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PROPRIEDADE INTELECTUAL E AMBIENTALISMO CULTURAL INTELLECTUAL PROPERTY AND CULTURAL ENVIRONMENTALISM Afonso de Paula Pinheiro Rocha RESUMO O artigo tem por objetivo traçar um paralelo entre o Direito Ambiental e o direito da Propriedade Intelectual. São apresentadas as similitudes de formação e tratamento constitucional entre as duas searas jurídicas, com ênfase na estreita relação entre o Meio Ambiente e a Cultura. Propõe-se a idéia de existência de um Meio Ambiente Cultural. Apontam-se as possíveis repercussões que uma perspectiva ambiental pode ter sobre a hermenêutica a ser utilizada nas questões envolvendo a propriedade intelectual e sobre a dinâmica dos bens imateriais na sociedade. São apresentadas sugestões de aplicações dos princípios ambientais à propriedade intelectual. Conclui-se que uma visão ambiental pode ser extremamente útil para ressaltar os pontos comuns às diversas doutrinas da Propriedade Intelectual, bem como para indicar soluções mais efetivas para garantir a difusão do conhecimento através de um sistema equilibrado de incentivos e limitações de direitos intelectuais. PALAVRAS-CHAVES: PROPRIEDADE INTELECTUAL; AMBIENTALISMO CULTURAL, DESENVOLVIMENTO ABSTRACT The article’s purpose is to show a parallel between Environmental Law and Intellectual Property rights. It presents the similarities in the formation and constitutional treatment in the two fields of law, with emphasis in the close relation between Environment and Culture. It proposes the idea of an existing Cultural Environment. It suggests possible repercussions that an environmental view might have in intellectual property issues and the dynamic of intellectual goods in society. It presents suggestions of possible applications of environmental principles to intellectual property. It concludes that an environmental view might be extremely useful to highlight the commonalities in the several doctrines of intellectual property, as well as to point effective solutions to assure the dissemination of knowledge through a balanced system of incentives and limitations on intellectual rights. KEYWORDS: INTELLECTUAL PROPERTY; CULTURAL ENVIRONMENTALISM, DEVELOPMENT 6734

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PROPRIEDADE INTELECTUAL E AMBIENTALISMO CULTURAL

INTELLECTUAL PROPERTY AND CULTURAL ENVIRONMENTALISM

Afonso de Paula Pinheiro Rocha

RESUMO

O artigo tem por objetivo traçar um paralelo entre o Direito Ambiental e o direito da Propriedade Intelectual. São apresentadas as similitudes de formação e tratamento constitucional entre as duas searas jurídicas, com ênfase na estreita relação entre o Meio Ambiente e a Cultura. Propõe-se a idéia de existência de um Meio Ambiente Cultural. Apontam-se as possíveis repercussões que uma perspectiva ambiental pode ter sobre a hermenêutica a ser utilizada nas questões envolvendo a propriedade intelectual e sobre a dinâmica dos bens imateriais na sociedade. São apresentadas sugestões de aplicações dos princípios ambientais à propriedade intelectual. Conclui-se que uma visão ambiental pode ser extremamente útil para ressaltar os pontos comuns às diversas doutrinas da Propriedade Intelectual, bem como para indicar soluções mais efetivas para garantir a difusão do conhecimento através de um sistema equilibrado de incentivos e limitações de direitos intelectuais.

PALAVRAS-CHAVES: PROPRIEDADE INTELECTUAL; AMBIENTALISMO CULTURAL, DESENVOLVIMENTO

ABSTRACT

The article’s purpose is to show a parallel between Environmental Law and Intellectual Property rights. It presents the similarities in the formation and constitutional treatment in the two fields of law, with emphasis in the close relation between Environment and Culture. It proposes the idea of an existing Cultural Environment. It suggests possible repercussions that an environmental view might have in intellectual property issues and the dynamic of intellectual goods in society. It presents suggestions of possible applications of environmental principles to intellectual property. It concludes that an environmental view might be extremely useful to highlight the commonalities in the several doctrines of intellectual property, as well as to point effective solutions to assure the dissemination of knowledge through a balanced system of incentives and limitations on intellectual rights.

KEYWORDS: INTELLECTUAL PROPERTY; CULTURAL ENVIRONMENTALISM, DEVELOPMENT

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INTRODUÇÃO

O trabalho busca identificar os paralelos existentes entre o Direito da Propriedade Intelectual e o Direito Ambiental, de forma a propor a existência de um meio ambiente intelectual ou cultural e como instrumentos do direito ambiental podem ser utilizados para aprimorar a tutela jurídica da propriedade intelectual.

Inicialmente serão apresentadas algumas similitudes fáticas e epistemológicas entre essas duas searas jurídicas, para posteriormente sugerir formas de aplicação de alguns princípios do direito ambiental para o campo da propriedade intelectual. Por fim, demonstra-se que a idéia de um ambientalismo cultural já vem sendo debatida no direito comparado e que o prisma ambiental sobre a propriedade intelectual pode ser útil tanto para a hermenêutica destinada aos bens intelectuais como para a definição de políticas públicas.

1 SIMILARIDADES ENTRE O DIREITO AMBIENTAL E O DIREITO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL

A idéia de um direito ambiental ou direito do meio ambiente, está relacionado com a progressiva compreensão da existência de um bem comum abrangente – o meio ambiente – que funcionaria como aglutinador do discurso de diversos movimentos e interesses sociais correlatos – grupos focados na preservação de animais, plantas, biodiversidade, preservação dos oceanos, preservação de parques nacionais, etc.

Para James Boyle: “A invenção do conceito de ‘ambiente’ agrupou um conjunto de questões de outra forma desconexas, ofereceu uma nova visão em face da cegueira implícita nas concepções passadas e permitiu encontrar um interesse comum nunca antes vislumbrado.” [1]

Logo, o direito ambiental surge da convergência de diversas doutrinas específicas relacionadas a bens ambientais específicos. No direito brasileiro, é preciso fazer destaque à Constituição Federal de 1988 que passou a referenciar o meio ambiente de forma expressa, no art. 225 e seguintes. Anteriormente, o direito ambiental era referenciado apenas em legislações esparsas e de forma não específica.[2]

Assim, nas palavras de Paulo Affonso Machado:

O Direito Ambiental é um Direito sistematizador, que faz a articulação da legislação, da doutrina e da jurisprudência concernentes aos elementos que integram o ambiente. Procura evitar o isolamento dos temas ambientais e sua abordagem antagônica. Não se trata mais de construir um Direito das águas, um Direito da atmosfera, um Direito do solo, um Direito florestal, um Direito da fauna ou um Direito da biodiversidade. O

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Direito Ambiental não ignora que cada matéria tem de específico, mas busca interligar estes temas com a argamassa da identidade dos instrumentos jurídicos de prevenção e de reparação, de informação e de monitoramento e de participação.[3]

Assim, a ausência de uma codificação única não retira do direito ambiental a sua identidade, sendo facilmente perceptível, atualmente, que os diversos diplomas legislativos que tratam de bens ambientais possuem um quantum comum, uma razão de ser pautada por princípios comuns – a proteção do ambiente.

O direito da propriedade intelectual, por sua vez, também apresenta uma formação similar, podendo ser classificada como uma expressão genérica, correspondendo ao direito de apropriação sobre criações, obras e produções do intelecto, talento e engenho humanos.

Funciona como um conceito “guarda-chuva”, que engloba uma série de diferentes doutrinas, todas, porém, relacionadas com atividades intelectuais ou com a implementação de idéias, dados e conhecimento em atividades práticas.

Carol Proner ressalta que a idéia de “propriedade intelectual” deve ser entendida como categoria, respondendo aos estímulos econômicos e políticos de cada período histórico, envolvendo: direitos autorais, desenhos e processos industriais, marcas, patentes de invenção, denominações de origem, contratos de transferência de tecnologia, saberes tradicionais - folclore, costumes populares, artes reproduzidas em pintura e escultura -, enfim, temáticas diversas e abrangentes.[4]

Denis Borges Barbosa, da mesma forma, compreende-se a noção de Propriedade Intelectual: “(...) como a de um capítulo do Direito, altissimamente internacionalizado, compreendendo o campo da Propriedade Industrial, dos direitos autorais e outros direitos sobre bens imateriais de vários gêneros”.[5]

De forma ainda mais abrangente, Bettina Augusta Amorim Bulzico entende que a Propriedade Intelectual “(...) envolve toda atividade humana de caráter intelectual, que seja passível de agregar valores e que necessite de proteção jurídica”.[6]

A expressão consagrou-se a partir da “Convenção de Estocolmo”, de 14 de julho de 1967, com a constituição da Organização Mundial da Propriedade Intelectual – OMPI (World Intellectual Property Organization – WIPO), que, posteriormente, veio a se tornar uma agência especializada dentro do sistema das Nações Unidas, em 17 de dezembro de 1974. No Brasil, o a convenção de constituição da OMPI foi promulgada pelo Decreto nº 75.541, de 31 de março de 1975.[7]

Maristela Basso destaca a importância da OMPI para uma compreensão unificada: “(...) a OMPI unifica os conceitos, abolindo a tradicional divisão existente no modelo tradicional ou histórico, que separava os direitos dos autores e dos inventores em duas categorias: direito de autor e conexos e propriedade industrial”.[8]

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Com efeito, vários doutrinadores apontam elementos comuns às diversas doutrinas identificadas com a propriedade intelectual, o que permitiria a sua classificação e estudo conjunto.

Para Robert Sherwood existem oito elementos comuns aos diversos regimes de proteção: o conceito de um direito exclusivo; o mecanismo para a criação do direito exclusivo; a duração do direito exclusivo; o interesse público correlato ao direito exclusivo; a negociabilidade desse direito; os acordos informais e entendimentos entre as nações; a vigência do direito exclusivo; e os arranjos de transação para efeitos de mercado.[9]

Luis Otávio Pimentel, por sua vez, também vislumbra um núcleo comum a tais direitos: “(...) entre os elementos comuns, ou nucleares, de toda a propriedade intelectual a imaterialidade do seu objeto (incorpóreo) e o tempo limitado da sua proteção (...)”.[10]

Contudo, para que a simetria com o direito ambiental se mantenha, é necessário identificar qual o objeto comum ao qual se destina todo o conjunto de tutelas e mecanismos jurídicos.

No Direito Ambiental, não obstante os objetos de proteção nos casos concretos sejam bens ambientais específicos – corpos d’água; florestas, terrenos – o objetivo do sistema, enquanto conjunto, é a tutela de um equilíbrio ambiental. O objetivo maior do sistema é a tutela de um equilíbrio dinâmico nas interações da humanidade com os elementos bióticos e abióticos de forma sustentável.

Para os propósitos deste trabalho, entenda-se essa sustentabilidade ambiental como a durabilidade dos recursos frente às necessidades dos ecossistemas naturais e às demandas dos ecossistemas sociais com destaque para os processos de produção e consumo.[11]

Para a Propriedade Intelectual, os objetos específicos de proteção são diversos, relacionando-se a cada doutrina especifica e englobando criações intelectuais, expressões, informações, conhecimentos e tecnologias. O objetivo geral do sistema, entretanto, não é tão claro, possivelmente porque o foco da tutela jurídica é mais vislumbrado como o direito individual, eclipsando o interesse público subjacente.

Os direitos de propriedade intelectual relacionam-se diretamente com o interesse público, pois tem sua existência justificada pelo interesse público simultâneo de: a) reconhecer os autores e inventores pelas suas criações; e de b) estimular que os mesmos produzam novos produtos e informações para a sociedade. Objetiva-se, portanto, um ciclo contínuo de inovação que trará conhecimentos e tecnologias que beneficiarão a sociedade e, ainda, o desenvolvimento econômico.[12]

Logo, tal qual no direito ambiental, deve existir uma dinâmica própria relacionada à interação dos seres humanos com os conhecimentos, informações e criações produzidas no ecossistema social. A sustentabilidade desse ambiente cultural relacionar-se-á, portanto, com a produção e disseminação de conhecimentos.

Eliane Y. Abrão, discorrendo sobre o direito autoral, demonstra a dinâmica dos bens imateirias que pode ser estendida à propriedade intelectual como um todo:

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O privilégio temporário garantido por lei é, em si mesmo, enunciado e solução: os autores, pessoas comuns e sensíveis frutos do meio social e ambiental que habitam, recebem do meio ambiente histórico, geográfico e cultural os estímulos necessários à sua singular criação. Esta, por outro lado resulta de sua leitura pessoal do universo, decodificada pelos sentidos, razão pela qual goza o autor de privilégio temporário e exclusivo em relação à obra. E como é a coletividade que lhe fornece os ingredientes para a criação e a confecção de seu trabalho intelectual, de modo justo e equânime, manda a lei que ele devolva o uso e o gozo da obra criada a essa mesma coletividade, após a extinção do privilégio temporário.[13]

Assim, da mesma forma, que existem ciclos naturais dos recursos ambientais, existe um ciclo próprio dos bens imateriais que compõe o horizonte cultural e científico da humanidade.

Da mesma maneira que o Direito Ambiental se pretende uma forma de regulação da utilização dos bens ambientais de modo a salvaguardar a continuidade desse ciclo e otimizar o aproveitamento social dos bens naturais, o Direito da Propriedade Intelectual deveria atuar como um mecanismo de salvaguarda dos ciclos do ecossistema social de produção de conhecimentos, bem como otimizar o aproveitamento social dos mesmos.

A preocupação na preservação do meio ambiente natural não é meramente ética. Os recursos naturais e as dinâmicas dos ecossistemas naturais são elementos essenciais dos ecossistemas sociais, especialmente à economia moderna. David Bollier ressalta essa relevância da natureza:

“A natureza proporciona, de forma silenciosa, inúmeros outros benefícios para a economia. A biodiversidade representa uma biblioteca genética que está sendo cada vez mais utilizada para desenvolver novos remédios e para aumentar a produtividade de trigo e milho. Os oceanos do planeta são importantes para a filtragem biológica de água, para desintoxicar poluentes, proporcionar alimentos e encorajar o turismo. Pesticidas naturais proporcionam um valioso serviço os agricultores ao melhorar as colheitas e diminuir custos de produção (um benefício que fica mais aparente quando o sistema ecológico está comprometido). No total, estima-se de forma grosseira que os serviços que a natureza proporciona estão na ordem de US$ 39 trilhões de dólares para a economia – isto num PIB estimado em US$ 35 trilhões”.[14]

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Marcos Wachowicz, por sua vez, faz bela comparação entre os bens intelectuais na sociedade atual e a importância dos recursos naturais que foram base da “Revolução Industrial”:

O bem intelectual na Sociedade da Informação paulatinamente passa a ser considerado tão valioso quanto, para a Revolução Industrial, foram os recursos das matérias-primas do carvão, do ferro e do óleo. Isto com nítida vantagem e diferença em relação a estes últimos, por se tratar de recursos naturais limitados e não-renováveis, ao passo que o bem intelectual é um recurso indefinidamente renovável.[15]

O ecossistema social, tanto nos seus processos produtivos como nos seus processos de consumo, está cada vez mais voltado para os bens intelectuais. Quanto ao aspecto produtivo, Aires Rover destaca que, “(...) para as empresas, a posse do capital físico está se tornando marginal ao processo econômico e até desnecessário e incômodo. Em contraposição, agora a fonte da riqueza é o capital intelectual: conhecimentos estratégicos, marcas, patentes, conceitos, enfim, propriedade intelectual”.[16] Os processos de consumo, por sua vez, tem os próprios bens consumidos estreitamente ligados aos sistemas de propriedade intelectual, especialmente na vertente dos direitos autorais e de copyright: músicas, filmes, shows, jogos eletrônicos, etc.

Desta forma, conjugando-se a importância do meio ambiente para a economia – e para a própria sociedade – com a crescente relevância a importância dos bens imateriais, são válidas as indagações: Será que existe uma universalidade tal qual é o meio ambiente para os bens naturais em relação aos bens imateriais? Será que existe algo como um meio ambiente imaterial, meio ambiente intelectual ou cultural?

A resposta é afirmativa, existe sim um horizonte cultural comum que congrega todos os conhecimentos e informações da humanidade. Tal qual o ar que é respirado, existe uma pletora de sentidos e significados que são utilizados por todos, sem normalmente qualquer reflexão do grande valor social que possuem: a linguagem, a matemática, os conhecimentos científicos básicos, etc.

Esse meio ambiente dos bens e recursos imateriais pode ser identificado com a própria cultura humana. Outro aspecto curioso é perceber que também existem importantes similitudes entre o meio ambiente e a cultura.

2 UM MEIO AMBINETE CULTURAL E INTELECTUAL

Da mesma forma que o Direito Ambiental vai determinar formas de comportamento social em relação aos recursos naturais, o direito da Propriedade Intelectual é um importante segmento da ordem jurídica que vai determinar como a coletividade vai se relacionar com essa sua “ecologia do conhecimento”, em razão dos recursos imateriais.

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O equivalente ao meio ambiente natural no plano imaterial seria a cultura. Esta última vista como a integralidade dos conhecimentos, informações e sentidos existentes na sociedade.

Para Ana Maria Marchesan a cultura “(...) é tudo aquilo que é criado pelo homem. É também um conjunto de entes que, embora não sejam fruto da criação humana (ex. as paisagens naturais) são valorados como bens culturais”.[17]

Danilo Fontenele Sampaio Cunha, indica que é possível compreender “(...) a cultura como sendo a maneira pela qual os humanos se humanizam por meio de práticas que criam a existência social, econômica, política, religiosa, intelectual e artística.”[18]

Logo, essa concepção abrangente permite reformular a idéia de cultura como todos aqueles elementos imateriais ou o valor imaterial atribuído a coisas materiais que compõe o horizonte comum da humanidade e constitui as interações intersubjetivas humanas e as interações com a realidade natural.

Com efeito, a própria relação do homem com o meio ambiente é mediada por informação, conhecimento. As revoluções tecnológicas colocam em evidência que a relação do ser humano com a realidade circundante passa a ser cada vez mais dependente da tecnologia, sendo esta entendida como o conhecimento aplicado.

Nessa perspectiva, justifica-se a interpretação ampliativa proposta por José Afonso da Silva para o conceito de meio ambiente que deve ser “(...) globalizante, abrangente de toda a Natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico”.[19]

Logo, não seria de todo absurdo, defender a existência de um meio ambiente cultural, no qual os recursos naturais seriam as idéias, conhecimentos e tecnologias do horizonte cultural comum da humanidade, especialmente quando a Constituição Federal de 1998, expressamente consagra, no caput do art. 216, o patrimônio cultural imaterial. Há uma contraposição ao paradigma anterior, onde somente bens físicos e edificações com valor histórico seriam integrantes do patrimônio cultural.[20]

Além disso, o inc. III do art. 216 da Constituição Federal ressalta que as criações artísticas, científicas e tecnológicas compõem o patrimônio cultural. Logo, devem ser protegidas de acordo com esta natureza, embora a tutela jurídica das mesmas seja a da Propriedade Intelectual no que diz respeito aos interesses individuais dos autores, artistas e inventores.

Há ainda algumas similitudes interessantes no tratamento constitucional dispensado tanto ao Patrimônio Cultural[21] como ao Meio Ambiente[22]. Primeiro, ambos são tratados como direitos difusos da coletividade. O meio ambiente chega a ser expressamente designado como bem de uso comum do povo. Logo, ambos passam a ser direitos públicos subjetivos, oponíveis até mesmo contra o estado. Segundo, em ambos há a expressa previsão de participação da sociedade na proteção. Fica assim caracterizada uma responsabilidade da própria sociedade em relação aos mesmos.

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Ainda na linha defendida por José Afonso da Silva, seria possível até mesmo enquadrar esse meio ambiente cultural dentro de uma idéia global de meio ambiente.

Observe-se que o conceito legal de meio ambiente identificado no art. 3º, inciso I da Lei 6.938/31 aponta para o meio ambiente como “(...) o conjunto de condições leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.”(grifado e negritado).

A expressão abrangente do final do dispositivo torna possível argumentar que a vida engloba inda um aspecto imaterial ou cultural que não só o biológico, pois as interações do homem com os recursos naturais são, invariavelmente, mediadas pela cultura.

Essa perspectiva de um meio ambiente cultural é relevante, pois serve para colocar a ótica na proteção cultural integralmente considerada e não no direito individual como usualmente acontece nos campos da propriedade intelectual.

Ao contrário do Direito Ambiental, onde os debates e discussões sempre partem de um paradigma de proteção do interesse coletivo no equilíbrio ambiental, no caso da Propriedade Intelectual a própria forma de raciocínio jurídico está marcada pela perspectiva de um raciocínio privado de direitos individuais. Por exemplo, os debates do direito autoral são vistos como questões de direito civil e os debates da propriedade industrial vistos como questões de direito comercial, em todos os casos dissociados do profundo impacto social que possuem sobre a cultura de determinada sociedade.

A própria expressão “propriedade intelectual” coloca-se em contraponto ao a expressão “patrimônio cultural”. As duas palavras que compõe a primeira expressam um aspecto individualista, vez que “propriedade” e “intelectual” evocam a idéia do indivíduo e da criatividade individual. Já as palavras que compõe a segunda expressão evocam uma noção de coletivo – patrimônio e cultura.

Colocar em evidência a importância de um espaço cultural comum é necessário para evitar que uma lógica de tutela jurídica individualista venha a ser extremada na atribuição progressiva de direitos individuais em detrimento do direito difuso da coletividade de acesso aos bens culturais. Pertinente destacar a análise de José Oliveira de Ascensão, que embora se refira aos direitos autorais pode ser expandida para toda a propriedade intelectual:

A defesa da cultura faz-se com a liberdade e não com a proibição.

A afirmação pareceria desnecessária, mas não é. Quando hoje se vem falar de cultura, freqüentemente é apenas como pretexto para novas imposições a título de direito autoral.

[...]

Infelizmente, assistimos a uma evolução decepcionante.

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O hiperliberalismo selvagem em que vivemos manifesta-se, no domínio do direito de autor, pelo que se chamaria a “caça as exceções”. Toda a restrição é perseguida, invocando-se a qualificação do direito de autor como propriedade – quando, mesmo que a qualificação fosse verdadeira, nem por isso a “propriedade” deixaria de estar submetida às exigências da função social.

[...]

É lamentável que assim se proceda. As restrições ao direito de autor permitem a adaptação constante deste direito às condições de cada época. Agora, não só não se prevêem as restrições adequadas à evolução tecnológica como se impede toda a adaptação futura. O direito de autor torna-se rígido, insensível a todo o devir.[23]

Além disso, outro ponto que a ótica sob um prisma ambiental coloca em evidência é qual a ecologia natural dos bens imateriais, qual o comportamento dos mesmos no âmbito social.

3 CONTRASTE ENTRE AS DIÂMICAS DE UTILIZAÇÃO DOS BENS NATURIAS E DOS BENS INTELECTUAIS

Do paralelo traçado ao logo do trabalho verifica-se que um dos objetivos do sistema de propriedade intelectual deve ser a manutenção de um equilíbrio na “ecologia natural” dos bens intelectuais, além de promover um aproveitamento otimizado dos recursos. É a nota característica da imaterialidade que vai diferenciar o tipo de tutela jurídica que deve incidir sobre tais bens imateriais das tutelas jurídicas dispensadas aos bens ambientais.

Um dos paradigmas para a definição das formas de proteção dos recursos naturais é o problema econômico que se tornou famoso com o artigo The Tragedy of the Commons[24], publicado por Garret Hardin, na revista Science, em 1968.[25]

O problema procura ilustrar como a racionalidade individual importa num incentivo natural para sobre-utilizar recursos naturais mantidos em regime comunal. O exemplo prático utilizado foi o de pastagens comunais e um grupo de criadores de gado.

A tragédia que os terrenos vêm a sofrer é a sobre-pastagem. Segundo Hardin, esta decorre da situação aonde os benefícios provenientes de cada cabeça de gado adicional vão na sua totalidade para o proprietário – internalização dos benefícios – ao passo que o ônus que aquele consumo sobre o recurso ambiental – pastagem – é partilhado por todos os utilizadores do terreno – exteriorização dos custos. O resultado lógico dessa dinâmica é a utilização excessiva do pasto comunal, com o conseqüente esgotamento do próprio recurso.

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Logo, direitos de propriedade, ou direitos de exclusividade sobre a utilização de recursos naturais – no exemplo, propriedade sobre os terrenos de pastagem – é uma forma de prover incentivos para que os criadores de gado procurem manejar de forma eficiente os recursos que possuem, procurando extrair o máximo daquela área de pastagem, até mesmo reduzindo a utilização para permitir sua conservação.

Contudo, esta lógica de atribuição de direitos exclusivos necessita ser reformulada quando da aplicação sobre bens intelectuais. Com efeito, os bens intelectuais são o que se pode chamar de “imperfeitamente exclusivos”[26], pois é possível excluir terceiros de determinada informação ou conhecimento enquanto estes forem mantidos em segredo. Uma vez comunicados não é mais possível excluir aquele conhecimento ou informação do terceiro.

A natureza imaterial ainda permite que o mesmo bem ou recurso – informação – seja utilizada por múltiplos indivíduos sem esgotar o recurso original. Uma mesma música, por exemplo, pode ser cantada por milhares de pessoas simultaneamente sem que a música se esgota, ao passo que a pastagem consumida por uma cabeça de gado não subsiste mais disponível para outros animais.

Assim, os bens imateriais são diferentes no que se relaciona aos critérios econômicos de rivalidade e exclusividade dos recursos. Essas diferenças de comportamento econômico implicam que o os equilíbrios do meio ambiente natural e do meio ambiente cultural prestar-se-ão a dinâmicas diferenciadas, demandando lógicas e formas de regulação próprias.

Lawrence Lessig explica as implicações da rivalidade na definição de um sistema de controle sobre a utilização de recursos econômicos, naturais ou imateriais

1. Se o recurso é rival, então o sistema de controle é necessário para assegurar que o recurso não será esgotado, o que significa que o sistema deve assegurar que o recurso será tanto produzido como não sobre-utilizado;

2. Se o recurso é não rival, então o sistema de controle é necessário simplesmente criado – um problema de provisionamento. Uma vez criado não há qualquer perigo de que o recurso seja esgotado. Por definição um recurso não rival não pode ser exaurido.

[...]

O que se segue é crucial: O sistema de controle criado para recursos rivais (terra, carros, computadores) não é necessariamente apropriado para recursos não rivais (idéias, música, expressões). De fato, o mesmo regime para os dois tipos de recursos pode ocasionar um dano real. Portanto, o sistema legal ou a sociedade em geral, deve cuidadosamente delinear o tipo de controle ao tipo de recurso. Um só tipo de regulação não serve para todos os casos.[27]

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Logo, o sistema de propriedade intelectual não deveria ter, a priori, a mesma formatação de um sistema de propriedade para bens materiais ou de recursos naturais. Embora o que se persiga no Direito Ambiental e no direito de Propriedade Intelectual seja o equilíbrio, no primeiro, uma preocupação deve ser a sobre-utilização ou esgotamento dos recursos, no segundo a existência ou não de incentivos suficientes à produção dos bens imateriais.

Uma vez produzidos, os bens intelectuais podem ser amplamente difundidos, sem que o detentor originário veja-se diminuído no acesso ao bem. Essa vocação para a difusão dos bens intelectuais torna-se ainda mais patente diante das tecnologias digitais e das redes de telecomunicação, cujo exemplo por excelência é a Internet, que se consubstanciam em uma infra-estrutura que reduz os custos de distribuição dos bens intelectuais à quase zero.

Contudo, essa facilidade de replicação ocasiona um problema que se relaciona com os incentivos necessários à produção do bem intelectual em primeiro plano. Surge o problema econômico conhecido como free riding, ou seja, a possibilidade de “pegar carona” no esforço alheio. Se os custos com a cópia ou a engenharia reversa de um determinado produto intelectual são muito menores do que os custos com a criação ou desenvolvimento do mesmo, a racionalidade individual sugeriria que todos os agentes aguardassem que outrem criasse o produto. Com todos agindo dessa forma o produto sequer seria criado inicialmente.

O sistema de direitos de Propriedade Intelectual é a forma como a sociedade busca resolver esse problema. Através da atribuição de direitos exclusivos, busca-se equacionar tanto a questão dos incentivos para a produção como garantir uma distribuição eficiente. Consoante Lévêque e Ménière,

Através da oferta de direitos exclusivos por um período de tempo limitado, a propriedade intelectual trata desses dois problemas de forma seqüencial. Inicialmente, o mecanismo legal de proteção torna o produto exclusivo. Usuários devem pagar pelos serviços oferecidos, através de royalties. Seqüencialmente, quando o trabalho passa para o domínio público, todos os consumidores podem acessá-lo de forma gratuita. Propriedade Intelectual procura encontrar um equilíbrio entre incentivos para a criação e inovação e usos, traduzindo-se em linguagem econômica como uma troca entre eficiências dinâmica e estática.[28]

Essa sistemática de atribuição de direitos exclusivos é comum às diversas doutrinas da propriedade intelectual, seja no tocante às criações artísticas seja no que se relaciona aos inventos industriais. Logo, traduz-se na própria dinâmica do equilíbrio ecológico desse meio ambiente cultural.

Os direitos exclusivos são uma forma de permitir o controle da criação de modo que o titular possa cobrar pelo acesso desse recurso intelectual para não só recuperar os custos com a criação ou desenvolvimento, bem como se sentir estimulado à criar em primeiro lugar.

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Dessa concepção decorre importante constatação, a forma e a extensão do controle é que delimitam o equilíbrio dessa ecologia informacional. Se o controle for muito reduzido, não haverá incentivos suficientes para a produção de novos bens intelectuais e o ambiente intelectual não estará a se expandir em toda a sua potencialidade.

Por outro lado, se o controle for excessivo, estar-se-á limitando o acesso a esses bens imateriais desnecessariamente em favor do interesse individual. Além disso, não se está a permitir que outros indivíduos na sociedade elaborem sobre esse conhecimento prévio, produzindo algo novo sobre fundamentos passados.

É possível dizer que as diferenças de dinâmica econômica entre os recursos naturais e os recursos intelectuais determinam duas diferentes posturas em relação à tutela dos respectivos meio ambientes.

O meio ambiente natural, composto de bens materiais, necessidade de uma lógica de preservação e limitação da utilização de modo a promover a sustentabilidade do mesmo frente à esgotabilidade dos recursos.

Já o meio ambiente cultural, composto de bens imateriais, necessita de uma lógica de expansão progressiva, tendo em vista a inesgotabilidade dos recursos. Para tanto, necessita de uma tutela que providencie tão somente os incentivos necessários a um nível de produção ótimo para a posterior difusão dos bens produzidos. O equilíbrio desse meio ambiente peculiar encontra-se na adequada atribuição da exclusividade tanto em escopo, como em duração.

Os princípios ambientais, por sua vez, orientam tanto a construção de políticas públicas, como a hermenêutica a ser aplicada às questões ambientais. Válido, portanto, fazer algumas ilações de como transportar os principais princípios do direito ambiental para o campo da Propriedade Intelectual.

4 CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE AS APLICAÇÕES DOS PRINCÍPIOS AMBIENTAIS À PROPRIEDADE INTELECTUAL

Os princípios ambientais têm grande importância para se obter a efetividade do direito subjetivo a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. São diversos os princípios ambientais de índole constitucional: a) o princípio do acesso eqüitativo aos recursos naturais; b) o princípio do usuário-pagador; c) o princípio do poluidor-pagador; d) o princípio da precaução; e) o princípio da prevenção; f) o princípio da reparação; g) o princípio da informação; h) o princípio da participação.[29]

Contudo, para os propósitos deste estudo, destacamos alguns princípios nos quais é possível fazer paralelos e suscitar questões cuja análise pode se mostrar relevante para a compreensão da propriedade intelectual.

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4.1 Princípio da Responsabilidade Intergeracional

O princípio da responsabilidade intergeracional decorre da previsão constitucional, no final do caput do art. 225, da necessária preservação do meio ambiente para as gerações futuras. Tal princípio coloca em evidência que a tessitura social não é pontual, mas sim um contínuo através da história, ligando as mais diversas gerações. Nas palavras de Edmund Burke:

Sociedade é realmente um contrato. (...) É uma parceria em toda a ciência; uma parceria em todas as artes; uma parceria em toda virtude e em toda a perfeição. Como os objetivos dessa parceria não podem ser obtidos em várias gerações, fica claro que essa parceria não é somente entre aqueles que estão vivos, mas entre aqueles que estão vivos, aqueles que estão mortos e aqueles que estão por nascer.[30]

O Direito Ambiental, portanto, objetiva salvaguardar as condições ambientais para o futuro. Do contrário, o uso desregrado atual irá comprometer a quantidade e qualidade de recursos ambientais necessários para que as gerações futuras possam exercer, no seu momento próprio, o direito a uma qualidade sadia de vida.[31] Para José Rubens Leite, portanto:

(...) a defesa do meio ambiente está relacionada a um interesse intergeracional e com necessidade de um desenvolvimento sustentável, destinado a preservar os recursos naturais para gerações futuras, fazendo com que a proteção antropocêntrica do passado perca fôlego, pois está em jogo não apenas o interesse da geração atual. Assim sendo, este novo paradigma de proteção ambiental com vistas às gerações futuras, pressiona um condicionamento humano, político e coletivo mais consciencioso com relação às necessidades ambientais.[32]

O tratamento constitucional da cultura, por sua vez, também aponta para a preservação da história e memória cultural do povo. Com efeito, existe toda uma gama de instrumentos jurídicos para a proteção do Patrimônio Cultural. Contudo, este é normalmente vislumbrado como tão somente os bens materiais e imateriais de valor histórico ou historiográfico, quando os incisos do art. 216 claramente indicam que os elementos desse Patrimônio transcendem os bens de valor meramente historiográfico.

Particularmente no tocante aos bens do inciso III, as criações artísticas, científicas e tecnológicas, o princípio da responsabilidade intergeracional no campo da Propriedade Intelectual traduzir-se-ia em um imperativo de que, para as gerações futuras, não seja repassado um horizonte cultural e intelectual mais reduzido em razão da atribuição excessiva de direitos exclusivos sobre bens intelectuais.

De fato, uma expansão desmedida de direitos de Propriedade Intelectual sobre bens intelectuais implica numa redução do horizonte cultural comum que estará à disposição da humanidade para que novas descobertas científicas e novos trabalhos de arte.

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Esse horizonte cultural comum disponível à todos, pode ser identificado com o domínio público, ou seja, um conjunto de bens ou recursos imateriais disponível à todos para utilização independentemente de autorização ou controle. Trata-se, portanto, de um commons cultural.

Esse tipo de commons é normalmente negligenciado ou pouco estudado, pois o foco da atenção social usualmente reside com a novidade, não com a ciência ou conhecimentos básicos subjacentes. Peter Barnes assim se posiciona sobre este commons cultural:

Por este eu me refiro aos presentes da linguagem, arte e ciência que herdamos, mais as contribuições que fazemos enquanto vivemos. Cultura é um trabalho conjunto – uma co-produção – de indivíduos e sociedade. As sinfonias de Morzart, tal quais as canções de Lennon e McCartney, são trabalhos de gênio. Mas elas surgem da cultura na qual tais gênios vivem. A instrumentação, o sistema de partituras, as formas musicais prevalentes são a massa da qual os compositores assam os seus bolos. Também com as idéias. Todos os pensadores e escritoras evocam histórias e descobertas que foram desenvolvidas por incontáveis homens e mulheres antes deles. Parafraseando Issac Newton, cada geração vê um pouco mais longe porque está nos ombros de suas predecessoras. Desta forma, todos os novos trabalhos absorvem do coletivo e o enriquecem. Para manter a arte e a ciência florescendo, nos devemos garantir que o commons cultural seja cuidado.

[...]

Hoje em dia, infelizmente, este commons cultural, tal qual o commons da natureza e comunidade está sendo enclausurado por corporações privadas. O perigo é que estas corporações venham a esgotar o solo onde a cultura cresce. O remédio é revigorar o commons cultural.[33]

A idéia de um meio ambiente cultural é importante para evidenciar a importância dessa cultural básica na qual toda a inovação e criatividade são geradas.

A aplicação de um princípio de responsabilidade intergeracional à Propriedade Intelectual, por sua vez, implica na inserção de um componente ético na definição do que pode ou não ser apropriado, de que forma e por quanto tempo, para que esse commons cultural que é passado através das gerações não seja progressivamente enclausurado e controlado por uns poucos detentores de ativos intelectuais, sufocando a criatividade futura e o acesso aos conhecimentos básicos para que se possam conduzir novas pesquisas científicas.

Essa noção de um meio ambiente cultural que deve ser cuidado possui, portanto, implicação direta para as diversas doutrinas da propriedade intelectual: a necessidade de uma gestão racional dos recursos intelectuais.

Se para o Direito Ambiental a utilização racional é aquela que permite a preservação e recuperação natural do ambiente, a utilização racional da Propriedade Intelectual será

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aquela onde a exclusividade e o controle privado são atribuídos na medida adequada para que haja um máximo de produção social de bens intelectuais e o retorno dos mesmos ao patrimônio comum.

Foge aos propósitos deste trabalho delinear todas as possíveis aplicações que a construção desse princípio no campo da Propriedade Intelectual permitiria, contudo, fica patente que diversas questões atualmente debatidas poderiam ser beneficiadas com uma ótica ambiental, por exemplo, a questão dos conhecimentos tradicionais associados ao patrimônio genético.

4.2 Princípio do Poluidor-Pagador

Para Marcelo Abelha,

(...) o princípio do poluidor-pagador, juntamente com o do desenvolvimento sustentável (utilização racional dos componentes ambientais, que também constituem um direito das futuras gerações) e com a identificação do objeto de proteção do Direito Ambiental (equilíbrio ecológico derivado da interação de seus componentes – bens de uso comum), constituem os mais robustos “pilares” do Direito Ambiental, sobre os quais devem se assentar todas as normas do ordenamento jurídico do ambiente.[34]

De fato, o princípio do polidor-pagador e do usuário-pagador além do viés econômico, possuem uma dimensão de ordem repressiva, de índole reparatória e ressarcitória, buscando internalizar ao processo produtivo os custos sociais que são suportados com o desenvolvimento das atividades econômicas. Consoante Paulo Affonso Machado: “A atividade poluente acaba sendo uma apropriação pelo poluidor dos direitos de outrem, pois na realidade a emissão poluente representa um confisco do direito de alguém em respirar um ar puro, beber água saudável e viver com tranqüilidade”.[35]

Num nível bem básico, o que o princípio prevê é uma reparação tendo em vista o valor do ambiente que é aproveitado ou degradado dentro de um processo produtivo que gera lucros para determinado agente econômico.

O pagamento financeiro é apenas a forma residual de reparação, pois o objetivo ideal do Direito Ambiental é a manutenção, recuperação ou reparação do próprio bem ambiental.

No campo da Propriedade Intelectual é possível verificar uma dinâmica com algumas possíveis analogias. Com efeito, os titulares de ativos intelectuais relacionam-se com o meio ambiente ex ante e ex post à atribuição dos direitos exclusivos.

No caso do direito de propriedade industrial, por exemplo, ao solicitar a patente o inventor deve expor a técnica e o conhecimento inerentes à sua invenção, de modo que um técnico no assunto possa repetir o processo (art. 24 da Lei de Propriedade Industrial[36]). Neste momento, ex ante à proteção patentária, já há um retorno de

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conhecimento à coletividade. Ao expirar à patente, há um retorno mais significativo à sociedade, pois o conhecimento subjacente àquele invento ou processo passa para o domínio público, o que permite à qualquer indivíduo trabalhar com e elaborar sobre o mesmo.

No direito autoral, o final da proteção dos direitos patrimoniais reflete a possibilidade de uma disseminação muito mais fácil e abre-se a possibilidade de elaboração de novos trabalhos sobre os bens intelectuais.

Com efeito, um exemplo icônico do problema a qual está sujeito o meio ambiente cultural é a história da Disney Corporation. Lawrence Lessig informa que a maior parte dos grandes sucessos da Disney foram histórias derivadas de trabalhos do domínio público:

Em verdade, o catálogo de trabalhos da Disney derivados do trabalho de outros é assombroso quando colocado em conjunto: Snow White (1937), Fantasia (1940), Pinocchio (1940), Dumbo (1941), Bambi (1942), Song of the South (1946), Cinderella (1950), Alice in Wonderland (1951), Robin Hood (1952), Peter Pan (1953), Lady and the Tramp (1955), Mulan (1998), Sleeping Beauty (1959), 101 Dalmatians (1961), The Sword in the Stone (1963), and The Jungle Book (1967) , Treasure Planet (2003). Em todos esses casos, Disney (ou Disney, Inc.) retirou criatividade da cultura ao seu redor, mixou essa criatividade com seu extraordinário talento e gravou essa mistura na alma dessa cultura.[37]

Inegável que toda essa criatividade produzida corporativamente é uma importante parte da nossa cultura e valorizada pela comunidade. Com efeito, muitas dessas histórias passaram a se tornar elementos indissociáveis dos sentidos e significados de várias comunidades pelo globo.

Contudo, essa criatividade está apenas disponível para consumo, nos termos ditados pelo detentor dos direitos. Qualquer uso não autorizado pode ser reprimido pelo aparato policial e jurisdicional do estado. Assim, é inegável que essa criatividade não retornou efetivamente para commons cultural, não obstante o efetivo valor desses trabalhos esta na apreciação do público. Através de progressivas expansões dos períodos de proteção dos trabalhos expressivos, nenhum dos trabalhos acima listados ingressou no domínio público.

Assim, retirou-se um grande valor do commons cultural e ocorreu apenas um retorno parcial, com a elaboração de novos trabalhos, porém, esses novos objetos permanecem no controle de alguns poucos titulares, que efetivamente passam a ditar como a cultura pode ou não ser utilizada.

Esse problema da ausência de um efetivo retorno ao commons cultural fica ainda mais cristalizado frente às novas tecnologias digitais que, através de tecnologias e equipamentos de baixo custo, democratizaram a possibilidade dos indivíduos de capturar sons e imagens da cultura ao seu redor e alterá-las para expressar novas mensagens e significados. Contudo, a maioria das imagens, músicas e filmes da nossa cultura são trabalhos protegidos pela Propriedade Intelectual, através da qual, os

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titulares detêm o controle de como tais bens e a criatividade subjacente aos mesmos será utilizada.

Ainda na comparação entre o meio ambiente natural e o meio ambiente intelectual, cumpre definir o que seria poluição que se pretende prevenir ou reparar no Direito Ambiental para a Propriedade Intelectual.

A poluição é vista como uma externalidade negativa do processo produtivo, logo o direito cria mecanismos para que esta externalidade seja internalizada, através da imposição de custos, como por exemplo, necessidade de tratamento dos efluentes industriais.

O equilíbrio que norma ambiental deve alcançar é a internalização dos custos associados a uma atividade produtiva sem, contudo, se tornar tão excessiva ao ponto de inviabilizar as próprias atividades econômicas necessárias à sociedade.

Para os bens intelectuais, o problema é inverso, há uma dificuldade de internalizar os benefícios de determinada criação, uma vez que é da natureza desses bens uma grande assimetria entre os custos de produção e os custos de reprodução. Essa facilidade de reprodução gera, na verdade, externalidades positivas para a sociedade, uma vez que determinado conhecimento ou informação pode ser utilizado pode ser utilizado por terceiros, levando a novas descobertas.

Numa simetria interessante, a lógica subjacente à Propriedade Intelectual deve ser a busca de um equilíbrio que permita a internalização dos benefícios oriundos de determinado bem intelectual produzido sem, contudo, reduzir as externalidades positivas ao ponto de anular qualquer benefício à sociedade.

Logo, poderíamos entender como “poluição” do ambiente cultural o desequilíbrio causado por utilizações abusivas ou controles excessivos dos titulares de ativos intelectuais, uma vez, que a vocação natural da informação e do conhecimento é a difusão.

A idéia de um poluidor-pagador, traduzir-se-ia, para a Propriedade Intelectual, em um princípio pelo qual o deve-se valorizar o commons cultural, bem como devem existir mecanismos jurídicos e institucionais através do qual o conhecimento produzido e usufruído com base nesse manancial informacional coletivo retorne para a sociedade de modo ainda útil e com potencial para permitir novas criações. Um dos pagamentos desse “poluidor” – aquele que se apropria do conhecimento através da ordem jurídica – seria o próprio novo produto cultural quando do seu retorno ao domínio público.

5. O AMBIENTALISMO CULTURAL NA PERSPECTIVA DO DIREITO COMPARADO

Embora as considerações sobre as possíveis formas de instrumentalização e transposição de princípios ambientais à Propriedade Intelectual no direito brasileiro

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sejam apenas iniciais, demandado uma maior reflexão e estudo doutrinário, essa comparação e utilização do conjunto conceitual e metodológico do ambientalismo para a construção de uma perspectiva unificada dos movimentos sociais relacionados com a informação e o conhecimento já é presente no direito comparado.

A idéia específica de um ambientalismo cultural (cultural environmentalism) no campo da propriedade intelectual surgiu na doutrina americana a partir dos trabalhos de James Boyle, professor da universidade de Duke.[38] No livro Shamans, Software, and Spleens, Boyle explicita a multiplicidade de campos aparentemente díspares que tem como elemento comum a regulação sobre a informação.

A utilização do movimento ambientalista como um paradigma de estudo é interessante para dotar os diversos movimentos em torno da regulação das informações e do conhecimento de uma identidade. Desta forma, fortalecendo o discurso sobre a necessidade de valorizar o commons cultural e informacional que tem cada vez maior importância na sociedade.

Nas palavras do próprio Boyle:

Eu tenho defendido que, da mesma forma, temos que tornar visíveis as invisíveis contribuições do domínio público, o “eco-sistema de serviços” realizados pelo ignorado, porém vital, reservatório de liberdade na cultura e na ciência. E, da mesma forma que com o ambientalismo, necessitamos não só de um reconhecimento semântico ou um movimento devotado a este fim, mas de um conjunto de ferramentas conceituais e analíticas.[39]

O domínio público é o foco de uma grande valorização no trabalho de Boyle, para quem o mesmo sofre problemas similares ao ambiente em seu processo de afirmação social:

O ambiente era sub-valorizado por uma concepção estreita e formalista de direitos de propriedade, que ignorava os efeitos da poluição e de outras atividades na ecologia coletiva, não reconhecidos como danos legalmente tuteláveis. Similarmente, existiam áreas da propriedade intelectual onde o domínio público era sub-valorizado por uma ideologia romântica de autoria, que pressupunha que a inovação surgia do éter – o autor não necessitaria de materiais básicos para suas criações.[40]

Retirar o foco do debate da pessoa do criador de um bem intelectual é uma forma importante para permitir a compreensão da importância do horizonte cultural comum da comunidade para o próprio processo criativo. Valorizar a idéia e o estudo do domínio público é uma forma de destacar a importância de um espaço de liberdade, seja nas artes ou nas ciências:

A idéia do “ambiente” literalmente criou o “auto-interesse” ou conjunto de preferência que torna o movimento coeso. O mesmo é verdade aqui. Interesses aparentemente

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díspares são ligados pela idéia de proteção do domínio público e da importância de equilíbrio entre proteção e liberdade na ecologia cultural e científica.[41]

Essa ecologia da informação e do conhecimento necessita ser vislumbrada em toda a sua extensão, especialmente para que os diversos problemas existentes nas diversas doutrinas da Propriedade Intelectual possam ser entendidos como decorrência de uma causa comum, o desequilíbrio entre o controle e a liberdade sobre os bens intelectuais.

O foco dos debates deve passar a ser o equilíbrio e não simplesmente a idéia de proteção e regulação. A já assentada idéia de um direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, transposta à Propriedade Intelectual em relação a um meio ambiente cultural, pode ser um importante fator para reformular o debate de forma mais lúcida e racional.

É necessário, portanto, valorizar tanto o papel do indivíduo e seus interesses como o indispensável papel da coletividade nos processos de produção cultural e científica. Nas palavras de Lawrence Lessig:

Tal qual o meio ambiente global, cada vez mais percebemos como escolhas relativamente específicas sobre como a informação será regulada possuem efeitos radicais na saúde e diversidade da ecologia informacional. E da mesma forma que precisamos levar em consideração os efeitos globais de nossa decisão de usar como fonte de energia o carvão, ou a utilização de gasolina nos carros, também devemos levar em consideração os efeitos culturais globais do aumento radical na regulação característica legislação sobre informação. O ponto não é anarquia. Ambientes informacionais, como os ambientes físicos, necessitam de regulação. Ninguém duvida que certa regulação é boa. Mas simplesmente porque alguma é boa, não segue que quanto mais é melhor. Ou mesmo se mais for melhor para alguns propósitos, não é necessariamente o melhor para a difusão do conhecimento ou progresso da cultura.[42]

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O artigo procurou demonstras as similitudes de tratamento existente entre o tratamento constitucional do meio ambiente e do patrimônio cultural, destacando que este último é composto não somente dos bens de valor historiográfico. A dicção constitucional expressamente indica que compõe esse patrimônio as criações artísticas, científicas e tecnológicas.

A Propriedade Intelectual, por sua vez, disciplina exatamente os limites de apropriabilidade desses bens, bem como cria incentivos para a produção e regula o retorno dos bens produzidos para o horizonte cultural comum da humanidade.

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Conclui-se se possível traçar alguns paralelos entre o meio ambiente e um commons cultural da sociedade, contudo, os respectivos bens formadores prestam-se a dinâmicas de produção e consumo diferenciadas em razão da natureza material ou imaterial. Essas diferenças, por sua vez, vão determinar sistemáticas e equilíbrios próprios para o meio ambiente natural e o meio ambiente cultural.

A transposição de princípios do direito ambiental para a propriedade intelectual encontra diversas aplicações. Primeiro, por traduzir para a propriedade intelectual a noção de uma responsabilidade intergeracional relativamente à cultura que é repassada às gerações futuras, que deve ser rica, farta e, principalmente, acessível para que possa haver uma evolução e expansão do conhecimento humano. Segundo, a idéia do direito a um meio ambiente equilibrado, onde os ônus impostos pela atividade humana devem ser reparados, evoca a idéia análoga de um ambiente cultural onde o acesso aos bens intelectuais não seja desnecessariamente limitado em favor da apropriação individual do conhecimento, bem como haja um efetivo retorno dessa cultura à coletividade.

O artigo ainda demonstra que a idéia de um ambientalismo cultural como forma de unificar a visão dos diversos problemas e questões envolvendo a Propriedade Intelectual em suas diversas doutrinas, já vem sendo construído no direito comparado. A dignidade constitucional do meio ambiente é transportada para a seara intelectual como a dignidade do domínio público e do commons cultural da humanidade.

Por fim, conclui-se que as analogias e o estudo das interações do Direito Ambiental, com a Propriedade Intelectual podem apresentar relevantes insights para o aprimoramento do debate, bem como para a construção racional e equilibrada do sistema jurídico de tutela dos bens intelectuais e informacionais.

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[1] BOYLE, James. The Second Enclosure Movement and the Construction of the Public Domain. In: Duke Conference on the Public Domain. Law and Contemporary Problems. Volume 66, p. 33-74. Winter/Spring 2003. p. 52. No original: “The invention of the concept of “the environment” pulls together a string of otherwise disconnected issues, offers analytical insight into the blindness implicit in prior ways of thinking, and leads to perception of common interest where none was seen before.”

[2] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de direito ambiental: parte geral. 2. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 57.

[3] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 16ª. ed. Malheiros: São Paulo. 2008. p. 54-55.

[4] PRONER, Carol. Propriedade Intelectual: Para uma outra ordem jurídica possível. São Paulo: Cortez Editora, 2007. p. 3.

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[5] BARBOSA, Denis Borges. Uma Introdução à Propriedade Intelectual. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. vol. 1. p. 5.

[6] BULZICO, Bettina Augusta Amorim. Evolução da Regulamentação Internacional da Propriedade Intelectual e os Novos Rumos Para Harmonizar a Legislação. Revista Direitos Fundamentais & Democracia. Unibrasil. Vol 1. 2007. Disponível em: <http://revistaeletronicardfd.unibrasil.com.br>. Acesso em: 25.07.08.

[7] O art. 2º da Convenção indica de forma exemplificativa e ampliativa uma série de direitos que estariam englobados pela noção de propriedade intelectual. No texto do Decreto 75.541/75: “(...)Para os fins da presente Convenção, entende-se por: (...) viii “propriedade intelectual”, os direitos relativos: às obras literárias, artísticas e científicas, às interpretações dos artistas intérpretes e às execuções dos artistas executantes, aos fonogramas e às emissões de radiofusão; às invenções em todos os domínios da atividade humana, às descobertas científicas, aos desenhos e modelos industriais, às marcas industriais, comerciais e de serviço, bem como às firmas comerciais e denominações comerciais, à proteção contra a concorrência desleal e todos os outros direitos inerentes à atividade intelectual nos domínios industrial, científico, literário e artístico”.

[8] BASSO, Maristela. A proteção da propriedade intelectual e o direito internacional atual. Revista de Informação Legislativa. Brasília a. 41. n. 162. p. 287-310. abr./jun. 2004. p. 288.

[9] SHERWOOD, Robert M. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento Econômico. São Paulo: EdUsp. 1992. p. 37.

[10] PIMENTEL, Luís Otávio. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento. In: Propriedade Intelectual – Estudos em Homenagem à Professora Maristela Basso. Curitiba: Juruá Editora. 2005. p 41-60. p. 46.

[11] MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente. 5ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2007. p. 69.

[12] SHERWOOD, Robert M. Propriedade Intelectual e Desenvolvimento Econômico. São Paulo: EdUsp. 1992. p. 46.

[13] ABRÃO, Eliane Y. Conhecimento, Pesquisa, Cultura e os Direitos Autorais. In: ADOLFO, Luis Gonzaga; WACHOWICZ, Marcos (Orgs.). Direito da Propriedade Intelectual – Estudos em Homenagem ao Pe. Bruno Jorge Hammes. Curitiba: Juruá Editora, 2006. p. 165-182. p. 167-168.

[14] BOLLIER, David. Silent Theft – The private plunder of our common wealth. New York: Routledge, 2003. p. 65. No original: “Nature quietly provides countless other benefits to the economy. Biodiversity represents a “genetic library” that is increasingly used to develop new medicines and increase de productivity of wheat and corn crops. The world’s oceans are important in biologically filtering water, detoxifying some pollutants, providing food, and encouraging tourism. Natural pests provide a highly valuable service to farmers in improving crop yields and lowering costs (a benefit that is most apparent when the ecosystem service has broken down). All told, it

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has been crudely estimated that nature´s service provide some US$ 39 trillion of value to the economy – this in a global GDP estimated at US$ 35 trillion”.

[15] WACHOWICZ, Marcos. Propriedade Intelectual do Software & Revolução da Tecnologia da Informação. Curitiba: Juruá Editora, 2004. p. 96.

[16] ROVER, Aires J. O Direito Intelectual e seus Paradoxos. In: ADOLFO, Luis Gonzaga; WACHOWICZ, Marcos (Orgs.). Direito da Propriedade Intelectual – Estudos em Homenagem ao Pe. Bruno Jorge Hammes. Curitiba: Juruá, 2006. p. 33-38. p. 36.

[17] MARCHESAN, Ana Maria Moreira. A tutela do patrimônio cultural sob o enfoque do direito ambiental, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 17.

[18] SAMPAIO CUNHA, Danilo Fontenele. Patrimônio Cultural – Proteção Legal e Constitucional. Rio de Janeiro: Letra Legal Editora, 2004. p. 25.

[19] SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 20.

[20] GANDELMAN, Silvia Regina Dain. Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural Imaterial. In: Anais do Seminário Patrimônio Cultural e Propriedade Intelectual: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais. Belém/PA, 13-15 de out. 2004. MOREIRA, Eliane; BELAS, Carla Arouca; BARROS, Benedita; PINHEIRO, Antônio. (Orgs.). p. 211-222. Belém: CESUPA/MPEG. 2005. p. 216.

[21] Constituição Federal de 1988: Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, (...). § 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação. (...) § 3º - A lei estabelecerá incentivos para a produção e o conhecimento de bens e valores culturais. § 4º - Os danos e ameaças ao patrimônio cultural serão punidos, na forma da lei.

[22] Constituição Federal de 1988: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (...) § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

[23] ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito da Internet e da Sociedade da Informação. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 135-137.

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[24] O termo “commons” refere-se a qualquer recurso natural que disponha de pouca ou nenhuma regulação, ou seja, são recursos naturais que podem ser livremente utilizados pela comunidade.

[25] HARDIN, Garret. The Tragedy of the Commons. Science Magazine. nº 162. p. 1243-1248. 1968.

[26] LESSIG, Lawrence. The Future of Ideas – The Fate of the Commons in a Connected World. New York: Vintage Books, 2002. p. 94.

[27] LESSIG, Lawrence. Idem. p. 94-95. No original: “1. If the resource is rivalrous, then a system of control is needed to assure that the resource is not depleted which means the system must assure the resource is both produced and not overused; 2. If the resource is nonrivalrous, then a system of control is needed simply to assure the resource is created – a provisioning problem, (…). Once it is created, there is no danger that the resource will be depleted. By definition, a nonrivalrous resource cannot be used up. [...] What follows then is critical: The system of control that we erect for rivalrous resources (land, cars, computers) is not necessarily appropriate for nonrivalrous resources (ideas, music, expression). Indeed, the same system for both kinds of resources may do real harm. Thus a legal system, or a society generally, must be careful to tailor the kind of control to the kind of resource. One size won´t fit all.”

[28] LÉVÊQUE, François; MÉNIÈRE, Yann. The Economics of Patents and Copyright. Paris: Berkley Eletronic Press, 2004. p. 5. No original: “By offering an exclusive right for a limited period, intellectual property law addresses these two problems sequentially. Initially, the legal mechanism of protection makes the good excludable. Users are required to pay for the services offered, through royalties. Subsequently when the work passes into the public domain, all consumers can access it free of charge. Intellectual property law thus attempts to strike a balance between the incentive to create and innovate and use translates into economic language as a trade-off between dynamic and static efficiency.”

[29] DELGADO, José Augusto. Aspectos constitucionais do direito ambiental. BDJur, Brasília, DF. 19 dez. 2007. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/16087>.

[30] BURKE, Edmund. Reflections on The Revolution in France. 1790. Disponível em: <http://socserv2.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/burke/revfrance.pdf>. Acesso em 08/08/08. No original: “Society is indeed a contract. (…) It is a partnership in all science; a partnership in all art; a partnership in every virtue and in all perfection. As the ends of such a partnership cannot be obtained in many generations, it becomes a partnership not only between those who are living, but between those who are living, those who are dead, and those who are to be born.”

[31] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de direito ambiental: parte geral. 2. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 171.

[32] LEITE, José Rubens. Dano Ambiental: do individual ao coletivo e extrapatrimonial. RT. São Paulo, 2003. p.74.

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[33] BARNES, Peter. Capitalism 3.0. San Francisco: Berret-Koehler Publishers, Inc. 2006. p. 117. No original: “By this I mean the gifts of language, art, and science we inherit, plus the contributions we make as we live. Culture is a joint undertaking—a co-production—of individuals and society. The symphonies of Mozart, like the songs of Lennon and McCartney, are works of genius. But they also arise from the culture in which that genius lives. The instrumentation, the notation system, and the prevalent musical forms are the dough from which composers bake their cakes. So too with ideas. All thinkers and writers draw on stories and discoveries that have been developed by countless men and women before them. To paraphrase Isaac Newton, each generation sees a little farther because it stands on the shoulders of its predecessors. In this way, all new work draws from the commons and then enriches it. To keep art and science flourishing, we have to make sure the cultural commons is cared for. […] Today, unfortunately, this cultural commons, like the commons of nature and community, is being enclosed by private corporations. The danger is that corporations will deplete the soil in which culture grows. The remedy is to reinvigorate the cultural commons.”

[34] RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de direito ambiental: parte geral. 2. ed. São Paulo: RT, 2005. p. 190.

[35] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 16ª. ed. Malheiros: São Paulo. 2008. p. 273.

[36] Lei nº 9.279/96: “Art. 24. O relatório deverá descrever clara e suficientemente o objeto, de modo a possibilitar sua realização por técnico no assunto e indicar, quando for o caso, a melhor forma de execução”.

[37] LESSIG, Lawrence. Free Culture. New York: Penguin Books, 2004. p. 23-24. No original: “Indeed, the catalog of Disney work drawing upon the work of others is astonishing when set together: Snow White (1937), Fantasia (1940), Pinocchio (1940), Dumbo (1941), Bambi (1942), Song of the South (1946), Cinderella (1950), Alice in Wonderland (1951), Robin Hood (1952), Peter Pan (1953), Lady and the Tramp (1955), Mulan (1998), Sleeping Beauty (1959), 101 Dalmatians (1961), The Sword in the Stone (1963), and The Jungle Book (1967) , Treasure Planet (2003). In all of these cases, Disney (or Disney, Inc.) ripped creativity from the culture around him, mixed that creativity with his own extraordinary talent, and then burned that mix into the soul of his culture”.

[38] LESSIG, Lawrence. Foreword. In: Cultural Environmentalism @ 10. Law and Contemporary Problems. Volume 70, p. 1-4. Spring 2006. p. 1.

[39] BOYLE, James. Cultural Environmentalism and Beyond. In: Cultural Environmentalism @ 10. Law and Contemporary Problems. Volume 70, p. 5-22. Spring 2006. p. 7. No original: “I argued that, in a similar way, we needed to make visible the invisible contributions of the public domain, the “eco-system services” performed by the under-noticed but nevertheless vital reservoir of freedom in culture and science. And, just as with environmentalism, we needed not only a semantic reorganization, or a movement devoted to a goal, but a set of conceptual and analytic tools.”

[40] BOYLE, James. Cultural Environmentalism and Beyond. In: Cultural Environmentalism @ 10. Law and Contemporary Problems. Volume 70, p. 5-22. Spring

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2006. p. 7. No original: “The environment was undervalued by a narrow and formalistic conception of property rights that ignored the effects of pollution and other activities on the collective ecology, not counting it as a legally cognizable harm. Similarly, there were areas in intellectual property law where the public domain was undervalued by an ideology of authorial romance, which assumed innovation sprang out of thin air—the great author needs no raw material for his creations.”

[41] BOYLE, James. Cultural Environmentalism and Beyond. In: Cultural Environmentalism @ 10. Law and Contemporary Problems. Volume 70, p. 5-22. Spring 2006. p. 17. No original: “The idea of the “environment” literally created the “self-interest” or set of preferences that ties the movement together. The same is true here. Apparently disparate interests are tied together by the ideas of the protection of the public domain and of the importance of a balance between protection and freedom in the cultural and scientific ecology.”

[42] LESSIG, Lawrence. Foreword. In: Cultural Environmentalism @ 10. Law and Contemporary Problems. Volume 70, p. 1-4. Spring 2006. p. 4. No original: “For, like the global environment, more now see how relatively specific choices about how information gets regulated have radical effects upon the health and diversity of an information ecology. And Just as we need to account for the global effects of our decision to heat with coal, or drive with oil, so too we need to account for the global cultural effects of the radical increase in regulation that marks information law. The claim is not for anarchy. Information environments, like physical environments, need regulation. None doubt that some regulation is good. But just because some is good, it does not follow that more is better. Or even if more is better for some purposes, it is not necessarily better for the spread of knowledge or the progress of culture”

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