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DISSERTAÇÃO ARTIGO DE REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e em outros países Susana Gonçalves Fernandes Lareiro Mestrado Integrado em Medicina 6º ano Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar Universidade do Porto Centro Hospitalar do Porto ORIENTADOR Dr. Humberto José da Silva Machado Porto 2013/2014

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DISSERTAÇÃO

ARTIGO DE REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais

no trauma em Portugal e em outros países

Susana Gonçalves Fernandes Lareiro

Mestrado Integrado em Medicina – 6º ano

Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar

Universidade do Porto

Centro Hospitalar do Porto

ORIENTADOR

Dr. Humberto José da Silva Machado

Porto 2013/2014

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

1

Dissertação apresentada ao Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar

para obtenção do grau de Mestre em Medicina.

Título: Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados

assistenciais no trauma em Portugal e em outros países

Orientador: Dr. Humberto José da Silva Machado

Chefe de Serviço - Diretor do Serviço de Anestesiologia do CHP

Afiliação: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Rua de Jorge Viterbo Ferreira

n. 228, 4050-313 Porto

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

2

Agradecimentos

Aos meus Pais, pela educação e por todas as oportunidades que me proporcionaram

sempre!

Ao meu Irmão, pela paciência e boa disposição.

Ao Pedro, pelo incentivo e carinho prestado em todas as etapas deste trabalho.

Ao Dr. Humberto, pela ajuda incessante, pela disponibilidade e simpatia constantes.

Ao ICBAS, ao CHP e aos seus Profissionais pelo tempo dedicado ao ensino.

Aos meus Colegas que tornaram esta viagem tão agradável.

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

3

Resumo

A organização dos sistemas de urgência e trauma tem sido exaustivamente

discutida no mundo. Diversos modelos têm sido propostos, principalmente pelos países

desenvolvidos. Embora exista um consenso em relação à necessidade e aos grandes

benefícios trazidos pela organização dos sistemas de urgência e trauma, ainda não

existem evidências quanto à supremacia de um único modelo.

Esta revisão bibliográfica pretende comparar as principais diferenças e

semelhanças na organização dos cuidados assistenciais, no trauma, em Portugal e em

outros países. Será abordado todo o processo, desde o atendimento pré-hospitalar,

passando pela triagem do doente com trauma e por fim do acompanhamento intra-

hospitalar, tendo em vista a multidisciplinaridade e competência das diferentes

especialidades e do melhor interesse do doente.

É feita uma visão geral dos sistemas de assistência médica Anglo-Americano e

Franco-Alemão que têm influenciado um número substancial de países ao redor do

mundo na estruturação dos seus cuidados pré-hospitalares e sistemas de emergência

médica. Países selecionados pelo seu grau de desenvolvimento e organização de

serviços médicos de emergência são abordados mais profundamente. Estes países

incluem os Estados Unidos da América, Canadá, França, Alemanha, Reino Unido,

Portugal e Israel.

A emergência médica é uma especialidade em evolução. Diferentes modelos

existem em diferentes partes do mundo. Não há evidência de que um modelo seja

melhor do que o outro, uma vez que é difícil ter estudos randomizados. Deve-se insistir

no registo de dados para avaliação e comparação dos diferentes sistemas de

emergência.

Palavras-Chave: emergência médica, serviços de emergência médica, organização

de sistemas de trauma, suporte avançado de vida.

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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Abstract

The organization of the emergency and trauma systems have been thoroughly

discussed in the world. Several models have been proposed, mainly by developed

countries. While there is consensus about the need and the great benefits of organizing

the emergency and trauma systems, there isn’t yet no evidence of the supremacy of a

single model.

This literature review aims to compare the similarities and differences in the

organization of supportive care, in trauma, in Portugal and other countries. The whole

process will be covered, from pre-hospital care, through the screening of patients with

trauma and finally the intra-hospital monitoring, having concerned the multidisciplinary

and competence of the different specialties and the best interest of the patient.

An overview of Anglo-American and Franco-German medical care, that have

influenced a substantial number of countries around the world in the structuring of their

pre-hospital care and emergency medicine systems, is made. Selected countries by their

level of development and organization of emergency medical services are covered more

deeply. These countries include the United States, Canada, France, Germany, United

Kingdom, Portugal and Israel.

Emergency medicine is an evolving specialty. Different models exist in different

parts of the world. There is no evidence that one model is better than the other, since it

is difficult to have randomized trials. We must insist on registration data for evaluation

and comparison of the different systems of emergency.

Key-words: emergency medicine, emergency medical services, organization of trauma

systems, advanced life support.

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

5

Ìndice

Introdução .................................................................................................................................7

Material e Métodos ..................................................................................................................9

Resultados ..............................................................................................................................10

Modelo Franco-Alemão ......................................................................................................10

Modelo Anglo-Americano ...................................................................................................10

Modelo dos Estados Unidos da América .........................................................................11

Modelo do Canadá ..............................................................................................................13

Modelo da França ................................................................................................................15

Modelo da Alemanha ..........................................................................................................16

Modelo do Reino Unido ......................................................................................................18

Modelo de Portugal .............................................................................................................20

Modelo de Israel ..................................................................................................................22

Discussão................................................................................................................................25

Conclusão ...............................................................................................................................28

Bibliografia..............................................................................................................................29

Anexos .....................................................................................................................................34

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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Lista de Abreviaturas

SEM - Serviço de Emergência Médica

SBV - Suporte Básico de Vida

SAV - Suporte Avançado de Vida

OMS - Organização Mundial de Saúde

TEM - Técnico de Emergência Médica

EUA - Estados Unidos da América

ATLS - Advanced Trauma Life Support

ACLS - Advanced Cardiac Life Support

BLS - Basic Life Support

PALS - Pediatric Advanced Life Support

PHTLS - Pre-Hospital Trauma Life Support

NOPC - National Occupation Competency Profiles for paramedic practitioners

EMR - Emergency Medical Responder

PCP - Primary Care Paramedic

ACP - Advanced Care Paramedic

CCP - Critical Care Paramedic

ECG - Eletrocardiograma

IV - Intra-venoso

DAE - Desfibrilhador Automático Externo

SAMU - Serviço d'Aide Médicale d'Urgence

UTIM - Unidade de Terapia Intensiva Móvel

SMUR - Service Mobile d’Urgence et de Réanimation

RCP - Ressuscitação Cardio-Pulmonar

DE - Departamento de Emergência

INEM - Instituto Nacional de Emergência Médica

PSP - Polícia de Segurança Pública

GNR - Guarda Nacional Republicana

CODU - Centro de Orientação de Doentes Urgentes

MDA - Magen David Adom

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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Introdução

A Europa desde cedo foi um solo fértil para a ressuscitação cardiopulmonar e o

atendimento médico de emergência. As sangrentas guerras no continente Europeu

(como na América do Norte) estimularam o estabelecimento de serviços médicos de

emergência para os militares e civis. Mais tarde surgiram também as organizações não-

governamentais como a Cruz Vermelha. A Europa tem produzido muitos dos

verdadeiros pioneiros da ciência da reanimação: Vladimir Negovsky, Peter Safar e

também Fritz Ahnefeld que introduziu o conceito universal da Cadeia de Sobrevivência.

A investigação europeia tem influenciado significativamente a gestão da morte

súbita e a síndrome coronária aguda, frequentemente subjacente: desfibrilhação, (JL

Prévost and F Batelli, Geneva 1899), cuidados cardíacos pré-hospitalares (Frank

Pantridge, Belfast 1965), angioplastia coronária (Andreas Gruntzig 1975), terapia

hipotérmica, e introdução de diversos fármacos, tais como: beta-bloqueadores,

antagonistas do cálcio, aspirina, trombolíticos e antiarrítmicos.(1)

Nos dias de hoje, o trauma é considerado um problema global major de saúde

pública. A cada ano, 5,8 milhões de pessoas morrem por lesões de trauma em todo o

mundo, e muitos mais ficam desabilitados. É considerada a principal causa de morte de

homens e mulheres com idade inferior a 45 anos. E é responsável por uma maior perda

de anos com qualidade de vida do que as doenças cardiovasculares e o cancro

combinados. A prevalência é especialmente alta em países de baixo e médio

desenvolvimento onde mais de 90% das mortes no mundo provocadas por trauma,

ocorrem.(2) Também em Portugal o trauma mantém-se como uma das causas mais

importantes na origem da morbilidade e da mortalidade, com maior incidência na

população mais jovem.(3)

Um Serviço de Emergência Médica (SEM) pode ser definido como "Um sistema

abrangente que faculta meios humanos, instalações e equipamentos para uma eficaz,

coordenada e atempada intervenção dos serviços de saúde e segurança às vítimas de

doença ou lesão repentina”.(4)

Inúmeros países procuraram desenvolver serviços e sistemas para o

atendimento às urgências médicas e trauma.(5) Nos últimos cinquenta anos, diversas

propostas foram implementadas e desenvolvidas no mundo, em especial nos países

ricos.

No mundo avançado, a medicina de emergência é tradicionalmente realizada de

duas formas diferentes. A primeira é o sistema Anglo-Americano com uma qualificada

base hospitalar e um serviço de emergência médica pré-hospitalar utilizando

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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paramédicos. A segunda chamada sistema Franco-Alemão consiste num serviço

médico de emergência pré-hospitalar altamente desenvolvido, mas apenas uma

organização básica da medicina de emergência na base hospitalar.(6) Outro método de

classificar o SEM é de acordo com o nível de cuidados prestados, Suporte Básico de

Vida (SBV) e Suporte Avançado de Vida (SAV).(4)

Contudo, embora atualmente exista uma grande experiência acumulada no

atendimento às urgências e trauma, deparamo-nos com uma diversidade de modelos.

Diferenças entre propostas da abordagem pré-hospitalar, do ambiente hospitalar, das

especialidades e de programas de treino.(7) A ausência de evidências científicas tem

colaborado com a manutenção de diferentes modelos, não havendo comprovação de

maior eficácia de um determinado tipo.(8) Em 2004, a Organização Mundial de Saúde

(OMS) publicou as Guidelines for Essential Trauma Care procurando diminuir as

disparidades entre os resultados de trauma entre países de baixo-médio

desenvolvimento e de alto desenvolvimento estabelecendo padrões viáveis e acessíveis

para cuidados assistenciais em todo o mundo. Medida que tem apresentado resultados

positivos, nos países onde foi aplicado.(9)

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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Material e Métodos

O material bibliográfico utilizado para a realização deste artigo de revisão foi

obtido através da pesquisa efetuada nas bases de dados eletrónicas PubMed e

ScienceDirect. As palavras-chave utilizadas na pesquisa foram: ‘emergency medical

service’, ‘emergency medicine’, ‘organization of trauma systems’ e ‘advanced life

support’.

Utilizaram-se artigos publicados compreendidos entre 1982 a 2013. No entanto,

foi dada prevalência aos artigos entre 1995 e 2013.

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

10

Resultados

Desde 1970, o modo de prestação de cuidados de saúde de emergência em

ambiente pré-hospitalar evoluiu em torno de dois principais modelos de SEM com

características distintas. O modelo Anglo-Americano e o modelo Franco-Alemão. Estas

distinções categóricas eram óbvias durante os anos setenta até ao final do século XX.

Hoje a maioria dos sistemas de SEM à volta do mundo são compostos por

características de ambos os modelos.(10)

Modelo Franco-Alemão

O modelo Franco-Alemão do SEM é baseado na filosofia “stay and stabilize”. O

motivo deste modelo é trazer o hospital aos pacientes. É normalmente efetuado por

médicos com uma ampla experiência prática e com tecnologia avançada. Além das

ambulâncias, este modelo utiliza outras formas de transporte tais como helicópteros e

ambulâncias costeiras.(11) Este modelo é geralmente um subconjunto do sistema geral

de saúde. Esta filosofia é amplamente implementada na Europa onde a emergência

médica é relativamente um campo novo.(6) Portanto, na Europa, a emergência pré-

hospitalar é quase sempre realizada por médicos de emergência. Os médicos de

emergência presentes no campo têm autoridade para fazer julgamentos clínicos

complexos e tratar pacientes nas suas casas ou no local do acidente. Isto faz com que

muitos usuários do SEM sejam tratados no local do incidente e, consequentemente, haja

uma menor transferência dos pacientes para o hospital. Os poucos pacientes

transportados são geralmente diretamente admitidos nas enfermarias dos hospitais pelo

médico que os assistiu no local do acidente, sem passar pelo departamento de

emergência. Neste modelo, a medicina de emergência não é oficialmente reconhecida

como uma especialidade e geralmente é controlada pelos anestesistas.(12) Países

como Alemanha, França, Grécia, Itália, Malta, Áustria, Bélgica, Rússia, Portugal,

Finlândia, Suiça e Suécia têm um sistema de SEM Franco-Alemão bem

desenvolvido.(13-23)

Modelo Anglo-Americano

Ao contrário do modelo Franco-Alemão, o Anglo-Americano baseia-se na

filosofia de “scoop and run”.(11) O objetivo deste modelo é trazer rapidamente os

pacientes para o hospital com poucas intervenções pré-hospitalares. Normalmente ele

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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atua em conjunto com os serviços de segurança pública como a polícia e os bombeiros

em vez dos serviços públicos de saúde ou hospitais.(24) Paramédicos treinados e

Técnicos de Emergência Médica (TEM) executam o processo com supervisão clinica.

Este modelo incide fortemente em ambulâncias terrestres e menos em evacuações

aero-médicas ou costeiras. Nos países que seguem este modelo, a emergência médica

está bem desenvolvida e geralmente é reconhecida como uma especialidade médica

independente. Quase todos os pacientes do modelo Anglo-Americano são

transportados, pelo pessoal do SEM, para departamentos de emergência desenvolvidos

em vez das enfermarias dos hospitais. Países que usam este tipo de modelo são os

Estados Unidos, Canadá, Nova Zelândia, Reino Unido, Hong Kong, Japão, Sultanato de

Omã e Austrália.(24-32)

Outra forma de classificar os sistemas de emergência médica é de acordo com

o nível de serviço prestado e âmbito da prática. Estes são geralmente classificados em

Suporte Básico de Vida (SBV) e Suporte Avançado de Vida (SAV).

O Suporte Básico de Vida está intimamente associado com a filosofia de “load

and go” proporciona intervenções não-invasivas básicas e transporte rápido para a

unidade de cuidados definitiva. As intervenções incluem ressuscitação cardiopulmonar

não-invasiva, estabilização de fraturas, imobilização completa e administração de

oxigénio. Por outro lado o Suporte Avançado de Vida correlaciona-se melhor com a

abordagem de “stay and stabilize”. Inclui todos os procedimentos do SBV com a adição

de procedimentos invasivos como entubação endotraqueal, colocação de linha

intravenosa, reposição de fluidos, descompressão com agulha no peito e administração

controlada de medicamentos potentes.(33)

Modelo dos Estados Unidos da América

Existem inúmeros modelos de sistemas de urgência nos Estados Unidos da

América (EUA). A abundância de modelos resulta da dificuldade de obter evidência

científica objetiva pela qual se defina e implemente um sistema “ideal”.(34) A geografia,

a topografia e as disparidades de alocação de recursos também tornam difícil identificar

e implementar um sistema de SEM unificado num país tão grande como os EUA.(24)

Na dependência da região, estado ou município podemos encontrar diferentes

desenhos de organização. Serviços governamentais ou privados são encontrados,

assim como algumas organizações híbridas público-privadas. A maioria dos serviços

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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públicos é baseada no serviço de bombeiros e sedes policiais. O "9-1-1" é o número de

telefone universal de acesso aos serviços de emergência e tem sido adotado por muitas

comunidades dos Estados Unidos para fornecer um acesso fácil e rápido à assistência

médica.

Embora exista comummente uma variação local, há quatro níveis distintos de

cuidados pré-hospitalares prestados nos EUA: socorrista, TEM-básico (TEM-B), TEM-

Intermediário (TEM-I) e TEM-paramédico (TEM-P).(24) O atendimento pré-hospitalar

pode ainda ser dividido de acordo com o tipo de cuidados prestados: SBV e SAV. A

maioria dos sistemas de SEM dos centros urbanos atua ao nível de SAV.

O socorrista é tipicamente o primeiro a chegar ao local do acidente. Compete-

lhe a ele a avaliação inicial do paciente, juntamente com intervenções limitadas

salvadoras de vida. Em adição às habilidades do socorrista, os TEM- B estão envolvidos

também na triagem dos pacientes no local e têm uma formação complementar em

administração de oxigénio, desencarceramento e transferência do paciente.

Sistemas categorizados como SAV oferecem um nível mais abrangente de

serviços, fornecidos por técnicos altamente qualificados, geralmente certificados no

nível intermediário ou paramédico (TEM-I ou TEM-P, respetivamente).(24, 35)

Com a expansão das habilidades e competências dos Paramédicos, os médicos

passaram a estar cada vez menos no local do acidente. Em vez dos médicos estarem

fisicamente presentes, os paramédicos passaram a atuar “sob licença” do médico.

Desenvolveram-se assim os sistemas de orientação médica “on-line” e “off-line”. A

orientação médica “on-line” envolve a comunicação física direta entre o paramédico e o

médico ou enfermeiro especialmente treinado. O controlo médico “off-line” permite que

paramédicos prestem cuidados, seguindo protocolos padrão, que são pré-estabelecidos

pelo diretor médico do SEM.

Pelos EUA há alguns hospitais designados “Centros de Trauma”.(36) Esses

hospitais têm departamentos de emergência e cirurgia especificamente orientados para

o cuidado de pacientes que sofram um trauma major. Estes centros frequentemente

possuem uma "equipa de trauma", formada por cirurgiões e anestesistas disponíveis no

hospital 24 horas por dia. A maioria dos sistemas de SEM têm protocolos para que os

paramédicos passem hospitais menores, que não estão preparados para o atendimento

ao trauma e entreguem o paciente diretamente num Centro de Trauma.(24) Os Centros

de Trauma normalmente seguem as guidelines desenvolvidas pela American College of

Surgeons Committee on Trauma (ACSCOT). Os critérios de ativação da equipa de

trauma, os membros da equipa de resposta ao trauma, os equipamentos necessários e

outros recursos são bem definidos nesse documento.(37)

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

13

A equipa de trauma, normalmente compreende o cirurgião de trauma, os

residentes de trauma, os assistentes e residentes de emergência médica, os

enfermeiros, os técnicos de laboratório e radiologia, entre outros, que deverão estar

presentes na área de receção de trauma no momento da chegada do paciente. O "chefe

da equipa", normalmente o cirurgião de trauma dirige a avaliação do diagnóstico e o

plano de tratamento, incluindo as consultas de especialidade e para onde será a

posterior transferência do paciente, para a sala de cirurgia, a unidade de cuidados

intensivos ou para uma enfermaria regular de trauma. Durante a admissão aguda do

paciente, os cirurgiões especialistas, em particular o ortopedista, o neurocirurgião e o

cirurgião plástico, podem ser envolvidos na gestão do paciente. O cirurgião de trauma

permanece responsável pelo paciente até à sua alta, ou até que este tenha de ser

transferido para outra especialidade (trauma ortopédico, neurocirurgia). Uma

abordagem multidisciplinar e colaborativa fornece os cuidados necessários para a

recuperação do paciente e o seu retorno à comunidade.(35)

Modelo do Canadá

O Canadá, como segundo maior país em extensão no mundo, possui grandes

dificuldades logísticas para organização do atendimento de urgências. Os serviços pré-

hospitalares variam, cada província e território é responsável pelo seu SEM com as suas

próprias jurisdições. Sendo que no Canadá existem 13 sistemas distintos de SEM. Os

paramédicos com SAV tendem a concentrar-se nos grandes centros urbanos. Outros

municípios adotaram o SBV como padrão. Existem ainda muitas cidades com sistemas

híbridos de SBV/SAV com triagem durante o processo de despacho.

O acesso pelo público é feito, na maioria das localidades, através do número

telefónico 911.

O treino das equipas, embora não padronizado para todo o país, é baseado em

cursos de curta duração como o Advanced Trauma Life Support (ATLS), Advanced

Cardiac Life Support (ACLS), Basic Life Support (BLS), Pediatric Advanced Life Support

(PALS), entre outros. O controlo da atividade profissional dos médicos emergencialistas

é realizado pela Canadian Medical Association. De maneira a uniformizar os serviços

de emergência a Paramedic Association of Canada (PAC) desenvolveu recentemente o

National Occupation Competency Profiles for paramedic practitioners (NOCP). O NOCP

estabelece critérios detalhados para provedores de SEM e organiza os praticantes em

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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quatro níveis: emergency medical responder (EMR), primary care paramedic (PCP),

advanced care paramedic (ACP) e critical care paramedic (CCP).

Os EMRs podem ser os respondedores primários em áreas rurais. Eles têm

qualificações básicas, e estão equipados com material simples de suporte básico de

vida. Alguns serviços de EMRs estão equipados com desfibrilhadores externos semi-

automáticos. Os EMRs não realizam qualquer intervenção invasiva.

Os PCPs são especializados em procedimentos invasivos simples, como

monitorização de glicose no sangue e acessos intra-venosos (IVs). Eles estão treinados

para administrar um número limitado de medicamentos, incluindo aspirina, 50 % de

dextrose em água, adrenalina sub-cutânea, nitroglicerina sublingual e salbutamol. Os

PCPs também fornecem monitorização cardíaca utilizando configurações de 3

derivações e são treinados para o uso de desfibrilhadores externos semi- automáticos.

A desfibrilação manual não faz parte do conjunto de habilidades dos PCPs.

Os ACPs realizam um estudo em profundidade da lesão e da doença, bem como

realizam intervenções avançadas, incluindo entubação endotraqueal, interpretação de

ECG (3 derivações), terapia elétrica apropriada (desfibrilação, cardioversão, pacing

transtorácico), agulha de torocostomia e administração intravenosa e intra-óssea de

medicamentos. Podem administrar todos ou a maioria dos medicamentos de primeira

linha da ACLS.

Os CCPs além das habilidades dos ACPs são treinados na gravação de ECG de

12 derivações, gestão das vias aéreas assistida por anestesia/paralisia, cateterização

urinária e monitorização e transporte de pacientes entubados ou com linhas arteriais.

OS CCPs também são treinados para interpretar resultados de laboratório e de raios-x.

O atendimento hospitalar, embora bem estruturado por todo o território, pode

variar de acordo com as características de cada hospital, em especial entre hospitais-

escola ou não-escola.

Hospitais-escola oferecem atendimento por médicos, que estão em formação,

cuja prática é supervisionada por especialistas. Enquanto nos hospitais não académicos

os médicos generalistas e, eventualmente, especialistas fornecem o atendimento.

Especialistas em emergência médica oferecem atendimento na maioria dos hospitais

de médio e grande porte, enquanto na zona rural a maioria das urgências é abordada

por médicos de família, para posterior transferência.(25, 38)

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

15

Modelo da França

A França está dividida em 95 départements, semelhantes aos condados nos

Estados Unidos. Cada departamento, embora não autónomo, tem um governo que

define a agenda de saúde local. A França tem um sistema sofisticado e moderno de

cuidados de emergência pré-hospitalar.(39)

A gestão de situações de emergência fora do hospital é da responsabilidade do

Serviço d'Aide Médicale d'Urgence (SAMU). A França é dividida em 105 SAMUs

regionais organizados da seguinte forma: Um centro de distribuição com telefonistas e

médicos fica situado num grande hospital e cobre uma determinada região. O acesso

universal ao SAMU é efetuado por um número de telefone nacional de acesso único:

“15”. Telefonistas (disponíveis 24 horas por dia) recebem todas as chamadas

relacionadas com a emergência médica no centro de despacho e encaminham-nas para

o médico coordenador. Algumas chamadas são recebidas através do número 112, o

número europeu universal para a assistência de emergência. Assim, os números de

telefone 15 e 112 são usados em simultâneo.

O médico coordenador determina o nível apropriado da resposta médica de

emergência. As opções incluem: (1) ambulâncias compostas por técnicos de

emergência médica (TEM); (2) bombeiros, com habilidades de suporte básico de vida

(incluindo desfibriladores automáticos externos); (3) um clínico geral num veículo

particular, ou (4) uma unidade de terapia intensiva móvel (UTIM) ou um helicóptero, se

disponível. As UTIMs estão distribuídas por toda a região com bases locais chamadas

Service Mobile d’Urgence et de Réanimation (SMUR). Existem 320 centros SMUR na

França. Na suspeita de uma paragem cardíaca ou insuficiência respiratória, o

coordenador pode dar instruções por telefone, a leigos, para iniciarem manobras de

RCP ou manobra de Heimlich.(40)

Cada SMUR é equipado com um ou mais UTIMs, as ambulâncias médicas de

reanimação incluem sempre um médico sénior (geralmente um médico de emergência),

uma enfermeira (ou uma enfermeira anestesista) e, por vezes, um estudante de

medicina. Uma pessoa da ambulância especialmente treinada conduz a UTIM. A UTIM

fornece todas as técnicas de resgate e auxílio médico, conhecidas como suporte

avançado de vida. Por exemplo, um médico pode obter uma história clínica, executar

um exame físico, obter um ECG e iniciar a trombólise no campo. Algumas UTIMs são

especializadas em cuidados perinatais e são compostas por um pediatra e uma

enfermeira. O intervalo de tempo entre a receção da chamada e a chegada ao paciente

é geralmente inferior a 15 minutos.(41, 42)

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

16

Se o transporte para o hospital for necessário, o médico coordenador irá

determinar o destino do hospital e os serviços especializados necessários.

Todos os recursos disponíveis de uma região são acessíveis aos pacientes

através de uma vasta rede de cuidados de emergência coordenada, que integra ambos

os serviços públicos e privados de primeiros socorros, unidades de saúde de cuidados

primários e especializados, e hospitais.

Em França, existem dois níveis diferentes de departamento de emergência (DE).

O primeiro nível é o chamado de Service d’Accueil des Urgences "SAU" e tem cobertura

contínua por cirurgiões, com unidades de cuidados intensivos, laboratórios e instalações

de radiologia disponíveis 24 horas por dia. Os DE’s de nível 2 são chamados de Unité

de Proximité d’Accueil, d’Orientation et de Traitement des Urgences "UPATOU". Nessas

unidades, determinadas especialidades podem estar disponíveis apenas por chamada.

Em 2004 havia 200 hospitais com DE’s nível 1 e 350 hospitais com DE’s nível 2.

Quando o paciente chega a um DE, o primeiro passo é a triagem, que é

geralmente realizada pela enfermeira de emergência. A enfermeira encaminha o

paciente para um dos residentes ou médicos de emergência.

Cada DE tem uma sala de reanimação totalmente equipada para os pacientes

com condições de risco de vida. Normalmente, o médico de emergência de serviço é

responsável pela reanimação inicial do paciente. Após a reanimação inicial, os

especialistas de serviço adequados são chamados para a área de reanimação para

avaliar o paciente. Se a natureza da condição exigir a transferência para outro hospital,

o SAMU é chamado e o transporte é realizado por uma equipa da UTIM.(14)

Em França não existe especialização em traumatologia. Todos os cirurgiões

especializados tratam os aspetos da patologia do trauma que lhes digam respeito. (43)

Modelo da Alemanha

Na Alemanha, cerca de 82 milhões de cidadãos vivem numa área de 356.000

km2. Para garantir a ajuda rápida e profissional pelas equipas de resgate, existem cerca

de 400 centros de coordenação de salvamento (Rettungsleitstellen) coordenando 854

ambulâncias compostas por médicos e 52 helicópteros de resgate.

Cada região é exclusivamente servida por um centro de despacho, que coordena

todas as atividades do SEM. Em algumas regiões, eles são integrados com o corpo de

bombeiros. Em outras áreas o corpo de bombeiros e centros de despacho de SEM

funcionam independentemente. A implementação de um número de telefone nacional

não foi bem-sucedida. Na maior parte das regiões, existem pelo menos dois (112 e

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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19222) e, por vezes, mais números. Uma segunda questão estrutural fundamental é o

sistema de duas camadas, com ambulâncias de SBV para o transporte de baixo risco e

ambulâncias de SAV para emergências com risco de vida. Uma porção das ambulâncias

de SAV são formadas por médicos.

A maioria dos centros de despacho trabalham com um sistema “rendezvous”.

Quando o centro de despacho determina que a emergência exige um médico no local,

os dois tipos de ambulâncias são despachadas sob a premissa de que a ambulância

com pessoal não-médico chega ao local mais rápido e pode iniciar tratamento básico

até que a unidade composta por médicos chegue. Uma vez que o paciente foi tratado,

o médico decide se o paciente necessita da presença do médico durante o transporte.

Em casos menos graves, o paciente é tipicamente transportado na unidade não

composta por médicos. Uma vantagem desta estratégia é que a unidade composta por

médicos está imediatamente disponível para a próxima missão.

O serviço médico aéreo funciona sempre segundo o sistema “rendezvous”. Os

helicópteros são compostas por um médico, um paramédico, e um ou dois pilotos. Cada

helicóptero serve num raio de 50 km em torno do seu hospital de base. A Alemanha é

assim completamente coberta por serviços médicos aéreos.

A medicina de emergência ainda não foi aceite como uma especialidade médica

separada. A formação ou certificação em ACLS e ATLS não são necessários.

A maioria dos médicos do SEM são contratados por hospitais e trabalham em

anestesiologia (em 1991, 37%), cirurgia (26%), ou medicina interna (29%).

O Registro de Trauma da Sociedade Alemã [Deutsche Gesellschaft für

Unfallchirurgie (DGU)] desenvolveu um software que permite a avaliação dos custos de

tratamento mínimos, de pacientes gravemente feridos, desde o momento do acidente

até o fim do período de internamento.

O início do tratamento hospitalar é baseado em recomendações para o

diagnóstico e tratamento emitido pelo Comité de Orientação do DGU.

A Alemanha instituiu um sistema em que o mesmo médico segue o paciente

desde o seu resgate até à sua reabilitação.

Os cirurgiões de trauma na Alemanha estão envolvidos no resgate primário, e

são responsáveis pelas prioridades de diagnóstico e tratamento, no departamento de

emergência, como líderes da equipa de trauma. (44, 45)

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

18

Modelo do Reino Unido

Os cuidados de saúde de emergência no Reino Unido são entregues quase

exclusivamente pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS), que é gratuito para moradores

e visitantes.

O atendimento médico de emergência e aconselhamento pode ser acedido das

seguintes maneiras:

• SNS Direto

• Cuidados primários

• Unidades de ferimentos leves e Walk-in centres

• Serviços de ambulância

• Departamentos de emergência

O SNS Direto fornece informações, por telefone ou através da Internet. Os

conselhos de saúde são entregues por enfermeiros. Uma alta proporção de chamadas

são simplesmente conselhos sobre auto-cuidados, mas o serviço pode desviar

chamadas para organizar o transporte do paciente ao serviço de urgência, por uma

ambulância, se necessário. Os cuidados primários só podem ser acedidos por pacientes

registados nos seus médicos de família. Pacientes não registados podem aceder

diretamente as outras formas descritas acima.

As unidades de ferimentos leves (UFL) foram desenvolvidas para prestar

cuidados a populações onde o acesso aos grandes serviços de emergência eram um

problema. O cuidado é predominantemente entregue por enfermeiros de emergência.

As UFL são frequentemente populares entre os pacientes, pois podem prevenir visitas

inconvenientes e desnecessárias ao DE.

Os Walk-in centres estão localizados em centros urbanos, espaços comerciais e

estações ferroviárias, são especialmente importantes para trabalhadores pendulares

que não conseguem aceder aos médicos de família sem faltar um tempo significativo ao

trabalho. Estes centros são compostos por enfermeiros e criados para gerir problemas

de cuidados primários.

Os pacientes que ficam gravemente doentes ou feridos na comunidade

geralmente são transportados para um hospital por um dos 38 serviços de ambulância

do SNS. As ambulâncias de emergência são acedidas marcando o número de acesso

nacional comum (999 ou 112).

As chamadas de emergência são classificadas como categoria A se a condição

apresenta um risco de vida imediato, categoria B se a condição é séria mas não

apresenta um risco de vida imediato e categoria C se a condição não é séria nem

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

19

apresenta um risco de vida imediato. Esta é determinada usando o software do

Advanced Medical Priority Despatch System (AMPDS) utilizado no momento da

chamada de emergência recebida pelo pessoal da sala de controlo de ambulâncias.

O governo do Reino Unido estabeleceu um padrão para o serviço de

ambulâncias do SNS em que 75% das chamadas da categoria A devem ser respondidas

no prazo de 8 minutos após o local do incidente ter sido estabelecido e que 95% das

categorias B e C devem ter uma resposta dentro de 14 minutos (áreas urbanas) e 19

minutos (áreas rurais). Antes deste sistema ser implementado as equipas eram

despachadas de acordo com a ordem de chegada das chamadas. Este importante

desenvolvimento aumenta a probabilidade de uma resposta atempada aos pacientes

mais doentes.

As ambulâncias de emergência utilizadas são geralmente ocupadas por um

paramédico e um técnico. A decisão de mobilizar recursos específicos é feita por um

oficial sénior da sala de controlo de ambulâncias que pode ou não ter tido experiência

prévia em atendimento pré-hospitalar. Os médicos não são utilizados para esta

finalidade. Os serviços de ambulância também podem mobilizar uma ambulância aérea

regional, se estiver disponível. Os principais cuidados imediatos e habilidades de

reanimação dos técnicos de ambulâncias e os fármacos usados estão listados no Anexo

I.

A medicina de emergência é uma especialidade relativamente nova no Reino

Unido tendo as suas origens na década de 1960. No Reino Unido existem 285 DE’s. Os

DEs são avisados previamente antes da chegada do paciente para permitir uma melhor

organização das equipas de trauma e reanimação. À chegada ao DE os pacientes são

inicialmente avaliados e triados de acordo com a prioridade clínica. Estas avaliações

são geralmente realizadas por um membro sénior da equipa de enfermagem. Alguns

DE’s usam protocolos de triagem baseados em sintomas (por exemplo: Triagem de

Manchester) que deverá ocorrer dentro de 15 minutos após a chegada do doente. Os

pacientes são então direcionados para a área clinica apropriada dependendo da

necessidade (por exemplo, sala de reanimação, 'majors' ou 'minors').

Os DE’s são compostos por especialistas (geralmente 3 por departamento),

internos de especialidade, assistentes clínicos, enfermeiros, entre outros.

Os pacientes com doença ou lesões graves são inicialmente avaliados e geridos

pela equipa médica do DE, e são depois referenciados para equipas especializadas

apropriadas ao doente. O sénior da equipa médica do DE tem um papel fundamental ao

liderar o trauma e as equipas médicas de reanimação, coordenando a investigação

especializada e a referência posterior.(46, 47)

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

20

Modelo de Portugal

Os serviços de emergência médica pré-hospitalar em Portugal são uma

conquista relativamente recente. Portugal tem, desde 1981, um Sistema Integrado de

Emergência Médica (SIEM).

O SIEM trata-se de um conjunto de entidades que cooperam com um objetivo:

prestar assistência às vítimas de acidente ou doença súbita. Essas entidades são a

PSP, a GNR, o INEM, os Bombeiros, a Cruz Vermelha Portuguesa e os Hospitais e

Centros de Saúde. O Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) é o organismo

do Ministério da Saúde responsável por coordenar o funcionamento, no território de

Portugal Continental, do SIEM. Em 2003, este sistema atendia mais de 75% da

população com 4 centros de despacho e 21 veículos com pessoal médico.

O sistema começa quando alguém liga 112 - o Número Europeu de Emergência.

O atendimento das chamadas cabe à PSP, nas centrais de emergência. Sempre que o

motivo da chamada tenha a ver com a saúde, a mesma é encaminhada para os Centros

de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) do INEM.(48) A maioria dos componentes

do sistema são adotadas a partir do modelo Francês – SAMU.

Atualmente, e desde 2007, o CODU é responsável pela triagem e avaliação das

chamadas telefónicas, cobrindo todo o território de Portugal Continental.

Com base na categoria de triagem da chamada, o coordenador do SEM pode

iniciar um dos três níveis de resposta. Se houver a suspeita de uma situação de

emergência com risco de vida é obrigatória a ativação de um veículo de intervenção

rápida hospitalar. Se a situação é urgente, mas não uma ameaça à vida, uma

ambulância com dois técnicos é enviada. O terceiro nível de resposta permite que o

coordenador forneça apenas conselhos por telefone.

O INEM é também responsável por um serviço de informações sobre venenos,

que está disponível tanto para o público em geral como para profissionais de saúde.

Há um sistema de despacho específico e separado para incidentes marítimos.

Ele é chamado CODU-MAR. Um médico nomeado fornece orientação e pode ativar uma

equipa de resgate. Nestas situações as operações são realizadas em conjunto com a

Marinha Portuguesa e a Força Aérea.(49)

A Viatura Médica de Emergência e Reanimação (VMER) pode ser enviada para

situações em que o SAV é necessário. A ativação é feita sempre através do CODU. O

veículo é composto por um médico e um enfermeiro. O enfermeiro é também o condutor

do veículo. O equipamento de série inclui um desfibrilador manual com capacidade de

pacing e monitorização, ECG de 12 derivações, equipamentos para gestão avançada

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

21

das vias respiratórias, sucção, oxigenoterapia, acesso IV, fluidos, imobilização de

fraturas, vários fármacos, um monitor de sinais vitais, incluindo oximetria de pulso e um

ventilador portátil automático. A equipa pode transportar o paciente para o hospital com

uma ambulância do INEM e o seu próprio equipamento. Em 2003, havia 21 desses

veículos operacionais.(49)

Em Julho de 2004, os motociclos de emergência médica passaram a fazer parte

dos meios do INEM. O motociclo de emergência médica é um meio ágil, vocacionado

para o trânsito citadino, que permite chegar rapidamente ao local onde se encontra o

doente. Este veículo transporta um aparelho de Desfibrilhação Automática Externa,

oxigénio, adjuvantes da via aérea e ventilação, equipamento para avaliação de sinais

vitais e glicemia capilar e outros materiais de Suporte Básico de Vida. Em alguns casos,

a intervenção deste meio é a única necessária, dispensando a presença de uma

ambulância de socorro no local.

O INEM tem dois helicópteros, com sede em Lisboa e Porto que podem

responder a missões primárias (no local) ou secundárias (entre hospitais). Os

helicópteros são ativados apenas pelo CODU. Os helicópteros do INEM estão providos

com um médico e um enfermeiro que estão treinados para cuidados intensivos e

atendimento pré-hospitalar. Os helicópteros têm todo o equipamento necessário para o

SAV e estão disponíveis 24h por dia. Há um terceiro helicóptero no meio do país, gerido

pelo Serviço de Ambulâncias, que pode ser composto, a pedido, com um médico e um

enfermeiro do INEM. Se necessário o INEM também pode solicitar a ajuda de

helicópteros das forças aéreas.(50)

As ambulâncias do INEM são equipadas com dois socorristas e com

equipamentos para SBV e salvamento básico. Estas ambulâncias do INEM estão

alocadas na sede da polícia, departamentos de bombeiros e instalações da Cruz

Vermelha, mas só podem ser ativadas pelo CODU. Todas as outras ambulâncias (não

INEM) do serviço de bombeiros, da polícia ou da Cruz Vermelha podem ser ativados

tanto pelo CODU em situações de urgência, quando as ambulâncias do INEM não estão

disponíveis, ou pelas suas próprias políticas de despacho para o transporte de pacientes

não urgentes para ou do hospital.

A maioria das pessoas que trabalham neste sistema do SEM são voluntárias, o

que é uma fraqueza importante do sistema. Existem três níveis distintos de cuidados

prestados por fornecedores pré-hospitalares: socorrista básico, técnico de ambulância

e equipa médica. Os socorristas básicos, mais comumente são polícias ou bombeiros.

Eles passam por treinamento em primeiros socorros básicos e SBV. Os técnicos de

ambulância são treinados em SBV, trabalho de parto simples, manuseamento básico de

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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feridas, imobilização da coluna e fraturas, administração de oxigênio,

desencarceramento de pacientes e sua transferência. A equipa médica composta por

um médico e por um enfermeiro têm o mais alto nível de capacidades de atendimento

pré-hospitalar. A maioria dos médicos são anestesistas, sendo os outros médicos,

cirurgiões e clínicos gerais. Os enfermeiros costumam trabalhar no Departamento de

Emergência, Terapia Intensiva ou na Sala de Cirurgia do hospital. Há um currículo

mínimo nacional e treinamento adicional é fornecido. Todas as equipas médicas são

capazes de efetuar SAV, PALS e ATLS.

Não existem normas nacionais para os serviços de emergência dos hospitais e

instituições individuais determinam a organização dos seus departamentos. Na maioria

dos hospitais, há um departamento de emergência separado que recebe todas as

vítimas agudas. Há geralmente um grande número de pacientes, muitos deles com

problemas que poderiam ser tratados a nível dos cuidados de saúde primários. Apesar

de os departamentos de emergência serem fisicamente separados eles raramente têm

a sua própria equipa médica. Isso resulta numa falta de continuidade e compromisso. A

equipa de enfermagem e pessoal não médico geralmente pertencem ao departamento

de emergência. A estrutura física e organização dos serviços de emergência variam

consideravelmente entre os hospitais. Um número crescente de hospitais usa modelos

de triagem específicos, em particular o Sistema de Triagem de Manchester. Existem

relações estreitas entre a urgência do hospital e os serviços pré-hospitalares. Os

principais hospitais gerais têm a sua própria equipa de assistência pré-hospitalar que é

ativada pelo CODU.

O SEM tem protocolos próprios para o transporte de pacientes específicos, por

exemplo para doença coronária, acidente vascular cerebral e trauma. Nestas situações

ambulâncias e equipa médica podem ignorar hospitais menores ou menos

especializados e levar o paciente para um centro mais adequado.(51)

Modelo de Israel

Israel é um país pequeno com um sistema de trauma único. Israel tem uma

população de cerca de 7 milhões de pessoas. Tem uma democracia plena e todos os

cidadãos israelenses (independentemente da fé) têm um igual direito à saúde. Diante

das múltiplas incidências de acidentes em massa, um protocolo único foi desenvolvido,

para garantir uma resposta rápida e eficaz a tais eventos devastadores.(52)

O nível pré-hospitalar é mantido principalmente pelos serviços de emergência

médica, Magen David Adom (MDA) (traduzido, Escudo Vermelho de David). O MDA foi

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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fundado em 1930 e era executado inicialmente como um serviço voluntário.(53) No início

dos anos oitenta as estações regionais do MDA foram reunidas numa organização

nacional com uma organização operacional centralizada. Além de ser o único provedor

de SEM em Israel, o MDA também fornece médicos de apoio para as Forças de Defesa

de Israel em tempo de guerra. Por esta razão, o MDA precisa de recursos e de uma

gestão estrutural para lidar com incidentes nacionais de grande escala. O MDA também

gerência a coleta de sangue e a entrega de produtos sanguíneos. O MDA é atualmente

dividida em 11 regiões operacionais, que são geograficamente distintas.

O SEM é acedido através do número de telefone de emergência gratuito “101”.

O serviço de bombeiros e da polícia têm um número diferente. O MDA executa um dos

dois níveis de resposta: básico ou avançado. A resposta de nível básico envolve uma

ambulância normal composta por dois técnicos de emergência médica ou por um TEM

e um voluntário. Estas ambulâncias são equipados para fornecer suporte básico de

tratamento / vida e transportar o doente para o hospital. A resposta de nível avançado

é subdividida.

A Unidade de Terapia Intensiva Móvel (UTIM) consiste numa ambulância de

cuidado intensivo móvel composta por um médico, um paramédico e um TEM /

motorista. Estes veículos estão equipados para proporcionar um nível mais avançado

de apoio e são geralmente encarregados dos acidentes de trauma (acidentes de

trânsito, agressões, etc).(54)

A ambulância de cuidados intensivos (ACI) é composta por um paramédico e um

TEM / motorista. Também é equipada para fornecer suporte avançado de vida, mas com

um espectro mais estreito do que a UTIM.

O MDA também tem vários veículos de resposta multi-casuais (VRMC), que são

essencialmente lojas de equipamentos móveis que são usados durante os incidentes

multi-casuais prolongados. O MDA emprega 600 TEM (habilitados com SBV e capazes

de funcionar com DAE’s), 450 paramédicos (com o curso de SAV, PHTLS e PALS), mais

de 10.000 voluntários e por médicos que trabalham no MDA como um suplemento ao

seu trabalho regular.

Israel tem 5 hospitais que são equivalentes a um centro de trauma nível um, com

todas as especialidades no local. Uma rede de outros hospitais com serviços

especializados variáveis situam-se entre esses centros. Todos os hospitais têm um

departamento de emergência. A medicina de emergência é uma especialidade em

evolução em Israel. Muitos departamentos de emergência são divididos em emergência

médica / cirúrgica / pediátrica, etc e os pacientes são transferidos de um departamento

para outro de forma a serem avaliados por especialistas competentes. A equipa pré-

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

24

hospitalar decide qual o hospital para qual o paciente deve ser levado e, se necessário,

pode passar um hospital mais próximo de forma a alcançar um centro com uma

especialidade mais adequada ao paciente (ex: neurocirurgica).

O transporte aéreo, tanto para militares como civis é fornecido quase que

exclusivamente pelos militares. A força aérea de helicópteros é composta por médicos

(todas as especialidades) e paramédicos. Eles estão envolvidos no resgate e tarefas de

evacuação sob 24 horas, com a maioria das missões envolvendo lesões traumáticas.

Onze por cento de todo o transporte aéreo é pediátrico.(55)

O financiamento do MDA provém de uma variedade de fontes diferentes. Além

do financiamento governamental, municípios, taxas pagas pelos pacientes e

seguradoras as doações de organizações de ‘amigos' no exterior são consideráveis e

geralmente têm como alvo áreas específicas, como as ambulâncias, renovação das

estações das ambulâncias e recursos consumíveis.(56)

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

25

Discussão

A medicina de emergência está a começar a ser estabelecida como uma

especialidade única e independente em todo o mundo. Dois grandes modelos de

prestação de cuidados de emergência existem hoje: o modelo Anglo-Americano em que

“o paciente é trazido para o hospital” e o modelo Franco-Alemão em que “o hospital é

trazido ao paciente”.

Os críticos têm observado vários problemas com o modelo Franco-Alemão: os

médicos não são bem treinados, não são bem supervisionados, e não estão sujeitos à

mesma qualidade-garantia como os médicos dos sistemas Anglo-Americanos.(31, 39,

45) Porque as perspetivas de carreira são pobres, médicos talentosos são perdidos para

outras especialidades.(31, 39) A coleta de dados é insuficiente, tornando o custo-

efetividade e a eficácia médica difíceis de demonstrar.(12, 21, 31)

Apesar destas preocupações, nenhum estudo multinacional comparativo existe

para demonstrar a superioridade de um modelo sobre o outro.(12)

Muitos estudos têm tentado comparar os dois sistemas em termos de resultados

e custo-efetividade. No entanto, parece que eles não são realmente comparáveis,

porque tendem a operar em diferentes contextos com diferentes tipos de demandas

para atender. Além disso, a falta de normas unificadas entre os dois modelos e a coleta

de dados insuficientes torna difícil demonstrar o custo-efetividade e a eficácia médica

de ambos sistemas.(12, 21, 31) Assim, não há atualmente nenhuma evidência de que

um modelo seja melhor do que o outro e os estudos continuam a mostrar conclusões

conflituantes.(11, 12, 31, 57-60)

Muitos estudos têm tentado também defender a eficácia do sistema do Suporte

Avançado de Vida sobre o sistema de Suporte Básico de Vida.

Enquanto alguns estudos afirmam que as intervenções SAV em ambientes pré-

hospitalares melhoram os outcomes dos pacientes.(61-66). Outros estudos têm

mostrado que um rápido transporte de vítimas para uma unidade de saúde definitiva,

em vez de intervenções avançadas têm um maior impacto no outcome do paciente.(67-

71)

Seria de esperar que um nível avançado de atendimento a todas as situações

de emergência, independentemente da gravidade, fosse mais vantajoso. No entanto,

esta é uma abordagem muito ineficaz de cuidado pré-hospitalar. Um estudo dos Estados

Unidos mostrou que 85% dos casos estavam no âmbito dos cuidados de Suporte Básico

de Vida e não necessitavam de cuidados avançados.(24) Por outro lado, a desvantagem

do sistema hierárquico é o efeito de diluição que pode levar à perda de capacidades dos

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

26

profissionais devido a uma menor exposição a situações de emergência.(33)

Paramédicos altamente treinados muitas vezes trabalham em ambientes urbanos, onde

os tempos de transporte para os hospitais são curtos, podendo haver uma menor

necessidade de usar aptidões avançadas. Na verdade, pode ser mais benéfico manter

uma via aérea simples, quando o centro de trauma é apenas a alguns minutos de

distância, do que iniciar medidas de suporte avançadas com fluidos IV, causando atraso

no transporte. TEMs com treinamento mais básico, mais comumente trabalham no meio

rural, onde os tempos de resposta e de transporte são muito mais propensos a serem

prolongados. Isso torna também a manutenção de competências um problema, uma vez

que nenhum provedor de qualquer nível consegue manter competências que só são

usadas apenas uma ou duas vezes por ano. Infelizmente, o ambiente rural com um

tempo de transporte prolongado é, provavelmente, a situação específica em que as

intervenções de campo avançadas para controlo das vias aéreas, descompressão do

peito com agulha ou ressuscitação intravenosa são provavelmente mais

necessárias.(72) Assim, é essencial determinar os pontos fortes e fracos de ambos os

níveis de atendimento e utilizar o que combina melhor com o contexto local.

Apesar de tudo, a lacuna entre o modelo Franco-Alemão e o modelo Anglo-

Americano parece estar a fechar rapidamente, por causa do rápido avanço da medicina

de emergência de base hospitalar na Europa. Isso deve proporcionar um grande impulso

para todos os médicos na Europa fazerem avançar a especialidade de medicina de

emergência no continente. Onze dos 27 países europeus reconhecem a emergência

médica como uma especialidade independente. São eles a Bélgica, a Républica Checa,

a Estónia, a Hungria, a Irlanda, a Itália, a Malta, a Polónia, a Roménia, a Eslovénia e o

Reino Unido. Outros países estão ansiosos por faze-lo, como por exemplo a Suécia, a

França, a Alemanha e a Grécia. O estilo europeu de medicina de emergência sempre

envolveu uma forte dedicação aos cuidados de emergência pré-hospitalar. A maioria

dos países europeus envia médicos para o campo com as ambulâncias. Alguns países,

por exemplo a França, a Alemanha e a Itália, chegaram a um alto nível de proficiência

de fazer isso. A Alemanha foi ainda mais longe e cobriu toda a nação com um serviço

médico de emergência pré-hospitalar, tanto terrestre como aéreo.(6)

Nos EUA várias linhas de evidência sugerem que os sistemas regionais de

trauma são eficazes na redução da mortalidade relacionada a lesões.(60) O risco

relativo de morte por acidentes de automóvel foi 10% menor em estados com sistemas

organizados de atendimento ao trauma do que em estados sem tais sistemas.(73) Os

EUA continuam a expandir as capacidades de todos os seus prestadores de cuidados

de emergência. Alguns paramédicos podem já iniciar tratamento trombolítico num

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

27

paciente que esteja a sofrer um enfarte do miocárdio, mas apenas após a discussão do

ECG com um médico.

No Canadá também continuam a melhorar o nível de cuidados entre os

prestadores mas, dada a sua extensão, a prestação de serviços é desigual entre as

diferentes províncias e mesmo em regiões dentro das próprias províncias.

O SEM da França inclui uma triagem pré-hospitalar feita por um médico no local

do acidente, o que evita o transporte desnecessário de um paciente para um centro de

trauma. Esta utilização eficiente dos recursos permite uma limitação rigorosa sobre o

número de centros de trauma, não superior a 15 em todo o país, otimizando os recursos

do sistema de saúde francês.(60)

Na Alemanha médicos altamente treinados fornecem os cuidados pré-

hospitalares embora as práticas não sejam homogéneas em toda a sua extensão.

No Reino Unido as equipas de emergência são muito bem equipadas, uma coisa

a melhorar são os tempos de resposta em ambientes remotos e durante os períodos de

alta demanda.

Portugal apesar de continuar a melhorar a qualidade dos seus serviços mantém

desafios em satisfazer o aumento da procura de cuidados de emergência. Uma

desvantagem do sistema português é a inexistência de um padrão nacional para os

departamentos de emergência assim como a inexistência de dados epidemiológicos

consistentes e de registos em trauma. Na maioria dos hospitais existe um departamento

de emergência fisicamente separado mas que raramente têm a sua própria equipa

médica. Isso resulta numa falta de continuidade e compromisso. Em 2009, a Ordem dos

Médicos nomeou um grupo de trabalho para elaborar normas de boa prática em trauma,

de maneira a suprimir estas lacunas.(3)

Portugal, assim como a Grécia e Hong Kong, utiliza motociclos no atendimento

pré-hospitalar, o que permite uma chegada mais atempada de cuidados ao local do

incidente.(15, 32)

Espanha e Israel têm um número de acesso telefónico apenas para situações de

emergência ao contrário do que acontece em outros países, em que este está associado

ao serviço de bombeiros e da polícia.(56, 74)

Para um país tão pequeno, o SEM em Israel é extremamente robusto. Muitos

países não têm um médico dedicado e disponível 24 horas por dia no ambiente pré-

hospitalar. O SEM em Israel precisa dar cobertura a uma ampla variedade de

eventualidades que vão desde as chamadas de emergência do dia-a-dia até cenários

de desastre em massa e desde conflitos internacionais até guerras regionais. Uma gama

tão ampla de atividades é incomum para uma única organização de SEM.

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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Conclusão

Para se organizar um sistema de urgências devem ser considerados muitos

fatores: geografia, demografia, condição socioeconómica da região, aspetos culturais e

profissionais, condições de investimento em saúde de determinada região, entre outros.

Estas necessidades contribuem com a diversidade entre sistemas e dificultam a

comparação entre eles. Os sistemas de cuidados de emergência cada vez mais

precisam de registar os resultados dos seus pacientes para defenderem o equilibro do

seu sistema, entre a eficácia médica e a eficiência económica.

Na literatura não há consenso sobre qual o melhor modelo de organização dos

sistemas de urgência no mundo, contudo não se contesta a necessidade desta

organização.

Embora existam particularidades entre os modelos atuais, todos apresentam,

em geral, bons resultados.

Esta revisão bibliográfica permitiu apresentar de forma sistematizada alguns dos

principais modelos de emergência médica existentes no mundo e identificar limitações

ainda existentes, onde futuros estudos e investigações poderão ter um contributo

fundamental.

Principais diferenças e semelhanças na organização dos cuidados assistenciais no trauma em Portugal e

em outros países

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Anexos

Anexo I

Appendix A

Appendix B

The immediate care skills of ambulance

technicians:

• Basic resuscitation procedures

• Haemorrhage control and wound care

• Fracture management

• Spinal injury care and immobilisation

techniques

• Analgesia with inhaled Entonox

• Management of respiratory emergencies

• Basic physiological measurements

• Administration of therapeutic drugs (see below).

• 12 lead electrocardiogram

• Supporting paramedics delivering advanced

medical care

Ambulance technician resuscitation skills:

• Basic life support

• Oxygen administration

• Oral and nasal airway adjuncts

• Bag-valve-mask ventilation

• Laryngeal mask airway*

• Semiautomatic and manual defibrillation

*not yet implemented by all ambulance services

Ambulance technician drug usage (Oxfordshire):

• Oxygen

• Aspirin 300 mg

• Salbutamol 5mg (nebulised)

• Sublingual GTN

• Intramuscular Adrenaline 1:1000 I.M.

• Intramuscular Glucagon

Paramedic clinical skills:

• Tracheal intubation

• Needle thoracocentesis

• Needle cricothyroidotomy

• Intravenous cannulation

• IV analgesia

• Oral/IM/IV drug administration

Drugs available for paramedic use:

Adrenaline (1:1000, 1;10000)

Aspirin 300 mg

Atropine 3mg in 10 mls and 1mg in 10 mls

Benzyl Penicillin 600 mg

Chlorpheniramine 10 mg/1 ml

Diazepam (10 mg/2 ml IV and 2.5 mg, 5.0 mg 10

mg in

2.5 ml PR)

Entonox (50% nitrous oxide/50% oxygen)

Frusemide 50 mg/5 mls

Glucagon 1 mg/IM

Glucose 10%

Glyceryl trinitrate 400 ug spray or 2/3 or 5mg

tablets (local

availability)

Hydrocortisone 100 mg

Glucose 40% Gel

Lignocaine 1% (100 mg/10 mls)

Metoclopramide 10 mg IV/IM

Morphine Sulphate 10 mg

Nalbuphine 10 mg IV

Naloxone 400 mcgs

Oxygen

Paracetamol (120 mg/5 ml or 250 mg/5 ml

suspension)

Salbutamol 2.5 or 5 mgs amps

Sodium Chloride 0.9% infusion

Compound Sodium Lactate (Hartmann’s)

infusion

Syntometrine (ergometrine 500 mcgs/ Oxytocin 5

units)

Thrombolytics