões periódicas, teve a idéia de fazê-los sentar à volta de uma mesa redonda, não tendo privilégios para ninguém.

Outra história que marca o período medieval e que encanta quem a lê é o romance Tristão e Isolda. Um clássico romântico que retrata o amor proibido entre dois jovens, que se depara com diversos obstáculos políticos e sociais para permanecerem juntos. Na Inglaterra, clãs lutam entre si pelo poder, após a queda do império romano. Tristão torna-se um grande guerreiro. O jovem é dado como morto e é encontrado pela bela Isolda. Vive um amor secreto ao lado da jovem. Num torneio, ganha a mão da princesa irlandesa, sem saber que ela é na verdade Isolda. O casamento traz a paz e a unificação dos clãs. A primeira versão do romance é datada do século XII. O cinema contou a história do jovem casal celta no ano de 1909, depois 1948 e, recentemente, em 2006. A mesma história inspira o músico alemão Richard Wagner (1813-1883) a compor a famosa ópera “Tristão e Isolda”, que continua encantar os amantes da bela música clássica.

E o que dizer de El Cid, escrito por Miguel de Cervantes no século XVII? E Hobin Hood, do famosíssimo escritor Alexandre Dumas, datado do ano de 1840? Livros tão lidos e comentados por gerações e gerações, atravessando continentes?

Na modernidade – período em que há uma grande propagação dos livros, graças à invenção da imprensa – há uma infinidade deles existentes e merecem ser lidos, devido sua importância no contexto literário. Quantos adolescentes e jovens já choraram ao ler Romeu e Julieta? Por que Shakespeare traçou um destino tão cruel para aquele jovem casal, impedindo-os de ficarem juntos? Por que aquelas duas famílias não poderiam viver em paz? Indagações surgem e remexem nossa mente. É o poder que o escritor tem de penetrar no intimo do ser humano. Romeu e Julieta – considerada uma das maiores obras da dramaturgia mundial foi escrita no século XVI. Há centenas de adaptações teatrais e cinematográficas da obra, além de gibis, revistas e outros meios que se utilizam como forma de disseminação cultural do drama.

A contemporaneidade está ricamente repleta de valiosíssimas obras literárias. Escritores do século XIX se utilizaram da história dos antepassados para que guardássemos na memória os feitos dos tempos idos. É o caso de As Cruzadas - livro que relata a história do nascimento e da guerra Santa que se estendeu durante dois séculos na Idade Média. Outro livro que marca esse período é “Joana d,Arc”. A autora, Mary Gordan, explora o mistério, as contradições e desejos mais secretos que levaram Joana, de uma vida obscura à luta por seus ideais. Esses são alguns dos exemplos de criadores que adentraram, revitalizando a Idade Média em livros de leitura, que foram transformados em filmes, documentários, histórias em quadrinho, mini-séries, e são clássicos famosos que se perpetuam no tempo.

Um dos trabalhos mais populares da literatura do século XX é “O Senhor dos Anéis”, do escritor Tolkien. O romance foi escrito em 1955 e gira em torno da mitologia Nórdica e Germânica. A enorme popularidade do livro inspirou trabalhos de arte, música, televisão (jogos de videogame) e cinema, além das adaptações feitas para o rádio, teatro e cinema. Há outros como “O Senhor dos Anéis: A irmandade Secreta do Anel,” (2001), “O Senhor dos Anéis: As Duas Torres”, (2002) e “O Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei/ O Retorno do Rei,” (2003). Magos, anões, elfos e outras criaturas habitam o cenário ficcional – que, ainda encantam platéias de todo o mundo.

Harry Potter é o título de uma série de romances fantásticos criados pela escritora britânica J. K. Rowling. “O primeiro livro da série –” Harry Potter e a pedra filosofal”- foi lançado em 1997. Grande parte da narrativa se passa numa escola de magia e bruxaria. A temática gira em torno dos conflitos entre Harry e o bruxo maligno das trevas. Ao mesmo tempo explora temas como amizade, ambição, preconceito, coragem, crescimento, responsabilidade, entre outros. Os livros ganharam grande popularidade e deram origem a filmes de vídeo games e estão presentes nos cinemas em todos os continentes. O primeiro filme da série foi lançado em 2001 e se tornou uma das maiores bilheterias da história cinematográfica.

O clássico, pelo valor que possui, adquiriu o respeito e a admiração dos leitores ao longo da humanidade. Não perde o prazo de validade. Os escritos clássicos pertencem a um determinado contexto histórico, datados, mas permanecem atuais, necessários, através dos tempos e estão sempre “na moda”.

A leitura de uma obra clássica deve vir acompanhada de sua historicidade, ou seja, o contexto em que viveu o autor e a época em que foi escrita a obra, pois facilitam e auxiliam os leitores na compreensão da leitura. A leitura deles deve ser iniciada desde a infância pela família e depois pela escola. São referências indispensáveis ao universo infantil.

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Os jovens têm um encontro com os clássicos de um modo diferente que o adulto. Isso significa dizer que a leitura de um clássico na vida adulta, tem outro sabor, outro significado. Na maturidade apreciam-se muitos detalhes, níveis e significados a mais. As leituras da juventude, na maioria das vezes, podem ser marcadas pela impaciência, distração e inexperiência da vida. Essas leituras são formativas, porque mesmo que sejam frágeis, fornecem subsídios e escala de valores para a fase adulta.

É como explica Calvino (2005, 2005, p. 13),

Os clássicos não são lidos por dever ou por respeito, mas só por amor. Exceto na escola: a escola deve fazer com que você conheça bem ou mal um certo número de clássicos dentre os quais (ou em relação aos quais) você poderá depois reconhecer os “seus”clássicos. A escola é obrigada a dar-lhe instrumentos para efetuar uma opção: mas as escolhas que contam são aquelas que ocorrem fora e depois de cada escola.

No início do ano letivo de 2008, desenvolvemos na Escola Estadual Pedro Fecchio, no

município de São Tomé, Estado do Paraná, um projeto de leitura a partir das obras clássicas. Para tanto, utilizamos o cinema como importante instrumental para a efetivação do projeto.

Vimos em outro momento deste trabalho que muitos clássicos viraram filmes. O cinema é uma forma de aproximar o jovem de textos clássicos. Apesar de não se constituir numa prática pedagógica, pode ser um recurso pedagógico que enriquece a compreensão do aluno, visto que, a leitura e o cinema formam componentes de grande aceitação por parte dos educandos, isto é, se bem encaminhados e direcionados pelo professor: leia o livro; assista ao filme. Posteriormente, indique o livro aos alunos; fale sobre o autor; contextualize o momento em que foi escrito o livro; faça todo um trabalho de pesquisa sobre o autor; veja o filme com os alunos; faça comparações entre a linguagem do livro e a linguagem cinematográfica; instigue os alunos a falarem sobre o que acontece quando o livro vira filme; comente sobre obras literárias que viraram filmes, trabalhe a riqueza da leitura de legendas.

Mesmo filmes antigos despertam o interesse dos alunos. É o que aconteceu no dia 28 de abril de 2007, numa mostra de cinema em que a Prof. Dra. Regina Taam, docente da Universidade Estadual de Maringá, exibiu o filme “O Circo”, de Charles Chaplin, aos alunos do Ensino Fundamental (1ª a 4ª séries), da rede municipal de Maringá. O filme é mudo, não é colorido e foi produzido no ano de 1928. A professora fez a explanação do filme. Falou sobre a vida de Chaplin: sua infância pobre, sua mãe, o meio em que vivia, a juventude, a ascensão à carreira cinematográfica, enfim. As crianças assistiram ao filme com muita curiosidade. Ao final, os comentários e as indagações foram surpreendentes, pois os alunos se mostraram interessados em saber mais sobre os filmes que ele havia produzido a vida amorosa, os filhos, a causa da morte. Uma menina de 8 anos, ao final da exibição, pegou o microfone e, emocionada, disse. “Nunca esquecerei este dia! Assisti uma obra-de-arte”.

Filmes clássicos como João e Maria, A bela e a fera, A moreninha, O guarani, Vidas Secas, foram produzidos em contextos e épocas diferentes e que retratam aspectos importantíssimos daqueles períodos. Está aí a riqueza em explorá-los e contextualizá-los com os alunos.

A revista Veja, em publicação do dia 15 de Outubro de 2008, apresenta uma matéria intitulada “Grandes autores para pequenos leitores”, em que retrata a adaptação de obras clássicas para crianças. De acordo com a análise feita por especialistas no assunto, entre elas a professora da Unicamp Marisa Lajolo, as adaptações conseguem manter o espírito e a riqueza do texto original. As especialistas analisam para a revista cinco das adaptações mais vendidas no mercado brasileiro, entre elas Memórias de um sargento de milícias (Manuel Antonio de Almeida), Triste fim de Policarpo Quaresma (Lima Barreto), Dom Quixote em quadrinhos (Miguel de Cervantes), O alienista (Machado de Assis) e Sonho de uma noite de verão (William Shakespeare). Ao fazerem uma apreciação sobre cada obra, elas sempre comparam a versão infanto-juvenil à original.

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Em 18 de março de 2008, apresentei uma proposta de textos para os alunos da escola. Tal proposta era a partir de obras clássicas, como contos de fadas, contos maravilhosos, contação de histórias, poesias e romances.

Nas quintas-séries trabalhou-se, a partir do mês de abril de 2008, contos de fadas e contos maravilhosos. Em chapeuzinho vermelho, exploraram-se as versões de Perrault e Grimm. Chapeuzinho vermelho de raiva – Mario Prata; Chapeuzinho amarelo – Chico Buarque; Fita vermelha no cabelo – Guimarães Rosa; Lobo bobo – Ronaldo Bôscoli (música); Chapeuzinho vermelho (áudio); Chapeuzinho vermelho politicamente correto – James Finn Garner; Deu a louca na chapeuzinho (filme);

Em Branca de neve e os sete anões, exploraram-se o filme de Walt Disney; curiosidades em torno da história e do filme produzido em 1937; o comportamento e o temperamento dos anões, comparando-os aos dos alunos, além de outras atividades e encaminhamentos para o conteúdo em sala de aula. O livro foi amplamente estudando e debatido com os alunos.

Nas sextas-séries, os alunos já estão com 11 a 12 anos e gostam de aventuras e histórias do cotidiano. Pensando nisso, trabalhamos com a história “A preguiça” de Basílio de Guimarães e “O filho da filha do bicho-preguiça” 4(uma releitura de A preguiça) feita pelo famoso contador de histórias Ricardo Azevedo. Os textos foram apresentados aos alunos com encaminhamento metodológico previamente planejado. Além das atividades sugeridas, os alunos deveriam interrogar seus pais, avós ou vizinhos e perguntarem sobre histórias acontecidas no passado (são os casos que se tornam lendas e que passam de pai a filho).

Ainda na mesma série trabalhamos o filme Robin Hood, nas duas versões: um de animação e o outro na versão clássica com Kevin Costner. Também os alunos conheceram uma poesia clássica entitulada “Robin Hood”. Através do filme os alunos tiveram a oportunidade de fazer uma comparação à época de Robin Hood e à nossa, vendo diferenças e semelhanças entre períodos e contextos históricos diferentes. Após o filme, os alunos passaram à leitura do livro. Foi-lhes dito que fizessem uma comparação entre a linguagem cinematográfica com a linguagem do livro, e ainda, que observassem os personagens, se no livro havia semelhança com os personagens do filme, e ainda, se as imagens existentes no filme eram semelhantes às existentes no livro. Essas atividades em todas as séries são demoradas, pois se trabalham de diferentes maneiras e, paralelas a outros conteúdos escolares.

Nas sétimas-séries as atividades foram realizadas a partir de textos poéticos, em virtude dos alunos estarem na faixa etária entre 13 e 14 anos e gostarem de poesia. Assim, trabalhamos com os alunos os textos poéticos: “Meus oito anos” de Casimiro de Abreu e “Ai que saudades” de Ruth Rocha. Foi solicitado aos alunos que fizessem uma comparação entre a infância de Casimiro – vivenciada na zona rural – e a de Ruth Rocha – no meio urbano. Por serem tempos históricos bem distantes, foi-lhes sugerido que pesquisassem sobre as circunstâncias histórias em que os textos foram produzidos, bem como, a história de vida de cada poeta. Posteriormente, os educandos escreveram seus próprios poemas relatando a infância de cada um, ou uma infância idealizada.

Posteriormente, assistiram ao filme “Escritores da liberdade”. Trata-se de um filme americano produzido em 2007 por Richard La Gravenese. O filme narra a história verídica de uma professora que leciona em uma pequena escola de um bairro periférico dos Estados Unidos. Os alunos da instituição são adolescentes criados no meio de tiroteios e agressividade. Devido aos conflitos na sala de aula, adota novas metodologias. Solicita aos alunos que escrevam diariamente os conflitos familiares e existenciais que vivenciam no dia a dia.

4 - A ação que deflagra o conflito na história é a eminência do nascimento do filho da filha da preguiça. O conto brinca com a ação criada pela proximidade do parto e a demora no atendimento. Extrai humor da hipérbole, isto é, do exagero. O conto é narrado bem devagar, em câmera lenda – o que deixa o texto muito mais engraçado não apenas pelo que acontece na história, mas também, pelo jeito como a conta.

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Incentiva os alunos a lerem obras literárias com temas de guerra, objetivando com que os alunos percebessem a necessidade de tolerância mútua.

Após a exibição do filme, os alunos foram dispostos em equipes compostas de três alunos. Cada equipe teria que responder a uma série de questões relativas à exibição, tais como: a temática abordada, as cenas que mais chamaram a atenção e por que, os fatos acontecidos no filme e a relação com a realidade vivenciada pelos alunos, a síntese do filme e a mensagem que os educandos tiraram daquela apresentação cinematográfica.

Em outro momento, trabalharam-se três textos: I Carta de São Paulo aos Coríntios (Cap. 13, 1-13), cuja temática é o amor. Nele, o apóstolo fala sobre a necessidade de os cristãos terem amor aos gentios, serem fraternos àquelas pessoas não-cristãos. Os alunos de posse do texto bíblico, juntamente com as professoras das turmas estudaram, além do texto, a biografia do Apóstolo Paulo. A seguir, foi-lhes apresentado o Soneto IV de Camões. O soneto retrata o amor carnal – um sentimento que, de acordo com o poeta é forte, dói e queima. Novamente foram feitas análises sobre o poema, contextualizando a época vivenciada pelo poeta português, além é claro, de consulta à biografia do escritor. Para finalizar o estudo, foi apresentada às turmas, a música “Monte Castelo” escrito pelo cantor e compositor Renato Russo. Na letra, o poeta fala também sobre o amor, mas aquele vivenciado pelos soldados brasileiros quando tomaram o Monte Castelo, na Itália, durante a Segunda Guerra Mundial. Para ilustrar melhor a canção, foi exibido um clip da música. Um áudio com a análise literária da canção foi apresentado aos alunos. Nele, o crítico fala sobre o título, o contexto em que foi escrita a música, o porquê do título, além da intertextualidade existente na canção. Renato Russo se utiliza de dois outros textos para escrever a letra: um texto datado do ano 66, da Era Cristã e outro escrito no século XVI.

Às oitavas-séries, iniciamos o projeto exibindo o filme “Escritores da liberdade”. A partir do filme, os alunos se interessaram por outras leituras visto que, o conteúdo deste aborda, entre outras questões, o diário de Anne Frank. Isso fez com que nossos alunos quisessem conhecer a obra. Como tínhamos apenas um exemplar na biblioteca, imediatamente efetuamos a aquisição de outro, além é claro, de os alunos recorrerem a outras bibliotecas em busca do livro. Uma das professoras, explica que durante algum tempo lia em sala de aula alguns fragmentos do livro e que isso deixava os alunos ávidos pela leitura.

Outra professora solicitou à docente da disciplina de História que retomasse alguns aspectos ligados à II Guerra Mundial, em especial, ao holocausto. Feito isso, os alunos assistiram a um documentário sobre o holocausto, além do filme “A lista de Schindler”.

Ainda na mesma série, optamos por desenvolver um trabalho em que se privilegiavam filmes românticos, devido à fase em que os alunos se encontram. Dessa forma, trabalhamos com o filme “Tristão e Isolda”, seguido da leitura do livro. Para esse trabalho, foi contextualizado o período em que aconteceu a história: costumes e hábitos medievais, a guerra vivenciada pelos protagonistas, o amor que havia entre ambos, o comportamento das personagens, entre outros aspectos. Foi-lhes solicitado que fizessem uma comparação entre as cenas do filme e as do livro, verificando se havia entre ambos, semelhanças e diferenças.

Dando continuidade às atividades relativas à leitura nas oitavas-séries, exibimos o filme “Romeu e Julieta”. Trabalhamos a versão clássica e a contemporânea, protagonizado pelo ator Leonardo Di Caprio. A seguir, os alunos passaram à leitura da obra clássica. Pesquisaram sobre a Verona daquele período medieval e a Nova York da contemporaneidade – uma mega metrópole. Solicitamos que estabelecessem comparação entre a história de Tristão e Isolda e Romeu e Julieta, pois ambas retratam o amor e apresentam desfechos semelhantes.

Para finalizar o projeto na Escola Estadual Pedro Fecchio – Ensino Fundamental, solicitei que os alunos que quisessem, escrevessem sobre a importância da leitura no dia-a-dia. Semelhante pedido foi feito aos professores de Língua Portuguesa. Recolhi os textos e

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selecionei fragmentos deles. Transcrevi em cartolina e elaborei dois painéis: um com o conteúdo escrito pelos professores e outro, pelos alunos.

Nos dias 07 e 08 de julho de 2008, reuni no pátio da escola, cada turma separadamente, e fiz uma retrospectiva das atividades desenvolvidas desde o início do ano letivo de 2007, expus o pensamento dos professores sobre leitura e li, em conjunto com os alunos, fragmentos de textos produzidos por eles próprios.

Assim, não posso dizer que o projeto finalizou porque o trabalho com leitura é infinito, uma vez que, tudo depende dela. O que fizemos naquela escola foi somente instigar e conscientizar os alunos da necessidade da leitura em suas vidas.

Como sou docente do Curso de Formação de Docentes numa escola de Ensino Médio – Colégio Estadual Santos Dumont – Ensino Médio e Normal – e, leciono a disciplina de Metodologia de Português e Alfabetização nos 3º 4º Anos, achei oportuno aplicar parte do material que eu havia produzido, nas referidas turmas. Assim, conversei com a Coordenadora de Estágio do curso, bem como, com a diretora e encaminhei meu projeto para que elas avaliassem a pertinência ou não de sua aplicabilidade. Tendo tido apoio da coordenação e da direção, fiz uma capacitação docente, no período noturno, com carga horária de 20 horas. O curso aconteceu nos dias 05 a 09 de maio de 2008. Foram trabalhadas as seguintes temáticas: “Musicalização na educação infantil, Contos de fadas como recurso pedagógico, Contação de histórias: uma arte do tempo das avós, A magia do texto poético e O universo das fábulas.” Cada noite foi abordado um tema, com conteúdos sistematizados e uma algumas oficinas. Ao final do evento, os alunos receberam certificados pela participação. A capacitação contribui para que ampliassem os conhecimentos acerca da literatura infantil – já que serão futuros professores da educação infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental.

Outros encaminhamentos foram feitos com as duas turmas. Ambas tiveram posse dos dois materiais produzidos por mim. Discutimos, debatemos, socializaram em equipes os conhecimentos adquiridos e deram suas contribuições, sugerindo-me algumas atividades que poderiam fazer parte daqueles textos.

Percebi que ficaram entusiasmados com a diversidade textual presente na literatura infantil e abordados no curso, assim, achei que poderia ampliar as aprendizagens, se estendendo a outras pessoas, em especial aos professores de Educação Infantil e Séries Iniciais da Escola em que os alunos realizam seus estágios. Dessa forma, resolvemos socializar o projeto com a comunidade.

Nos dias 11 e 12 de agosto, fizemos uma mostra pedagógica intitulada “A literatura infantil no cotidiano escolar”. Os alunos foram divididos em cinco equipes. Cada uma desenvolveu uma temática. Os projetos foram-me entregues com bastante antecedência para que eu pudesse orientá-los quanto aos conteúdos, atividades e encaminhamentos que iriam abordar.

A equipe encarregada de desenvolver “A musicalização na educação infantil” justificou que o projeto serviria para demonstrar a importância que a música tem dentro da sala-de-aula para as crianças da educação infantil, além de incentivar os alunos e os professores a expressarem seus sentimentos, emoções, tristezas e alegrias e que, a criança interagindo com o adulto pode obter melhores resultados e o que é melhor, de forma prazerosa.

Além de sugerir encaminhamentos metodológicos aos professores, a equipe fez a explanação e leitura da música “Aquarela”, dos compositores Toquinho e Vinicius de Moraes, interpretada por Toquinho. Os alunos responsáveis por desenvolverem o tema “musicalização” consultaram alguns professores do colégio onde estudam, questionando sobre o significado da letra “Aquarela” e como poderia ser o trato metodológico em sala de aula, daquela canção.

Os alunos que desenvolveram a “Contação de histórias” alegaram ser imprescindível esse projeto cuja finalidade era demonstrar e ensinar aos professores uma nova forma de contar

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histórias, fazendo com que os alunos e o professor mergulhem nesse universo e se sintam dentro da história. Para comunicar o conteúdo utilizaram fantoches, com adequada trilha sonora e para finalizá-lo encenaram “Chapeuzinho vermelho politicamente correto”, do escritor americano James Finn Garner. A obra é uma versão adaptada aos novos tempos.

O terceiro grupo responsabilizou-se por trabalhar “O universo das fábulas”. Os alunos do grupo estabeleceram como objetivo principal a valorização das fábulas no cotidiano escolar. Expuseram aos participantes uma síntese da origem das fábulas, destacando os grandes fabulistas existentes no decorrer da história. Sugeriram diversos encaminhamentos para o trabalho em sala de aula. Por fim, encenaram a fábula “A tartaruga e a lebre”, é atribuída a Esopo (Séc. VI a. C) e, recontada pelo escritor e fabulista francês, Jean de La Fontaine (Séc. XVII).

Outro grupo trabalhou “A magia dos textos poéticos” focando para a importância desse gênero textual e que este tem ficado à margem do trabalho pedagógico nas escolas brasileiras. Salientou ser imprescindível que os professores resgatem o trabalho com o texto poético, não como pretexto para atividades gramaticais e ortográficas, mas sim, a poesia enquanto valor literário e refinamento da sensibilidade.

Os alunos destacaram alguns nomes de grandes poetas brasileiros e exibiram, em slides, trechos escritos de poetas consagrados, como Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e Manuel Bandeira onde os mesmos falam sobre a concepção que têm sobre o texto poético. Concluíram a exposição com a declamação da poesia “Das pedras “da poetisa e contista brasileira, Cora Coralina (1889-1985).

Por fim, ao último grupo, coube o papel de expor aos participantes “Contos de fadas como recurso pedagógico”. Tal projeto justifica-se pela importância de despertar nos professores o interesse pelo trabalho com contos de fadas, uma vez que, possibilita à criança o desenvolvimento da imaginação criadora e o gosto pela leitura – aspectos estes indispensáveis para a formação de uma criança em idade escolar.

Para a apresentação ao público, as alunas (em número de quatro), trajaram-se a rigor: Chapeuzinho, Bela Adormecida, Cinderela e Alice (no país das maravilhas). As estudantes foram ao longo da apresentação contando suas histórias e reclamando que os professores estão deixando de desenvolver esse trabalho com os alunos. Ao mesmo tempo, foram sugerindo formas de o professor realizar esse trabalho em sala de aula. Elas iam contando e passando folhas de um enorme livro cujo título era “Contos de fadas”.

Essas e outras atividades servem como ilustração e material para reflexão para que os professores façam de sua docência algo tão sublime que eleve a capacidade criadora e leitora dos alunos para muito além daquilo que eles fazem em sala de aula, ou seja, que os torne verdadeiros leitores da vida, do mundo, do cotidiano e que sejam capazes de poetizar, até mesmo, as coisas mais simples que existem na humanidade. “Esse papel, só o professor consegue desempenhar”.

2.3 As Diretrizes Curriculares para o Ensino da Língua Portuguesa: do estado de arte às práticas efetivas de aprendizagem

As Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa constituem-se num documento preliminar, cujo objetivo é repensar a prática pedagógica das escolas paranaenses e propor alternativas para a melhoria na qualidade de ensino. Portanto, objetivando se colocar como um instrumental propositivo para orientar os profissionais do ensino de Língua Portuguesa.

Através do documento, percebe-se que as práticas adotadas nas escolas, com relação ao processo de aquisição e no aprimoramento da língua materna que há ainda contextos que não

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privilegiam nem o sujeito, nem a história, mas sim, o uso de regras de e nomenclaturas. Processos estes que fazem do texto, apenas pretexto para trabalhar questões de ordem gramatical.

No tocante à literatura, a prática pedagógica, em geral, não proporciona aos alunos o contato com a integridade dos textos literários, uma vez que propõe a leitura de resumos e fragmentos de textos e breves biografias de seus autores.

Desde o início do ano de 2003, estabeleceu-se como linha de ação prioritária da Secretaria de Estado da Educação do Paraná, a retomada de discussão coletiva do currículo. A concepção adotada é de que o currículo é uma produção social, construído por pessoas que vivem em determinados contextos históricos e sociais; portanto, almeja-se uma intervenção a partir do que está sendo vivido, pensado e realizado nas escolas.

Durante dois anos, houve discussões, levantamento da situação concreta das escolas da Rede Estadual de Ensino do Paraná, cursos, eventos, reuniões técnicas e a sistematização das propostas curriculares por disciplina, níveis e modalidades de ensino. Nessa etapa, os professores foram os protagonistas que, elaboraram suas propostas de reformulação curricular.

A partir dos documentos elaborados coletivamente e encaminhados pela SEED para as escolas, foram feitas análises, discussões e encontros envolvendo os professores de todas as modalidades de ensino.

Por fim, as propostas foram implementadas e estão sendo avaliadas permanente e continuamente. Nesse processo de sistematização das Diretrizes Curriculares devem fazer parte as reflexões que contemplem: a visão de mundo, de homem e de escola; a concepção de educação, suas teorias e práticas; a contextualização da Educação frente à conjuntura nacional, os estudos da realidade sócio-econômica e cultural da região; o perfil do aluno e do professor paranaense, bem como da escola e dos órgãos colegiados; as diretrizes curriculares nacionais; a legislação educacional atualizada, os resultados de estudos de demandas, escolares e as bases dos projetos que compõem a cultura escolar.

A partir desta discussão, a base disciplinar foi a ênfase nos conteúdos científicos, nos saberes escolares das disciplinas que compõem a grade curricular. Dessa forma, o ensino da Língua Portuguesa passa a ser regido pela concepção sócio-interacionista onde se privilegia o texto, a partir de um trabalho pedagógico em que estejam articuladas as três práticas: a leitura, a produção oral/escrita e a análise lingüística.

O esforço é por superar uma prática de ensino da língua impregnada, ainda, de resquícios de uma visão pedagógica tradicional, em que o texto é visto, na maioria das vezes, como simples pretexto, em que a avaliação é considerada um fim e não meio, em que o professor mais reproduz do que reflete o que impede que se realize uma verdadeira interação educativa. Em seus relatos, os professores concordam que há uma descontextualização e a falta de sentido nas atividades de leitura e produção de textos e que isso colabora para o fracasso escolar.

Mas, pelo discurso docente, observa-se há professores que concebem o aluno como co-autor daquele texto, uma vez que também produz sentido: está dialogando não só com o autor, mas com outros textos que já foram produzidos e já lidos. Entram também as experiências partilhadas pelo leitor não só no contexto escolar, mas também fora dele. A leitura passa a ser vista, assim, como uma atividade de desafio para o aluno, pois não configura como um simples “desvelar de um mistério” presente no texto, mas como toda uma caminhada em busca de respostas que nos desafiam a encontrar razões ao dito e levantar hipóteses para o não-dito.

Na concepção interacionista a linguagem é interação, isto é, a forma de ação entre sujeitos histórica e socialmente situados que se constituem e constituem uns aos outros em suas relações dialógicas. A linguagem, nessa concepção pode ser considerada como trabalho e produto do trabalho.

É através da linguagem que o homem se reconhece como ser humano porque interage com outras pessoas, adquirindo experiências e conhecimentos e, portanto, compreende melhor o meio em que está inserido e o seu papel como um ser social.

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Afirma Bakhtin (1992, p. 113), dando ênfase à questão da interação:

Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que precede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro.

Isto significa dizer que o texto é articulação de discursos, ou seja, palavras minhas e de outros que, sendo alheias, tornam-se também minhas. Nesse sentido, o texto tem voz. Daí ser uma ação humana. Assim, as Diretrizes agora assumem uma concepção de linguagem como um ato social porque nasce da necessidade de interação entre as pessoas. Isso significa dizer que ela não nasce pronta, e sim quando as pessoas mergulham nessa corrente é que sua consciência desperta e começa a operar.

Para se inserir nessa corrente, é preciso que se considerem os aspectos sociais e históricos em que o sujeito está inserido, bem como o contexto de produção do enunciado, uma vez que os seus significados são sociais e historicamente constituídos.

Dessa forma, o ensino de Língua Portuguesa visa aprimorar os conhecimentos lingüísticos e discursivos dos alunos, para que eles possam compreender os discursos que os cercam e ter condições de interagir com esses discursos.

As práticas discursivas de oralidade, escrita e leitura presentes nas Diretrizes Curriculares pautam o trabalho em atividades planejadas que possibilitem ao aluno a leitura e a produção oral e escrita, assim como, a reflexão e o uso da língua em diferentes situações, isto é, que se priorize as práticas sociais.

Além disso, deve desenvolver uma prática de escrita escolar que considere o leitor, o destinatário e as finalidades, para se pensar o que escrever. Textos como poema, bilhete, texto científico ou de opinião e, não esquecendo de que a linguagem digital deve estar na sala de aula; que está na WEB também precisa habitar o universo escolar.

A prática de leitura então é vista como um processo de produção de sentidos que acontece a partir das relações dialógicas e sociais que acontecem entre leitor/texto/leitor. O conhecimento prévio do leitor, bem como, as experiências que o mesmo tem, contribuem para que a assimilação e as inferências aconteçam de forma mais clara, porque ele constrói, procura pistas, reformula hipóteses, aceita ou rejeita conclusões, usa estratégias baseadas em seu conhecimento lingüístico e na sua vivência sociocultural.

O documento sugere que o ensino seja abordado numa dimensão histórica e social, considerando o aluno como um sujeito – ativo no processo ensino-aprendizagem. Dá-se ênfase aos usos reais da língua, ou seja, o aluno aprenderá a ler e compreender textos e a produzir textos orais e escritos para defender seu ponto de vista, sugerir, convencer, interagir.

No que se refere à análise lingüística e as práticas discursivas, João Vanderlei Geraldi, em sua obra “O texto na sala de aula” (1984), apresenta uma nova perspectiva sobre o trabalho da Língua Portuguesa na escola, principalmente ao que se refere ao ensino da gramática. Afirma Geraldi que os alunos trazem para a escola um conhecimento prático dos princípios da linguagem, que assimilam pelas interações cotidianas que empregam em seus discursos para se comunicarem.

Isso nos leva a pensar que o trabalho com esses alunos deve voltar-se para a observação e análise da língua em uso, o que inclui as relações e diferenças entre língua oral e língua escrita. O professor deve analisar a coesão e coerência internas do texto, adequação do texto aos objetivos pretendidos e, ainda proceder à análise dos recursos expressivos utilizados.

Portanto, o professor deve criar oportunidades para o aluno refletir, construir, considerar hipóteses a partir da leitura e da escrita de diferentes textos, instância em que pode chegar à compreensão de como funciona a língua. O ensino da nomenclatura gramatical, de definições ou regras a serem construídas, com a mediação do professor, deve ocorrer somente após o aluno ter realizado a experiência de interação com o texto.

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Assim, o trato com a gramática deixa de ser trabalhado a partir de exercícios tradicionais, e passa a implicar que o aluno compreenda o que seja um bom texto, como é organizado, como os elementos gramaticais ligam palavras, frases, parágrafos.

O ensino da Língua Portuguesa durante muito tempo, foi ministrado utilizando conteúdos legitimados no âmbito de uma classe social dominante e pela tradição acadêmica escolar. Tais conteúdos, não conseguiram universalizar o domínio das práticas lingüísticas, no que se refere à norma culta.

As Diretrizes sugerem que o ensino se exerça pelos processos discursivos, numa dimensão histórica e social, cujo foco se concretiza nos usos reais da língua. Dessa forma, o aluno aprenderá a ler e compreender textos seja ele publicitário, reportagem, música, poema e a produzir textos orais e escritos para defender o seu ponto de vista, colocar-se diante de diferentes situações sociais, argumentando, contrapondo, convencendo.

A partir das considerações feitas, define-se o conteúdo estruturante da disciplina de Língua Portuguesa. Entende-se por conteúdo estruturante o conjunto de saberes e conhecimentos de grande dimensão, os quais identificam e organizam uma disciplina escolar. Os conteúdos estruturantes são: prática da oralidade, prática da escrita, prática da leitura e análise lingüística (contextualizada).

2.4 Práticas propostas nas Diretrizes Curriculares

A fala é a prática discursiva mais utilizada no dia-a-dia das pessoas. Por isso, as atividades orais precisam oferecer condições ao aluno de falar com fluência. As variantes lingüísticas são legitimadas no contexto atual da Língua portuguesa, uma vez que, são expressão de grupos sociais historicamente marginalizados em relação à centralidade ocupada pelo norma culta.

Por isso, deve planejar e desenvolver um trabalho com a oralidade que, gradativamente, permita ao aluno conhecer, usar também a variedade lingüística padrão e entender a necessidade desse uso em determinados contextos sociais.

O professor deve possibilitar ao aluno o trabalho com os gêneros orais apresentando temas variados como histórias de família, da comunidade, um filme, um livro. Solicitar depoimentos sobre situações marcantes e significativas vivenciadas pelo aluno ou pessoas do seu convívio. As dramatizações, os debates, seminários, júris-simulados são algumas atividades que contribuem para o desenvolvimento da argumentação. Trabalhos com recado, contação de histórias, troca de opiniões, declamação de poesias também facilitam o treino da oralidade.

O trabalho com os gêneros orais deve ser consistente. Além de ensinar o aluno a falar corretamente, a expressar com clareza suas idéias, deve-se avaliar o conteúdo de sua participação oral. Por isso, o professor primeiramente precisa selecionar os objetivos que pretende atingir com o gênero oral escolhido.

Quando por exemplo o professor propor um seminário, além de explorar o tema, é necessário ouvir sobre o contexto social de uso desse gênero, refletir sobre as características textuais, além de organizar a seqüência da apresentação, a relevância dos fatos presentes, a coesão e coerência do texto.

Ao participar de um debate, uma dramatização, a narração de um fato, a análise de programas televisivos como novelas, jornais, propagandas, o professor deve observar nos alunos a consistência das idéias, a argumentação, a entonação, a adequação da linguagem ao contexto, além da interação entre os participantes.

O objetivo do professor nesse caso é o de ensinar os alunos a expressarem suas idéias com segurança e fluência. Esse trabalho visa o aprimoramento lingüístico e a argumentação.

No que tange à prática da escrita, concebe-se como premissa de que o texto é o elo de interação social e os gêneros discursivos são construções coletivas. Há diversos gêneros que podem ser trabalhados em sala de aula para aprimorar a prática de escrita, tais como: aviso, notícia, editorial, convite, bilhete, carta, artigo de opinião, relatórios, carta do leitor, resultados

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de consultas bibliográficas, resultados de pesquisas, resumos, resenhas, solicitações, requerimento, crônica, conto, poema, relatos de experiências, receitas, e-mail, blog, orkut, entre outros.

O professor deve possibilitar aos alunos a socialização dos textos por eles produzidos fazendo uso de diversas estratégias como, por exemplo, afixar os textos dos alunos no mural escolar, reunir os diversos textos em uma coletânea, publicá-los em jornal da região, fazer intercâmbio com outras turmas para que os textos sejam socializados por todos os alunos, realizar exposição de textos à comunidade e aos pais.

Dessa forma, além de proporcionar o caráter dialógico e interlocutivo da linguagem, possibilitando aos estudantes constituírem-se agentes e sujeitos do fazer lingüístico, além de incentivar os alunos a produzirem textos significativos, incentiva-os à prática da leitura.

Com relação à prática da leitura, as Diretrizes propõem uma prática dialógica, interlocutiva, onde o aluno leitor passa a ter um papel ativo no processo de leitura porque ele é o responsável por reconstruir o sentido do texto, uma vez que, o leitor vai se familiarizando com diferentes textos produzidos em diferentes esferas sociais, ou seja, cotidiana, didático-pedagógica, científica, artística, literária, jornalística, midiática, entre outras.

É importante que o professor, ao encaminhar a prática de leitura em sala de aula, realize atividades que propiciem a reflexão e discussão do tema, do conteúdo veiculado, da finalidade, das ideologias apresentadas no texto, dos argumentos elaborados, da intertextualidade, além dos recursos lingüísticos e estilísticos apresentados na construção do texto.

Assim, as atividades de interpretação de texto precisam apresentar questões que levem o educando a construir um sentido para o que lê, que o faça retomar os textos, quantas vezes forem necessárias, para que tenha um verdadeira leitura, ou seja, a compreensão. As práticas discursivas possibilitam a leitura crítica dos textos e entender os valores ideológicos defendidos naquele texto.

Ao realizar a seleção dos textos e das obras a serem trabalhadas na escola, o professor precisa ter em mente que o seu papel é o de fazer com que o aluno tenha um amadurecimento nas leituras, ampliando o horizonte de expectativas. Por isso, o docente deve ser um leitor contínuo, porque precisa instrumentalizar o aluno no amadurecimento das opiniões a respeito do que lê. Deve-se portanto, considerar o contexto da sala de aula, os gostos e as preferências, as expectativas de leitura dos alunos e as sugestões sobre textos que gostariam de ler, para então oferecer textos cada vez mais complexos, que realmente ampliem as leituras dos estudantes.

A literatura, por estar instrinsecamente ligada à vida social, precisa estar sendo trabalhada cotidianamente em sala de aula porque ela não é somente apreensível em sua constituição, mas em suas relações dialógicas com outros textos. Esse diálogo que há entre leitor, texto e autor, de diferentes épocas, acaba por atualizá-la, o que releva sua constante atualização.

Dessa forma, a literatura busca formar um leitor capaz de sentir e de expressar o que sentiu, isto é, sua subjetividade, tendo em vista, a obra, o autor e o leitor. É sair da passividade e envolver-se, penetrar na intimidade do texto, porque toda obra está sujeita ao horizonte de expectativas de um público. O modo como cada leitor recebe o texto é único visto que, cada um dá uma interpretação, um entendimento peculiar, porque cada leitor tem uma recepção diferente.

O conhecimento da realidade sócio-cultural dos educandos, é fator importantíssimo para o trabalho com o texto literário. Inicialmente, deve apresentar-lhes textos que atendam a esse universo. Contudo, para que haja uma ampliação do conhecimento literário do escolar, textos que se distanciem das experiências de leitura dos alunos precisam ser trabalhados.

Deve-se levar tanto em consideração o universo vivido, quanto o universo sonhado, imaginado. O que está na imaginação de alguém, faz parte da sua realidade.

Para que as propostas das Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa e Literatura se concretizem no processo ensino aprendizagem, é indispensável o comprometimento político e pedagógico dos professores que, devem estar buscando novos conhecimentos e práticas

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condizentes com o perfil dos alunos para poderem no cotidiano escolar, colaborarem para que a aprendizagem se efetive.

3. CONSIDERAÇÒES FINAIS

A palavra escrita é o instrumento mais eficiente para a transmissão, expressão e fixação de uma cultura, bem como dos conhecimentos técnicos e científicos da sociedade. Isto porque a leitura é o meio mais importante para a aquisição de saberes e um instrumento básico para todo o sistema educativo.

Por ser a leitura de extrema importância na vida das pessoas deve começar cedo. É no seio familiar que o hábito deve começar a ser desenvolvido porque ensinar o gosto pela leitura em casa é tornar os filhos perspicazes e criativos. Por isso, deve-se contar e ler histórias, levá-los a conhecer livrarias, bibliotecas, feiras de livros e deixá-los à vontade para escolherem os livros de sua preferência, isso porque a individualidade do leitor determinará o interesse e o gosto pela leitura.

Assim como a família, a escola também exerce um papel fundamental no estímulo à leitura. O primeiro passo para a formação do hábito de ler na escola diz respeito à seleção do material e a forma pela qual será trabalhado. Ao escolher um livro, o professor deve levar em consideração a realidade de seus alunos, idade e o interesse pelo tema, além é claro, de dispor de recursos atrativos como massinhas de modelar, sucatas e brinquedos, para que os alunos criem em cima do enredo e avancem para além dele.

Uma das maneiras de iniciar o hábito de leitura nos alunos é através dos clássicos. Eles são a base de tudo, porque a leitura de livros essenciais para a formação do ser humano passa pelos clássicos. Como a leitura dos clássicos modernos, são mais agradáveis aos jovens, pode-se iniciar por elas. É o caso de ler os poemas de Carlos Drummond de Andrade, um trecho de uma obra de Clarice Lispector, Guimarães Rosa, ou um conto de Machado de Assis, por exemplo.

A escola que dá especial atenção à essa temática, além de fornecer espaços específicos para a leitura (biblioteca, sala de leitura), proporciona a seus alunos o acesso a bons livros, jornais, revistas e vídeos, para que eles possam usufruir desse acervo e escolher o gênero literário com o qual se identifica.

Quando o hábito da leitura é incentivado ao longo da vida de uma pessoa, com certeza aumentam as possibilidades de que se torne uma pessoa crítica e culturalmente rica. Quem lê muito, descobre naturalmente as formas de se expressar, comparar idéias e estilos, se enriquece com novas experiências, conhece melhor o mundo e um pouco melhor de nós mesmos, pois nos deixa preparados para formar opiniões próprias sobre os assuntos.

As Diretrizes Curriculares apontam para a necessidade de se usar a língua oral e escrita em práticas sociais, isso porque através delas os alunos efetuam diferentes operações com a linguagem, refletindo sobre as diversas possibilidades de uso da língua. Dessa forma, permite-lhes o aperfeiçoamento lingüístico constante, tornando-os indivíduos letrados.

E o letramento passa necessariamente pelo trabalho com a diversidade textual. Através de atividades com fábulas, por exemplo, pode-se desenvolver o hábito, o gosto e o prazer pela leitura e pela escrita, porque se trata de um texto muito simples e geralmente atraente para o jovem. E nestes tempos em que vivemos uma crise ou incertezas sobre ética e valores, a fábula se presta muito bem para os debates sobre a nossa vida real.

Outro exemplo de texto a ser trabalhado com os alunos é a poesia – gênero um tanto esquecido devido as marcas de nossa era pós-moderna - esta é de extrema importância ao ser humano, uma vez que, cria seres capazes de ler além da letra impressa, além da palavra dita. Para o trabalho com a poesia com alunos em idade acima de 12 anos, um filme poético bastante atrativo é “O poeta e o Carteiro”. O filme foi produzido em 1994. Narra a história (fictícia) entre o poeta Pablo Neruda e um carteiro.

Além da fábula e da poesia, a crônica, o romance, o conto, devem fazer parte do universo escolar, tanto na educação infantil, quanto no ensino médio, trabalhando-se

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necessariamente a leitura, a produção textual e a análise lingüística, tendo como ponto de partida o texto. É a partir dele que será desenvolvida a oralidade, a escrita e a leitura.

Portanto, ao se trabalhar essas práticas discursivas, o aluno entra em contato com a linguagem, nas diferentes esferas sociais, permitindo-lhe compreender melhor a realidade em que está inserido e o seu papel como sujeito social. É utilizando a língua oral e escrita em práticas sociais, seja realizando operações com a linguagem e refletindo sobre as diferentes possibilidades de uso da língua que a aprendizagem efetivamente acontece.

À medida que um bom leitor descobre o significado literal de uma passagem, ele se envolve em vários passos, isto é, faz referência, vê implicações, julga a validade e qualidade, eficiência ou adequação das idéias, compara os pontos de vista de autores diferentes, aplica as idéias adquiridas às novas situações, soluciona problemas e integra as idéias lidas com as experiências prévias.

A aprendizagem da leitura sempre se apresenta intencionalmente como algo mágico, senão enquanto ato, enquanto processo de descoberta de um universo desconhecido e maravilhoso. Parodiando Paulo Freire “ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém educa a si mesmo; os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo”. Refletindo melhor se poderia dizer: ninguém ensina ninguém a ler. O aprendizado é, em última instância, solitário, embora se desenvolva na convivência, cada vez mais com os outros e com o mundo.

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