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PROGRAMA ARTES HÍBRIDAS: PROCESSO E REFLEXÃO
Karol Luan Sales Oliveira
Ricardo Rigaud Salmito
O programa Artes Hibridas tem como objeto fomentar o diálogo entre as diversas artes e
pesquisar de que forma os coletivos artísticos da região do cariri vem atuando dentro deste
paradigma, para tal trabalhamos na elaboração de uma publicação e um documentário sobre a
cena artística local, focando na atuação de coletivos artísticos.
O processo de elaboração da publicação começou a partir da discussão de um referencial
teórico para o projeto: o livro Sincrétika, de Massimo Canevacci. No livro, o autor faz uma
etnografia do Brasil contemporâneo, usando uma metodologia nomeada por ele de vagante,
nas palavras de Canevacci:
É no vagar que se encontra o estranho, se percebe o perturbante, se
absorve o diferente, se remastiga o outro. Juntam-se fragmentos
irredutíveis e se expõem as diversas obras sincreticamente. O vagar à
procura do vago é a prática(e também o método) do artista etnógrafo
espontâneo que elabora o encontro estético com o sincrético.
(2013, p.15)
A pesquisa para o livro nasceu das estadias do autor no Brasil, para ele o Brasil é um
laboratório do sincretismo, e portanto antecipador de características culturais e
comportamentais emergentes em um mundo cada vez mais globalizado, onde as diferenças
cada vez mais se encontram e elaboram novas formas de viver. O autor destaca alguns
conceitos que permeiam esse sincretismo cultural brasileiro, dentre eles o da antropofagia.
A antropofagia é sincrética, a subjetividade, diaspórica; as
antropologias, hibridas. Elas praticam a “remastigação” de todo
código que chega de qualquer parte geográfica; selecionam
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atentamente as partes conceituais a devorar: cospem zonas carnais ou
sintaxes confusas porque consideradas saborosas e que, ao contrario,
se revelam pútridas; saboreiam o bolo antes de engoli-lo
definitivamente, defecam histórias e depois de ter absorvido toda a
nutrição possível e, como extrema raio, vomitam simbólicos pedaços
nojentos.(CANEVACCI, 2013, p.23)
É importante frisar que tipo de sincretismo o autor está falando, essa palavra está comumente
associada apenas ao sincretismo religioso, para o autor esse tipo de sincretismo está
relacionado a uma pratica defensiva das religiões de matriz africana para conseguirem existir
em um contexto que as oprimia, adotava-se em parte certas características da religião cristã
para que se pudesse ter algum nível de tolerância. Para Canevacci esse tipo de sincretismo é
baseado em uma pacificação cultural entre vencedores e vencidos. Em oposição à essa noção
de sincretismo, ele propõe um sincretismo que negue as superações dialéticas, os
evolucionismos e pacificações, um sincretismo que seja baseado no movimento, um
movimento desejante e vagante.
Assim, a leitura de Canevacci nos impeliu a buscar as disjunções, as fraturas da experiência
dentro do contexto cultural no qual estamos inseridos, procurando um outro tipo de olhar para
o nosso trabalho.
Outro referencial para os trabalhos foi o texto “Fora de Quadro” do cineasta russo Sergei
Einsenstein, neste texto o cineasta elabora uma teoria da montagem do filme a partir de um
tipo especifico de poesia japonesa, o haikai. Para Eisenstein, a montagem dialética deve
conduzir ao conflito.
Se a montagem deve ser comparada a alguma coisa, então uma legião
de trechos de montagem, de planos, deveria ser comparada à série de
um motor de combustão interna, que permite o funcionamento do
automóvel ou trator(EISENSTEIN, 2002, p.43)
Embora as duas referencias sejam de áreas e épocas distintas, é possível relaciona-los do
ponto de vista conceitual, do mesmo modo que Canevacci propõe uma dialética que seja um
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motor de produção de diferenças, e não de equalizações, a montagem dialética procura
produzir estas combustões enquanto forma, uma forma que produza conflitos.
Partindo destas referencias, realizamos algumas imersões em contextos inusuais como uma
forma de produzir deslocamentos na percepção, ao mesmo tempo levamos câmeras para
registrar esta etapa, visitamos algumas exposições e cada um levou alguma referencia, seja
artística ou literária, que tivesse relação com os temas discutidos.
Apòs essa etapa inicial, iniciamos o processo de elaboração da publicação, com o material
acumulado começamos a delinear a publicação, ficou decidido que o nome dela seria Baldio,
segundo o dicionário Michaelis, Baldio significa: 1 Frustrado, inútil, sem proveito. 2 Agreste,
estéril, inculto. sm Terreno inculto e desaproveitado.
A imagem de capa foi fruto dessas imersões, cada membro do grupo foi contribuindo de
diferentes formas para a publicação com fotos, textos e editoração. Procuramos construir uma
identidade visual condizente com os conceitos que estudamos.
Minha contribuição em especifico, além o trabalho editorial e imagens, foi uma entrevista
que realizei com o artista israelense Uri Tzaig quando o mesmo esteve no Cariri a convite do
Sebrae. Ele realizou uma palestra na UFCA e depois me concedeu uma entrevista onde
explicou de forma mais detalhada o seu pensamento sobre Arte e Design e sua experiência
artística.
Em relação ao documentário fizemos um levantamento dos coletivos atuantes na região a
partir de uma lista fornecida pelo Coletivo Camaradas, desta lista, com mais de 30 nomes,
selecionamos alguns coletivos que trabalhavam especificamente com produção artística, já
que na lista englobava coletivos que tinham uma atuação mais politica e/ou social. Entramos
em contato com os coletivos e apresentamos o projeto, e perguntamos se eles estariam
disponíveis para colaborar conosco. Iniciamos as filmagens com entrevistas com duas
professoras de história da arte que atuam na região, para sonda-las sobre as suas percepções
sobre a arte produzida atualmente no Cariri e levantar mais informações sobre a atuação de
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coletivos na região. Em um ponto desenvolvemos tanto a revista quanto o documentário
concomitantemente, depois decidimos optar pela revista, também devido a interrupção das
atividades provocada pela greve, deixamos o documentário mais para o ultimo bimestre de
trabalhos, e atualmente se encontra em fase de realização.
Acredito que o programa contribui para se pensar a produção cultural local dentro de um
outro paradigma, e a sua relação com um contexto maior, ou glocal, para usar outro conceito
estudado durante o trabalho. Em um contexto de grande conectividade, os processos de
sincretização cultural tendem a cada vez mais se colocarem como a força dinâmica das
culturas.
Referências:
CANEVACCI, Massimo. Sincrétika: Explorações etnográficas sobre artes
contemporâneas. São Paulo: Studio Nobel, 2013.
EISENSTEIN, Sergei. A Forma do Filme. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002.