raul córdula 50 anos de arte . uma antologia .catálogo

52
RAUL CÓRDULA | 50 anos de arte | uma antologia

Upload: icraulcordula

Post on 27-Dec-2015

17 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

RAUL CÓRDULA | 5 0 a n o s d e a r t e | u m a a n t o l o g i a

Page 2: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 3: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

Ministério da Cultura Apresenta

RAUL CÓRDULA50 anos de arte, uma antologia

Page 4: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 5: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

RAUL CÓRDULA50 anos de arte, uma antologia

CURADORIA

Olívia Mindêlo e Raul Córdula

Page 6: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

6

1 PauloSérgioDuarteeJoséCláudiofizeramalusãoaesseaspectoemtextosparaexposiçõesdeRaulCórdula.Duarte,em2000,eZéCláudio,em1984(ArteGaleria,Fortaleza/CE).

Muito além das geometriasOlívia Mindêlo

A primeira vez que soube da existência de Raul Córdu-

la estava diante de uma parede. Uma tela com cerca

de um metro de largura – imagino eu – se estendia na

superfície plana, onde figuras geométricas negociavam

um lugar no espaço. Me lembro de um cinza recorrente,

talvez, mas principalmente de linhas retas e diagonais

delimitando uma composição na qual havia um triângu-

lo. Não recordo bem em que museu ou galeria do Recife

(ou Olinda) estava o quadro, mas foi ele o responsável

por me introduzir ao artista – se não me falhe a memó-

ria, entre outros nomes de uma exposição coletiva.

Confesso que aquilo me intrigou e, apesar de eu não ter

registrado tudo muito bem, o nome de Raul Córdula fi-

cou. Percebi que era importante. Minha primeira impres-

são diante de sua obra, contudo, misturou estranhamento

e curiosidade. O quadro parecia deslocado do tempo e

do lugar. E logo depois comecei a entender por que: o

abstracionismo geométrico não é (nem era) mesmo muito

comum pelas bandas de cá do Nordeste, onde a pintura

figurativa acabou se impondo. O próprio crítico Paulo

Sérgio Duarte e o pintor José Cláudio1 já haviam reparado

nisso quando escreveram a respeito de sua obra.

E tinha mais uma questão provável. Tendo sido o início

dos anos 2000 marcado pelo despontar de uma nova

geração de artistas visuais contemporâneos, nos quais

eu sempre esbarrava em minhas descobertas pela arte

pernambucana, uma pintura do tipo me jogava dire-

tamente a um passado artístico. A uma história que,

seguindo a “lógica” dos livros, ficara para trás.

O ponto é que, com algum conhecimento em arte e já

me arvorando a tecer os primeiros comentários sobre a

produção plástica pernambucana, tirei prontamente do

meu (curto) repertório uma conclusão para o que via

ali. Raul Córdula seria, portanto, um legítimo exemplar

do Concretismo, movimento que, a partir dos anos

1950, colocou régua nos pincéis e apartou a pintura

do mundo exterior comumente idealizado. Foi assim

na Europa, nos Estados Unidos e também no Brasil

– todos com uma boa dose de influência da corrente

construtivista. Uma onda de abstracionismo marcou a

produção pictórica num momento em que o interesse

dos criadores se curvou em direção à “estética pura”,

a uma pintura com um fim em si mesma – mínima,

racional, geométrica, formal e antimimética, rompida

com o realismo tradicional e o “subjetivismo artístico”.

Com relação a Raul Córdula, minha observação

incipiente não era de todo equivocada. Era, na verda-

de, precipitada, porque pela tela (e por outras que vi

Page 7: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

RAUL CÓRDULA | 5 0 a n o s d e a r t e | u m a a n t o l o g i a

7

2 Comovereiadiante,mesmodialogandocomaestéticadomovimento,RaulCórdulabuscouemsuapinturaumjeitopeculiardelidarcomelementosgeométricos.

depois) eu enquadrei o pintor no rigor de suas formas.

Mas estava apenas diante de uma de suas fases – que,

aliás, jamais recebeu do artista o título de “concre-

ta”2. Por sorte, o conhecimento e o tempo nos livram

de vereditos apressados. Na medida em que fui me

aproximando do trabalho deste paraibano, acolhido por

Olinda há mais de 30 anos, descobri um artista de mui-

tos predicados. Um nome que Pernambuco e outros

estados ainda parecem desconhecer em sua amplitude.

Muitos estudiosos e admiradores da arte certamente

conhecem o curador, o crítico, o pintor abstrato e até o

cenógrafo. Mas o que dizer do artista com mais de meio

século de trabalho e uma porção de obras relevantes

para a nossa história? Fazer um apanhado desse extenso

percurso é, portanto, mais do que a proposta da expo-

sição Raul Córdula: 50 anos de arte (uma antologia). É

um papel e tanto. A seleção dos trabalhos feita por ele,

nesse exercício de revisitar a própria obra, se mostra aqui

generosa e reveladora. Um convite para adentrarmos

melhor num universo ainda pouco explorado, apesar das

suas muitas facetas e consagrações mundo afora.

Este não é um trabalho simples, muito menos se resu-

me ao abstracionismo geométrico – apesar de sua pre-

sença recorrente. Abrangendo uma produção datada

de 1965 até agora, as nove séries escolhidas apontam

para tempos e estilos distintos, capazes de atestar uma

obra que, não raro, carrega na sua complexidade. Não

podia ser diferente. Raul é um desses artistas cons-

cientes do seu ofício. Ele sintetiza a história da arte no

próprio trabalho e ainda traz a reboque conhecimentos

de outros campos, como o religioso e o político. Pode-

ríamos afirmar, portanto, que ele se encaixa no hall dos

artistas cultos, no qual estão nomes como Francisco

Brennand, Montez Magno e João Câmara, seu con-

terrâneo. Ele não gosta muito de ser visto assim, mas

esta me parece uma chave para acessarmos a densi-

dade das pinturas, dos desenhos, dos grafismos e das

demais empreitadas do seu arsenal criativo.

Paradoxalmente, o hermetismo que resvala de boa

parte de seus trabalhos parece contradizer – ou no mí-

nimo tensionar – seu desejo de fazer arte para o povo.

Mas justo nesse impasse reside a poética do artista,

que busca se equilibrar entre o esteta e o político, sem

necessariamente romper essas duas dimensões (qual-

quer ruptura mostra-se arbitrária ou é somente uma

tentativa de abstração).

A meu ver, ambas as tendências – ou essa dualida-

de – pontuam de maneira crucial o conjunto escolhido

Page 8: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

8

3 ReferênciaàfaladeHélioOiticica(1979)transpostaem:SOARES,PauloMarcondesFerreira.Arte, política e juventude no Brasil:questõesdearteeparticipaçãosocial.In:GROPPO,LuísAntonioet.al.Juventudeemovimentoestudantil:ontemehoje.Recife:EditoraUniversitáriadaUFPE,2008.

4 COUTO,MariadeFátimaMorethy.Por uma vanguarda nacional:acríticabrasileiraembuscadeumaidentidadeartística(1940-1960).Campinas:EditoradaUnicamp,2004.

por ele para representar seus 50 anos de arte. Uma

representação, aliás, para ser encarada não pela

perspectiva cronológica, típica de efemérides como esta

– por sinal, retroativa a 2010, quando Raul relembrou

sua primeira individual, realizada na João Pessoa de

1960. O apanhado deve ser antes visto em seu poten-

cial de antologia, que, como toda ela, produz um olhar,

um dado discurso. Não se trata de uma tentativa de

reducionismo, mas de uma interpretação possível, de

uma estratégia talvez mais proveitosa, através da qual

podemos reter, em maior profundidade, o sentido deste

nome para a história da arte no Brasil.

Um artista de 60

Pela sua fala, pela sua arte, Raul Córdula parece se si-

tuar melhor na geração de artistas como Hélio Oiticica,

Antônio Dias (também paraibano), Carlos Zilio e Lygia

Pape, do que na anterior. Tidos por historiadores como

a neovanguarda brasileira, que despontou com a dé-

cada de 1960, foram eles os responsáveis por colocar

a produção visual do País num novo patamar. À sua

maneira, talvez menos extrema no experimentalismo,

Raul comungou com eles alguns dos ideais artísticos

centrais da época, além da idade semelhante – muitos

deles nasceram também na década de 1940 – e do

convívio direto em momentos históricos, como na expo-

sição Nova objetividade brasileira, realizada em 1967,

no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/

RJ), por iniciativa de Hélio Oiticica.

Foi o artista carioca quem de fato puxou uma revisão

crítica do movimento Concretista, reclamando uma

“nova figuração”, “uma nova objetividade” à arte

brasileira. Seu projeto voltava-se à ideia de “objeto”

(inter-relacional, “perceptivo”, “ambiental”, o princí-

pio da instalação), em contraponto ao que chamou

de “descrença nos valores esteticistas de quadro de

cavalete”3. Curiosamente, ele mesmo havia pintado

abstrações geométricas nos anos 1950, mas logo

deixou de lado, diante do contexto de mudança no

Brasil e no mundo. Na visão da historiadora Maria de

Fátima Morethy Couto4, o rompimento, teorizado pelo

próprio Oiticica, marca a passagem de dois momentos

na história da nossa arte: do Concretismo para o Neo-

concretismo, a partir do eixo Rio-São Paulo. Em outras

palavras, da “arte pura” para uma arte experimental e

engajada, comprometida, em seus princípios, com o

Page 9: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

RAUL CÓRDULA | 5 0 a n o s d e a r t e | u m a a n t o l o g i a

9

5 SOARES,PauloMarcondesFerreira.Arte, política e juventude no Brasil:questõesdearteeparticipaçãosocial.In:GROPPO,LuísAntonioet.al.Juventudeemovimentoestudantil:ontemehoje.Recife:EditoraUniversitáriadaUFPE,2008.

envolvimento do público ou, nas palavras do sociólogo

Paulo Marcondes Soares5, com a “participação social”.

Apesar de ele ter trilhado seu próprio caminho, Raul

Córdula é cria desse momento. Isso transparece tanto

em boa parte das obras aqui reunidas quanto no seu

próprio discurso. Logo na primeira vez em que conver-

samos sobre os trabalhos da mostra, me chamou aten-

ção a maneira enfática com que afirmou “Sou de uma

geração que ainda acredita na arte para o povo”. Ora,

até pela carga utópica da frase, ela é típica da geração

1960. Está no discurso de críticos como Mário Pedrosa

e Ferreira Gullar, assim como do próprio Hélio Oiticica.

Na visão de Couto, existiram pontos cruciais que uni-

ram artistas desse momento. Desejos de uma arte para

o povo e pelo povo; de uma arte participativa e coletiva,

para o público; de uma arte experimental e libertária,

sem “ismos”; de uma arte para além da pintura e do

caráter visual – “politecnomorfa”, de múltiplas lingua-

gens; de uma arte ligada ao cotidiano e à realidade,

sem o dever da mímese; em suma, de uma arte polí-

tica. Embora essas vontades tenham, algumas vezes,

se distanciado da prática, e mesmo da relação com

o público, as criações artísticas foram quase sempre

tentativas nessa direção, o que decerto levou parte da

produção brasileira a trilhar novos rumos, ainda mais

radicalizados na geração seguinte, dos anos 1970.

Sob o ponto de vista imediato, que reduz Raul Córdula

a um mero pintor formal, é difícil enxergá-lo nesse

meio. Mas isso não acontece se estivermos dispostos

a mergulhar nos trabalhos escolhidos para representar

sua trajetória até aqui. Mesmo as suas pinturas mais

abstratas são motivadas por um desejo de mundo, de

olhar para o outro. As telas da série Geometrias recen-

tes, por exemplo, têm como uma das suas inspirações

a arquitetura popular das casas de interior. O resultado,

claro, dialoga com a estética formal do Concretismo ou

do Construtivismo, mas há elementos que o tornam um

pintor diferente dentro da corrente abstrata.

Na verdade, Raul não começou por aí. A obsessão pela

geometria se tornou uma característica imponente de

sua obra, é verdade, mas jamais definidora de tudo.

Ele mesmo nunca se inseriu entre artistas “concre-

tos”, como Waldemar Cordeiro, Geraldo de Barros e o

próprio Hélio Oiticica, nos anos 1950. Enquanto estes

Page 10: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

10

6 ManifestoPor uma exposição censurada,redigidoporJomardMunizdeBritoeWillsLealapóscensurasofridapelaexposiçãodeRaulCórdula,nohalldareitoriadaUFPB.

se detinham nas formas, no Sudeste, Raul começava

na Paraíba a pintar flores, pássaros, mulheres, peixes

e outros temas da região. A relação estabelecida com

triângulos, quadrados e círculos só veio anos depois. E,

de maneira recorrente, com mais vinculação simbólica,

de carga religiosa e mística, do que puramente formal.

A conhecida série de aquarelas feitas em Paris, em

1991, é um exemplo disso e também pode ser vista

nas escolhas da exposição.

O trabalho mais antigo do conjunto antológico aqui

exposto, aliás, não compactua com nenhuma tentativa

de formalidade estética. Ao contrário, os desenhos da

série João Pessoa 1965 nascem do interesse do artista

pela arte espontânea, quase primitiva, das garatujas de

criança ou dos rabiscos deixados por pessoas comuns

no muro. Uma atitude bastante moderna, no sentido

artístico da palavra, que já aponta nos seus quadros

também uma postura política, própria de sua geração.

Basta observar, por exemplo, a subversão que ele faz

da imagem dos três macacos do “não vejo”, “não falo”,

“não ouço”, colocando-os para ver, gritar e ouvir, numa

representação figurativa mais humana. E há ainda ou-

tras sutilezas, como a frase “Cuidado com este chão”,

em alusão às Ligas Camponesas.

O engajamento segue seu rumo em obras subsequen-

tes, como as telas de 1968, censuradas na Paraíba, por

ordem do Conselho Universitário da UFPB, onde Raul

trabalhava e expunha na ocasião. Não foi a Polícia Fe-

deral e tampouco uma “proeza” do AI-5, que ainda nem

havia baixado seu capuz negro sobre a liberdade artísti-

ca. A direção da universidade viu nos quadros do pintor

uma “ofensiva à moral e ao pudor público”. A série de

pinturas trazia algumas imagens de mulheres virgens

e nuas, rodeada de guardiões felinos, o que deve ter

incomodado os conservadores da instituição. Isso fez o

agitador Jomard Muniz de Brito soltar, num manifesto6,

provocações como: “A imoralidade está na obra ou na

perspectiva de quem vê? Os nossos doutores provincia-

nos se escandalizariam diante da Vênus de Milo?”.

Havia na série imagens mais impactantes, que dialoga-

vam muito bem com o contexto sociohistórico brasileiro

daquele momento. Em um dos quadros, também vistos

nesta antologia, um homem aponta um revólver para

o espectador. Em quase todas as telas, é direta a refe-

rência de Raul a episódios e símbolos de um período

repressor, como arma, coturno e sangue no chão. Mas

estes não foram, ao que parece, o motivo da censura,

tanto que ele mesmo voltou a montar a exposição no

Page 11: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

RAUL CÓRDULA | 5 0 a n o s d e a r t e | u m a a n t o l o g i a

11

7 NoseutextoparaocatálogodaexposiçãoAnos 1970 – arte como questão,promovidapeloInstitutoTomieOhtakeem2007|Arte como questão:anos70=Art as question:the1970s.Curadoria:GlóriaFerreira.Versãoparaoinglês:StephenBergetal.SãoPaulo:InstitutoTomieOhtake,2009.Meioséculodeartebrasileira;2.

Teatro Santa Rosa, logo depois. Meu pai, que é pa-

raibano e militou contra a ditadura, me confessou dia

desses que jamais esqueceu do revólver apontado para

ele na juventude – tempos depois o quadro foi exposto

numa sorveteria de João Pessoa e foi lá que ele viu.

Interessante observar a estética utilizada por Raul

Córdula nesse trabalho, um dos primeiros da arte bra-

sileira a revelar influências da Pop Art, numa pegada

bem cartunesca. Nesse sentido, e mesmo à distân-

cia, o artista revela mais uma vez seu diálogo com a

geração 60 que, lá do Rio de Janeiro e de São Paulo,

também cuidava de enaltecer a vanguarda pop norte-

americana. Os brasileiros viam no movimento artístico

dos Estados Unidos uma aproximação com as mas-

sas, uma linguagem original, atual e popular, mesmo

bebendo da estratégia da publicidade, como fez Andy

Warhol. Hélio Oiticica era um dos que se identificavam

com o movimento, cujas características ajudaram a

colocar mais tintas nos seus ideais de construção no

País de uma arte “para o povo”. Tudo isso reverberou

nas criações surgidas dos anos 1960 em diante no

Brasil, fazendo quadros como Anywhere is my land, de

Antônio Dias, serem primos-irmãos das telas de 1968

pintadas por Raul. E, vale dizer, não pela mesma terra

que viu os dois nascerem, mas pelo trilho artístico no

qual ambos deslizaram suas poéticas.

As séries O país da saudade, Araguaia e Made in

PB – feito em chumbo, também reunidas na presente

antologia, não dialogam tão diretamente com a Pop

Art, mas seguem rumo semelhante na obra de Raul.

Em especial, apontam para um percurso político e

experimental mais evidente na geração de 1970,

embora sejam trabalhos produzidos posteriormente. Se

a geração anterior já havia apontado para um engaja-

mento como resposta a um dado momento na arte e

na política brasileiras, a década seguinte “desdobra-se

em diferentes situações inseparáveis dos contextos

sociopolíticos decorrentes da ditadura”, como enfatiza

a curadora Glória Ferreira7.

Raul não passou ao largo desse desdobramento. De

1982, O país da saudade é um exemplo inserido nesse

tempo, seja pela linguagem, seja pela temática. Política

desde o processo, a série em arte postal segue a linha de

trabalhos que buscaram formas coletivas de produção

– como a do Grupo Fluxus – e vias alternativas para a

arte – a exemplo dos trabalhos em arte correio feitos por

Paulo Bruscky no Recife, ou da série história Inserção

Page 12: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

12

8 EstanãofoisempreabandeiradaParaíba.AmudançaaconteceudepoisdoassassinatodeJoãoPessoa,entãopresidentedoestado(oequivalenteagovernador),numepisódiotidocomooestopimdachamadaRevoluçãode1930,queinaugurouaEraVargasnoBrasil.Contaahistóriaquecercadeumanoantes,JoãoPessoahavianegadoapoioaocandidatodasituaçãoàpresidênciaJúlioPrestes,masasinsatisfaçõesrelacionadasaele(eàsuamorte)nasceramantes,dentrodaprópriaParaíba.Osperrepistaseramseusprincipaisopositores.OavôdeRaulfaziapartedestegrupo.Eopróprioartistasedizatéhojeumperrepista,emboraoPartidoRepublicanoPaulistatenhasidoextinto.DadosporOtávioCitone,amigodeRaulesobrinhonetodeZéPereira,famosoperrepista,ostirosnoquadrorepresentamamortedopolíticoquevirounomedecidade,mitificadaemseupassadoregistradocomoheroico.

em circuitos ideológicos, de Cildo Meireles, na qual se

apropria de cédulas de dinheiro e garrafas de coca-cola.

Na sua obra, Raul enviou um papel em branco, endere-

çado a artistas e amigos com os quais via identificação.

Na folha, estava o tema (O país da saudade) e o seguinte

pedido carimbado: “Por favor, interfira e me devolva”.

Mais de 60 respostas estão reunidas na série, sendo qua-

se metade de Jomard Muniz de Brito. As interpretações

são múltiplas e dialogam muitas vezes com o contexto

sociopolítico do qual falou Glória Ferreira.

O compromisso com a história do Brasil, na perspectiva

de revisão, também transparece em Araguaia e Made

in PB – feito em chumbo, independente de terem sido

produzidas nos últimos cinco anos. Aliás, o encontro, no

mesmo momento, destas e de outras séries descritas aci-

ma parece não só oportuno como cumpre um papel: nos

atira inevitavelmente na direção da crítica e do questio-

namento. Nunca é tarde para revermos o discurso sobre

nosso passado. E Raul nos incita a isso, assumindo nova-

mente a postura artística e política que mobilizou sua

geração. Seja ao evidenciar o nome dos desaparecidos

políticos na Guerrilha do Araguaia (1972-1975), ainda

arquivados pela história oficial; seja ao sacudir a própria

simbologia da sua terra natal – a bandeira paraibana.

Pelas mãos do artista, a flâmula rubro-negra está longe de

balançar orgulhosa. Apropriando-se da sua imagem e ge-

ometria, Raul procura fazer sua leitura dos acontecimen-

tos que regem a origem do signo onde se lê, em letras

garrafais, “NEGO”. No lado preto da bandeira, o artista

colocou chumbo (literalmente) com três tiros. No ver-

melho, suprimiu o “n”, deixando transparecer a palavra

“EGO”, que, na sua versão, surge de forma velada, como

se largada num muro8. Há outras obras em Made in PB,

mas esta cumpre, sem dúvida, uma função sintetizadora.

Apesar das inclinações ideológicas de esquerda, Raul

conta que nunca assumiu uma postura combativa ou

partidária – como se seus quadros não gritassem para o

mundo... De outro lado, não desconsidera seu frequente

envolvimento com questões coletivas e sociais, que mar-

caram, de forma indelével, sua visão de mundo. Como

Page 13: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

RAUL CÓRDULA | 5 0 a n o s d e a r t e | u m a a n t o l o g i a

13

9 Dotexto“AsimbologiadeRaulCórdula”,escritoparaumaexposiçãodoartistarealizadanaGaleriaVicentedoRêgoMonteiro,noRecife,em1990.

ser humano, como artista. Quando perguntei sobre a

participação dele nas lutas contra a ditadura, responde

que nunca foi de fato militante, mas solidário com a cau-

sa, ajudando na fuga de amigos ou dando sua contribui-

ção artística. “Essas coisas nunca saíram da cabeça e

do coração das pessoas da minha geração.”

É preciso dizer que mesmo quando se ocupa da formali-

dade pictórica, Raul não se esquece de sua humanidade,

no sentido menos “racionalista”. Há nas suas pinturas

abstratas uma “geometria do próprio ser”, como assinala

a artista Amélia Couto9. Ora relacionada a figuras simples

e populares, ora a uma dimensão transcendental, repleta

de mistério e espiritualidade. Em nenhum momento, ele

se mostra puro ou frio. Tudo isso pode ser observado mais

de perto no seu livro de artista, no qual revela, de maneira

inédita, um pouco do seu processo criativo.

Realmente me impressionei quando ele me confessou

que passou a pintar figuras abstratas por medo da

repressão – e depois por necessidade de sobrevivên-

cia, haja vista o potencial comercial de seu abstracio-

nismo geométrico. Claro, ele também tem apego pelas

geometrias, mas, de alguma maneira, elas parecem ca-

muflar uma renúncia do artista aos seus ideais, à sua

vocação – o que o faz voltar agora para fazer justiça

com a própria obra. Está certo. Seu trabalho é mais do

que triângulos, quadrados e círculos, sem eximir a rele-

vância dessa produção em sua trajetória. Afinal, não

por acaso está na antologia.

Seu repertório, contudo, é mais vasto do que o discur-

so que o enquadrou nos últimos tempos, embora não

deixe de ser fruto da própria escolha do artista. Pelo

menos em parte. Mas é tarefa nossa, como observa-

dores da arte, abrir novas trilhas interpretativas, novos

campos de fruição. São mais de 50 anos de arte e

quase 70 de vida. De resto, não há mais nada a dizer.

Ainda precisamos conhecê-lo melhor.

Recife, maio de 2012.

Page 14: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

14

Apesardedialogarvisualmentecommovimentosquelevaramapinturana

direçãodoabstracionismogeométrico,estastelasdeRaulCórdulanãobus-

camumfimemsimesmas.Nãosãoaexpressãodaartepelaarte,daforma

pelaforma,daautorreferênciapreconizadapeloidealda“estéticapura”.

Nestecaso,éprecisoiralémdecódigosreproduzidospelahistóriada

arte.Nãoháaquiumrompimentototaldapinturacoma“realidade”,

ouseja,comasuafunçãorepresentativa.Nãoraro,ascomposições

monocromáticasdoartistaremetemadiversasreferênciasdeseureper-

tóriovisual.Sãoalusões,muitasvezes,aoarsenaldeumaricamemória

imagética;deumaarquiteturaafetiva,sobretudo.

Detalhesdeplatibandasdascasasdeinterior,comadornoslosangulares,

porexemplo,sãotrazidosàcenapeloseuolhargeometrizado.Ografismo

deumcarro,vistopeloartistanasparedesdeumacasadoSertãodo

Ceará,nosanos1980,ganhanovarepresentaçãopelasmãosdele.São

trabalhosrecentescontaminadosporquestõesantigas,comodizopintor.

Entretrípticosedípiticos,pinturasganhamvolumeecoressaltam

aosolhos,camadaacamada.Écomosequisessemconfirmarotítulo

de“colorista”dadousualmentepelaartistaAméliaCoutoaele,seu

marido.Explorandoumageometriafigurativa,eleparecequererbuscar,

outravez,oprincípiodascoisas;o“grauzero”dapinturabrasileira,

usandoaexpressãodePauloSérgioDuarte,queRaulacompanhouem

pesquisassobrecasasdeinterior.

Masnãohánemumapretensãominimalista,tampoucoumpactode

fidelidadecomo“real”.RaulCórdulatrafegaentreasbrechasesegue

seupercursosemquerersaberdemuitasdistinções.

Geometrias Recentes

Page 15: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

15

Conjunto5pinturasemtela2012331x120cm

Page 16: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

GrafiteFotografiaimpressaemtela1980(fotografiaoriginal)/2012(interferênciaeimpressão)150x100cm

Page 17: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

17

Conjunto e GrafiteTríptico2012280x100cm

Page 18: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

18

Fachada5pinturasemtela2012270x120cm

Page 19: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

19

Fachada3pinturasemtela2012300x120cm

Page 20: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

20

PlatibandaDíptico2012300x100cm

Page 21: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

21

Page 22: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

22

Estasérierepresentaumadasfasesmaislongasebem-sucedidasda

carreiradeRaulCórdula.Foiatravésdoestilodesenvolvidonessas

aquarelas–tambémexploradoemoutrastécnicas–queeleficou

maisconhecidoentregaleristasecolecionadoresdearte,sobretudono

Recife.Curiosamente,éumtrabalhobastante“cerebral”ehermético

naproduçãodoartista,queaquiseachaemsuafasemaisexotérica.

Deformarecorrente,Raulfaznestesquadrosummergulhoem

elementossimbólicosquemesclammisticismoeracionalidade.A

tetraktys,dePitágoras,éumadasfigurasmaisexploradas.Nela,dez

bolas(quatrodecadalado)formamumtriânguloequilátero,represen-

tandoumaharmoniasintetizadapelonúmeroquatro.Éconsiderada

umadasfigurasmaistranscendentaisdopensamentopitagórico.Para

oteóricogrego,osnúmeroserammuitomaisdoqueumamaneirade

mensurarascoisasdavida.Eram,antes,ofundamentodouniverso.

ComoestudiosodePitágoraseobservadoratento,Raulfaztambém

nestetrabalhosuasincursõespornúmerosegeometrias,marcando

comcores,pinceladaseoutrasreferênciasvisuaissuainterpretação

domundo.Ummundoondehádiferentesmovimentos,infinitas

possibilidadeseumlimitetênueentreoabstratoeofigurativo.

Paris 1991

ParisConjuntode15

aquarelassobrepapel1999

50x35cm

Page 23: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 24: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

24

Page 25: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

25

Page 26: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

26

SobochãodoNortebrasileiro,aindamoraadúvida.Àsmargens

doRioAraguaia,rondamnomesdedesaparecidospolíticos.Onde

estarãoValquíria,Chico,Mané,DudaeOsvaldão?Oquedizerde

Landinho,Amauri,Mundico,Joaquimetantosoutrosfilhosefilhas,

mulheresemaridos,amigoseamigas?Quemsabe?Nestasérie,feita

nosúltimoscincoanos,oartistaretomaumcapítuloduroeainda

obscurodenossahistória:aGuerrilhadoAraguaia.

Movimentopolíticoderesistênciaàditaduramilitar,organizadopor

militantesdeesquerdaentre1972e1975,aguerrilhatinhaideiais

comunistasebuscavaconstruirumaestratégiaalternativanazona

ruralbrasileira,longedoclimadarepressãourbana.Acabousendo

esmagadapelasForçasArmadas.Osaldofoidemortos,desapareci-

dosealgunssobreviventes,quesaírampresos.

Atéhoje,maisde50nomesencontram-sesumidos,arquivados.

Destinosperdidosdefamíliasaindaàprocuradeseusdireitos.

Numaalusãoaomovimento,RaulCórdulaprocurafazer,digamos,a

suajustiça.Comasmãosdeartista,derramaemtintas,desenhos,

colagenseoutrosartifícioscriativosumaversãopossívelparaum

episódioaqueahistóriaaindadevemuitaspáginas.

Araguaia

ARAGUAIABarrocozido200428x46cm

Page 27: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

27

ARAGUAIANanquimecarvãosobrepapel2012150x100cm

Page 28: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

28

Page 29: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

29

ARAGUAIAPinturasobrepapel2012450x150cm

Page 30: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

30

Primavera Negra 1Pinturasobremadeiraerelevo(ColeçãoOtacílioCartacho)196895x140cm

Marcasdahistóriapercorremestaspinturascomosequisessemcontar

tudooqueviveramatéaqui.Estardiantedelasémuitomaisdoque

percebersímbolosfortes,alusivosaumperíododeviolênciamilitar

noBrasil,quepodiam,deoutramaneira,tambémfalardehoje.Estar

frenteaestasérieé,alémdetudoisso,conhecerumavidacujoper-

cursoseconfundecomaprópriatrajetóriapolíticaeartísticadopaís.

Comestasmesmaspinturas,RaulCórdulasentiuopesodacensura

eoconstrangimentodeversuasobrasseremretiradasdohallda

reitoriadaUniversidadeFederaldaParaíba(UFPB),ondeestavam

sendoexpostas.Nãofoiumadeterminaçãodoregimemilitar,tam-

poucoteverelaçãocomoAI-5,queaindanãohaviasidoinstituído,

emboraoanofosse1968.Acensuraaconteceuantesdissoepartiu

deumaordemdoConselhoUniversitáriodaUFPB,queviunestes

quadrosuma“ofensivaàmoraleaopudorpúblico”.

Oepisódionacapitalparaibanaacabousendoamenizadoporuma

intervençãodeJoãoAgripino,entãogovernadordaépoca,quedeter-

minouqueasérievoltasseaserexposta.OTeatroSantaRosarece-

beuastelas,oquenãoevitouademissãodoartistadaUFPB,onde

trabalhavacomocoordenadordosetordeartesplásticasdoDepar-

tamentoCultural.Emseguida,oRecifeeOlindatambémvirama

mostra.Naaberturadestaúltima,CaetanoeGilleramomanifesto

tropicalista“Inventáriodofeudalismoculturalnordestino”,escrito

porJormardMunizdeBrito.

Todasasobrasvistasaquicarregamessehistórico–mesmoastelas

repintadas,porteremsidovendidasouperdidas.Erevelamaindaos

primeirosflertesdaproduçãobrasileiracomapopartnorte-americana.

1968

Page 31: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

31

Primavera Negra 2Pinturasobretela(releitura)2008180x150cm

Primavera Negra 3Pinturasobretela(díptico,repintura)201280x160cm

Page 32: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 33: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 34: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

34

Livro

Odesigner,oartista,opintor,ometiculoso,oestudioso,o

religioso...Esteéumtrabalhoquerevelaasmuitasfacetasde

RaulCórdulae,dealgumaforma,desnudaumpoucodasua

intimidade,escancarando,embrechas,umpoucodomistério

desuascriaçõesnomomentodoprocesso.

Nãoeraparaser,masacabouvirandoumlivrodeartista,um

objetodearte.Destesquedávontadedeviraraspáginas

repetidasvezes,comolhardecuriosidade–paranãodizerde

voyer.Noinício,eraparasersóumcadernodepautas,mas

aospoucosfoivirandoumcompanheiroinseparáveldeRaul,

ondeelederramaatéhojeseusesboços,seusestudos.Oinício

foinosanos1980enuncamaisdeixoudeserocomeçode

muitostrabalhos.Váriosprincípiosestãoaquidesdeentão.O

esboçodeobrasquesematerializaram–comosepodever–e

oprojetodeoutrasquetalvezfiquemporaí.

Deumaformaoudeoutra,olivronosajudaaentenderaarte

deRaul.Nuncareveladoaopúblicoatéentão,surgecomo

umapistanovaparaoentendimentodeumconjuntosignifi-

cativo.Nestecontexto,aparececomopeça-chave.Umapeça

viva,atravésdaqualpodemoscompreenderumprocesso

artísticoquepassanecessariamenteporumlaborintelectual;

porumhermetismocarregadodesimbologia.Ageometria,a

espiritualidade,ahistóriaeografismosãoalgunsdospontos

recorrentes.Nãoháintençãodidática,masopercursopor

essaspáginasamareladaspodenoslançarmuitasluzes.

Livrodecontabilidadecomdesenhosecolagens

1980a2012

Page 35: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

35

Page 36: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

36

A Gaivota Cega

Umaobraparaservistacomasmãos.Eisopropósitodestetra-

balho:seralcançadoatravésdotato,umaformadeacessomenos

imperativanoterritóriovisualdaarte.Otocaréaquioinstrumento,

omecanismopormeiodoqualoartistaoferecesuasensibilidade

aomundoe,emespecial,aoscegos–aquemdedicaestasérie.

OtrabalhopartedocontoAgaivotacega,escritopelopróprioRaul

Córdula.Namostra,aspalavrasdotextosãoapresentadasem

braile,paraseremlidascomapele...Oenredogiraemtornode

umsupostoencontroentreoartistaeAristides,umhomemcuja

deficiênciavisualchamasuaatençãodeumjeitoinesperado,eisso

acabadoaproximandoosdoisparaumaconversasobrepintura.

NametáforaexploradaporRaulnesteconto,onãoenxergarérela-

tivo.Nestecaso,éumamaneiradetranscenderosentidodaarte;

dascores,dasformas.Enquantooartistafaladepinturaedeuma

desuascriações,oseunovoamigoosurpreendecominterpretações

quasesinestésicas:“...overmelhoécomoogritodopavão!”.

Alémdotexto,eleexpõeseisplacasdeacrílico,comdesenhosem

relevoparaseremtateadospelopúblico.Sãocontornosretiradosde

trabalhosantigos,pelosquaiseletemapego.Sena“conversa”com

Aristidesapalavradeleécomo“umaluz”,nestetrabalhopropostas

alternativasdefruiçãonoslevamaoutrasformasdevisão.

Page 37: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

37

Placadeacrílicocomdesenhogravado–6peças2012

Page 38: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

38

OPaísdaSaudadeéumasériedeartepostaleoutraexpressão

dosanguepolíticoquecorrenasveiasdeRaulCórdula.Bemno

espíritocoletivoquemarcasuapersonalidadeeadasuageração,o

trabalhovainatrilhadosquebuscaram,pormeiodecircuitosalter-

nativos,romperasfronteirasinstitucionaisdaartenoBrasil.Através

deenviospostais,Raulestimulouamigos,artistaseoutraspessoas

comasquaistinhaidentificaçãoacolaborarcomasérie.

Oanoera1982eatrocaconsistianoseguinte:elemandavaum

papelembranco,apenascomomote“Opaísdasaudade”.Noenvio

tambémiaumrecadocarimbado–“Porfavor,interfiraemedevolva”.

Várioscolaboradoresenviaramsuasrespostas.Asinterferênciasvisuais

everbais,comosepodeveraqui,foramtãosintomáticasquantoomo-

mentopeloqualpassavanossopaísdeentão–emviasdereabertura

emuitolongeaindadetrazerseusexiladosdevoltaparacasa.

OinquietoJomardMunizdeBritofoioartistaquemaiscontribuiu

comasérie.Emcadaumadesuasplaquetas,épossívelsentiroes-

píritolibertárioeutópicoquemarcouaartepostalbrasileira,tanto

políticaquantoesteticamente.

O País da Saudade

O País da Saudade66folhasdepapelofício

cominterferênciasgráficas1982

Page 39: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 40: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

40

Page 41: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

41

Page 42: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

42

Nestetrabalho,feitonosúltimosanos,PBéumasiglatomadaemseu

duplosentido:remetetantoàParaíbaquantoaoelementochumbo.A

junçãoéumametáforadahistoriografiapolíticadoestadodeorigemde

RaulCórdula,queéparaibano,efunde-senumapinturabastantesigni-

ficativa–emborahajaoutrasobrasnasérie.

Sobumaperspectivacrítica,oartistaprocurarever,atravésdeste

trabalho,opassadodesuaterra–etambémoseu.Apropriando-seda

imagemdaatualbandeiraparaibana,elerevisitaosacontecimentospor

trásdaprópriacriaçãodosímbolorubro-negro,ondeselêoriginalmen-

te“NEGO”.Noladopretodabandeira,elecolocouchumbo(literal-

mente)enoladovermelho,suprimiuo“n”,deixandotransparecera

palavra“EGO”,que,nasuaversão,surgedeformavelada,comose

tivessesidodeixadasobreummuro.

Sabe-sequeestanãofoisemprebandeiradaParaíba.Amudança

aconteceudepoisdoassassinatodeJoãoPessoa,entãopresidentedo

estado(oequivalenteagovernador),numepisódiotidocomooestopim

dachamadaRevoluçãode1930,queinaugurouaEraVargasnoBrasil.

Contaahistóriaquecercadeumanoantes,JoãoPessoahavianegado

apoioaocandidatoàpresidênciaJúlioPrestes,masasinsatisfaçõesem

relaçãoaelenasceramantes,dentrodaprópriaParaíba.Osperrepistas

eramseusprincipaisopositores.OavôdeRaulfaziapartedestegrupo.

Eopróprioartistasedizatéhojeumperrepista,emboraoPartidoRe-

publicanoPaulistatenhasidoextinto.Ostirosnoquadrorepresentama

mortedopolíticoquevirounomedecidade.

MadeinPBtambéméumrockdeZéRamalho,amigodoartista.

Made in PB - feito em chumbo

Page 43: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

43

Made in PB – Feito em ChumboTintaacrílicaemtela2005100x80cm

Bandeira do EGOChumboetelapintada–Díptico2005230x100cm(conjunto)

Page 44: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 45: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 46: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

46

João Pessoa 1965

Nestasériededesenhosaquarelados,feitostambémcomoutros

materiais–comocarimbos–,vemosumRaulCórdulamaissolto,

espontâneo,quaseprimitivo.Eisumarelíquiadeseuacervo,ainda

poucoexplorada.Vembemdoiníciodesuatrajetória,quandooolhar

doartistasecurvava,comfrequência,aosdesenhosougaratujasde

criança;aosdizeresegrafismoslargadosnosmuros,nascalçadas,

nasárvores;aosrabiscosfeitosaotelefoneporqualquerpessoa.

OconjuntodessasfigurasorgânicasremeteàbuscadeRaulpelo

espontâneonaarteetalvezatépelo“puro”.Nãonosentidoformal

dadoàprocuraporuma“estéticapura”,levadaacabopormuitos

nomesdesuageração.Masnosentidointuitivo,dequembuscao

princípiodofazerartístico.Oprocesso,contudo,nãoéinconscien-

te.Bastaobservar,porexemplo,asubversãoqueelefazdaimagem

dostrêsmacacosdo“nãovejo”,“nãofalo”,“nãoouço”,colocando-

osparaver,falareouvir.

Sãosutilezasdequemjáafirmouumdiaque,deformaconciente,

“ogrotescocomoengajamento,semquerersersartreano,represen-

taráo‘absurdodocotidiano’”.

Desenhos 19658desenhosemAquarela

enanquimempapel1965

Page 47: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 48: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

48

Page 49: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

49

Page 50: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 51: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo
Page 52: Raul Córdula 50 Anos de Arte . Uma Antologia .Catálogo

Apoio

Patrocínio Produção Realização