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Pelotas - RS, 06 a 08 de julho de 2016
SBSP - Sociedade Brasileira de Sistemas de Produção
PROGRAMA CISTERNA: UMA ANÁLISE DAS POTENCIALIDADES E
LIMITAÇÕES DA POLÍTICA PÚBLICA IMPLANTADA NO ESTADO DO CEARÁ
Autor(es) Rafaela Carnevale1; Janaina Cabral da Silva
2; Jennifer Cicera dos Santos Faustino
3;
Wallace da silva Almeida4
Filiação 1 Doutoranda em Economia – UFU. Uberlândia/Minas Gerais; 2 Doutoranda em
Economia – UFU. Uberlândia/Minas Gerais; 3 . Mestre em Desenvolvimento e Meio
Ambiente (PRODEMA) – Campus do Pici/UFC Fortaleza/Ceará; 4 Doutorando em Economia
– UFU. Uberlândia/Minas Gerais
E-mail 1 [email protected]; 2 [email protected]; 3
[email protected]; 4 [email protected]
Grupo de Pesquisa: PROCESSOS DE FORMAÇÃO, INOVAÇÃO, SISTEMAS DE
CONHECIMENTO E TEIAS SÓCIAS-TÉCNICAS LOCAIS
Resumo
A Tecnologia Social e seu papel enquanto política pública é o tema central deste estudo, com
a finalidade de analisar as ações do Programa Cisternas no intuito de tentar solucionar os
problemas ocasionados pela seca no semiárido cearense. Para tanto, foi utilizado o estudo de
caso das ações realizadas pelo programa mencionado no estado, a revisão bibliográfica e
documental e descritiva também colaboram no enriquecimento metodológico da pesquisa.
Desta forma, este artigo pretende analisar quais as potencialidades e limitações que o
Programa Cisterna possui, enquanto políticas públicas implantada no Estado do Ceará. Para
isto, foram analisados os dados coletados junto a Secretaria do Desenvolvimento Agrário no
período de 2010 a 2013. Constatou-se que nos anos de 2011 e 2012 foram os anos onde mais
se investiu recursos e onde mais cisternas foram construídas, o ano de 2010 foi o que menos
cumpriu seu objetivo, apenas 17% e o ano de 2013 ultrapassou a meta estabelecida de
cisternas implantadas, mais de 288%.
Palavras-chave: Tecnologias Sociais, Políticas Públicas, Cisternas, Semiárido.
Abstract
The Social Technology and its role as a public policy is the focus of this study, in order to
analyze the actions of the Cisterns Program in order to try to solve the problems caused by
drought in Ceará semiarid region. Therefore, the case study of the actions performed by said
program in the state was used, the bibliographical and documentary and descriptive review
also collaborate on methodological enrichment research. Thus, this article aims at examining
the potential and limitations of the Cistern Program has, as public policies implemented in
the state of Ceará. For this, the data collected from the Department of Agrarian Development
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were analyzed for the period 2010 to 2013. It was found that in 2011 and 2012 were the years
where more is invested resources and where more tanks were built, 2010 was the least
accomplished his goal, only 17% and the year 2013 exceeded the target set of deployed tanks,
more than 288%.
Key words: Social Technologies, Public Policy, Tanks, Semi-Arid.
1. Introdução
A aproximação do Estado com a sociedade civil tem inserido no âmbito da gestão
pública novos parâmetros nos processos de desenvolvimento, avaliação e controle das ações
governamentais. Atualmente o debate em torno da utilização das Tecnologias Sociais (TS)
como políticas públicas para o enfrentamento dos problemas sofridos pela sociedade tem se
intensificado, sendo necessário que haja um cuidadoso estudo sobre os elementos que as
norteiam.
Para Fraga (2011) as tecnologias sociais tem um grande potencial como ferramenta
para ser utilizada no desenvolvimento de uma localidade, alterando assim, seus modelos
produtivos. É importante também, o modo como os agentes envolvidos nesses processos
atuam no fortalecimento deste campo no Brasil, sendo isto foco de observação nos últimos
anos (FONSECA E SERAFIM, 2010).
Sendo assim, para uma melhor análise da forma como o Estado vem se apropriando
das TS’s na formulação de políticas, é relevante que o arcabouço teórico seja apresentado,
refletindo e identificando o modo como as TS’s tem sido implementadas e os entraves que
impossibilitam seu melhor aproveitamento. Aprofundar o debate sobre a relação entre
tecnologias sociais e políticas públicas também faz-se importante, contribuindo para que o
conhecimento seja fortalecido e que novas proposições de ações sobre a temática possam ser
incorporadas pelo Estado. A vasta bibliografia sobre as políticas públicas permitem um
esclarecimento acerca do arranjo institucional, dos processos e mecanismos na articulação e
implementação das mesmas.
Um dos cenários que mais necessitam de políticas públicas é o semiárido brasileiro,
que tem padecido com o aumento da desertificação. A região semiárida tem 980.133,079
Km², que abrange os estados Piauí, Paraíba, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Alagoas,
Sergipe, Bahia, Minas Gerais e Ceará. No estado cearense vivem cerca de 4.724.705 milhões
de pessoas (MEDEIROS, 2012).
A desertificação no semiárido nordestino vem se agravando simultaneamente às
mudanças climáticas. Uma série de fatores contribui para aumentar a vulnerabilidade da
população a esse fenômeno: irregularidade pluviométrica, deficiência da gestão dos recursos
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hídricos, a pobreza e a baixa capacidade adaptativa (OBERMAIER, 2009). A população rural
é a mais afetada. A seca torna a agricultura familiar vulnerável às modificações climáticas de
tal maneira que cria-se uma pressão antrópica favorável à desertificação (WEHBE et al,
2005).
Para mudar essa conjuntura, surgem as tecnologia sociais como instrumento inovador.
A Tecnologia Social TS busca além dessa transformação dos problemas sociais, a crítica ao
modelo convencional do desenvolvimento tecnológico, propondo uma lógica mais sustentável
e solidária de tecnologia para toda as camadas da sociedade (COSTA, 2013).
Frente à esse cenário, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
(MDS), financia desde 2003 a construção de cisternas de placas através da Secretaria
Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SESAN). Esta tecnologia pode armazenar
cerca de 16 mil litros de água da chuva, sendo uma das mais baratas à serem implantadas.
(MDS, 2014).
Em 2013, através do Decreto Nº. 8.038, regulamentou o Programa Nacional de Apoio
à Captação de Água de Chuva e Outras Tecnologias Sociais de Acesso à Água - Programa
Cisternas, dedicado ao acesso autônomo e sustentável de água para consumo humano e para a
produção de alimentos às famílias de baixa renda que residem na zona rural atingidas pela
seca ou falta regular de água (MDS, 2014).
A implantação das tecnologias sociais tem o intuito de mobilizar e capacitar as
famílias por meio das parcerias firmadas com a sociedade civil e com governos estaduais e
municipais. No Ceará, o convênio é realizado com a Secretaria de Desenvolvimento Agrário
(SDA) a partir de 2005. Desde 2011, 142,9 mil cisternas foram implantadas no Semiárido
cearense, auxiliando à convivência com a seca (DIÁRIO DO NORDESTE, 2014).
Diante disto, o presente artigo tem como objetivo, por meio de estudo de caso, analisar
quais as potencialidades e limitações que o Programa Cisterna possui, enquanto políticas
públicas implantada no Estado do Ceará. Para responder ao questionamento proposto neste
projeto, será realizado um estudo de caso, cuja unidade de análise é o Programa Cisternas e os
envolvidos em suas formulações no Governo do Estado do Ceará. Yin (2002), considera o
estudo de caso como uma estratégia de pesquisa que contempla a investigação de um
fenômeno dentro de seu contexto real, principalmente quando os limites entre o contexto e o
fenômeno não são claros.
Trata-se de uma pesquisa documental, abordando a legislação específica referente à
política estudada. Para Cellard (2008) “[...] o documento escrito constitui uma fonte
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extremamente preciosa para todo pesquisador nas ciências sociais [...] muito frequentemente,
ele pertence como o único testemunho de atividades particulares ocorridas num passado
recente”.
Segundo Gil (2002), as pesquisas descritivas têm como principal objetivo a descrição
das características de um fenômeno. O Programa Cisternas e seus possíveis impactos nas
famílias cearenses compõem o fenômeno a ser descrito nesta pesquisa, portanto, este estudo é
de natureza descritiva e explicativa quanto aos seus objetivos.
Os dados foram coletados juntos aos documentos subsidiados pela SDA. Malhotra
(2001) afirma que a abordagem não-probalística confia no julgamento pessoal do pesquisador,
o qual pode deliberadamente definir os elementos a serem incluídos na amostra. Segundo ele,
as amostras não-probalísticas podem oferecer boas estimativas das características da
população, contudo não permitem a projeção estatística dessas estimativas para a mesma.
A pesquisa será apresentada em três seções, além da introdução e considerações finais.
A primeira ilustra um panorama histórico da maneira como se fazia políticas públicas até sua
concepção atual, com base no referencial teórico utilizado. Em seguida, são expostos os
principais conceitos sobre Tecnologia Social, enfatizando as cisternas e como esta tem sido
empregada como política pública. A terceira seção aborda o caso do Programa Cisternas e a
sua implantação no Estado do Ceará, bem como identificar os limites e capacidades que esta
política possui no estado.
2. Políticas Públicas
A compreensão sobre políticas públicas e sua execução inicia-se a partir do
entendimento da influência dos momentos políticos e econômicos dos Estados e da sociedade
civil ao longo da história. No caso do Brasil, a partir da década de 1980 a população começou
a participar de forma mais intensiva da democracia do país, por meio de iniciativas inovadoras
que os governos locais começaram a pôr em prática, não apenas ligadas ao sistema político
(FARAH, 2000).
A participação da sociedade levou à uma ruptura do modelo que predominava até o
momento, o estado de bem-estar social, que tinha como premissa a ação exclusiva do Estado
na promoção de bens e serviços públicos a partir de soluções simples, diante da fragilidade da
população. Marta Farah (2000, p.9) enfatiza o modelo como:
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[...] hegemônico nos países capitalistas ocidentais no pós-guerra, teria sido
responsável, inclusive, pelo refluxo das iniciativas da sociedade civil e do
mercado, sendo vista a proteção social, no limite, como responsabilidade
exclusiva do Estado.
O estado de bem-estar social começou um processo de crise a partir do processo de
democratização, fortalecendo o pensamento neoliberal. O Estado viu-se incapaz de atender as
demandas sociais, principalmente depois da crise fiscal entre as décadas de 1980 e 1990,
levando à uma preocupação com a eficiência, a eficácia e a efetividade da ação estatal, bem
como com a qualidade dos serviços públicos (FARAH, 2000).
Spink (2002) afirma que neste período, a Constituição de 1988 apontava para uma
mudança legal das muitas demandas sociais, devido aos novos desafios apresentados. A nova
relação entre o Estado e a sociedade civil, a partir da década 1990, buscou reformular a ação
estatal para o melhor fornecimento de serviços públicos. O Estado deixou de ser o único
provedor e começou a formar parcerias com outros setores, tornando-se coordenador e
fiscalizador dos serviços prestados.
É importante ressaltar que esta nova articulação do setor público com o setor privado e
a sociedade civil não faz referência ao pensamento neoliberal, uma vez que todas essas
parcerias não substituem a função do Estado, mas mostram que ele faz-se necessário. A
construção mais ampla da esfera pública torna-a descentralizadora, participativa, ágil e efetiva
ao introduzir novas formas de gestão (SPINK, 2002).
Essas novas parcerias levam a uma possibilidade de desenvolver ações com melhor
qualidade. Spink (2002) ressalta que essa relação busca que as atuações desenvolvidas se
tornem sustentáveis e afirma que “[…] neste grande universo de ações públicas, muitas das
quais lideradas pelos governos municipais, os gestores municipais, mesmo exercendo
liderança nos seus programas e projetos, raramente estão sozinhos”.
Com a possibilidade dos governos locais poderem criar e implantar políticas públicas
focadas em seus territórios, ampliaram-se as formas e os agentes envolvidos nas mesmas,
fortalecendo-as. É nesse contexto que as tecnologias sociais, produzidas por intermédio da
comunidade, tornam-se técnicas e métodos que proporcionam soluções para os problemas da
localidade (FEENBERG, 2010).
Diante disto, faz-se interessante a aproximação das temáticas “políticas públicas” e
“tecnologia social”, devido ao recente debate em torno da segunda e por cooperar na nova
formulação de práticas inovadoras, que possibilitem uma gestão pública eficiente. A seguir,
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será abordada a TS e sua implantação no semiárido, destacando especialmente as cisternas de
placas.
3. Tecnologias Sociais
As tecnologias sociais têm influenciado, ao longo dos séculos, as relações de trabalho,
a economia e o meio ambiente, atingindo de forma significativa a sociedade em geral. Além
de tentar solucionar os problemas que a população sofre, a TS pode servir, a partir dos seus
experimentos inovadores, como incentivo para que representantes da sociedade ganhem
espaço público para assim, defender os interesses coletivos, na tentativa de gerar inclusão
social (BAVA, 2004).
Herrera (1970), foi um dos precursores em dar atenção às tecnologias sociais como
instrumento de solução das necessidades dos países subdesenvolvidos. Para que essa
transformação social ocorra é necessário que essas nações busquem metodologias tecno-
cientistas para desenvolver “conjunto de pressupostos ou paradigmas gerados endogenamente
que possam servir como marco básico para desenvolver tecnologias destinadas às suas
próprias necessidades e aspirações”.
O conhecimento local e a participação da sociedade no processo de transformação pela
tecnologia social são os subsídios para que esta aconteça. O conhecimento local aliado ao
científico auxilia o pesquisador a buscar novas meios de solução dos problemas e o
envolvimentos da população ajuda no desenvolvimento tecnológico (HERRERA, 1970).
Atualmente, a metodologia que objetiva facilitar o acompanhamento, o monitoramento
e o desenvolvimento das tecnologias sociais, foi elaborado pelo Sistema de Acompanhamento
das Tecnologias Sociais (SATECS), para formar indicadores que respondam às questões
durante o processo das TS. Para a SATECS o objetivo das TS dá-se a partir da solução dos
problemas referentes à segurança alimentar, ao desenvolvimento local, à geração de trabalho e
renda, à saúde, moradia e agricultura familiar, além da ecologia, Tecnologia Assistiva e
promoção dos direitos humanos (ITS BRASIL, 2012).
A metodologia visa agrupar os dados sobre iniciativas, programas ou experiências que
tenham propriedades de Tecnologia Social para descobrir as principais características da
mesma. As dimensões apresentadas na metodologia abordam desde a gênese, sua concepção,
implantação, funcionamento, até o seu desenvolvimento da TS. As dimensões metodológicas
são dispostas na seguinte ordem: a dimensão referente à aplicação de conhecimento, ciência,
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tecnologia e inovação; a dimensão da participação, cidadania e democracia; a dimensão da
educação e a dimensão da relevância social (ITS BRASIL, 2012).
A primeira dimensão diz respeito a aplicabilidade dos conhecimentos, ciência,
tecnologia e inovação para resolver os problemas, enfatizando aspectos que, muitas vezes,
estão ausentes nas tecnologias convencionais. As TS tentam minimizar ou solucionar questões
como: alimentação, saúde, saneamento, habitação, atividades produtivas, de defesa do meio
ambiente, assistência às pessoas com necessidades especiais, o resgate das tradições de povos
indígenas, o manejo da floresta, etc. (ITS BRASIL, 2012).
A dimensão seguinte trata da participação da população no desenvolvimento da
tecnologia social, a partir de um ambiente democrático e cidadão. A TS se fundamenta na
cidadania e nos direitos humanos, uma vez que as pessoas que geram as tecnologias visam
beneficiar a população, mesmo não tendo muitos recursos (ITS BRASIL, 2012).
A dimensão educativa aborda a intencionalidade educativa que se encontra na grande
parte das TS’s, pois incentiva o aprendizado da população no que se refere à questão que a
tecnologia tenta solucionar, para que os envolvidos se apoderem da TS e não dependam dela.
Através da TS os cursos, palestras e seminários se unem ao conhecimento popular,
desenvolvendo parcerias e estreitando as relações entre o conhecimento acadêmico e o saber
popular (ITS BRASIL, 2012).
De acordo com o ITS Brasil (2012), a última dimensão, a relevância social, trata dos
resultados esperados pela TS, ou seja, na sua eficácia em resolver as problemáticas sociais e
sua adequação entre os meios e os resultados obtidos. Quanto mais eficiente a tecnologia
social, mais benefícios ela produz, seja na inclusão social, qualidade de vida, justiça social,
autonomia, seja na autoestima da comunidade beneficiada.
É com o objetivo de transformar a condição de vida que a tecnologia social propõe
uma lógica sustentável e solidária, a partir do envolvimento dos cidadãos, associação de
moradores, ONG’s, movimentos sociais, etc, junto aos especialistas que técnicas e
metodologias podem ser pensadas para solucionar problemas como: a seca no Semiárido, os
desastres ocasionados pelas chuvas, as dificuldades vividas no campo. Assim, a tecnologia
social é uma obra gerada pelo contexto peculiar vivido por determinada sociedade e provoca
impactos sobre a população (COSTA, 2013).
Para o Instituto de Tecnologias Sociais (2012) a TS é um conjunto de técnicas e
metodologias transformadoras, que são desenvolvidas e/ou aplicadas a partir da interação com
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a população e sendo apropriadas por ela, concebendo soluções para inclusão social e melhoria
das condições de vida.
O conceito de TS está diretamente ligada à noção de replicabilidade, que de acordo
com Bava (2004) a partir de experimentos inovadores, novas iniciativas surjam para auxiliar
na organização social, oferecendo novas ferramentas para gerar uma nova sociedade. É
importante que essas iniciativas colaborem para que se manifestem outros atores no cenário
público, criando novas relações sociais.
Desta forma, a tecnologia social deve ser visualizada por dois planos: o conceitual,
onde a TS se torna participante na construção do conhecimento cientifico e tecnológico; e o
plano material, por buscar resolver problemas sociais dos mais variados (RTS, 2006). Assim,
as tecnologias sociais podem ser utilizadas para o enfrentamento da desertificação do
Semiárido, com elementos que tornem mais claros os conceitos apresentados.
A sustentabilidade social, econômica e ambiental é uma das inquietações das
tecnologias sociais, buscando cuidar do meio ambiente. E, diante das peculiaridades da região
semiárida, a maior parte das TS’s criadas buscam tentar diminuir os problemas ocasionados
pela escassez de água. Uma das maneiras de captação de água é através das precipitações de
chuvas, “a coleta de água de chuva foi inventada isoladamente em diversas partes do mundo e
em diferentes continentes há milhares de anos” (GNADLINGER, 2006).
Nascimento (2006) afirma que para armazenar a água para o uso nos tempos de seca
são utilizadas táticas de captação em várias escalas, sendo os reservatórios o principal
instrumento. A cisterna é uma das ferramentas mais populares por estar recebendo
investimento do setor público, espalhando-se por vários lugares e podendo ser construída de
várias maneiras (COSTA, 2013).
De acordo com o autor acima (2013)
A cisterna é uma tecnologia social que consiste basicamente em uma
estrutura para captação e armazenamento de água da chuva. A água
acumulada pode ser destinada ao consumo, à produção de alimentos, à
criação de pequenos animais, dentre outros usos.
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Nessa perspectiva, a Articulação do Semiárido (ASA), possui o Programa Um Milhão
de Cisternas (P1MC)1 em parceria com os Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome e o do Desenvolvimento Agrário, a partir da construção de diversas cisternas.
As cisternas-calçadão, onde a água escorre do calçadão de cimento de 220m² até a
cisterna por um cano, muito utilizada pelos agricultores (COSTA, 2013). Sua função é
armazenar a água para usar em sistemas de produção como: quintais produtivos, a cultura de
hortaliças e frutas, etc. próximas à casa dos agricultores (ASA, 2014).
As cisternas de placas são um depósito, que de acordo com Ribeiro (2005), pode ser
construído de maneiras e com materiais diferentes, que seja completamente vedado,
armazenando a água que cai da chuva através dos telhados, abastecendo as famílias durante a
seca. São reservatórios de baixo custo que tem mudado a paisagem do semiárido brasileiro,
tanto pelo branco das cisternas quanto pela água que armazena (SARAIVA, 2006).
Essa água pode ser utilizada para consumo se a tecnologia permanecer fechada e os
canos e calhas limpos. A limpeza e a construção das cisternas são, na maioria,
responsabilidade das comunidades envolvidas. Para que a água escorra limpa o camponês
desvia o tubo condutor para fora da cisterna e quando a água começa a fluir limpa, é que se
põe o condutor na posição normal (ASA, 2014).
A captação correta da água pode abastecer famílias, de até cinco pessoas por oito
meses, que muitas vezes não tem muito acesso à esse recurso e quando possuem, a água tem
péssima qualidade. Esse tipo de tecnologia social tem fortalecido a identidade cultural e da
inclusão das famílias envolvidas (COSTA, 2013).
4. Resultados e Discussão
4.1 Semiárido Cearense e a ação do Programa Cisternas
O estado do Ceará possui 148.920,538km², seus limites encontram-se ao norte com o
Oceano Atlântico, ao sul com o estado de Pernambuco, ao oeste com o Piauí, e ao leste com o
Rio Grande do Norte e a Paraíba. Localizado na região denominada de “polígono das Secas”,
no qual ocupa 86,74 % do seu território, onde vivem de 4.724.705 habitantes. De acordo com
1 “O objetivo do P1MC é beneficiar cerca de cinco milhões de pessoas em toda região semiárida com
água potável para beber e cozinhar, através das cisternas de placas. Juntas, elas formam uma
infraestrutura descentralizada de abastecimento com capacidade para 16 bilhões de litros de água”
(ASA BRASIL, 2014).
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a divisão político-administrativa do estado, o Ceará possui 184 municípios, dos quais 150
estão totalmente incluídos na região semiárida (MEDEIROS, 2012).
Assim como nos outros estados nordestinos, o semiárido cearense possui
características semelhantes: intensa insolação da temperatura, taxas elevadas de evaporação e
evapotranspiração e estação pluviométrica de 3 a 5 meses. Situado na região Morfoestrutural
da Depressão Sertaneja, o estado conta com a predominância de rochas do embasamento
cristalino, possuindo pouca capacidade na acumulação de água (OLIVEIRA, 2007).
Diante desses aspectos, torna-se importante estudar e analisar que técnicas estão sendo
abordadas e desenvolvidas com êxito na solução dessa problemática, promovendo a
valorização do meio ambiente em questão. Nesse intuito, foi criado o Programa Nacional de
Apoio à Captação de Água de Chuva e Outras Tecnologias Sociais de Acesso à Água -
Programa Cisternas, em 2003, através do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome – MDS e da Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SESAN,
visando favorecer as famílias rurais de baixa renda que tem dificuldade de acesso à água
(MDS, 2014).
A partir da construção de cisternas de placas de cimento, consegue-se armazenar a
água da chuva para consumo humano, facilitando o acesso à água, uma vez que as barragens e
açudes, geralmente, estão à grandes distancias das residências. As cisternas auxiliam na
melhora da qualidade da água e na sua preservação, oferecendo às famílias a garantia da
Segurança Alimentar e Nutricional (BRASIL, 2011).
Por se tratar de uma tecnologia simples e de baixo custo, captando a água da chuva
pelo telhado das casas por meio de calhas, armazenando em um reservatório de 16 mil litros,
garantindo que famílias de até cinco pessoas consigam ser abastecidas em um período de
estiagem de aproximadamente oito meses (MDS, 2014).
A metodologia para a implantação da tecnologia segue três etapas (BRASIL, 2011):
I - Mobilização, seleção e cadastramento das famílias – Refere-se ao procedimento de
escolha das comunidades e a mobilização das famílias que serão apreciadas com a construção
das cisternas. O processo é responsabilidade da entidade executora e deve ter a participação
de instituições representativas da localidade.
II - Capacitação de beneficiários sobre o uso adequado da cisterna e sobre a gestão da
água armazenada e de pessoas responsáveis pela construção – Capacitar os beneficiários é
uma das partes mais importantes para que o projeto se consolide. O envolvimento das
famílias, a conscientização e a orientação das mesmas garante a utilização correta das
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cisternas. O conteúdo da capacitação e as técnicas de ensino devem obrigatoriamente estar
inseridas na realidade econômica e cultural das famílias.
III - Construção das cisternas - A construção inicia-se após a confirmação da
participação da família na capacitação em gestão da água para o consumo humano.
O programa implanta cisternas a partir da integração da União, dos Estados,
Municípios e da Sociedade Civil subsidiando na convivência com o semiárido. No Estado do
Ceará a implantação das cisternas é realizada pela Secretaria do Desenvolvimento Agrário
(SDA)2. Neste artigo foram estudadas as ações do Programa Cisternas em parceria com a
SDA no período de 2010 à 2013, por ter os dados disponibilizados na Prestação de Contas e
Relatório de Desempenho do Fundo Estadual de Combate à Pobreza do governo cearense,
como podem ser observados na Tabela abaixo.
Tabela – Implantação de Cisternas (2010 – 2013)
Ano Indicador Unidade Programado Executado %
Total
Empenhado
2010
cisternas
construídas n.º 26.335 4.370 17% 15.956.591,11
2011
cisternas
construídas n.º 42.307 16.885 40% 23.905.182,79
2012
cisternas
construídas n.º - 17.532 - 20.175.451,10
2013
cisternas
construídas n.º 3.380 9.739 288,14% 6.249.638,50
Fonte: elaborado pelos autores.
De acordo com a tabela acima, percebe-se que os anos que mais foram investidos
recursos e onde mais cisternas foram construídas foram 2011 e 2012, mesmo o primeiro ano
citado não cumprindo a quantidade de tecnologias programadas. De acordo com os dados
disponibilizados pelo Governo do Ceará, apenas o ano de 2013 ultrapassou a meta
estabelecida de cisternas implantadas, mais de 288% e o ano de 2010 o que menos cumpriu
seu objetivo, apenas 17%.
2 “A Secretaria do Desenvolvimento Agrário, Órgão da Administração Direta do Governo do Estado
do Ceará, tem por finalidade planejar, coordenar e executar, diretamente ou através das suas
Vinculadas, as ações do Governo para o desenvolvimento da agropecuária, mediante apoio à
agricultura familiar, ao incremento do agronegócio, ao fortalecimento da agricultura de sequeiro e
pecuária, à expansão da agricultura irrigada, com destaque para fruticultura, floricultura, olericultura,
pesca e aquicultura” (SDA, 2014).
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Um dos motivos apontados pelo Governo para explicar a dificuldade da implantação
de cisternas no ano de 2010 foi a escassez de chuva, que atingiu a safra e inviabilizou ações.
A inadimplência das prefeituras e associações e o atraso para receber recursos de convênios
firmados com o Governo Federal também contribuíram para impedir a construção de mais
cisternas.
No ano seguinte, o Projeto investiu na aplicação de R$ 23.905.182,79, sendo a maior
quantia dispendida na melhoria de vida das famílias, ao disponibilizar água limpa, sem
poluição, sem veneno, sem sal, colaborando com a saúde das comunidades, uma vez que
diminui a diarreia nas crianças. Com a implantação dessa tecnologia próxima à residência
diminui o trabalho de coleta d’agua, sobrando mais tempo para a realização de outras
atividades como: estudar, trabalhar, etc (CEARÁ, 2011).
Em 2011, o principal entrave enfrentado durante a execução do projeto ocorreu devido
ao atraso na construção das cisternas por parte das entidades executoras. Com o período de
chuvas no estado ocorrer nos primeiros meses do ano, ocasionou a diminuição do ritmo de
construção das cisternas, pois as estradas que dão acesso às comunidades ficam em péssima
qualidade, o que atrapalha também na entrega do material necessário para a construção
(CEARÁ, 2011).
De acordo com o Relatório do ano estudado (CEARÁ, 2011), algumas alternativas
foram empregadas para superar estes problemas. Uma delas foi a realização de reuniões
mensais com as entidades para acompanhar o andamento das metas e para enquadrar as
famílias da zona rural de municípios do semiárido estadual que não dispunham de água ou
meios adequados de armazená-la. Estas famílias precisam passar pelos critérios de
elegibilidade do Programa Bolsa Família, do Governo Federal, mesmo não sendo
beneficiadas.
No ano de 2012 o Ceará registrou uma das piores secas desde 1950, as precipitações
observadas no período chuvoso ficou 50,7% abaixo da média histórica. A SDA desenvolveu
sete projetos destinados a disponibilizar água para consumo humano, tanto através da
construção de cisternas quanto da implantação de pequenos sistemas de captação e
distribuição de água. As ações executadas resultaram na implantação de 17.532 cisternas que
beneficiaram 32.032 pessoas (CEARÁ, 2012).
Dentre os problemas que surgiram nesse período, o principal foi provocado por uma
medida cautelar expedida pelo Tribunal de Contas do Estado, determinando que os recursos e
novos convênios só poderiam ser executados depois que todas as prestações de contas
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estivessem analisadas e aprovadas. Esta regulação durou aproximadamente 5 meses (CEARÁ,
2012).
No ano seguinte, o Programas Cisternas recebeu uma regulamentação no primeiro
semestre através da Medida Provisória, que definem o contrato como instrumento jurídico
para execução dos convênios de parcerias entre o MDS e Estado. Em julho do mesmo ano foi
sancionado o Decreto nº 8.038, regulamentando o credenciamento das unidades executoras do
programa. A quantidade de cisternas construídas em 2013, 9.739 unidades, mais do dobro do
que foi programado, 3.380 unidades, mostra como foi importante a regulamentação deste
projeto. O relatório também informou que foi gasto cerca de R$ 400.000,00 para o pagamento
de acompanhamento do Contrato de Gestão (CEARÁ, 2013).
Diante disto, vê-se que assim como a tecnologia precisa ser adaptada ao contexto em
que vai ser inserida, a política pública criada para resolver os problemas da sociedade também
precisa se ajustar, uma vez que sempre existirão situações que facilitem ou não o
cumprimento da mesma.
5. CONCLUSÃO
Nesse artigo buscou-se relacionar as tecnologias sociais e as Políticas Públicas, a partir
do estudo do Programa Cisternas no Estado do Ceará e da literatura sobre os temas. Foi
desenhado um cenário histórico das políticas públicas e demonstrado como o discurso sobre
como a implantação das políticas públicas foi se transformando, saindo de uma estrutura onde
eram formuladas e legitimadas pelos superiores e passavam ao sistema de execução
administrativo e atualmente tornou-se práticas operacionais.
A concepção das TS’s dialoga inteiramente com o novo prisma das políticas públicas,
onde a população torna-se participante da implementação, colaborando nas decisões que serão
tomadas junto aos órgãos responsáveis. Procurou-se situar também, nesse artigo, a análise do
Programa Cisternas e seu processo de implantação de tecnologias no período de 2010 à 2013.
No âmbito do desenvolvimento e controle das cisternas como políticas públicas, esse
artigo buscou conversar com os aspectos que demonstram o processo de transformação da
ação estatal para a importância do envolvimento dos atores na formulação, na implementação
e no controle do Programa Cisternas no Ceará. Uma política que tem estreitado a relação entre
TS, principalmente as cisternas, e políticas públicas, através da parcerias entre Estado e
sociedade civil para o suprimento dos serviços públicos.
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Mesmo com essa aproximação com as políticas públicas, é preciso de cautela para que
as tecnologias sociais não percam sua essência natural. O Programa Cisternas busca ter uma
visão integradora entre os processos e os agentes envolvidas diretamente em todas as etapas
de implantação das tecnologias.
Desta maneira, a partir da proposição aqui defendida, percebeu-se que a
implementação das cisternas no estado do Ceará tem contribuído para que as famílias da zona
rural tenham acesso à uma estrutura simples e eficiente que capta e conserva água da chuva,
promovendo a formação e a capacitação da população para a convivência com o semiárido.
Esse programa tem ajudado na integração entre União, Estados, Municípios e Sociedade
Civil, o MDS, por intermédio da SESAN, vem apoiando a construção de cisternas.
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