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Práticas de análise linguística em um livro didático Kalen Franciele Piano Maman 1 Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) Resumo: Este artigo tem por objetivo apresentar uma análise linguística de um capítulo do livro didático Araribá juntamente com a análise da gramática normativa. Para este estudo, trazemos recortes do livro, da editora moderna e, tendo como base os estudos de Geraldi, analisamos como a língua é trabalhada no interior do livro didático do 7º ano anos finais. Na perspectiva de alcançar o objetivo proposto, sustentamos a pesquisa nos pressupostos teóricos da Linguística Aplicada. Trata-se, de uma pesquisa qualitativa, de caráter descritivo interpretativo, relevante para professores em formação finais e continuada que poderão refletir criticamente sobre o ensino de Língua a partir da ordem metodológica proposta pela análise linguística. Por meio das reflexões apresentadas nesse artigo, abrimos espaços para que outras análises sejam feitas e possam também contribuir para melhorias no ensino de línguas através do livro didático. Palavras-chave: Análise linguística. Gramática normativa. Livro didático. Resumen: Este artículo tiene por objetivo presentar un análisis lingüístico de un capítulo del libro didáctico Araribá junto con el análisis de la gramática normativa. Para este estudio, traemos recortes del libro, de la editorial moderna y, teniendo como base los estudios de Geraldi, analizamos cómo la lengua es trabajada en el interior del libro didáctico 7 año. En la perspectiva de alcanzar el objetivo propuesto, sostenemos la investigación en los presupuestos teóricos de la Lingüística Aplicada. Se trata, de una investigación cualitativa, de carácter descriptivo interpretativo, relevante para profesores en formación finales y continuada que podrán reflejar críticamente sobre la enseñanza de Lengua a partir del orden metodológica propuesta por el análisis lingüístico. Por medio de las reflexiones presentadas en este artículo, abrimos espacios para que otros análisis sean hechos y puedan también contribuir a mejoras en la enseñanza de lenguas a través del libro didáctico. Palabras-clave: Análisis linguístico. Gramática normativa. Libro didáctico. Introdução Percorrendo a história, podemos observar que a língua era ensinada nas escolas era por meio de regras condizentes à gramática normativa e de conceitos que definiam seus elementos, partindo do fonema, avançando para os morfemas na composição da palavra, expandindo-se até a frase. Nesse sentido, dominar e empregar as regras, assim como classificar seus componentes era saber a gramática. Segundo Travaglia (1996), a gramática normativa “[...] é 1 Mestranda no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras, área de concentração Linguagem e Sociedade, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná UNIOESTE. E-mail: [email protected]

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Práticas de análise linguística em um livro didático

Kalen Franciele Piano Maman1

Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE)

Resumo: Este artigo tem por objetivo apresentar uma análise linguística de um capítulo do

livro didático Araribá juntamente com a análise da gramática normativa. Para este estudo,

trazemos recortes do livro, da editora moderna e, tendo como base os estudos de Geraldi,

analisamos como a língua é trabalhada no interior do livro didático do 7º ano anos finais. Na

perspectiva de alcançar o objetivo proposto, sustentamos a pesquisa nos pressupostos teóricos

da Linguística Aplicada. Trata-se, de uma pesquisa qualitativa, de caráter descritivo

interpretativo, relevante para professores em formação finais e continuada que poderão refletir

criticamente sobre o ensino de Língua a partir da ordem metodológica proposta pela análise

linguística. Por meio das reflexões apresentadas nesse artigo, abrimos espaços para que outras

análises sejam feitas e possam também contribuir para melhorias no ensino de línguas através

do livro didático.

Palavras-chave: Análise linguística. Gramática normativa. Livro didático.

Resumen: Este artículo tiene por objetivo presentar un análisis lingüístico de un capítulo del

libro didáctico Araribá junto con el análisis de la gramática normativa. Para este estudio,

traemos recortes del libro, de la editorial moderna y, teniendo como base los estudios de

Geraldi, analizamos cómo la lengua es trabajada en el interior del libro didáctico 7 año. En la

perspectiva de alcanzar el objetivo propuesto, sostenemos la investigación en los presupuestos

teóricos de la Lingüística Aplicada. Se trata, de una investigación cualitativa, de carácter

descriptivo interpretativo, relevante para profesores en formación finales y continuada que

podrán reflejar críticamente sobre la enseñanza de Lengua a partir del orden metodológica

propuesta por el análisis lingüístico. Por medio de las reflexiones presentadas en este artículo,

abrimos espacios para que otros análisis sean hechos y puedan también contribuir a mejoras en

la enseñanza de lenguas a través del libro didáctico.

Palabras-clave: Análisis linguístico. Gramática normativa. Libro didáctico.

Introdução

Percorrendo a história, podemos observar que a língua era ensinada nas escolas era por

meio de regras condizentes à gramática normativa e de conceitos que definiam seus elementos,

partindo do fonema, avançando para os morfemas na composição da palavra, expandindo-se

até a frase. Nesse sentido, dominar e empregar as regras, assim como classificar seus

componentes era saber a gramática. Segundo Travaglia (1996), a gramática normativa “[...] é

1 Mestranda no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Letras, área de concentração Linguagem e

Sociedade, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE.

E-mail: [email protected]

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concebida como um manual com regras de bom uso da língua a serem seguidas por aqueles

que querem se expressar adequadamente”. (TRAVAGLIA, 2006, p. 24).

Na década de 1980, alguns estudiosos como Britto (1997) e Geraldi (1984), através de

uma série de reflexões, enfatizaram a necessidade de um deslocamento do objeto de ensino da

LP: de frases ou palavras soltas para o texto.

Britto (1997) contrapunha o método da gramática trabalhada de forma isolada, em

frases soltas, fora de um contexto. O autor acreditava que

[...] o papel da escola regular deve ser o de permitir a emergência de sujeitos

críticos, capazes de investigar, descobrir, articular, aprender, em suma,

capazes de, a partir de objetos do mundo conhecidos, estabelecer uma relação

inusitada entre eles. [...] garantir ao estudante o convívio constante e

progressivo com textos e outros materiais cognitivos que ampliem seu

universo de referências, propiciando-lhe familiaridade crescente com

expressões culturais e científicas cada vez mais complexas (BRITTO, 1997,

p. 23).

Geraldi (1984), no livro Texto na sala de aula, também critica o ensino da gramática

normativa em função do baixo desempenho linguístico dos alunos quanto à utilização da

língua, tanto na oralidade como na modalidade escrita.

[...] a juventude de hoje não consegue expressar seu pensamento; que, estando

a humanidade na ‘era da comunicação’, há uma incapacidade generalizada de

articular um juízo e estruturar linguisticamente uma sentença. E para

comprovar tais afirmações, os exemplos são abundantes: as redações de

vestibulandos, o vocabulário da gíria jovem, o baixo nível de leitura

comprovável facilmente pelas baixas tiragens de nossos jornais, revistas [...]

(GERALDI,1984, p. 41).

Como contraproposta a forma de ensino de língua aplicada até a década de 1980,

Geraldi (1984) apresenta uma concepção de linguagem: a linguagem como forma de interação.

O autor acreditava que essa ideia resultaria “[...] numa postura educacional diferenciada, uma

vez que situa a linguagem como o lugar de constituição de relações sociais, onde os falantes se

tornam sujeitos” (GERALDI, 1997, p. 43).

Para dar conta de desenvolver um trabalho na escola que considere a língua a serviço

da interação entre os sujeitos, Geraldi (1984) propõe que o ensino da LP se articule em torno

de três práticas fundamentais: prática de leitura de textos, prática de produção de textos e

prática de análise linguística. O autor entendia que, por meio dessas práticas, era possível

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observar como as regras da gramática se articulam ao texto, e como se poderia emprega-las

com propriedade, estabelecendo, assim, um processo de reflexão da sua estrutura.

Dentre essas três práticas apresentadas pelo autor, interessa-nos, nesta pesquisa, a

Prática de Análise Linguística (doravante, PAL), uma vez que se trata de uma outra forma de

trabalhar com a gramática em sala de aula. Assim, nosso objetivo neste texto é analisar uma

unidade do livro didático (LD) Araribá – 7º ano – da Editora Moderna em relação aos

encaminhamentos de trabalho com a língua. Com isso, pretendemos responder a seguinte

pergunta: O livro em foco aborda o trabalho com a língua na perspectiva da PAL? Trata-se de

uma pesquisa de mestrado em andamento2, a partir da qual apresentamos apenas um recorte

Para dar conta do proposto, organizamos este texto da seguinte forma: Primeiramente

tecemos reflexões teóricas sobre a PAL e sua relação com o ensino de Língua Portuguesa (LP);

em seguida, apresentamos o LD que tomamos como objeto de estudos; e, finalmente,

recortamos a Unidade 1 do referido livro, dentro da qual recortamos algumas atividades de

estudo da língua para refletir sobre sua forma de encaminhamento.

1 Prática de Análise Linguística no processo de ensino-aprendizagem de Língua

Portuguesa

Por se tratar de um estudo que aborda a PAL com alunos de 7º ano de ensino

fundamental, este artigo identifica-se com a área da Linguística Aplicada (LA) pelo fato de

apresentar como principal objeto de estudo a linguagem, nas atividades de escrita, interpretação

e reescrita de texto, observando como o trabalho com a língua está sendo aplicado nas várias

atividades do LD analisado. O interesse da LA, segundo Rojo (2005), é de compreender,

explicar ou questionar problemas relativos à linguagem para viabilizar ou apresentar soluções

possíveis.

Dentre esses problemas, encontra-se a PAL, um encaminhamento de trabalho com a

língua (oral ou escrita) apresentada por Geraldi (1984) e que tem como objetivo repensar o

ensino de LP nas escolas, por meio de uma proposta que articulasse as práticas de leitura, escrita

e de gramática que o autor passar a denominar de PAL, tendo em vista sua reconfiguração.

Suassuna (2012) historicisa essa proposta:

2 Pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Letras – área de concentração em Linguagem e

Sociedade, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Campus de Cascavel, sob orientação da

Profª Drª Terezinha da Conceição Costa-Hübes, com vigência entre 2016 a 2018.

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O termo análise linguística (AL) apareceu nos debates sobre ensino da língua

portuguesa em 1981, quando o professor e pesquisador João Vanderlei

Geraldi, da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), publicou o

texto “Subsídios metodológicos para o ensino da língua portuguesa”, no qual

propunha uma metodologia de trabalho com a língua materna em sala de aula

que articulasse três praticas: a leitura, a produção de textos e análise

linguística (SUASSUNA, 2012, p. 11).

Segundo Geraldi (1997]), a reflexão sobre a língua (oral e escrita) e suas

particularidades em diversos contextos precisa estar integrada com a PAL, para que a

competência comunicativa/discursiva possa ser desenvolvida nos alunos. Mas o que significa,

afinal, a PAL? O autor explica que se trata de promover reflexões sobre os usos da linguagem,

“[...] quer pela produção de textos, quer pela leitura de textos, [pois] é no interior destas e a

partir destas que a análise linguística se dá” (GERALDI, 1997, p. 189). E na perspectiva de

esclarecer sua proposta, o autor complementa:

Com a expressão “análise linguística” pretendo referir precisamente este

conjunto de atividades que tomam uma das características da linguagem como

seu objeto: o fato de ela poder remeter a si própria, ou seja, com a linguagem

não só falamos sobre o mundo ou sobre nossa relação com as coisas, mas

também falamos sobre como falamos (GERALDI, 1997, p. 189).

O termo PAL denomina uma nova perspectiva de reflexão sobre o sistema linguístico

e sobre os usos da língua, com vista ao tratamento escolar de fenômenos gramaticais, textuais

e discursivos. Nessa direção, a PAL não veio para substituir o ensino da gramática, mas para

repensá-lo, ou melhor, recontextualizá-lo no âmbito do texto. Reconhecendo seu valor

incondicional, uma vez que não há língua sem gramática, a proposta que se alavanca a partir

da AL engloba, paralelamente à gramática, aspectos discursivos do texto, na perspectiva de

aliar gramática, texto e discurso como objeto de reflexão, focalizando-se, assim, diferentes

situações de uso da linguagem.

Como diz Geraldi (1991), não se trata apenas de uma nova terminologia. E nem se trata

de excluir a gramática do ensino de LP. Ao contrário, o trabalho com a PAL inclui tanto as

questões gramaticais quanto outros aspectos mais amplos do texto, no sentido de propiciar, ao

aluno, situações de reflexão sobre o texto.

Ao elegermos o texto como objeto de estudo privilegiado do ensino de linguagem, a

ideia não é abandonar a gramática normativa, mas trabalharmos com ela através do exercício

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com o texto, isto é, não ensinar as regras gramaticais através de frases soltas, mas dentro da sua

funcionalidade textual.

Conforme Geraldi (1997), temos opções a seguir para transmitir o conteúdo sobre a

linguagem: podemos levar o aluno ao reconhecimento das informações ou inverter essa

direção, mostrando a ele um processo de conhecimento a respeito das atividades

metalinguísticas.

[...] é problemática a prática comum na escola de partir de uma noção já

pronta, exemplificá-la e, através de exercícios, fixar uma reflexão. Na

verdade, o que se fixa é a metalinguagem utilizada. E daí a sensação do aluno

de que saber sua língua é saber utilizar-se de metalinguagem aprendida na

escola para analisar esta língua. Esta percepção é fruto do trabalho escolar: o

aluno, falando em português, diz não saber português (GERALDI, 1997, p.

191).

A prática de análise linguística se define em estudar as maneiras da linguagem e como

ocorre dentro das práticas de leitura e produção de texto, por fim, como diz Geraldi (1997)

“[...]incluem-se nas atividades de análise linguística as reflexões sobre as estratégias do dizer”

(GERALDI, 1997, p.191).

É com essa compreensão do que vem a ser a PAL que selecionamos o tema de nossa

pesquisa e direcionamos nosso olhar para o objeto de análise, o que apresentamos a seguir.

2 O livro didático em estudo: uma apresentação

No que tange ao corpus deste artigo (e de nossa pesquisa), trata-se de um material

didático de Língua Portuguesa, de 7° ano, do Ensino Fundamental II. Intitulado Araribá Plus

Português – 7º ano, o material é da editora Moderna, com responsabilidade da editora executiva

Mônica Franco Jacintho, 4ª edição, 2014. O LD em análise é composto de 8 unidades, sendo

que essas são divididas em seções.

O material foi adotado por uma escola da rede privada de ensino de Cascavel/PR,

através de uma análise feita em conjunto: direção, coordenação e professores de cada área do

conhecimento. O livro é trabalhado durante as aulas de gramática e produção textual, com 5

horas aulas semanais por turma. A aceitação do material pelos alunos foi boa, mesmo havendo

alguns percalços no caminho, pois tem uma rica relação de textos de diferentes gêneros, que

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estão distribuídas no material (na introdução de cada unidade), permitindo a discussão e a

reflexão de temas transversais.

O conteúdo do sétimo ano traz como proposta de trabalho os seguintes gêneros textuais:

unidade 1 - narrativa (mito), unidade – 2 narrativa de aventura, unidade - 3 relato pessoal,

unidade 4 - depoimento, unidade 5 - notícia, unidade 6 - crônica argumentativa e texto de

opinião, unidade 7 – poema, e unidade 8 - anúncio publicitário.

Através dos textos, os pontos gramaticais que são desenvolvidos são: unidade 1 –

revisão de determinante do substantivo, pronome, verbo, acentuação das palavras

proparoxítonas e oxítonas; unidade 2 – estrutura e regularidade verbal, tempos do subjuntivo,

revisão de acentuação nos hiatos; unidade 3 – verbos no modo imperativo, substantivação e

funções das formas nominais do verbo, acentuação dos ditongos abertos; unidade 4 –

proposição, conjunção e acentos diferenciais; unidade 5 – frase, oração, período simples e

composto, sujeito e predicado, emprego de X e CH; unidade 6 – tipos de sujeito, concordância

em orações com sujeito composto e com expressões partitivas, emprego de S, Z e X; unidade

7 – verbo de ligação, predicativo do sujeito, tipos de predicado, emprego de J e G; unidade – 8

transitividade verbal, adjunto adnominal, adjunto adverbial, abreviaturas e siglas.

Todo capítulo traz como introdução imagens que estimulam a reflexão e o debate sobre

temas propostos, estabelecendo relações com os demais textos da unidade e ampliando as

reflexões propostas nas seções de leitura, para estudo dos assuntos, que são explorados nos

textos no decorrer da unidade através da professora e dos alunos.

Há sempre um contexto, antes de iniciar cada texto proposto, que traz maiores

informações sobre o assunto que será desenvolvido no texto, podendo ser histórico, social ou

cultural. Também apresenta um box nomeado de “Saiba +”, sendo que nesse momento o aluno

poderá ter um contato maior sobre um fato, um acontecimento ou uma situação curiosa sobre

o conteúdo que será debatido no capítulo.

A “Compreensão do texto” traz exercícios elaborados para os alunos verificarem o

quanto assimilaram sobre o texto lido. Ao realizar os exercícios da seção “A língua em uso: os

sentidos do texto”, o aluno inicia o trabalho do ponto gramatical que é abordado na unidade,

porém a partir do texto sugerido pela unidade do livro. Após as interpretações dos exercícios,

perante o conhecimento já existente e o que adquiriu na aula, o aluno pode compreender a

estrutura do gênero, por meio de exercícios, exposição teórica e resumo em forma de esquema

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para que o livro possa servir como material de referência para estudarem em casa e se

prepararem para as provas.

A produção textual apresenta etapas bem definidas e o estudo da língua explora textos

de circulação real, facilitando o ensino e o aprendizado. O Araribá Plus ainda oferece recursos

digitais variados e introduz o trabalho com os Hábitos da mente, ações que vão ajudar o aluno

a enfrentar os desafios do mundo atual de forma criativa, flexível e cooperativa.

Nas seções “Estudo da língua” e “Questões da língua”, a partir de trechos do texto da

unidade, o aluno pode compreender a importância de saber conceitos gramaticais no momento

de ler e produzir textos. A sistematização dos conceitos, os esquemas e as atividades ajudam o

estudante a compreender melhor o conteúdo com maior qualidade e eficácia, nestas seções

faremos, na próxima seção, uma análise de alguns trechos de atividades envolvendo a PAL.

Nessa mesma seção, o aluno encontra um box nomeado “conteúdo digital” que indica vídeos,

atividades e outros recursos para que o aluno possa ampliar o conteúdo estudado em sala.

“Leitura da hora” é um momento de o aluno descontrair com contos, crônicas e trechos

de romances, para que ele possa conhecer personagens incríveis e descobrir algumas aventuras

maravilhosas que acontecem dentro dos livros; desse modo, o material procura incentivar o

hábito da leitura de maneira atrativa e com temas próximo da realidade do aluno.

“E por falar nisso... “ é uma seção que ajuda o aluno a ampliar seu conhecimento antes

da produção textual, pois nesse momento ele pode debater com a turma sobre o tema proposto.

As propostas de produção de textos orais e escritos são precedidas por análise de textos e

acompanhadas por orientações passo a passo que tenha os recursos necessários no momento da

produção. Após essa etapa, é apresentada uma ficha de avaliação para ajudar os alunos a

revisarem suas produções com maior clareza.

Todas essas seções educativas apresentam uma finalidade, responde a algum objetivo

previamente definido e visa alcançar um determinado resultado. Isso significa que, a cada

atividade preparada e executada em sala de aula (ações que dizem respeito ao ensino), espera-

se como resultado um determinado aprendizado por parte do aluno.

Dentre as 8 Unidades organizadoras do livro, interessa-nos, neste capítulo, a Unidade

1, da qual recortaremos atividades de trabalho com a língua, as quais analisaremos na próxima

seção.

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3 Análise de trechos da unidade 1 do livro didático

O LD é uma ferramenta de grande importância para o professor e aluno no

desenvolvimento dos conteúdos que são trabalhados na sala de aula. Devido a sua importância

e presença constante na sala de aula, interessa-nos analisar e compreender como o LD Araribá

– 7º ano – da Editora Moderna encaminha suas atividades para explorar o ensino de língua:

será que mantem orientações que são próprias da gramática normativa ou direciona-se para a

PAL? Para responder a esse questionamento, selecionamos para análise, neste artigo, algumas

atividades que constam na primeira unidade do livro.

Prevê-se aproximadamente um mês de trabalho para cada unidade. A sequência dos

conteúdos antevê um nível ascendente de complexidade. Por isso, o material busca focalizar,

na abordagem dos grupos de gêneros em cada volume, um aspecto ou problema linguístico

distinto, cujo domínio proporcionará ao aluno o desenvolvimento progressivo da capacidade

linguística predominante naquele gênero. Com esse objetivo, a unidade propõe (assim como a

coleção toda) o enfoque primeiro no enredo, no diálogo e na descrição dos personagens, depois

a constatação das personagens e do foco narrativo; na sequência, os aspectos argumentativos

do texto e a construção do humor (caso tenha).

A abertura da unidade através de um texto não verbal introduz o trabalho com o foco

de apresentar ou relembrar heróis e heroínas míticos, por meio de situação lúdica envolvendo

representações em imagens, oportunizando, assim, a reflexão e a pesquisa sobre a influência

de mitos em narrativas modernas. Pela imagem e de alguns questionamentos feitos sobre a

narrativa mítica e a figura do herói como: quais são as características marcantes dos heróis que

conhecem; é possível definir em que época eles vivem e o local; como é a vida dos heróis:

tranquila, monótona ou cheia de ação e acontecimentos emocionantes e citando exemplos, estas

perguntas estão no livro ou que o próprio profissional poderá criar, desta forma conseguirá

levar o aluno a uma antecipação dos conteúdos que serão foco do trabalho com a leitura na

sequência da unidade.

Ainda na página inicial da unidade, neste caso – pois ele pode aparecer em qualquer

parte das unidades, o box “Saiba +” cumpre uma função particular na página que é de fornecer

informações complementares a respeito do texto não verbal nela apresentada.

Figura 1 – Informações extras “Saiba +”

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Fonte: Araribá Plus Português, (2014, p. 12).

Na sequência, haverá um texto relacionado à imagem discutida anteriormente,

intitulada a seção de “Leitura” sendo um alicerce dentro da unidade. Esta seção é iniciada pelo

box “Contexto”, que, como o nome indica, busca contextualizar o texto que será lido,

antecipando informações a respeito do gênero que ele representa, o veículo do qual foi extraído

e o contexto sócio-histórico em que foi produzido.

Figura 2 – Seções “Leitura e Contexto”

Fonte: Araribá Plus Português, (2014, p. 14 e 15).

Depois de trabalhar o texto “As duas mortes de Eurídice” (p.14-17), tendo abordado as

principais características do gênero mito, propõe aos alunos a leitura do texto sobre o mito de

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Ícaro no Caderno de atividades (p. 100), e que resolva as atividades a ele relacionadas para

poder ampliar a compreensão do gênero e identificar os elementos típicos da narrativa mítica.

Neste momento, observa-se a forte presença e influência da mitologia helênica na literatura, no

teatro, no cinema, na música, nas artes plásticas, etc.

Outro recorte da unidade é a seção “A língua em uso: os sentidos do texto”, em que

explora: os aspectos linguísticos que contribuem para a produção de sentido e confere a maior

expressividade do texto lindo; o léxico do texto, com vistas à ampliação do vocabulário do

aluno e à exploração de relações entre a seleção lexical e a produção de sentidos; a observação

de fatos relacionados à variação linguística – inclusive de natureza diafásica (registros formais

ou menos formais) – presentes no texto lido. Esta é a seção que mais nos interessa, pois

queremos compreender como a língua é trabalhada nesse contexto.

De início percebemos que sua abordagem parte da gramática normativa, pois o

conteúdo gramatical tratado nesta unidade é o conceito de determinantes do substantivo

(revisão do ano anterior), destacando a importância de identificar esses determinantes em

situações de escrita e mostrar as diferentes classes gramaticais que podem atuar como

determinantes do substantivo.

Embora focalize conceitos e normas gramaticais, propõe-se que o conteúdo seja

trabalhado a partir do texto da mitologia, explorando trechos retirados dele. Esta seção não

orienta o aluno a decorar ou trabalhar frases isoladas, mas provoca-o a questionar e levantar

problemas sobre o ponto gramatical em questão.

O caminho metodológico compreende quatro movimentos. O primeiro tem início na

subseção “Observe e analise”, em que são propostas questões que solicitam a observação e a

análise de um determinante uso da língua, relacionado ao tópico “Determinantes do

substantivo”. Vejamos:

Figura 3 – Exercício 1 sobre o ponto gramatical

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Fonte:

Araribá Plus Português, (2014, p. 22).

Parece-nos que a atividade da figura 3 procura desenvolver uma PAL, pois a partir do

texto que foi interpretado pelos alunos, a gramática é aplicada como uma reflexão por buscar

recursos expressivos construindo o conhecimento, e não apenas reconhecendo as regras

impostas normativamente. Isso pode ser observado em alguns momentos, por exemplo, quando

o autor promove uma reflexão sobre o uso da língua propiciado pelo emprego do adjetivo no

trecho “Braços Fortes”.

Primeiro, na alternativa A, o aluno reflete sobre a importância da construção frasal para

a compreensão da leitura; observa a diferença em dizer “Lá, braços fortes a agarravam”, em

vez de “Lá, Aristeu a agarrou”, pois, a omissão do sujeito, nesse caso, cria um suspense que é

benéfico para instigar a leitura do gênero em estudo. Na sequência, na alternativa B, leva o

aluno a refletir sobre o efeito de sentido entre optar por uma expressão ou outra. E, finalmente,

na letra C, relaciona essa construção frasal e a seleção lexical (fortes) com a gramática

(adjetivo), para que o aluno compreenda a função dessa classe de palavra.

Sendo assim, parece-nos que esse encaminhamento se aproxima da PAL, pois como diz

Geraldi (1997), o trabalho com a PAL inclui tanto as questões gramaticais quanto outros

aspectos mais amplos do texto, no sentido de propiciar, ao aluno situações de reflexão sobre o

texto.

Na sequência, dentro do conteúdo gramatical, ainda é desenvolvida uma atividade com

os pronomes para a compreensão dos determinantes dos substantivos, também utilizando do

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texto da mitologia explorado no capítulo para realizar a atividade, sem precisar usar frases

isoladas para a explicação. Essas atividades são complementadas por um trabalho de

sistematização metalinguística mais complexa, com exposição teórica de caráter transmissivo,

como quadros e diagramas.

Figura 4 – Exercício 2 sobre o ponto gramatical

Fonte: Araribá Plus Português, (2014, p. 23).

Nesse caso, o propósito foi trabalhar sob o ponto de vista da teoria linguística,

analisando a coesão referencial. Com a retirada dos pronomes pessoais e possessivos, percebe-

se a importância que eles têm para estabelecer a referência aos substantivos para não tornar a

leitura cansativa e desanimadora, pois os pronomes são importantes para fazer alusão a palavra

“Orfeu” sem repeti-la no período, tornando exaustivo.

Dessa forma, a atividade ajudará o aluno a ver que a coesão referencial o ajudará na

produção de um texto sem a repetição de palavras chaves, e conseguir ainda assim, não perder

a ideia original no discurso.

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Portanto, esse seria mais um passo metodológico da seção, correspondente à subseção

“Aplique seus conhecimentos”. Os conceitos estudados são praticados em exercícios

estruturais e, sempre que possível contextualizados. Procura-se integrar os conteúdos

trabalhados anteriormente com a interpretação e a análise de textos, de modo que os alunos

percebam os elementos linguísticos e gramaticais que contribuem na composição e na

construção da expressividade de um texto.

Figura 5 – Exercícios da seção “Aplique seus conhecimentos”

Fonte: Araribá Plus Português, (2014, p. 27).

No segundo “Estudo da língua”, há uma subseção em que se intitula “Questões da

língua”. Nela são abordados outros aspectos gramaticais, como a acentuação, a sufixação e a

ortografia, com maior ênfase nesta última, uma vez que o ensino da ortografia nos anos finais

do ensino fundamental ainda tem papel importante na construção de produtores de texto e bons

transmissores do conhecimento.

No caso da figura 5, o objetivo foi trabalhar através do gênero cartum a retomada do

ponto gramatical (determinantes do substantivo) discutido no texto da mitologia, sugerido no

capítulo para interpretação. Dessa forma, o aluno pode ampliar seu conhecimento a respeito da

mitologia, sobre Medusa, também conseguiu observar mais uma vez a função e a importância

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da utilização dos determinantes em um texto para que ele não fique confuso e cansativo. O

aluno pode observar que se o determinante for utilizado de maneira inadequada poderá

transmitir ao leitor um tipo de sensação, como no cartum que transmite a ideia humorística.

Em síntese, o capítulo é bem elaborado e desenvolvido para atingir o objetivo referente

à transmissão do conhecimento acerca da língua portuguesa. Observou-se que há um equilíbrio

entre a análise linguística e a gramatica normativa.

Considerações finais

No presente artigo, procuramos trazer informações de como é trabalhada a língua no

LD em análise, na perspectiva de compreender se o foco recai mais na gramática ou em PAL.

Pela análise que empreendemos vimos que o LD procura aproximar-se da PAL, ao

procurar promover a reflexão sobre o uso da linguagem de forma articulada e simultânea dentro

do texto e dos questionamentos a respeito dele. A necessidade de reconhecer o universo

discursivo e a intenção do enunciador, os interlocutores, a situação de interação e contexto

sócio-histórico é de grande importância para que depois o aluno possa atingir o objetivo da

língua.

Com isso, necessitamos relembrar que toda e qualquer atividade educativa escolar

apresenta-se como uma atividade intencional: responde a algum objetivo previamente definido

e pretende alcançar um resultado específico, por isso que a gramática nas atividades não é

trabalhada isolada. Isso significa que, a cada atividade preparada e executada em sala de aula

(ações que dizem respeito ao ensino), espera-se como resultado um certo aprendizado do aluno

e não simplesmente um amontoado de informações decoradas sem um objetivo significativo a

ele.

Sendo assim, faz parte do processo de ensino-aprendizagem verificar se a ação

pedagógica corresponde às intenções, ou seja, se aquilo que foi definido como objetivo se

concretizou nos resultados esperados pela ação pedagógica desenvolvida pelo professor.

REFERÊNCIAS

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