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Relatório de Estágio apresentado para cumprimento dos requisitos necessários
à obtenção do grau de Mestre em Edição de Texto realizado sob a orientação
científica de Fernando Cabral Martins
Agradecimentos
À minha mãe, Helena, por me apoiar em mais um desafio.
Ao Vladimiro e à Fátima, por me receberem de braços abertos e proporcionarem uma
excelente oportunidade de aprendizagem.
À Rita, pelas gargalhadas.
Ao professor Fernando Cabral Martins, pela orientação.
Relatório de Estágio na Editora Ponto de Fuga
Helena Sofia de Magalhães Martins
Resumo
Este relatório tem como objetivo a descrição do meu estágio na editora Ponto de
Fuga, entre julho e novembro de 2017. As várias tarefas que tive, entre elas revisão de
texto e de traduções, serão descritas e analisadas tendo em conta o conhecimento prévio
adquirido no Mestrado de Edição de Texto.
Será também descrita a posição que a Ponto de Fuga ocupa no mercado editorial
português, bem como os desafios que enfrenta enquanto editora independente.
Palavras-chave: revisão de texto; tradução; edição; mercado
Relatório de Estágio na Editora Ponto de Fuga
Helena Sofia de Magalhães Martins
Abstract
With this internship report I intend to describe the time I spent at Ponto de Fuga
publishing house as an intern, from July to November 2017. I will list the various
assignments I was tasked with, from proofreading to revising translations, and I will
assess them critically within the context of the Editing and Publishing master’s
programme.
Furthermore, I will provide a brief analysis of Ponto de Fuga’s placement within
the Portuguese publishing world and what kind of challenges it faces as an independent
publishing house.
Keywords: proofreading; translation; editing; publishing;
Índice
Introdução………………………………………………………………… 1
1. A Ponto de Fuga ………………………………………………………. 2
2. O estágio ………………………………………………………………. 4
2.1. Revisão de texto ……………………………………………. 4
2.1.1. Reinaldo Ferreira ………………………………............... 4
2.1.2. Gertrude Stein …………………………………………… 9
2.1.3. André Brun ……………………………………………… 11
2.1.4. Beatrix Potter …………………………………………… 12
2.1.5. Natália Correia ………………………………………….. 12
2.1.6. Carlos Eurico da Costa …………………………………. 13
2.2. Outras tarefas ………………………………………………. 15
Conclusão ………………………………………………………………... 17
Bibliografia ……………………………………………………………… 19
Anexos …………………………………………………………………... 20
Anexo 1………………………………………………………………….. 20
Anexo 2 …………………………………………………………………. 21
Anexo 3…………………………………………………………………. 22
Anexo 4…………………………………………………………………. 23
Anexo 5…………………………………………………………………. 24
Anexo 6…………………………………………………………………. 25
Anexo 7…………………………………………………………………. 26
1
Introdução
O presente relatório tem como objetivo a descrição e análise da minha experiência
durante o estágio realizado na editora Ponto de Fuga, entre julho e novembro de 2017.
Optei pelo estágio enquanto componente não-letiva não só por achar ser
necessário pôr em prática os conhecimentos adquiridos durante o mestrado em Edição de
Texto, mas também por considerar que seria uma experiência absolutamente
complementar ao meu percurso académico.
O meu interesse em literatura foi sempre marcado pelo fascínio com autores de
língua inglesa, o que influenciou o meu ciclo de estudos no ensino superior, tendo sempre
optado por cadeiras que aprofundassem os meus conhecimentos. Quando chegou a hora
de escolher a editora à qual iria dedicar quatro meses, a Ponto de Fuga apresentou-se
como uma forte opção. O seu catálogo, embora ainda composto por poucos títulos,
distinguia-se pela qualidade das obras escolhidas, com autores que me chamavam a
atenção, como Virginia Woolf e William Faulkner.
Quando me dirigi à pequena loja que serve de base de operações da Ponto de Fuga
para uma entrevista, percebi que a minha escolha tinha sido acertada. À entrada da loja,
a montra, repleta de pequenas antiguidades, reflete imediatamente o aspeto que os dois
responsáveis, Vladimiro Nunes e Fátima Fonseca, pretendem dar à editora. Ao longo da
entrevista percebi também que teria a possibilidade de travar conhecimento com todas as
vertentes de trabalho inerentes a uma casa, desde a esperada revisão de texto e de provas
até à relação com as distribuidoras e às estratégias de comunicação, sem as quais qualquer
editor terá dificuldade em subsistir.
Num primeiro momento irei dar a conhecer a origem da Ponto de Fuga, bem como
o seu funcionamento enquanto editora independente de pequena dimensão, tendo em
conta o seu posicionamento no mercado editorial português.
De seguida farei o levantamento do trabalho que realizei ao longo do estágio,
apresentando sempre que possível as observações que fiz no decorrer do mesmo.
Por último, pretendo fazer uma pequena reflexão sobre a influência que o
mestrado e o estágio exerceram um sobre o outro e sobre o modo como o estágio
contribuiu para a finalização do meu percurso académico.
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1. A Ponto de Fuga
A Ponto de Fuga foi fundada em agosto de 2014, por Vladimiro Nunes e Fátima
Fonseca. Definiram um perfil editorial generalista, pretendendo editar livros no campo da
literatura portuguesa e estrangeira que considerassem com valor para serem divulgados.
Ao mesmo tempo, havia também o desejo de dar à editora uma abordagem centrada em
autores proveniente da própria experiência dos seus fundadores enquanto leitores.
Para esse efeito, e numa primeira movimentação no mercado editorial português,
reeditaram a coleção de livros infantis Petzi. Em simultâneo, para assinalar os 40 anos do
fim do PREC1, lançaram Não Percas a Rosa / Ó Liberdade, Brancura do Relâmpago,
uma edição que reúne não só o diário que Natália Correia manteve durante o decurso do
PREC, mas também crónicas por ela escritas durante o mesmo período, além de uma série
de inéditos.
Em 2015 são abordados pela Europress, a gráfica com a qual até então haviam
trabalhado para impressão de livros, com a proposta de criarem uma chancela em
conjunto. Os custos de impressão representam um pesado investimento, e para uma
pequena editora independente como a Ponto de Fuga, a parceria foi acolhida com agrado,
nascendo então a chancela Pim! Edições.
Tal como havia acontecido com o livro da Natália Correia, a Pim! decidiu, para o
seu arranque, celebrar uma efeméride: os 150 anos do nascimento de Beatrix Potter. Com
esse propósito, preparou uma edição integral, em quatro volumes, dos contos infantis
escritos e ilustrados pela autora britânica. O recurso às efemérides será uma estratégia
adotada muitas vezes tanto na Ponto de Fuga como na Pim!, de modo a aproveitar a
ocasião dos aniversários para expandir as oportunidades de divulgação das obras.
Continuando numa vertente mais vintage, lançaram em 2017 Retratos de Jovens
Senhoras, Cavalheiros e Casais, de Charles Dickens e Edward Caswall, a tempo de
celebrar o Dia dos Namorados.
Na segunda metade de 2017 publicaram O Mistério da Rua Saraiva de Carvalho,
o primeiro livro de uma coleção dedicada à obra policial de Reinaldo Ferreira, mais
1 Processo Revolucionário em Curso.
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conhecido como «Repórter X», aproveitando os 120 anos do nascimento do autor e os
100 anos da primeira publicação da obra, nas páginas do jornal O Século, em 1917.
Com a Pim! em crescimento, em 2016 a Ponto de Fuga acabou por passar por
momentos difíceis em termos de distribuição. A Urbanos Press, distribuidora com a qual
trabalhavam, e o grupo à qual esta pertencia, começaram a experienciar dificuldades
económicas, e a Ponto de Fuga tomou a difícil mas oportuna decisão de mudar de
distribuidora, para a Bertrand. Seis meses depois, a Urbanos Press entrava em processo
de insolvência.
Num mercado onde é praticamente impossível uma pequena editora como a Ponto
de Fuga conseguir impor-se com distribuição própria, os quatro meses que decorreram
entre a mudança de distribuidoras implicaram um hiato na atividade da editora. Com a
recolha dos livros distribuídos pela Urbanos e a sua recolocação no mercado pela
Bertrand, não foi possível cumprir o planeamento editorial delineado para 2017.
No entanto, a editora iniciou o ano com um parceiro de distribuição mais forte e
com uma série de títulos prontos a serem lançados. Publicaram Momentos de Vida, uma
antologia de escritos autobiográficos de Virginia Woolf inéditos em português, e, para
assinalar os 150 anos do nascimento de Raul Brandão, reeditaram o último livro escrito
pelo autor, O Pobre de Pedir.
Inauguraram também uma coleção infantojuvenil com uma característica peculiar:
todos os livros foram escritos por autores que não eram conhecidos por escreverem para
crianças. Nesta coleção, o primeiro título foi A Árvore dos Desejos, de William Faulkner.
Já durante o estágio colaborei na revisão do segundo livro da coleção, uma edição bilingue
de O Mundo é Redondo, de Gertrude Stein.
Também de Gertrude Stein, e prosseguindo no registo autobiográfico, a Ponto de
Fuga publicou A Autobiografia de Alice B. Toklas.
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2. O estágio
Iniciei o estágio numa fase em que a Ponto de Fuga se encontrava a recuperar da
situação de distribuição com a Urbanos Press. Inesperadamente, o meu estágio coincidiu
com o de outra estagiária, uma colega de mestrado, o que acabou por ser uma situação
extremamente positiva tanto para nós as duas como para a editora. Por um lado, começar
uma etapa tão importante deixou-me algo nervosa, mas ao poder partilhar esta experiência
com outra pessoa que se encontrava numa situação semelhante, consegui ambientar-me
mais rapidamente a esta nova realidade. Por outro lado, o facto de cada uma ter uma
formação académica diferente beneficiou a editora. A minha colega “tinha olho” para a
literatura portuguesa e para a poesia, já eu sentia-me bastante à vontade com a literatura
inglesa e traduções do inglês. Tendo em conta os nossos pontos fortes, o Vladimiro não
teve dificuldade em dividir o trabalho entre nós, ficando a minha colega encarregue com
mais frequência de manuscritos em português e eu de traduções.
Com uma estrutura mínima e, até então, apenas duas pessoas encarregues de fazer
toda a editora funcionar, o volume de trabalho inicial parecia ser enorme. Havia que
terminar a revisão de dois livros de Gertrude Stein, preparar o lançamento de O Mistério
da Rua Saraiva de Carvalho, iniciar a recuperação de mais originais de Reinaldo Ferreira,
para dar seguimento à coleção, e começar o processo de fixação e revisão de texto numa
série de outras obras de autores como André Brun, Beatrix Potter e Natália Correia. Estas
foram as tarefas que mais tempo ocuparam e nas quais participei mais aprofundadamente,
mas, como é natural numa editora de pequena dimensão, tive a possibilidade de ajudar
em outros aspetos, desde a redação de press releases à expedição de livros e à receção de
originais.
2.1. Revisão de texto
Reinaldo Ferreira
O “Repórter X” foi o autor que mais trabalhei ao longo do estágio. Comecei pela
fixação e revisão de uma série de três fascículos, A Rússia dos Sovietes, Mistérios de
Moscovo e Inferno e Paraíso, que compunham uma reportagem por ele escrita aquando
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de uma suposta ida à Rússia em 19252, enquanto jornalista a serviço da revista ilustrada
ABC, para acompanhar o rescaldo da morte de Lenine. Para incluir nesta edição, trabalhei
também três novelas do mesmo autor, A Aventura dum Português na Rússia, Os Russos
da Minha Pensão e O Homem que Embalsamou Lenine, e fiz a revisão de duas entrevistas
que Reinaldo havia feito sobre Rasputine e Lenine.
Para além destes textos, trabalhei em As Sensacionais Aventuras de Jim-Joyce, o
Ás dos Detetives Americanos, A Vida dum Aventureiro, O Táxi nº 9297 e As Sombras do
Barredo.
A viva imaginação de Reinaldo Ferreira foi a minha prova de fogo no mundo da
edição. Tanto as suas entrevistas e reportagens como a sua ficção estão repletas de
“reinaldices”, o termo afetivo que passei a usar para me referir às incoerências,
inconsistências e invenções com as quais me vi, de início, assoberbada, mas que agora
considero terem sido particularmente importantes no crescimento das minhas
capacidades.
Antes de poder começar a trabalhar no texto em si, é necessário transformá-lo de
um ficheiro pdf pesquisável para um documento de texto, e ao longo deste processo é
frequente ocorrerem gralhas, pois o software utilizado é falível e tem dificuldades em
reconhecer certas letras, acabando por transcrever “urna” em vez de “uma” ou “corno”
em vez de “como”. O meu trabalho passava por corrigir estas ocorrências e outros erros
ortográficos, bem como atualizar a grafia em consonância com o Acordo Ortográfico de
1990. Este trabalho provou ser mais complicado do que ao início parecia, especialmente
nos textos de cariz soviético.
Na sua reportagem sobre a Rússia, Reinaldo menciona várias localizações e
personagens russas e consegue quase sempre escrever os seus nomes de maneiras
diferentes (cf. Anexo 1), desde o nome de uma redação russa escrito de três formas, à
mulher de Lenine, a quem Reinaldo chama tanto Krep Lenine como Maria, sendo que
nenhum desses nomes corresponde ao verdadeiro, como sucede, de resto, com o nome
completo de Trotsky.
Também a uniformização da grafia foi um problema. Reinaldo é bastante
descritivo no decorrer dos três fascículos e faz referência a várias ruas e bairros. Ao
2 Segundo Joel Lima, que tem trabalhado com a editora na obra de Reinaldo, o Repórter X nunca chegou a
ir à Rússia. Teria ficado em Paris, de onde escrevia os textos que depois enviava para Portugal.
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contrário dos nomes próprios, que frequentemente estavam errados, a dificuldade com os
nomes das ruas deveu-se ao facto de Reinaldo não apresentar qualquer tipo de critério ao
longo da sua escrita (cf. Anexo 2). É frequente encontrar terminações semelhantes escritas
de duas formas diferentes, com uma versão que corresponde em parte à norma inglesa e
outra que se aproxima de uma norma portuguesa.
O foco do meu trabalho estava não só em apresentar um texto legível, sem erros
ortográficos e que desse prazer em ler, mas também em assinalar estas inconsistências,
em fazer um trabalho de pesquisa sobre o qual me pudesse apoiar quando fazia pequenas
notas de rodapé a assinalar um nome incorreto ou um dado erróneo. O facto de não ter
conhecimento da língua russa foi uma grande influência na demora do trabalho, e por
vezes era difícil ter a certeza se aquilo que estava no texto era verídico, se era Reinaldo a
tomar liberdades com a sua narrativa ou se era uma das suas incoerências.
A minha experiência com os dez volumes de As Sensacionais Aventuras de Jim-
Joyce, o Ás dos Detetives Americanos foi algo parecida. Da Rússia passei para os Estados
Unidos da América, e da reportagem passei para a ficção. Os nomes inventados e as
incoerências permaneceram, mas desta vez o fator atenuante era o de se tratar de uma
narrativa fictícia, na qual Reinaldo tinha toda a legitimidade para não corresponder ao
real histórico, se assim o entendesse. De qualquer maneira, assinalei todas as
impossibilidades que Reinaldo referia, desde estações de metro que à data não existiam a
nomes de localizações que não se encontravam em nenhum mapa, para que, quando o
Vladimiro fosse fazer a revisão final, pudesse tomar decisões sobre o texto de um modo
informado.
Também nestes volumes me deparei com problemas de uniformização,
especialmente no volume 1, O Mistério do Metropolitano, e no volume 10, O Clube dos
Regicidas. Ao longo destes dois volumes, Reinaldo refere-se repetidamente a carruagens
de comboios e metros que transportam passageiros, e utiliza dois termos para o fazer:
“vagon” e wagon (cf. Anexo 3). Wagon aparece duas vezes no texto, ambas entre aspas,
as quais Reinaldo utilizava frequentemente quando recorria a estrangeirismos nas suas
histórias. Já “vagon”, embora se encontre mais de dez vezes nos textos, apenas uma ou
duas vezes aparece entre aspas. Este pequeno pormenor pode ser interpretado de duas
manerias: ou Reinaldo simplesmente se esqueceu das aspas para assinalar que “vagon”,
no seu entender, era um estrangeirismo, ou decidiu normalizar o uso deste vocábulo, que
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não faz parte da língua portuguesa. Conhecendo o estilo peculiar de Reinaldo, é possível
que estas ocorrências sejam lapsos, dado o seu uso do vocábulo correto, wagon.
No entanto, lapso ou não, o problema para o editor permanece. À medida que ia
trabalhando nestes volumes, atualizando a grafia e indicando todas as outras incoerências
que inevitavelmente ia encontrando, não podia deixar de me perguntar como é que este
problema poderia ser resolvido. Esta foi provavelmente a primeira vez que tive
verdadeiramente de pensar sobre a influência que o editor poderá ter sobre o texto.
Parecia-me óbvio que não podia deixar ficar um vocábulo inexistente na língua
portuguesa sem qualquer tipo de pontuação. Para além disso, “vagon” também não fazia
parte do vocabulário inglês, ou do francês, embora fosse possível tentar explicar a sua
existência com o facto de corresponder foneticamente ao vocábulo francês wagon. Sendo
assim, deveria o editor corrigir a grafia e transformar todas as ocorrências de “vagon” em
wagon? Ou deveria traduzir o termo, presumindo que Reinaldo teria tentado usar “vagon”
da mesma forma que se utilizaria “vagão” ou “carruagem”?
Esta questão está presente ao longo de outros textos de Reinaldo, em que ele faz
uso de estrangeirismos quando existe uma versão portuguesa, mas tal pode ser explicado
pelo facto de, há quase cem anos, a versão estrangeira da palavra ainda ser a norma. É
apenas neste caso que Reinaldo utiliza uma palavra que simplesmente não existe, seja na
sua própria língua, seja nas duas outras que é frequente usar nos seus textos. Devido ao
volume de trabalho e à urgência de outros projetos, não foi possível aprofundar esta
questão antes do término do estágio, tendo eu acabado por começar a trabalhar em outros
títulos cujos lançamentos se encontravam à porta.
Até aqui, o meu trabalho era de cariz mais ou menos superficial. Embora fizesse
alterações óbvias em termos de grafia e corrigisse erros ortográficos, todas as alterações
que achasse serem necessárias a um nível mais profundo no texto eram deixadas a
vermelho no documento word, destacadas para que o Vladimiro depois desse a sua
opinião final. Quando se pôs a possibilidade de lançarmos ainda em 2017 a reportagem
na Rússia, em conjunto com outros pequenos textos alusivos ao mesmo tema, foi
necessário que toda a equipa se aplicasse neste trabalho e para isso foi-me pedido que
revisse duas entrevistas escritas sobre Rasputine e Lenine. Pela primeira vez, teria de ser
eu a tomar a responsabilidade e a decidir com finalidade sobre o texto (cf. Anexo 4), e
aqui considero que a existência de um livro de estilo me teria dado uma grande ajuda.
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Durante o processo de revisão deparei-me com momentos em que Reinaldo
pretende dar ênfase a certas palavras e expressões no texto da entrevista sobre Rasputine,
recorrendo às aspas liberalmente para tal efeito. No entanto, são as aspas também o seu
método preferido de assinalar estrangeirismos, conforme acima referido. Foi necessário
decidir a estratégia a aplicar ao texto, e acabei por me socorrer várias vezes do Vladimiro
para perceber qual a norma que a Ponto de Fuga aplicava aos seus títulos, de modo a fazer
um trabalho coerente com o que havia sido feito até aqui. Um livro de estilo teria sido
uma maneira de agilizar todo este processo, sendo que por vezes até o Vladimiro não se
recordava de como certos problemas de cariz idêntico tinham sido resolvidos em títulos
anteriores, o que nos levava a despender de mais tempo à procura de uma solução.
A revisão da entrevista sobre Lenine foi mais simples, uma vez que o texto
correspondia quase por inteiro ao último capítulo do último fascículo da reportagem de
1925 de Reinaldo. Apenas tive de comparar o texto que tinha em mãos com aquele sobre
o qual já havia trabalhado, ignorando quaisquer partes que fossem iguais, pois essas
seriam revistas pelo Vladimiro, e focando-me apenas naquelas que representavam novos
acrescentos.
Numa reviravolta peculiar, a fixação do texto de O Táxi nº 9297 foi a que menos
trabalho me deu e a que consegui fazer mais rapidamente. Se até aqui todos os textos de
Reinaldo eram provenientes de jornais e revistas do início do século XIX e necessitavam
de um olhar atento, O Táxi nº 9297 foi trabalhado a partir de uma edição de 1974,
publicada pela Arcádia e editada pela Natália Correia, autora cujas obras também
trabalhei. A diferença entre este título e todos os outros era notória: a completa ausência
das incoerências a que me tinha acostumado, o uso correto da vírgula e do travessão, os
nomes cuja grafia não variava de capítulo a capítulo. Não só pude ver como seria uma
obra de Reinaldo depois de editada, mas também foi interessante ler um título com a
influência da Natália e mais tarde poder trabalhar com os seus manuscritos.
A última obra que trabalhei foi As Sombras do Barredo, um texto que até então
tinha sido publicado apenas em jornal. As fotocópias a que tínhamos acesso eram de fraca
qualidade, o que tornou impossível a utilização de ficheiros OCR para tornar a transcrição
mais fácil. Dada a quantidade das fotocópias, cerca de 90, correspondendo ao número de
fascículos, foi tomada a decisão de dividir o trabalho entre as duas estagiárias, ficando
cada uma com metade das fotocópias. Foi então necessário transcrever todo o texto
diretamente para um documento de texto, o que dificultou um pouco o processo de fixação
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e revisão. Tornou-se cansativo estar sempre a parar de transcrever para assinalar uma
dúvida de revisão ou um erro de sintaxe, mas ao transcrever o texto todo de uma vez
também foi mais difícil voltar atrás e apanhar todos os erros, pois já estava familiarizada
com o texto e poderia não conseguir reconhecer uma vírgula a mais ou uma letra a menos.
Por essa razão decidi rever o que tinha transcrito capítulo a capítulo. Pareceu-me
um meio-termo adequado, e penso que consegui realizar o trabalho de forma competente
e cuidada, chegando a encontrar duas ou três ocasiões em que, mais uma vez, Reinaldo
se revela caracteristicamente incoerente.
A obra de Reinaldo Ferreira foi transversal ao meu estágio, tendo trabalhado nela
desde o primeiro dia até à penúltima semana, quando tive de parar por causa de outro
projeto. Foi através do imaginário de Reinaldo que consegui avaliar a evolução das
minhas capacidades, comparando a minha hesitação em assinalar o que entendia serem
passagens merecedoras de revisão em A Rússia dos Sovietes, o primeiro título em que
trabalhei, com a confiança com que tomei as rédeas do texto em As Sombras do Barredo,
o último título.
Gertrude Stein
Como é normal numa estrutura pequena, por vezes é necessário deixar a meio o
que se está a fazer porque surge outro projeto mais premente e é preciso dar uma ajuda.
Foi o caso de Gertrude Stein, cujos títulos, entre revisões complexas e ilustrações
demoradas, corriam o risco de verem o seu lançamento atrasado. Em O Mundo é Redondo
ajudei na fixação do texto da versão inglesa, uma vez que o plano era fazer uma edição
bilingue. Já em A Autobiografia de Alice B. Toklas fui mais um par de olhos na revisão
inicial da tradução, e depois ajudei também na revisão das provas.
O Mundo é Redondo não apresentou dificuldades. A tradução já se encontrava
feita e revista, e a fixação do texto original foi feita com o cuidado de manter a formatação
original. Apenas tive de ter atenção àquelas gralhas comuns aos OCR e corrigir quaisquer
que encontrasse.
A revisão da tradução de A Autobiografia de Alice B. Toklas foi algo novo para
mim. Embora tivesse experiência com o processo de tradução, através da frequência de
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cadeiras de tradução durante a licenciatura, ter de o fazer num contexto profissional e
num livro no qual o meu nome iria constar foi de uma grande responsabilidade.
O estilo de escrita de Stein, com a sua ausência de aspas e de itálicos, e com o uso
da vírgula para marcar falas, não me era desconhecido. Reconhecia-o em Saramago, e,
por estar familiarizada com a obra deste autor, considero que me senti um pouco mais à
vontade para me debruçar sobre a tradução do original de Stein. A abordagem adotada,
como consta da nota de tradução (Stein, 5), consistia em preservar o estilo da autora para
que o leitor português tivesse uma experiência o mais próxima possível do original,
corrigindo apenas erros nítidos.
Tendo isto em conta, o meu dever foi sobretudo o de olhar para as provas com
olhos de quem nunca tinha tido acesso ao original em inglês, pôr-me no lugar de leitor e
fazer uma revisão de forma a garantir que alguém que lesse aquele livro não se perdesse
pelas memórias de Stein mais do que uma pessoa que tivesse lido o texto original. Fiz
algumas sugestões (cf. Anexo 5) quando me deparei com frases mais ambíguas, que
dificultavam a compreensão no português e que me pareciam ter sido traduzidas de uma
maneira mais literal do que a necessária, para além de ter assinalado as pequenas gralhas
que é natural encontrar numa prova.
Fiz a revisão das provas no final do primeiro mês de estágio e embora sentisse
confiança nas minhas capacidades, havia uma diferença patente entre traduzir e rever uma
tradução. Por vezes duvidava dos meus instintos e do meu conhecimento do português,
especialmente em frases que me poderiam soar estranhas mas que, conhecendo o estilo
de Stein, eram perfeitamente possíveis no original.
De certa forma, encarei esta revisão como o primeiro teste do meu estágio e talvez
tenha colocado demasiado pressão em mim mesma, mas ao mesmo tempo foi essa pressão
que me obrigou a questionar todas as decisões que fazia e a justificar todas as alterações
que propunha, para que pudesse apresentar o melhor trabalho possível. Com prática,
penso que este rigor na revisão se poderá tornar quase um instinto, e ao ler traduções por
prazer dou por mim a fazê-lo com uma olhar mais crítico, a dar mais atenção ao texto e a
tentar perceber como seria o original.
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André Brun
O autor que provavelmente me deu mais prazer trabalhar foi André Brun,
humorista português do século XX cuja obra, composta na sua maioria pela sátira da classe
média lisboeta dos anos 20, ainda hoje é relevante.
Relativamente a este autor, trabalhei em quatro títulos sendo eles Outra vez
Praxedes, Procópio Baeta, e os primeiros dois volumes de uma trilogia de pequenos
contos, Sem Pés nem Cabeça e Cada Vez Pior.
O processo de revisão para todos estes títulos foi semelhante ao que até então tinha
sido feito. Preparar ficheiros pdf pesquisáveis de modo a extrair o texto e depois tratar de
fixar o mesmo, atualizando a ortografia e assinalando passagens que levantassem
problemas e tivessem de ser solucionadas com o Vladimiro.
A obra de Brun pareceu oferecer menos problemas comparativamente à de
Reinaldo Ferreira, e permitiu-me a oportunidade de trabalhar com um tipo de texto
diferente. Embora Reinaldo tivesse uma vertente algo humorística em certos textos, era
um escritor de policiais. Com Brun, todo o trabalho à volta da sua obra prendeu-se com
questões estilísticas e de formatação, embora por vezes fosse necessário o fact-checking
a que Reinaldo me tinha habituado, mas os enganos em factos eram quase sempre
propositados de modo a proporcionar um momento humorístico.
Notei também uma evolução na minha capacidade de olhar o texto, de diferenciar
entre aquilo que corresponde ao tom e estilo do autor e aquilo que representa uma
possibilidade de intervenção por parte do editor, podendo-se dizer que este foi um ponto
de viragem no meu trabalho na Ponto de Fuga.
Até aqui tinha encarado o texto como algo que à partida teria sempre de sofrer
algum tipo de intervenção, o que não está necessariamente incorreto, mas antes de “entrar
pelo texto a dentro”, como diz o Vladimiro, é importante perceber o autor e o seu texto.
Alterar vírgulas e expressões só para justificar o facto de ser a revisora de um texto não é
um bom trabalho.
Para além da oportunidade de fazer algo diferente, a revisão da obra de André
Brun deu-me a oportunidade de trabalhar em equipa de forma mais significativa. Esta foi
a primeira vez que eu e a minha colega trabalhámos uma trilogia em conjunto, o que não
só proporcionou uma segunda perspetiva sobre o meu trabalho, e vice-versa, uma vez que
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nos deparávamos com desafios semelhantes, mas também nos permitiu alguns momentos
mais leves, durante os quais comentávamos sobre as peripécias do protagonista ou líamos
passagens humorísticas que nos faziam rir à gargalhada.
Beatrix Potter
A certa altura surgiu a possibilidade de reeditar os quatro volumes da obra de
Beatrix Potter num só, que integrasse a obra completa da autora. O trabalho consistiu em
comparar os textos publicados com os respetivos ficheiros word, de modo a uniformizar
o texto em geral. Ao longo desta tarefa, deparei-me com passagens que faziam parte dos
volumes publicados mas que não encontravam correspondência nos ficheiros word a que
tinha acesso. Desde simples omissões de algumas letras a várias frases que tinham sido
reescritas, as diferenças amontoavam-se à medida que ia avançando neste projeto (cf.
Anexo 6).
Perguntei ao Vladimiro o porquê destas discrepâncias e fiquei a saber mais um
pouco sobre o trabalho de um editor, que não acaba quando o livro vai para a gráfica. A
paginação pode, por vezes, alterar a formatação do texto, deixando espaços em branco
excessivamente grandes, e é então necessário alterar o texto de modo a resolver este
problema. Os ficheiros com os quais estava a trabalhar representavam a primeira versão
que tinha sido enviada à gráfica, antes de lhes serem introduzidas alterações. O meu
trabalho, portanto, foi atualizar os ficheiros de modo a corresponderem ao que havia sido
publicado, para que não se encontrassem diferenças entre a edição completa e os quatro
volumes previamente publicados.
Natália Correia
O meu contacto com a obra de Natália Correia foi curto mas extremamente
trabalhoso. Foi feito à Ponto de Fuga um convite, por parte da Cooperativa António
Sérgio para a Economia Social, para participar na edição de um conjunto de textos, alguns
éditos e alguns inéditos, que Natália Correia escreveu sobre António Sérgio. A
investigadora Ângela Almeida, que tem trabalhado com a editora na recolha de materiais
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do espólio da escritora, depositado na Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Ponta
Delgada, enviou-nos um conjunto de cinco pastas que continham manuscritos e
datiloscritos.
Tal como havia acontecido com As Sombras do Barredo, foi impossível extrair o
texto dos ficheiros para um documento editável, o que levou a que grande parte do meu
trabalho fosse transcrever manualmente os textos que me tinham sido atribuídos. Foi um
processo demorado e algo cansativo, mas consegui perceber que certas passagens de texto
que tinha transcrito num documento se encontravam presentes noutro, numa forma mais
elaborada, bem como outras passagens que não se encontravam presentes nos manuscritos
mas que eram depois adicionadas aos respetivos datiloscritos. Tratei então de assinalar
essas passagens (cf. Anexo 7), para além da habitual revisão de texto à procura de gralhas
ou erros, para que posteriormente o Vladimiro pudesse decidir como organizar a obra.
Neste caso utilizei os conhecimentos adquiridos em Crítica Textual, sendo
extremamente relevantes para o trabalho que tinha em mãos. Achei importante
transcrever tanto os manuscritos como os datiloscritos, embora ambos representassem
dois momentos diferentes da escrita dos textos. Por um lado, senti que, ao mergulhar nos
manuscritos diretamente, conseguia compará-los aos datiloscritos de uma forma mais
aprofundada. Ter duas ou mais versões de um texto à minha frente possibilitou uma
análise mais pormenorizada do que se tivesse trabalhado apenas uma versão. Por outro
lado, ao comparar as várias versões consegui compreender um pouco melhor o estilo de
Natália Correia, e perceber de entre os vários textos que tinha entre mãos quais os que
constituíam a versão mais recente que ela havia escrito, para que no produto final não se
encontrassem repetições desnecessárias que não iriam corresponder à visão que a autora
tinha para o texto.
Carlos Eurico da Costa
O último projeto no qual trabalhei chegou à editora na última semana do estágio.
Tratava-se da obra édita e inédita de Carlos Eurico da Costa, poeta e artista plástico do
século XX, ligado ao movimento surrealista, que os filhos do autor pretendiam que fosse
reeditada. Foi entregue à editora o espólio literário do autor na forma de manuscritos e
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datiloscritos arrumados por décadas numa série de pastas, bem como duas outras pastas
que continham poemas por arrumar e poemas sem data.
O primeiro passo a tomar foi o de digitalizar todo o material para que o
pudéssemos ter disponível num ambiente digital, de forma a que a subsequente separação
entre éditos e inéditos fosse mais fácil. Esta separação decorreu do plano de edição
adotado: manter a ordem original dos livros já publicados e depois acrescentar,
cronologicamente, os inéditos que tivessem qualidade suficiente para serem editados.
Esta última parte do projeto ainda decorre.
Optou-se por excluir todos os poemas que constituíssem versões anteriores de
poemas já publicados, uma vez que não faria sentido apresentá-los juntamente com a
versão final. Por outro lado, o processo de identificação dos inéditos foi um trabalho
moroso por duas razões.
A primeira prende-se com o facto de ser por vezes difícil identificar o que
constituía uma versão inicial de um poema já editado e o que era verdadeiramente um
inédito. Alguns dos poemas continham versos que o autor tinha aproveitado para outros
poemas, que entretanto tinham sido publicados. Nestes casos optou-se por excluir
também esses poemas, por se considerar que seriam uma versão incipiente.
A segunda razão resulta da existência de várias versões do mesmo poema inédito,
sendo por isso necessário identificar a versão final. Alguns dos poemas encontravam-se
em diferentes fases, desde rascunhos em guardanapos e manuscritos em vários tipos de
papel a datiloscritos, uns com emendas a tinta e outros sem. Durante este processo, e tal
como havia acontecido com Natália Correia, dei por mim a relembrar-me das aulas de
Crítica Textual sobre os processos da crítica textual genética, de modo a encontrar a
última versão de todos os poemas, considerada a versão que o autor pretendesse que fosse
publicada.
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2.2. Outras tarefas
Para além do trabalho com o texto tive a oportunidade de lidar com outros aspetos
pertinentes ao mundo da edição, com níveis de envolvimento diferentes.
No seguimento da inauguração da coleção de Reinaldo Ferreira, e depois de já
terem sido trabalhados os textos que tínhamos disponíveis, deparámo-nos com um
problema. Um dos títulos que me chegou às mãos foi As Sombras do Barredo e constituía
uma incrível oportunidade para publicar um texto de Reinaldo Ferreira que até então
nunca havia sido editado em livro. A fraca qualidade das fotocópias com as quais teria de
trabalhar ditaram uma ida à Biblioteca Nacional.
O Vladimiro teve a disponibilidade e a amabilidade de oferecer às duas estagiárias
o cartão da Biblioteca Nacional e eu deparei-me com uma faceta da edição sobre a qual
nunca tinha pensado muito: como é que a Ponto de Fuga obtinha os títulos com os quais
trabalhei de forma tão próxima?
No caso de Reinaldo em particular, a ida à Biblioteca Nacional significou
encontrar cinco novelas policiais e um livro, e também os originais do jornal onde As
Sombras do Barredo tinham sido publicadas. À exceção dos originais, que não ficariam
com melhor qualidade do que as fotocópias que tínhamos, todos os outros textos foram
fotocopiados e regressámos à Ponto de Fuga com mais material para trabalho. Com
autores que já se encontram em domínio público, esta é uma das maneiras de se poder
reeditar o seu trabalho.
Numa ocasião em especial, assisti a uma reunião com um autor, estando em cima
da mesa a possibilidade de edição do seu livro por parte da Ponto de Fuga, e percebi que
às vezes tudo isto pode parecer um pouco como o jogo da corda, até que cheguem a acordo
ou que a corda se parta. O livro iria ser ilustrado, mas ainda não se tinha chegado a um
consenso quanto ao ilustrador a escolher, sendo que o autor apresentava forte oposição às
propostas que Vladimiro e Fátima lhe faziam. No final, a Ponto de Fuga acabou por
prescindir do livro.
Tive a possibilidade de lidar de perto com a “correria” que é a finalização de um
livro até ao seu lançamento, incluindo não só a revisão de provas finais, mas também toda
a área de assessoria de comunicação. Lidei com situações em que o calendário que tão
bem preparámos parece estar prestes a implodir com atrasos em ilustrações, como
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aconteceu com O Mundo é Redondo, e com revisões mais demoradas nos casos de A
Autobiografia de Alice B. Toklas e o conjunto de volumes sobre a Rússia de Reinaldo
Ferreira (cujo lançamento acabou adiado para 2018).
Estive presente em três lançamentos da Ponto de Fuga: O Mistério da Rua Saraiva
de Carvalho, de Reinaldo Ferreira, as duas obras acima mencionadas de Gertrude Stein,
e ainda 33 Revoluções, de Canek Sanchéz Guevara, cuja edição já estava preparada antes
de começar o estágio. A preparação destes lançamentos implicou uma série de tarefas que
não estavam diretamente relacionadas com os atos de revisão e edição de um texto, mas
que não deixavam de ser relevantes para o sucesso de um livro, nomeadamente a criação
de uma página no Facebook para publicitar o evento e o envio dos livros atempadamente
para os convidados que os iriam apresentar.
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3. Conclusão
Tentei ao longo do relatório apresentar a minha experiência de estágio em função
do seu enquadramento no meu percurso de mestrado. Não teria sido possível trabalhar da
forma como trabalhei se não tivesse todo um conhecimento teórico que guiasse as minhas
ações e decisões. Da mesma maneira, penso que o estágio curricular foi imprescindível
na consolidação dos meus conhecimentos, e sem ele não poderia considerar o mestrado
completo.
Quando comecei o estágio não tinha uma noção completa do que seria trabalhar
numa editora. Embora ao longo do mestrado tenha tido cadeiras onde o funcionamento
de uma editora foi explicado, tal foi feito de uma forma mais superficial, muitas vezes
apenas sobre o processo de edição de um livro desde o original até ao lançamento e
publicação. Mesmo tendo algumas aulas com profissionais do meio, as descrições por
eles feitas enquadravam-se sempre no mercado editorial em geral e nunca nas
especificidades do dia a dia de uma editora. O estágio complementou estas abordagens
mais teóricas e permitiu-me experienciar em primeira mão realidades que me tinham sido
apresentadas apenas num contexto de sala de aula, para além de me abrir as portas àquilo
que é verdadeiramente o mundo editorial.
As cadeiras de Revisão de Texto e Técnicas de Edição deram-me as bases que me
permitiram começar o primeiro dia de estágio confiante de que conseguiria trabalhar o
texto de maneira técnica, mas foram os quatro meses que passei na Ponto de Fuga que me
proporcionaram o ambiente para perceber que ser editor é mais do que gostar muito de
ler e saber corrigir uma frase agramatical. Ao longo do estágio, dei por mim a libertar-me
das inseguranças que me prendiam ao rigor da teoria, à imagem do editor enquanto ser
infalível da língua portuguesa, e a ter mais confiança no trabalho que fazia.
Este progresso deve-se em grande maioria ao facto de ter podido trabalhar vários
géneros de texto, com registos diferentes e contextos específicos que me fizeram aplicar
todo o conhecimento que tinha adquirido até então, mas foi também o Vladimiro que me
ajudou a perceber as subtilezas do trabalho que fizemos. Ao poder trabalhar numa
pequena editora consegui experienciar um pouco todas as áreas que têm de funcionar em
sintonia para que um trabalho, que por si só já é árduo, não seja mais difícil do que o
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necessário. Ao mesmo tempo, vivi situações caricatas como uma estagiária e um editor
que não têm a certeza se a fala de um galo deve ser grafada em itálico ou não, e pessoas
que entram na loja a perguntar pelos livros ou a perguntar se algum dos presentes fala
inglês porque precisa de um tradutor.
Em conclusão, considero que este estágio foi uma mais-valia, que reforçou a
minha escolha em ter iniciado o mestrado em Edição de Texto e que não só ajudou na
preparação para uma carreira no mundo editorial, mas também contribuiu para um desejo
ainda maior de querer fazer desta indústria o meu futuro.
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Bibliografia
Correia, Natália. Entre a Raiz e a Utopia (Escritos sobre António Sérgio e o
Cooperativismo). Ponto de Fuga, 2018
Ferreira, Reinaldo. Na Rússia dos Sovietes. O Primeiro de Janeiro. n.d.
---------------------- As Aventuras de Jim-Joyce, o Às dos Detetives Americanos.
n.p. n.d.
Potter, Beatrix. Contos Completos I. Pim!, 2016
Stein, Getrude. A Autobiografia de Alice B. Toklas. Ponto de Fuga, 2017
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Anexo 3 – Exemplos dos problemas de uniformização em As Aventuras de Jim-
Joyce, o Às dos Detetives Americanos de Reinaldo Ferreira