qfl1221 estrutura e propriedades de compostos orgânicos · 2020. 3. 26. · gerados em duas...

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1 QFL1221 – Estrutura e Propriedades de Compostos Orgânicos Massuo Jorge Kato (Bloco 11 T, sala 1124, 3091-1886/3813, [email protected]); Aula 20 de março Esse texto, que é um roteiro para esse conjunto inicial de temas dentro da disciplina, não pretende esgotar o assunto, mas é um roteiro de leitura para a análise de hidrocarbonetos e de outras classes de compostos orgânicos. É iniciado com uma discussão sobre propriedades físicas, especialmente pontos de ebulição, para a caracterização de compostos orgânicos, com ênfase em hidrocarbonetos. Introduzo os conceitos de formação e de estabilidade de espécies reativas como carbocátions e radicais livres. Descrevo os fatores que contribuem para a sua estabilização. Esse é um assunto de grande importância para o curso de estruturas e reatividade, que será tema da próxima disciplina em química orgânica e não devo adentrar em detalhes nas reações propriamente ditas, mas darei ênfase em alguns conceitos fundamentais. A estabilidade e o modo de formação de carbocátions e radicais são de fundamental importância em técnicas analíticas de determinação de estruturas, como a espectrometria de massas. Nesse resumo, são apresentados alguns dos modos de fragmentação, com ênfase na fragmentação alfa que é bastante dominante em hidrocarbonetos e em outros compostos orgânicos nos quais alguns heteroátomos facilitam essa fragmentação, mas também em fragmentações envolvendo a ruptura de duas ligações de forma simultânea. Tópicos Caracterização de hidrocarbonetos por propriedades físicas Análise de hidrocarbonetos por cromatografia a gás Estabilidade de cátions e radicais e suas consequências na análise por EM Uso de espectrometria de massas (EM) na análise de hidrocarbonetos e outros compostos. Conhecimentos prévios: Estrutura de compostos orgânicos, ligações químicas, principais funções, nomenclatura e geometria das funções orgânicas. Caracterização de hidrocarbonetos por propriedades físicas (métodos clássicos) A análise de hidrocarbonetos puros pode ser feita por medidas simples como ponto de fusão, ponto de ebulição, densidade e solubilidade. No entanto, no caso de misturas, há a necessidade de etapas de purificação como a destilação fracionada. Tais processos são amplamente utilizados na indústria do petróleo para a purificação de frações como a gasolina, diesel e outros. Vejam as faixas de ponto de ebulição principais e as correspondentes frações obtidas.

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QFL1221 – Estrutura e Propriedades de Compostos Orgânicos

Massuo Jorge Kato (Bloco 11 T, sala 1124, 3091-1886/3813, [email protected]);

Aula 20 de março

Esse texto, que é um roteiro para esse conjunto inicial de temas dentro da disciplina, não pretende esgotar o

assunto, mas é um roteiro de leitura para a análise de hidrocarbonetos e de outras classes de compostos

orgânicos. É iniciado com uma discussão sobre propriedades físicas, especialmente pontos de ebulição, para a

caracterização de compostos orgânicos, com ênfase em hidrocarbonetos. Introduzo os conceitos de formação e

de estabilidade de espécies reativas como carbocátions e radicais livres. Descrevo os fatores que contribuem

para a sua estabilização. Esse é um assunto de grande importância para o curso de estruturas e reatividade, que

será tema da próxima disciplina em química orgânica e não devo adentrar em detalhes nas reações

propriamente ditas, mas darei ênfase em alguns conceitos fundamentais. A estabilidade e o modo de formação

de carbocátions e radicais são de fundamental importância em técnicas analíticas de determinação de

estruturas, como a espectrometria de massas. Nesse resumo, são apresentados alguns dos modos de

fragmentação, com ênfase na fragmentação alfa que é bastante dominante em hidrocarbonetos e em outros

compostos orgânicos nos quais alguns heteroátomos facilitam essa fragmentação, mas também em

fragmentações envolvendo a ruptura de duas ligações de forma simultânea.

Tópicos

Caracterização de hidrocarbonetos por propriedades físicas

Análise de hidrocarbonetos por cromatografia a gás

Estabilidade de cátions e radicais e suas consequências na análise por EM

Uso de espectrometria de massas (EM) na análise de hidrocarbonetos e outros compostos.

Conhecimentos prévios:

Estrutura de compostos orgânicos, ligações químicas, principais funções, nomenclatura e geometria das funções

orgânicas.

Caracterização de hidrocarbonetos por propriedades físicas (métodos clássicos)

A análise de hidrocarbonetos puros pode ser feita por medidas simples como ponto de fusão, ponto de ebulição,

densidade e solubilidade. No entanto, no caso de misturas, há a necessidade de etapas de purificação como a

destilação fracionada. Tais processos são amplamente utilizados na indústria do petróleo para a purificação de

frações como a gasolina, diesel e outros. Vejam as faixas de ponto de ebulição principais e as correspondentes

frações obtidas.

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Tabela 1. Refino do petróleo bruto por destilação

fracionada.

Esse seria um típico resultado de uma destilação de uma

amostra de petróleo no qual abaixo de 30 oC, obtém-se fases

constituído por metano até butano, tipicamente um gás de

cozinha. Gradativamente as frações mais pesadas vão saindo

no processo de destilação com composição que sendo

gradativamente constituída por hidrocarbonetos com

número maior de carbonos.

Qual é o fenômeno envolvido no aumento das faixas de ponto de ebulição na medida que aumenta o número

de átomos de carbono?

Figura 1. Pontos de ebulição e ilustração

sobre as forças de London.

A principal causa para o aumento dos

pontos de ebulição na medida que se

aumenta o tamanho das moléculas dos

hidrocarbonetos, são as forças

intermoleculares conhecidas como forças

de van der Waals ou forças de London.

O que são tais forças? São forças atrativas

causadas pelo movimento de elétron em

torno dos átomos nas moléculas gerando

dipolos temporários. Na média, os dipolos

gerados em duas moléculas vizinhas

culminam por acarretar atração molecular.

Apesar das diferenças de eletronegatividade entre o hidrogênio (2,1 na escala de Pauling) e o carbono (2,5)

serem razoáveis, na média, um determinado átomo de carbono numa molécula de hidrocarboneto é

relativamente pouco polarizado e como um todo um hidrocarboneto é considerado uma molécula apolar.

Figura 2. Correlação entre o número de átomos de

carbono e as faixas de pontos de ebulição.

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Figura 3. Pontos de fusão e de ebulição de alguns hidrocarbonetos

ramificados.

As ramificações acarretam diminuição no ponto de fusão

e de ebulição (hexano para 2-metilpentano); uma molécula

simétrica possui interações intermoleculares mais significativas do

que um análogo assimétrico. Esse é o caso do 3-metilpentano para

o 2-metilpentano ou do 2,3-dimetilbutano (simétrico) para o 2,2-

dimetilbutano (assimétrico).

Figura 4. Efeito das diferentes funções sobre os

pontos de ebulição.

Aqui temos vários compostos contendo 4 – 6

átomos de carbono e massa molecular em

torno de 83-88 Da. Tentem justificar as

diferenças de pontos de ebulição tendo como

ponto de partida o hexano (69oC). Quando se

tem o 1-pentanol o ponto de ebulição aumenta

para 138 oC ou, no caso do ácido butanoico,

164 oC, o que é explicado pelas ligações de

hidrogênio. No caso do ácido butanoico,

forma-se um dímero (como seria?). Para

aminas, ocorre também a formação de ligações

de hidrogênio. No caso de nitrilas, temos um

grupamento polar CN.

Agora, o que acontece no caso de ésteres etanoato de etila ou propanoato de metila? Por que não temos tantas

interações por ligações de hidrogênio?

Um caso extremo de ponto de ebulição é a butanamida (216 oC). O que acontece aqui? Qual é o nível de

sobreposição do par de elétron não ligante do Nitrogênio com a carbonila?

Vejam também o efeito da polarização ou das ligações de hidrogênios sobre a solubilidade em água.

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Figura 5. Variação do índice de polaridade na série

de solventes.

Enfim, todos esses compostos (solventes)

apresentam propriedades como viscosidade e

pontos de ebulição que podem ser justificadas

pelas as características estruturais. O índice de

polaridade é uma medida que reflete a capacidade

do solvente em interagir com diferentes solutos

polares. Essa tabela é útil para se escolher um

solvente para, por exemplo, definir um solvente ou

mistura de solventes para solubilizar um soluto ou

para utilizar como fase móvel em cromatografia

líquida.

Em sistemas biológicos, podem ser encontrados compostos apolares como ácidos graxos, esteroides e

terpenoides de cadeia longa, que devido as suas propriedades, são coletivamente como os compostos apolares.

Figura 7. Lipídeos comuns em membranas biológicas.

Podem gliceroílicos, carotenoides e esteroidais. Todos

possuem uma cabeça polar, o que possibilita um

ordenamento em membranas. O círculo representa a

parte do glicerol polar e as linhas as cadeiras lipofílicas.

Em geral os lipídeos podem ser derivados de ácidos graxos (produtos de condensação de unidades C2, acetato

com malonato) ou terpenoides (derivados de unidades C5, conhecidos como isoprenos, formando os

carotenoides e esteroides). As propriedades emergentes dessas substâncias lipofílicas são de extrema

importância em sistemas biológicos. Compostos de baixa massa molecular (até C15) são voláteis e são

constituintes de aromas de plantas. Os de massa molecular mais elevada são constituintes de membranas em

células. Em vários fármacos, o equilíbrio entre hidrofilicidade e lipofilicidade são importantes tanto no

transporte quanto na atuação em sítios ativos.

As reações envolvidas na formação desses lipídeos envolvem reações de compostos carbonílicos (ácidos graxos:

condensação de Claisen; terpenos: condensação de Claisen, condensação aldólica e substituição nucleofílica;

temas da “Química orgânica II” e não serão abordados na QFL1221.

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Análises de hidrocarbonetos por cromatografia a gás (CG) (acoplada a espectrometria

de massas)

Os constituintes do petróleo demandaram o desenvolvimento de técnicas de separação e análise. A principal

técnica tem sido a cromatografia a gás acoplada a espectrometria de massas. Todas as frações do petróleo

podem ser analisadas por essa técnica, assim como todas as substâncias orgânica com uma certa pressão de

vapor. Substâncias polares como açúcares e outros não são volatilizados e não podem ser analisados pela CG, a

não ser que sejam derivatizados (por exemplo, na forma de derivados trimetilsilanos que são termicamente mais

estáveis e mais voláteis).

O ponto de ebulição, ou de fusão, é adequado para a análise de uma substância pura. Se for uma mistura, não

se observa um ponto de ebulição, mas uma faixa ampla que pode dar uma ideia de qual a composição, mas não

leva a uma informação mais precisa de sua composição, ou seja, é necessário usar uma técnica de separação

antes da determinação da composição. A técnica de separação de escolha para compostos relativamente leves

(MM < 500, aproximadamente) é a cromatografia a gás (CG). Ela permite analisar 1 microlitro de uma amostra

diluída.

A cromatografia é uma técnica de separação e de identificação de componentes de uma mistura. Esta separação

é baseada na diferença de comportamento dos analitos com relação a uma fase estacionária e a fase móvel (se

tiver mais interesse, faça uma leitura num livro texto mais específico)

No caso da cromatografia a gás (CG), a fase estacionária pode estar acondicionada dentro de uma coluna de aço

ou ser a própria parede de um tudo capilar que pode ter tamanhos típicos de 30 metros de comprimento e

diâmetro de 0,25-0,5 mm de diâmetro interno. A fase móvel é um gás (como Hélio) que passa sob um certo

fluxo. Para que os componentes sejam eluidos (arrastados) é necessário fazer um gradiente de temperatura. Os

constituintes são detectados na saída da coluna através de diferentes detectores. O mais simples é um detector

de ionização de chama, ocasionado pela queima dos constituintes, mas podem ser de vários tipos. Focaremos

na disciplina QFL1221 o uso de espectrometria de massas que informa sobre o íon molecular (massa molecular)

do hidrocarboneto inteiro, mas informa também sobre os fragmentos que são formados quando a amostra é

ionizada no espectrômetro de massas.

Figura 8. Esquema de um cromatógrafo a

gás acoplada a um espectrômetro de

massas

Figura 9. Detalhe de uma coluna capilar dentro de um

forno de um cromatógrafo a gás. Essa coluna é uma HP-5

(5% de fenil e metilsilicone, 0,25 mm de diâmetro interno

e 25 metros de comprimento e 0,2 m de fase

estacionária).

A CG é uma técnica de maior eficiência de separação, do

que o CLAE (Cromatografia líquida de alta eficiência) por

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causa do tamanho da coluna e do que se chama de pratos teóricos (medida da capacidade de uma fase em

separar os constituintes).

Existem diferentes tipos de fases estacionárias e cada conjunto de analitos requer um tipo de fase (coluna).

A identificação de cada componente pode ser feita pelo uso de padrões, quando disponíveis, ou pelo uso de um

espectrômetro de massas que gera informações sobre as estruturas dos constituintes. Nesse caso, tivemos cerca

de 96 constituintes identificados a partir da análise de uma amostra de gasolina.

Figura 10. Exemplo de cromatograma a gás de uma amostra de gasolina. Coluna Petrocol DH, 100 m, 0,25 mm

d.i., 0,5 m (24160-U)

Figura 11. Um cromatógrafo a gás acoplado a

um espectrômetro de massas.

Antes de entrar em detalhes na espectrometria de massas, cabe adentrar um pouco sobre a química envolvida

nos processos de ionização e fragmentação. Os conceitos de formação de carbocátion e radicais livres são

importantes.

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Reatividade de hidrocarbonetos

Uma molécula neutra como o n-pentano não possui acidez significativa para ionizar os seus hidrogênios (pka

~50). Não podem formar ânions ou cátions em condições amenas.

É, portanto, uma molécula estável, mas apenas volátil e pode sofrer

combustão.

Um hidrocarboneto saturado, diferentemente dos insaturados, é muito pouco reativo. Por esse motivo,

hidrocarbonetos de cadeia longa, presentes, por exemplo, na cera de carnaúba, são utilizados em ceras

automotivas. Outros hidrocarbonetos são utilizados como lubrificantes. Os hidrocarbonetos insaturados, por

sua vez, sofrem reações de adição eletrofílica, clivagens oxidativas, reações radicalares nas posições vizinhas as

ligações duplas, reações de isomerização, cicloadição de Diels-Alder e etc.

As principais reações que os hidrocarbonetos saturados podem sofrer são:

- combustão

- reações homolíticas (formando radicais de forma pouco seletivas)

- reações heterolíticas (formando cations e ânions)

No caso das reações homolíticas, elas podem ser inicializadas por Fotólise: luz UV (200-400 nm); por Termólise:

Temperaturas elevadas (500°C) ou inferiores, mas iniciados por PbMe4, peróxido dietílico (80oC), H2O2 ou

peróxido de benzoila PhCOOOCOPh (80-100oC). Podem ser ainda observadas em Reações redox: através de

Processos biológicos diversos, reação de Fenton: H2O2 + Fe2+, e assim por diante.

Notação para movimentação de elétrons (tanto para reações quanto para espectrometria de massas)

Nas reações homolíticas, cada átomo fica com um elétron da ligação covalente formando dois radicais livres.

Essa representação de movimentos de elétrons é bastante

importante. Setas de uma só farpa (um lado) é empregado para

o movimento de um único elétron em uma reação homolítica.

Os radicais livres são espécies reativas e podem causar reações

em cadeia até que dois radicais se combinem numa etapa conhecida com término.

Na reação heterolítica a seta completa indica a movimentação de um par de elétrons para um dos átomos

gerando cátion e um ânion. Qual das espécies deve reter o par de elétrons? Isso vai depender da estabilidade

relativa das espécies formadas.

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Clivagem heterolítica:

Esse tipo de reação não ocorre facilmente em hidrocarbonetos saturados sem

algum substituinte que possa ser eliminado. Nesse caso, podem ser formados

os carbocátions, uma espécie deficiente de elétrons formada pela saída de um

substituinte que leva o par de elétrons.

Figura 12. Ruptura heterolítica de um

bromoalcano. Utiliza-se uma seta dupla

para indicar o movimento de um par de

elétrons. O brometo, mais eletronegativo,

leva o par de elétrons deixando o carbono

deficiente de elétrons (um carbocátion).

Tabela 2. Energias de dissociação de ligações

químicas.

Há diferenças inerentes as estruturas que podem

ser observadas a partir das energias de

dissociação homolíticas das várias ligações.

A quebra da ligação C-H será mais facilitada

quando maior o número de carbonos ligados ao

carbono que terá a ligação rompida. Vide quadro

em azul.

O mesmo é verdadeiro quando se compara a

ruptura das ligações carbono-carbono (quadro

em vermelho). Para fins de comparação, o

peróxido de benzoíla, um catalizador utilizado

para iniciar reações radicalares na formação de

polímeros (como o polietileno e análogos), pode

ser rompido por um leve aquecimento, desencadeando a reação em cadeia.

Figura 13. Ordem de estabilidade de

carbocátions e de radicais.

Essa é uma das bases para se iniciar

a discussão sobre a estabilidade de

carbocátions e radicais livres.

Por que será que essa ordem é a

mesma para carbocátions e

radicais? (e inversa para ânions?).

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Fatores de estabilização de carbocátions e radicais:

1) + I (efeitos indutivos);

2) Hiperconjugação;

3) Efeitos mesomericos (ressonância).

O efeito indutivo é um efeito de doação (ou retirada) de densidade eletrônica ocorre através da ligação sigma.

A doação ou retirada de densidade de elétrons é baseado na diferença relativa da densidade de elétrons dos

átomos ligados, bem como é dependente da eletronegatividade desses átomos. No caso de haletos de alquila,

R-X (onde X-=haleto), o efeito será de retirada de elétrons, portanto pode ser representado como efeito -I. Toda

molécula que possui um átomo mais eletronegativo que o carbono terá uma certa polarização por efeito

indutivo, que pode ser -I ou +I.

Tais efeitos são mais significativos quando se tem um carbocátion. No caso de carbonos diretamente ligados a

um carbocátion, esses terão efeito doador +I, minimizando a deficiência desse carbocátion, dispersando essa

deficiência. O efeito da eletronegatividade não é de longo alcance, sendo minimizado em 2-3 ligações sigma.

Figura 13. Representação do efeito indutivo +I

(doação de densidade de elétrons através da

ligação sigma)

A doação de densidade de elétrons de grupos

substituintes aos carbocátions através do efeito

indutivo +I ocorre via ligação sigma. Portanto,

como no caso do

cátion terc-butílico, quanto maior o número de

substituintes alquílicos, maior será o efeito de estabilização. Esse cátion seria mais facilmente formado do que

o secundário (CH3CH+CH3) que, seria mais facilmente formado do que o primário (CH3CH2+) ou o cátion metílico

(CH3+).

A hiperconjugação é outro fenômeno que é importante para a estabilização. É um comportamento no qual os

centros deficientes (radicalares ou carbocátions) são parcialmente supridos pelos orbitais das ligações C-H

vizinhas a essas deficiências, como se fosse uma ligação pi.

Figura 14. Representação do efeito

de hiperconjugação. A ligação sigma

C-H do carbono vizinho ao

carbocátion ou radical estabiliza a

deficiência.

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A hiperconjugação não depende do tamanho do grupo alquílico, mas da presença de um hidrogênio nesse

carbono vizinho e, da mesma maneira que o efeito indutivo, quanto maior o número de grupos alquílicos

diretamente ligados aos carbonos deficientes, melhor será a estabilização.

Figura 15. Representação do efeito de hiperconjugação de um carbocátion em várias situações aumentando-se

o número de grupos metílicos capazes de realizar tal efeito.

A geometria de espécies como o carbocátion e radicais é sempre planar, mas no caso de carbânions, o par de

elétron ocupa um espaço tal qual o nitrogênio e essa será piramidal. Essa geometria dos carbocátions e de

espécies radicalares terão consequência na formação de uma nova ligação com uma espécie rica em elétrons

(nucleófilos) em reações de substituição nucleofílica alifática ou radicalares com importantes consequências

para a estereoquímica dos produtos formados. Mas isso será tópico da próxima disciplina em química orgânica.

Figura 16. Geometria de espécies reativas.

O terceiro efeito que contribui a estabilização de carbocátions é conhecido como Efeito Mesomérico, também

conhecido como efeito de ressonância. Considerem um carbocátion no qual um átomo de oxigênio que possui

um par de elétron não ligante, está diretamente ligado a esse carbocátion. O que seria de se esperar?

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Seria um compartilhamento do par de elétrons formando uma ligação dupla e deixando o oxigênio, por exemplo,

parcialmente deficiente. Nesse caso, a notação para o efeito de ressonância é indicada por uma flecha de ponta

dupla. <->

Figura 17. Efeito mesomérico ou de ressonância

causado pela vizinhança de um átomo contendo um

par de elétrons não ligantes como o oxigênio.

O mesmo processo poderia ocorrer quando se tem um nitrogênio, enxofre ou halogênio.

Nesses casos, o efeito é conhecido como +M. Se os substituintes tiverem um efeito retirador de elétrons com

um derivado de carbonila (qual é a distribuição de elétrons nesse grupo e por quê?), grupo nitro e nitrila.

Figura 18. Grupos substituintes com

efeitos mesoméricos +M (doadores) e -

M (retiradores de elétrons)

O efeito de ressonância (+M) é mais

importante do que o efeito indutivo +I

(ou +R). Se o efeito

E se o carbocátion tivesse um átomo

vizinho com uma ligação dupla (conjugado) ou a um anel aromático? Teríamos o mesmo efeito de estabilização,

com dispersão de deficiência para mais de um carbono. Nesse caso abaixo, teríamos formalmente as duas

espécies deficientes de forma simultâneas ou um híbrido de ressonância.

Figura 19. Dispersão da deficiência de um carbocátion por

uma ligação dupla conjugada.

No caso de termos um anel aromático, isso será visto mais adiante no tópico Aromaticidade. O efeito de ligações

duplas ou de anéis aromáticos pode variar dependendo dos substituintes ligados a esses grupos.

Tais estruturas de ressonância poderiam também ser representadas nos casos onde se tem um radical ou um

carbânion, mas só podem ocorrem quando as ligações duplas estão vizinhas. Esse fenômeno não pode ocorrer

se o carbocátion estiver isolado ou separado por um carbono sp3, quando estaria não conjugado.

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Figura 20. Efeito de conjugação de um

carbocátion, radical ou de um carbânio.

Em resumo, os diferentes fatores que

contribuem para a estabilização dos

carbocátions ou de radicais apontam

para a sequência de estabilidade

mostrada ao lado. Tais fatores

governam os modos fragmentacionais

em espectrometria de massas e

também os diferentes mecanismos de

reações que envolvem espécies

deficientes como substituição

eletrofílica e nucleofílica alifáticas.

Esses conceitos de estabilização de carbocátions e de radicais são fundamentais para se compreender

como a técnica de fragmentação pode ser utilizada para a análise de compostos orgânicos.

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Espectrometria de massas

Na espectrometria de massas uma amostra pode ser injetada diretamente ou ser injetada via cromatógrafo

(Figura 20). As amostras podem ser analisadas em solução contendo aproximadamente 1 mg/mL no qual são

injetados em torno de 1 microlitro. Dessa solução, 1/50 avos vão para o cromatógrafo. Após passar pela coluna,

o eluato é injetado no espectrômetro de massas em um compartimento sob vácuo onde sofre um bombardeio

de elétrons (~70 eV) que ioniza parte significativa da amostra). Moléculas ionizadas intactas ou fragmentadas

por causa da corrente de elétrons são aceleradas num analisador e coletadas num detector.

Figura 20. Componentes de um espectrômetro de

massas.

As modalidades de espectrometria de massas estão

associadas ao tipo de ionização. A separação ou

resolução é outro aspecto relevante que vai originar

dados de qualidade mais simples (baixa resolução ou

com valores unitários de massas) ou de melhor

qualidade (alta resolução). Os CG-EM possuem tipicamente um espectrômetro de impacto de elétrons e a

grande maioria dos bancos de dados são baseados nesse tipo de informação. A técnica por electrospray é

utilizada predominantemente na CLAE (HPLC) acoplada a espectrômetro de massas (ESI). O MALDI (Matrix

Assisted Lazer Desorption Ionization), e também o ESI, são utilizados para as análises de moléculas mais pesadas

como macromoléculas, pois a CG-EM não serve para tal por causa da volatilidade reduzida. A técnica da

ionização química é uma variação da CG-EM e é utilizada quando não se detecta claramente o íon molecular de

uma substância problema. Um gás como o metano pode ser utilizado e o gás é ionizado e protonado gerando

CH5+ que transfere o próton ao analito que pode ser detectado como M+H.

Figura 21. Processo de ionização de uma amostra no qual

o feixe de elétrons remove um elétron da molécula

gerando um íon (cátion) radicalar que sofre

fragmentação gerando um cátion e eliminando um

radical.

Na espectrometria de massas por impacto de elétrons a amostra volatilizada numa câmara à vácuo e é

bombardeada com um feixe de elétrons que remove um único elétron de alguma posição da molécula formando

um cátion radicalar.

O vácuo é importante para que as reações íons-molécula sejam minimizadas, caso contrário haveria muitos

artefatos formados que poderiam dificultar a detecção e identificação das substâncias originais.

A deficiência +. refere-se ao fato de que falta um elétron da molécula. Essa deficiência pode ser localizada em

alguma função ou ligação química da molécula, mas pode ser indicada de forma genérica através de um colchete

no qual não há localização da posição onde o elétron foi removido.

Dada a força do feixe de elétrons, as moléculas se fragmentam gerando íons e radicais. Tipicamente, somente

os íons radicalares ou cátions são detectados, mas há outros modos de detecção nos quais os ânions podem ser

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igualmente detectados. Mas sob o ponto de vista experimental, é mais fácil gerar cátions. O potencial de

ionização de uma substância é variável e depende dos átomos da molécula, mas quando se utiliza 70 eV, gera-

se uma quantidade suficiente de íons radicalares. A detecção dos íons moleculares (molécula intacta) e dos íons

fragmentários formados são bastante específicos de uma dada substância e essa é a base dos bancos de dados

e da identificação por espectrometria de massas. Os dados de massas podem ser obtidos na forma de uma

tabela.

No caso do metano, observa-se que o íon molecular possui abundância de 100%, sendo também o pico base.

Portanto, o espectro de massas é um registro da relação massa/carga. Como a carga é unitária, os números

referem-se as massas moleculares dos íons moleculares e dos íons fragmentários. As intensidades são dadas em

abundância relativa (%) que é normalizada para o íon mais intensos como 100%. As intensidades relativas

refletem as estabilidades relativas dos íons formados, sendo os mais abundantes os mais estáveis.

Figura 22. Espectro de massas

do metano.

Na técnica de espectrometria de

massas com ionização por

impacto de elétrons para uma

molécula sem nitrogênio, o íon

molecular deve ser par. No caso

do metano, o íon molecular é

m/z 16, que corresponde a

molécula intacta. Quando perde

um hidrogênio radicalar, forma-

se o cátion m/z 15

correspondente a CH3+.

Se tiver um nitrogênio (ou

número ímpar de átomos de

nitrogênio), como no caso da

amônia (NH3), o íon molecular será m/z 17 Da (cátion radicalar) e após uma perda de hidrogênio radicalar

formaria m/z 16 (cátion).

No entanto, se a substância tiver número par de átomos de nitrogênio, o íon molecular será par.

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Figura 22. Espectro de massas do n-

hexano.

No caso do hexano, o íon molecular em

m/z 86, gera por fragmentação do

radical metílico, o íon m/z 71 Da. Por

fragmentação de um radical propila,

gera o cátion m/z 57 (pico base), e

assim por diante.

Observem que o cátion etílico se forma,

mas não é o radical que é detectado.

Radicais NÃO são detectados. Assim,

uma fragmentação diferente daquela

que gera o cátion m/z 57 deve ocorrer

no qual sairia o radical C4H9., formando o cation CH3CH2

+ (m/z 29). Esses dois modos fragmentacionais devem

ocorrer de forma independente.

Figura 23. Espectro de massas do n-dodecano.

Na medida que a cadeira carbônica vai

aumentando, a intensidade do íon molecular

diminui devido a maior probabilidade de

fragmentação.

Apesar de observarmos diferenças de 14

unidades de massas, tais íons não

correspondem a fragmentação de CH2. A

fragmentação da molécula de partida é que

gera os diferentes íons que possuem diferença de 14 unidades como indicado abaixo.

CH3 CH2 CH2 CH2 CH2CH2 CH2 CH3

m/z = 114

8571574329

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Figura 23. Emprego de massas para a diferenciação de isômeros ramificados do dodecano.

Quando se compara os espectros dos isômeros do dodecano, observa-se que praticamente não se observa o

pico correspondente ao íon molecular em m/z 170.

No entanto, com base nas fragmentações é possível atribuir os espectros ao 3-metilundecano e 4-

metilundecano. No primeiro caso, há a fragmentação do radical etila, gerando o m/z 141 (M-29) enquanto que,

no segundo caso, observa-se a fragmentação de M-43, gerando o cátion m/ z 127. No caso do n-dodecano

(Figura 22), esses dois íons m/z 141 e 127, não se sobressaem. Neste caso, o padrão de diminuição de

intensidade dos íons fragmentários sugere uma cadeia carbônica longa, linear e sem ramificações.

Conclui-se que a possibilidade de estabilização de um carbocátion secundário é suficiente para discernir entre

os dois isômeros.

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Figura 24. Espectro de massas do cis-2-

penteno.

A fragmentação da metila gerando um cátion

alílico é favorecida e o íon em m/z 55 aparece

como pico base.

A espectrometria de massas não permite

distinguir entre isômeros cis ou trans, e

muitas vezes a determinação da posição da

ligação dupla não é possível em função da

isomerização radicalar que pode ocorrer.

Nesses casos, deve-se obter um derivado com

um dimetilsulfeto.

Sob determinadas circunstâncias é possível identificar estereoisômeros, mas a espectrometria de massas não é

normalmente a técnica de escolha.

Figura 25. Espectro de massas do 1-pentino.

Acetilenos possuem acidez de seu hidrogênio

terminal suficientemente ácidos (pka 25) por

causa da maior eletronegatividade do Csp

(50% de caráter s – quanto maior o caráter s,

mais próximo os elétrons estarão do núcleo).

Assim, a fragmentação da molécula perdendo

o hidrogênio radicalar é bastante

característica de acetilenos terminais.

Outra fragmentação favorecida, tal qual nos

alcenos, é a fragmentação na posição alílica

[de onde vem esse nome? Lembra alho? De

fato, o alho (Allium sativum) tem uma série de compostos como sulfetos de alila (H2C=CH−CH2SH)].

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Figura 26. Espectro de massas do 2-butanol.

As fragmentações alfas, que levam aos dois cátions no carbono que sustenta o grupamento hidroxílico são

igualmente favorecidas levando ao cátion m/z 59, resultante da fragmentação do radical metílico, e ao m/z 45,

áresultante da fragmentação da etila radicalar. Em ambos os casos, um dos elétrons do oxigênio, por efeito

mesomérico, estabiliza os cátions. Há preferência na fragmentação do radical maior, justificando a maior

abundância do cátion em m/z 45.

m/z 45

m/z 59

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Figura 27. Espectro de massas do N-etiletanamina

Nesse caso, a amina possui o íon molecular (cátion

radicalar) ímpar e, por eliminação de um radical

metílico, forma o cátion m/z 58.

O processo de estabilização é determinado

novamente pela presença do heteroátomo que

estabiliza o cátion formado no carbono alfa, que por

ressonância de um elétron conduz à formação de m/z

58.

Figura 28. Fragmentação de compostos

carbonílicos também leva a formação do

cátion no carbono carbonílico, que é

estabilizado pelo elétron do átomo de

oxigênio formando o cátion acílio.

Figura 29. Espectro de massas do butiraldeído.

A fragmentação alfa do hidrogênio pode ser

utilizada como diagnóstico para caracterizar um

aldeído. Nesse caso o íon molecular em m/72,

por eliminação de um hidrogênio radicalar forma

o cátion acílio m/z 71. A outra fragmentação leva

do íon CHO+ (m/z 29). Forma-se ainda o cátion

m/z 29 (CH3CH2CH2+) e, por rearranjo, o cátion

radicalar m/z 44 (CH3CH2CH3+.) com saída de CO

neutro.

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Figura 29. Espectro de massas da 2-butanona.

A fragmentação alfa pode ocorrer nas duas

ligações perdendo tanto o radical etílico quando

o radical metílico. A fragmentação do grupo

maior é favorecida e o íon m/z 43 torna-se o pico

base.

Os espectros de massas de hidrocarbonetos simples, ramificados e

funcionalizados podem ser caracterizados pelos íons moleculares e pelas fragmentações alfa (que levam aos

carbocátions mais estabilizados).

Figura 30. Fragmentação alfa que pode ser utilizada para a caracterização de compostos orgânicos

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Fragmentações com quebras simultâneas de duas ligações sigma

Além das fragmentações observadas nos quais ocorre a ruptura de uma simples ligação sigma, as fragmentações

de duas ligações sigma também são relativamente comuns. Alguns requisitos estruturas são necessários e são

exemplificados nos exemplos abaixo.

Figura 31. A reação de eliminação de água é

característica de álcoois e pode ser utilizada como

diagnose. Aqui tem-se a reação de clivagem de uma

ligação simples sigma, quando a clivagem de duas

ligações simples com eliminação de uma molécula

neutra de água.

Outras duas fragmentações de duas ligações simples de forma simultâneas são as retro Diels-Alder e rearranjo

de McLafferty.

Figura 32. Espectro de massas de um

cicloexeno (limoneno).

O modo de fragmentação conhecido por

retro Diels-Alder é característico de um

cicloexeno. No caso do limoneno, forma-

se um cátion radicalar de massa par em

m/z 68 pela eliminação de uma molécula

neutra com massa também de 68 (mas

por ser neutra não é detectada).

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Figura 33. Espectro de massas de

uma cetona contendo hidrogênio

na posição gama.

Todos os compostos carbonílicos,

desde aldeídos, cetonas, ésters,

ou ainda um composto

benzenoídico que apresentar um

hidrogênio gama, tenderá

apresentar esse mofo de

fragmentação conhecido como

rearranjo de McLafferty.

m/z 58 neutro

Assim, se a condição para tipo de rearranjo ocorrer é a presença de um hidrogênio gama, essa condição

é igualmente preenchida quando temos alquilbenzenos de cadeia longa (Figura 32) ou quando se tem

ésteres ou outra função.

Figura 34. Rearranjo de McLafferty em

alquilbenzenos, além da fragmentação alfa

no qual o cátion benzílico é estabilizado pelo

anel aromático.

[M-43]

85M-15

C5H1171

McLaffertrearrangement

Mass spectrum (EI) of 2-octanone?

g

b

a

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Figura 35. Rearranjo de McLafferty em

ésteres (além do clivagem alfa).

No caso da espectrometria de massas de baixa resolução, a abundância isotópica natural dos elementos pode

utilizadas para a caracterização da composição química e da fórmula molecular.

Tabela 3. Contribuições

isotópicas em vários átomos.

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Figura 36. Espectro de massas do cloreto de isopropila.

O íon molecular m/z 78 é acompanhada pelo íon M+2 m/z 80 indicativa da presença de 37Cl. A proporção (vide

Tabela 3) de 3:1 constitui-se numa característica que pode ser utilizada para diagnosticar a presença de cloro.

Figura 37. Espectro de massas do brometo de n-propila.

Devido a abundância natural do bromo ser de aproximadamente 1:1 (79Br:81Br), a presença de M+2 caracteriza

a presença de bromo.

Pelo mesmo princípio, a presença de enxofre pode ser diagnosticada.

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A identificação dos compostos orgânicos pode ser realizada utilizando os recursos de busca nas bibliotecas

disponíveis nos bancos de dados disponíveis nos instrumentos. No entanto, o índice de acerto pode variar e

mesmo com um índice alto, a identificação precisa de um determinado constituinte deve ser feita com cautela.

O ideal seria o uso de padrões que poderiam ser utilizados para uma coinjeção num cromatógrafo a gás. Além

disso, há vários bancos de dados nos quais podem ser realizadas buscas específicas. Alguns dos bancos de dados

mais utilizados são os indicados abaixo. Um dos mais simples é o SDBS com vários tipos de espectros que podem

ser acessados a partir de buscas.

Aspectos que devem ser considerados ainda para uma identificação mais precisa de uma determinada

substância problema é a informação obtida a partir de um equipamento de alta resolução no qual a massa

precisa dos átomos são consideradas. No exemplo abaixo, uma molécula com massa molecular de 44 poderia

ser resultante de uma combinação de diferentes átomos. Somente um espectro de massas de alta resolução

poderia distingui-los. Os espectrômetros de massas de alta resolução possuem recursos que possibilitam a

separação mais eficiente dos íons e isso se traduz em equipamentos de alto custo.

Resumo: Os fatores que contribuem para a facilidade de fragmentação envolvem a facilidade de

estabilização de carbocátions (ou radicais) seja por maior grau de substituição, presença de

heteroátomos como N, S, X, ou ligações duplas (ou triplas) e anéis aromáticos. A presença de

cicloexenos pode ser caracterizada pela fragmentação retro Diels-Alder e compostos contendo funções

carbonílicas (ou anel aromático) contendo hidrogênios na posição g, são passíveis de fragmentação

pelo rearranjo de McLafferty.