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16 HISTÓRIA Ciências Humanas e Suas Tecnologias Professor Zilfran Varela O prestigiado historiador britânico Eric Hobsbawm comparou as revoltas no mundo árabe em 2011 às revoluções que explodiram na Europa no fatídico ano de 1848. Em entrevista à BBC, Hobsbawm ressaltou que desta vez os movimentos de contestação são impulsionados pela classe média, e não pelo proletariado. “Foi uma grande alegria redescobrir que é possível que as pessoas saiam às ruas para se manifestar e derrubar governos”, disse o historiador, que passou toda sua vida ligado às revoluções. Hobsbawm nasceu poucos meses antes da Revolução Russa, de 1917, e foi comunista a maior parte de sua vida, assim como um influente pensador marxista. Um de seus livros mais conhecidos, a Era das Revoluções, que retrata justamente as revoltas de 1848, é um clássico da historiografia. Além de escrever sobre as revoluções, Hobsbawm também apoiou algumas revoltas. Com mais de 90 anos, sua longa paixão pela política aparece no título de seu mais novo livro: How to change the World (Como mudar o mundo) e em seu enorme interesse pela Primavera Árabe. “A verdade é que eu tenho um sentimento de excitação e alívio”, disse, ao receber a reportagem em sua casa em Hampstead Heath, bairro no norte de Londres. Democracias árabes? Para Hobsbawm, 2011 lembra outro ano de revoluções. “Me lembra 1848, outra revolução impulsionada de forma autônoma, que começou em um país e depois se estendeu por todo um continente em pouco tempo”, diz. “A esquerda tradicional estava orientada para um tipo de sociedade que já não existe mais ou está deixando de existir. Acreditava-se sobretudo no movimento operário como o grande responsável pelo futuro. Bem, nos desindustrializamos e isso já não é possível”, afirmou Eric Hobsbawm. Naquele ano, um levante popular em Paris acabou se alastrando pela área da atual Alemanha e Itália e pelo Império Habsburgo (hoje Áustria). Para quem ajudou a encher a praça Tahir, no Cairo, derrubando o regime de Hosni Mubarak, em fevereiro, e agora teme pelo destino da revolução egípcia, Hobsbawm tem REVOLUÇÕES DE 2011 ‘‘ME LEMBRAM 1848’’, DIZ HOBSBAWM Para o historiador, é a classe média e não os operários quem impulsiona as atuais revoltas.

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nº16HISTÓRIA

Ciências Humanas e Suas Tecnologias

Professor Zilfran Varela

O prestigiado historiador britânico Eric Hobsbawm comparou as revoltas no mundo árabe em 2011 às revoluções que explodiram na Europa no fatídico ano de 1848. Em entrevista à BBC, Hobsbawm ressaltou que desta vez os movimentos de contestação são impulsionados pela classe média, e não pelo proletariado. “Foi uma grande alegria redescobrir que é possível que as pessoas saiam às ruas para se manifestar e derrubar governos”, disse o historiador, que passou toda sua vida ligado às revoluções. Hobsbawm nasceu poucos meses antes da Revolução Russa, de 1917, e foi comunista a maior parte de sua vida, assim como um infl uente pensador marxista. Um de seus livros mais conhecidos, a Era das Revoluções, que retrata justamente as revoltas de 1848, é um clássico da historiografi a. Além de escrever sobre as revoluções, Hobsbawm também apoiou algumas revoltas. Com mais de 90 anos, sua longa paixão pela política aparece no título de seu mais novo livro: How to change the World (Como mudar o mundo) e em seu enorme

interesse pela Primavera Árabe. “A verdade é que eu tenho um sentimento de excitação e alívio”, disse, ao receber a reportagem em sua casa em Hampstead Heath, bairro no norte de Londres.

Democracias árabes?

Para Hobsbawm, 2011 lembra outro ano de revoluções. “Me lembra 1848, outra revolução impulsionada de forma autônoma, que começou em um país e depois se estendeu por todo um continente em pouco tempo”, diz. “A esquerda tradicional estava orientada para um tipo de sociedade que já não existe mais ou está deixando de existir. Acreditava-se sobretudo no movimento operário como o grande responsável pelo futuro. Bem, nos desindustrializamos e isso já não é possível”, afi rmou Eric Hobsbawm.

Naquele ano, um levante popular em Paris acabou se alastrando pela área da atual Alemanha e Itália e pelo Império Habsburgo (hoje Áustria). Para quem ajudou a encher a praça Tahir, no Cairo, derrubando o regime de Hosni Mubarak, em fevereiro, e agora teme pelo destino da revolução egípcia, Hobsbawm tem

REVOLUÇÕES DE 2011 ‘‘ME LEMBRAM 1848’’, DIZ HOBSBAWMPara o historiador, é a classe média e não os

operários quem impulsiona as atuais revoltas.

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uma palavra de alento: “Dois anos após 1848, tudo parecia como se houvesse fracassado. Mas no longo prazo não houve fracasso. Conseguiu-se uma boa quantidade de avanços liberais, de modo que foi um fracasso imediato, mas um êxito parcial no médio prazo, ainda que não tenha sido na forma de revolução”, diz. Talvez com exceção da Tunísia, Hobsbawm não vê grandes possibilidades da democracia liberal ou governos representativos ao estilo ocidental triunfarem no mundo árabe. O historiador ressalta ainda as diferenças entre os vários países varridos pela atual onda revolucionária. “Estamos no meio de uma revolução, mas não de uma única revolução”, diz. “O que une (os árabes) é um descontentamento comum e forças de mobilização comuns: uma classe média modernizadora, sobretudo jovem, estudantes e, principalmente, uma tecnologia que permite que hoje seja muito mais fácil mobilizar os protestos”, afi rma.

Indignados e Occupy

A importância das redes sociais também fi cou evidente em outro movimento que marcou 2011: os protestos dos indignados e as ocupações que ocorreram na Europa e na América do Norte. Segundo Hobsbawm, o movimento remonta à campanha eleitoral de Barack Obama, em 2008. Na ocasião, o então candidato mobilizou com sucesso uma juventude até então apática à política por meio da Internet. “As ocupações, em sua maioria, não foram protestos de massa, não foram os 99% (da população), mas de estudantes e membros da contracultura. Em momentos, isso encontrou eco na opinião pública. É o caso dos protestos contra Wall Street e as ocupações anticapitalistas”, afi rma. De todo modo, a velha esquerda, da qual Hobsbawm tomou parte, manteve-se às margens das manifestações.

Hobsbawm lembra que houve revezes após as revoluções de 1848, mas o saldo foi positivo:“As mobilizações de massa mais efetivas hoje são aquelas que começam em meio a uma classe média moderna e em particular em um grupo grande de estudantes. São mais efetivos em países onde, demografi camente, os jovens são mais numerosos”, diz.

Compreender o passado

Eric Hobsbawm não espera que as revoluções árabes tenham maiores ecos no mundo, ao menos não como uma antessala de uma revolução mais ampla. Será mais provável, assegura, uma dinâmica que compreenda reformas graduais do estilo das que “ocorreram na Coreia do Sul nos anos 1980, quando uma classe média jovem passou a disputar o poder com os militares”. Sobre o drama político que ainda se desenrola nos países árabes, o historiador diz que vale a pena recordar o Irã de 1979, cenário da primeira revolução que teve o Islã como elemento político. Esse aspecto da revolução iraniana teve refl exos na Primavera Árabe. “Quem fez concessões ao Islã sem ser religioso acabou marginalizado. Dentre eles os reformistas, liberais e comunistas”, diz, destacando outros grupos que se somaram aos religiosos para derrubar a monarquia iraniana alinhada ao Ocidente. “A ideologia das massas não é a ideologia dos que começaram as manifestações”, pontua. Embora diga que a Primavera Árabe lhe tenha causado alegria, Hobsbawm diz que o elemento religioso no movimento é “desnecessário e não necessariamente bem-vindo”.

Andrew Whitehead, da BBC News.http://www.bbc.co.uk/portuguese/

noticias/2011/12/111231_hobsbawm_2011_1848_revolucoes_mm.shtml, acesso em 11 de abril de 2012.

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1. Após uma leitura atenta do texto, assinale a opção correta.A) As redes sociais se constituíram em

importante instrumento de divulgação das ideias revolucionárias, contrárias ao islão e suas imposições.

B) O controle exercido pelos governos ditatoriais aos meios de comunicação tem se revelado inefi ciente em todo o mundo em relação à Internet.

C) Os movimentos sociais no mundo árabe são marcados pela luta por democracia e maiores liberdades individuais em países tradicionalmente autoritários.

D) A naturalidade com que a população muçulmana aderiu às revoltas demonstra o antagonismo muçulmano a reformas liberais.

E) Os líderes esquerdistas do movimento egípcio conseguiram mobilizar as massas na defesa por igualdade de direitos entre os sexos.

2. Primavera dos Povos foi o nome dado ao conjunto dos movimentos revolucionários de 1848, em especial devido ao seu caráter nacionalista. A Europa da época era composta por diversas regiões multiétnicas, em especial no leste do continente, onde havia grandes impérios como o Austríaco e o Russo, em que as minorias não eram respeitadas ou ouvidas. Na região da Alemanha e da Itália também houve revoltas, pois havia unidade cultural, mas não política. Os levantes de 1848 afi rmavam as diferenças ou semelhanças, as identidades dos povos.

A Primavera dos Povos foi a primeira revolução potencialmente global, tornando-se um paradigma de “revolução mundial” que alimentou rebeldes de várias gerações.

http://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20090923070933AACgZlS. Acesso em 11 de abril de

2012.

Exercícios Assinale a alternativa correta, em relação à

chamada “Primavera dos Povos”.A) A “Primavera dos Povos” não infl uenciou a

formação dos movimentos sociais do século XIX.B) Foi uma revolução brasileira, mas que atingiu

também outros países do Cone Sul.C) Houve infl uência da “Primavera dos Povos”

no Brasil por meio do movimento dos “Seringueiros”.

D) Atribuição colocada ao movimento revolucionário francês em 1848, que derrubou a monarquia de Luiz Filipe e trouxe à discussão a exploração burguesa e a dominação política.

E) A infl uência da “Primavera dos Povos” se restringiu às preocupações francesas do período.

3. (FGV/2009) “A nova onda se propagou rapidamente por toda a Europa. Uma semana depois da queda de Luiz Filipe I, o movimento revolucionário tomou conta de uma parte da Alemanha e, em menos de um mês, já estava na Hungria, passando pela Itália e pela Áustria. Em poucas semanas, os governos dessa vasta região foram derrubados, e supostamente se inaugurava uma nova etapa da História europeia, a Primavera dos Povos”.

Luiz Koshiba. História – origens, estruturas e processos.

O texto faz referência: A) à Belle Epoque.B) às Revoluções de 1848.C) à Restauração de 1815.D) à Guerra Franco-Prussiana.E) às Revoluções Liberais de 1820.

4. “Qualquer historiador reconhece-a imediatamente: as barbas, as gravatas esvoaçantes, os chapéus dos militantes, as bandeiras tricolores, as barricadas, o sentido inicial de libertação, de imensa esperança e confusão otimista. Era a ‘primavera dos povos’ – e, como a primavera, não durou”.

Eric Hobsbawm. Era do Capital. Paz e Terra, RJ, 1982, p. 33.

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As revoluções de 1848 tiveram seu início na França, em fevereiro daquele ano, com a derrubada do “Rei Burguês”, Luiz Filipe, e se estenderam por diversos Estados europeus em pouco tempo.

Assinale a alternativa correta.A) As revoluções de 1848 foram marcadas pela

dualidade de ideias liberais e nacionalistas associadas aos ideais socialistas utópicos que cresciam no meio operário.

B) As revoluções do período foram marcadas pelo antagonismo entre socialismo e liberalismo, que representavam a oposição entre a burguesia e o proletariado urbano.

C) Apesar de ocorrerem em um mesmo espaço histórico, os diversos movimentos de 1848 não apresentavam ligações históricas entre si, representando particularidades locais.

D) Os movimentos de 1848 foram marcados pelo predomínio da ideologia socialista que começava a ganhar espaço nos meios operários e culminou com a vitória na Comuna de Paris.

E) O processo revolucionário de 1848 teve início com a proclamação da Terceira República francesa e se expandiu pela Europa e América, difundindo a ideologia restauradora e nacionalista.

5. Observe a afi rmação: “Signos infalíveis anunciam que, dentro

de poucos anos, as questões das nacionalidades, combinadas com as questões sociais, dominarão sobre todas as demais no continente europeu.”

Henri Martin, 1847.

Analisando os acontecimentos que vieram a ocorrer por volta de um século e meio depois dessa declaração, podemos afi rmar que o autor:A) parecia estar desinformado, pois naquele

momento tais questões já apareciam como parcialmente resolvidas em grande parte da Europa.

B) conseguiu identifi car, nas linhas de força da história europeia, a articulação entre intelectuais e nacionalismo exacerbado que originaria o nazismo.

Anotações

58836/12 | 19/04/2012 / Dig.: Tarqui – Rev.: TSS

C) não foi capaz de perceber que as forças do antigo regime eram sufi cientemente fl exíveis para incorporar e anular tais questões.

D) demonstrou sensibilidade ao perceber que aquelas duas questões estavam na ordem do dia e como tal iriam por muito tempo fi car.

E) comprovou que a análise subjetivista pode conter verdades absolutas que dão origem a conceitos que se estabelecem no futuro.

FB no Enem – Nº 15 – Professor Tácito Vieira

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C B C B E