renascimento cultural

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Texto escrito por mim sobre Renascimento Cultural

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Page 1: Renascimento Cultural

RenascimentoCultural

RenascimentoCultural

“Que obra de arte é o homem; tão nobre no raciocínio; tão vário na capacidade; emforma e no movimento, tão preciso e tão admirável. Na ação é como um anjo, no entendimento é

como um Deus, a beleza do mundo; o exemplo dos animais”.Shakespeare - Hamlet

O final da Idade Média foi para os habitantes do mundo ocidental, uma época de dúvida, ansiedade e expectativa

de mudanças. Há muito, as rotas de comércio interli-garam o Oriente com o Ocidente. As cidades ocupa-vam o espaço dos feudos, dinamizadas pelo capitalburguês que aumentava a cada minuto. A sociedademoderna nascida do ventre da sociedade medieval,carecia de renovação cultural que libertasse os artistasda influência teocêntrica exercida pela Igreja Católica.As mudanças transformavam o universo feudal dan-do-lhe um colorido diferente. Chegava o momento desacudir o mundo e desenvolver uma arte em sintoniacom os novos tempos. Por tudo isso, a tradição foicolocada em xeque quando no fim da Idade Médiadespontou o Renascimento Cultural.

Obra precoce, e a única assinada, a Pietá , deMiguel Ângelo mostra um autêntico virtuosismo

técnico e uma confiança juvenil. É uma expressãopiedosa cristã e de crença neoplatônica de que a

beleza física é um reflexo da alma. Quando lheperguntaram porque é que Maria era tão jovem disse

que Deus tinha garantido a sua juventude com oobjetivo de “provar ao mundo a virgindade e a pureza

perpétua da Virgem”.

Uma artepara exaltar

a belezahumana

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O Renascimento começou no século XIV e pro-longou-se até o século XVI. Seu apogeu em termos deintensidade e produção artística, situou-se entre 1420 e1560. Inegavelmente a Itália foi o centro gerador dacultura renascentista. Após o desenvolvimento docomércio, Veneza, Gênova, Pisa e Florençamonopolizaram as rotas do Mar Mediterrâneo. Comessa realidade tiveram um desenvolvimento bem maisacentuado do que o restante do continente europeu. Apartir dessas transformações a nobreza feudaldesempenhou um papel econômico secundário, ceden-do espaço para a burguesia em ascensão. A predomi-nância nos negócios destacou os ricos mercadores ebanqueiros, tornando-os a parcela mais ativa da socie-dade.

A convivência burguesia – nobreza nunca foimuito tranqüila. Freqüentemente ocorriam choques quese refletiam na estrutura política das cidades. Via deregra, a burguesia saía vencedora, derrubando anobreza na “queda de braço.” O triunfo burguêsfavoreceu um clima mais susceptível para os investi-mentos na arte, propiciando uma situação de maiorproteção para os artistas. No bojo das transformaçõesnobreza e a Igreja também se engajaram, conferindouma amplitude inédita às transformações culturais.

VALORES EM CONFLITO

O progresso econômico alterou o estilo de vidadas pessoas nas cidades. As relações de dependênciapessoal perderam sua força, dando espaço aos valoresterrenos e a busca de realização individual. A vida ur-bana permitiu os cidadãos se livrarem da coação dosenhorio feudal e da Igreja Católica. A perspectivasecular significou a procura de sentimentos próprios.Os homens da época não se preocuparam em negar aexistência de Deus, porém, emergiram menospreocupados com a salvação e a vida espiritual.

Voltaram-se para a descoberta do prazer de vi-ver e os desafios diante do mundo. Esses valores fo-ram canalizados para a arte e a ciência renovando osconceitos que eram tidos como inquestionáveis.

“Foi o Renascimento italiano que pro-jetou a arte de viver nas cidades para o restoda Europa e para uma posteridade cada vezmais urbanizada. A cidade italiana era maisque um mercado ou um centro administrativo;era um lugar onde um homem podia passartoda a sua vida, um lugar que provia deemprego e de diversão não somente aburguesia com crescentes padrões de confortoe de cultura, mas a nobreza que em qualquerparte da Europa preferia gastar seu tempo emreclusões aristocráticas nos seus feudos cam-pestres.

O campo para o cidadão italiano era umlugar para visitar. Muitos comerciantes e lojistaspossuíam vinhas e olivais e abandonavam a cida-de para viverem perto deles na época da colheita;entre os ricos e poderosos entrou em moda ter umavilla campestre. Isso satisfazia o crescente gostoda aristocracia pelas caçadas e dava uma carac-terística de ócio luxuoso em uma carreira bemsucedida de político ou homem de negócios.(...)Porém, a vida de verdade, a vida que os satisfa-zia, esta estava nas cidades. Príncipes, banquei-ros e lojistas voltavam com prazer dos campos quecertamente eram belos, e freqüentemente lucrati-vos, mas que não podiam deixar encarar comolugares sem cultura, povoados apenas por bárba-ros e rústicos.” 1

Itália na época doRenascimento.Fonte: HistóriaModerna eContemporânea.Leonel Itaussu eLuís CesarCosta. EditoraScipione. pág 41.

O credohumanista

ordenava a seusseguidores

transmitir eacumular

conhecimento

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A elite urbana impossibilitada de obter o privi-légio de nascimento, compensava a diferença inves-tindo nas artes. Em conseqüência, vários artistas pu-deram desfrutar da proteção e incentivo dos “magna-tas” da cultura, que se tornaram os mecenas. Para osnovos ricos a arte tinha um sentido pratico, vinculadaà riqueza e o sucesso no mundo dos negócios.

Paradoxalmente a Igreja Católica acossada porvárias heresias e seitas que abalavam os seus alicer-ces, procurou se aproximar, ao máximo, dos artistasdo Renascimento. Os artistas que atenderam o ape-lo tiveram acolhida segura. Entretanto, os “re-beldes” foram perseguidos pela Igreja Católi-ca que não perdoaria a contestação aos seusdogmas.

O intenso contato com regiões domundo oriental contribuiu imensamentepara a renovação cultural. No Oriente ha-via uma civilização mais dinâmica onde afilosofia grega era debatida por inúmerosintelectuais. Os navios que vinham doOriente trazendo perfumes, âmbar, incen-so e outras mercadorias, traziam tambémlivros, obras científicas, e às vezes, os pró-prios sábios que se deslocavam para osmagníficos centros de comércio e culturaitalianos. O ataque de árabes e turcos quenão deixavam Constantinopla em paz, con-tribuiu para acentuar o êxodo de sábios para oOcidente, diante da iminência da cidadebizantina vir a ser conquistada pelos turcos-otomanos.

HUMANISMOA ALMA DO RENASCIMENTO.

Durante a Alta Idade Média, a Igreja Católicacontrolava todos os centros de estudo que eram mi-nistrados por clérigos e padres. As escolas tinham comofinalidade preparar os noviços que investiam na car-reira religiosa. Nos mosteiros os jovens padres com-pletavam as carreiras tradicionais de Teologia, Medi-cina e Direito.

A concepção de mundo imposta pelos valoresreligiosos, era estática e dogmática não permitindo mu-danças que afastassem o homem do plano espiritual. Opadrão moral religioso impunha a submissão, obediên-cia, paciência, tolerância e aceitação.

No fim da Idade Média, as alterações doRenascimento Comercial, exigiram da Igreja Católica umaadequação aos novos tempos. Nesse contexto se inse-re a Suma Teológica, escrita pelo dominicano Tomás de

Aquino. Sua obra se constitui a primeira tentativa deconciliar a fé com a razão, quando a própriaIgreja admitiu os postulados da Antigüidade.“Como a razão não era inimiga da fé, suaaplicação à revelação não devia ser temida.À medida que o raciocínio humano se tor-nava mais eficiente, disse Aquino, tambémse tornava mais cristão, e as incompatibili-dades entre a fé e a razão desapareciam.

Reconhecendo que tanto a fé comoa razão se voltam para a mesma verdade, ohomem prudente aceita a religião comoguia em todas as questões diretamente re-lacionadas com o conhecimento neces-sário à salvação. Havia também toda uma

ampla gama de conhecimentos que Deusnão revelou e que não eram necessários àsalvação. Nessa categoria enquadrava-segrande parte do conhecimento sobre omundo natural das coisas e das criaturas,que os seres humanos tinham perfeita li-berdade de explorar.” 2

A obra de Tomás de Aquino quebrou a barreiraque divorciava a Igreja dos pensadores da época. Seusseguidores exaltaram os valores do indivíduo,enaltecendo a relação do homem com o mundo. O jeitodiferente de pensar e agir envolveu os artistas e pensa-dores, que se viam sedentos de transformar e mudar osvalores tradicionais. Os humanistas voltavam-se para opresente, olhavam para o futuro e resgatavam o ladobom do passado medieval. Movia-os o ideal, que ohomem.era a mais bela criação de Deus. Buscaram en-tão valorizar o que havia de divino dentro de cada pes-soa.

O Tempo da História

IDADE MÉDIA

- SUBMISSÃO DO HOMEM- CONTEMPLAÇÃO- VALORIZAÇÃO DO ESPIRITUAL- METAFÍSICO

TEOCENTRISMO

RENASCIMENTOCULTURAL

- HUMANISMO E ANTROPOCENTRISMO- CIÊNCIA E RAZÃO- INDIVIDUALISMO- CONTESTAÇÃO

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ARTE RENASCENTISTA.

A antiga arte medieval apesar do caráter monu-mental de suas obras, revelava um grande compromis-so com o espírito religioso predominante no período.No início prevaleceu o gênero românico caracterizadopor um estilo denso e pesado. Exemplo desse padrãoartístico foram as grandes catedrais, construídas à se-melhança das fortalezas militares. Na pintura, as figu-ras humanas eram condicionadas à visão teocêntrica,desenhadas em posição estática e uniforme, destituídasde expressividade.

A noção de espaço era restrita à cena predomi-nante no tema. Na arte medieval os artistas foram ain-da prejudicados pela carência de recursos técnicos,obrigando os pintores a colocarem suas obras nas pa-redes das catedrais e mosteiros. Também nesses locaispoderiam ser admiradas por um número maior de pes-soas.

Na Baixa Idade Média despontou o gótico ali-viando o estilo pesado do românico. Nos seus arcos eogivas destacava-se uma arquitetura dotada de levezae esplendor. Nas catedrais góticas existem espaço, luze cor em abundância. Pesa contra o gótico o fato daarte ainda ser era concebida como instrumento didáti-co.

Na sociedade medieval onde pou-cos tiveram acesso ao conhecimento, a artefuncionava como veículo ideológico ex-pressando os valores da hierarquia religio-sa, imutável e inabalável na sua onipotên-cia. O gótico já pode ser encarado comotransição para o Renascimento, ou atémesmo, evolução para o estilo de arte,amadurecido com os mestres renas-centistas. Na pintura, essa transição foimuito bem concebida por Giotto, o pintorque desvendou a nova forma de encarar apintura.

Segundo Albert Duhrer, Giotto foino século XIII o primeiro mestre do novohumanismo. “Em Giotto, Cristo é realmen-te filho do homem. Os acontecimentos dahistória sagrada tornam-se acontecimen-tos terrenos, situam-se bem no mundo hu-

mano e não mais no além. Mesmo o suave halodourado que circunda a cabeça dos santos, já não éum eco dos distintivos de uma hierarquia sobrenatu-ral presente nas velhas pinturas.

A história de Cristo é contada como alguémtão tangível e tão próximo ao espectador que esteparece convidado a tomar parte nela. São situaçõesdramáticas e não imagens imutáveis que são pinta-das; as figuras relacionadas umas às outras, não maisse confinam a um espaço bidimensional: saem dele,buscam o espaço como se quisessem romper com to-dos os limites e unir-se a todos os que estão vivendoaqui e agora. Uma nova realidade social e uma novaconsciência não dogmática se fazem sentir nas ima-gens secularizadas e humanizadas.” 3

No século XIV os artistas passaram a desfrutarda grande novidade da pintura à óleo. Além do inegá-vel avanço técnico, permitia a comercialização dos qua-dros em telas, ao contrário das obras medievais queeram os estáticos afrescos. Com isso, as obrasganharam em mobilidade, permitindo-se a compra evenda de uma tela como qualquer bom negócio. O in-vestimento na arte multiplicava o lucro dos mecenas,dentre os quais, se destacava a família de Lourenço deMédici, famoso banqueiro da cidade de Florença.

O Tempo da História

SÉCULO XII - XIII

RENASCIMENTO COMERCIALE FORMAÇÃO DASMONARQUIAS

SÉCULO XIV

INÍCIO DORENASCIMENTO

1453

TOMADA DECONSTANTINOPLA

SÉCULO XVI

APOGEU E DECADÊNCIA

DO RENASCIMENTO 1545

CONCÍLIO DETRENTO E

CONTRA-REFORMA

Um meninoestudioso lêCícero como umguia para a vidabem sucedida.Muitos jovens daelite tiveramtutoreshumanistas:outros - inclusivealguns que erampobres mas bemdotados detalento -frequentavamescolas dirigidaspor humanistas.

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O palácio em que vivia foi transformado naGaleria Ufisi, onde se encontram vários quadros e es-culturas da época de ouro do Renascimento. Um exem-plo é a Sagração da Primavera de Boticelli, quadroadmirável pela textura, beleza e transparência.

Entretanto o grande gênio do Renascimentofoi o italiano Leonardo Da Vinci. Apesar da pequenaquantidade de quadros pintados, Da Vinci fez obastante para eternizar obras-primas, a exemplo daGioconda, Última Ceia e A Virgem dos Rochedos. Naopinião dos críticos de arte, o pintor preferiu técnicasimprecisas para não ficar preso a estéticasconvencionais. A irreverência do artista se revelou porinteiro no rosto da enigmática Mona Lisa.

As inúmeras interpretações sobre o sorriso daMona Lisa confirmam a natureza polêmica desse ar-tista. Da Vinci foi um grande exemplo das vantagensque a ciência trouxe para os pintores do Renascimento.Os quadros eram precedidos por um estudo minucio-so de perspectivas matemáticas. Na maioria dos ca-sos, pintores e escultores faziam o rascunho da obra,antes que fosse realizada a versão final. A técnica decontrastar o claro e escuro deu vida às obras permitin-do aos autores infinitas possibilidades. No quadro AVirgem do Rochedo, parece que Leonardo da Vinciconcentrou todas as luzes do universo, no rostocelestial da Virgem Maria.

A expressão perspectiva significa “ver atra-vés”. Essa expressão inédita de olhar-se para umaparede pintada e parecer que se vê para além dela,como se ali tivesse sido aberta uma janela para umoutro espaço, o espaço pictórico, era o principal efei-to buscado pelos novos artistas. A pintura tradicio-nal, gótica ou bizantina, praticamente se restringiaao plano bidimensional das paredes, produzindo nomáximo um efeito decorativo. O novo estilo multipli-cava o espaço dos interiores e com a preocupação dedar às pessoas, objetos e paisagens retratados a apa-rência mais natural possível, parecia multiplicar aprópria vida. Uma arte desse tipo impressionava muitomais os sentidos que a imaginação, convidava muitomais ao desfrute visual do que à meditação interior.

Era uma arte que remetia o homem ao própriohomem e o induzia a uma identificação maior com seumeio urbano e natural, ao contrário dos estilos medie-vais que predispunham as pessoas a penetrarem nosuniversos imateriais das hostes celestiais. A arterenascentista, portanto, mantinha uma consonânciamuito maior com o modo de vida implantado no Oci-dente europeu com o incremento das relações mercan-tis e o desenvolvimento das cidades. 4

Outro expoente do Renascimento foiMichelângelo. A Criação do Homem, pintada no teto elaterais da Capela Sistina, no Vaticano, é a maior provada criatividade desse artista, que demorou vários anospara concluir a obra. Como escultor não fez por me-nos, como se pode observar no magnífico Davi, reali-zado na adolescência do artista quando lhe solicitaramuma prova na academia que estudava. A escultura trans-mite uma sensação de orgulho e heroísmo, combinadocom leveza graça e espiritualidade. Na Pietá,Michelângelo desenvolveu um sentimento de emoçãoao retratar a imagem da Virgem Maria acolhendo Cris-to nos braços após o sofrimento do calvário.

O Tempo da História

1346

PESTENEGRA

1350

DE BOCACCIO

DECAMERON

1304

GIOTTO

COMEÇA OS AFRESCOSDA CAPELADE PÁDUA

1428

AFRESCOSDE

EM FLORENÇAMASACCIO

1477

BOTICELLI

A PRIMAVERAde

1498

da VINCIÚLTIMA CEIA

1505

deMICHELÂNGELODAVI

1507

da VINCI

MONA LISA

1572

CAMÕES

OS LUSÍADAS

1603

SHAKESPEARE

HAMLET

Detalhe da Capela Sistina de Miguel Ângelo. Na cena da criação deAdão pode deduzir-se a confiança da época no ideal masculino.

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Galeria doRenascimento

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O compromisso doHumanismo com o passadoclássico e sua rejeição dacultura medieval sãoclaramente revelados nas trêsobras de arte exibidas nestapágina. Todas representam asTrês Graças, servas da deusado Amor. Na versão clássica,acima, à esquerda, as graçassão dançarinas robustas,pintadas de modo a idealizar abeleza humana. Entretanto, naIdade Média a forma humananão era admirada em simesma, e as Graças, à direita,acima, tornaram-se planas esem corpo. Os humanistasdenunciavam tais obras como“Uma caricatura do corpohumano”.Um pintor do século XV, SandroBoticelli, não era humanistadoutrinário, mas sua arte irradiavao espírito do renascimentoclássico. Em sua famosa versãodas Três Graças, ao lado, elerestituiu os movimentos joviais, euma vez mais revela sua beleza.Ao tema antigo Boticelliacrescenta a elegância, a graça ea nova sofisticação de sua época.In. John R. Hale. Renascença.Biblioteca de História UniversalLife. Editora José Olympio. pág26.

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Os pensadores medievais defenderam a teoria do Universoestático e imóvel. Para eles, a Terra ficava no centro e osastros giravam em torno do planeta. Essa concepção teocêntrica foi contestada por Nicolau

Copérnico, em 1453. Na sua obra Sobre as Revoluções das Esferas Celestes, o cientista jogou por terra milanos de Geocentrismo, contrapondo o Heliocentrismo - o Sol no centro do nosso sistema e a Terra junto comos outros planetas e astros girando em torno do astro-rei. Comungando com essa teoria, Galileu aprofundouos estudos de Copérnico, observando os astros com auxílio das revolucionárias lunetas. Os instrumentosóticos inventados por Galileu confirmavam a teoria de Copérnico, destruindo cientificamente as ultrapassadasafirmações da Igreja.

A teoria provocou um estardalhaço nos meioscientíficos despertando, ao mesmo tempo a fúria daIgreja Católica que resolveu condenar o cientista. Apósvárias sessões da Inquisição Galileu conseguiu driblarseus algozes reiterando a fé em Deus diante do tribunal.Depois de muita pressão diria: “ Eu, Galileu juro quesempre acreditei, acredito agora e com a ajuda deDeus acreditarei doravante em tudo o que ensina eprega a Igreja Católica. Mas porque, depois de terrecebido uma ordem que me foi legalmente dada paraque abandonasse totalmente a falsa opinião, segundoa qual, o Sol é o centro do mundo e não se move, e aTerra não é o centro do mundo e se move, e nãosustentasse, defendesse ou ensinasse a dita falsadoutrina de nenhum modo (...) escrevi e publiquei umlivro em que a dita doutrina condenada foi versada.Portanto abjuro, amaldiçôo e abomino os referidoserros e heresias. ” 5

Em síntese, o Renascimento Cultural foi ummomento singular na história, marcado por três séculosde grande produção artística, literária e científica. Aatitude dos mecenas investindo e apoiando os artistasconferiu um papel de destaque para a burguesia. Ointeresse dos burgueses era movido pela crença nosnovos padrões e pela certeza de auferir grandes lucroscom a venda das obras artísticas. Vinculou-se também àperspectiva ideológica de criar um novo padrão de vida e uma forma diferente de pensar e ver o mundo.

No final do século XVI diminuiu sensivelmente a produção cultural engajada com o Renascimento. Odeslocamento do comércio para o Atlântico prejudicou as cidades italianas, afetando os investimentos nasobras renascentístas. De outro lado, a Igreja Católica deslocou seu foco para a Contra-Reforma que foiassociada ao Barroco que lembrava o Renascimento mas tinha outros objetivos. Mesmo assim o espírito doRenascimento continuou guiando a humanidade e seus paradigmas conduzem as sociedades na busca de ummundo melhor.

Renascimento eCiência

Leonardo daVinci foi ocurioso maisinsistente dahistória.Perguntava oporquê e comode tudo que via(...) Descobre,anota: quandopode ver,desenha. Copia.Faz a mesmapergunta, uma,duas, váriasvezes. Acuriosidade deLeonardo unia-se a uma energiamentalincansável. Nãose contenta comum sim porresposta. Nãodeixa nada delado: preocupa-se, expõe,responde ainterlocutoresimáginários. Noquadro ao lado, afamosa eenigmática MonaLisa.

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“A história da cultura renascentista ilustra com clareza todo o processo de construção cultural dohomem moderno e da sociedade contemporânea. Nele se manifestam os germes do individualismo e doracionalismo, conceitos típicos de comportamentos mais imperativos e representativos de nosso tempo.Consagra a razão que é a instância suprema de toda a cultura moderna, versada no rigor das matemáticas,que passarão a reger os sistemas de controle do tempo, do espaço, do trabalho e do domínio da natureza.

Será essa mesma razão abstrata que estará presente tanto na elaboração da imagem naturalis-ta pela qual é representado o real, quanto na formação das línguas modernas e naprópria constituição da chamada identidade nacional. Ela é a nova versão dopoder dominante e será consubstanciada no Estado Moderno, entidaderacionalizadora, controladora e disciplinadora por excelência, que extinguirá amultiplicidade do real, impondo um padrão único, monolítico e intransigentepara o enquadramento de toda a sociedade e cultura. Isso, contraditoriamente,fará brotar um anseio de liberdade e autonomia de espírito, certamente o maisbelo legado do Renascimento para a atualidade.” 6

PENSAMENTORELIGIOSO E POLÍTICO

Os pensadores renascentistas lutaram por uma religião renovada, nãopoupando críticas à Igreja Católica. A idéia de elaborar uma religião

simplificada influenciou o teólogo Erasmo de Roterdã a escrever o fantástico livro - OElogio da Loucura. Segundo o autor, os teólogos da Igreja se escudavam numa muralha dedefinições teológicas. Dizia Erasmo que: “A verdadeira religião, não dependia do dogma,do ritual, ou do poder clerical. Ao contrário, ela é revelada de modo simples e claro naBíblia e portanto é diretamente acessível a todas as pessoas, desde os sábios e poderososaté os pobres e humildes.” 7 Quando foi processado pela Igreja, Erasmo retrocedeuprovavelmente com receio das penalidades que lhe seriam impostas. Mas a teoria deErasmo não ficaria adormecida. Serviria de inspiração para Martinho Lutero atacar a Igrejaem seus fundamentos básicos.

No plano político a maior obra do Renascimento foi escrita pelo italiano NicolaiMaquiavel. Sua motivação inicial ao escrever “O Príncipe” foi traçar o caminho mais fácilpara a Itália efetivar a centralização política, a exemplo do que havia acontecido com outrasmonarquias européias. Na época de Maquiavel a Itália não conseguia superar a fragmenta-

ção que confrontava as cidades em lutas intestinas. O crescimentodo comércio mergulhou as cidades num insano clima de disputaque sangrou o território italiano. Na opinião de Maquiavel, a únicaforma de reverter a desordem era a imposição da ordem total, semcontestação.

Na sua concepção, o monarca ideal seria motivado pelasgrandes ações e não deveria hesitar diante das adversidades. Umpríncipe deve agir com rapidez e precisão, não permitindo aosinimigos a chance de reação. A negligência é a prova da fraqueza,da incapacidade e despreparo do príncipe diante da tarefa degovernar. Segundo o autor, valia mais a reputação da virtude doque a própria virtude. É necessário, portanto, que o soberanodissimule, saiba fingir e engane os súditos.

Maquiavel foiusado comoembaixador pelarepública deFlorença numaépoca em que aordem políticada Europaparecia estar sedesmanchando.Na gravura daesquerda,quadro dopensadorpolítico

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Cabe ao povo obedecer aos soberanos. Em caso de transgres-são das leis, deve o príncipe usar a força para que a ordem na

sociedade seja mantida a qualquer custo.“É muito louvável por parte dos príncipes de serem

fiéis aos seus compromissos mas, entre os de nosso tempo,que vimos fazer grandes coisas, são poucos os que sejam

gabados desta fidelidade e que tenham tido escrúpulosde enganar os que se fiavam na sua lealdade”.

Ora, os animais cujas formas o príncipe devesaber revestir são as formas da raposa e do leão. Aprimeira se defende mal contra o lobo e o outro caifacilmente nas arapucas que lhe preparam. Daprimeira o príncipe aprenderá a ser sagaz e dooutro a ser forte. Os que desprezam o papel deraposa entendem pouco da sua profissão. Emoutras palavras um príncipe prudente nãopode nem deve manter a sua palavra senãoquando ele pode fazê-lo sem se prejudicar eas condições em que ele se comprometeu

ainda subsistem.Eu não me atreveria a enunciar

semelhante preceito se todos oshomens fossem bons; mas como elessão todos maus e sempre prontos afaltar com a sua palavra, o príncipenão se deve gabar de ser mais fiel àsua e esta falta de boa fé é semprefácil de justificar. Eu poderia citardezenas de provas e mostrarquantos compromissos e tratadostêm sido rompidos, entre os quaiso mais feliz é sempre o que melhorsabe cobrir-se com pele deraposa. O caso é de bem desempe-

nhar o seu papel e de saber oportunamente mentir edissimular. Os homens são tão simples e tão fracos que quem os quer enganar, facilmente os engana.” 8

Maquiavel foi considerado o primeiro grande pensador político do mundo moderno. A leitura de suaobra confirma o lema que o tornou imortal - Os fins justificam os meios. Suas idéias serviram de inspiraçãopara outros escritores da época, tornando-se também o livro de cabeceira dos monarcas do Antigo Regime.Mas perguntaria o leitor - como pôde ser tão importante um autor que defendeu idéias que inspiraram gover-nos despóticos e autoritários? Onde estaria o lado renascentista de Maquiavel? A resposta é simples: Aodefender o poder real vinculando-o à manutenção da ordem, contribuía para debilitar a força da Igreja, quedisputava com os reis o direito de governar os homens na Terra. Ressaltava o espírito renascentista naexaltação do homem-príncipe, capaz de usar a força e a razão ao mesmo tempo.

1 In. Hale, John R. Hábitos e Moral. A Renascença. Biblioteca Time-Life. José Olympio Editora. P. 52.2 In. Perry, Marwin. Civilização Ocidental. Uma História Concisa. Martins Fontes Editora. Pág. 231.3 In. Fischer, Ernst. Apud. Nicolau Sevscenko. O Renascimento. Pág 38.4 In. Sevcenko, Nicolau. Op. Cit. Pág. 48.5 In. Blitzer, Charles. O Universo Reconstruído. A Era dos Reis. Coleção Time-Life. Pág. 103.6 In. Sevcenko. Nicolau. Op. Cit. Pág. 2.7 In. Perry, Marwin. Op. Cit. Pág. 283.8 In. Maquiavel. Nicolau. O Príncipe. Edições ao Livro de Ouro. Pág. 38.

Odesenvolvimentono comércio e oapoio dosmecenas,transformouVeneza numdos grandescentros deRenascimentoCultural