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REFLEXÕES SOBRE O COMPORTAMENTO SOCIAL POR MEIO
DA LITERATURA FICCIONAL: UM ESTUDO DOS PERSONAGENS
CORIOLANO E MACBETH DE SHAKESPEARE doi: 10.4025/XIIjeam2013.cyrilo.oliveira.rodrigues13
CYRILO, Silvana Pereira São
OLIVEIRA, Terezinha
RODRIGUES, Jéssica Salomão
INTRODUÇÃO
Este texto refere-se aos resultados finais da pesquisa intitulada Reflexões sobre o
comportamento social por meio da literatura ficcional: um estudo dos personagens
Coriolano e Macbeth de Shakespeare, iniciada em 2012, sob orientação da Prof.ª Dr.ª
Terezinha Oliveira, em nível de iniciação científica. Detalharemos, ao longo de nosso
relato, as etapas decorridas durante a execução do projeto, a metodologia utilizada, o
propósito e as conclusões.
Tivemos por objetivo, nessa pesquisa, a observação e análise do comportamento
humano, partindo do princípio da diversidade de comportamentos existentes. Nosso ponto
de partida foi fruto da inquietação em compreender até que ponto a subjetividade humana
pode ser influenciada pelo meio em que o indivíduo está inserido, ou seja, até que ponto as
decisões humanas são individuais ou respondem a interesses de outros indivíduos, além de
verificar em que medida os comportamentos singulares dos indivíduos interferem na
sociedade como um todo.
Ao realizarmos nossos estudos, utilizamos como fonte principal duas peças
literárias do dramaturgo e poeta inglês, Willian Shakespeare: tratam-se de Macbeth e
Coriolano. Sabemos que a inquietação para entender a natureza humana não é um fato
novo e que muitos autores, dentre eles, filósofos, teólogos e pesquisadores, de diferentes
ramos da ciência como a sociologia, sociobiologia, psicologia, entre outros, dedicaram
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anos de suas vidas na busca dessa compreensão, cada qual com suas singularidades e ideias
típicas do período social e histórico em que estavam inseridos.
Partindo desse pressuposto, analisamos também os escritos de Tomás de Aquino,
padre dominicano, filósofo e téologo e de Aristóteles. Embora os autores citados tenham
um longo período de distância temporal, sendo Aristóteles um clássico da filosofia antiga,
Tomás de Aquino, escritor do século XIII, conhecido como o principal mestre escolástico
do seu tempo e William Shakespeare (1564-1516), principal poeta inglês da modernidade,
os três autores tratam em seus escritos, fundamentalmente do comportamento humano,
nosso objeto de estudo. Destacamos também, que como nosso estudo insere-se nos campos
da filosofia e da psicologia da educação, sob a perspectiva da história social, torna-se
importante considerar autores de tempos históricos distintos do nosso, não para
reproduzirmos seus pensamentos e experiências, mas para sabermos como os homens
produziram seus saberes e suas relações ao longo do tempo. Os acontecimentos por nós
hoje vivenciados, já foram também vivenciados por outros indivíduos, em diferentes
períodos históricos e é isso que faz com que possamos partir de um conhecimento já
construído, para então construirmos os nossos próprios.
A busca dos homens pelo conhecimento já se tornou algo natural e constante.
Ainda encontramos pessoas que frequentam o nível básico escolar, ou até mesmo o nível
superior, não com o intuito de estar aprendendo algo novo, mas apenas para adquirir um
diploma, e atuar profissionalmente, ou até mesmo para aprender a solucionar problemas do
dia a dia, como fazer “contas” e ler. Todavia, consideramos o conhecimento para além das
experiências e práticas cotidianas, mas também para exercermos nossa humanidade e
transformarmos e vivermos melhor.
Pensamos que o objeto de nosso estudo, a natureza e o comportamento humano são
essenciais na formação do professor, para atuar no processo de ensino e aprendizagem. É
comum encontrarmos entre colegas de trabalho, alguns professores e os próprios
acadêmicos de Pedagogia, a preocupação exacerbada em estudar apenas metodologias para
o ensino de conteúdos e teorias educacionais, como se a única tarefa do professor fosse
transmissão de conhecimentos. Não somos contrários a essa ideia, mas também não somos
totalmente favoráveis. Recorremos aqui a prática da virtude estudada por Aristóteles, onde
não devemos cair em extremos, mas encontrar sempre o meio- termo. O estudo dos
conteúdos e de teorias educacionais são fundamentais para a formação e futura atuação do
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profissional, mas não podemos ignorar o fato que este estará lidando com seres humanos,
que não são tábulas rasas e que trazem para a sala de aula, seu modo de ser, hábitos de sua
classe social, sua etnia, suas histórias, e costumes. No processo de ensinar, o projeto
político pedagógico, o currículo e os materiais curriculares são importantes, mas, tem
pouca importância se não estiver presente no professor o princípio da formação da pessoa,
especialmente, no seu aspecto ético.
Muito se tem falado, atualmente, sobre a necessidade de educar para a cidadania,
que já é até mesmo lemas em fachadas e uniformes escolares e nos projetos políticos
pedagógicos. Mas o modo como concebemos o conhecimento escolar e nossas ações
cotidianas em sala de aula, nos permitem realmente essa formação de cidadãos críticos e
reflexivos? Ou precisamos nos atentar apenas ao ensinar conhecimentos básicos para que o
aluno consiga passar de ano? Se quisermos formar pessoas conscientes, que sejam
verdadeiras cidadãs, é necessário que lhes dê, primeiramente, condições de serem pessoas,
mas há tempo destinado para aprender ética e valores morais no ambiente escolar? Como
afirma Oliveira (2012, p.112) “[...] devemos sempre, enquanto docentes, formar pessoas na
sua totalidade, construindo pessoas sábias de conteúdo e de ética. Quando ensinamos uma
criança a ler e a escrever devemos ensinar, também, as condições para ser sujeito
consciente em seu locus”.
Assim, nossa pesquisa de cunho bibliográfico, teve como princípio norteador duas
áreas específicas do conhecimento pedagógico: a filosofia da educação e a psicologia da
educação. No âmbito da Filosofia da Educação trabalhamos com o conceito de ética e no
da Psicologia da Educação, o conceito de subjetividade. Todavia, estes dois campos foram
conduzidos pelo olhar da história na medida em que os dois conceitos que elegemos para
compreender o comportamento dos homens, a ética e a subjetividade, só podem ser
compreendidos dentro de um tempo específico.
Compreender a obra de um autor sem levar em consideração questões e
acontecimentos que contribuíram para a formulação de suas ideias, não é uma tarefa fácil,
e talvez a ausência desse conhecimento possa nos levar a cometer equívocos quanto a suas
formulações. Contextualizaremos, brevemente, o período vivenciado por Aristóteles e
Tomás de Aquino, escritores que descreveram a natureza humana em períodos distintos.
Para iniciarmos esta contextualização e caracterização do período da filosofia
antiga, recorremos ao clássico Aristóteles por meio da obra Ética a Nicômaco, escrita entre
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335 a. C a 323 a.C. O autor nasceu em Estagira – Macedônia em 384 a.C.. Era filho do
médico Nicômaco, da corte do Rei Amintas II, pai de Filipe da Macedônia. Ainda na
adolescência, dirigiu-se para Atenas, para obter uma boa formação. Com a morte de
Alexandre (323), Aristóteles teve de fugir a perseguição dos democratas atenienses,
refugiando-se em Calcide, na Eubeia, onde morreu em322 a.C.
Através da leitura da obra, podemos compreender a investigação de Aristóteles
sobre o modelo de saber que se pode obter acerca da conduta, levando em conta a situação
concreta do Homem, um ser que está acima do animal, mas que não pode ser definido
apenas pela pura razão, esse meio-termo é o que se entende por virtude. Vale ressaltar a
importância do conhecimento e leitura de um clássico da filosofia antiga para o melhor
desenvolvimento de nosso projeto, uma vez que o autor aborda o tema da virtude, uma
ação do individuo que só existe no interior das relações humanas.
Shakespeare e seu tempo histórico
Shakespeare nasceu no dia 23 de abril de 1564, na pequena cidade inglesa de
Stratford-upon-Avon. Aos dezoito anos de idade casou-se com Anne Hathaway com quem
teve três filhos. Seus textos fizeram e faz ainda muito sucesso por se tratarem de temas
próprios dos seres humanos abordando questões de sentimentos, temas políticos, questões
sociais, independente do tempo histórico.
Shakespeare cria maneiras diversas de representar a mudança no ser humano,
alterações essas provocadas não apenas por falhas de caráter ou por corrupção, mas
também pela vontade própria, pela vulnerabilidade temporal da vontade. Os ideais tanto da
sociedade como do indivíduo, eram talvez, mais importantes no mundo de Shakespeare do
que no nosso.
Ao ler as peças de Shakespeare, até certo ponto, ao assistir a encenação o
procedimento mais sensato é deixar se levar pelo texto e pelos personagens, e permitir uma
recepção que possa distanciar daquilo que é lido, ouvido e visto, de maneira a incluir
quaisquer contextos relevantes. Não podemos moldar Shakespeare segundo nossas próprias
tendências políticas e culturais. Sendo Shakespeare o mais memorável dos escritores faria
sentido supor que a dor que Shakespeare nos causa seja tão significante quanto o prazer.
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Conforme Kieman (1999) em relação à época em que Shakespeare viveu, não
podemos afirmar que fosse uma Inglaterra feliz, no século XVI, os níveis populacionais
estavam crescendo na Europa, e entre 1500 e 1650, a população da Inglaterra deve ter
aumentado de dois para cinco milhões.
Esse aumento na população criava grandes pressões e favorecia uma economia
rígida. O quadro social da Inglaterra estava desagregando-se com o alto índice de
desemprego, a existência de muitos desabrigados e a vadiagem. Quando a situação da
religião, a Igreja Católica passava por uma grande ruptura pela degradação do clero, o que
deu origem a diversas guerras e ocasionou a Reforma Luterana, a Reforma Calvinista e a
Reforma Anglicana.
A educação sob o signo da ética
O termo ética vem sendo estudado desde muito tempo atrás, por diversos
pensadores e em épocas diferentes, cada qual dando um significado ao tema, mas todos
estudaram o homem como objeto de estudo moral e politico, datado historicamente. De
acordo com a crença dos filósofos metafísicos, tanto gregos como medievais, 1acreditava-
se que na essência dos seres humanos, já estaria inscrita, de maneira estável e permanente,
a referência básica dos valores que deveriam nortear suas ações morais.
Sob o enfoque praxista¹ a ética decorre de um modo igualmente novo de pensar o
homem, embora ele continue sendo entendido como um ser natural e dotado de identidade
subjetiva, o que lhe permite projetar e antever suas ações, já não é visto mais nem com um
ser totalmente determinado, nem como um ser inteiramente livre. Ele é simultaneamente
determinado e livre. Sua ação é sempre um compromisso, em equilíbrio instável entre as
imposições da sua condição de ser natural e a autonomia de sujeito, capaz de intencionar
suas ações, a partir da atividade de sua consciência. Partindo do pressuposto da ética
contemporânea o homem não é totalmente livre, mas também não é puramente empírico,
dominado pela sociedade ou pela natureza, portanto o homem se encontra sob a dualidade
de sua realidade natural e sua realidade histórico-social, que até certo ponto podem
conduzi-lo a determinados comportamentos, mas que também é construída por ele, por
1Práxis: No marxismo, o conjunto de atividades humanas tendentes a criar condições indispensáveis á existência da sociedade e, particularmente, á atividade material, á produção e a prática.
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meio de suas ações práticas. Percebe-se aqui a importância da racionalidade humana em
gerir sua própria vida.
O ser humano é eminentemente um ser prático e histórico e vai construindo seu
modo de ser, mediante sua prática com o trabalho e no processo de sociabilidade com seus
semelhantes, com a própria subjetividade, mediante sua vivência da cultura simbólica2.
Mas sua prática se distingue dos demais animais por não ser mecânica como é a prática dos
demais seres naturais; mas como uma prática intencional, marcada por um sentido,
vinculado a objetivos e fins. A natureza humana é determinada pelas condições objetivas
de sua existência, ao mesmo tempo que atua sobre elas por meio de sua praxis.
Retomando Aristóteles e a obra Ética a Nicômaco sobre a teoria ética filosófica
podemos verificar que o autor busca estabelecer o bem tanto ao indivíduo quanto à
sociedade num todo. Acreditamos ser importante a reflexão dos pensamentos de
Aristóteles sobre a ética, a conduta, a moral e a virtude a fim de fazermos uma relação com
o cotidiano de nossos personagens e também do comportamento humano contemporâneo.
Todos os acontecimentos por nós hoje vivenciados, já foram também vivenciados por
outros indivíduos, em diferentes períodos históricos, e é isso que faz com que possamos
partir de um conhecimento já construído, para ai então construirmos os nossos próprios².
Considerando que o conceito de ética no pensamento filosófico de Aristóteles leva
a contextualização descritiva do que é ética, acreditamos ser fundamental seu estudo na
sociedade contemporânea, uma vez que estamos num curso, no qual, ao seu término,
sairemos habilitadas a ensinar e alfabetizar crianças das séries iniciais. Ensino esse que, a
nosso ver, não deve se limitar aos conhecimentos básicos de ler, escrever e contar, mas se
amplia na responsabilidade de ensinar os valores éticos e morais, para que esses sejam
impregnados na essência humana do cidadão, e que as decisões, em qualquer instância,
sejam norteadas pelo bom-censo sem ferir o outro ou a coletividade.
O ser humano só consegue se distinguir dos demais animais por possuir a
capacidade de intelecto, de viver em comunidade, seja na relação do trabalho, seja em
qualquer outro âmbito, na relação entre outros homens e a comunidade. O homem, já nasce
com as características físicas de homem, mas precisa aprender a sê-lo e isso só se fará com
o contato com seus iguais, por meio da aprendizagem de valores já estabelecidos no 2 Entendemos por cultura simbólica de acordo com o italiano Carlo Genzeberg em seu trabalho “O Queijo e outros Vermes” analisa a reprocidade entre as espefas culturais, mostrando que uma vivência, cultura simbólica tem dimensões múltiplas, ampliando suas possibilidades sócio cultural, transmitidos historicamente abriu novas possibilidades para a escrita da história.
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ambiente em que se encontra. Toda ação humana tem uma intenção, e é essa capacidade de
planejar algo com vistas a alcançar um resultado, de usar o intelecto a nosso favor
intencionalmente, que nos difere dos demais animais. A ética reflete exatamente sobre
esses valores já impregnados na sociedade, para se buscar a moralidade e os meios para
alcança-los.
Mas esses ‘códigos de ética’ nem sempre existiram. Nos primórdios do pensamento
grego, não havia nenhum estabelecimento de regras na conduta do relacionamento
humano. Com as conquistas da ciência de novos conhecimentos, a ideia da essência
humana como natureza humana permanente, não se sustenta mais e a filosofia moderna se
vê levada a buscar outros fundamentos para compreender aos comportamentos éticos.
Vale ressaltar que moral e ética são conceitos distintos. A moral consiste num
conjunto de comportamentos e normas aceitos como válidos nas relações humanas. Quanto
à ética, trata de estudar sobre a aceitação de alguns comportamentos como legítimos,
válidos, considerando sempre outros aspectos do moral pertinentes a aspectos pessoais e
culturais, ou seja, é a união entre o sujeito e seus valores, a reflexão do comportamento
moral e a conduta de cada indivíduo. De modo geral, a ética é o estudo dos juízos da
conduta humana, que é passível do bem e do mal, isto é, de vícios e virtudes, presente em
um único ser ou em grupo. A ética visa a nosso ver, tomada de decisões individuais, mas
sempre em relação ao outro, com a intenção de promover o bem comum. Só pode ser
estabelecida por meio de um processo de compreensão do tempo histórico no qual os
sujeitos se encontram e não partindo de valores já abstratamente idealizados e concebidos.
É preciso lembrar, ainda que a ética é construída a partir de referenciais econômicos,
políticas, sociais e culturais.
Mas podemos nos questionar sobre qual a relação entre a ética e a educação? É
comum ouvirmos falar ou lermos em alguns projetos políticos pedagógicos escolares a
necessidade e interesse em formar sujeitos críticos e reflexivos, para a prática da cidadania,
ou seja, o compromisso assumido por professores e demais pessoas envolvidas na
educação pela aplicação do conhecimento na construção da cidadania. É necessário que os
professores desempenhem suas funções partindo de um método para que possamos
alcançar o conhecimento desejado. É por meio da aprendizagem de formas culturais que
adquirimos também nossos valores éticos, um trabalho que vincule não somente os
profissionais da educação, mas também os familiares.
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As salas de aulas são os ambientes nos quais são desenvolvidas várias experiências
sociais, não só de alunos, mas também de professores. Não se pode acreditar que a escola
seja um espaço isolado, pois a formação e a educação resultam em significação e
subjetivação. De acordo com Gonzalez Rey (2003), a subjetividade pode ser definida, "[...]
como a organização dos processos de sentido e significação que aparecem e se organizam
de diferentes formas e em diferentes níveis do sujeito e na personalidade, assim como nos
diferentes espaços sociais em que o sujeito atua" (PINHEIRO, 2006, p. 2)
Os valores morais são acompanhados pelo caráter normativo e prescritivo, ditando
como nossas ações devem ser praticadas, dizendo-nos o que deve ser feito. São exemplos
das ordens recebidas pelos professores, pais, parentes ou pessoas mais velhas, mas cabe a
nós segui-las ou não.
Essa deve ser aprendida por meio da própria ação, ou seja, é empírica e não inata.
Não nascemos bons ou maus professores, por exemplo, com um ‘dom’ especial, mas nós
nos tornamos bons ou maus por meio do hábito.
A seguir, passaremos a analisar esses aspectos que tratam das virtudes e dos vícios
humanos a partir de duas peças de Shakespeare que, efetivamente, se constituem nos
objetivos de nossa pesquisa.
Macbeth e Coriolano em meio a virtudes e vícios
As duas obras analisadas são peças de tragédia de autoria de William Shakespeare
(1564-1516), dramaturgo inglês e poeta, cujos escritos tratam, fundamentalmente, dos
comportamentos humanos.
A peça Coriolano é uma tragédia de Shakespeare, escrita em 1608. A história
circunscreve-se em torno de Caio Márcio, um general romano que ficou sendo conhecido
como Coriolano após vencer uma batalha contra os Volscos e se tornou odiado pela plebe
por evidenciar à ela o quanto ela tornava-se oportunista e corrompida por se submeter,
integralmente às vontades dos tribunos do povo.
A segunda peça que analisamos, Macbeth pode ser considerada uma das tragédias
mais curtas de Shakespeare. Ela foi escrita, provavelmente, entre os anos de 1603 e 1606,
não há uma data estabelecida, podendo ser encontrada datas diferentes em cada escrito. A
obra trata sobre um regicídio e suas consequências. Nessa peça podemos observar que
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todas as consequências dos comportamentos humanos interpessoais passados, presentes e
antecipados influenciam as suas atividades, no geral, por mais remotas ou simples que se
possam parecer.
Aristóteles lembra-nos que a virtude, intelectual e moral, a primeira, por via de
regra, gera-se. e cresce graças ao ensino — por isso requer experiência e tempo, enquanto a
segunda se forma através de hábitos. Aprendemos a ser virtuosos praticando atos virtuosos
e aprendemos a ser viciosos, praticando atos viciosos.
“[…] os homens tornam-se arquitetos construindo e tocadores de lira tangendo seus instrumentos. Da mesma forma, tornamo-nos justos praticando atos justos” (ARISTÓTELES, II).
Podemos citar como exemplo o personagem Macbeth, que de inicio apenas
almejava possuir um trono, mas com as profecias das bruxas e pedido de sua esposa, acaba
iniciando uma série de atos viciosos. “Verbalmente, quase todos estão de acordo, pois tanto
o vulgo como os homens de cultura superior dizem ser esse fim a felicidade e identificam o
bem viver e o bem agir como o ser feliz” (ARISTÓTELES,1973,p.251)
Segundo Aristóteles, toda ação e toda escolha tem em mira um bem qualquer, e o
fim da ação dos homens é a busca da felicidade. Embora todos os homens procuram levar
uma vida em busca da felicidade, há divergências em onde encontra-la. “A julgar pela vida
que os homens levam em geral, a maioria deles, e os homens de tipo mais vulgar, parecem
(não sem um certo fundamento) identificar o bem ou a felicidade com o prazer, e por isso
amam a vida dos gozos.” (ARISTÓTELES, 1973,p.252)
Podemos perceber nitidamente isso na sociedade contemporânea, na qual os
homens buscam, constantemente, dar um significado a sua existência e incessantemente
procuram ser felizes. Dentro dessa perspectiva, cada qual se apega a um caminho. Uns
encontram a felicidade nos bens materiais, se alienando na posse de obter cada vez mais
coisas para ser alguém. Outros buscam a felicidade na religião, ao dinheiro, na riqueza, em
honras, etc. e nessa procura pela felicidade, onde valoriza-se o TER e não o SER, os atos
virtuosos, do qual estudamos em Aristóteles, é frequente encontrarmos pessoas que
desenvolvem problemas depressivos, estresse, se alienam ao mundo material, em uma
felicidade passageira e inconstante.
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Por exemplo, tanto o medo como a confiança, o apetite, a ira, a compaixão, e em geral o prazer e a dor, podem ser sentidos em excesso ou em grau insuficiente; e, num caso como no outro, isso é um mal. Mas senti-los na ocasião apropriada, com referência aos objetos apropriados, para com as pessoas apropriadas, pelo motivo e da maneira conveniente, nisso consistem o meio-termo e a excelência característicos da virtude (ARISTÓTELES,1973,p. 272-273).
Aristóteles acreditava que a virtude é o meio-termo e que tanto o excesso quanto a
falta, são considerados vícios, fazendo com que o homem pereça. Mas senti-los na ocasião
apropriada, com referência aos objetos apropriados, para com as pessoas apropriadas, pelo
motivo e da maneira conveniente, nisso consistem o meio-termo e a excelência
característicos da virtude. “Está, pois, suficientemente esclarecido que a virtude moral é
um meio-termo, e em que sentido devemos entender esta expressão; e que é um meio-
termo entre dois vícios, um dos quais envolve excesso e o outro deficiência, e isso porque a
sua natureza é visar à mediania nas paixões e nos atos” (ARISTÓTELES,1973, p. 277).
A virtude visa o desenvolvimento pleno do ser humano, no meio- termo, sem cair
em nenhum dos extremos. Ela consiste na disposição adquirida voluntariamente, definida
pela razão conforme a conduta de um homem que age refletidamente.
Costuma-se dizer que nada há que acrescentar nem tirar nas coisas bem-feitas, considerando-se que o excesso ou a falta destrói a perfeição e a justa medida a conserva (...). E a virtude que é mais perfeita e melhor que toda a arte, do mesmo modo que a natureza, tenderá para o meio. (...) Chamo meio da coisa o igualmente distante dos extremos, que é um e idêntico para todos, meio a respeito de nós, o que não é excesso nem falta. E este não é único nem idêntico para todos (ARISTÓTELES, III)
Portanto, a virtude está no meio termo das decisões de comportamento, de como
atuar para uma situação específica.
(...) a virtude está em nosso poder, do mesmo modo que o vício, pois quando depende de nós o agir, também depende o não agir, e vice-versa. De modo que quando temos o poder de agir quando isso é nobre, também temos o de não agir quando é vil; e se está em nosso poder o não agir quando isso é nobre, também está o agir quando isso é vil. Logo, depende de nós praticar atos nobres ou vis, e se é isso que se entende por ser bom ou mau, então depende de nós sermos virtuosos ou viciosos (ARISTÓTELES, III).
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Para Aristóteles, a ética é tratada como a ciência das condutas humanas,
objetivando enfim comprometer-se em possibilitar ao homem a garantia da felicidade por
meio de uma vida regida por virtudes morais e éticas. Não há moralidade em uma ação
irresponsável, ou naquela em que o sujeito não agiu com pleno conhecimento. Ou seja, é
necessário que o sujeito tenha conhecimento da justiça, para assim alcançar a disposição de
caráter que a torna propensa a fazer o que é justo, desejando e fazendo.
Considerações Finais
Com as constantes transformações sofridas pela sociedade, o processo educativo
deve estar sempre sendo revisado. Desse modo, a instituição de ensino vem se tornando
cada vez mais um local de instrução, mas também de educação, assumindo as
responsabilidades de educar não apenas nas disciplinas escolares, mas também para a
formação humana.
Reconhecemos, assim, a importância dos estudos de autores de diferentes períodos
históricos: antiguidade, medieval e moderno, que se dedicaram à compreensão da natureza
humana, servindo como modelo aos pedagogos contemporâneos como fonte de reflexão de
atitudes e conhecimentos.
Portanto, a leitura e análise das duas peças shakesperianas, proporcionou e
proporciona às pessoas a possibilidade de adquirir conhecimento. Ela nos ajudará também
a compreender o passado sem atribuir juízo, mais, possibilitará abrir inúmeras
possibilidades de compreender nos nossos próprios comportamentos. Embora o intelecto
humano possa nos levar a agir conforme a razão, levando em consideração suas
experiências, emoções e sentimentos, cada sujeito é capaz de estabelecer suas próprias
verdades, tornando-se assim um ser único e responsável por si mesmo.
Ainda que esses aspectos sejam perceptíveis em nossos estudos, constatamos que
cada indivíduo é capaz de se moldar de acordo com o ambiente em que está inserido, e tem
sua formação de caráter construída por meio de sua subjetividade e influência de suas
respectivas culturas. Como o ser humano é dotado de desejos e valores, esse procura agir
de acordo com seus interesses, mesmo que possa ferir os sentimentos alheios ou seus
próprios sentimentos.
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REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. IN: Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
OLIVEIRA, Terezinha. A influência da leitura de Tomás de Aquino na formação do
Professor. In: _____. Ensino e debate na Universidade Parisiense do Século XIII: Tomás de Aquino e Boaventura de Bagnoregio. Maringá: Eduem, 2012. p. 103-112.
PINHEIRO, Maria Cláudia Tardin. Publicidade: a procura amorosa do consumo. Comunicação, Mídia e Consumo, São Paulo, v. 3, n. 8, p. 169-187, nov. 2006.
SHAKESPEARE, W. Coriolano. EBookLibris. Disponível em: http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/coriolano.html Acesso em: 30 out. 2011.
SHAKESPEARE, W. Macbeth. EBookLibris. Disponível em: http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/macbethr.html Acesso em: 30 out. 2011.