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Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC Centro de Comunicação e Expressão – CCE Programa de Pós-Graduação em Jornalismo TITO LUIZ PEREIRA Contribuições da Ontologia do Ser Social lukacsiana para aproximação entre o consensualismo e as teorias do imaginário.

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Projeto de mestrado

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Universidade Federal de Santa Catarina UFSC

Centro de Comunicao e Expresso CCE

Programa de Ps-Graduao em Jornalismo

TITO LUIZ PEREIRA

Contribuies da Ontologia do Ser Social lukacsiana para aproximao entre o consensualismo e as teorias do imaginrio.

Florianpolis, 2014

1 INTRODUO

O presente projeto parte na busca de se aprofundar na investigao acerca dos estudos sobre o carter simblico-mtico do fenmeno jornalstico a partir de um resgate ao conceito de ideologia sob a tica lukacsiana, que, concomitantemente, reflete uma crtica terica e epistemolgica acerca das atuais e predominantes abordagens e estudos da dimenso simblico-mtica do jornalismo. Para tal, inicia-se fazendo um recorte metodolgico das teorias do jornalismo, separando-as em objetivista/funcionalista e subjetivista/ideolgica, primeiramente apontando brevemente as caractersticas e limites da corrente funcionalista.

Em um segundo momento, parte-se para o aprofundamento dos estudos da corrente subjetivista, nomeada aqui como consensualista, terminologia usada Jock Young. Tal terminologia usada, pois seus principais estudos percebem o jornalismo como uma atividade de formao de consensos, e relaciona as dimenses simblico-mticas como uma forma de garantia de manuteno do status quo. Tais estudos sobre a dimenso simblico-mtica so divididos em crtico-ideolgico, que parte de um paradgima estruturalista e do marxismo vulgar, e estabelece o mito como forma de alienao da massa trabalhadora sob gide da ideologia burguesa, e cultural-antropolgico, que traz uma viso do mito como forma de compartilhamento dos significados e emoes do passado.

partindo tanto desse limite conservador da perspectiva consensualista e tambm identificando sua potencialidade dentro dos estudos da dimenso simblico-mtica, tentamos resgatar o conceito de ideologia a partir da ontologia do ser social, proposta por Lukcs, na perspectiva de se aprofundar nos estudos dessa dimenso dentro do jornalismo, de forma a enxergar nele no apenas uma fora conservadora, mas um potencial do mito como um campo em aberto, que consiga acompanhar e fortalecer os desenvolvimentos sociais.

2 JUSTIFICATIVAS

O campo de estudo e trabalho se mostra cada vez mais dominado por uma percepo funcionalista do jornalismo e seus mantras da objetividade, imparcialidade e neutralidade. Como conseqncia, esse modus operandi de tratar o jornalismo chega, em muitos casos, a relegar o jornalismo a um mero ofcio tcnico, onde a pesquisa cientfica sobre o tema ou se torna desnecessria ou opera apenas no campo da tecnologia e exageros, ou seja, ora tentando encontrar novos instrumentos e normas que melhor expressam a verdade epifenomnica emprica, ora fazendo estudos de casos sobre manipulaes exageradas e evidentes. Para alm disso, este tipo de patamar terico funciona como forma de engessar a operao jornalstica a um tipo de profisso que, ao invs de produzir conhecimento, funciona como mero instrumento de manuteno do pensamento socialmente vigente na sociedade em prol das classes privilegiadas.

Desta forma, mostra-se imperativo o esforo analtico dos estudos sobre uma epistemologia do jornalismo que consiga primeiro delinear o objeto de estudo da sua teoria, assim como repensar o ofcio jornalstico. Entretanto, os estudos que operam sob coordenadas diferentes do funcionalismo, em sua maioria, ainda pecam por enxergar a capacidade do jornalismo como produtor de narrativas histricas sob uma tica conservadora. Primeiro tratando a produo jornalstica apenas como manipuladora das massas e segundo por encarar o processo narrativo de maneira unvoca, ou seja, apenas seguindo o caminho da produo ao consumo, sem perceber este movimento de maneira reflexiva, onde o prprio o produzir se forma a partir da dimenso social e suas mudanas, fazendo que o movimento de produzir e consumir do fenmeno jornalstico no seja unvoco, mas compartilhado, onde um influencia o outro de maneira reflexiva.

por conta desta limitao que se faz necessrio um novo olhar sobre o fenmeno jornalstico, suas teorias e patamares epistemolgicos, para que consigamos nos aproximar cada vez mais de uma perspectiva de produo de teoria jornalstica que consiga entender o fenmeno jornalstico e sua expresso social de maneira complexa e totalizante, onde a dimenso simblico-mtica ocupa um lugar essencial na formao de narrativas. Para tal tarefa, o resgate do conceito de ideologia e ontologia do ser social de Lukcs mostra-se essencial, pois consegue compreender a formao desde o ser social e sua forma de socializao pelo trabalho e a linguagem, assim como sua expresso na produo de ideologia, aqui no mais como falseamento da realidade como imprime o marxismo vulgar, mas a partir de uma lgica totalizante de complexo de complexos.

3 PROBLEMA DE ESTUDO

O presente projeto busca encontrar respostas para a pergunta: qual a contribuio que os estudos sobre ideologia e ontologia do ser social em Lukcs tem a dar para a teoria do jornalismo?

No campo de estudos da dimenso simblico-mtica dos fenmenos jornalsticos, muito tem se estudado e afirmado a respeito da funo do mito dentro da notcia. As vises dominantes, aqui denominadas consensualistas, tendem a enxergar o mito apenas sob uma perspectiva conservadora, que engessa a populao dentro dos mesmo dilemas e referenciais morais, como a imagem de heri, vilo, vtima, grande me, etc, assim relegando a indstria jornalstica o papel de controladora das massas e produtora de narrativas que mantm o status quo.

a partir dessa perspectiva que um novo patamar de estudos sobre teoria do jornalismo precisa ser formado, que consiga entender a complexidade do mito, do fenmeno jornalstico, do pblico-alvo e sua reao ao produto jornalstico, e as suas inmeras relaes com o Estado, os movimentos sociais, a economia, a cultura, a arte, e suas tambm inmeras contradies, negociaes, movimentos, avanos e recuos.

Nesse sentido, a noo de totalidade e complexos de complexos, proposta por Lukcs no trazem grande contribuio para entender os mecanismos que operam na transformao social, e, em conseguinte, o papel que o jornalismo, os jornalistas e a teoria do jornalismo, tem cumprido e podem cumprir socialmente.

4 OBJETIVOS

4.1 Objetivo Geral

O objetivo geral do trabalho conseguir demonstrar como a ontologia do ser social e o conceito de ideologia proposto por Lukcs pea fundamental no desenvolvimento de uma nova teoria do jornalismo, que se preocupa no apenas como a objetividade epifenomnica, mas consegue encara a dimenso simblica da qual o fenmeno jornalstico est imerso, contribuindo assim para avanar os estudos para um novo patamar epistemolgico da teoria do jornalismo.

4.2 Objetivos Especficos

Resgatar o conceito de ontologia do ser social proposta por Lukcs como fundamental para uma anlise marxista totalizante;

Fazer uma reviso dos conceitos de funcionalismo e consensualismo na teoria do jornalismo;

Se aprofundar acerca da importncia dos estudos dos mitos para a teoria do jornalismo;

Mostrar a relao entre a ideologia em Lukcs e os estudos da dimenso simblico-mtica da teoria do jornalismo;

5 REFERENCIAL TERICO

Para conseguirmos identificar a relevncia do estudo da ontologia e do conceito de ideologia em Lukcs para o avano da comprenso da dimenso simbolico-mitica dentro da teoria do jornalismo, preciso retornar as definies bsicas desta mesma teoria. Ao adentrarmos nos estudos sobre a Teoria do Jornalismo, percebemos, inicialmente, que dois pontos de vista tericos tm sido usados para estudar os fenmenos jornalsticos. Estes dois pontos de vista podem ser separados entre aqueles que observam o fenmeno jornalstico como sendo um reflexo da realidade factual objetiva ou o jornalismo como forma de construo de uma realidade expressada, ou uma narrativa que expresse uma realidade anterior objetiva atravs da mediao pelos agentes do jornalismo. Enquanto a primeira se insere mais formalmente no campo do que chamamos de objetivismo ou funcionalismo, a segunda se insere na tica da ideologia ou subjetividade. O presente trabalho, portanto, se esforar em introduzir brevemente estes dois campos, expor seus princpios norteadores, assim como seus limites, problemas, e, no caso do segundo campo, desenvolvendo suas potencialidades ao introduzir uma viso mais abrangente que o reducionismo do ideologismo vulgar em geral traz, atravs primeiramente da introduo do conceito do imaginrio dentro do fenmeno jornalstico, e mais adiante, aprofundando um conceito no-vulgar de ideologia, atravs de uma apurao aprofundada da ontologia do ser social na viso de Lukcs.

Conforme Cremilda Medina, em sua obra Cincia e jornalismo: da herana positivista ao dilogo dos afetos, aponta, o objetivismo, ainda hoje, ocupa a rea de hegemonia dentro no s da rea de discusso da Teoria do Jornalismo, como, em especial, na prtica cotidiana da mdia tradicional. Sua expresso mxima se d dentro do chamado jornalismo informativo, que tem o cartesianismo, ancorado na lgica positivista de Auguste Comte, como base. Assim, sua norma a simplificao. A partir desta base, o texto jornalstico to mais adequado quo mais objetivo, simples e direto for, quo mais ortodoxamente seguir a cartilha do fazer jornalstico: imparcial, objetivo, simples, distanciando o sujeito e o objeto e respondendo as perguntas base da notcia: o qu, quem, quando, como onde, por qu. Tal prtica pode ser facilmente observada desde a grande mdia at os manuais lecionados na academia e traz intrnseco a elas, uma lgica epistemolgica de base positivista (MEDINA, 2008).

Assim, a autora coloca que:

Sempre que o jornalista est diante do desafio de produzir notcia, reportagem e largas coberturas dos acontecimentos sociais, os princpios ou comandos mentais que conduzem a operao simblica espelham a fora da concepo de mundo positivista. Das ordens imediatas nas editorias dos meios de comunicao social s disciplinas acadmicas do Jornalismo, reproduzem-se em prticas profissionais os dogmas propostos por Auguste Comte: a aposta na objetividade da informao, seu realismo positivo, a afirmao de dados concretos de determinado fenmeno, a preciso da linguagem. Se visitarmos os manuais de imprensa, livros didticos da ortodoxia comunicacional, l estaro fixados os cnones dessa filosofia, posteriormente reafirmados pela sociologia funcionalista (MEDINA, 2008, p. 25).

Assim, ao fincar sua base no positivismo funcionalista, a teoria objetivista do fenmeno jornalstica acaba por priorizar elementos formais que melhor apresentem um realismo positivo, o que, em ltima instncia, no apenas pode ter como conseqncia a produo de notcias levianas e descontextualizadas, o que engessa os fatos como isolados, desconexos e sem demonstrar sua relao com outros complexos e determinaes sociais, como tambm ignora os elementos subjetivos que conformam a notcia, tratando a realidade, no a complexo de produo do real, mas como apenas realidade emprica aparente.

Para apresentar a o campo que v o fenmeno jornalstico para alm de uma expresso reflexa da realidade aparente, mas que observa atravs de sua dimenso simblico-mtica, utilizaremos como base o artigo Sobre a perspectiva dominante nos estudos da dimenso simblico-mtica das notcias, de Silva e Dourado Maia (2011). As autoras afirmam que, mesmo no constituindo uma tradio de pesquisa, as anlises feitas acerca dimenso simblico-mtica do jornalismo caminham em direo a uma percepo do uso dos significantes simblicos como forma de garantir a reproduo das lgicas e relaes sociais vigentes. Isto se d, pois esses esforos analticos tm como mtodo uma percepo conservadora da funo do jornalismo, tratando-o como instituio que promovem narrativas e consensos de manuteno das estruturas (ou classes) hegemnicas de poder na sociedade (SILVA e DOURADO MAIA, 2011).

Para as autoras, mesmo de forma predominante conservadora, o panorama consensualista se expressa nas pesquisas que relacionam a notcia e os significantes simblicos entre dois enfoques: um cultural-antropolgico e outro crtico-ideolgico. (SILVA e DOURADO MAIA, 2011). A perspectiva cultural-antropolgica traz uma viso em que o jornalismo precisa ser entendido no como um processo unvoco de transmisso de informaes, mas um processo relacional, uma comunho de significados e emoes compartilhadas, enquanto as perspectivas crtico-ideolgicas por partir dos paradigmas estruturalistas e do marxismo vulgar, colocando o mito dentro das coordenadas da ideologia burguesa, ou seja, uma forma de alienar e imobilizar a classe trabalhadora, no sentido de acalmar os clamores das massas operrias e garantir a reproduo ampliada do capital. Para tal, o jornalismo serviria como narrativa de naturalizao da histria, construindo uma concepo de realidade como natural e imutvel. (SILVA e DOURADO MAIA, 2011)

Assim, estas correntes tm como base a noo da notcia como histrias construdas com base em convenes narrativas e engendradas dentro de um sistema simblico (SILVA e DOURADO MAIA, 2011, p.116), ou seja, so mais que meras informaes objetivas de novos epifenmenos, elas carregam em si, subjetividades, uma carga cultural anterior ao prprio evento, e so estas subjetividades que do um carter inteligvel ao processo jornalstico.

Nesse sentido, Flvia Dourado Maia, explica:

Em sua dimenso narrativa e mtica, o jornalismo exerceria, ento, uma funo explicativa e pedaggica, conforme aponta Barkin. Segundo o autor, ao recorrer a categorias universais, como as de heri e vilo, bem e mal, crime e punio, as notcias situam fenmenos complexos dentro de cenrios simblicos e obtm, com isso, um efeito duplo: por um lado, interpretam os fatos em termos universais e compreensveis, facilitando a comunicao; por outro, provm lies de moral e guias de comportamento ligadas a valores e crenas dominantes na sociedade, contribuindo para a sustentao do statu quo e coibio de desvios em relao normalidade consensual. (DOURADO MAIA, 2011, p 36)

Ainda que lance me de uma nova forma de percepo do fenmeno jornalstico, o consensualismo, por tratar o simblico-mtico como produo de narrativas de consenso, est intimamente ligado a um processo de conservao das prticas culturais vigentes, o que resulta em encarar o jornalismo como mecanismo de produes de notcia genricas e descontextualizadas, pois se furta em questionar as ideologias consolidadas, tratando, atravs da notcia, as aes que quebram com os paradigmas correntes como um ponto fora do desvio-padro de comportamento, um outlier, e no como uma possvel nova tendncia.

Ao colocar como central a questo da formao de consensos, dos significantes mtico-simblicos e a subjetividade, o consensualismo se mostra como um contraponto contundente do objetivismo funcionalista. Mas, ao somente posicionar o jornalismo como mantedor do status quo, o consensualismo acaba ocupando uma posio diametralmente oposta ao objetivismo, o que igualmente perigoso. Dessa forma, enquanto o objetivismo est preocupado com a exposio de uma pretensa realidade objetivada explicita na notcia, o consensualismo trabalha pensando a subjetividade, a dimenso mtico-simblica na notcia como deformadora da realidade, uma falseadora da verdade, e o jornal um manipulador de massas. Sobre essa dicotomia, Adelmo Genro Filho afirma:

De um lado, ele visto apenas como instrumento particular da dominao burguesa, como linguagem do engodo, da manipulao e da conscincia alienada. Ou simplesmente como correia de transmisso dos "aparelhos ideolgicos de Estado", como mediao servil e andina do poder de uma classe, sem qualquer potencial para uma autntica apropriao simblica da realidade. De outro lado, esto as vises meramente descritivas ou mesmo apologticas - tipicamente funcionalistas - em geral suavemente coloridas com as tintas do liberalismo: a atividade jornalstica como "crtica responsvel" baseada na simples divulgao objetiva dos fatos, uma "funo social" voltada para "o aperfeioamento das instituies democrticas". (GENRO FILHO, 1987, s/p)

Para conseguirmos ter uma viso mais ampliada da dimenso simblico-mtica do fenmeno jornalstico, Maia (2011) buscam a conceituao proposta por Motta (2005) dos paradigmas desta rea, separando-os em midiacntrico e sociocntrico, tentando assim ver seus limites e potencialidades assim como tentando encontrar solues para a dicotomia objetividade/subjetividade (DOURADO MAIA, 2011).

O que caracteriza o paradigma midiacntrico a posio primria da mdia no processo do fenmeno jornalstico e a maneira como ela responsvel pela atribuio de narrativas que moldar a compreenso de mundo. Assim, este campo de pensamento esta voltado a como a produo do jornalismo, e sua conseqente expresso na sociedade civil est imbricada nas determinaes econmicas, culturais e ideolgicas dos detentores dos meios de produo miditico, dando ao fenmeno jornalstico no s um aspecto despolitizante e mantedor do status quo, mas tambm centrando o processo de escolha da notcia e da forma narrativa como unvoca, ou seja, com origem na mdia e direcionada para a populao, como uma via de mo nica. Tal perspectiva, muito comum a esquerda vulgar, centraliza a produo de sentidos na mdia e ignora a influncia do campo social como reflexiva a produo jornalstica, em ltima instncia, propondo uma identidade vulgar de populao como manipulada e mdia como manipuladora.

Para Motta (2005), a resposta desta problemtica surge atravs da definio do paradigma sociocntrico, que, a no encarar o jornalismo como unidirecional, percebe a produo da notcia dentro de um contexto de sociabilidade, de disputa, contradio, negociao, avanos e recuos. Assim, consegue analisar o fenmeno jornalstico no apenas como um modelo simplrio, baseado num conceito vulgar de hegemonia e ideologia, em que a estrutura de poder dominante tem poder absoluta na construo da narrativa histrica, simblica e cultural da sociedade, tratando o fenmeno jornalstico como disputa pela visibilidade e pela conquista do poder (MOTTA apud DOURADO MAIA, p. 53).

Assim, este novo paradigma consegue limpar o campo para um estudo renovado do poder da dimenso simblica no agir e pensar dos sujeitos. Agora, no mais visto como um ideologismo vulgar, um controle do pensamento de uma massa inerte e passiva, mas fruto de um complexo social mais amplo e imbricado de contradies em constante movimento e disputa. Onde os antagonismos e as diferenas de poder ainda esto vigentes e limitando a produo de conhecimento do todo social, mas com aberturas para disputa e negociaes.

A partir deste novo patamar, que consiga tanto superar a viso liberal do jornalismo funcionalista, e que alm disso, no fique preso no conservadorismo e na concepo vulgar de ideologia proposta pelos consensualista, e consiga ver na dimenso simblico-mtica no apenas fora de conservao, mas tambm de transformao e mudana, que um novo arranjo terico-metodolgico precisa se firmar, para tanto, SILVA e MAIA, apontam:

Trata-se de outros modelos interpretativos que no tomem as manifestaes do simblico-mtico nas notcias como um movimento de repetio continuada do mesmo, mas como um movimento em espiral, que no redunda na retomada dos mesmos pontos, mas que acompanha as transformaes da sociedade e se deixa contaminar pelos confrontos, pluralidades e negociaes. Na nossa avaliao, o dilogo das teorias do jornalismo com os estudos do imaginrio poderia contribuir muito para isso. Dessa perspectiva, as notcias poderiam ser alvejadas no apenas com o olhar quase sempre reducionista do racionalismo, do ideologismo e do arcasmo, mas com uma viso mais abrangente, que reconhece na dimenso simblico-mtica do jornalismo uma dimenso imaginativa, que nos convida a uma experincia esttica. (SILVA e DOURADO MAIA, 2011, p. 122)

a partir dessas ponderaes, que o presente trabalho tenta, para conseguir justamente superar estas vises conservadoras da dimenso simblico-mtica e abarcar as transformaes da sociedade em seu aspecto complexo, resgatar o conceito de ideologia sob uma tica marxista rigorosa, distante da concepo vulgar como falseamento da realidade, to comum dentro da bibliografia tradicional.

No de hoje que o estudo da ideologia vem sendo alvo de intensos debates dentro da comunidade cientfica, a ponto de poder facilmente ser considerado o conceito de definio menos precisa de todo arcabouo terico marxista. Isso se deve, como afirma Terry Eagleton em sua obra Ideologia: uma Introduo, no porque as pessoas que trabalham nessa rea sejam notveis por sua pouca inteligncia, mas porque o termo ideologia tem toda uma srie de significados convenientes, nem todos eles compatveis entre si. (EAGLETON, 1997). Estes significados no s variam entre correntes tericas diametralmente opostas, mas tambm dentro do prprio marxismo h um rico e intenso debate acerca da real significao do tema.

Assim, Eagleton inicia apresentando uma coleo de significaes de ideologia que circulam socialmente, em vistas de iniciar um mapeamento das definies do tema nos debates correntes. Esta lista traz percepes de ideologia como processos de produo de significados, signos e valores na vida social; ideias falsas que ajudam a legitimar um poder dominante; comunicao sistematicamente distorcida; um corpo de idias caracterstico de um determinado grupo ou classe social; formas de pensamento motivadas por interesses sociais; pensamento de identidade; iluso socialmente necessria; o veculo pelo qual atores sociais conscientes entendem o seu mundo; conjunto de crenas orientadas para a ao; a confuso entre realidade lingstica e realidade fenomenal; o meio pelo qual os indivduos vivenciam suas relaes com uma estrutura; etc. (EAGLETON, 1997).

No meio deste emaranhado de conceitos, rupturas, significados e impactos polticos reais, para conseguirmos afastar a neblina que turva nossa viso acerca do objeto de estudo da ideologia, optamos por fazer um resgate metodolgico rigoroso do mtodo marxista. Para conseguirmos avanar na anlise sobre ideologia, resolvemos ento tratar apenas de ideologia sob tica de um autor considerado fundamental sobre o tema, Gyrgy Lukcs. A escolha por Lukcs se deu, pois ele o principal responsvel por buscar as origens que fundam os processos ideolgicos, ou seja, a ontologia do ser social, os processos de reificao e fetichismo e a concepo totalizante do capitalismo como fundamentos da ideologia.

Pela complexidade dos dois temas abordados (a ontologia do ser social e o conceito de ideologia em Lukcs), se torna impossvel expor a dimenso do avano de seu pensamento para a formulao de uma nova forma de pensar ideologia que antagnica ao conceito vulgar de ideologia expostos por muitos marxistas, mesmo de renome. O que nos possvel apontar que, atravs dos estudos ontolgicos de Lukcs, conseguimos compreender a sociabilidade no mais como um simples retrato de luta de proletrios contra burgueses, mas dessa luta imersa em um patamar histrico conjuntamente com um sem-nmero de outros complexos sociais que se articulam, disputam, negociam, e se transformam mediados por outro sem-nmero de complexos, formando assim o que Lukcs denomina de complexos de complexos, onde o papel da luta poltica desvelar essas relaes na busca de um devir da totalidade capitalista (LUKCS, 1979). Nesse sentido, a ideologia em Lukcs deixa de possuir um carter de falseamento de realidade, ou de manipulao de massas, mas, como Eagleton aponta:

[...] a ideologia antes um campo de significado complexo e conflitivo, no qual alguns temas estaro intimamente ligados experincia de classes particulares, enquanto outros estaro mais deriva, empurrados ora para um lado, ora para o outro na luta entre os poderes contendores. A ideologia um domnio de contestao e negociao, em que h um trfego intenso e constante: significados e valores so roubados, transformados, apropriados atravs das fronteiras de diferentes classes e grupos, cedidos, recuperados, reinfletidos. (EAGLETON, 1997, p. 96)

Desta forma, percebe-se que no s fundamental resgatar as teorias de Lukcs acerca de ideologia e ontologia como maneira de aprofundar, encontrar semelhanas, diferenciar e encontrar vicissitudes entre este debate e as teorias do imaginrio, como tambm importante este debate como forma de se avanar numa compreenso mais totalizante por uma epistemologia do jornalismo.

6 METODOLOGIA

Acreditamos que o raciocnio cientfico o nico tipo de pensamento que no natural ou congnito ao ser humano. Este no se desenvolve espontnea ou biologicamente determinado por sua gentica mas por meio de um esforo mental deliberado e disciplinado (DIETERICH, 1999, p. 24). Diferencia-se assim, do senso comum, da arte, ou da magia, por sua forma artificial, no sentido de ser inveno humana, mas, sobretudo por seguir uma srie de procedimentos considerados indispensveis na busca desta forma de sabedoria.

Nesse sentido, a metodologia da pesquisa basicamente o conjunto de procedimentos e tcnicas utilizados para o desenvolvimento do conhecimento cientfico.

O uso de uma metodologia torna-se necessrio porque frequentemente os fenmenos no so o que aparentam ser, e no aparentam ser o que realmente so. Haveria desta forma, uma diferena entre a aparncia e a essncia da realidade objetiva das coisas, a verdadeira Verdade (DIETERICH, 1999).

Assim sendo, este trabalho se caracteriza como uma pesquisa qualitativa por ter um objeto de pesquisa basicamente terico e epistemolgico ao buscar aprofundar a compreenso das relaes referentes a este objeto, a saber, os estudos da teoria do jornalismo e sua dimenso simblico-mtica, o conceito de ideologia em Lukcs, sua relao com o atual patamar das pesquisas em teoria do jornalismo e suas consequncias sociais.

O conjunto de procedimentos bsicos utilizados no mbito de uma pesquisa qualitativa composto pela pesquisa bibliogrfica e pela pesquisa documental. A pesquisa bibliogrfica se centra, principalmente, sobre livros, artigos, teses e dissertaes referentes ao tema e problema estudados aqui, ou que, por sua ligao ao nosso referencial terico contriburam de alguma maneira compreenso do fenmeno estudado.

7 BIBLIOGRAFIA

DIETERICH, Heinz. Novo Guia para a Pesquisa Cientfica. Blumenau: Editora da FURB, 1999.

DOURADO MAIA, F. D. Jornalismo entre o Efmero e o Eterno: Imaginrio e Natureza na Globo Rural (1985-2010). 2011. Dissertao (Mestrado em Jornalismo) Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis, 2011.

EAGLETON, T. Ideologia: Uma Introduo. So Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista: Editora Boitempo, 1997.

GENRO FILHO, Adelmo. O segredo da pirmide: para uma teoria marxista do jornalismo. Porto Alegre: Editora Tch, 1987.

________. Sobre a necessidade de uma teoria do Jornalismo. Estudos em Jornalismo e Mdia, v.1, n.1, 1 semestre de 2004a, p. 160-162.

LUKCS, G. Ontologia do ser social: Os princpios ontolgicos fundamentais de Marx. Trad. Calor Nelson Coutinho. So Paulo: Cincias Humanas, 1979.

________. Histria e conscincia classe. Rio de Janeiro: Elfos Ed., 1989

MEDINA, Cremilda, Cincia e jornalismo: da herana positivista ao dilogo dos afetos. So Paulo: Summus, 2008.

SILVA, Gislene; DOURADO MAIA, Flvia. Sobre a perspectiva dominante nos estudos da dimenso simblico-mtica das notcias. Revista Galxia, So Paulo, n. 21, p. 113-124, jun. 2011.