processo no estado do paranÁ · cidadãos com plenos direitos: os homens livres e gregos de...
TRANSCRIPT
GESTÃO ESCOLAR E ELEIÇÕES DE DIRETORES: UMA REFLEXÃO SOBRE O
PROCESSO NO ESTADO DO PARANÁ
Autor: Luis Claudio Pereira1
Orientadora: Sônia Ana Charchut Leszczynski2
Resumo
O presente artigo é uma reflexão sobre o processo de escolha dos gestores escolares nos estabelecimentos de ensino público estadual no Paraná e sua contribuição para a democratização do espaço escolar. Ele analisa o significado da gestão democrática como expressão do anseio dos indivíduos que buscam alcançar a cidadania por meio da participação ativa. Discute democracia como um conceito e que como tal está situado no tempo e nos diversos espaços humanos e que se transforma historicamente. Debruça sobre alguns desses conceitos e busca aquele que melhor responde aos anseios da comunidade escolar (Chauí, Coutinho, Paro, Sposio) a gestão da escola pública e o grande desafio para sua democratização, discute a realidade escolar e a existência de correlação de forças de poder no interior dos estabelecimentos de ensino, entre os diversos sujeitos que neles atuam. Apresenta subsídios para construção de uma gestão escolar democrática de fato e de direito.
Palavras-chave: Democracia, Eleição, Gestão Escolar.
1 Professor PDE da Rede Estadual de Ensino do Paraná – Graduado em Filosofia; Especialização em Educação.
2 Professora PhD, Titular da UTFPR.
1
Introdução
Vimos que a Constituição Federal de 1988 institui o regime democrático em
nossa sociedade quando estabelece no seu artigo 1º “A República Federativa do
Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito [...]”, (Brasil, 1988, p. 13)
possibilitando ao seu povo participar como cidadão consciente ativo dos processos
de decisão e planejamento, execução e fiscalização das políticas públicas; como
trabalhador competente e ativo; como sujeito da luta pela equidade social interna;
como sujeito qualificado dos benefícios resultantes da riqueza nacional e como
mediador da solidariedade.
Assim entendemos que se faz necessário refletir sobre esta temática no
espaço escolar, objetivando construir a cidadania e uma sociedade democrática a
partir de ações verdadeiramente democráticas e não apenas nos aspectos teóricos,
citados em leis, documentos, princípios.
O objetivo do presente artigo é refletir sobre o processo de consulta de
escolha de diretores (eleição) nos estabelecimentos de ensino público estadual no
Paraná, bem como refletir sobre a necessidade da democratização do espaço
escolar.
Contextualização Histórica e Política da Democracia e da Gestão Escolar Democrática3
Para refletir sobre gestão democrática é relevante que nos debrucemos sobre
alguns conceitos de democracia e façamos uma viagem sobre a sua evolução
histórica.
Sabemos que ao conceituar democracia cada autor leva consigo, leituras,
experiências, posicionamento político-ideológico dentre outros elementos que
influenciam os sujeitos. Cabe-nos inicialmente uma reflexão sobre a origem e
3 Algumas das informações contidas correspondem ao conhecimento prévio do autor que é professor de história.
2
evolução histórica do conceito e sobre o ideal de democracia.
Para facilitar a compreensão do conceito de democracia, procuramos resgatar
um caminho que remonta aproximadamente ao ano 600 a.C., quando o legislador
Sólon formulou os princípios da política democrática para a cidade-estado de
Atenas, a chamada democracia clássica, onde se promoveu a emancipação dos
cidadãos gregos. É importante esclarecer que a concepção de democracia
desenvolvida inicialmente pelos gregos não é a mesma dos dias atuais.
Na Grécia antiga, a participação do cidadão ocorria de forma direta,
objetivando a criação e manutenção da vida em comunidade, ou seja, os interesses
individuais e pessoais submetiam-se ao interesse público e não vice-versa.
Os gregos dedicavam-se, de forma exclusiva a polis, no sentido de que os
indivíduos somente poderiam realizar-se como plenos cidadãos na e por meio dela.
Não havia divisão entre governo e cidadão, devendo cada qual estar envolvido no
processo de autogestão.
Apesar de a democracia grega ser para a época um sistema político
considerado bastante avançado, a realidade era outra, pois só eram considerados
cidadãos com plenos direitos: os homens livres e gregos de nascimento estavam
excluídos do processo de participação as mulheres que se encontravam numa
condição de submissão, escravos, estrangeiros e os gregos sem posses. “No
entanto, estes formavam a maioria esmagadora da população da polis ateniense
que, segundo algumas estimativas, agregavam um conjunto superior a 200 mil
habitantes” (VICENTINO e DORIGO, 2001, p. 64).
Dessa forma, podemos classificar a democracia grega como uma democracia
limitada e excludente, posto que mais de 80% da população estava excluída dela
(HELD, 1987).
Portanto, a democracia antiga apresentava-se conflitante, à medida que tinha
uma regra “includente” e “excludente” do processo de decisão política. Includente,
quando procurava envolver os cidadãos no fazer político, tornando-os responsáveis
pela administração do que é público em favor do bem comum. Excludente, quando
não faz uso da igualdade, divulgada como princípio democrático, já que deixa de
fora do processo todos aqueles caracterizados como inferiores, submissos e sem
direitos (CORDEIRO, 2006).
Entre democracia grega, moderna e a democracia contemporânea, tivemos
uma longa caminhada histórica com inúmeros acontecimentos que contribuíram para
3
uma reformulação do seu conceito e conteúdo original. Para não nos alongarmos
nesta análise podemos citar Thomas Hobbes (1588-1679) e Jean Jacques
Rousseau (1712-1778) que foram os filósofos, por excelência de uma nova visão de
democracia. Estes filósofos em suas idéias teorizaram sobre a representação e a
participação dos sujeitos na sociedade, preocupados com a legitimidade da ordem e
da autoridade política.
Embora a principal alusão à Hobbes é a de ser o filósofo do absolutismo, em
Hobbes podemos constatar três elementos legitimadores do ato político, que são: o
conhecimento, à vontade e o julgamento, para que o representante imbuído de
poder e autoridade promovam a ação política com legitimidade.
Neste aspecto entendemos que a teoria defendida por Hobbes assemelha-se,
particularmente, à democracia representativa contemporânea. O que significa dizer
que a representação é um tomar parte e fazer-se juntamente com outros, estando,
ao mesmo tempo, validando e abrindo espaço para articulação e participação de
todos no processo de escolha do dirigente.
Diferentemente da concepção de Hobbes, em Rousseau, a soberania é do
povo e não do governante investido do poder atribuído pelos governados. Ou seja,
ao representante cabe a ação política, efetivada a partir da autorização ou
delegação feita pelo povo, permitindo aquele que está sendo representada, sua
efetiva e contínua participação em manifestações públicas e até em atos que levem
a destituição do lugar de representante que é o caso do impeachment.
Sobre esta questão temos Chauí (1994, p 49.) que afirma:
Para Rousseau, o soberano é o povo, entendido como vontade geral, pessoa moral coletiva livre e corpo político de cidadãos... Assim sendo, o governante não é o soberano, mas o representante da soberania popular. Os indivíduos aceitam perder a liberdade civil: aceitam perder a posse natural para ganhar a individualidade civil, isto é, a cidadania. Enquanto criam a soberania e nela se fazem representar, são cidadãos. Enquanto se submetem às leis e à autoridade do governante que os representa chamam-se súditos. São, pois, cidadãos do Estado e súditos das leis.
Reforçando a tese de Chauí trazemos também para a reflexão as
considerações de Aranha e Martins (1992), quando atentam que para Rousseau a
democracia se dá de forma direta ou participativa por meio de assembléias
constantes. O povo é soberano, é nele que está o poder de eleger seus governantes
4
e também de destituí-los. O senhor não é o governante, e sim o povo.
Convém ficarmos atento ao alerta da filósofa Marilena Chauí, quando ela
reflete sobre a prática democrática na contemporaneidade e observa que a
democracia é muito frágil no sistema capitalista e serve para reforçar as
desigualdades, sendo considerada por muitos críticos como um mito, “a democracia,
modelada sobre o mercado e sobre a desigualdade sócio-econômica, é uma farsa
bem sucedida, visto que os mecanismos por ela acionados destinam-se apenas a
conservar a impossibilidade efetiva da democracia.” (CHAUÍ, 1997, P. 41). Nesse
sentido democracia é instrumento ideológico do sistema que permite a sua
manutenção do status-quo4.
Coutinho afirma que democracia está relacionada à igualdade de condições
de vida para todos os sujeitos. Segundo ele a democracia é o: “regime que assegura
a igualdade, a participação coletiva de todos na apropriação dos bens coletivamente
criados” (COUTINHO, 2001, p. 20).
Michael Apple também ressalta que a discussão sobre a democracia,
encontra grandes dificuldades porque o: “significado de democracia é [...] ambíguo
[...] e a conveniência retórica dessa ambigüidade é mais evidente do que nunca”
(APPLE, 1997, p. 15) isto porque, tem se prestado a palavra democracia os mais
diversos usos permitindo muitas vezes manobras até autoritárias.
Entre as possibilidades e a verdadeira concretização da participação
democrática acreditamos que existe ainda um caminho longo e de lutas a percorrer,
passando, inclusive e, primordialmente, pela formação de todos para e pela
democracia, ainda não experimentamos a democracia plena em nossa sociedade
vista a desigualdade reinante entre os sujeitos.
Como ressalta Chauí (1999, p. 432), citando Aristóteles e Marx:
[...] a mera declaração do direito à igualdade não faz existir os iguais, mas abre o campo para a criação da igualdade, através das exigências e demandas sociais. Em outras palavras, declarado o direito à igualdade, a sociedade pode instituir formas de reivindicação para criá-lo como direito real.
Assim optamos por discorrer acerca do termo democracia, no sentido de
4 Manutenção de uma dada situação social.
5
oferecer um caminho teórico para embasamento da nossa pesquisa, tendo em vista
que o foco da nossa discussão é a democratização da gestão escolar a partir da
participação dos diversos sujeitos e segmentos que compõe a comunidade escolar,
tendo como eixo provocador inicial o processo de eleições diretas para diretores das
escolas públicas estaduais do Paraná.
Considera-se um grande passo no cotidiano escolar já que os sujeitos
envolvidos podem participar do processo de discussão e escolha do novo gestor.
Também se abre um canal de participação na gestão escolar, uma vez que a
comunidade escolhe o dirigente e torna-se corresponsável pela sua gestão, através
do planejar, deliberar, avaliar e acompanhar as principais ações do dia-a-dia escolar,
tanto do campo pedagógico, como no administrativo e financeiro.
Entendemos que estes são marcos que fundamentam a participação efetiva
da comunidade na gestão escolar, voltada para a busca da qualidade do ensino
público.
Mas alguns obstáculos se apresentam como inibidores da participação dos
vários segmentos da comunidade escolar na gestão da escola pública, dentre eles,
como ressalta Paro (1996), “os condicionantes institucionais” que se verificam na
maneira como se dão as relações no interior da escola e que papel desempenha o
diretor na distribuição do poder e autoridade.
Ainda temos que tomar muito cuidado devido aos resquícios de autoritarismo
presente na função do gestor e ainda na cultura de não participação, historicamente
construída em nossa sociedade, não por vontade própria, mas sim por
condicionantes externos.
A comunidade ao eleger o diretor exerce uma ação democrática. Concretiza-
se um processo participativo. Verifica-se em alguns casos que após ser eleito o
diretor torna-se a autoridade única no interior da escola, imbuído deste poder ele
acumula todas as funções em suas mãos, as de planejar, deliberar e executar, entre
outras, pois este entende que lhe foi transferido amplos poderes e agora com tal
autoridade, tudo pode. Parece até que existe um consenso entre aqueles que o
elegeram e o eleito, como ocorre no processo eletivo dos demais cargos públicos de
representatividade, uma vez que eleito ele abarca todo o poder e distancia-se das
bases, ou seja, percebe-se a democracia no processo eleitoral, mas não garante a
mesma democracia durante a gestão.
Em muitos casos percebe-se um mandato autocrático e não democrático, um
6
desvirtuamento na prática da democracia na medida em que os interesses pessoais
ou corporativos representam prioridades na gestão do diretor, que acaba burlando e
fugindo do processo de construção da democracia no interior da escola.
Segundo Paro “o fato de alguém ser investido de autoridade, ou seja,
probabilidade de ter cumpridas ordens, não significa que essas ordens representem
a sua vontade”. (PARO, 1996, p. 77) e como afirma Chauí:
O poder não se identifica com os ocupantes do governo, não lhes pertence, mas é sempre um lugar vazio, que os cidadãos, periodicamente, preenchem com um representante, podendo revogar seu mandato se não cumprir o que lhe foi delegado para representar (1999, p. 432).
Para SPÓSITO (1996, p. 55) se faz necessário o amplo diálogo no interior da
escola como expressão de relações divergentes e conhecimentos específicos para
construir caminhos para formação de uma nova geração.
O consenso não é ponto de partida para a interação dos protagonistas, pois apenas obscurece a diversidade; ele deve ser buscado numa trajetória que comporte a discussão, o conflito; enfim o consenso e as decisões devem ser construídas coletivamente.
A eleição de diretores para as escolas públicas estaduais não deve ter o
objetivo em si mesma, mas, como toda a ação que se propõe para uma instituição
escolar, contribuir para a formação integral do aluno, incluindo a educação para a
cidadania.
Devemos despertar o educando para a cidadania, procurando com isso
promover a sua emancipação cultural, religiosa e política.
Constata-se que os sujeitos de direitos no mundo atual estão menos
participativos. Entendemos que se faz necessário e urgente intensificar a prática
política democrática no interior das escolas, devendo educando e educadores
reivindicar, escolher, fazer parte, planejar, decidir, bem como ter voz e vez e projetar
essa prática para o exterior da escola, à sociedade em geral.
Objetivamos uma escola pública democrática, em que as decisões são
tomadas, de forma coletiva, num ambiente de respeito às diferenças, contribuindo
7
para que todos se sintam como afirma Bordenave “donos da escola” e responsáveis
por tudo o que nela venha a acontecer, ou seja, arcando, de maneira conjunta, com
“bônus e ônus” (BORDENAVE, 1985).
Assim acreditamos que a gestão escolar democrática é uma ferramenta para
democratização e melhoraria da escola pública e da sociedade, pois ela proporciona
no espaço escolar a discussão, o planejamento, à decisão, a coordenação e
execução de ações, o acompanhamento, a avaliação e o controle das ações
voltadas para o desenvolvimento escolar. Como afirma Souza, Silva, Gouveia e
Schwendler quando dizem que gestão democrática é:
Um processo político-pedagógico de discussão e planejamento, decisão, coordenação e execução de ações, acompanhamento, controle e avaliação do conjunto das ações voltadas ao desenvolvimento da escola. Este processo, sustentado no diálogo, tem como base a participação efetiva de todos os seguimentos da comunidade escolar, a constituição democrática de regras para o processo decisório que considere a vontade da maioria, mas com o respeito às posições minoritárias desta comunidade e a garantia de amplo acesso às informações aos sujeitos da escola (Souza, Silva, Golveia e Schwendler, 2005, p.).
Este processo tem como base a participação efetiva de todos os segmentos
da comunidade escolar, que considera a vontade da maioria e respeitando as
posições minoritárias. A escola deve ter em conta que o desenvolvimento da
cidadania de seus alunos se constrói num grupo social através de experiências e
não apenas de teorias.
A escola necessita romper com a cultura do autoritarismo e promover a
cultura da democracia, onde todos devem estar envolvidos nas escolhas e no
transcorrer dos mandatos. O diálogo deve permear a gestão. Esse diálogo precisa
ser dialético, onde diferentes segmentos apresentam suas posições e confrontam
opiniões objetivando a formação de uma cultura da participação.
Acreditamos que a democracia posta em prática no interior da escola terá um
valor didático-pedagógico para a sociedade, contribuindo com a formação de
cidadãos participativos e conscientes de seus direitos e de suas responsabilidades.
A escolha dos dirigentes escolares por processo eletivo encontra respaldo
nas considerações de Bordignon e Gracindo, que afirmam: “[...] essa escolha tem
sido encarada como um compromisso coletivo e um importante instrumento para a
8
construção da gestão democrática” (2000, p. 164), e acrescenta ainda: “Gestão
democrática é o processo de coordenação das estratégias de ação para alcançar os
objetivos definidos e requer liderança centrada na competência, legitimidade e
credibilidade” (2000, p.165).
A democratização da escola ultrapassa a pura participação da comunidade
escolar na tomada das decisões ela tem um horizonte superior uma vez que deve
buscar a democratização do conhecimento produzido e acumulado historicamente,
que no dizer de:
A eleição de diretores e diretoras não pode ser, sozinha, indicador de que a gestão da escola é democrática. É fundamental, para que a democracia se instale no sistema público de ensino, que seja assegurado a todos os alunos e alunas o acesso ao conhecimento, seja ele ou ela proveniente de qualquer parte do país, originário desta ou daquela classe social, deste ou daquele grupo étnico, seja católico, evangélico, umbandista ou judeu. É preciso, ainda, que o poder público tome verdadeiramente a seu cargo a função de oferecer as condições materiais e pedagógicas para que os professores realizem o seu trabalho de educar as novas gerações, além de desenvolver políticas concretas de capacitação dos profissionais que administram as escolas de seu sistema, criando mecanismos institucionais para um eficiente e eficaz planejamento, coordenação, acompanhamento e avaliação da ação educativa e de controle da aplicação dos recursos públicos de que a escola vier a dispor (DEMO, 1997, p.109).
Princípios éticos e legais
O princípio de gestão escolar democrática, encontramos expresso no artigo
206, inciso VI da Constituição Federal, onde se lê “O ensino será ministrado com
base nos seguintes princípios: VI – gestão democrática do ensino público, na forma
da lei” e também está reafirmado no artigo 3º, inciso VIII da LDB - Lei de Diretrizes e
Bases da Educação - 9694/96: “gestão democrática do ensino público, na forma
desta lei e da legislação dos sistemas de ensino” o que estabeleceu mudanças
significativas na organização e administração das escolas no país.
Encontraremos algumas indicações no artigo 14 da LDB, onde diz que para a
democratização da gestão escolar é necessário: “I – participação dos profissionais
da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II – participação das
comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes”.
9
No estado do Paraná, temos a lei 14231/203 publicada no DOE sob nº 6615
de 27/11/2003 estabelece os critérios de escolha, mediante a consulta Comunidade
Escolar, para designação de diretores e diretores auxiliares da Rede Estadual de
Educação Básica do Paraná, sendo posteriormente alterada pela lei 15.329 de 15 de
Dezembro de 2006.
Observamos no Estado do Paraná que com a aprovação desta lei, que houve
um avanço significativo para a construção coletiva de uma gestão escolar
democrática.
O provimento do cargo de diretor das unidades escolares sofreu uma
mudança profunda na maioria das escolas, diretores e diretoras com raras
exceções, agora são indicados pela própria comunidade escolar e não mais pelo
chefe do executivo estadual sob influência político-partidária.
Esta indicação que em outros momentos históricos objetivava vantagens
eleitoreiras agora é feita através de um processo democrático interno a cada três
anos, que permite a comunidade escolar à participação direta na escolha do gestor
do triênio.
Instâncias democráticas no interior da escola
Ao analisarmos a gestão democrática, devemos considerá-la como elemento
da organização de um sistema descentralizado, no qual a instituição tenha
autonomia de decisão financeira, pedagógica e administrativa, e conte,
efetivamente, com a participação de seus membros para tomar decisões coletivas. A
descentralização, a autonomia e a participação são categorias fundamentais para se
concretizar a gestão democrática.
Os estabelecimentos públicos estaduais do Paraná dispõem de instâncias
colegiadas que podem propiciar uma participação mais efetiva da comunidade
escolar. Percebe-se que é até uma exigência formal possuirmos no interior das
escolas, Conselhos Escolares, Associação de Pais Mestres e Funcionários
(APMFs), Grêmios Estudantis e Conselho de Classe. Conforme segue as
características e funções de cada órgão:
10
a) Conselho Escolar: Instância máxima que cotidianamente coordena a
gestão escolar sendo responsável pelo estudo, planejamento, debate,
deliberação, acompanhamento, controle e avaliação das ações da escola no
campo pedagógico, administrativo e financeiro. Pais, professores, alunos,
funcionários, direção, equipe pedagógica e comunidade organizada, reúnem-
se para sugerir medidas e/ou para tomar decisões.
b) Associação de Pais, Mestres e Funcionários (APMF): Um órgão de
representação dos Pais, Mestres e Funcionários que busca a integração dos
segmentos escolares, para discutir as políticas educacionais e o Projeto
Político-Pedagógico da escola Pública, visando a melhoria da qualidade do
ensino.
c) Grêmio estudantil: Órgão máximo de representação dos estudantes a
serviço da ampliação da democracia na escola, por meio das suas funções de
representação e organização dos alunos, contribui para a efetivação de uma
educação emancipatória e transformadora.
d) Conselho de Classe: Órgão colegiado, presente na organização da
escola, em que os professores das diversas disciplinas, juntamente com a
direção, equipe pedagógica e alunos representantes de turma, reúnem-se
para refletir, avaliar e propor ações no processo pedagógico da escola.
Todos esses são espaços colegiados que podem representar ativamente os
diversos seguimentos que compõe a comunidade escolar formada por professores,
pedagogos, funcionários, pais, alunos e representação da comunidade.
Cabe esclarecer que esses órgãos existentes no interior das escolas podem
apresentar distorções quanto à sua formação e composição. Uma vez que na
escolha dos membros pode ocorrer influência da direção da escola, de grupos
corporativos ou de segmentos com interesses específicos. Justificada em razão da
cultura de participação estar ligada a condicionantes burocráticos e poucos
democráticos, ou seja, podem se apresentar como instrumentos de manipulação,
para o diretor e para os demais membros da comunidade escolar, variando a
capacidade de manipulação conforme o peso de cada um na correlação de forças.
11
A possibilidade de manipulação dos conselhos decorre, logicamente, da
inexistência de políticas de formação que, estrategicamente, subsidiem essa
instância, mediante a criação de condições de participação de todos nas tomadas de
decisão.
Entre as possibilidades e a verdadeira concretização da participação
democrática acreditamos que existe ainda um caminho longo e de lutas a percorrer,
passando, inclusive e, primordialmente, pela formação de todos para e pela
democracia, ainda não experimentamos a democracia plena em nossa sociedade
vista a desigualdade reinante entre os sujeitos.
A participação da escola e do Grupo de Trabalho em Rede (GTR)
Em nossa pesquisa sobre a questão da gestão escolar democrática,
contamos com a participação dos professores das escolas públicas estaduais do
Paraná, onde tais profissionais tiveram a oportunidade de expor suas opiniões e
conceitos sobre a democracia no espaço escolar, o que nos proporcionou um
contato mais amplo com profissionais da educação de todo o Estado.
No primeiro fórum do GTR, que teve como titulo a democracia no espaço
escolar, o objetivo foi de promover uma discussão sobre a democracia no espaço
escolar, partindo do principio que a eleição de diretores não eliminou o autoritarismo
existente no interior da escola pública, não efetivou a democracia por si só. Assim
propomos o seguinte questionamento no fórum: “Como podemos tornar a escola
pública efetivamente democrática? Como a eleição de diretores pode contribuir para
o exercício da cidadania e da democracia no espaço escolar e na sociedade em
geral?”.
No segundo Fórum, após a leitura da unidade didática foi apresentado a ideia
de socializar no fórum de discussão as observações referente à produção Didático-
Pedagógica, a fim de produzir um material mais consistente e fundamentado sobre
como efetivar uma gestão escolar verdadeiramente democrática.
O terceiro fórum teve como objetivo refletir as questões que aplicamos aos
professores durante a intervenção pedagógica realizada na escola. Foi recomendo
aos participantes que as respostas fossem de cunho pessoal, sem embasamento
12
teórico cientifico, para que depois num segundo momento as mesmas questões
fossem respondidas com auxilio bibliográfico, promovendo assim um estudo
comparativo entre o senso comum apresentado originariamente e com posterior
fundamentação teórica cientifica, como ocorreu quando da intervenção na escola.
Esse foi um momento muito importante para o desenvolvimento do trabalho
no PDE, pois despertamos entre os diversos participantes o desejo pela superação
do senso comum e a busca do senso crítico baseado no conhecimento científico.
Apresentamos a seguir as questões aplicadas aos participantes do grupo de
estudo durante a intervenção pedagógica no estabelecimento de ensino:
1 – Qual é a sua concepção sobre Democracia?
2 – Qual é a sua concepção sobre Gestão Escolar Democrática?
3 – Como deve ser a participação da Comunidade na Gestão Escolar?
4 – Quem é responsável pela efetivação da Democracia no interior da escola?
Durante a aplicação da proposta de intervenção pedagógica realizada na
escola e nos fóruns do GTR, realizamos os seguintes procedimentos: aos dois
grupos encaminhamos o mesmo questionário contendo questões objetivas e/ou
subjetivas.
No primeiro questionamento nossa intenção foi a de buscar a visão que cada
participante tinha sobre o conceito de democracia, pedimos para que o questionado
escolhesse entre as alternativas qual era a melhor concepção de democracia ou que
este apresentasse sua própria concepção.
Obtivemos 50% dos entrevistados optando pela alternativa “c” onde
propúnhamos a seguinte afirmação que democracia é uma forma de gestão onde
todos são envolvidos no processo de tomada de decisões e responsáveis pela
execução do que foi aprovado.
Outros 37% optaram pela alternativa “a” onde se afirmava que democracia é
uma forma de gestão onde todos participam na tomada das decisões e os 13%
restante optaram pela alternativa “d” onde o entrevistado deveria apresentar
subjetivamente sua própria concepção sobre democracia.
13
Percebemos que os 50% dos entrevistados optaram pela alternativa que
afirmava que democracia é um processo contínuo de participação co-responsável
em que deve haver envolvimento contínuo e que todos devem atuar como
protagonistas e não figurantes.
Enquanto que 37% acreditam que no processo democrático basta a
participação num primeiro momento e de certa forma delegar a execução a outro.
No espaço que foi reservado para livre manifestação sobre o conceito que
cada um possuía sobre democracia tivemos a abstenção de13% dos entrevistados.
Na segunda questão fomos específicos em querer saber sobre a concepção
de gestão escolar democrática de cada um. A questão proposta foi aberta, ou seja,
cada participante teve a oportunidade de apresentar uma concepção própria.
Tivemos os seguintes resultados:
– “Na minha concepção o gestor deve estar presente em todos os setores da escola, com os funcionários, alunos, professores, equipe pedagógica atendendo as reivindicações, os questionamento, as dúvidas. ”(Professor 01)
– “Onde todos participam na tomada de decisões, ou seja, direção escolar, docentes e o corpo administrativo e a comunidade envolvida com a escola.” (Professor 02)
– “Uma gestão participativa, onde a tomada de decisões, devem ser analisada por todos.” (Professor 03)
– “É quando é levado em conta a opinião e necessidade das pessoas envolvidas.” (Professor 04)
– “Gestão democrática é aquela em que de alguma forma todos participam das decisões. Mais do que hierarquia há papéis a serem exercidos.” (Professor 05)
– “Gestão escolar democrática é uma forma de gestão onde todos são envolvidos no processo de tomada de decisões, responsáveis pela execução e resultado do que foi aprovado.” (Professor 06)
– “É o conceito onde a participação da comunidade APMF, Conselho Escolar e o corpo docente atua de forma integral, participando das decisões escolares, fiscalizando e principalmente propondo soluções e ideais para o ambiente escolar”. (Professor 07)
– “É onde a comunidade escolar participa das decisões em âmbito escolar.” (Professor 08)
Outra pergunta que fizemos foi sobre a participação da comunidade escolar
14
na gestão escolar, propomos três alternativas: Dever ser representativa, direta ou
participativa e mista.
Tivemos 63 % optando pela terceira opção, ou seja, mista, onde ora a
comunidade participa das decisões, ora delega amplos poderes ao gestor.
Outros 25% responderam que a participação da comunidade deve ser
representativa, onde o diretor é escolhido e tem a incumbência de administrar a
escola.
Apenas 12% optaram pela opção direta/participativa, onde a comunidade
participa ativamente de todas as decisões pertinentes a escola.
Na quarta questão pedimos aos professores que posicionarem se a eleição
do diretor da escola garantiria a democratização da escola. Transcrevemos as
respostas a seguir:
– “Não garante, porque muitas vezes o próprio diretor se apóia no cargo durante anos e não dá abertura para outros se elegerem. Acho que cada candidato não deveria se reeleger, porque em muitas vezes acaba se tornando maquiavélico.” (Professor 01)
– “Sim, você tem a opção de escolher o seu representante, ou seja, aquele que vai representá-lo em suas reivindicações.” (Professor 02)
– “Não, porque muitos diretores não tem comprometimento.” (Professor 03)
– “Não é garantia de a direção ser democrática e às vezes sim, ser autoritária.” (Professor 04)
– “Não, o voto apenas é um elemento da democracia.” (Professor 05)
– “Não, após eleger a direção, a comunidade escolar deve continuar participando da administração escolar. Deve participar e acompanhar principalmente o processo ensino aprendizagem.” (Professor 06)
– “Não, muitas vezes a eleição passa pelo fator interesse no poder político, prejudicando o andamento da escola e ainda divide o corpo docente.” (Professor 07)
– "Não, nem sempre a eleição garante a democracia.” (Professor 08)
Na última questão procurei saber o que cada professor pensava sobre a
responsabilidade da criação de um ambiente democrático na escola, obtive as
seguintes respostas:
15
– “Todos são responsáveis, porque quem elege o diretor e todos. E o diretor representa todos, mas ele não deve tomar a decisão sozinho ele deve pedir a participação de toda comunidade.” (Professor 01)
– “Todos aqueles envolvidos no processo: diretor, docentes, funcionários, alunos e a comunidade que participa.” (Professor 02)
– “Todos são responsáveis por ela.” (Professor 03)
– “Todos, pois há necessidade de envolver a comunidade escolar e aceitar opiniões diversas.” (Professor 04)
– “A comunidade e os mais diversos segmentos da comunidade.” (Professor 05)
– “Toda comunidade escolar é responsável pela construção democrática da escola, que tem como objetivo principal ofertar ensino de qualidade, com respeito às diversidades.” (Professor 06)
– “Os professores comprometidos com o trabalho e a direção mostrando liderança.” (Professor 07)
– “Todos são responsáveis, mas o diretor deve orientar as ações.” (Professor 08)
Tanto no grupo de estudos realizado com os professores do estabelecimento
de ensino durante a intervenção bem como entre os participantes dos fóruns, nos
deparamos com uma diversidade de opiniões e conceitos sobre democracia e
gestão escolar democrática, o que foi muito oportuno para o exercício da cidadania.
16
Considerações finais
O presente artigo teve por objetivo apresentar brevemente a questão da
gestão escolar democrática face o processo de consulta de diretores para o
estabelecimento de ensino.
A presente pesquisa não esgota o assunto, se trata apenas de um olhar a
partir do chão da escola, sendo apresentado neste artigo os conceitos e opiniões
dos colegas professores da rede pública estadual do Paraná.
O processo de consulta para diretores nas escolas públicas do Estado do
Paraná para se caracterizar como democrático deve possibilitar disputas mais
legítimas. Entendendo que o cargo de diretor deve ser atribuição da comunidade
escolar e de natureza política e transitória e que a permanência de quaisquer
pessoas no poder contraria os princípios democráticos, cria vícios que interferem
nas relações institucionais e impedem a formação de novas lideranças.
Entendemos que cabe ao gestor e a comunidade escolar desenvolver ações
que visem para a condução da democracia no espaço escolar e social, rompendo
com o tradicional autoritarismo ainda presente em muitos estabelecimentos, ou seja,
gestor e comunidade escolar devem estar incluídos nesse processo de construção
da cidadania, tendo como principio básico a democracia.
Embora a eleição de diretores de escola não garanta por si só a
democratização do espaço escolar, devemos entendê-la como momento significativo
para o exercício da cidadania e de participação efetiva da comunidade escolar, um
caminho que se faz caminhando.
17
Referências
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. São Paulo: Moderna, 1992.
BORDIGNON, GRACINDO, Regina Vinhaes. Gestão da educação: o município e a escola. In: FERREIRA, Naura Syria Carapeto; AGUIAR, Márcia Ângela da S. (Orgs.).
Gestão da educação: impasses, perspectivas e compromissos. São Paulo: Cortez, 2000.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, n° 9394. Brasília, 1996.
CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 1994.
CORDEIRO, Noemi Alencar Araripe. Eleição de Diretores: a participação dos segmentos escolares no processo de democratização da gestão escolar. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2006.
COUTINHO, C. N. A democracia na batalha das idéias e nas lutas políticas do Brasil de hoje. Petrópolis, Vozes, 2002.
DEMO, Pedro. A nova LDB: ranços e avanços. Campinas: Papirus, 1997.
_________. Participação é conquista. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1988.
DEMO, Pedro. Participação é conquista. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1988.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Cortez, 1997.
HELD, David. Modelos de Democracia. Belo Horizonte: Paidéia, 1987.
HOBBES, Thomas. Leviatã. Trad. João Paulo Monteiro e Beatriz Nizza da Silva. São Paulo:Nova Cultura, 1999.
PARO, Vitor Henrique. Eleição de diretores: a escola pública experimenta a democracia. Campinas, Papirus, 1996.
__________. Gestão Democrática da Escola Pública. São Paulo: Ática, 2004.
18
__________. A utopia da gestão escolar democrática. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 60, p. 51-53, 1987.
__________. Administração escolar: introdução crítica. São Paulo, Cortez: Autores Associados, 1986.
ROUSSEAU, Jean Jacques. Do contrato social. Trad. Lourdes Santos Machado. São Paulo: Nova Cultura, 1999.
SÁNCHEZ VÁZQUEZ, Adolfo. Filosofia da práxis. 2.ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977.
SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia, Cortez,1984.
SOBRINHO, José & MARRA, Fátima (org.). Gestão escolar: desafios e tendências. Brasília, Ipea. (Série Ipea, 145). p. 107-122.
SOUZA A. R, SILVA M.R, GOUVEIA A.B, SCHWENDLER S.F. Gestão da Escola Publica. Caderno 1: Gestão da Escola Publica. Curitiba: Editora da UFPR, 2005.SPÓSITO, M. P. O povo vai a escola. São Paulo: Loyola, 1984.
VICENTINO, Cláudio e DORIGO, Gianpaolo. História para o Ensino Médio: História Geral e do Brasil. São Paulo, Scipione, 2001.
ZABOT, Nircélio. Eleições para Diretores Escolares; uma importante conquista democrática. Revista Brasileira de Administração da Educação, Porto Alegre, v. 2, n. 1, p. 88-91, 1984.
19