práticas religiosas através de três cantos de arandu arakuaa · 2016-11-04 · caseiros, e etc.)...
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Práticas religiosas através de três cantos de Arandu Arakuaa
Este trabalho é fruto das análises prévias de fontes que utilizo em minha dissertação de
mestrado no PPGH-UDESC. A banda Arandu Arakuaa faz parte do movimento
“Levante do Metal Nativo” (dentro do Heavy Metal Brasileiro) que é uma “união de
bandas que escrevem sobre história do Brasil”, e através da análise de três canções
(letra/melodia) e de performances em três vídeo-clipes, poderemos refletir alguns
aspectos desta lógica social que não segmenta religião, música, trabalho, e etc. Além de
ser uma comunicação de História do Tempo Presente, onde pesquiso meu próprio
tempo, a mesma tem como reflexo diminuir o preconceito através da diversidade
cultural/musical ao visibilizar as sociedades indígenas como atores de suas próprias
experiências, evidenciando as apropriações e ressignificações, alterando suas
cosmovisões com base na oralidade, indissociáveis das práticas religiosas.
Palavras chave – religiosidade indígena – heavy metal – história do tempo presente
Práticas religiosas através de três cantos de Arandu Arakuaa
Natasha Aleksandra Bramorski1
Desde a sua renovação em meados de 1970, a História do Tempo Presente muitas
vezes é tratada como objeto a ser analisado pelo/a historiador/a, e em outros, é o período
em que vivemos, a atualidade. Por ser um campo de disputa entre historiadores/as e,
consequentemente, muito debatido, é necessário ter as definições do que seria o
passado, o presente e o futuro atualmente em nossa sociedade, além dos marcos das
(então consideradas) grandes transformações sociais que variam de local para local
(sociedade para sociedade). Partindo destes parâmetros, teríamos uma História do
Tempo Presente a partir de um recorte temporal, ou através de questões (e/ou objetos)
de outros períodos, porém ainda “não resolvidos”. Um ponto de convergência, também
a distinção do que estava sendo produzido na historiografia até então, é que esta
História deve ser produzida por um/a historiador/a sobre seu próprio tempo, ele/a é
contemporâneo/a dos sujeitos estudados, e ao mesmo tempo pode ser uma testemunha.
No Brasil, por exemplo, se falarmos em recorte temporal, teremos histórias
produzidas sobre períodos pós 1945, igualmente na França, já na Alemanha seria pós
1918, e outras divergências ocorrem ao olharmos outras regiões do mundo. Mas, ao
falarmos sobre questões ainda “não resolvidas”, como por exemplo, a saúde das
mulheres negras na década de 2000-2010, provavelmente, nos depararemos com
questões que perpassam nossa sociedade desde a Idade Média/Brasil Colônia até os dias
atuais.
Um fator instigante é a variedade de fontes, para além dos documentos oficiais,
devido as tecnologias existentes, como imagens, canções, vídeos, e muitas vezes a
grande quantidade de material sobre os temas trabalhados, e também os diferentes
acervos, por exemplos, os blogs, sites e redes de relacionamentos.
Neste trabalho, analiso quatro produções da Arandu Arakuaa em formato de
vídeo-clipe2, que é a junção da música e do cinema, da imagem, som, texto e melodia. É
1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado de Santa Catarina –
PPGH/UDESC. Orientada pela profa. Márcia Ramos de Oliveira.
o desejo de extrapolar a canção, e ultrapassar as possibilidades dos filmes, de exprimir
ideias em um curto espaço de tempo, demonstrando sentidos, e possíveis interpretações
para as canções, para as bandas/cantores(as), e também para o período em que o vídeo é
lançado.
O cinema não é um assunto novo a ser debatido, nem analisado pelos
historiadores, inclusive autores brasileiros discutem como fazer uma análise social do
cinema desde a década de 1940, mas foi a partir de 1990 que se pensou na relação entre
emissão e recepção. Com as novidades tecnológicas os estudos sobre o assunto vêm em
um crescente. Maior a popularidade, maior o interesse.
Enquanto instituição, o cinema, e suas produções, que vamos estender também
para seus desdobramentos como o vídeo-clipe, acabam tendo elementos nacionais e
internacionais, sofrem alterações conforme o sistema econômico, o mesmo se relaciona
com as estruturas de dominação e resistência, ideologias e movimentos sociais, ele é
orgânico, está em movimento, e é imprescindível ter essa referência para análise.
Bordwell (2005) aborda que podemos estudar a narrativa cinematográfica como
uma representação (qual o conjunto de ideias exposto?), ou uma estrutura (abordagem
sintática), ou ato (forma de contar a história à um receptor). Outras questões para análise
trazidas por Lera (1997) que eu condenso aqui como produção, gênero, emissão,
recepção e contexto.
O vídeo-clipe foi lançado com o objetivo de empregar as equipes que faziam
filmes por mais tempo no ano, e criar um novo produto a ser consumido. Assim,
rapidamente tínhamos a MTV americana, cuja programação principal era apresentar
clipes durante 24 horas (sem parar), que foi espalhada pelo Ocidente através de filiais,
como a brasileira que aportou no ano de 1991 e, alterou muitas linguagens de programas
de televisão, rádio, propaganda e cinema nos demais canais, e também nos circuitos de
filmes alternativos brasileiros.
Pensando a nossa realidade atual, em 2016, a ferramenta mais utilizada para
compartilhar e publicar vídeos (filmes, propagandas, vídeo-clipes, lyrics vídeos, vídeos
caseiros, e etc.) é o Youtube, uma plataforma da/na internet onde o usuário faz um
cadastro com dados pessoais, construindo um perfil, e através deste consegue
2 Também pode ser chamado de clipe, clip, vídeo.
postar/publicizar os seus próprios vídeos, comentar os vídeos de outros usuários,
compartilhar publicações que não são suas, além de se inscrever como espectadores
(seguidores) de outros perfis para acompanhar os conteúdos sempre que forem
atualizados.
As mídias especializadas, como por exemplo, complexos que uniam gravadoras
de discos, canais de televisão, escritórios de representação/marketing, e produtoras, por
muitos anos detinham o poder da maioria da produção e emissão de conteúdos
publicizados que alcançavam a maioria da população, porém, no Brasil a partir da
década de 1990, temos uma facilidade em acessar materiais tecnológicos de caráter
amador, e em meados de 2010 de caráter profissional, como máquinas filmadoras e
fotográficas, microfones, instrumentos musicais, computadores e, muitos acessórios
(placas de som e de vídeo, softwares, e etc.). O advento da internet foi como uma
injeção, alterando as formas de sociabilidades, e os pontos de fusão das informações,
tornando cada usuário um produtor, emissor, e espectador de conteúdos variados.
Esta alteração refletiu também no crescimento de produções independentes, pois
elas são gratuitas, e disponibilizam os conteúdos para a maior parte do mundo, ficam de
fora apenas os países que sofrem com ditaduras onde o acesso à internet é proibido ou
limitado.
A Arandu Arakuaa fez suas obras de forma independente e, para a divulgação
utilizam as ferramentas gratuitas de internet, sendo as principais o Facebook e o
Youtube. Para realizarem seus vídeo-clipes, chamaram o colega Caio Cortonesi, que por
ser neto de um proprietário de cinema, se envolveu com a arte de forma familiar, e
através de sua formação em Desenho Industrial pela Universidade de Brasília em 2008,
conseguiu ser um profissional diversificado, o mesmo gerencia cinco perfis no
Facebook relacionados com suas áreas de atuação, são eles: @cortonesi3, o perfil
pessoal onde podemos conhecer um pouco deste profissional, que também é conhecido
como Caio Duarte (da banda Dynahead); @dynaheadband4, perfil da banda de Heavy
Metal do qual é vocalista e compositor utilizando o nome Caio Duarte;
3 https://www.facebook.com/cortonesi 4 https://www.facebook.com/dynaheadband
@broadbandprod5, perfil do estúdio de gravação, do qual é proprietário e produtor
musical (setenta álbuns em sua carreira até agora); @procyonfilms6, produtora
cinematográfica, que além de dono, é roteirista, diretor e produtor cinematográfico e, o
@ifallart7, onde ele demonstra suas habilidades artística enquanto designer e músico, é
o seu álbum solo, sua sonoridade e expressão artística própria. Estes perfis têm como
língua base o inglês, o que já demonstra um contato com o mercado estrangeiro.
“Sabedoria do cosmos” ou “saber dos ciclos dos céus” é o significado de Arandu
Arakuaa, nome retirado do livro “A Terra dos Mil Povos – História Indígena do Brasil
Contada por um Índio” de Kaká Werá Jecupé, que remete à cosmovisão indígena.
Zândhio Aquino além de tocar guitarra, viola caipira, teclado, maracás e, fazer backing
vocal e alguns vocais nas canções, é o principal porta-voz e idealizador da banda. Ele,
desde cedo se percebeu entre as culturas indígenas e não-indígenas, pois passou a
infância na zona rural da região central do Estado do Tocantins, nas proximidades da
comunidade Salto Kripre (Terra Indígena Xerente) e, também da Terra Indígena Krahô.
Na adolescência teve “colegas de aula” indígenas, e os laços foram se estreitando, até
hoje ele freqüenta a Terra Indígena Xerente, o que aumentou a vontade de fazer algum
projeto artístico que se relacionasse com estas comunidades e culturas. Então, após
terminar a faculdade (Pedagogia) mudou-se para Brasília, e mais estabilizado, pode se
dedicar à música.8
A partir de 2008 ele começa a ter uma estrutura mais definida de como seria a sua
trajetória, sua sonoridade, mas foi complicado de encontrar parceiros para tocar Heavy
Metal com letras em tupi. E através de classificados de músicos na internet, em Outubro
de 2010, o guitarrista entra em contato com Nájila Cristina (vocal, maracás) que
prontamente aceitou o convite, e em janeiro de 2011, com Adriano Ferreira (bateria e
percussão) que passou a integrar a banda, e menos de um mês depois, o baterista
5 https://www.facebook.com/broadbandprod 6 https://www.facebook.com/procyonfilms 7 https://www.facebook.com/ifallart 8 https://fansaranduarakuaa.wordpress.com/category/zandhio-aquino/
convidou o Saulo Lucena (contrabaixo/vocais de apoio/maracá) para a banda, já que
ambos tocavam juntos desde os tempos de moleques.9
Com esta estrutura, o som tomou corpo, e desde então, esta banda de Taguatinga
no Distrito Federal, lançou o EP-demo10 (homônimo) no Leste Europeu em 2012 (ver
ANEXO-1) pelo selo Depressive Illusions Records em tiragem limitada11. Segundo
Marcos Garcia do site Metal Samsara12, ao fazer uma crítica sobre este álbum, comenta
que a banda faz "Metal agressivo e intenso com ritmos indígenas brasileiros", as
temáticas são voltadas para histórias vividas e contadas pelos povos originários, assim
como, a língua utilizada para compor as letras, são em tupi antigo, a língua original do
Brasil. Esta obra foi produzida por Guilherme Peixoto no RS Estúdio, e contou com
reforço nos vocais femininos nas faixas em ‘Tupinambá’ e ‘e Moxy pe~e Supé
Anhangá’, da cantora Isa.
Em setembro de 2013, lançam o álbum de estréia, o primeiro full length - álbum
completo, contendo 13 faixas, nestas, as 4 do álbum anterior “repaginadas” -, intitulado
Kó Yby Oré, também de forma independente, mas agora produzido por Caio Duarte (ou
Caio Cortonesi) vocalista da banda Dynahead, dono e produtor musical do estúdio
Broadband Studio, pelo mesmo selo que o EP, a MS Metal Records. E em 2015, outro
full length, com a mesma parceria de Caio Duarte (gravação, produção e mixagem), o
álbum Wdê Nnãkrda esbanja criatividade, não somente sonora, pois a banda mistura
mais estilos que apenas o Heavy Metal Extremo, neste percebemos outras vertentes do
Rock, mas também, diferentes línguas originárias, ao todo são cinco canções em Akwẽ
Xerente13, três em Tupi14, duas em Xavante15 uma em Português16.
9 Segundo entrevista cedida para o site Heavy World em 28 de maio de 2015, os integrantes tem seus
trabalhos comuns: Adriano trabalha na área da saúde, o Saulo em Hipermercado, Nájila com Call Center
e o Zândhio com trabalhos em situações in loco vinculados a órgãos do governo.. Disponível
em:<http://heavyworld.com.br/noticias/arandu-arakuaa-confira-entrevista-exclusiva-com-a-banda/>.
Acesso em: 26 de jul. de 2016. 10 Formato de álbum com poucas faixas, este, por exemplo, tinha o registro de 4 canções: 01. Tupinambá,
02. Auê!, 03. Kunhâmuku’~i e 04. Moxy pe~e Supé Anhangá. 11 Sepulchral Voice Fanzine. Disponível em:<http://www.sepulchralvoicefanzine.com/2013/02/arandu-
arakuaa-primeira-demo-da-banda-e.html>. Acesso em: 26 de jul. de 2016. 12 http://metalsamsara.blogspot.com/2012/09/arandu-arakuaa-arandu-arakuaa-cd-demo.html 13 Watô Akwẽ (sou Indígena), Hêwaka Waktû (Nuvem Negra), Dasihâzumze (Brincadeira), Padi
(Tamanduá), Wawã (Anoitecer ) que é uma “música instrumental”. 14 Nhandugûasu (Aranha Grande), Nhanderú (Criador) e Sumarã (Inimigo). 15 Ĩwapru (Meu Sangue) e Ĩpredu (Ancião).
Paralelo a esta trajetória de lançamentos, a banda participou e participa de eventos
variados, o que auxilia em sua divulgação para diferentes públicos. A mesma foi trilha
sonora do desfile da marca ErreNove na 7ª edição do Paraná Business Collection17 na
Federação das Indústrias do Estado do Paraná, se apresentaram em formato acústico no
Fórum Mundial de Direitos Humanos (ano de 2013)18, e foram convocados para grandes
festivais como Agosto de Rock (TO), Femme Festival (GO), Ferrock (DF), Porão do
Rock (DF) e THORHAMMERFEST (SP), por exemplo, destaco também, que em 14 de
Outubro de 2014, a Rádio Yande (a primeira rádio indígena online do Brasil) faz uma
matéria sobre a Arandu Arakuaa demonstrando que aprovam o trabalho da banda, e que
esta chama atenção para as causas indígenas. Hoje a rádio é considerada um dos
principais canais de comunicação entre as diferentes comunidades indígenas do Brasil e
América Latina, assim como, uma fonte para não-indígenas conhecerem sobre a luta
destes povos para com seus direitos, e suas culturas, pois são indígenas falando por eles
mesmos.19 Outro destaque é o convite para participarem da trilha sonora do
documentário sobre a trajetória do Cacique Nailton Muniz Pataxó, indígena de
descendência Tupinambá, a obra contempla e sua luta pela reconquista da Terra
Indígena Caramuru-Catarina Paraguassu e como, a partir disto, tornou-se um
personagem de grande importância no movimento indígena do Brasil. A canção Watô
Akwẽ, que significa “Sou Indígena” no idioma Akwẽ Xerente, e está no último álbum da
16 Povo Vermelho. 17Arandu Arakuaa: música em trilha sonora de desfile de moda. Disponível
em:<http://whiplash.net/materias/news_833/166754-aranduarakuaa.html#ixzz4FXhnbXoi >. Acesso em:
26 de jul de 2016. Evento dia 9 de novembro de 2012. O Paraná Business Collection – o maior evento de
moda do sul do país – ganhou mais uma edição em 2012, e agora está em sintonia com as tendências de
cada estação. Com o tema “A moda de corpo inteiro”, o PBC coloca no centro das atenções os acessórios,
que contribuem na essência do visual e trazem refinamento estético. Nessa 7ª edição, além das onze
marcas que lançam coleções Inverno 2013 na passarela, o evento traz um showroom de negócios que vai
movimentar o mercado fashion com empresas do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Na
programação de eventos paralelos, o PBC traz palestras, oficinas e lançamentos de livros que
democratizam a cultura fashion com a participação de especialistas em estilo, criação, varejo, marketing,
que passam sua experiência a profissionais, ou estudantes, interessados nestas áreas. 18 Fórum Mundial de Direitos Humanos. Disponível
em:<http://www.ebc.com.br/cidadania/2013/12/forum-mundial-de-direitos-humanos-ja-tem-mais-de-dez-
mil-inscritos>. Acesso em: 26 de jul. de 2016. 19 Banda de Brasília faz metal em tupi para chamar atenção à causa indígena. Disponível
em:<http://radioyande.com/default.php?pagina=index.php&site_id=975&pagina_id=21862&tipo=post&p
ost_id=61>. Acesso em: 26 de jul. de 2016.
banda (Wdê Nnãkrda – de 2015)20. Tanto a matéria, como a trilha sonora, ambos as
manifestações indicam que existe uma proximidade entre banda e Movimento Indígena.
E por isso, retornamos aos vídeo-clipes, pois a Arandu Arakuaa utiliza da
linguagem, da estética, dos povos indígenas, assim como, de elementos da música
tradicional brasileira (baião, catira, frevo, moda de viola…), também chamada de
regional e/ou muitas vezes folclóricas, para conseguir fazer suas canções, o que reflete
em sua performance, seja no palco, seja nos vídeos.
Ao todo, hoje no mês de Julho de 2016, são quatro clipes, os dois primeiros são
Gûyrá e Aruanãs, faixas do álbum Kó Yby Oré de 2013, e os dois últimos, são Hêwaka
Waktû e Ĩpredu do álbum Wdê Nnãkrda de 2015. Álbuns gravados, produzidos, e
mixados por Caio Cortonesi, assim como, todos os vídeos foram produzidos e dirigidos
pelo mesmo. Devido a estas características, e percebendo que as obras estabelecem
relações umas com as outras, fazendo parte de um conjunto, analiso com o auxílio das
metodologias de Sophie Cassagne (com o processo de analise de fontes), Martine Joly
(com suas definições de imagem), assim como, a de Paul Zumthor (para a compreensão
de performance) e Luiz Tatit (para a análise de melodia e letra, a canção). Para tal,
parto do canal (perfil da banda) no Youtube, que podemos considerar um acervo online
da banda, o mesmo funciona desde 09 de Outubro de 2011, e contém 3.611 inscritos
(seguidores/espectadores), e teve 238.963 visualizações no total. Os dados que trago
abaixo, foram todos revistos no dia 26 de Julho de 2016.
O clipe Gûyrá21 foi publicado em 8 de Julho de 2013, e hoje tem 63.729
visualizações, e dentre estas pessoas, 1.922 deixaram sua opinião dizendo que gostaram
("deram likes") e outras 29, deixaram sua opinião dizendo que não gostaram ("deram
dislikes"). A canção é a faixa número 12, é a penúltima do álbum, cuja letra aborda
sobre o sentimento de liberdade, materializada na figura de um pássaro (“gûyrá”), a
banda demonstra intimidade com cantos indígenas, que é a base melódica para esta
canção. Este vídeo tem grande importância por apresentar a banda em performance, e
20 Arandu Arakuaa: em trilha sonora de documentário indígena. Disponível
em:<http://whiplash.net/materias/news_795/236516-aranduarakuaa.html>. Acesso em: 26 de jul. de 2016. 21 Vídeo-clipe Gûyrá. Disponível em:https://www.youtube.com/watch?v=OXvTZ_tqcYc. Acesso em: 20
de Jul. de 2016.
tem como destaque o cenário escolhido para o vídeo foi o Recanto Morro da Capelinha,
localizado no Distrito Federal.22
O segundo, Aruanãs23, foi publicado em 4 de Junho de 2014, apresenta atualmente
números muito parecidos com o anterior, 60.820 visualizações, 1.769 likes e 38 dislikes.
O mesmo foi gravado na Chácara São Sebastião e Fazenda Capão Redondo em Águas
Lindas no Estado de Goiás. A canção é a segunda faixa das 13 (treze), e foi composta
entre 2002 e 2003 por Zândhio Aquino, e segundo o mesmo, em entrevista para o
website (consagrado do Heavy Metal) Whiplash24 onde comenta as faixas do álbum, diz
que a letra, cujo título significa “Espírito das Águas” aborda o mito de origem dos
(índios) Karajá que moravam no fundo do rio. Um jovem indígena, ao se interessar por
conhecer terra firme, encontrou uma passagem e, ficou fascinado pelas praias e riquezas
do Rio Araguaia. Depois disso, muitos Karajá subiram também. Anualmente na festa de
Aruanãs acredita-se que os espíritos de seus ancestrais aquáticos sobem até a superfície
para celebrar.25 Os Karajá se autodenominam Iny, que em sua língua de tronco Macro-
Jê (como os Javaé e Xambioá) significa “nós”. Os mesmos vivem na região do Rio
Araguaia com aproximadamente 4 (quatro) mil pessoas que englobam os Estados de
Tocantins, Mato Grosso e Goiás.
O álbum Kó Yby Ore (de 2013), todo em tupi antigo, tem como autor do conceito
gráfico (encarte e capa) Leandro Lestat, que contou com material fotográfico cedido por
Zândhio Aquino (guitarrista). As cores predominantes são vermelho, laranja, marrom,
azul e verde, ao fundo temos o olhar de um indígena (com os olhos compostos por uma
faixa em pintura vermelha), e logo a frente, no lado direito do álbum temos uma sombra
de outro indígena, aparenta ser mais velho, em silhueta vemos um cocar, colares de
miçangas e sementes, assim como pulseiras do mesmo material. Este faz o gesto como
22 Faixa-a-faixa com Arandu Arakuaa. Disponível em:< http://whiplash.net/materias/biografias/186452-
aranduarakuaa.html>. Acesso em: 19 de jul. de 2016. 23 Vídeo-clipe Aruanãs. Disponível em:< https://www.youtube.com/watch?v=L11HRPYon7o>. Acesso
em: 20 de Jul.de 2016. 24 Faixa-a-faixa com Arandu Arakuaa. Disponível em:< http://whiplash.net/materias/biografias/186452-
aranduarakuaa.html>. Acesso em: 19 de jul. de 2016. 25 Whiplash. Disponível em<whiplash.net>Acesso em 27 de janeiro de 2016.
se estivesse apresentando o álbum para alguém, o corpo levemente inclinado e a mão
estendida, indico ver o Anexo 1. 26
O terceiro vídeo-clipe, Hêwaka Waktû27, publicado no dia 25 de Junho de 2015,
hoje apresenta 52.343 visualizações, 1.885 pessoas que declararam gostar, e apenas 30
não gostaram. A canção, cujo título significa “Nuvem Negra” (em Xerente) é a terceira
faixa do álbum, e foi escrita por Zãndhio e tem como cenários de vídeo o Santuário dos
Pajés localizado na Aldeia Bananal no Distrito Federal, cujas gravações foram efetuadas
no dia 19 de Abril de 2015 (data comemorativa ao Dia do Índio) em um ritual de
homenagem a um ano da morte de seu líder, Pajé Santxiê Tapuya no Recanto do Jacaré
também no Distrito Federal no dia 21 de Junho de 2015. Esta canção foi composta
(também) por Zândhio, ao visitar amigos na comunidade Salto Kripre (Tocantins), e
para ter um elemento diferente na melodia, utilizam a flauta Enawenê-nawê, cujo uso é
restrito para rituais do grupo Enawenê-nawê, como também de alguns povos do
Xingu.28
O último clipe, Ĩpredu29, mesmo publicado a pouco tempo, no dia 22 de Março de
2016, já demonstra certa popularidade com 10.903 visualizações, onde 739 pessoas
afirmam gostar, e 9 pessoas afirmam não gostar da obra. A nona faixa do álbum tem
“Ancião” como significado de seu título (em Xavante), e as gravações do vídeo foram
em Brasília, no Memorial dos Povos Indígenas (com participação de Ailton Krenak e
Álvaro Tukano, entre outraas lideranças), durante a cerimônia de encerramento da
Vigília Guarani Kaiowá e, no Córrego do Urubu.
Estes dois últimos são do álbum Wdê Nnãkrda (de 2015), cujo projeto gráfico
(encarte e capa) são de Natalie e Bianca Duarte. As irmãs também são as idealizadoras e
26 Arandu Arakuaa: disponibilizada arte da capa do debut álbum. Disponível
em:http://whiplash.net/materias/news_827/180482-aranduarakuaa.html#ixzz4FouiPocf. Acesso em: 26 de
jul. de 2016. 27 Vídeo-clipe Hêwaka Waktû . Disponível em< https://www.youtube.com/watch?v=aT6eLthDwUE>.
Acesso em: 20 de Jul. de 2016. 28 Arandu Arakuaa: exaltando a cultura indígena em novo vídeo clip Disponível
em:http://whiplash.net/materias/news_799/230753-aranduarakuaa.html#ixzz4FotjsBMd. Acesso em: 22
de jul. de 2016. 29 Vídeo-clipe Ĩpredu. Disponível em:< https://www.youtube.com/watch?v=ouOcLdgp-70>. Acesso em:
20 de Jul. de 2016.
ilustradoras do projeto Brasil Fantástico30, que é sobre mitologia brasileira, e envolve
folclore brasileiro e cultura indígena. Em entrevista dada para o blog Pindorama
História, elas afirmam para fazerem suas ilustrações, utilizam da técnica “pintura
digital”, e que o projeto com as lendas brasileiras era para a conclusão do curso de Artes
na Universidade Federal da Bahia (UFBA), mas ele acabou transbordando os limites
imaginados, hoje contendo mais de 200 lendas catalogadas (maioria indígenas), e em
breve, sairá um livro (ilustrações e lendas), entre outros produtos com parcerias
externas.
Álbum mais maduro, que demonstra uma maior imersão na cultura indígena como
um todo. A capa tem como destaque a figura de uma mulher, ela está centralizada,
iluminada e emoldurada pelo logotipo da banda e título do álbum. Ela aparece de corpo
inteiro, e tem o tamanho das árvores ao redor, seu corpo se parece muito com os corpos
reais de mulheres magras, os traços trazem curvas, fugindo dos traços de "mulheres
fantásticas", mulheres robotizadas e/ou heroínas da Marvel. É uma mulher possível.
Através das características físicas, como pintura e vestimentas, podemos dizer que é
uma indígena, e que não é norte-americana, pelo estilo de saiote ela provavelmente é
parte dos povos originários latino-americanos. Ela aparece de corpo inteiro, tem as
bochechas pintadas de vermelho, e seu tronco pintado com listras que se assemelham
com as ranhuras dos troncos de árvores, seios a mostra, cabelos longos, lisos e escuros,
com corte em diferentes camadas (incluindo franja), o saiote aparentemente feito com
vegetação, tipo uma palha, folhas secas/desidratadas. Seu corpo e rosto virados para a
frente, fazendo menção de caminhar. No fundo temos uma paisagem mais iluminada,
que indica que a mulher está entrando na mata, ao mesmo tempo em que cria uma
luminosidade por de trás desta. Ela caminha para dentro, do mais luminoso para o ponto
mais escuro, de uma vegetação mais aberta (acessível) para uma vegetação mais
fechada, o ato de embrenhar-se. A única figura que tem movimento é ela, e ao seu redor
surgem penas caindo potencializando este sentido de movimento. No lugar dos seus pés,
temos raízes, que se conectam com a terra e, plantas ao redor. Veja o Anexo 1.
Ao pesquisar pinturas de povos indígenas do Brasil, encontrei a imagem abaixo:
30 Interesse, entrar nos endereços: http://brasilfantastico.tumblr.com e
https://pindoramahistoria.wordpress.com/2015/02/13/brasil-fantastico-entrevista-com-bianca-duarte/
Indígena do povo Kanela,31
Para mim, isso demonstra uma tentativa muito grande de trazer uma semelhança
com a realidade, temos o saiote, as pinturas como ranhuras e as bochechas pintadas de
vermelho. Conforme notícias encontradas o povo Kanela reside no estado do Amapá,
sua língua provavelmente é do tronco Xerente, já que o álbum tem seu título nesta
língua. O cenário tem sua aparência próxima a de jogos para vídeo-games e/ou
computadores, composto por uma floresta em tons de verde, os tons mais claros atrás, e
os tons mais escuros na frente. Dá a impressão de que estamos dentro da floresta.
Olhamos de dentro para fora.
O logotipo da banda está localizado no topo na imagem, bem centralizado, como
se estivesse no céu, junto a copa das árvores. Muitos poderiam associar com o mundo
das idéias, dos ideais. E a opção de não colocarem o título em maior destaque do que o
logo é instigante. Nos outros álbuns a cor para o logotipo era verde, em um degrade do
mais claro para o mais escuro. Aqui, ele vai de tons de verde para tons de vermelho. A
palavra Arandu está em verde, e a palavra Arakuaa está em vermelho, assim como as
penas que compõem a logo, a parte superior é verde, e a inferior é vermelha.
A cor vermelha é referente aos indígenas, inclusive a última faixa deste CD se
chama “Povos Vermelhos”. Com este terceiro álbum, a banda está se consolidando no
heavy metal, o terceiro disco é para sobreviventes, aqui apontam seu posicionamento,
31 Indígena do povo Kanela. Acesso em:<
http://br.radiovaticana.va/news/2016/04/15/vergonha_os_%C3%ADndios_est%C3%A3o_sendo_extermi
nados/1222912> 14 de jul. de 2016.
sua transformação através da imersão e proposta. Estão se tornando indígenas em sua
alma. O título do álbum, Wdê Nnãkrda, está na parte inferior da capa, bem centralizado,
localiza-se no chão da imagem de fundo, junto às raízes. Seu significado é "tronco de
árvore", "enraizamento", origem, raiz, base no idioma Akwẽ Xerente32. O mesmo está
totalmente na cor vermelha. Mais uma menção ao enraizamento da banda com as
questões indígenas, é este sentido de pertencer também a uma cosmovisão indígena que
guia este trabalho. Como diz o ditado “Existem pessoas que tem sangue indígena nas
mãos, umas em suas veias, enquanto outras em sua alma”. A base do trabalho é esta
conexão entre banda-indígenas-natureza-cosmovisão.
As linguagem, e imagens, utilizada nas capas também são elementos do que
vimos tabém em seus vídeo-clipes. Vale lembrar que a banda (afirma quando
entrevistados pelo Blog “Povos indígenas do Brasil”) utiliza do diálogo com indígenas,
vídeos publicados na internet pelos mesmos, livros e, de dados tidos como oficiais sobre
as etnias indígenas como o Instituto Sócio Ambiental33 por terem dados mais acessíveis
para escreverem suas letras. Como sabemos, os estudos sobre indígenas é muito
escasso, sem contar que os poucos que existem, muitas vezes são preconceituosos.
Outro fator, é que em 2016 começamos a ver indígenas nas universidades, tudo reflexo
das políticas públicas voltadas para a educação indígena a partir de 1995, para que os
mesmos tenham suas vozes ouvidas.
As duas primeiras canções, Guyrá e Aruanãs, são na língua Tupi Antigo, esta foi a
mais popular até o século XVII no Brasil, tendo suas variações, inclusive a nheengatu,
língua desenvolvida pelos bandeirantes e demais exploradores do país, que para
conseguirem auxílio dos nativos (indígenas) tiveram que aprender algumas palavras de
suas diferentes línguas, e depois, sofreu diversas alterações com a exploração da mão de
obra de africanos escravizados trazidos para o Brasil, trazendo sua cultura. Desta forma,
o português tardou a ser nossa língua oficial, principalmente pois, muito tempo depois
abrigamos diferentes europeus fugidos das guerras, e é uma língua muito distinta da
32 Arqueologia Egípcia. Acesso em:< http://arqueologiaegipcia.com.br/aegipcia/tag/bianca-duarte-e-
natalie-duarte/>. 10 de jul. de 2016.
Zândhio: O próprio conceito do álbum. Wdê Nnãkrda (tronco de árvore no idioma Akwẽ Xerente), em
um sentido amplo seria origem, raiz, base, ancestralidade, conexão com a mãe terra. 33 Site do Instituto Socio Ambiental. Disponível em:<http://www.isa.com.br> Acesso em 27 de janeiro de
2016.
falada em Portugual. Conforme a imersa, e o acesso alcançado pela banda através de
suas obras, temos uma diversidade maior de línguas cantadas.
Oralidade é o ato, prática, de verbalizar, de se comunicar utilizando expressões
corporais e sonoras (do corpo) para transmitir relatos de geração em geração
perpetuando memórias coletivas de um povo, comunidade, nação. É importante
estabelecer a diferença com a História Oral, que é uma metodologia de análise de
evidências orais, as obtidas através de entrevistas com pessoas vivas, pois muitos
pesquisadores acabam confundindo34.
Zumthor identifica diferentes formas das sociedades se relacionarem com a sua
oralidade. A Primária e Imediata seriam as comunidades sem a necessidade de escrita.
A oralidade é a sua estrutura de comunicação. Já as sociedades de Oralidade Mista,
utilizam a escrita como um suporte possível para armazenar a oralidade, e para auxiliar
em sua difusão. E a Oralidade Segunda, estabelece uma relação como uma simbiose
entre fala e escrita, já que a escrita pode trazer muitos elementos do falado para o papel,
e vice-versa.35 Somos muito mais orais do que imaginamos
A canção – junção entre letra e melodia – possibilita uma experiência maior, uma
relação mais profunda. E Schaffer, ao abordar paisagens sonoras percebemos a presença
da música em nosso cotidiano. Nossas primeiras experiências são através da audição e
com isso, partimos para as próximas, fala-voz-oralidade. Com a possibilidade de nos
filmar, e com as plataformas que armazenam e divulgam audiovisuais, tivemos um
crescimento de expressões de grupos, que até então eram traduzidos apenas por grupos
sociais de maior importância econômica-política, compartilhadas.36
O ato de contar algo em verso é muito antigo, e para as sociedades em que a
escrita está em segundo plano, a utiliza como metodologia para que a memorização da
História seja mais fácil, como artifícios poéticos, do mesmo modo em que a rima auxilia
também no ritmo.
34 GALVÃO, Ana Maria O.; BATISTA, Antônio A. G. Oralidade e escrita: uma revisão. In: Cadernos de
Pesquisa, v. 36, n. 128, maio/ago. 2006 35 GALVÃO, Ana Maria O.; BATISTA, Antônio A. G. Oralidade e escrita: uma revisão. In: Cadernos de
Pesquisa, v. 36, n. 128, maio/ago. 2006 36 SCHAFER, R. Murray. A afinação do mundo. São Paulo: UNESP, 2011.
Araújo, conta que cada sociedade define o conceito e a importância para a
oralidade, tradição e música conforme o espaço em sua cultura. Como vimos, nosso ato
de falar envolve elementos que em nossa sociedade definimos como musicais, porém
para sociedades sem escrita, ou com pouca importância da mesma, farão uso de suas
verbalizações com melodia, ritmo, rima e letra para transmitir histórias sobre passado,
mantendo assim, as memórias coletivas, muitos rituais, e consequentemente a
tradição.37
Não podemos pensar as tradições como algo fixo, as comunidades orais se
modificam, e estas podem alterar suas narrativas, seja através de sua forma, estrutura,
e/ou conteúdo. Por exemplo, os povos guaranis introduziram a viola em seus rituais, em
sua musicalidade.
Os historiadores/as por muito tempo quiseram negar, ignorar, as histórias dos
povos originários, colocaram estas a categoria de mito, de lendas. Hoje com a
aproximação com outras áreas, historiadores/as perceberam que a tradição oral é o
registro que temos de um Brasil muito anterior ao ano de 1500.
O pensar em música é um pensar em rede, em coletivos. É conectar com os outros
e consigo, com o meio onde vive. É transpor o tempo linear, é pensar em espiral, é
oralidade na prática.
Um elemento muito importante são os “cantos indígenas”, melodia de cantos
muito similares aos ouvidos em comunidades indígenas, apresenta uma proximidade
com a ancestralidade, com os “mais velhos”, com a tradição de transmitir oralmente os
valores de uma comunidade. A questão da ancestralidade é um tema muito trabalhado
por todas as bandas do Levante, as Pernambucanas se remetem muito ao caipira, a
Recife de outrora, que acabou urbanizada e descaracterizada pelo bem da urbanização e
distanciamento com a natureza.
A Floresta é o cenário principal destes vídeos, nos remete a conexão (ou o
reconectar) com a terra. Algo muito levantado pelas lideranças indígenas pela
proximidade com ONGs ou instituições relacionadas à ambientalistas, onde se
37 ARAÚJO, Samuel. Em busca da inocência perdida? Oralidade, tradição e música no novo milênio. In:
Músicas africanas e indígenas no Brasil.TUGNY, Rosângela Pereira de; QUEIROZ, Ruben Caixeta de.
Beolo Horizonte: UFMG, 2006.
desenvolveu o discurso de que as terras indígenas são os locais onde a mata é
preservada, que o indígena é o humano responsável por protege-la, de que fazem parte
da terra, se reconhecem como mais um elemento da Mãe Terra (Pachamama), sendo
este discurso um catalisador da principal pauta do Movimento Indígena, a demarcação e
legalização das terras das muitas comunidades.
A vegetação do cerrado conta que a banda não é do meio urbano, Não se
identificam como tal, eles são parte do sertão brasileiro, do interior, do rural, eles estão
a margem, assim como, sua sonoridade Heavy Metal é Extrema e underground, com
elementos do trash, death, doom e black. O primeiro é conhecido como um dos estilos
mais antigos, fruto da mistura entre punk californiano (que depois gerou o hardcore) e
metal, este estilo fez a ruptura do Heavy Metal virtuoso com muitos solos de guitarra
intermináveis, traz consigo uma sonoridade mais urbana, crua e direta, a banda
Motorhead é a mais popular e antiga do estilo. O Death Metal é o trash mais agressivo,
mais rápido, mais pesado, aos poucos foi se distanciado de sua matriz e se tornou um
estilo próprio. O Doom Metal (também conhecido como Gothic Metal) tem como
principal elemento misturar vocais tidos com masculinos e femininos, é onde
encontramos as vocalistas mulheres. O estilo faz um diálogo entre a voz lírica (de
ópera) e o gutural, feita na garganta, muito rouca (voz que remete ao extremo, ao
underground, ao “Diabo”), o diálogo entre a Bela e a Fera, que na Arandu ambas as
vozes são feitas por Nájila (vocalista). O Black é o mais extremo, seja nas distorções de
vozes e instrumentos, seja nas temáticas, mas são muito populares por suas pinturas
corporais.38
Os elementos da natureza apresentados como portais, a água, ela limpa, conecta e
renova. Os elementos da natureza funcionam em conjunto, por exemplo, Tupã (criado
pelo criador (Nhanderu) também conhecido pelos seus poderes como trovão,
tempestades, chuva, nuvens e afins), teria como morada o Sol, o mesmo se apaixonou
por Jaci (ou Araci), cuja morada é a Lua, responsável pela comunicação entre os
humanos, eles se conheceram através das estrelas, demoraram anos para se encontrarem,
38 CAMPOY, Leonardo Carbonieri. Trevas sobre luz: o underground do Heavy Metal Extremo no Brasil.
SP: Alameda Casa Editorial, 2010.
e no dia pós seu casamento, vieram para a terra para construírem os rios e os mares. E
grande parte da cultura dos povos originários do Brasil traz em suas histórias e
cerimoniais o Ciclo de Tupã (Tradição do Sonho, do Sol e da Lua), que é a base da
ciência dos Guaranis, cujo nome é “Arandu Arakuaa”, que significa “A Sabedoria dos
Movimentos do Céu”, que aborda as leis dos ciclos da Terra, do Céu e dos seres
humanos. 39
As histórias que muitas vezes chamamos de mitos também são apropriadas e
ressignificadas no cotidiano das bandas, isso acaba aparecendo em suas práticas e
reflete em seus acessórios e adornos corporais.
Em seus clipes, a Arandu utiliza muito de fibras naturais, principalmente nas cores
verde (referente a mata) e vermelha (referente ao “povo vermelho”, que seriam os
indígenas). Cada integrante tem um traço dentro das identidades existentes no Metal,
como Nájila (vocalista) utiliza animal print (estampas eu imitam peles de animais)
como cobras e onças, muito utilizados entre as mulheres headbangers, mas que também
referenciam os animais da mata, além de colares e pulseiras de sementes ou miçangas,
mechas verdes no cabelo – cabelos coloridos são muito populares dentro do rock- o que
aqui também pode indicar que aos poucos ela faz parte da natureza, brincos de penas e
pinturas no rosto. Zândhio (guitarrista) utiliza um visual mais clássico com os cabelos
compridos e lisos, corpo desnudo na parte superior, coturnos e calça de couro,
munhequeira de couro, tudo acrescido e potencializado com pintura nos braços e tronco,
colares de semente e miçangas, e saiote feito de fibras vegetais por cima da calça. Saulo
(baixista) é de um visual mais básico, frequentemente utilizado pelos fãs, ou
headbangers, no cotidiano, a camiseta preta (as mais populares tem a capa de álbuns de
bandas de Heavy Metal estampadas) e calça jeans lavagem escuras nos tons de azul e
preto. Já, Adriano (baterista) tem um visual bem urbano e esportivo, fazendo referência
ao gore, grind e splatter, cujas vestimentas integram a bermuda, cabelos moicanos ou
muito curto, e aos esportes radicais, muito relacionados aos estilos de vidas extremos,
não-normativos, como o próprio skate. As pinturas corporais também são utilizadas no
39 Sabedoria dos movimentos do Céu. Disponível
em:<https://pindoramahistoria.wordpress.com/2014/12/23/arandu-arakuaa-a-
sabedoria-dos-movimentos-do-ceu/>. Acesso em: 21 de jul. de 2016.
Heavy Metal, principalmente no Black Metal, são conhecidas como corpse paint,
pinturas que imitam cadáveres, porém, a banda utiliza pinturas muito similares as dos
povos Akwe-Xerente.
Inclusive a banda fechou uma parceria com a Grife Thiago Paes na primeira turnê
da banda em 2013, após sua música ser utilizada na 7ª edição do Paraná Business
Collection. O empresário e estilista Thiago Paes, proprietário da marca, mora em
Curitiba a mais de sete anos, embora seja alagoano, seu estilo segue o militarismo
através das modelagens das peças, dos cortes retos, cujas cores predominantes sejam o
preto, o verde militar, o cru e, o marrom, formatando figurinos mais sóbrios. 40
Quanto aos instrumentos, para além das guitarras distorcidas, teclado, baixo e
bateria, utiliza-se uma diversidade de tambores, e chocalhos, como maracás, e outros
formados por uma seqüência de sementes amarradas nos tornozelo e antebraços, pau-de-
chuva, e flautas de diferentes comunidades indígenas como a já mencionada Enawenê-
nawê. O mais popular entre as bandas do movimento é a viola caipira, mesmo que
algumas não a tenha efetivamente enquanto um instrumento, utilizam muitos riffs
conhecidos de modas de viola, já outras preferem utiliza-la como um diferencial, mais
uma referência as identidades regionais que permeiam o “sertão brasileiro”, que
atravessa nosso país (extenso) de norte a sul, pois vemos a mesma brilhar nas melodias
de caipiras, caboclos, caiçaras, boiadeiros e tropeiros, do mesmo jeito que foi
“absorvida” (apropriada e resignificada) entre muitos povos indígenas latinos.
Conectando regionalismos, indígenas, ancestralidade, história do Brasil em prol
de chamar a atenção de questões das populações por muitos anos invisibilizadas por
serem consideradas subalternas, em prol de políticas de mudanças como lei 11.645/08 e
lei 9.639/03 ambas educacionais, e ações afirmativas para que essas populações tenham
seus direitos civis garantidos e possam ter suas próprias vozes ouvidas.
40 Arandu Arakuaa: confirmada parceria com a Grife Thiago Paes Disponível
em:http://whiplash.net/materias/news_824/186958-aranduarakuaa.html#ixzz4FovFvHVG. Acesso em: 01
de jun. de 2016.
BIBLIOGRAFIA
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Fernão (org.). Teoria contemporânea de cinema. São Paulo: Senac, 2005.
CAMPOY, Leonardo Carbonieri. Trevas sobre luz: o underground do Heavy Metal Extremo no Brasil.
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JAUSS, Hans. Estética da recepção: colocações gerais. In: COSTA LIMA, Luiz. A leitura e o leitor:
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JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. Campinas, SP: Papirus, 1996.
LERA, J.M. Caparrós. Análisis crítico Del cine argumental. História, Antropologia y Fuentes Orales. Voz
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PINSKY, Carla Bassanezi; BACELLAR, Carlos de Almeida Prado. Fontes históricas. 2. ed. São Paulo:
Contexto, 2006;
PINSKY, Carla Bassanezi; LUCA, Tânia Regina de. O historiador e suas fontes. São Paulo: Contexto,
2009.
ANEXOS
Anexo – 1
01. Tupinambá
02. Auê!
03. Kunhâmuku’~i
04. Moxy pe~e Supé Anhangá
01. T-atá îasy-pe
02. Aruanãs
03. Kunhãmuku’i
04. A-kaî T-atá
05. O-îeruré
06. Tykyra
07. Tupinambá
08. îakaré ‘y-pe
09. Auê!
10. A-î-Kuab R-asy
11. Kaapora
12. Gûyrá
13. Moxy Pee Supé Anhangá
01 Watô Akwẽ
02 Nhandugûasu
03 Hêwaka Waktû
04 Dasihâzumze
05 Padi
06 Wawã
07 Ĩwapru
08 Nhanderú
09 Ĩpredu
10 Sumarã
11 Povo Vermelho
Anexo – 2
GÛYRÁ (composição: Zândhio Aquino) - do álbum 'Kó Yby Oré' (2013)
Kûeî îasy
Kûeî îasy îub
Kûeî îasy
Îasy o-mosykyîé
Kûeî îasytatá
Kûeî îasytatá îub
Kûeî îasytatá
Berab ybaka-pe
O-nhan gûyrá
O-bebé gûyrá
O-byr ybyra-pe
O-nhan gûyrá
O-bebé gûyrá
O-bebé ybaka-pe
Xe r-oryb, nh~ur r-upi a-guatá
Aquela lua
Aquela lua amarela
Aquela lua
A lua foge
Aquelas estrelas
Aquelas estrelas amarelas
Aquelas estrelas
Brilham no céu
Corra pássaro
Voa pássaro
Erga-se na árvore
Corra pássaro
Voa pássaro
Voa no céu
Eu sou feliz, ando pelos campos
A-î-potar ma'~e ybaka resé
Xe guainumbi, xe taperá un
Îandé îa-bebé eté
Xe arara oby, xe güiranheenguentá
Îandé îa-nhe'engar eté
O-'ar pytuna-ne
O-'ar pytuna-ne
Ybaka r-asapa
Ybaka s-oby
Nde r-eîá
T'a-só-ne! T'a-só-ne!
Ybytyra supé
T'a-só-ne! T'a-só-ne!
O-nhan gûyrá
O-bebé gûyrá
O-byr ybyra-pe
O-nhan gûyrá hooo
O-bebé gûyrá
O-bebé ybaka-pe
O-nhan gûyrá
Quero que olhes para o céu
Sou o beija flor, sou a andorinha preta
Nós voamos muito
Sou a arara azul, sou o pássaro cantador
Nós cantamos muito
Cairá a noite
Cairá a noite
Atravessando o céu
O céu está azul
Deixando-te
Ei de ir! Ei de ir!
Para as montanhas
Ei de ir! Ei de ir!
Corra pássaro
Voa pássaro
Erga-se na árvore
Corra pássaro
Voa pássaro
Voa no céu
Corra pássaro
ARUANÃS (composição: Zândhio Aquino) - do álbum 'Kó Yby Oré' (2013)
Abá o-ikó 'y pupé
Taba suí 'y pupé
Kunumim o-monhang r-apé
Kunumim o-monhang r-apé
Yby oby supé
Os índios moravam dentro do rio
Na aldeia dentro rio
O menino fez o caminho
O menino fez o caminho
Para a terra verde
Arara kûara-pe
Kunumim o-monhang r-apé
Kunumim o-monhang r-apé
Yby oby supé
Arara kûara-pe
E-îori abá, e-îori abá , e-îori abá, poraseî ,
poraseî , poraseî aruanãs
E-îori abá, e-îori abá , e-îori abá, e-îrori o-
moeté aruanãs
E-îori abá, e-îori abá , e-îori abá, poraseî ,
poraseî , poraseî aruanãs
E-îori abá, e-îori abá , e-îori abá, e-îrori o-
moeté aruanãs
Abá o-ikó yby oby-pe
O-ikó o-esãî ka'a oby-pe
O-mo-eté aruanãs
O-mo-eté aruanãs
ka'a oby pupé
Arara kûara pupé
O-mo-eté aruanãs
O-mo-eté aruanãs
ka'a oby pupé
Arara kûara pupé
E-îrori e-îrori aruanãs
E-îrori e-îrori aruanãs
E-îrori e-îrori aruanãs
T-atá piririca îá
Para o buraco das araras
O menino fez o caminho
O menino fez o caminho
Para a terra verde
Para o buraco das araras
Venham homens, (...), dancem, (...),
dancem para aruanãs.
Venham homens, (...), venham louvem
aruanãs.
Venham homens, (...), dancem, (...),
dancem para aruanãs.
Venham homens, (...), venham louvem
aruanãs.
Os índios vivem na terra verde
Vivem alegres na mata verde
Louvem os aruanãs
Louvem os aruanãs
Dentro da mata verde
Dentro do buraco das araras
Louvem os aruanãs
Louvem os aruanãs
Dentro da mata verde
Dentro do buraco das araras
Venham, venham aruanãs
Venham, venham aruanãs
Venham, venham aruanãs!
Como faíscas de fogo
E-îrori e-îrori aruanãs
E-îrori e-îrori aruanãs
E-îrori e-îrori aruanãs
T-atá piririca îá
Venham, venham aruanãs!
Venham, venham aruanãs!
Venham, venham aruanãs
Como faíscas de fogo
Hêwaka Waktû (composição: Zândhio Aquino) - do álbum Wdê Nnãkrda (2015)
Aiwi hêwaka, aiwi tã
Kâ hêmba, aiwi tã
Kãwa kbawê krêwi!
Rowahku, aiwi tã!
Hêwaka waktû wat kmãdâk
Wa-nõr~i to akw~e
Hêwaka waktû wat kmãdâk
Rowahku tet waipã
Hêwaka waktû wat kmãdâk
Arê wanõkrê kwaba
Watô akwẽ!
Kãwa kbawê krêwi
Rowahku, aiwi tã
Aiwi hêwaka, aiwi tã
Wa-nõr~i to akw~e
Aiwi hêwaka, aiwi tã
Arê wanõkrê kwaba
Aiwi hêwaka, aiwi tã
Rowahku, aiwi tã
Rowahku!
Vem nuvem, vem chuva
Espirito da água, vem chuva
Aproximem-se!
Vento, vem chuva!
Vi a nuvem negra
Nós somos indígenas
Vi a nuvem negra
O vento está soprando
Vi a nuvem negra
Vamos cantar
Eu sou indígena!
Aproximem-se
Vento, vem chuva
Vem nuvem, vem chuva
Nós somos indígenas
Vem nuvem, vem chuva
Vamos cantar
Vem nuvem, vem chuva
Vento, vem chuva
Vento!
Eu sou indígena!
Watô akwẽ!
Ĩpredu (composição: Zândhio Aquino) - do álbum Wdê Nnãkrda (2015)
Robdzenawa ‘udu, wahã, bödöwa ‘ mãdö
Robdzenawa ‘udu,
wawaparowa’u’uwamreme
Wadza’remõö’a’a’u,
wamãdöbötödzatsidzé
Ĩtsimãiwena ~ihöimana, wahãti’ai’rá
Wa ~inhõ’re (Dzö, dzö, dzö )
Ĩpredu, e momõtedzaaimõ, e
momõtedzaaimõ
Ĩpredu, Itsiminha’re
Róbdzawi’wa, róptede’wa!
Impredu, en~ihaatsitsi, emãatsiwaihu’u
Ĩpredu, mõr~i ré, watitsã
Róbdzawi’wa, róptede’wa!
Ĩpredu, õhã mãdorö
Wanor~ihã, mawa’ dza’reni, te ti nhõ’re
Õ hã mãdorö, õ nor~i te ti ‘ru’ru,
õhãmãpetse ~ihödzé
Wanor~ihã, mawa’ dza’reni, te ti nhõ’re
Õ hã mãdorö, õ nor~i te ti ‘ru’ru,
~ihöibawarõrópö ~ihöimana
Wa ~inhõ’re (Dzö, dzö, dzö )
Acordei feliz, eu vejo o sol
Acordei feliz, ouço o barulho do vento
Vou para a cachoeira, vejo o por do sol
Sou livre, sou filho da terra
Eu canto! (maracá, maracá, maracá)
Ancião, onde está indo?
Ancião, sábio
Ele ama a natureza, ele protege a
natureza!
Ancião, como é seu nome? Diga-me.
Ancião, quando ele estava caminhando eu
o vi
Ele ama a natureza, ele protege a
natureza!
Ancião, ele está morto
Nós somos feridos, ele canta
Ele está morto, eles choram
Ele curou o doente
Nós somos feridos, ele canta
Ele está morto, eles choram, minha alma é
livre
Eu canto! (maracá, maracá, maracá)
Ĩpredu, e momõtedzaaimõ, e
momõtedzaaimõ
Ĩpredu, en~ihaatsitsi, emãatsiwaihu’u
Ĩpredu, õhã mãdorö
Ancião, onde está indo?
Ancião, como é seu nome? Diga-me
Ancião, ele está morto