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RELATÓRIO DE FISCALIZAÇÃO
CRFEF/GFEF 01/2013
ADEQUAÇÃO DE COBRANÇA À PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DA
COPASA MG NO MUNICÍPIO DE CORONEL FABRICIANO/MG
Resposta à CE n.° 838/2012 - PRE COPASA
Processo Administrativo CRFEF/GFEF 04/2012
ARSAE-MG
14 de janeiro de 2013
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1. Introdução:
Motivada por solicitação do Ministério Público da Comarca de Coronel Fabriciano a
prestar esclarecimentos sobre a cobrança de tarifa de esgoto no município, a ARSAE-
MG instaurou o Processo Administrativo CRFEF/GFEF 004/2012 e realizou
fiscalização para verificar se os procedimentos de faturamento da COPASA-MG estão
em conformidade com o estabelecido pela legislação e notadamente por suas resoluções.
O Inquérito Civil do Ministério Público teve origem em uma solicitação da Associação
dos Moradores do Bairro Potira – AMOBAP. A Associação afirmou que os esgotos de
grande parte da população do bairro seriam despejados in natura em córregos da região,
além do fato de não haver Estação de Tratamento no município. Pediu, assim, ao
Ministério Público o ajuizamento de ação civil coletiva para impedir a implantação da
cobrança pelo tratamento de esgoto pela COPASA em alguns bairros anunciada para
dar-se a partir novembro de 2012.
Os resultados da fiscalização, de acordo com o Relatório de Fiscalização CRFEF/GFEF
12/2012 juntado ao PA CRFEF/GFEF 004/2012, corroboraram as alegações da
AMOBAP, a saber:
Que os esgotos de vários munícipes do bairro são de fato despejados in natura
nos córregos da região;
Que nem todos os usuários contam com coleta e que inexiste tratamento do
esgoto em toda a cidade;
Que, a despeito do serviço não prestado, a prestadora cobra tarifa por serviço de
esgoto tratado.
No âmbito do PA CRFEF/GFEF 004/2012, a ARSAE deu oportunidade à COPASA
para justificar a cobrança feita em desacordo com as disposições legais e regulatórias.
Na CE 838/2012, a empresa apresentou as seguintes justificativas:
Há uma ação judicial em curso, o processo n.° 0194 09 105528-6, atualmente na
segunda instância, que embasaria a cobrança da tarifa de esgoto na forma como
vem sendo feita;
A empresa argumenta, ainda, que a substituição da tarifa de esgoto com
tratamento pela tarifa de esgoto com coleta ameaçariam seu equilíbrio
econômico-financeiro.
2. Fundamentação:
2.1. Análise dos aspectos jurídicos das razões apresentadas pela
COPASA
Trata-se de confrontar a legislação setorial, notadamente as resoluções nº 003/2010, nº
004/2011 e nº 20/2012 da ARSAE, e os efeitos de um recurso de uma apelação em
processo movido contra a COPASA. Notadamente, trata-se de examinar as
consequências da superveniência de lei estadual que criou entidade regulatória do setor
de saneamento para segurança jurídica da prestação dos serviços em Minas Gerais.
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Desde a publicação da Lei Federal 11.445/2007, marco do setor de saneamento, a
validade dos procedimentos de tarifação se condiciona à sua adequação aos dispositivos
legais, os quais atribuem à regulação os poderes de definição da política tarifária. A Lei
11.445/2007 dispõe em seu artigo 23, IV o seguinte:
Art. 23. A entidade reguladora editará normas relativas às dimensões técnica,
econômica e social de prestação dos serviços, que abrangerão, pelo menos, os
seguintes aspectos:
IV - regime, estrutura e níveis tarifários, bem como os procedimentos e prazos de
sua fixação, reajuste e revisão;
No mesmo sentido, a Lei Estadual nº 18.309/2009, que estabelece normas para a
prestação dos serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário e cria a
ARSAE, estabelece no art.6º, inciso V, como competência da Agência:
V - estabelecer o regime tarifário, de forma a garantir a modicidade das tarifas e
o equilíbrio econômico-financeiro
Inequívoca, portanto, a competência da ARSAE de estabelecer o regime tarifário dos
serviços de água e de esgoto de prestadores regulados. Nos municípios onde presta
serviços, a COPASA vem cobrando os valores da tarifa aprovados pela ARSAE desde
2010: Resolução Normativa 001/2010 - Reajuste tarifário da COPASA 2010; Resolução
Normativa 004/2011 - Reajuste tarifário da COPASA 2011; Resolução Normativa
020/2012 - Reajuste tarifário da COPASA 2012.
Como será detalhado em seguida, a COPASA iniciou antes da existência da Agência a
cobrança de tarifa de esgoto que diferenciava os casos onde havia tratamento daqueles
onde apenas havia coleta ou tratamento parcial. A partir de 2011, a ARSAE instituiu de
forma mais explícita um novo regime tarifário que estabelece distinção clara na tarifa
entre os serviços de coleta e tratamento. A tabela tarifária passou a contar com duas
tarifas, EDT (Esgoto Dinâmico com Tratamento) e EDC (Esgoto Dinâmico com Coleta)
a primeira destinada a usuários com serviço de coleta e tratamento e a segunda apenas
com coleta.
A COPASA alega que ainda não presta o serviço de tratamento em Coronel Fabriciano
devido a uma liminar de 2009 que embargou a construção da Estação de Tratamento.
Entretanto, cobra tarifas referentes ao tratamento dos esgotos de todos os usuários
faturados por esse serviço, procedimento em flagrante desrespeito às normas
regulatórias da ARSAE.
A empresa se sustenta em uma ação civil pública de 2009. O juiz de primeira instância
dera procedência parcial ao pedido formulado por associação de moradores em ação
civil pública e determinara a diminuição do montante a ser cobrado na tarifa de esgoto
de todos os moradores do município pela inexistência de tratamento. Na CE N.° 838, à
fl. 5, a empresa anexou cópia de despacho do juiz de primeiro grau datado de 20 de abril
de 2010, no qual recebe a apelação interposta em ambos os efeitos e remete os autos ao
Tribunal de Justiça.
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Saliente-se que o processo judicial teve início antes da criação da ARSAE e que em
nenhum momento as partes fazem referência à superveniência de norma regulatória
referente à matéria. Em vários momentos, da própria sentença de primeiro grau,
transparece o desconhecimento das resoluções da Agência por parte de todos aqueles
que tiveram voz no processo:
A. Para o cálculo do montante a ser devolvido pela COPASA aos munícipes, o juiz
de primeira instância emprega a seguinte metodologia:
Considerando três serviços de esgoto (coleta, remoção e tratamento), define o valor da
tarifa a ser paga como correspondente ao serviço prestado e em proporções iguais, isto
é, 1/3 do valor total da tarifa de esgoto para cada serviço. Como em Coronel Fabriciano
há apenas coleta de esgoto e remoção, deve-se pagar 2/3 do valor total da tarifa de
esgoto.
A resolução mais recente da ARSAE determina a utilização de metodologia distinta, na
qual há distinção entre esgoto coletado e esgoto coletado e tratado. No primeiro caso, o
valor da tarifa de esgoto equivale a 50% da tarifa de água e no segundo a 90%.
B. Ainda sobre a mesma questão, o juiz de primeiro grau determinou apenas a
suspensão da cobrança da tarifa, sendo devida, ainda, a devolução dos valores
cobrados a mais, como definido no Artigo 108 da Resolução ARSAE MG
003/2010 das Condições Gerais da Prestação de Serviços,
Art. 108. Em caso de ausência de emissão de faturas ou de emissão com valores incorretos não
causada por ação ou culpa do usuário, os seguintes procedimentos serão observados:
I. fatura com valor à menor: o prestador de serviços não poderá efetuar cobrança
complementar, mas considerará a leitura realizada para fins de apuração de uso
posterior
II. fatura inexistente: o prestador de serviços não poderá emitir fatura, mas considerará a
leitura realizada para fins de apuração de uso posterior; e
III. fatura com valor à maior: o prestador de serviços providenciará a devolução em dobro
da quantia recebida indevidamente do usuário, observado o prazo de prescrição
previsto no Código Civil.
e também no Parágrafo único do Artigo 42 do Código de Defesa do
Consumidor, aplicável também ao caso em apreço:
O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual
ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo
hipótese de engano justificável.
C. A própria interveniência do Ministério Público dando procedência ao pedido
supõe o desconhecimento do mesmo sobre as deliberações da ARSAE, já que
implica sua concordância com a metodologia adotada pelo juiz.
De forma que não tem razão a COPASA em sua argumentação. Devido, portanto, às
mudanças do setor promovidas pelas Leis 11.445/2007 e 18.309/2009, e pela criação
superveniente de uma Agência Reguladora com a competência de estabelecer o regime
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tarifário e de faturamento dos serviços de água e de esgoto, prevalecem as normas
regulatórias da ARSAE.
2.2. Análise dos aspectos econômico-financeiros das razões apresentadas
pela COPASA
A regra de faturamento explicitada desde a Resolução ARSAE 004/2011 associa o
faturamento pelo serviço de esgotamento sanitário ao tipo de serviço prestado: apenas
coleta (EDC – Esgoto Dinâmico com Coleta) ou coleta e tratamento (EDT – Esgoto
Dinâmico com Coleta e Tratamento). Entende-se, assim, que o respeito às regras
tarifárias definidas pela Agência antecede a discussão sobre a ameaça ao equilíbrio
econômico-financeiro da COPASA.
Fonte: Resolução nº 004/2011 – ARSAE-MG
Fonte: Resolução nº 20/2012 – ARSAE-MG
Esta mesma regra de faturamento não seguida em Coronel Fabriciano, onde todos os
usuários com serviço de esgotamento são faturados com a tarifa EDT apesar de não
haver tratamento no município, propicia aumento de receita em outros municípios
quando uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) entra em operação.
Desde 2010, a COPASA sistematicamente lista em seus Relatórios de Informações
Trimestrais aos investidores, e nos Releases de Resultados, os municípios que tiveram
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aumento de faturamento devido à entrada em operação de novas ETE’s, que permite a
cobrança dos usuários com esgoto tratado com uma tarifa maior. Foram 20 municípios
entre fevereiro de 2010 e setembro de 2012, totalizando uma população de quase 1,3
milhão de habitantes segundo o Censo de 2010 do IBGE.
Fonte: Relatórios de Informações Trimestrais da COPASA e CENSO IBGE
Como comprovaram as fiscalizações da ARSAE em Curvelo e Pouso Alegre, a
COPASA tem o cuidado de delimitar a área de abrangência do tratamento e cobrar a
tarifa EDT apenas dos usuários beneficiados pela operação da ETE.
Como a estrutura de mercado é dinâmica, mesmo a manutenção das tarifas pode resultar
em incremento de receita caso haja transferência de parcela de mercado de uma tarifa
menor para outra maior. A listagem reproduzida acima permite concluir que a COPASA
respondeu ao incentivo tarifário, intensificou investimentos em tratamento de esgoto e
foi capaz de auferir ganhos de receita mesmo com a manutenção das tarifas, com
possibilidade de rendimento acima do equilíbrio econômico-financeiro.
Entretanto, o mecanismo de incentivo ao tratamento de esgoto não tem apenas o sentido
de beneficiar o prestador quando do início de operação de uma ETE. É um mecanismo
de mão dupla: o prestador não pode extrair o benefício de uma tarifa maior caso não
haja o efetivo tratamento de esgoto. Caso a COPASA fature os usuários sem tratamento
Município mês população 2010
Rio Pardo de Minas fev/10 29.075
Montes Claros mar/10 361.971
Serro dez/10 20.833
Lavras jan/11 92.171
Dores do Indaiá fev/11 13.781
Conselheiro Lafaiete mar/11 116.527
Curvelo jun/11 74.184
Itajubá jun/11 90.679
João Pinheiro jun/11 45.260
Bueno Brandão jun/11 10.892
Alfenas set/11 73.722
Itaobim set/11 21.001
Araçuaí set/11 36.041
Itacarambi out/11 17.739
Coronel Murta jan/12 9.117
Cláudio fev/12 25.777
Divisópolis fev/12 8.970
Mata Verde mar/12 7.880
Pouso Alegre jun/12 130.586
Pará de Minas set/12 84.252
Municípios com alteração de faturamento de esgoto (de EDC para EDT)
devido à entrada em operação de ETE's
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de esgoto com a mesma tarifa destinada a usuários com tratamento (EDT), qual
incentivo econômico a prestadora terá para investir em tratamento de esgoto?
Surpreende, portanto, o fato de o faturamento pelo serviço de esgotamento sanitário em
Coronel Fabriciano utilizar a tarifa integral de esgoto mesmo sem haver tratamento no
município, desrespeitando a regra tarifária que reconhece a justa remuneração pelo
serviço efetivamente prestado.
A Comunicação Externa Nº 838/2012 – PRE cita a previsão legal de igualdade entre
tarifa de água e de esgoto e justifica a cobrança do esgoto com tarifa integral (grifo
nosso):
“Neste contexto, é importante enfatizar que a COPASA MG seguia uma política tarifária
definida pelo Estado de Minas Gerais, até mesmo antes da instituição da ARSAE-MG.
E, no caso específico de Coronel Fabriciano, a situação não era diferente. O contrato firmado
em 1965 entre o Município e a Concessionária já apresentava previsão em sua cláusula 6°
inciso 111, que a tarifa de esgoto não excederia a 100% da tarifa de água.
No ano de 2003, a COPASA MG renovou a Concessão, por meio do II Termo Aditivo ao
Contrato de Concessão que, em sua cláusula 12 previu a regulamentação da prestação dos
serviços pelos Decretos Estaduais n° 32.809/91 e 33.611/92, sendo que este último estabelece
de forma expressa em seu art. 24 que ‘A tarifa de esgoto corresponderá a 100% (cem por
cento) da tarifa de água.’
A partir de 2006, o Governo do Estado, visando estimular a adesão aos serviços de
esgotamento sanitário, definiu a tarifa de esgoto no percentual de 90% da tarifa de água. Em
2007 a representatividade da tarifa de esgoto foi reduzida em relação à tarifa de água, passando
de 90% para 60%. No caso de Coronel Fabriciano, em observância a legislação vigente à
época, Decretos nº 43753-2004, 43930-2004, 44249-2006 e 44468-2007, as tarifas foram
mantidas nos mesmos patamares, considerando os novos percentuais, como forma de manter o
equilíbrio econômico-financeiro da empresa.”
Entretanto, o citado Decreto 43.753/2004 prevê, no parágrafo único do artigo 95 a
aplicação de tarifa de esgoto menor que a de água de acordo com a implantação dos
serviços:
“Art. 95 - A tarifa de esgoto será igual à tarifa de água.
Parágrafo único. A COPASA MG poderá praticar tarifa de esgoto diferenciada da de
água ou desconto em função das especificidades da implantação dos serviços.”
De fato, por diversas ocasiões a COPASA alterou sua estrutura tarifária. Até 2005, a
tarifa de esgoto correspondia a 100% da tarifa de água. Em 2006, a tarifa de esgoto
passou a 90% da tarifa de água. Para compensar a redução da tarifa de esgoto, a tarifa
de água aumentou bem mais que o reajuste médio, como prova a comparação das tarifas
da faixa de consumo de 11 a 15 m³ (outras faixas de consumo apresentam resultados
semelhantes):
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Fonte: elaboração própria a partir das resoluções citadas
O reajuste médio de 2006 divulgado pela COPASA à Bovespa no dia 24/02/2006 foi de
7,6%, apesar de o reajuste tarifário médio constante em seu site ser de 9,50% (seção
“Tarifa Média, Reajuste e Investimentos” do site www.copasa.com.br/ri/). De fato, a
receita bruta de água e esgoto da COPASA entre o 2° trimestre de 2006 ao 1° trimestre
de 2007 aumentou 8,6% em relação ao ano anterior, mesmo com a redução de volume
faturado de 6,3% devido à redução do consumo mínimo1.
Entretanto, a tarifa de esgoto de 90% da tarifa de água não era aplicada em todos os
municípios em que a COPASA operava, como evidencia a Resolução SEDRU n° 22 de
2007 em seu artigo 2° e nas tabelas de desconto da parcela água. No município de
Curvelo, por exemplo, o Contrato de Concessão assinado em janeiro 2006, quando a
tarifa de esgoto praticada pela empresa era igual à tarifa de água, previa no Parágrafo 3°
da Cláusula 5ª:
“A tarifa remuneratória dos serviços de esgoto prestados pela CONCESSIONÁRIA na sede do
MUNICÍPIO será igual à tarifa de água. Até o início de operação da unidade de tratamento de
esgotos será concedido um desconto de 50% (cinqüenta por cento) na tarifa de esgoto, sendo
que a cobrança desta tarifa se iniciará imediatamente após o início da operação do referido
Sistema, conforme previsto no Parágrafo Quinto da Cláusula Segunda deste instrumento.”
Em 2007, a COPASA, em radical alteração da estrutura tarifária, reduziu ainda mais a
relação de tarifas de esgoto e água, de 90% para 60% com o objetivo de intensificar o
incentivo à adesão ao serviço de esgotamento sanitário.
Como esta Agência provou na Nota Técnica 004/2011, que detalhou o cálculo do
reajuste tarifário da COPASA de 2011, e como pode ser visto na tabela abaixo, a
redução da tarifa de esgoto foi acompanhada de aumento da tarifa de água que
compensou a perda de receita do serviço de esgoto. Em 2007, o reajuste médio foi de
6,72% e a receita bruta de água e esgoto aumentou 12,5% devido principalmente ao
reajuste e ao aumento do volume faturado de 6,4% (do 2T07 ao 1T08 e comparado ao
2T06 ao 1T07), mesmo com aplicação integral dos “descontos” criados pela empresa
em 2007.
1 Como o consumo mínimo caiu de 10 m³ para 6 m³ em 2006, é razoável que a tarifa aumente mais que o
reajuste médio para manutenção do nível de receita.
Tarifa
Água
R$/m³
Tarifa
Esgoto
R$/m³
Relação
Esgoto/
Água
Tarifa Água +
Tarifa Esgoto
RESOLUÇÃO Nº 002/2005 2,4473 2,4473 100% 4,8946
RESOLUÇÃO Nº 005/2006 2,8470 2,5623 90% 5,4093
Variação 2006/2005 16,3% 4,7% 10,5%
Tarifa da faixa de 11 a 15 m³ da Categoria Residencial
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Fonte: elaboração própria a partir das resoluções citadas
Percebe-se que a redução da relação entre a tarifa de esgoto e de água representou um
incentivo ilusório aos usuários e municípios para a adesão aos serviços de esgotamento,
pois a redução da tarifa de esgoto foi totalmente compensada pelo aumento da tarifa de
água e a fatura total (água mais esgoto) não sofreu qualquer redução, mesmo
descontando o reajuste médio2. Isto é, como a tarifa de água aumentou para subsidiar o
serviço de esgotamento, a prestadora não teve redução de receita, assim como os
usuários não tiveram redução de faturamento total (água mais esgoto). Como não houve
contrapartida financeira ao incentivo à adesão, este foi apenas ilusório e produziu efeito
apenas pela desinformação de titulares dos serviços e usuários.
O aumento da tarifa de água em 2007 para compensar a redução da tarifa de esgoto
exigiu a criação de descontos na parcela água de usuários que tinham apenas o serviço
de água ou que não contavam com tratamento de esgoto. Caso contrário, estes usuários
seriam prejudicados com aumentos abusivos sem qualquer alteração do serviço
prestado. De fato, municípios sem tratamento de esgoto, apenas com coleta, não
estavam sujeitos a tarifa de 60% da tarifa de água, mas a uma tarifa limitada a 40%
(como define o artigo 2° da Resolução SEDRU 22/2007). Os quadros dos itens VI e VII
definem os descontos na parcela água para clientes que pagavam em 2006 tarifas de
esgoto equivalentes a 50%, 60% e 70% e não os 90% então aplicados a usuários com
tratamento de esgoto. Portanto, a própria COPASA, antes da existência da ARSAE,
aplicava tarifas de esgotamento diferenciadas conforme a prestação de serviço.
Como agravante, a Resolução SEDRU n° 22 de 2007, que aprovou os estudos da
COPASA, previa redução dos referidos descontos na parcela água, que iniciavam3 com
15,79% em 2007, passariam para 10,10% em 2008, para 5,05% em 2009 e acabariam
em 2010. O efeito de tal redução de descontos seria aumento de faturamento (ou de
tarifa de aplicação) de usuários sem serviço de esgotamento sanitário ou sem
tratamento, apenas com coleta, que pagavam tarifas de esgoto menores que os 90% de
2006. Isto é, mais de 400 municípios sofreriam aumentos de tarifa de água sem qualquer
alteração na prestação de serviços ou de custos pela COPASA.
2 A própria COPASA admite aos investidores que a redução de receita de esgoto em 2007 “já era
esperada e é decorrente da reestruturação tarifária ocorrida a partir de março de 2007, que passou a
tarifa de esgoto para 60% da tarifa de água, com o objetivo de incentivar a adesão aos serviços de
esgotamento sanitário e, como demonstrado, não implicou em qualquer comprometimento da receita
total da COPASA.” (Release de Resultados 1T2008, grifo nosso). 3 No caso de clientes residenciais sem serviço de esgotamento sanitário.
Tarifa
Água
R$/m³
Tarifa
Esgoto
R$/m³
Relação
Esgoto/
Água
Tarifa Água +
Tarifa Esgoto
RESOLUÇÃO Nº 005/2006 2,8470 2,5623 90% 5,4093
RESOLUÇÃO Nº 22/2007 3,7000 2,2200 60% 5,9200
Variação 2007/2006 30,0% -13,4% 9,4%
Tarifa da faixa de 11 a 15 m³ da Categoria Residencial
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Fonte: Resolução SEDRU 22/2007
A redução dos descontos efetivada em 2008 foi alvo de ação do Ministério Público que
culminou com o impedimento judicial do reajuste de 2009 até a criação de uma agência
reguladora, como ditava a Lei 11.445/2007. Apesar da não efetivação do reajuste de
2009, os descontos permaneceram em patamar inferior até o reajuste de 2010
promovido pela ARSAE, quando os descontos retornaram ao valor original, impedindo
assim que a empresa auferisse receita não justificada a partir de então.
A COPASA explicou a reestruturação tarifária de 2007 aos investidores da seguinte
maneira (Relatório de Resultados e Informações Financeira Suplementares – 1°
Trimestre de 2007 - grifo nosso):
“Visando um aumento das adesões ao serviço de esgoto, houve mudanças na estrutura tarifária
da empresa:
• Foi aplicado um reajuste na tarifa de água de 18,75%;
• A tarifa de esgoto passou a ser de 60% da tarifa de água, não podendo o valor relativo à coleta
ser inferior a 40%.
• Para quem possui somente o serviço de água, foi dado um desconto de 15,79% na tarifa em
2007, de forma a compensar o aumento dado na tarifa de água. A partir de 2008, este desconto
será reduzido para 10,10%, passando para 5,05% em 2009 até o ano de 2010, quando não
haverá mais desconto, gerando assim um impacto adicional de 18,75% nas contas de água
para as cidades que não aderirem aos serviços de esgoto da Copasa até 2010.”
O “incentivo” promovido pela COPASA foi, pelo que se pode entender da mensagem
acima, a ameaça de punição com aumento de 18,75% na tarifa de água em caso de não
adesão ao serviço de esgotamento, em vez de se conceder algum benefício.
Ao perceber este aspecto, a ARSAE, nos reajustes de 2011 e de 2012, promoveu o
retorno da estrutura tarifária a algo semelhante ao praticado em 2006, com aumento da
tarifa de esgoto, correspondente redução da tarifa de água e incorporação dos
“descontos” integrais criados em 2007 nas tarifas. Mas manteve o critério adotado pela
COPASA, pelo menos desde 20064, de faturar o serviço de esgotamento sanitário de
usuários conforme a prestação de serviço, integral no caso de tratamento e reduzido em
caso de apenas coleta. Assim, a cobrança teria relação com o serviço de esgotamento
efetivamente prestado e o prestador sentiria incentivo a investir em tratamento de
esgoto, pois o início da operação de ETE’s permitiria adicional de receita.
Em resposta ao Ofício ARSAE-MG n° 115 de 2011, a COPASA informou faturar em
maio de 2011 com tarifa de coleta (EDC) usuários de 88 dos 149 (ou 59%) municípios
4 A Resolução SEDRU 22/2007 evidencia a distinção no artigo 2º e nos quadros de descontos da parcela
água.
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com operação de esgotamento. Nos 61 demais municípios o faturamento era com tarifa
de tratamento de esgoto (EDT).
Quando da fiscalização de faturamento na empresa com informações de setembro 2011,
no âmbito do Processo Administrativo ARSAE 01/2012, foram reconhecidos 3 clientes
industriais de Pouso Alegre faturados com tarifa de esgotamento com tratamento (EDT)
sendo que não havia tratamento de esgoto no município na época. A empresa respondeu
no Relatório 013/2011 de 07/12/2011 (grifo nosso):
“Neste bloco foram apontados 3 imóveis – Os imóveis pertencem a localidade com esgoto
coletado. Todos os imóveis possuem contrato de demanda com a Copasa e em decorrência disso
foram faturados como esgoto tratado. A negociação existente no SICOM foi alterada para
que o faturamento desses imóveis seja com esgoto coletado”.
Através da Comunicação Externa nº 028/12 – DFI – COPASA, de 26 de março de 2012,
a empresa informou que, após a contestação da ARSAE,
“as contas foram analisadas e recalculadas e para aquelas que apresentaram valores cobrados a
maior do usuário, foram aplicadas devoluções de valores na forma de crédito na próxima fatura”.
A devolução correspondente a estes 3 usuários foi de R$ 122.356,33 referente a 6
meses. Ainda segundo a Comunicação Externa nº 028/12 – DFI – COPASA, em
atendimento à Resolução ARSAE 003/2010, houve devolução em dobro, acréscimo de
juros de 1% ao mês e correções a partir das faturas de abril de 2011.
Em função dos fatos apresentados acima, não há de se falar em ameaças ao equilíbrio
econômico-financeiro da COPASA. De forma geral, pode-se afirmar que o próprio
crescimento de mercado permite, pelo ganho de escala, aumento da produtividade e
aumento de remuneração. Como o Fator X nos reajustes anteriores à primeira revisão
tarifária da COPASA é considerado igual a zero, tem-se a possibilidade de aumento de
rentabilidade, mesmo acima do equilíbrio econômico-financeiro, até a próxima revisão
em caso de aumento de eficiência e redução do custo operacional.
Considerando-se o acréscimo de faturamento em vários municípios devido à operação
de novas ETE’s, o crescimento de mercado e a possibilidade de redução de custos
operacionais associados à manutenção do nível das tarifas nos reajustes de 2010, 2011 e
2012, o equilíbrio econômico-financeiro da COPASA não é ameaçado.
Por fim, a revisão tarifária é de competência da Agência e será realizada no momento
em que as informações e as condições necessárias a sua execução forem
disponibilizadas, não cabendo sua discussão no âmbito deste processo administrativo
que abrange essencialmente direitos dos usuários dos serviços.
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3. Conclusão:
De acordo com os dispositivos da Lei Federal nº 11.445/2007 e da Lei Estadual nº
18.309/2009 citados acima, é de competência da ARSAE aprovar o regime tarifário dos
prestadores de serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário.
A partir da Resolução Normativa 004/2011, a ARSAE associa explicitamente o
faturamento pelo serviço de esgotamento sanitário à efetiva prestação de serviço, com a
existência de uma tarifa para os casos em que há tratamento de esgoto (EDT) e outra
para casos em que há apenas coleta, sem tratamento (EDC).
As resoluções normativas e demais determinações da ARSAE têm o atributo da
presunção de legalidade e são, como todo ato administrativo, executáveis de ofício. Não
é uma ação na justiça anterior à Lei 18.309/2009 e à criação da Agência o fundamento
legal para a cobrança de tarifa, muito menos processo judicial ainda em curso. Mas sim
a superveniência da legislação setorial e, assim, das resoluções normativas da Agência.
Portanto, a COPASA deve faturar os usuários conforme a prestação de serviço (com ou
sem tratamento de esgoto), critério por ela definido antes da existência da ARSAE e
explicitado nas resoluções tarifárias a partir do reajuste de 2011.
No município de Coronel Fabriciano, a COPASA vem descumprindo as determinações
da ARSAE desde 2011, justamente porque cobra o valor da tarifa de esgoto tratado, mas
presta somente serviço de coleta, prática que enseja a devolução dos valores cobrados a
mais.
Analisados os argumentos apresentados pela COPASA na Comunicação Externa
838/2012, conclui-se pela inconformidade da cobrança de tarifa de esgoto nos termos
em que vem sendo feita devido ao flagrante desrespeito das resoluções expedidas por
esta Agência.
Recomenda-se que ARSAE determine à COPASA a adequação dos valores da tarifa de
esgoto bem como a devolução imediata dos valores cobrados a mais dos usuários do
município de Coronel Fabriciano desde abril de 2011, facultando-se à empresa o
desconto de tais valores nas faturas subsequentes.
Entende-se aplicável ao presente caso a adoção dos procedimentos definidos no Artigo
108 da Resolução ARSAE MG 003/2010 das Condições Gerais da Prestação de
Serviços, isto é, a devolução em dobro dos valores cobrados a mais depois de
comunicada aos usuários a irregularidade na cobrança operada desde abril de 2011.
Finalmente, considera-se que tais determinações devem ser cumpridas quando da
emissão da fatura imediatamente subsequente ao recebimento do Ofício de
Comunicação da presente decisão administrativa, devendo ainda a COPASA remeter à
ARSAE a comprovação da devolução dos valores cobrados a mais tão logo a mesma se
efetive em prazo não superior a 30 dias.
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Bruno Aguiar Carrara de Melo
Coordenador Técnico de Regulação e Fiscalização Econômico-Financeira
Economista – CORECON-MG nº 5564
Magnus Antonio Gusman
Fiscal Econômico-Financeiro
MASP: 359.389-4
Matheus Valle de Carvalho e Oliveira
Assessor Jurídico da Coordenadoria de Regulação e Fiscalização Econômico-Financeira
MASP: 1.309.340-6
Samuel Alves Barbi Costa
Gerente de Fiscalização Econômico-Financeira
Economista – CORECON-MG nº 7420