projecto educativo apordoc 2017/18 · bruta, o índio caçador vence pela esperteza. É o que...

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PROJECTO EDUCATIVO APORDOC 2017/18

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PROJECTOEDUCATIVOAPORDOC

2017/18

ÍNDICE

“O DOCUMENTÁRIO E O MUNDO” 2

TEMA 2017/18: “VÍDEO NAS ALDEIAS” 3

PROGRAMAÇÃO 4

OFICINAS DOCS4KIDS 1º CICLO 6

SESSÕES DOCESCOLAS PARA OS 2º/3º CICLOS E SECUNDÁRIO 7

OFICINAS DOCS4KIDS PARA FAMÍLIAS 8dos 4 aos 7 anos 8dos 8 aos 11 anos 9dos 12 aos 15 anos 10Férias Escolares 10

OUTRAS ACTIVIDADES 11Extensões 11Sessões Sénior 11

ENTREVISTA A VICENTE CARELLI 12

SCI-DOC 15

APORDOC 16

O Projecto Educativo da Apordoc nasce da convicção de que o cinema documen-tal é, enquanto forma de arte, uma expressão humana com potencial transforma-dor dos cidadãos no sentido de uma cidadania mais crítica, informada, aberta e respeitadora da diferença, visando a construção de uma sociedade mais com-pleta, justa, tolerante e, portanto, mais forte. O projecto “O Documentário e o Mundo” apresenta sessões e oficinas para crianças e jovens, em contexto escolar ou familiar e assenta naquela que acreditamos ser uma dupla força do docu-mentário: a capacidade cinematográfica de revelar ao espectador um ponto de vista singular sobre o real, e a capacidade de ser veículo para um acesso quase directo a mundos e experiências potenciadoras da aprendizagem de conteúdos curriculares.

No ano lectivo de 2017/2018, apresentamos, por um lado, um conjunto de ofici-nas Docs4Kids - oficinas de cinema para crianças e jovens dos 4 aos 15 anos - direccionadas para famílias, em parceria com a Rede de Bibliotecas de Lisboa. Por outro lado, serão realizadas sessões DocEscolas em escolas do 3º ciclo e Ensino Secundário ao longo do ano, bem como oficinas continuadas para turmas do 1º ciclo. Pela primeira vez, a Apordoc apresenta oficinas orientadas para o público das Universidades Sénior. Em 2018, iremos explorar a relação dos povos indígenas do Brasil com o cinema, arma essencial para o fortalecimento das suas identidades e os seus patrimónios territoriais e culturais, tal como foi experienciado pelo projecto Vídeo nas Aldeias.

“O DOCUMENTÁRIO E O MUNDO”

As lutas dos povos indígenas para fortalecer as suas identidades e o seu patrimó-nio territorial e cultural.

E se um dia um realizador em vez de pegar na sua câmara para registar, a entre-gasse àqueles que tenciona filmar? E se além de deixá-los filmar, lhes permitisse assistir ao material filmado? Primeiro teria que garantir que os seus protagonistas estão ambientados com esse tipo de equipamento, dar-lhes formação, e depois verificar que possuem formas de exibir os seus próprios vídeos.

Esse experimento foi realizado pelo realizador Vincent Carelli com os índios Nam-biquara, no Brasil, na década de 90 do século passado. Diante do potencial que o instrumento apresentava, esta experiência foi sendo levada a outros grupos, e gerando uma série de conteúdos em suporte audiovisual sobre como cada povo incorporava o vídeo de uma maneira particular. Este projecto intitulado “Vídeo nas Aldeias” permitiu criar um importante acervo de imagens sobre os povos indí-genas no Brasil e produzir uma colecção de mais de 70 filmes, até ao momento. Alguns destes vídeos serão o ponto de partida das oficinas e das sessões.

Sobre o projecto Vídeo nas AldeiasO Vídeo nas Aldeias (VNA) é uma iniciativa pioneira no Brasil, na área de pro-dução e formação audiovisual indígena, fundada em 1987, pelo antropólogo e cineasta Vincent Carell. Criado para “apoiar os povos indígenas no fortalecimento de suas identidades e os seus patrimónios territoriais e culturais” através de recur-sos audiovisuais, o VNA realiza filmes sobre a questão indígena em parceria com as comunidades, além de promover oficinas nas aldeias para formar cineastas indígenas.

TEMA 2017/18: “VÍDEO NAS ALDEIAS”

Palavras-chaveProtecção, diversidade, povos indígenas, índio, expressões, luta, identidade, território, recursos, mobilização, vídeo nas aldeias, terra e Terra.

FormadoraCláudia Alves é realizadora de documentários e dá formação ao público infan-to-juvenil, na área de cinema e artes plásticas. Foi professora do 1º ciclo ao se-cundário, em disciplinas do campo das artes visuais. Trabalha com os serviços educativos do doclisboa, da Apordoc e da Cinemateca Júnior. Apresenta sessões escolares, concebe e orienta oficinas em parceria com alguns municípios, tentan-do transmitir o prazer de ver e fazer cinema.

PROGRAMAÇÃO

Boa Viagem, Ibantu!Vincent Carelli / 1999 / Brasil / 17’

A realidade indígena muitas vezes é diferente do que costumamos ver nos livros ou filmes. Este filme apresenta impressões de quatro adolescentes que fizeram uma visita à reserva indígena dos Krahôs, em uma região de divisa entre Tocantins e Maranhão. Eles tiveram a oportunidade de conviver com os índios, de conversar com eles sobre os costumes e até de serem batizados, ganhando um nome indígena durante o ritual. É o 3º episódio da série Índios no Brasil, uma iniciativa da TV Escola, da Secretaria de Educação à Distância e do Ministério da Educação, produzida pela ONG Vídeo nas Aldeias.

Já me transformei em imagemZezinho Yube / 2008 / Brasil / 32’

Comentários sobre a história de um povo, feito pelos realizadores dos filmes e por seus personagens. Do tempo do contato, passando pelo cativeiro nos seringais, até o trabalho atual com o vídeo, os depoimentos dão sentido ao processo de dispersão, perda e reencontro vividos pelos Huni kui.

A História do Monstro KhátpyWhinti Suyá, Kambrinti Suyá, Yaiku Suyá, Kamikia P. T. Kisêdjê / 2009 / Brasil / 6’

Os índios da aldeia Kisêdjê conhecem bem os perigos da mata. O monstro Khátpy é sem dúvida um deles. O curioso é que índio e monstro têm algo em comum: ambos são hábeis caçadores e exemplares chefes de família. Enquanto o primeiro caça macacos, o segundo caça índios. Enquanto Khátpy usa da força bruta, o índio caçador vence pela esperteza. É o que contam os anciãos da aldeia, ao relembrar a história de como um caçador astuto conseguiu escapar das garras do monstro e voltar são e salvo para o convívio de sua família.

No tempo do VerãoWewito Piyãko / 2012 / Brasil / 22’

É fim de semana e as crianças Ashaninka deixam a escola e partem, rio acima, para acampar com os pais e aprender a vida na mata.

Minha VizinhaRita Brás / 2014 / Brasil, Portugal / 12’

Guarassuy é minha vizinha na Rua da Relação onde moro no Rio de Janeiro. Nascida numa aldeia Arawak perto da fronteira com a Venezuela, ela foi trazida para a cidade pelos antropólogos Villas-Boas quando era ainda menina. Este filme estabelece um paralelo entre sua trajetória e o projeto nacional de expansão do território, iniciado por Getúlio Vargas no século XX.

Das crianças Ikpeng para o mundoNatuyu Yuwipo Txicão, Kumaré Ikpeng, Karané Ikpeng / 2001 / Brasil / 35’

Quatro crianças Ikpeng apresentam a sua aldeia respondendo à vídeo-carta das crianças da Sierra Maestra em Cuba. Com graça e leveza, elas mostram suas famílias, suas brincadeiras, suas festas, seu modo de vida. Curiosas em conhecer crianças de outras culturas, elas pedem para que respondam à sua vídeo-carta.

Kinja Iakaha - Um Dia na AldeiaKabaha Waimiri, Sawá Waimiri, Iawysy Waimiri, Sanapyty Atroari, Wamé Atroari, Araduwá Waimiri / 2003 / Brasil / 40’

Seis índios de diferentes aldeias Waimiri e Atroari, na Amazônia, registam o dia-a-dia de seus parentes da aldeia Cacau. Estes registos, sintetizados em “Um dia na aldeia”, nos transportam para a intimidade do quotidiano indígena com a sua interacção intensa com a natureza.

Durante o ano lectivo de 2017/2018, a Apordoc acompanhará 4 escolas da cidade de Lisboa numa oficina de continuidade com um percurso de 4 sessões. Estas oficinas permitem aos alunos aprofundar a sua relação com o cinema, pro-movendo não apenas a discussão temática, mas também (e especialmente) o trabalho prático sobre os temas apresentados.

Dividir-se-ão em 3 fases: visionamento de um ou mais filmes, desenvolvimento de actividades práticas e apresentação e debate sobre os resultados finais.

OFICINAS DOCS4KIDS 1º CICLO

O DocEscolas apresenta sessões de cinema para alunos dos vários graus de en-sino. Todas as sessões são acompanhados de debate, realçando a importância e a pertinência artística, social, política e filosófica do filme assistido.A presença da nossa formadora é essencial para ajudar a criar um espaço de aprendizagem e crescimento do público infantil e juvenil.

Este ano, a Apordoc levará estas sessões, já habituais durante o festival Doclis-boa, às salas de aula de algumas escolas da cidade. O intuito é realizar 10 ses-sões, divididas entre os 2º e 3º Ciclos do Ensino Básico e o Ensino Secundário.O filme a apresentar e discutir durante estas sessões será o Já me transformei em imagem (para mais informações, consultar o ponto 4. Programação).

SESSÕES DOCESCOLAS PARA OS 2º/3º CICLOS E SECUNDÁRIO

As actividades do Projecto Educativo da Apordoc não se esgotam nas escolas. Assim sendo, durante os fins-de-semana e férias escolares, serão organizadas oficinas de inscrição livre com um máximo de 12 participantes.Contamos com o apoio da Rede de Bibliotecas de Lisboa, que durante o próximo ano estará em colaboração connosco para organizar estas actividades no espaço da Biblioteca das Galveias (Campo Pequeno).

Filme: Das Crianças Ikpeng para o Mundo

Oficina:Vamos conhecer a aldeia de quatro crianças que vivem no interior da Amazónia, através do filme Das Crianças Ikpeng para o Mundo. Com graça e leveza, elas falam directamente à câmara, num registo muito fresco e cativante. Mostram-nos as suas famílias, as suas brincadeiras, as suas festas, como são os rios na sua aldeia. Curiosas em conhecer crianças de outras culturas, elas pedem para que respondam à sua vídeo-carta.Depois de uma conversa dinâmica em torno do filme, em que colocaremos todas as perguntas que nos vêm à cabeça, iremos conceber uma vídeo-carta, para responder ao desafio lançado pelas crianças do povo indígena Ikpeng. Mas, afi-nal o que é um vídeo-carta? Será possível inventar uma carta sem usar caneta e papel?

Nesta oficina, a nossa caneta será a câmara (a câmara de fotografias ou a do pró-prio telemóvel) e o vídeo o nosso suporte. Somos capazes de contar ao “outro” o nosso modo de vida? E se os nossos destinatários não estão familiarizados com os nossos jogos, objectos e hábitos? Dividindo responsabilidades, pais e filhos fa-lam entre si acerca dos seus hábitos em família, os afazeres no tempo de escola e de férias, os seus desportos preferidos, a forma como se constroem as casas em Portugal, o que comem, como são os nossos rios e identificam tradições do seu lugar de nascença.

Além das diferenças entre os costumes das crianças portuguesas e as do povo Ikpeng, haverá também diferenças entre pais e filhos?

OFICINAS DOCS4KIDS PARA FAMÍLIAS

_DOS 4 AOS 7 ANOS

Filmes: Kinja Iakaha – Um Dia na AldeiaBoa Viagem, Ibantu!

Oficina:Vamos conhecer um dia nas aldeias Waimiri e Atroari, no interior da Amazónia, através do filme Kinja Iakaha – Um Dia na Aldeia. Seis índios registam o dia-a-dia dos seus parentes. Estes registos, sintetizados num único dia, desde o ama-nhecer até ao anoitecer, transportam-nos para a intimidade do quotidiano indí-gena com a sua interacção intensa com a natureza. Depois de mergulhar nesta experiência sensorial do outro lado do Atlântico, os participantes da oficina são convidados a partir à aventura até uma destas aldeias indígenas, para vivencia-rem a diversidade cultural. Durante o filme Boa Viagem, Ibantu! quatro jovens de diferentes regiões do Brasil viajam até a aldeia dos Krahô.

Se tivesses que planear uma expedição à Amazónia, o que levarias contigo? E o que deixarias para trás? Os jovens do filme partiram cheios de expectativas e ideias pré-concebidas. O que mais te preocupa a ti? Quais os medos que sentes? Depois de listar as tuas tarefas diárias em Portugal e identificar os hábitos que te esperam na Amazónia, consegues dizer o que mais te fará mais falta? Prepara-do/a para pintar o corpo e ser batizado/a e receber um nome indígena?

Nesta oficina vamos “trabalhar” as nossas emoções, os medos e expectativas, expressando através de uma vídeo-carta as preocupações do grupo, imaginando que partem no prazo de dez dias para a aldeia indígena dos Krahô. As vídeo-car-tas serão dirigidas a um dos personagens dos filmes Kinja Iakaha – Um Dia na Aldeia e Boa Viagem, Ibantu!.

_DOS 8 AOS 11 ANOS

Filmes: Já me transformei em ImagemBoa Viagem, Ibantu!

Oficina:Antes de pôr a mão na massa, vamos ver dois documentários filmados em al-deias indígenas: Já me transformei em Imagem e Boa Viagem, Ibantu!.

No primeiro, vamos conhecer a história do povo Huni kui (Amazónia, Brasil) atra-vés dos depoimentos dos próprios realizadores (também de origem indígena) e dos personagens que eles elegem como protagonistas desta narrativa. Prepara-dos para viajar no tempo? Primeiro viajaremos até ao tempo do primeiro contacto com os brancos, depois ao período do cativeiro nos seringais, até ao presente. Como o projecto Vídeo nas Aldeias, o vídeo tornou-se num instrumento impor-tante para as comunidades registarem as suas traições e se defenderem. No fim do visionamento do filme, falaremos sobre o processo de dispersão, perda e reencontro vividos pelos Huni kui. Após uma pausa para reflectir sobre estas questões, vamos assistir ao segundo filme.

Com Boa Viagem, Ibantu! os participantes da oficina são convidados a partir à aventura até uma destas aldeias indígenas, para vivenciarem a diversidade cul-tural, à imagem do que aconteceu com quatro jovens de diferentes regiões do Brasil (provenientes de centros urbanos) que viajaram até à aldeia dos Krahô. Juntos iremos preparar uma entrevista que iremos fazer à Rita Carelli, uma das participantes do filme Boa Viagem, Ibantu!.

Oficinas de continuidade com a duração de uma semana (5 sessões de 3 horas), que permitirão às crianças dedicar mais tempo à realização das actividades e, assim sendo, aprofundar a sua experimentação e o acompanhamento da mesma.Os temas e filmes a explorar são os mesmos que nas oficinas de fim-de-semana.

_DOS 12 AOS 15 ANOS

_FÉRIAS ESCOLARES

Para além de todas estas actividades, e alojadas dentro do tema geral do projecto Vídeo nas Aldeias, pretendemos também realizar pela primeira vez sessões junto com o público sénior.Para isso, durante o próximo ano tentaremos realizar 3 sessões de cinema segui-das de debate no espaço de Universidades Sénior da cidade de Lisboa.Os filmes a apresentar serão Já me transformei em imagem e Minha Vizinha.

Tendo consciência de que grande parte das actividades incluídas neste dossier se focam no centro da cidade de Lisboa, devemos ainda referir que promovemos, junto dos restantes municípios, o mesmo programa de actividades (Docs4Kids Escolas e Famílias, DocEscolas e Sessões Sénior).Estas podem ser solicitadas no contexto das nossas extensões Doclisboa, um projecto que desenvolvemos durante todo o ano, e através do qual já realizámos, em edições anteriores, oficinas com escolas e famílias de outros pontos do país.

OUTRAS ACTIVIDADES

_SESSÕES SÉNIOR

_EXTENSÕES

O método de trabalho do Vídeo nas Aldeias é o mesmo há 30 anos: a cap-tação das imagens é quase exclusivamente feita pelos indígenas e vocês colaboram no processo de edição, certo?

Ana Carvalho: Ao longo desses 30 anos, o Vídeo nas Aldeias criou uma abor-dagem própria, que não é exatamente um método, mas um princípio. Não existe um modo indígena específico de fazer cinema, existe um conjunto de posturas e práticas de filmagem. São experiências que geram resultados diversos em rela-ção aos povos e aos seus filmes, que revelam formas de ver, estar e sobreviver no mundo.Em 1986, nas primeiras experiências, era só o Vincent com uma câmera colo-cada ao serviço dos índios; não era possível equipar as aldeias com câmeras, microfones e ilhas de edição. A câmara, guiada pelo olhar e pelas demandas dos índios, foi o embrião de um cinema que nasceu da colaboração entre brancos e índios e da apropriação de uma tecnologia não indígena na construção de um cinema indígena.Os processos de formação são imersivos, e de longa duração, e neles orienta-mos in loco a construção do trabalho. Mas no campo são apenas eles, a câmera e os seus personagens, os seus espaços, as suas questões. Eles filmam e, no fim do dia, vemos juntos o material.A produção de um filme nasce do desejo da comunidade de fazer cinema e nunca de uma demanda externa. O processo começa com uma oficina de captação e produção audiovisual, que dura de 20 a 40 dias, durante os quais os participantes filmam diariamente. No fim de cada dia, vemos o material e discutimos as ques-tões estéticas, éticas e técnicas que surgirem. As aldeias são equipadas com câmeras e ilhas de edição para que o trabalho continue na nossa ausência.As oficinas de tradução e edição são a segunda parte do projecto. A tradução das falas e do diálogos revela aos não-índios a profundidade do material. É um processo colectivo, sempre realizado em espaço aberto, com toda a comunidade a assistir: uma alegria. Depois, iniciamos a edição. O primeiro corte é feito na aldeia. Os cineastas indígenas e a comunidade discutem e decidem o roteiro, o que vai ser mostrado, o que não vai etc. A montagem final acontece na sede do Vídeo nas Aldeias, onde estão os equipamentos mais robustos para finalizar as produções, com a participação de cineastas que acompanharam o processo.

ENTREVISTA A VICENTE CARELLI

De que forma essa estratégia contribui para a formação do olhar desses povos?

AC: Esta formação contínua, colaborativa e de longa duração permite que formas específicas de apropriação surjam ao longo do processo. Cada grupo revela-se nos modos de produção dessas imagens. Esta aprendizagem prática permite que as diferentes estratégias cinematográficas se manifestem.Vicente Carelli: O processo ajuda a desconstruir a linguagem televisiva, a única que lhes é familiar hoje em dia; desenvolve a atenção ao som, a observação e o respeito pelo tempo próprio do mundo indígena. Mas é importante também que eles entrem em contato com outros repertórios, como os da videoarte, da anima-ção e da ficção, o que permite a cada um encontrar sua linguagem e seus temas preferidos. No começo da formação, a autoria é colectiva, mas aos poucos, al-guns destacam-se e decidem continuar a produção de registos e histórias, e a autoria passa então a ser individual ou em parceria.

Que questões surgem durante a produção dos filmes?

VC: Os povos mais presentes são aqueles com os quais construímos relações de formação continuada duradouras: os Mbya-Guarani do Rio Grande do Sul, os Ashaninka e os Huni Kuin, do Acre, os Xavante e os Kuikuro, de Mato Grosso. Cada um traz questões específicas: os Guarani focam-se em aspectos espiri-tuais; os Ashaninka, em aspectos ambientais; os Huni Kuin, no mundo da Jiboia, nos seus ensinamentos de cantos e pinturas; os Xavante, nos grandes rituais de iniciação que estruturam a sua sociedade. No caso dos Kuikuro, vemos também as grandes festas. Neste momento, porém, o cineasta Takumã iniciou a sua car-reira solo e tem procurado novos temas, como os antropólogos, os missionários e a vida da sua família na cidade.Em termos gerais, não é um cinema de questões abstratas, mas de imersão na vida quotidiana, principalmente dos jovens - mesmo que, no caso das aldeias, haja uma interação constante entre jovens e velhos. Eles não raciocinam atra-vés de abstrações: é preciso entrar na vivência, principalmente se o objectivo for desenvolver uma linha de cinema directo, mostrar a realidade sem se impor nela. Os primeiros filmes costumam registrar o quotidiano, os personagens, e só depois aparecem as questões. Os Ashaninka gostam da ficção e das cerimónias de iniciação. À medida que a produção amadurece, aparecem os assuntos reli-giosos, as disputas políticas, e os filmes tornam-se mais complexos. Já fizemos oficinas onde tentámos impor temas, mas é difícil começar por recortes temáti-cos. É melhor deixar fluir, partir de uma ideia geral, “um dia na aldeia”, e ver o que acontece.

Há 30 anos, a câmara de vídeo era um aparelho pouco conhecido nas al-deias. Hoje é bastante popular. Como é que essa mudança se refletiu no trabalho do Vídeo nas Aldeias?

VC: Não só a câmara: a TV também ainda não tinha chegado às aldeias. Depois veio a parabólica, o VHS, a internet, o telemóvel, o YouTube e as redes sociais. Hoje há índios a produzir e postar imagens de todos os cantos do Brasil. A produ-ção de autoria indígena que fomentámos foi uma grande inspiração para muitos povos, e estimulou um interesse que viria naturalmente com o tempo.Embora hoje todos tenham acesso aos equipamentos de produção de imagens, ainda é preciso estimular a produção de narrativas cinematográficas. O interesse que contagiou indígenas, tanto os mais jovens quanto os mais velhos, é mara-vilhoso. Quando sairmos do obscurantismo em que vivemos, será fundamental pensar numa política pública de estímulo do cinema indígena. Numa civilização da comunicação, as minorias precisam de garantir o seu espaço no imaginário nacional; é uma estratégia de sobrevivência.

A recepção ao projeto mudou ao longo dos anos?

VC: Não temos visitado muitos grupos novos. A escola de cinema do Vídeo nas Aldeias está praticamente parada porque não temos financiamento. A situação é tão crítica que vamos fechar a nossa sede (um casarão na rua de São Francisco, em Olinda, Pernambuco). As oficinas têm um custo elevado porque cedemos equipamentos aos índios para dar continuidade ao processo de formação. Mas eles continuam a ficar eufóricos quando vêem os resultados da sua produção. Acho que hoje mantêm a mesma reacção de há 30 anos atrás, quando come-cei este trabalho. Assumem imediatamente o comando, sabem o que querem. Quando outros grupos assistem aos seus vídeos, também ficam interessados em mostrar sua vida: a primeira reacção é sempre querer mostrar “quem nós somos”, e é isso o que nos interessa.

Falta informação sobre a situação indígena no Brasil?

VC: Sem dúvida. Os média hegemónicos não falam de índios, tornou-se um tema tabu. É algo que circula nas redes sociais, ou melhor, circula na minha rede so-cial, porque fica restrito a uma bolha. Tudo isto motivou-me a fazer o Martírio: a necessidade de esclarecer este drama. (...) Os índios não são um bando de malucos que resolveram invadir fazendas. Eles estão a ir para lugares muito es-pecíficos, que já conhecem, onde os antepassados moraram e estão enterrados. Tudo tem uma razão de ser. O filme propõe-se a esclarecer esse equívoco.

Entrevistas a Ana Carvalho e Vincent Carelli (Vídeo nas Aldeias) para a Revista Zum e Revista Trip

O SCI-DOC - Festival Europeu de Documentário Científico de Lisboa é o maior festival europeu de documentário científico direcionado para o grande pú-blico. A sua programação reflete a crescente presença da ciência e tecnologia na vida do espectador. Dos avanços na medicina à fascinante exploração do espa-ço, da expansão informática, à crescente criatividade em aplicações de IT, é cada vez maior o desejo da sociedade de entender mais sobre o mundo que a rodeia. O Festival envolve, para além da mostra de documentários realizados para a televisão, docudramas, programas de televisão generalistas dedicados à ciência e debates com investigadores, e pretende criar um ambiente cultural, onde um público heterogéneo de diferentes idades e conhecimentos, usufrua de alguns dos equipamentos culturais mais icónicos da cidade, com o propósito de apren-der sobre os mistérios do Universo.

Este ano, pela primeira vez, o festival vai organizar sessões e outras actividades escolares. Ao longo dos 5 dias do festival, a Apordoc irá organizar 2 oficinas Do-cs4Kids de fim-de-semana (dos 4 aos 7 e dos 8 aos 11 anos), 1 oficina Docs4Kids para alunos de 1º Ciclo e 4 sessões DocEscolas (2 para alunos dos 2º/3º Ciclos e 2 para alunos do Ensino Secundário). Estas actividades terão como ponto de partida as temáticas abordadas na pro-gramação do festival.

Para conhecer mais sobre o projecto e a programação da edição de 2016, visite a página do festival. Pode também seguir-lo no facebook (SCI-DOC) e manter-se atento às novidades sobre a edição deste ano.

Contacto: [email protected]ções para Grupos Escolares: [email protected]

SCI-DOC

A Apordoc – Associação pelo Documentário, fundada em 1998, é uma as-sociação cultural sem fins lucrativos que tem como principais objectivos apoiar, promover e estimular o interesse pelo cinema documental. Dos seus sócios fa-zem parte cineastas, produtores, professores, investigadores, programadores e espectadores. A Associação tem sido, ao longo dos seus 19 anos de existência, o motor de um processo que definiu um território forte e estável para o documentá-rio em Portugal. Vemos o documentário na sua pluralidade, não cabendo dentro de uma definição limitada e comportando uma multiplicidade de resistência e um desejo de convivência. A Apordoc trabalha ao longo do ano em actividades de formação de públicos e na educação para o cinema através das programas DocEscolas e Docs4Kids.

As instituições de ensino podem tornar-se sócias da Apordoc, podendo usufruir da sua videoteca online da associação. A videoteca online reúne cerca de 7.000 títulos, de entre os 11.000 que compõem o acervo da Apordoc. Recolhidos ao lon-go da actividade da Associação, estes filmes podem ser visionados pelos sócios numa plataforma digital.

Jóia de Inscrição - Sócios Institucionais: 25,00 €Quotas Anuais - Sócios Institucionais (Estabelecimento de Ensino): 100,00€Mais informações em: www.apordoc.org

APORDOC

PARCERIAS

_FINANCIAMENTO

_MATERIAL

_DIVULGAÇÃO