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PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Faculdade Mineira de Direito REFLEXÕES ACERCA DO IMPACTO DO MEIO AMBIENTE NA CONSTRUÇÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE Hugo Rios Bretas Belo Horizonte 2011

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PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Faculdade Mineira de Direito

REFLEXÕES ACERCA DO IMPACTO DO MEIO AMBIENTE NA CONSTRUÇÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

Hugo Rios Bretas

Belo Horizonte 2011

Hugo Rios Bretas

REFLEXÕES ACERCA DO IMPACTO DO MEIO AMBIENTE NA CONSTRUÇÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Direito. Área de concentração: Direito Privado Orientadora: Professora Dra. Taísa Maria Macena de Lima

Belo Horizonte

2011

FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Bretas, Hugo Rios B844r Reflexões acerca do impacto do meio ambiente na construção da função social

da propriedade. / Hugo Rios Bretas. Belo Horizonte, 2011. 122f. Orientadora: Taísa Maria Macena de Lima Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Programa de Pós-Graduação em Direito. 1. Propriedade Privada. 2. Meio ambiente. 3. Função Social da Propriedade.

4. Autonomia Privada. I. Lima, Taísa Maria Macena de. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Direito. III. Título.

CDU: 347

Hugo Rios Bretas

Reflexões acerca do impacto do meio ambiente na con strução da Função Social da Propriedade.

Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito,

____________________________________________ Taísa Maria Macena de Lima (Orientadora) – PUC Minas

____________________________________________ Rodrigo Almeida Magalhães -PUC Minas

____________________________________________ Gustavo Pereira Leite Ribeiro-UNA

____________________________________________ Antônio Cota Marçal -PUC Minas (Suplente)

Belo Horizonte, 02 de dezembro de 2011

À Deus, por me dar força e guiar os meus passos, aos meus pais, minha noiva e familiares por todos os momentos, pois sem vocês este sonho não teria sido realizado!

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, que me deu saúde, serenidade, inspiração, e me guiou em

cada passo, desde o ventre de minha maravilhosa mãe.

Aos meus queridos e amados pais, que de forma emocionante, desde o início

de minha vida, com o mais pleno, incondicional e profundo amor me ensinaram que

o estudo é uma nobre forma de se formar um homem. Além do mais, desde a minha

infância se dedicaram lindamente a mim, com carinho, cuidado e apreço em todos

os âmbitos. Não tenho palavras para descrever o meu exemplar pai Hugo e a minha

sensível mãe Carmem.

À minha delicada noiva Kelly, pelo companheirismo infindável e pelo amor

igualmente infindável. Assim como a toda sua família, que também se tornou

profundamente minha família.

Aos meus avós, pelos lindos sentimentos, e me ensinaram que ser avó é ser

também um pai e uma mãe. Meus jovens avós são inspiradores. E a todos os meus

familiares e amigos.

À minha orientadora Taísa Maria Macena de Lima, pela solidariedade ao

transmitir seus ricos conhecimentos, pelas lições, pela educação e pelo incalculável

crescimento que me propiciou com as aulas e as orientações.

Aos professores, alunos, orientandos e a toda comunidade acadêmica, em

especial da PUC-Minas, UNIPAC, e ESNOR pelas indescritíveis oportunidades.

Todos vocês são muito queridos, inesquecíveis e são os pilares de minha vida.

“A prova real da Lealdade é a exposição da deslealdade. A Deslealdade pode se esconder...por um Tempo. A Lealdade não se esconde, nunca. A verdadeira Lealdade é tão apaixonada e óbvia e reconhecida que os líderes nunca questionam aqueles que são realmente leais. A Lealdade gera tanta energia que rapidamente revela a presença da Deslealdade. A Lealdade torna a Deslealdade insuportável. Honrar um Líder é uma alegria natural àquele que é Leal. Honrar um Líder transtorna o Desleal.”

Mike Murdock

RESUMO

A função social da propriedade historicamente ganhou força na ciência do direito,

em razão de sua interveniência no furor capitalista denominado propriedade privada,

em seu caráter quiritário. A consequência dessa interveniência consiste na mitigação

do princípio da autonomia da vontade. Dessa forma, a função social se destaca nos

horizontes do direito atual, em razão de sua consagração constitucional e

infraconstitucional, ante o seu propósito de respeito ao homem e por sua afronta ao

egoísmo e à concentração econômica. Também é pertinente destacar no contexto

atual o meio ambiente, ante a intensidade de suas medidas protetivas, em sua

inteireza, e da profundidade do tratamento constitucional presente principalmente

nos artigos 225 e 170 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Nessa medida, as proferidas restrições ambientais figuram como impactantes no

processo de construção da função social. Portanto, a função social da propriedade e

a proteção ambiental, compreendidas como interdependentes, são impactantes

razões legislativas e protagonistas no processo de despatrimonialização e

humanificação.

Palavras-chave: função social da propriedade, restrições ambientais, meio ambiente,

propriedade privada, autonomia privada.

ABSTRACT

The social functional of the property historically gained strength in the science of law,

because of its intervention of the fury called capitalism private property. The result of

that intervention is the mitigation of the principle of Freedom of Choice. The social

function stands on the horizon of the modern law, because of its constitutional and

constitucional below consecration, the intention it´s to respect the man and his

offense to selfishness and economic concentration. It is also relevant to note in the

current context the environment, given the intensity of their protective measures, in

its entirety and depth of constitutional treatment present mainly in Articles 225 and

170 of the Constitution of the Federative Republic of Brazil in 1988. As such, the

preferred environmental restrictions impacting appear as in the construction of the

institute of social function. Therefore, the social function of property and

environmental protection, it´s understood as interdependent, these reasons are

important players in the legislative process of lose of the sense patrimony and

humanization.

Keywords: Social functional of the property, restriction environment, environment,

private property, Freedom of Choice.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................10 2 REFLEXÕES HISTÓRICAS ACERCA DA PROPRIEDADE PRIVAD A E SUAS

DISTINTAS CONCEPÇÕES................................................................................12 2.1 Caráter Absoluto ............................... ................................................................12 2.2 Flexibilização da propriedade privada.......... ...................................................16 2.3 Teorias da posse e sua incidência na propriedad e........................................18 3 FUNCIONALIZAÇÃO NO DIREITO PRIVADO .............. ......................................22 3.1 Momentos históricos da função social da proprie dade.................................22 3.2 Outras modalidades de função social ............ .................................................30 3.2.1 Função social da empresa..................... ........................................................30 3.2.2 Função social dos contratos ................. .......................................................32 4 PRINCÍPIOS PROSPERANTES NO CENÁRIO PATRIMONIAL: NÚCLEOS DE

CONTEXTUALIZAÇÃO DO INSTITUTO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE...................................................................................................35

4.1 Clássica principiologia ........................ .............................................................35 4.1.1 Princípio da autonomia da vontade ............ ..................................................37 4.2 Principiologia moderna......................... ............................................................41 4.2.1 Estado liberal.............................. ...................................................................41 4.2.2 Mitigações do liberalismo.................... ..........................................................44 4.2.2.1 Estado social .............................. .................................................................44 4.2.2.2 Estado democrático de direito .............. .....................................................46 4.2.3 Princípio da dignidade da pessoa humana...... ............................................48 4.2.4 Princípio da função social da propriedade .... ..............................................52 4.2.5 Princípio da autonomia privada ............... .....................................................52 4.2.6 Princípio da boa-fé .......................... ...............................................................55 4.2.7 Princípio da transparência ................... .........................................................58 4.3 Dualismo entre autonomia da vontade e autonomi a privada.......................60 5 TEORIZAÇÕES ACERCA DO BEM JURÍDICO MEIO AMBIENT E ....................67 5.1 Etimologia ..................................... .....................................................................67 5.2 Classificação do meio ambiente ................. .....................................................69 5.3 Impacto do bem juridico meio ambiente .......... ...............................................72 5.4 Princípios ambientais .......................... .............................................................77 5.4.1 Princípio do desenvolvimento sustentável..... .............................................77 5.4.2 Princípio do poluidor pagador ................ ......................................................79 5.4.3 Patrimônio comum da humanidade............... ...............................................80 5.4.4 Princípio da responsabilidade comum.......... ...............................................81 5.4.5 Princípio da preservação e da precaução...... ..............................................82 5.4.6 Princípio da informação...................... ...........................................................84 5.4.7 Princípio da participação.................... ...........................................................85 5.4.8 Princípio da reparação....................... ............................................................86 5.5 Reflexões acerca das restrições................ ......................................................87 5.5.1 Leis extracodificadoras restritivas .......... .....................................................88

5.5.1.1 Restrições de preservação.................. .......................................................93 5.5.1.1.1 Código Florestal ......................... ..............................................................93 5.5.1.1.2 Outros dispositivos normativos específico s de preservação..............96 5.5.1.2 Restrições de conservação .................. ......................................................98 5.5.1.2.1 Unidades de proteção integral ............ ....................................................98 5.5.1.2.2 Unidades de uso sustentável .............. ....................................................99 6 INTERLIGAÇÃO ENTRE A PROPRIEDADE PRIVADA, FUNÇ ÃO SOCIAL DA

PROPRIEDADE E RESTRIÇÕES AMBIENTAIS................ ..............................101 7 CONCLUSÃO ........................................ ..............................................................110 REFERÊNCIAS.......................................................................................................112

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1. INTRODUÇÃO

A função social assume importante papel no cenário dogmático e axiológico

em um viés constitucional e infraconstitucional, sobretudo a função social da

propriedade.

Um dos motivos pelos quais a função social da propriedade emerge nesse

cenário se deve ao fato de que a sua incidência, a sua afetação incide no âmago do

capitalismo, qual seja, a propriedade privada.

Não obstante a flexibilização nesse sistema, é crucial não enxergar a função

social da propriedade pura e simplesmente como uma propagação do solidarismo, e

sim como um instrumento de mitigação da autonomia da vontade e da força da

propriedade privada, e acima de tudo como um instrumento de respeito à

coletividade.

Desse modo, para se atingir as proposições anunciadas é necessário

percorrer um longo trajeto histórico que paira sobre a mudança do condão quiritário

inerente à propriedade privada.

Após refletir sobre a propriedade privada, o próximo passo será identificar os

elementos influenciadores para a mudança panorâmica da propriedade privada, o

que exige que se repense até mesmo a pertinência terminológica da expressão

“propriedade privada”.

Em razão dessa busca, o capítulo subsequente terá como fim precípuo

abordar a evolução da função social da propriedade, bem como as modalidades da

função social dos contratos e da empresa.

Nesse ínterim, no capítulo seguinte a preocupação será de refletir acerca dos

princípios concernentes à propriedade privada.

Outro momento da dissertação será ponderar acerca da influência do bem

jurídico meio ambiente na construção da função social da propriedade, a partir de

uma análise teórica e deontológica.

Nesse percurso, é importante individualizar o bem jurídico meio ambiente,

tendo em vista a sua complexidade, as suas classificações, as restrições por este

apresentadas, e sua influência no processo de despatrimonialização e conseqüente

funcionalização da propriedade privada.

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Após individualizar a esfera ambiental restará promover uma interligação

entre a propriedade privada, a função social da propriedade e as restrições

ambientais.

Adota-se como bibliografia central a obra: A função social da posse e a

propriedade contemporânea de Luiz Edson Fachin (1988).

Diante disso, em meio às variabilidades exteriorizadas, em uma visão

cronológica, será perseguido o devido impacto do valor meio ambiente na

construção da função social da propriedade e o impacto de ambos na

dessacralização da propriedade privada.

Ao longo dos capítulos buscar-se-á demonstrar que a função social da

propriedade logrou profundidade a partir da perda do caráter quiritário da

propriedade privada e do consequente avanço do princípio da autonomia privada

nos horizontes do Direito Privado.

Assim como se tem o escopo de fundamentar que a importância da função

social da propriedade se mostra intensa no Estado Democrático de Direito, e o

elemento central para a sua construção é precisamente o bem jurídico meio

ambiente.

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2. REFLEXÕES HISTÓRICAS ACERCA DA PROPRIEDADE PRIVA DA E SUAS

DISTINTAS CONCEPÇÕES

2.1 Caráter absoluto

A propriedade privada é objeto de incalculável relevância na história, Caio

Mário da Silva Pereira (2005) analisa que a propriedade é objeto de estudos em

distintas áreas, como a economia, a política e a história. Diante dessa colocação, o

interesse transcendente é inerente à propriedade.

Washington de Barros Monteiro (1997) exalta a importância da propriedade

privada:

“O direito a propriedade é o mais importante e o mais sólido de todos os direitos (...),

o direito real por excelência é o eixo em torno do qual gravita o direito das coisas.”

(MONTEIRO, 1997, p.82)

A professora Taísa Maria Macena de Lima (2003) considera a propriedade

privada um princípio do Direito Civil, mais especificamente um “princípio fundante do

Direito Civil.” (LIMA, 2003, p. 243)

É importante dissertar que o caráter absoluto que aqui se sustenta, tem

caráter polissêmico. Por isso, é necessário colocar que quando se fala de caráter

absoluto da propriedade, logo se pensa em sua oponibilidade “erga omnes”, isto é,

oponibilidade perante a coletividade, como bem mencionam Jefferson Daibert

(1979), Maria Helena Diniz (2002), e outros tantos autores.

Mas, o sentido que aqui se emprega para o caráter absoluto diz respeito ao

impacto dos poderes que são conferidos ao proprietário e a reflexa ausência de

limitações.

O sentido do termo “absoluto” que neste item da dissertação se abordará,

pode ser esclarecido por Washington de Barros Monteiro:

“Realmente, num certo sentido, o direito de propriedade é de fato absoluto, não só

porque é oponível `erga omnes´, como também porque apresenta caráter de

plenitude, sendo incontestavelmente, o mais completo e extenso de todos os direitos

reais(....)” (MONTEIRO, 1998, p. 83)

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Sílvio Rodrigues (2002) reputa que o absolutismo da propriedade deve ser

completado com a exclusividade, isto é, o proprietário exerce a propriedade, sem

maiores intervenções.

Preliminarmente é devido refletir acerca da história da propriedade privada.

Haja vista que essa reflexão é relevante para se entender a interveniência do

discurso da função social da propriedade.

A história da propriedade privada, a partir de um breve panorama, demonstra

uma modificação interpretativa do posicionamento da propriedade perante a

sociedade.

A primeira atribuição dada à propriedade consiste no caráter quiritário ou

absoluto nas palavras de José Isaac Pilati (2005). Este caráter é percebido no Direito

Romano e até em períodos contemporâneos. E tem como principais características,

o seu caráter absoluto e perpétuo, na concepção de Luiz Edson Fachin (1988).

Essas características demonstram a estrita vinculação entre o homem e a sua

propriedade, sem quaisquer limitações, restrições ou intervenções estatais ou de

seus pares. Vale afirmar, o proprietário nada deve, tudo pode, e todos têm um dever

pleno de abstenção em relação a ele.

Ainda sobre o caráter absoluto no Direito Romano, Darcy Bessone diz: “a

propriedade foi tipicamente individualista, a própria expressão domínio indica a

dominação da coisa, considerando absoluta.” (BESSONE, 1988, p. 24)

Nesse primeiro momento, tem-se a propriedade como o bem jurídico mais

precioso para o homem, mais relevante do que a própria vida. Identifica-se esse

posicionamento, exemplificadamente, na evolução histórica da responsabilidade

civil.

No Direito Romano, remotamente, se houvesse o inadimplemento de uma

obrigação, a responsabilidade atingiria o corpo do devedor, num flagrante nexo entre

o credor e o corpo do devedor. Hipótese essa, que era rechaçada pela “Lex Poetelia

Papiria”, tal incidência corpórea passou a ser objeto de vedação. Isso explicita a

preocupação romana com a blindagem patrimonial intransponível e o reflexo

posicionamento do patrimônio como o cerne da sociedade, como o centro dos bens

jurídicos. Blindagem essa, que tinha explicações religiosas para o seu alastramento.

Ora, a propriedade carregava toda uma ancestralidade dos parentes que habitaram

naquele lar historicamente. Além disso, a propriedade também era impactante para a

manutenção da existência familiar, primordial se fazia o culto aos ancestrais. Nesses

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termos, se houvesse a perda da propriedade, para aquela família repercutiria como o

seu fim existencial. Daí o caráter religioso inerente à propriedade.

Num aspecto quiritário não havia o mais exíguo espaço para discursos

concernentes à função social da propriedade. Ao contrário, mais aproximado está o

caráter quiritário de uma função individual da propriedade. Sobre esse

posicionamento no Direito Romano, cite-se César Fiúza:

Tradicionalmente sempre se falou em apenas um vínculo, de caráter pessoal e coercitivo. Pessoal, porque se traduzia no poder do credor sobre uma pessoa, o devedor, sendo seu objeto um comportamento do devedor, que deve realizar uma prestação em favor do credor. Coercitivo, porque jurídico, não apenas moral ou social. Esta é a teoria monista tradicional. No Direito Romano primitivo, a obrigação era vínculo estritamente pessoal, respondendo a pessoa do devedor, com seu corpo, sua vida e sua liberdade. O direito do credor recaía sobre a pessoa do devedor, assumindo caráter de direito real, análogo aos direitos de propriedade. Posteriormente,foi-se abrandando, com a própria evolução do Direito Romano, essa força pessoal do vínculo, que se tornava patrimonial. A submissão pessoal foi substituída pelo bonarum venditio e pela bonorum distractio (...).(FIÚZA, 2006, p.287)

A par da evolução, nota-se que este caráter absoluto e místico, segundo

César Fiúza (2006), foi flexibilizado. Por isso, as acepções acerca da propriedade

foram modificadas, até atingir um caráter relativo. Para a fortificação do movimento

de relativização do caráter absoluto da propriedade, inúmeros fenômenos históricos

ocorreram.

A relativização do caráter absoluto da propriedade termina por se operar com

a contribuição de alguns momentos históricos paradigmáticos. Tais como a idade

Média e a Revolução Francesa.

O primeiro momento histórico já foi apontado e diz respeito ao caráter

religioso destacado no Direito Romano. César Fiúza (2006) enaltece a invasão

bárbara também como um fenômeno relevante para o entendimento da evolução da

propriedade privada. A invasão bárbara termina por provocar a queda do império

romano. Queda essa que provoca a entrega das terras dos pequenos proprietários

de terra aos grandes proprietários.

E posteriormente surge a burguesia. Contudo, nenhum desses fenômenos

explicita um tratamento relativista em relação à propriedade. O autor, anteriormente

citado, ainda acrescenta que o Iluminismo quando surge, contribui para a

culminação de três revoluções. Quais sejam, a Revolução Gloriosa, Americana e a já

invocada Revolução Francesa. Essas três, sim reflexos do Iluminismo, transmitem

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consequências no meio social. O que contribuiu para um repensar sobre o papel da

propriedade no Estado.

Após refletir sobre o caráter quiritário, assim como, brevemente, sobre alguns

fenômenos de relativização da propriedade privada, resta identificar qual das

concepções prosperou em cada um dos períodos históricos brasileiros que serão

enfocados, a começar pelas Ordenações Filipinas.

Nas Ordenações Filipinas, vigentes no Brasil do ano de 1603 até o ano de

1915, identifica-se que há a preponderância do caráter absoluto da propriedade

privada. Essa preponderância pode ser explicada por elementos sociológicos típicos

que se alastravam no tempo de vigência das Ordenações.

Edson Fachin explicita sobre o caráter absoluto:

A propriedade, em Roma, constituiu direito absoluto e perpétuo, excluindo-se a possibilidade em exercitá-la vários titulares. A idade Média, por seu turno, consagrou a superposição de propriedades diversas incidindo sobre um único bem, e a Revolução Francesa instaurou o individualismo e o liberalismo. (FACHIN, 1988, p.15)

Para o entendimento do caráter absoluto da propriedade privada emerge a

análise de Orlando Gomes (2003), ao escrever sobre as raízes históricas e

sociológicas em distintas ordenações civis já vigentes no Brasil, ao comentar que no

período de vigência das Ordenações Filipinas havia a influência substancial da

burguesia mercantil interveniente na esfera macroeconômica e também social. Além

disso, essa classe aspirava também a uma influência política cada vez maior, de tal

forma que seus interesses de liberdade plena fossem mais intensificados.

Diante da influência, anteriormente citada, da primazia de interesses

representados politicamente, e por haver uma massa de miseráveis no Brasil, vê-se

que o Ordenamento terminava por sacralizar a propriedade privada como

maximamente protegida e inviolável. Sem maiores intervenções estatais e sem a

razão legislativa de fomentar a consagração da função social da propriedade como

elemento de racionalização da propriedade privada.

Ainda como elemento de nítida proteção do proprietário privado, Orlando

Gomes (2003) soma que no período ora estudado, havia um sistema permissivo

para o proprietário se resguardar de eventuais investidas em detrimento de sua

propriedade e seus interesses fundamentais. Outro elemento era o sistema de

franquias liberais que era aproveitado apenas pela minoria da população, vulnerável

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psiquicamente, economicamente, juridicamente e representativamente. Minoria

sobre a qual se consolidava um escudo indestrutível em relação à propriedade.

Orlando Gomes (2003) comenta os primeiros anos da República brasileira,

mais especificamente os trinta primeiros anos. O autor está preocupado em traçar

algumas particularidades contributivas para o entendimento da destinação dada à

propriedade privada. Nas palavras de Gomes (2003), possível será compreender

traços marcantes do período das Ordenações Filipinas:

A contradição resultante do desenvolvimento desigual do capitalismo no país, que, grosso modo, pode ser expressa no contraste entre o litoral e o interior, não provocou crises profundas, porque o setor mais ponderável da camada social superior- o dos fazendeiros- utilizou, em proveito próprio, a classe média urbana, que, por sua vez, adstrita ao serviço burocrático e militar, por falta de desenvolvimento industrial, a ela se submeteu docilmente, para alargar as suas possibilidades. Esses interesses coincidiam, por outro lado, com os da burguesia mercantil, agindo todos em detrimento da massa rural, cujas condições de vida não permitiam, sequer tivesse consciência de sua miserável situação. (GOMES, 2003, p.27)

A partir de um quadro desenhado nos moldes ventilados, não há espaço para

o discurso da função social da propriedade.

2.2 Flexibilização da propriedade privada

O Código Civil brasileiro de 1916 (BRASIL, 1916), desde o início de sua

vigência até a sua revogação, ante a sobreposição da lei 10.406 do ano de 2002

(BRASIL, 2008), passou por modificações sociais. Entretanto, não é possível dizer

que o caráter absoluto convergente à propriedade privada deixou de prosperar no

Código em foco. Em que pese a promulgação da Constituição da República

Federativa do ano de 1988, época em que ainda vigia o Código Civil de 1916, que

trazia disposições sobre a função social da propriedade, assim como a lei 10.257 de

2001 (BRASIL, 2001), entre outros dispositivos.

Afirme-se que nos anos finais de vigência do Código Civil de 1916 (BRASIL,

1916), a função social da propriedade passa a ser cada vez mais uma preocupação

do legislador brasileiro, bem como da sociedade em geral. Todavia, foi a

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (BRASIL, 2008) e o Código

Civil de 2002 (BRASIL, 2008) que trouxeram sim suportes fáticos abstratos, por

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intermédio dos quais se constata vigor no que tangencia a função social da

propriedade. Em decorrência dos quais a matéria está cada vez mais em voga.

Nesse âmbito, deve-se discutir a relativização do caráter absoluto da propriedade

privada. Relativização, reforce-se, que até mesmo permite a discussão acerca da

plausibilidade da expressão “propriedade privada”, para uma certa propriedade

privada pública.

Importa também acrescentar que o Código Civil de 2002 (BRASIL, 2008) não

estabeleceu um conceito acerca da propriedade privada. Segundo Caio Mário da

Silva Pereira (2005), o legislador tão apenas fixou atributos. Por este motivo, o autor

conceitua:

“a propriedade é o direito de usar, gozar e dispor da coisa e reivindica-la do que

injustamente a detenha.” (PEREIRA, 2005, p. 91)

A propriedade privada sofre limitações de distintas ordens. E essa limitação é

central para se falar em função social. As limitações se apresentam de variadas

formas. Tais como limitações constitucionais, infraconstitucionais, materiais e

processuais, e afetas a distintos ramos do saber jurídico.

Acerca de limitações, destaque-se Sílvio Rodrigues, conforme o qual as

limitações são fracionadas basicamente a partir de três tipos:

1) limitações voluntárias, como, por exemplo, servidão e usufruto; 2) limitações da própria natureza do direito de propriedade, a exemplo do abuso do direito.Segundo o autor: Se tal utilização é abusiva, o comportamento excessivo do proprietário não alcança a proteção do ordenamento jurídico, que, ao contrário, impõe-lhe o ônus de reparar o prejuízo causado. Portanto, o exercício do direito encontra uma limitação em sua própria finalidade 3) limitações impostas pela lei. (RODRIGUES, 2004, p. 85)

Conforme afirma Arnaldo Rizzardo (2007), as limitações do direito de

propriedade podem ser: 1) constitucionais, 2) administrativas e legais, 3) de

interesse particular, 4) interesse público e até mesmo florestais.

Orlando Gomes (2003) reputa que a propriedade pode sofrer limitações

advindas da dogmática, isto é, jurídicas. Bem como as limitações podem decorrer

dos princípios, e até mesmo do desígnio do proprietário, esta de cunho voluntário.

Edson Fachin (1988), em consonância com o pensamento exposto, faz uma

análise evolutiva da propriedade. Segundo esse autor, é devido nessa análise se

constatar quais são as condições econômicas e políticas existentes na sociedade. A

partir dessa constatação, consegue-se conceituar a propriedade.

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Ainda num estágio primitivo, anterior ao direito clássico, segundo Fachin

(1988), pode-se apurar que a propriedade comum significa a primeira forma de

propriedade, que tem uma ligação direta com a concepção que se tinha em relação

à família.

Esse pensamento não prosperou plenamente no Direito Romano. Vale dizer,

o pensamento clássico sofreu transformações. E aí sim, segundo Tristão de Athayde

citado por Fachin (1988), tem-se a gênese do conceito de propriedade privada.

Nesse ponto, Monteiro de Barros, igualmente citado por Fachin (1998), anuncia que

a propriedade nos primórdios da civilização, tinha um caráter coletivo. E em outro

instante da história, nota-se a transformação do invocado caráter e se atinge o

caráter individual.

Jefferson Daibert (1979) quando fala de propriedade privada e da mudança

de seu caráter, percebe que este fenômeno acontece exatamente em razão da

retirada do caráter egoísta da propriedade privada.

Portanto, a partir da traçada evolução das distintas características à

propriedade se tem a migração do caráter quiritário para o caráter social da

propriedade, o que transmite guarida para a idéia de função social.

2.3 Teorias da posse e sua incidência na propriedad e

É adequado analisar a teoria da posse e da propriedade para a compreensão

da função social da posse e da propriedade.

A teoria da posse, em uma visão histórica, pode ser considerada subjetiva ou

simplificada.

A teoria da posse, em uma visão subjetivista, segundo Menezes Cordeiro

(2000), de Friedrich Carl Von Savigny, exige o “corpus” e o “animus domini”. O

primeiro elemento é considerado elemento objetivo. Elemento esse, que pode ser

considerado o poder físico sobre a coisa, o contato físico sobre a coisa, mais o

“animus”, isto é, a intenção de proprietário.

O elemento objetivo é o mais criticado, em decorrência do fato de que a

exigibilidade de um contato físico para consagrar a posse é por demais inadequada.

Ante a impossibilidade de um indivíduo estabelecer um contato permanente com

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todos os objetos que lhe digam respeito. O que não se confunde com a detenção.

Vez que este elemento surge quando tão somente o elemento “corpus” aparece.

Jefferson Daibert (1979) explica que a posse para Savigny pode representar

uma síntese do “corpus” e do “animus”. Neste ponto, o primeiro é o elemento

externo. E o segundo elemento é interno, intelectivo, projetado na mente do

possuidor.

Para Savigny, fundamental para gerar a posse era a existência de detenção.

Segundo Savigny, citado por Menezes Cordeiro:

“Todas as definições de posse consideram como posse de uma coisa a situação na

qual não só a actuação própria, sobre a coisa, é fisicamente possível, mas também

pode ser impedida qualquer interferência exterior”. (CORDEIRO, p.24, 2000)

Menezes Cordeiro (2005) transmite dispositivos do BGB que são capazes de

demonstrar elementos típicos da teoria de Ihering.

Por outro lado, a teoria simplificada da posse de Rudolf Von Ihering é mais

adequada para tempos modernos. E necessita também de dois elementos, quais

sejam, “corpus” e “affectio”, aquele princípio objetivo, e este subjetivo.

O Código Civil brasileiro (BRASIL, 2008) adota a teoria de Rudolf Von Ihering,

e considera possuidor aquele que tenha a aparência de proprietário. Por isso, a

propriedade é o pressuposto, é amparo sobre o qual se estruturarão e se refletirão

acerca da posse. Em outras palavras, o ponto de partida da posse é a propriedade e

são esses os elementos que devem ser sempre cotejados para se ponderar acerca

da posse e da propriedade.

Segundo Ihering, quanto ao elemento objetivo, criticando a teoria de Savigny:

Dá-se hoje o nome de `corpus´ à relação exterior da pessoa com a coisa estabelecida pela apreensão. Os juristas romanos, pelo contrário, não se serviam dessa expressão senão para designar a manifestação da vontade no ato de apreensão. O `corpus,segundo a teoria dominante, é o poder físico ou a supremacia de fato sobre a coisa, tal é a noção fundamental pela teoria atual. Ela é absolutamente errônea, como se pode ver em minha obra já citada: O fundamento da proteção possessória(IHERING, p.43, 2002)

Adota-se no Código Civil brasileiro (BRASIL, 2008) a teoria de Rudolf Von

Ihering. Assim, possuidor no Brasil é o que tem a aparência de proprietário. E em

sede argumentativa, detentor será aquele que a lei do País adotar, conforme afirma

Adriano Stanley (2009).

20

Acerca da adoção da teoria simplificada da posse, com seu típico cunho

objetivo, Orlando Gomes (2004) explicita que o Código Civil (BRASIL, 2008) em seu

artigo 1.196 cristalizou a adoção dessa teoria: “Art. 1.196. Considera-se possuidor

todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes

inerentes à propriedade.” (BRASIL, 2008)

Aliás, o autor argumenta que o legislador nesse suporte fático se valeu de

mesma opção teórica que o legislador do Código Civil de 1916 (BRASIL, 1916).

Todavia, a previsão poderia ser vista precisamente no artigo 485:

“Art. 485. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício pleno, ou

não, de algum dos poderes inerentes ao domínio, ou propriedade.” (BRASIL, 1916)

Orlando Gomes (2004) ainda acrescenta que o Código Civil brasileiro de 1916

(BRASIL, 1916) é um dos primeiros, em um direito comparado, a adotar os princípios

da doutrina objetiva da posse.

Laura Beck Varela (2002) trabalha a facilidade e a adoção da teoria

simplificada da posse, ante a facilidade perceptível em relação à distinção entre

posse e detenção.

Sílvio Rodrigues (2002) soma que Clóvis Beviláqua, já no Código Civil de

1916 (BRASIL, 1916), fez opção pela teoria objetiva da posse. Nesse ponto,

Rodrigues (2002) é enfático ao dizer que não só Beviláqua, mas, também os outros

autores brasileiros, que abordam acerca da teoria da posse, exteriorizam que o

Brasil fez a opção, desde o Código Civil de 1916, pela doutrina objetiva.

Interpretar a posse é fundamental para se interpretar a propriedade. Haja

vista que os elementos da posse também podem aparecer na propriedade. Em

verdade, a propriedade plena aparece quando estiverem presentes os elementos da

posse. Em outros vocábulos, uma das maneiras de se exercer a propriedade é

exercendo a posse. Assim, o proprietário em decorrência dos elementos reivindicar e

dispor, tem a prerrogativa de também apresentar a posse, de forma direta ou no

mínimo indireta.

Em decorrência da tendência historicamente patrimonialista, a posse e a

propriedade são formas de satisfação destes desígnios patrimonialistas. Em razão

desses motivos, analisar a posse sem analisar a propriedade é praticar um erro.

Posto que estes elementos são interdependentes e preenchem o conteúdo

intelectivo humano de satisfazer seu afã patrimonialista.

21

O possuidor traz consigo os elementos de usar, fruir e gozar. E o proprietário,

este portador de direitos reais sobre coisas próprias, tem as prerrogativas de usar,

fruir, gozar, dispor e reivindicar.

22

3 FUNCIONALIZAÇÃO NO DIREITO PRIVADO

3.1 Momentos históricos da função social da proprie dade

Este capítulo não tem como escopo precisar todos os momentos da história

da função social da propriedade, pois esta tarefa demandaria escrever um

verdadeiro manual. Por isso, aqui serão colocados alguns momentos históricos

relevantes para a compreensão da função social da forma como hoje se concebe.

Conforme as reflexões feitas acerca da propriedade privada, aqui se reputa

que a história e o desenvolvimento de uma função social terminam por se confundir

com a história da propriedade privada.

Nesse ponto, salienta-se que as histórias da propriedade privada e da função

social da propriedade termina por se confundir, entretanto, elas se apresentam em

sentidos paradoxais. Isto é, a propriedade privada perde a sua força quiritária e em

contrapartida a função social ganha força.

Ao se ponderar sobre a propriedade privada, inúmeros fatos foram ditos, na

construção de uma propriedade privada e absoluta, onde em princípio não havia que

se falar em função social. Todavia, alguns autores mencionam alguns elementos que

ajudam na hora de enxergar a gênese do instituto.

César Fiúza (2006) acrescenta que o Código de Hamurabi foi importante na

história da função social. É certo que o referido código não previa explicitamente a

função social. Mas, tinha um interessante mecanismo que tinha sim como razão

legislativa, a limitação ao proprietário. O que é um auxilio na hora de se

compreender a evolução da função social da propriedade.

Para Fiúza (2006), o dispositivo estava previsto no artigo 40, que determinava

que um mercador poderia vender seu imóvel, para tanto tinha a incumbência de

assumir o serviço peculiar ao bem, o objeto da venda.

Arnaldo Rizzardo (2007) invoca que a Encíclica “Rerum Novarum”, de 1891,

também merece apreço historicamente. Pois esse dispositivo, de cunho religioso,

regulava que o proprietário deveria bem aproveitar o seu patrimônio. Por esse bom

aproveitamento, e não desenfreado, extrai-se o caráter social desejado pelo Papa

Leão XIII.

23

Outro personagem histórico a ser destacado, segundo Darcy Bessone (1988)

é Santo Tomás de Aquino, no período da idade média. Personagem que é

antagônico a Adam Smith, responsável por defender o individualismo.

Conforme foi dito, a propriedade privada apresentava um caráter egoístico,

perceptível dogmaticamente, o que tornava dificultosa a inserção de uma função

social mais contundente no direito brasileiro, até o Código Civil de 1916 (BRASIL,

1916).

Ademais, a função social não tinha espaço em um Estado Liberal e sim em

um Estado Social e Democrático de Direito. Paradigmas esses, mais preocupados

com os direitos sociais, e, reflexamente, com a coletividade.

O caráter egoísta é visto na fala de Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves

(2007), que acrescentam que a intervenção estatal acontecia subsidiariamente,

quando houvesse a aferição de culpa. Em suas palavras:

A função social é um princípio inerente a todo direito subjetivo. No receituário liberal define-se o direito subjetivo como o poder concedido pelo ordenamento ao indivíduo para a satisfação de seu interesse próprio. Ou seja, a realização de qualquer atividade econômica apenas encontrava limites em uma conduta culposa que eventualmente causasse danos a terceiros. Afora tais situações extremas, exaltava-se a conduta egoística de contratantes e proprietários (...) (CHAVES; ROSENVALD, 2007, p. 189)

Para que se tenha sapiência sobre a função social da propriedade é

necessário apontar qual é a espécie de propriedade analisada. A partir daí se atinge

a devida seriedade e maturidade para a reflexão sobre a função social.

Orlando Gomes (2003), ao discutir sobre as particularidades sociais nos anos

iniciais do Código Civil de 1916 (BRASIL, 1916), contribui para a compreensão da

primazia do supracitado viés. Assim se pronuncia Gomes:

O quadro econômico e social em que se processa a obra dos codificadores, de 1899 a 1916, deve ser traçado em suas linhas gerais, para a melhor compreensão do sentido da codificação, melhor aferição do seu valor, e melhor fixação das suas coordenadas. A esse tempo não se iniciará o processo de transformação da economia brasileira, que a guerra mundial de 14 viria desencadear. A estrutura agrária mantinha no país o sistema colonial, que reduzia a sua vida econômica ao binômio da exportação de matérias-primas e gêneros alimentares e da importação de artigos fabricados (...). Predominavam os interesses dos fazendeiros e dos comerciantes (...) (GOMES, 2003, p.25)

Sustente-se, uma vez mais, que nos anos finais do Código Civil de 1916

(BRASIL, 1916), dispositivos constitucionais e infraconstitucionais já se faziam

24

presentes no sentido de consagrar a função social da propriedade. Mas, analisando

a inteireza do período de vigência do Código Civil de 1916 (BRASIL, 1916), é

legítimo dissertar que o caráter absoluto da propriedade se manteve robusto. E tão

só nos últimos anos da existência desta lei que a propriedade em seu caráter

absoluto sofreu um enfraquecimento.

Luciano de Souza Godoy (1999) aponta que graças a perda do caráter

absoluto da propriedade privada a função social termina ganhando corpo. De forma

literal o autor dispõe:

A propriedade privada, como um direito individual e funcionalizado, isto é, que tem presente uma função social, apresenta um conceito não absoluto de propriedade- pela função social que lhe é inerente. Essa fórmula é adotada em grande parte dos países, como o conceito de propriedade juridicamente correto. Para usar uma expressão metafórica muito feliz, diz-se que o direito de propriedade é o corpo e a função social é a alma, elementos inseparáveis, mas distintos, que se mantêm vivos enquanto ligados. O direito de propriedade é garantido pela ordem jurídica: todavia, deve ser exercido à luz da função social que lhe é inerente. (GODOY, p. 31, 1999)

Passa-se a estudar, a história da função social da propriedade no Brasil. Pelo

proposto, acerca da função social, especificamente da propriedade, cabível será

trazer o pensamento de Elisabete Maniglia (2005), na obra organizada por Lucas

Barroso, Mário Lúcio Quintão e Alcir Gursen de Miranda (2005). Autora que de início

faz uma análise histórica e dogmática da função social no Brasil. Para tanto, destaca

que a primeira constituição que positivou a matéria foi a de 1934, de modo incipiente

aliás, uma vez que preceituava no artigo 113 que o direito de propriedade devia ser

exercido sem vilipendiar o interesse social. A constituição subsequente se queda

silente no que tangencia a matéria. A Constituição Federal de 1946, por sua vez, faz

alusão à função social, ao positivar a desapropriação por interesse punitivo.

Orlando Gomes (2004) afirma sobre a existência de um aumento da

fortificação do interesse público que passa a ser predominante. E por essa razão, as

restrições à propriedade privada passam a ser mais presentes.

Gomes afirma também que “a função da propriedade tornou-se social”

(GOMES, 2004, p.125). Em razão disso, perfaz-se um ensejo para se falar em

função social da propriedade.

Caio Mário da Silva Pereira (2005), invocando Savatier, afirma que há autores

que problematizam tão fortemente acerca da intervenção estatal na propriedade

25

privada, que chegam a suscitar que se está diante de um processo de publicização

da propriedade privada.

Maniglia (2005) ainda aborda sobre a Constituição Federal de 1967 (BRASIL,

1967) e 1969 (BRASIL, 1969), ao dizer que a função social está presente ao falar de

pagamento da desapropriação para imóveis rurais.

Antes de se analisar o caráter preponderante no Código Civil de 2002

(BRASIL, 2008), invocam-se alguns preceitos trazidos pelo legislador constituinte,

que versam sobre a função social. O primeiro consiste no artigo 186, que dispõe:

Art.186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos requisitos: I-aproveitamento racional e adequado II- utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente III- observância das disposições que regulam as relações de trabalho

IV- exploração que favoreça o bem-estar dos trabalhadores. (BRASIL, 2008)

É buscando maior completude, que se invoca mais um preceito de ordem

constitucional que versa explicitamente sobre a função social da propriedade, qual

seja, o artigo 182, em seu parágrafo 2º, presente no capítulo II, apresentado sob o

título “Política Urbana”:

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.(BRASIL, 2008)

Elisabete Maniglia (2005), na obra Direito agrário na Constituição, aborda o

tema nos termos seguintes:

Percebe-se que o esforço da lei em dizer simultaneamente a todos os itens dispostos no artigo 186 e em colocar e definir nos incisos do artigo 9º da Lei número 8.629 como deve se fazer para atingir o cumprimento deste propósito, na prática, desprezam-se estes argumentos à luz do cumprimento da produtividade. Fala-se muito em meio ambiente e em direitos sociais nos discursos acadêmicos e mesmo políticos mas, estes, no momento vital de serem exigidos, são levados a bancarrota sendo preferencialmente preteridos pelo elemento econômico da produtividade.(MANIGLIA, 2004, p. 37)

26

A par do comentário trazido por Elisabete Maniglia (2005), salienta-se que no

presente trabalho está se analisando o conceito de função social e a influência das

restrições ambientais nesta função. Por isso, nota-se que quando a reflexão disser

respeito à preponderância de algum aspecto na função social, inúmeras

divergências aparecerão. Neste caso, Maniglia (2004) destaca o elemento

econômico na produtividade, que é um dos elementos que dão corpo à função

social.

O preceito supramencionado alude elementos concernentes à competência

legislativa. A partir da leitura do parágrafo segundo do artigo 182 da Constituição

Federal (BRASIL, 2008), vê-se que expressamente houve a determinação do

requisito principal para a concretização da função social da propriedade. Entretanto,

o constituinte não se preocupou em exaustivamente construir o conceito jurídico de

função social da propriedade, tão apenas foram estabelecidos alguns parâmetros

gerais.

A Constituição Federal (BRASIL, 2008) optou por transmitir a competência

para estruturar parâmetros do plano diretor. Plano diretor que é instrumento

normativo especifico de cada município que eventualmente o tenha construído.

Diante dessa transmissão, importa citar que o diploma em comento terminou por

aceitar que o conceito de função social é subjetivo. Subjetivo e convergente também

com as especificidades sociais de cada município, além de ser modificável. Razão

pela qual não é possível atribuir um conceito único à função social. É possível

aproximar de um conceito, a partir de um parâmetro geral de ordem constitucional.

Sem temer fugir do tema central do trabalho, pondera-se ,propedeuticamente,

que o Plano Diretor tem previsão no Estatuto da Cidade, a Lei 10.257 do ano de

2001 (BRASIL, 2001). Estatuto esse que traz elementos gerais que são aplicáveis

ao território nacional, todavia, as peculiaridades de cada município estarão

presentes nas leis orgânicas, planos diretores e outros dispositivos.

A partir da leitura do texto constitucional, se houvesse uma interpretação

semântica, a conclusão a ser extraída seria no sentido de que se houver plano

diretor no município é possível que a função social seja cumprida. Todavia, se não

houver plano diretor, a função social não será exigida. Entretanto, tal interpretação

semântica não poderá prosperar, uma vez que o plano diretor não existe em todos

os municípios. E, não obstante inexista tal plano, não se pode reputar que se está

diante de uma elisão ao dever de cumprimento da função social.

27

Após ter feito uma análise constitucional, atinge-se o Estatuto da Cidade

(BRASIL, 2001). Estatuto que traz elementos corolários, por intermédio dos quais se

alcança a função social da propriedade. E é a Constituição da República Federativa

do Brasil (BRASIL, 2008) e o Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001), que trazem uma

pedra de toque entre a função social da propriedade e as restrições ambientais. E

por meio dessa reflexão será possível compreender o impacto das restrições

ambientais na função social da propriedade.

Além disso, se interpretará se há um paradoxo entre a função social e as

referidas restrições. Após observar os múltiplos preceitos e teorias se constata que

conceituar função social é sim uma árdua tarefa, em verdade se está diante de um

conceito que constantemente deverá ser aprimorado, em razão das modificações

sociais que se desencadeiam naturalmente.

O legislador, em relação ao conceito de função social da propriedade, não foi

exaustivo, não esgotou o conceito. Ao contrário, anuiu com a subjetividade, ao

passo em que também foi atribuída competência, em certa medida ao legislador

municipal, para traçar elementos estruturantes da função social. Em outras palavras,

cada um dos municípios poderá apresentar idéias acerca do exercício da função

social. Porém, divergências intransponíveis não podem se perfazer, pois os

parâmetros gerais da função social estão acostados na Constituição Federal

(BRASIL, 2008).

A partir da alegada constante formação conceitual de função social, resta

mencionar que as restrições ambientais ganham relevo. Nessa formação, aponte-se

que as restrições ambientais não têm outra explicação senão consagrar a função

social da propriedade. Seria essa a real razão, seria esse o fator motivacional

culminante legislativo que ilumina a mente do legislador ao criar uma restrição.

Sobretudo, porque o bem jurídico ambiente não traz o condão da individualidade.

Trata-se de um bem jurídico, um valor necessário para a coletividade.

Some-se que o conceito de função social, conforme já foi dito, não é marcado

pela estaticidade. Diante disso, o papel ambiental na construção do conceito em

comento é visível. Por isso, acredita-se que as restrições ambientais são a “conditio

sine qua non”, a condição fundamental para construir o conceito de função social da

propriedade.

Amparado no artigo 182 e 183 da Constituição Federal (BRASIL, 2008), nota-

se o comando para a construção da Lei 10.257 de 2001 (BRASIL, 2001). E no artigo

28

2º, vê-se o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da

cidade e da propriedade privada, mais especialmente segundo o inciso I. Sobre a

preocupação estatal em relação ao meio ambiente, colacione-se o dispositivo:

Art.2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: I-Garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.(BRASIL, 2001)

Ainda no mesmo artigo, em seu inciso IV, percebe-se o foco de proteção ao

meio ambiente:

IV- planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos ao meio ambiente. (BRASIL, 2001)

Já no inciso VI, existe o objetivo de promover a ordenação do uso do solo. E

para tamanha ordenação, uma vez mais se tem o meio ambiente como elemento

norteador.

“VI- ordenação e controle do uso do solo de forma a evitar: g) a poluição e a

degradação ambiental. (BRASIL, 2001)

O inciso VIII do mesmo artigo também é construído tendo como sentido

legislativo a proteção ao meio ambiente e a promoção da função social:

“VIII- adoção de padrões de produção e de consumo de bens e serviços e de

expansão urbana e compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social

e econômica do Município e do território sob sua área de influência.” (BRASIL, 2001)

Ao se ponderar sobre os dispositivos que versam sobre a função social, é

perceptível que o elemento nuclear será a restrição ambiental. E os dispositivos

gerais que foram abordados, demonstram de forma categórica esse pensamento.

Demonstração que aparecerá, enfatize-se, além dos dispositivos já colacionados,

em relação aos demais dispositivos que tratam da função social.

Observe-se a partir da reflexão dogmática, que a função social se estrutura

sob a égide da primazia das restrições ambientais. Porém, deve-se afirmar que há

outros tantos pressupostos relevantes para a construção conceitual da função social.

O conceito de função social se considera sucessivo e indeterminado. Em

verdade, este se protrairá ao longo do tempo, com a presença de fortes e

29

substanciais elementos norteadores, quais sejam, as restrições ambientais estatais

impostas.

Ainda há mais um inciso, entre outros, que inserem o meio ambiente como

elemento central:

“XII- proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do

patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico.” (BRASIL, 2001)

Essas são concepções dogmáticas que mostram a profunda interveniência

das restrições ambientais na construção do conceito de função social.

Fachin (1988) esclarece, conforme já foi apontado, que em períodos mais

remotos da história a propriedade privada representava a exacerbação do

individualismo, além disso, era marcada pela inviolabilidade e pelo absolutismo.

Nesse sentido, entende-se que nesse período não havia qualquer possibilidade de

intervenção estatal. Uma vez que prosperava o caráter perpétuo e absoluto.

Taísa Maria Macena de Lima (2003) pondera que a função social pode ser

interpretada como um conjunto de limites que são impostos. Limites esses, que têm

como propósito comprimir certas atuações individuais.

Orlando Gomes (2004), após toda a evolução sedimentada, é importante para

atingir e precisar o elemento função social. Para o professor, a função social da

propriedade, como hoje se concebe, alheia, portanto, ao caráter individualista,

deverá pairar sobre tríplice aspecto, quais sejam:

“1. Privação de determinadas faculdades; 2. a criação de um complexo de condições

para que o proprietário possa exercer seus poderes; 3. A obrigação de exercer

certos direitos elementares de domínio.” (GOMES, 2004, p. 125)

A intervenção racional estatal, enfatize-se, ajuda na construção conceitual da

função social. E será em sintonia com esse pensamento conceitual que se consolida

a supremacia dos interesses sociais, a reação anti-individualista, segundo Fachin

(1988), como a base da função social. E será através do prestígio desse interesse

social, que as limitações à propriedade ocorrerão.

30

3.2 Outras modalidades de função social

3.2.1 Função social da empresa

Conforme já se apontou, a função social da empresa, assim como a função

social da propriedade têm previsão constitucional, diferentemente da função social

dos contratos, que tem previsão no Código Civil.

Por esse motivo, para se interpretar o peso e o impacto da função social,

explana-se também acerca da função social da empresa. Assim, o legislador

infraconstitucional não poderá criar quaisquer dispositivos que sejam antinômicos à

função social da empresa ou tampouco à função social da propriedade.

Concebe-se que a função social se estrutura a partir de elementos como a

solidariedade, boa-fé, mitigação do egoísmo, respeito à dignidade da pessoa

humana e outros tantos elementos.

José Afonso da Silva (2006), em uma análise constitucional, reputa que a

função social da empresa é atribuída em razão do artigo 170, bem como do artigo

160, em seu inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL,

2008). Pelo fato a função social ser um pilar da ordem social e econômica.

Rodrigo Almeida Magalhães (2007) acrescenta outros dispositivos, para

demonstrar o quão trabalhada é a função social dogmaticamente. Nessa análise, é

citado o artigo 5º em seu inciso XXIII, bem como o artigo 173, em seu parágrafo

primeiro, inciso I. Ainda acresce o artigo 182, parágrafo segundo, e os artigos 184

“caput” e 185, todos da Constituição Federal (BRASIL, 2008). Em análise

infraconstitucional, o professor soma o artigo 421 do Código Civil (BRASIL, 2008), o

artigo 116, parágrafo único da Lei 6.404/76, a Lei das sociedades por ações. E, por

fim, o artigo 47 da lei de falência e recuperação, a lei 11.101 do ano de 2005.

E é o que se nota em relação à lei das Sociedades Anônimas, a lei 6.404

(BRASIL, 1976), ao se perceber a exigibilidade aos administradores e até mesmo

aos acionistas, de uma pluralidade de deveres. Tais como a lealdade e a

transparência.

Nesse ponto, uma empresa preocupada em exigir deveres de lisura,

idoneidade aos seus sócios é uma empresa comprometida no exercício racional e

31

social da atividade empresária. Uma empresa com esses nortes, no exercício da

circulação de mercadorias e serviços, terá a preocupação com a coletividade. Uma

vez que todos esses deveres exigidos primam por afastar e reprimir condutas

individualistas, indiferentes aos indivíduos. E é precisamente essa a expectativa que

paira sobre a função social da empresa.

A respeito desses deveres, que são adjacentes à função social da empresa,

diz Osmar Brina (2005), primeiramente em relação ao acionista controlador:

Dever de exercer o direito de voto no interesse da companhia, evitando o abuso do direito e o conflito de interesses (art. 115); 2. Realizar, nas condições previstas no estatuto ou no boletim de subscrição, as prestações correspondentes às ações subscritas ou adquiridas (art. 106) (LIMA, 2005, p. 225)

Brina (2005), a partir de uma interpretação da lei 6.404 (BRASIL,1976)

menciona uma série de direitos concernentes aos administradores. O primeiro dos

quais consiste no dever de obediência, segundo o professor “obediência significa

respeito, acatamento, submissão à lei e ao estatuto social.” (LIMA, 2005, p.181)

Outro dever que também será contributivo para a função social da empresa

consiste no dever de diligência, que

significa cuidado ativo, zelo, aplicação, atividade, rapidez, presteza. O administrar da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios (art. 153). (LIMA, 2005, p. 181)

Outro dever a ser destacado, segundo Osmar Brina (2005), consiste no dever

de lealdade, sobre o qual repousa uma série de corolários, como o dever

informacional e o dever de votar em favor da companhia.

Acredita Magalhães (2007) que o sentido da função social é precisamente a

codificação de normas para incutir nos homens a necessidade de agir em

consonância com os interesses sociais. Diante disso, a função social da empresa

pode ser explicada:

Para a empresa, é atribuído o exercício de uma função sócia, que atende não só os interesses e a autonomia privada dos sócios, mas também da coletividade, atrelando a noção de função social à atividade econômica face a sua importância. (MAGALHÃES, 2007, p. 345)

Todavia, alerta o autor que função social não se confunde com filantropia:

32

Entretanto, a função social não pode ignorar a função primeira da empresa que é o lucro. Não pode ser esta anulada a pretexto de cumprir uma atividade assistencial, filantrópica. A empresa, tem uma função social, não uma função de assistência social(...) A função social jamais poderá ocupar a função econômica da empresa. Empresa sem lucro não sobrevive, deixa de funcionar. (MAGALHÃES, 2007, p. 345)

Embora a função social da empresa parta de semelhantes pressupostos em

relação à função social da propriedade, não há como negar que na primeira

modalidade de função social o furor pelo lucro, e pela necessidade intensa de

manter o empreendimento é um fator que não pode ser ignorado.

Em similar sentido está Fábio Konder Comparato (1990) segundo o qual a

função social é um poder-dever que é conferido à empresa e aos proprietários para

que estes exerçam suas funções de formar e valorar a coletividade.

A função social da empresa não nega a necessidade de respeito precípuo à

coletividade, porém, não se distancia da proposição de que sem renda e sem lucro,

mais difícil será a concretização da própria função social. Por isso, a função social

da empresa precisa de harmonizar a função econômica com a função social.

3.2.2 Função social dos contratos

É pertinente dizer que a função social dos contratos, diferentemente da

função social da propriedade e da empresa, não está presente na Constituição

Federal (BRASIL, 2008) e sim no Código Civil (BRASIL, 2008)

Ao se abordar este tema, é perceptível que este repercute como um autêntico

norte do vigente Código Civil (BRASIL, 2008). Trata-se de uma modificação

paradigmática, fruto de uma modificação de panorama interpretativo.

Caio Mário da Silva Pereira (1998) coloca que a função social dos contratos

surgiu com o passar do tempo, a partir de mudanças sociais. Diante disso, a função

social reconhece que os contratos são socializados, isto é, estão presentes para

toda a sociedade, de forma ampla ou limitada. Segundo o autor, todo o indivíduo

contrata de alguma forma. Nesse ponto, é o contrato que garante a subsistência dos

indivíduos.

33

Perfez-se uma modificação de hermenêutica da ciência do Direito Civil. Pois

não mais se lê um contrato em um caráter estritamente relativo às partes nele

contempladas. Todo o contrato, segundo a função social, traz consigo uma

transcendência, haja vista sua incidência parcial ou plena perante a coletividade.

Na concepção de Caio Mário da Silva Pereira (2003), a função social dos contratos,

pode ser observada a partir da proposição de que o código traz em seu arcabouço o

regime da livre iniciativa. Desta maneira, este regime é responsável por ser

dominante na economia do País, e se assenta em termos do Direito do Contrato,

assim como na liberdade de contratar. Estes elementos anunciam a regra contida no

artigo 420, de subordinação da referida liberdade à sua função social. E também

anunciam a predominância dos princípios condizentes com a ordem pública. Além

de anunciar a impossibilidade de vilipêndio ao conceito da justiça comutativa.

Um outro princípio consonante com a função social dos contratos pode ser a

socialidade, nas palavras de Rosenvald e Chaves (2006). Segundo os quais, este

princípio consistiu em uma ambição de projeto de Miguel Reale. E este princípio está

associado ao bem comum, que é traduzido como a solidariedade, mediante a

cooperação dos indivíduos, para a satisfação de interesses patrimoniais recíprocos,

sem permitir o comprometimento da dignidade e da personalidade.

A função social tem repercussões dogmáticas no Código Civil brasileiro e é

fruto de uma profunda evolução histórica. Dogmática que diz respeito ao artigo 421

ao 425 do citado Código Civil (BRASIL, 2008).

Interpretar a função social é ponderar sobre o grau de intervenção do Estado

e o grau de autonomia privada.

Como forma de ajudar na construção da função social, nota-se a busca de

constituição de uma sociedade livre, justa, solidária, e que prima pela promoção do

bem de todos.

Em se tratando de autonomia privada, percebe-se que esta se preocupa com

a liberdade ofertada aos cidadãos.

Outro elemento consiste no princípio da socialidade, e este termina

problematizando questões como a liberdade contratual, e liberdade de contratar.

Ora, objetiva-se verificar as consequência de uma restrição das aludidas liberdades.

Desse modo, para aperfeiçoar a função social há que se pensar na função do

contrato para a sociedade e para as partes. Percebe-se que na primeira faceta

existem efeitos indiretos e reflexos de cada um dos contratos perante a sociedade.

34

Vale dizer, começam os efeitos entre as partes e excedem tais efeitos para a

coletividade.

Segundo Caio Mário da Silva Pereira (2003), a função social dos contratos

não pode ser analisada dissociada do princípio da obrigatoriedade. Por isso, esses

princípios se complementam. A partir desse pensamento, não é errôneo inferir que a

função social tem peso para a sociedade e deve ser cumprida cotidianamente. Tal

princípio não pode ser encarado como uma faculdade às partes, não deve ser

cumprido eventualmente, e se possível for. Em verdade, este deve ser

impreterivelmente cumprido, sob pena de a própria coletividade ser prejudicada.

Acerca do princípio da função social dos contratos, que tem relevo para se

entender a função social da propriedade se cite Teresa Negreiros:

Combinados aos demais princípios já examinados, o princípio da função social importa redefinir o alcance daqueles outros princípios da teoria clássica, constituindo-se em um condicionamento adicional imposto à liberdade contratual. (NEGREIROS, 2006, p. 208)

Em concordância está Arnaldo Rizzardo (2010):

A função social do contrato decorre da doutrina que se opôs ao liberalismo decorrente da Revolução Industrial e que veio a ser adotada pela Constituição Federal do Brasil em 1988, a partir do direito de propriedade (art. 170, inc. III), passando a se impor como diretriz das relações jurídicas. (RIZZARDO, 2010, p. 21)

A eficiência contratual é também elemento relevante para a função social e

tem implicação direta em relação ao conceito de funcionalidade contratual. Vale

afirmar, os contratos necessitam de ter uma utilidade, uma importância para a

sociedade.

Portanto, constrói-se também um princípio da equivalência material como

implicante à função social dos contratos. Que seria a expressão do princípio da boa-

fé objetiva, e consagrado como concatenado ao princípio da probidade. Trata-se de

uma análise sobre o equilíbrio das prestações contratuais.

35

4. PRINCÍPIOS PROSPERANTES NO CENÁRIO PATRIMONIAL: NÚCLEOS DE CONTEXTUALIZAÇÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE 4.1 Clássica principiologia

Acerca dos princípios fundantes do Direito Civil é necessário dissertar que os

autores teorizam variáveis princípios. Em razão desse fato, é árduo catalogar com

segurança os princípios do Direito Civil.

Em caráter preliminar, os princípios fundantes do Direito Civil, segundo Taísa

Maria Macena de Lima (2003), amparada em Maria Helena Diniz e Carlos Alberto

Bittar, são os subsequentes:

1º Princípio da personalidade; 2º Princípio da Autonomia da vontade; 3º Princípio da liberdade; 4º Princípio da propriedade privada; 5º Princípio da proteção familiar; 6º Princípio da legitimidade da herança e do direito de testar; 7º Princípio da Responsabilidade; 8º Princípio do solidarismo social. (LIMA, p. 243, 2003)

Entretanto, o tema que ora se explora consiste na principiologia do Direito

Civil, tema que será abordado especialmente com o olhar para o aspecto

patrimonial. Na tentativa, portanto, de identificar quais são os princípios que se

aplicam à propriedade privada.

O entendimento da principiologia é importante para a identificação e melhor

precisão do contexto no qual se está inserido. Vê-se que o tema central desta

dissertação, a função social, coaduna-se à nova principiologia, proferida por César

Fiúza (2006) e se distancia da clássica principiologia auferida pelo mesmo professor.

Isso em razão, entre outros fatores, da presença da autonomia privada como

sustentáculo daquela vertente.

Nesse viés, os princípios auxiliam os atores do direito no processo

hermenêutico. Os princípios que serão transmitidos ajudam no esclarecimento do

instituto da função social, pois terminam por repercutir como núcleos que iluminam o

pensamento dos estudiosos da ciência do direito e os permitem alcançar a dimensão

do citado instituto.

Em razão disso, a ponderação principiológica será feita de forma

propedêutica. E o princípio enfatizado será a autonomia privada.

36

O norte dos princípios clássicos é a autonomia da vontade. E por outro lado,

os nortes da nova principiologia são a dignidade da pessoa humana e a função

social. Princípios que de fato são paradoxais entre si.

Na principiologia clássica se nota o desejo de valoração da vontade dos

indivíduos, a valoração, aliás, de desígnios egoístas, individuais.

Valorar sobremodo a liberdade é valorar os interesses humanos, o que gera

um descontrole. Além de se perder de vista o que mais a nova principiologia almeja,

que é o respeito à dignidade do homem.

A liberdade conduz o homem, em uma sociedade capitalista, para a

incessante inquietação do acúmulo de riquezas. E em sentido contrário, ao

desprestígio do homem. E ainda gera um obstáculo, em razão da extremada

valoração ao bem jurídico patrimônio, da dignidade.

As consequências da liberdade, se não houver o acompanhamento de

solidários elementos, lamentavelmente inclinam a sociedade para uma nebulosa

realidade de desprestígio à pessoa humana.

Em outras palavras, a autonomia da vontade, por si só não é capaz de

satisfazer as aspirações da dignidade da pessoa humana e da função social. Motivo

pelo qual, merece ser superada.

Nessa visão, encontra-se o insuportável abismo entre as vertentes

confrontadas. Assim, tão somente a partir da superação desse abismo será possível

se falar adequadamente em função social da propriedade.

Nesse patamar, a clássica principiologia deve ser superada. Pois esta não

projeta a liberdade em confronto com o aspecto humanístico. E sem este confronto,

prejudicada seria qualquer análise concernente à função social.

A autonomia da vontade se interliga à liberdade, assim como a autonomia

privada. Entretanto, a liberdade por si só, fomentada pela autonomia da vontade,

não é capaz de auferir a distinção entre o norte da clássica e da nova principiologia.

A diferença se pode auferir a partir da inteireza principiológica.

A função social, então, tem uma vertente humanista. Uma visão, que

posiciona a coletividade, que posiciona o homem no centro de sua análise. Trata-se

de uma visão que repudia o egoísmo.

Nesse capítulo, a busca, enfatize-se, é por confrontar a clássica e a nova

principiologia.

37

Quando se aborda a nova principiologia, segundo César Fiúza (2006), é

possível localizar a autonomia privada, a função social, a dignidade da pessoa

humana, a boa-fé. Todos que têm ligação direta com a propriedade privada.

Os citados princípios ao longo do presente capítulo serão refletidos

individualmente.

4.1.1 Princípio da autonomia da vontade

Conforme já se exteriorizou na introdução deste capítulo, o princípio da

autonomia da vontade é central ao sentido da principiologia clássica.

A origem da autonomia da vontade, segundo Eduardo Sens dos Santos

(2004), diz respeito às teorizações Kant e Rosseau. Autonomia da vontade que foi

amoldada, em períodos ulteriores.

A autonomia da vontade consiste em um princípio que se perfazia mais

intensamente em anteriores ordenamentos infraconstitucionais. Em verdade, este

princípio não tem lugar pleno no Código Civil de 2002 (BRASIL, 2008).

A autonomia da vontade tem como escopo transmitir aos sujeitos contratuais

absolutas, amplas e praticamente ilimitadas liberdades para esses manifestarem as

suas vontades.

Vale afirmar, as partes decidem os moldes de sua atuação, e por

conseguinte, executam o seu desígnio de tangibilidade patrimonial. Onde o Estado

não interviria. Aliás, só interviria se houvesse agressão tênue ou intensa ao Estado.

Nesse princípio, presente está o individualismo. Ausente está a presença

estatal. Estado que não participava da formação, por exemplo, contratual. Aqui o

relativismo se exacerba. Motivos pelos quais, árdua seria a intervenção estatal.

Em outros termos, o Estado tolerava as decisões dos indivíduos. Porém, esse

pensamento não permite afirmar a ausência total estatal.

Taísa Maria Macena de Lima (2003) acredita que esse princípio tem relação

com um direito de resistência que é conferido ao indivíduo em razão de intervenções

de ordem estatal.

Clóvis Beviláqua (1954) teoriza acerca da liberdade conferida ao indivíduo,

em um contexto patrimonial. Liberdade essa, considerada central para a

38

determinação do conceito da autonomia da vontade. Esclarece o autor que para a

verificação da vontade e para a apuração do exercício da liberdade, é necessária a

observância dos elementos psíquicos dos indivíduos. .

Arnold Wald (1994) a partir do direito de liberdade, também conceitua a

autonomia da vontade: “A autonomia da vontade se apresenta sob duas formas

distintas, na lição dos dogmatistas modernos, podendo reverter o aspecto da

liberdade de contratar e da liberdade contratual.” (WALD, 1994, p.152)

César Fiúza (2006) esclarece que o princípio em foco pode ser traduzido a

partir de quatro características visíveis. Essas que inelutavelmente terminam por

traduzir a tensão entre a presença estatal e a vontade das partes.

A primeira característica aponta para a legitimidade, atrelada às partes, no

sentido de decidir se haverá a contratação, ou mesmo se não haverá a contratação.

Ninguém poderá intervir, no sentido de substituir, ou afrontar a invocada

legitimidade.

Se houver a citada intervenção, entre outras conseqüências, destaca-se um

efeito. Uma das quais de cunho constitucional, notadamente descrita no artigo 5º,

inciso II, segundo o qual:

“ninguém será obrigado a fazer, ou deixar de fazer, senão em virtude de lei.”

(BRASIL, 2008)

Existe nessa primeira característica da autonomia da vontade, uma ligação ao

princípio da liberdade de contratar. Hoje contemplada, nos termos propagados pelo

autor anteriormente dito, ao princípio da autonomia privada.

O princípio da autonomia da vontade ainda traz outra característica. Qual

seja, a possibilidade de decisão, por parte dos sujeitos, sobre as pessoas com as

quais haverá a contratação. E assim, o indivíduo terá a liberdade de decidir de quais

pessoas comprará um bem, e em favor de quais pessoas disporá sobre a sua

propriedade, conforme Caio Mário da Silva Pereira (2003).

Segundo Fiúza (2006), a terceira característica que decorrerá do princípio da

autonomia da vontade, consiste na vedação para a atribuição de cláusulas que

venham a contrariar o permissivo legal. Em outras palavras, cláusulas defesas em

lei, não devem ser reputadas como válidas.

Caio Mário da Silva Pereira (2003) trabalha a autonomia da vontade e a sua

interação com as intervenções do Estado. Segundo o professor, a ordem jurídica é

responsável por solidificar a legitimidade conferida aos indivíduos para a criação de

39

direitos, como o direito de propriedade. Assim como a autonomia da vontade legitima

os indivíduos a decidirem sobre a vinculação ou não com terceiros.

Conforme se apontou durante a teorização sobre a autonomia da vontade,

esse princípio não demonstra um grau satisfatório de dirigismo estatal, de presença

estatal. O que transmite exacerbada liberdade e que por sinal, saliente-se, gera um

afastamento do cenário teórico pertinente para o acolhimento da função social.

Certamente não se está a ponderar substancial intervenção do Estado na

autonomia da vontade, está a se ponderar uma necessária e equilibrada intervenção

do Estado, sob pena de se fulminar a razão existencial da ciência do Direito Civil.

Para se abordar sobre a medida certa de intervenção, sem se afastar do

núcleo dessa dissertação, é devido uma vez mais acrescentar que um dos

elementos justificadores de intervenção é precisamente a partir da função social. O

que se coaduna com a nova principiologia, com a função social e não com a

autonomia da vontade.

O consensualismo também deve ser trabalhado como princípio aplicável em

uma realidade principiológica patrimonial clássica.

O consensualismo tem intima concatenação com a própria gênese e

conceituação do contrato, por exemplo, uma vez que o consensualismo almeja

valorizar a liberdade que os sujeitos têm de consolidar o contrato no formato

objetivado, sem imposições, e interveniências unilaterais.

Ora, será por intermédio do consensualismo que se perfará a transferência de

propriedade. Nesse ponto, para se falar em propriedade e destinação desta, é

necessária a obediência ao princípio do consensualismo.

Acontece que o consensualismo, em uma principiologia clássica, era muito

enfatizado. Isto é, as decisões produzidas pelas partes acerca de seus bens, não

geravam posteriormente uma modificação. Diante dessa colação, as partes decidiam

e a soberania da vontade, sem intervenções estatais, se cristalizava.

Segundo César Fiúza (2010), o princípio do consensualismo denota uma

valorização da vontade das partes e de fato é capaz de complementar a clássica

principiologia. Ora, aqui há flagrante guarida ao desígnio das pessoas envolvidas em

um ato.

Vale afirmar, as partes segundo as suas liberdades se inclinam para criar,

modificar ou extinguir algum direito, conforme a gênese contratual, por exemplo. E

são estas partes que decidirão o que farão, sem intervenções diretas estatais.

40

Literalmente o autor Fiúza explica:

O princípio do consensualismo dita considerarem-se os contratos celebrados, obrigando, pois as partes, no momento em que estas cheguem a consenso, na conformidade com a lei, sendo dispensada qualquer formalidade adicional. (FIÚZA, 2010, p.37)

Posiciona-se o consensualismo no capítulo sobre a autonomia da vontade,

pela relação de complementariedade que existe entre ambos. Fiúza acrescenta que

um ato como, por exemplo, um contrato, é celebrado a partir de um consenso entre

as partes, em conformidade com o disposto no ordenamento jurídico.

Aqueles atos produzidos em respeito à vontade das partes, não têm outro

efeito senão o respeito ao consensualismo. Há, portanto, uma relação de causa e

efeito entre a autonomia da vontade e o consensualismo. Isto é, o consensualismo

só se verifica em razão do pressuposto de liberdade, isto é, a autonomia da vontade,

conforme se preceituava no cenário clássico principiológico.

Arnaldo Rizzardo comenta a influência do consensualismo para um contrato:

Desde o surgimento, passado pelo Direito Romano e pelas várias correntes filosóficas e jurídicas da história, o princípio da autonomia da vontade sempre foi consagrado. Por isso, é o contrato considerado como acordo de vontade livres e soberanas, insuscetível de modificações trazidas por qualquer outra força que não derive das partes envolvidas. Induziu a tão alto grau a liberdade de pactuar, que afastou quase completamente a interferência estatal. Assim, pontificou na doutrina de J. J. Rousseau, na qual prepondera a vontade geral, e não a individual, com o menor envolvimento possível do Estado, formada pelo livre consentimento das vontades individuais, vindo a construir o contrato social. (RIZZARDO, 2010, p. 19)

Não obstante o comentário de Rizzardo (2010) seja interessante para se

entender o consensualismo, não é distante salientar que este princípio só tem

pertinência para esta dissertação se interpretado como um princípio relevante para o

entendimento das destinações das propriedades privadas.

É possível apreender a relevância do consensualismo, como crucial para a

própria transferência de uma propriedade, pois sem respeito às vontades dos

sujeitos, em um sentido equilibrado e que seja capaz de atender o afã destes,

ilegítima será a transferência de propriedade.

O consensualismo se apresenta como uma autêntica premissa-maior que diz

respeito aos sujeitos contratuais. Ora, existe um objetivo por parte de um dado

41

sujeito no contrato. Objetivo que pode ser tratado na Teoria Geral dos Contratos,

como negociação preliminar.

Nesse mesmo sentido, quando se está diante de um contrato notadamente

bilateral ou plurilateral, por exemplo, nos quais respectivamente existem vontades

norteadas em sentidos opostos ou simétricos, o que se repara é que

preliminarmente as partes demonstram vontades, premissas-menores.

Proposições essas, que quando se instaura a convenção, atinge-se a

premissa-maior, a decisão final no sentido de solidificar o consensualismo. E via

reflexa, a vontade estará harmonizada e instrumentalizada nas cláusulas contratuais.

Isto é, as duas vontades se apresentam em um determinado sentido, todavia, este

sentido se exterioriza com a vontade do outro sujeito. Nesse viés, o choque e a

busca pela harmonia entre as duas vontades transmitem o consensualismo.

De fato o consensualismo é posicionado, por alguns autores, como um

princípio distinto do princípio da autonomia da vontade. Hipótese que não é negada

neste trabalho. Todavia, vislumbra-se uma relação tão intensamente complementar.

Reputa-se uma contiguidade tão profunda, que a análise do consensualismo se

operou no mesmo capítulo dedicado à autonomia da vontade.

Esse capítulo objetivou transmitir aos estudiosos do direito, que de fato

repensar a autonomia da vontade é necessário. Em decorrência do fato de que será

a sua mitigação que contribuirá para construir a nova principiologia.

E é a análise sobre esses elementos que dá guarida à nova hermenêutica do

Direito Civil. Ora, a função social é contributiva para a migração da autonomia da

vontade para a autonomia privada.

4.2 Moderna Principiologia 4.2.1 Estado liberal

O cartesianismo não se coaduna com os limites paradigmáticos

historicamente presentes no cenário jurídico brasileiro. Por isso, é árduo localizar a

época precisa capaz de ter gerado a migração do cenário clássico principiológico

para a nova principiologia.

Todavia, há um conjunto de fatores que foi relevante para atingir a nova

principiologia. Um marco temporal relevante diz respeito ao liberalismo, em razão do

42

“laissez- faire”. Fenômeno que tem como significado precisamente a atuação mínima

estatal. Vale afirmar, o Estado não é intervencionista, ao contrário, ele permite que

os indivíduos livremente atuem, notoriamente em relação ao âmbito econômico.

O Estado liberal converge com o liberalismo. E é perceptível que essa

conduta estatal se disseminou por diversos países, notadamente europeus.

A política é de permitir que os indivíduos atuem, acreditando-se em uma

regulação da economia, com forte influência ideológica da Revolução Francesa. O

óbice gerado diz respeito às características individualistas do homem, que com

tamanha liberdade, terminam deixando de lado o compromisso social que deveria

ser ínsito a qualquer ser vivo. Cria-se, por conseqüência, um cenário de exacerbado

encorajamento à iniciativa privada.

Kildare Gonçalves Carvalho (2007), invocando Alberto Venâncio Filho, fortifica

a idéia sobre a história e os basilares pressupostos do Estado liberal, além de

enaltecer a importância do maior porta-voz do liberalismo econômico, qual seja,

Smith:

A concepção liberal de Estado ( ou de Estado Liberal) predominou no século XIX e projetou-se para o século XX, sendo seu ideário acolhido pelas Constituições européias que vigoravam, com repercussões no incipiente constitucionalismo do continente americano. A propósito, Alberto Venâncio Filho leciona que a ideologia liberal foi produto da dupla influência do individualismo político-filosófico do século XVIII tomado pelas idéias vitoriosas da Revolução Francesa, sendo objetivo maior proteção dos direitos individuais contra abusos de autoridade e do liberalismo econômico- na linha das idéias defendidas por Adam Smith e fisiocratas- no sentido de que a intervenção estatal não deveria falsear o jogo das leis econômicas (CARVALHO, p.12, 2007)

Inequívoco é o abismo e o dualismo que se cria entre os indivíduos e o

Estado. Há um paradoxo entre a atuação do Estado e a liberdade individual.

Há uma oposição entre o Estado e o indivíduo, vale afirmar, o Estado não

interviria na órbita privatista das pessoas e se portaria de forma a residualmente

fiscalizar.

Janice Silveira Borges (2009) enaltece o individualismo, patrimonialismo e

distanciamento estatal, que caracterizavam o Estado liberal, bem como caracterizam

a instigação à concentração de capital, e suas conseqüências sociais. Estado esse

que tem plena ligação ao princípio da autonomia da vontade. Segundo a professora:

43

O paradigma de Estado Liberal caracterizou-se por sua visão essencialmente individualista do ser humano, o que fez com que houvesse a prevalência do princípio da autonomia da vontade, na esfera privada, e uma forte influência patrimonialista, sobretudo, na propriedade dos meios e bens de produção. O posicionamento omisso do Estado, de certo modo, favoreceu a construção dos grandes capitais, por parte dos que detinham os meios de produção. Essa situação acabou por ampliaras desigualdades sociais, que foram severamente agravadas após a Revolução Industrial. (BORGES, 2009, p.92)

A idéia exposta no último parágrafo pode ser vista nas palavras de André

Ruger e Renata de Lima Rodrigues (2007):

O Estado liberal se fundava em uma ordem de coisa em que o `status´dos cidadãos era determinado segundo um sistema de direitos negativos opostos frente ao Estado e a outros cidadãos, e que possibilitaram a realização de interesses individuais a salvo de intervenções estatais. O modelo liberal partia da concepção de que todos os sujeitos individualmente considerados deveriam ter ampla liberdade para a realização de seus interesses e inclinações. A idéia de que o Estado pudesse condicionar o âmbito de atuação das consciências individuais era tida como contraproducente, pois limitava o progresso e o desenvolvimento humano e social (RODRIGUES; RUEGER, 2007, p.18)

A idéia de baixa intervenção estatal pode também ser apreendida em

Perlingieri:

“a liberdade de regular por si as próprias ações ou, mais precisamente, de permitir a

todos os indivíduos envolvidos em um comportamento comum determinar as regras

daquele comportamento através de um entendimento comum.” (PERLINGIERI,

2002, p. 17).

Norberto Bobbio (1994) na tentativa de precisar a expressão “liberalismo”

acrescenta ainda a expressão “liberismo”. O significado pode ser de liberdade em

um sentido estritamente econômico, sem trazer de forma imediata a preocupação

com liberdades atreladas a aspectos diversos à economia.

Em remate, pode-se dizer que o contexto do Estado Liberal é concernente à

autonomia da vontade e contraditório a função social da propriedade. Assim, o

Estado necessitou evoluir sob a égide humanista, e aí então, inserir em seu seio

uma onda social mais avantajada.

44

4.2.2 Mitigações do Liberalismo

4.2.2.1 Estado Social

Nessa análise, após o Estado liberal, entra em cena o Estado social, no final

do século XIX e início do século XX, com outra vertente, com outro comportamento

estatal. Dessa vez o Estado se porta de uma forma mais intervencionista, entretanto,

primando pelo cumprimento de direitos típicos sociais.

Para o ingresso efetivo na nova principiologia era necessária a promoção de

certa ruptura com os clássicos princípios, que abalizavam sim um autêntico Estado

liberal.

A compreensão dos fenômenos políticos, sociais e do comportamento estatal

típicos do Estado liberal e social se mostram importantes para identificar o panorama

principiológico vigente.

Ora, saliente-se, a nova principiologia precisa flexibilizar o liberalismo. Pois a

proteção à autonomia da vontade, o prestígio extremado à liberdade, e a

conseqüente negação de intervenções estatais, geram a proteção a interesses

individuais, egocêntricos, e não coletivos, como é desejável em um discurso que

verse sobre função social.

O Estado social é importante para se reconhecer que o Estado liberal foi

irracionalmente fomentador de um capitalismo desenfreado, e que termina por

demonstrar a necessidade de certa intervenção estatal. Posto que a idéia liberal

legitima aos indivíduos a possibilidade de livre atuação ilimitada e independente de

prejuízos de ordem social, o que é nefasto para a visão pretendida de função social.

Paulo Bonavides (2008) na obra “Do Estado liberal ao Estado social” define

uma série de facetas do Estado social, entre os quais, exemplificadamente, o Estado

social sob o formato marxista. No entanto, aqui se concebe que o Estado Social sob

o escopo existencial da busca por Direitos Sociais, traz contenções ao furor

privatista.

Para se atingir um racional posicionamento acerca de função social há que se

identificar a importância cognitiva das benesses teóricas oriundas do Estado Social,

nos termos que agora foram trabalhados.

45

Na nova principiologia, destaque para a flexibilização do liberalismo, egoísmo

e individualismo. E via de consequência, para a perda de força da autonomia da

vontade, da mitigação racional da proteção aos interesses estritamente privados.

O que instaura precioso espaço para a função social, que efetivamente é a

condição fundamental, o pressuposto inafastável, para movimentar toda a clássica

principiologia e modificá-la drasticamente. Daí o papel de destaque da função social

na construção dogmática e axiológica do Direito Civil.

Com essa aludida visão, ingressa no cenário do direito brasileiro,

precisamente a ordem principiológica contratual mais pertinente.

Ademais, a função social não tinha profundo cabimento em um Estado Liberal

e sim em um Estado Social e Democrático de Direito. Paradigmas esses, mais

preocupados com os direitos sociais e, reflexamente, com a coletividade.

Conforme se enfatizou, a propriedade privada tem a perda de seu impacto e

em contrapartida se instaura um consistente espaço para a função social.

O Estado Social valora os direitos sociais, coletivos. Notadamente,a

educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a

previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos

desamparados esses que estão previstos no artigo 6º da Constituição da Republica

Federativa do Brasil (BRASIL, 2008).

Paulo Luiz Netto Lobo (2003) ao falar da constitucionalização do Direito Civil,

isto é, ao explanar acerca da força constitucional sobre a ordem civil, destaca as

principais balizas do Estado Social:

O Estado Social caracteriza-se exatamente por controlar e intervir em setores da vida privada, antes interditados à ação pública pelas constituições liberais. No Estado Social, portanto, não é o grau de intervenção legislativa, ou de controle do espaço privado, que gera a natureza de direito público.(LOBO, p. 200, 2003)

Em complementação, Lobo (2003) menciona que em um Estado Social,

diferentemente do Estado Liberal, o interesse público não se confundirá com

interesse social, em razão da aproximação entre interesses públicos e privados.

Por esse discurso de Lobo (2003), tem-se uma elementar característica, que

transmite a exata harmonia entre complementariedade entre a função social e as

restrições ambientais. Ora, ambas toleram e incentivam a harmônica e salutar

46

intervenção no âmbito privado para a construção de propósitos mais solidários

perante a sociedade.

O “pecado” do Estado liberal consiste no fato de que seus holofotes não estão

voltados à participação popular, ao sufrágio universal, voto direto, e outras marcas

da democracia.

Note-se que esses direitos têm como fim legislativo a proteção à coletividade,

com importante caráter de solidariedade. Idéia preciosa à função social.

4.2.2.2 Estado Democrático de Direito

O Estado Democrático de Direito, embora tenha similitudes em relação ao

Estado Social, é possível se verificar distinções, ainda que de modo introdutório.

O Estado Democrático de Direito prestigia os direitos sociais, individuais,

coletivos e outros tantos fundamentalmente constitucionais e mesmo formalmente

Constitucionais. Este Estado se orienta pela agregação de distintas variáveis

ideológicas, pela perseguição de um Estado mais igualitário e capaz de flexibilizar os

interesses egoístas. Assim como pela busca de uma perseguição à democracia, e

de uma valorização da vontade da população.

Kildare Gonçalves disserta sobre as bases do Estado Democrático de Direito:

As bases do Estado Democrático são a soberania do povo, expressa na manifestação da vontade popular, e a dignidade humana, consagrada na enunciação dos direitos fundamentais. Em razão desse segundo pilar, evidencia-se uma ampliação do conceito de democracia a qual terá que realizar-se não apenas no plano político, mas também nas dimensões econômica, social e cultural (...)( CARVALHO, p. 650, 2008 )

O papel social e o solidarismo também são ilustres marcas ditas por Kildare

Gonçalves de Carvalho:

Na perspectiva social, exige-se justiça social, sendo esta não apenas a justiça distributiva que estabelece que cada um deve receber de acordo com os seus méritos ou capacidades, mas também aquela que proclama que deve ser dada a cada um segundo as susas necessidades, ou seja, as necessidades humanas primordiais devem ser atendidas. Finalmente, no plano cultural, exige-se que a todos seja assegurada a educação(....)( CARVALHO, p.650, 2008)

47

Neste horizonte, a participação do povo e a aproximação de um pluralismo,

são marcas perceptíveis deste Estado.

A solidariedade tem vital importância para o Direito, uma vez que a sua carga

ética, e seu desejo de respeitabilidade à dignidade são marcantes. O ingresso deste

elemento no Direito é salutar para a construção de uma função social. Segundo

Osvaldo Rocha Torres (2009), a solidariedade, em um contexto previdenciário,

assim pode ser interpretada:

Esta pode ser definida como sendo um conjunto integrado de ações de ações de iniciativa do Poder Público e da sociedade, com vistas a assegurar aos indivíduos e suas famílias, a tão preocupada segurança jurídica. Deve, por conseguinte, grantir ao indivíduo meios básicos de sobrevivência, não só para o presenta como também para o futuro. (TORRES, 2009, p. 396)

Kildare Gonçalves (2008), fazendo menção ao autor Glauco Barreira

Magalhães, teoriza acerca da marca do Estado Democrático de Direito, que é a

busca incessante pela promoção da dignidade da pessoa humana, e pela busca

incessante do processo de humanização:

O Estado Democrático de Direito é aquele que se estrutura através de uma democracia representativa, participativa e pluralista, bem como o que garante a realização prática dos direitos fundamentais, inclusive sociais, através de instrumentos apropriados, conferidos aos cidadãos, sempre tendo em vista a dignidade humana. (CARVALHO, p. 2008, p.650)

O Estado Democrático de Direito, conforme se vê, prima por dar guarida ao

povo, por não ignorar os seus clamores. E, aliás, trata-se de um Estado que até

mesmo tem como primevo, o respeito às manifestações da população. Essas são

marcas de uma solidariedade tão perseguida e que auxiliam na formação do

conteúdo da função social.

Ora, a sociedade em geral mudou bastante. Além dos fenômenos que já

foram citados, tem-se a globalização, a mundialização da economia, a desenfreada

tecnologia, a mecanização da mão-de-obra, a industrialização, a cibernética, os

transgênicos. E assim, as leis que vão ao encontro dessa nova realidade, como o

Código de Defesa do Consumidor (8.078/90, a Lei de Biosseguranca(11.105) e

outras tantas.

Essa realidade, exposta no ultimo parágrafo, é melhor vista em períodos

mais atuais, mas, que se amoldam destacadamente ao Estado Democrático de

Direito.

48

Essa postura é um pouco mais intervencionista e é capaz de por em xeque a

propriedade privada. E foi essa modalidade de Estado necessária para mitigar o

Estado Liberal e valorar a função social.

4.2.3 Princípio da dignidade humana

O princípio da dignidade da pessoa humana tem profundo relevo no

cenário jurídico brasileiro, bem como no direito comparado.

Trata-se de um princípio capaz de fortificar a humanização do direito. E é

capaz de conter a relevância extremada atribuída à propriedade, ao patrimônio.

Conforme se percebe no capítulo que versa sobre a propriedade privada, dessa

dissertação.

Segundo Carlos Alberto Bittar (1994), a personalidade, composta pela

dignidade, são muito importantes na ciência do direito, e cristalizam a ordem jurídica.

Para Maria Celina Bodin de Moraes, inspirada em Chauí:

o valor da dignidade alcança todos os setores da ordem jurídica(...) o substrato material da dignidade desse modo entendida pode ser desdobrado em quatro postulados: i) sujeito moral (ético) reconhece a existência dos outros como sujeitos iguais a ele; ii) merecedores do mesmo respeito à integridade psicofísica de que é titular; iii) é dotado de vontade livre, de autodeterminação; iv) é parte do grupo social, em relação ao qual tem a garantia de não vir a ser marginalizado. (MORAES, 2006, p.17)

É perceptível que as sociedades que atribuem exagerada importância ao

patrimônio, terminam por minorar a importância destinada à dignidade da pessoa

humana.

A dignidade da pessoa humana é fundamental no ordenamento jurídico

brasileiro. Consiste em um bem jurídico central, que adquiriu estado de princípio.

A centralidade da dignidade da pessoa humana pode ser percebida no artigo

1º, inciso III da Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 2008).

Segundo o suporte fático invocado, este elemento é considerado um princípio

fundamental da República Federativa do Brasil.

A dignidade é considerada central, assim como os demais pilares que estão

contemplados em semelhante preceito constitucional. Quais sejam, a soberania, a

cidadania, os valores sociais do trabalho, a livre iniciativa e o pluralismo político.

49

José Afonso da Silva (2006) é contributivo ao comentar a importância e o

posicionamento da dignidade no direito constitucional. Esta tem estado de cláusula

pétrea, representa um direito fundamental, um dispositivo materialmente

constitucional.

Essa repercussão transmite que não será possível revogar parcialmente ou

totalmente este dispositivo do ordenamento constitucional. Vale afirmar, quaisquer

tentativas legislativas que tenham como fim retirar do ordenamento o elemento em

questão, serão marcadas pela ilegitimidade.

Em razão dos comentários feitos no último parágrafo, resta concluir que a

dignidade da pessoa humana tem especial blindagem. Percebida precisamente no

artigo 60, parágrafo quarto da Constituição Federal (BRASIL, 2008).

Ainda sob o aspecto constitucional importa analisar, segundo Janice Silveira

Borges (2009), que a dignidade, tem tipicamente um condão constitucional. E a

pessoa, por outro lado, com uma conotação infraconstitucional. A professora

acredita que:

A dignidade, como norma constitucional, pode ser aplicada em qualquer subárea do Direito, porém seu uso está condicionado à análise da preexistência ou não, no ordenamento, de outros princípios que melhor possam ser aplicados ao caso concreto (....)(BORGES, 2009, p.95)

A função social em razão de seu especial posicionamento axiológico e

dogmático pressupõe a dignidade da pessoa humana. Em outras palavras,

impossível será um ordenamento jurídico primar pela dignidade da pessoa humana

sem tutelar a função social.

Se houver a tutela da função social, necessariamente haverá a tutela da

dignidade da pessoa humana. Argumenta-se desse modo, pois a função social

persegue a defesa de uma coletividade, composta por homens. Aliás, o homem tem

como conteúdo existencial e fundamental a dignidade da pessoa humana.

Por essas razões, a função social e a dignidade da pessoa humana têm

relação “umbilical”. E em meio a um sistema, ambas passam por um plano de

justificação necessário em qualquer discurso de humanificação.

A dignidade da pessoa humana é deveras contributiva na tentativa de

precisão morfológica e hermenêutica da função social. Por essa razão, violar a

função social é violar a dignidade da pessoa humana.

50

A par da forte inserção da dignidade da pessoa humana no direito brasileiro,

tem-se a convergência ao cenário pós-moderno, segundo Francisco Amaral (2003).

A função social da propriedade e a dignidade da pessoa humana são

essenciais para a construção de um Estado Democrático de Direito. A ausência

desses elementos representaria flagrante retrocesso no discurso humanificador do

Direito, em uma visão norteada por Francisco Amaral (2003).

A partir da proteção humana se justifica toda uma ordem constitucional e

infraconstitucional. A fundamentação para esta afirmação pode ser extraída das

palavras de Luiz da Cunha Gonçalves (1955), quando este comenta que unicamente

o homem é suscetível de ter direitos, bem como obrigações no Direito.

A dignidade da pessoa humana é a demonstração inequívoca de

humanização do Direito. Não há como negar que a vertente patrimonialista termina

colidindo com a vertente humanizadora.

Segundo Janice Silveira Borges (2009), a dignidade tem distintos parâmetros

em seu conteúdo. Um dos quais diz respeito à respeitabilidade plena do Direito à

vida. E o segundo parâmetro tem repercussão sob a órbita da atuação estatal, isto é,

o Estado deve ser um protagonista no processo de perseguição à promoção da

dignidade da pessoa humana.

Sobre o mesmo direito, é perceptível que a dignidade é escopo da existência

humana. E é um direito que deve ser transmitido para toda a coletividade. Sobre

essa questão, Janice Silveira Borges (2009) traz que existem teóricos que abordam

sobre o conteúdo mínimo da dignidade da pessoa humana, no tocante a direitos

como a liberdade, e até mesmo a integridade.

A extração da idéia mostrada no último parágrafo pode ser claramente

identificada, a partir de Gustavo Tepedino (2001), em razão da destacada proteção

da personalidade. Está descrita no artigo 11 do Código Civil (BRASIL, 2008),

conforme o qual, a personalidade é irrenunciável, inviolável, intransmissível, entre

outros caracteres descritos nesse suporte, e outros tantos que decorrem dos que ora

estão sendo capitulados.

Além disso, a personalidade consiste, segundo Tepedino (2001), na

integridade física e integridade intelectual. E em razão de uma conotação monista

inerente a este bem jurídico, termina por obter a sua conceituação, especificamente

no já citado artigo 1º, inciso III da Constituição Federal (BRASIL, 2008). Esta teoria

predomina, por se perceber que o elemento em foco não é minuciosamente

51

discriminado pelo legislador infraconstitucional. O que existe é uma busca protetiva

que encontra seu conteúdo constitucionalmente.

A partir da indissociável ligação entre a personalidade e propriamente a

dignidade da pessoa humana, importa para conceituar este princípio invocar a

concepção de personalidade de Pablo Stolze Gagliano (2004). Conforme o qual a

personalidade consiste em uma aptidão de cunho genérico, por intermédio da qual

serão destinados direitos e também serão exigidas obrigações dos indivíduos.

Em prosseguimento ao mesmo raciocínio de interligação entre personalidade

e dignidade, impende proferir que os atributos da personalidade são aplicáveis à

dignidade. Segundo Maria Helena Diniz (2004), os direitos da personalidade são

“absolutos, intransmissíveis, irrenunciáveis, ilimitados, imprescritíveis, impenhoráveis

e inexpropriáveis.” (DINIZ, 2004, p.129)

A idéia de personalidade, segundo Caio Mário da Silva Pereira (1987), está

intimamente ligada à da pessoa, por expressa aptidão genérica para adquirir direitos

e contrair obrigações. “Esta aptidão é hoje reconhecida a todo ser humano, o que

expressa uma conquista da civilização jurídica.” (PEREIRA, 1987, p.153)

João Franzen Lima (1977), refletindo sobre a pessoa humana dotada de

dignidade, afirma que a pessoa, encarada como um sujeito de direitos, representa o

primeiro elemento que deve ser analisado em um ordenamento. Uma vez que será a

partir da pessoa humana que atividade jurídica se perfará, e será a partir de seu

reconhecimento que o convívio social se pautará.

Janice Silveira Borges (2009) pondera acerca da pessoa humana, cujo

conceito foi destacadamente elaborado pela Escola de Jurisprudência dos

Conceitos, no Século XVIII. Segundo a autora, ao abordar a dignidade da pessoa

humana, há que ser observada a sua ligação com a vida. Nesse argumento, é

perceptível que o Direito deve se mirar na promoção da dignidade.

Acrescenta ainda:

Dessa forma, ainda há o condicionamento de existência de uma vida para atribuição de dignidade de um ente humano; no entanto, requer, defende-se e promove-se a vida digna, a qualidade do desenvolver da existênica do ser humana, a intangibilidade da vida indigna. (BORGES, 2009, p.90)

Acerca da pessoa humana, é mister explanar que Perlingieri (2007) a

posiciona como um núcleo central, como o centro na construção do ordenamento

jurídico.

52

Percebe-se que proteger a dignidade da pessoa humana é proteger o ser

humano em grau máximo, abarcando dimensões existenciais substanciais.

Muito embora a teoria do Direito analise o primevo posicionamento da

dignidade da pessoa humana no Direito brasileiro, reputa-se que o meio ambiente

também pressupõe a dignidade da pessoa humana. Por esse motivo, a excessiva

proteção do constituinte em relação ao meio ambiente, terminou por, reflexamente,

proteger a dignidade da pessoa humana, o que gera o desejável efeito teórico

protetivo ao ser humano.

A tutela da dignidade da pessoa humana, com todas as implicações que

foram abordadas, representa um profundo momento da história do Direito Privado.

4.2.4 Princípio da função social da propriedade

O princípio da função social é objeto desta dissertação. Motivo pelo qual a

sua abordagem mais detida foi feita em capítulo à parte.

Diante disso, destacadamente se insere a função social no arcabouço

principiológico moderno, todavia, repita-se, será abordado em outra parte da

dissertação, por se tratar de um tema central desta.

4.2.5 Princípio da autonomia privada

O princípio da autonomia privada termina por ser estruturador e contributivo

para a construção da função social, diferentemente da flexibilizada autonomia da

vontade.

É possível salientar que a autonomia privada é um reflexo da intervenção da

função social, ao se mitigar a força da autonomia da vontade. E também por aquela

atingir um elemento tão impactante, inclusive na gênese do Direito Civil, qual seja, a

propriedade privada.

Washington de Barros Monteiro (1982) afirma que, desde a época em que

vigia o Código Civil de 1916 (BRASIL, 1916), o princípio da autonomia da vontade

53

efetivamente sofre mitigações. Essas mitigações decorrem da supremacia da ordem

pública. Nessa visão, o interesse coletivo intervém na autonomia da vontade.

Monteiro (1982) conclui que as mitigações e as restrições estatais e de outras

naturezas transmitem que o princípio da autonomia da vontade de modo algum é

absoluto. Por isso essa autonomia se mostra abalada, o que dá ensejo ao ingresso

no cenário do Direito Privado do princípio da autonomia privada.

Maria Helena Diniz (1995), em consonância com o pensamento de Monteiro

de Barros (1982), ao analisar o ingresso da autonomia privada em detrimento da

autonomia da vontade, esclarece que a autonomia da vontade não é ilimitada. E seu

limite se encontra na própria supremacia da ordem pública. Então, a autonomia da

vontade é limitada e “subordinada ao interesse coletivo” (DINIZ, 1995, p.28).

Denis Franco Silva (2006) amparado em Schneewind, afirma que:

a origem clássica de autonomia privada deriva da noção kantiana de autonomia moral, no cerne da qual se encontra a afirmativa de que a moralidade, em si, se centra em uma lei que os ser que os seres humanos impõem a si próprios, necessariamente se proporcionando, ao fazê-lo, motivos para obedecê-la, afastando-se concepções deterministas de caráter natural ou teológico.(SILVA, 2006, p. 135)

Eduardo Sens dos Santos (2004) acredita que o ponto de partida para se

prosperar a idéia de autonomia privada é o bem-estar social. Em razão de suas

intensas preocupações sociais.

A autonomia privada tem uma série de corolários. Para César Fiúza (2006)

são os que se seguem:

princípio da liberdade de contratar, princípio da liberdade contratual, princípio da

relatividade contratual, princípio do consesualismo, princípio da auto

responsabilidade, princípio da imutabilidade ou intangibilidade, princípio da

irretratabilidade. E por fim, o princípio da obrigatoriedade.

A liberdade tem duas facetas destacáveis. A primeira das quais é a liberdade

de contratar, que se apresenta como a autonomia destinada às pessoas no sentido

de selecionar precisamente as pessoas com as quais serão firmados contratos, sem

qualquer ingerência externa, via de regra.

E a outra consiste na liberdade contratual, que legitima os sujeitos contratuais

a equilibradamente avençarem as cláusulas, as especificidades, que pairarão sobre

os negócios jurídicos firmados.

54

Quando se fala em vontade livre, é inelutável emergir o princípio da

autonomia privada. Que de fato prima pela liberdade inerente aos sujeitos

contratuais.

Ao se clamar por liberdade, clama-se pela manifestação livre, desimpedida e

desprovida de vícios por parte de dada pessoa. Tudo isso no sentido de transmitir

num negócio jurídico determinadas vontades das partes.

Liberdade que tem limites nos termos pensados no capítulo anterior.

Notadamente limites dogmáticos, axiológicos, morais, entre outros.

A liberdade não pode agredir preceitos e princípios constitucionais e

infraconstitucionais. A liberdade deve estar em consonância à cidadania, dignidade,

função social e jamais poderá agredir o Estado Democrático de Direito.

Conforme já se depurou, agredir a autonomia privada é dar ensejo a um vício

de cunho social, do consentimento ou outro fenômeno merecedor de elisão.

Segundo Leonardo Macedo Poli, citando Habermas:

“A autonomia privada só pode ser entendida como elemento de um processo

progressivo de efetivação das garantias constitucionais. Consequentemente, o

exercício do direito subjetivo não pode se desvirtuar dessa finalidade.” (POLI, p.82,

2008)

A autonomia privada não pode ignorar a sua faceta ética e solidária, até

mesmo no que tangencia o seu papel de não permitir a concentração econômica.

Esse discurso é feito por Eduardo Sens dos Santos

“A autonomia privada consiste na liberdade de as pessoas regularem através de

contrato, ou mesmo de negócios jurídicos unilaterais, quando possível, os seus

interesses, em especial à produção, e à distribuição de bens e serviços.” (DOS

SANTOS, p.50)

A autonomia privada passa a apresentar forte elo com a função social. Posto

que o Estado agora, em uma atuação social, perdura em defesa da proteção às

vontades. Mas, protege as vontades, desde que não haja agressão a sociedade. Isto

é, os comportamentos devem prestigiar a coletividade. Nessa nova autonomia,

Perlingieri defende que esta é dirigida:

“à realização de interesses e de funções que merecem tutela e que são socialmente

úteis. Sendo que somente ocorre a utilidade social se ela estiver em conformidade

com a segurança, a liberdade e a dignidade humana.” (PERLINGIERI, 2002, p. 19).

55

Ana Prata (1982) destaca a influência de forças políticas, sociais e éticas, na

justificação de uma autonomia privada:

A autonomia privada revela-se, portanto, como produto e como instrumento de um processo político e econômico baseado na liberdade e na igualdade formal, com positivação jurídica nos direitos subjetivos de propriedade e de liberdade de iniciativa econômica (....) (PRATA, p. 338, 1982)

A autonomia privada tem implicação social, tem preocupação com a

sociedade, pois apresentou nova roupagem, e seu impacto à função social se

ampliou conforme a perda da força do estado liberal.

A autonomia privada interessantemente é estruturante em relação à função

social, em razão de sua própria sucumbência à autonomia da vontade. Nesse

universo, tem-se que a autonomia privada transmite marcante preocupação social.

Autonomia que é auxiliar no processo de consagração e efetivação dos direitos

fundamentais do cidadão.

Esse discurso pode ser apreendido em André Ruger e Renata de Lima

Rodrigues:

A autonomia privada encontra-se relacionada à efetivação desse rol de direitos fundamentais do homem, revelando a essência do Estado democrático, que orienta o exercício dos direitos subjetivos desatrelado de fins egoísticos e individualistas ou de sua aniquilação por meio de uma suposta vontade coletiva, corrigindo os excessos da autonomia da vontade que ocorreram sob a égide do Estado Liberal ou sua mitigação no Estado Social (RUGER; RODRIGUES, p. 18, 2007)

4.2.6 Princípio da boa-fé

Não é errôneo enfatizar que, a despeito da defesa do liberalismo, a boa-fé

poderia até ser preterida, repita-se, por não ser um princípio clássico. Sobre essa

questão, a autonomia da vontade se mostrava intensa, ainda que houvesse

condutas marcadas pela má-fé. Tal tolerância existia se houvesse o benefício ao

mercantilista burguês.

A liberdade poderia ser antagônica à boa-fé. Antagônica nos mais múltiplos

ramos do Direito, entre os quais o Direito do Trabalho. O que pode ser percebido na

subsequente passagem de uma das obras de Orlando Gomes:

56

Expressa vigorosamente o pensamento conseqüente do individualismo jurídico infenso a toda regulamentação legislativa do trabalho. As condições de sua prestação deveriam ser deixadas à vontade dos contratantes. Em nenhum território do direito contratual caberia maior amplitude ao princípio da autônima da vontade. A esse tempo ainda era dogma, entre nós, o preceito da liberdade de contratar no campo do trabalho, tanto assim que Fábio Leal, discutindo o assunto na Comissão Especial, embora considerasse o projeto atrasado, incompleto e inadequado à nova feição da nossa atividade econômica advogasse leis consentâneas com as relações modernas, contudo, declarava-se partidário da mais ampla liberdade individual e adversário da regulamentação do trabalho.(GOMES, p.40, 2003)

Essa passagem da obra de Orlando Gomes (2003) demonstra o propósito

estatal nítido no sentido de consagrar a liberdade econômica, destacadamente no

âmbito do Direito do Trabalho. Liberdade essa, que se contrapõe, grosseiramente,

ao princípio da proteção.

Reputa-se que a boa-fé jamais pode ser sucumbida. Em verdade esta deve

orientar os mais distintos âmbitos da sociedade, para que se perfaçam

comportamentos suficientemente contributivos para uma salutar vida social.

Se a boa-fé não instruir os comportamentos humanos, lamentavelmente

fadada estará a sociedade à anomia.

E a sacralização da boa-fé orientou o legislador brasileiro na construção dos

textos constitucionais e infraconstitucionais, de forma explícita ou implícita.

Traçadas essa linhas gerais, resta ingressar efetivamente nas facetas da boa-

fé. De acordo com Cesar Fiúza:

este princípio tem funções interpretativa, integrativa e de controle. Na função interpretativa, o contrato deve ser interpretado de acordo com o sentido objetivo, salvo, quando o destinatário conheça, a vontade real do reclamante. Na função integrativa, os contratos contem deveres, poderes, direitos e faculdades primários e secundários e na função de controle, o credor no exercício de seu direito, não pode exceder os limites impostos pela boa-fé, sob pena de proceder ilicitamente. A função contratual tem a ver com as limitações da liberdade contratual, da autonomia da vontade em geral e com o abuso de direito. (FIÚZA, 2010, p.44-45)

O princípio da boa-fé objetiva transmitir a preocupação com os

comportamentos que foram exteriorizados no mundo jurídico.

A preocupação não está atrelada precipuamente ao que se passa na mente

do agente, e sim ao que aconteceu visivelmente. E será por meio desta visibilidade

que todos os raciocínios acerca da mensuração da boa-fé serão realizados.

A boa-fé objetiva tem a consciência de que a intenção não pode ser

precisamente alcançada. Motivo pelo qual a missão dos atores do Direito será no

57

sentido de identificar se os elementos inerentes a esta faceta da boa-fé se fazem

presentes.

A boa-fé objetiva traz diversas implicações. Implicações que passam a ser

analisadas.

César Fiúza, Gustavo Ribeiro e Renata Barbosa assim fundamentam a boa-fé

objetiva:

“A boa-fé objetiva designa padrão de conduta que deve ser observada pelos

contratantes independentemente de adesão voluntária, caracterizado por

parâmetros socialmente reconhecíveis de lealdade e de cooperação.” (FIÚZA;

RIBEIRO; ALMEIDA, 2009, p. 331)

Para César Fiúza e Lucas Brito a boa-fé objetiva:

baseia-se em fatos de ordem objetiva. Baseia-se em condutas das partes, que devem agir com correção e honestidade, correspondendo à confiança reciprocamente depositada. As partes devem ter motivos objetivos confiar uma na outra. (FIÚZA; BRITO, 2009, p. 368)

A primeira espécie a ser analisada é a boa-fé objetiva integrativa. Esta que

exige que os comportamentos respeitem os deveres de lealdade, cooperação e

transparência.

Quando o Direito Civil transmite a idéia de equilíbrio contratual tanto originário

quanto derivado, o princípio prestigiado é a boa-fé objetiva integrativa.

Quanto aos equilíbrios citados, constata-se que desde a formação contratual,

com as negociações preliminares, bem como na fase proposta e da celebração do

contrato, já deve haver a condução ao equilíbrio entre os sujeitos contratuais.

Evidentemente é mister salvaguardar exceções, como os contratos aleatórios.

A boa-fé objetiva também pode ter uma conotação interpretativa. Vale

afirmar, as interpretações dos atores do Direito devem ser feitas de forma a

perseguir a boa-fé.

O Direito tem distintas formas de ser interpretado e distintas fontes. Todavia,

as interpretações devem caminhar no sentido de prestigiar as ações humanas, em

estrita obediência aos padrões da boa-fé.

A boa-fé objetiva ainda pode ter um aspecto limitativo. Limitação que

demonstra que fenômenos podem acontecer em busca da boa-fé, em busca do

equilíbrio. Um bom exemplo de intervenção é o dirigismo estatal, em que o Estado

58

se manifesta no sentido de prestigiar a boa-fé, caso naturalmente o perseguido

equilíbrio não tenha sido deflagrado.

A outra faceta da boa-fé é a de natureza subjetiva. Esta que se preocupa em

analisar se os já invocados elementos da lealdade, transparência e cooperação de

fato gravitaram na mente dos agentes contratuais durante o pacto que os une.

Na concepção de César Fiúza e Lucas Brito a boa-fé subjetiva assim pode ser

esclarecida:

A boa-fé subjetiva consiste em crenças internas, conhecimentos e desconhecimentos, convicções internas. Consiste, basicamente, no desconhecimento de situação adversa. Quem compra de quem não é dono, sem saber, age de boa-fé, no sentido subjetivo. (FIÚZA; BRITO, 2009, p.368)

Em outras palavras, a boa-fé subjetiva transmite a complexa idéia de atingir, a

grosso modo, a mente humana. Consiste em compreender as particularidades dos

sujeitos contratuais.

Tanto a boa-fé objetiva quanto a subjetiva são relevantes para a construção

da função social da propriedade. Uma vez que a sociedade clama por

comportamentos leais, transparentes e idôneos. Ora, se esses deveres éticos são

violados, em busca de uma atuação individual, está-se diante de uma violação à

boa-fé, e também diante de uma agressão à própria função social.

4.2.7 Princípio da transparência

Por intermédio da observância das particularidades contratuais, possível será

identificar se houve ou não o desígnio por parte dos sujeitos contratuais no sentido

de respeitar ou não a boa-fé.

Outra conotação do princípio da boa-fé é o princípio da transparência. Esse

que pode ser considerado um subprincípio da boa-fé. E por este subprincípio, as

partes devem ser explicitas, diligentes e probas no sentido de informar aos sujeitos

obrigacionais envolvidos precisamente todos os elementos relevantes mediatos e

imediatos contemplados ao contrato. Desse modo, viabilizada será a salutar

execução do contrato.

59

Segundo Venosa, o subprincípio da transparência:

“se estampa pelo dever das partes de agir de forma correta, eticamente aceita,

antes, durante, e depois do contrato, isso porque, mesmo após o cumprimento de

um contrato, podem sobrar-lhes efeitos.” (VENOSA, 2009, p. 362)

César Fiúza e Lucas Brito também posicionam a transparência como um

subprincípio da boa-fé, segundo os quais:

“Um subprincípio da boa-fé é o princípio da transparência, segundo o qual as partes

têm o dever de informar uma a outra tudo o que julgarem importante para a boa

execução do contrato.” (FIÚZA; BRITO, 2009, p.369)

Caio Mário da Silva Pereira diz:

O Direito Romano estruturou o contrato, e todos os romanistas a ele se reportam sobre a base de um acordo de vontades a respeito de um mesmo ponto. O confronto com o direito moderno pode não acusar, ao primeiro súbito, maior disparidade. Uma aproximação mais chegada e uma perquirição mais aguda apontam, entretanto, sensível diferença, que vai articular-se na noção mesma do ato, naquele sistema jurídico. Ali, como nas sociedades antigas, a convenção por si só não tem o poder criador de obrigações. (PEREIRA, 2009, p. 8)

Cláudia Lima Marques (2002) define o que seria o princípio da transparência,

no contexto do Direito do Consumidor, mas, tal conceito pode ser abrangido para o

Direito Civil com perfeição. Pois a transparência envolve ética, probidade,

moralidade, honestidade, respeito e sinceridade. Tal princípio tem forte abrangência.

A autora afirma:

A idéia central é possibilitar uma aproximação e uma relação contratual mais sincera e menos danosa entre consumidor e fornecedor. Transparência significa informação clara e correta sobre o produto a ser vendido, sobre o contrato a ser firmado, significa lealdade e respeito nas relações entre fornecedor e consumidor, mesmo na fase pré-contratual, isto é, na fase negocial dos contratos de consumo. (MARQUES, p. 595, 2002)

Foi pensada a transparência como um subprincípio. Desse modo, este é sim

um atributo crucial da boa-fé. Nessa mesma linha, também seria possível posicionar

a lealdade e a cooperação. A verdade é que os três são complementares entre si, e

juntos consagram um forte princípio do Direito Civil.

Impossível é o trabalho eficaz de construção da função social, ignorando a

boa-fé. A função social também carrega consigo forte carga ética, de lealdade, de

solidariedade perante a sociedade. Por isso, a boa-fé merece ser objeto de estudo

para a construção da função social da propriedade.

60

A transparência, portanto, contribui para a boa-fé, porque de forma cogente

estabelece fortes deveres éticos por parte das pessoas interligadas ao contrato.

Repudiando-se, assim, qualquer engodo, qualquer anomalia informacional.

4.3 Dualismo entre a autonomia da vontade e autonom ia privada

A par dos princípios, é pertinente, propedeuticamente, sopesar que os

princípios que ora estão sendo abordados repercutem sob a égide filosófica como

regras. Em outras palavras, trazem a deontologia, o dever ser e a dogmática, posto

que as regras reputadas como válidas obrigam os seus destinatários finais.

Todavia, é deixado para o campo dos valores a axiologia, o subjetivismo, e a

teleologia, conforme analisam Maria de Fátima Freire de Sá e Bruno Torquato

Naves(2009), amparados em Jürgen Habermas. É esta a idéia que se extrai no

tocante ao dualismo entre axiologia e dogmática.

Após a reflexão de ordem propedêutica, é adequado apontar que a teoria do

Direito Civil brasileiro termina divergindo quanto ao posicionamento metodológico

dos princípios.

Ao conceituar princípios no presente trabalho, são extraídos princípios de

ordem patrimonial e com perfeita aplicabilidade ao problema proposto. E de fato

teorizações mais consistentes acerca dos princípios se perfarão no tocante àqueles

que diretamente contribuirão para a resolução da inquietação acadêmica

manifestada nesta dissertação.

Desse modo, os princípios que têm ligação direta com a dissertação

consistem na função social, autonomia da vontade e autonomia privada. Em relação

aos demais, uma breve consideração deve ser feita.

Ligado ao princípio da autonomia da vontade é possível localizar o princípio

do “pacta sunt servanda”. Princípio que é traduzido como a obrigatoriedade de

concretização das cláusulas contratuais, por exemplo. O que intervém, conforme já

se expôs, na própria destinação da propriedade. E é sistematizada sob a expressão

“os pactos devem ser cumpridos”. Em continuidade, reforce-se que o

consensualismo, segundo César Fiúza (2006), dá guarida à manifestação de

vontade das partes. E permite atingir a premissa de que a manifestação de vontade

61

dos sujeitos contratuais efetivamente determinará os efeitos típicos de um contrato.

Como se não bastasse, menciona o autor acerca da autonomia da vontade, que

será falada mais cautelosamente posteriormente.

Por outro lado, no que toca à nova principiologia, é mais adequada a já

argumentada boa-fé objetiva, fracionada em integrativa, limitativa e interpretativa. E

a boa-fé subjetiva, que procurará identificar os elementos de cooperação, lealdade e

transparência no próprio âmago dos indivíduos. Isto é, existe a busca por perquirir a

real intenção, os reais elementos intelectivos e volitivos das partes, saliente-se mais

uma vez.

Como se não bastasse a dignidade da pessoa humana, também ganha peso

em uma visão pós-moderna do Direito Civil, conforme já se afirmou.

Desse modo, é flagrante o peso constitucional em uma visão inelutavelmente

constitucionalizada do Direito Civil. Em que se tem na Constituição da República

Federativa do Brasil (2008), a repercussão pétrea, material e cogente da dignidade

da pessoa humana, codificada precisamente no artigo 1º, inciso III deste diploma. E

que termina por afetar intensamente quaisquer interpretações, em quaisquer

institutos do Direito Civil.

Para Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves (2006) na obra Direito das

obrigações, que a dignidade pessoa humana é simultaneamente valor e princípio,

constituindo elemento decisivo na afirmação de qualquer Estado Democrático de

Direito, repercutindo até mesmo cláusula geral para a confecção dos preceitos que

tutelarão os indivíduos. E repercute também como supremacia axiológica. Mas,

sobretudo tem ligação com a autonomia privada.

Especificamente sobre a autonomia da vontade, nota-se sua gênese está

presente no Código Francês, segundo Sílvio de Salvo Venosa (2007). Que pode ser

explicada como a cristalização da manifestação da liberdade dos indivíduos, para

que por intermédio desta se operem os desígnios dos indivíduos, em busca da

circulação de elementos materiais, como terra, trabalho e capital,

exemplificadamente.

Será em busca da perquirição da real vontade das partes, que serão feitas as

interpretações. Para César Fiúza (2006), trata-se do mais importante princípio, posto

que é ele que faculta às partes plena liberdade para concluir as suas vontades.

Explica-se esse princípio, como a vontade livre. Este princípio tem repercussão

individual, quase que egocêntrica. Nessa autonomia da vontade não há espaço para

62

discursos como a função social. Em verdade não se prestigia a coletividade e sim os

sujeitos contratantes.

Segundo Fiúza (2006), tal autonomia é exercida sob quatro planos. Quais

sejam, contratar ou não contratar. Assim como, com quem e o que contratar. Assim

como estabelecer as cláusulas contratuais em estrita observância às normas.

Mobilizar ou não o poder judiciário para respeitar o contrato.

No sentido de entender as distinções entre os dois princípios do item deste

capítulo, emerge a concepção de Pontes de Miranda (1958). Que também denomina

a autonomia da vontade de “auto regramento da vontade.” (MIRANDA, p. 5, 1958).

Autonomia essa, que produzirá efeitos a partir da exteriorização da vontade dos

indivíduos. O professor já alertava que a autonomia da vontade não pode ser

interpretada isoladamente. Assim, é necessário interpretá-la a partir da proposição

de que a vontade humana é limitada. Posto que se houver a prática de atos, embora

marcados pela autonomia, ilícitos absolutamente ou relativamente, o Direito intervirá.

Acrescenta Pontes de Miranda (1958), comentando a restrição à autonomia

da vontade, que as limitações podem ser inclusive naturais, pois o direito é um

processo social.

Na concepção de Sílvio Rodrigues (2004), a autonomia da vontade consiste

na prerrogativa conferida aos indivíduos. Para tanto é necessária a respeitabilidade

às disposições legais. Por isso, a pessoa capaz apresenta a possibilidade de criar

relações, ante a sua manifestação de liberdade.

Desde já, aponte-se que não será nesse cenário da autonomia da vontade

que surgem as restrições ambientais. Em se tratando de tais limitações, observa-se

a sua justificação se dá a partir de um prestígio à coletividade, trata-se de um

prestígio social. E não um prestígio tão restrito às partes. As restrições se limitam e

se enfraquecem quando se está diante da autonomia privada.

Francisco Amaral (2006), almejando esclarecer sobre autonomia da vontade,

afirma que a vontade psicológica e vontade exteriorizada não coincidem. Pois a

vontade psicológica conhece a vontade como tipo especial de tendência psíquica,

associada à representação consciente de uma finalidade, e de meios considerados

necessários para a realização da aludida finalidade. O que está associado ao campo

do ser. Todavia, o Direito está associado ao dever ser.

O Direito atribui relevância em relação aos direitos subjetivos. Assim, a

possibilidade que uma pessoa tem de agir de acordo com sua vontade, podendo

63

fazer ou deixar de fazer é o próprio conceito de liberdade.E entre as espécies de

liberdade, percebe-se a liberdade natural, social, política, pessoal e jurídica.

Em busca de uma melhor conceituação de autonomia da vontade emerge a

concepção de Miguel Maria de Serpa Lopes (1996). Segundo o qual, o princípio

resume-se ao fato de que toda a obrigação, para produzir seus efeitos deve ter

consentimento livre. E assim toda a obrigação feita livremente, deve ser sancionada

pelo Direito.

Os postulados da autonomia da vontade, segundo Serpa Lopes (1996),

seriam: os indivíduos são livres para contratar, e se a manifestação se der

livremente, haverá o efeito da incorporação ao ordenamento jurídico. Se não for

livre, a manifestação jurídica se dará por nula. O conteúdo do contrato, portanto, é

preenchido pela vontade das partes.

Soma Rodrigues (2004) que a autonomia da vontade sofre restrições

reconhecidas, notadamente limitações normativas. Explicitamente menciona: “o

princípio da autonomia da vontade encontra restrição mais severa nalguns preceitos

legislativos.” (RODRIGUES, 2004, p.20). O que transmite que a mantença da

autonomia da vontade não se mostra mais apropriada para a principiologia corrente.

Para se migrar da autonomia da vontade para autonomia privada é pertinente

dizer:

Dessa maneira, a visão de autonomia precisou ser novamente trabalhada, e como isso, uma nova concepção que primava pela proteção dos interesses coletivos foi sendo delineada. Foram estabelecidos limites à livre atuação dos indivíduos e da sociedade com um todo por meio da idéia de função social. Mais uma vez, a concepção de autonomia aliou-se a uma idéia extremista, recorrendo ao excesso- desta vez não de abstenção, mas, sim, de intervenção- como meio de reequilibrar a premissividade da atuação individual. (SÁ; PONTES, 2009, p.45)

Inelutavelmente ao se mitigar a autonomia da vontade emerge o debate

acerca da “co-dependência entre autonomia pública e privada.” (SÁ; PONTES, 2009,

p.45). Em decorrência da previsibilidade de intervenções públicas perpetradas no

âmbito privado.·.

Entender o dualismo entre a autonomia da vontade e autonomia privada é

necessário para compreender a relação entre interesse público e interesse privado.

Este sobejamente protegido na idéia de autonomia da vontade.

Em relação ao interesse individual, percebe-se a sua consonância com a

autonomia da vontade. Autonomia essa, que representa a ausência de observância

substancial constante dos eventuais prejuízos que são causados a terceiros. Em

64

outros termos, em primeiro plano, há que se primar pela satisfação dos interesses

individuais. Acerca dos interesses individuais, argumenta Bruno Torquato de Oliveira

Naves:

Interesse individual é aquele escopo jurídico, que não se constitui como direito subjetivo, mas é judicialmente garantido. A manutenção da lealdade na concorrência pode constituir interesse de alguma sociedade empresarial específica, sem que haja atribuição de poderes a esta pessoa jurídica.(NAVES, 2009, p. 307)

O interesse individual foi mitigado, e, como consequência, perfez-se a

inserção da autonomia privada. Haja vista o prestígio aos interesses públicos, que

não mais prestigiam estritamente um indivíduo. Em verdade se tem a preocupação

com a coletividade. Sobre esse interesse:

Interesse coletivo é aquele que tem como titular um grupo, categoria ou classe de pessoas. Para que o interesse seja coletivo, devemos observar duas condições: a) impossibilidade de fracionamento entre as pessoas que compõem o grupo, categoria ou classe; e b) reunião destas pessoas em uma mesma relação jurídica, que os une em interesses comuns. (NAVES, 2009, p.307)

Especialmente sobre a autonomia privada, Taísa Maria Macena de Lima

(2004) propaga suas fortes implicações:

O princípio da autonomia privada justifica a resistência do indivíduo à intromissão do Estado no espaço que deve ser só seu(...) assume novas dimensões, como a luta pelo direito à redesignação sexual. o reconhecimento de diferentes modelos de família(...) (LIMA, 2004, p.5)

No mesmo patamar, invoque-se o pensamento de Sílvio de Salvo Venosa,

que auxilia o intérprete na compreensão do dualismo entre autonomia da vontade e

autonomia privada:

Na contemporaneidade, a autonomia da vontade clássica é substituída pela autonomia priva, sob a égide de um interesse social. Nesse sentido, o atual Código aponta para a liberdade de contratar sob o freio da função social. Há, portanto, uma nova ordem jurídica contratual, que se afasta da teoria clássica, tendo em vista mudanças históricas tangíveis. O fenômeno do interesse social na vontade privada negocial não decorre unicamente do intervencionismo do Estado nos interesses privados, como o chamado dirigismo contratual, mas da própria modificação de conceitos históricos em tono da propriedade. No mundo contemporâneo há infindáveis interesses interpessoais que devem ser sopesados, algo nunca imaginado em passado recente, muito além dos princípios do simples contrato de adesão. (VENOSA, 2008, p. 365)

65

Perceba-se que os princípios da função social e socialidade convergem e

abrem margem para a construção e justificação das restrições ambientais.

E será neste cenário, que prestigia a função social, a coletividade, que se tem

o espaço para a migração da clássica autonomia da vontade para a autonomia

privada.

A autonomia privada, segundo César Fiúza (2006), consiste na liberdade de

as pessoas regularem seus interesses, e obviamente em respeito aos parâmetros

legais. Em especial, os contratos fazem parte da autonomia privada, diferentemente

da autonomia da vontade, que vem de dentro para fora, ante o seu caráter volitivo. E

no que toca a autonomia privada, a contratação se dará por necessidades humanas

e não pela manifestação de vontade. Isso pois as necessidades típicas trazidas

pelas sociedade terminam por artificializar a natural manifestação de vontade, que é

contemplada à autonomia da vontade. Fiúza (2006) arrola os subsequentes

subprincípios decorrentes da autonomia privada: Liberdade de contratar, liberdade

contratual, relatividade contratual, consensualismo, auto-responsabilidade,

imutabilidade, intangibilidade, obrigatoriedade.

Para Francisco Amaral (2006) a autonomia privada é o poder que os

particulares têm, mediante a manifestação de sua vontade sobre as relações de que

participam, estabelecendo-lhes o conteúdo e a disciplina jurídica. Não se confunde

com a autonomia da vontade, uma vez que esta tem uma conotação de ordem

subjetiva e psicológica.

No sentido de cotejar a autonomia da vontade e autonomia privada, é

possível explanar:

A autonomia privada, conformada pelo ordenamento jurídico, confere ao sujeito a possibilidade de determinar conteúdo, forma e/ou efeitos do negócio jurídico. Podendo, numa situação concreta, o sujeito determinar somente conteúdo e efeitos, ficando a determinação da forma como função da lei ou esta, prescrevendo forma e efeitos, restando ao sujeito o exercício da autonomia privada no referente ao conteúdo ou outras combinações de conteúdo, forma e efeitos determinados ora pelo ordenamento, ora pelo sujeito de direitos. É claro que essa determinação de conteúdo, forma e efeitos se faz na conformidade de outras normas jurídicas (NAVES, 2007, p.239)

Todavia, a autonomia privada traduz o poder da vontade de forma objetiva,

concreta e real. É a projeção do personalismo ético, da concepção axiológica da

pessoa como o centro da ordem jurídica privada. É classificado também como

princípio aberto, e é princípio informador do sistema jurídico.

66

A autonomia privada parece conduzir até mesmo terminologicamente, para a

idéia de liberdade. Em verdade, em um contexto privatista, a sua análise, em meio

aos demais princípios mais contemporâneos, deve conduzir o intérprete a uma

autonomia flexibilizada pela função social.

67

5. TEORIZAÇÕES ACERCA DO BEM JURÍDICO MEIO AMBIENTE

5.1 Etimologia

Ao se abordar os bens jurídicos, nota-se que Luiz Régis Prado (1997), em

uma análise das ciências criminais, diz que esses são considerados valores. São

elementos importantes considerados pela sociedade e pelo legislador.

A idéia de bem jurídico envolve uma análise sobre elementos que devem

receber uma valoração e uma proteção das distintas fontes de poder do Estado. E

que se violadas, merecedor será o agente violador deste bem de uma

correspondente e proporcional sanção.

Os bens jurídicos são os mais distintos, e a sua inteireza indicia a estrutura do

ordenamento jurídico.

A proteção dos bens jurídicos merece guarida na ciência do Direito, porque a

sua respeitabilidade e a coerção em detrimento daqueles violadores concretizam o

escopo do Direito. Qual seja, a promoção de paz social e estabilidade aos seus

destinatários. Vale afirmar, o afastamento da temível anomia.

A busca pela estabilidade social, sob a nomenclatura de anomia, também

traduz preocupação nas ciências sociais, a julgar pelos disseminados estudos de

Tânia Quintaneiro Barbosa, Maria Lígia de Oliveira e Márcia Gardênia Quintaneiro

Barbosa (2002), citando Émile Durkheim. Segundo o qual, a sociedade deve se

pautar no sentido de repudiar a anomia, isto é, no sentido de estabelecer regras

morais, que se violadas exigem a forte mão notoriamente estatal sobre os

comportamentos desviantes.

Nessa magnitude de bens jurídicos variáveis, conforme o tempo e conforme o

espaço se encontra o meio ambiente. Quando se pensa acerca do bem jurídico meio

ambiente, ou mesmo, acerca de quaisquer bens jurídicos, é preliminar que se

individualize este.

Em busca de uma individualização, apura-se que o meio ambiente é um valor

imprescindível para a humanidade. Sem o qual, portanto, inexiste verdadeiramente

sociedade, posto que este bem pressupõe os demais valores.

68

O bem jurídico em comento inspira a criação de uma série de dispositivos

profiláticos e repressivos que primam por repelir violações de distintas naturezas,

notadamente em relação à fauna e à flora. Isso em perseguição a própria mantença

da humanidade.

As argumentações acima formalizadas são incapazes de atingir a magnitude

do bem jurídico em comento. Entretanto, a partir de fontes teóricas e legais a

tentativa será de apreensão de mecanismos para se atingir a proximidade

conceitual. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a partir

de critérios geográficos, é plausível fracionar o meio ambiente em alguns sistemas

típicos, a partir da vegetação predominante em regiões brasileiras.

O dito fracionamento abarca em seu rol os sistemas ambientais, a floresta

amazônica, bem como a caatinga, a mata de cocais, o pantanal mato-grossense, o

cerrado, as matas de araucárias, zona litorânea, campos e mata atlântica.

A sensibilidade inerente a esse valor é marcante, em uma visão

constitucional. O artigo 225 da Constituição Federal (BRASIL, 2008), em seu

parágrafo quarto, a partir de critérios biológicos e geográficos posicionou como

patrimônio nacional os que se seguem, em meio ao complexo cenário ambiental: “A

Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-

Grossense e a Zona Costeira.” (BRASIL, 2008)

A proteção ao meio ambiente se justifica nesse nível, em razão das

incontáveis agressões perpetradas cotidianamente. E para o combate, existem

distintos dispositivos que versam sobre as queimadas, desertificações, erosões,

assoreamento, entre outras agressões.

As poluições também se operam sensivelmente, em suas distintas

modalidades. Tais como a sonora, a visual, aérea, no próprio solo, no meio aquático.

Tudo isso termina por comprometer cada vez mais perceptivelmente a vida de cada

indivíduo. Em razão dos fatos comentados, não resta dúvida de que incômodas

alterações passam a assustar a cada instante de forma mais intensa. Alguns

fenômenos são os acréscimos de temperatura, a camada de ozônio, o efeito estufa,

e outros tantos. Todos que obstam, flagrantemente, uma vida mais saudável.

É importante também trazer um conceito deontológico inerente ao meio

ambiente. Emerge nessa busca conceitual invocar o artigo 3º da Lei

6.938/1981(BRASIL, 1981). Lei essa, que versa sobre a política nacional do meio

ambiente.

69

A citada lei extracodificadora prevê parte da grande dimensão do meio

ambiente, tanto sob o ponto-de-vista legal, quanto sob o ponto-de-vista material, do

meio ambiente propriamente dito. Segundo esse dispositivo: “O conjunto de

condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que

permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. (BRASIL, 1981)

A riqueza do meio ambiente torna complexa a sua conceituação, mas,

representa um valor, um bem imprescindível para a mantença das pessoas, e que

merece todo o apreço e aparato estatal, perpassando por notáveis variáveis,

destacadamente fauna e flora, conforme já se disse.

Em outro plano, cabe invocar conceitos dos teóricos. O primeiro dos quais é

Edis Milaré, que prefere identificar o meio ambiente, a partir de sua integridade

jurídica, segundo ele:

não é, pois, este ou aquele recurso isolado, por mais valioso que seja, nem sequer seu conjunto, ou a soma de todos eles, que faz a característica de patrimônio da coletividade, mas a sua organização por meio das relações ecossistêmicas. Esta ultima é que constitui o meio ambiente como bem difuso de interesse coletivo. (MILARÉ, 2007, p. 198)

José Afonso da Silva (2010), por sua vez, opta por tentar conceituar o meio

ambiente levando em conta o posicionamento deste bem em relação à Constituição

Federal (BRASIL, 2008), fazendo alusão ao artigo 225:

Veja-se que o objeto do direito de todos não é o meio ambiente em si, não é qualquer meio ambiente. O que é objeto do direito é o meio ambiente qualificado. O direito que todos temos é a qualidade satisfatória, ao equilíbrio ecológico do meio ambiente. Essa qualidade é que converteu em um bem jurídico. A isso é que a constituição define com bem de uso comum do povo e essencial á sadia qualidade de vida. (SILVA, 2010, p. 83-84)

Por essas razões, é árdua a conceituação do meio ambiente, ante as

incontáveis variáveis.

5.2 Classificação do Meio Ambiente

O meio ambiente, segundo Celso Antonio Pacheco Fiorillo (2007), apresenta

variações em sua própria natureza. Isso significa que o meio ambiente, não

obstante, tenha uma identidade unitária, com a composição de todas as

70

classificações que serão ditas, tem variabilidades de espécies. Nesse patamar, para

o autor, o meio ambiente pode ser natural, artificial, cultural e até mesmo do

trabalho.

O meio ambiente natural, segundo o mesmo autor anteriormente dito, é

constituído por uma série de elementos. Tais como a atmosfera, biosfera, águas,

solo, subsolo, fauna e flora. É perceptível que o meio ambiente natural, para existir

historicamente, não foi criação do homem. Ao contrário, pertence à natureza.

Nessa mesma passagem o autor soma que o meio ambiente: Concentra o fenômeno da homeostase, consistente no equilíbrio dinâmico entre os seres vivos e meio em que vivem. O meio ambiente natural é mediatamente tutelado pelo `caput´ do artigo 225 da Constituição Federal e imediatamente, v.g, pelo parágrafo 1º , I, III e VII, desse mesmo artigo (...) (FIORILLO, p.22, 2007)

O meio ambiente traz uma segunda classificação, segundo Fiorillo (2007).

Qual seja, meio ambiente artificial. Nesta faceta, diferentemente do meio ambiente

natural, há a intervenção do homem, há uma intervenção capaz de artificializar este

meio. Isto é, a natureza é transformada, modificada, e dá ensejo à fúria de urbanizar

e a um universo marcado pela criatividade humana.

César Fiúza (2006) comenta que são considerados bens imóveis por natureza

o solo e suas adjacências, isto é, tudo que não sofre a intervenção do homem, posto

que se sofrer será considerado bem imóvel por acessão física, por exemplo. Esta

manifestação civilista permite identificar importante análise acerca do meio

ambiente. Isto é, quando houver intervenção a alguma coisa, que de forma

originária, não apresentava a intervenção direta do homem, está-se diante de um

meio ambiente artificial.

Segundo Celso Fiorillo (2007)

O meio ambiente artificial é compreendido pelo espaço urbano construído, no conjunto de edificações(chamado de espaço urbano fechado), e pelos equipamentos públicos (espaço urbano aberto). Este aspecto do meio ambiente está diretamente relacionado ao conceito de cidade. Vale verificar que o vocábulo `urbano´, do latim `urbs´. `urbis´, significa cidade e, por extensão, seus habitantes. (FIORILLO, p.23, 2007)

O meio ambiente cultural, também é outro momento classificatório e tem a

previsão constitucional especialmente no artigo 216 da Constituição Federal

(BRASIL, 2008), e outros dispositivos.

71

O meio ambiente cultural tem previsão constitucional explícita. Tal espécie

demonstra a razão fortemente protetiva empregada pelo constituinte.

Esta conotação pode aparecer tanto no meio ambiente artificial, quanto

natural. O fato é que a repercussão do meio ambiente cultural para a própria

representatividade do Brasil é impactante.

Para haver a conotação de meio ambiente cultural devem ser ponderados

distintos aspectos. Entre os quais a própria visibilidade, o valor histórico, artístico,

paisagístico, o impacto monumental, e outros elementos.

A previsão do meio ambiente cultural está codificada no artigo 216 da

Constituição Federal (BRASIL, 2008):

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

Na concepção de José Afonso da Silva o meio ambiente assim se caracteriza:

meio ambiente cultural, integrado pelo patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico, turístico, que, embora artificial, em regra, como obra do homem, difere do anterior pelo sentido de valor especial que adquire ou de que se impregnou; (SILVA, 2002, p.21)

Nesses termos se constitui o meio ambiente cultural. Ambiente esse, que

clama pela conservação e mantença, ante a forte repercussão histórica para o

Brasil.

O meio ambiente do trabalho é composto por um complexo de elementos que

envolvem a execução e a condução da prestação do labor. E suas consequências

são atreladas aos seus dois protagonistas, os seus sujeitos precípuos, quais sejam,

empregado e empregador.

Segundo Fiorillo:

Constitui meio ambiente do trabalho o local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais relacionadas à sua saúde, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independente da condição que ostentem (homens ou mulheres, maiores ou menores de idade, celetistas, servidores públicos, autonomias etc.)(FIORILLO, p.24, 2007)

72

O meio ambiente do trabalho deve primar pela higiene e segurança, elidindo-

se assim acidentes e doenças de trabalho. Afirme-se também que este ambiente

deve viabilizar a continuidade da relação trabalhista e proporcional e justa

destinação de créditos alimentícios por parte do empregado.

Alice Monteiro de Barros assim se expressa sobre o ambiente e a

correspondente necessidade protetiva:

A integridade física do trabalhador é um direito da personalidade oponível contra o empregador (...) quando o empregado é admitido pelo empregador, leva consigo uma série de bens jurídicos ( vida, saúde, capacidade de trabalho, etc), os quais deverão ser protegidos por este último, com adoção de medidas de higiene e segurança para prevenir doenças profissionais e acidentes no trabalho(...). (BARROS, p.1021-1022, 2006)

Valentin Carrion complementa:

A segurança e higiene do trabalho são fatores vitais na prevença de acidentes e na defesa da saúde do empregado, evitando o sofrimento humano e o desperdício econômico lesiva às empresas e a o próprio País. Pratica falta o empregado que não obedece as normas de segurança e higiene do trabalho, inclusive quanto ao uso de equipamentos. (CARRION, p.172, 2008)

Portanto, para se precisar o meio ambiente do trabalho não é distante se

analisar que este ambiente deve ser conduzido de tal forma que propicie acessível,

digno e seguro ambiente para a prestação do serviço.

5.3 Impacto do bem jurídico meio ambiente

Para uma reflexão mais apurada sobre as restrições ambientais, e para se

entender o porquê o meio ambiente é tão essencial no discurso da função social, é

necessário compreender o posicionamento do bem jurídico meio ambiente perante a

teoria do direito, bem como perante o ordenamento jurídico.

Cabe afirmar, desde já, o posicionamento de Celso Fiorillo (2007), que

menciona que o bem jurídico meio ambiente tem uma natureza híbrida. Em razão do

fato de que há especial posicionamento na órbita jurídica, uma vez que ele perpassa

pelo Estado e pelos indivíduos.

73

Por isso, seria público e privado concomitantemente. Edis Milaré (2005),

reputa o meio ambiente como um direito difuso, e que tem um interesse atrelado à

sociedade.

O bem jurídico meio ambiente nem sempre teve o tratamento que hoje lhe é

peculiar. Entretanto, a demonstração explícita em distintos âmbitos da sociedade,

notadamente biológico, mostrou que a vaga proteção não bastaria, sob pena de

comprometer a raça humana.

Essa preocupação pode ser verificada em uma série de conferências

internacionais. Tais como a Conferencia das Nações Unidas que versava

ostensivamente sobre o ambiente, no ano de 1972, ocorrida em Estocolmo. É

possível acrescentar também a Conferência das Nações Unidas sobre Meio

Ambiente, Desenvolvimento, no Rio de Janeiro em 1992.

O Tratado de Ramsar merece guarida, pois a sua preocupação é demonstrar a

preocupação internacional ao meio ambiente, e as suas conseguintes implicações

nos ordenamentos jurídicos. Some-se também Johannesburg na África do Sul, em

2002, e outros inúmeros tratados.

Antes de ingressar em uma análise constitucional, opta-se por tentar

brevemente localizar a geração que melhor se amolda o bem jurídico meio ambiente.

Uma vez que compreender a classificação contribuirá para o entendimento do meio

ambiente, como tão impactante para a sociedade:

a doutrina mais moderna vem se referindo a uma nova categoria de direitos- chamados direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, e que não se afeiçoam à dicotomia(público ou privado) do Direito tradicional, como são exemplos o Direito do Ambiente (...) (MILARÉ, 2005, p.2005)

Identifica-se que os autores Édis Milaré e Maximilianus Führer (2005)

posicionam o direito do ambiente como um direito de terceira geração. Isto é, não

comportam nem os direitos de primeira geração, notadamente os direitos civis e

políticos. E nem tampouco os direitos de segunda geração, nitidamente os direitos

econômicos, sociais e culturais.

José Adércio Sampaio Leite (2003), em equânime sentido, crê, ser o meio

ambiente um direito de terceira geração:

74

O direito a integridade do meio ambiente-típico direito de terceira geração - constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mais num sentido verdadeiramente abrangente, a própria coletividade social. (...) Os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade. (LEITE;WORLD;NARDY, 2003, p.08)

Ainda com o fito de identificar a geração afeita ao direito ambiental, cite-se a

manifestação do Supremo Tribunal sobre a questão. Pronunciou-se nos termos

subsequentes:

O direito à integridade do meio ambiente- típico direito de terceira geração- constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social(...)(STF, MS 22.164, Rel. Min. Celso de Mello, 1995)

Em uma análise constitucional, o meio ambiente se encontra em posição de

destaque. Conforme se aduz por intermédio da leitura do artigo 225 da Constituição

da República Federativa do Brasil (BRASIL, 2008). Por meio deste suporte é

possível constatar que o ambiente é sim impactante na sociedade, motivo pelo qual

intervém e é razão das limitações ambientais, visto que toda a propriedade e posse

que vilipendie o meio ambiente não cumpre a função social. O artigo 225 prevê:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (BRASIL, 2008)

É pertinente apontar que o artigo 225 da Constituição Federal (BRASIL,

2008) é o suporte fático central acerca do Direito Ambiental. E é abalizado, isto é,

tem a sua razão legislativa construída por meio das restrições ambientais.

Restrições que têm a sua margem existencial em consonância com a função social.

Analisou-se os aspectos teóricos que dizem respeito ao ambiente, e no

próximo item é adequado entender os princípios ambientais que constroem os

dispositivos legais que trazem as restrições ambientais e enchem a função social de

conteúdo.

75

Em complementação ao artigo 225, emerge ainda o artigo 170 da

Constituição Federal (BRASIL, 2008), que versa sobre a ordem econômica e social.

E nesta ordem, surge como centro o meio ambiente. Isto é, para que haja harmonia

nos invocados setores, mister se faz o respeito e a proteção ao meio ambiente. O

que aparece sob a expressão “defesa do meio ambiente”, inclusive com a previsão

de tratamento diferenciado. Desse modo, o artigo dispõe:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV - livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; VII - redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.(BRASIL, 2008)

O Meio ambiente, portanto, apresenta-se como central em relação ao

arcabouço geral dos bens jurídicos em uma visão constitucional. Saliente-se,

apresenta-se como basilar para as atuais e futuras gerações. E em uma flagrante

prevenção e solidariedade ativa, é primordial que se opere uma fiscalização por

parte do poder público e por parte dos cidadãos. Posto que se trata de um valor

jurídico excessivamente estruturante para a manutenção existencial humana.

Isso quer dizer que o meio ambiente afeta a própria manutenção da

integridade dos demais bens jurídicos. Em outras palavras é um valor, um centro

protetivo que perpassa por todos os demais bens, que condiciona a estruturação dos

outros bens jurídicos, é patrimônio genético, conforme anuncia Fiorillo (2007). Motivo

pelo qual o meio ambiente apresenta privilegiado posicionamento no paradigma

democrático de Direito. O que torna plausível a missão de aproximar o bem jurídico

central meio ambiente ao elemento basilar do novo Código Civil (BRASIL, 2008),

qual seja, a função social.

O pensamento exposto no parágrafo pretérito se coaduna com a visão

hermenêutica de Celso Antônio Fiorillo (2007), ao nomear como visão

76

antropocêntrica de Direito Ambiental, em decorrência do central posicionamento

ambiental. O que, aliás, é central para essa dissertação, pois, em razão dessa

centralização, o impacto em relação ao elemento estruturante estatal função social é

profundo. Nas palavras do autor:

A Constituição Federal de 1988, ao estabelecer em seus princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) como fundamento destinado a interpretar todo o sistema constitucional, adotou visão (necessariamente com reflexos em toda a legislação infraconstitucional- nela incluída toda a legislação ambiental) explicitamente antropocêntrica, atribuindo aos brasileiros e estrangeiros residentes no País( arts.1º, I, e 5º da Carta Magna) uma posição de centralidade em relação ao nosso sistema de direito positivo.(FIORILLO, 2007, p.16-17)

E prossegue Fiorillo:

De acordo com esta visão, temos que o direito ao meio ambiente é voltado para a satisfação das necessidades humanas. Todavia, aludido fato. De forma alguma, impede que ele proteja a vida em todas as suas formas, conforme determina o art.3º da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), cujo conceito de meio ambiente foi, a nosso ver, inteiramente recepcionado.(FIORILLO, 2007, p.17)

O Meio ambiente, em meio a essa hierarquia de bens jurídicos, de fato

cristalizou nos horizontes dogmáticos e axiológicos uma idéia diferenciada, uma

idéia realmente especial no que diz respeito à razão legislativa.

Pondera-se que o bem jurídico se projeta por um lapso temporal que beira o

infinito. Porém, essa questão não é decisiva para o posicionamento de destaque e

para a correspondente visão antropocêntrica. A decisiva questão reside no fato de

que o bem jurídico meio ambiente perpassa por todos os outros bens jurídicos.

Nessa visão, inexiste o bem jurídico vida, ou integridade física, intelectual,

patrimônio, e todos os demais que se apresentam no Estado Democrático, se não

houver o meio ambiente.

O meio ambiente é importante para a respiração, para o ar, para todos os

seres, e para todos os elementos existentes na sociedade. E em ênfase a esse

argumento, o vilipêndio ao bem jurídico meio ambiente é o vilipêndio a todos os

outros bens jurídicos. E é o próprio comprometimento da permanência da

humanidade.

Por todo este impacto, outra decisão não poderia existir senão a proteção

exacerbada, inclusive de forma intertemporal, sob a égide até mesmo dogmática, a

77

julgar pelo já citado artigo 225 da Constituição da República Federativa do

Brasil(BRASIL, 2008).

5.4 Princípios ambientais

A partir de uma leitura dos teóricos que abordam sobre os princípios

ambientais é inelutável encontrar princípios diferentes. Em razão disso, neste item

serão refletidos os princípios ambientais, a partir da identificação, sobretudo, da

análise de José Adércio Sampaio Leite (2003) e Celso Fiorillo (2007).

A principiologia ambiental elucida a razão existencial da ciência do Direito, e

representa verdadeiro núcleo. Trata-se de um centro de pensamento, que auxilia o

intérprete a promover salutares teorizações e problematizações.

Em sede teórica, é notório que existe um incontável número de princípios que

são trabalhados por diversos autores. Entretanto, aqui serão ponderados alguns

princípios que têm grande relevo no que toca o instituto da função social da

propriedade.

Os princípios ambientais são variáveis, segundo o autor, ou segundo a lei que

se analise. Ordinariamente, em princípio, existe uma lista de princípios presentes em

lei específica ambiental.

A lei referida é um Decreto, cujo número é 5.098/04 (BRASIL, 2004). Nesse

dispositivo são encontrados no artigo 2º os subsequentes princípios:

o principio da informação; principio da informação; principio da prevenção; principio

da precaução; principio da reparação; e principio do poluidor pagador.

5.4.1 Princípio do Desenvolvimento sustentável

O primeiro princípio que será comentado, serve como elemento fundamental

interpretativo das questões que estão em comento. Trata-se do desenvolvimento

sustentável, princípio consagrador da manutenção estrutural ambiental.

78

Inicialmente Fiorillo (2007) faz menção à suposta gênese desse princípio.

Segundo o professor, a origem está associada à Conferência Mundial do Meio

ambiente, ocorrida no ano de 1972 em Estocolmo. Explica ainda o autor, que uma

série de conferências reproduziu e trabalhou esse princípio, inclusive a ECO-92.

O Princípio do desenvolvimento sustentável é explicado por Édis Milaré:

A sustentabilidade inerente aos próprios recursos da natureza prende-se às cadeias ecossistêmicas, nas quais a existência e perpetuação de alguns desses recursos dependem naturalmente de outros recursos. Sem essa sustentabilidade haveria o comprometimento da própria biodiversidade, com a aceleração da sua perda, culminando em riscos ao ecossistema planetário. Como se pode ver, a sustentabilidade vai mais além dos destinos da espécie humana: ela alcança a perpetuação da vida e o valor intrínseco da criação ou do mundo natural. (MILARÉ, 2007, p. 68)

Cabe somar, segundo Paulo de Bessa Antunes (2005), que o

desenvolvimento sustentável tem várias razões de existência. E as restrições, em

geral, teriam inúmeras razões existenciais que incidem na propriedade privada e

outras órbitas. Segundo o autor, o crescimento populacional, a pobreza, as

desigualdades, as práticas da agricultura sustentável, a proteção às florestas, entre

outras razões.

O princípio do desenvolvimento sustentável é central para o meio ambiente,

pois ele incide sobre a tentativa de harmonização entre os interesses capitalistas e

propriamente o desígnio de continuidade existencial ambiental, e,

consequentemente, humana.

A dificuldade desse princípio diz respeito precisamente à diminuição da força

capitalista de concentração econômica e até mesmo da livre e desenfreada atuação

individual em detrimento do meio ambiente.

Em outras palavras, esse princípio reconhece e teme a liberdade econômica

do indivíduo, porque esta indicia o descontrole e as mazelas ao meio ambiental, que

são tão caras ao homem.

Esse princípio orienta a não preferir as iniciativas de desenvolvimento

econômico, tecnológico, robótico, mecânico, urbano e até mesmo político, em

detrimento do futuro. Em verdade este núcleo tenta harmonizar e disciplinar

interesses econômicos e sociais. É o que Fiorillo chama de “ponto de equilíbrio”

(FIORILLO, p.32, 2007)

79

Há uma preocupação com as futuras e presentes gerações. Todavia, este

princípio não afasta a intervenção do homem no meio ambiente, apenas racionaliza,

limita e restringe a intervenção, ante a justificada relevância deste bem.

Portanto, este princípio tem o apontado viés, mas, reconhece-se a dificuldade

de harmonizar interesses econômicos e sociais.

5.4.2 Princípio do poluidor pagador

Outro princípio que será trazido é do poluidor pagador, igualmente

contributivo para explicar as intervenções do Estado. Este princípio transmite a

necessidade de um comportamento humano daquele que interveio no meio

ambiente, com o objetivo de manter a integridade deste meio. Nas palavras de José

Adércio Sampaio Leite:

O princípio do poluidor pagador pode ser compreendido com um mecanismo de alocação da responsabilidade pelos custos ambientais associados à atividade econômica. Em essência, portanto, este princípio fornece o fundamento dos instrumentos de política ambiental de que os Estados lançam mão para promover a internalização dos custos ambientais vinculados à produção e comercialização de bens e serviços(...) Assim, no muito conhecido caso do acidente provocado pelo petroleiro. Exxon Valdez, a companhia petrolífera responsável pelo acidente foi obrigada a arcar com os custos de diversas medidas de reabilitação do meio ambiente(...) (LEITE, 2003, p. 23)

O principio do poluidor-pagador, tem caráter econômico, social e mesmo

pedagógico, em razão da sanção que deve ser imposta àquele que praticar poluição,

nitidamente a imposição de reparação do dano causador. Dessa forma, busca-se

atenuar os prejuízos que foram gerados em face do meio ambiente. Com similar

entendimento:

vocação redistributiva do Direito Ambiental e se inspira na teoria econômica de que os custos sociais externos que acompanham o processo produtivo precisam ser internalizados, vale dizer, que os agentes econômicos devem levá-los em conta ao elaborar os custos de produção e, consequentemente, assumi-los. Busca-se, no caso, imputar ao poluidor o custo social da poluição por ele gerada, engendrando um mecanismo de responsabilidade por dano ecológico, abrangente de efeitos da poluição não somente sobre bens e pessoas, mas sobre toda natureza. Em termos econômicos, é a internalização dos custos, externos. (MILARÉ, 2007, p. 770, 771)

80

Fiorillo (2007) acredita que o princípio do poluidor-pagador está ligado à

prioridade da reparação específica do dano ambiental, à solidariedade e também à

responsabilidade objetiva. Isto é, a responsabilidade civil objetiva, de origem

sugerida na Revolução Industrial, apregoa que o causador do dano será obrigado a

indenizar, independentemente da prova de culpa. Isto é, trata-se de uma imposição

forte ao autor do prejuízo.

O princípio em tela se assenta nos danos ambientais, conforme a Lei da

Política Nacional do Meio Ambiente, a Lei 6.938 de 1981 (BRASIL, 1981), em seu

artigo 14, parágrafo primeiro. Trata-se de uma sanção ao poluidor, até porque se

está diante de um risco temível à coletividade.

Na mesma Lei ainda há menção explícita ao princípio do poluidor-pagador, especificamente no artigo 4º, em seu inciso VII:

À imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.(BRASIL, 1981)

Há que se reconhecer que toda a coletividade e as autoridades devem se

preocupar com o difuso Direito ao meio ambiente e lutar por sua saúde, conforme a

Declaração do Rio de 1992:

as autoridades nacionais devem procurar promover a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em principio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais.(BRASIL, 1992)

Por esses motivos, aquele que causar dano ao meio ambiente deve repará-lo,

preferencialmente recompor o destinatário do dano, vale afirmar, a própria

coletividade.

5.4.3 Patrimônio Comum da Humanidade José Adércio Sampaio (2003) ainda invoca outros princípios, que têm a razão

legislativa de fomento das restrições ambientais. O professor cita o princípio do

patrimônio comum da humanidade.

Princípio esse, de origem nas negociações para a elaboração da Convenção

da ONU no tocante ao Direito do Mar. E o propósito deste princípio é mostrar que

81

nenhum Estado poderia reivindicar a propriedade dos recursos ambientais. Em

verdade a relevância é tão intensa que todos os Estados indistintamente, toda a

humanidade, precisam destes recursos, sem os quais prejudicados estarão todos os

Estados.

Esse princípio mostra a todos que o meio ambiente não pode ser projetado

meramente territorialmente. Ou seja, não pode haver uma limitação de fronteiras no

que tange à busca pelo cuidado com o meio que ora se analisa.

Esse princípio tem repercussão extraterritorial e busca identificar que todos

países têm o mister, através de todos os comportamentos considerados nobres, de

instigar o dever inafastável de manter o bem em comento.

5.4.4 Princípio da Responsabilidade Comum

José Adércio (2003) invoca o princípio da responsabilidade comum, mas.

diferenciada que exige do intérprete a estrita compreensão de que todos têm um

“múnus”, uma função de cunho social, em relação ao meio ambiente. Princípio esse,

que é intimamente ligado ao princípio do patrimônio comum da humanidade.

Todos têm uma missão em relação ao meio ambiente, o que impõe o dever

comportamental no sentido de respeitar o ambiente, sem vilipendiá-lo, sem agredi-lo,

para que ao longo de todas as gerações a existência sustentável ambiental seja

mantida.

Assim, a responsabilidade sobre o ambiente deverá ser compartilhada, posto

que os problemas ambientais não são residuais, e sim globais. Este princípio se

aperfeiçoará com o cumprimento dos propósitos atrelados ao princípio da

precaução. Princípio da precaução, que é harmoniosamente complementado com o

princípio da participação, invocado por Fiorillo (2007), este é um dos elementos do

Estado Social, que impõe a todos o dever de proteger o bem jurídico em comento.

82

5.4.5 Princípio da prevenção e da precaução

Para Celso Fiorillo (2007), o princípio da prevenção é condizente com a

própria razão legislativa do Direito Ambiental, isto é, todas as condutas ambientais

devem objetivar solidificar a sua própria integridade e de modo preventivo. Nesse

ponto, não se nega que o caráter repressivo também insurge. Porém, a atuação

primeva é profilática.

E para a sedimentação da citada solidariedade, em busca da proteção

ambiental, primordiais se fazem a educação e informação ambiental, princípio

igualmente invocado pelo autor anteriormente trazido à pesquisa.

Para Édis Milaré (2007), o Direito Ambiental tem um caráter profilático,

preventivo. Pois é crucial que o Estado se abasteça de instrumentos suficientemente

robustos para evitar precipuamente que o dano se perfaça. O mesmo autor

acrescenta de forma prática a aplicação desse princípio:

a invocação de tal principio é uma decisão a ser tomada quando a informação cientifica é insuficiente, inconclusiva ou incerta e haja indicações de que possíveis efeitos sobre o ambiente, a saúde das pessoas ou dos animais ou a proteção vegetal possam ser potencialmente perigosos e incompatíveis com o nível de proteção escolhido. (MILARÉ, 2008, p. 767)

Esses princípios foram invocados por se acreditar que estão intimamente

ligados aos problemas contidos na dissertação em caráter exemplificativo, todavia,

doutrinariamente são encontrados outros diversos princípios. José Adércio Sampaio

Leite (2003) exterioriza o princípio do direito ao desenvolvimento, princípio da

precaução, do dever de não causar dano ambiental, da responsabilidade estatal.

É racional invocar nesse tempo a Declaração do Rio de Janeiro sobre meio

ambiente do ano de 1992, que versa sobre o princípio da prevenção e precaução. E

termina por conduzir o intérprete, ao já dito caráter profilático. Esse princípio é

perceptível precisamente nos termos seguintes: “Para proteger o meio ambiente

medidas de precaução devem ser largamente aplicadas pelos Estados segundo

suas capacidades”. (BRASIL, 1992)

Machado (2006) teoriza acerca do princípio da prevenção e da precaução em

concomitância, assim como teoriza acerca da influência de tratados na construção

destes:

83

Essas convenções apontam para a necessidade de prever, prevenir e evitar na origem as transformações prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente. Todos esses comportamentos dependem de uma atitude do ser humano de estar atento ao seu meio ambiente e não agir sem previa avaliação das conseqüências. O Direito Positivo internacional e nacional irá traduzindo, em cada época, através de procedimentos específicos, a dimensão do cuidado que se tem com o presente e o futuro de toda forma de vida do planeta. (MACHADO, 2006, p.81-82)

Em complementar raciocínio, cite-se Fiorillo (2007), que termina por associar

o princípio da prevenção e da precaução ao princípio da informação. A associação

acontece pois o primeiro para ser concretizado necessita de fomentar uma educação

ambiental e uma coletiva consciência ecológica.

O caráter profilático inerente ao meio ambiente ainda é perceptível

dogmaticamente, na Lei 6.938 do ano de 1981, especificamente no artigo. 2º, incisos

IV e IX:

Art 2º - A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios: I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo; II - racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar; Ill - planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais; IV - proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas; V - controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras; VI - incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos recursos ambientais; VII - acompanhamento do estado da qualidade ambiental; VIII - recuperação de áreas degradadas; IX - proteção de áreas ameaçadas de degradação; X - educação ambiental a todos os níveis de ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente. (BRASIL, 1981)

Portanto, o princípio da precaução e da prevenção são complementares e

similares, e, sem elidir o caráter repressivo do Direito Ambiental, estabelecem

sanções e incentivos para evitar a ocorrência de agressões ao meio ambiente.

84

5.4.6 Princípio da Informação

Esse núcleo interpretativo do Direito Ambiental mostra aos estudiosos a

necessidade de disseminação informacional para que se promova uma educação. E

ademais, se conscientize toda uma comunidade acerca da gravidade de cada um

dos comportamentos, além de conscientizar a todos acerca das missões atreladas

ao meio ambiente. Para tanto, a responsabilidade é exigida a todos, porém, as

citadas normas se referem às instituições de ensino, independentemente do nível.

Este princípio tem previsão constitucional no artigo 225 da Constituição

Federal (BRASIL, 2008), especialmente no parágrafo primeiro, inciso IV. A primeira

lei dispõe que para assegurar a efetividade do Direito Ambiental é incumbido ao

poder público o seguinte: “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou

atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente,

estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.” (BRASIL, 2008)

Sobre o princípio da informação, importante é a reflexão de Fiorillo (2007), ao

ponderar sobre a premência do meio ambiente na ordem econômica e social, onde

se insere a comunicação social.

A ordem econômica e financeira constitucional, na qual está inserida a comunicação social, tem por principio norteador, no seu art. 170, VI, a proteção do meio ambiente, o que nos propõe o entendimento de que a comunicação social deverá ser livre dentro dos princípios de proteção e conservação do meio ambiente, porquanto a manifestação do pensamento, que a criação , a expressão e a informação“...não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição...”. Isso significa que o art. 220 não torna intocável esse direito, reclamado a interpretação sistemática da Carta Constitucional. (FIORILLO, 2007, p. 46)

A par da educação ambiental, observa-se a análise de Leme Machado (2006).

Com amparo no qual a dilação informacional deve se dar de forma ampliativa, sem

restrições, para que todos tenham o discernimento do impacto do meio ambiente. De

forma a tornar a população mais madura e lúcida acerca das variáveis desse meio.

A informação ambiental deve ser transmitida de forma a possibilitar tempo suficiente aos informados para analisarem a matéria e poderem agir diante a Administração Pública e do Poder Judiciário. A informação ambiental deve ser prevista nas convenções internacionais de forma a atingir não somente as pessoas do país onde produza o dano ao ambiente, como também atingir pessoas de países vizinhos que possam sofrer as conseqüências do dano ambiental. (MACHADO, 2006, p. 88)

85

No Brasil, enalteça-se a Declaração do Rio de Janeiro, que é auxiliar ao

entendimento já ventilado sobre o princípio que ora se tem como alvo:

no nível nacional, cada individuo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e atividades perigosas em suas comunidades. (BRASIL, 1992)

Por esses motivos, informar é um dever de todos, e a inércia desta

incumbência repercute como uma anuência para agressões ambientais.

5.4.7 Princípio da participação

O princípio da participação é diretamente ligado patrimônio comum da

humanidade, ao da informação. E o princípio em mira, termina por instigar e chamar

a todos para o seu dever de participar do processo de manutenção da integridade

ambiental.

Este princípio chama a atenção para a necessidade de participação de todos,

trata-se de um princípio que tem como protagonistas e destinatários um número

indiscriminado e indeterminado de indivíduos.

Celso Antônio Pacheco Fiorillo reflete sobre esse princípio

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 225, caput, consagrou na defesa do meio ambiente a atuação presente do Estado e da Sociedade civil na proteção e preservação do meio ambiente, ao impor à coletividade e ao Poder Público tais deveres. Disso retira-se uma atuação conjunta entre organizações ambientalistas, sindicatos, indústrias, comércio, agricultura e tantos outros organismos sociais comprometidos nessa defesa e preservação. (FIORILLO, 2007, p. 46)

Tal princípio também tem previsão na declaração do Rio de Janeiro de1992:

Art. 10 O melhor modo de tratar as questões do meio ambiente é assegurando a participação de todos os cidadãos interessados, no nível pertinente” enquanto a nível nacional todos devem ter “a possibilidade de participar no processo de tomada de decisões.(BRASIL, 1992)

86

Portanto, este princípio clama por uma participação conjunta dos indivíduos,

todos são co-legitimados e co-destinatários das ações por meio das quais se

constrói e se conserva o meio ambiente.

5.4.8 Principio da reparação

O presente princípio tem concatenação com o princípio já estudado do

poluidor-pagador. Conforme o qual, as normas são elaboradas no sentido de

preventivamente preservar o estado do meio ambiente, e se eventualmente houver o

vilipêndio, a norma ambiental incidirá exigindo a reparação do dano causado.

Pelo apontado motivo, se houver conduta lesiva, aplicar-se-ão sanções de

natureza cível, administrativa e até mesmo penal. Este princípio tem previsão legal,

especificamente no artigo 225, parágrafo terceiro da Constituição Federal (BRASIL,

2008)

As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (BRASIL, 2008)

A interligação entre o princípio do poluidor-pagador e o princípio da

reparação, pode ser percebida legalmente, no inciso VII, artigo 4º da Lei 6.938 do

ano de 1981: “à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar

e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de

recursos ambientais.” (BRASIL, 1981)

Não há como afastar a pertinência da retomada do debate sobre a

responsabilidade civil extracontratual inerente aos danos ambientais. Nesse viés,

Quanto à responsabilidade, considerada objetiva por dano ambiental, Fiorillo

comenta:

Com a promulgação da Lei Maior tal norma infraconstitucional foi recepcionada, tendo como fundamento de validade o art. 225, §3º, porquanto este não estabeleceu qualquer critério ou elemento vinculado á culpa como determinante para o dever de reparar o dano causado ao meio ambiente. Consagrou-se, portanto, a responsabilidade objetiva em relação aos danos ambientais(...) (A adoção pela Constituição Federal do regime de responsabilidade objetiva implica a impossibilidade de

87

alteração desse regime jurídico da responsabilidade civil, em matéria ambiental, por qualquer lei infraconstitucional (FIORILLO, 2007, p. 34)

Por esses motivos, a lei sedimentou, em busca de uma efetividade e até

mesmo de prevenção geral, a responsabilidade de cunho objetivo, que traz consigo

severidade. Nesses termos, alude-se que outra espécie de responsabilidade civil

extracontratual não seria plausível senão a objetiva, por coerência a importância do

bem jurídico que se tutela, pelos riscos dos atos e pelas razões legislativas

preventivas e repressivas que abalizam as normas ambientais.

5.5 Reflexões acerca das restrições

As restrições ambientais em relação à propriedade privada surgem de

distintas formas. Entre as quais, segundo Roxana Cardoso Borges(2005), as

propriedades privadas consideradas de área de proteção ambiental, ou de refúgio da

vida silvestre. Nessa mesma linha, a área de relevante interesse ecológico, a

imposição de zoneamento, licenciamento, criação de reservas biológicas,

extrativistas, exemplificadamente. Todas essas matérias explicitam, num conceito

clássico de propriedade privada, uma incompatibilidade.

Impossível será a abordagem e o exaurimento de todas as hipóteses de

restrições existentes no que tangencia o meio ambiente. Por isso, serão divagadas

acerca de algumas restrições ambientais, para que se compreenda a intensa

preocupação do Estado.

A primeira restrição ambiental que se coloca está presente no artigo 225 da

Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 2008). Essa questão

envolve uma proteção suprema que se verifica em relação a determinados âmbitos

do meio ambiente, atingindo “status” de patrimônio nacional. Em razão de suas

dimensões e de suas interveniências em todo o universo ambiental nacional e

internacional. É sim restrição em decorrência do fato de que os mecanismos judiciais

e extrajudiciais para proteger, e assim mitigar atuações privativas, têm intensidades

inimagináveis.

Essa suprema proteção está precisamente no parágrafo quarto desse mesmo

suporte fático, conforme o qual:

88

A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. (BRASIL, 2008)

5.5.1 Leis Extracodificadoras restritivas

As restrições ambientais são medidas impostas em face dos particulares, em

detrimento da propriedade privada. Estas almejam a proteção do bem jurídico meio

ambiente e a sua continuidade.

Uma restrição ambiental, exemplificadamente, pode estar ligada ao artigo 32

do Código de Águas. A partir deste preceito, à primeira vista salta aos olhos a

preponderância do interesse público em detrimento do interesse privado. E de forma

reflexa se nota a agressão gerada em relação à propriedade privada em seu sentido

clássico. O que solidifica a idéia de que a expressão propriedade privada não é a

mais acertada. O artigo citado dispõe:

“Art. 32. As águas públicas de uso comum ou patrimoniais dos Estados ou dos

Municípios, bem como as águas comuns e as particulares, respectivos álveos e

margens, podem ser desapropriadas por necessidade ou por utilidade pública.”

(BRASIL,2008)

Além do citado Decreto, inúmeros outros dispositivos têm como razão

existencial a imposição de restrições ambientais, entre os quais o Código Florestal,

Código de Pesca, a Lei instituidora da Política Nacional do meio ambiente, e outros

mais.

As restrições ambientais podem ser observadas também através das sanções

estatais impostas pelo Estado. Isso porque se o proprietário não se amoldar aos

propósitos estatais, a referida sanção será aplicada. Entre as sanções se destacam

a advertência, a multa, interdição de atividade, fechamento de estabelecimento,

entre outros.

Todas essas restrições formam o entendimento de que estas estão em estrito

e flagrante auxílio para a consagração da função social. Em outras palavras, o

89

motivo pelo qual as restrições da natureza em comento se verificam se deve a uma

sistemática construção de imponência da função social da propriedade.

Essas limitações são um choque à propriedade privada e terminam por

controlar a livre atuação do indivíduo frente às propriedades. Tais limitações geram

uma série de efeitos, como a limitação à concentração patrimonial.

Limitar o exercício da propriedade é fomentar o respeito à sociedade, é

preferir a coletividade, em detrimento de interesses privados. E é nesse sentido que

se tem a harmônica relação entre função social e restrições ambientais.

De forma propedêutica, outros dispositivos normativos também serão

proferidos, para se compreender a intensificada atuação legislativa

infraconstitucional no sentido de limitar a atuação particular e proteger o meio

ambiente. Essa ponderação e sistematização normativa podem ser vistas no site do

Ministério do Meio Ambiente.

Em pesquisa, observa-se que na década de 60 é positivado o Código

Florestal, que, conforme o seu preâmbulo, prima por : “instituir a política Nacional de

Resíduos Sólidos.” (BRASIL, 1965). Além de alterar a Lei 9.605 de 1998, entre

outras providências.

Ainda na década de 60, localiza-se no ano de 1967 a Lei nº 5197 (BRASIL,

1967). Esta que tem como objetivo precisamente a proteção à fauna.

Em avanço para a década de 70, cite-se a Lei nº 5870/1973. Esta que -

"Acrescenta alínea ao artigo 26 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro 1965, que institui

o novo Código Florestal." (BRASIL, 1973) -

No final da década de 1970, destaque para Lei nº 6766/1979 que dispõe

sobre:“ o Parcelamento do Solo Urbano e dá outras Providências."(BRASIL, 1979)

Também para a compreensão da atuação estatal no sentido de mitigar a

atuação privada, cite-se no início da década de 1980 a Lei número 6938/1981, que

objetiva dispor sobre: “a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e

mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências." (BRASIL, 1981)

Ainda na década de 1980, todavia, em meados desta, tem-se a Lei nº

7551/1986 (BRASIL, 1986). Lei esta, que assim como a citada lei 5.870/1973

(BRASIL, 1973), objetiva alterar o Código Florestal. Esta lei é composta por tão

somente quatro artigos. O primeiro dos quais objetiva acrescentar e ordenar alíneas

em relação ao artigo 2º do Código Florestal (BRASIL, 1971). O segundo artigo versa

sobre o artigo 19 do mesmo Código e demonstra o propósito legislativo de promover

90

a preservação de espécies nativas, além de explicitamente conter a exploração de

madeira. A redação dada pela lei ora trabalhada prevê:.

Art. 19 Visando a rendimentos permanentes e à preservação de espécies nativas , os proprietários de florestas explorarão a madeira somente através de manejo sustentado, efetuando a reposição florestal, sucessivamente, com espécies típicas da região. § 1º É permitida ao proprietário a reposição com espécies exóticas nas florestas já implantadas com estas espécies. § 2º Na reposição com espécies regionais, o proprietário fica obrigado a comprovar o plantio das árvores, assim como os tratos culturais necessários a sua sobrevivência e desenvolvimento. (BRASIL, 1986)

No final da década de 1980, percebe-se importante legislação que busca o

cuidado e a mantença salutar dos rios. E o foco desta lei é especificamente proteger

as florestas que existem nas nascentes dos rios. Esta observância é tida pela Lei

número 7754/1989 (BRASIL, 1989).

No Direito do Consumidor é percebida também a busca do legislador para

obstar a livre comercialização de produtos e embalagens, sem maiores intervenções

estatais. Sabe-se que a intervenção estatal neste âmbito, afeta diretamente a

propriedade privada. Uma vez que com esta atuação, a mitigação atinge a própria

auferição de lucros por parte do empresário. A lei em comento é a de número

7802/1989 (BRASIL, 1989), que dispõe:

sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências (BRASIL, 1989)

A década de 1990 tem apreço, em razão da influência constitucional, a Lei

8974 de ano de 1995 (BRASIL, 1995), em razão das modificações normativas

atinentes precisamente ao artigo central ambiental, qual seja, o artigo 225 da

Constituição Federal (BRASIL 1988). E a partir dessas modificações se tem a

redação que hoje se conhece e centraliza o bem jurídico meio ambiente. As

modificações são nos seguintes preceitos:

incisos II e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados, autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, e dá outras providências (BRASIL, 1995)

91

No final da década de 1990, através da Lei número 9433/1997 (BRASIL,

1997), nota-se preocupação com notável parcela ambiental, notadamente a água, a

partir da iniciativa da criação de nominadas Política Nacional de Recursos Hídricos,

assim como o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos,

regulamentando ademais, o inciso XIX do artigo 21 da vigente Constituição Federal

(BRASIL, 2008). Além de alterar o artigo 1º da Lei 8.001 de 1990.

No ano de 1998 entra em vigor a Lei 9.605 do ano de 1998, a Lei de Crimes

ambientais. Norma que fixa sanções mais gravosas, ante a natureza penal, até

mesmo a pena privativa de liberdade, se houver a prática de determinados delitos.

Nesse mesmo raciocínio Pacheco Fiorillo:

(...) Em obediência ao que determina ao art.1º, III, da Constituição Federal,

estabeleceu de forma pioneira a possibilidade de sujeitar todo e qualquer infrator, ou

seja, aqueles que praticam condutas e atividades consideradas lesivas ao meio

ambiente, a sanções penais (...) (FIORILLO, p.437, 2007)

A Lei de Crimes Ambientais (BRASIL, 1998) é fracionada em alguns

capítulos, notadamente o capítulo que versa sobre a aplicação da pena, previsto no

artigo 8º. Nesse suporte, existe a previsão de circunstâncias judiciais do agente, que

devem ser verificadas para a dosimetria da pena, de forma proporcional.

No capítulo III, tem-se a previsão sobre a apreensão do produto criminoso e

de instrumentos de infração administrativa ou mesmo de crime .

No capítulo subsequente, o capítulo IV, tem-se a previsão sobre a ação e o

processo penal. Isto é, tem-se a previsão sobre o percurso, o processo específico

para se tramitar uma ação penal. Neste capítulo, aponte-se a possibilidade de

aplicação da Lei 9.099 de 1995, em aspectos como a propositura imediata de penas

restritivas e multas. Nesse patamar, tão só quando houver a composição do dano

ambiental, nos delitos de pequeno potencial ofensivo ambiental. Ou mesmo a

aplicação do artigo 89 da Lei 9.099, que versa sobre a transação penal, com as

especificidades descritas no artigo 28 da Lei de Crimes ambientais (BRASIL, 1998).

No capítulo V, tem-se a previsão dos crimes ambientais em espécie. Neste

capítulo, tem-se a busca por proteger os distintos âmbitos do meio ambiente. Por

meio da previsão de penas por crimes contra a fauna, crimes contra a flora, poluição

e outros crimes, bem como crimes contra o Ordenamento Urbano e o patrimônio

cultural, crimes contra a administração ambiental.

92

No capítulo VI, o tratamento legislativo diz respeito às infrações de cunho

administrativo. E a lei prossegue com seu caráter interespacial, no capítulo VII,

versando sobre a cooperação do meio ambiente.

Nestes termos, nota-se que o legislador reputou primordial o tratamento de

uma lei específica, dada a complexidade ambiental e a iminência de se proteger tal

valor, diversa do Código Penal.

No ano de 1999 foi positivada a Lei de número 9795, que versa sobre a Lei de

Educação Ambiental. E nessa mesma lei, tem-se a previsão da instituição da Política

Nacional de Educação Ambiental.

Em 2000 a lei é-a de número 9966, que trata da prevenção, do controle e

também da fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo, assim como

de outras substâncias considerados nocivas ou perigosas em águas nacionais.

Nesse mesmo ano 2000, ainda surgem duas leis que restringem a atuação

privada. A primeira das quais consiste na lei de número 9.984, que previu sobretudo

a criação do Sistema Nacional de Unidades de Recursos hídricos. A outra norma a

ser dita é a 9.985, que regulamentou o central artigo 225 da Constituição Federal

(BRASIL, 2008), especialmente no parágrafo primeiro, incisos I, II, III e VII, além da

instituição do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza.

Já no ano de 2006, é encontrada a Lei 11.284, que fixa critérios acerca da

gestação de florestas públicas para fins de produção sustentável, além de instituir o

Serviço Florestal brasileiro. Observe-se, segundo o preâmbulo, que o dito órgão

estará contemplado à estrutura do Ministério do Meio ambiente. Além da criação de

outro órgão, qual seja, o Fundo Nacional de Desenvolvimento florestal.

A mesma lei, tratada no último parágrafo, foi sim uma lei reformadora, pois

além dos aspectos acima proferidos, modificou inúmeras leis. Notoriamente, o já

citado Código Florestal (BRASIL, 1965) e a Lei de Crimes Ambientais (BRASIL,

1998). E ainda no mesmo ano, a Lei 11.428, tem-se a disposição, para fins

protetivos, sobre a adequada e limitada utilização do Bioma Mata Atlântica.

No ano de 2010, entrou em vigor a Lei 12.305, responsável por instituir a

Política Nacional de Resíduos sólidos, pois esses resíduos são sim temerários para

a saudável integridade ambiental.

Isso posto, essa pluralidade de normas, que não foi citada de modo exaustivo,

ilustram o amplo quadro normativo protetivo ao meio ambiente, e que mobiliza uma

série de órgãos, em busca de valorar e salvaguardar esse bem.

93

5.5.1.1 Restrições de preservação

5.5.1.1.1 Código Florestal

Em uma análise dogmática, percebe-se que existem mecanismos que o

legislador se valeu, com o anseio profilático, isto é, com o desígnio de

verdadeiramente perseguir que se evite o mal antes mesmo do ocorrido. E a

preservação representa uma fortificada restrição, pois de forma preventiva o homem

não pode nessas propriedades intervir.

Pois bem, o primeiro preceito consiste na Lei 4.771 do ano de 1965 (BRASIL,

1965). Esta lei é conhecida como Código Florestal e a sua amplitude é considerável.

A lei florestal que ora se comenta, em relação à conservação, termina por

firmar reservas ambientais. Reservas essas, que representam limitações estatais

que obstam a intervenção livre imobiliária, tendo em vista a importância que

determinada floresta representa para o meio ambiente.

. Em simétrico sentido:

A reserva de floresta legal decorre de normas que limitam o direito de propriedade e somente incide sobre o domínio privado. A área objeto da reserva legal será medida em cada propriedade e a sua dimensão dependerá da região do país em que estiver localizado o imóvel rural, em conformidade com o estabelecido no artigo 16 do Código Florestal e com as modificações introduzidas pela MP número 2.116-67/01. (VIRGÍLIO; IRIGARAY, p. 230, 2005)

No que diz respeito à preservação, nota-se que a referida lei considerou como

área de preservação permanente, as florestas e outras formas de vegetação,

aquelas vegetações que estiverem situadas desse modo:

a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: 1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura; 2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura; 3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura; 4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura; 5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros; b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais;c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos

94

chamados "olhos d'água", qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinquenta) metros de largura; d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na l inha de maior declive;f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais; h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação. (BRASIL,1965)

Esse artigo foi invocado para se ter uma idéia acerca das opções legislativas,

para a solidificação de uma restrição intervencionista em face do homem. Contudo, a

mesma lei ainda fixa outros critérios para restringir, a partir da elevação de uma

vegetação ao estado de área de preservação permanente. Nesse ponto, segundo o

artigo 3º do mesmo Código Florestal (BRASIL, 1965), é possível que o poder público

considere dada vegetação como de preservação permanente. Desde que para tanto

se observe esses critérios:

Art. 3º Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas: a) a atenuar a erosão das terras; b) a fixar as dunas; c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias; d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares; e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico; f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção; g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas; h) a assegurar condições de bem-estar público.(BRASIL, 1965)

A partir desse artigo, percebe-se que outra proteção e restrição foi verificada,

a partir da declaração do poder público. Porém, a partir da vinculação às

especificidades mensuradas por esse suporte.

Outro suporte fático chama a atenção no Código Florestal (BRASIL, 1965),

quando o assunto é a preservação. O artigo a que se refere é o 16, que permite sim

a supressão das florestas e vegetação nativa, dando margem, em primeiro plano, a

se pensar que o legislador flexibilizou seu ríspido tratamento. Mas, essa é só uma

visão aparente, pois quando se faz a leitura do artigo, é perceptível que a supressão

não pode atingir as já citadas áreas de preservação permanente, e tampouco as

áreas objeto de legislação específica e nem mesmo as de regime de utilização

limitada.

Essas vegetações nativas e florestas, que não são áreas de preservação

permanente ou com as limitações descritas no último parágrafo, poderiam ser alvo

95

de supressão, mas, com a ressalva de que a área eventualmente suprimida, seja

mantida, na condição ou título de reserva legal, observando as limitações:

I - oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta localizada na Amazônia Legal; II - trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de cerrado localizada na Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte por cento na propriedade e quinze por cento na forma de compensação em outra área, desde que esteja localizada na mesma microbacia, e seja averbada nos termos do § 7o deste artigo; III - vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País; e IV - vinte por cento, na propriedade rural em área de campos gerais localizada em qualquer região do País. (BRASIL, 1965)

Esses preceitos inclinam o intérprete a proposição de que as áreas de

preservação permanente e outras assim definidas pela lei recebem absoluta

proteção. Em decorrência das inúmeras ressalvas, acima arroladas, que primam

pela mantença em saudáveis condições do meio ambiente.

Ainda em relação à conservação almejada pelo Código Florestal é necessário

apontar uma limitação frontal ao direito de propriedade e posse, especialmente no

meio rural. Em razão da propensão ao atingimento mais provável ao meio ambiente.

Dessa forma, aquele que tenha em seu arcabouço possessório ou de propriedade,

área florestal nativa, natural, primitiva ou regenerada, deverão adotar

obrigatoriamente as seguintes medidas:

I - recompor a reserva legal de sua propriedade mediante o plantio, a cada três anos, de no mínimo 1/10 da área total necessária à sua complementação, com espécies nativas, de acordo com critérios estabelecidos pelo órgão ambiental estadual competente; II - conduzir a regeneração natural da reserva legal; e III - compensar a reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia, conforme critérios estabelecidos em regulamento. (BRASIL, 1965)

As proferidas defesas se dão em áreas que de fato têm maior relevância ao

meio ambiente, entretanto, essas são limitações mais intensas, não excluindo outras

diversas nas demais áreas.

96

5.5.1.1.2 Outros dispositivos normativos específico s de preservação

A Lei 6.766 do ano de 1979 (BRASIL, 1979) versa sobre o parcelamento do

solo urbano e tem aspectos que merecem guarida quando o assunto é preservação

ambiental. Este elemento destacado, positiva acerca da competência, e mais

especialmente sobre as áreas de preservação especiais.

No artigo 13 dessa Lei, a competência é firmada aos Estados-membros, no

que toca a aprovação pelos municípios, sobre os loteamentos e desmembramentos,

desde que respeitado o seguinte pressuposto descrito no inciso I:

“quando localizados em áreas de interesse especial, tais como as de proteção aos

mananciais ou ao patrimônio cultural, histórico, paisagístico e arqueológico, assim

definidas por legislação estadual ou federal.” (BRASIL, 1979)

E ainda em relação à competência, é perceptível que serão os Estados

responsáveis por definir quais são as áreas de proteção especial. Literalmente

dispõe o preceito:

“Art. 14 - Os Estados definirão, por decreto, as áreas de proteção especial, previstas

no inciso I do artigo anterior.” (BRASIL, 1979)

Nessa mesma caminhada, uma das resoluções do Conama, a de número

303, do ano de 2002, tem semelhante propósito legislativo, qual seja, o de

regulamentar áreas de preservação.

Segundo a Resolução, em seu preâmbulo, o objetivo é dispor sobre

parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente. Ilustre-se

nessa disposição, o artigo 3º, que de forma semelhante ao Código Florestal

(BRASIL, 1971), também dá diretrizes para a auferição das áreas de preservação

permanente. Veja-se:

I - em faixa marginal, medida a partir do nível mais alto, em projeção horizontal, com largura mínima, de: a) trinta metros, para o curso d`água com menos de dez metros de largura; b) cinqüenta metros, para o curso d`água com dez a cinqüenta metros de largura; c) cem metros, para o curso d`água com cinqüenta a duzentos metros de largura; d) duzentos metros, para o curso d`água com duzentos a seiscentos metros de largura;e) quinhentos metros, para o curso d`água com mais de seiscentos metros de largura; II - ao redor de nascente ou olho d`água, ainda que intermitente, com raio mínimo de cinqüenta metros de tal forma que proteja, em cada caso, a bacia hidrográfica contribuinte; III - ao redor de lagos e lagoas naturais, em faixa com metragem mínima de:a) trinta metros, para os que estejam situados em áreas urbanas consolidadas; b) cem metros, para as que estejam em áreas rurais, exceto os corpos d`água com até vinte

97

hectares de superfície, cuja faixa marginal será de cinqüenta metros; IV - em vereda e em faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de cinqüenta metros, a partir do limite do espaço brejoso e encharcado; V - no topo de morros e montanhas, em áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a dois terços da altura mínima da elevação em relação a base; VI - nas linhas de cumeada, em área delimitada a partir da curva de nível correspondente a dois terços da altura, em relação à base, do pico mais baixo da cumeada, fixando-se a curva de nível para cada segmento da linha de cumeada equivalente a mil metros; VII - em encosta ou parte desta, com declividade superior a cem por cento ou quarenta e cinco graus na linha de maior declive; VIII - nas escarpas e nas bordas dos tabuleiros e chapadas, a partir da linha de ruptura em faixa nunca inferior a cem metros em projeção horizontal no sentido do reverso da escarpa; IX - nas restingas: a) em faixa mínima de trezentos metros, medidos a partir da linha de preamar máxima; b) em qualquer localização ou extensão, quando recoberta por vegetação com função fixadora de dunas ou estabilizadora de mangues; X - em manguezal, em toda a sua extensão; XI - em duna; XII - em altitude superior a mil e oitocentos metros, ou, em Estados que não tenham tais elevações, à critério do órgão ambiental competente; XIII - nos locais de refúgio ou reprodução de aves migratórias; XIV - nos locais de refúgio ou reprodução de exemplares da fauna ameaçadas de extinção que constem de lista elaborada pelo Poder Público Federal, Estadual ou Municipal; XV - nas praias, em locais de nidificação e reprodução da fauna silvestre. Parágrafo único. Na ocorrência de dois ou mais morros ou montanhas cujos cumes estejam separados entre si por distâncias inferiores a quinhentos metros, a Área de Preservação Permanente abrangerá o conjunto de morros ou montanhas, delimitada a partir da curva de nível correspondente a dois terços da altura em relação à base do morro ou montanha de menor altura do conjunto, aplicando-se o que segue: I - agrupam-se os morros ou montanhas cuja proximidade seja de até quinhentos metros entre seus topos; II - identifica-se o menor morro ou montanha; III - traça-se uma linha na curva de nível correspondente a dois terços deste; e IV - considera-se de preservação permanente toda a área acima deste nível.

Com esse item se buscou transmitir os principais nortes que contribuem para

a identificação de áreas de preservação, que limitam o homem de forma repressiva

ou preventiva, em seu exercício da propriedade ou mesmo da posse.

98

5.5.1.2 Restrições de Conservação

5.5.1.2.1 Unidades de Proteção Integral

Em sede de conservação, inúmeros mecanismos são encontrados no

ordenamento jurídico brasileiro. As denominadas unidades de conservação também

são úteis para se apreender a dimensão das restrições ambientais, pois a

conservação impõe um comportamento contido por parte do homem, elidindo a sua

livre atuação frente as unidades em análise.

A primeira lei a ser problematizada consiste na Lei 9.985 do ano 2000

(BRASIL, 2000). Nessa lei são encontradas basicamente duas espécies de unidades

de conservação. Quais sejam, as unidades de proteção integral e as unidades de

uso sustentável.

Essa lei exterioriza em seu preâmbulo que a finalidade legislativa é a

regulamentação do art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal

(BRASIL, 2008). Além de instituir o Sistema Nacional de Unidades de Conservação

da Natureza e dá outras providências.

As unidades de proteção integral podem ser, em primeiro lugar, as estações

biológicas, à luz do artigo 9º. Segundo essa lei, estas estações têm como objetivo a

preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas (BRASIL, 2000)

Perceba-se que essa norma incidirá no domínio e sobre a posse, uma vez

que essa lei não permite sequer a livre visitação das estações biológicas, salvo

quando houver um objetivo educacional, e seu domínio é público (BRASIL, 2000).

Ainda sobre a proteção integral, localiza-se o artigo 10, que firma a reserva

biológica. Dessa vez, o objetivo é a preservação da biota e outros atributos naturais

existentes em sues limites, sem interferência humana. Excetuando-se, todavia, as

medidas de recuperação de seus ecossistemas. Nessa reserva biológica, importa

dissertar que é proibida a visitação que não tenha o anseio educacional. (BRASIL,

2000)

No artigo seguinte é encontrado o parque nacional, cujo objetivo é preservar

basicamente ecossistemas naturais de profunda relevância ecológica, e de sublime

beleza, de forma a viabilizar pesquisas científicas, atividades educacionais e outras.

99

Nota-se que a restrição diz respeito até mesmo à visitação, que para a sua

legitimação é necessária a previsibilidade de normas e restrições estabelecidas no

nominado plano de manejo da unidade. (BRASIL,2000).

O artigo que se segue na unidade de proteção consiste no artigo 12, que trata

do monumento natural. O objetivo nesta feita, é de preservar sítios considerados

naturais, singulares ou de grande beleza cênica. (BRASIL, 2000)

O artigo 13, por sua vez, tutela a reserva de vida silvestre. Nesse momento, o

fim é a proteção à fauna, no sentido de proteger ambientes onde se assegure a

mantença das espécies de animais, bem como a procriação desses. Percebe-se que

a visitação pública se sujeitará às normas de manejo da unidade. (BRASIL, 2000)

5.5.1.2.2 Unidades de Uso sustentável

Outro ponto tratado na Lei 9.985 de 2000 (BRASIL, 2000) consiste nas

unidades de uso sustentável, estas que também configuram limites, em razão do

impedimento para a visitação e conseguinte exploração da iniciativa privada. Aqui o

prestígio se alastra em relação à coletividade.

A primeira unidade que merece essa proteção está descrita no artigo 15, que

estabelece a área de preservação ambiental. O objetivo dessa área é a proteção à

diversidade biológica e também de assegurar a sustentabilidade no uso dos

recursos naturais. Nesse horizonte, a limitação acontece em áreas que tipicamente

têm ocupação humana, o que representa um choque à propriedade privada. A

restrição é identificada, também pelo fato de a visitação poder ocorrer para fins de

pesquisas científicas. (BRASIL, 2000)

No artigo 16 da mesma lei, surge a previsão da área de relevante interesse

ecológico, que prima pela mantença dos ecossistemas naturais, que tenham

importância local, objetivando-se a regularização da natureza. Nessa categoria, tem-

se áreas de relevante interesse ecológico privadas ou mesmo públicas. (BRASIL,

2000)

A floresta nacional também é uma unidade de uso sustentável. Estas têm o

objetivo de promover o uso sustentável dos recursos florestais e até mesmo a

100

pesquisa. Nesse ponto, segundo o artigo 17 da lei em tela, é possível a visita para

fins de lazer, educação e até turismo. (BRASIL, 2000)

A reserva extrativista está prevista no artigo 18 da mesma lei, e a razão

legislativa é a proteção dos meios de vida das populações nativas e assim assegurar

o uso sustentável dos recursos naturais, em área com populações extrativistas. A

restrição atinge até mesmo a visitação pública, que é regularizada por decretos de

criação de cada uma das unidades (BRASIL, 2000).

Ainda como limitação ambiental de similar calão, está a reserva da fauna,

prevista no artigo 19. A razão é a proteção ao habitat de animais e espécies nativas,

que sejam contributivas aos estudos científicos. A limitação é nítida, proibindo-se a

caça proibida. (BRASIL, 2000).

A sequência da lei que se apresenta se dá com o artigo 20, que fixa a reserva

de desenvolvimento sustentável. Esse que tem como fim precípuo a preservação

das populações tradicionais, que vivam de sistemas sustentáveis, no tocante à

exploração dos recursos naturais. Nesta faceta até mesmo se percebe o incentivo

para a visitação, mas, a posse e o domínio certamente não são privados, posto que

se forem, gerarão uma restrição administrativa à propriedade privada. (BRASIL,

2000).

As reservas particulares de patrimônio natural estão previstas no artigo 21 da

mesma lei aqui destacada. O anseio legislativo é a preservação de espaços de

importância ambiental ou paisagística. Nessa unidade de uso sustentável, trata-se

de uma área privada, cujo proprietário, mediante o seu alvedrio, firma um gravame

em face de sua própria propriedade e seu gravame é marcado pela perpetuidade.

(BRASIL, 2000)

101

6. INTERLIGAÇÃO ENTRE PROPRIEDADE PRIVADA, FUNÇÃO S OCIAL DA

PROPRIEDADE E RESTRIÇÕES AMBIENTAIS

O que se percebe sobre a função social diz respeito à plausibilidade da

inserção deste instituto como princípio fundamental da nova principiologia,

mencionada por César Fiúza (2006).

A função social da propriedade inelutavelmente, em um cenário

principiológico já abordado, não é puramente uma benesse e um instrumento de

exercício do poderio nas relações privadas nas mãos de detentores de riquezas. A

propriedade se apresenta como um elemento sobre o qual o poder estatal e a

necessidade de respeito à coletividade recaem. Este bem, portanto, impõe uma série

de responsabilidades, notadamente as restrições ambientais.

Já se analisou, e agora se reitera, uma série de fenômenos históricos, como

a “Lex Poetelia Papiria”, a migração da teoria monista subjetivista para a teoria

dualista, as Revoluções do Iluminismo e outros tantos fenômenos. Que contribuíram

para retirar do seio do Direito Privado sua responsabilização pessoal corpórea.

A rigidez patrimonial, em um período clássico do Direito, desrespeitava a

personalidade da pessoa humana.

No Direito Romano, segundo Fustel de Coulanges (1995), em uma

propriedade imobiliária familiar havia forte conotação religiosa. Por isso, o bem de

família carregava consigo toda uma ancestralidade.

A força religiosa pode ser vista a partir da necessidade atrelada ao pai de

família, ao sacerdote do lar, no sentido de ministrar sobre a sua família e proteger os

seus ancestrais através da mantença do fogo aceso. Tratava-se de um culto aos

ancestrais.

A propriedade, portanto, era tida como primordial para a integridade do

indivíduo, mais do que propriamente a sua vida.

Uma imensidão de atrocidades já se alastrou na história, em total desrespeito

à pessoa humana. Esse incontável número de vidas dizimadas foi contributivo no

processo de construção da personalidade.

Gustavo Tepedino (2001) cita como importantes para o instituto da

personalidade a primeira guerra mundial e a segunda guerra mundial, que em

verdade avassalaram famílias, e ignoraram completamente a raça humana. Nesse

102

ponto, com a estarrecedora dor, outro caminho não há senão modificar, a partir da

reflexão acerca dos comportamentos humanos, o escuro e nebuloso quadro de

penúria espiritual, inerente às guerras.

A partir desse olhar sensibilizado, é possível se falar em solidariedade.

Solidarismo que é tão frutífero e salutar para um discurso de função social. Discurso

que é reforçado a partir de choques à humanidade, que sensibilizaram o Direito Civil.

Conforme o professor Gustavo Tepedino (2001), diversos fenômenos históricos

foram relevantes para a construção da personalidade, entre os quais as duas

guerras mundiais.

Tão somente com o respeito à personalidade é possível se falar em função

social, em razão das limitações patrimoniais que são impostas por esta.

Para atingir a função social é necessário tocar na frieza patrimonialista e

humanizar para questões transcendentais.

Por isso, segundo o mesmo professor Tepedino (2001), declarações, tratados

e outros fenômenos passam a ser vislumbrados, no sentido de fomentar a

respeitabilidade à personalidade.

A função social é atrelada à dignidade da pessoa humana. E ambas terminam

por despatrimonializar, e, reflexamente, humanizar o Direito

A função social modifica a visão tradicional do Direito Civil, e é elemento

relevante para humanização, conforme já se dissertou. Pois afasta a visão egoística

e patrimonialista, em que o proprietário tem flagrante liberdade para exercer a sua

propriedade da forma como melhor lhe convier.

A função social permite que, mesmo em um simples contrato, em princípio,

em razão de seu relativismo inerente, não permita a observância de uma

coletividade, a partir desse princípio, é cogente que se sopese acerca de uma

coletividade e se mitigue o egoísmo patrimonialista relativista típico da ciência

contratual.

Até mesmo um simples contrato que tenha como objetivo meramente

transmitir um bem móvel de insignificante valor, em aplicação a ordem constitucional

e infraconstitucional, premente será constatar que a coletividade deve ser

respeitada, ainda que implicitamente. Isso pelo simples fato de que este contrato

deverá afastar violações ilícitas à ordem ambiental ou urbanística.

103

Porém, para a compreensão deste impacto, que vem sendo demonstrado, é

necessário precisar o elemento, verificando suas múltiplas variáveis, em seguimento

à sistematicidade constitucional.

O elemento em comento deve demonstrar que a função social, para ser

concretizada, não obriga a destinação de propriedade. Mas, é devido explanar que

em todos os atos praticados pelas pessoas na sociedade, há que se observar que o

sentido primordial inerente à função social deverá sempre ser respeitado.

Os comportamentos dos indivíduos devem ser pautados no respeito à pessoa

humana, em seu conteúdo significativo, qual seja, a dignidade da pessoa humana.

Por essa razão, prestigiada, ao menos indiretamente, deve ser a função social.

A função social da propriedade, da forma como deve ser concebida, denota

algo mais do que um desígnio de reflexão em relação à propriedade, denota a

necessidade de respeito ao ser humano.

A nova principiologia e a corrente humanista do Direito Civil transmitem uma

expectativa de humanização. Desse modo, a função social da propriedade deve ser

enxergada de forma a humanizar, como um instrumento crucial para a concretização

do propósito de prestigiar o ser humano.

Acredita-se que só será possível compreender a conotação humanista,

quando houver a identificação de elementos estruturantes da função social. E como

se apreende nesta dissertação, o elemento estruturante central é o meio ambiente,

que carrega consigo uma carga intensa de humanidade, aliás, justifica-se pela

humanidade.

O motivo pelo qual se enfoca precisamente na função social a propriedade

deve-se à identificação, conforme se percebe no capítulo que trata da principiologia,

que a construção do Direito Civil, em seu período clássico, cristalizava como o

protagonista dos bens jurídicos o patrimônio, nitidamente a propriedade.

Por isso, o grande desafio do Direito Civil para construir ou precisar a função

social da propriedade, é superar a sua própria gênese, que era a proteção

extremada patrimonial e individual. Aliás, esta visão ainda perdura, de uma maneira

menos forte, mas, o caminho de humanização ainda está em processo.

O posicionamento que aqui se concebe é no sentido de que a função social

da posse é um instrumento viável e realmente adotado. Entretanto, em uma visão

histórica, não obstante a posse transmita atributos que deságuam sobre a

propriedade e até mesmo a pressuponha, não há como negar que a superação da

104

excessiva proteção à propriedade é mais impactante do que propriamente a função

social da posse, para se superar a visão patrimonialista.

Atingir a função social da propriedade envolve uma busca por conter o furor

dos indivíduos por acúmulo de riqueza.

A função social no âmbito imobiliário se mostra, portanto, independente, da

concessão universal de propriedade. Porém, não se pode repelir a idéia de que a

função social da propriedade, em sua inteireza, necessita mitigar o exercício

desenfreado da obtenção de vantagens e locupletamentos concernentes à

propriedade.

Outra característica impactante presente no ordenamento brasileiro é que as

previsões do ordenamento, ao se reportarem sobre função social da propriedade,

fazem basicamente menção preponderante à função social da propriedade imóvel.

Entretanto, essa manifestação preponderante não elide a necessidade de

amoldamento da função social da propriedade privada imobiliária para a sua faceta

mobiliária.

Essa visão da propriedade privada como o âmago para se atingir, como forma

de se superar a visão classicamente patrimonialista, pode ser reparada até mesmo

dogmaticamente. A partir do instante em que a função social no âmbito patrimonial

apresenta a propriedade no centro.

A função social é uma proteção ao capitalismo. Trata-se de um manto

emergente, capaz de proteger o homem de seu incontido desígnio de enriquecer

através da violenta exploração.

É sim uma proteção contra a desigualdade, e contra a concentração de

riquezas, que não atinge o ponto de uma defesa do sistema socialista. Mas,

abomina a miséria e clama por maior equidade.

A função social, em distintas gradações, prima pelas presentes e futuras

gerações, como se verifica no capítulo que versa sobre o meio ambiente. Além de

proteger o homem de seus pares. Além de marcar uma necessária intervenção do

Estado, patrimonialmente, em busca de uma contenção ao desequilíbrio. Nesse

sentido:

“No mundo atual, sentimos a imperante precisão de que o Estado intervenha na

ordem contratual, para que a mesma não seja instrumento de escravização. Essa

intervenção, por normas de ordem pública, evita o desequilíbrio.” (AZEVEDO, 2002,

p. 24)

105

Este princípio tem extrema importância no mundo de hoje, com base nele que

muitos contratos têm seus problemas solucionados.

A função social para Fachin (1988) está intimamente associada ao uso da

propriedade, mais especificamente à forma que se dá o seu exercício. Em suma,

está ligada a forma pela qual se dá o exercício dos pressupostos fático jurídicos que

se afeiçoam à propriedade, associado à forma pela qual se dá o exercício das

faculdades ou poderes inerentes ao direito de propriedade. O autor invoca, para

explicar o fenômeno, Eduardo Espínola, segundo o qual a confiança recíproca e

boa-fé, têm uma ligação com o conceito obrigacional, e terminam gerando uma

ajuda para o entendimento do conceito de função social, considerando assim a

solidariedade social.

Prossegue Luiz Edson Fachin (1988), desta vez invocando Larenz, afirmando

que na “Lex Maxima” da República Federal alemã, o exercício da propriedade se

verificava, levando-se em conta o bem da coletividade. Essa notícia histórica é

contributiva para o entendimento da função social no Brasil. A Alemanha destaca de

forma tamanha a função social, posicionando-a como princípio jurídico. É destacável

ainda ,segundo Elisabete Maniglia (2005), na obra coordenada por Lucas Barroso,

Mário Lúcio Quintão e Alcir Gursen de Miranda (2005), que a Constituição do México

do ano de 1917, surgiu como substancial na construção do conceito de função

social. Pois neste diploma, há a primazia de uma ideologia social que ilumina o texto

constitucional, até aplicável à posse e a propriedade.

Observe-se que Luiz Fachin (1988), ao se manifestar sobre a função social,

diz aos seus interlocutores que a visibilidade de função social é muito mais clara na

posse do que na propriedade. Especificamente sobre a função social da posse, uma

vez mais invocando Fachin (1988), ao citar Hernández Gil, destaca que o sentido

existencial desta modalidade de função social, é contribuir para a transformação de

realidades sociais.

Para Pietro Perlingieri (2007), para se refletir sobre a função social é

necessário se ter em mente o seu propósito promocional, ante a influência em

ordens econômicas, políticas e assim na dignificação do homem, segundo o autor:

Em um sistema inspirado na solidariedade política, econômica e social e ao pleno desenvolvimento da pessoa (artigo 2º Const.) o conteúdo da função social assume um papel de tipo promocional, no sentido de que a disciplina das formas de propriedade e suas interpretações deveriam ser atuadas para

106

garantir e para promover os valores sobre os quais se funda o ordenamento(...) (PERLINGIERI, 2007, p.226)

Roxana Cardoso Brasileiro Borges (2005), acredita que a função social em

verdade, a exemplo do que dispõe Luiz Edson Fachin (1988), seria uma superação

da individualidade, seria um conceito associado à oponibilidade à coletividade.

Conforme se depreende da seguinte passagem:

“A função consiste numa atividade exercida no interesse não apenas do sujeito que

a executa, mas, principalmente, no interesse da sociedade(...)”(BORGES, 2005,

p.275)

Pietro Perlingieri citado por Gustavo Tepedino(2000) se manifesta sobre a

função social:

A função social, constituída como o conjunto dos limites, representaria uma noção somente de tipo negativo voltada a comprimir os poderes proprietários, os quais sem os limites, ficariam íntegros e livres. Este resultado está próximo à perspectiva tradicional. Em um sistema inspirado na solidariedade política, econômica e social e no pleno desenvolvimento da pessoa(...) o conteúdo da função social assume um papel de tipo promocional, no sentido de que a disciplina das formas de propriedade e as suas interpretações deveriam ser atuadas para garantir e para promover os valores sobre os quais se funda o ordenamento.(TEPEDINO, 2000, p.48)

Já Elimar Szaniawski (2000), trazendo uma visão de Léon Duguit, explana

sobre o tema também:

A idéia de função social insere, em seu conteúdo, o poder e a obrigação de o proprietário empregar seus bens na satisfação de suas necessidades e, também, no dever de satisfazer a finalidade coletiva, afastando-se, totalmente, da noção da propriedade individual como corolário da liberdade individual e absoluta. A propriedade deixa de ser um direito subjetivo de seu proprietário, passando a exercer uma função social do detentor de riquezas, já que o mesmo se insere dentro de uma coletividade, cumprindo uma certa função em virtude do lugar que nela ocupa. Duguit concebe a propriedade como um instrumento de satisfação imediata das necessidades ou do interesse individual do proprietário, e medianamente, do interesse coletivo(SZANIAWSKI, 2000, p.132,)

A partir disso, segundo Fachin (1988), identifica-se que a função social da

propriedade é paradoxal em relação ao caráter absoluto e perpétuo.

Para se compreender a função social da propriedade é necessário modificar,

conforme já se afirmou, a idéia de propriedade direito de propriedade e migrar para a

idéia de dever da propriedade, como anuncia Adriano Stanley (2007). Na opinião do

professor:

107

Portanto, podemos mesmo dizer que o proprietário deixou a sua cômoda condição de `senhor que tudo pode” e foi conclamado pelo poder público a prestar-se socorro da sociedade, assumindo, assim, o novo papel de “senhor que tudo deve´ (STANLEY, p. 2.591, 2007)

As restrições ambientais, por sua vez, representam um paradoxo em relação

à estrutura de propriedade privada e que não poderiam ir além do discurso

justificador da função social. Então, teríamos três aspectos chaves. Quais sejam, a

propriedade privada, a função social e mais amplamente as restrições ambientais.

Ainda se está tentando analisar que as restrições ambientais são

predominantes e "conditio sine qua non" para a construção do conceito de função

social.

As restrições ambientais devem existir em justa medida à função social. Por

isso, o limite das restrições ambientais é a própria precisão conceitual da função

social, que por sinal é o sentido existencial das restrições ambientais.

As restrições ambientais, reputa-se, são amparadas no discurso da função

social. Posto que as restrições aparecem como preponderantes conceituais da

função social, conforme se apontou preteritamente.

Pelo que foi exposto, analisa-se que as restrições ambientais aparecem em

consonância à função social e são um óbice à propriedade privada, até mesmo em

seu sentido etimológico. Trata-se de um inelutável limite, conforme afirma Perlingieri

(2007): “Limite é o instrumento com o qual o interesse público ou privado

circunscreve o direito, sacrificando a sua extensão e determinando o seu conteúdo

concreto.(...)” (PERLINGIERI, 2007, p.231)

Refletir a função social da propriedade a partir das restrições ambientais exige

uma releitura. A partir da qual se fará possível atribuir uma concepção pertinente

sobre tais elementos. Nessa busca, cite-se Roxana Cardoso Brasileiro

Borges(2005), na obra Direito Agrário na Constituição :

A proteção do meio ambiente, quando visa a bens ambientais que estão sob domínio de alguém, pode afetar diretamente o direito de propriedade. A problemática entre o direito de propriedade e a proteção do meio ambiente tem reflexos na esfera patrimonial, econômica, de cunho eminentemente privado, embora a propriedade pública também se submeta às normas ambientais. (BORGES, 2005, p.271)

Em similar sentido está o autor Benjamin (1997) que promove uma

interligação entre a função social da propriedade e propriamente as restrições

ambientais, tendo em vista a ECO 92

108

De fato, direito de propriedade e meio ambiente, são institutos interligados, como que faces de uma mesma moeda; nesse sentido, não seria incorreto dizer-se que o Direito Ambiental é fruto de uma amálgama do Direito das Coisas com o Direito Público. Com isso queremos mostrar que qualquer tutela do meio ambiente implica sempre interferência (não necessariamente intervenção, como abaixo veremos) no direito de propriedade(...) (BENJAMIN, p.14, 1997)

A função social aparece como um elemento crucial no Estado Democrático de

Direito, e que está cada vez mais em voga. Neste Estado, o meio ambiente se

coloca em privilegiada posição no apontado elemento crucial.

A referida importância se alastra muito em decorrência de seu amparo

justificador função social. Motivo pelo qual, reputa-se que há uma interdependência

inelutável entre a função social e as restrições ambientais, e um óbice de

convivência com a propriedade privada em seu sentido etimológico clássico. Em

decorrência deste fenômeno, a relativização da propriedade privada, termina

implicando uma releitura morfológica desta expressão, e até mesmo o seu

descabimento, ante a intervenção estatal precisamente na seara privada.

Esta defesa de imprecisão pode aparecer a partir de algumas considerações

teóricas, quando se observa a defesa da inserção da função social no conceito de

propriedade. Ora, se a função social efetivamente intervém no próprio conceito de

propriedade, legítimo é preponderar que a expressão propriedade privada, não é tão

intensamente adequada, embora utilizada recorrentemente. A par dessa análise,

traz-se a argumentação de Maria Auxiliadora Castro e Camargo (2004), na obra

Direito Agrário contemporâneo:

“Assim a função social deve ser considerada como parte integrante do próprio

conceito do direito de propriedade e não apenas como elemento externo que venha

comprimir ou restringir sue conteúdo.”(CAMARGO, p. 57, 2004)

Nessa seara, deve-se posicioná-lo na reconstrução dos paradigmas do

Estado Democrático como um direito de quinta geração, em uma visão mais

inovadora. O que reconstrói um pensamento mais remoto no tempo. .

Em remate, identificar a interdependência entre restrições ambientais e

função social é promover uma séria interpretação de elementos basilares do Estado

Democrático de Direito, sem os quais fadados estarão os juristas à imprecisão

teórica. E esta identificação se mostra substancialmente importante na reconstrução

do paradigma no qual os pesquisadores mais modernos se encontram inseridos.

109

Como forma de identificar essa interdependência é mister invocar o pensamento de

Luiz Edson Fachin:

A exacerbação do individualismo acentou na propriedade o caráter de inviolabilidade e de absolutismo. Hoje, já se imprime à propriedade privada um conjunto de limitações formais, sendo composto de restrições e induzimentos que formam o conteúdo da função social da propriedade que não se confunde como função social da posse. O absolutismo no exercício da propriedade sofreu a intervenção de idéias que progressivamente construíam a doutrina a denominada função social da propriedade.(FACHIN, 1988, p.17)

Todas essas problemáticas, salienta-se, que se amparam na busca pelo

entendimento do nexo existencial e a interdependência entre a função social,

restrições ambientais e propriedade privada, precisam ser apontadas nas mais

distintas fontes do Direito. E será por intermédio desta relação de dependência, que

será possível compreender e estruturar mais solidamente o posicionamento do meio

ambiente no Estado Democrático de Direito e o papel cogente e preponderante da

função social neste mesmo Estado. Sem essas reflexões, acredita-se no prejuízo

para a compreensão e até mesmo para o alcance conceitual dos elementos

basilares em comento no Estado Democrático de Direito.

110

7. CONCLUSÃO

Conclui-se que a propriedade privada, outrora com um caráter quiritário,

absoluto e sagrado, perdeu o seu sentido em decorrência da mitigação do princípio

da autonomia da vontade, o que reflexamente gerou o progresso incessante da

função social da propriedade.

O fortalecimento da função social da propriedade caminha harmonicamente

com as intervenções e limitações impostas pelo Estado, destacadamente a partir da

justificativa de proteção ambiental.

A função social da propriedade é contributiva para o rompimento da

principiologia clássica e para a consequente migração para novo paradigma

principiológico. Mas, sobretudo a aludida função é responsável pelo respeito ao

homem, em detrimento do egoísmo inerente à propriedade privada.

Em meio a todos os bens jurídicos valorados pelo ordenamento jurídico, o

meio ambiente merece especial atenção. Ante a profundidade da previsão

constitucional, ao codificar a imprescindibilidade deste bem na ordem econômica,

social e sua premente necessidade para as presentes e futuras gerações.

A dimensão do meio ambiente é de fato notável, uma vez que este perpassa

por todos os bens jurídicos, implícita ou explicitamente. Importa dizer, inexiste vida

ou quaisquer outros bens jurídicos se não houver o salutar meio ambiente. Em

outros termos, sem o meio ambiente fadado estará o homem ao temível fim.

Ademais, pois os efeitos ambientais advindos das agressões humanas se tornam

cada dia mais perceptíveis.

Respeitar o meio ambiente é um dever cogente e sua concretização é a

própria dignificação e humanificação do homem. Por isso, o meio ambiente é a

condição sem a qual não há sociedade, é a própria proteção da coletividade.

Trata-se de um desafio, no plano da efetividade, harmonizar a necessidade

de agregação de novas tecnologias, fenômenos como a robotização, e a

mecanização do homem, com a mantença e conservação do meio ambiente, pois

inelutavelmente há um aparente paradoxo. Todavia, não há outra alternativa para as

futuras gerações senão o equilíbrio entre as variáveis em foco e o desenvolvimento

sustentável.

111

O meio ambiente se posiciona como o principal elemento para a construção e

justificação da função social da propriedade, em uma visão dogmática e axiológica,

haja vista os dispositivos constitucionais e infraconstitucionais.

Portanto, os institutos da função social da propriedade e as restrições

ambientais, e a percepção da intensa interdependência de ambos insurgem como

protagonistas no processo de despatrimonialização , humanificação e na busca por

se salvaguardar o homem, em detrimento do egoísmo atinente à propriedade

privada e à autonomia da vontade.

112

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