re vista

Upload: andrea-karinne-albuquerque-maia

Post on 21-Jul-2015

40 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Revista Internacional de

FOLKCOMUNICAO FOLKCOMUNICACIN

2003 / Nmero 1

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

2

REVISTA INTERNACIONAL DE FOLKCOMUNICAO REVISTA INTERNACIONAL DE FOLKCOMUNICACIN

Revista cientfica virtual da Rede de Pesquisa em Folkcomunicao Rede Folkcom.

Publicada em parceria com Instituto de Educao Superior de Braslia IESB, o Museu da Imprensa de Portugal e a Ctedra Unesco/UMESP de Comunicao para o Desenvolvimento Regional, em colaborao com o Ncleo de Pesquisa em Folkcomunicao da INTERCOM Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicao e os Grupo de Estudios de Folkcomunicacin de ALAIC Asociacin Latinoamericana de Investigadores de la Comunicacin, FELAFACS Federacin Latinoamericana de Asociaciones de Facultades de Comuniacin Social, LUSOCOM Federao Lusfona de Cincias da Comunicao e IBERCOM Asociacin Iberoamericana de Comunicacin.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

3

EXPEDIENTE: Rede FolkcomunicaoPresidente: Profa. Dra. Cristina Schmidt (SP) Diretoria Executiva: Marlei Sigrist (UFMS), Rosa Nava (UNIMONTE), Maria Cristina Gobbi (UMESP) Presidente Honorrio: Prof. Dr. Jos Marques de Melo (UMESP)

Instituto de Educao Superior de Braslia (IESB)Diretora-Geral: Profa. Dra. Eda C. B. Machado. Coordenador do Curso de Comunicao Social: Prof. Dr. Sergio Dayrell Porto Coordenadora do Curso de Comunicao Institucional e Relaes Pblicas: Profa. Dra. Elizabeth Pazito Brando

REVISTA INTERNACIONAL DE FOLKCOMUNICAOEditores: Antonio Teixeira de Barros (UniCEUB/IESB) Severino Alves de Lucena Filho (UFPB) Editores Associados: Luiza Elayne Correa Azevedo (UFPA), Maria Cristina Gobbi (UMESP), Marlei Sigrist (UFMS), Osvaldo Trigueiro (UFPB), Rosa Nava (UNIMONTE), Rossana Gaia (CEFET-AL), Samantha Castelo Branco (UniFIAM), Sebastio Breguez (UFV). Projeto Grfico: Marcelo Jdice (IESB)

CONSELHO EDITORIAL: Antonio Hohlfeldt (Brasil) Carlos Nogueira (Portugal) Cristina Schmidt (Brasil) Daniel Jones (Espanha) Eduardo Namburete (Moambique) Esmeralda Villegas (Colmbia) Marcelo Guardia (Bolivia) Jorge Gonzalez (Mxico) Jos Marques de Melo (Brasil) Joseph Luyten (Brasil) Luis Humberto Marcos (Portugal) Roberto Benjamin (Brasil)

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

4

Proposta EditorialA Revista Internacional de Folkcomunicao destina-se a divulgar trabalhos de pesquisa e reflexes realizados por pesquisadores associados Rede Folkcom, investigadores independentes, estudantes de graduao e ps-graduao, especialmente dos pases lusfonos e ibero-americanos. ESTRUTURA DA REVISTA: 1 Ensaios (Comunicaes de pesquisas cientficas) 2 Artigos (Trabalhos de iniciao cientfica) 3 Comentrios (Reflexes sobre fenmenos folkcomunicacionais) 4 Resenhas (Anlises de publicaes ou de eventos) 5 - Notcias (Registro das atividades da Rede Folkcom ou de entidades similares) 6 Galeria Folk (Fotos, quadrinhos, desenhos e outros registros grficos) NORMAS PARA PUBLICAO: Os textos devero ser escritos em Times New Roman, corpo 10, espao simples, com o seguinte nmero de pginas: 1- Ensaios e Artigos - 8 a 15 pginas 2 Comentrios e Resenhas - 3 a 5 laudas. 3 Notcias 1 a 2 laudas O ttulo do texto deve ser grafado em corpo 12, negrito, caixa baixa e centralizado. Abaixo do ttulo deve constar os dados de identificao dos autores. Em seguida um resumo de 5 a 10 linhas e a indicao de 3 a 5 palavras-chave. O corpo do trabalho (no caso dos itens 1 e 2) deve conter: introduo, metodologia, anlise, concluses e referncias bibliogrficas. As citaes devem seguir o padro autor, data, pgina (evitando o uso de notas de rodap, exceto quando se trata de notas explicativas ou informaes adicionais). As referncias bibliogrficas devem seguir o padro das normas da ABNT. Alm do texto, os autores devem explicitar sua autorizao para a publicao do texto. Em caso de vrios autores, cada um deve enviar mensagem autorizando a publicao separadamente.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

5

O Conselho Editorial pode recusar o texto ou pedir modificaes. Os textos devem ser enviados por e-mail para: [email protected] ou [email protected]

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

6

ApresentaoA Revista cientfica virtual da Rede de Pesquisa em Folkcomunicao Rede Folkcom, publicada em parceria com Instituto de Educao Superior de Braslia IESB, a Ctedra Unesco / UMESP de Comunicao para o Desenvolvimento Regional e outras instituies, apresenta seu primeiro nmero, referente ao primeiro quadrimestre de 2003. A proposta editorial da Revista Internacional de Folkcomunicao divulgar trabalhos de pesquisa e reflexes realizados por pesquisadores associados Rede Folkcom, investigadores independentes, estudantes de graduao e ps-graduao, especialmente dos pases lusfonos e ibero-americanos. Com isso, pretendemos conferir maior visibilidade ao campo especfico da Folkcomunicao no Brasil, na Amrica Latina e nos pases lusfonos. O suporte digital, a nosso ver, contribui em muito para facilitar o acesso aos textos e, conseqentemente, fomentar o debate entre todos aqueles interessados nos estudos foilkcomunicacionais. Outra vantagem do peridico eletrnico permitir aos estudantes de graduao que tomem conhecimento das pesquisas que esto sendo realizadas na rea. Isso, sem dvida, contribuir para renovar o campo da Folkcomunicao, ao incentivar novas geraes de pesquisadores. Esperamos contar com muitos colaboradores nos prximos nmeros.

Os Editores

Sumrio

Proposta Editorial................................................................................................................................4 Apresentao .......................................................................................................................................6

Artigos e EnsaiosMsica Folklrica en la Industria Cultural Marcelo Guardia Crespo ...............................................................................................................8 Folkcomunicao em Portugal: a esfera permevel da literatura oral Carlos Nogueira...........................................................................................................................18 Folkcomunicao, contribuio brasileira Teoria da Comunicao Jos Marques de Melo .................................................................................................................28 Devoes populares no-cannicas na amrica latina: uma proposta de pesquisa Roberto Benjamin........................................................................................................................41 O folheto de circunstncia: 11 de setembro em cordel Maria Alice Amorim ...................................................................................................................48 A fotografia como processo folkcomunicacional Cristina Schmidt Silva.................................................................................................................56 Marujada de B (pa): (des)construes e construes Lundia Azevedo, L.E..................................................................................................................64 A menina sem nome: um espao de comunicao folk Jos Xavier dos Santos ................................................................................................................74 Joo, Manoel, Maciel Salustiano: trs geraes de artistas populares e sua comunicao com o massivo na perspectiva da reconverso cultural Mariana Mesquita .......................................................................................................................79

ComentriosTurismo religioso popular: um cenrio folkcomunicacional Severino Alves de Lucena Filho..................................................................................................98 Os estudos de folkcomunicao hoje no Brasil Sebastio Geraldo Breguz........................................................................................................105

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

8

Msica Folklrica en la Industria CulturalMarcelo Guardia Crespo Universidad Catlica Boliviana-Cochabamba [email protected] Bolivia

RESUMEN: Este trabajo pretende demostrar que la msica popular, en sus dimensiones folklrica y autctona, experimenta radicales transformaciones de orden formal y de contenido cuando se inserta en los procesos de produccin y difusin masiva en las sociedades contemporneas. Para ello, concentramos una descripcin cualitativa de la msica llamada autctona en la regin andina de Bolivia en base a contribuciones de la etno-musicologa andina y observaciones propias. As podemos apuntar las siguientes caractersticas como "fuertes" de este tipo de msica: produccin ritualizada; produccin colectiva; concepcin de tiempo cclico. Cuando se produce el encuentro con la industria cultural, estas caractersticas son transformadas para su difusin, puesto que no es posible trasladar la complejidad de esta manifestacin esttica, cientfica y ritual a un sistema fragmentado de produccin de bienes simblicos que funciona atendiendo a las reglas del mercado. Por tanto se producen las siguientes adaptaciones: descontextualizacin espacio temporal; fragmentacin de la dimensin esttica, la religiosa y la cientfica; la concepcin cclica del tiempo es convertida en tiempo lineal en una pieza con inicio y fin determinados; baladizacin de la msica, la instrumentacin es adaptada a la de la msica occidental. De manera similar se producen transformaciones con la msica folklrica.En ese caso, la homogenizacin se presenta en aspectos de forma y contenido. Sin embargo, no se puede tener un anlisis completo de este fenmeno si no se toma en cuenta el proceso de comunicacin generado tanto dentro como fuera de los sistemas de industria cultural y, en ese sentido, conocer la perspectiva de los sujetos protagonistas de estos fenmenos, que en estos casos son los productores de la msica y especialmente los consumidores. Los cambios deben ser entendidos dentro de la dinmica cultural que si bien determina ciertas prdidas, tambin permite ganancias y sobre todos redefine la dimensin comunicacional de la cultura sin destruirla.

La Msica Popular en Bolivia es como un termmetro mediante el cual se puede medir lo que ocurre en el campo cultural del pas y en los campos econmico y poltico. Es por eso que se necesita analizar los fenmenos culturales en Bolivia, considerando las relaciones que implcita y explcitamente tiene la msica con el resto de los factores que estn presentes en la sociedad. En este caso pretendemos analizar cmo la industria cultural interfiere en la produccin de la msica folklrica andina de Bolivia y en la llamada msica autctona. La motivacin principal para este cometido es comprender las dinmicas culturales que sirven de base para la produccin de msica en las ltimas dcadas y tambin vislumbrar que ocurrir en este campo en las prximas dcadas. Para comprender estos procesos debemos recordar cul o cuales son los orgenes de lo que conocemos hoy como msica popular boliviana. Por tanto, es necesario recordar la memoria y ver que los campos de produccin de la msica popular boliviana son producto de un proceso de interaccin nacional e internacional rico, dinmico y permanente.

I. CAMPOS DE PRODUCCIN DE LA MSICA POPULAR EN BOLIVIAActualmente, y siguiendo la evolucin de la produccin cultural de los pases de la regin andina, podemos identificar, aunque solamente con fines didcticos que arriesgan la precisin de

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

9

anlisis, la existencia de tres grandes campo de produccin musical y cultural en Bolivia: el del mundo andino, el del mundo occidental y el mestizo.

1.1 Mundo andinoPese a que pasaron muchos aos de tentativas coloniales que sometieron y hasta extinguieron grandes pueblos y culturas, en Bolivia existen muchas comunidades quechuas y aymars que conservan sus rasgos culturales con poca influencia de la cultura occidental o con una marcada presencia de estructuras cosmovisiones milenarias. Muchas comunidades mantienen sus formas de relacionarse con el mundo material, la sociedad, la naturaleza y el mundo sobrenatural y en esas relaciones la msica juega un papel fundamental como propiciador de comunicacin . La cosmovisin andina supone la existencia de vnculos de identificacin y relacionamiento ntimo con la tierra, no podemos fragmentarla de sus dimensiones esttica, cientfica y religiosa. As, podemos afirmar que una de las principales caractersticas de la msica andina, tambin llamada autctona, es la concepcin ritual, es decir su existencia en momentos ritualizados, festivos y religiosos. Entre otras caractersticas tenemos el carcter grupal no solamente de su concepcin, puesto que no existe ningn autor intelectual (individual), sino tambin de su ejecucin que es grupal, colectiva (tcnica dialogada). No existen autores y solistas. Todo es social. Por eso tampoco es posible distinguir la nocin de espectculo, presenta en la msica occidental, donde podemos ver la separacin actor/espectador. La msica andina y el empleo de determinados instrumentos responden a la celebracin de las fiestas ms importantes del ciclo agrcola. Tanto ritmos como instrumentos son usados de acuerdo a los ritos y las pocas de siembra, cosecha y almacenamiento. (lluvias y seca) Tcnicamente podemos afirmar el carcter mondico(unsono), de la msica es la marca del ese carcter no moderno, propio de culturas que no tienen relacin con la polifona de la historia de la msica occidental. formales y de contenido que tienen que ver con

1.2 Mundo OccidentalLa msica trada por los europeos en pocas coloniales ya experimentaba un proceso de fragmentacin consagrado en la exaltacin del msico virtuoso, la separacin actor/espectador, el

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

10

carcter contemplativo de la dimensin esttica, la admiracin por lo bello, la polifona, armona, el uso de registros como el pentagrama, las tcnicas complejas de la afinacin y exactitud racional de la organizacin del sonido y sobre todo el carcter individual de su concepcin. Actualmente esas caractersticas se mantienen en el espacio de la produccin de la msica occidental no-boliviana, si la clasificamos por su origen, adems de un fenmeno importante surgido en este siglo: el mercado, es decir la necesidad de entrar en el sistema tcnico econmico de produccin, difusin y consumo. En esta vertiente encontramos como ejemplo la msica llamada clsica o erudita, el jazz, el rock, salsa cumbia etc, que tienen origen cultural geogrfico identificado.

1.3 Mundo MestizoDesde que comenz la conquista se inici el mestizaje. As como hubo mestizaje biolgico entre los andinos y los europeos, tambin hubo un rico proceso de mezcla cultural. Esto no quiere decir que all comenzaron a combinarse las formas musicales. Antes de la llegada de los espaoles, la cultura y en particular la msica se enriquecan a partir de la influencia de pueblos y grupos vecinos con los que entraban en contacto. La cultura siempre fue, es y ser dinmica, a no ser que est muerta. En este campo tenemos todas las formas de msica conocidas como folklrica, tradicional, la de los pueblos pequeos del pas, desde el taquirari, la cueca, la morenada, el huayo y a infinidad de estilos que persisten y son creados por los msicos. El neo- folklore, que a diferencia del folklore tradicional, le da importancia a la autora y tiene como principal caracterstica de insercin en los sistemas de registro fonogrfico y difusin masiva, tambin conocida como Industria Cultural. El espacio de la produccin de las fraternidades, en el que son recreados estilos tradicionales como la diablada, la morenada, recientemente la saya etc. Tambin se encuentra el espacio significativo, aunque con mucha relacin con la vertiente occidental, de la cumbia boliviana, conocida tambin como msica chicha, tropical, electrnica etc. Esta vertiente tiene en la cumbia su estilo bsico, pero adopta lo mestizo boliviano de manera

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

11

privilegiada en estilos que van desde la cueca, el huayo, la saya, morenada y otros bailables que sirven para amenizar las fiestas. Ms hacia el polo de la msica occidental estn todos los tipos de experimentaciones musicales, tales como las diversas fusiones del jazz y el rock con el folklore, composiciones sinfnicas o electrnicas con elementos folklricos, que tiene un carcter responden a actitudes de orden esttico ms profundo, por tanto ms elitistas. De estas lneas de produccin en el mundo mestizo, debemos destacar por su importancia y representatividad, no slo como produccin sino tambin por lo que representa econmica y culturalmente, en primer lugar a la Cumbia boliviana o chicha, porque es en este campo donde se produce ms que en cualquier otro en la msica nacional, porque es tambin all donde se encuentran los ms interesantes productos de hibridacin creativa, y tambin porque es donde ms existe actividad musical , movimiento econmico y por tanto actividad cultural. En un segundo lugar se debe destacar el campo de la msica folklrica, vinculada al mercado, e decir el llamado neo- folklore, por ser el segundo espacio de importancia para la produccin , innovacin y creacin de formas que retoman lo tradicional y lo adaptan a las nuevas condiciones de produccin y difusin musical, inclusive provocando importantes movimientos y fenmenos de revalorizacin y modernizacin musical. Luego est el de la msica de fraternidades que, si bien no es un campo tan fuerte como los dos anteriores, tiene importancia al funcionar como una especie de escenario donde en momentos festivos se descubren las tendencias de la msica nacional, en combinaciones en las que aparecen estilos hbil y curiosamente combinados de saya , huayo, morenada, cumbia, baladas, etc. Los dems campos, aunque son my ricos como propuesta renovadora, no llegan a la representatividad que supone trabajar con sistemas de asimilacin de la demanda, no slo de estilos, sino tambin de temticas. ms elaborado,

II. CONFLICTOSSin embargo la existencia de todos estos campos de produccin musical en Bolivia es frecuentemente conflictiva. Uno de los factores, entre otros, que promueve esa conflictividad es la presencia de la Industria Cultural.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

12

Las culturas andinas y el folklore estn en un proceso que podra ser definido como de debilitamiento, en el que sus caractersticas formales y de contenido se van alterando gracias a su ingreso o adopcin de los sistemas de industria cultural. En realidad no se puede hablar de msica en todos sus gneros, que no tenga que recurrir a la industria cultura para poder existir. La nica msica que tiene distancia con estos esquemas es la autctona y algo del folklore de las zonas rurales del pas.

2.1 IC y Msica AutctonaVarios son las incidencias de la IC en la msica autctona, cuando sta entra al sistema de produccin industrial, difusin masiva o tiene alguna aproximacin a las cultura masiva. La IC exigencia de adaptacin a los formatos estandarizados de registro fonogrfico, mutila el carcter cclico del tiempo de manifestaciones puras. Una de las caractersticas de la msica andina es el carcter cclico presente como estructura bsica. Se trata de una necesidad de retorno o repeticin del motivo o tema principal que est expuesto en perodos de tiempo largos que pueden durar horas y hasta das. Para la Industria Cultural el tiempo, tanto de produccin como el de difusin, es concebido linealmente, por tanto tiene inicio y fin, adems tiene valor mercantil. Por esa razn no se puede concebir una pieza producida en los marcos de esta industria con las caractersticas antes mencionadas, por tanto la nica forma de poder producir y difundir un tema autctono de regin andina es recortndola a un tiempo estndar de 3 minutos aproximados, crear una introduccin y un final; adems de proporcionarle arreglos en el tema , (motivo) de la pieza. Eso refierindonos a grabaciones masa o menos respetuosas de las formas bsicas de esta msica. Otro elemento importante como caracterstica es que la msica es monotemtica, lo que permite la memorizacin y repeticin a cargo de los miembros de las llamadas tropas que son grupos de 20 o 30 personas tocando los instrumentos. Este tema nico , para entrar a una grabacin industrial, en primer lugar es afinado, es decir, se uniformizan los sonidos hacia un afinado en base a la escala occidental de siete notas. Luego se coordinan los sonidos para lograr una ejecucin limpia, sin desafinaciones, ni descompaginacin por parte de los msicos. Es una suerte de higienizacin de la msica autctona que le quita la espontaneidad y libertad propias de la manifestacin original.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

13

Otro elemento de prdida formal es la descontextualizacin del tiempo y espacio originales. Toda esta compleja manifestacin hace parte de las representaciones culturales del las comunidades con elementos estticos, porque se pueden entender como actos de embellecimiento de la materia natural; cientficos, por cuanto son parte de celebraciones del calendario agrcola , lo que suponen actos de transformacin de a naturaleza en beneficio de la comunidad y religiosos, por tratarse de rituales que contactan el ser humano con sus figuras y mundo mitolgico. Por tanto estamos hablando de tiempos y espacios especiales, en los que ocurren reordenamientos simblicos de la vida cotidiana. Al entrar, esta manifestacin, a la Industria Cultural, ocurre un quiebre con estos elementos. En primer lugar se fragmenta la unin estrecha entre esttica, ciencia y mito, para privilegiar la primera, incorporando la dimensin comercial. a esto llamamos descontextualizacin, que arranca un aspecto del todo para convertirlo en algo otro distinto, con otra funcin, otro contexto y otro uso. Implcitamente est la separacin actor espectador que originalmente no exista por cuanto el msico era tambin parte de la comunidad y viceversa. Aqu se separan los dos sujetos y se inaugura una relacin que permite el goce esttico y la contemplacin de la obra de arte por seres extraos a ella, adems en contextos artificiales de reproduccin de la grabacin, ya no de presencialidad. Un siguiente paso es la espectacularizacin de la msica autctona que convierte una manifestacin compleja en mercanca, en objeto con valor de cambio. Estos elementos tienden a una homogeneizacin de la produccin cultura, pues todo tipo de manifestaciones culturales entran en moldes ajustados por la relacin oferta y demanda del mercado. Los invariante de la produccin musical tiene formas que tienden a ser universales que son legitimadas por los medios de difusin masiva por cuanto al empresario de medios masivos, tampoco le interesa arriesgar el uso de su tiempo radial o televisivo en productos que no se encuadran en los moldes antes mencionados. El sistema de Industria Cultural funciona sincrnicamente para permitir estas posibilidades de produccin y difusin de bienes simblicos.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

14

2.2 La IC y el FolkloreEntendemos por folklore a toda la cultura popular que se transmite de generacin en generacin sin vnculos con el mercado ni sus sistemas de produccin y difusin cultural. Asimismo entendemos por neo-folklore a la cultura popular que entra a los sistemas de produccin , circulacin, difusin y consumo de la industria Cultural. Al igual que en el caso de la msica autctona, el folklore tambin se ve afectado por la lgica de la IC en cuanto a aspectos formales y tambin de contenido. Como define Adorno, la IC es una sistema que trabajo especialmente por la obtencin de lucro en un sistema de mercado. Para ello, los empresarios invierten capital a fin de promover la produccin de bienes simblicos que atiendan las necesidades culturales de la poblacin consumidora. para ello, no existe preocupacin sobre aspectos de cultura, identidad, caractersticas propias, etc. Al contrario, el parmetro comercial se gua por lo rentable. En la msica folklrica, la IC imprime una serie de marcas que las podemos ordenar de la siguiente manera: Fuerte adaptacin de formas musical tradicionales. - Cuando las formas y contenidos no se ajustan a los patrones de la industria fonogrfica y difusin masiva, se procede a una adaptacin forzosa consistente en recortar tiempos, convertir formas monotemtica en bitemticas. estructurar cuerpos coherentes y equilibrados en base a introduccin, estrofa, coros , y repeticin de lo mismo y final. Estandarizacin hacia temticas individualistas,- Consistente en la baladizacin de las canciones que se concentran en temas de amor, en dos posibilidades: encuentro amoroso o desencuentro siendo ste ltimo el ms frecuente. un tratamiento melodramtico. En la actualidad el fenmeno de la baladizacin es una tendencia que absorbe inclusive formas que originalmente no tenan ninguna relacin con esa temtica. Por ejemplo, el Chuntunqui, que es un villancico antiguo de las navidades rurales, ha sido incorporado a travs de la IC al neo-folklore, incorporando le tras de canciones romnticas . Actualmente es uno de los ritmos ms importantes del neo-folklore boliviano. la balada latinoamericana es l base de canciones de las dcadas e 40, 50 , 60 del siglo XX, en las que se privilegia el tema del amor con

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

15

Pareciera que la tendencia de la produccin musical es la baladizacin tanto en forma como en contenido. Desde un punto de vista semiolgico se trata de temas con una fuerte marca de mensaje individualista, al no contemplar las temticas colectivas antiguas, paisajismo, orgullo por la tierra, ni el tratamiento humorstico y vulgar del folklore, sino solamente problemas de orden individual o de pareja. Para sectores crticos de la cultura masiva seran contenidos ideolgicos de una sociedad clasista. Asimismo no se percibe ningn contenido ilustrador u orientador de la sociedad, por cuanto se podra afirmar que carece de sentido educativo o conscientizador que tambin muchos sectores esperan encontrar en el arte. Posee todas las caractersticas del llamado arte de masas, producido en el mercado y condicionado por las reglas de oferta y demanda.

III La Necesidad de la Industria CulturalPara muchos la presencia de la IC tiene un efecto perverso para la produccin de la msica autctona y folklrica nacionales. El mercado no acaba se ser asumido como un espacio en el que tambin puede producirse buen arte. A eso se suma que en Bolivia existen importantes sectores que incentivan esas discusiones porque gracias a ellas obtienes lucros de orden material y tambin de orden simblico. Se busca defender las esencias y purezas de la cultura y la identidad nacional, para legitimar polticas culturales xenfobas y aferradas a un pasado esttico y sin dinmica. Con ello se gana prestigio y tambin dinero a travs de la industria del turismo que convierte grandes manifestaciones culturales populares en museos vivientes. Mientras esos sectores discuten sobre cultura y folklore, millares de consumidores de todas las clases sociales, escuchan msica para acompaar sus actividades cotidianas. Mientras los cultos se preocupan por las contaminaciones, los jvenes enamoran con canciones tildadas de alienantes. Mientras poderosos seores se preocupan por los cambios que experimenta la msica autctona, campesinos de regiones andinas aprovechan todas las oportunidades posibles para ocupar espacios que durante siglos les fueron prohibidos.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

16

As, estos sujetos producen y escuchan msica sin preocuparse

por las esencias,

inconsistencias, profundidades o simplezas de la msica. Porque lo que les interesa es remarcar sus relaciones interpersonales reales, adornndolas con msica, en rituales nuevos y viejos que les proporcionan satisfacciones los refrigeradores de la historia. Para ellos, ignorar el mercado y la IC es ignorar que fuera de ellos slo queda el abandono y que la creatividad de productores y consumidores debe considerar seriamente la reformulacin y apropiacin de las posibilidades que ofrece este sistema. Comprender la importancia de la IC en la Msica no slo debe ver el lado perverso de la desintegracin y la incoherencia, sino la resignificacin y apropiacin de los bienes simblicos en eventos muchos ms ricos que los aferrados al pasado, pero que son importantes no tanto por su pureza, sino por las posibilidades de interaccin (comunicacin) que permiten. explicables slo por ellos mismos y no por ningn discurso racionalista que busca esencias pretendiendo insinuar que la msica debera quedarse intacta en

Referencias Bibliogrficas:ADORNO,T.& HORKHEIMER, M. O Iluminismo Como Mistificao de Massa, In: ADORNO,T. A Indstria Cultural. In: COHN,G. Comunicao e Industria Cultural. 5 ed.So Paulo, Queiroz, 1987. BARBERO, Jess Martn, De los Medios a las Mediaciones. Mxico, Gustavo Gili, 1987. _______ Modernidad, Posmodernidad, Modernidades: Discursos sobre la Crisis y la Diferencia. Cali, Universidad del Valle (mimeo), 1991. BAKTHIM, Mikhail. A Cultura Popular na Idade Mdia e no Renascimento. So Paulo, HUCITEC, ed. UNB, 1987. BOSI,Alfredo. Cultura Brasileira. In: Mendes Trigueiro (coord.). Filosofia da Educao Brasileira. Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 1985. _______ Plural mas No Catico.In: Cultura Brasileira: Temas e Problemas. So Paulo, Atica,1987. _______ Dialtica da Colonizao. So Paulo, Companhia das Letras, 1992. BOUYSSE,Cassagne & HARRIS, Olivia. Pacha, en Torno al Pensamiento Aymara.In:Tres Reflexiones Sobre el Pensamiento Andino La Paz, Hisbol,1987. BOURDIEU, Pierre. El Espacio Social y la Gnesis de las Clases.In: Estudios sobre las culturas Contemporaneas.n7. Colima, septiembre, 1989. DIAZ GAINZA, Jos. Msica Boliviana, La Paz. Puerta del Sol, 1977. GARCIA CANCLINI, Nestor. Las Culturas Populares en el Capitalismo, Mxico, Nueva Imagen, 1982. GUARDIA, Crespo Marcelo; Msica Popular y Comunicacin en Bolivia: las interpretaciones y conflictos; segunda Edicin; Cochabamba; UCB; 2001. _______. Mediaciones en la Mira; culturas populares, recepcin, educacin y desarrollo; en Rev Contribuciones; Buenos Aires; CIEDLA1988.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

17

_______, Comunicacin Carnavalesca en Bolivia; Imaginario en tres Escenarios de Proyeccin; ponencia en el IV FOLKCOM; Universidade Federal de Mato Grosso do Sul; Campo Grande -Brasil; junio - 2001. JAMBEIRO,Othon. A Cano de Massa: As Condies de Produo. So Paulo, Pioneira,1975. MONTES, R.Fernando. La Mscara de Piedra: Simbolismo y Personalidad Aymaras en la Historia. La Paz, Quipus,1984. MONSIVAIS,CARLOS. Notas sobre Cultura Popular en Mxico, Historia General de Mxico, vol. 4, el Colgio de Mxico, 1976. SIEGMASTER,Elie. Msica y sociedad. Mxico, 2ed. Coleccin Mnima,1980. URBANO,Enrique (org,). Modernidad en Los Andes: Un Tema y Un Debate. (Introduccin). Cuzco, CERA, 1990.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

18

Folkcomunicao em Portugal: a esfera permevel da literatura oralCarlos Nogueira

Resumo: O intercmbio entre o patrimnio folk artstico-verbal e os meios de comunicao de massa configura uma curiosa forma moderna de compatibilizao entre o antigo, o integral ou residual da tradio oral, o progresso tecnolgico acelerado e a voragem cada vez mais intensa da publicidade. Sinalizar, conhecer e estudar essa nova biblioteca ou videoteca oral, esses produtos simultaneamente arcaicos e modernos, compreend-los no novo quadro social, histrico, econmico, antropolgico e cultural, significa interpretar melhor os valores simblicos e psicolgicos associados voz humana, o homem moderno e a sociedade da informao. No espao meditico portugus (e ibero-americano), a oralidade mediatizada mecanicamente, portanto diferida, adiada, prolongada, repetida no tempo e no espao, interioriza a memria colectiva e ao mesmo tempo expressa-a, espacializa-a. por isso que a voz, mais habitualmente do que a escrita, assume na poesia um discurso ertico explcito, a que modernamente se junta a fora da imagem estilizada. A reiterao que caracteriza essas vozes mediatizadas despersonaliza-as, mas essa propriedade no lhes retira a sua vocao comunitria, o que significa que uma oralidade mediatizada que se alimente do folclore oral pertence assim, por direito, cultura de massas.

Na supermediatizada sociedade portuguesa (europeia e no s) dos nossos dias, fusiona-se o tradicional antigo com o tradicional novo, quer dizer, o produto que, de certa forma, j nasce tradicional, porque radicado ou directamente descendente de um todo por natureza tradicional, como sucede com os enquadramentos publicitrios de textos orais folclricos ou com a sua estilizao por parte de msicos e cantores bem preparados, com a divulgao de narrativas tradicionais ou de outras tipologias em suportes como a televiso, a rdio, a Internet, a cassete de vdeo ou de udio, manuais escolares ou livros infantis (banda desenhada, ou edies ilustradas em verso ou prosa). Num cotejo genrico com o sistema de prticas literrias consideravelmente activo at aos anos 70 do sculo XX mais integrado e integrador, inclusivo e lento , diramos que a disseminao global de formas simblicas promove hoje a produo de padres de pensamento

Centro de Tradies Populares Portuguesas Prof. Manuel Viegas Guerreiro Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

A presente comunicao deve muito ao referencial cientfico enformado pela teoria e pela metodologia folkcomunicacional de Luiz Beltro e seus seguidores, de entre os quais nos permitimos citar o nome do Prof. Marques de Melo, cujos estudos na rea das cincias da comunicao e, em particular, da folkcomunicao tm iluminado os nossos mais recentes estudos sobre literatura oral / tradicional / popular portuguesa. recente o nosso contacto com o pensamento de Luiz Beltro compreende apenas alguns dias, desde que, entre 1 e 4 de Maio, participmos, com uma comunicao sobre a literatura de cordel portuguesa, na V Conferncia Brasileira de Folkcomunicao, consagrada Imprensa do Povo , pensamento com que, curiosamente, j comungvamos, a partir do momento em que comemos a querer detectar e compreender a comunicao artstica de nvel popular, nos seus moldes mais antigos como nas suas novas modalidades, particularmente as que se alojam ou so usadas pela indstria publicitria e cultural. Esta para ns uma nova fase de estudos, aliciante e promissora, pelos caminhos e problemas da sociedade de informao e pelas linhas de pesquisa interdisciplinar das cincias da comunicao, com vista a um entendimento mais efectivo e totalizador das literaturas marginais ou marginalizadas. Literaturas, como se sabe, ainda muito prejudicadas nos circuitos acadmicos oficiais por preconceitos ideolgicos, polticos, socioculturais e estticos.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

19

cultural muito mais fragmentados, sujeitos a questionamento e a derivaes generativas que no contrariam o processo activo que sempre a tradio. Outrora veiculados atravs da oralidade momentnea ou de objectos impressos de consumo popular como os folhetos ou as folhas volantes, os universos culturais simblicos, digamos, em vez de folclricos, patrimoniais, para evitarmos a ambiguidade do termo folclore1, conhecem, na sociedade ultramediatizada psmoderna, um tratamento cada vez mais calculado, em obedincia a objectivos propagandsticos ditados pelas regras do mercado capitalista. Mas nem por isso, mutatis mutandis2, o seu papel menos relevante na nossa aldeia global, pautada pela internacionalizao da cultura, processo estribado em valncias que acabam por garantir a continuidade de traos culturais que, de outra forma, no teriam validade, ou teriam menos legitimidade, no mundo ps-moderno. No outra a funo desempenhada pela edificao antes de mais memorstica (e nalguns casos, quando apressada, fraudulenta) decorrente da aco dos ranchos folclricos, muito dependentes da indstria do entretenimento, que trazem a oralidade literria para uma espcie de palco teatral, numa actuao que, tendo perdido o valor ritual festivo que ao mesmo tempo transcendia o sentido grupal e individual, interioridade e colectividade, deslocada para um novo estdio evolutivo, com sentido, em primeiro lugar, para aqueles que nela intervm como actores reais. A princpio, sobretudo no Brasil, um instrumento das elites, a televiso tornar-se-ia progressivamente um espao de resgate do folclrico e, com ela, outros meios de comunicao social, como a rdio, o cinema, a imprensa falada e escrita, a rede digital, responsveis, no pela morte dos segmentos folclricos, como muitos vaticinavam (e ainda vaticinam), mas pela suaIndependentemente da forma mais ou menos flexvel como encaremos os termos contguos ou, nalgumas propostas, sinnimos de folclore, como cultura, cultura popular, cultura de massa e patrimnio cultural (expresso mais neutra, que, segundo a UNESCO, no nosso ponto de vista com legitimidade, deveria substituir o termo folclore, criado por William John Thoms, e divulgado pela primeira vez em 22 de Agosto de 1846 na revista The Atheneum, numa altura em que poucos se preocupariam com a recolha e o estudo das mltiplas subculturas), h vectores que no podem deixar de figurar numa conceituao que no falseie alguns dos pressupostos bsicos desse universo inabarcvel, na sua espantosa diversidade e contnua mutao: a aceitao e o reconhecimento colectivos; a tradicionalidade, que implica anonimato e um espectro temporal considervel, sem fronteiras cronolgicas precisas, capaz de permitir o enraizamento de ideologias, pensamentos, idiossincrasias, objectos, usos e costumes no complexo da prtica sociocultural, traduzvel, muitas vezes, como no folclore literrio, em variantes que asseguram o movimento das partes que compem o todo cultural; funcionalidade, no sentido de uma relao comunicativa profcua com o meio, conhecido ou desconhecido (por exemplo, objectos decorativos ou instrumentais, como bonecos de barro que figuram pessoas empricas ou entidades religiosas ou mgicas, colares, espanta-espritos, etc., ou, no patrimnio verbal devocionrio, as oraes, os ensalmos e os conjuros, que pretendem agir sobre o misterioso, o sobrenatural); e dinamismo, na acepo de equivalncias e constantes cumplicidades com os novos tempos. De entre os estudos que abordam esta questo, cf. Alan Dundes, The Study of Folklore, N. J., Prentice-Hall, Englewood Clifs, 1965, p. 2; e Amrico Pellegrinni Filho, Comunicao Popular Escrita Mundial O Processo, So Paulo, Edio do Autor, 1998, p. 11 e ss. 2 Num apontamento lcido, o poeta Antnio Amrico de Medeiros, j com mais de trinta anos de escrita cordelstica, refere-se deste modo importncia do cordel brasileiro: A cultura nordestina/ Manda que toda nao/ Entenda o que cordel/ Recordando a tradio/ Isto para provar/ Como foi nosso lugar/ O tempo muda a feio (Os Mestres da Literatura de Cordel, Fortaleza Cear, Editora Tupynanquim).1

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

20

modernizao participada, pragmtica, e, diramos, no necessariamente programada (de onde, pensamos, o principal mrito dessa redistribuio do patrimnio comum, mesmo que apenas local ou, mais propriamente, nas multiplicadas pormenorizaes locais, sempre dependentes de uma matriz comum). Nos objectos publicitrios, o segmento literrio obedece a uma brevidade potico-musical que garante a sua funcionalidade o texto oral, literrio ou no, mas sobretudo o primeiro, sob pena de ruir logo ao nascer, um texto antes de mais persuasivo , seja nas vozes que ecoam desde o fundo cultural comunitrio, seja nas vozes criadas originalmente para o registo meditico (visual-sonoro ou impresso), de onde podem libertar-se para viver na oralidade. O caso do slogan criado por Fernando Pessoa para a coca-cola, nos incios do sculo XX Primeiro estranha-se, depois entranha-se , ou o sugestivo H mar e mar, h ir e voltar de Alexandre ONeill, hoje clssicas formas breves, ilustram de forma plena esta tendncia irrepreensvel de renovao sucessiva do caudal oral literrio que independentiza a idiossincrasia de uma comunidade ou de um pas. Caudal que, no que concerne simbiose entre o antigo comunal e o novo autoral, muito deve a figuras tutelares como Jos Afonso, Vitorino, Fausto, Isabel Silvestre ou Srgio Godinho, com congneres brasileiros de no menor qualidade e importncia (ao funcionarem como representantes dessa cultura pop que atravessa classes sociais, desfazendo a ciso culto-popular), como Chico Buarque, Caetano Veloso e Elba Ramalho. Nas obras frteis e diversificadas destes cantautores, o substrato ideolgico-cultural mais ou menos invariante da populao o intimismo, a religiosidade (mesmo que difusa, intraduzvel, imperceptvel), a ateno concedida ao belo, nas suas diversas formas, concepes humanistas bsicas, como a justia, a honestidade, a luta por valores tico-morais universais articula-se com os novos valores de cidadania, de que as metamorfoses operadas entre o binmio masculino/feminino constitui talvez o paradigma mais revolucionrio. Se essa intercesso se faz com especial argcia pela via dos contedos, a parte estrutural e formal no menos importante no palpitante mundo moderno, que no dispensa leis bsicas da tradicionalidade literria, como a clareza conceptual (sem que com isso o texto surja destitudo de ambiguidade, um dos principais mecanismos produtores de poeticidade), o ritmo e a rima cantantes, smbolos e imagens radicados na identidade do grupo ou dos grupos. O patrimnio tradicional mediatizado insere-se num fundo cultural slido que podemos designar de supercultura3, no sentido de um nvel em que se movem formas dinmicas objectos3

Para o desenvolvimento deste conceito funcional, cf. James Lull Multiculturalismo y la supercultura, in Cicilia Maria Krohling Peruzo e Jos Benedito Pinho (orgs.), Comunicao e Multiculturalismo, Intercom 2000, So Paulo/Manaus, Intercom, Universidade do Amazonas, 2001, pp. 61-97.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

21

mediticos, publicitrios, de conformao esttico-literria que promovem o auto e o heteroentendimento, os sentimentos de pertena e de identidade, numa reconfigurao acelerada do espao simblico-cultural. Se evidente que a literatura de transmisso oral antiga (embora a evoluo sempre se tenha processado) tende a desaparecer enquanto fenmeno de comunicao interpessoal e comunicacional intensivo, num dado tempo e num dado lugar, no menos verdade que o alcance sociolgico da questo no to linear como pode parecer. Repetimos que a esta arte com um significado esttico muito particular no esto vedados os circuitos de massificao informativa e de lazer modernos. Nas novas formas e funcionalidades assumidas pela literatura oral, como tambm a cultura popular genericamente considerada, intervm um refinamento que se apropria da essncia da beleza desses objectos literrios que no esgotaram a sua fora estticocomunicativa. Seramos muito ingnuos e crdulos se pensssemos que a literatura oral poderia ou deveria continuar a ser uma reproduo exacta das formas cristalizadas nas muitas colectneas existentes (escritas, sonoros ou audiovisuais) de que dispomos. Mas, curiosamente, o discurso nostlgico comum entre os estudiosos do sculo passado, alguns deles ainda enrgicos em produo, passou para no poucos dos mais jovens pesquisadores de cultura literria tradicional, como se pode perceber facilmente em publicaes do gnero e em discursos pronunciados em colquios, conferncias, encontros. Em 1974, Renato Almeida escrevia um belicoso pargrafo a propsito dos cantadores populares brasileiros e da literatura de cordel brasileira, insurgindo-se contra a contaminao do folclrico pelo urbano: Ns os vemos reproduzidos hoje nos nossos cantadores, cuja arte contudo das mais ameaadas pelo impacto da civilizao material. Vo perdendo sua funo e diminuindo o seu interesse. E o que pior eles prprios se deixam influenciar pelas cidades, vm se exibir nas capitais, nos rdios e televises, conspurcam sua pureza e se tornam atores. Esto fazendo da literatura de cordel, para a qual ambicionam copyright, instrumento lucrativo. No s a civilizao que os desloca, eles mesmos ambicionam incorporar-se civilizao, transformando a vida andeja e bomia, hoje aqui e amanh ali, em profisso organizada, talvez com sindicatos e proteces trabalhistas... esse um dos sectores mais ameaados, inclusive por uma srie de mistificadores, sem contar com os empresrios, que j os levaram at a cantar para propaganda eleitoral4.

4

A Inteligncia do Folclore, 2. ed., Rio de Janeiro, Companhia Editora Americana / Instituto Nacional do Livro/MEC, 1974, p. 79.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

22

Vrios erros prejudicam este bloco textual, suficiente por si s para inviabilizar a criatividade do ttulo da obra A Inteligncia do Folclore que, de outra forma, resumiria perfeitamente o valor e a capacidade de reinveno constante do que entendo por folclore5. Mesmo acreditando que o autor j ter reformulado a sua viso de um fenmeno que se caracteriza mais pela renovao do que pelo apagamento, mais pela destreza acutilante do que pelo estatismo, devemos assinalar que uma posio assim extremada esquece uma das mais interessantes e visionrias ideias de Luiz Beltro: a ideia de que a folkcomunicao no suporta fronteiras estanques entre o popular e o massivo, o urbano e o rural, princpio basilar nos seus escritos sobre Comunicao e, em particular, na sua tese de doutoramento, intitulada Folkcomunicao Um Estudo dos Agentes e dos Meios Populares de informao de Fatos e Expresso de Idias6. As mais recentes produes cordelsticas provam que o empreendimento folkcomunicacional associado ao cordel tem sido estimulado pelas novas tecnologias, permitindo, por exemplo, a divulgao em CD-ROM da arte dos cantadores violeiros, orgulhosos por via dessa fixao do seu conhecimento independente de critrios estritamente acadmicos7. As principais linhas de fora desta literatura tm resistido ao impacto intenso das novas formas de evaso ldica, informao e sociabilidade, mantendo a superior altivez da sua fora esttica, que hoje seduz um pblico muito mais numeroso oriundo da elite intelectual da sociedade (brasileira e no s), e sintonizando-se com o lastro das novas ideologias. O sentimento de margem desses cantadores agora certamente menor, desde logo porque, ao serem tutelados por figuras acadmicas proeminentes e procurados pela imprensa, esto mais conscientes do valor da sua palavra em aco, da sua visibilidade cada vez maior, e, portanto, da sua contribuio capital para a consciencializao poltico-social das camadas mais desfavorecidas das vrias comunidades8. Renato Almeida esquece, por outro lado, que nunca a cultura tradicional teve um purismo5 6

Cf. nota 1.

Braslia, Universidade de Braslia, 1967. Essa tese foi recentemente publicada na ntegra, depois de, por razes de ordem poltica, ter circulado mutilada, com o ttulo Comunicao e Folclore (So Paulo, Melhoramentos, 1971): Antonio Hohlfeldt e Juremir Machado da Silva (coordenadores da edio), introduo de Jos Marques de Melo, Porto Alegre, EDIPUCRS, 2001. No impunemente que To Azevedo afirma: Sou formado numa escola/ O seu nome natureza/ Meu diploma a viola/ Num ponteio de grandeza/ Do jeito que canta a gua/ Quebrando na correnteza (Faculdade sertaneja, in 50 Anos de Cultura Popular Cantos Do Brasil Puro, Kuarup Discos KCD 158). Na sua j citada histria do cordel, precisamente em formato cordelstico, Antnio Amrico de Medeiros alude a nomes de poetas ainda no activo e a tipografias que lucram com esta produo: Ainda esto atuado/ Juvenal Evangelista/ Antnio Amrico Medeiros/ E Octaclio Batista/ Pedro Bandeira de Caldas/ Cantador e cordelista.// Ccero Pedro de Assis/ E Machado Nordestino/ Manoel Monteiro em Campina/ Em Aracaju Joo Firmino/ Luiz Gonzaga de Lima/ E Vicente Vitorino.// Tem a casa da Criana/ Na cidade de Olinda/ Tambm trabalha em cordel/ E faz uma obra linda/ Comandada por Bacaro/ Que a nossa classe brinda.// Ainda esto na ativa/ A Editora Luzeiro/ Faz o cordel em So Paulo/ Vende para o mundo inteiro/ E no nordeste em Recife/ A Editora Coqueiro (Os Mestres da Literatura de Cordel, pp. 14-15).

7

8

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

23

absoluto, nem o poderia ter, sob pena de rapidamente se expor a uma dissecao arqueolgica, dependendo, antes, da incorporao de novos materiais que desencadeiam a evoluo da morfologia de um objecto, de um rito, costume ou expresso oral j existentes; como esquece o trnsito evidente de palavras, textos literrios, modas, rituais entre o meio rural e o urbano, ou entre a criao artstica e os modos inventivos artesanais, habitualmente determinados pela funcionalidade. Nos estudos dos processos evolutivos e dos mecanismos de transmisso e de recriao da cultura folclrica literria, a figura do especialista ou agente difusor desse conhecimento deve merecer uma ateno especial, porquanto nele que conflui, como num painel selectivo, o tratamento de resduos arcaicos com novas substncias, fonte e fundamento de novos produtos. Mau grado os modernos processos tecnolgicos tendentes fixao de uma determinada verso de um produto literrio, continua a ser verdadeiro o postulado de que, no processo de transvase prefigurado pelos mecanismos comunicacionais populares recobertos pelo termo folkcomunicao, nos quais intervm procedimentos, ideias, pensamentos e opinies, no h verses autenticamente definitivas. O desenvolvimento da indstria publicitria determinou o aparecimento de um tipo de agente poderoso o publicitrio , cuja aco ultrapassa o circuito da pequena sociedade rural, palco por excelncia, embora no exclusivo, de personagens como o cego cantador, que podia acumular vrias funes (a de vendedor, poeta-produtor e intrpretepoeta), o intrprete (que tambm reelabora o edifcio da oralidade artstica, ao recuperar e transformar os textos que existem em estado latente) ou o versificador local (numeroso no sul de Portugal, mas at agora pouco estudado9), que renova a oratura tradicional com as suas aportaes pessoais. Ligados a agncias ou empresas de publicidade, esses criadores de sonhos valem-se da energia magntica da palavra numa altura em que se diz precipitadamente que a palavra est em crise10 , em articulao com uma elaborada linguagem flmica, no obstante a

9

Interventor no circuito social local ou regional com as suas cantigas mordazes, crticas, ferinas, hoje com um alcance substancialmente maior do que o corrente h algumas dcadas atrs, por intermdio de suportes e canais radiofnicos, televisivos, impressos, virtuais vistos como opositores implacveis da vocalidade artstica de rua, de feira, do serto e de outros espaos abertos, o autor e intrprete de cordel brasileiro tem ainda, em Portugal, congneres activos de grande mrito, sobretudo no Alentejo e no Algarve (cf. Paulo Lima, Artistas da fala a sul do Tejo, in Jorge Freitas Branco e Paulo Lima (orgs.), Artes da Fala, Colquio de Portel, Oeiras, Celta Editora, 1997, pp. 47-85). bem diversa a nossa opinio, cautelosa, como no poderia deixar de ser, mas optimista, porque acreditamos no aproveitamento que das novas tecnologias pode ser feito em favor da desejvel democratizao e revalorizao da literatura (nas escolas, quase sempre os mtodos cientficos asfixiam a orgstica erotizao das palavras), seja na sua vertente autoral, culta, seja na modalidade annima, colectiva, popular ou pop. Mesmo que seja por mero acaso, quando, por exemplo, se adopta o famoso zapping, os espectadores de televiso que nunca (ou quase nunca) leram um livro ou um poema deparam com frequncia com um universo (livresco, literrio) que, de outra forma, lhes passaria totalmente despercebido. Nem que seja uma vez por ano, no dia internacional da poesia, quando os

10

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

24

singeleza aparente do cdigo que suporta a mensagem, num minucioso produto cujo envolvimento sensorial e cognitivo pensado ao segundo. A mudana de forma essencial na literatura de transmisso oral, que hoje passa de puramente vocal e instrumentalizada a oral mediatizada electronicamente, audiovisual, o que implica que a imagem, j no a imagem esttica (xilogrfica ou procedente de processos mais modernos de impresso) mas a imagem em movimento, cumpre com especial acuidade o seu papel de mediao da mensagem entre a fonte um conjunto de tcnicos de publicidade (de comunicao) bem treinados e os receptores. O recente anncio televisivo do azeite Gallo, que recupera uma msica tradicional11, ou o tambm recente slogan radiofnico atinente a um tarifrio da rede telefnica mvel TMN, que assenta em dois versos de uma conhecida frmula de seleco infantil (Um d li t/ Cara de amendo), evidenciam como, a partir de tcnicas propagandsticas urdidas com eficincia pragmtico-comunicativa, se alcana uma estratgia no programada de mobilizao e democratizao da cultura oral popular, que assim pode libertar-se com maior legitimidade da conotao de infraliteratura que lhe est associada h demasiado tempo. Objectos literrios folclricos pertencentes memria resistente de certas faixas sociais ou de todo um pas acabam assim por ser absorvidos e devolvidos sociedade por uma estrutura que muitos ainda julgam ser incompatvel com a palavra literria comunal. E nem se trata aqui de comunicao artificial suspensa entre a evoluo e o conservadorismo, antes de uma purificao que conjuga elementos da cultura popular / oral / tradicional, da cultura de massas e da cultura erudita, numa prova notvel de ligao s manifestaes populares que muitos dizem irremediavelmente perdidas. uma literatura, nas suas multiformes manifestaes, pronta a emergir do p que cobre muitas das suas prticas e das suas especificaes textuais, antes de mais porque percorrida por uma profunda humanidade. Os recursos, as temticas e os valores que permitiram o seu progresso no passado mantm-se fundamentalmente os mesmos: a complexa relao homem / mulher, o amor, a morte, o humor, a ironia, o riso, a linguagem firme, consistente e potica, para apelar aos sentidos e, dessa forma osmtica, combinar emoo comtelejornais e programas de ndole cultural falam do tema e colocam no ar declamaes clebres, como sucedeu neste ano de 2002 com a interpretao do poema Poeta castrado, no pelo prprio Jos Carlos Ary dos Santos. Convivem hoje duas formas de literacia a do impresso e a do audiovisual , mais complementares do que opositoras, ambas propcias alteridade e a uma nova literacia, compsita, impressa, sonora, visual, digital, analgica (sobre este assunto, cf. o notvel livro de Jos Afonso Furtado, Os Livros e as Leituras Novas Ecologias da Informao, Lisboa, Livros e Leituras, 2000).11

Obedecendo ao princpio da simplificao, o anncio inclui agora apenas, em fundo suave, a parte instrumental, sem que se perca a identidade da pea oral tradicional subjacente, uma vez que todos os portugueses reconhecem a cano integral que lhe corresponde: rama, que linda rama,/ rama da oliveira,/ o meu par o mais lindo/ que anda ali na roda inteira.// Que anda ali na roda inteira,/ ali, em qualquer lugar,/ rama, que linda rama,/ rama do olival.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

25

intelectualizao, razo com emoo. Recordemos, por exemplo, que os valores que regem ou regiam os heris dos folhetos de cordel clssicos so, no fundamental, os mesmos que engrenam as oposies bem / mal, riqueza / pobreza operadas dos mais modernos filmes de aventuras de Hollywood, porque radicados na prpria essencialidade do ser humano enquanto estrutura em (des)construo permanente, na busca da compreenso de si mesmo e da relao com a natureza e com os outros12. So paradigmticas as estilizaes e execues de romances tradicionais, de cantigas lricas ou narrativas (como a Pastorinha, uma das mais puras do ponto de vista esttico13) da12

Em Portugal, predomina ainda a postura negativista face runa da literatura de transmisso oral, embora algumas vozes, erguendo-se estrategicamente no meio acadmico portugus, tenham conseguido nos ltimos anos inverter consideravelmente essa viso deformada de um fenmeno que est longe de constituir uma massa inaltervel e passiva: cf. Francisco Topa, Literatura Oral Pare, escute e olhe, in Revista da Faculdade de Letras Lnguas e Literaturas, II Srie, vol. XVII, Porto, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2000, pp. 441-450; Arnaldo Saraiva, Do cancioneiro e desde cancioneiro, prefcio a Carlos Nogueira, Cancioneiro Popular de Baio, vol. II, in Bayam, n.os 7-10, Baio, Cooperativa Cultural de Baio Fonte do Mel, Janeiro de 2002, pp. 7-9; e Carlos Nogueira, Introduo, in Cancioneiro Popular de Baio cit., pp. 11-22.13

Texto subordinado temtica amorosa, uma das mais abundantes, como se sabe, no romanceiro e no cancioneiro narrativo tradicional, no que aquela envolve de riscos, anseios e realizao humanas. Os poemas narrativo-dramticos que configuram esses espaos genolgicos, no contexto da teoria e da metodologia da folkcomunicao, so geralmente as espcies textuais que mais carcter e contedo jornalstico comportam, divulgados por agentes cantadores populares profissionais, como os cegos, ou executantes mais ou menos ocasionais do prprio grupo e meios a oralidade ou a dualidade oral escrito, na modalidade do folheto e da folha volante que promovem o conservadorismo mas tambm a mudana social. Um pai tinha uma filha que andava co gado no monte; ela j era grandinha, o pai queria traz-la para casa, e ela no queria. Depois, o irmo, que chegara do Brasil, perguntou-le pela irm, e o pai disse-le que ela no queria vir, e o irmo disse que a traria. E ento se passou o seguinte: Deus te salve, Rosa, clara to formosa! Linda pastorinha, que fazes aqui? Por esta montanha a guardar meu gado; J nasci, senhor, para este fado. Por estas montanhas tambm corre perigo; Queira a pastorinha, quer ir comigo? Palavras mal dadas dum homem honrado; Como hei-dir consigo e deix-lo meu gado? Voc ingrata, to impertinente; No falo consigo como a outra gente. Seu sou ingrata, passe muito bem; Queu sou ingrata.... assim me convm. Sassim le convm, com bem se v embora, V guardar o gado pela serra fora. Pola serra fora isso vou fazendo; Quo amor tanto, j me vou rendendo.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

26

responsabilidade de grupos conceituados, profissionais ou amadores, como a Brigada Victor Jara ou a Ronda dos Quatro Caminhos, ou de cantautores clebres como Jos Afonso, Vitorino ou Fausto. Essas interpretaes modernas, para l da importncia do estilo textual, continuam a depender muito de tudo o que torna a voz humana no mais prodigioso dos instrumentos humanos, mormente o tom e o timbre, o sentido do ritmo e os impulsos sensoriais, em comunicao directa com a movimentao corporal, num intercmbio que acciona o binmio poesia / corpo, indissocivel dessa relao artstica, como tm notado Paul Zumthor e Ruth Finnegan nos seus clebres trabalhos sobre poesia oral14. Atravs da voz, o intrprete comunica ao seu corpo e, por contgio rtmico-magntico, ao dos ouvintes um valor expressivo que potencia a poetizao, a emocionalizao e a percepo da mensagem. Um ecr menos nobre do que o televisivo ou cinematogrfico formado pelas paredes das retretes, que foram ou so um espao privilegiado de difuso de mensagens marginais e marginalizadas no mosaico constitudo pela imprensa do povo (t-shirts, pratos, faianas, azulejos, etc.). Imprensa reveladora da descontraco conceituosa popular portuguesa sria e bemhumorada, anmica e fisiolgica ou do jeitinho brasileiro de comunicar, para aproveitarmos as palavras de Sebastio Breguez, autor de uma recolha de quadras grafticas em Governador Valadares, que designa de frases da privada15, entre as quais figura uma variante do famoso grafito portugus Neste lugar solitrio/ Onde a vaidade se acaba,/ Todo o cobarde faz fora,/ Todo o forte se caga. Presidida pelo mesmo critrio estilstico e estrutural uma primeira parte supostamente gnmica, solene, e um segundo momento abrupto e escatolgico , a verso

Vamos pera a sombra quaqui faz calor, E l experimentaremos o nosso amor. Pastorinhos do monte, guardai o meu gado! Foge a pastorinha co seu namorado! to namorado, no me digo nada! Qua aposta que eu fiz levo-a ganhada. E levou-a para casa. (S. Tom de Covelas, c. de Baio, 1902: in Jos Leite de Vasconcelos, Romanceiro Portugus, II, Coimbra, Por Ordem da Universidade, 1960, pp. 385-386). Entre as obras mais importantes desses autores, cf., respectivamente, Introduction la Posie Orale, Paris, d. du Seuil, 1983, e Oral Poetry Its Nature, Significance and Social Context, Bloomington and Indianapolis, Indiana University Press, 1992.15 14

Material gentilmente disponibilizado atravs de correio electrnico pelo prprio Sebastio Breguez, numa atestao inequvoca de que a Internet constitui um sustentculo notvel desta literatura breve, fragmentria, volante, apta a hospedar-se em novos ambientes (o ecr, a disquete, a folha de papel), a fazer-se mover com maior rapidez e a tornarse mais universal do que quando dependia de processos artesanais de inscrio e difuso (a carvo, giz, lpis ou caneta, em paredes de tijolo, cimento, azulejo, madeira).

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

27

brasileira menos disfemstica do que a lusa, mas no menos propiciadora da obscenidade, do sorriso ou do riso, a mais divulgada e a mais eficaz teraputica dos marginalizados: Neste lugar solitrio/ Toda verdade se acha,/ Todo covarde faz fora/ E todo valente se agacha. Esse mesmo princpio construtivo calculista, insidioso, se observa numa outra quadra em que actua tambm o primeiro verso formulstico (a tese de coincidncia textual, que no rara na poesia oral, no parece aqui plausvel, dada a especificidade lingustica e imagtica do referido verso), embraiante da esttica do obsceno que opera na segundo dstico: Neste lugar solitrio/ Sinto uma tristeza profunda,/ Quando a bosta cai na gua / E a gua bate na bunda. O eterno enigma do folclore literrio ou do patrimnio verbal artstico reside justamente na sua notvel independncia, na era da contaminao das tradies (que logo partida coloca problemas intrincados, quando se trata de distinguir o antigo do novo e passageiro, o integral do fragmentrio) e, simultaneamente, da sua preservao na transformao, sob o postulado da identidade na diversidade, do local no global.

Porto, Maio de 2002

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

28

Folkcomunicao, contribuio brasileira Teoria da ComunicaoJos Marques de Melo16Sumrio: Relato histrico sobre a primeira tese de Doutorado em Cincias da Comunicao, defendida pelo Professor Luiz Beltro, na Universidade de Braslia, em 1967, estabelecendo as bases da nova disciplina cientfica, a Folkcomunicao. Trata-se de um episdio importante para a memria do campo comunicacional brasileiro, confirmando o protagonismo do autor da referida tese, que tambm fundara a nossa primeira revista cientfica de comunicao, sendo por isso mesmo considerado como o pioneiro das Cincias da Comunicao no Brasil. Palavras-chave: Histria das Cincias da Comunicao. Pensamento Comunicacional Brasileiro. Folkcomunicao. Biografia. Luiz Beltro Resumo: Relato histrico sobre la primera tesis de Doctorado en Ciencias de la Comunicacin, defendida por el Profesor Luiz Beltro, en la Universidad de Braslia, en 1967, estableciendo las bases de la nueva disciplina cientfica, la Folkcomunicacin. Se trata de un episodio importante para la memoria del campo comunicacional brasileo, confirmando el protagonismo del autor de la referida tesis, que tambin fund nuestra primera revista cientfica de comunicacin, siendo por eso mismo considerado como el pioneiro de las Ciencias de la Comunicacin en el Brasil. Palabras-chave: Historia de las Ciencias de la Comunicacin. Pensamiento Comunicacional Brasileo. Folkcomunicacin. Biografa. Luiz Beltro Abstract: Historic report on the first Brazilian PhD Dissertation in the field of the Communication Sciences, presented by Professor Luiz Beltro at the National University of Braslia, in 1967, founding a new sicientific discipline labeled as Folkcommunication. It is an historic chapter for the memory of the Brazilian communication scholarship, pointing out the pioneer trajectory of his author, who had also created the first Brazilian Journal on Communication, gaining later recognition as the Founding Father of the Communication Sciences in Brazil. Key-words: History of the Communication Sciences. Brazilian Thought on Communication. Folkcommuniation. Biography. Luiz Beltro

Luiz Beltro de Andrade Lima (1918-1986) destaca-se no panorama intelectual brasileiro como figura paradigmtica17. Seu nome est imediatamente associado Folkcomunicao disciplina que integra o universo das Cincias da Comunicao18. Se consultarmos duas obras de referncia da literatura comunicacional brasileira veremos que Luiz Beltro sinnimo de Folkcomunicao19:

16

Professor Emrito da Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo (ECA-USP). Atualmente Titular da Ctedra UNESCO de Comunicao na Universidade Metodista de So Paulo (UMESP) O perfil biogrfico de Luiz Beltro est contido no livro organizado por Roberto Benjamin - Itinerrio de Luiz Beltro, Recife, AIP/UNICAP, 1998. Ali foram coligidos dados e depoimentos que confirmam todo o seu pioneirismo acadmico, ademais da sua atuao de vanguarda como jornalista e das suas incurses singulares pela vida literria.

17

18

A presena da Folkcomunicao como disciplina integrante do segmento das cincias da informao individual ou grupal est justificada no meu livro de estria na vida acadmica. Vide: MARQUES DE MELO, Jos - Comunicao Social: Teoria e Pesquisa , Petrpolis, Vozes, 1970, p. 62-64. Ela tambm foi includa na coletnea que abriga textos marcantes da minha trajetria intelectual - MARQUES DE MELO, Jos - Teoria da Comunicao: paradigmas latino-americanos, Petrpolis, Vozes, 1998, p. 69-70

Essa associao entre a palavra e o seu criador deu-se naturalmente quando ela foi dicionarizada. Sua incorporao ao lxico miditico fez-se por iniciativa do Professor Mrio ERBOLATO - Dicionrio de Propaganda e Jornalismo, Campinas, Papirus, 1985, p. 154 Somente mais tarde ela seria assimilada pelo pelos estudiosos do folclores, quando Mrio SOUTO MAIOR publica o seu Dicionrio de Folcloristas Brasileiros, Recife, 20-20 Comunicao e Editora, 1999, dedicando um verbete a Luiz Beltro, identificado como personagem polivalente: romancista, contista, jornalista, advogado, professor, folclorista (p. 116)

19

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

29

BELTRO - Jornalista e professor de comunicao... (...) o termo folkcomunicao, por ele criado, delimita a vasta rea qual dedicou grande parte de suas pesquisas. Designa o conjunto de procedimentos de intercmbio de informaes, idias, opinies e atitudes dos pblicos marginalizados urbanos e rurais, atravs de agentes e meios direta ou indiretamente ligados ao folclore (RABAA & BARBOSA)20 FOLKCOMUNICAO - Em termos gerais, pode-se dizer que folkcomunicao comunicao em nvel popular. Por popular deve-se entender tudo o que se refere ao povo, aquele que no se utiliza dos meios formais de comunicao. Mais precisamente: folkcomunicao a comunicao atravs do foclore. (...) A origem do termo folkcomunicao se deu em 1967, com a tese de doutoramento do Prof. Luiz Beltro... (LUYTEN)21

Ao criar em 1997 o Prmio Luiz Beltro de Cincias da Comunicao, atribudo anualmente s personalidades ou instituies que prestaram relevantes servios ao nosso campo do conhecimento, a INTERCOM - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicao - pretendeu homenage-lo como pioneiro dos estudos cientficos da comunicao no Brasil22. Seu pioneirismo multifacetado23. Ele fundou o primeiro centro nacional de pesquisas acadmicas sobre comunicao - o ICINFORM (Instituto de Cincias da Informao) - na Universidade Catlica de Pernambuco, em Recife, 1963. Criou ainda a primeira revista cientfica brasileira dedicada a temas comunicacionais - Comunicaes & Problemas, tambm na cidade do Recife, 1965. Tornou-se, finalmente, o primeiro Doutor em Comunicao diplomado por universidade brasileira, ao defender na Universidade de Braslia, em 1967, a tese Folkcomunicao - Um estudo dos Agentes e dos Meios Populares da Informao de Fatos e Expresso de Idias. Essa tese doutoral representou, na sua biografia, uma espcie de odissia: srie de complicaes, peripcias ou ocorrncias singulares, variadas e inesperadas (Aurlio, 1975, p.

20 21

RABAA, Carlos Alberto & BARBOSA, Gustavo - Dicionrio de Comunicao, So Paulo, tica, 1987, p. 611

LUYTEN, Joseph - Folkcomunicao, In: UEIROZ E SILVA, Roberto P. de, coord. - Temas Bsicos em Comunicao, So Paulo, Paulinas/INTERCOM, 1983, p. 32-34

KUNSCH, Waldemar - Premio Luiz Beltro: um reconhecimento pesquisa em comunicao, Comunicao & Sociedade, n. 32, So Bernardo do Campo, UMESP, 1999, p. 226-22923

22

Essas diferentes facetas do mestre olindense mereceram a ateno dos participantes do CELACOM1999 - III Ciclo de Estudos sobre a Escola Latino-Americana de Comunicao, atravs das contribuies de Maria Luiz Nbrega Icinform: uma experincia pioneira; Maria das Graas Targino - A contribuio do Instituto de Cincias da Informao (Icinform) na gnese do pensamento comunicacional brasileiro; Rosa Maria Nava - Comunicaes & Problemas: o primeiro peridico de estudos e pesquisas da Comunicao do Brasil; Samantha Viana Castelo Branco Rocha Carvalho - Luiz Beltro: da criao do Icinform teoria da Folkcomunicao; Tereza Halliday e Roberto Benjamin - Pernambuco falando para o mundo: contribuio da Unicap e do Icinform para as Cincias da Comunicao. Vide: MARQUES DE MELO, Jos e GOBBI, Maria Cristina. Orgs. - Gnese do Pensamento Comunicacional Latino-Americano: o protagonismo das instituies pioneiras (Ciespal, Icinform, Ininco), So Bernardo do Campo, UMESP, 2000, p. 155-217

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

30

999). Tendo permanecido indita, ela alcana o seu happy-end neste primeiro ano do novo milnio, publicada integralmente pela Editora da Pontifcia Universidade Catlica do Rio do Sul, por iniciativa do Prof. Dr. Antonio Hohlfeld, coordenador do Programa de Ps-Graduao em Comunicao. Nessa entidade universitria, seu autor colaborou como Professor-Visitante em vrias ocasies24. Trata-se, portanto, de um servio inestimvel, este que a PUC-RS presta ao campo das cincias da comunicao, possibilitando s novas geraes de pesquisadores da rea o contato direto com este documento histrico. Embora consolidados em 1967, os dados e reflexes coligidos por Luiz Beltro para sua tese de doutorado na verdade comearam a germinar bem antes. Eles so contemporneos da sua iniciao no terreno jornalstico. A temtica privilegiada na tese a mesma que ele escolheu para a primeira reportagem. Difundida no Dirio de Pernambuco, em 18 de dezembro de 1936, essa matria tratava de devoes e romarias, Igreja do Monte, em Olinda, ao tempo habitada por um velho monge beneditino25. A paixo pela cultura popular, o interesse pelas classes trabalhadoras, a sensibilidade para entender o cotidiano das camadas empobrecidas da sociedade, tudo isso ele herdou do pai, o dentista Dr. Andrade26. Inspirou-se tambm na doutrina social da igreja catlica27, bafejada pelos ensinamentos de Leo XIII, o papa que sutilmente dialogou com as teses revolucionrias de Karl Marx. Mas tambm foi influenciado pelo ambiente socialista que impregnava, desde os tempos de Tobias Barreto, as lideranas forjadas na tradicional Faculdade de Direito do Recife28. Ali e alhures, Beltro travaria colquios enriquecedores, sem necessariamente comprometer-se, com os ideais marxistas propugnados por Francisco Julio, Paulo Cavalcanti, Clodomir Bezerra, Abelardo da Hora, entre outros companheiros de gerao .24

Evidncias dessa estreita colaborao ficaram registradas nos livros Jornalismo Interpretativo (1976) e Jornalismo Opinativo (1980), publicados em Porto Alegre pela Editora Sulina, integrando a Estante de Comunicao Social, editada em convnio com a ARI - Associao Riograndense de Imprensa - e dirigida pelo ento diretor da FAMECOS - Faculdade dos Meios de Comunicao Social -, Professor Antonio Firmo de Oliveira Gonzlez. BENJAMIN, Roberto - Itinerrio de Luiz Beltro, Recife, AIP/UNICAP, 1998, p. 59 Ele assim reconstitui a memria do seu pai: Dr. Andrade era, por natureza, um participante. (...) Em Olinda, tomava posio em todas as iniciativas e campanhas que tinham em mira levar benefcios populao. Orador fluente, a sua palavra, a servio das boas causas olindenses, estimulava a ao construtiva da audincia... BELTRO, Luiz - Memria de Olinda, Recife, FIAM/ Olinda, Prefeitura Municipal, 1996, p. 81-82 Minha formao cultural teve incio efetivamente no Seminrio de Olinda. Ali principiei a estudar e a escrever. Luiz Beltro: a folkcomunicao no uma comunicao classista (entrevista), Revista Brasileira de Comunicao, Ano X, n. 57, So Paulo, INTERCOM, 1987, p.6 A Faculdade de Direito no eram as aulas. A Faculdade de Direito do Recife no eram os professores. A Faculdade de Direito do Recife, para mim, eram os corredores... Luiz Beltro: a folkcomunicao no uma comunicao classista (entrevista), Revista Brasileira de Comunicao, Ano X, n. 57, So Paulo, INTERCOM, 1987, p.6

25 26

27

28

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

31

Por isso mesmo, ele fazia questo de deixar claro seu distanciamento em relao luta de classes. s vezes me vem a idia de que a pessoa pode confundir a folkcomunicao com uma comunicao classista. Mas ela no exatamente uma comunicao classista. (...) ...eu estudei alguns grupos que utilizam a folkcomunicao, isto , meios no-formais de comunicao ligados direta ou indiretamente ao folclore. Ento eu vi que alguns desses grupos tm capacidade de integrao na sociedade, apenas no concordam com essa sociedade. Os grupos a que me refiro so os culturalmente marginalizados, contestam a cultura dominante. Eles contestam, por exemplo, as crenas dominantes na sociedade e as religies estabelecidas. O grupo erticopornogrfico no aceita, por exemplo, a moral dominante.29 Na verdade, sua fundamentao insere-se naquela concepo scio-psicolgica e transclassista que Gilberto Freyre sagazmente denominaria nimo folcrico, entronizando-a como varivel essencial compreenso do comportamento cultural dos brasileiros30. Tal filiao terica fica subentendida em vrios trechos desta obra, especialmente naqueles em que analisa o sentido contestatrio inerente s peas produzidas pelos artesos do barro ou crtica social implcita nos folguedos populares. No sem justificativa que Beltro convidaria Gilberto Freyre para ser um dos principais conferencistas do I Curso Nacional de Cincias da Informao, promovido no perodo de 16 de janeiro a 4 de maro de 1964, no Recife, uma das primeiras iniciativas do recm-fundado ICINFORM31. Nesse momento, suas preocupaes folkcomunicacionais ainda no haviam ultrapassado as fronteiras da observao jornalstica. Tanto assim que o programa daquele evento acadmico inclua vrios trabalhos de campo, entre eles participao e assistncia a (...) festas folclricas e carnavalescas ocorridas no perodo de durao do Curso32 Contudo, ele destaca o impacto que lhe causaria a leitura do livro de Edson Carneiro - A dinmica do folclore (Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 1965), despontando no cenrio nacional como uma espcie de obra maldita. Ela desagrada os folcloristas ortodoxos, que a29

Luiz Beltro: a folkcomunicao no uma comunicao classista (entrevista), Revista Brasileira de Comunicao, Ano X, n. 57, So Paulo, INTERCOM, 1987, p. 5-15

30

FREYRE, Gilberto - O nimo folclrico no comportamento e na cultura do brasileiro, inclusive na literatura, Alhos & Bugalhos, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1978, p. 135-145 I Curso Nacional de Cincias da Informao, Comunicaes & Problemas, vol. I, n. 2, Recife, ICINFORM, julho de 1965, p. 109-120 BENJAMIN, Roberto - Itinerrio de Luiz Beltro, Recife, AIP/UNICAP, 1998, p.73

31

32

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

32

consideram avanada, esquerdizante. Mas tambm no entusiasma os cientistas sociais, encastelados nas ctedras universitrias, que avaliam o folclore como um objeto menor, signo da alienao das classes subalternas.33 Vivendo na provncia, alheio s querelas acadmicas que animavam os principais centros culturais do pas (Rio - So Paulo), Luiz Beltro supervaloriza a contribuio daquele folclorista de vanguarda. Edson Carneiro foi o nico homem que percebeu que o folclore no era esttico, o folclore no era uma coisa parada no tempo, mas uma coisa dinmica. (...) Este livro teve uma grande influncia em mim, pois verifiquei que qualquer manifestao popular estava ligada ao povo, porque o povo no tinha meios, ele utilizava esses meios que lhe davam34. Beltro sente-se estimulado a fazer a primeira incurso investigativa fora do campo especficamente jornalstico. Seu ensaio Iniciao filosofia do Jornalismo (Rio de Janeiro, Agir, 1960), bem recebido pela crtica nacional e internacional35, credenciando-o a vos academicamente mais ousados. Na primeira edio da revista Comunicaes & Problemas (Recife, ICINFORM, 1965) publica um ensaio monogrfico - O ex-voto como veculo jornalstico (p. 9 a 15). Estribado teoricamente em Gilberto Freyre36 e ancorado metodologicamente em Alceu Maynard Arajo e Luiz Saya37, ele formula a sua embrionria teoria da folkcomunicao:No somente pelos meios ortodoxos - a imprensa, o rdio, a televiso, o cinema, a arte erudita e a cincia acadmica - que, em pases como o nosso, de elevado ndice de analfabetos e incultos, ou em determinadas circunstncias sociais e polticas, mesmo nas naes de maior desenvolvimento cultural, no somente por tais meios e veculos que a massa se comunica e a opinio se manifesta. Um dos grandes canais de comunicao coletiva , sem dvida, o folclore.

33

Essa contenda entre folcloristas e cientistas sociais est bem documentada no livro pstumo de Luis Rodolfo VILHENA - Projeto e Misso: o movimento folclrico brasileiro, 1947-1964, Rio de Janeiro, Funarte, 1997 De certo modo, a questo fora resgatada, numa perspectiva internacional, pelo livro de Renato ORTIZ - Cultura Popular Romnticos e Folcloristas, So Paulo, Olho dAgua, 1992 Luiz Beltro: a folkcomunicao no uma comunicao classista (entrevista), Revista Brasileira de Comunicao, Ano X, n. 57, So Paulo, INTERCOM, 1987, p. 13

34

35

LEAL, Csar - Luiz Beltro, terico do jornalismo, In: BENJAMIN, Roberto - Itinerrio de Luiz Beltro, Recife, AIP/UNICAP, 1998, p.133-136

36

Ele no cita expressamente nenhuma obra do Mestre de Apipucos, transparecendo, contudo, o conhecimento da sua trilogia sobre a sociedade brasileira (Casa Grande & Senxala., Sobrados e Mocambos, Ordem e Progresso), onde os elementos da cultura popular esto valorizados enquanto processos comunicacionais tpicos (stira, crtica, caricatura etc.)

37

Folcloristas paulistanos. Alceu Maynard de ARAJO autor da consagrada obra, em trs volumes, Folclore Nacional, So Paulo, Melhoramentos, 1964 e Luiz SAYA escrevera o livro Escultura Popular Brasileira, So Paulo, Editora Gaxeta, 1944.

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

33

Das conversas de bca de noite, nas cidades interioranas, na farmcia ou na barbearia; da troca de impresses provocada pelas notcias trazidas pelo chofer de caminho, pelo representante comercial ou pelo bicheiro; ou, ainda, pelos versos do poeta distante, impressos no folheto que se compra na feira, e pelos martelos do cantador ambulante; pelos inflamados artigos do jornalista matuto ou pelas severas admoestaes dos missionrios; do raciocnio do homem solitrio no seu trabalho na floresta, na caatinga ou na coxilha - que surgem, vo tomando forma, cristalizandose as idias-motrizes, capazes de em dado instante e sob certo estmulo, levar aquela massa aparentemente dissociada e aptica a uma ao uniforme e eficaz.

Seu manifesto folkcomunicacional encontra boa receptividade. Luiz Beltro recebe cartas entusiticas de dois eminentes representantes das comunidades nacionais do jornalismo e do folclore. O ento secretrio-geral da ABI - Associao Brasileira de Imprensa, Fernando Segismundo, acena genericamente: O artigo - O ex-voto como veculo jornalstico dos mais curiosos38. Entretanto, o patriarca do folclore brasileiro, Luis da Cmara Cascudo, profuncia-se de modo mais enftico, preciso, desafiador:O seu artigo-de-abertura (...) um magnfico master-plan. Valorizar o cotidiano, o vulgar, o realmente popular de feio, origem e funo. No espere que venha um nome de fora, um livro de longe, ensinando a amar o que temos ao alcance dos olhos. Teime, como est fazendo, em valorizar o Homem do Brasil em sua normalidade. (...) Acima de tudo, veja com seus olhos. Ande com seus ps. Depois compare com as concluses de outros olhos e com as pegadas de outros ps39.

Entusiasmado, ele continuou as observaes a respeito de outros fenmenos da comunicao tradicional.Eu ainda estava impressionado com a informao puramente. A eu chamei isso de folkcomunicao jornalstica40.

Esse trabalho embasaria empiricamente a tese com que se inscreveu na Universidade de Braslia, em 1967, para conquistar o ttulo de Doutor em Comunicao. O volume compe-se de trs partes. Na primeira, concisa, ele apresenta seus fundamentos tericos e metodolgicos, esboando uma teoria da folkcomunicao. A segunda constiuda por dois segmentos: um documental, historicizando a comunicao brasileira, do perodo prcabralino ao domnio colonial portugus; outro emprico, inventariando as manifestaes38 39

Ainda sobre C&P - N. 1 , Comunicaes & Problemas, v. 1, n. 2, Recife, ICINFORM, 1965, p. 136

CMARA CASCUDO, Luis da - Carta a Luiz Beltro sobre o Ex-Voto, Comunicaes & Problemas, v. 1, n. 2, Recife, ICINFORM, 1965, p.135 Luiz Beltro: a folkcomunicao no uma comunicao classista (entrevista), Revista Brasileira de Comunicao, Ano X, n. 57, So Paulo, INTERCOM, 1987, p.13

40

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

34

folkcomunicacionais do Brasil contemporneo. A terceira contm as concluses, a bibliografia consultada e um berve curriculum-vitae do pesquisador. Qual a tese defendida por Luiz Beltro ? Ela constitui um desdobramento da hiptese construda por Lazarsfeld e Katz - two-setp-flow of communication - para refutar a idia dominante da onipotncia miditica41. As evidncias empricas coletadas nos Estados Unidos permitem concluir que a mdia consegue mobilizar a ateno coletiva dos usurios, mas seus efeitos so mediados por lderes de opinio que filtram as mensagens segundo os padres consensuados nos grupos primrios. No caso brasileiro, Luiz Beltro verificou que o papel das lideranas grupais exercido, no campo, cidades do interior ou nas periferias metropolitanas, por agentes folkcomunicacionais. Estes recodificam as mensagens miditicas, reinterpretando-as de acordo com os valores comunitrios. A banca examinadora designada pela Universidade de Braslia para avaliar a tese compunha-se de trs eminentes pesquisadores: o espanhol Juan Beneyto, o norte-americano Hod Horton e o brasileiro Roberto Lyra Filho. Eles se manifestam favoravelmente aprovao do trabalho e recomendam a concesso do ttulo de doutor ao candidato. At aquele momento, a trajetria intelectual de Luiz Beltro tinha sido um mar de rosas. Ao ingressar na vida universitria ele possua notrio saber no campo jornalstico, o que o eximia, segundo as regras vigentes, de disputar ttulos acadmicos. Tanto assim que fora reconhecido como Catedrtico pelo CIESPAL - Centro Internacional de Estudios Superiores de Periodismo para Amrica Latina, mantido pela UNESCO em Quito, Equador, onde assumira em 1963 a regncia da cadeira de Pedagogia del Periodismo42. Na Universidade Catlica de Pernambuco ele j ocupava desde 1961 a Ctedra de Tcnica de Jornal e Peridico43, tendo sido designado pelo Reitor Padre Aloisio Mosca de Carvalho para implantar e coordenar o Curso de Jornalismo. Convocado, em 1965, pelo Presidente Castelo Branco, atravs do seu Assessor de Imprensa, Jos Vamberto, para dirigir a Faculdade de Comunicao da Universidade de Braslia

41

Vide: KATZ, Elihu and LAZARSFELD, Paul F. - Personal Influence - The part played by people in the flow of mass communication, New Yoirk, Free Press, 1955

42

Suas aulas foram reunidas em livro: BELTRO, Luiz - Mtodos en la Enseanza de la Tcnica del Periodismo, Quito, CIESPAL, 1963, 169 p. Sua experincia didtica em Pernambuco foi sistematizada e difundida nacionalmente. Ela deu origem ao livro : BELTRO, Luiz - A Imprensa Informativa, So Paulo, Folco Masucci, 1969

43

Revista Internacional de FOLKCOMUNICACIN N 1

35

no lastro da crise ali desencadeada no incio do regime militar, Beltro quis valorizar a proposta do idealizador daquela universidade, Darcy Ribeiro. Ele pretendia que todos os seus docentes amadurecidos se engajassem em programas de doutorado e os docentes jovens em programas de mestrado, no sentido de fortalecer a pesquisa, estimulando a produo de novos conhecimentos. Assim sendo, Luiz Beltro deu o bom exemplo, inscrevendo-se no programa de Doutorado em Comunicao, e com isso obteve a adeso de vrios outros colegas. As regras do doutorado seguiam, naquela conjuntura, o modelo europeu, caracterizado pela realizao de uma pesquisa original, finalmente submetida ao julgamento de uma banca examinadora. Tratava-se de uma avaliao de mrito, sem a intervenincia de fatores polticos. Contudo, a turbulncia que abalou os alicerces da UnB aps o golpe militar de 1964 acabaria por radicalizar a convivncia dentro do campus, politizando todas as suas atividades. Quando o professor Beltro se apresentou para a defesa da tese de doutorado perante a banca examinadora constituda pela Reitoria, a Faculdade de Comunicao encontrava-se conflagrada44, culminando com a sua demisso do cargo executivo para o qual fora convidado pela administrao anterior. Aps o julgamento, cada examinador emitiu seu parecer, sendo que os dois estrangeiros protocolaram imediatamente o boletim de aprovao. O socilogo Juan Beneyto, Catedrtico da Universidade de Madrid, recomendou fosse concedida a mxima distino ao candidato: A juicio del abajo firmante, el estudio que se dictamina muestra desde luego valor cientfico sobrado para aspirar a la mxima calificacin que el procedimiento acadmico autoriza, por lo que estima que es obra merecedora de Distincin com Honor45. Por sua vez, o diplomata Hod Horton, Catedrtico da Universidade de Denver, Colorado, EUA, emitiu o seguinte ponto de vista: Obra de alta categoria, plenamente documentada, bem dirigida, escrita com o maior apuro literrio e, por sua inteireza, consgrando o autor como um pesquisador srio. Ningum duvidava da lisura do processo. Aprovado pela banca examinadora, o candidato fazia jus ao grau correspondente. Mas o ento Reitor Laerte Ramos de Carvalho, que demitira

44

Vale a pena ler o relato deixado sobre esse episdio pelo prprio Luiz Beltro. Ele se encontra transcrito no livro organizado por BENJAMIN, Roberto - Itinerrio de Luiz Beltro, Recife, AIP/UNICAP, 1998, p.82-93 BENEYTO, Juan - Julgamento da Tese de Doutorado, In: BENJAMIN, Roberto - Itinerrio de Luiz Beltro, Recife, AIP/UNICAP, 1998, p.310-311

45

Revista Internacional de FOLKCOMUNICAO N 1

36

Luiz Beltro do cargo executivo, quis prejudicar o novo doutor, dificultando a outorga do ttulo conquistado com brilhantismo. Para tanto, convenceu o membro brasileiro da banca, integrante do corpo docente da prpria universidade, no sentido de retardar a entrega do seu boletim de avaliao. A ausncia desse documento foi usada como justificativa para impedir a outorga do diploma correspondente. Tudo isso, apesar do processo ter incorporado os pareceres dos dois outros examinadores, evidenciando a aprovao do candidato pela maioria dos seus membros titulares. Mas, estvamos em pleno governo Costa e Silva, quando o regime militar endureceu, culminando com o golpe-dentro-do-golpe engendrado pelo Ato Institucional N. 5. A aparncia de normalidade jurdica, perseguida inicialmente pelo governo Castelo Branco, ficaria totalmente prejudicada. Por isso, a concesso do ttulo s se efetivaria atravs de demanda administrativa instaurada formalmente, muito tempo depois da defesa da tese46. O calvrio de Luiz Beltro no terminou a. Sua tese repercutiu intensamente na comunidade acadmica nacional e internacional, sendo considerada a mais original das contribuies brasileiras teoria da comunicao. Umberto Eco, por exemplo, dedica-lhe simptico comentrio no jornal LEspresso de Milo (30/10/1966). Porm ela encontrou barreiras para a sua publicao integral. A Editora Melhoramentos mostrou-se interessada pela edio, submetendo-a ao crivo do Prof. Loureno Filho, seu consultor para a rea de humanidades. Este emite parecer favorvel, argumentando sobre a inconvenincia poltica de se publicar o captulo terico, naquela conjuntura repressiva. Depreende-se que ele discordava da ancoragem do autor nas premissas subversivas de Edson Carneiro. Temia-se represlia do sistema autoritrio, por se tratar de literatura posta em quarentena pelos novos donos do poder47. No restou outra alternativa a Luiz Beltro seno aceitar a mutilao da sua obra. Ela circula sob o ttulo Comunicao e Folclore (So Paulo, Melhoramentos, 1971), respaldada por uma irnicaapresentao de Alceu Maynar Arajo, membro da Academia Paulista de Letras:

46

Vide, a propsito desse fato, o meu depoimento, como testemunha ocular desse e de outros acontecimentos da poca. MARQUES DE MELO, Jos - Nos tempos da gloriosa, Revista Brasileira de Comunicao, v. XX, n. 2,