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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP MARIA DE FÁTIMA PATU DA SILVA TRANSPLANTAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA: COMO É VISTA POR DOADORES E DOENTES EM LISBOA E NO RECIFE DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS SÃO PAULO 2013

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

MARIA DE FÁTIMA PATU DA SILVA

TRANSPLANTAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA: COMO É VISTA POR DOADORES E

DOENTES EM LISBOA E NO RECIFE

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

SÃO PAULO

2013

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MARIA DE FÁTIMA PATU DA SILVA

Tese apresentada à Banca examinadora

da Pontifícia Universidade Católica de

São Paulo, como exigência parcial para

obtenção do título de Doutor em Ciências

Sociais, sob a orientação da Profª Dra.

Maria Helena Villas Boas Côncone e

Coorientação da Profª Dra. Manuela

Hasse.

Área de concentração: antropologia

SÃO PAULO

2013

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MARIA DE FÁTIMA PATU DA SILVA

TRANSPLANTAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA:COMO É VISTA POR DOADORES E

DOENTES EM LISBOA E NO RECIFE

APROVADA EM: _______________

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________ Maria Helena Villas Bôas Concone (Orientadora)

Doutora em Ciências Sociais - PUC/SP

_____________________________________ Josildethe Gomes Consorte

Doutora em Ciências Sociais - PUC/SP

____________________________________ Paula Loureiro

Doutora em Saúde Pública - UPE

__________________________________ Mª Manuela Vasconcelos Hasse de Almeida e Silva

Doutora em Ciências da Motricidade Universidade Técnica de Lisboa

_________________________________

Acácio Sidinei Almeida Santos Doutor em Sociologia – PUC/SP

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DEDICATÓRIA

À minha mãe que já não está mais aqui, de quem recebi a energia e o desejo de

construir, por ter fornecido a base de tudo: a educação. Sem ela, não teria chegado

até aqui.

E à Maria Luíza Oliveira Patu, como gosta de ser chamada minha neta, a minha

razão de querer sempre continuar viva. Amo-te.

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AGRADECIMENTOS

Foi uma longa caminhada. Desde a entrada no doutorado em 2009, foram 4 anos

em que não faltaram espinhos, pedras. Mais que tudo foram anos de estudo e de

muito aprendizado. Como não poderia deixar de ser, tudo isso não seria possível

sem o apoio, a amizade, a força e a alegria que me deram ao longo desse percurso.

Iniciarei os agradecimentos começando por ordem cronológica dos acontecimentos.

Inicio por uma força chamada Deus, sem essa fé, força, credibilidade, nada teria

acontecido. Aqui a mais profunda reverência por ter aprendido que as coisas que

realmente se investem de valor são movidas muito menos pela força de vontade,

mas principalmente com a conexão que se estabelece com a alma.

Aos meus filhos, Thaís, Tiago e Tatiana pelo apoio incondicional, sem eles não teria

ultrapassado as dificuldades vivenciadas durante o percurso dessa tese. Obrigada

por vocês existirem na minha vida.

À Bezerra ex-companheiro, por ter possibilitado ser mãe desses três filhos

maravilhosos que a vida nos concedeu e ter contribuído para o meu crescimento

intelectual, quanto ao custeio das viagens que precisei fazer entre Recife/São Paulo.

Às minhas irmãs Neide e Ivany que sempre estiveram presentes na minha vida

pessoal e profissional.

Aos meus genros e nora Erinaldo, Rangel e Gê, obrigada por se agregarem à minha

família e terem dividido comigo esse momento importante.

E Rafa, Joice e Nathalia sobrinhos queridos, não podia esquecer.

À minha orientadora, a Professora Dra. Maria Helena Villas Boas Concone, desde o

ínicio da nossa conversa quando da minha visita à PUC sobre a possibilidade de

aceitação e seleção no doutorado, por ter acreditado no meu potencial, assim como

na tese, e ter me estimulado a não desistir mesmo nos momentos mais difíceis.

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Aos professores com quem tanto aprendi na PUC-SP, Terezinha Bernardo, Edgar

Carvalho, Margarida Limenha, Leila Blass e Josildete, pelo compartilhamento dos

seus conhecimentos. E compreender que a Universidade é um espaço de dissenso

e não consenso.

Às amizades que nasceram em meio a este percurso, construídas com uma

dimensão que tiveram uma inserção pessoal em mim. Benedito Carlos, Carla,

Idalina, Eduardo, Leandro, Jonas, Maria José, Regimeire e Isaac Vitório.

À professora Dra. Manuela Hasse minha coorientadora pelo apoio, presença e

acolhimento das angústias pessoais e ansiedade durante o período, não somente

quando estive em Lisboa para o estágio sanduíche, junto à prestigiosa Universidade

Técnica de Lisboa, mas durante todo o processo de construção desse trabalho.

À CAPES que contribuiu tanto para realização do Curso por um período de 2 anos,

quanto para o (Estágio Sanduíche-PDEE) no exterior, oportunidade única, junto à

Universidade Técnica de Lisboa, na Faculdade de Motricidade Humana.

A Luiza Conceição, ao Professor Dr. Manuel Abecasis, Diretor do CTMO do Instituto

Português de Oncologia pelo acolhimento, ao colocar sua equipe à disposição da

investigação.

À Mônica Conceição secretária de Dr. Manuel Abecasis, sempre à disposição do

estudo.

Ao Professor Dr. Helder Trindade, diretor do CEDACE por contribuir com a

investigação.

À Fundação Hemope, na pessoa do Diretor-Presidente Dr. Divaldo de Almeida

Sampaio, quanto à minha liberação para o desenvolvimento do estudo.

À Dra. Paula Loureiro, que sempre compartilhou comigo as minhas angústias

pessoais e profissionais durante esse percurso.

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À Coordenação de Ensino e Pesquisa, pela compreensão quanto a minha liberação,

no sentido de estimular a capacitação dos servidores.

Ao Dr. Raul Melo, por ter incentivado minha participação na implantação do projeto

Redome na Fundação Hemope.

Aos amigos queridos, que são tantos e inestimáveis, alguns recentes outros de

longa data, exemplos de solidariedade, por terem acompanhado nessa jornada,

dividindo comigo as alegrias e tristezas: Etelvina, Sueli, Alessandra Ximenes, Ana

Vieira, Carminha, Vírginia, Eliene, Josiete, Pollyanna, Adriana, Livramento, Heloísa,

Regina, Fred, Rivaldo, Leomar, Jorge Venâncio, Ana Patrícia, Valda e Fernando

Sabino.

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EPÍGRAFE

Sonhos

Os nossos sonhos são os nossos desejos mais profundos, são aqueles que nascem de dentro pra fora, “do interior do nosso interior”. Estamos aqui neste planeta, vivendo esta vida, com nosso corpo, nossas habilidades, dons, nossa inteligência e nossa capacidade transformadora. Tudo isso pra quê? Seria realmente para apenas podermos trabalhar para conseguir dinheiro para manter os nossos e nós mesmos? E os dias estão passando… De que nos vale passar por aqui e não realizarmos as coisas que mais profundamente desejamos? Para onde estamos indo? Quais são, então, os seus sonhos, seus desejos mais profundos? Resgate-os e nunca desista deles.

Nado Rodrigues, 2012

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RESUMO Este trabalho é uma pesquisa de doutorado em Ciências Sociais e tem como objeto de estudo o doador de medula óssea/transplante. Este pode ser analisado, pelo menos, por duas áreas do conhecimento: antropologia e medicina. Tomamos a noção de dádiva como conceito fundante da nossa reflexão. Para isso, convém lembrar que a medula óssea enquanto objeto doado para o transplante carrega além da constituição genética e sua capacidade fisiológica, o poder e a força de reviver o receptor. Nas últimas décadas, o transplante de órgãos tem atraído opiniões de setores diversificados da sociedade brasileira, a mídia, por sua vez, vem cumprindo importante papel na ampla divulgação ao democratizar as informações a discussões, algumas vezes acaloradas e contraditórias, assim como esclarece ou suscita dúvidas e receio nas pessoas. É, portanto, um tema de muita relevância social e como tal, tem sido tratado tanto pela sociedade, receptiva aos apelos da solidariedade na doação de órgãos, como pela saúde pública, por se tratar de um procedimento de alta complexidade e elevado custo, exigindo medidas de planejamento de políticas públicas e alocação de recursos, critérios éticos e democráticos. Este estudo objetiva descrever o perfil dos receptores de medula óssea em Recife e Lisboa. Foi realizada uma análise retrospectiva no período de 2002 a 2010. No período analisado, 134 pacientes realizaram transplante com doadores não aparentados destes, 107 em Lisboa e 26 em Recife. Os pacientes transplantados em Lisboa (51,4%) são do sexo feminino, enquanto em Recife (69,2%) pertence ao sexo masculino. Estão na faixa etária de 0 a 17 anos em Portugal (54,2%) e Recife (50 %) com diagnóstico prevalente de Anemia Aplástica. No entanto, em Lisboa prevaleceu o diagnóstico de Leucemia Mieloide Aguda. O estudo chama a atenção para o fato de que Lisboa realizou mais transplantes na faixa etária de 30 a 39 anos (18,7%), diferente de Recife (11,5%) na mesma faixa etária. Em relação à faixa etária de 18 a 29 anos, apresentou um percentual de (15,9%). A pesquisa mostrou a leucemia mieloide aguda como a doença mais prevalente em Lisboa. É um dado que corrobora com a literatura, por afetar indivíduos de todas as idades, principalmente os que estão na fase adulta. Nesse estudo está na faixa etária acima de 50 anos em Lisboa (6,5%) e Recife (3,8%). Ressaltamos que, no período da coleta de dados, Recife tinha uma população de 1.537.704 e Lisboa 2.821.699 pessoas. Apesar de Recife possuir outras unidades, apenas o centro onde foi realizada a pTesquisa estava fazendo este tipo de transplante. Palavras Chaves: Doação de medula óssea. Transplante. Dádiva. Ciências Sociais.

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ABSTRACT

This work is a doctoral research in Social Sciences and whose object of study has been the bone marrow donor/transplantation. This can be analyzed at least by two areas of knowledge: Anthropology and Medicine. We take the notion of gift as a founding concept of our reflection. Thus, we should remember the bone marrow as an object donated for transplantation that carries beyond the genetic and physiological capacity, power and strength to revive the receiver. In recent decade, organ transplantation has attracted reviews from various sectors of the Brazilian society, the media, on the other hand, has been playing an important role in the broad disclosure information by democratizing the discussions, sometimes heated and contradictory, and clarifies or raises doubts and fear in people. It is therefore a matter of great social relevance and as such has been treated well by society; it has been receptive to the calls of solidarity in organ donation as public health, because it is a procedure of high complexity and high cost, requiring measures of public policy planning and resource allocation, democratic and ethical criteria. This study aims to describe the profile of recipients of bone marrow in Recife and Lisbon. We performed a retrospective analysis from 2002 to 2010. Over this period, 134 patients underwent transplantation with unrelated donors of these, 107 in Lisbon and 26 in Recife. Patients transplanted in Lisbon (51.4 %) are female; while in Recife (69.2 %) are male. Are in the age group 0-17 years in Portugal (54.2 %) and Recife (50 %) diagnosed with Aplastic Anemia prevalent. However, in Lisbon prevailed diagnosis of Acute Myeloid Leukemia. The study draws attention to the fact that Lisbon performed more transplants in the age group of 30-39 years old (18.7%), different from Recife (11.5%) in the same age group. In terms of age group 18-29 years old showed a percentage of (15.9 %). Research has shown acute myeloid leukemia as the most prevalent disease in Lisbon. It is a fact that confirms the literature, to affect individuals of all ages, especially those in adulthood. This study is in the age group above 50 years old in Lisbon (6.5%) and Recife (3.8 %). We emphasize that in the period of data collection, Recife had a population of 1,537,704 and 2,821,699 people Lisbon. Although Recife has other units, only the center where the research was conducted was doing this type of transplant.

Key Words: Bone marrow donation. Transplant. Gift. Social Sciences.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

ILUSTRAÇÃO 1 - Mapa da Hemorrede de Pernambuco 34

ILUSTRAÇÃO 2 – Número de transplantes realizados no Brasil em 2012 56

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - Localização da medula óssea e sua produção celular 70

FIGURA 2 - Medula óssea e sua diferenciação celular. 70

FIGURA 3 - Coleta da Medula Óssea por aspiração 79

FIGURA 4 - Coleta da Medula Óssea por Aférese 80

FIGURA 5 - Cordão Umbilical 80

FIGURA 6 - Esquema do Sistema HLA. 81

FIGURA 7 - Convocação dos potenciais doadores para a palestra 91

FIGURA 8 - Palestra sobre doação de medula óssea 92

FIGURA 9 - Coleta de sangue periférico para exame HLA. 92

FIGURA 10 - Coleta de medula óssea por aspiração em centro

transplantador 96

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1- distribuição dos doadores segundo o sexo 98Tabela 2 -distribuição dos doadores segundo a idade no período de 2002 a

2010 99Tabela 3 - distribuição dos doadores segundo a escolaridade no período de

2002 a 2010 100

Tabela 4- distribuição dos doadores segundo estado civil 101

Tabela 5 - distribuição dos doadores de lisboa segundo situação profissional 101

Tabela 6 - distribuição dos doadores de lisboa segundo faixa salarial 102Tabela 7 - distribuição dos doadores segundo religião 102

Tabela 8 – distribuição dos doadores segundo motivação 104

Tabela 9 - distribuição dos doadores segundo prática religiosa 105Tabela 10 - distribuição dos doadores segundo expectativa quanto ao

transplantado 105

Tabela 11 - distribuição dos doadores segundo alterações pós doação 106Tabela 12 - distribuição dos doadores segundo doação medula óssea x

doação de sangue 107Tabela 13 - distribuição dos doadores segundo recompensa 107

Tabela 14- distribuição dos receptores segundo o sexo 108

Tabela 15- distribuição dos receptores sugundo idade 108

Tabela 16 – distribuição dos receptores quanto a naturalidade 108Tabela 17- distribuição dos doadores segundo a escolaridade no periodo 108 De 2002 a 2010 Tabela 18 - distribuição dos recptores segundo estado civil 109Tabela 19 - distribuição dos receptores segundo religião 109

Tabela 20- distribuição dos receptores frequência religiosa 109Tabela 21- distribuição dos receptores quanto ao tipo de coleta 110

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 1 - Distribuição da população de doadores estudada através do questionário 78

GRÁFICO 2 - Distribuição dos doadores quanto à faixa etária 78

GRÁFICO 3 - Distribuição dos doadores quanto à religião 78

GRÁFICO 4 - Distribuição dos receptores por sexo/ Portugal 119

GRÁFICO 5 - Distribuição dos receptores por sexo/ Recife 119

GRÁFICO 6 - Distribuição dos receptores por faixa etária/ Portugal 119

GRÁFICO 7 - Distribuição dos receptores por faixa etária/ Recife 119

GRÁFICO 8 - Distribuição dos receptores por diagnóstico/Portugal 119

GRÁFICO 9 - Distribuição dos receptores por diagnóstico/ Recife 119

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas

ABTO Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos

CEMO Centro de Transplante de Medula Óssea

CFM Conselho Federal de Medicina

CNCDO

Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de

Órgãos

CNT Central Nacional de Transplante

CPH Complexo Principal de Histocompatibilidade

CT Células-Tronco

DECH Doença do Enxerto contra o Hospedeiro

HLA Antígeno Leucocitário Humano

INCA Instituto Nacional do Câncer

ME Morte Encefálica

MEC Ministério da Educação e Cultura

ONG´s Organizações Não Governamentais

OPOs Organização de Procura de Órgãos

OPTN Organização Nacional de Procura de Órgãos

QSR

NUD*IST

Non-numeric Unstructured Data, Index Searching and

Theorizing

REDOME Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea

REREME Registro Nacional de Receptores de Medula Óssea

SCU Sangue de Cordão Umbilical

SNT Sistema Nacional de Transplantes

SOS Síndrome de Obstrução Sinucoidal

SUS Sistema Único de Saúde

TCTH Transplante de Células-Tronco Hematopoiéticas

TMO Transplante de Medula Óssea

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SUMÁRIO

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1. INTRODUÇÃO

1.1 A Construção do Objeto de Investigação

O estudo das relações entre medicina e sociedade como objeto das Ciências

Sociais já é frequente no Brasil. Se lembrarmos de que alguns dos primeiros

antropólogos em nosso país, no início do século passado, tinham formação em

Medicina (para citar apenas dois dos mais conhecidos: Raimundo Nina Rodrigues e

Arthur Ramos lidaram a partir dos instrumentos teórico-metodológicos que foram

buscar em diferentes momentos nos estudiosos franceses, alemães ou norte-

americanos, pode-se ver que o interesse não é recente, mesmo que muitas das

suas ideias possam ser hoje questionadas. Saltando para as últimas décadas do

século XX podemos ler no livro de Ana Maria Canesqui, publicado em 2007, quando

a autora mapeando as atividades de investigação e ensino das Ciências Sociais no

campo da saúde no Brasil, considera (para as últimas três décadas, portanto de

meados dos anos 1970 até a data do trabalho):

Não se pode negar, contudo, a visibilidade e o maior amadurecimento conquistado durantes estas três últimas décadas pelas ciências sociais no âmbito da Saúde Coletiva, onde mais fortemente se institucionalizaram, embora reste a ampliação de suas interlocuções mais extensivas com outros campos da biomedicina como os saberes e práticas psicológicas e psiquiátricas, outras áreas biomédicas, tanto quanto a sua inclusão mais incisiva na formação de outros profissionais de saúde. Da mesma forma pode-se ainda vislumbrar variadas possibilidades na ampliação e aprofundamento temático […] tanto quanto na consolidação de subcampos disciplinares, cujo processo de especialização é visível e não particular às ciências sociais e saúde, incidindo também sobre as ciências sociais em geral, como noutros campos de conhecimento (CANESQUI, 2007, p. 103-104).

A Sociologia, a Antropologia e outras áreas afins como a Psicologia,

apresentam autores importantes que se ocuparam daquela relação entre a Medicina

e a sociedade, que discutiram o corpo, a morte, a doença se debruçaram sobre

formas que hoje chamaríamos de etno-medicina, como Talcott Parsons (1984),

Erving Goffman, Howard Becker, Evans-Pritchard, Marcel Mauss (1950), entre

outros. Na Sociologia, as décadas de 1950 e 1960 são decisivas para a afirmação

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do campo das relações entre Medicina e sociedade. Antes mesmo dessas décadas,

entretanto, podemos destacar as contribuições de Marcel Mauss (autor que se

insere num campo comum entre a sociologia e a antropologia) na produção de

reflexões para a compreensão da dimensão simbólica na doença e na cura. Mauss,

inspirado por seus próprios estudos etnográficos sobre sociedades tradicionais,

escreve em 1926 (MAUSS, 1999) o ensaio Efeito Físico no Indivíduo da Ideia de

Morte, pode ser também verificada nas sociedades modernas que o não-respeito às

regras sociais pode conduzir o indivíduo à morte.

Vários autores contribuíram para mostrar as relações entre saúde/doença e

sociedade ao destacarem que a doença e a saúde não são problemas apenas de

ordem orgânica ou fisiológica, mas que dependem principalmente do contexto social;

mostraram também que o enfrentamento da doença não se faz apenas pela ciência,

mas também por outros recursos existentes na sociedade (MAUSS,1999).

Apresentar o cenário que envolve um conjunto de atores sociais importa não

apenas para nos situarmos no tempo e no espaço, mas representa também o

detalhamento dos elementos que se entrelaçam, que compõem e que condicionam

as ações desses atores e que as tornam mais compreensíveis. Nesse contexto, os

estudos sócio-antropológicos em geral, e a sociologia da saúde em particular, têm

sido pressionados a se confrontarem com novos dilemas teóricos e práticos.1 Como

afirmam Berger; Luckmann (2005), os processos de modernização, pluralização e

secularização têm produzido uma crise de sentido, que afeta diretamente as

instituições, como por exemplo, as unidades de saúde, que fornecem os padrões de

experiência para os indivíduos, bem como a coesão intersubjetiva. As formas

tradicionais de socialização dos comportamentos esperados, dos saberes e das

práticas no âmbito de instituições específicas como a família, a escola e o Estado,

vão sendo suplementadas, alteradas, quando não, substituídas.

Aproximando-nos mais diretamente do nosso tema de investigação, o primeiro

ponto a ser considerado e que está relacionado diretamente à questão da

modernização, pluralização e secularização e seu rebatimento sobre as instituições

sociais, é que vivemos rápidas e profundas mudanças nas concepções de saúde

(concepções que afetam hábitos estabelecidos – por exemplo, o consumo de sal ou

de açúcar, de álcool ou de tabaco, entre outros), além de ampliação no

1 Colocam-se, portanto, novas questões aos conceitos herdados das tradições clássicas da Sociologia (DURKHEIM, 1978).

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conhecimento biomédico – que de fato já devemos dizer biogenético e médico – e

nas suas aplicações técnicas. Novas técnicas médicas, laboratoriais e outras,

mudam os marcadores de saúde (por exemplo: diabetes, pressão arterial, colesterol

etc.) mudando a visão, ou o enfoque do profissional e também dos leigos.

Finalmente, podemos apontar as técnicas de correções cirúrgicas ou especialmente

de transplantes sempre em contínuo aperfeiçoamento ou mudança e em associação

com o desenvolvimento de novos medicamentos. Tudo isso parece repor as antigas

representações da superação da morte (ou do envelhecimento), no caso pelo

aprimoramento técnico. Inegavelmente as concepções de saúde e doença não são

as mesmas de poucos anos atrás e nem são as mesmas as noções de prevenção e

promoção da saúde.

De acordo com Canesqui (2001), no Brasil, a promoção da saúde, não se

restringe à mera formulação de políticas saudáveis, paralelas à construção do

Sistema Único de Saúde, mas serve de referência para reforçar a saúde como bem

público. No âmbito das intervenções específicas de saúde, requer a ampliação e

renovação dos modelos de atenção, cuidado, prevenção/reabilitação, cuja

implementação geralmente está circunscrita à assistência médica com baixa

qualidade da atenção.

Destaca-se ainda que a promoção da saúde é uma necessidade sentida nos

programas de desenvolvimento tanto pelo Ministério da Saúde como por outras

organizações governamentais preocupadas como o setor saúde. Para Paulo Buss

(2002), a promoção à saúde é a reafirmação da saúde como direito humano

fundamental; que as desigualdades são inaceitáveis; que os governos têm

responsabilidade pela saúde dos cidadãos e a população tem o direito de participar

das decisões no campo da saúde.

Desta forma a discussão do tema que propusemos se encontra no cruzamento

entre questões médicas e socioculturais, estabelecendo necessariamente o diálogo

entre ciências sociais e medicina. No caso das doações e das recepções de medula

óssea, podemos dizer que cabe à medicina, entre outras questões, estudar os

aspectos mais relacionados com as questões ligadas à aceitação ou rejeição do

enxerto, assim como com a viabilidade clínica pré e pós-transplante. Ao cientista

social mergulhado nessa área caberia, pelo menos, estudar a doação ou o doador

contextualizando-o social e culturalmente utilizando-se de algumas categorias como

sexo, idade, religião, relação com o problema específico ou outros fatores

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motivacionais, religiosidade, solidariedade, generosidade, reciprocidade, autoestima

entre outros.

1.2 Premissas Fundamentais do Estudo

Ao se propor uma discussão do tema doação de medula óssea a partir da

dádiva, é importante ter-se claro que está se penetrando em uma dimensão humana

que apresenta um carater abrangente. Por trazer em si a possibilidade de inclusão

da dicotomia, do ser, ou seja, a inclusão das contradições humanas, sugerindo uma

ponte entre os individuos como afirma Caillé(2002) […]o dom é por natureza aquilo

que permite superar a antítese entre eu e o outro, entre a obrigação e liberdade,

entre a parte do herdado e a parte do legado a receber[…].Sob essa perspectiva, o

dom (Caillé,2002) ou a dádiva ganha dimensão, a condição do processo de

aproximação, de estreitamento das relações sociais.

O primeiro pressuposto é que a doação de medula óssea mobilizaria o conceito

existente sobre doador por parte não só do receptor, como também da família e da

comunidade na qual ele está inserido. O segundo pressuposto é que ao fazer a

doação, o doador passaria a ocupar uma posição diferenciada, de prestígio, perante

sua comunidade e sua família, de fato a posição diferenciada do doador, o

acréscimo de prestígio, reflete-se no seu grupo primário.

O Brasil tem um programa de transplantes bem consolidado.Com mais de 190

milhões de habitantes. O número de transplantes com doador vivo vem decrescendo

quase que em todos os estados brasileiros, compensado pelo crescimento do

transplante com doador falecido. Muitos profissionais de saúde merecem o

reconhecimento pelo sucesso desse programa: desde o profissional que faz a

notificação do potencial doador, até os profissionais que fazem o acompanhamento

ambulatorial após o transplante. No que se refere ao transplante de medula óssea,

1753 pessoas realizaram transplante em 2012 e Pernambuco contribuiu com 162

transplantes (RBT, 2012).

Estamos ainda, pressupondo a relação entre doação e sacrifício: o doador

colocando-se na posição de possibilitar “salvar uma vida” esperaria algum tipo de

retorno, especialmente porque a doação pressupõe sacrifício. A representação

social do sacrifício do doador é bastante forte dado que o ato de doar pode ou não

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estar vinculado a uma relação diretamente afetiva. Neste caso, a doação estaria

baseada no dom entre desconhecidos, não havendo em princípio um vínculo

primário entre doador e o receptor. Claro está que há uma tendência dessa relação

tornar-se familiar, fazendo com que os agentes envolvidos sintam-se o menos

estranho possível. A noção do sacrifício, entretanto, persiste qualquer que seja a

situação embora um maior privilégio seja atribuído aos sujeitos que se candidataram

voluntariamente à doação. Consideramos ainda que esse tipo de dádiva venha

acompanhada do sentido característico da “dádiva de si”: o indivíduo sente-se

obrigado a dar de si para que sua ação tenha sentido.

Assim, acreditamos que a perspectiva escolhida de acessar os discursos sobre

doação de medula óssea permitirá compreender alguns aspectos antropológicos aí

envolvidos: as percepções e motivações correlatas aos motivos que impulsionam o

dom.

O envolvimento dos indivíduos, os laços de amizade, familiaridade, vizinhança

enquanto doadores de medula matizam o cenário com características importantes

quanto ao alcance da ação vai depender da percepção e interpretação concebidas

pela população inserida no contexto social. O afeto circula nesses espaços, da

mesma maneira que a necessidade de criação de mecanismos institucionais que

façam com que a ação se amplie para além dos limites institucionais. Assim, para

que o ato seja realizado, passa por uma decisão individual, porém exige uma

participação coletiva. O olhar para o interior dessas pessoas que se estruturam em

torno de regras de sociabilidade referidas ao circuito da dádiva (MAUSS, 1960;

1999). Entretanto, ao enfatizar o tema da solidariedade para com o outro – o que é

assistido – procurei o discurso que fundamenta as relações que institucionalizam o

grupo.

Portanto nas últimas décadas, o transplante de órgãos tem atraído opiniões de

setores diversificados da sociedade brasileira, e ainda a mídia vem cumprindo

importante papel na ampla divulgação, encarregando-se de democratizar as

discussões e informações, algumas vezes acaloradas e contraditórias, outras

esclarecendo ou suscitando dúvidas e receio nas pessoas. É, portanto, um tema de

muita relevância social e como tal tem sido tratado tanto pela sociedade, receptiva

aos apelos da solidariedade na doação de órgãos como pela saúde pública, por

tratar-se de um procedimento de alta complexidade e alto custo, exigindo medidas

de planejamento de políticas públicas e alocação de recursos, critérios éticos e

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democráticos. Todas essas políticas têm como objetivo a manutenção e defesa da

vida.

A antropologia pode contribuir para a disussão do contexto altamente

tecnológico da medicina contemporânea e evidentemente dos transplantes. A

problematização das ações técnicas só pode acontecer a partir de um olhar crítico

que as Ciências Sociais, e antropologia podem fornecer. Por essa razão, assume-se

a doação voluntária de medula óssea na perspectiva teórica de Marcel Mauss

(1974), como referência central na construção desse trabalho. Ela permite equilibrar

os diversos motivos que configuram a existência humana. Através de uma formação

assim compreendida, diz Mauss no final do seu Ensaio sobre a Dádiva, é possível

analisar o comportamento humano total, vislumbrando nesse estudo os fundamentos

da própria sociedade e da vida em comum.

Admite-se que o reconhecimento de uma cultura da dádiva resinificará a

construção dos laços sociais que constituem a esfera pública. O sistema teórico da

dádiva possibilita ultrapassar os dilemas das teorias democráticas modernas. Essas

abordagens têm enfrentado uma dificuldade de articular as questões da justiça com

os princípios da solidariedade social (DOMINGUES, 2002 apud SIMÕES, 2005).

Os interesses sociais, surgidos no contexto da modernidade científica, tendem

a definir o sistema social como um todo, coincide com o interesse pela manutenção

do próprio sistema, privatizando o espaço das ações sociais. Quando se trata de um

campo avançado do conhecimento científico (como é o caso da medicina)

apresentando possibilidades técnicas que frequentemente se chocam contra os

modos de compreensão e valorização da vida humana, os indivíduos podem ser

simplesmente instrumentalizados em benefício de interesses privados que, agindo

segundo uma lógica que lhes escapa inteiramente à compreensão, tendem a

colonizar o sistema social como um todo (KAUFMAM, 2003).

1.3 A Questão Central do Estudo

O nosso projeto integra então o campo dos estudos das Ciências Sociais no

âmbito da saúde partindo de uma indagação principal: Quais as razões e

motivações para a decisão de doar medula óssea?

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1.4 Inquietações Sobre o tema

A nossa própria motivação para propor esta investigação veio do nosso

envolvimento profissional na Fundação Hemope, em Pernambuco (Brasil), que nos

abriu todo um espaço de conhecimento relacionado aos casos de doenças que têm

indicação para transplante, como é o caso específico da leucemia para a qual existe

a indicação de transplante de medula óssea. No Brasil, o número de transplantes de

medula óssea tem aumentado significativamente nas últimas décadas, sendo

atualmente realizados em unidades de saúde na maioria das capitais brasileiras. Em

diversas situações clínicas não se consegue o doador aparentado para a realização

do Transplante de Medula Óssea (TMO), sendo necessário recorrer aos bancos de

medula.

O emprego da prática médica do tranplante tem aumentado significativamente

nas últimas décadas.Dentre os diversos órgãos transplantaveis (coração, fígado,

pele, rim, córnea, pâncreas e medula óssea com boas respostas, possibilitando uma

razoável sobrevida para o receptor.

No entanto, cabe à medicina estudar os aspectos mais relacionados do ponto

de vista da aceitação ou rejeição do enxerto, assim como das suas viabilidades

clínicas pré e pós-transplante, entre outras questões. As ciências sociais devem

estudar o doador no sentido de contextualizá-lo na sociedade na qual está inserida,

segundo algumas categorias estabelecidas como sexo, idade, religiosidade, fatores

motivacionais, solidariedade entre outras. Por outro lado, o número de casos novos

de doenças que precisam de transplantes cresce a cada dia. Citamos como

exemplo, as doenças que têm indicação para transplante como a leucemia.

No Brasil a chance de encontrar um doador compatível entre familiares é uma

em 100 e de uma em 100 mil entre os doadores não aparentados, ou seja, os

doadores voluntários. Segundo o REREME2 existem atualmente 3000 pacientes nas

listas de espera aguardando aquele tipo de transplante e cerca de dois milhões de

pessoas cadastradas isto é, doadores potenciais (BRASIL, 2012).

Considera-se possível o aumento do número de casos de transplantes

aumentando a necessidade de doadores, parentes ou não. Além disso, muitos

candidatos não se tornam efetivamente doadores. Os serviços de hematologia têm

encontrado dificuldades para realizar transplantes com doadores aparentados para

2 Registro Nacional de Receptores de Medula Óssea. Ministério da Saúde, 2012.

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atender a demanda. Em todas as sociedades onde o transplante é realizado,

existem leis já definidas ou que podem estar em fase de regulamentação. Este é um

procedimento terapêutico, onde as normas que o regulamentam, não só no Brasil,

como na maioria dos países, ainda podem encontrar-se em fase de ajustamentos

para que possam atender a sociedade como um todo e não apenas os potenciais

receptores. Aparententemente há número muito superior de doadores potenciais

para o número de pessoas que necessitam de transplante. Essa diferença é

enganosa, porque de fato há enorme possibilidade de incompatibilidade.

No cenário do transplante participam vários personagens e dentre eles e de

maneira mais ativa, pelo dois especificamente, se interrelacionam de modo mais

íntimo. Cada um deles, e as relações entre eles, mereceriam um olhar e um pensar

antropólogico.

Este estudo visou compreender alguns aspectos antropológicos dos dois

personagens: o doador e receptor , e nele houve a preocupação de tentar

estabelecer o desenho do seu imaginário correspondente aos motivos que

impulsionam o dom.

O interesse por temas relacionados com elementos do cenário que compôe o

transplante nasceu quando a Fundação Hemope (instituição na qual trabalho)

implantou o projeto Doador Voluntário de Medula Óssea no Estado de Pernambuco

e eu fui convidada a compor a equipe responsável pela captação de doadores.

Durante esse trabalho, percebemos a existência de múltiplos questionamentos de

caráter ético, moral e religioso relativos ao tema do transplante de medula óssea

revelando um cenário bastante complexo.

Surgia então, a necessidade e o desejo de pesquisar alguns aspectos sócio

culturais do doador e receptor, considerando que objetividade da ciência médica

com seus números e percentuais ou as técnicas psicoterápicas, eram elementos

redutores e não permitiriam maior do perfil do doador.

A entrada para o estudo do tema doação de medula óssea do ponto de vista

empírico, no presente trabalho oferece uma possibilidade de verificar valores e os

elos que identificam os vínculos sociais estabelecidos que se relacionem com a

atitude de doar medula óssea. Outra entrada está voltada para investigar as

características da doação, alcance, limites e significados a partir da perspectiva dos

receptores. Mesmo sendo este um evento que determina mudanças relacionais

entre o doador e o receptor, entre ele e a família, e entre ele e a sociedade, esta foi

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pensada também através das representações ou ações determinadas pela

consciência individual dos doadores, revela dados que refletem alguns contextos

nos quais os sujeitos estão inseridos.

O tema do transplante de órgãos tem provocado grande impacto no cenário

social e cultural, pois envolve além dos aspectos relativos ao avanço da medicina e

da tecnologia, a questão da subjetividade humana, mobilizando sentimentos e

emoções diretamente relacionados à representação da vida e da morte. No cenário

do transplante participam vários personagens

Como nas últimas décadas o transplante deixou de ser um procedimento

experimental e passou a ser incorporado como opção terapêutica, viu-se alvo de

maior atenção seja pelo avanço da medicina, seja pelas campanhas de doação de

órgãos, ocupando como dissemos um novo espaço na vida e no imaginário social. É

interessante notar que esta presença pode ser aferida nas novelas e filmes de

grande apelo emocional e pode ser captada nas falas dos nossos sujeitos de

pesquisa. O fato é que nas últimas décadas, esse assunto tem atraído opiniões de

setores diversificados da sociedade brasileira e a mídia não está ausente da

discussão tendo sido ao contrário divulgadora do tema e encarregando-se de

democratizar (e as vezes banalizar) discussões e informações, algumas vezes

polêmicas e contraditórias e também tendo o papel de incentivar a população,

receptiva aos apelos da solidariedade, a aceitar a doação de órgãos. Por outro lado,

os procedimentos em si são procedimentos de alta complexidade e custo, exigindo

medidas de planejamento de políticas públicas e alocação de recursos justificando-

as pela ótica da manutenção e da defesa da vida. Por isso falamos mais acima que

os debates envolvem questões éticas, morais, religiosas, culturais, políticas e

econômicas.

Este cenário coloca questões de fundo relacionadas às diversas categorias de

atores sociais envolvidos: profissionais da saúde, pessoas com indicação do enxerto

e seus familiares e grupos de sociabilidade, poder público em suas várias

dimensões, doadores parentes ou não, mídia etc. Podemos arrolar algumas

perguntas relacionadas ao problema em pauta: Haveria uma busca de critérios de

ação que atendessem a um consenso público? Quais seriam os interesses

hegemônicos de ordem econômica e política envolvida no debate? Quais seriam os

interesses científicos e as razões instrumentais? Quais seriam os elementos de

ordem humanitária (solidariedade, fraternidade, autoestima, reconhecimento social e

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familiar, exercício de poder, entre outros) que poderiam emergir das relações

intersubjetivas dos atores sociais envolvidos diretamente no processo de doação?É

inegável, portanto, que a antropologia tem um papel importante a desempenhar na

análise deste conjunto de questões levantadas.3 A análise antropológica, no nosso

entender, sinaliza um caminho no qual podemos situar o nosso estudo sobre

doação.

Não seria possível abarcar todo aquele cenário. Assim, nosso foco serão os

doadores. Privilegiá-los, bem como as razões por eles apresentadas, poderá permitir

responder mesmo que indiretamente algumas daquelas perguntas acima. E os

receptores de doadores voluntários em Recife e Lisboa.

O fato de priorizar tais recortes significa a relevância dos mesmos. Significa

assumir que meu interesse se volta para o estudo das formas assentadas na

voluntariedade na perspectiva desses atores sociais. Para tanto, o estudo sob a

ótica antropológica significa ir ao encontro das motivações que levaram essas

pessoas a se cadastrarem, com base no questionamento quanto aos limites da ação

técnica na área de saúde diante da doença. O envolvimento dos indivíduos, os laços

de amizade, familiaridade, vizinhança enquanto doadores de medula matizam o

cenário com características importantes quanto ao alcance da ação vai depender da

percepção e interpretação concebidas pela população inserida no contexto social.

O afeto circula nesses espaços, da mesma maneira que a necessidade de

criação de mecanismos institucionais que façam com que a ação se amplie para

além dos limites institucionais. Assim para que o ato seja realizado passa por uma

decisão individual, porém exige uma participação coletiva. O olhar para o interior

dessas pessoas que se estruturam em torno de regras de sociabilidade referidas ao

circuito da dádiva (MAUSS, 1960; 1999). Entretanto, ao enfatizar o tema da

solidariedade para com o outro – o que é assistido –procurei o discurso que

fundamenta as relações que institucionaliza o grupo.

Nas últimas décadas, o transplante de órgãos tem atraído opiniões de setores

diversificados da sociedade brasileira, e ainda a mídia vem cumprindo importante

papel na ampla divulgação, encarregando-se de democratizar as discussões e

3 Seria o indivíduo totalmente autônomo, ou até que grau estaria determinado pela sociedade? Seria esta superior e prévia a ele, ou seria ele um elemento importante na construção da ordem social? Como definir a ‘ação’ social, quais seus aspectos fundamentais? Seria o caso de falar-se em um condicionamento mútuo entre ‘agência’ e ‘estrutura’ ou ‘sistema’? Como caracterizar essas noções de forma precisa? A causalidade social seria exercida, somente, pelos indivíduos ou teriam as coletividades impacto causal sobre seus membros? E teriam as coletividades impactos umas sobre as outras, ou apenas os indivíduos interagem entre si? Como entender essa interação entre indivíduos e/ou coletividades? (DOMINGUES, 2001, p. 18).

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informações, algumas vezes acaloradas e contraditórias, outras esclarecendo ou

suscitando dúvidas e receio nas pessoas. É, portanto um tema de muita relevância

social e como tal tem sido tratada tanto pela sociedade, receptiva aos apelos da

solidariedade na doação de órgãos, como pela saúde pública, por trata-se de um

procedimento de alta complexidade e alto custo, exigindo medidas de planejamento

de políticas públicas e alocação de recursos, critérios éticos e democráticos. Todas

essas políticas têm como objetivo a manutenção e defesa da vida.

Dessa forma, apesar de todos os recortes possíveis problematizarem essas

interpretações, na compreensão antropológica, mostra que o meio vivido nessa área

da medicina cerca-se de práticas institucionais modernas. Por essa razão, assume-

se doação voluntária de medula óssea na perspectiva teórica de Marcel Mauss

(1974), como referência central na construção desse trabalho. Ela permite equilibrar

os diversos motivos que configuram a existência humana. Através de uma formação

assim compreendida, diz Mauss no final do seu Ensaio sobre a Dádiva, é possível

analisar o comportamento humano total, vislumbrando nesse estudo os fundamentos

da própria sociedade e da vida em comum.

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1.5 Objetivos do Estudo

1.5.1 Geral:

Analisar a doação de medula óssea na perspectiva do reconhecimento social

na visão dos efetivos doadores voluntários e receptores em Recife (Brasil) e Lisboa

(Portugal).

1.5.2 Específicos:

Descrever as características sociodemográficas dos participantes da

investigação;

Identificar as motivações da ação voluntária na perspectiva dos

doadores voluntários;

Descobrir se os laços estabelecidos pela ação da doação de medula

óssea e suas formas extrapolam, criam novos ou aumentam os

vínculos entre os elementos participantes do circuito;

Estudar o impacto da doação sobre os vínculos familiares, sociais

dos receptores como: valores, afeto, as relações de interesse e

desinteresse, a solidariedade, o conflito, a obrigação, a partilha e o

benefício.

1.6 Organização do Trabalho

O trabalho está estruturado em capítulos. O primeiro pretende situar o objeto

de estudo, estabelecendo a problematização e se acercando das hipóteses, sejam

elas gerais ou operacionais.Assim a problematização e aproximação teórica, serão

abordadas as teorias que contribuiram para interpretar os dados encontrados no

trabalho de campo.

No segundo capítulo, medodologia, o objeto de estudo é circuncrito e os

procedimentos metodológicos descritos, levando em consideração as dificuldades e

facilidades experimentadas no trabalho de campo.

A terceira parte do trabalho faz uma incursão teórica, onde foram abordadas as

teorias que contribuiram para interpretar os dados encontrados no campo de

trabalho.

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Em se tratando de uma tese que aborda como objeto de pesquisa doador de

medula óssea/transplante e que pode ser analisado, pelo menos, por duas áreas do

conhecimento: antropologia e medicina pareceu lógico discorrer, também, sobre os

passos percorridos pela última ao longo dos anos para viabilizar o transplante. De

início, a necessidade pode ser expressa pelo fato de que esta tese essencialmente

antropológica se prestará também a consulta por pessoas da área médica, e esta

lógica é apoiada de que pelo fato a interdisciplinaridade se carcteriza, exatamente

em não privilegiar conhecimentos de aparentemente divorciadas, mas pelo contrário,

procura estabelecer pontes entre tais conhecimentos resultem numa tentativa de

aproximação. Assim essa parte, acompanha os passos das primeiras incursões

cintífico-metodológicas realizadas nos estudos sobre transplantes, até nossos dias.

O quarto capítulo, reporta-se ao lançamento dos resultados e discussão dos

dados coletados, segundo explicados na metodologia. Os discursos dos doadores e

receptores são interpretados, e os dados relacionados com os motivos da doação,

assim como a análise simbólica dos discursos dos receptores, correlacionados com

o ato da doação em si.

As considerações finais sintetizam resumidamente os achados e indicam

tendências que respondem às proposições que justificam a pesquisa.

Seguem-se as referências bibliográficas, os anexos e apêndices.

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2 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

Neste trabalho estamos propondo uma reflexão teórica sobre os fatos

envolvidos na doação de medula óssea. O trabalho se desenvolve em duas frentes

que devem manter diálogo permanente: trabalho teórico (aprofundamento dos

conceitos chave) e trabalho de campo. O trabalho de campo tem dois momentos:

uma primeira fase quantitativa (com aplicação de questionários), seguida de uma

abordagem qualitativa (apoiando-se em entrevistas).

2.1 Caracterização Geral do Estudo

Os dados deste trabalho são fruto, da pesquisa de campo realizada em Lisboa

(Portugal) e Recife/ Pernambuco (Brasil) em 2011. Para ter acesso ao material

empírico, foram eleitos dois grupos sociais: doadores voluntários e pessoas

receptoras que foram submetidas ao TCTH no Brasil (Recife e em Portugal Lisboa).

Para o desenvolvimento, foi utilizado o referencial teórico da dádiva para conhecer e

analisar os dados. Trata-se de um estudo descritivo, de caráter exploratório na

perspectiva de Richardson et al (2007), a abordagem é de natureza qualitativa. Pois

a pesquisa qualitativa responde a questões particulares. Esta perspectiva é capaz

de investigar ou conhecer de modo aprofundado um evento ou situação,

possibilitando a explicação de comportamentos.

Um dos objetivos desse trabalho é obter depoimentos acerca das concepções

e da motivação, seja do ponto de vista dos doadores, seja do ponto de vista dos

receptores de medula óssea. Dessa forma, não somente os aspectos técnicos (o

uso correto de solicitações, controle dos exames sorológicos, instalações físicas

adequadas), como também as relações estabelecidas entre doadores/fornecedores

de matéria prima serão analisados, de modo que venha proporcionar o

estabelecimento de um processo contínuo e sistemático que estimule a doação.

O estudo se constituiu de acordo com os objetivos propostos em dois

momentos distintos, porém interligados. O primeiro foi o estabelecimento de uma

configuração significativa sobre doação e, a segunda da configuração da recepção

de medula óssea. Partindo do pressuposto em acordo com Minayo, a pesquisa

constitui:

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“[…] Uma atitude e uma prática teórica de constante busca e, por isso, tem a característica do acabado provisório e do inacabado permanente. É uma atividade de aproximação sucessiva da realidade que nunca se esgota, fazendo uma combinação particular entre teoria e dados, pensamento e ação.” (MINAYO, 2006, p.47).

Houve nesta tese, a preocupação só de utilizar os doadores que foram

selecionados naturalmente pela genética, ou seja, compatíveis com o receptor e

voluntário, o chamado doador não relacionado (doador não parente). Essa

preocupação possibilitou trabalhar um grupo que não corresse o risco de entrevistar

pessoas cujos discursos se tornassem comprometida com algum dos receptores.

Esse cuidado evitou que a amostra fosse viciada pelo conhecimento prévio do

conteúdo da entrevista. Nessa perspectiva concordamos com Salem, quando a

mesma diz que há um risco de se generalizar os achados quando se pesquisa em

pequeno grupo. Esta perspectiva é capaz de investigar ou conhecer de modo

aprofundado um evento ou situação, possibilitando a explicação não conhecida, da

qual se tem necessidade de maiores informações (SALÉM, 1980).

Optamos pela abordagem qualitativa em decorrência do objeto de estudo,

apesar de realizarmos a utilização da estatística descritiva básica com a tabulação

das frequências de ocorrência e os percentuais.

2.2 Técnicas de Investigação

A pesquisa utilizou técnicas de registro e análise qualitativa (diário de campo,

observação não participante, entrevistas) e quantitativa (levantamento de dados do

sistema de informações oficiais e aplicação de questionários).

A escolha da população entrevistada foi intencional no sentido de abordarmos

os doadores voluntários, de acordo com a disponibilidade de cada doador. Um dos

primeiros passos foi procurar o CEDACE em Portugal para saber da disponibilidade

naquele momento e do interesse do serviço em participar do estudo.

Para caracterizar o perfil dos doadores efetivos, foi utilizada como primeira

técnica de investigação o questionário semiestruturado. O questionário consistiu

em duas partes: a primeira, com questões relativas a identificação pessoal do

entrevistado, com informações sobre idade, escolaridade, renda, profissão, religião,

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a segunda, contendo questões que visavam obter os valores, as motivações dos

agentes e conhecimento sobre transplante (APÊNDICE- G).

Com o objetivo de explorar os significados da participação dos sujeitos foi

utilizada como segunda técnica a entrevista, que teve em média 40 minutos de

duração. Essa técnica consistiu em 3 fases principais: a pré-análise, a exploração

do material, tratamento dos resultados e interpretação, além da observação direta

(MINAYO, 2007).

2.3 Participantes da Investigação

Foram os doadores voluntários de medula óssea que se cadastraram no

Programa de Doadores Voluntários, (REDOME) no Brasil e (CEDACE) em

Lisboa/Portugal, assim como os receptores de medula óssea que realizaram

transplante no Hospital Português em Recife (Pernambuco/Brasil e Instituto

Português de Oncologia de Lisboa/Portugal, que se disponibilizarem a responder a

entrevista (APÊNDICE D).

No caso dos doadores voluntários, foram enviados questionários com

perguntas abertas e fechadas (APÊNDICE- G), em Portugal, para as residências,

aqui no Brasil, a pesquisadora foi as residências. Em relação aos receptores, os

mesmos em Portugal foram entrevistados no Serviço de Transplante de Medula

Óssea do Hospital de Oncologia de Lisboa (IPO). E no Brasil também nas

residências.

As entrevistas com os receptores em Lisboa e Recife foram realizadas nos

consultórios utilizados para a realização da consulta médica, no momento em que

estes aguardavam a chamada para o médico; tiveram em média, a duração de 40

minutos. Foram realizadas antes ou após a consulta de rotina de acompanhamento

pós-transplante, o que pareceu ser importante no sentido de ouvir sua fala de

receptor. O roteiro da entrevista passou por um teste piloto, objetivando realizar um

controle de qualidade. Foram feitas entrevistas semi estruturadas, entretanto, em

algum momento do processo foi deixado o entrevistado à vontade para dar corpo a

suas ideias e, até certo ponto encaminhar o diálogo.

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O material das entrevistas foi lido exaustivamente, na tentativa de entender o

outro sob sua própria perspetiva; tendo em mente que a neutralidade absoluta não

existe, pois quem analisa carrega consigo seu referencial, sua vivência. As falas

foram analisadas, buscando-se noções repetitivas e/ou significativas de visões de

realidade, que podem pautar comportamentos em relação ao processo de doação

de sangue, tanto do ponto de vista do doador de sangue, quanto do profissional de

saúde

É reconhecido que a entrevista como instrumento de pesquisa, pode e deve

traduzir ideias, que podem de fato ser quanto ao transplante equivocadas. Em

função desse fato, foi tida a preocupação de ser feita uma observação do

comportamento do entrevistado. Este cuidado permitiu que fossem registrados no

diário de campo aspectos comportamentais como: hesitação, reticências, risos, etc.

O roteiro da entrevista com os doadores e os receptores, possibilitou classificar

em grupo, segundo categorias como sexo, idade, profissão, motivação da doação, o

que influiu na maneira de ver e sentir o transplante/ doação.

Com cada um dos entrevistados foi tida uma conversa inicial, explicando a

razão da pesquisa e ressaltando também sua importância para se obter

conhecimento aproveitável para a pesquisa. As perguntas foram sistematizadas, que

viabilizando alguns critérios escolhidos como importantes, classificados e agrupados

obedecendo o nível de interesse tal como se segue:

Características econômicas

Características intelectuais

Características psicoafetivas

Religiosidade

Representações do corpo

Motivação para doar

Relações familiares

Cor

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2.4 Local e Período de Estudo

A primeira parte da investigação foi realizada na Fundação Hemope (BRASIL),

organização que atualmente ocupa uma área de 7.586m², conta com 1.040

funcionários, possui uma rede composta por seis hemocentros regionais: Caruaru,

Petrolina, Palmares, Garanhuns, Serra Talhada e Recife, além de seus dois

hemonúcleos: Salgueiro e Ouricuri (como mostra o mapa abaixo). A segunda parte

da investigação foi no hospital Português do Recife. A terceira parte foi realizada no

Instituto Português de Oncologia, particularmente no Serviço de Transplantação de

Células Genitoras Hematopoiéticas, mediante autorização da Direção e Comitês de

Ética e Científica no Centro de Histocompatibilidade Sul(CEDADE) realizado no

período de julho a outubro de 2011.

Ilustração 1 . Mapa da Hemorrede de Pernambuco

Fonte: Fundação Hemope, 2011.

2.5 Aspectos Bioéticos do Estudo

Para obedecer aos aspectos legais exigidos pela ética e a ciência, o protocolo

de investigação foi apreciado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação

Hemope, situada em Recife (BRASIL) e aprovado. Além desse procedimento, a

confidencialidade dos dados será rigorosamente respeitada, segundo os princípios

da Declaração de Helsinque e da Resolução nº 196/96 sobre pesquisa envolvendo

seres humanos (BRASIL, 1996), esclareceremos aos sujeitos os objetivos da

investigação, a sua forma de participação, bem como os seus direitos - ao

anonimato, à desistência inócua e a novos esclarecimentos se necessários, além da

necessidade de anuência, não apenas verbal; assim os que concordarem em

participar do estudo o farão por escrito mediante a assinatura do Termo de

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Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE A). Também o Comitê de Ética em

Portugal se pronunciou, além do Comitê Científico.

2.6 Processamento e Análise dos Dados

Neste estudo os dados qualitativos serão analisados por um programa

computacional, denominado QSR NUD*IST (Non-numeric Unstructured Data, Index

Searching and Theorizing), um software desenvolvido por pesquisadores que

trabalham com pesquisa qualitativa na área das ciências sociais. (MILES e

HUBERMAN, 1987; RICHARDS e RICHARDS, 1994; COFFEY et al., 1996).

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3 CAPÍTULO I - DIALOGANDO COM O PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO DE MAUSS

3.1 A Antropologia e o Sistema de Dádiva

3.1.1 A Doação de Medula Óssea como um Fato Social

A dádiva é entendida nos estudos das Ciências Sociais, como fator de

organização social que prioriza o valor do vínculo sobre o valor do uso e da troca,

assim entendida como um terceiro paradigma encontrado nas sociedades.Com as

ações autocentradas (individualismo metodológico) como primeiro paradigma, ou

quando as ações da coletividade, citamos como exemplo o culturalismo, o

estruturalismo e o funcionalismo sejam a base de explicação para todas as ações do

indivíduo como segundo paradigma; o dom, ou a dádiva, será considerado terceiro

paradigma, explicando a sociedade como um sistema organizado de laços e

vinculação, incluindo o cuidado com outros, dessa forma criando a estrutura de

sustentação social.

A dádiva bastante estudada por Mauss (2005, p 37-184) implica no surgimento

de um contrato legitimado por trocas. A doação de medula a primeira vista como

voluntária, pelos laços de não consanguinidade existente entre os atores, é revestida

virtualmente de obrigatoriedade. A aceitação da dádiva é concretamente obrigatória,

considerando que a medula representa para o receptor a própria vida. De forma que

a retribuição torna-se vital para que a virtude do ato do dom, não fique estagnada e

mantenha- se circulante, reafirmando, inclusive, as relações sociais dos envolvidos.

Tomamos a noção de dádiva como o conceito fundante da nossa reflexão, ele

é que permitirá passar do fato empírico à possível interpretação. O fato empírico

será a doação (de medula). A doação, aqui descrita como a maneira de pensar, de

sentir o indivíduo em seu exterior, na medida em que pode ser definida como um ato

exercido por um agente social enquanto indivíduo que participa das manifestações

decorrentes das relações, das atividades, e dos produtos sociais, isto é, de tudo que

é resultante das interações interpessoais e envolvida com os diversos aspectos da

sociedade. Entretanto parece não ser um evento semelhante àqueles que

extrapolam a consciência do indivíduo, obrigando-o a agir apenas por cumprimento

do dever, ou hábito cultural.

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De acordo com Lévi-Strauss “para compreender convenientemente um fato

social, é preciso apreendê-lo totalmente, ou seja, de fora, mas como uma coisa de

que faz parte integrante à apreensão subjetiva consciente ou inconsciente que dela

faríamos se vivêssemos o fato em lugar de observá-lo como etnógrafo” (LÉVI-

STRAUSS, 1974, p.17).

A doação vista como um fato social pode ser pensada em sua essência pela

teoria do reconhecimento. Desta maneira a dádiva explicita os mecanismos

relacionados com as contradições, trocas recíprocas, surgidas por intermédio

aparentemente voluntário. Nela, fica evidente que as dádivas, mesmo parecendo

voluntárias, se submetem a uma obrigatoriedade transcendente, tanto no seu

instante inaugurador quanto no seu retorno consequente. Com essa categoria de

fato social total coloca toda sociedade em movimento. São fatos sociais totais

porque não abarcam apenas uma instituição, ou parte dela, mas sim sistemas

sociais inteiros.

Com essa categoria de fato social Mauss nos oferece o princípio metodológico

segundo o qual há fatos sociais estratégicos, a partir dos quais o analista deve

descortinar mecanismos que revelariam a sociedade como uma totalidade coerente

e em atividade, Mauss parece perceber que por trás dos desafios morais das trocas

do sistema Potlach, há uma estrutura de equivalência entre os homens expressa na

reciprocidade (receber, dar e retribuir), fenômeno que exige obrigação recíproca de

realizar o dom pelo dom, e de se exceder nesse doar, internalizando e envolvendo a

coisa dada, encontra-se o espírito ou virtude que atribui à mesma um poder

simbólico de transmissão.

Mauss analisou esse costume em grupos no norte da Polinésia, Melanésia e no

Alasca, identificado também em outras regiões, continuou a ser estudado pelo

próprio Mauss e por muitos autores, sendo mantido Mauss e sua obra-como

referências no assunto.

A consequência dessa postura teórica sobre o método é que os fatos sociais

não podem mais serem vistos como causas exteriores, mas como símbolos que são

totais, pois têm a possibilidade de imbricação, gradação e tradução nos diversos

planos da ação. Assim, a lógica da dádiva coloca numa linha horizontal a ação

individual e a estrutura social. Partindo desses pressupostos, a pesquisa pretende

correlacionar a dádiva com questões especificas como: reconhecimento social,

autoestima, exercício de poder entre outras questões.

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Assim o arcabouço teórico dos conceitos elaborados por Mauss na teoria do

dom, a visão antropológica da reciprocidade, bem o como a teoria da dádiva

segundo Alan Caillé, permitirá acionar estratégias metodológicas e interpretativas

desta tese, como pretendemos mostrar durante o estudo.

A doação pode ser vista como um fato social, aqui descrita como a maneira de

pensar, do sentir o indivíduo em seu exterior, na medida em que pode ser definida

como um ato exercido por um agente social enquanto indivíduo que participa das

manifestações decorrentes das relações, das atividades, e dos produtos sociais, isto

é, de tudo que é resultante das interações interpessoais e envolvida com os diversos

aspectos da sociedade. Entretanto, a doação de medula parece não ser um evento

semelhante àqueles que extrapolam a consciência do indivíduo, obrigando-o a agir

apenas por obrigatoriedade, cumprimento do dever, ou hábito cultural. Todos esses

patamares, de apreensão do social necessitam girar em torno de uma experiência

concreta em uma dada sociedade localizada tempo-espacialmente, e também em

um indivíduo e em grupo de indivíduos dessa sociedade.

Para estudar a doação, do ponto de vista da antropologia, não devemos nos

ater a vê-la como um gesto mediado por imposições culturais que dão lugar a

hábitos e costumes que qualifica o agir social, até porque podem existir doadores

que se recusem a doar. A doação vista como um fato social pode ser pensado em

sua essência pela Teoria do Dom. Desta maneira, a teoria da dádiva explicita os

mecanismos relacionados com as contradições, trocas recíprocas, surgidas por

intermédio aparentemente voluntário.

Assim esses mecanismos fomentam representações sociais, além de torná-las

estáveis. Nela, fica evidente que, as dádivas, mesmo parecendo voluntárias, se

submetem a uma obrigatoriedade transcendente, tanto no seu instante inaugurador

quanto no seu retorno consequente. Com essa categoria de fato social total coloca

toda sociedade em movimento. São fatos sociais totais porque não abarcam apenas

uma instituição, ou parte dela, mas sim sistemas sociais inteiros.

No ensaio sobre a dádiva, com essa categoria de fato social Mauss nos

oferece o princípio metodológico segundo o qual há fatos sociais estratégicos, a

partir dos quais o analista deve descortinar mecanismos que revelariam a sociedade

como uma totalidade coerente e em atividade, Mauss parece perceber que por trás

dos desafios morais das trocas do sistema Potlach, há uma estrutura de

equivalência entre os homens expressa na reciprocidade (receber, dar e retribuir),

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fenômeno que exige obrigação recíproca de realizar o dom pelo dom, e de se

exceder nesse doar, internalizando e envolvendo a coisa dada, encontra-se o

espírito ou virtude que atribui à mesma um poder simbólico de transmissão. Desse

modo, aquele que recebe torna-se impotente para recusar a dádiva e obrigado a

retribuí-la. Os participantes desse circuito passam a ser elementos de articulação da

comunidade, fortalecendo a coesão social, e fomentando, inclusive bases religiosas.

A obrigação de dar e receber é revestida de uma dinâmica que resulta no

fortalecimento das instituições, e não é de natureza moral. Esses sistemas de troca

são encontrados em vários aspectos da vida social e cotidiana.

A obrigação de dar, receber, de aceitar e devolver, explicado pelo mana ligado

ao objeto e que vincula doadores e receptores a ele, pode ser um esquema aplicável

a doação de medula. Para tal convém lembrar convém lembrar que a medula óssea

enquanto objeto doado para o transplante carrega além de sua constituição genética

e sua capacidade fisiológica, o poder e a força de reviver o receptor. Tanto o doador

como o receptor sabe disso. A medula doada encontra-se vinculada, dessa mana, o

doador traduz vida e que parte do seu corpo será introjetado no receptor. É algo

próprio do doador que será cedido. Assim a medula recebida encontra-se vinculada,

primeiro por saber que no objeto doado está contida sua própria vida, e nada pode

ser mais obrigatório do que receber vida, principalmente quando a morte se faz tão

presente. O receptor sabe da virtude que está sendo doada, por se tratar de vida

jamais poderá ser total, de maneira que o receptor sempre será um devedor.

A medula então passará a ser circulante, no processo de transplante pode ser

visto como algo que guarda em si o sentido de poder que simboliza vida, isto é, um

valor que excede seus limites visíveis. O que se verifica é a possibilidade de

tradução entre os diversos campos de atuação do homem na sociedade, ou seja, a

interpretação entre o utilitário, o simbólico, interesse e o desinteresse.

Interpretando a dádiva, segundo Mauss, percebe-se que ela institui um tipo de

relação que envolve o espiritual e que, por isso mesmo, ultrapassa a coisa dada e

recebida. A dádiva transcende as pessoas que participam da transferencia e a

própria transferência em si, repercute sobre o mundo natural, social e espiritual.

A experiência de ser um doador voluntário pode fornecer, além do sentimento

de solidariedade, a oportunidade de participar de modo significativo na sociedade,

intensificando o senso de responsabilidade social.

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Godbout “a dádiva serve antes de tudo, para estabelecer relações. É uma relação sem esperança de retorno por parte daqueles a quem damos por parte daqueles que venha a substituir, uma relação de sentido único, gratuita, neste sentido e sem motivo não seria relação. Aquém e além dos momentos abstratos do egoísmo e altruísmo, da antítese entre o momento considerado do interesse considerada real do interesse material calculado e um momento ideal inacessível ao interesse radical, é preciso pensar a dádiva não como uma série unilateral e descontínua, mas como uma relação” (GODBOUT, 1999, p. 16).

Esta tese tenta descobrir se o carater transcendente dos laços estabelecidos

pela dádiva da medula óssea e suas formas que extrapolam ao conteúdo concreto

do presente concreto, criam novos, ou aumentam os vínculos entre os elementos

participantes do circuito. Descobrir também, se na celebração do transplante, o

doador busca alguns elementos envolvidos na troca segundo a teoria do dom.

O bem público inferido a partir das análises do sistema da dádiva se estabelece

em uma esfera social intermediária (Caillé, 2004; Godbout, 2004; Chanial, 2004),

relacionando o indivíduo e a coletividade relacionando o indivíduo e a coletividade.

O bem público é o que permite acionar o sentido de obrigações recíprocas ao

mesmo tempo em que ativa as virtudes cívicas que engajam os indivíduos ao mundo

social. Isso permite pensar as práticas sociais que visam democratizar o Brasil, não

a partir de valores ideais, combinando “o tradicional e o moderno (LANIADO, 2001,p.

228).

Por isso, é impossível, nesta atual conjuntura, impedir o público não médico,

não especialista, de discutir os reflexos sobre a medicina moderna. A crescente

tecnificação da prática médica, o enfraquecimento do discurso social sobre saúde, a

falência do Estado de bem estar disseminou uma visão restritiva da saúde como

fenômeno social e coletivo.

Portanto, o aumento das taxas de doadores depende de um olhar que

extrapole as questões técnicas do processo de doação de órgãos e tecidos, como

vêm fazendo vários países, que trabalham sistematicamente nesse processo, há

longo tempo, incorporando a abordagem social e a perspetiva ética, baseadas no

altruísmo e voluntarismo das pessoas e no respeito ao direito de autonomia dos

potenciais doadores. Esta visão precisa ser parte integrante.

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Na América Latina e em diversos outros países, vários pesquisadores e

estudiosos têm articulado seus estudos e pesquisas em torno do paradigma do pós-

estruturalismo, dedicando especial atenção ao papel dos sujeitos sociais. Em todos

os casos, é evidente a ênfase no sujeito, contudo a maioria dos sociólogos que

assumem tal enfoque analítico tem feito grande esforço intelectual e, empreendido

uma batalha metodológica para superar as oposições do tipo individualismo/holismo,

resgatando para tal, as contribuições de Giddens e Bourdieu. Os modelos teóricos

individualistas não têm como conceber essa forma de obrigação em sua vinculação

com o exercício da liberdade a essa tradição de pensamento.4

3.2 A Doação de Medula como Prática de Reconhecimento Social

Tendo como ponto de partida o indivíduo relacional que compartilha um

universo simbólico com o outro, e que somente encontra validade nele

(HABERMAS, 2002) nas relações de conhecimento mútuo (HONNETH, 2003),

observa-se além do saber técnico e de uma linguagem natural as experiências do

sujeito. Pela teoria do reconhecimento de Honneth as relações determinantes do

mundo da vida, colocariam os atores em experiências comuns de sofrimento como é

o caso dos pacientes que precisam de transplante de medula óssea. É a partir desta

operação de sentido que os atores partem para uma luta moralmente motivada. A

contribuição de Honneth se distancia, por sua vez, do comportamento do julgador,

para colocar em evidência os conflitos numa perspectiva normativa fundamental, o

movimento de partida do autor são os indivíduos. As lutas por reconhecimento

apesar de terem sido apropriadas na emergência dos novos movimentos sociais,

nas reivindicações de natureza cultural, contribuíram para colocar dentro do debate

político o agravamento das desigualdades sociais pelas políticas neoliberais na

década de 1980, a questão da globalização econômica (SILVA, 2005), deslocando

os tipos de demanda ao lado das demandas pós-redistribuição, numa concepção e

crítica da sociedade capitalista, trazendo para a regulação econômica formas

assimétricas de reconhecimento (FRAZER, 2001).

4 A vontade subjetiva e a vontade coletiva nunca são, de fato, completamente reconciliáveis, coexistindo em uma tensão permanente (BAUMAN, 2000, p. 190).

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Diante desse quadro, seria preciso elaborar elementos normativos dessa

concepção de luta motivada na experiência dos doentes, somados à observação

contextual dos movimentos na sociedade civil e, ao mesmo tempo, às mudanças.

Para Honneth, 2003, no processo histórico a luta de classes é um exemplo de

conflito moral onde o trabalho no capitalismo provoca a destruição das relações de

conhecimento e demonstra a existência de conflito entre concepções diferentes: o

conflito representa uma”espécie de mecanismo de comunitarização social,que

forçam os sujeitos a se reconhecerem mutuamente no outro (HONNETH, 2003,p.

64).

São as experiências de uma determinada sociedade que colocam os indivíduos

em interação e os impelem a uma autorrelação prática de luta pelo reconhecimento

recíproco: “os sujeitos só podem chegar a uma autorrelação prática quando

aprendem a se conceber da perspectiva normativa de seus parceiros de interação

como seus destinatários sociais” (HONNETH, 2003, p. 155). A análise de Honneth

se antecipa as estruturas atomizadas das teorias centradas no indivíduo. Hegel que

o influencia não assume o indivíduo como categoria necessária e suficiente para a

compreensão da liberdade e sustenta que há um vínculo que precede o indivíduo.

Ele retorna a ideia aristotélica de sociedade em decorrência de vínculos comuns que

precedem o próprio movimento de individuação das ações.

Com efeito, a luta por reconhecimento de direitos constitui um padrão

intersubjetivo ou uma das três esferas de interação subdivididas na vida social onde,

a identidade do indivíduo se confirma. Padrões de reconhecimento e a sociologia

numa luta constante de todos contra todos pela autoconservação, mas na luta pelo

reconhecimento das dimensões da individualidade humana. De forma ideal típica e

positiva, são três as relações significativas no desenvolvimento moral dos indivíduos

que se intensificam passo a passo na luta pelo reconhecimento: primeiro as ligações

emotivas ou primárias do amor nas relações familiares, de onde se desenvolve a

autoconfiança para a participação autônoma dos indivíduos na vida pública;

segundo, a adjudicação de direitos criando uma relação prática de autorrespeito dos

indivíduos com a sociedade civil; e, terceiro, a solidariedade numa comunidade de

valores, que cria uma relação prática de autoestima, na tolerância e afeição dos

indivíduos às diferenças de prosperidades entre os sujeitos humanos. Esta luta

implica também na ampliação e questionamento da comunidade a qual os indivíduos

estão inseridos.

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Não o bastante estes padrões de reconhecimento consistem num parâmetro

normativo e convergem para os enunciados mais universais possíveis, ou seja,

valores e princípios da modernidade, diferente das ideias singulares de vida, para os

fins de autorrealização humana. “Honneth articula uma teoria social, crítica que

mantém em seu núcleo a noção do conflito, sem, no entanto, retornar aos modelos

holísticos” (SILVA, 2005, p. 8).

Em todas as abordagens, as variáveis utilizadas para análise do fenômeno da

ação voluntária são muito semelhantes, destacando-se: circulação, fluxo, troca,

motivações, valores, intercâmbio de informações; intensividade e extensividade; o

compartilhamento de experiências, a colaboração em ações coletivas; o aprendizado

coletivo e as inovações; a ampliação do poder de pressão; a diversidade e

articulação; pluralismo organizacional e ideológico; ação direta e institucionalidade;

atuação nos campos cultural, integralidade e realimentação; a horizontalidade

organizativa, a relação entre flexibilidade e agilidade.

Por ser esta uma pesquisa na área de antropologia, é importante, também

entender o conteúdo e o processo de formação dessas representações no indivíduo;

mais especificamente no grupo social enquanto produto de internalização das

condições materiais de existência. Esses aspectos não são aprofundados por

Bourdieu. Optamos por buscar outros autores que pudessem responder essa

questão. Destacamos Luc Boltanski, ao demonstrar em seu trabalho uma maior

preocupação com o processo de constituição das representações dos agentes. Para

Boltanski, as representações encontradas muitas vezes parecem ter um caráter

individual onde cada sujeito pode apresentar uma descrição particular, mas, na

realidade, “elas constroem segundo regras fixas, um grupo de categorias e de

esquemas de classificações que possuem um caráter coletivo, determinados pelas

condições objetivas” (BOLTANSKI, 1984, p. 72).

3.3 A Teoria da Reciprocidade na Perspectiva Antropológica

3.3.1 A Doação como Prática de Reciprocidade

A teoria antropológica da dádiva demonstra uma disposição compreensiva das

vinculações e experiências coletivas, de forma contextual e local, tanto nos aspectos

de sistematicidade, quanto naqueles assistemáticos do social, no sentido de que o

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sistema social se constitui de relações numa regra tripartite de reciprocidade dar,

receber e retribuir na razão instrumental e significativa entre os sujeitos com

competência linguística, e de forma ainda mais complexa considera a mediação dos

presentes, bens e objetos na tessitura do vínculo social. A dádiva segundo Freitas

(2002), possui uma reflexão radical ao interrogar o vínculo social, acionando outro

nível de análise do social, o que deve ser enfatizado, no trabalho de resgate das

memórias, das significações simbólicas e das lógicas institucionais, é a tentativa de

ir além das oposições binárias, já que estas oposições são impeditivas de uma

melhor apreensão das redes e práticas que organizam a ação social. Ao invés de

opor a objetividade das estruturas e a subjetividade das representações, essa teoria

busca articular as diversas modalidades da relação ao mundo social que demarcam

a existência das redes sociais que vinculam os atores entre si e entre as instituições,

com isto, descartam-se as antigas concepções enquanto representação do real.

Nesta perspectiva, a dádiva ultrapassa os valores de uso e de troca do objeto

que circula, inserindo o valor do vínculo que traduz a intensidade da relação entre os

atores envolvidos. Na dádiva, a relação conta mais que o bem doado, posto que

esta circulação não esteja subordinada à racionalidade utilitária nem à racionalidade

política, ela está a serviço dos vínculos sociais. De maneira que a pesquisa ao

estudar o doador de medula óssea, assim como, o receptor, reflete os valores que

circundam o gesto da doação e os motivos envolvidos no ato. Aparentemente esse

gesto se dá por livre vontade, desvinculado de qualquer tipo de retorno material.

A caracterização da reciprocidade enquanto modo de sociabilidade, desde a

lógica do paradigma da dádiva, permite evidenciar que o vínculo que conecta os

indivíduos, exige que os bens circulem como bens simbólicos, ou seja, eles devem

carregar algo do doador, o seu espírito. Pois, é este espírito que estabelece um

vínculo com o outro: um compromisso, uma lealdade, um crédito futuro para a

retribuição, que atravessa tempos e gerações. As normas sociais são incorporadas

pelos sujeitos, através de um sentido de pertencimento.

Trata-se de um pensamento que inspira no movimento da vida, e na sua

pluralidade das lógicas, inclusive aquelas de interesse do (mercado) da obrigação do

(Estado), mas que prioriza na constituição do vínculo social não outra lógica, mas

todas simultaneamente gerando um movimento paradoxal e incerto de interesse,

desinteresse, de liberdade e de obrigação centrado no valor da relação. Por esta

abordagem reabilita-se a experiência dos atores e grupos sociais, em lugar de partir

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de categorias abstratas e estritamente científicas, ao buscar a intencionalidade e

justificativas dos mesmos nas determinações do fazer e do dizer. Ou seja, percebe-

se que ela institui um tipo de relação que envolve outras questões, a partir do

surgimento dos vínculos sociais diversos, e na maneira pela qual a sociedade faz

circular seus bens simbólicos. Desta forma transcende às pessoas que participam e

repercute sobre o mundo natural, social e porque não dizer espiritual. “Para Martins,

no sistema da dádiva, a circulação dos bens não se submete à equivalência, mas ao

paradoxo, escapa ao simplismo do interesse egoísta para se abrir sobre a

diversidade de razões para se produzir vínculos e solidariedades” (MARTINS, 2003,

p. 64).

O senso comum, reflexo de um conhecimento que não é submetido ao crivo

pelo qual passa a epistemologia científica, reduz a complexidade das razões

fundamentais da doação, unicamente ao altruísmo. Esta razão pode estar expressa

nos discursos dos receptores, dos familiares e dos profissionais de saúde envolvidos

com o transplante, e principalmente nos discursos elaborados pelos doadores. Além

do que há uma exarcebação e mitificação da mídia reproduzindo-a por meio dos

agentes que formam opinião pública, fortalecendo esta representação social, aqui

entendida como forma de conhecimento socialmente elaborada e partilhada, e que

percebe a realidade afetiva inscrita no indivíduo, reinterpretando a realidade.

Outro autor que discute reciprocidade é Polanyi para ele é uma forma de

integração superior em virtude da sua capacidade de empregar a redistribuição e o

intercâmbio como métodos subordinados. Ele observou que a reciprocidade

pressupõe movimentos de recursos e informações entre correlatos de agrupações

simétricas. E como sistema integrativo configura, uma relação onde a dimensão

cooperativa e o valor da confiança são reconhecidos como essenciais à

continuidade, estabilidade e eficiência do processo de interação (POLANYI, 2001).

O problema da natureza ambivalente da reciprocidade passou a suscitar

debates cruciais para a teoria sociológica contemporânea, em geral com o modelo

de reciprocidade materializado na dádiva (VANDENBERGUE, 2004). Descobre-se

que a circulação social de objetos pode reger-se por outras motivações além dos

interesses utilitários. Os bens sociais podem circular na perspectiva, não apenas do

enriquecimento ou sobrevivência física dos indivíduos, mas também para criar,

manter ou regenerar o próprio laço social. No ensaio sobre a dádiva, Mauss

desenvolve a noção de reciprocidade, e é um dos principais teóricos que sempre

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estabeleceu uma via onde pode transitar qualquer coisa, seja material ou simbólico,

pois a dádiva inaugura o conceito de aliança na qual a reciprocidade alimenta.

O conceito de reciprocidade generalizada se traduz como a troca de bens,

favores e trabalho, baseada na suposição de que retribuições se equilibrarão em

longo prazo, e por conta dessa expectativa a questão da retribuição não é

especificada ou mesmo sugerida. Entretanto a generosidade comum entre amigos e

familiares pode ser considerada como altruísmo superlativo, no qual a reciprocidade

existe como expectativa convicta, embora genérica quanto ao valor e tempo de

retribuição deva ocorrer. Ela difere da reciprocidade equilibrada, posto que esse

condicione uma troca direta e presumivelmente satisfatória para aqueles que

permutam. “Embora essas colocações em torno da reciprocidade sejam levantadas

para as sociedades tribais, elas podem ser remetidas para a nossa sociedade”

(VASCONCELOS apud SHALINS, 1983, p. 31-32).

A caracterização da reciprocidade enquanto modo de sociabilidade permite

evidenciar que o vínculo que conecta os indivíduos, exige que os bens circulem

como “bens simbólicos”, ou seja, eles devem carregar algo do doador, o seu espírito.

Para Simmel, a noção sobre sociabilidade, vai além das representações sociais.

Esta se baseia em formas de interação recíproca entre os membros da sociedade,

implicando em uma participação e contribuição efetiva de seus membros para a vida

social. Por perceber que é uma categoria analítica central, organiza os laços de

solidariedade entre os doadores voluntários de medula óssea. A marca inicial

desses doadores reside na formação dos vínculos de parentesco, amizade e

anônimos, que reúnem um grupo em prol de uma causa, gerando uma ação coletiva

que se replica.

O desdobramento analítico – que surge desse deslizamento da solidariedade –

a sociabilidade nos permite no campo sociológico as análises de Simmel sobre o

entrelaçamento entre individualidade e formas sociais. O debate sobre o lugar

ocupado pelo ator social, pelos sujeitos nas análises sociológicas ganha com o

referencial simmeliano a possibilidade de rever dicotomias entre indivíduo e

sociedade, entre subjetividade e objetividade. É a partir dessa discussão teórica que

dialogamos com a dimensão da sociabilidade e seus significados baseados na

interação entre sujeitos sociais, que desenvolvem ações sociais pautadas na

voluntariedade (SIMMEL,1983). Nessa perspectiva, a vida cotidiana ganha destaque

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e com ela a possibilidade de investimento na sociabilidade, na ampliação dos laços

em direção ao espaço público.

De acordo com Melucci (2001) é a voluntariedade do vínculo social na qual a

ação voluntária está inserida, define essa ação como categoria sociológica. Quatro

características estão inseridas, são elas: adesão livre, solidariedade coletiva,

pertencimento de uma rede de relações e gratuidade aos serviços oferecidos. Se as

vantagens econômicas não estão em jogo, outros benefícios se fazem presentes:

vantagens simbólicas, prestígio, autoestima, poder de qualquer forma de intercâmbio

social. Para o autor, o altruísmo social é também uma marca forte da ação

voluntária, não só na prestação de um serviço, distribuição de um bem a outros, mas

principalmente pela função dos serviços por parte dos destinatários.

No que se refere à solidariedade essa se torna uma categoria chave do

imaginário moderno e se relaciona à temática da doação voluntária de medula

óssea. A mesma aparece ancorada em valores presentes no ideário da pessoa

moderna, e que não se esgotam em uma visão utilitarista de custo/benefício. Quais

sejam os valores que possibilitam o reconhecimento, o pertencimento no interior

dessa dimensão (MOREIRA, 2005).

Segundo Domingues (2002), a solidariedade remete aos processos sociais

específicos, definindo estratégias de reconhecimento e pertencimento de indivíduos

e coletividades a um todo mais inclusivo. Para o autor tanto a solidariedade quanto a

liberdade, a igualdade e a responsabilidade, se concretizam com categorias que

organizam o ideário da sociedade moderna. Ainda de acordo com o autor, a

solidariedade ganha contornos de uma categoria que equivale à integração social ou

sistêmica, englobando tanto as relações entre indivíduos, quanto coletividades,

estendida em todos os domínios da vida social, em sua concretude nos laços, sejam

eles familiares ou não, na cidadania, na política social, na nação e na classe.

A maioria dos doadores pode estar nesta categoria, por não ter alguma relação

com as pessoas que precisam receber transplante de medula óssea. Essa relação

pode estar tanto nos laços a um desconhecido, como nos de amizade, assim como

no biológico. Doar, visando à necessidade do próximo, ou a de um parente ou

amigo, pode constituir o início de um processo onde a doação para estas pessoas

depende das relações de proximidade entre doadores e receptores e por isso pode

ser garantida a doação aos pacientes que estão precisando do transplante. É

interessante observar a manutenção de atitudes positivas em relação à população

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que possibilite os grupos sociais a se organizarem no seu dia-a-dia, orientando,

assim, condutas e comportamentos em suas ações.

Ao examinar as formas de circulação dos bens em diferentes sociedades,

Mauss se dedicou a compreender o caráter livre e gratuito, mas ao mesmo tempo

obrigatório e interessado, dos atos de dar, receber e retribuir. No encadeamento

dessas operações, reconheceu o fundamento dos vínculos entre os sujeitos.5 Para

ele, o que funda a sociedade não é a submissão que dá origem ao Estado, mas o

estabelecimento de uma forma de relação, na qual os homens podem "opor-se sem

massacrar-se" (MAUSS, 1974, p. 45).

3.4 A Doação de Medula no Contexto da Antropologia da Saúde

De acordo com Kleinman (1980) há quatro abordagens de saúde expostas na

literatura: são elas racional, aplicada, ecológica e interpretativa. Nesta investigação

utilizaremos a quarta derivada da antropologia interpretativa cujo objetivo é trazer

novos horizontes à biomedicina no que se refere aos conceitos saúde e doença. No

centro das abordagens está a relação entre cultura e doença.

Quando acontece, um evento na vida do indivíduo, seja ele bom ou ruim, sendo

este último, por exemplo, uma doença, este busca explicá-lo, procurando suas

causas para compreender e enfrentar esse fenômeno. A maneira como o individuo

reagirá ao problema é influenciada pela cultura (ADAM; HERZLICH, 2001).

Esses autores dizem que cada sociedade organiza-se diferentemente com

relação a crenças e atitudes diante da vida. Por isso, se muito ou pouca importância

a um fenômeno, como por exemplo, uma doença, dependendo do significado que

ela representa para a sociedade.

Acrescentamos (SILVA, 2001, p. 32) que aborda os aspectos da realidade

social e as questões de saúde dizendo que“ portanto, é na realidade social, mutante

e dinâmica que são construídas as doenças, seus processos de tratamento e cura.

As questões de saúde não acontecem de maneira separadas dos demais aspectos

da vida de uma pessoa e da sociedade, fazem parte de contexto sócio cultural.

5 Refutando a noção corrente de uma economia natural supostamente baseada na maximização dos interesses individuais, Mauss (1974) colocou em destaque o entrelaçamento entre fenômenos econômicos, morais, estéticos, religiosos e jurídicos no seio de prestações e contraprestações que se apresentam preferencialmente como atos voluntários, mas nos quais se entrevê a força obrigatória do dever, "sob pena de guerra privada ou pública" (p. 45).

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3.5 O Corpo na Doação de Medula Óssea Como um Fato Social Total

Na contemporaneidade o corpo é visto como uma matéria a ser modelada, está

sempre em evidência e é constantemente redescoberto, porém nunca totalmente

revelado. As acções se voltam para o corpo com o objectivo de conhecê-lo, dominá-

lo, de ultrapassar seus limites e alcançar algo mais, como por exemplo: mais saúde,

produtividade, melhor performance e qualidade de vida.

A partir dos anos de 1960, o culto ao corpo convive, ao mesmo tempo, com

imagens da violência a ele imposto no quotidiano, além do crescente comércio

internacional de suas partes, incluindo órgãos, células e genes. De acordo com

Santana, o corpo passou a ser o lugar preferido para a descoberta de si, em que

acções corporais passam a desempenhar um papel fundamental, como uma

necessidade básica. Ainda de acordo com o pensamento do autor as asceses

corporais praticadas na antiguidade configuram-se como práticas de liberdade, em

que os indivíduos almejam não apenas a saúde do corpo, mas também da alma,

visando superação, transcendência e sabedoria.

Diferentemente destas, as asceses praticadas na atualidade chamadas pelo

autor de bioasceses, privilegiam o corpo. Os indivíduos se submetem a esse

processo na busca pelo aperfeiçoamento constante do corpo e nesta acção a saúde

passa a ser objecto em si, ou seja, passou a ser a verdade e também a utopia do

corpo.

Outra característica evidenciada na atualidade é a visibilidade dada a esse

corpo, que está cada vez mais a mostra, não apenas em sua superfície segundo

padrões estéticos, mas também na sua interioridade por meio das técnicas de

imageamento corporal e de monitoramento de suas estruturas internas,

possibilitando assim, um maior controlo sobre o corpo. Também na arte as imagens

corporais têm sido exploradas como ferramentas para a intervenção artística.

As possibilidades tecnológicas no século XX apontam para o surgimento de

uma nova sensibilidade do corpo, para possibilidades de transformação e controlo

desse espaço interno, um espaço de exploração e conhecimento sobre o corpo.

O avanço das tecnologias médicas de imageamento corporal tem possibilitado

o que é chamado por Santana de colonização do interior do corpo. O autor atribui o

fim das ideologias colectivas como uma das possíveis causas da centralidade do

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corpo na actualidade, em que este passa a ser a única possibilidade de

transformação.

É em Lévi Strauss que encontramos para alocar um conceito ou uma noção

que pudesse determinar certo objeto em outro objeto.Na introdução a obra de

Marcel Mauss (2003,p.42), o autor ressalta a existência de um excedente de

significados. Menciona que o conceito de coisa, este se torna flutuante à espera de

um significado ao vincular-se. É neste sentido que correndo aos excedentes de

significantes, encontramos o conceito de coisa, e o uso para definir corpo.

O corpo não é captado pela inteligência pura.Parece sempre ser necessário

recorrer as experiências pessoais e modos de vida particulares para refletir a

questão.Neste sentido, o corpo não é inerte. É um dado histórico, expressivo e

modificado, portanto técnico.

A noção de técnica confere ao corpo uma forma social. Quando Marcel Mauss,

em seu livro técnicas corporais, de 1934, propõe tratamento como objeto

comunicativo, através da técnica corporal. A inserção da dimensão social no trato

com o corpo é um exemplo do trabalho de Mauss, que não deixa lacunas ao ir

adiante com a proposição de, além de constituir um fato social total.

A noção do corpo como fato social total eleva o status de instrumento completo

de análise de uma dada sociedade, de maneira que as investigações sociais e

culturais do corpo, em que as Ciências Sociais devem ter como objeto de análise,

além da dimensão de uma apreensão às dimensões simbólicas.Todos esses

patamares, de apreensão do social necessitam girar em torno de uma experiência

concreta em uma dada sociedade localizada tempo-espacialmente, e também em

um indivíduo e em grupo de indivíduos dessa sociedade.

Neste sentido os participantes passam a ser elementos de articulação da

comunidade, fortalecendo a coesão social, e fomentando, inclusive bases religiosas.

Para isso convém lembrar que a medula óssea enquanto objeto doado para o

transplante carrega além de sua constituição genética e sua capacidade fisiológica,

o poder e a força de reviver o receptor. Tanto o doador como o receptor sabem

disso. A medula doada encontra-se vinculada, o doador traduz vida e que parte do

seu corpo será introjetado no receptor.

Na perspectiva filosófica a afirmação do eu revela a afirmação de uma

realidade implícita em cada um, seja ela íntima e pessoal que caracteriza o ser

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humano. Ou seja, o Eu como afirmação do que é pessoal, é o vetor fundamental

para a personalidade de cada um, única e irrepetível.

É esta especificidade que há em cada ser humano que desencadeia uma

preocupação sobre o sentido da vida, consiste numa perspectiva espontânea e

imediata anterior a reflexão filosófica.Trata-se de uma preocupação anterior e é

intrínseca a cada um de nós; numa interpretação singular e individual da experiência

vivida. Essa preocupação é entendida como uma perspectiva natural pelo modo

como a pessoa exprime o que viveu, sua experiência pessoal, procura um sentido

par o que lhe aconteceu e experimentou. Essa determinação sobre a existência

humana surge naturalmente como uma necessidade elementar da pessoa, não só

de compreender a si mesmo, como também de criar alternativas que permitam o seu

num tempo e espaços determinados.

De acordo com Bernard Groethwysen a reflexão para si pode significar duas

coisas, conforme o homem se atenha ao que lhe aconteceu na vida e queira

representar-se a si próprio, ou a vida e mesmo se torne para si um problema de

conhecimento. A segunda perspectiva fundamentada numa reflexão teórica, na

filosofia e procura especificamente definir a essência de pessoa, mas com o

conhecimento sobre a própria vida, encontrando na filosofia os fundamentos para

uma reflexão elaborada sobre o homem e aquilo que é especificamente humano.

Assim a reflexão filosófica exige uma precisão da linguagem e dos conceitos e

utilizados, de maneira a esclarecer o pensamento sobre o humano e sobre a

realidade existencial que o rodeia. Neste sentido, importa fazer a distinção

conceitual entre o que se entende por “ser humano e pessoa”.

Se, na prática, ambos os conceitos se referem ao mesmo tempo sujeito, o

sujeito humano, na teoria podem distinguir-se de acordo com Lucien Séve, o ser

humano tem como ponto de partida a humanidade com espécie biológica. A pessoa

num sentido completamente diferente: pelo fato de tomar a realidade como ideal

regulador. No ser humano, a humanidade está presente a título de facto. Na pessoa,

ela está representada como um valor. E é esta representação que constitui a

consciência moral. A noção de ser humano completa uma perspectiva biológica e

está associada ao ser natural, ao indivíduo que pertence a uma determinada

espécie. Ao contrário a noção de pessoa assume uma dimensão mais complexa no

seio do pensamento filosófico procurando desvendar o sentido da sua

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individualidade no seio da humanidade, na qual a sua espiritualidade se revela como

uma categoria determinante.

Deste modo, a noção de pessoa destaca-se na atualidade do pensamento

filosófico e sua teorização tornou-se fundamental, alargando-se o seu debate para

além da reflexão puramente filosófica. O debate em torno do conceito pessoa

tornou-se necessário em outras áreas do saber, especificamente naquelas que

intervêm directamente no desenvolvimento natural da vida humana. É neste ponto

que se dá o cruzamento da filosofia e das ciências biológicas, que colocam

gradualmente novos desafios sobre a vida humana e a sua possível artificialização.

Deste cruzamento emerge a reflexão ética aplicada a vida enquanto reguladora dos

alcances e limites da aplicação das ciências biológicas á vida humana.

A segunda parte dessa reflexão da noção do conceito de pessoa refere-se ao

questionamento sobre a perspectiva mais elaborada por parte da filosofia, e a um

conjunto de visões e concepções sobre a própria realidade que contribuíssem para

compreender a sua essência. Esta multiplicidade de significações foi ganhando ao

longo da história do pensamento antropológico, contribuindo para a determinação do

conceito de pessoa. A antropologia filosófica, entendida como a reflexão sobre si, o

ensaio sempre renomado que o homem faz para chegar a compreensão da

realidade e da noção actual de pessoa.

E sobretudo com o cristianismo que a noção de pessoa irá se estruturar com a

afirmação da criação do homem à imagem e semelhança do seu criador. O homem

é imperfeito na sua plenitude, mas distingue-se dos demais seres pela dimensão

espiritual que o interpela a participar da obra de Deus, numa busca constante do

aperfeiçoamento de si. Esta contribuição do cristianismo é fundamental par a o

enriquecimento da noção de pessoa, uma vez que o horizonte da espiritualidade é

desconhecido na antiguidade grega e, como tal não é teorizado.

A maior contribuição no contexto da modernidade para a noção substancialista

de pessoa é Descartes (1556-1650) com a verdade irredutível da substância

pensante. Ao longo da modernidade, a reflexão em torno da unidade de corpo e

alma é contemplada na tentativa de superar a teoria bi-substancialista do homem

pensado por Descartes. Neste contexto, a filosofia de Gottfried Leibniz (1646-1716),

representa uma contribuição determinante para a tentativa de estreitamento das

relações, e entre corpo e alma, e que integram a sua história metafísica da harmonia

pré-estabelecida.

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Portanto o corpo que é reflexo da sociedade e que articula significados sociais

e não é apenas um receptáculo exclusivamente biológico. O corpo é o primeiro

elemento instrumental e técnico do homem.É necessário que esse instrumento seja

adaptado seja adaptado aos fins mecânicos e quimicos propostos pela natureza e

tal adequação lhe conferida pela sociedade a qual pertence.

A contribuição de Leibniz e que se integrem alma entre a noção de pessoa

torna-se pertinente na medida em que supera a necessidade de justificar a unidade

do humano e de compreende-lo como uma substância única e composta. O

pensamento metafísico de Leibniz marca definitivamente a passagem de concepção

substancial para uma concepção dinâmica de pessoa.

É algo próprio do doador que será cedido. Assim a medula recebida encontra-

se vinculada, primeiro por saber que no objeto doado está contida sua própria vida,

e nada pode ser mais obrigatório do que receber vida, principalmente quando a

morte se faz tão presente. O receptor sabe da virtude que está sendo doada, por se

tratar de vida jamais poderá ser total, de maneira que o receptor sempre será um

devedor.

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4 CAPÍTULO II - A ESTRUTURA E PROCESSO DE DOAÇÃO DE ÓRGÃOS, TECIDOS E CÉLULAS

O presente capítulo apresenta ao leitor de forma sucinta o contexto histórico

em que se deu a construção da trajetória da Política de Transplante de Órgãos e

Tecidos em outros locais, assim como no Brasil, desde a implantação deste

procedimento, passando por diversas modificações até o momento atual. Nossa

intenção, entretanto, não é a mera descrição dos fatos, mas a possibilidade de

despertar no leitor o entendimento de que a realidade não está simplesmente posta,

mas é construída pelos seres humanos nas suas mais diversas relações e que, por

isso mesmo, pode ser modificada.

4.1 Histórico dos Transplantes

O tema transplante de órgãos tem provocado grande impacto no cenário

médico-científico e em toda sociedade não somente a brasileira, pois envolve além

dos aspectos relativos ao avanço da medicina e da alta tecnologia, a questão da

subjetividade humana mobilizando sentimentos e emoções por estar diretamente

relacionada à representação de vida e de morte. A progressiva melhora na

qualidade de vida das pessoas que se submetem ao transplante fez crescer o

número de pacientes a espera desse procedimento. No entanto, vale salientar, que o

transplante só é realizado quando o paciente não tem possibilidade alguma de

melhora através de tratamento médico ou de outra ação terapêutica.

A idealização do transplante de órgãos iniciou-se com as lendas. Com o passar

do tempo, diversos estudos foram realizados referentes à temática, rendendo muitos

prêmios aos seus pesquisadores. A partir de 1960, iniciou-se de fato a prática

corrente de transplantar e, na atualidade, existem mais de um milhão de

transplantados no mundo (MANZONI, 2005). O primeiro transplante humano

realizado com sucesso ocorreu na França em 1906. Porém foi um transplante

cardíaco, realizado na África do Sul, em 1967, o marco na história dos transplantes.

O paciente transplantado era homem e tinha 57 anos, permaneceu com o órgão

recebido por 18 dias, evoluindo a óbito devido a uma infecção e pneumonia. Isso

simbolizou o momento de ligação entre o tipo de óbito e a transplantação. Uma das

histórias mais famosas de transplantes ocorreu ainda na Idade Média, no século III,

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aparentemente o homem havia contraído uma gangrena em uma das pernas, mas

foi salvo pelo transplante do órgão recebido de um escravo que acabara de morrer

(KAUFMANN, 2003).

A evolução da cirurgia vem de épocas remotas, quando em Alexandria eram

realizados os primeiros transplantes para reconstrução de lesões, e o sucesso da

anestesia, foi um dos fatores mais importantes da história na cirurgia (ROSA, 2005).

Os primeiros relatos das práticas de transplantação remontam aos seculos VI e

V a.C., referem-se a cirurgiões indianos que realizariam enxertos de pele. Aponta-se

o principal problema.

Os passos científicos e jurídicos que normalizaram e propôs a morte encefálica

como critério de morte. Em 1968, uma comissão de especialistas americanos

estabeleceu critérios que definiram a morte encefálica, permitindo assim a retirada

de órgãos para fins de transplante. Passadas três décadas e meia em diferentes

culturas, religiões ou países, as crenças no poder científico ainda persistem

(KAUFMANN, 2003).

Assim, os critérios para o diagnóstico de ME estão definidos na Resolução

CFM n 1480/97 (de 8 de agosto de 1997), que conceitua morte como “a parada total

e irreversível das funções encefálicas”. Estabelece ainda os critérios clínicos a

serem seguidos e a necessidade de exame complementar para sua confirmação.

Dentre eles, podemos citar o eletroencefalograma e a pancarotidoangiografia, como

os dois mais utilizados, embora se possam usar o ultrassom transcraniano e outros

métodos radiográficos (CFM, 1997).

4.2 O Cénário do Transplante no Brasil

Durante quase 30 anos, de 1968 a 1997, a atividade de transplante era pouco

regulamentada (normalmente havia regulamentações loco-regionais), e

desenvolvida com bastante informalidade no que diz respeito à inscrição de

receptores, ordem de transplante, retirada de órgãos e nos critérios de distribuição

dos órgãos captados (BRASIL, 2002, p. 7).

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Os transplantes fazem parte das políticas de saúde mais desenvolvidas ao

longo da última década. Em torno de 90% dos transplantes e procedimentos

relacionados são cobertos pelo SUS e a distribuição de órgãos encontra-se sobre o

controle público.

Ilustração 2- Número de transplantes realizados no Brasil em 2012

Fonte: RBT, 2012. Dispinivel em www.abto.org.br

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Os gastos totais em reais com a política de transplantes, onde inclui o

Programa de Captação de Órgãos e Tecidos para transplante, elevaram-se de

pouco mais de 50 milhões de reais em 1995, para em torno de 300 milhões em

2004. Este crescimento foi acompanhado pelo número de transplantes realizados,

embora não com a mesma proporção (NORTEN, 2004).

Vários autores como Barreto (1993), Orlando (2002), Duarte (2006), Boas

(2007), relatam que a maior dificuldade enfrentada no Brasil para a realização de

um transplante é a carência de órgãos, mesmo nos casos em que o órgão é obtido

de um doador vivo.

A falta de informação e o preconceito acabam por limitar o número de

doadores. Ajudar a suprimir a necessidade de órgãos para transplante é uma

responsabilidade social. Neste sentido, existem grupos de sensibilização, cujo

objetivo é esclarecer a população sobre questões relacionadas com a doação de

órgãos e tecidos.

Segundo Garcia (2000), os doadores podem pertencer a uma das categorias

abaixo relacionadas:

Doadores vivos:

Doador relacionado (familiares do receptor do órgão);

Doador não relacionado (doador voluntário sem grau de parentesco com o

recptor).

Doadores falecidos:

São os indivíduos cujos familiares autorizam a captação de órgãos ou tecidos

para transplante, após ter sido diagnosticada a sua morte seja por parada

respiratória ou morte encefálica.

Animais:

Cujos tecidos são utilizados para: as válvulas cardíacas.

Avanços na imunologia e técnicas cirúrgicas têm transformado os transplantes

de órgãos em importante opção terapêutica para a falência orgânica. Como

consequência, tem havido um aumento dramático no número de pacientes à espera

de um órgão, chegando a 70%, na última década (SIMINOFF, 2001).

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Agora é possível que órgãos vitais, como o rim ou o coração, num processo de

falência acelerado e irreversível e em risco eminente de deixarem de funcionar,

podendo provocar a morte da pessoa, sejam substituídos por órgãos em boas

condições, provenientes inicialmente de cadáveres, prolongando o tempo e a

qualidade de vida do receptor. Esta prática constitui indubitavelmente um dos

progressos mais notáveis da medicina no século XX, através dos quais milhares de

vidas são salvas por ano em todo o mundo. Por isso se afirma que a

“transplantação, para além de representar uma possibilidade de salvar vidas e de

proporcionar os melhores resultados em termos de qualidade de vida para os

doentes, reduz significativamente os custos com a saúde em longo prazo”. Em

termos gerais, a transplantação apresenta indicadores de qualidade facilmente

mensuráveis quando comparada com outras terapias como a diálise.

A progressiva melhora na qualidade de vida das pessoas que se submetem ao

transplante fez crescer o número de enfermos a espera desse procedimento. No

entanto, vale salientar, que “o transplante só é realizado quando o paciente não tem

possibilidade alguma de melhora por meio de tratamento médico ou de outra ação

terapêutica.6

Todavia, as doações post mortem e em vida, tema abordado anteriormente,

deixaram de representar um recurso suficiente para responder a todos os doentes

que se encontram em lista de espera. Este cenário tem provocado uma busca

incessante por novas alternativas que procurem satisfazer o elevado número de

candidatos a transplante. Estas alternativas consistem na descoberta ou criação de

novas fontes de órgãos, que não apenas as de proveniência humana, com o objetivo

de aumentar o número de transplantes realizados e dar resposta a todos àqueles

que carecem de um órgão para sobreviver.

Assim, entre as possibilidades exploradas, destaca-se a xenotransplantação

que consiste na utilização de órgãos de animais para transplante em humanos. Para

além do xenotransplante, a criação de órgãos artificiais que substituam os órgãos

doentes representa também uma das alternativas que tem sido procurada como

solução para a penúria de órgãos. Por fim, uma das grandes expectativas da

atualidade, e que deverá vir a assumir uma importância crescente nas terapêuticas

6 Fonte: Instituto Nacional de Câncer – Inca. Disponível em www.inca.gov.br. Acesso em 16/12/2011.

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de transplantação, é a investigação em células tronculares (ou estaminais) e a

exploração das potencialidades da medicina regenerativa.

As novas possibilidades alternativas ao tradicional transplante realizado com

órgãos humanos são hoje um dos campos mais promissores e debatidos no domínio

das terapêuticas de transplantação. Assiste-se, pois, a uma nova fase dos

transplantes, com novos horizontes em investigação.

Com o objetivo de divulgar os resultados de transplantes, anualmente a

Associação Brasileira de transplantes apresenta um documento denominado

Registro Brasileiro de Transplantes. Trata-se de dados fornecidos pelas Centrais de

Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos (CNCDO) do Brasil sobre suas

atividades de captação e transplantes de órgãos e tecidos.

Entretanto, 15 a 30% dessas pessoas em lista de espera para um coração,

fígado ou pulmão acabam falecendo antes de obter o órgão. Estima-se que 1 a 4%

das pessoas que morrem em hospital e de 10 a 15% dos pacientes em unidades de

cuidados intensivos desenvolvem quadro de morte encefálica, sendo portanto,

potenciais doadores (SIMINOF et al, 1995).

Estima-se que, na população mundial exista em torno de 50 doadores por

milhão de pessoas por ano (GORE et al,1991). No Brasil apenas 20% dos potenciais

doadores acabam cedendo seus órgãos. Existe em torno de 3,7 doadores por

milhão de população por ano, mas com grandes disparidades regionais (CAMPOS,

2000).

No entanto, apesar de tantas mudanças, ainda não havia no país, na década

de 1950, uma legislação que regulamentasse a utilização de órgãos e tecidos para

fins terapêuticos, o que tínhamos eram regulamentações regionais destinadas à

inscrição de receptores, número de transplantes e retirada de órgãos e critérios de

destinação e distribuição dos órgãos captados.

4.3 Estrutura Funcional do Transplante no Brasil

Por se tratar de um processo difícil, esta parte do capítulo fala da questão

doação/transplante por estar embasada em leis que garantam o seu funcionamento.

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O Decreto nº 2268 em junho de 1997 regulamentou a Lei nº 9.434 e criou o

Sistema Nacional de Transplantes, responsável pela infraestrutura da notificação de

casos de Morte Encefálica (ME), captação e distribuição de órgãos e tecido, que é

denominado de fila única.

Assim, as leis que regulamentam a política de doação de órgãos e tecidos no

Brasil, têm sofrido, nos últimos 30 anos, uma série de alterações que culminaram

não apenas em uma mudança conceitual mas, sobretudo, definiram as

responsabilidades do estado e dos envolvidos no processo doação/transplante.

Em 1968- Lei nº 5.479 – Atribuiu aos médicos o diagnóstico de morte e a

obtenção de consentimento requerido. Proibia a remoção de órgãos em casos

de crime, mas não havia proibição expressa ao comércio de órgãos ou controle

de doador vivo não aparentado.

Resolução 1.346/91 – O Conselho Federal de Medicina (CFM) regulamenta o

diagnóstico de morte encefálica para pessoas maiores de dois anos exigindo

testes clínicos para identificar a morte encefálica sejam realizados em um

intervalo de seis horas atestados por dois médicos não ligados à equipe de

transplante.

1992- Lei nº 8.489 e Decreto Presidencial nº 879 de 22/07/1993 regulamentam

e revogam a Lei nº 5.479 de 1968, mantendo a maioria dos itens da lei anterior

e incluindo os seguintes tópicos:

Considera como morte encefálica a morte definida pelo CFM e certificada por

médico;

Essa definição de morte encefálica não exclui os outros conceitos ou condições

de morte torna obrigatória a notificação encefálica;

Permitem à pessoa maior de idade e capacitada dispor gratuitamente de

tecidos, órgãos e partes do corpo humano. A doação é limitada a parentes ou

cônjuges, sendo exigida autorização judicial em outras situações.

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O Ministério da Saúde normatiza sobre a organização das Centrais de

Notificação das Secretarias Estaduais de Saúde.

1997 - Lei nº 9.434 – Lei dos Transplantes, no sentido de se pensar uma

Política Nacional de Transplantes. Os principais pontos desta lei foram:

necessidade de consentimento presumido, a distribuição por lista única e as

penalidades para as infrações, sendo inclusive assumida pelo Ministério da

Saúde, via Sistema Único de Saúde (SUS), revelando as possibilidades de o

sistema colocar as práticas da área de saúde em defesa da vida preocupando-

se com a questão ética.

1997 - O decreto nº 2.268/97, regulamenta a Lei nº 9.434, cria também o

Sistema Nacional de Transplantes (SNT) e as Centrais de Notificação,

Captação e Distribuição de Órgãos (CNCDO) no âmbito dos Estados

estabelecendo a forma de distribuição de órgãos e tecidos através das listas de

espera regionalizadas. Esta lei atraiu a atenção de profissionais da saúde, dos

pacientes, da população e da mídia, promovendo grandes debates e

discussões. Anteriormente a publicação desta portaria, cada Estado brasileiro

administrava à sua maneira o processo de doação de órgãos.

1998 - Oficialização da Coordenação do Sistema Nacional de Transplantes

(SNT), e publicações de regulamento técnico e de portarias relativas a diversas

atividades. A lista de espera por tipo de órgão passou a ser organizada com a

criação do Cadastro Técnico Único ou Listas Únicas Estaduais ou

Regionalizadas nos Estados que possuem Centrais Regionais de Transplante.

Em 16 de agosto de 2000, em Brasília, foi realizado um seminário da

Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), onde se reuniram e

aprovaram as seguintes propostas que passaram a vigorar a partir de 1º de

março de 2001. São elas:

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1. Modificação da Lei nº 9.434/97

Retirada da opção de doação de órgãos dos documentos de identidade.

Passaria a prevalecer sempre a vontade da família. Seria criado o Registro

Nacional de Doação de Órgãos e Tecidos.

2. Modificações do Decreto nº 2.268/97

Estabelecer competência ao Sistema Nacional de Transplante (SNT) para

gerenciar o Registro Nacional de Doação de Órgãos e Tecidos;

Possibilitar a realização de perícia médico-legal durante ou imediatamente

após a retirada de órgãos, facilitando a devolução do corpo à família.

3. Modificações na Portaria nº 3.407/98

Possibilitar a criação de Centros de Notificação, Captação e Doação de

Órgãos regionais, para favorecer a descentralização, segundo definição do

gestor estadual e do SNR;

Convocar em parceria com entidades médicas, médicos intensivistas,

neurologistas, neurocirurgiões a participar do esforço de notificação,

avaliação e manutenção de doadores potenciais para transplante;

Tornar obrigatória, através das equipes de transplante, a participação de

todos os hospitais transplantadores, nas atividades de captação,

subordinados às centrais estaduais de transplante;

Favorecer, em parceria com o Ministério da Educação e Cultura (MEC) e o

conjunto de escolas médicas, a inclusão no currículo de medicina, temas

ligados a transplantes, distribuídos ao longo do curso;

Adotar medidas para que a política do Ministério da Saúde em relação a

transplantes seja aplicada de modo uniforme pelos Estados.

A Lei nº 9.434/97, a lei dos transplantes, fez com que a população debatesse a

questão da doação de órgãos e tecidos, a carência de doadores, permitindo assim o

princípio de uma conscientização da sociedade quanto às necessidades e a

importância do transplante para os indivíduos que dele necessitam. Esta lei também

apresentou outro aspecto importante, como a criação do Sistema Nacional de

Transplantes, das Centrais Estaduais das Centrais de Notificações (CNCDO), que

regulamentou o ingresso ao tratamento, através das listas únicas de receptores

estaduais e regionais, em que todos possuem o mesmo direito, prevalecendo à

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ordem de espera presente nas listas. Porém causou polêmica quanto à doação

presumida, que estabelece que toda pessoa é doadora de órgãos, a menos que

expresse vontade contrária no documento de identidade ou na Carteira Nacional de

Habilitação. Com relação à doação de órgãos da própria pessoa em vida, a Lei

dispõe: Diversos são os fatores que restringem a doação de órgãos, segundo

Pestana e Vaz tais fatores são:

“Falta de identificação de um potencial doador, cuidados clínicos adequados com o doador, exame subsidiário confirmatório de morte encefálica, a adequada abordagem aos familiares, a aceitação dos familiares, contato com as equipes de transplantes, retiradas dos órgãos e distribuição dos órgãos doados.” (PESTANA; VAZ, 1994, 235).

Por alterar a forma de consentimento, esta lei provocou grande repercussão na

imprensa nos primeiros meses que entrou em vigor, acarretando polêmica na

população e sendo criticada pela maioria dos representantes de instituições

médicas. Além de que, não foi esclarecido à sociedade o que seria morte encefálica,

ocasionando o medo de facilitarem uma morte para favorecer um receptor,

mantendo dessa forma a população à distância desta problemática.

A situação tornou-se ainda mais confusa com a publicação do Decreto nº

2.170, de 4 de março de 1997, por meio do qual, nas carteiras de habilitação

expedidas pelo Conselho Nacional de Trânsito, haverá a solicitação para que a

pessoa escolha utilizar a anotação de “doador de órgãos ou tecidos” ou de “não

doador”, tornando a escolha obrigatória. Muitas pessoas procuraram os postos de

identificação para definirem-se como “não doadores”. A população foi de fato

surpreendida com a vigência desta lei, embora tenha sido aprovado um ano antes

de vigorar, justamente para que o governo pudesse realizar uma ampla campanha

de esclarecimento e conscientização da população.

“ É permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos, órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuge ou consanguíneos até o quarto grau, inclusive, na forma do § 4º deste artigo, ou em qualquer pessoa, mediante autorização judicial, dispensada esta em relação à medula óssea.” (BRASIL, 2001).

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O que se pretendia com a mudança da doação voluntária para o consentimento

presumido era aumentar o número de doadores de órgãos, uma vez que, devido ao

sucesso cada vez maior nos procedimentos realizados, na fila à espera de um órgão

aumentava consideravelmente. No entanto, o que vimos foi uma população

assustada, procurando os órgãos responsáveis pela emissão dos referidos

documentos, para expressar sua opção por “não doador de órgãos”. Isso se deu por

medo, de que seus órgãos fossem retirados sem seu consentimento em vida, e

ainda por não saber o que aconteceria consigo após sua morte.

Toda essa situação de medo e de desconhecimento acerca da doação ocorreu,

justamente, por não ser passado de forma clara e objetiva para a população, os

procedimentos e a importância dos transplantes. Como nos mostra Agenor Spallini

Ferraz,7 “está lei foi mais uma tentativa equivocada de resolver por meio de uma Lei,

o problema da escassez de doadores no país”. No que diz respeito ao fracasso do

consentimento presumido, Ferraz diz que,

“O maior e mais grave problema para imposição de uma lei de doação presumida no país é o baixo nível cultural de nosso povo. Isto torna as pessoas vítimas ao invés de beneficiárias da Lei. (...) Ela também levanta uma questão ética social, não cogitada pela ética médica: o que acontecerá comigo se ao me declarar não doador, necessitar de um transplante?” (FERRAZ, 2012.)

No Brasil, os transplantes de órgãos iniciaram-se na década de 1960, mas,

segundo o Ministério da Saúde, em razão da baixa sobrevida dos pacientes

transplantados, esse tipo de tratamento pouco se difundiu. No entanto, esta

atividade ganhou importância, após 15 anos, com o desenvolvimento e criação de

técnicas cirúrgicas, equipamentos de suporte, métodos de determinação de

histocompatibilidade entre doador e receptor e, finalmente, dos fármacos

imunossupressores. Por fim, esses procedimentos difundiram-se entre

estabelecimentos hospitalares, aumentando a necessidade de uma regulamentação

para doação e transplante de órgãos (ALCÂNTARA, 1998).

7 FERRAZ, Agenor Spallini. Doação de órgãos para transplante: considerações legais, éticas e sociais. Disponível em <http://www.medilene.com.br>. Acesso em 16 de dezembro de 2012.

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A regulamentação do diagnóstico da morte encefálica (ME), no Brasil, ocorreu

somente em 1991 pelo Conselho Federal de Medicina. A ME é definida como a

situação irreversível das funções respiratória e circulatória ou cessação irreversível

de todas as funções do cérebro, incluindo o tronco cerebral.

O potencial doador de órgãos e tecidos pode ser definido, portanto, como um

paciente com diagnóstico de ME. Quando existe a identificação de um potencial

doador em unidade de terapia intensiva ou pronto-socorro, há obrigatoriedade de

notificação (compulsória) à Central de Notificação, Captação e Distribuição de

Órgãos e Tecidos (CNCDO), descentralizadas em OPOs (Organização de Procura

de Órgãos) (BRASIL, 2009).

Após esta notificação, uma série de ações deve ser realizada para a

manutenção efetiva do doador, viabilizando adequadamente seus órgãos para

transplante. Assim, o conhecimento das alterações fisiológicas que acometem vários

órgãos e sistemas no paciente em condição de ME, pelos profissionais que

trabalham com doação de órgãos e tecidos, é um dos fatores que parece estar

relacionado à melhoria de sobrevida do paciente (receptor) ou enxerto (órgão ou

tecido transplantado).

A desproporção crescente do número de pacientes em lista versus o número

de transplantes é um fato inquestionável, entre os fatores limitantes, estão a não

notificação de pacientes com diagnóstico de morte encefálica às CNCDO, há ainda a

falta de uma política de educação continuada aos profissionais de saúde, quanto ao

processo de doação transplante e de todos os desdobramentos decorrentes do não

conhecimento desse procedimento, além de recusa familiar.

Além disso, podemos identificar uma série de fatores de cunho

sociorganizacionais que contribuem para a limitação no número de doadores, tais

como: a ausência de identificação do potencial doador; a necessidade e realização

do exame complementar confirmatório da ME; inadequada manutenção do potencial

doador. Ainda, percebemos o desconhecimento por grande parte da população

sobre o conceito de ME e de todo o processo de doação e transplante que,

possivelmente, são fatores relevantes ao inexpressivo número de doações no Brasil.

A taxa de doadores falecidos em nosso País, em 2011, foi de 5,05 doadores

pmp/ano (893 doadores efetivos, para população de 176.871.437). (15 e 16) Ao

passo que em países como a Espanha passaram de 14,0 doadores pmp em 1998,

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para 36,5, em 2000, o que transforma esse país em modelo de êxito de uma política

pública em transplante.

Na América Latina, a taxa de potencial doador, é de 40 a 100 pmp/ano, é

similar ao observado nos países desenvolvidos, porém, a taxa de notificação do

potencial doador é de 5 a 25 pmp/ano, e a taxa de doador efetivo é de 2 a 12

pmp/ano.

Nos Estados Unidos da América (USA), de acordo com a Organização

Nacional de Procura de Órgãos (OPTN) para transplante, o número total de

doadores de órgãos aumentou em 78% de 7.092, em 1992, para 12.607, em 2001.

Em 1965, foi realizado o primeiro transplante renal no Brasil no mesmo hospital

citado anteriormente, pela equipe chefiada pelo Dr. José Geraldo Campos Freire e

pelo Dr. Emil Sabaga. O paciente recebeu o rim do irmão e viveu normalmente por

oito anos. Para Garcia (2000), o desenvolvimento e aplicação de transplantes no

tratamento de doenças terminais de alguns órgãos constituem um dos maiores

êxitos na história da medicina, que em poucas décadas evoluiu de um procedimento

arriscado para terapêutica eficaz. Estima-se que, anualmente, cerca de 500 mil

pacientes desenvolvam insuficiência renal crônica, 300 mil insuficiências cardíacas e

200 mil insuficiências hepáticas, provocando assim, uma demanda mundial somente

para esses órgãos, de um milhão de transplantes por ano.

Enquanto que, o primeiro transplante cardíaco foi realizado pelo Dr. Eurípedes

de Jesus Zerbini, em 1967 no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo e

o primeiro transplante de fígado em 1985, realizado pelo Dr. Silvano Raia, na

mesma universidade (FREGONESI, 2001).

Nas últimas décadas, o transplante de órgãos tem atraído opiniões de setores

diversificados da sociedade, e ainda a mídia vem cumprindo importante papel na

ampla divulgação, encarregando-se de democratizar as discussões e informações,

algumas vezes acaloradas e contraditórias, outras esclarecendo ou suscitando

dúvidas e receio nas pessoas. É, portanto um tema de muita relevância social e

como tal tem sido tratada tanto pela sociedade, receptiva aos apelos da

solidariedade na doação de órgãos, como pela saúde pública, por trata-se de um

procedimento de alta complexidade e alto custo, exigindo medidas de planejamento

de políticas públicas e alocação de recursos, critérios éticos e democráticos. Todas

essas políticas têm como objetivo a manutenção e defesa da vida.

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Atualmente vigora no Brasil a Lei de doação de órgãos e tecidos de número

9.434, de 04 de fevereiro de 1997, também conhecida como a lei dos transplantes,

dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de

transplante e tratamento e dá outras providências.

Com as regulamentações fortalecendo e criando condições para as atividades

de doação e transplante, iniciou-se crescimento importante dos centros

transplantadores em quase todas as regiões do País.

Existem, no Brasil, 148 centros cadastrados para transplante renal, 34 para

transplante cardíaco, 48 para transplante hepático, 5 para transplante de pâncreas,

18 para transplante conjugado pâncreas/rim e seis para transplante pulmonar.

Quando tratamos do enxerto de tecidos, observamos que existem 139 centros

cadastrados para córnea, 43 para medula óssea e seis para transplante ósseo. Isso

resulta em um total de 448 centros transplantadores cadastrados, com 403 ativos no

último ano, correspondente ao período de 1 de janeiro de 2011 a 31 de dezembro de

2011.

4.4 Falando sobre o Transplante de Células-tronco Hematopoiéticas (TCTH)

Este tópico do capítulo aborda uma visão geral da hematopoese, aspectos da

etiologia e fisiopatologia. Segundo Ortega (2004), o processo de formação das

células sanguíneas é chamado de hematopoese. Ou seja, um pequeno grupo de

células-tronco é responsável por produzir todos os constituintes celulares da medula

óssea, por meio do processo de diferenciação e maturação celular.

A célula-tronco é uma célula com capacidade de autorreplicação, isto é, com

capacidade de gerar uma cópia idêntica a si mesma e com potencial de diferenciar-

se em vários tecidos. Elas são classificadas em totipotentes, quando são capazes de

diferenciar-se em todos os 216 tecidos, que estruturam o corpo humano, incluindo a

placenta e os anexos embrionários; as pluripotentes ou multipotentes, quando são

capazes de diferenciar-se em quase todos os tecidos humanos, excluindo a placenta

e os anexos embrionários; oligopotentes, quando não são capazes de diferenciar em

muitos tecidos; e, a unipotente, quando se diferencia somente num único tipo de

tecido (OTTO, 2000).

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Em relação à natureza, podem ser embrionárias ou adultas. As embrionárias

são encontradas nos embriões humanos e são classificadas em totipotentes ou

pluripotentes; as adultas são encontradas, principalmente na medula óssea, sangue

periférico, cordão umbilical, placenta e fígado (OTTO, 2000).

Então, as células-tronco hematopoiéticas são células adultas com capacidade

de diferenciação e podem ser encontradas tanto na medula óssea, quanto no

sangue periférico. A mesma também é conhecida como stem cell e pode ser

definida como uma célula com grande capacidade de autorrenovação e potencial

proliferativo, o que possibilita a sua diferenciação em células progenitoras de todas

as linhagens sanguíneas e a reconstituição da população hematopoiética, a partir de

uma única célula. Constituem de 0,05% a 0,1% da medula óssea humana e das

células hematopoiéticas circulantes. O enxerto usado no TCTH possui células

progenitoras hematopoiéticas imaturas e mais maduras, incluindo as células-tronco

com capacidade de renovação (DEVETTEN, 2007).

Assim a medula óssea pode ser definida como um tecido esponjoso existente

na cavidade dos ossos, rico em células progenitoras ou stem cell , que são células

mais diferenciadas (ver figura 1).

Sabe-se que as células do estroma da medula óssea são importantes para o

desenvolvimento das células iniciadoras de cultura de longa duração, que são vitais

para manter e controlar as atividades das células-tronco hematopoiéticas

(DEXTER,1979; DEVETTEN, 2007).

As projenitoras mieloide originou os eritrócitos, as plaquetas, os glóbulos

brancos (neutrófilos, eosinófilos, basófilos, mastócitos e os monócitos. O projenitor

origina os linfócitos T e B e as células natural Killer. Na figura baixo apresentamos o

processo de formação das células sanguíneas e sua diferenciação a partir das

células-tronco hematopoiéticas.Ver a localização da medula óssea e sua produção

celular.

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Figura 1- Localização da medula óssea e sua produção celular

Fonte: Ameo (2008).

Fonte: Ameo (2008).

Figura 2- Medula óssea e sua diferenciação celular.

Fonte: Ameo (2008).

Na maioria dos serviços e mesmo na literatura é utilizado o termo transplante

de medula óssea (TMO), a taxonomia adequada é transplante de células – tronco

hematopoiéticas (GULATI, YAHALOM, PORTLOCK, 1991; MASSUMOTO, 2000).

Recentemente observa-se uma preocupação do Ministério da Saúde em

normatizar a política de transplante de medula óssea, através da Portaria nº 931, de

02 de maio de 2006, aprova o Regulamento Técnico para Transplante de Células-

tronco Hematopoiéticas. Estabelecendo a regulamentação e os critérios técnicos de

indicação dos TCTH e outros precursores hematopoiéticos. Também estabelece as

normas para autorização, funcionamento e renovações de estabelecimentos de

saúde/equipes para a realização de transplantes de células--tronco hematopoiéticas

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e também, para credenciamento/habilitação no âmbito do Sistema Único de Saúde

(BRASIL, 2007b).

Segundo a Portaria nº 931 do Ministério da saúde ficou denominado:

Transplante de Células-tronco Hematopoiéticas – TCTH, que se subdivide em:

• TCTH de Medula Óssea - Substituição de células-tronco hematopoiéticas a

partir de células-tronco hematopoiéticas normais obtidas de medula óssea, com

o objetivo de normalizar a Hematopoiese;

• TCTH de Sangue Periférico - Substituição de células-tronco hematopoiéticas

a partir de células-tronco hematopoéticas normais obtidas após mobilização

para o sangue periférico, com o objetivo de normalizar a hematopoiese;

• TCTH de Sangue de Cordão Umbilical - Substituição de células-tronco

hematopoiéticas a partir de células-tronco hematopoiéticas normais obtidas de

sangue de cordão umbilical, com o objetivo de normalizar a hematopoiese;

• TCTH Autólogo - Quando as células-tronco hematopoiéticas provêm da

medula óssea ou do sangue periférico do próprio indivíduo a ser transplantado

(receptor);

• TCTH Alogênico - Quando as células-tronco hematopoiéticas provêm da

medula óssea, do sangue periférico ou do sangue de cordão umbilical de um

outro indivíduo (doador);

• TCTH alogênico aparentado - Quando o receptor e o doador são

consanguíneos;

• TCTH alogênico não aparentado - Quando o receptor e o doador não são

consanguíneos;

• TCTH com mieloablação - Transplante convencional alogênico para o qual se

utilizam altas doses de agentes citotóxicos no condicionamento pré-transplante,

com o objetivo de destruição completa da medula óssea do receptor, antes da

infusão de células tronco Hematopoiéticas obtidas do doador;

• TCTH sem mieloablação - Quando se minimiza a intensidade ablativa do

tratamento com agentes citotóxicos do receptor pré-infusão das células-tronco

do doador (BRASIL, 2007b).

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No dia 12 de setembro de 2007 fez 50 anos do relato publicado no periódico

New England Medicine de uma nova abordagem para o tratamento do câncer, que

era a utilização da infusão de medula óssea por via endovenosa em pacientes

submetidos à quimioterapia e radioterapia pelo médico E. Donall Thomas

(APPELBAUM, 2007).

Outras tentativas de transplante alogênico, realizadas em algumas vítimas de

um acidente com reator nuclear, pelo grupo de pesquisadores coordenados por

George Mathé, os pacientes também foram a óbito pelas complicações decorrentes

do transplante.

Este grupo foi pioneiro no desenvolvimento do transplante de medula clínico,

descrevendo a técnica de infusão venosa de medula óssea idêntica. Em 1958, seis

físicos foram expostos acidentalmente a doses de irradiação entre 600 e 1000 rads.

Eles foram tratados com infusão de células de medula óssea alogênica.

McFarland, em 1961 foi o primeiro a identificar que o condicionamento pré-

transplante de medula óssea era importante para a recuperação da nova medula e

nos casos de leucemia, para a erradicação da doença. Thomas começou a realizar

experiências com cães. Ele descobriu que a maioria dos cães, que foram

submetidos a irradiação corporal total e infusão de medula tinham os mesmos

problemas que os seres humanos, incluindo a rejeição do enxerto, com a doença do

enxerto versus hospedeiro, e a morte por infecção oportunista. No entanto, um cão

teve uma boa sobrevida e Thomas concluiu que foi devido a escolha do doador certo

(APPELBAUM, 2007; MASSUMOTO, 2007).

No final dos anos 1960, o transplante de medula começou a ser realizado

somente quando havia irmãos HLA compatíveis (antígeno leucocitário humano),

melhorando a qualidade e a perspetival de vida dos pacientes. Concomitante com o

aperfeiçoamento na coleta de plaquetas e, no aprimoramento dos equipamentos

para aférese. Desenvolve-se a qualidade dos testes de histocompatibilidade, bem

como o estudo na área do controle das infecções, possibilitando uma maior

sobrevida ao paciente.

Após esta experiência em 1969 começaram os ensaios clínicos de transplante

de medula alogênico entre irmãos. Os primeiros pacientes tinham leucemia em

estágio avançado. Havia a necessidade do acesso endovenoso seguro e Robert

Hickman desenvolve um cateter venoso, que até hoje é utilizado tanto para a coleta

das células progenitoras no sangue periférico, como para a infusão da medula.

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Também foi aperfeiçoada a coleta de plaquetas, com as máquinas de aférese

(MERCÊS, 2009).

Em 1972, houve o primeiro caso bem-sucedido do transplante alogênico na

anemia aplástica. Em 1979, inicia-se os relatos de taxa de cura acima de 50% com

transplante nas leucemias mielóides aguda, que estavam em remissão

(APPELBAUM, 2007).

O grupo de Seattle realizou o primeiro transplante bem-sucedido em um

paciente com leucemia, de um doador não aparentado, o que contribuiu para

estimular a formação do Nacional Marrow Donor Program e o cadastro de mais de

11 milhões de doadores voluntários.

A partir de 1984 o transplante de células-tronco hematopoiéticas começou a

apresentar bons resultados, com diminuição da mortalidade. Principalmente na

década de 1990 começou-se a ser realizado o transplante autogênico em pacientes

onco-hematológicos, permitindo a utilização de doses supraletais de quimioterapia e

radioterapia, potencialmente curativa com o resgate medular pela reinfusão da

medula previamente coletada do próprio paciente.

Estes avanços, juntamente com a utilização do cordão umbilical e placentário

como uma fonte das células-tronco hematopoiéticas, vêm possibilitando novas

investigações clínicas. O transplante com o desenvolvimento de protocolos de

condicionamento mais seguros para erradicar o câncer, tem aumentado a chance de

pega e repovoamento medular, bem como a profilaxia da doença do enxerto contra

o hospedeiro, e as medidas para prevenir as infecções oportunistas (APPELBAUM,

2007; THOMAS, 2000).

O início do transplante de medula óssea, em nosso país ocorreu no final da

década de 1970 com o grupo liderado por Ricardo Pasquini no Hospital das Clínicas

da Universidade Federal do Paraná. Este grupo foi o pioneiro e em 1979 realizou o

primeiro transplante no Brasil. Outras unidades de TMO foram sendo criadas como a

do Instituto Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro, em 1983, da Faculdade de

Medicina da Universidade de São Paulo, em 1988 (DULLEY, 1996). Em 1992, foi

inaugurado no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de

São Paulo, em Ribeirão Preto (VOLTARELLI, 2000).

Essa terapêutica evolui muito nas últimas décadas, deixando de ser um

tratamento experimental para torna-se uma cura de fato para o paciente. Nos

últimos anos o TCTH é utilizado no tratamento de doenças hematológicas, malignas,

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imunodeficiências, erros inatos ao metabolismo e tumores sólidos (PASQUINI,

2001).

A fase de condicionamento é responsável por destruir totalmente as células

sanguíneas localizadas na medula óssea. Tem como objetivo prepará-la para

receber as células sadias de um doador previamente selecionados ou do próprio

paciente.

A fase que se segue chama-se infusão das células, é o momento mais especial

tanto a equipe de saúde como para o paciente e sua família, pois é a chance que

tem para obter a cura da doença com o restabelecumento da hematopoese.

Em sequência tem-se o período de aplasia medular. É o período em que o

organismo manifesta os primeiros sinais de enxertia das células infundidas. Neste

período, o paciente está exposto às consequências causadas por severos prejuízos

imunológicos, distúrbios de sangramentos, anemias, infecções e outras

complicações potencialmente fatais, que são: a Doença do Enxerto contra o

hospedeiro (DECH) e a Síndrome de Obstrução Sinucoidal (SOS). Quanto menos

complicações o paciente apresentar durante a fase de aplasia medular, menos será

o tempo de internação (CAETANO, 2009).

O Decreto determinava ainda a criação do Sistema Nacional de Transplante –

SNT, órgão responsável pela captação e distribuição de órgãos, tecidos e partes do

corpo humano retiradas para fins de tratamento cabendo ao Ministério da Saúde a

função de Órgão Central. Foram criadas ainda as Centrais de Notificação, Captação

e Distribuição de Órgãos (CNCDO), que serão as unidades executoras das

atividades do SNT, tanto a nível municipal quanto eestadual. De acordo com a

Portaria nº 1315/2000, Art 2º:

Todas as informações colhidas são repassadas para o SNT, para organização

da Lista Nacional. As CNCDO são responsáveis também, pelo transporte de órgãos,

tecidos e partes para o estabelecimento em que se encontra o receptor. E ainda,

fiscalizar, suspender e punir estabelecimentos e equipes especializadas que venham

a infringir a lei. Em cada estado do País, todos os indicados ao transplante de

tecidos e órgãos são inscritos em um programa informatizado do SNT, contido nos

computadores de cada central estadual, formando a lista nacional de receptores.

Vale lembrar que não é permitida a inscrição em dois centros.

No ano de 1999 foi criado o Fundo de Ações Estratégias e de Compensação e

todo o financiamento de transplantes foi incluído nele, dessa forma todos os

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procedimentos de transplantes passaram a ser financiado pelo MS, desonerando,

assim, os tetos financeiros dos municípios e Estados e aumentando o número de

transplantes realizados.

Em 24 de março de 2001, entra em vigor a Lei nº 10.211, que revoga o artigo

4º da Lei 9.434/97, tornando novamente, valida a vontade do cônjuge ou parente de

até segundo grau, do doador morto, firmada em documento mediante a presença de

duas testemunhas. Está Lei ainda permite a doação intervivos entre quaisquer

pessoas e não apenas entre parentes. A seleção dos possíveis receptores é feita

através do programa, considerando os seguintes critérios:

Grupo sanguíneo (O, A, B, AB);

Idade, peso e altura do doador;

O tempo de espera para o transplante;

Compatibilidade HLA (tecido imunologicamente compatível), no caso de

transplante de rim, quando disponível. No caso de empate, o critério de

desempate é pelo tempo de espera, idade, painel de reatividade e

urgência.8

Se o primeiro da fila não receber o órgão, ele não perde sua colocação, que

continua reservado. Contudo, a equipe de transplante terá que explicar os motivos

ao Ministério Público. A Central Nacional de Transplantes (CNT), ainda no ano de

2001, assinou um termo de cooperação com 15 empresas aéreas do País, visando o

transporte gratuito de órgãos e de equipes médicas, quando necessário, para

retirada destes. E ainda foi incluída na tabela de procedimentos do SUS a retirada

de parte do fígado de doadores vivos e de transplante de fígado intervivos.

Embora, tenhamos um considerável número de doadores de órgãos e tecidos

cadastrados na CNT, ainda existem dificuldades para atender a toda demanda a

espera de transplante. Sendo necessário recorrer aos bancos internacionais de

doadores, especialmente, de medula óssea.Podemos observar que houve um

grande avanço, não só nos procedimentos tecnológicos, mas nas políticas e

legislações que envolvem essa questão. Porém muito ainda deve ser avaliado,

especialmente, no que diz respeito aos critérios de escolha do paciente para

transplante.

8 COMO FUNCIONA A “FILA DE ESPERA”. Disponível em

http://www.roche.com.br/therapeuticAreas/trasnplantes/fila_unica/default_PT.htm?htmlpage1pager=3. Acesso em 28/12/2011.

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O transplante de órgãos assinala um avanço médico-cirúrgico, em diversas

áreas, mas impõe a necessidade de garantir, a seus transplantados, o direito de

proteção à integridade física e de igualdade. A Constituição Federal, em seu artigo

196 assegura que: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido

mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e

de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua

promoção, proteção e recuperação (CF, 1988).”

Desde seu período inicial até os dias atuais, está atividade se desenvolveu

bastante em termos de técnicas, resultados, variedade de órgãos transplantados,

número de procedimentos realizados e legislação. No entanto, muito ainda deve ser

feito para que possamos conscientizar a população acerca de seus benefícios e

assegurar um tratamento igualitário para todos.

4.5 Transplante de Medula Óssea: considerações gerais

A medula óssea é um tecido líquido que ocupa o interior dos ossos longos,

tendo a função de produzir três tipos de células sanguíneas: as hemácias são

células que carregam a hemoglobina, responsável pelo transporte do oxigênio dos

pulmões para os tecidos e de dióxido de carbono dos tecidos para os pulmões; os

leucócitos são os principais componentes do sistema imunológico, tem como

objetivo defender o organismo contra infecções e as plaquetas, são células que

contribuem na prevenção de hemorragias, compondo o sistema de coagulação do

sangue, a diminuição do seu número pode provocar sangramentos.

Segundo Pasquini e Ferreira (1996), o TMO é um procedimento terapêutico

consiste na infusão, por via intravenosa de sangue de medula óssea obtida de

doador previamente selecionado, em receptor adequadamente condicionado. Sua

finalidade é substituir tecido e órgãos irremediavelmente lesados devido a doenças

ou traumatismos, possibilitando a substituição de estruturas do corpo definitivamente

lesadas. O desenvolvimento deste procedimento é considerado um dos pontos de

maior êxito da história da medicina, pois aumentam as expectativas de vida dos

pacientes portadores de tecidos e órgãos considerados funcionalmente insuficientes

e não respondem aos tratamentos clínicos aplicados aos doentes, que levam a um

dispêndio de tempo nos serviços, e ainda não impedem que intercorrências os

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levem aos freqüentes internamentos hospitalares. Os transplantes são realizados

em unidades de saúde da maioria das capitais brasileiras.

Em 1888, Paull Ehrlich descreveu a morte de uma mulher jovem após doença

aguda caracterizada por anemia grave, sangramento de pele e retina, e febre alta. A

primeira tentativa de realização do transplante de medula óssea ocorreu em 1939,

nos Estados Unidos, com o intuito tratar um paciente com anemia aplástica induzida

por sais de ouro, utilizando como doador de medula óssea, um indivíduo ABO

compatível. Segundo Corcoran et al 1989; Deeg H. et al 1992; Schryber 1987 a

medula óssea já era utilizada como nutrição oral para tratamento de várias formas

de anemia e leucemia. Somente a partir de 1930, iniciaram as experiências de

medula por infusões intramedular e intravenosa. Pesquisas referentes ao TMO

abordaram a toxidade da radioterapia corporal total em várias dosagens aplicadas

em ratos, cachorros e macacos (SANTOS, 1983; BENJAMIM, 1995).

Em meados de 1930, ocorreu a primeira tentativa de transplante alogênico de

medula óssea, em um paciente portador de aplasia (OSGOOD et al, 1939). Na

ausência de conhecimento sobre antígenos humanos relacionados ao transplante e

células progenitoras hematopoéticas, essas tentativas foram condenadas ao

fracasso. Entretanto, com a persistência de investigadores clínicos, e com o advento

de novos conhecimentos sobre o sistema imune e hematopoético, o primeiro TMO

alogênico foi realizado com sucesso no final da década de 1960 (THOMAS; STORB,

1970).

O início do desenvolvimento das bases científicas atuais do TMO ocorreu por

meio de experiências com roedores, que após serem submetidos à radiação em

doses letais, sobreviviam ao receber infusão posterior intravenosa de medula óssea

(LORENZ, 1951). Experimentos bem-sucedidos com cães aconteceram durante as

décadas de 1950 e 1960, quando os animais recebiam doses mieloblativas de

irradiação corporal total, seguidas da infusão da medula de doadores aparentados

(TOMAS 1962; EPESTEIN, 1967). Os estudos com cães foi o principal modelo para

o desenvolvimento de TMO em humanos. A identificação do sistema de

histocompatibilidade humano contribuiu de forma decisiva para o sucesso dos

transplantes (DAUSSET, 1958).

O TMO evoluiu bastante nos últimos 50 anos desde os trabalhos pioneiros de

Jacobson et al (1949) com camundongos. As primeiras tentativas para replicar as

observações laboratoriais e os estudos experimentais tiveram pouco sucesso.

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Posteriormente, houve a identificação da complexidade e polimorfismo do sistema

HLA (Human Leucocyte Antigen). Estes estudos permitiram selecionar, como

doadores, irmãos compatíveis e, mais recentemente, doadores não aparentados.

Este tipo de transplante tem indicação nas doenças em que existe uma falência

do sistema hematopoético, seja por infiltração de células leucêmicas na Medula

Óssea, seja por doenças que alterem a produção dos constituintes sanguíneos.

Também apresenta indicação nas doenças que comprometem severamente o

sistema imunológico e nos tumores sólidos em que as doses de quimioterápicos

necessárias para o tratamento, possam comprometer o sistema hematopoético de

maneira irreversível.

É atualmente o tratamento de escolha para várias doenças hematológicas

incluindo as anemias e leucemias,9 mielomas, assim como as doenças genéticas,

imunodeficiências e auto-imunes. Atualmente o transplante de medula óssea é uma

das modalidades terapêuticas mais utilizadas na oncologia, seja em adultos ou

crianças, nas doenças hematológicas, congênitas e hereditárias. O número de

centros especializados em TMO e a frequência de tal procedimento apresentaram

um exponencial nas duas últimas décadas. Apesar de ser um tratamento complexo

e está associado à alta morbi-mortalidade, consegue curar e prolongar

significativamente a sobrevida dos doentes (ANDERS et al, 2004).

Sua indicação se baseia em alguns princípios, tais como: recuperação da

função medular em doenças caracterizadas pela redução acentuada ou inexistência

de precursores hematopoéticos, como no caso da anemia aplástica; a recuperação

da hematopoese após utilização de doses supraletais de agentes quimioterápicos,

associados ou não a radioterapia, o tratamento das neoplasias como as leucemias,

e a implantação de células capazes de sintetizar enzimas deficientes em

determinadas doenças genéticas.

Castro Jr; Gregianim; Brunetto (2001) ressaltam que a doença por si só, não é

determinante para a realização do transplante, uma vez que consideram a existência

de algumas condições básicas tais como: condições clínicas adequadas ao

paciente, existência de células progenitoras hematopoéticas disponíveis,

reconhecimento de que o TMO é o tratamento mais indicado para a doença de base,

9 A leucemia é uma doença maligna dos glóbulos brancos (leucócitos) de origem, na maioria das vezes, não conhecida. Tem como principal característica o acúmulo de células jovens (blásticas) anormais na medula óssea que substituem as células sanguíneas normais. Fonte: www.inca.com.br. <Acesso em: 11 nov. 2012>.

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além das condições familiares, psicológicas e socioeconômicas favoráveis à

realização não só durante, assim como, o acompanhamento, após o TMO.

O TCTH caracteriza-se por seis fases: condicionamento, infusão das células,

aplasia medular, enxertia, alta hospitalar e acompanhamento ambulatorial. A partir

de então, os avanços no campo do TMO têm possibilitado o aperfeiçoamento de

técnicas de diagnóstico e de terapêutica, como teste de histocompatibilidade,

prevenção e tratamento de doença do enxerto versus hospedeiro, regimes de

condicionamento e cuidados de suporte, especialmente de transfusões de

hemoderivados e antibióticos, aumentado as taxas de sobrevida dos pacientes

submetidos ao TMO (WINGARD,1991).

4.5.1 Fonte de Células

As células-tronco (CT) costumam ser identificadas pela sua capacidade de

diferenciação para células com maior grau de especialização, e por sua capacidade

de divisão assimétrica – o que ocorre como resposta à ação de estímulos

específicos e do microambiente (nicho). Ao se dividir, uma célula-tronco origina uma

célula-filha diferenciada e uma célula indiferenciada idêntica, mantendo-se assim a

população de células-tronco (autorrenovação).

Além de poderem ser obtidas do embrião (blastocisto e tecido gonadal de

aborto fetal – 15% quando são consideradas células pluripotentes, as CT também

podem ser encontradas no cordão umbilical e nos tecidos dos diversos órgãos –

quando são consideradas multipotentes –células-tronco adultas (PRESTON, 2003;

GLUCKMAN, 200).

Deste quando são consideradas células pluripotentes, as CT também podem

ser encontradas no cordão umbilical e nos tecidos dos diversos órgãos – quando

são consideradas multipotentes (células-tronco adultas).

As células progenitoras hematopoéticas podem ser coletadas diretamente na

crista ilíaca, do sangue periférico através de máquinas de aférese ou mais

recentemente de sangue de cordão umbilical. O termo transplante de medula óssea

apesar de genérico, mesmo que as células progenitoras hematopoéticas tenham

sido obtidas de outra maneira (CASTRO JR., 2002).

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Na coleta por aspiração de medula óssea, o doador é internado e o

procedimento realizado sob anestesia geral. Depois de posicionado em decúbito

ventral são realizadas diversas punções nas cristas ilíacas posteriores da qual é

aspirada, com agulhas apropriadas, a quantidade de medula óssea necessária para

o transplante, usualmente estimada em 10 ml KL de peso do receptor (TOMAS,

1970), que geralmente contém um número adequado de células progenitoras

suficientes para permitir a pega do enxerto. A medula óssea é injetada em uma

bolsa apropriada ou Becker contendo anticoagulante e posteriormente filtrado para a

remoção de gorduras e espículos ósseos. A maioria dos doadores dos transplantes

alogênicos ainda é realizada utizando-se esta forma de coleta (HOROWITZ, 2000a).

Figura 3 - Coleta da Medula Óssea por aspiração

Fonte: Arquivo da Fundação Hemope

As células progenitoras periféricas são coletadas com o auxílio de

equipamentos de aférese, após a mobilização das mesmas para o sangue periférico,

com a utilização de fatores de colônias de granulocitos e no caso de pacientes

submetidos a transplantes autólogos, sendo esse tipo de procedimento realizado em

mais de 90% dos transplantes autólogos e 20% nos transplantes alogênicos

(HOROWITZ, 2000). É necessário ter um acesso venoso com bom calibre para

coletas adequadas, sendo que a maioria dos pacientes necessita de um cateter de

duplo lúmem (CASTRO JR., 2002).

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Figura 4 - Coleta da Medula Óssea por Aférese

Fonte: Arquivo da Fundação Hemope.

Atualmente a experiência com aféreses em pacientes com peso abaixo de 10

kg é restrita devido às limitações relacionadas à hemodiluição do procedimento. O

uso de sangue de cordão umbilical (SCU) como fonte de células para a

reconstituição da medula ocorreu em 1988 na França com um paciente portador de

Anemia de Fanconi, utilizando o SCU de seu irmão para reconstituir a função

medular após quimioterapia mieloblativa (GLUCKMAN, 1989). O sangue de cordão

umbilical é coletado logo após o nascimento da criança, sendo posteriormente

processado e mantido congelado até a infusão (RUBISTEIN, 1998).

Figura 5 - Cordão Umbilical

Fonte: Google.com.br. Acesso em 20/12/2011.

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4.5.2 Histocompatibilidade

O TMO ocorre a partir de um doador identificado através da tipagem HLA

(antígeno humano leucocitário), do qual são coletadas células progenitoras capazes

de reconstituírem a medula óssea que, após o período de condicionamento, é

infundida no receptor. O regime de condicionamento é caracterizado por altas doses

de quimioterapia, associada ou não à irradiação corporal total ou linfonodal total.

Para Ortega e Neves (1996), o regime de condicionamento objetiva: a) erradicar a

medula doente do receptor, quando o TMO faz parte do tratamento, como nas

leucemias ou em outras neoplasias; b) erradicar o sistema imune do receptor para

que as células do doador sejam aceitas e proporcionar “espaço” para a nova medula

(PONTES, 2004).

Figura 6- Esquema do Sistema HLA.

Fonte:

As técnicas para definir antígenos de histocompatibilidade em humanos foram

cruciais para o desenvolvimento do transplante. Estes antígenos provocam reações

imunes quando tecidos são transplantados de um indivíduo para um receptor

geneticamente não idêntico o que resulta num processo denominado rejeição. Os

principais alvos moleculares nos casos de rejeição de transplantes são as formas

alélicas não próprias das moléculas do Complexo Principal de Histocompatibilidade

(CPH). O CPH é uma região cromossômica que compreende um conjunto de genes,

altamente polimórficos, os quais codificam aloantígenos de superfície celular. O

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sistema HLA constitui um subconjunto de genes do CPH humano, estes genes são

denominados HLA de classe I e classe II (SACHS apud VISENTAINER, 2003).

O sistema HLA tem um papel de destaque na área dos transplantes. Suas

moléculas agem como fortes antígenos de transplantação e o seu polimorfismo

constituem uma séria barreira para transplantes de órgãos entre indivíduos não

consanguíneos. Maior sobrevida de aloenxertos é observada entre indivíduos HLA

idênticos, para os loci HLA-A, B, DRB1 e DQB1. Com os recentes avanços nos

métodos de tipagem por DNA (genotipagens) é possível definir incompatibilidades

antes não detectadas por métodos sorológicos ou por cultura mista de linfócitos

primária. Diferenças alélicas têm sido correlacionadas com GVHD, principalmente,

em casos de doadores não aparentados. Mais de 130 diferentes antígenos HLA-A,

B, Cw, DR, DQ e DP foram definidos sorologicamente. Até o presente momento,

com a introdução de métodos de tipagem de DNA, com alta resolução, foram

incluídos 5320 haplótipos HLA-A e B e 1.647 HLA-DRB1 e DQB1, analisando-se 4

grupos étnicos: Asiáticos, Negros, Caucasóides Europeus e Caucasóides Norte-

Americanos (GJERTSON; LEE, 1998).

Segundo Ficher o TMO baseia-se na utilização da célula tronco-hematopoética.

Diversos estudos demonstraram a presença dessa célula na medula óssea,

constituindo cerca de 1 a 3% da população medular e apresentando como principal

identidade o antígeno de superfície CD34. Tais células são capazes das múltiplas

linhagens celulares após quimioterapia mieloblativa. O número de células-tronco

transplantadas constitui importante fator prognóstico do TMO, pois se sabe que as

taxas de sobrevida são diretamente proporcionais ao número de células CD34

infundidas no receptor (FICHER, 2004).

No entanto, apesar de todo avanço e conquistas havia complicação

considerável de natureza infecciosa, imunológica (rejeição e doenças do enxerto-

contra-hospedeiros e toxicidade, decorrentes do condicionamento da medula

colhida).

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Segundo Durlley:

“Sabe-se que a maioria das complicações ocorre durante os quatro primeiros meses após o transplante, em razão de potenciais alterações em múltiplos órgãos, seja pela toxidade do condicionamento, por infecções, por distúrbios imunológicos inerentes ao procedimento, por alterações no sistema hematopoético e pelo uso intensivo de múltiplos medicamentos”(DURLLEY,1996, p.140).

O desenvolvimento de novas técnicas de congelamento e armazenamento de

medula óssea possibilitou que o TMO e de células-tronco hematopoéticas se

tornassem procedimentos mais seguros e com menos riscos de rejeição e

complicações, possibilitando um avanço nesses procedimentos.

4.6 Transplante de Medula Óssea no Brasil

O número de TMO no Brasil tem aumentado significativamente nas últimas

décadas, sendo atualmente realizados em unidades de saúde da maioria das

capitais brasileiras. Atualmente no Brasil há 46 centros transplantadores dividido da

seguinte forma: 46 centros autorizados para transplante, destes, 11 centros para

doadores não aparentados. No Nordeste três centros e 1 Pernambuco. No entanto,

em diversas situações clínicas não se consegue o doador aparentado para

realização do TMO, sendo necessário recorrer aos bancos de medula óssea para a

realização do transplante (BRASIL, 2010).

O início do TMO, em nosso País, ocorreu na década de 1970, porém poucos

estudos foram publicados a respeito da experiência, peculiaridades e complicações.

No Brasil o primeiro TMO foi realizado em 15 de outubro de 1979, no Hospital das

Clínicas em Curitiba – Universidade Federal do Paraná, em seguida no Instituto

Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro em 1983; a seguir a Faculdade de Medicina

de São Paulo (DURLLEY, 1992), e o Hospital das Clínicas da Faculdade de

Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo em 1992. Desde então,

várias unidades de transplantes foram criadas e diversas equipes médicas, vêm

utilizando este tratamento com sucesso. Vale registrar que até o ano de 2000, com

oito anos de funcionamento, esta última instituição realizou cerca de 170

transplantes (VOLTARELLI, 2000).

Segundo os dados da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos, em

2010 foram realizados, no Brasil, nos centros cadastrados por esse órgão 1197

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transplantes efetuados no período (ABTO, 2011). Estes dados possibilitam uma

visão do panorama do TMO no Brasil e são fontes importantes para a análise de

sobrevida dos pacientes. Os diversos centros de TMO trazem a oportunidade de

intercâmbio e contribuem para a realização do tratamento de forma segura e

aplicável, por um número por um número cada vez mais de pacientes, seja na

população infantil ou adulta (ANDERS, 2004).

Até 1987, quando não existiam bancos de medula óssea, milhares de

pacientes que não tinham um doador compatível na família acabavam morrendo.

Pensando na dificuldade de encontrar doadores compatíveis, no Brasil foi criado o

Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea – Redome – cujo

objetivo é cadastrar número significativo de doadores tipados para HLA em um

Banco de Dados, para atender a demanda de pacientes.

Por determinação do Ministério da Saúde, coube ao CEMO sediar o Redome

(Registro Nacional de doadores voluntários não aparentados de medula óssea) e o

banco de células Umbilical e centralizar as consultas aos bancos internacionais de

doadores de medula óssea.

No dia 20 de outubro de 1998, por meio da Portaria nº 3761, foi oficializado o

Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea, delegando o Instituto

Nacional do Câncer o seu funcionamento. O Ministro da Saúde, José Serra, no uso

de suas atribuições, estabelece ser o Sistema Nacional de Transplante, a

Assessoria Técnica para Transplante de Medula Óssea, que iria gerenciar o

Redome, coordenar a distribuição de medula, através das CNCDO, e ainda

desenvolver e operar o sistema de avaliação de transplantes de medula óssea.

Neste período, foram realizadas campanhas de sensibilização da população quanto

à importância de doação de medula óssea, e também para credenciamento de

laboratórios de imunogenética no País.

No que diz respeito à Legislação, o transplante de medula óssea está inserido

na Legislação que lida como os transplantes em geral. Porém, em 13 de outubro de

1999 foi publicada a Portaria nº 1217, que regulamenta as varias indicações para o

transplante de medula óssea, normatiza as condições para a assistência e

estabelece as condições iniciais para a viabilização do programa de transplante

utilizando doadores não aparentados.

Segundo a Portaria nº 1315/2000, os cidadãos que desejarem,

voluntariamente, cadastrarem-se como doadores de medula óssea e outros

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precursores hematopoéticos deverão buscar, por telefone, e-mail ou pessoalmente,

na CNCDO de seu estado, informações a respeito de como proceder para realizar

seu cadastro de doador junto ao Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (

REDOME). “É determinado que as Secretarias de Saúde dos Estados e do Distrito

Federal tenham Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos instalada

e em funcionamento” (Portaria nº 1315/2000, Art. 2º).

Nas últimas décadas o transplante de medula óssea tem avanço tanto em

técnicas quanto em finalidades terapêuticas e legislativas, bem como em número de

credenciamentos de Unidades. De acordo com dados da Associação Brasileira de

Transplante de órgãos, em 2005 foram realizados 1197 transplantes, em centros

cadastrados (BRASIL, 2005).

4.6.1 Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea

A Legislação especifica que para o cadastramento no Redome deve-se seguir as

seguintes etapas:

Pacientes:

1. A Ficha de inscrição: deve ser preenchida pela equipe médica que acompanha o

paciente e encaminha ao REREME, conjuntamente com tipagem HLA;

2. A Tipagem HLA: para pacientes que tenham indicação de TMO deverá ser

realizada por orientação da equipe médica que encaminhará ao Redome.

Doadores:

1. O doador voluntário entra em contato com o Hemocentro, para realizar sua

inscrição.

2. Os candidatos voluntários serão convocados para receber informações sobre o

TMO, assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e coleta de sangue

para realizar a tipagem HLA para o cadastro do doador.

Para o Ministério da Saúde, é responsabilidade dos Hemocentros a

descentralização da captação de doadores, através do Programa Redome. Cabendo

aos Hemocentros a responsabilidade de:

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Orientar os candidatos no que se refere ao procedimento de doação de medula

óssea;

Receber os candidatos à doação encaminhados pela CNCDO;

Obter do candidato à formalização de sua disposição, no Termo de

Consentimento;

Coletar, processar e armazenar o material necessário à realização dos exames

de histocompatabilidade requeridos para cadastramento no Redome;

Enviar relatório de histocompatabilidade cadastrado o material a ser submetido

aos exames de HLA;

Localizar e chamar o candidato à doação no caso de o mesmo, após sua

inscrição no REDOME, vir a ser selecionado como possível doador para um

determinado receptor, ocasião em que coletará novamente nova amostra de

material para a realização da segunda etapa da identificação do doador e

realizará, no próprio Hemocentro, os exames de sorologia do doador, informando

os resultados obtidos à CNCDO;

Manter arquivo contendo as informações relativas aos candidatos à doação

recebidos e encaminhados(Portaria nº. 1315/2000).

Para ampliar e consolidar o cadastramento de candidatos voluntários de

medula óssea foi decretado a Portaria nº 1315, em 30 de novembro de 2000. O

Ministério da Saúde por meio desta estabeleceu os seguintes mecanismos para

organização do cadastro de doadores no Redome:

Organização dos fluxos de captação de doadores voluntários;

Organização do sistema de orientação aos candidatos;

Organização do encaminhamento desses candidatos ao Hemocentro mais

próximo, previamente designado pela Secretaria de Saúde;

Organização e informação ao(s) Hemocentro(s) de grade de distribuição dos

exames de histocompatibilidade aos laboratórios devidamente cadastrados no

SUS, classificados como de Tipo II, em conformidade com as Portarias GM/MS

nº 1312 e 1313, ambas de 30 de novembro de 2000, de acordo com sua

capacidade instalada contratada;

Recepção e envio ao Registro Nacional Doadores Voluntários Não

Aparentados de Medula Óssea REDOME no Instituto Nacional de Câncer

(INCA), do Ministério da Saúde, no Rio de Janeiro, dos resultados dos exames

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realizados pelos laboratórios e as demais informações necessárias à

implantação do cadastro, de acordo com o documento Termo de

Consentimento/Autorização de Exames/Resultados de Exames, conforme

modelo estabelecido no Anexo II desta Portaria;

Manutenção de arquivo contendo as informações repassadas ao REDOME.

Esta Portaria estabelece ainda:

“Que os procedimentos relativos à realização de exames de histocompatibilidade e de coleta, processamento inicial, armazenagem, acondicionamento e transporte de material colhido de candidatos à doação de medula óssea pelo Hemocentro, estabelecidos na PT GM/MS nº 1.317, de 30 de novembro de 2000, serão custeados com recursos do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação FAEC, devendo ser processados por meio de APAC” (BRASIL, 2000).

Para pacientes que são encaminhados ao Rereme, e não tiverem um doador

compatível no meio familiar ou no país, será feita uma busca internacional. Mas,

para que essa busca ocorra é necessário um numero de 60 pacientes cadastrados.

O Instituto Nacional do Câncer e o Hospital das Clinicas da Universidade Federal do

Paraná são os Órgãos responsáveis por efetuar essa busca.

No caso de localização de um doador compatível, o Redome providencia o

transporte da medula doada, após autorização do Sistema Nacional de Transplante

do Ministério da Saúde e dos cumprimentos necessários, e ainda, indica o Centro

mais próximo para realização dos exames e consequente transplante. Todos esses

procedimentos são financiados pelo SUS.

A falta de um Registro Geral em todos os Estados do País dificulta a realização

do TMO com doadores não aparentados e o atendimento a atual demanda. No País,

existem atualmente 47 Centros transplantadores de medula óssea, dos quais três

ficam na Região Nordeste: Bahia (um Centro) e em Pernambuco (dois centros,

sendo do Hemope a responsabilidade de captar doadores voluntários).

Portanto, uma das soluções para amenizar a atual situação da demanda de

doadores voluntários de medula óssea, será conscientizar a população acerca da

forma de doação e dos benefícios e consequências do transplante. E ainda, ampliar

o número de Centros para captar doadores voluntários.

Nas sociedades em que o transplante de órgãos vem acontecendo, existem

leis já definidas ou em fase de regulamentação definitiva. A legislação de

transplantes no Brasil iniciou-se com a Lei nº 5.479 do Congresso Nacional,

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promulgada em 10 de agosto de 1968 em decorrência dos primeiros transplantes

realizados no Brasil na década de 1960. No entanto, durante este período não havia

proibição expressa ao comércio de órgãos ou alguma forma de controle do emprego

de doador vivo não aparentado. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 199,

inciso 4º, proíbe expressamente o comércio de órgãos e tecidos do corpo humano:

“A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização” (OLIVEIRA, 1996, p. 105).

Apesar da Lei nº 8.489 ter vigorado até 31 de dezembro de 1997, ainda se

mantinha muito presente o problema da insuficiência de órgãos para fins de

transplantes, pois a legislação vigente não estimulava o aumento de doações, como

também não pressionava para que fossem criadas novas estruturas de captação e

transplantes de órgãos.

“O número insuficiente de doadores para atender à crescente demanda de pacientes em espera passou a ser o maior obstáculo para a realização de transplantes. A falta de órgãos reflete não apenas a falta de potenciais doadores, mas também, e principalmente, a falha em convertê-los em doadores efetivos” (GARCIA, 2000,p. 22).

No que se refere à doação de medula óssea, a Portaria nº 1217 de outubro de

1999, estabelece normas para autorização e cadastramento de equipes e

estabelecimentos de saúde para a realização do Transplante de Medula Óssea

(TMO), assim como para regulamentar a busca nacional e internacional de doador

não aparentado de medula óssea.

De acordo com a nova portaria nº 2480/GM, de 17 de dezembro de 2004, a

mesma estabelece a busca nacional e internacional de doador não aparentado de

células-tronco hematopoéticas é responsabilidade do Sistema Nacional de

Transplante. De acordo com esta portaria, esgotada a possibilidade de busca de

doador aparentado, a busca nacional de doador não aparentado somente poderá ser

realizada pelo Instituto Nacional de Câncer – INCA – e Hospital das Clínicas da

Universidade Federal do Paraná, mediante autorização prévia da Assessoria

Técnica para transplante de medula óssea. É importante ressaltar que não existe

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uma maneira ideal de consentimento para a doação, ou que o fato de um programa

de transplante ter êxito, que seja atribuído à sua legislação. As leis são boas

enquanto estão em consonância com o que a sociedade aceita e não quando

procuram modificar a sociedade através da coerção (BRASIL, 2004).

O TMO com doadores não aparentados, menos de 35% dos candidatos ao

transplante têm doador aparentado compatível para contornar essas dificuldades,

surgiram os bancos de doadores de medula óssea que são arquivos informatizados,

onde as tipagens HLA dos potenciais doadores voluntários podem ser pesquisadas

para eventuais transplantes. Caso um doador compatível seja encontrado, fazem-se

testes confirmatórios e posteriormente coletam-se as células progenitoras

hematopoéticas. Embora os bancos não estoquem a medula propriamente dita, seus

custos são elevados, devido à necessidade de tipagem de um grande número de

doadores.

Nos Estados Unidos, o Banco Nacional de Doadores de Medula Óssea, já tem

em torno de três milhões de doadores cadastrados e cerca de 70% dos pacientes

que recorrem ao mesmo, encontram um doador compatível (HORWITZ, 2000b).

No Brasil, a pesquisa é realizada pelo Redome, que busca doadores

compatíveis no país e no exterior. Atualmente segundo o Redome (2011) há em

torno de três mil pacientes na fila esperando por um transplante de medula óssea e

em torno de 2 milhões de potenciais doadores cadastrados.

No que diz respeito à Legislação, o transplante de medula óssea está inserido

na Legislação que lida como os transplantes em geral. Porém, em 13 de outubro de

1999 foi publicada a Portaria 1217, que regulamenta as várias indicações para o

transplante de medula óssea, normatiza as condições para a assistência e

estabelece as condições iniciais para a viabilização do programa de transplante

utilizando doadores voluntários.

Em 1983, foi criado o Centro de Transplante de Medula Óssea (CEMO),

vinculado ao Inca, é responsável por estudos e realização de transplantes de

medula, sendo o segundo maior centro do Brasil, nessa especialidade. Por

determinação do Ministério da Saúde, cabe ao Cemo sediar o Redome (Registro

Nacional de doadores voluntários não aparentados de medula óssea) e o banco de

células Umbilical e centralizar as consultas aos bancos internacionais de doadores

de medula óssea.

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O Ministro da Saúde, José Serra, em 1998, no uso de suas atribuições, através

da Portaria, 3761, resolve, estabelecer no Sistema Nacional de Transplante, a

Assessoria Técnica para Transplante de Medula Óssea, que gerencia o Redome,

coordena a distribuição de medula, através das CNCDO, e ainda desenvolve e

opera o sistema de avaliação de transplantes de medula óssea.

Até 1987, quando não havia bancos de medula, com isso milhares de pessoas

que não tinham doadores compatíveis na família, acabavam morrendo. Diante dessa

dificuldade foi criado o Redome, que dispõe de informações (nome, endereço,

resultados de exames HLA (histocompatibilidade), características genéticas) de

pessoas que se colocam, voluntariamente, a disposição para doar medula para fins

de transplantes.

Até o ano de 2000, existiam 16 Unidades de TMO credenciadas pelo SUS. Nas

regiões Norte e Nordeste do País não havia nenhuma Unidade credenciada. Em

2002, a Unidade de Transplante do Hemope10 foi credenciada e no dia 23 de

setembro do mesmo ano, implantou-se ao Projeto de Doadores Voluntários de

Medula Óssea para realizar a captação de doadores voluntários em Pernambuco.

4.6.2 Projeto Redome em Pernambuco.

A partir da publicação da Portaria nº 1315 do ano de 2000, o Hemope,10 como

serviço público no estado de Pernambuco ficou responsável para realizar o trabalho

de captação de potenciais doadores voluntários de medula óssea. Também em

2002, o Centro de Transplante de Medula Óssea do Hemope11 foi credenciado e no

dia 23 de setembro do mesmo ano, implantou-se o Projeto de Doadores Voluntários

de Medula Óssea em Pernambuco. Atualmente o referido centro foi extinto por

determinação do governo Estado, que o considerou ineficiente.

A Fundação desenvolve um trabalho de captação de doadores voluntários de

sangue para manter os estoques no Estado deste produto essencial à vida. Esta

estratégia de captação que consiste na sensibilização do doador em relação à

importância da doação de sangue por meio de informações, contribuiu para o

estabelecimento de uma metodologia com objetivo de ampliar o número de

candidatos voluntários a doação de medula óssea. O Redome iniciou o trabalho de

10 Fundação de Hematologia e Hemoterapia de Pernambuco. 11 Centro de Transplante de Medula Óssea da Fundação Hemope.

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captação sob a responsabilidade do serviço social lotado na Assessoria de Pesquisa

e Ensino da instituição Hemope, sendo esta formada por uma equipe multidisciplinar

com profissionais da área de medicina, laboratorial e de serviço social.

Para iniciar à convocação, primeiramente foi realizado um levantamento dos

potenciais doadores cadastrados na Central de Transplantes (CNCDO) órgão

vinculado à Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco, quando se verificou

uma lista com 641 pessoas que estavam inscritas há pelo menos dois anos. Essa

convocação foi realizada por telefone com a seguinte abordagem: solicitar para

comparecerem a instituição com o objetivo de assistirem a uma palestra explicativa

sobre a doação de medula óssea. As ligações eram realizadas durante a semana,

como primeiro momento de sensibilização dos candidatos à doação (Ver figura 5).

O início do cadastro de potenciais doadores voluntários de medula óssea na

Fundação Hemope foi responsabilidade do Serviço Social lotado na Coordenação de

Ensino e Pesquisa. O cadastro foi realizado em três etapas:

Figura 7- Convocação dos potenciais doadores para a palestra

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

A palestra era iniciada com a apresentação da equipe participante do projeto

aos candidatos em seguida, é era realizada uma dinâmica de grupo para refletir

quanto a doação de medula óssea, ao término da dinâmica, era aplicado o

questionário semi-estruturado, que avaliou dados pessoais, profissionais,

motivacionais e de conhecimento sobre a doação de medula óssea. Na palestra

aborda-se os seguintes tópicos: critérios para ser doador, benefícios para o receptor,

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termo de consentimento livre e esclarecido e coleta de sangue para exames

laboratoriais.

A mesma tinha por objetivo esclarecer os procedimentos para a realização da

doação e informar a importância do transplante de medula óssea para quem

necessita. Para os que concordaram em participar do banco de doadores é

solicitado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, para realizar o teste

HLA. Após esse momento do módulo instrucional houve a entrega de material

educativo sobre doação de medula (ver figura 8).

Figura 8- Palestra sobre doação de medula óssea

Fonte: arquivo da pesquisadora.

Para os que concordaram em participar do cadastro foi realizada a coleta de 10

ml de sangue para o exame HLA. Posteriormente seu Registro incluso no Banco

Nacional de Doadores de Medula Óssea. O doador é informado que caso de

compatibilidade e convocado novamente para efetuar os exames complementares e

posteriormente fazer a doação da medula óssea.

Figura 9- Coleta de sangue periférico para exame HLA.

Fonte: Arquivo da pesquisadora.

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A Fundação Hemope tornou-se um centro de referência na área de

histocompatibilidade e estar integrada ao esforço de criar competências na área de

doadores não aparentados de transplante de medula óssea. Aliando-se ao projeto

na tentativa de torná-lo um programa efetivo, permitindo, além da disponibilidade de

seus serviços, a captação de doadores de sangue, resultando no atendimento à

busca dos doadores de medula óssea, consequentemente diminuindo os custos do

Estado com tipagens, sendo imprescindível à realização de estudos que visem atrair

novos candidatos à doação e aumentar a quantidade de doadores cadastrados no

Redome. No entanto, o grande desafio enfrentado no momento é a captação de

doadores voluntários. O mito e a falta de informações acerca da forma de captação

da medula e sua utilização é um dos principais motivos para o crescente numero de

receptores.

4.7 Organização de Um Serviço de Transplante de Medula Óssea

Na literatura pesquisada enfatiza-se a estrutura e recursos humanos

necessários à realização do transplante. Isto se refere à infraestrutura adequada

como sendo a base material onde se realiza o procedimento e a recursos, como os

meios necessários a essa realização. Desta forma são descritos como infraestrutura

necessária: uma unidade de internação especializada, dentro da instituição; um

setor ambulatorial e setores complementares. Como recursos de pessoal

qualificado; planejamento; programas e critérios de atuação (RIUL, 1996).

O setor ambulatorial funciona no atendimento do paciente antes de sua

admissão na unidade de TMO e após sua alta hospitalar, é necessário ter

consultórios médicos, posto para intervenção de enfermagem, área de recepção,

sala para reuniões com os pacientes e familiares.

A unidade de internação deve ter a capacidade para atender no mínimo, a dois

pacientes. Cada enfermaria deve possuir dois espaços, área do paciente e

antessala, assim como, banheiro privativo. A área do paciente deve ser no mínimo

de 9m2 e deve ter leito ajustável. Deve ter ainda saída de oxigênio, ar e vácuo

centralizado.

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Os serviços complementares são relevantes como: banco de sangue com

capacidade para dar suporte aos pacientes por período mínimo de três semanas,

disponibilidade de elementos sanguíneos selecionados tais como hemácias, plasma,

plaquetas e irradiados para inativação de células imunologicamente competentes, e,

ainda capacidade para lidar com incompatibilidade ABO.

Outros serviços são: farmácia, laboratórios de imunologia, hematologia,

microbiologia, patologia, tipagem de histocompatibilidade, manipulação e crio

preservação no caso do serviço realizar transplante autólogo. Deve ter radiologia e

radioterapia com capacidade para realização de ICT, dietoterapia com capacidade

de descontaminação de alimentos, bloco cirúrgico, central de materiais, fisioterapia,

odontologia, serviço social, terapia ocupacional, psicologia, além de outros

profissionais inerentes a qualquer serviço de saúde.

O recurso humano necessário para desenvolver o trabalho com o paciente é

composto por uma equipe multiprofissional formada por médicos (hematologista,

oncologista e imunologista), enfermeiro, nutricionista, assistente social,

fisioterapeuta, psicólogo, terapeuta ocupacional e ainda radiologista e

epidemiologista.

Para melhor compreender a complexidade do procedimento terapêutico é

necessário conhecer cada fase do TMO. As quais estão apontadas a seguir: A

primeira fase é chamada pré-TMO compreende antes da admissão hospitalar, onde

o paciente e seus familiares passam por um acompanhamento ambulatorial para

definição de diagnóstico, a indicação de tratamento como o transplante, assim como

o levantamento de possíveis doadores de medula óssea, ressalta-se ainda, há um

acompanhamento multiprofissional durante todo o período.

Durante o acompanhamento ambulatorial o paciente com diagnóstico definido e

indicações para o TMO, juntamente com a família e os potenciais doadores, passam

por uma série de avaliações realizada por uma equipe multidisciplinar, composta por

assistente social, médico, enfermeiro, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional,

nutricionista, psicólogo. Neste período o paciente e família participam de reuniões

onde recebem orientações sobre os procedimentos, sobre a situação atual e história

natural da doença, riscos e resultados, complicações e preparo psicossocial,

informações essas que lhe ajudarão a fazer a opção pelo tratamento ou não.

Os doadores são selecionados de acordo com a identidade genética do

receptor em relação aos antígenos do sistema HLA. Também são submetidos a

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avaliações clínicas e epidemiológicas e laboratoriais para identificar possíveis

fatores prejudiciais à sua saúde ou identificação de doenças transmissíveis pela

doação. Quando necessários outros fatores são considerados como a

compatibilidade sanguínea do Sistema ABO, peso e sexo.

O segundo momento compreende a internação hospitalar, onde o paciente fará

condicionamento como parte do TMO, onde é implantado um cateter venoso central,

o qual será vital durante o tratamento devido a grande quantidade de infusão de

drogas endovenosas, hemoderivados, coletas constantes de amostras de sangue e

avaliação da pressão venosa central. O ambiente de internação hospitalar deve

conter medidas de proteção para se evitar infecções hospitalares nos pacientes.

Inicia-se uma contagem regressiva antecedente ao TMO, sendo considerado o dia

de infusão das células tronco como o dia zero e início da contagem progressiva pós-

infusão de medula óssea.

O tempo médio para a “pega da medula” é de duas a quatro semanas após o

transplante, identificada pela elevação na contagem de leucócitos por uma

monocitose relativa e pelo aparecimento de neutrófilos maduros (FOERSTER,

1998). Porém, esse período pode variar significativamente entre um paciente e

outro, provocando, muitas vezes, sentimentos de ansiedade e medo naqueles que,

por algum motivo, apresentem uma demora maior, o que pode representar um

aumento dos riscos de complicações do transplante. Após a confirmação da pega da

medula, em torno do dia +30, se o paciente não apresentar nenhuma complicação,

poderá sair do regime de internação hospitalar. Contudo, ele ainda precisa de um

controle diário até o dia +100 pós-transplante, aproximadamente, período em que é

atendido no ambulatório do TMO (PONTES, 2004).

No caso do doador alogênico, em particular nesse estudo é o que interessa, o

doador interna-se um dia antes do TMO e no dia seguinte é encaminhado ao centro

cirúrgico para a retirada da medula após múltiplas aspirações na crista ilíaca

posterior bilateral, com cerca de 3 a 5 ml a cada aspiração através do uso de

seringas lubrificadas com heparina condicionadas em um recipiente apropriado para

evitar-se a formação de coágulos, o material é filtrado para eliminar restos ósseos,

coágulos e grumos de gordura; em seguida, o sangue é transferido para uma bolsa

coletora, pesado e encaminhado para a unidade de TMO para infusão no receptor e

infundida imediatamente, utilizando-se de cateter central de duplo lúmem

(NICOLAU, 2004).

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Ressaltamos que a alta hospitalar do doador ocorre em um período de 24

horas após o procedimento de coleta. Vale salientar que esse procedimento se dá

sob anestesia geral e que a retirada depende da proporção quilo por peso do

receptor, sendo ideal a ser infundida no receptor superior a 3.0 x 108 kg. De acordo

com a figura 10.

Figura 10- Coleta de Medula Óssea por Aspiração em Centro Transplantador.

Fonte: Arquivo da Fundação Hemope.

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5 CAPÍTULO III - APRESENTANDO E ANALIZANDO OS RESULTADOS DA PESQUISA

….“É por intermédio da linguagem que o conhecimento subjetivo se torna também conhecimento objetivo, preparando assim o caminho para o terceiro mundo, o mundo das ideias e das teorias”……. Karl Poper

Para um melhor encaminhamento da análise e discussão dos dados coletados

na investigação, no presente capítulo procurou-se apresentar os resultados,

alcançados, distribuindo-os através de subitens, de forma a tornar a leitura mais

compreensível possível, está dividido em três momentos:

A leitura interpretativa, das entrevistas permitiu fazermos leituras mais gerais

antes de nos determos em temas mais específicos do presente estudo. O grupo

convidado a participar do estudo se caracterizou por aceitar com presteza ser

entrevistado, assumindo grande empenho na conversa.

Esta uniformidade parece indicar uma tendência geral, relacionada coma

vontade de falar sobre a doação. Por outro lado, esta interpretação é confirmada

pelo fato da maioria dos doadores, mesmos os mais introspectivos, mostram que

existe uma necessidade de tornar notória a experiência da doação.

Realizei o estudo com 74 sujeitos, dividida em dois grupos sociais distintos:

um grupo, composto de 48 pessoas doadoras de medula óssea em Lisboa e 26 em

Recife. A tabela 1 apresenta os sujeitos distribuídos nas duas Instituições, que

serviram de campo para o estudo.

Esta parte do capítulo visa categorizar os doadores de medula óssea em

Recife e Lisboa, identificando-os no contexto social. Ela apresenta e analisa

categorias como: sexo, grupo etário, condição conjugal, grau de instrução, estado

civil, profissão, renda e motivação para a doação. Esta categorização foi relevante

no sentido de estabelecer relações entre estes aspectos e a doação.

Da amostra pesquisada, 38 doadores pertenciam ao sexo feminino (51,4%), e

36 eram do sexo masculino (48,6%).Isso se justifica provavelmente, pelo fato de, no

momento de realização (convém notificar que não é objeto desse estudo, nem,

particularizar as informações prestadas pelos informantes de acordo com o sexo).

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O estudo, portanto, levanta uma questão de gênero quando coloca ser mulher

ou ser homem como uma construção social, onde a palavra gênero do ponto de

vista da gramática, é utilizada para identificar essa construção, diferenciando-a da

perspectiva biológica. Alguns fatores importantes têm contribuído para modificações

no sistema gênero: a crise econômica que força a inserção cada vez maior das

mulheres no mercado de trabalho, o aumento crescente de famílias chefiadas por

mulheres, e a organização desse segmento lutando por direito de igualdade.

5.1 Caracterização do perfil dos doadores em Recife e Lisboa

Tabela 1-Distribuição dos doadores segundo o sexo

Recife Lisboa Doadores Masculino

11

42%

25

52%

36

48,6%

Feminino

15

58%

23

48%

38

51,4%

Total 26 100% 48 100% 74 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

A tabela 1 apresenta o quantitativo de doadores referente as cidades de Recife

e Lisboa no período de 2002 a 2011, quanto ao gênero masculino 36 (48,6%) e o

feminino 38 (51,4%), e revela maior adesão do gênero feminino. O resultado indica

que a amostra apresenta um percentual considerável de doadoras, o que pode a

princípio levar a crer que a histocompatibilidade (HLA) dos candidatos a doação

tenderia a reconhecê-los como sendo biologicamente os doadores mais compatíveis,

do ponto de vista imunológico, não é assim que ocorre. Sexo não interfere na

histocompatibilidade.

A psicologia clássica defende que as mulheres têm diferença quanto a

formação de personalidade, em relação aos homens. Desde a infância na construção

primária do ego, a individuação já aparece nas meninas, diferentemente dos meninos,

com uma forte tendência, para que elas sintam as necessidades e os sentimentos dos

outros. Esse achado revela (51,4%) das doadoras exprimem a necessidade que

tiveram de impedir o sofrimento do outro. Eis os depoimentos de algumas dessas

mulheres:

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“ Fiquei feliz por eu ter sorte quanto a doação de poder ajudar alguém pela

dificuldade da compatibilidade”

“Com certeza, ela contribui (a doação) porque vai tirar alguém do sofrimento,

que vem se alastrando há muito tempo”

A dádiva, nestes relatos, expressam uma lógica intensificada tradicionalmente

de solidariedade, porém, sua essência também vem sendo ressignificada, Contudo,

a dádiva na contemporaneidade não está somente ligada à troca de presentes, ou

visitas, mas podemos encontrar essa lógica enraizada em algumas práticas do

cotidiano, e nesta lógica de “dar, receber e retribuir” os dois grupos, que são

divididos em relação à divisão sexual, são equivalentes na igualdade, não de

tarefas, mas de respeito e contribuição entre a ação desenvolvida. Para Marcel

Mauss (1974), a lógica da dádiva estabelece um tipo de aliança entre determinados

grupos, aliança essa que fortalece neste caso da doação de medula a reciprocidade

e a solidariedade, podem ser socialmente construídas de modo diferente, como

privilégios, obrigações etc. Ainda, segundo Marcel Mauss, a dádiva é espontânea e

ao mesmo tempo, obrigatória, porém tem como objetivo em sua essência de

fortalecer o laço social, não somente dos indivíduos, mas principalmente da

coletividade.

Tabela 2 -Distribuição dos doadores segundo a idade no periodo de 2002 a 2010

A maior incidência no Recife está na faixa etária de 29 a 39 anos totalizando

(43,7%), na faixa etária de 40 a 49 anos (37,5%). A faixa etária nos grupos de 18 a

28 anos perfazendo (14,6%) e (4,2%) encontram-se no grupo etário de 50 a 59

anos, idade limite para doação.

IDADE

Recife

% Lisboa %

18-28 7 14,6% 29-39 21 43,7% 40-49 18 37,5%

50-59 2 4,2%

Total 26 100% 48 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

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Quanto ao perfil da população pesquisada, observa-se que é jovem e está no

ápice de sua vida produtiva. O limite de idade estabelecido pelo o Ministério da

Saúde, em Portugal para o cadastro é 49 anos, enquanto no Brasil vai até 55 anos,

até o momento da realização do estudo.

Tabela 3 - Distribuição dos doadores segundo a escolaridade no periodo de 2002 a 2010

Grau de Instrução QTD. %

Fundamental completo 8 16,6%

Fundamental incompleto - -

Secundário 17 35,4%

Superior Completo 23 48%

Superior incompleto - -

Não Respondeu - -

Total 48 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

No que se refere à variável escolaridade, verificou-se que entre a população

estudada, (48%) tem grau de instrução de ensino superior. Isso mostra uma relação

entre a doação de medula, e grau de instrução. Pelo senso comum, pressupõe-se

que essas pessoas têm mais acesso a informação. Logo, estariam estão mais

sensibilizadas para as questões referentes à importância da doação de órgãos e

tecidos, assim como doação de sangue, como de outras pertinentes à problemática

social à enquanto (35,4%) dos doadores possuem nível médio, e são estes que

contribuem também de forma mais efetiva, (16,6%) têm o ensino fundamental. A

importância não só da doação de sangue, doação de órgãos e tecidos como de

outras pertinentes à problemática social. Nesse contexto, a participação na doação

de medula envolve grupos que se diferenciam pelas razões que os levam a doar.

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Tabela 4- Distribuição dos doadores segundo Estado Civil

RECIFE LISBOA

Estado Civil F M F M

Casado(a) ou união estável 17 (74%) 18 (72%)

Solteiro(a) 5 (21,7%) 4 (16%)

Viúvo(a) - -

Divorciado 1(4,3%) 3 (12%)

Total 23 (100%) 25 (100%) Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Em relação ao estado civil, do total de doadores, 35 são casados, 9 solteiros

e 4 divorciados. A concentração de solteiros do gênero masculino está na faixa

etária dos 18 aos 28 anos.

Tabela 5 - Distribuição dos doadores de Lisboa segundo situação profissional

Situação Profissional QTD. % Empregado 43 89,6%

Exerce funções - - Baixa - -

Desempregado 5 10,4% Aposentado p/ Idade - -

Aposentado p/ Doença - - Doméstica - -

Não Respondeu - - Total 48 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

No que se refere à profissão, observou-se que dos 48 doadores, 43 (89,6%)

encontram-se empregados e apenas 10,4% desempregados.

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Tabela 6 - Distribuição dos doadores de Lisboa segundo faixa salarial

Faixa Salarial QTD. %

Até 1000€ 10 21,00%

De 1000 a 2000€ 9 19,00%

De 2001 a 3000€ 3 6,00%

De 3001 a 4000€ 1 2,00%

Acima de 4000€ 2 4,10%

Não Respondeu 23 47,90%

Total 48 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

A tabela 6 demonstra um percentual de (21%) de doadores ocupando a faixa

salarial em Lisboa que aqui no Brasil corresponde em torno 1 a 3 salários mínimos;

na faixa entre 4 e 6 salários mínimos tiveram 3% desse universo; entre 7 e 9 não

tivemos doadores, e acima de 10 salários atingimos um percentual de (4%). Ainda

verificamos outros (47,9)% não responderam. Aqui no Brasil também temos

dificuldade que pessoas que têm a renda um pouco mais elevada, responder a esse

tipo de questionamento.

Tabela 7 - Distribuição dos doadores segundo religião

Religião QTD. % Católica 36 75,0%

Protestante 3 6,3% Judaica - - Islâmica - - Budista - - Outra 1 2,0%

Sem Religião 8 16,7% Total 48 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

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Em relação à religiosidade, ou melhor, ter ou professar uma crença religiosa

36 (75%) denominaram-se católicos, 3 (6,3%) protestantes, 1(2%) kardecista, o qual

inseriu-se na categoria outra, enquanto 8 (16,7%) das pessoas se autodenominou

sem religião.

Os dados empíricos ilustram o quadro atual da filiação religiosa não só

brasileira como em outros países como o caso de Portugal, inserido nesse contexto

de transformações gerais, o fenômeno religioso brasileiro experimenta significativas

alterações.A religião tradicional, o catolicismo, passou a declinar consideravelmente.

Nos anos 70, segundo dados do IBGE, (92%) da população declarava-se católica.

Mas, de acordo com Pierucci (2004) a tabela mostra um percentual considerado dos

que se audenominaram sem religião.

Os resultados do Censo Demográfico 2010 mostram o crescimento da

diversidade dos grupos religiosos no Brasil. A proporção de católicos seguiu a

tendência de redução observada nas duas décadas anteriores, embora tenha

permanecido majoritária. Em paralelo, consolidou-se o crescimento da população

evangélica, que passou de (15,4%) em 2000 para (22,2%) em 2010. Dos que se

declararam evangélicos, (60,0%) eram de origem pentecostal, (18,5%) evangélicos

de missão e (21,8%), evangélicos não determinados. A pesquisa indica também o

aumento do total de espíritas, dos que se declararam sem religião, ainda que em

ritmo inferior ao da década anterior, e do conjunto pertencente às outras

religiosidades.Os dados de cor, sexo, faixa etária e grau de instruçãorevelam que os

católicos romanos e o grupo dos sem religião são os que apresentaram

percentagens mais elevadas de pessoas do sexo masculino. Os espíritas

apresentaram os mais elevadosindicadores de educação e de rendimentos.

A religião é um fenômeno que tem como um de seus componentes a auto-

afirmação individual e conseqüentemente a afirmação social. Portanto, esta é um

referencial não só para a questão subjetiva quanto para a interferência do social no

indivíduo.Aquela muitas vezes não é explicitada enquanto a realidade externa é

explicitada nos discursos dos doadores. Por isso, a religião como espaço é capaz de

instigar as pessoas a uma reorganização da sua experiência no mundo.

Para Rabelo (1998), é possível fazer uma análise entre cultura e as estratégias

nas quais o ritual religioso é capaz tanto de orientar, como reorientar a atitude de

seus participantes sempre procurando compreender o efeito produzido e se de fato

há mudanças nas pessoas.

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Tabela 8 – Distribuição dos doadores segundo motivação

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Entretanto, no que se refere às formas que mais apareceram enquanto

motivações para doar medula, a solidariedade esteve presente em quase todas as

falas e, que consiste nas relações sociais reais de pessoa para pessoa, de acordo

com suas interações e comportamentos de uma em relação à outra; sendo

determinado por normas que regem o sistema no qual as pessoas estão inseridas,

especificamente quando este é feito por um conjunto de normas, práticas e padrões

de comportamento permitido ou proibido. A seguir alguns depoimentos de doadores:

“A pessoa deve ter o amor para salvar outra vida também”

“Acabei por me sentir alguém melhor e diferente por ter conseguido salvar

alguém, ou seja, acabou por ser muito bom para mim também”.

“Que a pessoa que recebeu minha medula fique bem e a minha energia”

Fator que o motivou a ser um doador % O Pedido de um amigo 4 8,3%

Um parente está a precisar 2 4,2% Preocupado com os doentes 16 33,3% Doença ou Morte na Família - -

Religião - - Solidariedade 17 35,4% Generosidade 3 6,3%

Altruísmo - - Cidadania 5 10,4%

Ter boa saúde - - Pode precisar amanhã 1 2,1%

Outros - -

Total 48 100%

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Tabela 9 - Distribuição dos doadores segundo prática religiosa

Praticante QTD. %

Praticante 10 20,8%

Não praticante 12 25,0%

Ocasionalmente 18 37,5%

Não Respondeu 8 16,7%

Total 48 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

As Religiões valorizam a existência de uma vida além da morte, sendo a

conservação do corpo, neste mundo, explicada através da dicotomia: prêmio

castigo. Para a Religião Católica, a integridade do corpo pós-morte é considerada

um prêmio. O fenômeno religioso é um dos componentes que muito interessa, tanto

através da ideologia, quanto por sua prática e auto -afirmação (individual ou social).

Esse fenômeno é um referencial não só para as questões subjetivas, quanto para a

interferência do social no individual. Dessa maneira, religiosidade aparece,

freqüentemente como um divisor entre uma realidade externa e uma interna que

está na vida das pessoas

Tabela 10 - Distribuição dos doadores segundo expectativa quanto ao transplantado

Expectativa em relação ao transplantado QTD. %

Indiferente 8 16,7%

Gratidão 10 20,8%

Retribua socialmente 17 35,4%

Outros 13 27,1%

Total 48 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Acima de qualquer discussão que a comunicação pode ser ser considerada um

fator de unidade social de forma que não não há possibilidade de haver um grupo

sem que haja comunicação entre seus elementos. Entretanto, as necessidades

humanas de comunicação atendem a alguns objetivos. A comunicação com o outro,

compreendendo sendo uma conexão necessária com outros indivíduos, e a partir

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daí a criação de um grupo que fortalece a sobrevivência individual, bem como a

comunicação entre os grupos, faz também melhorar a perspectiva de vida, já não

mais apenas como soberevivência do grupo, mas como intercâmbio e traços para

melhorar as condições em relação ao meio ambiente e ao futuro desejado.

Assim a forma de comunicar-se com o desconhecido, é a comunicação com

alguma coisa que possa facilitar ou ameaçar a subsistência do grupo. Em muitas

ocasiões, a ritualização de procedimento que encaminham a percepção do indivíduo

e do grupo às imagens que abordem na forma do significado pretendido ou o mais

próximo idealizado para a situação, não deixando ao acaso a utilização de

elementos do repertório do outro.

E assim criam-se os espaços para os rituais homogeneizados de experiências e

de conduta, conhecidos inicialmente na esfera de religiosidade, particularmente, que

desde os tempos primitivos estabelecem essa área de conhecimento e de

reconhecimento do outro.

E é quando a dádiva pode ser usada como senha para sentimentos e memória,

individual ou coletiva, que armazena e repete, ou que imagina ser espontânea ou

apreendida. No caso da dádiva nesse exemplo, há uma observação do objeto para a

presença – na ausência, seu valor simbólico certamente será diferente, que pode ser

maior ou menor do que o valor de mercado, pois este está ligado ao valor do laço, o

que está sendo representada na categoria de retribuição social, bem como gratidão.

Tabela 11 - Distribuição dos doadores segundo alterações pós doação

Após a doação, considera poder existir alterações no seu corpo

QTD. %

Sim 5 10,4%

Não 42 87,5%

Não opinaram 1 2,1%

Total 48 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

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Tabela 12 - Distribuição dos doadores segundo doação medula óssea x doação de sangue

Considera existir semelhança entre doação de medula óssea e de sangue

%

Sim 22 45,8%

Não 23 47,9%

Não opinaram 3 6,3%

Total 48 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Tabela 13 - Distribuição dos doadores segundo recompensa

Ao fazer a doação de medula óssea espera algo em troca

%

Sim 2 4,2%

Não 46 95,8%

Não opinaram - -

Total 48 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

5.2 Caracterizacão dos Receptores do estudo em Recife e Lisboa

A temática proposta aos dois grupos foi o transplante de células-tronco

hematopoiéticas. Utilizamos como instrumento de coleta de dados a técnica da

entrevista com um roteiro de questões pré-estabelecidas, que apesar de ter a

temática definida, ter uma pesquisadora, oportunizava o discurso livre e de

profundidade. O estudo foi realizado com uma população de 62 sujeitos que foram

submetidas ao transplante de células-tronco hematopoiéticas de medula óssea, que

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Tabela 14- Distribuição dos receptores segundo o sexo

SEXO QTD. %

M 11 33,3%

F 22 66,7%

Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Tabela 15- Distribuição dos receptores sugundo idade

IDADE QTD. % 1-10 2 13,3%

18-28 - - 29-39 7 46,7% 40-49 3 20,0% 50-59 3 20,0% 60-69 - - Total 15 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Tabela 16 – Distribuição dos receptores quanto a naturalidade

Naturalidade QTD. %

Portuguesa 33 100,0%

Outras 0 0,0%

Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Tabela 17- Distribuição dos doadores segundo a escolaridade no periodo de 2002 a 2010

Grau de Instrução QTD. %

2º/3º Ciclo (9º ano) 11 33,3%

Licenciatura 4 12,1%

Pré-primária 1 3,0%

Secundário 17 51,5%

Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

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Tabela 18 - Distribuição dos recptores segundo Estado Civil

Estado Civil QTD. %

Casado(a) ou união de facto 14 42,5%

Divorciado/a 3 9,0%

Solteiro(a) 15 45,5%

Não Respondeu 1 3%

Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Tabela 19- Distribuição dos receptores segundo religião

Religião QTD. %

Católica 26 79%

Não sou religioso 3 9%

Outra 2 6%

Sem Religião 2 6%

TOTAL 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

Tabela 20- Distribuição dos receptores frequência religiosa

Praticante QTD. %

Ativamente 5 13,9%

Não sou praticante 6 16,7%

Ocasionalmente 17 47,2%

Não Respondeu 8 22,2% TOTAL 36 100%

Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

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Tabela 21- Distribuição dos receptores quanto ao tipo de coleta

Que tipo de doação recebeu? QTD. %

Cateter 21 63,6%

Medula óssea 12 36,4%

Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora

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5.3 As Motivações dos doadores para com o ato de doar de Medula Óssea

O objetivo deste tópico é analisar os diversos discursos dos doadores, partindo

do pressuposto de que a doação é um processo que se constrói a partir de

informações sobre o seu significado, objetivos e relevância para a sociedade

construindo assim, um fenômeno social.

Procura-se também, a partir dos depoimentos dos informantes doadores,

demonstrar quais as razões que os motivam os mesmos a procurar o hemocentro

para realizar suas doações, onde às representações acerca da doação de medula

estão muito ligadas às representações sociais das pessoas quanto à qualidade do

sangue e a percepção quanto ao funcionamento da Instituição HEMOPE prestadora

de serviços à população na área de hemoterapia e hematologia.

VASCONCELOS (1995) procura mostrar que os motivos inconscientes que

justificam moral, ou racionalmente a prática de um costume, a aceitação de uma

crença, ou a existência de uma instituição são, às vezes, diferente das razões

explicitadas na forma como a pessoa se apresenta para realizar algum ato, como

por exemplo: a doação de medula. Estabelecendo uma correlação entre estas

razões e os aspectos culturais do doador, chega-se a compreensão do seu gesto. É

possível que as razões da doação estejam muito próximas das motivações

germinais12 do indivíduo, entretanto, não se deve esquecer que essas motivações

sempre dependem do somatório das questões subjetivas aquelas potencializadas

pela biografia individual e pelas injunções objetivas sócio-culturais.

A partir dos relatos as definições sobre motivações para doar medula foram

agrupadas em categorias que foram sistematizadas a partir de elementos

semelhantes percebidos nas falas dos entrevistados. Esta categorização se

apresenta da seguinte forma:

Significa assumir que nosso interesse para o estudo se volta para o estudo das

formas assentadas na voluntariedade na perspectiva desses atores sociais. Para

tanto, o estudo sob a ótica antropológica, significa ir ao encontro das motivações

que levaram essas pessoas a se cadastrarem, com base no questionamento quanto

aos limites da ação técnica na área de saúde diante da doença. Então o

12

Significando razões subjetivas, individuais e próprias do doador (VASCONCELOS, 1995, p. 139).

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pesquisador não somente é quem acumula dados mensurados, variáveis ou teorias,

mas, sobretudo quem a habilidade de construir na relação pesquisador/objeto

sentimentos de confiança e respeito.

QUADRO 1- Distribuição das Motivações

CATEGORIA FREQUÊNCIASolidariedade com desconhecidos 10 doadores

Relação de parentesco 13 doadoresPara ajudar as pessoas 10 doadores

Religiosa 03 doadores Gratidão 05 doadores

Obrigação 04 doadoresFonte:

Vale ressaltar, que alguns doadores apresentaram mais de um motivo que os

levaram a realizar a doação. E consideramos enriquecedor para o estudo

contextualizar sobre todos os motivos que nos foram relatadas. As representações

sobre as motivações serão apresentadas em acordo Minayo ”como uma categoria

de pensamento que expressa a realidade, a explica justificando-a ou questionando-

a” (MINAYO, 1994, p.89).

O paradigma da dádiva tem atraído o interesse de pesquisadores voltados para

sua análise nas sociedades complexas. A tônica permanece sendo o escrutínio das

regras e práticas que governam os sistemas de troca e seus impactos na vida social.

Nessa abordagem, sabemos que a vida em sociedade é resultado de um processo

cultural que se concretiza pelas relações sociais que instituem símbolos. Estes

expressam uma determinada visão de mundo comum, manifestando-se em várias

formas de comunicação, como a linguagem, comportamentos, artefatos materiais,

entre outros. Os símbolos instituídos terão capacidade de influenciar e controlar o

comportamento humano, dependendo da sua capacidade de transmitir e reforçar um

sistema ideológico já dado. A sociedade, então, pode ser considerada um agregado

de relações sociais, e a cultura é seu conteúdo, enfatizando os recursos acumulados

que as pessoas adquirem como herança, na medida em que os utilizam, transforma,

acrescentam e transmitem.

A decisão de procurar certas formas de ajudar ao outro emana de uma

avaliação da situação que está sendo vivenciada e da intenção para com o próximo.

Essa decisão de poder ajudar está fortemente relacionada à importância da família.

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Desse modo, é interessante observar a manutenção de atitudes positivas em

relação aos familiares e amigos citados nessas narrativas. As representações

sociais explicam a realidade de forma que possibilite que os grupos sociais se

organizem no seu dia-a-dia, orientando, assim, condutas e comportamentos em

suas ações. (RABELO, 1999).

Desta maneira a dádiva explicita os mecanismos relacionados com as

contradições, trocas recíprocas, surgidas por intermédio aparentemente voluntário.

Nela, fica evidente que, as dádivas, mesmo parecendo voluntárias, se submetem a

uma obrigatoriedade transcendente, tanto no seu instante inaugurador quanto no

seu retorno conseqüente. Com essa categoria de fato social total coloca toda

sociedade em movimento

A necessidade de se problematizar e sistematizar da forma mais profunda o

aspecto da doação de medula óssea, assim como suas especificidades, aproximou-

nos da perspectiva interpretativa, nela a cultura é concebida como uma linguagem

textual e sua análise uma interpretação provisória, de decodificações dos sistemas

simbólicos que estão sujeitos a novos olhares (GEERTZ, 1989).

Neste sentido Jaques Godbout (1999) nos faz lembrar que mesmo nas

sociedades modernas na esfera doméstica continua sendo um lugar natural de

dádiva fato de priorizar tais recortes significa a relevância dos mesmos. Para ele,

seria no universo das relações que se permite dar sem interesse. Porém, a premissa

constitui um fator significativo na economia da dádiva, como argumenta Mauss

(2003).

O envolvimento dos indivíduos, os laços de amizade, familiaridade, vizinhança

enquanto doadores de medula matizam o cenário com características importantes

quanto ao alcance da ação vai depender da percepção e interpretação concebidas

pela população inserida no contexto social. O afeto circula nesses espaços, da

mesma maneira que a necessidade de criação de mecanismos institucionais que

façam com que a ação se amplie para além dos limites institucionais. Assim para

que o ato seja realizado passa por uma decisão individual, porém exige uma

participação coletiva. O olhar para o interior dessas pessoas que se estruturam em

torno de regras de sociabilidade referidas ao circuito da dádiva (MAUSS, 1960;

1999). Entretanto, ao enfatizar o tema da solidariedade para com o outro-o que é

assistido-procurei o discurso que fundamenta ás relações que institucionaliza o

grupo.

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5.3.1 A Doação de Medula Óssea como Dádiva e o Vínculo Social

No presente tópico, analisaremos o que a doação de medula óssea e dádiva têm

em comum. Segundo Caillé (2001), as Ciências Sociais tentam classificar os

fundamentos da sociedade por meio de uma concepção utilitarista, segundo a qual

seus membros interagem movidos por interesses pessoais, não raro egoístas. Tais

Ciências divergem sobre como se deve pensar a sociedade: a partir do ponto de

vista dos próprios indivíduos, ou tomando como referencial a totalidade, que eles

formam que, por sua vez, constitui a própria sociedade. Sob a óptica do utilitarismo,

segundo o autor, está dividido em um momento individualista e outro holístico,

aparentemente inconciliáveis.

O autor defende que existe uma terceira via, possível, designada por ele de

interacionista. Tal visão constitui uma nova abordagem possível que explica o

relacionamento dos indivíduos em sociedade: é o paradigma da dádiva. Para

compreendermos o paradigma da dádiva, bem como seus impactos sobre a doação

de medula é importante definirmos o que é dádiva. O conceito de dádiva surgiu a

partir dos estudos etnográficos de Marcel Mauss, que vieram a público em 1923.

Mauss realizou diversas pesquisas em sociedades primitivas e constatou que a

forma de relacionamento entre as tribos, bem como entre os indivíduos, baseava-se

numa tríplice obrigação: dar, receber e retribuir. Segundo o referido autor, a dádiva é

a base da vida social e constitui uma mera troca de bens devido as complexas e

diferentes formas de comportamento praticadas em seu rastro.

Os movimentos de dar, receber e retribuir são classificados por Mauss como

fenómenos sociais totais por animarem inteiramente a estrutura social. Segundo

Caillé (2001), o movimento de dar, receber e retribuir o ciclo apresenta algumas

singularidades. Ao mesmo tempo em que o indivíduo dá sem receber nada em troca,

é natural que aquele que recebeu venha por sua vez, a retribuir o favor,

estabelecendo assim um ciclo que se renova a cada movimento. Esta constante

troca institui o circuito da dádiva, que é por natureza temporal, e que se fortalece á

medida que as ações são renovadas. É importante destacar que para Mauss essas

trocas não são ingénuas e desinteressadas, mas buscam a manutenção de uma

aliança.

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As reflexões de Mauss em sua obra buscam as razões que levam os homens às

trocas necessárias entre si e nos remetam a análises acerca da permanência

dessas práticas na sociedade moderna. Para Mauss, a dádiva permeia de forma

reduzida a sociedade ocidental contemporânea. Os estudiosos que formam a Revue

Du Mauss discordam sobre o caráter limitado da dádiva na modernidade. Formada

por pesquisadores como Alain Caillé, Jacques Goudbout e Guy Nicolas, entre

outros, a produção académica moderna pesquisa a aplicabilidade do paradigma da

dádiva a modernidade.

As representações sociais nesse campo, muitas vezes podem ser demonstrada

em crenças e atitudes que explicam os comportamentos que podem ser comuns a

determinados grupos sociais. Assim, amplia-se a discussão para um melhor

entendimento do saber científico, das crenças, e de outros factores que possam

estar envolvidos e oferecer mais subsídios para o estudo da representação social da

doação de medula óssea.

Neste contexto, reconhece-se que a questão dos transplantes de órgãos e

tecidos é tema atual que mobiliza a sociedade e ocupa espaço na vida e no

imaginário das pessoas, porque deixou de ser um procedimento experimental,

passando a ser incorporado com opção terapêutica. Devido a esse fato tem sido

alvo de muita atenção seja pelo avanço da medicina, seja pela abrangência das

campanhas de doação de órgãos ou ainda por envolver questões relacionadas à

vida e à morte, cujos ecos podem ser captados e revelados nas falas dos sujeitos da

pesquisa.

5.3.2 O Estado como substituto da Dádiva

O Estado por muito tempo foi e ainda é considerado por muitos, como forma de

apresentação da dádiva nos tempos modernos. Ele seria a representação da

solidariedade, pois redistribui de forma ampla e igualitária. No entanto esse sistema

coexiste com dois outros sistemas. A dádiva e o mercado, e está formado por

princípios diferentes dos demais. O Estado assumiu o papel de substituto da

caridade na medida em que os serviços antes prestados pelas redes de organização

de caridade, passaram a ser assumidos pelos mesmos.

Na sociedade moderna, na qual a presença do Estado é marcante, uma parcela

significativa das coisas que circulam passa pelo circuito da esfera pública. Para

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Timus (1972) o Estado tem a propriedade de difundir, na sociedade o espírito da

dádiva, pois a solidariedade governamental e a dádiva se ampliam e se alimentam

mutuamente. Ao apelar para a solidariedade entre os desconhecidos, como no caso

nas campanhas de doação de sangue, considerada como uma das formas mais

marcantes de dádiva. O Estado estimula o sistema de dádiva. A redistribuição de

recursos promovida pelo Estado representa, para o autor, a forma específica que a

dádiva assume na sociedade ocidental moderna, e seria o substituto da dádiva.

Desse modo, ao examinar a problemática da dádiva, Mauss acabou por

desvelar um tipo de relação social que permite integrar as chamadas “obrigações

recíprocas” na análise das questões sociais. Esse ponto é fundamental uma vez que

torna possível demarcar um terceiro princípio, para além da redistribuição e do

reconhecimento, na compreensão dos processos sociais: o princípio da reciprocidade.

A teoria Maussiana traz elementos relevantes para se pensar o laço social, a aliança

entre os indivíduos em interação, e não apenas as relações de grupo de pessoas que

no caso em estudo são os candidatos à doação de medula óssea.

Para que haja a contínua participação dos indivíduos na doação de medula óssea

é imprescindível que o indivíduo possa perceber este ato como uma forma de

atender uma necessidade social, que só pode ser suprida através do ser humano.

Quando o indivíduo não compreende os benefícios que o seu ato representa, mas

difícil será a construção de um processo participativo. No ensaio sobre a dádiva,

Mauss desenvolve a noção de reciprocidade, e é um dos principais teóricos que

sempre estabeleceu uma via onde pode transitar qualquer coisa, seja material ou

simbólico, pois a dádiva inaugura o conceito de aliança na qual a reciprocidade

alimenta.

Para Salém (1980) as interações voluntárias entre os indivíduos são motivadas

a nelas ingressarem e permanecerem em função de algum retorno, o que deve ser

positivo, de modo que se houver alguma frustração, por parte de um ou de ambos os

atores, em suas expectativas, essa associação será interrompida. A maioria dos

doadores pode está nesta categoria, pode ter alguma relação com as pessoas que

precisam, ou precisariam receber transplante de medula óssea. Essa relação está

tanto nos laços de amizade, como também no biológico. Doar, visando à

necessidade própria, ou a de um parente ou amigo, pode constituir o inicio de um

processo onde a doação para estas pessoas está sendo praticada e depende das

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relações de proximidade entre doadores e receptores e por isso pode ser garantida

aos seus pacientes que estão precisando do tratamento hematológico

Optar por uma abordagem dessa natureza é debrucar-se sobre uma discussão

que aborda a relação pesquisador/pesquisado, e também problematizar a inserção

de novas temáticas para a reflexão antropológica contemporânea. A partir dessa

discussão, emergem novas abordagens e pressupostos metodológicos, o carater

interdisciplinar e a possibilidade da utilização de novas posições teóricas.

5.4 Caracterizando dos Receptores de Medula Óssea em Recife e Lisboa

O estudo foi realizado com uma população de 62 sujeitos, dividida em dois

grupos sociais distintos: um grupo, composto de 31 pessoas com diversos

diagnósticos de doenças oncohematológicas que foram submetidas ao transplante

de células-tronco hematopoiéticas, que ao longo da análise, denomino como

pessoas transplantadas e, o outro com 26 pacientes de dois Serviços de Transplante

de Medula Óssea.

O Quadro 1 apresenta os sujeitos distribuídos nas duas Instituições, que

serviram de campo para o estudo. Observa-se, que 100% das pessoas

transplantadas estão sendo acompanhadas no ambulatório geral da

Oncohematologia tanto em Lisboa no Instituto Português de Oncologia como no

Hospital Português do Recife.

Na Instituição A, há um serviço ambulatorial específico do transplante, como na

Instituição B, bem como uma unidade de internação. O acompanhamento no período

pós transplante a médio e longo prazo também são realizados no ambulatório geral

da Oncohematologia.

A separação a princípio é para facilitar a sistematização dos dados dos dois

grupos que são universos sociais diversos.

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Quadro 2: Participantes do Estudo em Recife e Lisboa no período de 2002 a 2011

Fonte: Pesquisa de campo, 2011.A autora

No período analisado, 133 pacientes realizaram transplante com doadores não

aparentados destes, 107 em Lisboa e 26 em Recife. Os pacientes transplantados

em Lisboa (51,4%) são do sexo feminino, enquanto em Recife (69,2%) pertence ao

sexo masculino. Estão na faixa etária de 0 a 17 anos em Portugal (54,2%) e Recife

(50 %) com diagnóstico prevalente de Anemia Aplástica, Leucemia Mieloide Aguda.

O estudo chama a atenção para o fato de que Lisboa realizou mais transplantes na

faixa etária de 30 a 39 anos (18,7%), diferente de Recife (11,5%) na mesma faixa

etária. Em relação à faixa etária de 18 a 29 anos, apresentou um percentual de

(15,9%). A pesquisa mostrou a leucemia mieloide aguda como a doença mais

prevalente em Lisboa. É um dado que corrobora com a literatura, por afetar

indivíduos de todas as idades, principalmente os que estão na fase adulta. Nesse

estudo está na faixa etária acima de 50 anos em Lisboa (6,5%) e Recife (3,8%).

Ressaltamos que, no período da coleta de dados, Recife tinha uma população de

1.537.704 e Lisboa 2.821.699 pessoas. Apesar de Recife possuir outras unidades,

apenas o centro onde foi realizada a pesquisa estava fazendo este tipo de

transplante.

A concentração de pessoas com idade inferior a 60 anos reflete os dados de

transplantados no Brasil e no mundo, por ser um procedimento de alta

complexidade, que para ser realizado o portador de câncer precisa estar em

remissão da doença e em bom estado geral.

Sujeitos Instituição de Saúde A

Instituição de Saúde B

Total

Grupo de Pessoas transplantadas

107 26 133

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PORTUGAL RECIFE

Fonte : Pesquisa de campo, 2011 Fonte : Pesquisa de campo, 2011

Fonte : pesquisa de campo, 2011 Fonte : pesquisa de campo, 2011

Fonte : pesquisa de campo, 2011 Fonte : pesquisa de campo, 2011

Gráfico 4- Gráfico 5-

Gráfico 6- Gráfico 7-

Gráfico 8- Gráfico 9-

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Doadores 0‐17 % 18‐29 % 30‐39 % 40‐49 % >=50 % %

Masculino 52 31 53,4% 7 41,2% 8 40,0% 3 60,0% 3 42,9% 48,6%

Feminino 55 27 46,6% 10 58,8% 12 60,0% 2 40,0% 4 57,1% 51,4%

107 58 54,2% 17 15,9% 20 18,7% 5 4,7% 7 6,5% 100,0%

Doadores 0‐17 % 18‐29 % 30‐39 % 40‐49 % >=50 % %

Masculino 18 10 76,9% 3 50,0% 1 33,3% 3 100,0% 1 100,0% 69,2%

Feminino 8 3 23,1% 3 50,0% 2 66,7% 0 0,0% 0 0,0% 30,8%

26 13 50,0% 6 23,1% 3 11,5% 3 11,5% 1 3,8% 100,0%

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

É pensando nessa de análise sobre a teoria da dádiva que assumimos

integralmente as idéias dede Mauss. Aprendemos com ele que a preocupação

principal não é elaborar um grande esquema teórico geral que cubra todo o campo-

tarefa impossível- mas mostrar algumas dimensões do campo de que apenas

tocamos as margens. Nessa perspectiva, procuramos encontrar no pensamento

Marcel Mauss, Pierre Bourdieu, Honneth, apontamentos capazes de subsidiar uma

reflexão sobre a doação e recepção de medula óssea, não só no Brasil como

também em Lisboa.

Outro ponto a ser considerado: no Brasil o cadastro de doadores voluntários é

descentralizado, ou seja, é responsabilidade dos hemocentros a captação desses

doadores.

Em Portugal há dois centros de doadores o primeiro localizado em Lisboa,

denominado Centro de Histocompatibilidade do Sul e o segundo na Cidade do Porto,

Centro de Histocompatibilidade do Norte.

No Brasil, o cadastro é realizado até 55 anos, enquanto em Portugal é até 49

anos. O diagnóstico mais prevalente para a indicação do Transplante de Medula

Óssea em Lisboa foi a Leucemia Mielóide Aguda, enquanto no Recife foi a Anemia

Aplástica.

O estudo revelou mais adesão por parte das mulheres, tanto em Recife, como

em Portugal. O que pressupõe que a compatibilidade não é um fator determinante

quanto ao gênero.

Percebeu-se ainda, que tanto os doadores como os receptores estão

classificados como católicos e não foi encontrado nenhum relato de pessoa sem

religião. Isso sugere que o sofrimento, relacionado à doença, anterior ao transplante,

os leva a aproximar-se da religião. No entanto, ao serem perguntado sobre a

frequência dessa prática (47,2%) responderam ser ocasional.

A compreensão da complexidade das mudanças paradgimáticas no campo

médico, é dificultado, em grande parte, pelas resistências em se ver a medicina

como um fenômeno social total, na pesrpectiva Maussiana do termo.

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A medicina é também um fato social total quando se abre a uma

compreensão inter disciplinar, quando do reconhecimento como instituição e que

depende de um imaginário mais amplo.

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ANEXOS

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ANEXO A- PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA/RECIFE

ANEXO B- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO DOADOR/RECIFE

ANEXO C- PANFLETO INFORMATIVO DOADOR/RECIFE

ANEXO D- PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA/LISBOA

ANEXO E- PARECER DO COMITÊ DE CIENTÍFICO/LISBOA

ANEXO F- FORMULÁRIO DE INSCRIÇÃO DOADOR/LISBOA

ANEXO G- INQUÉRITO DE SATISFAÇÃO DOADOR/LISBOA

ANEXO H- CARTA DE ANUÊNCIA DO CEDACE/LISBOA

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ANEXO A – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA/RECIFE

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ANEXO B – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO

DOADOR/RECIFE

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ANEXO C – PANFLETO INFORMATIVO DOADOR/RECIFE

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ANEXO D – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA/LISBOA

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ANEXO E- PARECER DO COMITÊ DE CIENTÍFICO/LISBOA

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ANEXO F- FORMULÁRIO DE INSCRIÇÃO DOADOR/LISBOA

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ANEXO G- INQUÉRITO DE SATISFAÇÃO DOADOR/LISBOA

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\

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APÊNDICES

APÊNDICE A- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-

DOADOR/ RECIFE

APÊNDICE B- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-

RECEPTOR/ RECIFE

APÊNDICE C- QUESTIONÁRIO DOADOR/ RECIFE

APÊNDICE D- QUESTIONÁRIO RECEPTOR/ RECIFE

APÊNDICE E- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-

DOADOR/ LISBOA

APÊNDICE F- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-

RECEPTOR/ LISBOA

APÊNDICE G- QUESTIONÁRIO DOADOR/ LISBOA

APÊNDICE H- QUESTIONÁRIO RECEPTOR/ LISBOA

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APÊNDICE A- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO DOADOR/RECIFE

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APÊNDICE B- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-

RECEPTOR/ RECIFE

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Nome da Pesquisa: Doação de Medula Óssea: voluntários e devedores

Informações importantes aos sujeitos da pesquisa

Meu nome é Maria de Fátima Patu da Silva, sou assistente social (CRESS nº 2827),

aluna da Pós-Graduação em Sociologia, responsável pelo projeto de pesquisa acima

citado. Trabalho no projeto Doadores voluntários de Medula Óssea desde sua

implementação em 2002. Necessito da sua colaboração para participar da pesquisa

que será meu trabalho de conclusão do doutorado. Comprometo-me em lhe informar

a respeito do projeto e de seus direitos e, em caso de aceitação, solicito sua

assinatura no local determinado ao final do termo. A orientadora do projeto é a

professora Drª Maria Helena Villas Boas Concone, antropóloga da PUC/SP.

O objetivo da pesquisa é analisar a doação de medula óssea na perspectiva da

representação dos doadores, profissionais, receptores e dos familiares a estes

associados.

Gostaríamos de contar com sua colaboração, como receptor de medula e tudo o que

você falar será mantido em sigilo (anonimato). A qualquer momento poderá deixar

de participar da pesquisa sem prejuizo do tratamento. As informações que serão

fornecidas poderão ser utilizadas em trabalhos científicos, porém sua identidade

será preservada. Caso aceite, será realizada entrevistas sobre algumas questões

relativas após o transplante de medula óssea. Os resultados dessa pesquisa

ajudarão a compreender a lógica da doação de medula óssea e poderá contribuir na

política de captação de doadores. Após tomar conhecimento, aceito participar da

pesquisa assumindo não ter sofrido nenhuma pressão para tanto:

Eu, _______________________ aceito participar da entrevista do projeto de

pesquisa intitulado Doação de Medula Óssea: voluntários e devedores, em data e

local marcado antecipadamente. Estou ciente que a entrevista será espontânea, as

informações serão tratadas sigilosamente e caso decida não mais participar, tenho a

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liberdade de retirar meu consentimento. Eu recebi uma cópia desse termo e a

possibilidade de poder lê-lo a qualquer momento.

Assinatura do voluntário: _______________________________________________

Assinatura do responsável pela criança/adolescente: _______________________

Assinatura do pesquisador responsavél: __________________________________

Testemunha: ________________________________________________________

Data: ___/____/____

Endereço para contato: Rua Azeredo Coutinho, 121, Bl 08 Aptº 302, Várzea,

Recife/PE.

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APÊNDICE C- QUESTIONÁRIO DOADOR/ RECIFE

QUESTIONÁRIO PARA DOADORES VOLUNTÁRIOS DE MEDULA ÓSSEA/RECIFE

DADOS PESSOAIS

NOME

COMPLETO____________________________________________________________

TELEFONES______________________________

1. RELIGIÃO____________________________ 

IDADE:  18‐28(  )     29‐39(  )     40‐49(  )     50‐59(  ) 

2. NÍVEL DE ESCOLARIDADE 

2.1 ENSINO FUNDAMENTAL(   )   ENSINO MÉDIO(   ) ENSINO SUPERIOR(   )                

ANALFABETO(   ) 

2.2 COMPLETO (   ) INCOMPLETO (   ) 

3.  PROFISSÃO______________________________    

3.1 DESEMPREGADO?     SIM (   )     NÃO (   ) 

4. RENDA 

4.1 RENDIMENTO MÉDIO MENSAL 

 ATÉ UM SALÁRIO (   ) 

2 A 4 SALÁRIOS  (   ) 

5 A 7 SALÁRIOS  (   ) 

8 A 10 SALÁRIOS (   ) 

 QUANTO AO CONHECIMENTO SOBRE DOAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA 

5. COMO VOCÊ FICOU SABENDO SOBRE A DOAÇÃO VOLUNTÁRIA DE MEDULA ÓSSEA? 

NO HEMOPE(   ) 

NA CENTRAL DE TRANSPLANTES(   ) 

POR AMIGOS, PARENTES OU CONHECIDOS(   ) 

PALESTRAS, FEIRA DE CONHECIMENTO(   ) 

VOCÊ PROCUROU INFORMAÇÕES(   ) 

PELOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. QUAIS? 

RÁDIO (   )      TELEVISÃO(   )      REVISTA(   )       JORNAL (   )     INTERNET(   ) 

OUTROS MEIOS, QUAIS?______________________________________________ 

 

QUANTO AOS FATORES MOTIVACIONAIS PARA A DOAÇÃO 

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6. QUAL O PRINCIPAL FATOR QUE O MOTIVA  A SE TORNAR UM DOADOR DE MEDULA ÓSSEA? 

A PEDIDO DE UM AMIGO(A) (   ) 

UM PARENTE ESTÁ PRECISANDO (   ) 

INFLUÊNCIA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. QUAL? 

RÁDIO (   )      TELEVISÃO(   )      REVISTA(   )       JORNAL (   )     INTERNET(   ) 

PREOCUPADO COM O PROBLEMA DOS PACIENTES QUE PRECISAM DE TRANSPLANTE 

/SALVAR VIDAS (   ) 

DOENÇA GRAVE OU MORTE NA FAMÍLIA NO ÚLTIMO ANO (   ) 

MOTIAVAÇÃO RELIGIOSA (   ) 

AJUDAR AOS OUTROS/ HUMANISMO/ SOLIDARIEDADE (   ) 

DOAR HOJE PORQUE PODE PRECISAR AMANHà(   ) 

DEVER DE CIDADANIA/ OBRIGAÇÃO DE QUEM TEM BOA SAÚDE (   ) 

OUTROS MOTIVOS. QUAIS?_________________________________ 

QUANTO AOS FATORES QUE DESMOTIVAM E IMPEDEM A DOAÇÃO

7. O QUE VOCÊ CONSIDERA SER A PRINCIPAL RAZÃO QUE IMPEDE UMA

PESSOA DE SE TORNAR UM DOADOR DE MEDULA ÓSSEA?

APATIA/DESINTERESSE (   ) 

FALTA DE ESCLARECIMENTO SOBRE A DOAÇÃO (   ) 

FALTA DE CONHECIMENTO SOBRE A IMPORTÂNCIA DA DOAÇÃO  (   ) 

NÃO GANHAR NADA EM TROCA 

SÓ DOARIA SE FOSSE PRA SALVAR A VIDA DE ALGUÉM PRÓXIMO (   ) 

O DOADOR SENTE MEDO (  ) 

MOTIVAÇÃO RELIGIOSA (   ) 

OUTROS. QUAIS?_____________________________________________ 

QUANTO A DOAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA

8. QUAL A SUA EXPECTATIVA EM RELAÇÃOO AO SENTIMENTO DA PESSOA

QUE RECEBERÁ SUA DOAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA?

QUE SINTA GRATIDÃO 

QUE SEJA INDIFERENTE 

QUE PAGUE EM FUNÇÃO DO SEU ATO A DOAÇÃO 

OUTROS.________________________________ 

9. COMO SUA FAMÍLIA E SEUS AMIGOS REAGIRAM AO SABER QUE VOCÊ É UM

CANDIDATO À DOAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA?

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APOIARAM SUA DECISÃO DE SER DOADOR (   ) 

CONCORDARAM, POIS ALGUÉM DA FAMÍLIA OU UM AMIGO PODE PRECISAR (   ) 

NÃO DERAM OPINIÃO (   ) 

NÃO SABEM QUE VOCÊ É UM CANDIDATO (   ) 

NÃO CONCORDAM COM SUA DECISÃO (   ) 

ACHAM A DOAÇÃO PERIGOSA (   ) 

POR MOTIVOS RELIGIOSOS (   ) 

OUTROS___________________________________________ 

10. NA SUA OPINIÃO, QUEM SERIA O RESPONSÁVEL POR ESTAR

INCENTIVANDO AS PESSOAS A SEREM DOADORES VOLUNTÁRIOS DE MEDULA

ÓSSEA?

O PRÓPRIO (   ) 

A SOCIEDADE (   )                 

OS FAMILIARES DA PESSOA QUE PRECISA DE DOAÇÃO (   ) 

O GOVERNO FEDERAL, ESTADUAL E MUNICIPAL (   ) 

OUTROS________________________________________________ 

 

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APÊNDICE E- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-

DOADOR/ LISBOA

Termo de Consentimento

Declaro que foi solicitada a minha participação num estudo sobre Doação de Medula Óssea

realizado por Dra. Maria de Fátima Patu da Silva, no âmbito de colaboração entre Instituto

Português de Oncologia e a Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de

Lisboa e fui informado que:

1.A participação é voluntária e consiste em que responda a um questionário semi-

estruturado;

2.Trata-se de um estudo sobre Doação voluntária de medula óssea com o objectivo de

analisar a doação na perspectiva do reconhecimento social na visão dos dadores voluntários

efectivos e receptores em Recife (Brasil) e Lisboa (Portugal);

3.Os dados referentes à minha identidade, morada, telefone e quaisquer outros que

permitam identificar-me serão mantidos confidenciais e só existirão em ficheiro do CHSul

(não constarão dos impressos e das bases de dados do/s estudos e não serão revelados a

quaisquer outras pessoas ou entidades ligadas ou não ao/s estudos);

4. A divulgação dos resultados, a sua discussão científica a fim de contribuir para uma

melhor eficácia futura, será sempre feita na globalidade, garantindo por isso o anonimato de

cada participante;

5. Considerando-me suficientemente esclarecido sobre o estudo e sobre as medidas de

salvaguarda da confidencialidade dos meus dados pessoais, declaro que consinto em

participar.

Data: ------/-------/-------

Assinatura do/a receptor/a (legível) ---------------------------------------------------------------------

BI/Cartão do Cidadão----------------------------------------------------------------------------------

Assinatura do/a entrevistador/a (legível) -----------------------------------------------------------.

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APÊNDICE F- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-

RECEPTOR/ LISBOA

Termo de Consentimento

Declaro que foi solicitada a minha participação num estudo sobre Doação de Medula Óssea

realizado por Dra. Maria de Fátima Patu da Silva, no âmbito de colaboração entre Instituto

Português de Oncologia e a Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de

Lisboa e fui informado que:

1.A participação é voluntária e consiste em que responda a um questionário semi-

estruturado;

2.Trata-se de um estudo sobre Doação voluntária de medula óssea com o objectivo de

analisar a doação na perspectiva do reconhecimento social na visão dos dadores voluntários

efectivos e receptores em Recife (Brasil) e Lisboa (Portugal);

3.Os dados referentes à minha identidade, morada, telefone e quaisquer outros que

permitam identificar-me serão mantidos confidenciais (não constarão dos impressos e das

bases de dados do/s estudos e não serão revelados a quaisquer outras pessoas ou

entidades ligadas ou não ao/s estudos);

4. A divulgação dos resultados, a sua discussão científica a fim de contribuir para uma

melhor eficácia futura, será sempre feita na globalidade, garantindo por isso o anonimato de

cada participante;

5. Considerando-me suficientemente esclarecido sobre o estudo e sobre as medidas de

salvaguarda da confidencialidade dos meus dados pessoais, declaro que consinto em

participar.

Data: ------/-------/-------

Assinatura do/a receptor/a (legível) ---------------------------------------------------------------------

BI/Cartão do Cidadão----------------------------------------------------------------------------------

Assinatura do/a entrevistador/a (legível) -----------------------------------------------------------.

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APÊNDICE G- QUESTIONÁRIO DOADOR/ LISBOA

Informação para consentimento da entrevista

Chamo-me Maria de Fátima Patu da Silva, sou assistente social, epidemiologista e pesquisadora, tenho como objectivo fazer um estudo que se integra no Doutorado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Brasil). Com ele, pretendo compreender como os doadores efectivos expressam as principais razões para fazer doação de medula óssea na perspectiva do reconhecimento social. Estou a entrevistar pessoas e a pedir-lhes que relatem as suas motivações o que será concretizado através do preenchimento de um questionário semi-estruturado. Naturalmente, só será integrado neste estudo se assim o desejar e poderá rever a sua decisão em qualquer altura. COLETA DE DADOS PARA O PERFIL SÓCIO DEMOGRÁFICO E MOTIVACIONAL Caracterização do (a)participante: 1) Sexo: Masculino Feminino 2) Idade: 18- 28 Anos 29- 39 anos 40- 49 anos 50- 59 anos 3) Naturalidade:____________________________________ 4) Nível de Ensino Frequentado 1º Ciclo (primária) 2º/ 3º Ciclo (9º ano) Secundário Licenciatura Grau Académico Mestrado Doutoramento 5) Estado Civil Solteiro/a Casado/a e ou união de facto Viúvo/a Divorciado/a 6. Agregado familiar Com quem habita? Marido/Mulher ou Companheiro/Companheira Filhos Pais/Sogros Outros 7. Situação profissional Empregado Exerce funções Baixa Desempregado Reformado Por idade Por doença Doméstica 8) Qual sua faixa salarial? ____________________________________ 9) Qual é a sua religião? Católica Protestante

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Judaica Islâmica Budista Hindu Outra Não sou religioso 10) No caso de ser religioso, até que ponto pratica a sua religião? Não sou praticante Ocasionalmente Activamente QUANTO AOS FACTORES MOTIVACIONAIS 11) Qual o principal factor que o motiva a tornar-se um doador de medula óssea? O pedido de um amigo Um parente está a precisar Preocupado com os doentes que precisam de transplante Doença ou morte na família no último ano Motivação religiosa Ajudar os outros, solidariedade, generosidade, altruísmo Dever de cidadania, obrigação de quem tem boa saúde Doar hoje, porque pode precisar amanhã Outros motivos Quais:____________________________________________________________________ 12) Qual a sua expectativa em relação ao sentimento da pessoa que receberá sua medula óssea? Que seja indiferente Que tenha gratidão Que retribua socialmente Outros___________________________________________________________________ 13) Como reagiram a sua família e amigos ao saber que você é candidato a doação de medula óssea? Não concordaram Acham a doação perigosa Não manifestaram opinião Apoiaram a sua decisão Não sabem que você é candidato Concordaram, por pensar que a família ou um amigo pode precisar mais tarde Outros: __________________________________________________________________ 14) Na sua opinião quem é responsável por incentivar a doação voluntária de Medula Óssea? O governo central, Ministério da Saúde A sociedade em geral Os familiares de pacientes que precisam da doação 15) Considera dolorosa a doação de medula óssea? Que tipo: 1.Veias do Braço 2.Catecter 3.Medula óssea Sim Não Caso, sim, descreva o que pensa ou sente. ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 16) Após a doação, considera poder existir alterações no seu próprio corpo? Sim Não

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Caso,sim,descreva__________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 17) E no receptor? Sim Não Caso, sim. Quais?

18) Considera a existência de semelhança entre a doação de medula óssea e a doação de sangue? Sim Não Caso, sim. Quais? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 19) Ao proceder a doação de medula óssea considera estar a dar uma parte de seu corpo? Sim, Não Caso, sim. Qual? ___________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ 20) Ao fazer a doação de medula óssea espera algo em troca? Sim O quê? ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Porquê? --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Não Porquê?___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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APÊNDICE H- QUESTIONÁRIO RECEPTOR/ LISBOA

Informação para consentimento da entrevista

Chamo-me Maria de Fátima Patu da Silva, sou assistente social, epidemiologista e pesquisadora, tenho como objectivo fazer um estudo que se integra no Doutorado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Brasil). Estou a entrevistar pessoas e a pedir-lhes que relatem as suas experiências quanto ao recebimento da doação, o que será concretizado através do preenchimento de um questionário semi-estruturado. O Director do Serviço de Transplantação de Progenitores Hematopoiéticos deu o seu acordo para esta investigação. Naturalmente, só será integrado neste estudo se assim o desejar e poderá rever a sua decisão em qualquer altura. COLETA DE DADOS PARA O PERFIL SÓCIO DEMOGRÁFICO Caracterização do (a)participante: 1) Sexo: Masculino Feminino 2) Idade: 18- 28 Anos 29- 39 anos 40- 49 anos 50- 59 anos 60- 69 anos 3) Naturalidade:____________________________________ 4) Nível de Ensino Frequentado 1º Ciclo (primária) 2º/ 3º Ciclo (9º ano) Secundário Licenciatura Grau Académico Mestrado Doutoramento 5) Estado Civil Solteiro/a Casado/a e ou união de facto Viúvo/a Divorciado/a 6. Agregado familiar Com quem habita? Marido/Mulher ou Companheiro/Companheira Filhos Pais/Sogros Outros 7. Situação profissional Empregado Exerce funções Baixa

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Desempregado Reformado Por idade Por doença Doméstica 8) Qual sua faixa salarial? ____________________________________ 9) Qual é a sua religião? Católica Protestante Judaica Islâmica Budista Hindu Outra Não sou religioso 10) No caso de ser religioso, até que ponto pratica a sua religião? Não sou praticante Ocasionalmente Activamente QUANTO AO TRANSPLANTE 11) O que você sabe sobre transplante de medula óssea e como foi realizado? _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 12) Qual foi a sua expectativa em relação ao transplante? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13) Que tipo de doação recebeu? Veias de braço Cateter Medula óssea 14) Ao receber o comunicado que tinha um doador voluntário, qual o impacto da notícia na família? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 15) Ao submeter-se a um transplante de medula óssea – torna-se um receptor, como retribuir semelhante dádiva? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 16) Considera vir a estabelecer um vínculo com o dador? Sim Não Caso sim, que tipo? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 17) Considera vir a fazer algo para a promoção da doação de medula óssea? Sim Não Caso sim, de que formas: Informar sobre o seu caso e benefícios decorrentes da doação

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conselhar a doação Participar de acções de formação como agentes multiplicadores Contactar outros receptores de modo a criar uma rede de relações Promover aspectos positivos/ negativos ligados a doação/ recepção Reunir conhecimento do que é comum entre todos os receptores