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A ETNOGRAFIA UM MTODO, NO UMA MERAFERRAMENTA DE PESQUISA...
QUE SE PODE USAR DE QUALQUER MANEIRA.
Nesta edio da Revista de Cincias Sociaisapre-
sentamos Entrevista feita com Jos Guilherme Cantor
Magnani, Professor itular do Departamento de
Antropologia e do Programa de Ps-graduao em
Antropologia Social da Universidade de So Paulo
(USP).
Uma das principais referncias em Antropologia
Urbana no Brasil, Magnani autor de Festa no pe-
dao: cultura e lazer na cidade de So Paulo (Editora
Brasiliense, 1984) e De perto e de dentro: notas para
uma etnograa urbana (Revista Brasileira de Cincias
Sociais, 2002), dentre outros trabalhos. organizador
das coletneas Na metrpole: textos de Antropologia
Urbana(Magnani et alliEdusp/FAPESP, 1996) eJovens
na metrpole: etnograas de circuitos de lazer, encontro
e sociabilidade(Magnani et alli, Editora erceiro Nome,
2007). Na USP, Magnani coordenador do Ncleo de
Antropologia Urbana (NAU/USP) e editor de sua re-
vista eletrnica, Ponto.Urbe. ambm organizador do
evento Graduao em Campo que rene, anualmente
em So Paulo, jovens etngrafos de todo o pas.
A entrevista foi realizada porJania Perla Digenes
Aquino1, no primeiro semestre de 2012, ocasio em
que, atendendo a um convite do Departamento de
Cincias Sociais da Universidade Federal do Cear,
Magnani esteve em Fortaleza, para ministrar Aula
Inaugural no curso de graduao em Cincias Sociais.
Jania:professor Magnani, eu gostaria de comear
abordando a sua formao acadmica, a graduao em
Cincias Sociais que o senhor cursou na UFPR, o mes-
trado na FLACSO do Chile e o doutorado na USP.
Magnani: isso mesmo, eu z graduao em
Cincias Sociais na Universidade Federal do Paran,
no nal dos anos 1960. Em razo de militncia no mo-
vimento estudantil, respondi a um processo na justia
militar e, condenado pela lei de segurana nacional,
optei por sair do pas. Ainda assim, consegui terminar
a graduao e colar grau, e decidi ir para o Chile, para
onde auam, na poca, os perseguidos pela ditadura
militar que eram recebidos pelo governo socialista
de Salvador Allende. Na FLACSO (Faculdade Latino-
Americana de Cincias Sociais), iniciei meus estudos
de ps-graduao e, como no havia antropologia, es-
colhi sociologia, sob a orientao do professor Emilio
de Ipola que, por sua vez, fora aluno de Louis Althusser.
Era a poca do boom do estruturalismo no marxismo,
na literatura, lingustica e na antropologia e assim en-
trei em contato com uma bibliograa a que no tive
acesso na graduao. O tema da pesquisa - contos
orais camponeses - foi sugerido por Emlio, porque
era um tema tambm ligado conjuntura poltica do
pas. Como se sabe, na perspectiva de determinados
enfoques marxistas, os setores camponeses eram ti-
dos como estruturalmente avessos mudana social;
ento, ele sugeriu que eu zesse minha pesquisa com
pequenos proprietrios no sul do Chile, para analisar
sua ideologia, com base na semntica estrutural de A.
J. Greimas e anlise de discurso de Michel Pcheux. A
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ideia era justamente identicar os ncleos de ideologia
constitutivos da viso de mundo e do modo de vida
desses camponeses e ver at que ponto havia brechas
para aceitao de mudanas sociais radicais, como as
propostas pelo socialismo. O resultado da dissertao,
Os contos orais camponeses como produtos ideol-
gicos, foi interessante, mas no tenho muita certeza
sobre os desdobramentos polticos da pesquisa... Em
decorrncia do golpe militar no Chile, tive que sair
de l e fui para a Argentina, onde segui na FLACSO,
agora como pesquisador, desenvolvendo pesquisa so-
bre meios de comunicao de massa, em contato com
Eliseo Vern. Continuei, portanto, com o estudo de
ideologias. A essa altura, j estava mais claro meu in-
teresse por cultura, cultura popular, anlise de discur-
so. Enm, essa foi a trajetria de minha formao, da
graduao at o mestrado. Em seguida, voltei para o
Brasil e ingressei no Programa de Ps Graduao em
Cincias Humanas da USP.
Jania: no doutorado na USP, a professora Ruth
Cardoso foi a sua orientadora.
Magnani: sim, mas tambm procurei o Museu
Nacional e a Universidade de Braslia, onde conversei
com alguns professores. Mas terminei me acertando
melhor na USP com Ruth Cardoso, que conhecia o
ambiente intelectual do Chile onde me formei. Meu
crescente interesse por cultura popular combinou bem
com o que a Ruth estava trabalhando na poca, que
eram os movimentos sociais urbanos na periferia. E eu
escolhi um tema de cultura popular agora no contex-
to urbano pouco estudado na cidade de So Paulo,
que foi o circo-teatro.
Jania:e sua tese, Festa no Pedao, se tornou um
dos livros mais importantes da Antropologia urbana
feita no Brasil.
Magnani:bem, nem tanto assim... Mas que o re-
corte era original, isso era, porque na poca, escolher
um tema como esse, considerado irrelevante, era pou-
co usual. Havia pessoas preocupadas com a poltica, o
trabalho, os moradores de periferia e eu estudando uma
forma de entretenimento popular, de lazer e, ainda por
cima, circo-teatro ... No entanto, entre as disciplinas que
frequentei, estava a da professora Marlyse Meyer, que
era da Letras, sobre a formao do romance folhetim.
Ento comecei a perceber que essa forma de dramatur-
gia popular tinha razes no melodrama do sculo XIX,
na Commedia dell Arte do sculo XVI e era uma forma
atravs da qual as chamadas classes populares elabora-
vam, no palco, aspectos e valores ligados a seu modo de
vida: da o interesse do tema para a antropologia porqueia alm do mero entretenimento. Havia uma novidade
a, era uma espcie de via de acesso para o entendimen-
to do modo de vida dos moradores da periferia de So
Paulo.
Jania: em alguma medida, parece haver aproxi-
maes entre o circo-teatro e os contos camponeses,
seu tema no mestrado.
Magnani:na verdade, no se afastava muito por-
que o circo teatro uma forma de manifestao cultu-ral tradicional que circula no s em pequenas cidades
do interior do Brasil, mas tambm pelas periferias dos
grandes centros urbanos, como o caso de So Paulo.
Ademais, servi-me de ferramentas da semntica estru-
tural e da anlise de discurso em ambos os casos.
Jania: eu lembro que o senhor mencionou em
uma ocasio, pode ter sido em uma aula, que a Alba
Zaluar teria sido sua colega no doutorado; esse dado
interessante, anal Festa no pedao e A mquina e a
revolta, dois livros referenciais nos estudos de antropo-
logia urbana no pas, remetem a uma mesma turma de
doutorado.
Magnani: sim, fomos contemporneos, Alba foi
orientanda da Eunice Durham e eu de Ruth Cardoso;
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Jos Guilherme Cantor Magnani
eu trabalhava com a periferia de So Paulo e ela com
uma populao da periferia do Rio de Janeiro, na
Cidade de Deus. Mas o foco de cada um foi diferen-
te: ela se interessou pela questo da violncia e eu me
centrei na questo do lazer, na forma como as pessoas
utilizam o tempo livre. Foi uma questo de escolha, na
antropologia a biograa de cada um e o percurso aca-
dmico que vo desenhando as opes.
Jania: depois de concludo o doutorado, o senhor
comeou a lecionar na USP?
Magnani:defendi o doutorado na Universidade
de So Paulo no ano de 1982. Mas, um ano antes, fui
convidado para dar aulas na UNICAMP, onde perma-
neci por dois anos. Depois, a professora Eunice Durham
me convidou para ir para a USP; fui entrevistado pe-
los integrantes do Departamento de Antropologia ,
na poca no havia ainda concurso, como z depois
e assim, comecei a lecionar no Departamento de
Antropologia da FFLCH da USP em 1983.
Jania: observando sua produo, duas vertentes
de discusses so proeminentes; uma delas a ques-
to da antropologia urbana, a outra envolve as dis-
cusses sobre o fazer etnogrco. Como que esses
temas foram ganhando importncia na sua trajetria
acadmica?
Magnani: nos dois primeiros anos, dei aulas
apenas na graduao; em seguida, fui credenciado
para a ps-graduao e passei a ter orientandos que
comearam a escolher temas sobre a questo urbana.
Encaramos a cidade de So Paulo como um grande
laboratrio de prticas culturais, sociabilidade, trocas
simblicas. Era um desao que, claro, no dava para
ser enfrentado de forma individual. Assim comecei a
orientar projetos, inicialmente de mestrado, enquan-
to desenvolvia minhas prprias pesquisas com nan-
ciamento do CNPq; meus alunos comearam a fazer
pesquisas de mestrado, iniciao cientca e, depois,
doutorado com bolsas do CNPQ, CAPES e FAPESP.
Meu primeiro projeto, com bolsa Produtividade em
Pesquisa (1989/1991), tinha como ttulo Os pedaos
da cidade e, entre outros objetivos, propunha-se a
fazer uma espcie de experincia metodolgica com
a categoria pedao que eu tinha trabalhado na pe-
riferia. A pergunta era: existiam pedaos no centro?
Na periferia o contexto era o bairro e a vizinhana;
ser que esta categoria seria adequada para entender
a dinmica urbana fora da periferia? Era um desao
metodolgico e terico; ento eu e meus alunos, j no
Ncleo de Antropologia Urbana (NAU/USP), come-
amos a fazer incurses pela cidade para testar a cate-goria e nos demos conta que o pedao descrevia uma
forma especca de sociabilidade e que a dinmica da
cidade ia muito alm disso. Desta forma, a partir do
prprio campo, mas em novos contextos, que sur-
giram as demais categorias da familia: o trajeto, o
circuito, a mancha, o prtico. Elas foram desenvol-
vidas ao longo das etnograas, no campo da antropo-
logia urbana, pois se a cidade me dava as questes, era
preciso desenvolver ferramentas de anlise que dessemconta desses temas na cidade da So Paulo.
Jania: ento suas pesquisas caminham a partir de
experimentos com etnograas, em que algumas cate-
gorias nativas vo se tornando categorias analticas;
elas surgem em um certo contexto etnogrco, a o se-
nhor vai experimentando em outro trabalho de campo
e observando o seu rendimento. Algumas destas cate-
gorias como pedao, circuito e mancha tm sido
experimentadas por pesquisadores e estudantes nos
mais diferentes contextos etnogrcos. Como o senhor
pde ver na conferncia de ontem, seus textos fazem
muito sucesso entre nossos alunos...
Magnani:quei muito surpreso e bastante con-
tente ao me deparar, ao trmino da palestra que eu
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dei aqui em Fortaleza, na aula inaugural do curso de
Cincias Sociais em 2012, com a quantidade de per-
guntas que os alunos zeram, justamente sobre a uti-
lizao dessas categorias. Isso mostra que no apenas
elas so utilizadas, mas continuamente testadas. No
formam um conjunto fechado a ser aplicado de forma
mecnica. Os alunos experimentam de uma maneira
e se no d certo, a eles adaptam, ampliam, escolhem.
Porque essas categorias podem ser utilizadas algumas
vezes juntas, outra vezes separadamente ora o peda-
o, ou o circuito, ou ainda o trajeto e o prtico e assim
por diante. Vai depender da natureza do objeto da pes-
quisa. Na verdade foram forjadas coletivamente; um
trabalho do Ncleo de Antropologia Urbana ao longo
de pesquisas feitas com alunos de graduao e ps-
-graduao. Como categorias, elas so instrumentos de
trabalho, esto sujeitas a modicaes e gosto quando
vem um aluno e diz: professor, eu tive que fazer uma
modicao. timo, porque signica que a teoria est
viva, no est fossilizada, ela est sujeita aos estmulos
que vm do campo.
Jania: agora, pergunto sobre o Ncleo de
Antropologia Urbana que o senhor coordena na USP;
seria possvel contar como foi o surgimento do NAU e
como ele funciona?
Magnani:o Ncleo de Antropologia Urbana sur-
giu de uma forma meio espontnea, quando eu come-
cei a ter alunos de ps-graduao e tambm alguns de
graduao, na iniciao cientca. Dei-me conta de
que na universidade a forma de orientao na ps-gra-
duao muito solitria, uma relao entre o orienta-
dor e o orientando; o aluno pode debater com colegas,
mas basicamente uma situao bastante isolada; ao
propor uma rotina de intercambio mais sistemtico
para discutir os projetos e o andamento das pesquisas,
percebi que um espao mais institucionalizado de tro-
ca seria muito produtivo. Ento, o ncleo surgiu com
a necessidade de fazer uma espcie de orientao co-
letiva. Claro que eu os atendia individualmente, mas
percebi que, havendo temas em comum, ento alguma
bibliograa podia ser lida por todos. Cada aluno lia o
projeto do outro, era a leitura de um colega - s vezes,
at mais exigente que a do orientador. Eu nunca quis
formalizar o ncleo: o nome NAU evoca, metaforica-
mente, a dinmica de uma embarcao que s vezes
est em alto mar, e s vezes est no porto, sendo abaste-
cido, reparado.... Quando os alunos esto em determi-
nada fase da tese ou dissertao, eles desaparecem... e
como no havia nenhuma necessidade burocrtica de
funcionar, de tempos em tempos o NAU reua para o
porto e cava ancorado. Mas quando surgia um est-
mulo novo, era o sinal para fazer-se ao mar...
Jania: e a revista Ponto Urbe, do NAU? Como
que ela surge?
Magnani: a revista surge em um momento em
que o Ncleo se consolida. Neste ano, 2012, o Ncleo
de Antropologia Urbana acaba de ser reconhecido pela
Congregao da FFLCH como laboratrio, o que lhe
permite um pouco mais de recursos, visibilidade e tal.
Ao longo desse tempo l se vo mais de duas dcadas
, foi possvel investir em algumas linhas de pesqui-
sa que agora esto mais consolidadas. Por exemplo, os
alunos que trabalham com a cultura e a lngua de si-
nais (libras) ampliaram o leque de interesses, incluindo
outras modalidades alm da surdez, como cegueira e
autismo: o GESD, ou Grupo de Estudos da Surdez
e da Deciencia. Membros de outra equipe que tra-
balhava mais com a questo da cidade, comearam a
se interessar pela chamada cultura de periferia que
inclui grupos de rap, hip-hop, saraus literrios, sam-
ba de raiz, etc. e forma um grande circuito na peri-
feria de So Paulo. Um outro grupo de alunos, todos
nisseis, comeou a estudar o movimento da volta dos
dekasseguis, ao Brasil e logo ampliaram o objetivo,
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inserindo o estudo na questo mais geral dos proces-
sos migratrios contemporneos. O GERM Grupo
de Estudos da Religio na Metrpole congrega tam-
bm estudantes orientados por outros professores do
Departamento. Por ltimo, temos o GEU, voltado para
pesquisa com populaes indgenas em contextos ur-
banos na Amaznia. um campo novo e resolvemos
dar esse nome Grupo de Etnologia Urbana para
frisar a novidade e o desao, pois estamos entrando
numa seara nova e alheia... Em contato com etnlo-
gos que estudam populaes amerndias nessa regio
e tambm com gegrafos da Universidade Federal do
Amazonas, procuramos estabelecer uma interlocuoda Antropologia Urbana, feita no contexto das gran-
des metrpoles do Sudeste, com a realidade dos n-
dios urbanos em cidades de outras escalas, na regio
amaznica. Cabe ainda mencionar dois outros grupos
do NAU, em fase de consolidao: o CyberNau, vol-
tado para as novas tecnologias digitais, tanto como
ferramentas de pesquisa como objeto de estudo e o
NauConscincia, sobre uso de substancias psicoati-
vas em processos teraputicos, no campo das religi-
es ayahuasqueiras. Mesmo antes de termos todos
esses grupos em atividade, percebemos a necessidade
de um veculo mais institucionalizado de discusso e
difuso, mas no restrito s pesquisas do NAU, e sim
aberto para acolher trabalhos de outros pesquisadores
de Antropologia Urbana. Ento, a revista Ponto Urbe
surge com essa dupla nalidade: de ser um veculo de
exteriorizao das nossas pesquisas em dilogo com
pesquisadores de outras instituies. Sua periodicida-
de semestral e j est em sua dcima primeira edio.
Jania:j que o senhor mencionou a pesquisa da
etnologia urbana, eu gostaria que falasse mais sobre
essa passagem, na sua trajetria, de uma antropologia
na cidade (que o senhor acentua que diferente de
uma antropologia da cidade), para esta etnologia na
cidade?
Magnani: esse neologismo, Etnologia Urbana,
como j armei, designa um campo novo de reexo
e todos os desaos que acarreta. udo comeou com
um convite que me foi feito pela professora Marta
Amoroso, que da rea de etnologia indgena do nos-
so Departamento e estava fechando um convenio da
CAPES, o Procad, que permite um intercambio en-
tre um programa de ps-graduao j consolidado
e um outro em formao, no caso, o PPGAS da USP
com o PPGAS da UFAM Universidade Federal do
Amazonas. O projeto tinha como ttulo Paisagens
amerndias: habilidades, mobilidade e socialidade nos
rios e cidades da Amaznia e a participao do NAU
era no sentido de trabalhar com os chamados ndios
urbanos. Se a gente tomar, por exemplo, os dados do
ltimo censo do IBGE, a presena da populao ind-
gena em cidades signicativa: de um total de 896.900
pessoas, 315.180, ou seja, 36,2%, vivem em cidades.
Essa realidade no levada em sua devida conta ou en-
to encarada do ponto de vista da excluso, ou seja,
reduz os ndios a moradores de periferia, com todos os
esteretipos: insero precria no mercado de traba-
lho, localizao em reas de risco, desprovidas de equi-
pamentos e servios urbanos, etc. Ento, resolvi fazer
outras perguntas: o que cidade, a partir da cosmolo-
gia dos vrios povos que a esto instalados? Que mo-
dicaes sua presena acarreta na prpria dinmica
urbana? Com quem estabelecem vnculos e alianas?
Quais so seus trajetos na paisagem da cidade e que
instituies acionam, para manter um modo de vida
diferenciado? Ou seja, trata-se de encarar a presena
dos ndios na cidade do ponto de vista da sua agncia,
da sua forma de vida, de suas cosmologias. Eles dizem
e fazem algo diferente; no so apenas migrantes que
se dirigem cidade para poder arranjar algum tipo
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de recurso e sobreviver a duras penas: sua presena
transforma a cidade. Esse era o desao e comeamos
a trabalhar em Manaus, porque na capital a presena
indgena signicativa, mas inclumos outras cidades
da calha do Amazonas como Parintins e Barreirinha,
onde predominam os Sater-Maw.
Jania: todos os anos o senhor tem se empenhado
na organizao do Graduao em Campo. O ttu-
lo deste evento assinala a sua preocupao em iniciar
os alunos no trabalho de campo, j na graduao. Por
que?
Magnani: esta , sem dvida, uma postura que te-
nho adotado h algum tempo, a de valorizar o trabalho
de campo na graduao. Normalmente os institutos de
fomento valorizam a ps-graduao, e o trabalho aca-
dmico contabilizado pela produo, participao
em eventos, pelo nmero de teses e dissertaes orien-
tadas, etc. E o trabalho com a graduao no valo-
rizado. Nossos alunos muitas vezes cam sem espao
para discusses que vo alm da formao bsica. Se
voc pensar, por exemplo, nos encontros da ABA, da
ANPOCS, dicilmente um aluno de graduao tem
espao para expor o seu trabalho; no mximo, eles
conseguem cinco minutos para apresentar um pster.
Penso que esses menino(a)s precisam dispor de um es-
pao para discutir seriamente os seus CCs, os seus
relatrios nais de pesquisa e tal. Mas com dignida-
de, para sentirem que no so convidados incmodos
no evento. Ento, comecei a organizar o Graduao
em Campo que j tem dez anos de funcionamento.
Primeiro, abri para os alunos de uma disciplina que
dou no Curso de Cincias Sociais, chamada Pesquisa
de campo em Antropologia. Havia trabalhos de con-
cluso muito criativos e o risco era terminarem na ga-
veta do professor, sem nenhuma visibilidade. Ento,
tive a ideia de organizar um frum para que os alu-
nos pudessem expor os trabalhos, discutir, ouvir
comentrios sobre suas pesquisas e tal. E hoje recebe-
mos alunos do Brasil inteiro. H tambm o cuidado de
estabelecer uma ponte com a ps-graduao, porque
quem comenta os trabalhos so mestrandos e douto-
randos do PPGAS, e os alunos de graduao se sentem
valorizados porque um ps-graduando leu e comenta
seu trabalho. So quatro dias de trabalho; a abertura
feita por um antroplogo de renome, e graticante
observar a presena de estudantes vindos de todas as
partes do Brasil, para muitos dos quais uma oportu-
nidade de conhecer a USP e a prpria cidade de So
Paulo.
Jania:retomando o tema da sua produo, gosta-
ria que o senhor falasse sobre sua tese de livre docente,
Da periferia ao centro: trajetrias de pesquisas em an-
tropologia urbana em So Paulo, que uma espcie de
antropologia da antropologia, no ?
Magnani: um pouco isso. Como voc sabe, as
teses de livre docncia tm dois formatos: elas podem
ser apresentadas com base numa pesquisa indita ou
ento pode ser uma espcie de releitura de trabalhos
feitos pelo pesquisador ao longo de sua carreira. Eu
z uma coisa intermediria, tentei construir uma re-
exo sobre o surgimento da antropologia urbana na
Universidade de So Paulo a partir da contribuio
da minha orientadora Ruth Cardoso, da professora
Eunice Durham e da professora Gioconda Mussolini.
So trs pesquisadoras e professoras cujo trabalho foi
decisivo na constituio da antropologia urbana, den-
tro do debate entre a Escola Livre de Sociologia Poltica,
tributria da Escola de Chicago e a ento Faculdade de
Filosoa Cincias e Letras (que recebeu a misso fran-
cesa, com Claude Lvi-Strauss, Roger Bastide, e ou-
tros), onde comearam as cincias sociais na USP. Era
um ambiente intelectual muito estimulante e num pri-
meiro momento, eu historio essa formao, mostrando
a originalidade da proposta de Ruth Cardoso e Eunice
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Jos Guilherme Cantor Magnani
Durham, e a abertura que deram a seus alunos, entre
os quais me incluo. Foi toda uma gerao de orientan-
dos que consolidou uma reexo sobre a antropolo-
gia urbana no s em So Paulo, mas no Brasil, pois
elas formaram muitos alunos que hoje esto em vrias
universidades. Essa foi a primeira parte da tese; em
seguida mostro como, a partir da minha prpria pes-
quisa, a partir do lazer, abri o campo para os trabalhos
dos meus alunos. A segunda parte da tese (que agora
virou livro, Da periferia ao Centro: trajetrias de pes-
quisa em Antropologia Urbana, publicado pela editora
erceiro Nome) faz um apanhado de trs pesquisas:
uma sobre religies contemporneas na cidade de So
Paulo, outra sobre os surdos e nalmente sobre jovens;
trs temas desenvolvidos no Ncleo de Antropologia
Urbana. Por m, fao uma reexo metodolgica so-
bre o fazer etnogrco. A tese, ento, contempla a his-
tria, a pesquisa e termina com metodologia.
Jania:a discusso sobre o fazer etnogrco um
tema recorrente nos seus textos; eu gostaria que o se-
nhor falasse sobre o que motiva ou inspira essa reexo.
Magnani:comecei por notar o uso, muito redu-
cionista, que se faz da etnograa, em outras reas. No
ltimo artigo que escrevi para a revista Horizontes
Antropolgicos, cito na introduo um trechinho que
hilrio. Prossionais de pesquisa de mercado e de
marketing dizem que fazem etnograa para detectar a
pauta de consumo da classe C e D. Uma pessoa desse
ramo concedeu entrevista para o jornal Folha de So
Paulo e na entrevista para o jornalista, soltou a seguinte
denio de etnograa: Etnograa uma espcie de
estgio na favela. para rir (ou chorar), no ? pre-
ciso ressaltar que a etnograa um mtodo, no uma
mera ferramenta de pesquisa, pronta, que se pode usar
de qualquer maneira. Como mtodo, foi forjada pela
antropologia ao longo da sua formao e no pode ser
utilizada, sem mais, ignorando os diferentes contextos
tericos que lhe do fundamento. Se no, ela passa de
mtodo a ferramenta, sendo empregada de maneira
trivial, rasa. Isso no quer dizer que outras reas no
possam utilizar e se apropriar do nosso mtodo de tra-
balho, mas com o devido cuidado; do contrrio, perde
consistncia. A expresso observao participante,
ento, virou lugar comum; qualquer ida a campo vira
observao participante. Os prossionais de outras re-
as precisam entender que para produzir uma etnogra-
a, preciso antes conhecer as boas etnograas que
j foram feitas. Nesse artigo que escrevi na Horizontes
Antropolgicosdistingo entre a prtica etnogrca
e a experincia etnogrca. A prtica etnogrca a
parte que os alunos menos gostam, porque implica fa-
zer o projeto, consultar a bibliograa, ir a campo mes-
mo quando no ocorre nada de interessante, seguir o
cronograma. No entanto, a parte que, de certa manei-
ra, permite que haja uma pesquisa ao longo do tempo.
Seguindo direitinho o roteiro e estando equipado com
essa perspectiva, possvel ento que ocorra o outro
lado, que o considerado mais interessante, o insight, a
experincia etnogrca, o encontro com o outro. Mas
no d para separar um do outro, achar que a parte da
prtica etnogrca o lado burocrtico e pensar que
vai se ter insight, logo de cara, assim, por alguma ins-
pirao. Ento, acho que a etnograa o resultado des-
se dilogo entre as duas atitudes, uma que a prtica
cotidiana, exige empenho e dedicao ao campo, e a
outra, para a qual preciso estar atento para no deixar
passar aquele momento meio mgico que a sacada.
Jania: o caderno de campo parece ser uma ferra-
menta importante nesse processo. Em um artigo na
Ponto Urbe o senhor observa que os antroplogos
mobilizam esta logstica de diferentes modos: alguns
utilizam cadernetinhas, outros preferem o note-book...
Mas que o importante seria o processo subjacente ao
uso do caderno, de elaborao ou sistematizao em
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A etnografia um mtodo...
torno da experincia de contato com a alteridade...
Magnani: o velho e bom caderno de campo,
nosso instrumento, que cabe no bolso; claro que hoje
temos gravador como este que voc est usando, h o
recurso de lmar, de gravar entrevistas com celular,
bem discreto, mas nada substitui aquela conversa ou
observao que se prolongam, so interrompidas, so
retomadas. Como arma Geertz, preciso combinar
o estar l e o escrever aqui; o momento da obser-
vao exige a transcrio. uma prtica que eu fao
rotineiramente e recomendo aos alunos: vo a campo,
observem tudo, anotem, treinem o olhar e o ouvido;
de volta casa e, com base nas observaes mesmo
fragmentrias do caderno de campo, passem tudo a
limpo. D-se uma ordem a essas observaes; ainda
uma ordenao cronolgica, no preciso nenhuma
grande interpretao terica... Assim, distingo relato
de campo e notas do caderno de campo. Esse processo
permite uma primeira ordenao, uma narrativa dos
dados de campo; e, da leitura do corpus mais alentado
destes relatos, que vo aparecer os famosos insights,
comeam a surgir as linhas de interpretao, de ree-
xo, e o trabalho de campo ca prazeroso. Como se
sabe, no se vai a campo com uma teoria j pronta, sem
estar disposto a ser afetado, como hoje se diz. E este
ser afetado tambm aparece no caderno, depois no
relato e, ainda, na monograa nal.
Jania: em relao a parcerias acadmicas, neste
momento, quais so as principais parcerias e trocas in-
terinstitucionais que o senhor mantm?
Magnani:atualmente, coordeno um G de antro-
pologia urbana na ABA, Etnograas Urbanas: frontei-
ras e diversidades. No plano internacional, fao parte
de uma rede Brasil-Portugal, que congrega interessa-
dos na questo urbana. Esta rede se prope a conec-
tar pases lusfonos; iniciamos com Brasil e Portugal
e estamos ampliando agora para pases africanos de
lngua portuguesa. Essa parceria conta com o professor
Carlos Fortuna, de Coimbra, e na USP participamos
eu, Heitor Frgoli, Fraya Frhese; de Alagoas, Rogrio
Proena da UFAL, e aqui em Fortaleza, a professora
Irlys Barreira, alm de outros pesquisadores de vrias
outras instituies. Formamos um grupo que se en-
contra de tempos em tempos para poder discutir pes-
quisas sobre a cidade e os resultados foram publicados
em duas coletneas. Outro tipo de trabalho conjunto,
que considero como parceria, com meus ex-alunos
que foram aprovados em concursos em vrias univer-
sidades. Silvana Nascimento est na Paraba, atual
coordenadora da ps-graduao, no campus da UFPB
do Rio into. Antnio Maurcio est em Belm, Luiz
Henrique de oledo em So Carlos, Cima Bevilqua
em Curitiba, Elizete Schwade em Natal. Eles fazem
parte do NAU ampliado: zeram suas prprias es-
colhas, construindo parcerias, mas a gente procura
manter o esprito do Ncleo, compartilhando reexes
e atividades.
Jania: na opinio do senhor, quais so as dis-
cusses mais fascinantes do debate antropolgico
contemporneo?
Magnani:dentro de meu campo, que antropo-
logia urbana, penso que h uma contribuio com a
qual podemos dialogar num contexto mais amplo. Nas
pesquisas de etnologia indgena, essa contribuio j
reconhecida, mas acho que est na hora de a antropolo-
gia urbana tambm participar dos dilogos internacio-
nais, porque h especicidades decorrentes de nossos
recortes empricos e escolhas terico-metodolgicas.
Retomo nossa incurso s cidades mdias e pequenas
da Amaznia. uma tentativa de sair dos recortes di-
tados pela escala das grandes metrpoles, como faze-
mos habitualmente em cidades do Sudeste e capitais do
Nordeste. Essas cidades, nas calhas dos rios amazni-
cos, tm uma dinmica prpria, e esto a exigir novos
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Jos Guilherme Cantor Magnani
investimentos, experimentos e pesquisas. Acabamos
de publicar um livro na coleo Antropologia Hoje,
da Editora erceiro Nome; um texto de Michel Agier
em que ele trabalha com acampamentos e grupos de
refugiados. Esses movimentos de populao so vistos
como ameaa, mas o fato que esto chegando s cida-
des, integram a rede urbana. No d mais para pensar a
cidade isolada; preciso encarar sistemas de cidades e
a agncia de novos atores sociais que entram em conta-
to no apenas com o contexto urbano em suas circuns-
cries geogrcas, mas com a urbanidade atravs da
internet, dos meios de comunicao. As redes, virtual
e presencial, se comunicam; da a atualidade da cate-
goria de circuito ao permitir identicar trajetos que
transcendem o espao fsico.
Jania:ontem, quando proferia a aula inaugural do
nosso curso aqui na UFC, o senhor ressaltava esse mo-
vimento interessante que est ocorrendo nas cincias
sociais da Europa, que a apropriao de reexes e
categorias de anlise da Escola de Chicago, mencio-
nando que esta apropriao est relacionada a simila-
ridades entre o atual panorama urbano na Europa e a
cidade de Chicago na primeira metade do sculo XX.
O senhor poderia falar mais sobre este movimento?
Magnani: chama mesmo a ateno o fato de a
Escola de Chicago, que tirando Erving Goffman e
as leituras de Foot-White em Sociedade de Esquina-
esteve de quarentena depois dos anos sessenta, volte a
inspirar estudos de questes urbanas na Europa. Esse
retorno tem a ver com a intensicao dos processos
migratrios, com a visibilidade de jovens oriundos de
famlias das ex-colnias, agora cidados com plenos
direitos. Eles so franceses, por exemplo, mas exibem
um ethos diferente, uma religio diferente, uma cor di-
ferente e at roupas diferentes. Como pensar essa situ-
ao, que evoca a de Chicago nos anos 1920? Formam
guetos, renem-se em sociedades de esquina? Este
revival termina por valorizar o que a antropologia bra-
sileira tem produzido, pois muitos fenmenos urbanos
que so novidade na Europa, aqui so conhecidos de
longa data: conhecemos a Escola de Chicago desde
os anos 1930; j elaboramos categorias para analisar
esses problemas. A rede Brasil-Portugal, mencionada
anteriormente, uma tentativa de encontrar similari-
dades entre o que pesquisamos no Brasil e na Europa,
e tambm de comparar a forma como conduzimos as
pesquisas, c e l. Neste caso, tratamos mais das experi-
ncias ligadas a Portugal e Espanha, mas vejo possibili-
dades de ampliar em muitas vias esses dilogos.
Jania:nos ltimos anos, aqui no Brasil, ns temos
lido com entusiasmo alguns autores que no se pode
considerar componentes de uma escola, mas que apre-
sentam anidades em relao a preocupaes relacio-
nadas ao trabalho de campo e s linguagens conceituais
consagradas nas cincias humanas. Estou falando de
Roy Wagner, Marilyn Strathern, Bruno Latour, Alfred
Gell, dentre outros, que por falta de denominaes
mais precisas, costumam ser associados antropo-
logia simtrica. Qual a importncia desta bibliograa
em suas pesquisas atuais?
Magnani: essa literatura est bem em moda, e
nem muito nova; cabe lembrar que um dos textos
atualmente em alta, A inveno da cultura, de Roy
Wagner, foi publicado em 1974. Em todo caso, estou
trabalhando com um desses autores. No foi um dos
que voc citou, im Ingold, cujas preocupaes e
encaminhamentos analticos tem ajudado a pensar
a presena indgena na cidade. Ele tem como base a
sua etnograa com caadores e coletores da Lapnia e
comeou a ampliar a reexo sobre habilidades, mo-
dos de estar, maneiras de habitar. Comeamos com o
livro Te perception of environment, que uma co-
letnea de artigos; depois Lines... E interessante no-
tar que Ingold desenvolve anlises muito prximas a
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A etnografia um mtodo...
algumas que norteiam nosso trabalho. No caso dos
Sater Maw em Manaus e cidades vizinhas , no se
trata simplesmente de uma presena, e justamente em
bairros perifricos: eles circulam, estabelecem circuitos
entre as aldeias urbanas e as das erras Indgenas, esta-
belecem alianas com outros atores sociais, etc. Ento
isso; esta a forma como incorporamos um desses
autores de moda. Penso que esta literatura a que voc
se refere abre boas perspectivas desde que permita
ampliar os horizontes de nossas pesquisas. O perigo
uma certa empolgao que se traduz num uso descon-
textualizado, sem as devidas mediaes. O resultado
que as discusses inovadoras, que poderiam abrir
perspectivas no campo, acabam atrapalhando, no vo
alm do modismo.
Jania: para nalizar a entrevista, pergunto se h
alguma atividade intelectual que senhor ou o NAU es-
teja desenvolvendo que ns no contemplamos ainda e
que o senhor considera importante ressaltar?
Magnani:olha, alm do que voc perguntou, cabe
mencionar que mantemos um site, espcie de portal
do que a gente faz no Ncleo de Antropologia Urbana.
Atualmente, estou dando uma assessoria para o Museu
do Futebol, situado em dependncias do Estdio
do Pacaembu. As diretoras desse museu, Daniela
Amaral e Clara Azevedo, so integrantes do Ncleo de
Antropologia Urbana, e esto conduzindo um extenso
levantamento de orientao etnogrca sobre futebol
de vrzea na cidade. A ideia evitar uma prtica mu-
seolgica convencional e fazer do Museu do Futebol,
que tem grande apelo de pblico (juntamente com o
Museu da Lngua Portuguesa um dos mais visita-
dos), um espao interativo, dotando-o de um banco de
dados, fazendo dele um centro de referncia histrico
e de pesquisa. Nessa perspectiva, mais que um lugar
de guarda de trofus, camisas, cnticos, fotograas,
etc. um espao onde o futebol visto como locus de
sociabilidade, uma via de acesso a formas especicas
da dinmica urbana. Esta assessoria est ligada a ou-
tro objeto de pesquisa (tema da dissertao de outro
integrante do NAU, Rodrigo Chiquetto) que um tor-
neio de futebol amador em Manaus, o Pelado. Dele
participam indgenas numa chave especial, e o que te-
mos visto que no se trata de mero entretenimento;
no apenas uma modalidade de lazer, pois na hora
de formar os times h toda uma discusso sobre quem
e quem no ndio, se tal ou qual time tem branco,
etc. Ou seja, um momento de visibilidade, de con-
trovrsias, disputas, para alm, das quatro linhas... Na
verdade, h outras atividades e linhas de pesquisa em
andamento no NAU, mas j est na hora de concluir e
gostaria ento de enfatizar que o que realmente mobi-
liza a perspectiva de estar sempre experimentando. A
antropologia deve estar atenta s prticas dos atores so-
ciais, criativos em seus arranjos: ento, o pesquisador
tem que ser criativo, tambm. Como j dizia Mariza
Peirano, a antropologia a mais artesanal e a mais pre-
tensiosa das cincias sociais porque, com seu mtodo
tradicional, a etnograa, com instrumentos como a
observao participante, etc. sente-se vontade em te-
mas to ambiciosos como o sagrado, a poltica, a cos-
mologia, a organizao social...
* * *
Nota
1 Doutora em Antropologia Social pela USP. Professora doDepartamento de Cincias Sociais e do Programa de Ps-Graduao em Sociologia da UFC.
Rebecido para publicao em junho / 2012. Aceito em julho / 2012