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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Vitória Rosa Neal Boldrin A Sustentabilidade nos Relatórios da Administração Caso Itaú Unibanco 2009 a 2013 Mestrado em Ciências Contábeis e Financeiras São Paulo 2014

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  • PONTIFCIA UNIVERSIDADE CATLICA DE SO PAULO

    PUC-SP

    Vitria Rosa Neal Boldrin

    A Sustentabilidade nos Relatrios da Administrao

    Caso Ita Unibanco 2009 a 2013

    Mestrado em Cincias Contbeis e Financeiras

    So Paulo

    2014

  • VITRIA ROSA NEAL BOLDRIN

    A Sustentabilidade nos Relatrios da Administrao

    Caso Ita Unibanco 2009 a 2013

    Mestrado em Cincias Contbeis e Financeiras

    Dissertao apresentada Banca Examinadora

    da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo,

    como exigncia parcial para obteno do ttulo de

    Mestre em Cincias Contbeis e Financeiras sob

    a orientao do Professor Doutor Antonio Robles

    Junior.

    So Paulo

    2014

  • Banca Examinadora

    _______________________________________________

    Prof. Dr. Antonio Robles Junior

    Orientador

    Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo PUC-SP

    _______________________________________________

    Prof. Dr. Jos Roberto Kassai

    Universidade de So Paulo USP/FEA

    ________________________________________________

    Prof. Dr. Valrio Vitor Bonelli

    Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo PUC-SP

  • Isto sabemos.

    Todas as coisas esto ligadas

    como o sangue

    que une uma famlia...

    Tudo o que acontece com a Terra,

    acontece com os filhos e filhas da Terra.

    O Homem no tece a teia da vida;

    ele apenas um fio.

    Tudo o que faz teia,

    ele faz a si mesmo.

    - Ted Perry (inspirado pelo Chefe Seattle).

    Extrado do livro A Teia da Vida (CAPRA, Fritjof. 2007)

  • DEDICATRIA

    minha me (in memoriam), entusiasta da felicidade e conquistas de seus filhos.

    Tudo que acontecia com seus filhos, acontecia com ela...

    minha filha, a quem gostaria de passar lies de vida que aprendi com minha me.

  • AGRADECIMENTOS

    Muitos me ajudaram no processo de estudos e concluso deste trabalho.

    Agradeo a cada um que se envolveu direta ou indiretamente, com a certeza

    de que sozinha no teria sido possvel e ainda assim, se possvel fosse, a

    celebrao no faria sentido.

    Agradeo ao Adeildo Paulino, a primeira motivao para o desafio.

    Agradeo meu marido e minha filha, pela compreenso e respeito minha

    vontade de persistir neste desafio.

    Agradeo ao meu pai que, mesmo em um momento to difcil, entendeu e

    respeitou meu distanciamento.

    Agradeo minha famlia, que mesmo privada da minha companhia, continuou

    me provendo de carinho.

    Agradeo minha querida amiga Raquel, por fazer tudo parecer simples.

    Agradeo s amigas que me deram nimo para seguir em frente Arlete,

    Regina Casagrandi, Maria Lcia e Iaara.

    Agradeo Yeda, pelas animadas discusses sobre conceitos contbeis.

    Agradeo meu orientador, professor Dr. Antonio Robles Junior, pelas

    orientaes e por entender meus momentos de dificuldades.

    Agradeo ao professor Dr. Roberto Fernandes dos Santos, pela compreenso

    e por sempre ajudar a encontrar uma alternativa.

    Agradeo Banca, professor Dr. Valrio Vitor Bonelli e professor Dr. Jos

    Roberto Kassai, pelas importantes contribuies e provocaes para ampliao

    do conhecimento sobre o assunto.

  • RESUMO

    Esse estudo objetivou analisar os relatrios de sustentabilidade do Ita

    Unibanco no perodo de 2009 a 2013 e se as informaes contidas nesses

    relatrios so suficientes para assegurar a relevncia do tema sustentabilidade

    na empresa e se o relato integrado, primeiro a ser divulgado pela empresa,

    manteve conformidade com a Estrutura proposta pelo IIRC International

    Integrated Reporting Council. Os dados analisados e utilizados nesse estudo

    foram extrados de vasta pesquisa bibliogrfica sobre o tema e do site oficial da

    empresa objeto dessa pesquisa. Observou-se que as informaes dos

    relatrios de 2009 a 2013 asseguram a relevncia do tema na empresa e que o

    primeiro relato integrado do Ita Unibanco est em conformidade com a

    Estrutura.

    Palavras chave: Empresa Sustentvel. Relatrio de Sustentabilidade. Relato

    Integrado.

  • ABSTRACT

    The present study aimed to analyze the sustainability reports of Ita Unibanco

    for the period of 2009 to 2013 and whether the reported information was

    sufficient to assure the relevance of the subject sustainability in the company. It

    also aimed to analyze whether the integrated reporting, the first one to be

    published by the company, was in comformity with the Framework proposed by

    IIRC International Integrated Reporting Council. Data analyzed and used for

    this study were drawn from extensive litterature research on the topic and from

    the official website of the company object of this research. It was observed that

    the information from the 2009 to 2013 reports assured the relevance of the

    subject in the company object of this research and the comformity between the

    Ita Unibanco and the Framework was confirmed.

    Key words: Sustainable Enterprise. Sustainable Report. Integrated Reporting.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Modelo Stakeholder...........................................................................23

    Figura 2: Processo de gerao de valor............................................................51 Figura 3: Estrutura acionria do Grupo Ita Unibanco .....................................72 Figura 4: Ita Unibanco- Modelo de negcios...................................................93

    Figura 5: Entenda como funciona um banco.....................................................94

    Figura 6: Ita Unibanco: mapa de sustentabilidade...........................................97

  • LISTA DE QUADROS

    Quadro 1: Distribuio de empresas participantes no Programa Piloto, por pas de origem..........................................................................................47

    Quadro 2: Distribuio de investidores participantes no Programa Piloto, por pas de origem.................................................................................47

    Quadro 3: Relato Integrado Estrutura 1.0 - Elementos de Contedo.............54

    Quadro 4: Evoluo dos ndices ISE e IBOVESPA ..........................................63

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    A4S Accounting for Sustainability Project

    ADCE Associao dos Dirigentes Cristos de Empresas

    Anbima Associao Brasileira das Entidades de Mercado Financeiro e de Capitais

    API Anlise do Perfil do Investidor

    BACEN / BCB Banco Central do Brasil

    BM&FBovespa Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros

    BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento

    Bovespa Bolsa de Valores de So Paulo

    CERES Coalition for Environmentaly Responsible Economies

    CMN Conselho Monetrio Nacional

    CNSP Conselho Nacional de Seguros Privados

    CO2 Dixido de Carbono

    CPC Comit de Pronunciamentos Contbeis

    CSR Corporate Social Responsibility

    CVM Comisso de Valores Mobilirios

    DDA Dbito Direto Autorizado

    DJSI Dow Jones Sustainability Index (ndice Dow Jones de Sustentabilidade)

    DVA Demonstrao do Valor Agregado

    EP Equador Principles (Princpios do Equador)

    ESG Environmental, Social and Corporate Governance

    FEA/USP Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade da Universidade de So Paulo

    FEBRABAN Federao Brasileira de Bancos

    FSC Forest Stewardship Council

    GEE Gases Efeito Estufa

    GRI Global Reporting Initiative

    IBASE Instituto Brasileiro de Anlises Sociais e Econmicas .

    IBGC Instituto Brasileiro de Governana Corporativa

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    IBOVESPA ndice Bovespa

    ICO2 ndice Carbono Eficiente

    IFC International Finance Corporation

  • IFRS International Financial Reporting Standards (Normas Internacionais de Contabilidade)

    IIRC International Integrated Reporting Council (Conselho Internacional de Relato Integrado)

    IR Integrated Reporting (Relato Integrado)

    ISE ndice de Sustentabilidade Empresarial

    LIBRAS Linguagem Brasileira de Sinais

    ONU Organizao das Naes Unidas

    Oscip Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico

    PAB Posto de Atendimento Bancrio

    PIB Produto Interno Bruto

    PR Patrimnio de Referncia

    PRE Patrimnio de Referncia Exigido

    PRI Princpios para o Investimento Responsvel

    PSI Princpios para Sustentabilidade em Seguros

    RSE Responsabilidade Social Empresarial

    SFN Sistema Financeiro Nacional

    SUSEP Superintendncia de Seguros Privados

    TBL Triple Bottom Line

    Unep FI United Nations Environment Programme Finance Initiative

    UNEP / PNUMA United Nations Environment Program / Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente

    SEC Securities and Exchange Commission

    PROCON Fundao de Proteo e Defesa do Consumidor

  • SUMRIO

    INTRODUO .......................................................................................................................... 14

    OBJETIVO DA PESQUISA ..................................................................................................... 18

    1. FUNDAMENTAO ........................................................................................................ 20

    1.1. Responsabilidade Social ......................................................................................... 20

    1.2. Sustentabilidade e Desenvolvimento Sustentvel. ............................................. 26

    1.3. Os Relatos Corporativos e a Sustentabilidade. ................................................... 34

    1.4. Balano Social .......................................................................................................... 35

    1.5. Relatrio de Sustentabilidade ................................................................................. 37

    1.6. GRI Global Reporting Iniciative ........................................................................... 39

    1.7. IIRC e Relato Integrado ........................................................................................... 44

    1.8. O Setor Financeiro e a Sustentabilidade. ............................................................. 55

    2. PESQUISA ........................................................................................................................ 69

    2.1. Mtodo da Pesquisa ................................................................................................ 69

    3. APRESENTAO E DISCUSSO DOS RESULTADOS .......................................... 71

    3.1. O Ita Unibanco ........................................................................................................ 71

    3.2. Relatrios Ita Unibanco de Sustentabilidade - Anlise de Contedo. ........... 77

    3.3. Anlise Comparativa e de Conformidade do Relato Integrado Ita Unibanco

    com a verso 1.0 da Estrutura de Relato Integrado ........................................... 88

    3.4. Contribuies e Sugestes para que as Empresas possam Implementar o

    Relato Integrado ..................................................................................................... 106

    CONSIDERAES FINAIS .................................................................................................. 108

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................................... 110

  • 14

    INTRODUO

    Sustentabilidade um tema que, nas ltimas cinco dcadas, tem

    despertado o interesse crescente de pesquisadores, empresrios, governantes

    e da sociedade em geral.

    O foco da questo sobre a sustentabilidade est na esperana de que

    a humanidade no seja condenada extino, se souber cuidar da

    biocapacidade dos ecossistemas dos quais depende. (VEIGA, 2010 p. 36).

    At o final dos anos 70, o termo sustentvel era usado em algumas

    comunidades cientficas, em aluso manuteno de alguns ecossistemas,

    mesmo sofrendo agresso humana recorrente. (VEIGA, 2010 p. 11).

    Atualmente, o conceito de sustentabilidade tem sido associado a uma

    ampla gama de atividades relacionadas ao uso de recursos, incluindo os

    naturais, humanos e financeiros, implicando em continuidade e habilidade de

    prosseguir com essas atividades indefinidamente. (TODOROV; MARINOVA,

    2010 p. 1).

    Neste contexto, falar em sustentabilidade falar na perenidade da vida

    das pessoas e dos negcios. Muitas iniciativas foram lanadas para estudar as

    questes de sustentabilidade e para sensibilizar empresas e a populao em

    geral sobre os riscos envolvidos.

    O movimento em torno da ideia de sustentabilidade foi inicialmente

    articulado por ambientalistas, pela preocupao com a degradao de recursos

    naturais, mas a interdependncia entre questes ambientais, sociais e

    econmicas ampliaram a agenda da sustentabilidade. A degradao ambiental

    se apresenta como um empecilho para o desenvolvimento econmico e para a

    qualidade de vida; esta, por sua vez, especialmente quanto sade, educao

    e segurana, tambm se mostra prejudicial ao sistema econmico e

    qualidade ambiental. (DUARTE, 2013 p.41).

    Um marco importante no sentido de promover um debate global sobre

    os problemas ambientais foi a primeira Conferncia Mundial de Proteo ao

    Meio Ambiente, realizada em 1972, em Estocolmo. Reuniram-se cerca de mil

  • 15

    pessoas, representantes de 113 pases e de 400 entidades no

    governamentais. A segunda Conferncia ocorreu no Rio de Janeiro, em 1992 e

    reuniu em torno de 22 mil pessoas nos eventos oficiais. A terceira Conferncia,

    a RIO+20, foi realizada em 2012, tambm no Rio de Janeiro e reuniu 110 mil

    pessoas nos eventos oficiais e mais de um milho de pessoas nos eventos

    paralelos. No incio, essas reunies eram restritas a grupos ambientalistas e

    depois tornaram-se foco de discusses de polticas pblicas e de empresas.

    (CARVALHO; KASSAI, 2013).

    A participao das empresas neste processo de transformao

    imperativa. Elkington (2012), um dos precursores da disseminao da ideia de

    associar os impactos econmico, social e ambiental (trs pilares) ao lucro das

    empresas (Triple Bottom Line), alerta que recusar o desafio imposto pelos trs

    pilares correr o risco de extino. E no se refere apenas a grandes

    corporaes, considerando que estas sero foradas a repassar a presso, por

    meio da cadeia de fornecimento, para seus grandes e pequenos fornecedores

    e prestadores de servios. Estas mudanas vm de uma profunda

    reformulao das expectativas da sociedade e, por consequncia, daqueles

    que servem aos mercados local e global.

    Algumas mudanas culturais devero ocorrer nesta transio para o

    caminho da sustentabilidade e dentre elas, a revoluo da transparncia. Este

    processo, que est sendo impulsionado pela aproximao de novos sistemas

    de valor e de tecnologia da informao, implica em maior demanda dos

    stakeholders por informaes sobre a situao dos negcios e sobre o que

    est sendo planejado para o futuro. Haver exigncia cada vez maior de

    quebra de sigilo. Algumas formas de divulgao sero voluntrias, mas outras

    surgiro mesmo com pouco envolvimento direto das empresas. As reas de

    contabilidade, sistemas de gerenciamento e auditoria, que em geral so

    preteridas quando da elaborao dos relatos no financeiros, devero estar

    sincronizadas ao processo, como fator de sucesso. (ELKINGTON, 2012

    p.39,40).

  • 16

    Segundo Favaretto (2014), 37% das empresas brasileiras listadas na

    BM&FBovespa1 produzem relatrios de sustentabilidade. Considerando

    empresas que, embora no elaborem documentos especficos sobre o tema,

    mas reportam aes ambientais, sociais e de governana (ESG), resulta numa

    participao de 44,6%. Segundo a Bolsa, trs empresas brasileiras Ita

    Unibanco, Fbria e Natura tomaram a iniciativa de publicar o relato integrado,

    ou seja, um nico balano que combine as informaes financeiras e no

    financeiras. A partir desta atualizao de relatrios, a BM&FBovespa passar

    a usar a sigla EESG (Economic, Environmental, Social and Governance).

    Neste cenrio, onde mais de 50% das empresas abertas ainda no

    relatam suas aes (ou suas no aes) visando ao desenvolvimento

    sustentvel, evidencia-se que ainda h necessidade de grande esforo para se

    consolidar a cultura da sustentabilidade no Brasil.

    As instituies financeiras exercem um papel catalisador neste

    processo, considerando-se que podem contribuir na mitigao de riscos

    ambientais e sociais quando analisam responsavelmente as concesses de

    crditos ou o direcionamento de investimentos.

    Por outro lado, muitas instituies e organizaes, nacionais e

    internacionais, esto empenhadas com responsabilidade no objetivo de

    disseminar o assunto sustentabilidade como parte integrante e natural da

    estratgia das organizaes e da sociedade como um todo.

    Um debate recente evidenciou a necessidade de se integrar o

    pensamento sustentvel estratgia das empresas. Elegeu-se como caminho

    adequado a integrao entre os relatrios contbeis e de sustentabilidade, ou

    seja, o caminho do relato integrado. Esta iniciativa teve como patrono o

    Prncipe de Gales.

    A importncia da integrao entre relatrios contbeis e de

    sustentabilidade foi tema da Conferncia das Naes Unidas para o

    1 Dados da pesquisa atualizados at 31 de maio. Total de 437 empresas listadas na BM&FBovespa.

    (FAVARETTO, 2014).

  • 17

    Desenvolvimento Sustentvel, a Rio + 20, em junho de 2012. (CARVALHO;

    KASSAI, 2013).

    O IIRC - International Integrated Reporting Council - conselho

    composto por membros de diversos pases e com precedentes de engajamento

    em aes de sustentabilidade e governana, lanou em 2013 a primeira

    Estrutura de Relato Integrado, que deve ser a pedra fundamental para a

    transformao da mudana de paradigmas na gesto de sustentabilidade nas

    empresas.

    Esta pesquisa pretende contribuir para um melhor entendimento sobre

    como o Ita Unibanco, primeiro banco a lanar o relato integrado no Brasil,

    reflete a estratgias de sustentabilidade em seus relatrios de administrao e

    de que maneira o relato integrado se insere nesta estratgia.

  • 18

    OBJETIVO DA PESQUISA

    Tradicionalmente, os bancos atuam como agentes intermediadores de

    recursos, na funo de transformar recursos financeiros em produtos para os

    clientes.

    Antes de a agenda da sustentabilidade entrar no mundo corporativo, a

    boa gesto bancria preconizava administrao dos riscos de crdito e de

    mercado; os resultados econmicos eram os nicos parmetros de deciso.

    Os bancos esto lentamente mudando a forma de avaliar seus

    negcios e de se relacionar com a sociedade; o sucesso empresarial passa

    tambm a ser associado legitimidade do negcio, que no mais se resume

    conformidade com a legislao, mas depende de como os bancos se

    relacionam com outras esferas da sociedade. A reputao cada vez mais um

    ativo a ser valorizado e preservado para que garantam a estabilidade de seus

    negcios e capacidade de influenciar no desenvolvimento das regras de

    funcionamento dos mercados. (MAGALHES, 2010, p. 15).

    Todas as crises financeiras foram em parte provocadas por falhas de

    informao. A transparncia no mercado financeiro assume grande importncia

    neste contexto e para Magalhes (2010 p. 29), a transparncia das operaes

    financeiras se refere possibilidade de mapear as conexes pelas quais fluem

    os recursos financeiros e, mais recentemente, seus impactos sobre a natureza

    e a qualidade de vida das pessoas.

    As informaes devem ser disponibilizadas de maneira a possibilitar ao

    usurio uma avaliao sobre como o tema tratado pela organizao.

    O objetivo geral desta pesquisa analisar a relevncia do tema

    sustentabilidade nos relatrios do conglomerado Ita Unibanco, maior

    instituio financeira privada do Pas, e como estes relatrios proporcionam

    aos interessados no assunto subsdios para concluses sobre a atuao do

    Grupo em aes de sustentabilidade e como essas aes evoluram ao longo

    do tempo, incluindo a anlise do primeiro relato integrado publicado.

  • 19

    As questes problema ento consideradas nesta pesquisa so:

    O tema sustentabilidade tratado de forma relevante pelo

    conglomerado Ita Unibanco?

    O contedo dos relatrios do Ita Unibanco apresentou

    evoluo qualitativa?

    possvel perceber por meio dos relatrios um avano da

    organizao no tratamento de temas como governana, e nas

    dimenses econmica social e ambiental?

    O Relato Integrado, primeiro publicado pela organizao, est

    em conformidade com a verso 1.0 da Estrutura do Relato

    Integrado do IIRC - International Integrated Reporting Council?

    O perodo de abrangncia da pesquisa foram os exerccios de 2009

    (ano da consolidao efetiva dos bancos Ita e Unibanco) a 2013.

  • 20

    1. FUNDAMENTAO

    Este captulo apresenta conceitos identificados na literatura, e que so

    importantes para o entendimento do tema focal desta pesquisa. anlise da

    relevncia do tema sustentabilidade nos relatrios do Ita Unibanco, deve

    preceder a fundamentao sobre responsabilidade social, sustentabilidade e

    desenvolvimento sustentvel e relatos corporativos de sustentabilidade.

    1.1. Responsabilidade Social

    A Hierarquia das Necessidades, do psiclogo humanista Abraham

    Maslow, declara que a auto-realizao um estado buscado por

    todos os seres humanos, depois que tenhamos satisfeito as

    necessidades mais bsicas de sobrevivncia, de gratificao e da

    socializao.

    Parece bastante razovel afirmar que, conforme evolumos e nos

    tornamos seres mais conscientes, torna-se necessrio que as nossas

    empresas faam o mesmo. Conforme as pessoas prosseguem no

    caminho da auto-realizao, as vrias iniciativas, as instituies e as

    empresas em que os seres humanos se renem para produzir

    resultados devero mudar drasticamente para no perecer.

    (RENESH, 2008, p. 114).

    No Brasil de 1960, o censo do IBGE retratava uma populao com um

    ndice de analfabetismo de 39,6%; apenas 13,1% dos domiclios particulares

    possuam rede de esgoto e 10,7% possuam fossa sptica. Passados 50 anos,

    no censo de 2010, o ndice de analfabetismo caiu, mas ainda num patamar de

    9,6%; 55,5% dos domiclios eram contemplados com redes de esgoto e 11,6%

    com fossa sptica, indicando que mais de 40 milhes de brasileiros ainda no

    teriam acesso ao saneamento bsico. Transcorreu meio sculo com muitas

    mudanas, mas ainda evidencia-se a desigualdade que permeia a sociedade e

    a dificuldade do Estado em atender s demandas sociais.

    Schroeder & Schroeder (2004) abordam que a falncia do Estado como

    mantenedor das necessidades bsicas do cidado, juntamente com a escassez

    do trabalho ou emprego, especialmente no final do sculo XX, abriram espao

    e necessidade para o fenmeno da responsabilidade social corporativa. As

    empresas passaram a exercer um papel diferenciado do tradicional -

    provedoras de bens e servios assumindo tambm uma maior

    responsabilidade para com a sociedade e participando de causas sociais.

  • 21

    Como grandes centros de poder econmico e poltico, as empresas interferem

    diretamente na dinmica social. Assim, ao assumir causas sociais, estariam

    devolvendo sociedade parte dos recursos humanos, naturais, financeiros que

    consumiram para a alavancagem do lucro de sua atividade.

    Outros autores tambm focam a responsabilidade social como uma

    resposta s falhas do Estado, dentre eles:

    Freitas (2000, p. 10 apud FREGONESI, 2009 p.21), para quem a

    sociedade presencia um movimento de revalorizao do papel das empresas

    [...]. As organizaes modernas encontram espao para se posicionar como

    referencial que prope uma forma de vida de sucesso e uma misso nobre a

    realizar:

    [...] O Estado - falido e desacreditado - deve se restringir a oferecer

    as condies necessrias de infra-estrutura e deixar que as empresas

    se ocupem do que garante o emprego, a competitividade dos

    mercados e a potncia da nao neste mundo globalizado. Investidas

    como o novo polo da legitimao social e como o lugar que pode

    responder pelo esfacelamento dos vnculos sociais e pelas questes

    identitrias, as organizaes modernas com nfase nas grandes

    empresas constroem para e de si uma auto-imagem grandiosa, que

    vai enraizar-se num imaginrio prprio, que repassado no apenas

    para os seus membros internos mas tambm para a sociedade no

    seu conjunto.

    Passador e Ferraz (2007 p. 9, apud FREGONESI, 2009 p. 21), que

    defendem a descentralizao do Estado e colocam a necessidade de inovar as

    polticas pblicas de melhoria social, promovendo o desenvolvimento local com

    participao da comunidade sociedade civil e mercado:

    As polticas, principalmente da ltima dcada, de liberalizar,

    privatizar, flexibilizar as relaes de trabalho e diminuir cada vez mais

    a presena do Estado na sociedade acabaram por impor uma reviso

    urgente da teoria e da prtica do desenvolvimento econmico. [...]

    Nesta linha, passa-se a pensar na idia de desenvolvimento local, ou

    seja, na regionalizao das polticas sociais sendo que, a funo do

    Estado no mais a de resolver os problemas da populao, mas

    estimular e incentivar as comunidades a se mobilizarem para que

    elas desenvolvam suas potencialidades e vocaes e a partir da,

    resolvam os seus problemas.

    Em outra abordagem, a responsabilidade social teria surgido, segundo

    Mifano (2002, apud RICO, 2004 p.74), num contexto de crise mundial de

    confiana nas empresas. As organizaes empresariais comearam ento a

  • 22

    promover um discurso politicamente correto, pautado na tica, implementando

    aes sociais que pudessem significar ganhos em condies de qualidade de

    vida e trabalho para a classe trabalhadora ou, simplesmente, pudessem se

    tornar um mero discurso de marketing empresarial desvinculado de uma prtica

    socialmente responsvel.

    O investimento na rea social tornou-se ento estratgico para as

    empresas, que ao serem reconhecidas como socialmente responsveis,

    tendem a ter sua imagem valorizada, podem aumentar a motivao de seus

    funcionrios, com consequentes ganhos de produtividade, bem como melhorar

    a percepo do consumidor em relao aos seus produtos. (RICO, 2004 p.75).

    Rico (2004 p.73) aborda que na compreenso dos institutos,

    fundaes, associaes empresariais que vm buscando assumir uma gesto

    socialmente responsvel nos negcios, a responsabilidade social empresarial

    uma forma de conduzir as aes organizacionais pautada em valores ticos,

    integrando todos os protagonistas de suas relaes, promovendo a igualdade

    de oportunidades e a incluso social no pas. As empresas, adotando um

    comportamento socialmente responsvel, so poderosos agentes de mudana

    ao assumirem parcerias com o Estado e a sociedade civil, na construo de um

    mundo economicamente mais prspero e socialmente mais justo.

    A definio de responsabilidade social da empresa (RSE) no

    objetiva, e muito se tem discorrido sobre suas abordagens na academia.

    Marrewijik (2003, apud CINTRA, 2011 p.22), prope uma separao

    em trs abordagens, cada uma incluindo e transcendendo as anteriores, com o

    foco em para quem voltada a responsabilidade da organizao: 1)

    abordagem do shareholder; 2) abordagem do stakeholder; 3) abordagem da

    sociedade.

    Na abordagem do shareholder, essencialmente econmica, a

    responsabilidade da empresa se resume em prover produtos e servios para a

    sociedade por um lucro. Segundo Milton Friedman (1970), citao recorrente

    em trabalhos acadmicos, responsabilidade social de uma empresa gerar

    lucros. acrescentando que a principal responsabilidade dos gestores de uma

  • 23

    empresa para com seus acionistas (shareholders), agindo no interesse deles

    na busca de lucros crescentes, embora respeitando as regras bsicas da

    sociedade, contidas na lei, na tica e nos bons costumes.

    Na abordagem dos stakeholders, a organizao precisa balancear os

    mltiplos interesses de qualquer indivduo ou grupo que pode afetar ou ser

    afetado pela consecuo dos objetivos da empresa (FREEMAN, 1984). Nesta

    abordagem, toda a cadeia de relaes da empresa deve ser considerada alm

    de seus prprios acionistas. Embora os acionistas sejam apontados como

    possuindo interesses especficos e, por vezes, conflitantes aos dos demais

    stakeholders, consenso que a ateno aos diversos componente da cadeia e

    a outros atores acrescentados rede de partes interessadas, necessria ao

    sucesso do negcio. (CINTRA, 2011 p. 24).

    Donaldson e Preston (1995 p. 68, 69) ilustram na Figura 1 o modelo

    stakeholder como uma relao bilateral entre pessoas ou grupos com interesse

    legtimo envolvidas no negcio e que buscam obter benefcios, sem que haja

    prioridade de uns sobre os outros.

    Figura 1 Modelo Stakeholder

    Fonte: DONALDON; PRESTON, 1995 p. 69

    Na terceira abordagem, a da sociedade, as empresas so

    responsveis pela sociedade como um todo e operam por consenso pblico

    para servir construtivamente s necessidades da sociedade. Marrewijik (2003,

    Empresa

    aaa

    Associaes

    Comerciais

    Grupos

    Polticos

    Governo

    Investidores

    Empregados

    dos

    Fornecedores Clientes

    Consumidores

    dos

  • 24

    apud CINTRA, 2011 p.27). Esta abordagem marginal, pois o paradigma

    econmico ainda prepondera e direciona o sentido da sociedade (CINTRA,

    2011 p. 28).

    Segundo Garriga e Mel (2004 p.65), a maioria das teorias de RSE

    focada em quatro aspectos principais: (1) encontrar objetivos que produzam

    lucro no longo prazo, (2) usando o poder do negcio de um modo responsvel,

    (3), integrando demandas sociais e (4) contribuindo para uma boa sociedade

    atravs de aes eticamente corretas. (traduo livre2).

    Para o Instituto Ethos3, Responsabilidade Social Empresarial a forma

    de gesto que se define pelo compromisso pblico de implementao de

    processos produtivos, comerciais e gerenciais baseados em relaes ticas,

    transparentes e solidrias da empresa com todos os pblicos afetados pelas

    suas atividades e pelo estabelecimento de metas empresariais compatveis

    com a sustentabilidade da sociedade, preservando recursos ambientais e

    culturais para geraes futuras, respeitando a diversidade e promovendo a

    igualdade. (INSTITUTO ETHOS, 2000). Em termos prticos, implementar a

    RSE cuidar da qualidade dos relacionamentos da empresa com os seus

    diversos pblicos e dos impactos econmicos, sociais, ambientais e culturais

    de suas atividades.

    [...] preciso entender o conceito de responsabilidade social como o compromisso de cada um com a qualidade de vida, com a

    preservao da natureza e com uma sociedade mais justa. E conclui

    que no se pode esperar das empresas solues mgicas para

    resolver os graves problemas sociais da humanidade, mas reconhece

    a relevncia do papel das empresas em aes de transformao, por

    serem estas, talvez, as principais responsveis pelo funcionamento

    de toda a cadeia de relacionamentos de uma sociedade. (Grajew,

    2000, apud LIMA, 2005 p. 42).

    2 Most of current CSR theories are focused on four main aspects: (1) meeting objectives that produce long-term profits, (2) using business Power in a responsible way, (3) integrating social demands and (4) contributing to a good society by doing what is

    ethically correct. (GARRIGA; MEL, 2004 p. 65).

    3 Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social uma Oscip (Organizao da Sociedade Civil de Interesse Pblico) cuja misso mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerir seus negcios de forma socialmente responsvel, tornando-as

    parceiras na construo de uma sociedade justa e sustentvel. Criado em 1988 por um grupo de empresrios e executivos da

    iniciativa privada, o Instituto Ethos um polo de organizao de conhecimento, troca de experincias e desenvolvimento de

    ferramentas para auxiliar as empresas a analisar suas prticas de gesto e aprofundar seu compromisso com a responsabilidade

    social e o desenvolvimento sustentvel.

  • 25

    No Brasil, foi lanada em 2004 uma norma certificvel de sistema de

    gesto e responsabilidade social ABNT NBR 16001. Esta norma foi

    atualizada em julho de 2012, baseada na diretriz internacional ISO 26000,

    primeira norma internacional sobre responsabilidade social, publicada em

    novembro de 2010, e no certificvel.

    A ABNT (2012) define responsabilidade social como a responsabilidade

    de uma organizao pelos impactos de suas decises e atividades na

    sociedade e no meio ambiente, por meio de um comportamento tico e

    transparente que: contribua para o desenvolvimento sustentvel, inclusive a

    sade e o bem estar da sociedade; leve em considerao as expectativas das

    partes interessadas; esteja em conformidade com a legislao aplicvel e seja

    consistente com as normas internacionais de comportamento; e esteja

    integrada em toda a organizao e seja praticada em suas relaes.

    Com o pressuposto da transparncia, as aes de Responsabilidade

    Social Empresarial demandam divulgao e prestao de contas, tornando

    conhecidas informaes relevantes para com os envolvidos na cadeia de

    stakeholders. Este o significado atribudo a accountability, que no tem um

    termo correspondente na lngua portuguesa, sendo de maneira simplificada,

    considerado como a obrigao de prestar contas e segundo Sinclair (1995,

    apud CINTRA, 2011 p. 29), envolve um relacionamento no qual se requer das

    pessoas se explicarem e se responsabilizarem por suas aes.

    Segundo Machado (2010), as informaes de carter social e/ou

    ambiental a serem divulgadas vo alm daquelas monetrias, comumente

    encontradas nas tradicionais demonstraes contbeis, e devem envolver

    informaes quantitativas e qualitativas. Estas informaes tm sido

    crescentemente divulgadas pelas empresas atravs de demonstrativos

    estruturados denominados de balano social, relatrio socioambiental,

    relatrio ambiental, relatrio de sustentabilidade, entre outros. Aborda ainda

    uma diferenciao do relatrio de sustentabilidade em relao aos demais

    citados, aos quais trata por balano social.

  • 26

    Esta nomenclatura ser tambm adotada nesta pesquisa; nos itens 1.4 e

    1.5 deste captulo sero tratados conceitos de Balano Social e de Relatrio de

    Sustentabilidade, esclarecendo a diferenciao.

    1.2. Sustentabilidade e Desenvolvimento Sustentvel.

    O adjetivo sustentvel se aplicava, originalmente, ecologia. At final

    dos anos 1970, era usado por algumas comunidades cientficas para designar

    a condio de um ecossistema no perder sua resilincia4, ou seja, sua

    capacidade de absorver tenses ambientais sem alterar seu estado ecolgico.

    (VEIGA, 2011 p.11).

    Segundo Veiga (2010 p. 190), h indcios de que a expresso

    desenvolvimento sustentvel tenha tido empregada fora do contexto cientfico

    pela primeira vez em agosto de 1979, no Simpsio das Naes Unidas sobre

    as Interrelaes entre Recurso, Ambiente e Desenvolvimento, realizado em

    Estocolmo, no texto apresentado por W. Burger: A busca dos padres

    sustentveis de desenvolvimento. A ideia comeou realmente a se firmar a

    partir de 1987, quando ao apresentar do relatrio Nosso futuro comum

    Assembleia Geral da ONU, Gro Harlem Brundtland, presidente da Comisso

    Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, caracterizou

    desenvolvimento sustentvel como um conceito poltico, um conceito amplo

    para o progresso econmico e social.

    Em 1983, a ONU cria a Comisso Mundial sobre o Meio Ambiente e

    Desenvolvimento como um organismo independente5. Em 1987, a

    comisso sob a presidncia de Gro Harlem Brundtland, primeira-

    ministra da Noruega, materializa um dos documentos mais

    importantes do nosso tempo o relatrio Nosso Futuro Comum,

    responsvel pelas primeiras conceituaes oficiais, formais e

    sistematizadas sobre o desenvolvimento sustentvel ideia-mestra

    do relatrio. (TINOCO; KRAEMER, 2011 p.114).

    4 Conceito oriundo da fsica: propriedade de alguns materiais de, quando exigidos ou submetidos a

    estresse, acumular energia em que ocorra ruptura. Atualmente o termo tambm muito utilizado para caracterizar pessoas que so capazes de lidar com problemas sob presso ou estresse. (VEIGA, 2011 p. 11).

    5 A comisso foi criada em 1983, aps uma avaliao dos 10 anos da Conferncia da ONU sobre o meio

    ambiente, de 1972 em Estocolmo, com o objetivo de promover audincias em todo o mundo e produzir um resultado formal das discusses.

  • 27

    O relatrio Nosso Futuro Comum, tambm conhecido como Relatrio

    Brundtland, definiu desenvolvimento sustentvel como [...] aquele que atende

    s necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as geraes

    futuras atenderem s suas prprias necessidades. (Comisso Mundial sobre

    Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1991 p.46).

    Elkington (2012) considera Nosso futuro comum como um dos livros

    mais importantes do final do sculo 20, colocando o desenvolvimento

    sustentvel firmemente na agenda poltica internacional. Os objetivos principais

    observados pela comisso Brundtland incluam:

    [...] reativar o crescimento econmico, mas em uma nova forma

    (menos material e mais energia, porm, mais equitativo em seus

    impactos); atendimento das necessidades vitais de empregos,

    alimentos, energia, gua e saneamento; garantia de um nvel

    sustentvel de populao; conservao e aumento da base de

    recursos naturais; reorientao tecnolgica e do gerenciamento de

    risco; e fuso das consideraes ecolgicas e econmicas nas

    tomadas de deciso). (ELKINGTON 2012 p. 92).

    Segundo Veiga (2010 p.114,189), a expresso desenvolvimento

    sustentvel acabou se legitimando para negar a incompatibilidade entre

    crescimento contnuo e a conservao do meio ambiente. Refora a

    possibilidade de conciliao desses dois objetivos, isto , crescer sem destruir.

    Atenuou o temor gerado pela polarizao crescimento econmico versus

    preservao ambiental.

    As expresses desenvolvimento sustentvel e sustentabilidade so,

    segundo Cintra (2011), usadas de maneira intercambivel. Destaca algumas

    obras que introduziram a discusso e o processo de conscientizao sobre o

    tema: Silent spring, de Rachel Carson, publicado em 1962, um alerta para o

    uso massivo de agrotxicos levando extino de espcies; Limits to growth o

    Relatrio do Clube de Roma, publicado em 1972, sobre o esgotamento de

    recursos naturais. E mais recentemente, Uma verdade inconveniente de Al

    Gore, publicado em 2006, sobre o tema do aquecimento global e das

    mudanas climticas.(CINTRA, 2011 p. 18).

  • 28

    A definio de desenvolvimento sustentvel do Relatrio Brundtland,

    uma das mais difundidas e aceitas, encontra alguns crticos.

    Veiga (2010) cita Amartya Sen6 prmio Nobel de Economia em 1998,

    que questiona se o conceito proposto suficientemente abrangente,

    considerando-se que alm das cruciais necessidades enfatizadas no

    documento, as pessoas tm valores, como a capacidade de pensar, avaliar,

    agir, participar. Avaliar as geraes atuais e futuras apenas em termos de

    necessidades fazer uma ideia muito insuficiente da humanidade. VEIGA

    (2010 p. 166).

    Para Steinbuka e Wolff (2007, apud Fragalli, 2014 p. 26) a definio

    necessidades do presente sem comprometer necessidades de geraes

    futuras uma noo notoriamente difcil de ser transformada em ao

    operacional.

    Romeiro (2013) aponta a impreciso desta definio, pela falta de

    conceituao de necessidades, e de para quantas geraes se pretende

    garantir estas necessidades. Considerando ainda que o estoque de tomos

    finito e os recursos so finitos, levanta algumas indagaes. Como a definio

    diferenciaria necessidades de desejos? Atualmente, 75% da energia do

    Planeta consumida por menos de 50% da populao; qual seria ento o

    padro de medida para as necessidades?

    Elkington (2012 p. 92) cita a definio de Herman Daly7, economista do

    Banco Mundial, como alternativa aos que buscam uma definio mais precisa.

    Uma sociedade sustentvel precisa atender a trs condies: suas taxas de

    utilizao de recursos renovveis no devem exceder suas taxas de

    regenerao; suas taxas de uso de recursos no renovveis no devem

    exceder a taxa pela qual a renovao sustentvel dos substitutos

    desenvolvida; suas taxas de emisso de poluentes no devem exceder a

    capacidade de assimilao do meio ambiente.

    6 SEN, Amartya. Por que necessrio preservar a coruja-pintada. Folha de S. Paulo. 14 mar.2004,

    caderno Mais! p. 16-18 7 HERMAN, Daly. Institutions for a steady-state economy. Steady State Economics, Island Press, 1991

  • 29

    Segundo Barbieri e Cajazeira (2012, p. 65 - 69), o movimento do

    desenvolvimento sustentvel baseia-se na percepo de que a capacidade da

    Terra no poder ser ultrapassada sem que ocorram grandes catstrofes

    sociais e ambientais, e que problemas ambientais gravssimos como o

    aquecimento global, destruio da camada de oznio, poluio de rios e

    oceanos, extino acelerada de espcies vivas, j sinalizam que limites

    aceitveis foram ultrapassados. Acrescentam ainda os problemas sociais,

    como a pobreza, assentamentos urbanos desprovidos de infraestruturas

    mnimas, violncia urbana, trfico de drogas, epidemias globalizadas. A

    soluo para estes problemas globais s pode ser viabilizada com a

    participao de todas as naes, governos e sociedade civil, cada uma na sua

    abrangncia, e que as empresas cumprem papel central neste processo de

    recuperao e conduo para o desenvolvimento sustentvel, pois muitos

    problemas socioambientais foram produzidos e estimulados pelas suas

    atividades.

    Os debates sobre sustentabilidade se iniciaram na vertente ambiental,

    numa tentativa de harmonizar o pilar financeiro com o pensamento emergente

    do pilar ambiental e evoluram para o terceiro elemento, da justia social.

    Sustentabilidade transcende o simples desafio de esverdeamento, tornando

    os negcios mais eficientes e reduzindo custos. Questes e igualdade social e

    o conceito de igualdade entre as geraes j estavam na agenda de

    sustentabilidade do Relatrio Brundtland. (ELKINGTON, 2012 p.108).

    No mbito das organizaes em geral, a contribuio para o

    desenvolvimento sustentvel consiste em trs dimenses: a econmica, a

    social e a ambiental. Barbieri e Cajazeira (2012 p. 67) chamam ateno para o

    fato de que estas trs dimenses concentram o que mais especfico da

    atuao das organizaes, mas no implica em perda ou abandono de outras

    possveis dimenses.

    Elkington (2004), atento s questes de sustentabilidade, concebeu em

    1994 o termo triple bottom line TBL - com o intuito de integrar o teor

    econmico e social ao ambiental, numa linguagem que tivesse ressonncia no

    mundo dos negcios e que facilitasse a divulgao dos conceitos de

  • 30

    sustentabilidade. Bottom line faz aluso ao resultado lquido da demonstrao

    de resultado do exerccio. Adotou o termo em 1997, no livro de sua autoria

    Cannibals With Forks: The Triple Bottom Line of 21st Century Business, onde

    ressalta que uma gesto empresarial que se pretendesse sustentvel deveria

    considerar, obrigatoriamente, de forma integrada, as dimenses sociais,

    econmicas e ambientais do negcio. TBL passou a ser amplamente usado

    como referncia para sustentabilidade.

    Segundo Savitz (2007), o Triple Bottom Line uma maneira muito eficaz

    de captar a conexo de sustentabilidade e lucratividade, ou seja, de como as

    empresas podem tornar-se mais lucrativas, agindo de forma adequada. A partir

    desta observao, possvel ento se pensar na sustentabilidade como

    oportunidades de negcios.

    O ttulo do livro foi inspirado por uma citao do poeta polons

    Stanislaw Lec, que certa feita indagou se seria considerado progresso um

    canibal usar garfo. Elkington teria estendido a analogia para o capitalismo

    corporativo, que tambm chamou de canibalismo corporativo (no sentido de

    que em economias capitalistas crescentes, natural que corporaes devorem

    as concorrentes). E respondeu com um sim; isto , mudanas em ferramentas

    e atitudes fariam o capitalismo mais civilizado, ou melhor, um capitalismo

    sustentvel. O garfo representa os trs pilares da sustentabilidade:

    prosperidade econmica, qualidade ambiental e justia social. (ELKINGTON,

    2012 p.25).

    A linha do pilar econmico, pilar convencional das empresas, o lucro.

    Uma empresa precisa dar lucro e ter seu valor de mercado aumentado,

    gerando riqueza para seus acionistas. Em seu termo mais simples, capital

    econmico o valor total dos ativos da empresa menos suas obrigaes. Pode

    ser identificado de duas formas principais: capital fsico (prdios, mquinas e

    equipamentos) e capital financeiro. O conceito pode tambm ser estendido,

    incluindo o capital humano, que congrega o conhecimento da empresa,

    competncia profissional, experincia e habilidades e o capital intelectual,

    como marcas e patentes. (ELKINGTON, 2012 p. 111,114).

  • 31

    Elkington (2012) pondera que um conceito chave em relao s trs

    dimenses da sustentabilidade o da externalidade, especialmente relevante

    em relao aos custos ambientais e sociais. So os custos no registrados na

    contabilidade. Barbieri e Cajazeira (2012 p. 73) definem externalidade como

    um fenmeno externo ao mercado e que no afeta o seu funcionamento. As

    externalidades ocorrem quando a empresa provoca impactos em pessoas no

    envolvidas em suas transaes.

    Elkington (2012 p. 114) cita como um exemplo de externalidade na linha

    do pilar econmico, a deciso de uma empresa em localizar uma fbrica de alta

    tecnologia em uma regio relativamente no desenvolvida, com impacto pelo

    deslocamento de pessoal qualificado, e/ou impacto de preos na comunidade

    local.

    A dimenso social da sustentabilidade refere-se possibilidade de cada

    indivduo e tambm da coletividade ter suas necessidades referentes

    alimentao, sade, educao e de cidadania atendidos. SCANDELARI (2011

    p.90).

    Em termos sociais, a empresa deve satisfazer aos requisitos de

    proporcionar as melhores condies de trabalho aos seus

    empregados, procurando contemplar a diversidade cultural existente

    na sociedade em que atua, alm de propiciar oportunidade aos

    deficientes de modo geral. Alm disso, seus dirigentes devem

    participar ativamente das atividades socioculturais de expresso da

    comunidade que vive no entorno da unidade produtiva. Dias, (2006,

    p. 40 apud SCANDELARI, 2011 p. 90).

    A linha do pilar social est centrada na confiana dos stakeholders, no

    enriquecimento das relaes humanas. O capital social envolve o capital

    humano na forma de sade, habilidades e educao do pessoal interno; deve

    abranger tambm medidas mais amplas de sade da sociedade e do potencial

    de criao de riqueza. (BARBIERI; CAJAZEIRA, 2012 p. 74).

    Fukuiama apud Elkington (2012 p. 124) considera o capital social a

    capacidade de as pessoas trabalharem juntas, em grupo ou organizaes, para

    um objetivo comum, capacidade esta que surge da prevalncia da confiana

    em uma determinada sociedade ou grupo.

  • 32

    A linha do pilar ambiental envolve os recursos naturais e se aplica a

    bens e a servios ambientais. Os bens referem-se s fontes de matrias primas

    e em geral so classificados como renovveis ou no renovveis. No entanto,

    uma fonte pode deixar de ser renovvel, caso sua taxa de explorao supere

    sua taxa de renovao. Esta classificao, portanto, no absoluta. Os

    servios ambientais envolvem bens intangveis proporcionados pela natureza,

    como a polinizao, a circulao do ar, e outros, que mantm a vitalidade dos

    ecossistemas. (BARBIERI; CAJAZEIRA, 2012 p. 73).

    Sustentabilidade ambiental um processo decorrente da conservao,

    proteo e reduo do consumo de recursos naturais (gua, solo, energia,

    dentre outros) e do manejo adequado de resduos, efluentes e substncias

    txicas, de forma a minimizar o seu impacto sobre a terra. (SCANDELARI,

    2011 p. 93).

    O modelo TBL pressupe que uma empresa sustentvel oriente suas

    atividades e gesto baseada no trip econmico social e ambiental e busque

    alcanar seus objetivos atendendo, simultaneamente os critrios de equidade

    social, prudncia ecolgica e eficincia econmica.

    Para Savitz (2007, p.5, 42), a gesto da empresa deve gerar valor

    nestas trs dimenses e abrange a reduo de custos, melhoria da

    produtividade, eliminao de desperdcios desnecessrios e garantia de

    acesso a fontes de capital a custos mais baixos. Ele considera a ecoeficincia

    componente bsico da sustentabilidade, e a define como a reduo de

    quantidade de recursos utilizados para produo de bens e servios,

    aumentando o lucro da empresa e ao mesmo tempo reduzindo o impacto

    ambiental; e chama ateno para o fato de que poluio gera desperdcio.

    Para Robles Jr. (2003, p.17), entende-se como desperdcio a perda a

    que a sociedade submetida devido ao uso de recursos escassos. O

    desperdcio abrange recursos de material, mo de obra, energia, at horas de

    treinamento e aprendizado que a empresa e a sociedade perdem devido, por

    exemplo, a um acidente de trabalho.

  • 33

    Um desafio que se evidencia neste contexto, alm de boas prticas de

    gesto financeira e econmica, o enfrentamento de limitaes e problemas

    ambientais e sociais, de modo a garantir a continuidade com resultados

    consistentes.

    Barbieri e Cajazeira (2012 p. 73) apontam que h divergncias a

    respeito de como considerar a sustentabilidade dos recursos naturais. Numa

    linha, considerada sustentabilidade fraca, o capital natural no difere das

    demais formas de capital, o econmico e o social, sendo considerados

    perfeitamente substituveis entre si e o importante a manuteno e ampliao

    do montante total de capital, independente de quais sejam seus componentes;

    na outra linha, considerada sustentabilidade forte, as formas de capital so

    complementares, e uma no pode substituir a outra.

    Na linha batizada de sustentabilidade fraca, Solow (1993, apud VEIGA

    2010, p.122, 23), considera que a natureza jamais constituir srio obstculo

    expanso. O progresso cientfico tecnolgico sempre conseguir alternativa a

    qualquer elemento da biosfera que se torne limitante ao processo produtivo,

    reequilibrando seus trs ingredientes fundamentais: trabalho humano, capital

    produzido e recursos naturais. Apesar deste otimismo tecnolgico, defende que

    a humanidade precisa evitar tudo o que possa ocorrer em detrimento de seus

    descendentes, sejam eles os diretos ou os mais distantes, o que significa, em

    seu ponto de vista, a preservao da capacidade produtiva para um futuro

    indefinido, pela ilimitada substituio dos recursos no renovveis.

    Hawken, Lovins e Lovins (2009, p.55), atribuem ao desperdcio, devido

    natureza perdulria dos processos industriais atuais, a deteriorao do meio

    ambiente natural, alm da dissoluo de sociedades civis e da falta da vontade

    pblica necessria para promover o bem estar. O uso excessivo de recursos

    para tornar pouqussima gente mais produtiva uma frmula industrial cada

    vez mais cara e j no serve para o presente e nem para o futuro.

    A contabilidade est ainda em um estgio embrionrio na representao

    fiel dos efeitos do desperdcio, das perdas de capital natural, dos possveis

    efeitos de desequilbrios sociais em seus demonstrativos. Contudo, muito se

    tem pesquisado e discutido sobre o assunto; informaes sociais e ambientais,

  • 34

    que no configuram nas demonstraes financeiras das empresas, tm sido

    incorporadas aos seus controles gerenciais e divulgadas por iniciativas

    voluntrias e de responsabilidade social.

    A perda dos servios do capital natural j est impondo altos custos ao

    crescimento do capital econmico. A economia no vai funcionar como um guia

    confivel enquanto o capital natural no figurar nas folhas de balanos das

    empresas, dos pases e do mundo. (HAWKEN; LOVINS e LOVINS, 2009, p.

    57).

    1.3. Os Relatos Corporativos e a Sustentabilidade.

    O movimento que impulsiona empresas a aes de responsabilidade

    social e sustentabilidade tambm se reflete nos relatrios corporativos.

    At aproximadamente os anos 80, os relatrios corporativos continham

    substancialmente informaes financeiras e retratavam basicamente os bens

    tangveis. A partir dos anos 80, com o advento da era da informao, maior

    ateno passou a ser dada aos intangveis e as empresas comearam a

    incursionar pelo tema da sustentabilidade e a divulgar, alm de seus relatrios

    contbil-financeiros, seus relatrios de sustentabilidade. (CARVALHO, 2013).

    Um desafio para a elaborao dos relatrios corporativos a

    consistncia entre as informaes que se apresentam nos relatrios contbeis

    (obrigatrios) e nos relatrios sociais ou de sustentabilidade (em geral de

    iniciativa voluntria).

    Carvalho (2013) aponta para situaes em que os relatrios de

    sustentabilidade apresentam uma situao positiva sobre determinados temas,

    mas o relatrio financeiro contradiz com provises de contingncias sobre o

    mesmo tema (por exemplo, na rea trabalhista).

    Peter Bakker ressalta outro lado em que, quando os relatrios

    financeiros no so suficientes para identificar aes sociais positivas da

    empresa, estas devem ser, de alguma forma, relatadas. [...] Precisamos

    garantir que os relatos corporativos deixem claro como uma empresa est

  • 35

    fazendo seu dinheiro, no s quanto dinheiro ela est fazendo. (BAKKER,

    2013).

    As dimenses bsicas da sustentabilidade econmica, social e

    ambiental devem ser consideradas interrelacionadas nas aes para a busca

    do desenvolvimento sustentvel e, por consequncia, na forma como essas

    aes so reportadas nos relatrios corporativos. Diversas organizaes tm

    se mobilizado para propor modelos de relatrios e indicadores adequados para

    avaliao da sustentabilidade nas empresas. Nos captulos 1.6 e 1.7 sero

    apresentadas algumas dessas iniciativas

    Mais recentemente, um debate sobre a necessidade de os relatrios

    corporativos refletirem, numa mensagem integrada e coerente, o processo de

    gerao de valor nas empresas, e de como a sustentabilidade est inserida

    neste processo, resultou numa nova forma de divulgao dos relatrios

    corporativos: o relato integrado, que ser apresentado no captulo 1.7.

    1.4. Balano Social

    O objetivo do balano social empresarial tornar pblica a

    responsabilidade social da empresa, evidenciando suas aes para com a

    sociedade.

    Balano Social um instrumento de gesto e de informao que visa

    evidenciar, de forma mais transparente possvel, informaes

    financeiras, econmicas, ambientais e sociais, do desempenho das

    entidades, aos mais diferenciados usurios, seus parceiros sociais.

    (TINOCO; KRAEMER, 2011 p.12).

    O tema balano social introduzido no Brasil com a constituio em So

    Paulo da ADCE, Associao dos Dirigentes Cristos de Empresas, dando incio

    discusso sobre a responsabilidade dos dirigente da empresa nas questes

    sociais. Em 1977 a ADCE, organizou o 2 Encontro Nacional de Dirigentes de

    Empresas, tendo como tema central o Balano Social das Empresas. Porm,

    somente em 1984 se d a primeira experincia de balano social no Brasil,

    publicado pela Nitrofrtil, BA. Em 1997, no Rio de Janeiro, Herbert de Souza, o

    Betinho, um dos fundadores do IBASE (Instituto Brasileiro de Anlises Sociais

    e Econmicas) inicia campanha pela divulgao de um Balano Social das

    empresas no Brasil. Rioli, (apud TINOCO e KRAEMER, 2011 p.80).

  • 36

    O Balano Social tem sido, com raras excees8, de iniciativa voluntria.

    Tambm no h padro para a forma de apresentao, tampouco quanto s

    informaes que devem ser divulgadas e como.

    Entende-se que as informaes de natureza social e ambiental vo

    alm das informaes monetrias, comumente encontradas nas

    tradicionais demonstraes contbeis, e devem envolver tanto

    informaes quantitativas quanto qualitativas e, em alguns casos,

    fogem das especialidades dos contabilistas, os quais devem recorrer

    a profissionais qualificados, porm sem se eximir da responsabilidade

    pela veracidade e qualidade da informao prestada. (MACHADO,

    2010 p.32).

    Quatro vertentes, pelo menos, norteiam um balano social:

    demonstrao do valor adicionado, balano de recursos humanos, balano

    ambiental e benefcios e contribuies sociedade em geral. Para caracterizar

    um demonstrativo como um balano social, estas vertentes podem se

    apresentar isoladamente ou em conjunto. (IUDCIBUS; MARTINS; GELBCKE,

    2007, apud MACHADO, 2010 p.38).

    A demonstrao do valor adicionado (DVA), como descrita no CPC 09,

    deve proporcionar aos usurios das demonstraes contbeis informaes

    relativas riqueza criada pela entidade em determinado perodo e a forma

    como tais riquezas foram distribudas. Minimamente, deve ser detalhada em:

    (a) pessoal e encargos;

    (b) impostos, taxas e contribuies;

    (c) juros e aluguis;

    (d) juros sobre o capital prprio (JCP) e dividendos;

    (e) lucros retidos/prejuzos do exerccio.

    Cabe destacar que a DVA obrigatria para companhias abertas,

    conforme artigo 176, da Lei n 6.404/76, alterado pela Lei n 11.638/07.

    O balano de recursos humanos deve divulgar informaes acerca do

    corpo de funcionrios da empresa, quantificando dados monetrios e no

    8 Exemplificando uma exceo, Machado (2010, p. 39) cita exigncia de agncias reguladoras, como a ANEEL, que determina que as concessionrias devem utilizar o modelo de balano social do Ibase, adaptado, quando aplicvel, aos termos e especificaes

    relacionados s concessionrias do setor eltrico, com adaptaes para o setor.

  • 37

    monetrios, tais como: remunerao, benefcios concedidos, rotatividade da

    mo de obra, nvel de escolaridade, treinamento, alm da divulgao de

    condies de trabalho, como por exemplo, de segurana.

    O balano ambiental reflete a conduta da empresa em relao gesto

    ambiental. Segundo Robles e Bonelli (2012, p. 44), a gesto ambiental consiste

    em um conjunto de medidas e procedimentos definidos e adequadamente

    aplicados que visam a reduzir e controlar os impactos introduzidos por um

    empreendimento sobre o meio ambiente. Bonelli in ROBLES (2003, p. 131,

    133) acrescenta que a conscientizao ambiental dos dirigentes de uma

    empresa orienta suas prioridades estratgicas, e o meio ambiente visto como

    uma oportunidade de negcios; a qualidade ambiental parte inseparvel da

    qualidade total das empresas que pretendem se manter competitivas num

    mercado exigente e globalizado.

    Para Machado (2010 p.38), o balano ambiental deve demonstrar a

    postura da empresa com os recursos naturais, evidenciando gastos com a

    preservao e proteo do meio ambiente, investimentos em equipamentos e

    tecnologia para preservao do mesmo.

    Segundo Tinoco e Kraemer (2011 p.144), a contabilidade ambiental

    deve evidenciar e espelhar a relao das empresas e da Nao com o meio

    ambiente, destacando as aes ambientais que decorrem das atividades

    operacionais das empresas, ao reconhecerem a existncia de compromissos

    com o meio ambiente.

    Quanto vertente de benefcios e contribuies sociedade em geral,

    usualmente so divulgadas informaes quanto a doaes para bens sociais e

    culturais, tais como escolas, creches, hospitais, centros culturais, esportivos,

    dentre outros, refletindo o lado filantrpico e a interao da empresa com a

    comunidade.

    1.5. Relatrio de Sustentabilidade

    Elaborar relatrios de sustentabilidade a prtica de medir, divulgar e

    prestar contas para stakeholders internos e externos do desempenho

    organizacional visando ao desenvolvimento sustentvel. Relatrio de

    Sustentabilidade um termo amplo considerado sinnimo de outros

  • 38

    relatrios cujo objetivo descrever os impactos econmicos,

    ambientais e sociais (triple bottom line) de uma organizao, como o

    relatrio de responsabilidade social empresarial, o balano social, etc.

    (GRI, 2006).

    O relatrio de sustentabilidade deve ento basear-se no trip

    econmico, social e ambiental para sua caracterizao. Para o balano social,

    por sua vez, como mencionado no item 1.4 basta que se apresente uma dentre

    as vertentes recursos humanos, ambiental, relaes com a sociedade ou valor

    adicionado. Nota-se ento que um relatrio de sustentabilidade pode ser

    caracterizado como um balano social, porm nem todo balano social pode

    ser caracterizado como um relatrio de sustentabilidade (MACHADO, 2010

    p.43).

    No Brasil h diversas referncias para divulgao de balano ou de

    indicadores sociais, como o modelo IBASE (Instituto Brasileiro de Anlises

    Sociais e Econmicas), os indicadores Ethos (para negcios sustentveis e

    responsveis), dentre outros. No entanto, o modelo GRI (Global Reporting

    Initiative) tem se destacado com nmero relevante de empresas com

    publicaes aderentes a este padro.

    A KPMG realiza uma pesquisa, desde 1993, na qual divulga uma viso

    geral da tendncia de relatrios de responsabilidade empresarial, gerando

    subsdios para empresrios e gestores, alm de investidores, estudantes,

    agncias de rating e profissionais interessados em sustentabilidade, quer para

    o aprimoramento de seus relatos de responsabilidade empresarial, quer para

    uma anlise crtica de interessados no assunto. Em 2013 divulgou a oitava

    pesquisa, cobrindo 4.100 empresas, em 41 pases. (KPMG, 2013).

    Do universo da pesquisa, consideram-se as cem maiores empresas de

    cada pas (N100) e as 250 maiores empresas listadas no ranking da revista

    Fortune (500 maiores do mundo) (G250). A KPMG destaca que as diretrizes do

    modelo GRI so citadas pela maioria das empresas com divulgao voluntria

    de relatrio de responsabilidade empresarial em 2013, 78% dentre as N100

    (crescimento de 9 pontos percentuais desde 2011) e 82% dentre as G250 (era

    78% em 2011).

  • 39

    O Ita Unibanco S/A, objeto desta pesquisa, segue diretrizes da GRI na

    apresentao de seu relatrio de sustentabilidade.

    1.6. GRI Global Reporting Iniciative

    A GRI - Global Reporting Iniciative uma organizao no

    governamental, fundada em 1997, em Boston, pela CERES (Coalition for

    Environmentaly Responsible Economies) e pelo Instituto Tellus, organizaes

    norte americanas sem fins lucrativos.

    Inicialmente era um departamento da CERES. Em 1998 foi estabelecido

    um Comit Diretor, multi-stakeholder, com um mandato para desenvolver as

    diretrizes da GRI, com escopo social, econmico e de governana.

    A primeira verso das Diretrizes GRI (Guidelines GRI) foi lanada no ano

    2000. No ano seguinte, por recomendao do Comit Diretor, GRI tornou-se

    uma instituio independente da CERES.

    A segunda verso de Guidelines GRI G2 foi divulgada em 2002, em

    Johannesburg, durante a World Summit on Sustainable Development. GRI foi

    uma das referncias para divulgao de relatrios de sustentabilidade. Nesta

    ocasio, a UNEP (Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente)

    convidou pases membros da ONU para sediar a GRI. Desde ento GRI uma

    organizao formalmente designada como colaboradora da UNEP, e sediada

    em Amsterd, Holanda. A GRI conta tambm com representantes regionais,

    em diversos pases: Austrlia, Brasil, China, ndia, frica do Sul e Estados

    Unidos, chamados Pontos Focais (Focal Points). uma rede mundial de cerca

    de 30.000 pessoas.

    Em 2006 foi lanada a terceira verso do Guidelines GRI G3. Foi

    desenvolvida com o apoio de mais de 3.000 especialistas das reas de

    negcios, sociedade civil e da rea trabalhista. Em 2011 foi publicada uma

    reviso, a verso G3.1, expandindo orientaes em relao a direitos

    humanos, impactos na comunidade local e gnero (human rights, local

    community impacts, and gender).

  • 40

    Em maio 2013, GRI divulgou a quarta verso de Guidelines G4. Nesta

    verso, dado maior foco em materialidade. Ainda que materialidade no seja

    um assunto novo, a verso 4.0 do GRI demanda explicitamente esforos na

    anlise da materialidade impactos, riscos e oportunidades, para a divulgao

    dos temas referentes sustentabilidade.

    A misso da GRI fazer com que a prtica de relatrios de

    sustentabilidade se torne padro, fornecendo orientao e suporte para as

    organizaes. A viso da GRI uma economia global sustentvel onde

    organizaes possam medir seus desempenhos e impactos econmicos,

    ambientais, sociais bem como os relacionados governana, de uma maneira

    responsvel e transparente. (GRI 2012 - Pontos de Partida).

    As informaes divulgadas a seguir foram extradas das Diretrizes

    (Guidelines) GRI - G3 (GRI 2006), G3.1 (GRI 2011) e G4 (GRI 2013).

    A estrutura de relatrios da GRI foi delineada com o objetivo de servir

    como um modelo amplamente aceito para a elaborao de relatrios sobre o

    desempenho econmico, ambiental e social de uma organizao. Foi

    concebida para ser utilizada por organizaes de qualquer porte, setor ou

    localidade. Um relatrio de sustentabilidade baseado nas Diretrizes da GRI,

    entre outros propsitos, pode ser usado como:

    padro de referncia (benchmarking) e avaliao do

    desempenho e sustentabilidade com respeito a leis, normas,

    cdigos, padres de desempenho e iniciativas voluntrias;

    demonstrao de como a organizao influencia e influenciada

    por expectativas de desenvolvimento sustentvel;

    comparao de desempenho dentro da organizao e entre

    organizaes diferentes ao longo do tempo.

    O relatrio de sustentabilidade um processo e uma ferramenta vivos,

    que no se inicia nem termina com sua publicao. Possibilita uma slida

    avaliao do desempenho da organizao e pode dar suporte melhoria

    contnua do desempenho ao longo do tempo. Auxilia as organizaes a

  • 41

    estabelecer metas, aferir desempenho e gerir mudanas com vistas a tornar

    suas operaes mais sustentveis.

    Os relatrios so organizados seguindo certos princpios, visando

    garantia da qualidade das informaes relatadas e ao estabelecimento do limite

    do relatrio. Os princpios esto organizados em dois grupos: princpios para

    determinar quais temas e indicadores a organizao dever relatar e princpios

    para assegurar a qualidade e a adequada apresentao das informaes

    relatadas.

    Princpios para a definio do contedo do relatrio:

    incluso dos stakeholders: a organizao deve identificar seus

    stakeholders e explicar no relatrio que medidas foram tomadas em

    resposta s suas expectativas e interesses pertinentes;

    contexto da sustentabilidade: o relatrio deve apresentar o

    desempenho da organizao no contexto mais amplo da

    sustentabilidade, focando como a organizao contribui ou pretende

    contribuir no futuro para a melhora ou deteriorao das condies

    econmicas, ambientais e sociais, no mbito local, regional ou global;

    materialidade: o relatrio deve abordar aspectos que reflitam os

    impactos econmicos, ambientais e sociais significativos da

    organizao; ou que possam influenciar, substancialmente, as

    avaliaes e decises de stakeholders. A materialidade o limiar a partir

    do qual os aspectos tornam-se suficientemente expressivos para serem

    relatados;

    abrangncia / completude: a cobertura dos temas e indicadores

    relevantes, assim como a definio do limite do relatrio, devero ser

    suficientes para refletir os impactos econmicos, ambientais e sociais

    significativos e permitir que os stakeholders avaliem o desempenho da

    organizao no perodo analisado escopo, limite e tempo.

    Princpios para assegurar a qualidade do relatrio:

  • 42

    equilbrio: o relatrio deve refletir aspectos positivos e negativos do

    desempenho da organizao, de modo a permitir uma avaliao

    equilibrada do desempenho geral;

    comparabilidade: as questes e informaes devem ser selecionadas,

    compiladas e relatadas de forma consistente, de modo a permitir aos

    stakeholders analisar mudanas no desempenho da organizao ao

    longo do tempo e subsidiar anlises sobre outras organizaes;

    exatido: as informaes devem ser suficientemente precisas e

    detalhadas para que os stakeholders avaliem o desempenho da

    organizao;

    periodicidade / tempestividade: o relatrio publicado regularmente e

    as informaes so disponibilizadas a tempo para que os stakeholders

    tomem decises fundamentadas;

    clareza: as informaes devem estar disponveis de uma forma que

    sejam compreensveis e acessveis aos stakeholders que fizerem uso do

    relatrio;

    confiabilidade: as informaes e processos usados na preparao do

    relatrio devem ser coletados, registrados, compilados, analisados e

    divulgados de forma que o mesmo possa ser revisado e que seja

    estabelecida a qualidade e materialidade das informaes.

    O contedo bsico para compor um relatrio GRI deve conter

    informaes que forneam o contexto geral para a compreenso do

    desempenho organizacional, incluindo sua estratgia, perfil e governana;

    informaes sobre a gesto; e indicadores de desempenho, passveis de

    comparao.

    Os indicadores de desempenho de sustentabilidade do relatrio GRI so

    constitudos nas categorias econmica, ambiental, social. Os indicadores de

    desempenho social so subdivididos em quatro subcategorias: Prticas

    Trabalhistas, Direitos Humanos, Sociedade e Responsabilidade pelo Produto.

    Estas classificaes so desdobradas em diversos aspectos e para cada

    aspecto so elencados os indicadores propriamente ditos. Para cada indicador

  • 43

    ser indicada a obrigatoriedade ou a faculdade de resposta, por tipo de

    adeso.

    Para a GRI, o Desempenho Econmico tem por objetivo retratar o fluxo

    de capital entre as diversas partes interessadas e os principais impactos

    econmicos da organizao sobre a sociedade. Considera o aspecto financeiro

    fundamental para compreender uma organizao e a sua prpria

    sustentabilidade, contudo esta informao habitualmente disponibilizada nas

    demonstraes financeiras das instituies.

    Na dimenso ambiental so analisados os impactos da organizao

    sobre ecossistemas, terra, ar e gua. Os indicadores abrangem o desempenho

    relacionado a insumos (como material, energia, gua) e a produo (emisses,

    efluentes, resduos), alm dos impactos de seus produtos e servios.

    A dimenso social se refere aos impactos da organizao nos sistemas

    sociais nos quais ela opera. Baseia-se em normas internacionalmente

    reconhecidas, tais como Declarao dos Direitos Humanos, Declarao da

    Organizao Internacional do Trabalho, e outras. Busca tambm informaes

    sobre riscos associados a suborno, corrupo, influncia indevida na

    elaborao de polticas pblicas e prticas de monoplio.

    Os indicadores setoriais so referentes a impactos dos produtos e

    servios disponibilizados pela organizao.

    As diretrizes GRI preveem duas opes para a elaborao dos relatrios

    de sustentabilidade: a Essencial e a Abrangente. As opes no tm relao

    com a qualidade do relatrio ou com o desempenho da organizao. Elas

    refletem a conformidade do relatrio de sustentabilidade da organizao com

    as Diretrizes escolhidas.

    A opo Essencial contm os elementos essenciais de um relatrio de

    sustentabilidade. Nesta opo a organizao relata impactos do seu

    desempenho econmico, ambiental, social e de governana. Na opo

    Abrangente, alm das informaes da opo Essencial so exigidas

    informaes adicionais sobre a estratgia, anlise, governana, tica e

    integridade da organizao. Alm disso, optando por esta modalidade, a

  • 44

    organizao deve comunicar seu desempenho de forma mais ampla, relatando

    todos os indicadores referentes aos aspectos materiais identificados. Ainda,

    para ambas as opes, pode haver contedo padro especfico para o setor de

    atuao da organizao.

    Nas verses 3 e 3.1 o sistema GRI de relatrios contempla trs nveis de

    estrutura: C, B e A, para atender s necessidades de relatores iniciantes,

    intermedirios e avanados. Na verso 4 esta classificao foi descontinuada.

    Enquanto nas verses 3 e 3.1 o relatrio assinalado com um sinal + caso

    seja assegurado por uma entidade externa que no a prpria empresa, na

    verso 4 a indicao de aderncia deve ser atribuda para cada aspecto

    individualmente, caso a organizao opte pela validao de uma entidade

    externa.

    A GRI solicita ao usurio de suas Diretrizes que lhe envie uma

    notificao sobre a publicao do relatrio. A organizao pode tambm

    solicitar GRI que examine seu nvel de aplicao autodeclarado.

    O Ita Unibanco, objeto desta pesquisa, divulgou os relatrios na opo

    abrangente at 2012 e na opo essencial em 2013. Adotou as diretrizes 3.0

    (2009 e 2010) e 3.1 (2011 e 2012), no nvel A+ e as diretrizes 4.0 em 2013.

    1.7. IIRC e Relato Integrado

    Com o objetivo de desenvolver sistemas de relatrios e de tomada de

    deciso capazes de responder aos desafios de sustentabilidade do sculo 219,

    o Prncipe de Gales - His Royal Highness The Prince of Wales - lanou em

    2004 o Projeto do Prncipe de Gales para a Sustentabilidade - The Princes

    Accounting for Sustainability Project (A4S). O projeto A4S trabalha com

    empresas, investidores, governos, a classe contbil, acadmicos e a sociedade

    civil para construir um consenso internacional sobre a necessidade de uma

    9 Estamos lutando para enfrentar desafios do sculo 21 com, na melhor das hipteses,

    sistemas de relatrios e de tomada de deciso do sculo 20. (Prncipe de Gales, apud A4S, 2014).

  • 45

    estrutura integrada de relatrios corporativos que seja aceita de modo geral, e

    tambm para desenvolver diretrizes e ferramentas bsicas para incluir

    sustentabilidade nos processos de tomada de deciso. (CARVALHO; KASSAI,

    2013 p. 11).

    Desenvolver uma sistemtica de pensamento integrado, tendo a

    sustentabilidade como parte integrante da estratgia das empresas, direciona

    as linhas de trabalho do A4S. Muitas empresas apresentam um discurso

    alinhado com esta prtica em seus relatrios de sustentabilidade, porm nem

    sempre o discurso e a prtica so coerentes, sendo possvel verificar nos

    relatrios financeiros passivos exigveis e contingncias no compatveis com

    as aes socioambientais relatadas nos demais relatrios.

    Carvalho (2013 p.60) pondera que vrias razes podem contribuir para

    este desalinhamento entre os relatrios corporativos, destacando como uma

    das principais o mal do silo dentro da empresa, ou seja, estruturas

    departamentais verticalizadas, sem comunicao lateral umas com as outras,

    ficando os diversos relatrios na responsabilidade de departamentos diferentes

    e que no dialogam entre si.

    Em setembro de 2009, considerando a criao de uma estrutura de

    relatrio integrado como essencial para ajudar a transio para uma economia

    sustentvel, o Prncipe de Gales iniciou um movimento internacional visando a

    integrar os relatrios corporativos de forma a estarem alinhados em uma

    mensagem nica e coerente entre si. Este movimento resultou na criao do

    International Integrated Reporting Council (IIRC) - Conselho Internacional de

    Relato Integrado, anunciada em 02 de agosto de 2010 pelo The Princes

    Accounting for Sustainability Project (A4S), em conjunto com o Global

    Reporting Initiative (GRI).

    A misso do IIRC de criar uma estrutura globalmente aceita de

    contabilidade para sustentabilidade. Uma estrutura que rena informaes

    financeiras, ambientais, sociais e de governana em um formato claro, conciso,

    consistente e comparvel em sntese, em um formato integrado. A inteno

    de contribuir com o desenvolvimento de informaes mais abrangentes e

    compreensveis sobre o desempenho total de uma organizao, tanto

  • 46

    prospectiva quanto retrospectivamente, para atender s demandas de um

    modelo econmico emergente e mais sustentvel. (CARVALHO; KASSSAI,

    2013 p.10).

    O IIRC um grupo pluridisciplinar e multinacional e rene

    representantes da sociedade civil, dos setores empresarial, de contabilidade,

    de investimentos em aes, de regulao, ONGs (organizaes no

    governamentais), OIGs (organizaes intergovernamentais) e normatizadores.

    Na primeira reunio oficial do IIRC, realizada em Londres, o Brasil

    estava representado por Nelson Carvalho (FEA/USP), Roberto Pedote (Natura)

    e Maria Helena Santana (na poca presidente da CVM e do Comit Executivo

    da IOSCO International Organization of Securities Commissions).

    (CARVALHO; KASSSAI, 2013 p.10). Atualmente, representam o Brasil no

    conselho: Nelson Carvalho (FEA/USP), Roberto Pedote (Natura), Marco

    Geovanne (PREVI) e Sandra Guerra (IBGC). (IIRC, 2014a).

    No Brasil foi criada uma comisso Comisso Brasileira de

    Acompanhamento do Relato Integrado, coordenada por Vania Borgerth,

    assessora da presidncia do BNDES com objetivo de desenvolver um plano

    de implementao do Relato Integrado no pas. Cinco grupos de trabalho

    atuam nesta comisso: GT1 Exposure Draft, GT2 Comunicao com as partes

    interessadas, GT3 Empresas pilotos, GT4 relao com investidores e GT5

    Road show (CARVALHO; KASSSAI, 2013 p.10).

    A partir de sua fundao, O IIRC organizou diversos trabalhos para a

    preparao da Estrutura (Framework) do Relato Integrado. Estabeleceu um

    Programa Piloto envolvendo uma rede de empresas e uma rede de

    investidores institucionais que ajudam a desenvolver a Estrutura, seja com

    crticas e sugestes, seja testando sua aplicao a suas prprias estratgias,

    processos, e ciclos de gerao de relatrios. Mais de 100 empresas e mais de

    35 investidores institucionais participam do Programa Piloto, representando 26

    pases (situao em junho de 2014). O Programa Piloto deve se estender at

    setembro de 2014, enquanto as empresas testam a verso 1.0 da Estrutura em

    seus ciclos de relatrios. O Brasil est entre os pases com maior nmero de

    empresas participantes do Programa Piloto, (Quadro 1), que so: AES Brasil,

  • 47

    BNDES, BRF S.A., CCR S.A., CPFL Energia, Fbria Celulose S.A., Grupo

    Segurador Banco do Brasil e MAPFRE, Ita Unibanco, Natura, Petrobras, Via

    Gutenberg e Votorantim Industrial. (IIRC 2014b).

    De abril a julho de 2013 o IIRC submeteu a minuta da estrutura

    conceitual do Relato Integrado a uma consulta pblica - The Consultation Draft

    of the International Framework (CD) - que reuniu comentrios e sugestes

    de 359 participantes de diversos pases e que foram analisados para a

    formulao da verso 1.0 da Estrutura do Relato Integrado, lanada em

    Dezembro de 2013. (IIRC, 2014c).

    A Estrutura tem como objetivo estabelecer Princpios Bsicos e

    Elementos de Contedo que guiem o contedo geral de um relato integrado e

    explicar os conceitos fundamentais que os sustentam. Um Relato Integrado

    deve ser elaborado de acordo com a Estrutura. (IR, 2014 p.4).

    Nesta primeira verso (IR, 2014 p.2), o Relato Integrado foi apresentado

    com os objetivos de:

    Quadro 1 Quadro 2

    PasQuantidade de

    empresasPas

    Quantidade de

    investidoresBrasil 12 Reino Unido 8Reino Unido 12 Austrlia 6Holanda 10 Estados Unidos 5Estados Unidos 8 Frana 3Itlia 8 Holanda 3frica do Sul 7 frica do sul 2Espanha 7 Alemanha 2Alemanha 6 Japo 2Austrlia 5 Unio Europia 1Japo 4 Noruega 1Russia 4 Singapura 1Canad 3 Sucia 1Frana 3 Suia 1ndia 2 Baseado em IIRC 2014b Singapura 2Turquia 2Blgica 1Chile 1China 1Coria do Sul 1Dinamarca 1Nova Zelndia 1Paquisto 1Sri Lanka 1Sucia 1Suia 1

    Baseado em IIRC 2014b

    Distribuio de Empresas participantes no

    Programa Piloto, por Pas de Origem

    Distribuio de Investidores participantes

    no Programa Piloto, por Pas de Origem

  • 48

    melhorar a qualidade da informao disponvel a provedores de

    capital financeiro, permitindo uma alocao de capital mais eficiente

    e produtiva;

    promover uma abordagem mais coesa e eficiente do relato

    corporativo, que aproveite as diversas vertentes de relato e

    comunique a gama completa de fatores que afetam, de forma

    material, a capacidade de uma organizao de gerar valor ao longo

    do tempo;

    melhorar a responsabilidade pela gesto da base abrangente de

    capitais (financeiro, manufaturado, intelectual, humano, social e de

    relacionamento e natural) e fomentar o entendimento de suas

    interdependncias;

    apoiar a integrao do pensamento, da tomada de deciso e das

    aes que focam na gerao de valor no curto, mdio e longo prazos

    (IR, 2014 p.2).

    O Relato Integrado um processo de pensar e gerir a empresa de forma

    integrada, que resulta na comunicao um relatrio integrado peridico -

    sobre os fatores que afetam sua capacidade de gerar valor ao longo do tempo.

    Importante frisar que no se trata de mais um relatrio corporativo:

    os que existiam podem e devem continuar existindo, a critrio de

    cada empresa. Trata-se, de fato, de que os vrios relatrios que

    porventura existam sejam integrados numa mensagem coerente e

    coesa entre si, apontando as causas de sucessos e insucessos do

    passado nas dimenses que ajudam a criar ou destruir valor, e como

    os administradores pretendem no futuro preservar e expandir os

    fatores crticos de sucesso e evitar ou mitigar os fatores crticos de

    insucesso. (CARVALHO, 2013, P. 61).

    No decorrer deste trabalho ser designado por Relato Integrado ou

    o processo de gerao da comunicao integrada da empresa, incluindo o

    relatrio peridico que pode ser gerado neste processo.

    O objetivo principal do Relato Integrado explicar aos provedores de

    capital financeiro como a organizao gera valor ao longo do tempo; beneficia

    tambm a todos os interessados na informao, incluindo empregados,

    clientes, fornecedores, parceiros comerciais, comunidades locais, legisladores,

    reguladores e formuladores de polticas. (IR, 2014, p.4).

  • 49

    Os conceitos fundamentais do Relato Integrado so representados pela

    gerao de valor ao longo do tempo, pelo modelo de negcios da organizao

    e pelos capitais que a organizao utiliza e afeta.

    Valor no gerado apenas pela empresa ou dentro dela. Ele

    influenciado pelo ambiente externo, criado por meio das relaes com as

    partes interessadas e depende de recursos. (IR, 2014, p10).

    Os recursos e as relaes usados e afetados pela organizao so

    denominados na Estrutura do de capitais; so considerados estoques de

    valor dos quais as organizaes dependem para seu sucesso. Servem como

    insumos de seu modelo de negcios e aumentam, diminuem ou se

    transformam devido s atividades empresariais e produtos da organizao. Na

    Estrutura do Relato Integrado os capitais propostos so classificados em

    financeiro, manufaturado, intelectual, humano, social e de relacionamento, e

    natural. As organizaes no so obrigadas a adotar esta classificao em

    seus Relatos Integrados, tampouco estrutur-los conforme os tipos de capital.

    Os capitais so sugeridos como diretriz para assegurar que as organizaes

    levem em conta todas as formas de capital utilizadas ou afetadas por elas. (IR,

    2014, p. 4; 10; 12; 33).

    Na Estrutura do Relato Integrado, os seis capitais so descritos como:

    capital financeiro - conjunto de recursos que est disponvel

    organizao para ser utilizado na produo de bens ou servios e

    que so obtidos por financiamentos (dvidas, aes,

    subvenes), ou gerado por meio de investimentos;

    capital manufaturado - objetos fsicos manufaturados disponveis

    organizao para uso na produo de bens ou servios,

    incluindo prdios, equipamentos, infraestrutura (tais como

    estradas, portos, pontes e plantas para o tratamento de esgoto e

    gua);

    capital intelectual - intangveis organizacionais baseados em

    conhecimento, sendo propriedades intelectuais, tais como

    patentes, direitos autorais, software, diretos e licenas, ou capital

  • 50

    organizacional, tais como conhecimentos tcitos, sistemas,

    procedimentos e protocolos;

    capital humano - competncias, habilidades e experincias das

    pessoas e suas motivaes para inovar, incluindo seu

    alinhamento e apoio estrutura de governana, ao

    gerenciamento de riscos e aos valores ticos, suas capacidades

    de entender, desenvolver e implementar a estratgia de u