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O espaço do advogado no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) como trabalhador das “Equipes de Referência” dos serviços socioassistenciais. Ana Paula Pereira Flores* Resumo: A assistência social surge como uma política pública na Constituição Federal Brasileira de 1988 como parte integrante da Seguridade Social Brasileira (art. 194) 1 , ao lado da saúde e da previdência social. Em 1993 foi regulamentada pela Lei Federal nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993 Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), tendo sido atualizada em 06 de julho de 2011 pela Lei Federal nº 12. 435, que dentre outras importantes providências instituiu legalmente o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), definindo os seus serviços por níveis de proteção. Os serviços do SUAS passam a ter suas “Equipes de Referência” definidas na Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS – NOB/RH SUAS, aprovada pela Resoluçã o do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) nº 269, de 13 de dezembro de 2006 e atualizada pela Resolução CNAS nº 17, de 20 de junho de 2011. O objetivo deste artigo é explicitar e fortalecer o espaço de atuação do advogado no SUAS, enquanto membro integrante destas equipes, na expectativa de um trabalhador efetivo principalmente no âmbito dos municípios, com suas atribuições específicas voltadas para a garantia e proteção dos direitos dos usuários da política pública de assistência social, e defesa destes quando violados. PALAVRAS-CHAVE: Advogado. Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Equipes de Referência. 1 INTRODUÇÃO A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 a política de assistência social passa a protagonizar um novo momento no cenário brasileiro, qual seja, o início da transição de uma política assistencialista, até então, prestada na lógica do favor e da benesse, realizada por voluntários e, muitas vezes vinculada a favores políticos, para uma política pública integrante da Seguridade Social do país, que tem buscado implementar uma importante mudança de concepção, que é o fortalecimento do papel do Estado na garantia dos direitos e protetor da violação destes. A partir de sua instituição como política pública pela Constituição, a assistência social foi regulamentada pela Lei Federal nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993 Lei * Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 1 Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

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O espaço do advogado no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) como trabalhador

das “Equipes de Referência” dos serviços socioassistenciais.

Ana Paula Pereira Flores*

Resumo: A assistência social surge como uma política pública na Constituição Federal

Brasileira de 1988 como parte integrante da Seguridade Social Brasileira (art. 194)1, ao lado

da saúde e da previdência social. Em 1993 foi regulamentada pela Lei Federal nº 8.742, de 07

de dezembro de 1993 – Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), tendo sido atualizada em

06 de julho de 2011 pela Lei Federal nº 12. 435, que dentre outras importantes providências

instituiu legalmente o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), definindo os seus

serviços por níveis de proteção. Os serviços do SUAS passam a ter suas “Equipes de

Referência” definidas na Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS –

NOB/RH SUAS, aprovada pela Resoluçã o do Conselho Nacional de Assistência Social

(CNAS) nº 269, de 13 de dezembro de 2006 e atualizada pela Resolução CNAS nº 17, de 20

de junho de 2011. O objetivo deste artigo é explicitar e fortalecer o espaço de atuação do

advogado no SUAS, enquanto membro integrante destas equipes, na expectativa de um

trabalhador efetivo principalmente no âmbito dos municípios, com suas atribuições

específicas voltadas para a garantia e proteção dos direitos dos usuários da política pública de

assistência social, e defesa destes quando violados.

PALAVRAS-CHAVE: Advogado. Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Equipes de

Referência.

1 INTRODUÇÃO

A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 a política de assistência

social passa a protagonizar um novo momento no cenário brasileiro, qual seja, o início da

transição de uma política assistencialista, até então, prestada na lógica do favor e da benesse,

realizada por voluntários e, muitas vezes vinculada a favores políticos, para uma política

pública integrante da Seguridade Social do país, que tem buscado implementar uma

importante mudança de concepção, que é o fortalecimento do papel do Estado na garantia dos

direitos e protetor da violação destes.

A partir de sua instituição como política pública pela Constituição, a assistência

social foi regulamentada pela Lei Federal nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993 – Lei

* Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 1 Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos

Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

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Orgânica da Assistência Social (LOAS), passando a definir seu conceito

2, seus objetivos

(art. 2º), seus princípios (art. 4º) e diretrizes (art. 5º), e ainda estabelecendo algumas

garantias fundamentais, mas principalmente determinando que: deva ser o Estado, por meio

dos governos municipais, estaduais e federal, o agente promotor dessas garantias e dos

direitos constitucionalmente estabelecidos, inaugurando, assim, uma nova fase para a

cidadania brasileira.

A LOAS já previa em seu artigo 6º3 desde 1993, que sua gestão e execução se dariam

através de um sistema descentralizado e participativo, mas que de fato só foi instituído

legalmente em 06 de julho de 2011, quando da atualização desta, e com o reconhecimento

legal do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).

O SUAS teve sua efetivação deliberada de fato na IV Conferência Nacional de

Assistência Social ocorrida em Brasília em dezembro de 2003, tendo sua materialização se

efetivado principalmente a partir da aprovação de um amplo aparato legal, dos quais podem

ser destacados:

1993 – Lei Federal nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 – Lei Orgânica

da Assistência Social – LOAS;

2004 – Política Nacional de Assistência Social (PNAS), aprovada pela

Resolução CNAS nº 145, de 15 de outubro de 2004;

2005 – Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência

Social (NOB–SUAS), aprovada pela Resolução CNAS nº 130, de 15 de julho de

20054;

2006 – Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS

(NOB–RH SUAS), atualizada pela Resolução CNAS nº 17, de 20 de junho de

2011;

2007 – Decálogo dos Direitos Socioassistenciais, aprovado na VI

Conferência Nacional de Assistência Social realizada em Brasília, em 2007;5

2 Art. 1º A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade

Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas. 3 Art. 6º A gestão das ações na área de assistência social fica organizada sob a forma de

sistema descentralizado e participativo, denominado Sistema Único de Assistência Social (Suas), com

os seguintes objetivos: (“Caput” do artigo com redação dada pela Lei nº 12.435, de 6/7/2011) 4 A NOB/SUAS 2005 foi expressamente revogada pela NOB/SUAS 2012.

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2009 – Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (TNSS),

aprovada pela Resolução CNAS nº 109, de 11 de novembro de 2009 e suas

atualizações;

2011 – Lei Federal nº 12.435, de 6 de julho de 2011, que atualizou e

acrescentou dispositivos na LOAS;4

2012 – Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência

Social (NOB – SUAS), aprovada pela Resolução CNAS nº 33, de 12 de dezembro

de 2012.

O objetivo do presente artigo é explicitar e fortalecer a discussão acerca da

importância das “Equipes de Referências” definidas pela NOB/RH SUAS 2006 serviços

socioassistencias, e principalmente tratar da importância da presença do profissional

advogado nestas equipes, bem como nas equipes de gestão, visto que a partir das

regulamentações vigentes passa a ser reconhecido com um trabalhador efetivo da política

pública de assistência social6.

2 OS PERCURSOS DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL (SUAS) A

PARTIR DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 e, posteriormente, com a

aprovação da LOAS em 1993, a política pública de assistência social está em um contínuo

processo de implantação e implementação pelos três entes federados.

O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) é um sistema público não

contributivo, descentralizado e participativo, previsto incialmente pela LOAS (artigo 6º) em

1993, mas que teve de fato sua implementação iniciada a partir de importante deliberação

aprovada na IV Conferência Nacional de Assistência Social em 2003, posteriormente

regulamentada pela NOB–SUAS 2005, e só então instituído legalmente a partir da atualização

da LOAS em 2011, pela Lei Federal nº 12.435, de 6 de junho de 2011.

5 Os 10 Direitos Socioassistenciais são: 1 – Todos os direitos de proteção social de

assistência social consagrados em Lei para todos: 2 – Direito de equidade rural-urbana na proteção social não contributiva; 3 – Direito de equidade social e de manifestação pública; 4 – Direito à igualdade do cidadão e da cidadã de acesso à rede socioassistencial; 5 – Direito do usuário à acessibilidade, qualidade e continuidade; 6 – Direito em ter garantida a convivência familiar, comunitária e social; 7 – Direito à Proteção Social por meio da intersetorialidade das políticas públicas; 8 – Direito à renda; 9 – Direito ao cofinanciamento da proteção social não contributiva; 10 – Direito ao controle social e à defesa dos direitos socioassistenciais 6 Conforme a NOB/RH SUAS 2006 os “trabalhadores da assistência social”: são todos

aqueles que atuam institucionalmente na política pública de assistência social, conforme preconizado na LOAS, na PNAS e no SUAS, inclusive quando se tratar de consórcios intermunicipais e entidades e organizações de assistência social.

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O SUAS organiza e operacionaliza a política pública de assistência social na

perspectiva da universalização de direitos, e padroniza a sua gestão e execução em todo o

território brasileiro. Tem por funções: a proteção social, a vigilância socioassistencial e a

defesa de direitos (art. 2º LOAS), e se materializa através da provisão e da oferta de projetos,

programas, serviços e benefícios socioassistenciais. Foi inspirado aos moldes do Sistema

Único de Saúde (SUS), organizando seus programas e serviços de assistência social de forma

territorializada e instalando suas unidades de atendimento em comunidades com maiores

indicadores de vulnerabilidade social dos municípios brasileiros.

O SUAS, conforme definido pela LOAS, organiza as ações da assistência social em

dois tipos de proteção social: a) Proteção Social Básica: destinada à prevenção de riscos

sociais e pessoais; ao desenvolvimento de potencialidades e aquisições, além do

fortalecimento dos vínculos familiares, por meio da oferta de programas, projetos, serviços e

benefícios a indivíduos e famílias em situação de vulnerabilidade social de forma

territorializada (art. 6ºA), donde se destacam, como principais serviços, as unidades públicas

denominadas Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) (art. 6ºC, §§1º, 3º), que

ofertam o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF) (art. 24A); b)

Proteção Social Especial: destinada a famílias e indivíduos que já se encontram em situação

de risco e que tenham tido algum(ns) de seus direitos violados, por ocorrência de abandono,

maus-tratos, abuso sexual, uso de drogas, entre outros. A Proteção Social Especial se

subdivide em Média Complexidade, donde se destacam como principais serviços os Centros

Especializados de Assistência Social (CREAS) (art. 6ºC, §§2º, 3º), que ofertam o Serviço de

Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI) (art. 24B), e de Alta

Complexidade, em que se destacam, como principais os Serviços de Acolhimento

Institucional, que se subdivide em: Abrigo Institucional, Casa-Lar, Casa de Passagem e

Residência Inclusiva. Os serviços de assistência social estão definidos expressamente na

Tipificação Nacional dos Serviços de Assistência Social (TNSS 2009) e suas atualizações.

Relevante registrar que a PNAS 2004 também definiu os usuários da política de

assistência social a serem atendidos pelos seus serviços:

Constitui o público usuário da política de Assistência Social,

cidadãos e grupos que se encontram em situações de vulnerabilidade e

riscos, tais como: famílias e indivíduos com perda ou fragilidade de

vínculos de afetividade, pertencimento e sociabilidade; ciclos de vida;

identidades estigmatizadas em termos étnico, cultural e sexual;

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desvantagem pessoal resultante de deficiências; exclusão pela pobreza

e, ou, no acesso às demais políticas públicas; uso de substâncias

psicoativas; diferentes formas de violência advinda do núcleo familiar,

grupos e indivíduos; inserção precária ou não inserção no mercado de

trabalho formal e informal; estratégias e alternativas diferenciadas de

sobrevivência que podem representar risco pessoal e social (PNAS

2004 p. 27)

Também definiu os eixos estruturantes dos SUAS, quais sejam: matricialidade

sociofamiliar, descentralização político-administrativa e territorialização, definiu novas bases

para a relação entre Estado e sociedade civil, financiamento público, controle social,

participação popular cidadão/usuário, política de recursos humanos, informação,

monitoramento e avaliação.

. O SUAS envolve também a oferta de benefícios de assistência social prestados a

públicos específicos, de forma articulada aos demais serviços, programas e projetos, buscando

contribuir para a superação de situações de vulnerabilidade. Dentre eles destacamos o

Benefício da Prestação Continuada (BPC)7, destinado às pessoas com deficiência e às

pessoas idosas com 65 anos ou mais que não consigam suprir suas necessidades ou tampouco

por sua família, regulamentados pelos artigos 20 e 21 da LOAS e pelo Decreto Federal nº

6.214, de 26 de setembro de 2007. Também os Benefícios Eventuais (BE), provisões

suplementares e provisórias voltados aos cidadãos e às famílias em situações de morte,

nascimento e outras situações de vulnerabilidades temporárias e de calamidade pública,

estando previstos no artigo 22 da LOAS e no Decreto Federal nº 6.307, de 26 de setembro de

2007.

O SUAS também gerencia a vinculação de entidades e organizações de assistência

social ao sistema, atualmente em ativo processo de constituição e reconhecimento da “Rede

Socioassistencial Privada do SUAS”, previstas no artigo 3º da LOAS, e com normatização na

Resolução do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) nº 14, de 15 de maio de 2014.

Também relevante registrar que as organizações da sociedade civil8, inscritas nos Conselhos

7 Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à

pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não

possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (“Caput” do artigo com redação dada pela Lei nº 12.435, de 6/7/2011). 8 A regulação das parcerias entre a União, Estados e Municípios foi recentemente

regulamentada pela Lei Federal nº 13.019, de julho de 2014, sendo que neste momento atual está em processo de Consulta Pública o decreto complementar acerca deste assunto.

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Municipais de Assistência Social (CMAS) e reconhecidas como integrantes desta rede podem

executar de forma indireta ações de assistência social conforme previsão da Tipificação

Nacional de Assistência Social (TNSS 2009 e suas atualizações).

Em relação ao número atual de “trabalhadores do SUAS”, conforme dados do Censo

SUAS 20139, atualmente a “Rede Socioassistencial do SUAS” conta com aproximadamente

586.600 mil trabalhadores, sendo em torno de 260.000 vinculados à Rede Pública e 326.800

vinculados à Rede Privada.

Também, exercendo o controle social e público da política de assistência, estão os

Conselhos de Assistência Social reconhecidos inicialmente como formas de participação

popular na gestão das políticas públicas, pela Constituição Federal de 1988 e, no caso

específico desta política, reconhecidos no art. 16 da LOAS. São eles: o Conselho Nacional de

Assistência Social (CNAS), os Conselhos Estaduais de Assistência Social (CEAS) e os

Conselhos Municipais de Assistência Social (CMAS). Também normatizados nos artigos 113

a 124 da NOB–SUAS 2012.

Em relação a alguns dados acerca da implantação de serviços de assistência social no

Brasil que se iniciaram a partir do ano de 2003, se destacam os CRAS e os CREAS. Segundo

dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic 2013) do Instituto Brasileiro de

Geografia (IBGE)10

, os CRAS apresentaram um incremento de 44,9% do ano de 2009 a 2013

contando com 7.507 unidades até a presente data. Já os CREAS passaram por uma ampliação

de 79,9% no mesmo período, registrando no país a existência de 2.318 unidades até o

momento. Relevante registrar que até a presente data, o Brasil conta com 5.564 municípios

(IBGE 2013).

O SUAS é um sistema de proteção social em constante e acelerado processo de

implantação e fortalecimento, a partir da articulação dos três entes federados, dos seus

respectivos Conselhos de Assistência Social, de seus gestores, de seus trabalhadores, dos

usuários e ainda da sociedade brasileira como um todo, o que fundamentam todos os esforços

9 O Censo do Sistema Único de Assistência Social – Censo SUAS foi instituído pelo Decreto

Federal nº 7.334, de 19 de outubro de 2010, e tem por finalidade coletar informações sobre os serviços, programas, projetos de assistência social realizados no âmbito das unidades públicas de assistência social e das entidades e organizações da rede socioassistencial privada. 10 Conforme dados do IBGE 2013, o brasil conta com 5.564 municípios e o RS com 497.

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no intuito de efetivamente alcançarmos os objetivos por ele proposto como um sistema

garantidor de direitos da população brasileira que de sua proteção necessitar.

3 A ATUAÇÃO DO ADVOGADO NO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL

(SUAS)

Quando se passa a tratar especificamente da atuação do advogado no âmbito do

SUAS, além da previsão constante na NOB–RH SUAS 2006, atualizada pela Resolução

CNAS nº 17/2011, não há maiores fundamentações, sejam legais ou teóricas11

, acerca da

presença deste profissional neste sistema, o que com certeza é uma das principais

dificuldades para o fortalecimento desta função na política atual, ou seja, é possível afirmar

que, embora havendo a regulamentação supramencionada, ela ainda não está no plano do

real, palpável, factível, estando sua existência ainda em processo de amadurecimento,

enquanto um “trabalhador do SUAS”, efetivamente.

A partir da atual estrutura de serviços do SUAS já regulamentada, e a partir das

normativas acerca das “Equipes de Referência” preconizadas principalmente pela NOB/RH

SUAS 2006 e sua atualização, é possível observar o registro da presença do Advogado nas

Equipes de Referência dos seguintes serviços:

a) Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua –

Centro POP:

01 Coordenador (a)

02 Assistentes Sociais

02 Psicólogos (as)

01 Técnico de nível superior, preferencialmente com formação em Direito,

Pedagogia, Antropologia, Sociologia, ou Terapia Ocupacional.

04 Profissionais de nível superior ou médio para a realização do Serviço

Especializado em Abordagem Social (quando ofertado pelo Centro POP, e/ou para o

desenvolvimento de oficinas socioeducativas, dentre outras atividades.

11

Relevante registrar que está em processo de construção através do Edital Nº 91/2014 –

Projeto PNUD/BRA/12/2006 disponibilizado pelo MDS em setembro de 2014, o mapa das competências e atribuições dos cargos e especificidades do trabalho das equipes de gestão e de referência dos serviços.

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02 Auxiliares Administrativos

* Capacidade de atendimento do serviço/mês: 80 casos (famílias ou indivíduos)

Fonte: Orientações Técnicas Centro POP – Volume III - MDS 2011

b) Equipe de Gestão do SUAS:

Poderão compor as Equipes de Gestão do SUAS: Assistente Social, Psicólogo,

Advogado, Administrador, Antropólogo, Contador, Economista, Economista

Doméstico, Pedagogo, Sociólogo e Terapeuta Ocupacional.

Fonte: NOB/RH SUAS 2006, atualizada Resolução CNAS nº 17, de 20 de junho de

2011.

c) Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS):

Municípios Capacidade de

Atendimento/Acompanhamento

Equipe de Referência

Porte Nível

de

Gestão

Pequeno

Porte I e

II e

Médio

Porte

Gestão

Inicial,

Básica

ou

Plena

50 casos (famílias/indivíduos) 01 Coordenador (a)

01 Assistente Social

01 Psicólogo (a)

01 Advogado (a)

02 Profissionais de nível

superior ou médio

(abordagem dos usuários)

01 Auxiliar Administrativo

Grande

Porte,

Metrópo

le e DF

Gestão

Inicial,

Básica

ou

Plena

50 casos (famílias/indivíduos) 01 Coordenador (a)

02 Assistentes Sociais

02 Psicólogos (as)

01 Advogado (a)

04 Profissionais de nível

superior ou médio

(abordagem dos usuários)

02 Auxiliares

Administrativos

Fonte: NOB/RH SUAS 2006, atualizada Resolução CNAS nº 17, de 20 de junho de

2011;

Orientações Técnicas CREAS – MDS 2011

O profissional advogado surge neste contexto como uma figura indispensável na

concretização do Direito, no âmbito da política de assistência social, como operacionalizador

do “Direito à Assistência Social”.

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Com certeza a presença do advogado, de forma legítima e qualificada na política de

assistência social, mais especificamente no âmbito do SUAS, estará ampliando as áreas de

atuação deste profissional na gestão pública, até hoje mais focada na prestação tradicional do

campo privado, facilitando e contribuindo assim para o fortalecimento do exercício da

cidadania pelos cidadãos, principalmente os mais vulneráveis, através da viabilização do

acesso aos direitos sociais, direitos socioassistencias e outros, que já estejam

constitucionalmente ou legalmente regulamentados e/ou que venham a ser garantidos.

A partir das definições acima ficam evidenciados os espaços de atuação do advogado

no SUAS, bem como a importância de sua presença nestes serviços que atuam principalmente

na proteção dos direitos de indivíduos e famílias em situações de vulnerabilidade pessoal e

social, e ainda de forma mais relevante quando da violação destes, além da área da gestão da

política.

No que refere a presença dos advogados nos CREAS no estado do Rio Grande do Sul

(RS), conforme consulta aos dados públicos do CADSUAS12

, módulo Rede Socioassistencial

– CREAS – aba Recursos Humanos foi possível constatar que até a data da pesquisa13

, em

um universo de 497 municípios, existiam no RS 115 unidades CREAS em funcionamento,

distribuídos em 103 municípios, sendo 16 deles de pequeno porte I (16%), 42 de pequeno

porte II (42%), 24 de médio porte (24%), 18 de grande porte (18%) e 01 metrópole, no caso a

capital Porto Alegre.

Em relação à presença do advogado nestes espaços foi possível constatar o registro

de 45 profissionais atuando em CREAS no RS até a data da pesquisa.

Quanto à forma de contratação/vínculo empregatício, com base nos dados constantes

no sistema, destes 45 advogados atuantes nos CREAS: 16 profissionais constam na

classificação “outro vínculo não permanente” (35%) provavelmente contratos de prestação de

serviços com a administração pública, portanto temporários, 13 profissionais são Cargos

12

O CadSUAS é o Sistema de Cadastro do SUAS (Sistema Único de Assistência Social), instituído pela Portaria nº 430, de 3 de dezembro de 2008. Nele são inseridas informações cadastrais da Rede Socioassistencial, Órgãos Governamentais e trabalhadores do SUAS. Dados públicos acessível em: http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/redesuas/cadsuas 13

A pesquisa em questão aos dados do CadSuas foi realizada em 30 de julho de 2014. É relevante registrar que os dados do aplicativo não se demonstraram fidedignos na data da consulta, visto que no total de 116 itens encontrados, alguns CREAS se repetiam, gerando a necessidade de que autora complementasse a pesquisa manualmente, excluindo da sistematização os dados dos serviços que se repetiam.

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Comissionados (CC’s) (28%), 15 são servidores públicos efetivos (33%) e 01 é voluntário

(4%).

Analisando brevemente os dados acima e constantes no aplicativo acerca da atuação

do advogado nos CREAS do RS já é possível alcançar algumas percepções, embora de forma

empíricas visto que a pesquisa não tem cunho científico:

a) A forma de acesso predominante dos advogados ao SUAS/CREAS ainda é de

forma não efetiva/permanente, ou seja, o acesso via concursos públicos não predomina

conforme preconizam as normativas;

b) Observando também as datas de criação dos CREAS é possível constatar que

os serviços criados mais recentemente como de 2012 a 2014, contam com a presença do

advogado como servidor público efetivo, o que pode demonstrar um amadurecimento do

processo de implantação dos CREAS desde 2005.

c) Os dados do sistema CadSUAs não possibilitam visualizar se o advogado que

se encontra na configuração de servidor público efetivo atuando nos CREAS do RS, realizou

concurso público específico para a política de assistência social, ou se trata de um profissional

remanejado de outro espaço público, o que poderá comprometer a atuação deste profissional

no CREAS, que via de regra, se não passar por um processo de atualização acerca da

legislação da assistência e outras garantidoras de direitos (ECA, Estatuto Idoso, Lei Maria da

Penha etc) pode não atingir os objetivos dos serviços;

d) Que a maioria dos CREAS estão implantados em municípios de pequeno porte

II, o que pode justificar a ausência deste profissional pelas dificuldades de efetivação do

SUAS principalmente em municípios pequenos. Essa afirmação é empírica e se embasa

estritamente na atuação da autora na área da gestão da assistência social em seu município de

origem, e com base em dados que ainda não são oficiais;

e) Fica evidenciada a necessidade da ampliação da atuação do advogado na

esferas das políticas públicas, visto que o mesmo sempre teve uma atuação focada

principalmente na iniciativa privada.

Também fica visível a partir dos dados apresentados que a presença do advogado

embora já existente, ainda é frágil, e necessita de discussões e fortalecimentos por parte dos

gestores federal, estaduais, mas prioritariamente pelos municipais, visto serem os municípios

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o principal lócus de atuação deste profissional no âmbito da assistência social, mais

especificamente no SUAS.

Com isso, é esperado que as informações disponibilizadas neste artigo pudessem

estar fazendo cumprir o objetivo inicialmente registrado que é o de legitimar o SUAS como

uma área legítima de atuação do advogado, e ainda problematizar o fortalecimento da

presença deste profissional nestes espaços, bem como contribuir para a ampliação dos espaços

de atuação do advogado nas gestões públicas, prioritariamente em sede da política pública de

assistência social.

Também se justifica a presença do advogado como um protetor dos direitos das

crianças, adolescentes e idosos, sendo estes públicos prioritários dos CREAS, quando em

situação de vulnerabilidade pessoal e social ou violação de seus direitos.

5 CONCLUSÃO

A atuação do advogado no SUAS, se apresenta neste momento de fortalecimento da

implementação do sistema, principalmente na área dos recursos humanos, como um de seus

grandes desafios.

Este tema traz para o cenário a discussão da efetiva implantação e implementação do

SUAS no que concerne os seus recursos humanos, e a necessária qualidade dos mesmos para

que o sistema realmente cumpra seu papel de parte integrante da proteção social brasileira.

Também elucida um ponto bastante polêmico na efetivação da assistência social

como política pública de seguridade social, que é dificuldade da implementação de seus

recursos humanos de forma efetiva, pública e permanente, visto que, historicamente, a mesma

sempre foi executada por trabalhadores voluntários ou a ela vinculados por meio de formas de

contratação não permanentes, que não eram o ingresso via concurso público.

Demonstra a urgente necessidade de efetivação da atuação de advogados no âmbito

das políticas sociais públicas, mas especificamente na política pública de assistência social,

face ao seu papel de garantidora de direitos e protetora destes quando de suas violações.

Também, sendo a intersetorialidade entre as políticas públicas um grande desafio a

ser implementado já anteriormente ao SUAS, renova-se que a necessidade da constituição

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das Equipes de Referência com certeza será um fator determinante para o alcance do trabalho

em rede no âmbito das políticas públicas.

Por fim, considerando que a política de assistência social passa a assumir um caráter

de política pública garantidora de direitos, em substituição ao caráter assistencialista

historicamente consagrado, é mister que todo este processo de discussão se fortaleça de forma

equânime e qualificada por todo o país, para que de fato o SUAS se efetive concretamente

como planejado desde a sua concepção.

REFERÊNCIAS:

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em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em:

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– LOAS - Dispõe sobre a organização da assistência social e dá providências. Brasília, DF,

1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8742.htm>. Acesso em:

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Assistência Social – PNAS. Brasília, DF, 2004.

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Básica de Recursos Humanos do Sistema Único de Assistência Social (NOB–RH SUAS).

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Serviços Socioassistenciais. Brasília, DF, 2009.

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Técnicas: Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS). Brasília, DF,

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Técnicas: Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua. Brasília,

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http://www.mds.gov.br/gestaodainformacao/monitoramentodosuas. Acesso em julho 2014.