produção de raios x · 2017. 3. 14. · de raios x produzido por um tubo de coolidge conectado a...

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Produção de raios X Paulo Roberto Costa - IFUSP O espectro contínuo de raios X Da mesma forma que as aplicações dos raios X foram intensamente investigadas no início do século passado, o entendimento teórico sobre a forma com que a natureza responde aos estímulos elétricos que ocorrem em um tubo de raios X foi alvo de intensos estudos desde os primórdios do século XX. Naquela época ainda não havia um entendimento profundo sobre a natureza eletrodinâmica do processo de interação de partículas carregadas com a matéria, nem tampouco instrumentos de medição sofisticados o suficiente para permitir a determinação de correlações entre os parâmetros de estímulo dos elétrons no tubo e a produção de fótons. Apesar disso, duas características logo foram percebidas: a limitação em um valor mínimo do comprimento de onda da energia produzida e a existência de um máximo de intensidade na distribuição das partículas produzidas em função deste comprimento de onda. Os estudos experimentais iniciais sobre a natureza do espectro contínuo de raios X podem ser divididos em duas categorias principais, relacionadas à espessura do alvo a ser atingido pelo feixe de elétrons: Alvos espessos e massivos o suficiente para frear todos os elétrons incidentes; Alvos compostos por folhas finas de material, onde uma fração significativamente alta dos elétrons incidentes são transmitidos, mas suficientemente espesso para que os elétrons interajam nele. O primeiro caso, considerando alvos espessos, representa a situação na qual aparece a maior parte das aplicações, em especial a utilização dos raios X em Medicina, objeto de estudo do presente trabalho. A utilização de alvos finos é dedicada à investigação de processos fundamentais relacionados ao estudo da produção de raios X (Dyson, 1990). Devido a sua importância menor para as aplicações a serem tratadas nos capítulos seguintes desta tese, o fenômeno de geração de raios X pela interação de elétrons com alvos finos será tratado de forma resumida neste texto. Um dos primeiros estudos consistentes sobre a produção de raios X pela passagem de

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  • Produção de raios X

    Paulo Roberto Costa - IFUSP

    O espectro contínuo de raios X

    Da mesma forma que as aplicações dos raios X foram intensamente

    investigadas no início do século passado, o entendimento teórico sobre a forma

    com que a natureza responde aos estímulos elétricos que ocorrem em um tubo

    de raios X foi alvo de intensos estudos desde os primórdios do século XX.

    Naquela época ainda não havia um entendimento profundo sobre a natureza

    eletrodinâmica do processo de interação de partículas carregadas com a

    matéria, nem tampouco instrumentos de medição sofisticados o suficiente para

    permitir a determinação de correlações entre os parâmetros de estímulo dos

    elétrons no tubo e a produção de fótons. Apesar disso, duas características logo

    foram percebidas: a limitação em um valor mínimo do comprimento de onda da

    energia produzida e a existência de um máximo de intensidade na distribuição

    das partículas produzidas em função deste comprimento de onda.

    Os estudos experimentais iniciais sobre a natureza do espectro contínuo de

    raios X podem ser divididos em duas categorias principais, relacionadas à

    espessura do alvo a ser atingido pelo feixe de elétrons:

    Alvos espessos e massivos o suficiente para frear todos os elétrons

    incidentes;

    Alvos compostos por folhas finas de material, onde uma fração

    significativamente alta dos elétrons incidentes são transmitidos,

    mas suficientemente espesso para que os elétrons interajam nele.

    O primeiro caso, considerando alvos espessos, representa a situação na qual

    aparece a maior parte das aplicações, em especial a utilização dos raios X em

    Medicina, objeto de estudo do presente trabalho. A utilização de alvos finos é

    dedicada à investigação de processos fundamentais relacionados ao estudo da

    produção de raios X (Dyson, 1990).

    Devido a sua importância menor para as aplicações a serem tratadas nos

    capítulos seguintes desta tese, o fenômeno de geração de raios X pela interação

    de elétrons com alvos finos será tratado de forma resumida neste texto. Um dos

    primeiros estudos consistentes sobre a produção de raios X pela passagem de

  • 2

    elétrons por alvos de pequena espessura foi realizado por Nicholas, nos anos

    vinte do século passado (Nicholas, 1929, Nicholas, 1927). O entendimento da

    teoria conhecida até então foi descrita por Brunner (Brunner, 1938). Uma

    abordagem completa e bem referenciada pode ser consultada nos itens 2.2 e

    2.3 do livro de Dyson (Dyson, 1990)

    Em um experimento clássico, usando instrumentos rudimentares, mas técnicas

    experimentais muito aprimoradas para a época em que foram realizadas, William

    Duane e Franklin L. Hunt (Duane and Hunt, 1915) determinaram o que

    chamaram de comprimento de onda efetivo. Para isso fizeram com que um feixe

    de raios X produzido por um tubo de Coolidge conectado a uma fonte de alta

    tensão de 43 kV, aproximadamente constante, fossem detectados após

    atravessarem uma espessura de 2 mm de alumínio (Behling, 2015). Os autores

    correlacionaram este comprimento de onda específico com o coeficiente de

    atenuação mássico do alumínio através da expressão

    (1)

    Os autores repetiram o experimento utilizando fontes de tensão contínua bem

    calibradas e concluíram que a aplicação de tensões contínuas não produzia raios

    X homogêneos em termos energéticos, como se poderia esperar. Além disso,

    utilizando diferentes espessuras de alumínio e diferentes tensões aplicadas,

    perceberam que tanto o coeficiente de absorção, quanto o comprimento de onda

    efetivo, decresciam a medida que os raios X atravessavam a matéria.

    Perceberam, por seus resultados, que deveria haver um comprimento de onda

    mínimo relacionada à aplicação de uma dada diferença de potencial.

    Dyson (Dyson, 1990) aponta, ainda, a proporcionalidade entre a

    intensidade da parte contínua do espectro de raios X por unidade de energia,

    𝐼ℎ𝜈, de frequência, 𝐼𝜈, ou de comprimento, 𝐼𝜆, de ondas como:

    Logo,

    𝜆𝑒 = [1

    14,9(

    𝜇

    𝜌)]

    13

    𝐼ℎ𝜈|𝑑(ℎ𝜈)| = 𝐼𝜈|𝑑𝜈| = 𝐼𝜆|𝑑𝜆| ⟹ 𝐼ℎ𝜈 = 𝐼𝜈 |𝑑𝜈

    𝑑(ℎ𝜈)| = 𝐼𝜆 |

    𝑑𝜆

    𝑑(ℎ𝜈)|

  • 3

    (2)

    Na equação acima, ℎ é a constante de Planck, 𝑐 é a velocidade da luz e e 𝜆 o

    comprimento de onda do fóton.

    Clayton Ulrey estudou o fenômeno de bremsstrahlung experimentalmente e,

    em 1918 publicou um trabalho na Physical Review (Ulrey, 1918) apresentando

    detalhes de seu experimento e seus resultados. O trabalho destaca o intrincado

    aparato experimental desenvolvido em seu laboratório na Universidade de

    Colúmbia, ao realizar adaptações em um tubo de Coolidge, introduzindo um

    anodo com o formato de um prisma hexagonal em cujas faces foram acopladas

    placas de níquel, molibdênio, cromo, paládio, tungstênio e platina. Utilizando um

    criativo mecanismo, o sistema permitia que os elétrons acelerados atingissem as

    diferentes faces do prisma e, consequentemente, gerasse raios X a partir da

    interação com elementos de números atômicos diferentes.

    Continuaram a investigação do fenômeno utilizando um espectrômetro de

    raios X emprestado de David Locke Webster (Webster, 1915, Webster, 1934)

    que estava pesquisando a emissão de raios X característicos na Universidade

    de Stanford. O instrumento continha um conjunto de fendas e um cristal de

    calcita, que possui planos refletores distando 3,03 × 10-8 cm, permitindo

    identificar a intensidade do feixe em função do comprimento de onda. O feixe

    refletido passava através de outra fenda, atingido uma câmara de ionização com

    uma fina janela de mica (Ulrey, 1918). Com este instrumento, e aplicando a Lei

    de Bragg, perceberam a correlação entre tensão aplicada e valor máximo do

    comprimento de onda dos raios X produzidos. Na mesma série de experimentos

    perceberam que este comprimento de onda máximo era invariante com a

    corrente aplicada ao tubo. Com isso, correlacionaram tensão aplicada ao tubo,

    𝑉0, e comprimento de onda mínimo dos fótons gerados, 𝜆0, como:

    𝑉0𝑒 = ℎ𝜈0 =𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡

    𝜆0 ⟹ 𝜆0 =

    𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡

    𝑒𝑉0 (3)

    A equação (3) é conhecida como lei de Duane-Hunt e sua forma

    modificada, evidenciando a energia máxima dos fótons e não seu comprimento

    𝐼ℎ𝜈 =1

    ℎ𝐼𝜈 =

    𝜆2

    𝑐ℎ𝐼𝜆

  • 4

    de onda mínimo, é a base para procedimento de calibrações de valores de

    tensão aplicados em equipamentos de raios X modernos utilizando a técnica de

    end-point (Silva et al., 2000a, Silva et al., 2000b, Terini et al., 2004, Silva, 2001).

    Alvos espessos, de maior interesse no presente trabalho, foram tratados por

    Dyson como efeitos em “alvos opacos aos elétrons” (Dyson, 1990). O autor

    descreve que as observações iniciais realizadas por Ulrey (Ulrey, 1918) e por

    Kulenkampff (Kulenkampff, 1922) usando alvos de platina, latão, cobre, prata e

    alumínio, usando diferentes faixas de tensão de aceleração, permitiram a

    identificação de uma relação entre a intensidade da radiação emitida, o número

    atômico do material do alvo e a frequência dos fótons emitidos, que foi proposta

    como:

    𝐼(𝑉, 𝑍) = 𝐴𝑍(𝜈0 − 𝜈) + 𝐵𝑍2 (4)

    Nesta equação, 𝜈0 representa a frequência máxima dos fótons emitidos e 𝐴 e

    𝐵 são constantes independentes da tensão aplicada ou no número atômico e foi

    identificada uma relação aproximada 𝐵 𝐴⁄ ≈ 0,0025 para a faixa de tensões

    avaliadas, entre 7 e 12 kV, ou seja, o valor de B é pouco relevante comparado a

    A e a relação entre intensidade e o número atômico do material foi identificada

    como aproximadamente linear. Além disso, posteriormente, com medições em

    outras faixas de tensão, foi identificada uma proporcionalidade da intensidade do

    feixe com 𝑉2 por Kulenkampff e Schmidt (Kulenkampff and Schmidt, 1943). Esta

    proporcionalidade é utilizada, até hoje, como uma regra prática para relacionar

    intensidade do feixe de raios X com a tensão aplicada. Por outro lado, a

    proporcionalidade da intensidade de forma linear com o número atômico pode

    ser explicada pela maior auto-atenuação dos fótons produzidos com o maior

    número atômico do material, principalmente devido ao efeito fotoelétrico.

    Resultados experimentais adicionais são descritos por Dyson (Dyson, 1990)

    para outros alvos e tensões aplicadas aos tubos.

    Investigações empíricas sobre o comportamento da distribuição de intensidade

    de fótons, produzidos por tubos de raios X, em função de seus comprimentos de

    onda ou de suas energias continuaram pelas décadas seguintes. Destacam-se,

    além dos já citados, os experimentos de Stephenson e Mason (Stephenson and

    Mason, 1949) e de Peterson e Tomboulian (Peterson and Tomboulian, 1962) que

    permitiram a adequação das informações experimentais para outros materiais e

  • 5

    tensões aplicadas. Com isso, conjuntos de dados relacionando as intensidades

    de emissão com o número atômico para diferentes faixas de aceleração dos

    elétrons foram obtidas. Esses dados levaram os autores a elaborarem uma

    relação aproximada entre a intensidade do feixe e o comprimento de onda dos

    fótons na forma

    I(λ) =1

    λα, com 1,8 ≤ α ≤ 2,7 (5)

    Os experimentos, porém, não permitiam levar em consideração a auto-

    atenuação dos fótons pelo alvo utilizado e referem-se a medições realizadas em

    ângulos de cerca de 90º em relação à direção de incidência dos elétrons.

    Medições complementares, com outros materiais, outros valores de tensão

    aplicada e avaliando os fótons de raios X produzidos na direção de incidência

    dos elétrons, porém usando alvos espessos, foram realizadas por Dyson (Dyson,

    1959). Neste caso, a radiação produzida foi analisada utilizando uma câmara de

    ionização acoplada a um analisador de altura de pulsos monocanal. Dyson,

    ainda, considerou a atenuação dos fótons no caminho que atravessam o alvo,

    bem como a espessura de ar entre a saída do alvo e o contador. Por fim, de

    forma cuidadosa, considerou, na correção se seus dados, a eficiência do

    contador em relação a energia dos fótons incidentes. Com seus resultados,

    semelhantes aos obtidos por Kulenkampff, pôde concluir que a anisotropia da

    radiação era pequena e não deveria estar relacionada à difusão ou ao

    espalhamento de elétrons dentro do alvo. Além disso, analisando os resultados

    obtidos com energias maiores e comparando-os com os medidos em outros

    ângulos e com alvos finos, percebeu que a anisotropia era semelhante à que ele

    havia obtido no estudo de raios X produzidos por alvos espessos. Mais ou menos

    na mesma época, estudos de Edelsak e colaboradores (Edelsack et al., 1960)

    usando um acelerador Van der Graff operando em tensões de 1, 1,5 e 2 MeV e

    um detector de iodeto de sódio de 4 polegadas de comprimento, permitiram o

    levantamento de espectros apresentados em intervalos de vinte canais. Após

    cuidadosas correções de seus resultados experimentais, comparou-os com

    resultados semiempíricos, demonstrou comportamento do espectro com relação

    à proporcionalidade de sua intensidade com o número atômico do alvo, bem

    como o desvio desta proporcionalidade com o uso de alvos de número atômico

    alto e baixas energias.

  • 6

    Ainda no campo experimental, as distribuições angulares correspondentes à

    emissão de fótons de raios X através da interação de elétrons com alvos

    espessos foram exploradas desde meados da década de 1930. Diversos autores

    trataram esta questão empiricamente, na tentativa de elucidar como os efeitos

    de espalhamento e difusão dos elétrons dentro do meio afetavam a distribuição

    angular dos fótons produzidos em diferentes energias de aceleração dos

    elétrons. Dyson (Dyson, 1990) descreve, com razoável nível de detalhes, os

    principais resultados empíricos obtidos entre os anos de 1933 e 1959. Entre eles,

    o autor mostra resultados obtidos em seu próprio laboratório (Dyson, 1959),

    trazendo evidências do comportamento angular dos fótons produzidos em alvos

    de ouro e de alumínio após a interação de elétrons acelerados por uma diferença

    de potencial de 12,05 kV, por berílio usando tensão de aceleração de 8,36 kV e

    por polímeros com tensão de 10,05 kV.

    Dyson (Dyson, 1990) descreve, ainda, resultados interessantes para o contexto

    do presente trabalho obtidos por Thordarson (Thordarson, 1939), que utilizou

    tensões entre 60 e 170 kV e alvos de alumínio e tungstênio, ou seja, englobando

    material e faixa de energias utilizados em imagens radiológicas. Seus resultados

    apresentaram boa concordância com a teoria de Sommerfeld (Sommerfeld,

    1929), que será abordada adiante, até tensões de 110 kV. Por fim, Dyson

    (Dyson, 1990) apresenta um interessante resultado comparativo, anteriormente

    apresentado por Sesemann (Sesemann, 1941), entre os dados angulares para

    diferentes tensões de aceleração com feixes utilizando distintas filtrações,

    publicados previamente. Os dados experimentais são, também comparados com

    a previsão teórica de Sommerfeld (Sommerfeld, 1929), mostrando uma

    excelente concordância entre teoria e os experimentos. A descrição de outros

    experimentos, realizados com energias maiores, não serão abordadas no

    presente texto. Dyson (Dyson, 1990) apresenta uma excelente descrição destes

    experimentos realizados no século passado.

    Estas evidências experimentais relacionadas à interação de elétrons

    acelerados por diferentes potenciais com materiais de diferentes números

    atômicos estavam fortemente correlacionadas com o acentuado

    desenvolvimento da eletrodinâmica e da mecânica quântica. Nos parágrafos que

    seguem, será apresentado um resumo dos principais resultados teóricos que

  • 7

    corroboraram com as cuidadosas medições realizadas por diversos cientistas e

    que levaram ao atual estágio do conhecimento sobre a produção de raios X.

    A discussão resumida que se segue usa a mesma sequência adotada por

    Dyson (Dyson, 1990), apresentando inicialmente, de forma resumida e

    simplificada, a determinação da distribuição angular dos fótons emitidos pela

    interação, seguindo da apresentação teórica que deduz a distribuição energética

    do espectro contínuo. Finalmente, são apresentados os efeitos que ocorrem em

    alvos espessos, tais como os efeitos de espalhamento dos elétrons no alvo e a

    perda de energia. Serão, também, abordados temas de interesse prático e que

    possuem correlações com a teoria da produção dos raios X, tais como a

    eficiência de emissão do espectro contínuo, que está relacionada ao rendimento

    de tubos de raios X utilizados nas diversas aplicações que serão descritas nos

    capítulos subsequentes.

    A teoria do eletromagnetismo prevê que uma carga acelerada perde energia na

    forma de radiação eletromagnética. Se a aceleração se dá devido à interação

    com outra partícula carregada, ambas emitem radiação e irá ocorrer uma

    superposição coerente entre os campos de radiação (Jackson, 1999) e a

    amplitude dos campos depende do produto entre a carga elétrica e a aceleração

    que a partícula é submetida. Assim, no caso da desaceleração de um elétron por

    um núcleo atômico, sendo o primeiro muito mais leve e, portanto, podendo ser

    acelerado mais intensamente, o campo de radiação dele será muito mais

    significativo do que o produzido pelo núcleo. Neste caso, o problema é modelado

    como a colisão entre uma partícula leve interagindo com um campo elétrico fixo

    e a consequente emissão de radiação.

    No caso da interação de elétrons acelerados com um alvo espesso, muitas das

    interações que acarretam a desaceleração dos elétrons se dão, essencialmente,

    com os elétrons orbitais do meio. Isto pode gerar ionizações cujas

    consequências no processo de geração do espectro de energias resultante

    serão discutidas posteriormente. Contudo, algumas interações se dão através

    da interação coulombiana com núcleos atômicos, que também levam à

    desaceleração e, como previsto na teoria eletromagnética clássica, à emissão

    de radiação (Jackson, 1999).

    Considerando um deslocamento de amplitude 𝑓 de uma carga elétrica a partir

    de um ponto de origem no espaço, os vetores que representam os campos

  • 8

    magnético, 𝐇 , e elétrico, 𝐄, associados a este deslocamento podem ser

    representados por:

    𝐇 =e

    4πcr2𝐟̈ × 𝐫 e 𝐄 =

    e

    4πε0c2r3(𝐫 × (𝐫 × 𝐟)̈) (6)

    Onde 𝐫 representa o vetor posição da carga com relação à origem e e é a carga

    do elétron. Supondo, por simplicidade, que a desaceleração do elétron se dá de

    forma retilínea, mas considerando que a grandeza 𝑓̈ não tem a mesma direção

    do movimento dos elétrons, mas sim uma direção determinada pela força

    coulombiana exercida pelo núcleo, pode-se demonstrar que sua magnitude é

    dada por:

    �̈� =1

    4𝜋𝜀0

    𝑍𝑒2

    𝑚(𝑎(𝑡))2 (7)

    Onde 𝑎(𝑡) é a variável relacionada à distância relativa entre o elétron e o núcleo

    atômico com 𝑍 prótons com o qual está interagindo através do campo

    coulombiano. Como o elétron encontra-se em movimento, esta variável é

    dependente do tempo. Além disso, num modelamento realista, deve-se

    considerar que o elétron não interage somente com o núcleo, mas com o átomo

    como um todo, ou seja, existe uma contribuição relacionada à presença dos

    elétrons orbitais. Jackson (Jackson, 1999) argumenta que as contribuições

    diretas dos elétrons orbitais relacionadas à aceleração do elétron incidente são

    pequenas e podem ser negligenciadas. Contudo, estes elétrons orbitais

    oferecem um efeito secundário de blindagem com campo elétrico proveniente do

    núcleo atômico (screening), que é tratada no caso de perdas de energias

    radiativas relativísticas. Este efeito, contudo, será ignorado na abordagem

    simplificada a ser apresentada nos parágrafos seguintes.

    Sendo 𝜃 a direção na qual um campo elétrico ou magnético é medido em

    relação à direção de um feixe incidente de elétrons acelerados ou desacelerados

    e considerando a radiação emitida no plano x-y, as componentes z do campo

    magnético e 𝜃 do campo elétrico ficam:

    Hz =�̈�𝑒

    4𝜋𝑐𝑟𝑠𝑒𝑛θ considerando Hr = 0 e Hθ = 0 (8)

    Eθ =�̈�𝑒

    4π𝜀0c2r𝑠𝑒𝑛θ considerando Er = 0 e Ez = 0 (9)

    Um tratamento bastante completo do problema da produção de radiação por

    partículas carregadas aceleradas utilizando os chamados potenciais de Liénard-

  • 9

    Wiechert, que definem os vetores dos campos elétricos e magnéticos criados por

    cargas em movimento arbitrário, tanto para os casos relativísticos quanto não-

    relativísticos, é apresentado por Marion e Heald (Marion and Heald, 1980).

    O Vetor de Poynting, 𝐍, associado à fluência de energia relacionada à esta

    desaceleração é dado por:

    𝐍 = 𝐄 × 𝐇 (10) Sendo Eθ a magnitude do campo elétrico na direção 𝜃 e Hz a magnitude do

    campo magnético na posição 𝑧, a fluência de energia na direção de observação

    definida por (𝑧, 𝜃) é dada por (Marion and Heald, 1980)

    N = EθHz =1

    4πε0

    c

    4π(

    �̈�𝑒rc2

    )

    2

    𝑠𝑒𝑛2θ (11)

    Sommerfeld (Sommerfeld, 1964) e Jackson (Jackson, 1999) demonstram

    o comportamento dipolar desta distribuição espacial de energia, que se

    manifesta analiticamente no termo 𝑠𝑒𝑛2𝜃 que aparece na equação (11). A

    potência irradiada pode ser obtida pela integração em todos os ângulos, ou seja

    𝐼 = ∫ 𝑁2𝜋𝑟2𝑠𝑒𝑛𝜃𝑑𝜃 =𝜋

    0

    1

    4πε0

    c

    4π(

    𝑓̈𝑒

    rc2)

    2

    ∫ 2π𝑟2𝑠𝑒𝑛3𝜃𝑑𝜃𝜋

    0

    =1

    4πε0

    2𝑒2𝑓̈2

    3𝑐3

    (12)

    A equação (12) é conhecida como fórmula de Larmor para a potência irradiada

    por uma partícula carregada acelerada, com velocidade não-relativística (Marion

    and Heald, 1980). Jackson (Jackson, 1999) apresenta, também, sua

    generalização relativística. Combinando as equações (7) e (12), obtém-se a

    potência irradiada como:

    𝐼 = (1

    4πε0)

    2 2𝑒6

    3𝑐3𝑍2

    𝑚2(𝑎(𝑡))4 (13)

    A equação (13) demonstra uma proporcionalidade bem conhecida entre a

    intensidade da radiação emitida no processo de bremsstrahlung e o quadrado

    do número atômico do material que compõe o alvo. Considerações mais

    sofisticadas relacionadas aos efeitos relativísticos que ocorrem quando elétrons

    são acelerados por diferenças de potenciais usuais em tubos de raios X de

    aplicações médicas (acima de alguns kV) são tratadas em textos clássicos de

    eletromagnetismo (Jackson, 1999) e em textos modernos de Física das

  • 10

    Radiações (Podgorsak, 2010), levando ao seguinte resultado para a intensidade

    instantânea do feixe irradiado:

    𝐼 =1

    4πε0

    𝑐

    4𝜋(

    �̈�𝑒

    𝑟𝑐2)

    2𝑠𝑒𝑛2𝜃

    (1 − 𝛽𝑐𝑜𝑠𝜃)6 (14)

    Nesta equação, que explicita uma dependência angular da intensidade de

    fótons emitida com a aceleração do elétron em um dado instante, vale a

    representação relativística 𝛽 = 𝑣 𝑐⁄ . O valor de interesse prático, contudo, é seu

    valor integrado no tempo (Dyson, 1990, Podgorsak, 2010), ou seja:

    ∫ 𝐼𝑑𝑡 =1

    4πε0

    𝑐2

    16𝜋(

    𝑓̈𝑒

    𝑟𝑐2)

    2

    [1

    (1 − 𝛽𝑐𝑜𝑠𝜃)4− 1]

    𝑠𝑒𝑛2𝜃

    𝑐𝑜𝑠𝜃 (15)

    A equação (15) é válida para o limite de energias mais altas, onde a variação

    de velocidade do elétron é desprezível durante seu processo de freamento. O

    tratamento adotado por Sommerfeld (Sommerfeld, 1929, Sommerfeld, 1964)

    para outras faixas de energia considera a velocidade média do elétron e leva a

    previsões que estão de acordo com observações experimentais de Kulenkampff

    (Kulenkampff, 1928, Kulenkampff, 1938).

    Podgorsak (Podgorsak, 2010) trata, de forma complementar aos textos já

    citados, da correlação entre a intensidade de radiação emitida por elétrons com

    energias cinéticas diferentes. Este resultado está diretamente associado à

    dedução da equação (15) e relaciona-se à arquitetura de construção dos

    modernos tubos de raios X utilizados nas mais variadas aplicações.

    Mais relevante que a distribuição angular dos fótons emitidos para as

    aplicações da espectroscopia de raios X de interesse em Medicina é sua

    distribuição energética e as intensidades totais emitidas. Estas intensidades

    podem ser representadas pelo rendimento, em função das variáveis como a

    tensão aplicada no tubo e o número atômico do material do alvo. Assim, pode-

    se recorrer aos trabalhos de Kramers (Kramers, 1923) que adotou como modelo

    cinético do elétron dentro do alvo considerando uma trajetória parabólica e

    obteve equações para a intensidade da radiação emitida aplicando as leis da

    eletrodinâmica clássica. Na mesma época, Kirkpatrick (Kirkpatrick, 1923) obteve

    resultados experimentais que, apesar de rudimentares, corroboravam com as

    equações obtidas por Kramers.

    De forma simplificada, Kramers associou a trajetória do elétron no campo

    coulombiano no alvo na forma de componentes de Fourier, impondo que o limite

  • 11

    de emissão de mais alta energia deveria ser equivalente à máxima energia que

    os elétrons atingiam o alvo, ou seja, ℎ𝜈 = 𝑒𝑉, sendo 𝑉 a diferença de potencial

    que fornece a energia cinética para os elétrons. Assim, considerando um único

    elétron atravessando um alvo fino consistindo de 𝑛 átomos por unidade de

    volume (𝑛 = 𝑁𝐴𝜌 𝐴⁄ ), a intensidade de raios X emitidos em um intervalo de

    frequência 𝑑𝜈 será (Dyson, 1990)

    𝑖(𝜈)𝑑𝜈𝑑𝑥 = {

    16𝜋2

    3√3

    𝑍2𝑒5𝑛

    𝑐3𝑚𝑉𝑑𝜈𝑑𝑥 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝜈 < 𝜈0

    0 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝜈 ≥ 𝜈0

    (16)

    Nesta equação, novamente, aparece a dependência quadrática com Z, como

    comentado anteriormente. Integrando a equação (16) sobre todas as

    frequências, obtêm-se:

    𝑖𝑑𝑥 =16𝜋2

    3√3

    𝑍2𝑒6𝑛

    𝑐3𝑚ℎ𝑑𝑥 (17)

    Este resultado é válido para um alvo fino, no qual o elétron atravessa sem perda

    considerável de energia. O tratamento completo do problema pode ser feito

    considerando a função de onda do elétron antes e após a interação coulombiana.

    Isto foi estudado por Sommerfeld (Sommerfeld, 1929, Sommerfeld, 1964)

    usando o ferramental matricial da Mecânica Quântica e os momentos elétricos

    resultantes da interação, distribuídos em todo espaço. O mesmo problema foi

    detalhado por Kirkpatrick e Wiedmann (Kirkpatrick and Wiedmann, 1945). Este

    estudo está resumido em Dyson (Dyson, 1990) e não será detalhado no presente

    trabalho. Cabe somente ressaltar que a dedução da equação (17) por

    Sommerfeld não é válida quando a velocidade do elétron se aproxima da

    velocidade da luz.

    Uma abordagem mais robusta para o problema tratando de velocidades

    relativísticas do elétron e adotando as aproximações de Born foi apresentada por

    Bethe e Heitler (Bethe and Heitler, 1934). Os resultados desses autores mantêm

    a proporcionalidade com 𝑍2 da intensidade de fótons emitidos pela interação dos

    elétrons, mas considera a possibilidade do elétron emitir mais que um fóton antes

    de atingir a situação de repouso. Os autores ainda demonstram uma expressão

    para prever a quantidade média de fótons emitidos em função da energia do

    elétron incidente.

  • 12

    Um tratamento bastante completo dos processos de bremsstrahlung nas

    situações clássicas, ou seja, considerando elétrons incidentes no limite não-

    relativístico ((𝑣 𝑐⁄ ) ≪ 1), no limite não-relativístico, porém considerando a

    aproximação de Born segundo a mecânica quântica e argumentos

    semiclássicos, e no caso relativístico, aplicando-se ou não as transformações de

    Lorentz, são apresentados, detalhadamente, por Jackson (Jackson, 1999). O

    mesmo autor trata, ainda, da questão da blindagem do campo no núcleo pelos

    elétrons orbitais e da perda de energia por transições radiativas relativísticas,

    sempre comparando os resultados semiclássicos com os obtidos por Bethe e

    Heitler (Bethe and Heitler, 1934) através da aplicação de ferramentas da

    mecânica quântica.

    Conforme apresentado anteriormente, os resultados de Bethe e Heitler, apesar

    de fundamentais para o entendimento do processo de emissão de raios X

    através da interação do elétron em movimento com os átomos do alvo, não

    permitem a total compreensão dos fenômenos de maior interesse para as

    aplicações que serão descritas nos capítulos que seguem. Na maioria das

    aplicações práticas que serão descritas, o processo de emissão de

    bremsstrahlung se dá com a utilização de alvos espessos, onde outros

    fenômenos, tais como o espalhamento dos elétrons e a blindagem do campo

    elétrico nuclear pelos elétrons orbitais, devem ser considerados.

    Este problema foi tratado na década de 1930 por Hans Bethe e Felix Bloch, que

    desenvolveram uma nova teoria para o poder de freamento colisional de elétrons

    interagindo com meios, tomando por base a teoria quântica e conceitos

    relativísticos. A teoria de Bethe-Bloch (Ziegler, 1999) aperfeiçoava a teoria

    clássica da Bohr, obtendo excelentes resultados quando comparados a dados

    experimentais (Podgorsak, 2010). Seus resultados, apresentados na forma de

    funções que quantificam o poder de freamento dos elétrons, normalmente

    divididos entre colisões soft e hard, em função de diversos parâmetros de

    interesse, são bastante conhecidas por textos didáticos da área de Física das

    Radiações (Okuno and Yoshimura, 2010, Podgorsak, 2010, Attix, 1986, Johns

    and Cunningham, 1983).

    O resultado das interações previstas por Bethe e Block, para fins práticos

    relacionados ao alcance de elétrons, 𝑅, em meios espessos, pode ser expressa,

    simplificadamente, como uma lei de potência na forma 𝑅 = 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒 × 𝑉𝛼. Esta

  • 13

    regra aproximativa entre alcance dos elétrons e tensão de aceleração, chamada

    lei de Thomson-Whiddington, é frequentemente utilizada para a obtenção de

    valores aproximados de intensidade do feixe de raios X produzidos quando se

    conhece o valor de 𝑉 e é aplicada em diversos modelos de simulação

    computacional de espectros de bremsstrahlung, como será abordado em

    capítulos posteriores. O valor de 𝛼, contudo, varia de acordo com a tensão a ser

    aplicada, sendo em torno de 1,7 para tensões de 20 kV e caindo

    progressivamente até 1 para tensões de 1 MV. Whiddington (Whiddington,

    1912), porém, encontrou 𝛼 = 2 para energias de elétrons entre 8 e 30 keV. O

    apêndice 1 de Dyson (Dyson, 1990) apresenta outros resultados destas

    aproximações, em outras faixas de energia e com comparações interessantes

    com resultados experimentais.

    Pode-se, ainda, correlacionar os resultados de Kramers com a lei de

    Thompsom-Whiddington e derivar uma expressão simplificada para a

    intensidade do espectro de raios X considerando um alvo fino e uma pequena

    auto-atenuação dos fótons de raios X pelo material do alvo. Esta expressão é

    representada por (Dyson, 1990)

    𝐼(𝜈) = 𝐴𝑍(𝜈0 − 𝜈) (18)

    Onde 𝐴 é uma constante, semelhante à que aparece nos resultados de

    Kulenkampff (Kulenkampff, 1922, Kulenkampff, 1928).

    O problema pode, ainda, ser tratado de forma mais complexa considerando

    alvos semi-finos, ou seja, quando a espessura, 𝑑𝑥, não é suficiente para levar os

    elétrons ao repouso. Neste caso, a intensidade total do feixe, semelhante ao

    resultado apresentado na equação (17), é dada por

    𝐼𝑑𝑥 =16𝜋2

    3√3

    𝑒5

    𝑐3𝑚𝑍2𝑛

    𝑒

    ℎ𝑑𝑥 (19)

    A integração desta equação para um valor finito de 𝑥 demonstra que a

    intensidade total emitida em um alvo semi-fino é independente da energia do

    elétron e que espessuras semelhantes irão produzir intensidades totais

    semelhantes. A única hipótese necessária é que o elétron emerja do alvo com

    uma velocidade finita. Isto leva a resultados conhecidos e, normalmente,

    utilizados para representar, de forma didática, a emissão de raios X por alvos

  • 14

    espessos como se fossem superposições de alvos semi-finos (Johns and

    Cunningham, 1983, Behling, 2015, Brosed, 2011).

    Por fim, uma questão de alta relevância relacionada ao bremsstrahlung com

    relação às aplicações que serão tratadas no presente texto é o rendimento

    associado à produção de raios X em função do material do alvo e da tensão

    aplicada para a aceleração dos elétrons. Kirkpatrick e Wieldmann (Kirkpatrick

    and Wiedmann, 1945) compararam a intensidade total de um campo de radiação

    gerado por uma partícula carregada acelerada usando uma aproximação não

    relativística e considerando os momentos elétricos efetivos no plano x-y,

    transversal à direção da trajetória da partícula, que resultam em “componentes”

    de intensidade de radiação 𝐼𝑥 e 𝐼𝑦, obtendo:

    𝐼 = ∫ [𝐼𝑥𝑠𝑒𝑛2𝜃 + 𝐼𝑦(1 + 𝑐𝑜𝑠

    2𝜃)]2𝜋𝑠𝑒𝑛𝜃𝑑𝜃 =8

    3𝜋(𝐼𝑥 + 2𝐼𝑦)

    𝜋

    0

    (20)

    Os autores compararam este resultado à perda de energia de elétrons

    acelerados interagindo com alvos finos, o que permitiu a derivação da seguinte

    expressão:

    𝜂 = 2,8 × 10−6𝑍𝑉 (21)

    Na equação (21), 𝜂 representa a eficiência (ou rendimento) de produção de

    fótons, 𝑍 é o número atômico do material do alvo e 𝑉 é a diferença de potencial

    aplicada, expressa em quilovolts. Dyson (Dyson, 1990) descreve resultados de

    diversos trabalhos experimentais realizados em meados do século passado para

    demonstrar as relações entre a energia fornecida para os elétrons e o número

    atômico de um alvo fino com a quantidade de radiação absoluta gerada no

    processo. Muitos destes trabalhos buscavam confirmar os resultados teóricos de

    Sommerfeld.

    Contudo, os resultados de interesse real para as aplicações de espectros em

    Medicina são aqueles gerados por alvos espessos. Neste caso, os resultados

    obtidos por Krammers (Kramers, 1923) e por Compton e Allison (Compton and

    Allison, 1940) podem ser representados na forma

    𝑃 = 𝐾𝑍𝑉2 (22)

    Nesta equação, 𝑃 representa a potência irradiada por unidade de corrente e 𝐾

    é uma constante adimensional que varia entre 0,92x10-6 e 1,1 x10-6. Resultados

  • 15

    semelhantes a estes são, atualmente, usados em textos didáticos relacionados

    à tecnologia dos raios X (Behling, 2015) ou à Física do Diagnóstico por Imagem

    (Bushberg et al., 2012, Dance et al., 2014). O valor da constante 𝐾, contudo, foi

    revisado por diferentes autores, tais como Green e Cosslett (Green and Cosslett,

    1968) e por Dyson (Dyson, 1959). Este último apresenta, em seu livro-texto

    (Dyson, 1990), uma comparação entre seus resultados e o valor constante de

    Compton e Allison e discute o comportamento do valor de 𝐾 em função do

    numero atômico, que passa por um valor mínimo em 𝑍 ≈ 60, variando entre

    1,5x10-6 para 𝑍 = 13 e 0,85 para 𝑍 = 79.

    Observando a equação (4), considerando que a intensidade irradiada pode ser

    interpretada como a potência irradiada por unidade de frequência por intervalo

    unitário de corrente, e usando relação aproximada 𝐵 𝐴⁄ ≈ 0, temos:

    𝐼(𝑉, 𝑍) =𝑃

    𝑣≈ 𝐴𝑍(𝜈0 − 𝜈)

    Logo, integrando e utilizando a relação para os fótons de maior energia

    criados nas interações, ℎ𝜈0 = 𝑉𝑒, obtemos a seguinte expressão para a potência

    irradiada por unidade de corrente:

    𝑃 ≈ ∫ 𝐴𝑍(𝜈0 − 𝜈)𝜈𝑑𝜈 = 𝐴𝑍𝜈0

    2

    2=

    𝐴

    2(

    𝑒

    ℎ)

    2

    𝑍𝑉2𝜈0

    0

    (23)

    Como o rendimento pode ser definido como a potência irradiada dividida pela

    potência elétrica aplicada (lembrando que a definição de 𝑃, acima, é de potência

    irradiada por unidade de corrente e a potência elétrica é o produto da tensão

    aplicada pela corrente), temos:

    𝜂 =𝑃

    𝑉=

    𝐴

    2(

    𝑒

    ℎ)

    2

    𝑍𝑉 = 𝐾𝑍𝑉 (24)

    Ou seja, comparando este resultado com a equação (22) obtemos;

    𝐾 = 𝐴

    2(

    𝑒

    ℎ)

    2

    Pode-se, por fim, definir o rendimento como função da energia do elétron

    incidente (Nicholas, 1930). Neste caso, temos:

    𝜂 =𝐴

    2

    𝑒

    ℎ2𝑍(𝑉𝑒) =

    𝐴

    2

    𝑒

    ℎ2𝑍𝐸 = 𝐾´𝑍𝐸 (25)

    Onde

    𝐾´ = 𝐴

    2

    𝑒

    ℎ2

  • 16

    Recomenda-se o texto de Radiation Physics for Medical Physicists, de Ervin

    Podgorsak (Podgorsak, 2010) para leitores que desejam aprofundamento no

    tema da produção de radiação em tubos de raios X. Além de uma profunda e

    completa abordagem da física da produção dos raios X, o capítulo 14 do livro

    traz uma interessante abordagem sobre os diferentes tipos de aceleradores de

    partículas que resultam em emissão de radiação e suas particularidades.

  • 17

    O espectro de raios X característicos

    As técnicas experimentais utilizadas nos primeiros anos de estudo da produção

    dos raios X buscavam respostas para a distribuição energética do feixe

    produzido. Naquela época, a instrumentação para exploração dos fenômenos de

    difração ainda não havia sido desenvolvida e os cientistas experimentais

    utilizavam o comportamento da absorção dos raios X pela matéria como única

    fonte de informação empírica para avançar em seus resultados.

    Foi através do estudo da penetração da radiação-X em diferentes materiais que

    se deduziu que os espectros gerados por tubos de raios X eram compostos por

    um componente contínuo, descrito no item anterior, mas que também deveria

    haver um componente discreto. Descobriu-se, mais tarde, com os trabalhos de

    Bohr, Sommerfeld e muitos outros, que esta componente discreta tratava-se de

    várias linhas. Depois, o desenvolvimento da Mecânica Quântica permitiu a

    compreensão completa da estrutura fina deste tipo de espectro de radiação

    eletromagnética.

    O desenvolvimento do modelo de Bohr permitiu o entendimento e a

    quantificação dos níveis energéticos das diversas camadas eletrônicas,

    agrupadas em orbitais K, L, M, etc., e caracterizadas pelo Número Quântico

    principal, 𝑛. Por esta teoria, considerando um átomo semelhante do hidrogênio,

    porém com número atômico efetivo, 𝑍𝑒𝑓𝑓, correspondendo ao número atômico

    corrigido pelo efeito de blindagem dos elétrons orbitais (screening), os níveis de

    energia dos diferentes elétrons distribuídos em um átomo são representados por

    (Podgorsak, 2010, Dyson, 1990):

    𝐸𝑛 = −𝑚𝑟2ℏ2

    [𝑍𝑒𝑓𝑓𝑒

    2

    4𝜋𝜀0]

    21

    𝑛2= −

    𝑅ℎ𝑐𝑍𝑒𝑓𝑓2

    𝑛2 (26)

    Na equação (26), 𝑅 = (1

    4𝜋𝜀0)

    2 𝑚𝑟𝑒4

    4𝜋ℏ3𝑐 é a contante de Rydberg e 𝑚𝑟 =

    𝑚𝑀

    𝑀+𝑚

    é a massa reduzida do elétron orbital, sendo 𝑚 a massa do elétron e 𝑀 é a massa

    atômica. O modelo de Bohr-Sommerfeld, contudo, leva em consideração

    fenômenos adicionais, como o momento angular orbital e o acoplamento spin-

    órbita. O detalhamento deste modelo foge ao escopo do presente texto e pode

    ser encontrado na maioria dos livros didáticos de Física Moderna. A partir do

    detalhamento deste modelo, que considera efeitos relativísticos, pode-se deduzir

    uma equação geral para o nível energético de um átomo deste tipo levando-se

  • 18

    em consideração, além do número quântico principal, 𝑛, o número quântico

    momento angular, 𝑙, e o número quântico de spin, 𝑠 (Dyson, 1990):

    𝐸𝑛,𝑙,𝑗 = −𝑅ℎ𝑐 [(𝑍 − 𝜎𝑠)

    2

    𝑛2+

    𝛼2(𝑍 − 𝜎𝑠´)

    4

    𝑛4(

    𝑛

    𝑗 +12

    −3

    4)] (27)

    Na equação (27), 𝛼 =𝑒2

    4𝜋𝜀0ℏ𝑐 é a constante de estrutura fina, 𝑗 = 𝑙 ± 𝑠 é o número

    quântico angular total e 𝜎𝑠 e 𝜎𝑠´ são constantes que corrigem o efeito da

    blindagem parcial do campo elétrico do núcleo pelos elétrons orbitais.

    Um fator não considerado na discussão acima e que completa o modelo

    é o efeito de uma quantização magnética, associado ao número quântico

    magnético 𝑚𝑗, que assume valores tais que |𝑚𝑗| ≤ 𝑗. Esta característica adicional

    dos níveis energéticos de um átomo, associado ao Efeito Zeeman (Leroy and

    Rancoita, 2009) bastante conhecido na espectroscopia ótica, não é observável

    em espectros de raios X. Contudo, contribui para a definição das intensidades

    das linhas características, uma vez que influencia as probabilidades de transição

    entre estados.

    Para a correta interpretação do espectro característico produzido em

    tubos de raios X, o fenômeno de interesse está relacionado às transições

    eletrônicas que ocorrem após o átomo entrar em estado de ionização ou

    excitação por um estímulo externo. Isso ocorre, por exemplo, após a interação

    com um elétron acelerado. O rearranjo das camadas eletrônicas pode ser

    seguido de uma transição que produz fótons de raios X com energia equivalente

    à diferença de energia entre as camadas onde houve a transição, ou através de

    um processo competitivo, conhecido como efeito Auger. Uma das diferenças

    entre esses processos reside na complexidade da cadeia de rearranjos

    decorrentes de cada tipo de emissão. Quando um fóton de raios X característicos

    é emitido pelo átomo, uma vacância em uma camada eletrônica aparece, e que

    deve ser novamente preenchida. No caso da emissão de um elétron Auger, duas

    vacâncias aparecem. Além disso, após uma ionização, diferentes combinações

    destes fenômenos podem ocorrer.

    Um conjunto de linhas espectrais características dos espectros de raios X

    utilizados em aplicações médicas, em especial na mamografia, são os dubletos

    𝐾∝1 e 𝐾∝2, relacionados a transições que ocorrem após a ionização na camada-

  • 19

    K do átomo. Estas linhas respeitam as regras de seleção para radiação de dipolo

    (Jackson, 1999, Eisberg and Resnick, 1994). A energia do dubleto 𝐾𝛼 pode ser

    calculada pela fórmula aproximada (Dyson, 1990):

    𝐸 =3

    4𝑅ℎ𝑐(𝑍 − 𝜎𝑚)

    2 (28)

    Com 𝜎𝑚 ≈ 1, que foi obtida por Moseley e a dependência em 𝑍2 é conhecida

    como Lei de Moseley. As linhas 𝐾𝛽 apresentam linhas correspondentes a

    energias ligeiramente superiores às linhas 𝐾𝛼, sendo 2,5% mais altas para o

    sódio, que é o elemento químico mais leve no qual linhas 𝐾𝛽 podem aparecer, e

    15% mais energéticas para o urânio.

    O tratamento das linhas características L é importante para o correto

    entendimento da fenomenologia associada ao processo de transições

    eletrônicas em átomos ionizados. Contudo, as emissões de fótons referentes a

    estas linhas têm poucas aplicações práticas na área de imagens médicas. Estas

    linhas aparecerem em espectros muito fracamente filtrados e são de importância

    marginal para os casos que serão explorados no presente documento. Assim,

    uma abordagem detalhada pode ser obtida com a leitura de textos didáticos de

    Física Moderna ou no capítulo 3 do livro de Dyson (Dyson, 1990).

    Linus Pauling, em 1927, realizou cálculos teóricos para as constantes 𝜎𝑠 e 𝜎𝑠´

    (Pauling, 1927), obtendo excelente concordância com resultados experimentais.

    O tratamento matemático e conceitual para obtenção destas constantes é

    bastante complexo, mas a ideia geral é relativamente simples.

    O efeito da blindagem do campo do núcleo depende da quantidade de carga

    parcial que existe no interior do átomo. Assim, depende daquelas cargas

    distribuídas em raios menores que o raio da carga que está sentindo campo

    (blindagem interna) e das cargas distribuídas em raios superiores (blindagem

    externa). A blindagem interna depende, fundamentalmente, da carga total

    contida dentro do raio de interesse e sua distribuição é pouco importante. Por

    outro lado, a blindagem externa tem forte dependência na distribuição de cargas,

    uma vez que cargas distribuídas muito distantes do raio de interesse vão produzir

    um efeito de blindagem pequeno em comparação com aquelas cargas situadas

    em raios ligeiramente superiores ao raio onde se situa a carga que está sujeita

    aos efeitos do campo. Uma discussão detalhada e bem referenciada relacionada

    aos valores de 𝜎𝑠 e 𝜎𝑠´ pode ser encontrada em (Bambynek et al., 1972) e na

  • 20

    dissertação de mestrado de Suelen Barros (Barros, 2014), que acompanha uma

    excelente pesquisa bibliográfica sobre o assunto.

    Para o interesse do presente trabalho é importante tratar dos temas

    relacionados ao rendimento da produção de radiação fluorescente e do efeito

    Auger, citado anteriormente. Após um elétron acelerado por uma dada diferença

    de potencial atingir um átomo do alvo e ionizá-lo, removendo um elétron orbital

    de uma das camadas internas, o rearranjo eletrônico pode gerar um fóton de

    raios X ou, alternativamente, ocorrer uma transição não-radiativa. Neste caso, a

    energia disponibilizada pelo processo de acomodação das camadas eletrônicas

    é utilizada para liberar outro elétron orbital de uma das camadas mais externas.

    Este processo é conhecido como efeito Auger e o elétron ejetado é chamado

    elétron Auger (Johns and Cunningham, 1983, Podgorsak, 2010). Para um átomo

    com muitas camadas eletrônicas que realiza processos Auger após uma

    ionização, um grande conjunto de recombinações eletrônicas são possíveis, o

    que torna o espectro de emissões Auger bastante complexo (Dyson, 1990).

    Sem entrar em maiores detalhes destes processos, pode-se definir o

    rendimento fluorescente após a ionização de um átomo com a remoção de um

    elétron da camada K como:

    𝜔𝐾 =𝑁𝐾

    𝑁𝐾 + 𝐴𝐾 (29)

    Onde 𝑁𝐾 é o número de fótons de raios X da série K emitidos e 𝐴𝐾 é o número

    correspondente de elétrons Auger. Assim, a determinação de valores dos

    rendimentos 𝜔𝐾 (ou 𝜔𝐿, 𝜔𝑀, etc.) para diferentes átomos depende,

    fundamentalmente, das probabilidades relativas de ocorrência destes dois

    processos competitivos. De forma simplificada, pode-se determinar que a

    probabilidade de ocorrência de emissões de elétrons Auger varia pouco com o

    número atômico, enquanto a probabilidade de emissão de raios X característicos

    é proporcional à 𝑍4. Isso é demonstrado por Dyson (Dyson, 1990) considerando

    a emissão radiativa pelo átomo como um oscilador clássico amortecido,

    chegando no resultado:

    𝜔𝐾 =𝑍4

    𝑎𝐾+𝑍4, 𝑎𝐾 = 1,12 × 10

    6 (30)

    Bambynek e col. (Bambynek et al., 1972) apresentam uma versão polinomial

    semiempírica relacionando o rendimento fluorescente com o número atômico:

  • 21

    [𝜔𝐾

    1 − 𝜔𝐾]

    14

    = 𝐵0 + ∑ 𝐵𝑖𝑍𝑖

    𝑝

    𝑖=1

    (31)

    Onde os valores das constantes do polinômio referentes às medições

    realizadas por diferentes autores estão tabelados em (Bambynek et al., 1972).

    Além disso, Dyson (Dyson, 1990) faz um resumo da quantificação do rendimento

    fluorescente quando o elétron removido do átomo se situava na camada L.

    Outro tema relevante para a correta interpretação dos espectros de raios X

    obtidos em equipamentos de uso em Medicina diagnóstica ou para aplicações

    associadas é a intensidade relativa das linhas características que aparecem

    nestes espectros. Este tema foi, e vem sendo, tratado por diversos autores e

    resultados obtidos pelo autor do presente texto, em colaboração com outros

    colegas e estudantes, será discutida posteriormente (Lopez Gonzales et al.,

    2015, Bontempi et al., 2016)

    Dyson (Dyson, 1990) apresenta, ainda que de forma resumida dada a

    complexidade do assunto, a influência das regras de transição e redistribuições

    de Coster-Kronig e como elas influenciam, estatisticamente, as intensidades

    relativas das linhas características que ocorrem após processos de ionização de

    um átomo (Wu et al., 2012, Rahangdale et al., 2016, Barros et al., 2015,

    Fernandez-Varea et al., 2014).

    Podemos, enfim, apresentar os fundamentos básicos relacionados à emissão

    de radiação característica por alvos finos e espessos. No caso de alvos finos, a

    expressão para a seção de choque de ionização associada à (𝑛, 𝑙)-ésima

    camada, 𝜎𝑛.𝑙, pode ser expressa como:

    𝜎𝑛𝑙 =1

    (4𝜋𝜀0)22𝜋𝑒4𝑍𝑛𝑙

    𝑚0𝑣2|𝐸𝑛𝑙|𝑏𝑛𝑙𝑙𝑛 [

    2𝑚0𝑣2

    𝐵𝑛𝑙] (32)

    Nesta equação, 𝑍𝑛𝑙 é o número de elétrons na camada, |𝐸𝑛𝑙| é a energia

    de ligação dos elétrons na camada considerada, 𝑏𝑛𝑙 é uma constante numérica,

    𝐵𝑛𝑙 é uma função da energia de ligação dos elétrons e 𝑒, 𝑚0 e 𝑣 são,

    respectivamente, a carga, a massa de repouso e a velocidade dos elétrons

    incidentes. Após uma série de considerações práticas, Dyson apresenta a

    seguinte expressão para esta seção de choque, considerando a interação de um

    elétron com energia cinética superior a energia de ligação da camada K de um

    átomo e ionizando-o pela remoção do elétron desta camada:

  • 22

    𝜎𝐾 =1

    (4𝜋𝜀0)22𝜋𝑒4

    𝐸𝐸𝐾𝑏𝐾𝑙𝑛[𝑈𝐾] (33)

    Na equação (33), 𝐸 é a energia cinética do elétron incidente, 𝐸𝐾 é a

    energia de excitação da camada K e 𝑈𝐾 = 𝐸 𝐸𝐾⁄ é a razão de excitação. Esta

    expressão é bem confirmada por resultados experimentais provenientes de

    interação de elétrons com alvos finos de diferentes materiais. Mais uma vez,

    Dyson (Dyson, 1990) apresenta uma detalhada comparação entre o resultado

    apresentado na equação (33) e dados experimentais de diferentes autores.

    A abordagem de maior importância para as aplicações relacionadas ao

    presente trabalho é aquela que assume que o alvo é espesso. Neste caso, os

    elétrons que atingem o alvo perdem, gradualmente, sua energia cinética através

    de interações elásticas e inelásticas. Assim, a seção de choque para obtenção

    do rendimento fluorescente relacionado à radiação característica deve ser

    integrada considerando a distância que o elétron percorre dentro do alvo. Pra

    isso, utiliza-se a expressão para perda de energia inicial, 𝐸0, do elétron incidente

    e considerando ionizações na camada K, o número de fótons de raios X emitidos

    por elétron incidente é dado por:

    𝑁𝐾 = 𝜔𝐾 ∫ 𝜎𝐾

    𝐸𝐾

    𝐸0

    𝑛 (𝑑𝐸

    𝑑𝑥)

    −1

    𝑑𝐸 (34)

    Nesta equação, 𝑛 é o número de átomos por unidade de volume e 𝑑𝐸

    𝑑𝑥 é o

    poder de freamento do material para elétrons incidentes, dado pela fórmula de

    Bethe-Block. Esta fórmula, que é apresentada na maioria dos textos didáticos da

    área de Física das Radiações (Johns and Cunningham, 1983, Podgorsak, 2010)

    pode ser representada como:

    𝑑𝐸

    𝑑𝑥= −

    1

    (4𝜋𝜀0)24𝜋𝑒4𝑛𝑍

    𝑚0𝑣2𝑙𝑛 [(

    𝑒

    2)

    12 𝑚0𝑣

    2

    2𝐽 ̅]

    = −1

    (4𝜋𝜀0)22𝜋𝑒4𝑛𝑍

    𝐸𝑙𝑛 [(

    𝑒

    2)

    12 𝐸

    𝐽 ̅] ≈ −

    1

    (4𝜋𝜀0)2𝑘𝑛𝑍

    2𝐸

    (35)

    Nesta equação, 𝐽 ̅ é a média geométrica dos potencias de ionização e

    excitação do átomo e 𝑘 é uma constante. A última aproximação considera a

    pequena variação do termo logarítmico com 𝑍 e com 𝐸 e é válida como uma boa

    aproximação para elétrons incidentes com energias inferiores a 40 keV.

  • 23

    Substituindo a equação (33) em (34) e utilizando o resultado obtido na

    equação (35) temos:

    𝑁𝐾 =𝜔𝐾4𝜋𝑒

    4𝑏𝑘𝑘𝑍𝐸𝐾

    ∫ 𝑙𝑛 [𝐸

    𝐸𝐾] 𝑑𝐸 =

    𝐸0

    𝐸𝐾

    𝜔𝐾4𝜋𝑒4𝑏𝑘

    𝑘𝑍[𝑈0𝑙𝑛𝑈0 − (𝑈0 − 1)] (36)

    Onde 𝑈0 =𝐸0

    𝐸𝐾⁄ . Introduzindo, explicitamente, a dependência do

    rendimento fluorescente usando a equação (30), temos:

    𝑁𝐾 =𝑍3

    𝑎𝐾 + 𝑍44𝜋𝑒4𝑏𝑘

    𝑘[𝑈0𝑙𝑛𝑈0 − (𝑈0 − 1)] (37)

    A Figura 1 apresenta o comportamento do número de fótons gerados por

    fluorescência após a remoção direta de um elétron da camada K de um átomo.

    O gráfico apresenta somente o comportamento da proporcionalidade

    𝑍3 (𝑎𝐾 + 𝑍4)⁄ , com os demais termos da equação (37) aparecendo como um

    fator de normalização. Nota-se que, para elementos leves, o crescimento do

    número de fótons emitidos é dominado pelo termo 𝑍3 e cresce rapidamente.

    Porém, para átomos com número atômico próximos a 40 esta tendência se

    inverte e o termo em 𝑍4 no denominador passa a dominar. Além disso, nota-se

    que o rendimento de produção de radiação fluorescente é a mesma,

    independente da energia do elétron incidente, desde que este tenha energia

    suficiente para provocar o processo de ionização do átomo.

    0 20 40 60 80 100

    0.000

    0.002

    0.004

    0.006

    0.008

    0.010

    0.012

    0.014

    0.016

    0.018

    NK/[

    (4e

    4b

    K/k

    )(U

    0ln

    U0-(

    U0-1

    )]

    Z

    Figura 1 - Comportamento do número de fótons gerados por fluorescência após a remoção direta de um elétron da camada K de um átomo

  • 24

    O modelamento para radiação fluorescente apresentado até aqui leva em

    consideração somente a ionização de átomos resulta diretamente da interação

    com elétrons incidentes. Contudo, quando se trata de alvos espessos, a radiação

    contínua gerada no alvo contém fótons com energia suficiente para, também,

    provocar ionizações nos átomos e provocar a emissão de radiação de

    fluorescência. Este fenômeno, conhecido como produção indireta de radiação

    fluorescente, aumenta a intensidade de raios X característicos no espectro. Este

    aumento depende, entre outras coisas, da quantidade de fótons produzidos pelo

    processo de bremsstrahlung no material do alvo.

    A quantificação desta contribuição ao espectro discreto produzido por alvos

    espessos pode ser realizada considerando a razão:

    𝑆 =𝑌𝐾𝑁𝑐

    (38)

    Onde o numerador representa o número de ionizações da camada K

    produzidas por impacto de elétrons e o denominador o número de fótons no

    espectro contínuo com energia ℎ𝜈 > 𝐸𝐾. Inicialmente pode-se considerar o

    cálculo de 𝑌𝐾 como:

    𝑌𝐾 = 𝑛 ∫ 𝜎𝐾𝑑𝑥𝑥𝐾

    0

    =1

    (4𝜋𝜀0)22𝜋𝑒4

    𝐸𝐾𝑏𝐾𝑛 ∫

    1

    𝐸𝑙𝑛 [

    4𝐸

    𝐵𝐾] 𝑑𝑥

    𝑥𝐾

    0

    =1

    (4𝜋𝜀0)22𝜋𝑒4

    𝐸𝐾𝑏𝐾𝑛 ∫ 𝑙𝑛 [

    4𝐸

    𝐵𝐾]

    1

    𝐸

    𝑑𝑥

    𝑑𝐸𝑑𝐸

    𝐸𝑥

    𝐸0

    (39)

    Nesta equação, 𝑛 representa o número de átomos por unidade de volume

    do material do alvo, 𝜎𝐾 é a seção de choque de ionização definida na equação

    (33) e 𝑥𝐾 é a distância que os elétrons atravessam até perderem energia e esta

    se tornar inferior à energia necessária para ionização dos átomos do alvo. A

    partir da equação (35), pode-se definir a Lei de Thomsom-Widdington (Dyson,

    1990) como:

    𝑑𝑥

    𝑑𝐸=-(4𝜋𝜀0)

    2 2𝐸

    𝑘𝑛𝑍 (40)

    Substituindo (40) em (39) e definindo 𝐵𝐾 = 𝑎𝐸𝐾 e 𝑈0 = 𝐸𝑜 𝐸𝐾⁄ , obtemos:

    𝑌𝐾 =4𝜋𝑒3𝑏𝐾

    𝑍𝑘[𝑈0𝑙𝑛 (

    4𝑈0𝑎

    ) − (𝑈0 − 1) − 𝑙𝑛 (4

    𝑎)] (41)

    Para o cálculo do denominador da equação (38), pode-se retomar a expressão

    definida na equação Erro! Fonte de referência não encontrada., desprezando-

  • 25

    se o termo de baixa amplitude que varia com 𝑍2 e representando-a como a

    energia irradiada por unidade de frequência por elétron incidente como

    𝐸𝜈 = 𝐶𝑍(𝜈0 − 𝜈) (42)

    Na equação (42), 𝐶 = 𝐴𝑐𝑒. Assim, o número de fótons com energia ℎ𝜈

    produzidos pode ser expresso como

    𝑛𝜈 =𝐶𝑍(𝜈0 − 𝜈)

    ℎ𝜈 (43)

    Deste modo, o número de fótons de raios X característicos criados de forma

    indireta, pela interação fluorescente causada por fótons do espectro contínuo é

    dada por:

    𝑁𝑐 = ∫ 𝑛𝜈𝑑𝜈𝜈0

    𝜈𝐾

    =𝐶𝑍

    ℎ∫

    (𝜈0 − 𝜈)

    𝜈𝑑𝜈

    𝜈0

    𝜈𝐾

    =𝐶𝑍

    ℎ[𝜈0𝑙𝑛 (

    𝜈0𝜈𝐾

    ) − (𝜈0 − 𝜈𝐾)] =𝐶𝑍𝐸𝐾

    ℎ2[𝑈0𝑙𝑛(𝑈0) − (𝑈0 − 1)]

    (44)

    Por fim, combinando (44) e (43) obtemos

    𝑆 =4𝜋𝑒4ℎ2𝑏𝐾𝐶𝐸𝐾𝑘𝑍2

    [𝑈0𝑙𝑛 (4𝑈0

    𝑎 ) −(𝑈0 − 1) − 𝑙𝑛 (

    4𝑎)]

    [𝑈0𝑙𝑛(𝑈0) − (𝑈0 − 1)] (45)

    Outro parâmetro importante para a análise das linhas características emitidas

    em espetros provenientes de alvos espessos é dado pela razão entre o número

    de ionizações da camada K produzidas por impacto de elétrons e o número de

    ionizações produzidas por fluorescência:

    𝑃 =𝑌𝐾𝐹𝐾

    (46)

    Esta razão representa a proporcionalidade entre os processos de ionizações

    provocados pelos diferentes estímulos (impacto dos elétrons ou radiação

    fluorescente). O fenômeno foi estudado por diversos autores para os elementos

    químicos prata, paládio e cobre (Dyson, 1990), que encontraram valores

    aproximadamente constantes para uma grande faixa de tensões de aceleração

    dos elétrons. Usando esta grandeza, pode-se expressar o aumento da radiação

    fluorescente produzida devido a produção indireta como (𝑃 + 1) 𝑃⁄ .

    Para obter uma representação mais exata do número de fótons produzidos por

    radiação fluorescente relacionados à ionização da camada K, deve-se levar em

    consideração o efeito de retroespalhamento dos elétrons, que reduz a eficiência

  • 26

    de produção desta radiação por um fator 𝑅, e o efeito da auto-absorção dos

    fótons produzidos pelo próprio material do alvo, representada por 𝑓(ℎ𝜈, 𝜃), que

    será definida adiante.

    Assim, combinando esses fatores e a razão (𝑃 + 1) 𝑃⁄ com e equação (34),

    obtém-se

    𝑁𝐾 = 𝜔𝐾𝑛𝑓(ℎ𝜈, 𝜃) (𝑃 + 1

    𝑃) ∫ 𝜎𝐾

    𝐸𝐾

    𝐸0

    (𝑑𝐸

    𝑑𝑥)

    −1

    𝑑𝐸 (47)

    Dyson (Dyson, 1990) discute e apresenta resultados de diferentes abordagens

    práticas, com resultados experimentais e cálculos numéricos realizados por

    diferentes autores referentes aos possíveis valores de 𝑌𝐾. Um desses resultados,

    obtidos por Green e Cosslett (Green and Cosslett, 1961), representa uma

    aproximação numérica da intensidade de raios X fluorescentes emitidos como:

    𝑌𝐾 = 9,54 × 104

    𝑅𝜔𝐾𝑐𝐴

    [𝑈0𝑙𝑛(𝑈0) − (𝑈0 − 1)] (48)

    Na equação acima, 𝜔𝐾 é o rendimento de produção de radiação fluorescente

    da camada K e 𝑐 =1

    (4𝜋𝜀0)2𝑁𝐴𝑘𝑍

    𝐴, sendo 𝑁𝐴 o número de Avogadro e 𝐴 o número

    de massa dos átomos que compõe o alvo e 𝑅 varia pouco com a energia do

    elétron.

    A fração fluorescente produzida indiretamente é corresponde à parte do

    espectro de fluorescência emitido pela excitação por fótons do espectro contínuo

    com energias superiores a 𝐸𝐾.

    Dyson (Dyson, 1990) afirma que cerca da metade dos fótons incidentes em um

    alvo com a forma convencional será absorvida pelo próprio alvo. Desta forma,

    tem-se:

    𝐹𝐾 =1

    2𝑁(ℎ𝜈 > 𝐸𝐾)𝑓𝐾 (49)

    Ona equação (49), 𝑓𝐾 = (𝑟𝐾 − 1) 𝑟𝐾⁄ é a proporção das interações dos raios X

    dentro do alvo que ocorrem com elétrons da camada K, sendo 𝑟𝐾 a razão da

    descontinuidade da absorção na borda K, relacionada à ocorrência do efeito

    fotoelétrico.

    O número de fótons produzidos por elétron incidente por intervalo de energia

    (em keV) para o espectro contínuo pode ser obtido, usando a equação (43),

    como:

  • 27

    𝑛(ℎ𝜈) =𝐶𝑍

    ℎ2(ℎ𝜈0 − ℎ𝜈)

    ℎ𝜈= 2,76 × 10−6𝑍

    (ℎ𝜈0 − ℎ𝜈)

    ℎ𝜈 (50)

    Assim,

    𝑁(ℎ𝜈 > 𝐸𝐾) = 2,76 × 10−6𝑍 ∫

    (ℎ𝜈0 − ℎ𝜈)

    ℎ𝜈𝑑(ℎ𝜈)

    ℎ𝜈𝑘

    ℎ𝜈0

    = 2,76 × 10−6𝑍ℎ𝜈𝑘[𝑈0𝑙𝑛(𝑈0) − (𝑈0 − 1)]

    (51)

    Usando a fórmula empírica

    ℎ𝜈𝐾 = 1,263 × 10−2(𝑍 − 2)2 [𝑘𝑒𝑉] (52)

    E considerando

    𝑟𝐾−1

    𝑟𝐾≈ 0,85 𝑝𝑎𝑟𝑎 30 ≤ 𝑍 ≤ 80 (53)

    Conclui-se que

    𝐹𝐾 = 1,46 × 10−8(𝑍 − 2)2𝑍𝜔𝐾[𝑈0𝑙𝑛(𝑈0) − (𝑈0 − 1)] (54)

    Assim, o número total de fótons de raios X fluorescentes provenientes de

    interações com a camada K produzidos por elétron incidente no alvo pode ser

    obtido adicionando as equações (47) e (55):

    𝑁𝐾 = 𝑌𝐾+𝐹𝐾

    = 𝜔𝐾 (9,54 × 104

    𝑅

    𝑐𝐴+ 1,46 × 10−8(𝑍 − 2)2𝑍) [𝑈0𝑙𝑛(𝑈0)

    − (𝑈0 − 1)]

    (55)

    Expressando a relação acima na forma de fótons por unidade de ângulo sólido

    (esterradianos) obtém-se (Dyson, 1990):

    𝑁𝐾4𝜋

    = 𝜔𝐾 (2,80 × 103

    𝑅

    𝑐𝐴+ 4,27 × 10−10(𝑍 − 2)2𝑍) (𝑈0 − 1)

    1,67 (56)

    Onde foi utilizada a relação semiempírica, válida para 1,5 ≤ 𝑈0 ≤ 16 com erro

    inferior a 10%:

    [𝑈0𝑙𝑛(𝑈0) − (𝑈0 − 1)] ≈0,365(𝑈0 − 1)1,67

    As últimas considerações a serem feitas com respeito à produção de

    raios X característicos referem-se às correções a serem adotadas devido à

    variação da produção de radiação deste tipo com a profundidade no alvo e

    devido a efeitos de auto-absorção. Assim, supondo que um elétron tem energia

    inicial 𝐸0 e atinge um alvo espesso, após atravessar uma distância 𝑥 no alvo, o

    número de ionizações pode ser representado por (Dyson, 1990):

    𝑌𝐾𝑑𝑥 = 𝜎𝐾(𝐸)𝑛𝑑𝑥 (57)

  • 28

    Usando a equação (33), pode-se escrever:

    𝜎𝐾𝐸𝐾2 =

    1

    (4𝜋𝜀0)22𝜋𝑒4

    𝐸𝐸𝐾

    𝑏𝐾𝑙𝑛[𝑈𝐾] =1

    (4𝜋𝜀0)22𝜋𝑒4

    𝑈𝐾𝑏𝐾𝑙𝑛[𝑈𝐾]

    Da equação (35), obtemos, por integração:

    𝐸 = 𝐸0(1 −𝑥

    𝑥0⁄ )1/2

    A equação (57) pode ser utilizada para representar a quantidade de ionizações

    por elétron incidente por unidade de comprimento do caminho percorrido em

    função da penetração dentro do alvo como

    𝑌𝐾𝑑𝑥 =1

    (4𝜋𝜀0)22𝜋𝑒4𝑛𝑏𝐾

    𝑈0𝐸𝐾2(1 − 𝑥 𝑥0⁄ )

    1/2𝑙𝑛 [𝑈0(1 −

    𝑥𝑥0⁄ )

    1/2] 𝑑𝑥 (58)

    Onde 𝑈0 =𝐸0

    𝐸𝐾⁄

    O retroespalhamento dos elétrons incidentes no alvo é o fator preponderante

    que afeta a produção de raios X característicos associados às camadas

    eletrônicas mais internas dos átomos do alvo. A produção deste tipo de radiação

    irá diminuir em profundidades maiores do alvo e irá aumentar sua produção em

    camadas mais superficiais do alvo (Dyson, 1990, Behling, 2015). O

    retroespalhamento, contudo, irá sempre ter um efeito redutor em relação à

    quantidade total que poderia ser produzida, em especial devido à perda de

    elétrons na superfície do alvo. O fator de redução, como apresentado

    anteriormente, é denotado por 𝑅.

    O tratamento adequado desta parte do problema da geração de

    radiação X por alvos espessos passa pela análise da razão entre a radiação

    emitida e a gerada dentro do alvo, ou seja:

    𝑓(ℎ𝜈, 𝜃) =∫ 𝐼(𝜌𝑧)𝑒−[𝜒(ℎ𝜈,𝜃)∙𝜌𝑧]𝑑(𝜌𝑧)

    0

    ∫ 𝐼(𝜌𝑧)𝑑(𝜌𝑧)∞

    0

    (59)

    Na equação (59), 𝜃 representa o ângulo de saída ou de observação dos raios

    X que emergem do alvo, 𝜒(ℎ𝜈, 𝜃) = (𝜇

    𝜌) (ℎ𝜈)𝑐𝑜𝑠𝑒𝑐(𝜃), sendo (

    𝜇

    𝜌) (ℎ𝜈) o

    coeficiente de atenuação mássico do material do alvo em função da energia dos

    fótons e 𝑧 representa a profundidade no alvo em que a radiação característica

    foi gerada. Dyson (Dyson, 1990) ressalta que, à medida que 𝑧 aumenta, a

    magnitude de 𝑥 progressivamente aumenta devido à maior obliquidade da

    trajetória do elétron, resultante de sua perda de energia.

  • 29

    O fator 𝑧 × 𝑐𝑜𝑠𝑒𝑐(𝜃) corresponde ao caminho percorrido pelos fótons dentro do

    alvo. Este mesmo tratamento foi adotado por Soole (Soole, 1972, Soole and

    Jager, 1970, Soole, 1971, Soole, 1977), na década de 1970, tanto para espectros

    contínuos quanto para a radiação característica. Esta mesma abordagem foi

    adotada, posteriormente, em modelos mais sofisticados para previsão de

    espectros de raios X e que serão tratados posteriormente neste texto (Tucker et

    al., 1991, Costa et al., 2007).

    Este tema foi amplamente estudado nas décadas de 1960 e 1970 por diferentes

    métodos. Green (Green, 1963) e Bishop (Bishop, 1965) trataram a questão

    através de simulação Monte Carlo, exemplificando os resultados através da

    interação de elétrons com alvos de cobre. Green obteve ainda, resultados para

    a distribuição angular e da anisotropia da radiação característica emergente

    deste tipo de alvo, correlacionando estes efeitos com auto-absorção da radiação

    (Green, 1964). Neste estudo, o autor demonstrou que a função definida em (59)

    é, aproximadamente, independente do número atômico.

    Green (Green, 1964) faz, ainda, um interessante tratamento para obtenção de

    curvas genéricas para as produções direta e indireta de radiação característica

    por diferentes materiais utilizados como alvo, considerando a auto-atenuação

    pelo material. Para isso, considera que, após o elétron atingir a uma

    profundidade na qual fenômenos de difusão dominam a trajetória do elétron

    dentro do alvo, o mesmo se movimenta de forma aleatória até alcançar uma

    energia cinética semelhante à energia térmica do meio. Assim, sendo 𝑙 o livre

    caminho médio do elétron e 𝑀 o número de eventos de espalhamento que

    ocorrem enquanto ele percorre este caminho, o alcance medido ao longo de sua

    trajetória pode ser dado por:

    𝑥 = 𝑀𝑙 = 𝑘𝐸𝑛 (60)

    Na relação (60) deve-se assumir que 1,7 ≤ 𝑛 ≤ 2 e 𝑘 é uma constante de

    proporcionalidade (Green, 1964). A penetração dos elétrons pode, então, ser

    definida como:

    𝑧 = 𝑙√𝑀 = 𝑙(𝑘𝐸𝑛)12 (61)

    Considerando a faixa de valores previstos para 𝑛, espera-se uma relação quase

    linear entre a penetração dos elétrons e a energia dos elétrons após estes

    alcançarem a condição de difusão. Dyson (Dyson, 1990) ressalta, ainda, que a

  • 30

    hipótese de aleatoriedade da trajetória dos elétrons é tanto melhor quanto maior

    o número atômico do meio, devido ao aumento da probabilidade de

    espalhamento devido ao potencial nuclear nestes casos.

    Para concluir a discussão sobre esse tema, é de interesse prático associar os

    resultados obtidos para a razão entre o espectro característico e o contínuo

    produzidos com o bombardeio de elétrons em um alvo espesso. Este tema será

    retomado posteriormente neste trabalho, em conexão com os trabalhos recentes

    com colaboração do autor (Lopez Gonzales et al., 2015, Bontempi et al., 2016).

    Aqui será apresentado, a título de introdução, a abordagem apresentada por

    Dyson (Dyson, 1990), baseado nos dados experimentais de Green (Green,

    1963) e Tothill (Tothill, 1968).

    Tothill apresenta resultados da razão entre a intensidade das linhas

    características 𝐾𝛼 = 𝐾𝛼1 + 𝐾𝛼2 e o espectro de radiação contínua para espectros

    obtidos com alvo de tungstênio e tensões de aceleração dos elétrons de até 250

    kV. Apresenta, também, uma interessante discussão teórica com base em

    resultados anteriores de outros autores, que compara com seus valores obtidos

    experimentalmente utilizando contadores proporcionais.

    A razão 𝑆, definida na equação (38), pode agora ser revista considerando a

    razão 𝐽𝑑 e ter as intensidades da radiação característica 𝐾𝛼 diretamente

    produzidas e a radiação contínua. Esta grandeza pode ser representada por:

    𝐽𝑑 = 2𝑆𝑓𝛼𝜔𝐾ℎ𝜈𝐾𝛼ℎ𝜈𝐾[𝑈0𝑙𝑛𝑈0 − (𝑈0 − 1)]𝐸02

    = 2𝑆𝑓𝛼𝜔𝐾ℎ𝜈𝐾𝛼ℎ𝜈𝐾

    [𝑈0𝑙𝑛𝑈0 − (𝑈0 − 1)]𝑈02

    (62)

    Para considerar a produção indireta de radiação característica, a equação (62)

    precisa ser multiplicada pelo fator (𝑃+1

    𝑃), como discutido na dedução da equação

    (47).

  • 31

    I. Bibliografia

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