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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
MARIA DE FÁTIMA PATU DA SILVA
TRANSPLANTAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA: COMO É VISTA POR DOADORES E
DOENTES EM LISBOA E NO RECIFE
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
SÃO PAULO
2013
MARIA DE FÁTIMA PATU DA SILVA
Tese apresentada à Banca examinadora
da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, como exigência parcial para
obtenção do título de Doutor em Ciências
Sociais, sob a orientação da Profª Dra.
Maria Helena Villas Boas Côncone e
Coorientação da Profª Dra. Manuela
Hasse.
Área de concentração: antropologia
SÃO PAULO
2013
MARIA DE FÁTIMA PATU DA SILVA
TRANSPLANTAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA:COMO É VISTA POR DOADORES E
DOENTES EM LISBOA E NO RECIFE
APROVADA EM: _______________
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________ Maria Helena Villas Bôas Concone (Orientadora)
Doutora em Ciências Sociais - PUC/SP
_____________________________________ Josildethe Gomes Consorte
Doutora em Ciências Sociais - PUC/SP
____________________________________ Paula Loureiro
Doutora em Saúde Pública - UPE
__________________________________ Mª Manuela Vasconcelos Hasse de Almeida e Silva
Doutora em Ciências da Motricidade Universidade Técnica de Lisboa
_________________________________
Acácio Sidinei Almeida Santos Doutor em Sociologia – PUC/SP
DEDICATÓRIA
À minha mãe que já não está mais aqui, de quem recebi a energia e o desejo de
construir, por ter fornecido a base de tudo: a educação. Sem ela, não teria chegado
até aqui.
E à Maria Luíza Oliveira Patu, como gosta de ser chamada minha neta, a minha
razão de querer sempre continuar viva. Amo-te.
AGRADECIMENTOS
Foi uma longa caminhada. Desde a entrada no doutorado em 2009, foram 4 anos
em que não faltaram espinhos, pedras. Mais que tudo foram anos de estudo e de
muito aprendizado. Como não poderia deixar de ser, tudo isso não seria possível
sem o apoio, a amizade, a força e a alegria que me deram ao longo desse percurso.
Iniciarei os agradecimentos começando por ordem cronológica dos acontecimentos.
Inicio por uma força chamada Deus, sem essa fé, força, credibilidade, nada teria
acontecido. Aqui a mais profunda reverência por ter aprendido que as coisas que
realmente se investem de valor são movidas muito menos pela força de vontade,
mas principalmente com a conexão que se estabelece com a alma.
Aos meus filhos, Thaís, Tiago e Tatiana pelo apoio incondicional, sem eles não teria
ultrapassado as dificuldades vivenciadas durante o percurso dessa tese. Obrigada
por vocês existirem na minha vida.
À Bezerra ex-companheiro, por ter possibilitado ser mãe desses três filhos
maravilhosos que a vida nos concedeu e ter contribuído para o meu crescimento
intelectual, quanto ao custeio das viagens que precisei fazer entre Recife/São Paulo.
Às minhas irmãs Neide e Ivany que sempre estiveram presentes na minha vida
pessoal e profissional.
Aos meus genros e nora Erinaldo, Rangel e Gê, obrigada por se agregarem à minha
família e terem dividido comigo esse momento importante.
E Rafa, Joice e Nathalia sobrinhos queridos, não podia esquecer.
À minha orientadora, a Professora Dra. Maria Helena Villas Boas Concone, desde o
ínicio da nossa conversa quando da minha visita à PUC sobre a possibilidade de
aceitação e seleção no doutorado, por ter acreditado no meu potencial, assim como
na tese, e ter me estimulado a não desistir mesmo nos momentos mais difíceis.
Aos professores com quem tanto aprendi na PUC-SP, Terezinha Bernardo, Edgar
Carvalho, Margarida Limenha, Leila Blass e Josildete, pelo compartilhamento dos
seus conhecimentos. E compreender que a Universidade é um espaço de dissenso
e não consenso.
Às amizades que nasceram em meio a este percurso, construídas com uma
dimensão que tiveram uma inserção pessoal em mim. Benedito Carlos, Carla,
Idalina, Eduardo, Leandro, Jonas, Maria José, Regimeire e Isaac Vitório.
À professora Dra. Manuela Hasse minha coorientadora pelo apoio, presença e
acolhimento das angústias pessoais e ansiedade durante o período, não somente
quando estive em Lisboa para o estágio sanduíche, junto à prestigiosa Universidade
Técnica de Lisboa, mas durante todo o processo de construção desse trabalho.
À CAPES que contribuiu tanto para realização do Curso por um período de 2 anos,
quanto para o (Estágio Sanduíche-PDEE) no exterior, oportunidade única, junto à
Universidade Técnica de Lisboa, na Faculdade de Motricidade Humana.
A Luiza Conceição, ao Professor Dr. Manuel Abecasis, Diretor do CTMO do Instituto
Português de Oncologia pelo acolhimento, ao colocar sua equipe à disposição da
investigação.
À Mônica Conceição secretária de Dr. Manuel Abecasis, sempre à disposição do
estudo.
Ao Professor Dr. Helder Trindade, diretor do CEDACE por contribuir com a
investigação.
À Fundação Hemope, na pessoa do Diretor-Presidente Dr. Divaldo de Almeida
Sampaio, quanto à minha liberação para o desenvolvimento do estudo.
À Dra. Paula Loureiro, que sempre compartilhou comigo as minhas angústias
pessoais e profissionais durante esse percurso.
À Coordenação de Ensino e Pesquisa, pela compreensão quanto a minha liberação,
no sentido de estimular a capacitação dos servidores.
Ao Dr. Raul Melo, por ter incentivado minha participação na implantação do projeto
Redome na Fundação Hemope.
Aos amigos queridos, que são tantos e inestimáveis, alguns recentes outros de
longa data, exemplos de solidariedade, por terem acompanhado nessa jornada,
dividindo comigo as alegrias e tristezas: Etelvina, Sueli, Alessandra Ximenes, Ana
Vieira, Carminha, Vírginia, Eliene, Josiete, Pollyanna, Adriana, Livramento, Heloísa,
Regina, Fred, Rivaldo, Leomar, Jorge Venâncio, Ana Patrícia, Valda e Fernando
Sabino.
EPÍGRAFE
Sonhos
Os nossos sonhos são os nossos desejos mais profundos, são aqueles que nascem de dentro pra fora, “do interior do nosso interior”. Estamos aqui neste planeta, vivendo esta vida, com nosso corpo, nossas habilidades, dons, nossa inteligência e nossa capacidade transformadora. Tudo isso pra quê? Seria realmente para apenas podermos trabalhar para conseguir dinheiro para manter os nossos e nós mesmos? E os dias estão passando… De que nos vale passar por aqui e não realizarmos as coisas que mais profundamente desejamos? Para onde estamos indo? Quais são, então, os seus sonhos, seus desejos mais profundos? Resgate-os e nunca desista deles.
Nado Rodrigues, 2012
RESUMO Este trabalho é uma pesquisa de doutorado em Ciências Sociais e tem como objeto de estudo o doador de medula óssea/transplante. Este pode ser analisado, pelo menos, por duas áreas do conhecimento: antropologia e medicina. Tomamos a noção de dádiva como conceito fundante da nossa reflexão. Para isso, convém lembrar que a medula óssea enquanto objeto doado para o transplante carrega além da constituição genética e sua capacidade fisiológica, o poder e a força de reviver o receptor. Nas últimas décadas, o transplante de órgãos tem atraído opiniões de setores diversificados da sociedade brasileira, a mídia, por sua vez, vem cumprindo importante papel na ampla divulgação ao democratizar as informações a discussões, algumas vezes acaloradas e contraditórias, assim como esclarece ou suscita dúvidas e receio nas pessoas. É, portanto, um tema de muita relevância social e como tal, tem sido tratado tanto pela sociedade, receptiva aos apelos da solidariedade na doação de órgãos, como pela saúde pública, por se tratar de um procedimento de alta complexidade e elevado custo, exigindo medidas de planejamento de políticas públicas e alocação de recursos, critérios éticos e democráticos. Este estudo objetiva descrever o perfil dos receptores de medula óssea em Recife e Lisboa. Foi realizada uma análise retrospectiva no período de 2002 a 2010. No período analisado, 134 pacientes realizaram transplante com doadores não aparentados destes, 107 em Lisboa e 26 em Recife. Os pacientes transplantados em Lisboa (51,4%) são do sexo feminino, enquanto em Recife (69,2%) pertence ao sexo masculino. Estão na faixa etária de 0 a 17 anos em Portugal (54,2%) e Recife (50 %) com diagnóstico prevalente de Anemia Aplástica. No entanto, em Lisboa prevaleceu o diagnóstico de Leucemia Mieloide Aguda. O estudo chama a atenção para o fato de que Lisboa realizou mais transplantes na faixa etária de 30 a 39 anos (18,7%), diferente de Recife (11,5%) na mesma faixa etária. Em relação à faixa etária de 18 a 29 anos, apresentou um percentual de (15,9%). A pesquisa mostrou a leucemia mieloide aguda como a doença mais prevalente em Lisboa. É um dado que corrobora com a literatura, por afetar indivíduos de todas as idades, principalmente os que estão na fase adulta. Nesse estudo está na faixa etária acima de 50 anos em Lisboa (6,5%) e Recife (3,8%). Ressaltamos que, no período da coleta de dados, Recife tinha uma população de 1.537.704 e Lisboa 2.821.699 pessoas. Apesar de Recife possuir outras unidades, apenas o centro onde foi realizada a pTesquisa estava fazendo este tipo de transplante. Palavras Chaves: Doação de medula óssea. Transplante. Dádiva. Ciências Sociais.
ABSTRACT
This work is a doctoral research in Social Sciences and whose object of study has been the bone marrow donor/transplantation. This can be analyzed at least by two areas of knowledge: Anthropology and Medicine. We take the notion of gift as a founding concept of our reflection. Thus, we should remember the bone marrow as an object donated for transplantation that carries beyond the genetic and physiological capacity, power and strength to revive the receiver. In recent decade, organ transplantation has attracted reviews from various sectors of the Brazilian society, the media, on the other hand, has been playing an important role in the broad disclosure information by democratizing the discussions, sometimes heated and contradictory, and clarifies or raises doubts and fear in people. It is therefore a matter of great social relevance and as such has been treated well by society; it has been receptive to the calls of solidarity in organ donation as public health, because it is a procedure of high complexity and high cost, requiring measures of public policy planning and resource allocation, democratic and ethical criteria. This study aims to describe the profile of recipients of bone marrow in Recife and Lisbon. We performed a retrospective analysis from 2002 to 2010. Over this period, 134 patients underwent transplantation with unrelated donors of these, 107 in Lisbon and 26 in Recife. Patients transplanted in Lisbon (51.4 %) are female; while in Recife (69.2 %) are male. Are in the age group 0-17 years in Portugal (54.2 %) and Recife (50 %) diagnosed with Aplastic Anemia prevalent. However, in Lisbon prevailed diagnosis of Acute Myeloid Leukemia. The study draws attention to the fact that Lisbon performed more transplants in the age group of 30-39 years old (18.7%), different from Recife (11.5%) in the same age group. In terms of age group 18-29 years old showed a percentage of (15.9 %). Research has shown acute myeloid leukemia as the most prevalent disease in Lisbon. It is a fact that confirms the literature, to affect individuals of all ages, especially those in adulthood. This study is in the age group above 50 years old in Lisbon (6.5%) and Recife (3.8 %). We emphasize that in the period of data collection, Recife had a population of 1,537,704 and 2,821,699 people Lisbon. Although Recife has other units, only the center where the research was conducted was doing this type of transplant.
Key Words: Bone marrow donation. Transplant. Gift. Social Sciences.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
ILUSTRAÇÃO 1 - Mapa da Hemorrede de Pernambuco 34
ILUSTRAÇÃO 2 – Número de transplantes realizados no Brasil em 2012 56
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 - Localização da medula óssea e sua produção celular 70
FIGURA 2 - Medula óssea e sua diferenciação celular. 70
FIGURA 3 - Coleta da Medula Óssea por aspiração 79
FIGURA 4 - Coleta da Medula Óssea por Aférese 80
FIGURA 5 - Cordão Umbilical 80
FIGURA 6 - Esquema do Sistema HLA. 81
FIGURA 7 - Convocação dos potenciais doadores para a palestra 91
FIGURA 8 - Palestra sobre doação de medula óssea 92
FIGURA 9 - Coleta de sangue periférico para exame HLA. 92
FIGURA 10 - Coleta de medula óssea por aspiração em centro
transplantador 96
LISTA DE TABELAS
Tabela 1- distribuição dos doadores segundo o sexo 98Tabela 2 -distribuição dos doadores segundo a idade no período de 2002 a
2010 99Tabela 3 - distribuição dos doadores segundo a escolaridade no período de
2002 a 2010 100
Tabela 4- distribuição dos doadores segundo estado civil 101
Tabela 5 - distribuição dos doadores de lisboa segundo situação profissional 101
Tabela 6 - distribuição dos doadores de lisboa segundo faixa salarial 102Tabela 7 - distribuição dos doadores segundo religião 102
Tabela 8 – distribuição dos doadores segundo motivação 104
Tabela 9 - distribuição dos doadores segundo prática religiosa 105Tabela 10 - distribuição dos doadores segundo expectativa quanto ao
transplantado 105
Tabela 11 - distribuição dos doadores segundo alterações pós doação 106Tabela 12 - distribuição dos doadores segundo doação medula óssea x
doação de sangue 107Tabela 13 - distribuição dos doadores segundo recompensa 107
Tabela 14- distribuição dos receptores segundo o sexo 108
Tabela 15- distribuição dos receptores sugundo idade 108
Tabela 16 – distribuição dos receptores quanto a naturalidade 108Tabela 17- distribuição dos doadores segundo a escolaridade no periodo 108 De 2002 a 2010 Tabela 18 - distribuição dos recptores segundo estado civil 109Tabela 19 - distribuição dos receptores segundo religião 109
Tabela 20- distribuição dos receptores frequência religiosa 109Tabela 21- distribuição dos receptores quanto ao tipo de coleta 110
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 - Distribuição da população de doadores estudada através do questionário 78
GRÁFICO 2 - Distribuição dos doadores quanto à faixa etária 78
GRÁFICO 3 - Distribuição dos doadores quanto à religião 78
GRÁFICO 4 - Distribuição dos receptores por sexo/ Portugal 119
GRÁFICO 5 - Distribuição dos receptores por sexo/ Recife 119
GRÁFICO 6 - Distribuição dos receptores por faixa etária/ Portugal 119
GRÁFICO 7 - Distribuição dos receptores por faixa etária/ Recife 119
GRÁFICO 8 - Distribuição dos receptores por diagnóstico/Portugal 119
GRÁFICO 9 - Distribuição dos receptores por diagnóstico/ Recife 119
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
ABTO Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos
CEMO Centro de Transplante de Medula Óssea
CFM Conselho Federal de Medicina
CNCDO
Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de
Órgãos
CNT Central Nacional de Transplante
CPH Complexo Principal de Histocompatibilidade
CT Células-Tronco
DECH Doença do Enxerto contra o Hospedeiro
HLA Antígeno Leucocitário Humano
INCA Instituto Nacional do Câncer
ME Morte Encefálica
MEC Ministério da Educação e Cultura
ONG´s Organizações Não Governamentais
OPOs Organização de Procura de Órgãos
OPTN Organização Nacional de Procura de Órgãos
QSR
NUD*IST
Non-numeric Unstructured Data, Index Searching and
Theorizing
REDOME Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea
REREME Registro Nacional de Receptores de Medula Óssea
SCU Sangue de Cordão Umbilical
SNT Sistema Nacional de Transplantes
SOS Síndrome de Obstrução Sinucoidal
SUS Sistema Único de Saúde
TCTH Transplante de Células-Tronco Hematopoiéticas
TMO Transplante de Medula Óssea
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
1.1 A Construção do Objeto de Investigação
O estudo das relações entre medicina e sociedade como objeto das Ciências
Sociais já é frequente no Brasil. Se lembrarmos de que alguns dos primeiros
antropólogos em nosso país, no início do século passado, tinham formação em
Medicina (para citar apenas dois dos mais conhecidos: Raimundo Nina Rodrigues e
Arthur Ramos lidaram a partir dos instrumentos teórico-metodológicos que foram
buscar em diferentes momentos nos estudiosos franceses, alemães ou norte-
americanos, pode-se ver que o interesse não é recente, mesmo que muitas das
suas ideias possam ser hoje questionadas. Saltando para as últimas décadas do
século XX podemos ler no livro de Ana Maria Canesqui, publicado em 2007, quando
a autora mapeando as atividades de investigação e ensino das Ciências Sociais no
campo da saúde no Brasil, considera (para as últimas três décadas, portanto de
meados dos anos 1970 até a data do trabalho):
Não se pode negar, contudo, a visibilidade e o maior amadurecimento conquistado durantes estas três últimas décadas pelas ciências sociais no âmbito da Saúde Coletiva, onde mais fortemente se institucionalizaram, embora reste a ampliação de suas interlocuções mais extensivas com outros campos da biomedicina como os saberes e práticas psicológicas e psiquiátricas, outras áreas biomédicas, tanto quanto a sua inclusão mais incisiva na formação de outros profissionais de saúde. Da mesma forma pode-se ainda vislumbrar variadas possibilidades na ampliação e aprofundamento temático […] tanto quanto na consolidação de subcampos disciplinares, cujo processo de especialização é visível e não particular às ciências sociais e saúde, incidindo também sobre as ciências sociais em geral, como noutros campos de conhecimento (CANESQUI, 2007, p. 103-104).
A Sociologia, a Antropologia e outras áreas afins como a Psicologia,
apresentam autores importantes que se ocuparam daquela relação entre a Medicina
e a sociedade, que discutiram o corpo, a morte, a doença se debruçaram sobre
formas que hoje chamaríamos de etno-medicina, como Talcott Parsons (1984),
Erving Goffman, Howard Becker, Evans-Pritchard, Marcel Mauss (1950), entre
outros. Na Sociologia, as décadas de 1950 e 1960 são decisivas para a afirmação
do campo das relações entre Medicina e sociedade. Antes mesmo dessas décadas,
entretanto, podemos destacar as contribuições de Marcel Mauss (autor que se
insere num campo comum entre a sociologia e a antropologia) na produção de
reflexões para a compreensão da dimensão simbólica na doença e na cura. Mauss,
inspirado por seus próprios estudos etnográficos sobre sociedades tradicionais,
escreve em 1926 (MAUSS, 1999) o ensaio Efeito Físico no Indivíduo da Ideia de
Morte, pode ser também verificada nas sociedades modernas que o não-respeito às
regras sociais pode conduzir o indivíduo à morte.
Vários autores contribuíram para mostrar as relações entre saúde/doença e
sociedade ao destacarem que a doença e a saúde não são problemas apenas de
ordem orgânica ou fisiológica, mas que dependem principalmente do contexto social;
mostraram também que o enfrentamento da doença não se faz apenas pela ciência,
mas também por outros recursos existentes na sociedade (MAUSS,1999).
Apresentar o cenário que envolve um conjunto de atores sociais importa não
apenas para nos situarmos no tempo e no espaço, mas representa também o
detalhamento dos elementos que se entrelaçam, que compõem e que condicionam
as ações desses atores e que as tornam mais compreensíveis. Nesse contexto, os
estudos sócio-antropológicos em geral, e a sociologia da saúde em particular, têm
sido pressionados a se confrontarem com novos dilemas teóricos e práticos.1 Como
afirmam Berger; Luckmann (2005), os processos de modernização, pluralização e
secularização têm produzido uma crise de sentido, que afeta diretamente as
instituições, como por exemplo, as unidades de saúde, que fornecem os padrões de
experiência para os indivíduos, bem como a coesão intersubjetiva. As formas
tradicionais de socialização dos comportamentos esperados, dos saberes e das
práticas no âmbito de instituições específicas como a família, a escola e o Estado,
vão sendo suplementadas, alteradas, quando não, substituídas.
Aproximando-nos mais diretamente do nosso tema de investigação, o primeiro
ponto a ser considerado e que está relacionado diretamente à questão da
modernização, pluralização e secularização e seu rebatimento sobre as instituições
sociais, é que vivemos rápidas e profundas mudanças nas concepções de saúde
(concepções que afetam hábitos estabelecidos – por exemplo, o consumo de sal ou
de açúcar, de álcool ou de tabaco, entre outros), além de ampliação no
1 Colocam-se, portanto, novas questões aos conceitos herdados das tradições clássicas da Sociologia (DURKHEIM, 1978).
conhecimento biomédico – que de fato já devemos dizer biogenético e médico – e
nas suas aplicações técnicas. Novas técnicas médicas, laboratoriais e outras,
mudam os marcadores de saúde (por exemplo: diabetes, pressão arterial, colesterol
etc.) mudando a visão, ou o enfoque do profissional e também dos leigos.
Finalmente, podemos apontar as técnicas de correções cirúrgicas ou especialmente
de transplantes sempre em contínuo aperfeiçoamento ou mudança e em associação
com o desenvolvimento de novos medicamentos. Tudo isso parece repor as antigas
representações da superação da morte (ou do envelhecimento), no caso pelo
aprimoramento técnico. Inegavelmente as concepções de saúde e doença não são
as mesmas de poucos anos atrás e nem são as mesmas as noções de prevenção e
promoção da saúde.
De acordo com Canesqui (2001), no Brasil, a promoção da saúde, não se
restringe à mera formulação de políticas saudáveis, paralelas à construção do
Sistema Único de Saúde, mas serve de referência para reforçar a saúde como bem
público. No âmbito das intervenções específicas de saúde, requer a ampliação e
renovação dos modelos de atenção, cuidado, prevenção/reabilitação, cuja
implementação geralmente está circunscrita à assistência médica com baixa
qualidade da atenção.
Destaca-se ainda que a promoção da saúde é uma necessidade sentida nos
programas de desenvolvimento tanto pelo Ministério da Saúde como por outras
organizações governamentais preocupadas como o setor saúde. Para Paulo Buss
(2002), a promoção à saúde é a reafirmação da saúde como direito humano
fundamental; que as desigualdades são inaceitáveis; que os governos têm
responsabilidade pela saúde dos cidadãos e a população tem o direito de participar
das decisões no campo da saúde.
Desta forma a discussão do tema que propusemos se encontra no cruzamento
entre questões médicas e socioculturais, estabelecendo necessariamente o diálogo
entre ciências sociais e medicina. No caso das doações e das recepções de medula
óssea, podemos dizer que cabe à medicina, entre outras questões, estudar os
aspectos mais relacionados com as questões ligadas à aceitação ou rejeição do
enxerto, assim como com a viabilidade clínica pré e pós-transplante. Ao cientista
social mergulhado nessa área caberia, pelo menos, estudar a doação ou o doador
contextualizando-o social e culturalmente utilizando-se de algumas categorias como
sexo, idade, religião, relação com o problema específico ou outros fatores
motivacionais, religiosidade, solidariedade, generosidade, reciprocidade, autoestima
entre outros.
1.2 Premissas Fundamentais do Estudo
Ao se propor uma discussão do tema doação de medula óssea a partir da
dádiva, é importante ter-se claro que está se penetrando em uma dimensão humana
que apresenta um carater abrangente. Por trazer em si a possibilidade de inclusão
da dicotomia, do ser, ou seja, a inclusão das contradições humanas, sugerindo uma
ponte entre os individuos como afirma Caillé(2002) […]o dom é por natureza aquilo
que permite superar a antítese entre eu e o outro, entre a obrigação e liberdade,
entre a parte do herdado e a parte do legado a receber[…].Sob essa perspectiva, o
dom (Caillé,2002) ou a dádiva ganha dimensão, a condição do processo de
aproximação, de estreitamento das relações sociais.
O primeiro pressuposto é que a doação de medula óssea mobilizaria o conceito
existente sobre doador por parte não só do receptor, como também da família e da
comunidade na qual ele está inserido. O segundo pressuposto é que ao fazer a
doação, o doador passaria a ocupar uma posição diferenciada, de prestígio, perante
sua comunidade e sua família, de fato a posição diferenciada do doador, o
acréscimo de prestígio, reflete-se no seu grupo primário.
O Brasil tem um programa de transplantes bem consolidado.Com mais de 190
milhões de habitantes. O número de transplantes com doador vivo vem decrescendo
quase que em todos os estados brasileiros, compensado pelo crescimento do
transplante com doador falecido. Muitos profissionais de saúde merecem o
reconhecimento pelo sucesso desse programa: desde o profissional que faz a
notificação do potencial doador, até os profissionais que fazem o acompanhamento
ambulatorial após o transplante. No que se refere ao transplante de medula óssea,
1753 pessoas realizaram transplante em 2012 e Pernambuco contribuiu com 162
transplantes (RBT, 2012).
Estamos ainda, pressupondo a relação entre doação e sacrifício: o doador
colocando-se na posição de possibilitar “salvar uma vida” esperaria algum tipo de
retorno, especialmente porque a doação pressupõe sacrifício. A representação
social do sacrifício do doador é bastante forte dado que o ato de doar pode ou não
estar vinculado a uma relação diretamente afetiva. Neste caso, a doação estaria
baseada no dom entre desconhecidos, não havendo em princípio um vínculo
primário entre doador e o receptor. Claro está que há uma tendência dessa relação
tornar-se familiar, fazendo com que os agentes envolvidos sintam-se o menos
estranho possível. A noção do sacrifício, entretanto, persiste qualquer que seja a
situação embora um maior privilégio seja atribuído aos sujeitos que se candidataram
voluntariamente à doação. Consideramos ainda que esse tipo de dádiva venha
acompanhada do sentido característico da “dádiva de si”: o indivíduo sente-se
obrigado a dar de si para que sua ação tenha sentido.
Assim, acreditamos que a perspectiva escolhida de acessar os discursos sobre
doação de medula óssea permitirá compreender alguns aspectos antropológicos aí
envolvidos: as percepções e motivações correlatas aos motivos que impulsionam o
dom.
O envolvimento dos indivíduos, os laços de amizade, familiaridade, vizinhança
enquanto doadores de medula matizam o cenário com características importantes
quanto ao alcance da ação vai depender da percepção e interpretação concebidas
pela população inserida no contexto social. O afeto circula nesses espaços, da
mesma maneira que a necessidade de criação de mecanismos institucionais que
façam com que a ação se amplie para além dos limites institucionais. Assim, para
que o ato seja realizado, passa por uma decisão individual, porém exige uma
participação coletiva. O olhar para o interior dessas pessoas que se estruturam em
torno de regras de sociabilidade referidas ao circuito da dádiva (MAUSS, 1960;
1999). Entretanto, ao enfatizar o tema da solidariedade para com o outro – o que é
assistido – procurei o discurso que fundamenta as relações que institucionalizam o
grupo.
Portanto nas últimas décadas, o transplante de órgãos tem atraído opiniões de
setores diversificados da sociedade brasileira, e ainda a mídia vem cumprindo
importante papel na ampla divulgação, encarregando-se de democratizar as
discussões e informações, algumas vezes acaloradas e contraditórias, outras
esclarecendo ou suscitando dúvidas e receio nas pessoas. É, portanto, um tema de
muita relevância social e como tal tem sido tratado tanto pela sociedade, receptiva
aos apelos da solidariedade na doação de órgãos como pela saúde pública, por
tratar-se de um procedimento de alta complexidade e alto custo, exigindo medidas
de planejamento de políticas públicas e alocação de recursos, critérios éticos e
democráticos. Todas essas políticas têm como objetivo a manutenção e defesa da
vida.
A antropologia pode contribuir para a disussão do contexto altamente
tecnológico da medicina contemporânea e evidentemente dos transplantes. A
problematização das ações técnicas só pode acontecer a partir de um olhar crítico
que as Ciências Sociais, e antropologia podem fornecer. Por essa razão, assume-se
a doação voluntária de medula óssea na perspectiva teórica de Marcel Mauss
(1974), como referência central na construção desse trabalho. Ela permite equilibrar
os diversos motivos que configuram a existência humana. Através de uma formação
assim compreendida, diz Mauss no final do seu Ensaio sobre a Dádiva, é possível
analisar o comportamento humano total, vislumbrando nesse estudo os fundamentos
da própria sociedade e da vida em comum.
Admite-se que o reconhecimento de uma cultura da dádiva resinificará a
construção dos laços sociais que constituem a esfera pública. O sistema teórico da
dádiva possibilita ultrapassar os dilemas das teorias democráticas modernas. Essas
abordagens têm enfrentado uma dificuldade de articular as questões da justiça com
os princípios da solidariedade social (DOMINGUES, 2002 apud SIMÕES, 2005).
Os interesses sociais, surgidos no contexto da modernidade científica, tendem
a definir o sistema social como um todo, coincide com o interesse pela manutenção
do próprio sistema, privatizando o espaço das ações sociais. Quando se trata de um
campo avançado do conhecimento científico (como é o caso da medicina)
apresentando possibilidades técnicas que frequentemente se chocam contra os
modos de compreensão e valorização da vida humana, os indivíduos podem ser
simplesmente instrumentalizados em benefício de interesses privados que, agindo
segundo uma lógica que lhes escapa inteiramente à compreensão, tendem a
colonizar o sistema social como um todo (KAUFMAM, 2003).
1.3 A Questão Central do Estudo
O nosso projeto integra então o campo dos estudos das Ciências Sociais no
âmbito da saúde partindo de uma indagação principal: Quais as razões e
motivações para a decisão de doar medula óssea?
1.4 Inquietações Sobre o tema
A nossa própria motivação para propor esta investigação veio do nosso
envolvimento profissional na Fundação Hemope, em Pernambuco (Brasil), que nos
abriu todo um espaço de conhecimento relacionado aos casos de doenças que têm
indicação para transplante, como é o caso específico da leucemia para a qual existe
a indicação de transplante de medula óssea. No Brasil, o número de transplantes de
medula óssea tem aumentado significativamente nas últimas décadas, sendo
atualmente realizados em unidades de saúde na maioria das capitais brasileiras. Em
diversas situações clínicas não se consegue o doador aparentado para a realização
do Transplante de Medula Óssea (TMO), sendo necessário recorrer aos bancos de
medula.
O emprego da prática médica do tranplante tem aumentado significativamente
nas últimas décadas.Dentre os diversos órgãos transplantaveis (coração, fígado,
pele, rim, córnea, pâncreas e medula óssea com boas respostas, possibilitando uma
razoável sobrevida para o receptor.
No entanto, cabe à medicina estudar os aspectos mais relacionados do ponto
de vista da aceitação ou rejeição do enxerto, assim como das suas viabilidades
clínicas pré e pós-transplante, entre outras questões. As ciências sociais devem
estudar o doador no sentido de contextualizá-lo na sociedade na qual está inserida,
segundo algumas categorias estabelecidas como sexo, idade, religiosidade, fatores
motivacionais, solidariedade entre outras. Por outro lado, o número de casos novos
de doenças que precisam de transplantes cresce a cada dia. Citamos como
exemplo, as doenças que têm indicação para transplante como a leucemia.
No Brasil a chance de encontrar um doador compatível entre familiares é uma
em 100 e de uma em 100 mil entre os doadores não aparentados, ou seja, os
doadores voluntários. Segundo o REREME2 existem atualmente 3000 pacientes nas
listas de espera aguardando aquele tipo de transplante e cerca de dois milhões de
pessoas cadastradas isto é, doadores potenciais (BRASIL, 2012).
Considera-se possível o aumento do número de casos de transplantes
aumentando a necessidade de doadores, parentes ou não. Além disso, muitos
candidatos não se tornam efetivamente doadores. Os serviços de hematologia têm
encontrado dificuldades para realizar transplantes com doadores aparentados para
2 Registro Nacional de Receptores de Medula Óssea. Ministério da Saúde, 2012.
atender a demanda. Em todas as sociedades onde o transplante é realizado,
existem leis já definidas ou que podem estar em fase de regulamentação. Este é um
procedimento terapêutico, onde as normas que o regulamentam, não só no Brasil,
como na maioria dos países, ainda podem encontrar-se em fase de ajustamentos
para que possam atender a sociedade como um todo e não apenas os potenciais
receptores. Aparententemente há número muito superior de doadores potenciais
para o número de pessoas que necessitam de transplante. Essa diferença é
enganosa, porque de fato há enorme possibilidade de incompatibilidade.
No cenário do transplante participam vários personagens e dentre eles e de
maneira mais ativa, pelo dois especificamente, se interrelacionam de modo mais
íntimo. Cada um deles, e as relações entre eles, mereceriam um olhar e um pensar
antropólogico.
Este estudo visou compreender alguns aspectos antropológicos dos dois
personagens: o doador e receptor , e nele houve a preocupação de tentar
estabelecer o desenho do seu imaginário correspondente aos motivos que
impulsionam o dom.
O interesse por temas relacionados com elementos do cenário que compôe o
transplante nasceu quando a Fundação Hemope (instituição na qual trabalho)
implantou o projeto Doador Voluntário de Medula Óssea no Estado de Pernambuco
e eu fui convidada a compor a equipe responsável pela captação de doadores.
Durante esse trabalho, percebemos a existência de múltiplos questionamentos de
caráter ético, moral e religioso relativos ao tema do transplante de medula óssea
revelando um cenário bastante complexo.
Surgia então, a necessidade e o desejo de pesquisar alguns aspectos sócio
culturais do doador e receptor, considerando que objetividade da ciência médica
com seus números e percentuais ou as técnicas psicoterápicas, eram elementos
redutores e não permitiriam maior do perfil do doador.
A entrada para o estudo do tema doação de medula óssea do ponto de vista
empírico, no presente trabalho oferece uma possibilidade de verificar valores e os
elos que identificam os vínculos sociais estabelecidos que se relacionem com a
atitude de doar medula óssea. Outra entrada está voltada para investigar as
características da doação, alcance, limites e significados a partir da perspectiva dos
receptores. Mesmo sendo este um evento que determina mudanças relacionais
entre o doador e o receptor, entre ele e a família, e entre ele e a sociedade, esta foi
pensada também através das representações ou ações determinadas pela
consciência individual dos doadores, revela dados que refletem alguns contextos
nos quais os sujeitos estão inseridos.
O tema do transplante de órgãos tem provocado grande impacto no cenário
social e cultural, pois envolve além dos aspectos relativos ao avanço da medicina e
da tecnologia, a questão da subjetividade humana, mobilizando sentimentos e
emoções diretamente relacionados à representação da vida e da morte. No cenário
do transplante participam vários personagens
Como nas últimas décadas o transplante deixou de ser um procedimento
experimental e passou a ser incorporado como opção terapêutica, viu-se alvo de
maior atenção seja pelo avanço da medicina, seja pelas campanhas de doação de
órgãos, ocupando como dissemos um novo espaço na vida e no imaginário social. É
interessante notar que esta presença pode ser aferida nas novelas e filmes de
grande apelo emocional e pode ser captada nas falas dos nossos sujeitos de
pesquisa. O fato é que nas últimas décadas, esse assunto tem atraído opiniões de
setores diversificados da sociedade brasileira e a mídia não está ausente da
discussão tendo sido ao contrário divulgadora do tema e encarregando-se de
democratizar (e as vezes banalizar) discussões e informações, algumas vezes
polêmicas e contraditórias e também tendo o papel de incentivar a população,
receptiva aos apelos da solidariedade, a aceitar a doação de órgãos. Por outro lado,
os procedimentos em si são procedimentos de alta complexidade e custo, exigindo
medidas de planejamento de políticas públicas e alocação de recursos justificando-
as pela ótica da manutenção e da defesa da vida. Por isso falamos mais acima que
os debates envolvem questões éticas, morais, religiosas, culturais, políticas e
econômicas.
Este cenário coloca questões de fundo relacionadas às diversas categorias de
atores sociais envolvidos: profissionais da saúde, pessoas com indicação do enxerto
e seus familiares e grupos de sociabilidade, poder público em suas várias
dimensões, doadores parentes ou não, mídia etc. Podemos arrolar algumas
perguntas relacionadas ao problema em pauta: Haveria uma busca de critérios de
ação que atendessem a um consenso público? Quais seriam os interesses
hegemônicos de ordem econômica e política envolvida no debate? Quais seriam os
interesses científicos e as razões instrumentais? Quais seriam os elementos de
ordem humanitária (solidariedade, fraternidade, autoestima, reconhecimento social e
familiar, exercício de poder, entre outros) que poderiam emergir das relações
intersubjetivas dos atores sociais envolvidos diretamente no processo de doação?É
inegável, portanto, que a antropologia tem um papel importante a desempenhar na
análise deste conjunto de questões levantadas.3 A análise antropológica, no nosso
entender, sinaliza um caminho no qual podemos situar o nosso estudo sobre
doação.
Não seria possível abarcar todo aquele cenário. Assim, nosso foco serão os
doadores. Privilegiá-los, bem como as razões por eles apresentadas, poderá permitir
responder mesmo que indiretamente algumas daquelas perguntas acima. E os
receptores de doadores voluntários em Recife e Lisboa.
O fato de priorizar tais recortes significa a relevância dos mesmos. Significa
assumir que meu interesse se volta para o estudo das formas assentadas na
voluntariedade na perspectiva desses atores sociais. Para tanto, o estudo sob a
ótica antropológica significa ir ao encontro das motivações que levaram essas
pessoas a se cadastrarem, com base no questionamento quanto aos limites da ação
técnica na área de saúde diante da doença. O envolvimento dos indivíduos, os laços
de amizade, familiaridade, vizinhança enquanto doadores de medula matizam o
cenário com características importantes quanto ao alcance da ação vai depender da
percepção e interpretação concebidas pela população inserida no contexto social.
O afeto circula nesses espaços, da mesma maneira que a necessidade de
criação de mecanismos institucionais que façam com que a ação se amplie para
além dos limites institucionais. Assim para que o ato seja realizado passa por uma
decisão individual, porém exige uma participação coletiva. O olhar para o interior
dessas pessoas que se estruturam em torno de regras de sociabilidade referidas ao
circuito da dádiva (MAUSS, 1960; 1999). Entretanto, ao enfatizar o tema da
solidariedade para com o outro – o que é assistido –procurei o discurso que
fundamenta as relações que institucionaliza o grupo.
Nas últimas décadas, o transplante de órgãos tem atraído opiniões de setores
diversificados da sociedade brasileira, e ainda a mídia vem cumprindo importante
papel na ampla divulgação, encarregando-se de democratizar as discussões e
3 Seria o indivíduo totalmente autônomo, ou até que grau estaria determinado pela sociedade? Seria esta superior e prévia a ele, ou seria ele um elemento importante na construção da ordem social? Como definir a ‘ação’ social, quais seus aspectos fundamentais? Seria o caso de falar-se em um condicionamento mútuo entre ‘agência’ e ‘estrutura’ ou ‘sistema’? Como caracterizar essas noções de forma precisa? A causalidade social seria exercida, somente, pelos indivíduos ou teriam as coletividades impacto causal sobre seus membros? E teriam as coletividades impactos umas sobre as outras, ou apenas os indivíduos interagem entre si? Como entender essa interação entre indivíduos e/ou coletividades? (DOMINGUES, 2001, p. 18).
informações, algumas vezes acaloradas e contraditórias, outras esclarecendo ou
suscitando dúvidas e receio nas pessoas. É, portanto um tema de muita relevância
social e como tal tem sido tratada tanto pela sociedade, receptiva aos apelos da
solidariedade na doação de órgãos, como pela saúde pública, por trata-se de um
procedimento de alta complexidade e alto custo, exigindo medidas de planejamento
de políticas públicas e alocação de recursos, critérios éticos e democráticos. Todas
essas políticas têm como objetivo a manutenção e defesa da vida.
Dessa forma, apesar de todos os recortes possíveis problematizarem essas
interpretações, na compreensão antropológica, mostra que o meio vivido nessa área
da medicina cerca-se de práticas institucionais modernas. Por essa razão, assume-
se doação voluntária de medula óssea na perspectiva teórica de Marcel Mauss
(1974), como referência central na construção desse trabalho. Ela permite equilibrar
os diversos motivos que configuram a existência humana. Através de uma formação
assim compreendida, diz Mauss no final do seu Ensaio sobre a Dádiva, é possível
analisar o comportamento humano total, vislumbrando nesse estudo os fundamentos
da própria sociedade e da vida em comum.
1.5 Objetivos do Estudo
1.5.1 Geral:
Analisar a doação de medula óssea na perspectiva do reconhecimento social
na visão dos efetivos doadores voluntários e receptores em Recife (Brasil) e Lisboa
(Portugal).
1.5.2 Específicos:
Descrever as características sociodemográficas dos participantes da
investigação;
Identificar as motivações da ação voluntária na perspectiva dos
doadores voluntários;
Descobrir se os laços estabelecidos pela ação da doação de medula
óssea e suas formas extrapolam, criam novos ou aumentam os
vínculos entre os elementos participantes do circuito;
Estudar o impacto da doação sobre os vínculos familiares, sociais
dos receptores como: valores, afeto, as relações de interesse e
desinteresse, a solidariedade, o conflito, a obrigação, a partilha e o
benefício.
1.6 Organização do Trabalho
O trabalho está estruturado em capítulos. O primeiro pretende situar o objeto
de estudo, estabelecendo a problematização e se acercando das hipóteses, sejam
elas gerais ou operacionais.Assim a problematização e aproximação teórica, serão
abordadas as teorias que contribuiram para interpretar os dados encontrados no
trabalho de campo.
No segundo capítulo, medodologia, o objeto de estudo é circuncrito e os
procedimentos metodológicos descritos, levando em consideração as dificuldades e
facilidades experimentadas no trabalho de campo.
A terceira parte do trabalho faz uma incursão teórica, onde foram abordadas as
teorias que contribuiram para interpretar os dados encontrados no campo de
trabalho.
Em se tratando de uma tese que aborda como objeto de pesquisa doador de
medula óssea/transplante e que pode ser analisado, pelo menos, por duas áreas do
conhecimento: antropologia e medicina pareceu lógico discorrer, também, sobre os
passos percorridos pela última ao longo dos anos para viabilizar o transplante. De
início, a necessidade pode ser expressa pelo fato de que esta tese essencialmente
antropológica se prestará também a consulta por pessoas da área médica, e esta
lógica é apoiada de que pelo fato a interdisciplinaridade se carcteriza, exatamente
em não privilegiar conhecimentos de aparentemente divorciadas, mas pelo contrário,
procura estabelecer pontes entre tais conhecimentos resultem numa tentativa de
aproximação. Assim essa parte, acompanha os passos das primeiras incursões
cintífico-metodológicas realizadas nos estudos sobre transplantes, até nossos dias.
O quarto capítulo, reporta-se ao lançamento dos resultados e discussão dos
dados coletados, segundo explicados na metodologia. Os discursos dos doadores e
receptores são interpretados, e os dados relacionados com os motivos da doação,
assim como a análise simbólica dos discursos dos receptores, correlacionados com
o ato da doação em si.
As considerações finais sintetizam resumidamente os achados e indicam
tendências que respondem às proposições que justificam a pesquisa.
Seguem-se as referências bibliográficas, os anexos e apêndices.
2 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
Neste trabalho estamos propondo uma reflexão teórica sobre os fatos
envolvidos na doação de medula óssea. O trabalho se desenvolve em duas frentes
que devem manter diálogo permanente: trabalho teórico (aprofundamento dos
conceitos chave) e trabalho de campo. O trabalho de campo tem dois momentos:
uma primeira fase quantitativa (com aplicação de questionários), seguida de uma
abordagem qualitativa (apoiando-se em entrevistas).
2.1 Caracterização Geral do Estudo
Os dados deste trabalho são fruto, da pesquisa de campo realizada em Lisboa
(Portugal) e Recife/ Pernambuco (Brasil) em 2011. Para ter acesso ao material
empírico, foram eleitos dois grupos sociais: doadores voluntários e pessoas
receptoras que foram submetidas ao TCTH no Brasil (Recife e em Portugal Lisboa).
Para o desenvolvimento, foi utilizado o referencial teórico da dádiva para conhecer e
analisar os dados. Trata-se de um estudo descritivo, de caráter exploratório na
perspectiva de Richardson et al (2007), a abordagem é de natureza qualitativa. Pois
a pesquisa qualitativa responde a questões particulares. Esta perspectiva é capaz
de investigar ou conhecer de modo aprofundado um evento ou situação,
possibilitando a explicação de comportamentos.
Um dos objetivos desse trabalho é obter depoimentos acerca das concepções
e da motivação, seja do ponto de vista dos doadores, seja do ponto de vista dos
receptores de medula óssea. Dessa forma, não somente os aspectos técnicos (o
uso correto de solicitações, controle dos exames sorológicos, instalações físicas
adequadas), como também as relações estabelecidas entre doadores/fornecedores
de matéria prima serão analisados, de modo que venha proporcionar o
estabelecimento de um processo contínuo e sistemático que estimule a doação.
O estudo se constituiu de acordo com os objetivos propostos em dois
momentos distintos, porém interligados. O primeiro foi o estabelecimento de uma
configuração significativa sobre doação e, a segunda da configuração da recepção
de medula óssea. Partindo do pressuposto em acordo com Minayo, a pesquisa
constitui:
“[…] Uma atitude e uma prática teórica de constante busca e, por isso, tem a característica do acabado provisório e do inacabado permanente. É uma atividade de aproximação sucessiva da realidade que nunca se esgota, fazendo uma combinação particular entre teoria e dados, pensamento e ação.” (MINAYO, 2006, p.47).
Houve nesta tese, a preocupação só de utilizar os doadores que foram
selecionados naturalmente pela genética, ou seja, compatíveis com o receptor e
voluntário, o chamado doador não relacionado (doador não parente). Essa
preocupação possibilitou trabalhar um grupo que não corresse o risco de entrevistar
pessoas cujos discursos se tornassem comprometida com algum dos receptores.
Esse cuidado evitou que a amostra fosse viciada pelo conhecimento prévio do
conteúdo da entrevista. Nessa perspectiva concordamos com Salem, quando a
mesma diz que há um risco de se generalizar os achados quando se pesquisa em
pequeno grupo. Esta perspectiva é capaz de investigar ou conhecer de modo
aprofundado um evento ou situação, possibilitando a explicação não conhecida, da
qual se tem necessidade de maiores informações (SALÉM, 1980).
Optamos pela abordagem qualitativa em decorrência do objeto de estudo,
apesar de realizarmos a utilização da estatística descritiva básica com a tabulação
das frequências de ocorrência e os percentuais.
2.2 Técnicas de Investigação
A pesquisa utilizou técnicas de registro e análise qualitativa (diário de campo,
observação não participante, entrevistas) e quantitativa (levantamento de dados do
sistema de informações oficiais e aplicação de questionários).
A escolha da população entrevistada foi intencional no sentido de abordarmos
os doadores voluntários, de acordo com a disponibilidade de cada doador. Um dos
primeiros passos foi procurar o CEDACE em Portugal para saber da disponibilidade
naquele momento e do interesse do serviço em participar do estudo.
Para caracterizar o perfil dos doadores efetivos, foi utilizada como primeira
técnica de investigação o questionário semiestruturado. O questionário consistiu
em duas partes: a primeira, com questões relativas a identificação pessoal do
entrevistado, com informações sobre idade, escolaridade, renda, profissão, religião,
a segunda, contendo questões que visavam obter os valores, as motivações dos
agentes e conhecimento sobre transplante (APÊNDICE- G).
Com o objetivo de explorar os significados da participação dos sujeitos foi
utilizada como segunda técnica a entrevista, que teve em média 40 minutos de
duração. Essa técnica consistiu em 3 fases principais: a pré-análise, a exploração
do material, tratamento dos resultados e interpretação, além da observação direta
(MINAYO, 2007).
2.3 Participantes da Investigação
Foram os doadores voluntários de medula óssea que se cadastraram no
Programa de Doadores Voluntários, (REDOME) no Brasil e (CEDACE) em
Lisboa/Portugal, assim como os receptores de medula óssea que realizaram
transplante no Hospital Português em Recife (Pernambuco/Brasil e Instituto
Português de Oncologia de Lisboa/Portugal, que se disponibilizarem a responder a
entrevista (APÊNDICE D).
No caso dos doadores voluntários, foram enviados questionários com
perguntas abertas e fechadas (APÊNDICE- G), em Portugal, para as residências,
aqui no Brasil, a pesquisadora foi as residências. Em relação aos receptores, os
mesmos em Portugal foram entrevistados no Serviço de Transplante de Medula
Óssea do Hospital de Oncologia de Lisboa (IPO). E no Brasil também nas
residências.
As entrevistas com os receptores em Lisboa e Recife foram realizadas nos
consultórios utilizados para a realização da consulta médica, no momento em que
estes aguardavam a chamada para o médico; tiveram em média, a duração de 40
minutos. Foram realizadas antes ou após a consulta de rotina de acompanhamento
pós-transplante, o que pareceu ser importante no sentido de ouvir sua fala de
receptor. O roteiro da entrevista passou por um teste piloto, objetivando realizar um
controle de qualidade. Foram feitas entrevistas semi estruturadas, entretanto, em
algum momento do processo foi deixado o entrevistado à vontade para dar corpo a
suas ideias e, até certo ponto encaminhar o diálogo.
O material das entrevistas foi lido exaustivamente, na tentativa de entender o
outro sob sua própria perspetiva; tendo em mente que a neutralidade absoluta não
existe, pois quem analisa carrega consigo seu referencial, sua vivência. As falas
foram analisadas, buscando-se noções repetitivas e/ou significativas de visões de
realidade, que podem pautar comportamentos em relação ao processo de doação
de sangue, tanto do ponto de vista do doador de sangue, quanto do profissional de
saúde
É reconhecido que a entrevista como instrumento de pesquisa, pode e deve
traduzir ideias, que podem de fato ser quanto ao transplante equivocadas. Em
função desse fato, foi tida a preocupação de ser feita uma observação do
comportamento do entrevistado. Este cuidado permitiu que fossem registrados no
diário de campo aspectos comportamentais como: hesitação, reticências, risos, etc.
O roteiro da entrevista com os doadores e os receptores, possibilitou classificar
em grupo, segundo categorias como sexo, idade, profissão, motivação da doação, o
que influiu na maneira de ver e sentir o transplante/ doação.
Com cada um dos entrevistados foi tida uma conversa inicial, explicando a
razão da pesquisa e ressaltando também sua importância para se obter
conhecimento aproveitável para a pesquisa. As perguntas foram sistematizadas, que
viabilizando alguns critérios escolhidos como importantes, classificados e agrupados
obedecendo o nível de interesse tal como se segue:
Características econômicas
Características intelectuais
Características psicoafetivas
Religiosidade
Representações do corpo
Motivação para doar
Relações familiares
Cor
2.4 Local e Período de Estudo
A primeira parte da investigação foi realizada na Fundação Hemope (BRASIL),
organização que atualmente ocupa uma área de 7.586m², conta com 1.040
funcionários, possui uma rede composta por seis hemocentros regionais: Caruaru,
Petrolina, Palmares, Garanhuns, Serra Talhada e Recife, além de seus dois
hemonúcleos: Salgueiro e Ouricuri (como mostra o mapa abaixo). A segunda parte
da investigação foi no hospital Português do Recife. A terceira parte foi realizada no
Instituto Português de Oncologia, particularmente no Serviço de Transplantação de
Células Genitoras Hematopoiéticas, mediante autorização da Direção e Comitês de
Ética e Científica no Centro de Histocompatibilidade Sul(CEDADE) realizado no
período de julho a outubro de 2011.
Ilustração 1 . Mapa da Hemorrede de Pernambuco
Fonte: Fundação Hemope, 2011.
2.5 Aspectos Bioéticos do Estudo
Para obedecer aos aspectos legais exigidos pela ética e a ciência, o protocolo
de investigação foi apreciado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação
Hemope, situada em Recife (BRASIL) e aprovado. Além desse procedimento, a
confidencialidade dos dados será rigorosamente respeitada, segundo os princípios
da Declaração de Helsinque e da Resolução nº 196/96 sobre pesquisa envolvendo
seres humanos (BRASIL, 1996), esclareceremos aos sujeitos os objetivos da
investigação, a sua forma de participação, bem como os seus direitos - ao
anonimato, à desistência inócua e a novos esclarecimentos se necessários, além da
necessidade de anuência, não apenas verbal; assim os que concordarem em
participar do estudo o farão por escrito mediante a assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE A). Também o Comitê de Ética em
Portugal se pronunciou, além do Comitê Científico.
2.6 Processamento e Análise dos Dados
Neste estudo os dados qualitativos serão analisados por um programa
computacional, denominado QSR NUD*IST (Non-numeric Unstructured Data, Index
Searching and Theorizing), um software desenvolvido por pesquisadores que
trabalham com pesquisa qualitativa na área das ciências sociais. (MILES e
HUBERMAN, 1987; RICHARDS e RICHARDS, 1994; COFFEY et al., 1996).
3 CAPÍTULO I - DIALOGANDO COM O PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO DE MAUSS
3.1 A Antropologia e o Sistema de Dádiva
3.1.1 A Doação de Medula Óssea como um Fato Social
A dádiva é entendida nos estudos das Ciências Sociais, como fator de
organização social que prioriza o valor do vínculo sobre o valor do uso e da troca,
assim entendida como um terceiro paradigma encontrado nas sociedades.Com as
ações autocentradas (individualismo metodológico) como primeiro paradigma, ou
quando as ações da coletividade, citamos como exemplo o culturalismo, o
estruturalismo e o funcionalismo sejam a base de explicação para todas as ações do
indivíduo como segundo paradigma; o dom, ou a dádiva, será considerado terceiro
paradigma, explicando a sociedade como um sistema organizado de laços e
vinculação, incluindo o cuidado com outros, dessa forma criando a estrutura de
sustentação social.
A dádiva bastante estudada por Mauss (2005, p 37-184) implica no surgimento
de um contrato legitimado por trocas. A doação de medula a primeira vista como
voluntária, pelos laços de não consanguinidade existente entre os atores, é revestida
virtualmente de obrigatoriedade. A aceitação da dádiva é concretamente obrigatória,
considerando que a medula representa para o receptor a própria vida. De forma que
a retribuição torna-se vital para que a virtude do ato do dom, não fique estagnada e
mantenha- se circulante, reafirmando, inclusive, as relações sociais dos envolvidos.
Tomamos a noção de dádiva como o conceito fundante da nossa reflexão, ele
é que permitirá passar do fato empírico à possível interpretação. O fato empírico
será a doação (de medula). A doação, aqui descrita como a maneira de pensar, de
sentir o indivíduo em seu exterior, na medida em que pode ser definida como um ato
exercido por um agente social enquanto indivíduo que participa das manifestações
decorrentes das relações, das atividades, e dos produtos sociais, isto é, de tudo que
é resultante das interações interpessoais e envolvida com os diversos aspectos da
sociedade. Entretanto parece não ser um evento semelhante àqueles que
extrapolam a consciência do indivíduo, obrigando-o a agir apenas por cumprimento
do dever, ou hábito cultural.
De acordo com Lévi-Strauss “para compreender convenientemente um fato
social, é preciso apreendê-lo totalmente, ou seja, de fora, mas como uma coisa de
que faz parte integrante à apreensão subjetiva consciente ou inconsciente que dela
faríamos se vivêssemos o fato em lugar de observá-lo como etnógrafo” (LÉVI-
STRAUSS, 1974, p.17).
A doação vista como um fato social pode ser pensada em sua essência pela
teoria do reconhecimento. Desta maneira a dádiva explicita os mecanismos
relacionados com as contradições, trocas recíprocas, surgidas por intermédio
aparentemente voluntário. Nela, fica evidente que as dádivas, mesmo parecendo
voluntárias, se submetem a uma obrigatoriedade transcendente, tanto no seu
instante inaugurador quanto no seu retorno consequente. Com essa categoria de
fato social total coloca toda sociedade em movimento. São fatos sociais totais
porque não abarcam apenas uma instituição, ou parte dela, mas sim sistemas
sociais inteiros.
Com essa categoria de fato social Mauss nos oferece o princípio metodológico
segundo o qual há fatos sociais estratégicos, a partir dos quais o analista deve
descortinar mecanismos que revelariam a sociedade como uma totalidade coerente
e em atividade, Mauss parece perceber que por trás dos desafios morais das trocas
do sistema Potlach, há uma estrutura de equivalência entre os homens expressa na
reciprocidade (receber, dar e retribuir), fenômeno que exige obrigação recíproca de
realizar o dom pelo dom, e de se exceder nesse doar, internalizando e envolvendo a
coisa dada, encontra-se o espírito ou virtude que atribui à mesma um poder
simbólico de transmissão.
Mauss analisou esse costume em grupos no norte da Polinésia, Melanésia e no
Alasca, identificado também em outras regiões, continuou a ser estudado pelo
próprio Mauss e por muitos autores, sendo mantido Mauss e sua obra-como
referências no assunto.
A consequência dessa postura teórica sobre o método é que os fatos sociais
não podem mais serem vistos como causas exteriores, mas como símbolos que são
totais, pois têm a possibilidade de imbricação, gradação e tradução nos diversos
planos da ação. Assim, a lógica da dádiva coloca numa linha horizontal a ação
individual e a estrutura social. Partindo desses pressupostos, a pesquisa pretende
correlacionar a dádiva com questões especificas como: reconhecimento social,
autoestima, exercício de poder entre outras questões.
Assim o arcabouço teórico dos conceitos elaborados por Mauss na teoria do
dom, a visão antropológica da reciprocidade, bem o como a teoria da dádiva
segundo Alan Caillé, permitirá acionar estratégias metodológicas e interpretativas
desta tese, como pretendemos mostrar durante o estudo.
A doação pode ser vista como um fato social, aqui descrita como a maneira de
pensar, do sentir o indivíduo em seu exterior, na medida em que pode ser definida
como um ato exercido por um agente social enquanto indivíduo que participa das
manifestações decorrentes das relações, das atividades, e dos produtos sociais, isto
é, de tudo que é resultante das interações interpessoais e envolvida com os diversos
aspectos da sociedade. Entretanto, a doação de medula parece não ser um evento
semelhante àqueles que extrapolam a consciência do indivíduo, obrigando-o a agir
apenas por obrigatoriedade, cumprimento do dever, ou hábito cultural. Todos esses
patamares, de apreensão do social necessitam girar em torno de uma experiência
concreta em uma dada sociedade localizada tempo-espacialmente, e também em
um indivíduo e em grupo de indivíduos dessa sociedade.
Para estudar a doação, do ponto de vista da antropologia, não devemos nos
ater a vê-la como um gesto mediado por imposições culturais que dão lugar a
hábitos e costumes que qualifica o agir social, até porque podem existir doadores
que se recusem a doar. A doação vista como um fato social pode ser pensado em
sua essência pela Teoria do Dom. Desta maneira, a teoria da dádiva explicita os
mecanismos relacionados com as contradições, trocas recíprocas, surgidas por
intermédio aparentemente voluntário.
Assim esses mecanismos fomentam representações sociais, além de torná-las
estáveis. Nela, fica evidente que, as dádivas, mesmo parecendo voluntárias, se
submetem a uma obrigatoriedade transcendente, tanto no seu instante inaugurador
quanto no seu retorno consequente. Com essa categoria de fato social total coloca
toda sociedade em movimento. São fatos sociais totais porque não abarcam apenas
uma instituição, ou parte dela, mas sim sistemas sociais inteiros.
No ensaio sobre a dádiva, com essa categoria de fato social Mauss nos
oferece o princípio metodológico segundo o qual há fatos sociais estratégicos, a
partir dos quais o analista deve descortinar mecanismos que revelariam a sociedade
como uma totalidade coerente e em atividade, Mauss parece perceber que por trás
dos desafios morais das trocas do sistema Potlach, há uma estrutura de
equivalência entre os homens expressa na reciprocidade (receber, dar e retribuir),
fenômeno que exige obrigação recíproca de realizar o dom pelo dom, e de se
exceder nesse doar, internalizando e envolvendo a coisa dada, encontra-se o
espírito ou virtude que atribui à mesma um poder simbólico de transmissão. Desse
modo, aquele que recebe torna-se impotente para recusar a dádiva e obrigado a
retribuí-la. Os participantes desse circuito passam a ser elementos de articulação da
comunidade, fortalecendo a coesão social, e fomentando, inclusive bases religiosas.
A obrigação de dar e receber é revestida de uma dinâmica que resulta no
fortalecimento das instituições, e não é de natureza moral. Esses sistemas de troca
são encontrados em vários aspectos da vida social e cotidiana.
A obrigação de dar, receber, de aceitar e devolver, explicado pelo mana ligado
ao objeto e que vincula doadores e receptores a ele, pode ser um esquema aplicável
a doação de medula. Para tal convém lembrar convém lembrar que a medula óssea
enquanto objeto doado para o transplante carrega além de sua constituição genética
e sua capacidade fisiológica, o poder e a força de reviver o receptor. Tanto o doador
como o receptor sabe disso. A medula doada encontra-se vinculada, dessa mana, o
doador traduz vida e que parte do seu corpo será introjetado no receptor. É algo
próprio do doador que será cedido. Assim a medula recebida encontra-se vinculada,
primeiro por saber que no objeto doado está contida sua própria vida, e nada pode
ser mais obrigatório do que receber vida, principalmente quando a morte se faz tão
presente. O receptor sabe da virtude que está sendo doada, por se tratar de vida
jamais poderá ser total, de maneira que o receptor sempre será um devedor.
A medula então passará a ser circulante, no processo de transplante pode ser
visto como algo que guarda em si o sentido de poder que simboliza vida, isto é, um
valor que excede seus limites visíveis. O que se verifica é a possibilidade de
tradução entre os diversos campos de atuação do homem na sociedade, ou seja, a
interpretação entre o utilitário, o simbólico, interesse e o desinteresse.
Interpretando a dádiva, segundo Mauss, percebe-se que ela institui um tipo de
relação que envolve o espiritual e que, por isso mesmo, ultrapassa a coisa dada e
recebida. A dádiva transcende as pessoas que participam da transferencia e a
própria transferência em si, repercute sobre o mundo natural, social e espiritual.
A experiência de ser um doador voluntário pode fornecer, além do sentimento
de solidariedade, a oportunidade de participar de modo significativo na sociedade,
intensificando o senso de responsabilidade social.
Godbout “a dádiva serve antes de tudo, para estabelecer relações. É uma relação sem esperança de retorno por parte daqueles a quem damos por parte daqueles que venha a substituir, uma relação de sentido único, gratuita, neste sentido e sem motivo não seria relação. Aquém e além dos momentos abstratos do egoísmo e altruísmo, da antítese entre o momento considerado do interesse considerada real do interesse material calculado e um momento ideal inacessível ao interesse radical, é preciso pensar a dádiva não como uma série unilateral e descontínua, mas como uma relação” (GODBOUT, 1999, p. 16).
Esta tese tenta descobrir se o carater transcendente dos laços estabelecidos
pela dádiva da medula óssea e suas formas que extrapolam ao conteúdo concreto
do presente concreto, criam novos, ou aumentam os vínculos entre os elementos
participantes do circuito. Descobrir também, se na celebração do transplante, o
doador busca alguns elementos envolvidos na troca segundo a teoria do dom.
O bem público inferido a partir das análises do sistema da dádiva se estabelece
em uma esfera social intermediária (Caillé, 2004; Godbout, 2004; Chanial, 2004),
relacionando o indivíduo e a coletividade relacionando o indivíduo e a coletividade.
O bem público é o que permite acionar o sentido de obrigações recíprocas ao
mesmo tempo em que ativa as virtudes cívicas que engajam os indivíduos ao mundo
social. Isso permite pensar as práticas sociais que visam democratizar o Brasil, não
a partir de valores ideais, combinando “o tradicional e o moderno (LANIADO, 2001,p.
228).
Por isso, é impossível, nesta atual conjuntura, impedir o público não médico,
não especialista, de discutir os reflexos sobre a medicina moderna. A crescente
tecnificação da prática médica, o enfraquecimento do discurso social sobre saúde, a
falência do Estado de bem estar disseminou uma visão restritiva da saúde como
fenômeno social e coletivo.
Portanto, o aumento das taxas de doadores depende de um olhar que
extrapole as questões técnicas do processo de doação de órgãos e tecidos, como
vêm fazendo vários países, que trabalham sistematicamente nesse processo, há
longo tempo, incorporando a abordagem social e a perspetiva ética, baseadas no
altruísmo e voluntarismo das pessoas e no respeito ao direito de autonomia dos
potenciais doadores. Esta visão precisa ser parte integrante.
Na América Latina e em diversos outros países, vários pesquisadores e
estudiosos têm articulado seus estudos e pesquisas em torno do paradigma do pós-
estruturalismo, dedicando especial atenção ao papel dos sujeitos sociais. Em todos
os casos, é evidente a ênfase no sujeito, contudo a maioria dos sociólogos que
assumem tal enfoque analítico tem feito grande esforço intelectual e, empreendido
uma batalha metodológica para superar as oposições do tipo individualismo/holismo,
resgatando para tal, as contribuições de Giddens e Bourdieu. Os modelos teóricos
individualistas não têm como conceber essa forma de obrigação em sua vinculação
com o exercício da liberdade a essa tradição de pensamento.4
3.2 A Doação de Medula como Prática de Reconhecimento Social
Tendo como ponto de partida o indivíduo relacional que compartilha um
universo simbólico com o outro, e que somente encontra validade nele
(HABERMAS, 2002) nas relações de conhecimento mútuo (HONNETH, 2003),
observa-se além do saber técnico e de uma linguagem natural as experiências do
sujeito. Pela teoria do reconhecimento de Honneth as relações determinantes do
mundo da vida, colocariam os atores em experiências comuns de sofrimento como é
o caso dos pacientes que precisam de transplante de medula óssea. É a partir desta
operação de sentido que os atores partem para uma luta moralmente motivada. A
contribuição de Honneth se distancia, por sua vez, do comportamento do julgador,
para colocar em evidência os conflitos numa perspectiva normativa fundamental, o
movimento de partida do autor são os indivíduos. As lutas por reconhecimento
apesar de terem sido apropriadas na emergência dos novos movimentos sociais,
nas reivindicações de natureza cultural, contribuíram para colocar dentro do debate
político o agravamento das desigualdades sociais pelas políticas neoliberais na
década de 1980, a questão da globalização econômica (SILVA, 2005), deslocando
os tipos de demanda ao lado das demandas pós-redistribuição, numa concepção e
crítica da sociedade capitalista, trazendo para a regulação econômica formas
assimétricas de reconhecimento (FRAZER, 2001).
4 A vontade subjetiva e a vontade coletiva nunca são, de fato, completamente reconciliáveis, coexistindo em uma tensão permanente (BAUMAN, 2000, p. 190).
Diante desse quadro, seria preciso elaborar elementos normativos dessa
concepção de luta motivada na experiência dos doentes, somados à observação
contextual dos movimentos na sociedade civil e, ao mesmo tempo, às mudanças.
Para Honneth, 2003, no processo histórico a luta de classes é um exemplo de
conflito moral onde o trabalho no capitalismo provoca a destruição das relações de
conhecimento e demonstra a existência de conflito entre concepções diferentes: o
conflito representa uma”espécie de mecanismo de comunitarização social,que
forçam os sujeitos a se reconhecerem mutuamente no outro (HONNETH, 2003,p.
64).
São as experiências de uma determinada sociedade que colocam os indivíduos
em interação e os impelem a uma autorrelação prática de luta pelo reconhecimento
recíproco: “os sujeitos só podem chegar a uma autorrelação prática quando
aprendem a se conceber da perspectiva normativa de seus parceiros de interação
como seus destinatários sociais” (HONNETH, 2003, p. 155). A análise de Honneth
se antecipa as estruturas atomizadas das teorias centradas no indivíduo. Hegel que
o influencia não assume o indivíduo como categoria necessária e suficiente para a
compreensão da liberdade e sustenta que há um vínculo que precede o indivíduo.
Ele retorna a ideia aristotélica de sociedade em decorrência de vínculos comuns que
precedem o próprio movimento de individuação das ações.
Com efeito, a luta por reconhecimento de direitos constitui um padrão
intersubjetivo ou uma das três esferas de interação subdivididas na vida social onde,
a identidade do indivíduo se confirma. Padrões de reconhecimento e a sociologia
numa luta constante de todos contra todos pela autoconservação, mas na luta pelo
reconhecimento das dimensões da individualidade humana. De forma ideal típica e
positiva, são três as relações significativas no desenvolvimento moral dos indivíduos
que se intensificam passo a passo na luta pelo reconhecimento: primeiro as ligações
emotivas ou primárias do amor nas relações familiares, de onde se desenvolve a
autoconfiança para a participação autônoma dos indivíduos na vida pública;
segundo, a adjudicação de direitos criando uma relação prática de autorrespeito dos
indivíduos com a sociedade civil; e, terceiro, a solidariedade numa comunidade de
valores, que cria uma relação prática de autoestima, na tolerância e afeição dos
indivíduos às diferenças de prosperidades entre os sujeitos humanos. Esta luta
implica também na ampliação e questionamento da comunidade a qual os indivíduos
estão inseridos.
Não o bastante estes padrões de reconhecimento consistem num parâmetro
normativo e convergem para os enunciados mais universais possíveis, ou seja,
valores e princípios da modernidade, diferente das ideias singulares de vida, para os
fins de autorrealização humana. “Honneth articula uma teoria social, crítica que
mantém em seu núcleo a noção do conflito, sem, no entanto, retornar aos modelos
holísticos” (SILVA, 2005, p. 8).
Em todas as abordagens, as variáveis utilizadas para análise do fenômeno da
ação voluntária são muito semelhantes, destacando-se: circulação, fluxo, troca,
motivações, valores, intercâmbio de informações; intensividade e extensividade; o
compartilhamento de experiências, a colaboração em ações coletivas; o aprendizado
coletivo e as inovações; a ampliação do poder de pressão; a diversidade e
articulação; pluralismo organizacional e ideológico; ação direta e institucionalidade;
atuação nos campos cultural, integralidade e realimentação; a horizontalidade
organizativa, a relação entre flexibilidade e agilidade.
Por ser esta uma pesquisa na área de antropologia, é importante, também
entender o conteúdo e o processo de formação dessas representações no indivíduo;
mais especificamente no grupo social enquanto produto de internalização das
condições materiais de existência. Esses aspectos não são aprofundados por
Bourdieu. Optamos por buscar outros autores que pudessem responder essa
questão. Destacamos Luc Boltanski, ao demonstrar em seu trabalho uma maior
preocupação com o processo de constituição das representações dos agentes. Para
Boltanski, as representações encontradas muitas vezes parecem ter um caráter
individual onde cada sujeito pode apresentar uma descrição particular, mas, na
realidade, “elas constroem segundo regras fixas, um grupo de categorias e de
esquemas de classificações que possuem um caráter coletivo, determinados pelas
condições objetivas” (BOLTANSKI, 1984, p. 72).
3.3 A Teoria da Reciprocidade na Perspectiva Antropológica
3.3.1 A Doação como Prática de Reciprocidade
A teoria antropológica da dádiva demonstra uma disposição compreensiva das
vinculações e experiências coletivas, de forma contextual e local, tanto nos aspectos
de sistematicidade, quanto naqueles assistemáticos do social, no sentido de que o
sistema social se constitui de relações numa regra tripartite de reciprocidade dar,
receber e retribuir na razão instrumental e significativa entre os sujeitos com
competência linguística, e de forma ainda mais complexa considera a mediação dos
presentes, bens e objetos na tessitura do vínculo social. A dádiva segundo Freitas
(2002), possui uma reflexão radical ao interrogar o vínculo social, acionando outro
nível de análise do social, o que deve ser enfatizado, no trabalho de resgate das
memórias, das significações simbólicas e das lógicas institucionais, é a tentativa de
ir além das oposições binárias, já que estas oposições são impeditivas de uma
melhor apreensão das redes e práticas que organizam a ação social. Ao invés de
opor a objetividade das estruturas e a subjetividade das representações, essa teoria
busca articular as diversas modalidades da relação ao mundo social que demarcam
a existência das redes sociais que vinculam os atores entre si e entre as instituições,
com isto, descartam-se as antigas concepções enquanto representação do real.
Nesta perspectiva, a dádiva ultrapassa os valores de uso e de troca do objeto
que circula, inserindo o valor do vínculo que traduz a intensidade da relação entre os
atores envolvidos. Na dádiva, a relação conta mais que o bem doado, posto que
esta circulação não esteja subordinada à racionalidade utilitária nem à racionalidade
política, ela está a serviço dos vínculos sociais. De maneira que a pesquisa ao
estudar o doador de medula óssea, assim como, o receptor, reflete os valores que
circundam o gesto da doação e os motivos envolvidos no ato. Aparentemente esse
gesto se dá por livre vontade, desvinculado de qualquer tipo de retorno material.
A caracterização da reciprocidade enquanto modo de sociabilidade, desde a
lógica do paradigma da dádiva, permite evidenciar que o vínculo que conecta os
indivíduos, exige que os bens circulem como bens simbólicos, ou seja, eles devem
carregar algo do doador, o seu espírito. Pois, é este espírito que estabelece um
vínculo com o outro: um compromisso, uma lealdade, um crédito futuro para a
retribuição, que atravessa tempos e gerações. As normas sociais são incorporadas
pelos sujeitos, através de um sentido de pertencimento.
Trata-se de um pensamento que inspira no movimento da vida, e na sua
pluralidade das lógicas, inclusive aquelas de interesse do (mercado) da obrigação do
(Estado), mas que prioriza na constituição do vínculo social não outra lógica, mas
todas simultaneamente gerando um movimento paradoxal e incerto de interesse,
desinteresse, de liberdade e de obrigação centrado no valor da relação. Por esta
abordagem reabilita-se a experiência dos atores e grupos sociais, em lugar de partir
de categorias abstratas e estritamente científicas, ao buscar a intencionalidade e
justificativas dos mesmos nas determinações do fazer e do dizer. Ou seja, percebe-
se que ela institui um tipo de relação que envolve outras questões, a partir do
surgimento dos vínculos sociais diversos, e na maneira pela qual a sociedade faz
circular seus bens simbólicos. Desta forma transcende às pessoas que participam e
repercute sobre o mundo natural, social e porque não dizer espiritual. “Para Martins,
no sistema da dádiva, a circulação dos bens não se submete à equivalência, mas ao
paradoxo, escapa ao simplismo do interesse egoísta para se abrir sobre a
diversidade de razões para se produzir vínculos e solidariedades” (MARTINS, 2003,
p. 64).
O senso comum, reflexo de um conhecimento que não é submetido ao crivo
pelo qual passa a epistemologia científica, reduz a complexidade das razões
fundamentais da doação, unicamente ao altruísmo. Esta razão pode estar expressa
nos discursos dos receptores, dos familiares e dos profissionais de saúde envolvidos
com o transplante, e principalmente nos discursos elaborados pelos doadores. Além
do que há uma exarcebação e mitificação da mídia reproduzindo-a por meio dos
agentes que formam opinião pública, fortalecendo esta representação social, aqui
entendida como forma de conhecimento socialmente elaborada e partilhada, e que
percebe a realidade afetiva inscrita no indivíduo, reinterpretando a realidade.
Outro autor que discute reciprocidade é Polanyi para ele é uma forma de
integração superior em virtude da sua capacidade de empregar a redistribuição e o
intercâmbio como métodos subordinados. Ele observou que a reciprocidade
pressupõe movimentos de recursos e informações entre correlatos de agrupações
simétricas. E como sistema integrativo configura, uma relação onde a dimensão
cooperativa e o valor da confiança são reconhecidos como essenciais à
continuidade, estabilidade e eficiência do processo de interação (POLANYI, 2001).
O problema da natureza ambivalente da reciprocidade passou a suscitar
debates cruciais para a teoria sociológica contemporânea, em geral com o modelo
de reciprocidade materializado na dádiva (VANDENBERGUE, 2004). Descobre-se
que a circulação social de objetos pode reger-se por outras motivações além dos
interesses utilitários. Os bens sociais podem circular na perspectiva, não apenas do
enriquecimento ou sobrevivência física dos indivíduos, mas também para criar,
manter ou regenerar o próprio laço social. No ensaio sobre a dádiva, Mauss
desenvolve a noção de reciprocidade, e é um dos principais teóricos que sempre
estabeleceu uma via onde pode transitar qualquer coisa, seja material ou simbólico,
pois a dádiva inaugura o conceito de aliança na qual a reciprocidade alimenta.
O conceito de reciprocidade generalizada se traduz como a troca de bens,
favores e trabalho, baseada na suposição de que retribuições se equilibrarão em
longo prazo, e por conta dessa expectativa a questão da retribuição não é
especificada ou mesmo sugerida. Entretanto a generosidade comum entre amigos e
familiares pode ser considerada como altruísmo superlativo, no qual a reciprocidade
existe como expectativa convicta, embora genérica quanto ao valor e tempo de
retribuição deva ocorrer. Ela difere da reciprocidade equilibrada, posto que esse
condicione uma troca direta e presumivelmente satisfatória para aqueles que
permutam. “Embora essas colocações em torno da reciprocidade sejam levantadas
para as sociedades tribais, elas podem ser remetidas para a nossa sociedade”
(VASCONCELOS apud SHALINS, 1983, p. 31-32).
A caracterização da reciprocidade enquanto modo de sociabilidade permite
evidenciar que o vínculo que conecta os indivíduos, exige que os bens circulem
como “bens simbólicos”, ou seja, eles devem carregar algo do doador, o seu espírito.
Para Simmel, a noção sobre sociabilidade, vai além das representações sociais.
Esta se baseia em formas de interação recíproca entre os membros da sociedade,
implicando em uma participação e contribuição efetiva de seus membros para a vida
social. Por perceber que é uma categoria analítica central, organiza os laços de
solidariedade entre os doadores voluntários de medula óssea. A marca inicial
desses doadores reside na formação dos vínculos de parentesco, amizade e
anônimos, que reúnem um grupo em prol de uma causa, gerando uma ação coletiva
que se replica.
O desdobramento analítico – que surge desse deslizamento da solidariedade –
a sociabilidade nos permite no campo sociológico as análises de Simmel sobre o
entrelaçamento entre individualidade e formas sociais. O debate sobre o lugar
ocupado pelo ator social, pelos sujeitos nas análises sociológicas ganha com o
referencial simmeliano a possibilidade de rever dicotomias entre indivíduo e
sociedade, entre subjetividade e objetividade. É a partir dessa discussão teórica que
dialogamos com a dimensão da sociabilidade e seus significados baseados na
interação entre sujeitos sociais, que desenvolvem ações sociais pautadas na
voluntariedade (SIMMEL,1983). Nessa perspectiva, a vida cotidiana ganha destaque
e com ela a possibilidade de investimento na sociabilidade, na ampliação dos laços
em direção ao espaço público.
De acordo com Melucci (2001) é a voluntariedade do vínculo social na qual a
ação voluntária está inserida, define essa ação como categoria sociológica. Quatro
características estão inseridas, são elas: adesão livre, solidariedade coletiva,
pertencimento de uma rede de relações e gratuidade aos serviços oferecidos. Se as
vantagens econômicas não estão em jogo, outros benefícios se fazem presentes:
vantagens simbólicas, prestígio, autoestima, poder de qualquer forma de intercâmbio
social. Para o autor, o altruísmo social é também uma marca forte da ação
voluntária, não só na prestação de um serviço, distribuição de um bem a outros, mas
principalmente pela função dos serviços por parte dos destinatários.
No que se refere à solidariedade essa se torna uma categoria chave do
imaginário moderno e se relaciona à temática da doação voluntária de medula
óssea. A mesma aparece ancorada em valores presentes no ideário da pessoa
moderna, e que não se esgotam em uma visão utilitarista de custo/benefício. Quais
sejam os valores que possibilitam o reconhecimento, o pertencimento no interior
dessa dimensão (MOREIRA, 2005).
Segundo Domingues (2002), a solidariedade remete aos processos sociais
específicos, definindo estratégias de reconhecimento e pertencimento de indivíduos
e coletividades a um todo mais inclusivo. Para o autor tanto a solidariedade quanto a
liberdade, a igualdade e a responsabilidade, se concretizam com categorias que
organizam o ideário da sociedade moderna. Ainda de acordo com o autor, a
solidariedade ganha contornos de uma categoria que equivale à integração social ou
sistêmica, englobando tanto as relações entre indivíduos, quanto coletividades,
estendida em todos os domínios da vida social, em sua concretude nos laços, sejam
eles familiares ou não, na cidadania, na política social, na nação e na classe.
A maioria dos doadores pode estar nesta categoria, por não ter alguma relação
com as pessoas que precisam receber transplante de medula óssea. Essa relação
pode estar tanto nos laços a um desconhecido, como nos de amizade, assim como
no biológico. Doar, visando à necessidade do próximo, ou a de um parente ou
amigo, pode constituir o início de um processo onde a doação para estas pessoas
depende das relações de proximidade entre doadores e receptores e por isso pode
ser garantida a doação aos pacientes que estão precisando do transplante. É
interessante observar a manutenção de atitudes positivas em relação à população
que possibilite os grupos sociais a se organizarem no seu dia-a-dia, orientando,
assim, condutas e comportamentos em suas ações.
Ao examinar as formas de circulação dos bens em diferentes sociedades,
Mauss se dedicou a compreender o caráter livre e gratuito, mas ao mesmo tempo
obrigatório e interessado, dos atos de dar, receber e retribuir. No encadeamento
dessas operações, reconheceu o fundamento dos vínculos entre os sujeitos.5 Para
ele, o que funda a sociedade não é a submissão que dá origem ao Estado, mas o
estabelecimento de uma forma de relação, na qual os homens podem "opor-se sem
massacrar-se" (MAUSS, 1974, p. 45).
3.4 A Doação de Medula no Contexto da Antropologia da Saúde
De acordo com Kleinman (1980) há quatro abordagens de saúde expostas na
literatura: são elas racional, aplicada, ecológica e interpretativa. Nesta investigação
utilizaremos a quarta derivada da antropologia interpretativa cujo objetivo é trazer
novos horizontes à biomedicina no que se refere aos conceitos saúde e doença. No
centro das abordagens está a relação entre cultura e doença.
Quando acontece, um evento na vida do indivíduo, seja ele bom ou ruim, sendo
este último, por exemplo, uma doença, este busca explicá-lo, procurando suas
causas para compreender e enfrentar esse fenômeno. A maneira como o individuo
reagirá ao problema é influenciada pela cultura (ADAM; HERZLICH, 2001).
Esses autores dizem que cada sociedade organiza-se diferentemente com
relação a crenças e atitudes diante da vida. Por isso, se muito ou pouca importância
a um fenômeno, como por exemplo, uma doença, dependendo do significado que
ela representa para a sociedade.
Acrescentamos (SILVA, 2001, p. 32) que aborda os aspectos da realidade
social e as questões de saúde dizendo que“ portanto, é na realidade social, mutante
e dinâmica que são construídas as doenças, seus processos de tratamento e cura.
As questões de saúde não acontecem de maneira separadas dos demais aspectos
da vida de uma pessoa e da sociedade, fazem parte de contexto sócio cultural.
5 Refutando a noção corrente de uma economia natural supostamente baseada na maximização dos interesses individuais, Mauss (1974) colocou em destaque o entrelaçamento entre fenômenos econômicos, morais, estéticos, religiosos e jurídicos no seio de prestações e contraprestações que se apresentam preferencialmente como atos voluntários, mas nos quais se entrevê a força obrigatória do dever, "sob pena de guerra privada ou pública" (p. 45).
3.5 O Corpo na Doação de Medula Óssea Como um Fato Social Total
Na contemporaneidade o corpo é visto como uma matéria a ser modelada, está
sempre em evidência e é constantemente redescoberto, porém nunca totalmente
revelado. As acções se voltam para o corpo com o objectivo de conhecê-lo, dominá-
lo, de ultrapassar seus limites e alcançar algo mais, como por exemplo: mais saúde,
produtividade, melhor performance e qualidade de vida.
A partir dos anos de 1960, o culto ao corpo convive, ao mesmo tempo, com
imagens da violência a ele imposto no quotidiano, além do crescente comércio
internacional de suas partes, incluindo órgãos, células e genes. De acordo com
Santana, o corpo passou a ser o lugar preferido para a descoberta de si, em que
acções corporais passam a desempenhar um papel fundamental, como uma
necessidade básica. Ainda de acordo com o pensamento do autor as asceses
corporais praticadas na antiguidade configuram-se como práticas de liberdade, em
que os indivíduos almejam não apenas a saúde do corpo, mas também da alma,
visando superação, transcendência e sabedoria.
Diferentemente destas, as asceses praticadas na atualidade chamadas pelo
autor de bioasceses, privilegiam o corpo. Os indivíduos se submetem a esse
processo na busca pelo aperfeiçoamento constante do corpo e nesta acção a saúde
passa a ser objecto em si, ou seja, passou a ser a verdade e também a utopia do
corpo.
Outra característica evidenciada na atualidade é a visibilidade dada a esse
corpo, que está cada vez mais a mostra, não apenas em sua superfície segundo
padrões estéticos, mas também na sua interioridade por meio das técnicas de
imageamento corporal e de monitoramento de suas estruturas internas,
possibilitando assim, um maior controlo sobre o corpo. Também na arte as imagens
corporais têm sido exploradas como ferramentas para a intervenção artística.
As possibilidades tecnológicas no século XX apontam para o surgimento de
uma nova sensibilidade do corpo, para possibilidades de transformação e controlo
desse espaço interno, um espaço de exploração e conhecimento sobre o corpo.
O avanço das tecnologias médicas de imageamento corporal tem possibilitado
o que é chamado por Santana de colonização do interior do corpo. O autor atribui o
fim das ideologias colectivas como uma das possíveis causas da centralidade do
corpo na actualidade, em que este passa a ser a única possibilidade de
transformação.
É em Lévi Strauss que encontramos para alocar um conceito ou uma noção
que pudesse determinar certo objeto em outro objeto.Na introdução a obra de
Marcel Mauss (2003,p.42), o autor ressalta a existência de um excedente de
significados. Menciona que o conceito de coisa, este se torna flutuante à espera de
um significado ao vincular-se. É neste sentido que correndo aos excedentes de
significantes, encontramos o conceito de coisa, e o uso para definir corpo.
O corpo não é captado pela inteligência pura.Parece sempre ser necessário
recorrer as experiências pessoais e modos de vida particulares para refletir a
questão.Neste sentido, o corpo não é inerte. É um dado histórico, expressivo e
modificado, portanto técnico.
A noção de técnica confere ao corpo uma forma social. Quando Marcel Mauss,
em seu livro técnicas corporais, de 1934, propõe tratamento como objeto
comunicativo, através da técnica corporal. A inserção da dimensão social no trato
com o corpo é um exemplo do trabalho de Mauss, que não deixa lacunas ao ir
adiante com a proposição de, além de constituir um fato social total.
A noção do corpo como fato social total eleva o status de instrumento completo
de análise de uma dada sociedade, de maneira que as investigações sociais e
culturais do corpo, em que as Ciências Sociais devem ter como objeto de análise,
além da dimensão de uma apreensão às dimensões simbólicas.Todos esses
patamares, de apreensão do social necessitam girar em torno de uma experiência
concreta em uma dada sociedade localizada tempo-espacialmente, e também em
um indivíduo e em grupo de indivíduos dessa sociedade.
Neste sentido os participantes passam a ser elementos de articulação da
comunidade, fortalecendo a coesão social, e fomentando, inclusive bases religiosas.
Para isso convém lembrar que a medula óssea enquanto objeto doado para o
transplante carrega além de sua constituição genética e sua capacidade fisiológica,
o poder e a força de reviver o receptor. Tanto o doador como o receptor sabem
disso. A medula doada encontra-se vinculada, o doador traduz vida e que parte do
seu corpo será introjetado no receptor.
Na perspectiva filosófica a afirmação do eu revela a afirmação de uma
realidade implícita em cada um, seja ela íntima e pessoal que caracteriza o ser
humano. Ou seja, o Eu como afirmação do que é pessoal, é o vetor fundamental
para a personalidade de cada um, única e irrepetível.
É esta especificidade que há em cada ser humano que desencadeia uma
preocupação sobre o sentido da vida, consiste numa perspectiva espontânea e
imediata anterior a reflexão filosófica.Trata-se de uma preocupação anterior e é
intrínseca a cada um de nós; numa interpretação singular e individual da experiência
vivida. Essa preocupação é entendida como uma perspectiva natural pelo modo
como a pessoa exprime o que viveu, sua experiência pessoal, procura um sentido
par o que lhe aconteceu e experimentou. Essa determinação sobre a existência
humana surge naturalmente como uma necessidade elementar da pessoa, não só
de compreender a si mesmo, como também de criar alternativas que permitam o seu
num tempo e espaços determinados.
De acordo com Bernard Groethwysen a reflexão para si pode significar duas
coisas, conforme o homem se atenha ao que lhe aconteceu na vida e queira
representar-se a si próprio, ou a vida e mesmo se torne para si um problema de
conhecimento. A segunda perspectiva fundamentada numa reflexão teórica, na
filosofia e procura especificamente definir a essência de pessoa, mas com o
conhecimento sobre a própria vida, encontrando na filosofia os fundamentos para
uma reflexão elaborada sobre o homem e aquilo que é especificamente humano.
Assim a reflexão filosófica exige uma precisão da linguagem e dos conceitos e
utilizados, de maneira a esclarecer o pensamento sobre o humano e sobre a
realidade existencial que o rodeia. Neste sentido, importa fazer a distinção
conceitual entre o que se entende por “ser humano e pessoa”.
Se, na prática, ambos os conceitos se referem ao mesmo tempo sujeito, o
sujeito humano, na teoria podem distinguir-se de acordo com Lucien Séve, o ser
humano tem como ponto de partida a humanidade com espécie biológica. A pessoa
num sentido completamente diferente: pelo fato de tomar a realidade como ideal
regulador. No ser humano, a humanidade está presente a título de facto. Na pessoa,
ela está representada como um valor. E é esta representação que constitui a
consciência moral. A noção de ser humano completa uma perspectiva biológica e
está associada ao ser natural, ao indivíduo que pertence a uma determinada
espécie. Ao contrário a noção de pessoa assume uma dimensão mais complexa no
seio do pensamento filosófico procurando desvendar o sentido da sua
individualidade no seio da humanidade, na qual a sua espiritualidade se revela como
uma categoria determinante.
Deste modo, a noção de pessoa destaca-se na atualidade do pensamento
filosófico e sua teorização tornou-se fundamental, alargando-se o seu debate para
além da reflexão puramente filosófica. O debate em torno do conceito pessoa
tornou-se necessário em outras áreas do saber, especificamente naquelas que
intervêm directamente no desenvolvimento natural da vida humana. É neste ponto
que se dá o cruzamento da filosofia e das ciências biológicas, que colocam
gradualmente novos desafios sobre a vida humana e a sua possível artificialização.
Deste cruzamento emerge a reflexão ética aplicada a vida enquanto reguladora dos
alcances e limites da aplicação das ciências biológicas á vida humana.
A segunda parte dessa reflexão da noção do conceito de pessoa refere-se ao
questionamento sobre a perspectiva mais elaborada por parte da filosofia, e a um
conjunto de visões e concepções sobre a própria realidade que contribuíssem para
compreender a sua essência. Esta multiplicidade de significações foi ganhando ao
longo da história do pensamento antropológico, contribuindo para a determinação do
conceito de pessoa. A antropologia filosófica, entendida como a reflexão sobre si, o
ensaio sempre renomado que o homem faz para chegar a compreensão da
realidade e da noção actual de pessoa.
E sobretudo com o cristianismo que a noção de pessoa irá se estruturar com a
afirmação da criação do homem à imagem e semelhança do seu criador. O homem
é imperfeito na sua plenitude, mas distingue-se dos demais seres pela dimensão
espiritual que o interpela a participar da obra de Deus, numa busca constante do
aperfeiçoamento de si. Esta contribuição do cristianismo é fundamental par a o
enriquecimento da noção de pessoa, uma vez que o horizonte da espiritualidade é
desconhecido na antiguidade grega e, como tal não é teorizado.
A maior contribuição no contexto da modernidade para a noção substancialista
de pessoa é Descartes (1556-1650) com a verdade irredutível da substância
pensante. Ao longo da modernidade, a reflexão em torno da unidade de corpo e
alma é contemplada na tentativa de superar a teoria bi-substancialista do homem
pensado por Descartes. Neste contexto, a filosofia de Gottfried Leibniz (1646-1716),
representa uma contribuição determinante para a tentativa de estreitamento das
relações, e entre corpo e alma, e que integram a sua história metafísica da harmonia
pré-estabelecida.
Portanto o corpo que é reflexo da sociedade e que articula significados sociais
e não é apenas um receptáculo exclusivamente biológico. O corpo é o primeiro
elemento instrumental e técnico do homem.É necessário que esse instrumento seja
adaptado seja adaptado aos fins mecânicos e quimicos propostos pela natureza e
tal adequação lhe conferida pela sociedade a qual pertence.
A contribuição de Leibniz e que se integrem alma entre a noção de pessoa
torna-se pertinente na medida em que supera a necessidade de justificar a unidade
do humano e de compreende-lo como uma substância única e composta. O
pensamento metafísico de Leibniz marca definitivamente a passagem de concepção
substancial para uma concepção dinâmica de pessoa.
É algo próprio do doador que será cedido. Assim a medula recebida encontra-
se vinculada, primeiro por saber que no objeto doado está contida sua própria vida,
e nada pode ser mais obrigatório do que receber vida, principalmente quando a
morte se faz tão presente. O receptor sabe da virtude que está sendo doada, por se
tratar de vida jamais poderá ser total, de maneira que o receptor sempre será um
devedor.
4 CAPÍTULO II - A ESTRUTURA E PROCESSO DE DOAÇÃO DE ÓRGÃOS, TECIDOS E CÉLULAS
O presente capítulo apresenta ao leitor de forma sucinta o contexto histórico
em que se deu a construção da trajetória da Política de Transplante de Órgãos e
Tecidos em outros locais, assim como no Brasil, desde a implantação deste
procedimento, passando por diversas modificações até o momento atual. Nossa
intenção, entretanto, não é a mera descrição dos fatos, mas a possibilidade de
despertar no leitor o entendimento de que a realidade não está simplesmente posta,
mas é construída pelos seres humanos nas suas mais diversas relações e que, por
isso mesmo, pode ser modificada.
4.1 Histórico dos Transplantes
O tema transplante de órgãos tem provocado grande impacto no cenário
médico-científico e em toda sociedade não somente a brasileira, pois envolve além
dos aspectos relativos ao avanço da medicina e da alta tecnologia, a questão da
subjetividade humana mobilizando sentimentos e emoções por estar diretamente
relacionada à representação de vida e de morte. A progressiva melhora na
qualidade de vida das pessoas que se submetem ao transplante fez crescer o
número de pacientes a espera desse procedimento. No entanto, vale salientar, que o
transplante só é realizado quando o paciente não tem possibilidade alguma de
melhora através de tratamento médico ou de outra ação terapêutica.
A idealização do transplante de órgãos iniciou-se com as lendas. Com o passar
do tempo, diversos estudos foram realizados referentes à temática, rendendo muitos
prêmios aos seus pesquisadores. A partir de 1960, iniciou-se de fato a prática
corrente de transplantar e, na atualidade, existem mais de um milhão de
transplantados no mundo (MANZONI, 2005). O primeiro transplante humano
realizado com sucesso ocorreu na França em 1906. Porém foi um transplante
cardíaco, realizado na África do Sul, em 1967, o marco na história dos transplantes.
O paciente transplantado era homem e tinha 57 anos, permaneceu com o órgão
recebido por 18 dias, evoluindo a óbito devido a uma infecção e pneumonia. Isso
simbolizou o momento de ligação entre o tipo de óbito e a transplantação. Uma das
histórias mais famosas de transplantes ocorreu ainda na Idade Média, no século III,
aparentemente o homem havia contraído uma gangrena em uma das pernas, mas
foi salvo pelo transplante do órgão recebido de um escravo que acabara de morrer
(KAUFMANN, 2003).
A evolução da cirurgia vem de épocas remotas, quando em Alexandria eram
realizados os primeiros transplantes para reconstrução de lesões, e o sucesso da
anestesia, foi um dos fatores mais importantes da história na cirurgia (ROSA, 2005).
Os primeiros relatos das práticas de transplantação remontam aos seculos VI e
V a.C., referem-se a cirurgiões indianos que realizariam enxertos de pele. Aponta-se
o principal problema.
Os passos científicos e jurídicos que normalizaram e propôs a morte encefálica
como critério de morte. Em 1968, uma comissão de especialistas americanos
estabeleceu critérios que definiram a morte encefálica, permitindo assim a retirada
de órgãos para fins de transplante. Passadas três décadas e meia em diferentes
culturas, religiões ou países, as crenças no poder científico ainda persistem
(KAUFMANN, 2003).
Assim, os critérios para o diagnóstico de ME estão definidos na Resolução
CFM n 1480/97 (de 8 de agosto de 1997), que conceitua morte como “a parada total
e irreversível das funções encefálicas”. Estabelece ainda os critérios clínicos a
serem seguidos e a necessidade de exame complementar para sua confirmação.
Dentre eles, podemos citar o eletroencefalograma e a pancarotidoangiografia, como
os dois mais utilizados, embora se possam usar o ultrassom transcraniano e outros
métodos radiográficos (CFM, 1997).
4.2 O Cénário do Transplante no Brasil
Durante quase 30 anos, de 1968 a 1997, a atividade de transplante era pouco
regulamentada (normalmente havia regulamentações loco-regionais), e
desenvolvida com bastante informalidade no que diz respeito à inscrição de
receptores, ordem de transplante, retirada de órgãos e nos critérios de distribuição
dos órgãos captados (BRASIL, 2002, p. 7).
Os transplantes fazem parte das políticas de saúde mais desenvolvidas ao
longo da última década. Em torno de 90% dos transplantes e procedimentos
relacionados são cobertos pelo SUS e a distribuição de órgãos encontra-se sobre o
controle público.
Ilustração 2- Número de transplantes realizados no Brasil em 2012
Fonte: RBT, 2012. Dispinivel em www.abto.org.br
Os gastos totais em reais com a política de transplantes, onde inclui o
Programa de Captação de Órgãos e Tecidos para transplante, elevaram-se de
pouco mais de 50 milhões de reais em 1995, para em torno de 300 milhões em
2004. Este crescimento foi acompanhado pelo número de transplantes realizados,
embora não com a mesma proporção (NORTEN, 2004).
Vários autores como Barreto (1993), Orlando (2002), Duarte (2006), Boas
(2007), relatam que a maior dificuldade enfrentada no Brasil para a realização de
um transplante é a carência de órgãos, mesmo nos casos em que o órgão é obtido
de um doador vivo.
A falta de informação e o preconceito acabam por limitar o número de
doadores. Ajudar a suprimir a necessidade de órgãos para transplante é uma
responsabilidade social. Neste sentido, existem grupos de sensibilização, cujo
objetivo é esclarecer a população sobre questões relacionadas com a doação de
órgãos e tecidos.
Segundo Garcia (2000), os doadores podem pertencer a uma das categorias
abaixo relacionadas:
Doadores vivos:
Doador relacionado (familiares do receptor do órgão);
Doador não relacionado (doador voluntário sem grau de parentesco com o
recptor).
Doadores falecidos:
São os indivíduos cujos familiares autorizam a captação de órgãos ou tecidos
para transplante, após ter sido diagnosticada a sua morte seja por parada
respiratória ou morte encefálica.
Animais:
Cujos tecidos são utilizados para: as válvulas cardíacas.
Avanços na imunologia e técnicas cirúrgicas têm transformado os transplantes
de órgãos em importante opção terapêutica para a falência orgânica. Como
consequência, tem havido um aumento dramático no número de pacientes à espera
de um órgão, chegando a 70%, na última década (SIMINOFF, 2001).
Agora é possível que órgãos vitais, como o rim ou o coração, num processo de
falência acelerado e irreversível e em risco eminente de deixarem de funcionar,
podendo provocar a morte da pessoa, sejam substituídos por órgãos em boas
condições, provenientes inicialmente de cadáveres, prolongando o tempo e a
qualidade de vida do receptor. Esta prática constitui indubitavelmente um dos
progressos mais notáveis da medicina no século XX, através dos quais milhares de
vidas são salvas por ano em todo o mundo. Por isso se afirma que a
“transplantação, para além de representar uma possibilidade de salvar vidas e de
proporcionar os melhores resultados em termos de qualidade de vida para os
doentes, reduz significativamente os custos com a saúde em longo prazo”. Em
termos gerais, a transplantação apresenta indicadores de qualidade facilmente
mensuráveis quando comparada com outras terapias como a diálise.
A progressiva melhora na qualidade de vida das pessoas que se submetem ao
transplante fez crescer o número de enfermos a espera desse procedimento. No
entanto, vale salientar, que “o transplante só é realizado quando o paciente não tem
possibilidade alguma de melhora por meio de tratamento médico ou de outra ação
terapêutica.6
Todavia, as doações post mortem e em vida, tema abordado anteriormente,
deixaram de representar um recurso suficiente para responder a todos os doentes
que se encontram em lista de espera. Este cenário tem provocado uma busca
incessante por novas alternativas que procurem satisfazer o elevado número de
candidatos a transplante. Estas alternativas consistem na descoberta ou criação de
novas fontes de órgãos, que não apenas as de proveniência humana, com o objetivo
de aumentar o número de transplantes realizados e dar resposta a todos àqueles
que carecem de um órgão para sobreviver.
Assim, entre as possibilidades exploradas, destaca-se a xenotransplantação
que consiste na utilização de órgãos de animais para transplante em humanos. Para
além do xenotransplante, a criação de órgãos artificiais que substituam os órgãos
doentes representa também uma das alternativas que tem sido procurada como
solução para a penúria de órgãos. Por fim, uma das grandes expectativas da
atualidade, e que deverá vir a assumir uma importância crescente nas terapêuticas
6 Fonte: Instituto Nacional de Câncer – Inca. Disponível em www.inca.gov.br. Acesso em 16/12/2011.
de transplantação, é a investigação em células tronculares (ou estaminais) e a
exploração das potencialidades da medicina regenerativa.
As novas possibilidades alternativas ao tradicional transplante realizado com
órgãos humanos são hoje um dos campos mais promissores e debatidos no domínio
das terapêuticas de transplantação. Assiste-se, pois, a uma nova fase dos
transplantes, com novos horizontes em investigação.
Com o objetivo de divulgar os resultados de transplantes, anualmente a
Associação Brasileira de transplantes apresenta um documento denominado
Registro Brasileiro de Transplantes. Trata-se de dados fornecidos pelas Centrais de
Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos (CNCDO) do Brasil sobre suas
atividades de captação e transplantes de órgãos e tecidos.
Entretanto, 15 a 30% dessas pessoas em lista de espera para um coração,
fígado ou pulmão acabam falecendo antes de obter o órgão. Estima-se que 1 a 4%
das pessoas que morrem em hospital e de 10 a 15% dos pacientes em unidades de
cuidados intensivos desenvolvem quadro de morte encefálica, sendo portanto,
potenciais doadores (SIMINOF et al, 1995).
Estima-se que, na população mundial exista em torno de 50 doadores por
milhão de pessoas por ano (GORE et al,1991). No Brasil apenas 20% dos potenciais
doadores acabam cedendo seus órgãos. Existe em torno de 3,7 doadores por
milhão de população por ano, mas com grandes disparidades regionais (CAMPOS,
2000).
No entanto, apesar de tantas mudanças, ainda não havia no país, na década
de 1950, uma legislação que regulamentasse a utilização de órgãos e tecidos para
fins terapêuticos, o que tínhamos eram regulamentações regionais destinadas à
inscrição de receptores, número de transplantes e retirada de órgãos e critérios de
destinação e distribuição dos órgãos captados.
4.3 Estrutura Funcional do Transplante no Brasil
Por se tratar de um processo difícil, esta parte do capítulo fala da questão
doação/transplante por estar embasada em leis que garantam o seu funcionamento.
O Decreto nº 2268 em junho de 1997 regulamentou a Lei nº 9.434 e criou o
Sistema Nacional de Transplantes, responsável pela infraestrutura da notificação de
casos de Morte Encefálica (ME), captação e distribuição de órgãos e tecido, que é
denominado de fila única.
Assim, as leis que regulamentam a política de doação de órgãos e tecidos no
Brasil, têm sofrido, nos últimos 30 anos, uma série de alterações que culminaram
não apenas em uma mudança conceitual mas, sobretudo, definiram as
responsabilidades do estado e dos envolvidos no processo doação/transplante.
Em 1968- Lei nº 5.479 – Atribuiu aos médicos o diagnóstico de morte e a
obtenção de consentimento requerido. Proibia a remoção de órgãos em casos
de crime, mas não havia proibição expressa ao comércio de órgãos ou controle
de doador vivo não aparentado.
Resolução 1.346/91 – O Conselho Federal de Medicina (CFM) regulamenta o
diagnóstico de morte encefálica para pessoas maiores de dois anos exigindo
testes clínicos para identificar a morte encefálica sejam realizados em um
intervalo de seis horas atestados por dois médicos não ligados à equipe de
transplante.
1992- Lei nº 8.489 e Decreto Presidencial nº 879 de 22/07/1993 regulamentam
e revogam a Lei nº 5.479 de 1968, mantendo a maioria dos itens da lei anterior
e incluindo os seguintes tópicos:
Considera como morte encefálica a morte definida pelo CFM e certificada por
médico;
Essa definição de morte encefálica não exclui os outros conceitos ou condições
de morte torna obrigatória a notificação encefálica;
Permitem à pessoa maior de idade e capacitada dispor gratuitamente de
tecidos, órgãos e partes do corpo humano. A doação é limitada a parentes ou
cônjuges, sendo exigida autorização judicial em outras situações.
O Ministério da Saúde normatiza sobre a organização das Centrais de
Notificação das Secretarias Estaduais de Saúde.
1997 - Lei nº 9.434 – Lei dos Transplantes, no sentido de se pensar uma
Política Nacional de Transplantes. Os principais pontos desta lei foram:
necessidade de consentimento presumido, a distribuição por lista única e as
penalidades para as infrações, sendo inclusive assumida pelo Ministério da
Saúde, via Sistema Único de Saúde (SUS), revelando as possibilidades de o
sistema colocar as práticas da área de saúde em defesa da vida preocupando-
se com a questão ética.
1997 - O decreto nº 2.268/97, regulamenta a Lei nº 9.434, cria também o
Sistema Nacional de Transplantes (SNT) e as Centrais de Notificação,
Captação e Distribuição de Órgãos (CNCDO) no âmbito dos Estados
estabelecendo a forma de distribuição de órgãos e tecidos através das listas de
espera regionalizadas. Esta lei atraiu a atenção de profissionais da saúde, dos
pacientes, da população e da mídia, promovendo grandes debates e
discussões. Anteriormente a publicação desta portaria, cada Estado brasileiro
administrava à sua maneira o processo de doação de órgãos.
1998 - Oficialização da Coordenação do Sistema Nacional de Transplantes
(SNT), e publicações de regulamento técnico e de portarias relativas a diversas
atividades. A lista de espera por tipo de órgão passou a ser organizada com a
criação do Cadastro Técnico Único ou Listas Únicas Estaduais ou
Regionalizadas nos Estados que possuem Centrais Regionais de Transplante.
Em 16 de agosto de 2000, em Brasília, foi realizado um seminário da
Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), onde se reuniram e
aprovaram as seguintes propostas que passaram a vigorar a partir de 1º de
março de 2001. São elas:
1. Modificação da Lei nº 9.434/97
Retirada da opção de doação de órgãos dos documentos de identidade.
Passaria a prevalecer sempre a vontade da família. Seria criado o Registro
Nacional de Doação de Órgãos e Tecidos.
2. Modificações do Decreto nº 2.268/97
Estabelecer competência ao Sistema Nacional de Transplante (SNT) para
gerenciar o Registro Nacional de Doação de Órgãos e Tecidos;
Possibilitar a realização de perícia médico-legal durante ou imediatamente
após a retirada de órgãos, facilitando a devolução do corpo à família.
3. Modificações na Portaria nº 3.407/98
Possibilitar a criação de Centros de Notificação, Captação e Doação de
Órgãos regionais, para favorecer a descentralização, segundo definição do
gestor estadual e do SNR;
Convocar em parceria com entidades médicas, médicos intensivistas,
neurologistas, neurocirurgiões a participar do esforço de notificação,
avaliação e manutenção de doadores potenciais para transplante;
Tornar obrigatória, através das equipes de transplante, a participação de
todos os hospitais transplantadores, nas atividades de captação,
subordinados às centrais estaduais de transplante;
Favorecer, em parceria com o Ministério da Educação e Cultura (MEC) e o
conjunto de escolas médicas, a inclusão no currículo de medicina, temas
ligados a transplantes, distribuídos ao longo do curso;
Adotar medidas para que a política do Ministério da Saúde em relação a
transplantes seja aplicada de modo uniforme pelos Estados.
A Lei nº 9.434/97, a lei dos transplantes, fez com que a população debatesse a
questão da doação de órgãos e tecidos, a carência de doadores, permitindo assim o
princípio de uma conscientização da sociedade quanto às necessidades e a
importância do transplante para os indivíduos que dele necessitam. Esta lei também
apresentou outro aspecto importante, como a criação do Sistema Nacional de
Transplantes, das Centrais Estaduais das Centrais de Notificações (CNCDO), que
regulamentou o ingresso ao tratamento, através das listas únicas de receptores
estaduais e regionais, em que todos possuem o mesmo direito, prevalecendo à
ordem de espera presente nas listas. Porém causou polêmica quanto à doação
presumida, que estabelece que toda pessoa é doadora de órgãos, a menos que
expresse vontade contrária no documento de identidade ou na Carteira Nacional de
Habilitação. Com relação à doação de órgãos da própria pessoa em vida, a Lei
dispõe: Diversos são os fatores que restringem a doação de órgãos, segundo
Pestana e Vaz tais fatores são:
“Falta de identificação de um potencial doador, cuidados clínicos adequados com o doador, exame subsidiário confirmatório de morte encefálica, a adequada abordagem aos familiares, a aceitação dos familiares, contato com as equipes de transplantes, retiradas dos órgãos e distribuição dos órgãos doados.” (PESTANA; VAZ, 1994, 235).
Por alterar a forma de consentimento, esta lei provocou grande repercussão na
imprensa nos primeiros meses que entrou em vigor, acarretando polêmica na
população e sendo criticada pela maioria dos representantes de instituições
médicas. Além de que, não foi esclarecido à sociedade o que seria morte encefálica,
ocasionando o medo de facilitarem uma morte para favorecer um receptor,
mantendo dessa forma a população à distância desta problemática.
A situação tornou-se ainda mais confusa com a publicação do Decreto nº
2.170, de 4 de março de 1997, por meio do qual, nas carteiras de habilitação
expedidas pelo Conselho Nacional de Trânsito, haverá a solicitação para que a
pessoa escolha utilizar a anotação de “doador de órgãos ou tecidos” ou de “não
doador”, tornando a escolha obrigatória. Muitas pessoas procuraram os postos de
identificação para definirem-se como “não doadores”. A população foi de fato
surpreendida com a vigência desta lei, embora tenha sido aprovado um ano antes
de vigorar, justamente para que o governo pudesse realizar uma ampla campanha
de esclarecimento e conscientização da população.
“ É permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos, órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuge ou consanguíneos até o quarto grau, inclusive, na forma do § 4º deste artigo, ou em qualquer pessoa, mediante autorização judicial, dispensada esta em relação à medula óssea.” (BRASIL, 2001).
O que se pretendia com a mudança da doação voluntária para o consentimento
presumido era aumentar o número de doadores de órgãos, uma vez que, devido ao
sucesso cada vez maior nos procedimentos realizados, na fila à espera de um órgão
aumentava consideravelmente. No entanto, o que vimos foi uma população
assustada, procurando os órgãos responsáveis pela emissão dos referidos
documentos, para expressar sua opção por “não doador de órgãos”. Isso se deu por
medo, de que seus órgãos fossem retirados sem seu consentimento em vida, e
ainda por não saber o que aconteceria consigo após sua morte.
Toda essa situação de medo e de desconhecimento acerca da doação ocorreu,
justamente, por não ser passado de forma clara e objetiva para a população, os
procedimentos e a importância dos transplantes. Como nos mostra Agenor Spallini
Ferraz,7 “está lei foi mais uma tentativa equivocada de resolver por meio de uma Lei,
o problema da escassez de doadores no país”. No que diz respeito ao fracasso do
consentimento presumido, Ferraz diz que,
“O maior e mais grave problema para imposição de uma lei de doação presumida no país é o baixo nível cultural de nosso povo. Isto torna as pessoas vítimas ao invés de beneficiárias da Lei. (...) Ela também levanta uma questão ética social, não cogitada pela ética médica: o que acontecerá comigo se ao me declarar não doador, necessitar de um transplante?” (FERRAZ, 2012.)
No Brasil, os transplantes de órgãos iniciaram-se na década de 1960, mas,
segundo o Ministério da Saúde, em razão da baixa sobrevida dos pacientes
transplantados, esse tipo de tratamento pouco se difundiu. No entanto, esta
atividade ganhou importância, após 15 anos, com o desenvolvimento e criação de
técnicas cirúrgicas, equipamentos de suporte, métodos de determinação de
histocompatibilidade entre doador e receptor e, finalmente, dos fármacos
imunossupressores. Por fim, esses procedimentos difundiram-se entre
estabelecimentos hospitalares, aumentando a necessidade de uma regulamentação
para doação e transplante de órgãos (ALCÂNTARA, 1998).
7 FERRAZ, Agenor Spallini. Doação de órgãos para transplante: considerações legais, éticas e sociais. Disponível em <http://www.medilene.com.br>. Acesso em 16 de dezembro de 2012.
A regulamentação do diagnóstico da morte encefálica (ME), no Brasil, ocorreu
somente em 1991 pelo Conselho Federal de Medicina. A ME é definida como a
situação irreversível das funções respiratória e circulatória ou cessação irreversível
de todas as funções do cérebro, incluindo o tronco cerebral.
O potencial doador de órgãos e tecidos pode ser definido, portanto, como um
paciente com diagnóstico de ME. Quando existe a identificação de um potencial
doador em unidade de terapia intensiva ou pronto-socorro, há obrigatoriedade de
notificação (compulsória) à Central de Notificação, Captação e Distribuição de
Órgãos e Tecidos (CNCDO), descentralizadas em OPOs (Organização de Procura
de Órgãos) (BRASIL, 2009).
Após esta notificação, uma série de ações deve ser realizada para a
manutenção efetiva do doador, viabilizando adequadamente seus órgãos para
transplante. Assim, o conhecimento das alterações fisiológicas que acometem vários
órgãos e sistemas no paciente em condição de ME, pelos profissionais que
trabalham com doação de órgãos e tecidos, é um dos fatores que parece estar
relacionado à melhoria de sobrevida do paciente (receptor) ou enxerto (órgão ou
tecido transplantado).
A desproporção crescente do número de pacientes em lista versus o número
de transplantes é um fato inquestionável, entre os fatores limitantes, estão a não
notificação de pacientes com diagnóstico de morte encefálica às CNCDO, há ainda a
falta de uma política de educação continuada aos profissionais de saúde, quanto ao
processo de doação transplante e de todos os desdobramentos decorrentes do não
conhecimento desse procedimento, além de recusa familiar.
Além disso, podemos identificar uma série de fatores de cunho
sociorganizacionais que contribuem para a limitação no número de doadores, tais
como: a ausência de identificação do potencial doador; a necessidade e realização
do exame complementar confirmatório da ME; inadequada manutenção do potencial
doador. Ainda, percebemos o desconhecimento por grande parte da população
sobre o conceito de ME e de todo o processo de doação e transplante que,
possivelmente, são fatores relevantes ao inexpressivo número de doações no Brasil.
A taxa de doadores falecidos em nosso País, em 2011, foi de 5,05 doadores
pmp/ano (893 doadores efetivos, para população de 176.871.437). (15 e 16) Ao
passo que em países como a Espanha passaram de 14,0 doadores pmp em 1998,
para 36,5, em 2000, o que transforma esse país em modelo de êxito de uma política
pública em transplante.
Na América Latina, a taxa de potencial doador, é de 40 a 100 pmp/ano, é
similar ao observado nos países desenvolvidos, porém, a taxa de notificação do
potencial doador é de 5 a 25 pmp/ano, e a taxa de doador efetivo é de 2 a 12
pmp/ano.
Nos Estados Unidos da América (USA), de acordo com a Organização
Nacional de Procura de Órgãos (OPTN) para transplante, o número total de
doadores de órgãos aumentou em 78% de 7.092, em 1992, para 12.607, em 2001.
Em 1965, foi realizado o primeiro transplante renal no Brasil no mesmo hospital
citado anteriormente, pela equipe chefiada pelo Dr. José Geraldo Campos Freire e
pelo Dr. Emil Sabaga. O paciente recebeu o rim do irmão e viveu normalmente por
oito anos. Para Garcia (2000), o desenvolvimento e aplicação de transplantes no
tratamento de doenças terminais de alguns órgãos constituem um dos maiores
êxitos na história da medicina, que em poucas décadas evoluiu de um procedimento
arriscado para terapêutica eficaz. Estima-se que, anualmente, cerca de 500 mil
pacientes desenvolvam insuficiência renal crônica, 300 mil insuficiências cardíacas e
200 mil insuficiências hepáticas, provocando assim, uma demanda mundial somente
para esses órgãos, de um milhão de transplantes por ano.
Enquanto que, o primeiro transplante cardíaco foi realizado pelo Dr. Eurípedes
de Jesus Zerbini, em 1967 no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo e
o primeiro transplante de fígado em 1985, realizado pelo Dr. Silvano Raia, na
mesma universidade (FREGONESI, 2001).
Nas últimas décadas, o transplante de órgãos tem atraído opiniões de setores
diversificados da sociedade, e ainda a mídia vem cumprindo importante papel na
ampla divulgação, encarregando-se de democratizar as discussões e informações,
algumas vezes acaloradas e contraditórias, outras esclarecendo ou suscitando
dúvidas e receio nas pessoas. É, portanto um tema de muita relevância social e
como tal tem sido tratada tanto pela sociedade, receptiva aos apelos da
solidariedade na doação de órgãos, como pela saúde pública, por trata-se de um
procedimento de alta complexidade e alto custo, exigindo medidas de planejamento
de políticas públicas e alocação de recursos, critérios éticos e democráticos. Todas
essas políticas têm como objetivo a manutenção e defesa da vida.
Atualmente vigora no Brasil a Lei de doação de órgãos e tecidos de número
9.434, de 04 de fevereiro de 1997, também conhecida como a lei dos transplantes,
dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de
transplante e tratamento e dá outras providências.
Com as regulamentações fortalecendo e criando condições para as atividades
de doação e transplante, iniciou-se crescimento importante dos centros
transplantadores em quase todas as regiões do País.
Existem, no Brasil, 148 centros cadastrados para transplante renal, 34 para
transplante cardíaco, 48 para transplante hepático, 5 para transplante de pâncreas,
18 para transplante conjugado pâncreas/rim e seis para transplante pulmonar.
Quando tratamos do enxerto de tecidos, observamos que existem 139 centros
cadastrados para córnea, 43 para medula óssea e seis para transplante ósseo. Isso
resulta em um total de 448 centros transplantadores cadastrados, com 403 ativos no
último ano, correspondente ao período de 1 de janeiro de 2011 a 31 de dezembro de
2011.
4.4 Falando sobre o Transplante de Células-tronco Hematopoiéticas (TCTH)
Este tópico do capítulo aborda uma visão geral da hematopoese, aspectos da
etiologia e fisiopatologia. Segundo Ortega (2004), o processo de formação das
células sanguíneas é chamado de hematopoese. Ou seja, um pequeno grupo de
células-tronco é responsável por produzir todos os constituintes celulares da medula
óssea, por meio do processo de diferenciação e maturação celular.
A célula-tronco é uma célula com capacidade de autorreplicação, isto é, com
capacidade de gerar uma cópia idêntica a si mesma e com potencial de diferenciar-
se em vários tecidos. Elas são classificadas em totipotentes, quando são capazes de
diferenciar-se em todos os 216 tecidos, que estruturam o corpo humano, incluindo a
placenta e os anexos embrionários; as pluripotentes ou multipotentes, quando são
capazes de diferenciar-se em quase todos os tecidos humanos, excluindo a placenta
e os anexos embrionários; oligopotentes, quando não são capazes de diferenciar em
muitos tecidos; e, a unipotente, quando se diferencia somente num único tipo de
tecido (OTTO, 2000).
Em relação à natureza, podem ser embrionárias ou adultas. As embrionárias
são encontradas nos embriões humanos e são classificadas em totipotentes ou
pluripotentes; as adultas são encontradas, principalmente na medula óssea, sangue
periférico, cordão umbilical, placenta e fígado (OTTO, 2000).
Então, as células-tronco hematopoiéticas são células adultas com capacidade
de diferenciação e podem ser encontradas tanto na medula óssea, quanto no
sangue periférico. A mesma também é conhecida como stem cell e pode ser
definida como uma célula com grande capacidade de autorrenovação e potencial
proliferativo, o que possibilita a sua diferenciação em células progenitoras de todas
as linhagens sanguíneas e a reconstituição da população hematopoiética, a partir de
uma única célula. Constituem de 0,05% a 0,1% da medula óssea humana e das
células hematopoiéticas circulantes. O enxerto usado no TCTH possui células
progenitoras hematopoiéticas imaturas e mais maduras, incluindo as células-tronco
com capacidade de renovação (DEVETTEN, 2007).
Assim a medula óssea pode ser definida como um tecido esponjoso existente
na cavidade dos ossos, rico em células progenitoras ou stem cell , que são células
mais diferenciadas (ver figura 1).
Sabe-se que as células do estroma da medula óssea são importantes para o
desenvolvimento das células iniciadoras de cultura de longa duração, que são vitais
para manter e controlar as atividades das células-tronco hematopoiéticas
(DEXTER,1979; DEVETTEN, 2007).
As projenitoras mieloide originou os eritrócitos, as plaquetas, os glóbulos
brancos (neutrófilos, eosinófilos, basófilos, mastócitos e os monócitos. O projenitor
origina os linfócitos T e B e as células natural Killer. Na figura baixo apresentamos o
processo de formação das células sanguíneas e sua diferenciação a partir das
células-tronco hematopoiéticas.Ver a localização da medula óssea e sua produção
celular.
Figura 1- Localização da medula óssea e sua produção celular
Fonte: Ameo (2008).
Fonte: Ameo (2008).
Figura 2- Medula óssea e sua diferenciação celular.
Fonte: Ameo (2008).
Na maioria dos serviços e mesmo na literatura é utilizado o termo transplante
de medula óssea (TMO), a taxonomia adequada é transplante de células – tronco
hematopoiéticas (GULATI, YAHALOM, PORTLOCK, 1991; MASSUMOTO, 2000).
Recentemente observa-se uma preocupação do Ministério da Saúde em
normatizar a política de transplante de medula óssea, através da Portaria nº 931, de
02 de maio de 2006, aprova o Regulamento Técnico para Transplante de Células-
tronco Hematopoiéticas. Estabelecendo a regulamentação e os critérios técnicos de
indicação dos TCTH e outros precursores hematopoiéticos. Também estabelece as
normas para autorização, funcionamento e renovações de estabelecimentos de
saúde/equipes para a realização de transplantes de células--tronco hematopoiéticas
e também, para credenciamento/habilitação no âmbito do Sistema Único de Saúde
(BRASIL, 2007b).
Segundo a Portaria nº 931 do Ministério da saúde ficou denominado:
Transplante de Células-tronco Hematopoiéticas – TCTH, que se subdivide em:
• TCTH de Medula Óssea - Substituição de células-tronco hematopoiéticas a
partir de células-tronco hematopoiéticas normais obtidas de medula óssea, com
o objetivo de normalizar a Hematopoiese;
• TCTH de Sangue Periférico - Substituição de células-tronco hematopoiéticas
a partir de células-tronco hematopoéticas normais obtidas após mobilização
para o sangue periférico, com o objetivo de normalizar a hematopoiese;
• TCTH de Sangue de Cordão Umbilical - Substituição de células-tronco
hematopoiéticas a partir de células-tronco hematopoiéticas normais obtidas de
sangue de cordão umbilical, com o objetivo de normalizar a hematopoiese;
• TCTH Autólogo - Quando as células-tronco hematopoiéticas provêm da
medula óssea ou do sangue periférico do próprio indivíduo a ser transplantado
(receptor);
• TCTH Alogênico - Quando as células-tronco hematopoiéticas provêm da
medula óssea, do sangue periférico ou do sangue de cordão umbilical de um
outro indivíduo (doador);
• TCTH alogênico aparentado - Quando o receptor e o doador são
consanguíneos;
• TCTH alogênico não aparentado - Quando o receptor e o doador não são
consanguíneos;
• TCTH com mieloablação - Transplante convencional alogênico para o qual se
utilizam altas doses de agentes citotóxicos no condicionamento pré-transplante,
com o objetivo de destruição completa da medula óssea do receptor, antes da
infusão de células tronco Hematopoiéticas obtidas do doador;
• TCTH sem mieloablação - Quando se minimiza a intensidade ablativa do
tratamento com agentes citotóxicos do receptor pré-infusão das células-tronco
do doador (BRASIL, 2007b).
No dia 12 de setembro de 2007 fez 50 anos do relato publicado no periódico
New England Medicine de uma nova abordagem para o tratamento do câncer, que
era a utilização da infusão de medula óssea por via endovenosa em pacientes
submetidos à quimioterapia e radioterapia pelo médico E. Donall Thomas
(APPELBAUM, 2007).
Outras tentativas de transplante alogênico, realizadas em algumas vítimas de
um acidente com reator nuclear, pelo grupo de pesquisadores coordenados por
George Mathé, os pacientes também foram a óbito pelas complicações decorrentes
do transplante.
Este grupo foi pioneiro no desenvolvimento do transplante de medula clínico,
descrevendo a técnica de infusão venosa de medula óssea idêntica. Em 1958, seis
físicos foram expostos acidentalmente a doses de irradiação entre 600 e 1000 rads.
Eles foram tratados com infusão de células de medula óssea alogênica.
McFarland, em 1961 foi o primeiro a identificar que o condicionamento pré-
transplante de medula óssea era importante para a recuperação da nova medula e
nos casos de leucemia, para a erradicação da doença. Thomas começou a realizar
experiências com cães. Ele descobriu que a maioria dos cães, que foram
submetidos a irradiação corporal total e infusão de medula tinham os mesmos
problemas que os seres humanos, incluindo a rejeição do enxerto, com a doença do
enxerto versus hospedeiro, e a morte por infecção oportunista. No entanto, um cão
teve uma boa sobrevida e Thomas concluiu que foi devido a escolha do doador certo
(APPELBAUM, 2007; MASSUMOTO, 2007).
No final dos anos 1960, o transplante de medula começou a ser realizado
somente quando havia irmãos HLA compatíveis (antígeno leucocitário humano),
melhorando a qualidade e a perspetival de vida dos pacientes. Concomitante com o
aperfeiçoamento na coleta de plaquetas e, no aprimoramento dos equipamentos
para aférese. Desenvolve-se a qualidade dos testes de histocompatibilidade, bem
como o estudo na área do controle das infecções, possibilitando uma maior
sobrevida ao paciente.
Após esta experiência em 1969 começaram os ensaios clínicos de transplante
de medula alogênico entre irmãos. Os primeiros pacientes tinham leucemia em
estágio avançado. Havia a necessidade do acesso endovenoso seguro e Robert
Hickman desenvolve um cateter venoso, que até hoje é utilizado tanto para a coleta
das células progenitoras no sangue periférico, como para a infusão da medula.
Também foi aperfeiçoada a coleta de plaquetas, com as máquinas de aférese
(MERCÊS, 2009).
Em 1972, houve o primeiro caso bem-sucedido do transplante alogênico na
anemia aplástica. Em 1979, inicia-se os relatos de taxa de cura acima de 50% com
transplante nas leucemias mielóides aguda, que estavam em remissão
(APPELBAUM, 2007).
O grupo de Seattle realizou o primeiro transplante bem-sucedido em um
paciente com leucemia, de um doador não aparentado, o que contribuiu para
estimular a formação do Nacional Marrow Donor Program e o cadastro de mais de
11 milhões de doadores voluntários.
A partir de 1984 o transplante de células-tronco hematopoiéticas começou a
apresentar bons resultados, com diminuição da mortalidade. Principalmente na
década de 1990 começou-se a ser realizado o transplante autogênico em pacientes
onco-hematológicos, permitindo a utilização de doses supraletais de quimioterapia e
radioterapia, potencialmente curativa com o resgate medular pela reinfusão da
medula previamente coletada do próprio paciente.
Estes avanços, juntamente com a utilização do cordão umbilical e placentário
como uma fonte das células-tronco hematopoiéticas, vêm possibilitando novas
investigações clínicas. O transplante com o desenvolvimento de protocolos de
condicionamento mais seguros para erradicar o câncer, tem aumentado a chance de
pega e repovoamento medular, bem como a profilaxia da doença do enxerto contra
o hospedeiro, e as medidas para prevenir as infecções oportunistas (APPELBAUM,
2007; THOMAS, 2000).
O início do transplante de medula óssea, em nosso país ocorreu no final da
década de 1970 com o grupo liderado por Ricardo Pasquini no Hospital das Clínicas
da Universidade Federal do Paraná. Este grupo foi o pioneiro e em 1979 realizou o
primeiro transplante no Brasil. Outras unidades de TMO foram sendo criadas como a
do Instituto Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro, em 1983, da Faculdade de
Medicina da Universidade de São Paulo, em 1988 (DULLEY, 1996). Em 1992, foi
inaugurado no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo, em Ribeirão Preto (VOLTARELLI, 2000).
Essa terapêutica evolui muito nas últimas décadas, deixando de ser um
tratamento experimental para torna-se uma cura de fato para o paciente. Nos
últimos anos o TCTH é utilizado no tratamento de doenças hematológicas, malignas,
imunodeficiências, erros inatos ao metabolismo e tumores sólidos (PASQUINI,
2001).
A fase de condicionamento é responsável por destruir totalmente as células
sanguíneas localizadas na medula óssea. Tem como objetivo prepará-la para
receber as células sadias de um doador previamente selecionados ou do próprio
paciente.
A fase que se segue chama-se infusão das células, é o momento mais especial
tanto a equipe de saúde como para o paciente e sua família, pois é a chance que
tem para obter a cura da doença com o restabelecumento da hematopoese.
Em sequência tem-se o período de aplasia medular. É o período em que o
organismo manifesta os primeiros sinais de enxertia das células infundidas. Neste
período, o paciente está exposto às consequências causadas por severos prejuízos
imunológicos, distúrbios de sangramentos, anemias, infecções e outras
complicações potencialmente fatais, que são: a Doença do Enxerto contra o
hospedeiro (DECH) e a Síndrome de Obstrução Sinucoidal (SOS). Quanto menos
complicações o paciente apresentar durante a fase de aplasia medular, menos será
o tempo de internação (CAETANO, 2009).
O Decreto determinava ainda a criação do Sistema Nacional de Transplante –
SNT, órgão responsável pela captação e distribuição de órgãos, tecidos e partes do
corpo humano retiradas para fins de tratamento cabendo ao Ministério da Saúde a
função de Órgão Central. Foram criadas ainda as Centrais de Notificação, Captação
e Distribuição de Órgãos (CNCDO), que serão as unidades executoras das
atividades do SNT, tanto a nível municipal quanto eestadual. De acordo com a
Portaria nº 1315/2000, Art 2º:
Todas as informações colhidas são repassadas para o SNT, para organização
da Lista Nacional. As CNCDO são responsáveis também, pelo transporte de órgãos,
tecidos e partes para o estabelecimento em que se encontra o receptor. E ainda,
fiscalizar, suspender e punir estabelecimentos e equipes especializadas que venham
a infringir a lei. Em cada estado do País, todos os indicados ao transplante de
tecidos e órgãos são inscritos em um programa informatizado do SNT, contido nos
computadores de cada central estadual, formando a lista nacional de receptores.
Vale lembrar que não é permitida a inscrição em dois centros.
No ano de 1999 foi criado o Fundo de Ações Estratégias e de Compensação e
todo o financiamento de transplantes foi incluído nele, dessa forma todos os
procedimentos de transplantes passaram a ser financiado pelo MS, desonerando,
assim, os tetos financeiros dos municípios e Estados e aumentando o número de
transplantes realizados.
Em 24 de março de 2001, entra em vigor a Lei nº 10.211, que revoga o artigo
4º da Lei 9.434/97, tornando novamente, valida a vontade do cônjuge ou parente de
até segundo grau, do doador morto, firmada em documento mediante a presença de
duas testemunhas. Está Lei ainda permite a doação intervivos entre quaisquer
pessoas e não apenas entre parentes. A seleção dos possíveis receptores é feita
através do programa, considerando os seguintes critérios:
Grupo sanguíneo (O, A, B, AB);
Idade, peso e altura do doador;
O tempo de espera para o transplante;
Compatibilidade HLA (tecido imunologicamente compatível), no caso de
transplante de rim, quando disponível. No caso de empate, o critério de
desempate é pelo tempo de espera, idade, painel de reatividade e
urgência.8
Se o primeiro da fila não receber o órgão, ele não perde sua colocação, que
continua reservado. Contudo, a equipe de transplante terá que explicar os motivos
ao Ministério Público. A Central Nacional de Transplantes (CNT), ainda no ano de
2001, assinou um termo de cooperação com 15 empresas aéreas do País, visando o
transporte gratuito de órgãos e de equipes médicas, quando necessário, para
retirada destes. E ainda foi incluída na tabela de procedimentos do SUS a retirada
de parte do fígado de doadores vivos e de transplante de fígado intervivos.
Embora, tenhamos um considerável número de doadores de órgãos e tecidos
cadastrados na CNT, ainda existem dificuldades para atender a toda demanda a
espera de transplante. Sendo necessário recorrer aos bancos internacionais de
doadores, especialmente, de medula óssea.Podemos observar que houve um
grande avanço, não só nos procedimentos tecnológicos, mas nas políticas e
legislações que envolvem essa questão. Porém muito ainda deve ser avaliado,
especialmente, no que diz respeito aos critérios de escolha do paciente para
transplante.
8 COMO FUNCIONA A “FILA DE ESPERA”. Disponível em
http://www.roche.com.br/therapeuticAreas/trasnplantes/fila_unica/default_PT.htm?htmlpage1pager=3. Acesso em 28/12/2011.
O transplante de órgãos assinala um avanço médico-cirúrgico, em diversas
áreas, mas impõe a necessidade de garantir, a seus transplantados, o direito de
proteção à integridade física e de igualdade. A Constituição Federal, em seu artigo
196 assegura que: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e
de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação (CF, 1988).”
Desde seu período inicial até os dias atuais, está atividade se desenvolveu
bastante em termos de técnicas, resultados, variedade de órgãos transplantados,
número de procedimentos realizados e legislação. No entanto, muito ainda deve ser
feito para que possamos conscientizar a população acerca de seus benefícios e
assegurar um tratamento igualitário para todos.
4.5 Transplante de Medula Óssea: considerações gerais
A medula óssea é um tecido líquido que ocupa o interior dos ossos longos,
tendo a função de produzir três tipos de células sanguíneas: as hemácias são
células que carregam a hemoglobina, responsável pelo transporte do oxigênio dos
pulmões para os tecidos e de dióxido de carbono dos tecidos para os pulmões; os
leucócitos são os principais componentes do sistema imunológico, tem como
objetivo defender o organismo contra infecções e as plaquetas, são células que
contribuem na prevenção de hemorragias, compondo o sistema de coagulação do
sangue, a diminuição do seu número pode provocar sangramentos.
Segundo Pasquini e Ferreira (1996), o TMO é um procedimento terapêutico
consiste na infusão, por via intravenosa de sangue de medula óssea obtida de
doador previamente selecionado, em receptor adequadamente condicionado. Sua
finalidade é substituir tecido e órgãos irremediavelmente lesados devido a doenças
ou traumatismos, possibilitando a substituição de estruturas do corpo definitivamente
lesadas. O desenvolvimento deste procedimento é considerado um dos pontos de
maior êxito da história da medicina, pois aumentam as expectativas de vida dos
pacientes portadores de tecidos e órgãos considerados funcionalmente insuficientes
e não respondem aos tratamentos clínicos aplicados aos doentes, que levam a um
dispêndio de tempo nos serviços, e ainda não impedem que intercorrências os
levem aos freqüentes internamentos hospitalares. Os transplantes são realizados
em unidades de saúde da maioria das capitais brasileiras.
Em 1888, Paull Ehrlich descreveu a morte de uma mulher jovem após doença
aguda caracterizada por anemia grave, sangramento de pele e retina, e febre alta. A
primeira tentativa de realização do transplante de medula óssea ocorreu em 1939,
nos Estados Unidos, com o intuito tratar um paciente com anemia aplástica induzida
por sais de ouro, utilizando como doador de medula óssea, um indivíduo ABO
compatível. Segundo Corcoran et al 1989; Deeg H. et al 1992; Schryber 1987 a
medula óssea já era utilizada como nutrição oral para tratamento de várias formas
de anemia e leucemia. Somente a partir de 1930, iniciaram as experiências de
medula por infusões intramedular e intravenosa. Pesquisas referentes ao TMO
abordaram a toxidade da radioterapia corporal total em várias dosagens aplicadas
em ratos, cachorros e macacos (SANTOS, 1983; BENJAMIM, 1995).
Em meados de 1930, ocorreu a primeira tentativa de transplante alogênico de
medula óssea, em um paciente portador de aplasia (OSGOOD et al, 1939). Na
ausência de conhecimento sobre antígenos humanos relacionados ao transplante e
células progenitoras hematopoéticas, essas tentativas foram condenadas ao
fracasso. Entretanto, com a persistência de investigadores clínicos, e com o advento
de novos conhecimentos sobre o sistema imune e hematopoético, o primeiro TMO
alogênico foi realizado com sucesso no final da década de 1960 (THOMAS; STORB,
1970).
O início do desenvolvimento das bases científicas atuais do TMO ocorreu por
meio de experiências com roedores, que após serem submetidos à radiação em
doses letais, sobreviviam ao receber infusão posterior intravenosa de medula óssea
(LORENZ, 1951). Experimentos bem-sucedidos com cães aconteceram durante as
décadas de 1950 e 1960, quando os animais recebiam doses mieloblativas de
irradiação corporal total, seguidas da infusão da medula de doadores aparentados
(TOMAS 1962; EPESTEIN, 1967). Os estudos com cães foi o principal modelo para
o desenvolvimento de TMO em humanos. A identificação do sistema de
histocompatibilidade humano contribuiu de forma decisiva para o sucesso dos
transplantes (DAUSSET, 1958).
O TMO evoluiu bastante nos últimos 50 anos desde os trabalhos pioneiros de
Jacobson et al (1949) com camundongos. As primeiras tentativas para replicar as
observações laboratoriais e os estudos experimentais tiveram pouco sucesso.
Posteriormente, houve a identificação da complexidade e polimorfismo do sistema
HLA (Human Leucocyte Antigen). Estes estudos permitiram selecionar, como
doadores, irmãos compatíveis e, mais recentemente, doadores não aparentados.
Este tipo de transplante tem indicação nas doenças em que existe uma falência
do sistema hematopoético, seja por infiltração de células leucêmicas na Medula
Óssea, seja por doenças que alterem a produção dos constituintes sanguíneos.
Também apresenta indicação nas doenças que comprometem severamente o
sistema imunológico e nos tumores sólidos em que as doses de quimioterápicos
necessárias para o tratamento, possam comprometer o sistema hematopoético de
maneira irreversível.
É atualmente o tratamento de escolha para várias doenças hematológicas
incluindo as anemias e leucemias,9 mielomas, assim como as doenças genéticas,
imunodeficiências e auto-imunes. Atualmente o transplante de medula óssea é uma
das modalidades terapêuticas mais utilizadas na oncologia, seja em adultos ou
crianças, nas doenças hematológicas, congênitas e hereditárias. O número de
centros especializados em TMO e a frequência de tal procedimento apresentaram
um exponencial nas duas últimas décadas. Apesar de ser um tratamento complexo
e está associado à alta morbi-mortalidade, consegue curar e prolongar
significativamente a sobrevida dos doentes (ANDERS et al, 2004).
Sua indicação se baseia em alguns princípios, tais como: recuperação da
função medular em doenças caracterizadas pela redução acentuada ou inexistência
de precursores hematopoéticos, como no caso da anemia aplástica; a recuperação
da hematopoese após utilização de doses supraletais de agentes quimioterápicos,
associados ou não a radioterapia, o tratamento das neoplasias como as leucemias,
e a implantação de células capazes de sintetizar enzimas deficientes em
determinadas doenças genéticas.
Castro Jr; Gregianim; Brunetto (2001) ressaltam que a doença por si só, não é
determinante para a realização do transplante, uma vez que consideram a existência
de algumas condições básicas tais como: condições clínicas adequadas ao
paciente, existência de células progenitoras hematopoéticas disponíveis,
reconhecimento de que o TMO é o tratamento mais indicado para a doença de base,
9 A leucemia é uma doença maligna dos glóbulos brancos (leucócitos) de origem, na maioria das vezes, não conhecida. Tem como principal característica o acúmulo de células jovens (blásticas) anormais na medula óssea que substituem as células sanguíneas normais. Fonte: www.inca.com.br. <Acesso em: 11 nov. 2012>.
além das condições familiares, psicológicas e socioeconômicas favoráveis à
realização não só durante, assim como, o acompanhamento, após o TMO.
O TCTH caracteriza-se por seis fases: condicionamento, infusão das células,
aplasia medular, enxertia, alta hospitalar e acompanhamento ambulatorial. A partir
de então, os avanços no campo do TMO têm possibilitado o aperfeiçoamento de
técnicas de diagnóstico e de terapêutica, como teste de histocompatibilidade,
prevenção e tratamento de doença do enxerto versus hospedeiro, regimes de
condicionamento e cuidados de suporte, especialmente de transfusões de
hemoderivados e antibióticos, aumentado as taxas de sobrevida dos pacientes
submetidos ao TMO (WINGARD,1991).
4.5.1 Fonte de Células
As células-tronco (CT) costumam ser identificadas pela sua capacidade de
diferenciação para células com maior grau de especialização, e por sua capacidade
de divisão assimétrica – o que ocorre como resposta à ação de estímulos
específicos e do microambiente (nicho). Ao se dividir, uma célula-tronco origina uma
célula-filha diferenciada e uma célula indiferenciada idêntica, mantendo-se assim a
população de células-tronco (autorrenovação).
Além de poderem ser obtidas do embrião (blastocisto e tecido gonadal de
aborto fetal – 15% quando são consideradas células pluripotentes, as CT também
podem ser encontradas no cordão umbilical e nos tecidos dos diversos órgãos –
quando são consideradas multipotentes –células-tronco adultas (PRESTON, 2003;
GLUCKMAN, 200).
Deste quando são consideradas células pluripotentes, as CT também podem
ser encontradas no cordão umbilical e nos tecidos dos diversos órgãos – quando
são consideradas multipotentes (células-tronco adultas).
As células progenitoras hematopoéticas podem ser coletadas diretamente na
crista ilíaca, do sangue periférico através de máquinas de aférese ou mais
recentemente de sangue de cordão umbilical. O termo transplante de medula óssea
apesar de genérico, mesmo que as células progenitoras hematopoéticas tenham
sido obtidas de outra maneira (CASTRO JR., 2002).
Na coleta por aspiração de medula óssea, o doador é internado e o
procedimento realizado sob anestesia geral. Depois de posicionado em decúbito
ventral são realizadas diversas punções nas cristas ilíacas posteriores da qual é
aspirada, com agulhas apropriadas, a quantidade de medula óssea necessária para
o transplante, usualmente estimada em 10 ml KL de peso do receptor (TOMAS,
1970), que geralmente contém um número adequado de células progenitoras
suficientes para permitir a pega do enxerto. A medula óssea é injetada em uma
bolsa apropriada ou Becker contendo anticoagulante e posteriormente filtrado para a
remoção de gorduras e espículos ósseos. A maioria dos doadores dos transplantes
alogênicos ainda é realizada utizando-se esta forma de coleta (HOROWITZ, 2000a).
Figura 3 - Coleta da Medula Óssea por aspiração
Fonte: Arquivo da Fundação Hemope
As células progenitoras periféricas são coletadas com o auxílio de
equipamentos de aférese, após a mobilização das mesmas para o sangue periférico,
com a utilização de fatores de colônias de granulocitos e no caso de pacientes
submetidos a transplantes autólogos, sendo esse tipo de procedimento realizado em
mais de 90% dos transplantes autólogos e 20% nos transplantes alogênicos
(HOROWITZ, 2000). É necessário ter um acesso venoso com bom calibre para
coletas adequadas, sendo que a maioria dos pacientes necessita de um cateter de
duplo lúmem (CASTRO JR., 2002).
Figura 4 - Coleta da Medula Óssea por Aférese
Fonte: Arquivo da Fundação Hemope.
Atualmente a experiência com aféreses em pacientes com peso abaixo de 10
kg é restrita devido às limitações relacionadas à hemodiluição do procedimento. O
uso de sangue de cordão umbilical (SCU) como fonte de células para a
reconstituição da medula ocorreu em 1988 na França com um paciente portador de
Anemia de Fanconi, utilizando o SCU de seu irmão para reconstituir a função
medular após quimioterapia mieloblativa (GLUCKMAN, 1989). O sangue de cordão
umbilical é coletado logo após o nascimento da criança, sendo posteriormente
processado e mantido congelado até a infusão (RUBISTEIN, 1998).
Figura 5 - Cordão Umbilical
Fonte: Google.com.br. Acesso em 20/12/2011.
4.5.2 Histocompatibilidade
O TMO ocorre a partir de um doador identificado através da tipagem HLA
(antígeno humano leucocitário), do qual são coletadas células progenitoras capazes
de reconstituírem a medula óssea que, após o período de condicionamento, é
infundida no receptor. O regime de condicionamento é caracterizado por altas doses
de quimioterapia, associada ou não à irradiação corporal total ou linfonodal total.
Para Ortega e Neves (1996), o regime de condicionamento objetiva: a) erradicar a
medula doente do receptor, quando o TMO faz parte do tratamento, como nas
leucemias ou em outras neoplasias; b) erradicar o sistema imune do receptor para
que as células do doador sejam aceitas e proporcionar “espaço” para a nova medula
(PONTES, 2004).
Figura 6- Esquema do Sistema HLA.
Fonte:
As técnicas para definir antígenos de histocompatibilidade em humanos foram
cruciais para o desenvolvimento do transplante. Estes antígenos provocam reações
imunes quando tecidos são transplantados de um indivíduo para um receptor
geneticamente não idêntico o que resulta num processo denominado rejeição. Os
principais alvos moleculares nos casos de rejeição de transplantes são as formas
alélicas não próprias das moléculas do Complexo Principal de Histocompatibilidade
(CPH). O CPH é uma região cromossômica que compreende um conjunto de genes,
altamente polimórficos, os quais codificam aloantígenos de superfície celular. O
sistema HLA constitui um subconjunto de genes do CPH humano, estes genes são
denominados HLA de classe I e classe II (SACHS apud VISENTAINER, 2003).
O sistema HLA tem um papel de destaque na área dos transplantes. Suas
moléculas agem como fortes antígenos de transplantação e o seu polimorfismo
constituem uma séria barreira para transplantes de órgãos entre indivíduos não
consanguíneos. Maior sobrevida de aloenxertos é observada entre indivíduos HLA
idênticos, para os loci HLA-A, B, DRB1 e DQB1. Com os recentes avanços nos
métodos de tipagem por DNA (genotipagens) é possível definir incompatibilidades
antes não detectadas por métodos sorológicos ou por cultura mista de linfócitos
primária. Diferenças alélicas têm sido correlacionadas com GVHD, principalmente,
em casos de doadores não aparentados. Mais de 130 diferentes antígenos HLA-A,
B, Cw, DR, DQ e DP foram definidos sorologicamente. Até o presente momento,
com a introdução de métodos de tipagem de DNA, com alta resolução, foram
incluídos 5320 haplótipos HLA-A e B e 1.647 HLA-DRB1 e DQB1, analisando-se 4
grupos étnicos: Asiáticos, Negros, Caucasóides Europeus e Caucasóides Norte-
Americanos (GJERTSON; LEE, 1998).
Segundo Ficher o TMO baseia-se na utilização da célula tronco-hematopoética.
Diversos estudos demonstraram a presença dessa célula na medula óssea,
constituindo cerca de 1 a 3% da população medular e apresentando como principal
identidade o antígeno de superfície CD34. Tais células são capazes das múltiplas
linhagens celulares após quimioterapia mieloblativa. O número de células-tronco
transplantadas constitui importante fator prognóstico do TMO, pois se sabe que as
taxas de sobrevida são diretamente proporcionais ao número de células CD34
infundidas no receptor (FICHER, 2004).
No entanto, apesar de todo avanço e conquistas havia complicação
considerável de natureza infecciosa, imunológica (rejeição e doenças do enxerto-
contra-hospedeiros e toxicidade, decorrentes do condicionamento da medula
colhida).
Segundo Durlley:
“Sabe-se que a maioria das complicações ocorre durante os quatro primeiros meses após o transplante, em razão de potenciais alterações em múltiplos órgãos, seja pela toxidade do condicionamento, por infecções, por distúrbios imunológicos inerentes ao procedimento, por alterações no sistema hematopoético e pelo uso intensivo de múltiplos medicamentos”(DURLLEY,1996, p.140).
O desenvolvimento de novas técnicas de congelamento e armazenamento de
medula óssea possibilitou que o TMO e de células-tronco hematopoéticas se
tornassem procedimentos mais seguros e com menos riscos de rejeição e
complicações, possibilitando um avanço nesses procedimentos.
4.6 Transplante de Medula Óssea no Brasil
O número de TMO no Brasil tem aumentado significativamente nas últimas
décadas, sendo atualmente realizados em unidades de saúde da maioria das
capitais brasileiras. Atualmente no Brasil há 46 centros transplantadores dividido da
seguinte forma: 46 centros autorizados para transplante, destes, 11 centros para
doadores não aparentados. No Nordeste três centros e 1 Pernambuco. No entanto,
em diversas situações clínicas não se consegue o doador aparentado para
realização do TMO, sendo necessário recorrer aos bancos de medula óssea para a
realização do transplante (BRASIL, 2010).
O início do TMO, em nosso País, ocorreu na década de 1970, porém poucos
estudos foram publicados a respeito da experiência, peculiaridades e complicações.
No Brasil o primeiro TMO foi realizado em 15 de outubro de 1979, no Hospital das
Clínicas em Curitiba – Universidade Federal do Paraná, em seguida no Instituto
Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro em 1983; a seguir a Faculdade de Medicina
de São Paulo (DURLLEY, 1992), e o Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo em 1992. Desde então,
várias unidades de transplantes foram criadas e diversas equipes médicas, vêm
utilizando este tratamento com sucesso. Vale registrar que até o ano de 2000, com
oito anos de funcionamento, esta última instituição realizou cerca de 170
transplantes (VOLTARELLI, 2000).
Segundo os dados da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos, em
2010 foram realizados, no Brasil, nos centros cadastrados por esse órgão 1197
transplantes efetuados no período (ABTO, 2011). Estes dados possibilitam uma
visão do panorama do TMO no Brasil e são fontes importantes para a análise de
sobrevida dos pacientes. Os diversos centros de TMO trazem a oportunidade de
intercâmbio e contribuem para a realização do tratamento de forma segura e
aplicável, por um número por um número cada vez mais de pacientes, seja na
população infantil ou adulta (ANDERS, 2004).
Até 1987, quando não existiam bancos de medula óssea, milhares de
pacientes que não tinham um doador compatível na família acabavam morrendo.
Pensando na dificuldade de encontrar doadores compatíveis, no Brasil foi criado o
Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea – Redome – cujo
objetivo é cadastrar número significativo de doadores tipados para HLA em um
Banco de Dados, para atender a demanda de pacientes.
Por determinação do Ministério da Saúde, coube ao CEMO sediar o Redome
(Registro Nacional de doadores voluntários não aparentados de medula óssea) e o
banco de células Umbilical e centralizar as consultas aos bancos internacionais de
doadores de medula óssea.
No dia 20 de outubro de 1998, por meio da Portaria nº 3761, foi oficializado o
Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea, delegando o Instituto
Nacional do Câncer o seu funcionamento. O Ministro da Saúde, José Serra, no uso
de suas atribuições, estabelece ser o Sistema Nacional de Transplante, a
Assessoria Técnica para Transplante de Medula Óssea, que iria gerenciar o
Redome, coordenar a distribuição de medula, através das CNCDO, e ainda
desenvolver e operar o sistema de avaliação de transplantes de medula óssea.
Neste período, foram realizadas campanhas de sensibilização da população quanto
à importância de doação de medula óssea, e também para credenciamento de
laboratórios de imunogenética no País.
No que diz respeito à Legislação, o transplante de medula óssea está inserido
na Legislação que lida como os transplantes em geral. Porém, em 13 de outubro de
1999 foi publicada a Portaria nº 1217, que regulamenta as varias indicações para o
transplante de medula óssea, normatiza as condições para a assistência e
estabelece as condições iniciais para a viabilização do programa de transplante
utilizando doadores não aparentados.
Segundo a Portaria nº 1315/2000, os cidadãos que desejarem,
voluntariamente, cadastrarem-se como doadores de medula óssea e outros
precursores hematopoéticos deverão buscar, por telefone, e-mail ou pessoalmente,
na CNCDO de seu estado, informações a respeito de como proceder para realizar
seu cadastro de doador junto ao Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea (
REDOME). “É determinado que as Secretarias de Saúde dos Estados e do Distrito
Federal tenham Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos instalada
e em funcionamento” (Portaria nº 1315/2000, Art. 2º).
Nas últimas décadas o transplante de medula óssea tem avanço tanto em
técnicas quanto em finalidades terapêuticas e legislativas, bem como em número de
credenciamentos de Unidades. De acordo com dados da Associação Brasileira de
Transplante de órgãos, em 2005 foram realizados 1197 transplantes, em centros
cadastrados (BRASIL, 2005).
4.6.1 Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea
A Legislação especifica que para o cadastramento no Redome deve-se seguir as
seguintes etapas:
Pacientes:
1. A Ficha de inscrição: deve ser preenchida pela equipe médica que acompanha o
paciente e encaminha ao REREME, conjuntamente com tipagem HLA;
2. A Tipagem HLA: para pacientes que tenham indicação de TMO deverá ser
realizada por orientação da equipe médica que encaminhará ao Redome.
Doadores:
1. O doador voluntário entra em contato com o Hemocentro, para realizar sua
inscrição.
2. Os candidatos voluntários serão convocados para receber informações sobre o
TMO, assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e coleta de sangue
para realizar a tipagem HLA para o cadastro do doador.
Para o Ministério da Saúde, é responsabilidade dos Hemocentros a
descentralização da captação de doadores, através do Programa Redome. Cabendo
aos Hemocentros a responsabilidade de:
Orientar os candidatos no que se refere ao procedimento de doação de medula
óssea;
Receber os candidatos à doação encaminhados pela CNCDO;
Obter do candidato à formalização de sua disposição, no Termo de
Consentimento;
Coletar, processar e armazenar o material necessário à realização dos exames
de histocompatabilidade requeridos para cadastramento no Redome;
Enviar relatório de histocompatabilidade cadastrado o material a ser submetido
aos exames de HLA;
Localizar e chamar o candidato à doação no caso de o mesmo, após sua
inscrição no REDOME, vir a ser selecionado como possível doador para um
determinado receptor, ocasião em que coletará novamente nova amostra de
material para a realização da segunda etapa da identificação do doador e
realizará, no próprio Hemocentro, os exames de sorologia do doador, informando
os resultados obtidos à CNCDO;
Manter arquivo contendo as informações relativas aos candidatos à doação
recebidos e encaminhados(Portaria nº. 1315/2000).
Para ampliar e consolidar o cadastramento de candidatos voluntários de
medula óssea foi decretado a Portaria nº 1315, em 30 de novembro de 2000. O
Ministério da Saúde por meio desta estabeleceu os seguintes mecanismos para
organização do cadastro de doadores no Redome:
Organização dos fluxos de captação de doadores voluntários;
Organização do sistema de orientação aos candidatos;
Organização do encaminhamento desses candidatos ao Hemocentro mais
próximo, previamente designado pela Secretaria de Saúde;
Organização e informação ao(s) Hemocentro(s) de grade de distribuição dos
exames de histocompatibilidade aos laboratórios devidamente cadastrados no
SUS, classificados como de Tipo II, em conformidade com as Portarias GM/MS
nº 1312 e 1313, ambas de 30 de novembro de 2000, de acordo com sua
capacidade instalada contratada;
Recepção e envio ao Registro Nacional Doadores Voluntários Não
Aparentados de Medula Óssea REDOME no Instituto Nacional de Câncer
(INCA), do Ministério da Saúde, no Rio de Janeiro, dos resultados dos exames
realizados pelos laboratórios e as demais informações necessárias à
implantação do cadastro, de acordo com o documento Termo de
Consentimento/Autorização de Exames/Resultados de Exames, conforme
modelo estabelecido no Anexo II desta Portaria;
Manutenção de arquivo contendo as informações repassadas ao REDOME.
Esta Portaria estabelece ainda:
“Que os procedimentos relativos à realização de exames de histocompatibilidade e de coleta, processamento inicial, armazenagem, acondicionamento e transporte de material colhido de candidatos à doação de medula óssea pelo Hemocentro, estabelecidos na PT GM/MS nº 1.317, de 30 de novembro de 2000, serão custeados com recursos do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação FAEC, devendo ser processados por meio de APAC” (BRASIL, 2000).
Para pacientes que são encaminhados ao Rereme, e não tiverem um doador
compatível no meio familiar ou no país, será feita uma busca internacional. Mas,
para que essa busca ocorra é necessário um numero de 60 pacientes cadastrados.
O Instituto Nacional do Câncer e o Hospital das Clinicas da Universidade Federal do
Paraná são os Órgãos responsáveis por efetuar essa busca.
No caso de localização de um doador compatível, o Redome providencia o
transporte da medula doada, após autorização do Sistema Nacional de Transplante
do Ministério da Saúde e dos cumprimentos necessários, e ainda, indica o Centro
mais próximo para realização dos exames e consequente transplante. Todos esses
procedimentos são financiados pelo SUS.
A falta de um Registro Geral em todos os Estados do País dificulta a realização
do TMO com doadores não aparentados e o atendimento a atual demanda. No País,
existem atualmente 47 Centros transplantadores de medula óssea, dos quais três
ficam na Região Nordeste: Bahia (um Centro) e em Pernambuco (dois centros,
sendo do Hemope a responsabilidade de captar doadores voluntários).
Portanto, uma das soluções para amenizar a atual situação da demanda de
doadores voluntários de medula óssea, será conscientizar a população acerca da
forma de doação e dos benefícios e consequências do transplante. E ainda, ampliar
o número de Centros para captar doadores voluntários.
Nas sociedades em que o transplante de órgãos vem acontecendo, existem
leis já definidas ou em fase de regulamentação definitiva. A legislação de
transplantes no Brasil iniciou-se com a Lei nº 5.479 do Congresso Nacional,
promulgada em 10 de agosto de 1968 em decorrência dos primeiros transplantes
realizados no Brasil na década de 1960. No entanto, durante este período não havia
proibição expressa ao comércio de órgãos ou alguma forma de controle do emprego
de doador vivo não aparentado. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 199,
inciso 4º, proíbe expressamente o comércio de órgãos e tecidos do corpo humano:
“A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização” (OLIVEIRA, 1996, p. 105).
Apesar da Lei nº 8.489 ter vigorado até 31 de dezembro de 1997, ainda se
mantinha muito presente o problema da insuficiência de órgãos para fins de
transplantes, pois a legislação vigente não estimulava o aumento de doações, como
também não pressionava para que fossem criadas novas estruturas de captação e
transplantes de órgãos.
“O número insuficiente de doadores para atender à crescente demanda de pacientes em espera passou a ser o maior obstáculo para a realização de transplantes. A falta de órgãos reflete não apenas a falta de potenciais doadores, mas também, e principalmente, a falha em convertê-los em doadores efetivos” (GARCIA, 2000,p. 22).
No que se refere à doação de medula óssea, a Portaria nº 1217 de outubro de
1999, estabelece normas para autorização e cadastramento de equipes e
estabelecimentos de saúde para a realização do Transplante de Medula Óssea
(TMO), assim como para regulamentar a busca nacional e internacional de doador
não aparentado de medula óssea.
De acordo com a nova portaria nº 2480/GM, de 17 de dezembro de 2004, a
mesma estabelece a busca nacional e internacional de doador não aparentado de
células-tronco hematopoéticas é responsabilidade do Sistema Nacional de
Transplante. De acordo com esta portaria, esgotada a possibilidade de busca de
doador aparentado, a busca nacional de doador não aparentado somente poderá ser
realizada pelo Instituto Nacional de Câncer – INCA – e Hospital das Clínicas da
Universidade Federal do Paraná, mediante autorização prévia da Assessoria
Técnica para transplante de medula óssea. É importante ressaltar que não existe
uma maneira ideal de consentimento para a doação, ou que o fato de um programa
de transplante ter êxito, que seja atribuído à sua legislação. As leis são boas
enquanto estão em consonância com o que a sociedade aceita e não quando
procuram modificar a sociedade através da coerção (BRASIL, 2004).
O TMO com doadores não aparentados, menos de 35% dos candidatos ao
transplante têm doador aparentado compatível para contornar essas dificuldades,
surgiram os bancos de doadores de medula óssea que são arquivos informatizados,
onde as tipagens HLA dos potenciais doadores voluntários podem ser pesquisadas
para eventuais transplantes. Caso um doador compatível seja encontrado, fazem-se
testes confirmatórios e posteriormente coletam-se as células progenitoras
hematopoéticas. Embora os bancos não estoquem a medula propriamente dita, seus
custos são elevados, devido à necessidade de tipagem de um grande número de
doadores.
Nos Estados Unidos, o Banco Nacional de Doadores de Medula Óssea, já tem
em torno de três milhões de doadores cadastrados e cerca de 70% dos pacientes
que recorrem ao mesmo, encontram um doador compatível (HORWITZ, 2000b).
No Brasil, a pesquisa é realizada pelo Redome, que busca doadores
compatíveis no país e no exterior. Atualmente segundo o Redome (2011) há em
torno de três mil pacientes na fila esperando por um transplante de medula óssea e
em torno de 2 milhões de potenciais doadores cadastrados.
No que diz respeito à Legislação, o transplante de medula óssea está inserido
na Legislação que lida como os transplantes em geral. Porém, em 13 de outubro de
1999 foi publicada a Portaria 1217, que regulamenta as várias indicações para o
transplante de medula óssea, normatiza as condições para a assistência e
estabelece as condições iniciais para a viabilização do programa de transplante
utilizando doadores voluntários.
Em 1983, foi criado o Centro de Transplante de Medula Óssea (CEMO),
vinculado ao Inca, é responsável por estudos e realização de transplantes de
medula, sendo o segundo maior centro do Brasil, nessa especialidade. Por
determinação do Ministério da Saúde, cabe ao Cemo sediar o Redome (Registro
Nacional de doadores voluntários não aparentados de medula óssea) e o banco de
células Umbilical e centralizar as consultas aos bancos internacionais de doadores
de medula óssea.
O Ministro da Saúde, José Serra, em 1998, no uso de suas atribuições, através
da Portaria, 3761, resolve, estabelecer no Sistema Nacional de Transplante, a
Assessoria Técnica para Transplante de Medula Óssea, que gerencia o Redome,
coordena a distribuição de medula, através das CNCDO, e ainda desenvolve e
opera o sistema de avaliação de transplantes de medula óssea.
Até 1987, quando não havia bancos de medula, com isso milhares de pessoas
que não tinham doadores compatíveis na família, acabavam morrendo. Diante dessa
dificuldade foi criado o Redome, que dispõe de informações (nome, endereço,
resultados de exames HLA (histocompatibilidade), características genéticas) de
pessoas que se colocam, voluntariamente, a disposição para doar medula para fins
de transplantes.
Até o ano de 2000, existiam 16 Unidades de TMO credenciadas pelo SUS. Nas
regiões Norte e Nordeste do País não havia nenhuma Unidade credenciada. Em
2002, a Unidade de Transplante do Hemope10 foi credenciada e no dia 23 de
setembro do mesmo ano, implantou-se ao Projeto de Doadores Voluntários de
Medula Óssea para realizar a captação de doadores voluntários em Pernambuco.
4.6.2 Projeto Redome em Pernambuco.
A partir da publicação da Portaria nº 1315 do ano de 2000, o Hemope,10 como
serviço público no estado de Pernambuco ficou responsável para realizar o trabalho
de captação de potenciais doadores voluntários de medula óssea. Também em
2002, o Centro de Transplante de Medula Óssea do Hemope11 foi credenciado e no
dia 23 de setembro do mesmo ano, implantou-se o Projeto de Doadores Voluntários
de Medula Óssea em Pernambuco. Atualmente o referido centro foi extinto por
determinação do governo Estado, que o considerou ineficiente.
A Fundação desenvolve um trabalho de captação de doadores voluntários de
sangue para manter os estoques no Estado deste produto essencial à vida. Esta
estratégia de captação que consiste na sensibilização do doador em relação à
importância da doação de sangue por meio de informações, contribuiu para o
estabelecimento de uma metodologia com objetivo de ampliar o número de
candidatos voluntários a doação de medula óssea. O Redome iniciou o trabalho de
10 Fundação de Hematologia e Hemoterapia de Pernambuco. 11 Centro de Transplante de Medula Óssea da Fundação Hemope.
captação sob a responsabilidade do serviço social lotado na Assessoria de Pesquisa
e Ensino da instituição Hemope, sendo esta formada por uma equipe multidisciplinar
com profissionais da área de medicina, laboratorial e de serviço social.
Para iniciar à convocação, primeiramente foi realizado um levantamento dos
potenciais doadores cadastrados na Central de Transplantes (CNCDO) órgão
vinculado à Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco, quando se verificou
uma lista com 641 pessoas que estavam inscritas há pelo menos dois anos. Essa
convocação foi realizada por telefone com a seguinte abordagem: solicitar para
comparecerem a instituição com o objetivo de assistirem a uma palestra explicativa
sobre a doação de medula óssea. As ligações eram realizadas durante a semana,
como primeiro momento de sensibilização dos candidatos à doação (Ver figura 5).
O início do cadastro de potenciais doadores voluntários de medula óssea na
Fundação Hemope foi responsabilidade do Serviço Social lotado na Coordenação de
Ensino e Pesquisa. O cadastro foi realizado em três etapas:
Figura 7- Convocação dos potenciais doadores para a palestra
Fonte: Arquivo da pesquisadora.
A palestra era iniciada com a apresentação da equipe participante do projeto
aos candidatos em seguida, é era realizada uma dinâmica de grupo para refletir
quanto a doação de medula óssea, ao término da dinâmica, era aplicado o
questionário semi-estruturado, que avaliou dados pessoais, profissionais,
motivacionais e de conhecimento sobre a doação de medula óssea. Na palestra
aborda-se os seguintes tópicos: critérios para ser doador, benefícios para o receptor,
termo de consentimento livre e esclarecido e coleta de sangue para exames
laboratoriais.
A mesma tinha por objetivo esclarecer os procedimentos para a realização da
doação e informar a importância do transplante de medula óssea para quem
necessita. Para os que concordaram em participar do banco de doadores é
solicitado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, para realizar o teste
HLA. Após esse momento do módulo instrucional houve a entrega de material
educativo sobre doação de medula (ver figura 8).
Figura 8- Palestra sobre doação de medula óssea
Fonte: arquivo da pesquisadora.
Para os que concordaram em participar do cadastro foi realizada a coleta de 10
ml de sangue para o exame HLA. Posteriormente seu Registro incluso no Banco
Nacional de Doadores de Medula Óssea. O doador é informado que caso de
compatibilidade e convocado novamente para efetuar os exames complementares e
posteriormente fazer a doação da medula óssea.
Figura 9- Coleta de sangue periférico para exame HLA.
Fonte: Arquivo da pesquisadora.
A Fundação Hemope tornou-se um centro de referência na área de
histocompatibilidade e estar integrada ao esforço de criar competências na área de
doadores não aparentados de transplante de medula óssea. Aliando-se ao projeto
na tentativa de torná-lo um programa efetivo, permitindo, além da disponibilidade de
seus serviços, a captação de doadores de sangue, resultando no atendimento à
busca dos doadores de medula óssea, consequentemente diminuindo os custos do
Estado com tipagens, sendo imprescindível à realização de estudos que visem atrair
novos candidatos à doação e aumentar a quantidade de doadores cadastrados no
Redome. No entanto, o grande desafio enfrentado no momento é a captação de
doadores voluntários. O mito e a falta de informações acerca da forma de captação
da medula e sua utilização é um dos principais motivos para o crescente numero de
receptores.
4.7 Organização de Um Serviço de Transplante de Medula Óssea
Na literatura pesquisada enfatiza-se a estrutura e recursos humanos
necessários à realização do transplante. Isto se refere à infraestrutura adequada
como sendo a base material onde se realiza o procedimento e a recursos, como os
meios necessários a essa realização. Desta forma são descritos como infraestrutura
necessária: uma unidade de internação especializada, dentro da instituição; um
setor ambulatorial e setores complementares. Como recursos de pessoal
qualificado; planejamento; programas e critérios de atuação (RIUL, 1996).
O setor ambulatorial funciona no atendimento do paciente antes de sua
admissão na unidade de TMO e após sua alta hospitalar, é necessário ter
consultórios médicos, posto para intervenção de enfermagem, área de recepção,
sala para reuniões com os pacientes e familiares.
A unidade de internação deve ter a capacidade para atender no mínimo, a dois
pacientes. Cada enfermaria deve possuir dois espaços, área do paciente e
antessala, assim como, banheiro privativo. A área do paciente deve ser no mínimo
de 9m2 e deve ter leito ajustável. Deve ter ainda saída de oxigênio, ar e vácuo
centralizado.
Os serviços complementares são relevantes como: banco de sangue com
capacidade para dar suporte aos pacientes por período mínimo de três semanas,
disponibilidade de elementos sanguíneos selecionados tais como hemácias, plasma,
plaquetas e irradiados para inativação de células imunologicamente competentes, e,
ainda capacidade para lidar com incompatibilidade ABO.
Outros serviços são: farmácia, laboratórios de imunologia, hematologia,
microbiologia, patologia, tipagem de histocompatibilidade, manipulação e crio
preservação no caso do serviço realizar transplante autólogo. Deve ter radiologia e
radioterapia com capacidade para realização de ICT, dietoterapia com capacidade
de descontaminação de alimentos, bloco cirúrgico, central de materiais, fisioterapia,
odontologia, serviço social, terapia ocupacional, psicologia, além de outros
profissionais inerentes a qualquer serviço de saúde.
O recurso humano necessário para desenvolver o trabalho com o paciente é
composto por uma equipe multiprofissional formada por médicos (hematologista,
oncologista e imunologista), enfermeiro, nutricionista, assistente social,
fisioterapeuta, psicólogo, terapeuta ocupacional e ainda radiologista e
epidemiologista.
Para melhor compreender a complexidade do procedimento terapêutico é
necessário conhecer cada fase do TMO. As quais estão apontadas a seguir: A
primeira fase é chamada pré-TMO compreende antes da admissão hospitalar, onde
o paciente e seus familiares passam por um acompanhamento ambulatorial para
definição de diagnóstico, a indicação de tratamento como o transplante, assim como
o levantamento de possíveis doadores de medula óssea, ressalta-se ainda, há um
acompanhamento multiprofissional durante todo o período.
Durante o acompanhamento ambulatorial o paciente com diagnóstico definido e
indicações para o TMO, juntamente com a família e os potenciais doadores, passam
por uma série de avaliações realizada por uma equipe multidisciplinar, composta por
assistente social, médico, enfermeiro, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional,
nutricionista, psicólogo. Neste período o paciente e família participam de reuniões
onde recebem orientações sobre os procedimentos, sobre a situação atual e história
natural da doença, riscos e resultados, complicações e preparo psicossocial,
informações essas que lhe ajudarão a fazer a opção pelo tratamento ou não.
Os doadores são selecionados de acordo com a identidade genética do
receptor em relação aos antígenos do sistema HLA. Também são submetidos a
avaliações clínicas e epidemiológicas e laboratoriais para identificar possíveis
fatores prejudiciais à sua saúde ou identificação de doenças transmissíveis pela
doação. Quando necessários outros fatores são considerados como a
compatibilidade sanguínea do Sistema ABO, peso e sexo.
O segundo momento compreende a internação hospitalar, onde o paciente fará
condicionamento como parte do TMO, onde é implantado um cateter venoso central,
o qual será vital durante o tratamento devido a grande quantidade de infusão de
drogas endovenosas, hemoderivados, coletas constantes de amostras de sangue e
avaliação da pressão venosa central. O ambiente de internação hospitalar deve
conter medidas de proteção para se evitar infecções hospitalares nos pacientes.
Inicia-se uma contagem regressiva antecedente ao TMO, sendo considerado o dia
de infusão das células tronco como o dia zero e início da contagem progressiva pós-
infusão de medula óssea.
O tempo médio para a “pega da medula” é de duas a quatro semanas após o
transplante, identificada pela elevação na contagem de leucócitos por uma
monocitose relativa e pelo aparecimento de neutrófilos maduros (FOERSTER,
1998). Porém, esse período pode variar significativamente entre um paciente e
outro, provocando, muitas vezes, sentimentos de ansiedade e medo naqueles que,
por algum motivo, apresentem uma demora maior, o que pode representar um
aumento dos riscos de complicações do transplante. Após a confirmação da pega da
medula, em torno do dia +30, se o paciente não apresentar nenhuma complicação,
poderá sair do regime de internação hospitalar. Contudo, ele ainda precisa de um
controle diário até o dia +100 pós-transplante, aproximadamente, período em que é
atendido no ambulatório do TMO (PONTES, 2004).
No caso do doador alogênico, em particular nesse estudo é o que interessa, o
doador interna-se um dia antes do TMO e no dia seguinte é encaminhado ao centro
cirúrgico para a retirada da medula após múltiplas aspirações na crista ilíaca
posterior bilateral, com cerca de 3 a 5 ml a cada aspiração através do uso de
seringas lubrificadas com heparina condicionadas em um recipiente apropriado para
evitar-se a formação de coágulos, o material é filtrado para eliminar restos ósseos,
coágulos e grumos de gordura; em seguida, o sangue é transferido para uma bolsa
coletora, pesado e encaminhado para a unidade de TMO para infusão no receptor e
infundida imediatamente, utilizando-se de cateter central de duplo lúmem
(NICOLAU, 2004).
Ressaltamos que a alta hospitalar do doador ocorre em um período de 24
horas após o procedimento de coleta. Vale salientar que esse procedimento se dá
sob anestesia geral e que a retirada depende da proporção quilo por peso do
receptor, sendo ideal a ser infundida no receptor superior a 3.0 x 108 kg. De acordo
com a figura 10.
Figura 10- Coleta de Medula Óssea por Aspiração em Centro Transplantador.
Fonte: Arquivo da Fundação Hemope.
5 CAPÍTULO III - APRESENTANDO E ANALIZANDO OS RESULTADOS DA PESQUISA
….“É por intermédio da linguagem que o conhecimento subjetivo se torna também conhecimento objetivo, preparando assim o caminho para o terceiro mundo, o mundo das ideias e das teorias”……. Karl Poper
Para um melhor encaminhamento da análise e discussão dos dados coletados
na investigação, no presente capítulo procurou-se apresentar os resultados,
alcançados, distribuindo-os através de subitens, de forma a tornar a leitura mais
compreensível possível, está dividido em três momentos:
A leitura interpretativa, das entrevistas permitiu fazermos leituras mais gerais
antes de nos determos em temas mais específicos do presente estudo. O grupo
convidado a participar do estudo se caracterizou por aceitar com presteza ser
entrevistado, assumindo grande empenho na conversa.
Esta uniformidade parece indicar uma tendência geral, relacionada coma
vontade de falar sobre a doação. Por outro lado, esta interpretação é confirmada
pelo fato da maioria dos doadores, mesmos os mais introspectivos, mostram que
existe uma necessidade de tornar notória a experiência da doação.
Realizei o estudo com 74 sujeitos, dividida em dois grupos sociais distintos:
um grupo, composto de 48 pessoas doadoras de medula óssea em Lisboa e 26 em
Recife. A tabela 1 apresenta os sujeitos distribuídos nas duas Instituições, que
serviram de campo para o estudo.
Esta parte do capítulo visa categorizar os doadores de medula óssea em
Recife e Lisboa, identificando-os no contexto social. Ela apresenta e analisa
categorias como: sexo, grupo etário, condição conjugal, grau de instrução, estado
civil, profissão, renda e motivação para a doação. Esta categorização foi relevante
no sentido de estabelecer relações entre estes aspectos e a doação.
Da amostra pesquisada, 38 doadores pertenciam ao sexo feminino (51,4%), e
36 eram do sexo masculino (48,6%).Isso se justifica provavelmente, pelo fato de, no
momento de realização (convém notificar que não é objeto desse estudo, nem,
particularizar as informações prestadas pelos informantes de acordo com o sexo).
O estudo, portanto, levanta uma questão de gênero quando coloca ser mulher
ou ser homem como uma construção social, onde a palavra gênero do ponto de
vista da gramática, é utilizada para identificar essa construção, diferenciando-a da
perspectiva biológica. Alguns fatores importantes têm contribuído para modificações
no sistema gênero: a crise econômica que força a inserção cada vez maior das
mulheres no mercado de trabalho, o aumento crescente de famílias chefiadas por
mulheres, e a organização desse segmento lutando por direito de igualdade.
5.1 Caracterização do perfil dos doadores em Recife e Lisboa
Tabela 1-Distribuição dos doadores segundo o sexo
Recife Lisboa Doadores Masculino
11
42%
25
52%
36
48,6%
Feminino
15
58%
23
48%
38
51,4%
Total 26 100% 48 100% 74 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
A tabela 1 apresenta o quantitativo de doadores referente as cidades de Recife
e Lisboa no período de 2002 a 2011, quanto ao gênero masculino 36 (48,6%) e o
feminino 38 (51,4%), e revela maior adesão do gênero feminino. O resultado indica
que a amostra apresenta um percentual considerável de doadoras, o que pode a
princípio levar a crer que a histocompatibilidade (HLA) dos candidatos a doação
tenderia a reconhecê-los como sendo biologicamente os doadores mais compatíveis,
do ponto de vista imunológico, não é assim que ocorre. Sexo não interfere na
histocompatibilidade.
A psicologia clássica defende que as mulheres têm diferença quanto a
formação de personalidade, em relação aos homens. Desde a infância na construção
primária do ego, a individuação já aparece nas meninas, diferentemente dos meninos,
com uma forte tendência, para que elas sintam as necessidades e os sentimentos dos
outros. Esse achado revela (51,4%) das doadoras exprimem a necessidade que
tiveram de impedir o sofrimento do outro. Eis os depoimentos de algumas dessas
mulheres:
“ Fiquei feliz por eu ter sorte quanto a doação de poder ajudar alguém pela
dificuldade da compatibilidade”
“Com certeza, ela contribui (a doação) porque vai tirar alguém do sofrimento,
que vem se alastrando há muito tempo”
A dádiva, nestes relatos, expressam uma lógica intensificada tradicionalmente
de solidariedade, porém, sua essência também vem sendo ressignificada, Contudo,
a dádiva na contemporaneidade não está somente ligada à troca de presentes, ou
visitas, mas podemos encontrar essa lógica enraizada em algumas práticas do
cotidiano, e nesta lógica de “dar, receber e retribuir” os dois grupos, que são
divididos em relação à divisão sexual, são equivalentes na igualdade, não de
tarefas, mas de respeito e contribuição entre a ação desenvolvida. Para Marcel
Mauss (1974), a lógica da dádiva estabelece um tipo de aliança entre determinados
grupos, aliança essa que fortalece neste caso da doação de medula a reciprocidade
e a solidariedade, podem ser socialmente construídas de modo diferente, como
privilégios, obrigações etc. Ainda, segundo Marcel Mauss, a dádiva é espontânea e
ao mesmo tempo, obrigatória, porém tem como objetivo em sua essência de
fortalecer o laço social, não somente dos indivíduos, mas principalmente da
coletividade.
Tabela 2 -Distribuição dos doadores segundo a idade no periodo de 2002 a 2010
A maior incidência no Recife está na faixa etária de 29 a 39 anos totalizando
(43,7%), na faixa etária de 40 a 49 anos (37,5%). A faixa etária nos grupos de 18 a
28 anos perfazendo (14,6%) e (4,2%) encontram-se no grupo etário de 50 a 59
anos, idade limite para doação.
IDADE
Recife
% Lisboa %
18-28 7 14,6% 29-39 21 43,7% 40-49 18 37,5%
50-59 2 4,2%
Total 26 100% 48 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Quanto ao perfil da população pesquisada, observa-se que é jovem e está no
ápice de sua vida produtiva. O limite de idade estabelecido pelo o Ministério da
Saúde, em Portugal para o cadastro é 49 anos, enquanto no Brasil vai até 55 anos,
até o momento da realização do estudo.
Tabela 3 - Distribuição dos doadores segundo a escolaridade no periodo de 2002 a 2010
Grau de Instrução QTD. %
Fundamental completo 8 16,6%
Fundamental incompleto - -
Secundário 17 35,4%
Superior Completo 23 48%
Superior incompleto - -
Não Respondeu - -
Total 48 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
No que se refere à variável escolaridade, verificou-se que entre a população
estudada, (48%) tem grau de instrução de ensino superior. Isso mostra uma relação
entre a doação de medula, e grau de instrução. Pelo senso comum, pressupõe-se
que essas pessoas têm mais acesso a informação. Logo, estariam estão mais
sensibilizadas para as questões referentes à importância da doação de órgãos e
tecidos, assim como doação de sangue, como de outras pertinentes à problemática
social à enquanto (35,4%) dos doadores possuem nível médio, e são estes que
contribuem também de forma mais efetiva, (16,6%) têm o ensino fundamental. A
importância não só da doação de sangue, doação de órgãos e tecidos como de
outras pertinentes à problemática social. Nesse contexto, a participação na doação
de medula envolve grupos que se diferenciam pelas razões que os levam a doar.
Tabela 4- Distribuição dos doadores segundo Estado Civil
RECIFE LISBOA
Estado Civil F M F M
Casado(a) ou união estável 17 (74%) 18 (72%)
Solteiro(a) 5 (21,7%) 4 (16%)
Viúvo(a) - -
Divorciado 1(4,3%) 3 (12%)
Total 23 (100%) 25 (100%) Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Em relação ao estado civil, do total de doadores, 35 são casados, 9 solteiros
e 4 divorciados. A concentração de solteiros do gênero masculino está na faixa
etária dos 18 aos 28 anos.
Tabela 5 - Distribuição dos doadores de Lisboa segundo situação profissional
Situação Profissional QTD. % Empregado 43 89,6%
Exerce funções - - Baixa - -
Desempregado 5 10,4% Aposentado p/ Idade - -
Aposentado p/ Doença - - Doméstica - -
Não Respondeu - - Total 48 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
No que se refere à profissão, observou-se que dos 48 doadores, 43 (89,6%)
encontram-se empregados e apenas 10,4% desempregados.
Tabela 6 - Distribuição dos doadores de Lisboa segundo faixa salarial
Faixa Salarial QTD. %
Até 1000€ 10 21,00%
De 1000 a 2000€ 9 19,00%
De 2001 a 3000€ 3 6,00%
De 3001 a 4000€ 1 2,00%
Acima de 4000€ 2 4,10%
Não Respondeu 23 47,90%
Total 48 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
A tabela 6 demonstra um percentual de (21%) de doadores ocupando a faixa
salarial em Lisboa que aqui no Brasil corresponde em torno 1 a 3 salários mínimos;
na faixa entre 4 e 6 salários mínimos tiveram 3% desse universo; entre 7 e 9 não
tivemos doadores, e acima de 10 salários atingimos um percentual de (4%). Ainda
verificamos outros (47,9)% não responderam. Aqui no Brasil também temos
dificuldade que pessoas que têm a renda um pouco mais elevada, responder a esse
tipo de questionamento.
Tabela 7 - Distribuição dos doadores segundo religião
Religião QTD. % Católica 36 75,0%
Protestante 3 6,3% Judaica - - Islâmica - - Budista - - Outra 1 2,0%
Sem Religião 8 16,7% Total 48 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Em relação à religiosidade, ou melhor, ter ou professar uma crença religiosa
36 (75%) denominaram-se católicos, 3 (6,3%) protestantes, 1(2%) kardecista, o qual
inseriu-se na categoria outra, enquanto 8 (16,7%) das pessoas se autodenominou
sem religião.
Os dados empíricos ilustram o quadro atual da filiação religiosa não só
brasileira como em outros países como o caso de Portugal, inserido nesse contexto
de transformações gerais, o fenômeno religioso brasileiro experimenta significativas
alterações.A religião tradicional, o catolicismo, passou a declinar consideravelmente.
Nos anos 70, segundo dados do IBGE, (92%) da população declarava-se católica.
Mas, de acordo com Pierucci (2004) a tabela mostra um percentual considerado dos
que se audenominaram sem religião.
Os resultados do Censo Demográfico 2010 mostram o crescimento da
diversidade dos grupos religiosos no Brasil. A proporção de católicos seguiu a
tendência de redução observada nas duas décadas anteriores, embora tenha
permanecido majoritária. Em paralelo, consolidou-se o crescimento da população
evangélica, que passou de (15,4%) em 2000 para (22,2%) em 2010. Dos que se
declararam evangélicos, (60,0%) eram de origem pentecostal, (18,5%) evangélicos
de missão e (21,8%), evangélicos não determinados. A pesquisa indica também o
aumento do total de espíritas, dos que se declararam sem religião, ainda que em
ritmo inferior ao da década anterior, e do conjunto pertencente às outras
religiosidades.Os dados de cor, sexo, faixa etária e grau de instruçãorevelam que os
católicos romanos e o grupo dos sem religião são os que apresentaram
percentagens mais elevadas de pessoas do sexo masculino. Os espíritas
apresentaram os mais elevadosindicadores de educação e de rendimentos.
A religião é um fenômeno que tem como um de seus componentes a auto-
afirmação individual e conseqüentemente a afirmação social. Portanto, esta é um
referencial não só para a questão subjetiva quanto para a interferência do social no
indivíduo.Aquela muitas vezes não é explicitada enquanto a realidade externa é
explicitada nos discursos dos doadores. Por isso, a religião como espaço é capaz de
instigar as pessoas a uma reorganização da sua experiência no mundo.
Para Rabelo (1998), é possível fazer uma análise entre cultura e as estratégias
nas quais o ritual religioso é capaz tanto de orientar, como reorientar a atitude de
seus participantes sempre procurando compreender o efeito produzido e se de fato
há mudanças nas pessoas.
Tabela 8 – Distribuição dos doadores segundo motivação
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Entretanto, no que se refere às formas que mais apareceram enquanto
motivações para doar medula, a solidariedade esteve presente em quase todas as
falas e, que consiste nas relações sociais reais de pessoa para pessoa, de acordo
com suas interações e comportamentos de uma em relação à outra; sendo
determinado por normas que regem o sistema no qual as pessoas estão inseridas,
especificamente quando este é feito por um conjunto de normas, práticas e padrões
de comportamento permitido ou proibido. A seguir alguns depoimentos de doadores:
“A pessoa deve ter o amor para salvar outra vida também”
“Acabei por me sentir alguém melhor e diferente por ter conseguido salvar
alguém, ou seja, acabou por ser muito bom para mim também”.
“Que a pessoa que recebeu minha medula fique bem e a minha energia”
Fator que o motivou a ser um doador % O Pedido de um amigo 4 8,3%
Um parente está a precisar 2 4,2% Preocupado com os doentes 16 33,3% Doença ou Morte na Família - -
Religião - - Solidariedade 17 35,4% Generosidade 3 6,3%
Altruísmo - - Cidadania 5 10,4%
Ter boa saúde - - Pode precisar amanhã 1 2,1%
Outros - -
Total 48 100%
Tabela 9 - Distribuição dos doadores segundo prática religiosa
Praticante QTD. %
Praticante 10 20,8%
Não praticante 12 25,0%
Ocasionalmente 18 37,5%
Não Respondeu 8 16,7%
Total 48 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
As Religiões valorizam a existência de uma vida além da morte, sendo a
conservação do corpo, neste mundo, explicada através da dicotomia: prêmio
castigo. Para a Religião Católica, a integridade do corpo pós-morte é considerada
um prêmio. O fenômeno religioso é um dos componentes que muito interessa, tanto
através da ideologia, quanto por sua prática e auto -afirmação (individual ou social).
Esse fenômeno é um referencial não só para as questões subjetivas, quanto para a
interferência do social no individual. Dessa maneira, religiosidade aparece,
freqüentemente como um divisor entre uma realidade externa e uma interna que
está na vida das pessoas
Tabela 10 - Distribuição dos doadores segundo expectativa quanto ao transplantado
Expectativa em relação ao transplantado QTD. %
Indiferente 8 16,7%
Gratidão 10 20,8%
Retribua socialmente 17 35,4%
Outros 13 27,1%
Total 48 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Acima de qualquer discussão que a comunicação pode ser ser considerada um
fator de unidade social de forma que não não há possibilidade de haver um grupo
sem que haja comunicação entre seus elementos. Entretanto, as necessidades
humanas de comunicação atendem a alguns objetivos. A comunicação com o outro,
compreendendo sendo uma conexão necessária com outros indivíduos, e a partir
daí a criação de um grupo que fortalece a sobrevivência individual, bem como a
comunicação entre os grupos, faz também melhorar a perspectiva de vida, já não
mais apenas como soberevivência do grupo, mas como intercâmbio e traços para
melhorar as condições em relação ao meio ambiente e ao futuro desejado.
Assim a forma de comunicar-se com o desconhecido, é a comunicação com
alguma coisa que possa facilitar ou ameaçar a subsistência do grupo. Em muitas
ocasiões, a ritualização de procedimento que encaminham a percepção do indivíduo
e do grupo às imagens que abordem na forma do significado pretendido ou o mais
próximo idealizado para a situação, não deixando ao acaso a utilização de
elementos do repertório do outro.
E assim criam-se os espaços para os rituais homogeneizados de experiências e
de conduta, conhecidos inicialmente na esfera de religiosidade, particularmente, que
desde os tempos primitivos estabelecem essa área de conhecimento e de
reconhecimento do outro.
E é quando a dádiva pode ser usada como senha para sentimentos e memória,
individual ou coletiva, que armazena e repete, ou que imagina ser espontânea ou
apreendida. No caso da dádiva nesse exemplo, há uma observação do objeto para a
presença – na ausência, seu valor simbólico certamente será diferente, que pode ser
maior ou menor do que o valor de mercado, pois este está ligado ao valor do laço, o
que está sendo representada na categoria de retribuição social, bem como gratidão.
Tabela 11 - Distribuição dos doadores segundo alterações pós doação
Após a doação, considera poder existir alterações no seu corpo
QTD. %
Sim 5 10,4%
Não 42 87,5%
Não opinaram 1 2,1%
Total 48 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 12 - Distribuição dos doadores segundo doação medula óssea x doação de sangue
Considera existir semelhança entre doação de medula óssea e de sangue
%
Sim 22 45,8%
Não 23 47,9%
Não opinaram 3 6,3%
Total 48 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 13 - Distribuição dos doadores segundo recompensa
Ao fazer a doação de medula óssea espera algo em troca
%
Sim 2 4,2%
Não 46 95,8%
Não opinaram - -
Total 48 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
5.2 Caracterizacão dos Receptores do estudo em Recife e Lisboa
A temática proposta aos dois grupos foi o transplante de células-tronco
hematopoiéticas. Utilizamos como instrumento de coleta de dados a técnica da
entrevista com um roteiro de questões pré-estabelecidas, que apesar de ter a
temática definida, ter uma pesquisadora, oportunizava o discurso livre e de
profundidade. O estudo foi realizado com uma população de 62 sujeitos que foram
submetidas ao transplante de células-tronco hematopoiéticas de medula óssea, que
Tabela 14- Distribuição dos receptores segundo o sexo
SEXO QTD. %
M 11 33,3%
F 22 66,7%
Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 15- Distribuição dos receptores sugundo idade
IDADE QTD. % 1-10 2 13,3%
18-28 - - 29-39 7 46,7% 40-49 3 20,0% 50-59 3 20,0% 60-69 - - Total 15 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 16 – Distribuição dos receptores quanto a naturalidade
Naturalidade QTD. %
Portuguesa 33 100,0%
Outras 0 0,0%
Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 17- Distribuição dos doadores segundo a escolaridade no periodo de 2002 a 2010
Grau de Instrução QTD. %
2º/3º Ciclo (9º ano) 11 33,3%
Licenciatura 4 12,1%
Pré-primária 1 3,0%
Secundário 17 51,5%
Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 18 - Distribuição dos recptores segundo Estado Civil
Estado Civil QTD. %
Casado(a) ou união de facto 14 42,5%
Divorciado/a 3 9,0%
Solteiro(a) 15 45,5%
Não Respondeu 1 3%
Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 19- Distribuição dos receptores segundo religião
Religião QTD. %
Católica 26 79%
Não sou religioso 3 9%
Outra 2 6%
Sem Religião 2 6%
TOTAL 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 20- Distribuição dos receptores frequência religiosa
Praticante QTD. %
Ativamente 5 13,9%
Não sou praticante 6 16,7%
Ocasionalmente 17 47,2%
Não Respondeu 8 22,2% TOTAL 36 100%
Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
Tabela 21- Distribuição dos receptores quanto ao tipo de coleta
Que tipo de doação recebeu? QTD. %
Cateter 21 63,6%
Medula óssea 12 36,4%
Total 33 100% Fonte: Pesquisa de campo, 2011. A autora
5.3 As Motivações dos doadores para com o ato de doar de Medula Óssea
O objetivo deste tópico é analisar os diversos discursos dos doadores, partindo
do pressuposto de que a doação é um processo que se constrói a partir de
informações sobre o seu significado, objetivos e relevância para a sociedade
construindo assim, um fenômeno social.
Procura-se também, a partir dos depoimentos dos informantes doadores,
demonstrar quais as razões que os motivam os mesmos a procurar o hemocentro
para realizar suas doações, onde às representações acerca da doação de medula
estão muito ligadas às representações sociais das pessoas quanto à qualidade do
sangue e a percepção quanto ao funcionamento da Instituição HEMOPE prestadora
de serviços à população na área de hemoterapia e hematologia.
VASCONCELOS (1995) procura mostrar que os motivos inconscientes que
justificam moral, ou racionalmente a prática de um costume, a aceitação de uma
crença, ou a existência de uma instituição são, às vezes, diferente das razões
explicitadas na forma como a pessoa se apresenta para realizar algum ato, como
por exemplo: a doação de medula. Estabelecendo uma correlação entre estas
razões e os aspectos culturais do doador, chega-se a compreensão do seu gesto. É
possível que as razões da doação estejam muito próximas das motivações
germinais12 do indivíduo, entretanto, não se deve esquecer que essas motivações
sempre dependem do somatório das questões subjetivas aquelas potencializadas
pela biografia individual e pelas injunções objetivas sócio-culturais.
A partir dos relatos as definições sobre motivações para doar medula foram
agrupadas em categorias que foram sistematizadas a partir de elementos
semelhantes percebidos nas falas dos entrevistados. Esta categorização se
apresenta da seguinte forma:
Significa assumir que nosso interesse para o estudo se volta para o estudo das
formas assentadas na voluntariedade na perspectiva desses atores sociais. Para
tanto, o estudo sob a ótica antropológica, significa ir ao encontro das motivações
que levaram essas pessoas a se cadastrarem, com base no questionamento quanto
aos limites da ação técnica na área de saúde diante da doença. Então o
12
Significando razões subjetivas, individuais e próprias do doador (VASCONCELOS, 1995, p. 139).
pesquisador não somente é quem acumula dados mensurados, variáveis ou teorias,
mas, sobretudo quem a habilidade de construir na relação pesquisador/objeto
sentimentos de confiança e respeito.
QUADRO 1- Distribuição das Motivações
CATEGORIA FREQUÊNCIASolidariedade com desconhecidos 10 doadores
Relação de parentesco 13 doadoresPara ajudar as pessoas 10 doadores
Religiosa 03 doadores Gratidão 05 doadores
Obrigação 04 doadoresFonte:
Vale ressaltar, que alguns doadores apresentaram mais de um motivo que os
levaram a realizar a doação. E consideramos enriquecedor para o estudo
contextualizar sobre todos os motivos que nos foram relatadas. As representações
sobre as motivações serão apresentadas em acordo Minayo ”como uma categoria
de pensamento que expressa a realidade, a explica justificando-a ou questionando-
a” (MINAYO, 1994, p.89).
O paradigma da dádiva tem atraído o interesse de pesquisadores voltados para
sua análise nas sociedades complexas. A tônica permanece sendo o escrutínio das
regras e práticas que governam os sistemas de troca e seus impactos na vida social.
Nessa abordagem, sabemos que a vida em sociedade é resultado de um processo
cultural que se concretiza pelas relações sociais que instituem símbolos. Estes
expressam uma determinada visão de mundo comum, manifestando-se em várias
formas de comunicação, como a linguagem, comportamentos, artefatos materiais,
entre outros. Os símbolos instituídos terão capacidade de influenciar e controlar o
comportamento humano, dependendo da sua capacidade de transmitir e reforçar um
sistema ideológico já dado. A sociedade, então, pode ser considerada um agregado
de relações sociais, e a cultura é seu conteúdo, enfatizando os recursos acumulados
que as pessoas adquirem como herança, na medida em que os utilizam, transforma,
acrescentam e transmitem.
A decisão de procurar certas formas de ajudar ao outro emana de uma
avaliação da situação que está sendo vivenciada e da intenção para com o próximo.
Essa decisão de poder ajudar está fortemente relacionada à importância da família.
Desse modo, é interessante observar a manutenção de atitudes positivas em
relação aos familiares e amigos citados nessas narrativas. As representações
sociais explicam a realidade de forma que possibilite que os grupos sociais se
organizem no seu dia-a-dia, orientando, assim, condutas e comportamentos em
suas ações. (RABELO, 1999).
Desta maneira a dádiva explicita os mecanismos relacionados com as
contradições, trocas recíprocas, surgidas por intermédio aparentemente voluntário.
Nela, fica evidente que, as dádivas, mesmo parecendo voluntárias, se submetem a
uma obrigatoriedade transcendente, tanto no seu instante inaugurador quanto no
seu retorno conseqüente. Com essa categoria de fato social total coloca toda
sociedade em movimento
A necessidade de se problematizar e sistematizar da forma mais profunda o
aspecto da doação de medula óssea, assim como suas especificidades, aproximou-
nos da perspectiva interpretativa, nela a cultura é concebida como uma linguagem
textual e sua análise uma interpretação provisória, de decodificações dos sistemas
simbólicos que estão sujeitos a novos olhares (GEERTZ, 1989).
Neste sentido Jaques Godbout (1999) nos faz lembrar que mesmo nas
sociedades modernas na esfera doméstica continua sendo um lugar natural de
dádiva fato de priorizar tais recortes significa a relevância dos mesmos. Para ele,
seria no universo das relações que se permite dar sem interesse. Porém, a premissa
constitui um fator significativo na economia da dádiva, como argumenta Mauss
(2003).
O envolvimento dos indivíduos, os laços de amizade, familiaridade, vizinhança
enquanto doadores de medula matizam o cenário com características importantes
quanto ao alcance da ação vai depender da percepção e interpretação concebidas
pela população inserida no contexto social. O afeto circula nesses espaços, da
mesma maneira que a necessidade de criação de mecanismos institucionais que
façam com que a ação se amplie para além dos limites institucionais. Assim para
que o ato seja realizado passa por uma decisão individual, porém exige uma
participação coletiva. O olhar para o interior dessas pessoas que se estruturam em
torno de regras de sociabilidade referidas ao circuito da dádiva (MAUSS, 1960;
1999). Entretanto, ao enfatizar o tema da solidariedade para com o outro-o que é
assistido-procurei o discurso que fundamenta ás relações que institucionaliza o
grupo.
5.3.1 A Doação de Medula Óssea como Dádiva e o Vínculo Social
No presente tópico, analisaremos o que a doação de medula óssea e dádiva têm
em comum. Segundo Caillé (2001), as Ciências Sociais tentam classificar os
fundamentos da sociedade por meio de uma concepção utilitarista, segundo a qual
seus membros interagem movidos por interesses pessoais, não raro egoístas. Tais
Ciências divergem sobre como se deve pensar a sociedade: a partir do ponto de
vista dos próprios indivíduos, ou tomando como referencial a totalidade, que eles
formam que, por sua vez, constitui a própria sociedade. Sob a óptica do utilitarismo,
segundo o autor, está dividido em um momento individualista e outro holístico,
aparentemente inconciliáveis.
O autor defende que existe uma terceira via, possível, designada por ele de
interacionista. Tal visão constitui uma nova abordagem possível que explica o
relacionamento dos indivíduos em sociedade: é o paradigma da dádiva. Para
compreendermos o paradigma da dádiva, bem como seus impactos sobre a doação
de medula é importante definirmos o que é dádiva. O conceito de dádiva surgiu a
partir dos estudos etnográficos de Marcel Mauss, que vieram a público em 1923.
Mauss realizou diversas pesquisas em sociedades primitivas e constatou que a
forma de relacionamento entre as tribos, bem como entre os indivíduos, baseava-se
numa tríplice obrigação: dar, receber e retribuir. Segundo o referido autor, a dádiva é
a base da vida social e constitui uma mera troca de bens devido as complexas e
diferentes formas de comportamento praticadas em seu rastro.
Os movimentos de dar, receber e retribuir são classificados por Mauss como
fenómenos sociais totais por animarem inteiramente a estrutura social. Segundo
Caillé (2001), o movimento de dar, receber e retribuir o ciclo apresenta algumas
singularidades. Ao mesmo tempo em que o indivíduo dá sem receber nada em troca,
é natural que aquele que recebeu venha por sua vez, a retribuir o favor,
estabelecendo assim um ciclo que se renova a cada movimento. Esta constante
troca institui o circuito da dádiva, que é por natureza temporal, e que se fortalece á
medida que as ações são renovadas. É importante destacar que para Mauss essas
trocas não são ingénuas e desinteressadas, mas buscam a manutenção de uma
aliança.
As reflexões de Mauss em sua obra buscam as razões que levam os homens às
trocas necessárias entre si e nos remetam a análises acerca da permanência
dessas práticas na sociedade moderna. Para Mauss, a dádiva permeia de forma
reduzida a sociedade ocidental contemporânea. Os estudiosos que formam a Revue
Du Mauss discordam sobre o caráter limitado da dádiva na modernidade. Formada
por pesquisadores como Alain Caillé, Jacques Goudbout e Guy Nicolas, entre
outros, a produção académica moderna pesquisa a aplicabilidade do paradigma da
dádiva a modernidade.
As representações sociais nesse campo, muitas vezes podem ser demonstrada
em crenças e atitudes que explicam os comportamentos que podem ser comuns a
determinados grupos sociais. Assim, amplia-se a discussão para um melhor
entendimento do saber científico, das crenças, e de outros factores que possam
estar envolvidos e oferecer mais subsídios para o estudo da representação social da
doação de medula óssea.
Neste contexto, reconhece-se que a questão dos transplantes de órgãos e
tecidos é tema atual que mobiliza a sociedade e ocupa espaço na vida e no
imaginário das pessoas, porque deixou de ser um procedimento experimental,
passando a ser incorporado com opção terapêutica. Devido a esse fato tem sido
alvo de muita atenção seja pelo avanço da medicina, seja pela abrangência das
campanhas de doação de órgãos ou ainda por envolver questões relacionadas à
vida e à morte, cujos ecos podem ser captados e revelados nas falas dos sujeitos da
pesquisa.
5.3.2 O Estado como substituto da Dádiva
O Estado por muito tempo foi e ainda é considerado por muitos, como forma de
apresentação da dádiva nos tempos modernos. Ele seria a representação da
solidariedade, pois redistribui de forma ampla e igualitária. No entanto esse sistema
coexiste com dois outros sistemas. A dádiva e o mercado, e está formado por
princípios diferentes dos demais. O Estado assumiu o papel de substituto da
caridade na medida em que os serviços antes prestados pelas redes de organização
de caridade, passaram a ser assumidos pelos mesmos.
Na sociedade moderna, na qual a presença do Estado é marcante, uma parcela
significativa das coisas que circulam passa pelo circuito da esfera pública. Para
Timus (1972) o Estado tem a propriedade de difundir, na sociedade o espírito da
dádiva, pois a solidariedade governamental e a dádiva se ampliam e se alimentam
mutuamente. Ao apelar para a solidariedade entre os desconhecidos, como no caso
nas campanhas de doação de sangue, considerada como uma das formas mais
marcantes de dádiva. O Estado estimula o sistema de dádiva. A redistribuição de
recursos promovida pelo Estado representa, para o autor, a forma específica que a
dádiva assume na sociedade ocidental moderna, e seria o substituto da dádiva.
Desse modo, ao examinar a problemática da dádiva, Mauss acabou por
desvelar um tipo de relação social que permite integrar as chamadas “obrigações
recíprocas” na análise das questões sociais. Esse ponto é fundamental uma vez que
torna possível demarcar um terceiro princípio, para além da redistribuição e do
reconhecimento, na compreensão dos processos sociais: o princípio da reciprocidade.
A teoria Maussiana traz elementos relevantes para se pensar o laço social, a aliança
entre os indivíduos em interação, e não apenas as relações de grupo de pessoas que
no caso em estudo são os candidatos à doação de medula óssea.
Para que haja a contínua participação dos indivíduos na doação de medula óssea
é imprescindível que o indivíduo possa perceber este ato como uma forma de
atender uma necessidade social, que só pode ser suprida através do ser humano.
Quando o indivíduo não compreende os benefícios que o seu ato representa, mas
difícil será a construção de um processo participativo. No ensaio sobre a dádiva,
Mauss desenvolve a noção de reciprocidade, e é um dos principais teóricos que
sempre estabeleceu uma via onde pode transitar qualquer coisa, seja material ou
simbólico, pois a dádiva inaugura o conceito de aliança na qual a reciprocidade
alimenta.
Para Salém (1980) as interações voluntárias entre os indivíduos são motivadas
a nelas ingressarem e permanecerem em função de algum retorno, o que deve ser
positivo, de modo que se houver alguma frustração, por parte de um ou de ambos os
atores, em suas expectativas, essa associação será interrompida. A maioria dos
doadores pode está nesta categoria, pode ter alguma relação com as pessoas que
precisam, ou precisariam receber transplante de medula óssea. Essa relação está
tanto nos laços de amizade, como também no biológico. Doar, visando à
necessidade própria, ou a de um parente ou amigo, pode constituir o inicio de um
processo onde a doação para estas pessoas está sendo praticada e depende das
relações de proximidade entre doadores e receptores e por isso pode ser garantida
aos seus pacientes que estão precisando do tratamento hematológico
Optar por uma abordagem dessa natureza é debrucar-se sobre uma discussão
que aborda a relação pesquisador/pesquisado, e também problematizar a inserção
de novas temáticas para a reflexão antropológica contemporânea. A partir dessa
discussão, emergem novas abordagens e pressupostos metodológicos, o carater
interdisciplinar e a possibilidade da utilização de novas posições teóricas.
5.4 Caracterizando dos Receptores de Medula Óssea em Recife e Lisboa
O estudo foi realizado com uma população de 62 sujeitos, dividida em dois
grupos sociais distintos: um grupo, composto de 31 pessoas com diversos
diagnósticos de doenças oncohematológicas que foram submetidas ao transplante
de células-tronco hematopoiéticas, que ao longo da análise, denomino como
pessoas transplantadas e, o outro com 26 pacientes de dois Serviços de Transplante
de Medula Óssea.
O Quadro 1 apresenta os sujeitos distribuídos nas duas Instituições, que
serviram de campo para o estudo. Observa-se, que 100% das pessoas
transplantadas estão sendo acompanhadas no ambulatório geral da
Oncohematologia tanto em Lisboa no Instituto Português de Oncologia como no
Hospital Português do Recife.
Na Instituição A, há um serviço ambulatorial específico do transplante, como na
Instituição B, bem como uma unidade de internação. O acompanhamento no período
pós transplante a médio e longo prazo também são realizados no ambulatório geral
da Oncohematologia.
A separação a princípio é para facilitar a sistematização dos dados dos dois
grupos que são universos sociais diversos.
Quadro 2: Participantes do Estudo em Recife e Lisboa no período de 2002 a 2011
Fonte: Pesquisa de campo, 2011.A autora
No período analisado, 133 pacientes realizaram transplante com doadores não
aparentados destes, 107 em Lisboa e 26 em Recife. Os pacientes transplantados
em Lisboa (51,4%) são do sexo feminino, enquanto em Recife (69,2%) pertence ao
sexo masculino. Estão na faixa etária de 0 a 17 anos em Portugal (54,2%) e Recife
(50 %) com diagnóstico prevalente de Anemia Aplástica, Leucemia Mieloide Aguda.
O estudo chama a atenção para o fato de que Lisboa realizou mais transplantes na
faixa etária de 30 a 39 anos (18,7%), diferente de Recife (11,5%) na mesma faixa
etária. Em relação à faixa etária de 18 a 29 anos, apresentou um percentual de
(15,9%). A pesquisa mostrou a leucemia mieloide aguda como a doença mais
prevalente em Lisboa. É um dado que corrobora com a literatura, por afetar
indivíduos de todas as idades, principalmente os que estão na fase adulta. Nesse
estudo está na faixa etária acima de 50 anos em Lisboa (6,5%) e Recife (3,8%).
Ressaltamos que, no período da coleta de dados, Recife tinha uma população de
1.537.704 e Lisboa 2.821.699 pessoas. Apesar de Recife possuir outras unidades,
apenas o centro onde foi realizada a pesquisa estava fazendo este tipo de
transplante.
A concentração de pessoas com idade inferior a 60 anos reflete os dados de
transplantados no Brasil e no mundo, por ser um procedimento de alta
complexidade, que para ser realizado o portador de câncer precisa estar em
remissão da doença e em bom estado geral.
Sujeitos Instituição de Saúde A
Instituição de Saúde B
Total
Grupo de Pessoas transplantadas
107 26 133
PORTUGAL RECIFE
Fonte : Pesquisa de campo, 2011 Fonte : Pesquisa de campo, 2011
Fonte : pesquisa de campo, 2011 Fonte : pesquisa de campo, 2011
Fonte : pesquisa de campo, 2011 Fonte : pesquisa de campo, 2011
Gráfico 4- Gráfico 5-
Gráfico 6- Gráfico 7-
Gráfico 8- Gráfico 9-
Doadores 0‐17 % 18‐29 % 30‐39 % 40‐49 % >=50 % %
Masculino 52 31 53,4% 7 41,2% 8 40,0% 3 60,0% 3 42,9% 48,6%
Feminino 55 27 46,6% 10 58,8% 12 60,0% 2 40,0% 4 57,1% 51,4%
107 58 54,2% 17 15,9% 20 18,7% 5 4,7% 7 6,5% 100,0%
Doadores 0‐17 % 18‐29 % 30‐39 % 40‐49 % >=50 % %
Masculino 18 10 76,9% 3 50,0% 1 33,3% 3 100,0% 1 100,0% 69,2%
Feminino 8 3 23,1% 3 50,0% 2 66,7% 0 0,0% 0 0,0% 30,8%
26 13 50,0% 6 23,1% 3 11,5% 3 11,5% 1 3,8% 100,0%
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
É pensando nessa de análise sobre a teoria da dádiva que assumimos
integralmente as idéias dede Mauss. Aprendemos com ele que a preocupação
principal não é elaborar um grande esquema teórico geral que cubra todo o campo-
tarefa impossível- mas mostrar algumas dimensões do campo de que apenas
tocamos as margens. Nessa perspectiva, procuramos encontrar no pensamento
Marcel Mauss, Pierre Bourdieu, Honneth, apontamentos capazes de subsidiar uma
reflexão sobre a doação e recepção de medula óssea, não só no Brasil como
também em Lisboa.
Outro ponto a ser considerado: no Brasil o cadastro de doadores voluntários é
descentralizado, ou seja, é responsabilidade dos hemocentros a captação desses
doadores.
Em Portugal há dois centros de doadores o primeiro localizado em Lisboa,
denominado Centro de Histocompatibilidade do Sul e o segundo na Cidade do Porto,
Centro de Histocompatibilidade do Norte.
No Brasil, o cadastro é realizado até 55 anos, enquanto em Portugal é até 49
anos. O diagnóstico mais prevalente para a indicação do Transplante de Medula
Óssea em Lisboa foi a Leucemia Mielóide Aguda, enquanto no Recife foi a Anemia
Aplástica.
O estudo revelou mais adesão por parte das mulheres, tanto em Recife, como
em Portugal. O que pressupõe que a compatibilidade não é um fator determinante
quanto ao gênero.
Percebeu-se ainda, que tanto os doadores como os receptores estão
classificados como católicos e não foi encontrado nenhum relato de pessoa sem
religião. Isso sugere que o sofrimento, relacionado à doença, anterior ao transplante,
os leva a aproximar-se da religião. No entanto, ao serem perguntado sobre a
frequência dessa prática (47,2%) responderam ser ocasional.
A compreensão da complexidade das mudanças paradgimáticas no campo
médico, é dificultado, em grande parte, pelas resistências em se ver a medicina
como um fenômeno social total, na pesrpectiva Maussiana do termo.
A medicina é também um fato social total quando se abre a uma
compreensão inter disciplinar, quando do reconhecimento como instituição e que
depende de um imaginário mais amplo.
REFERÊNCIAS
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ANEXOS
ANEXO A- PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA/RECIFE
ANEXO B- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO DOADOR/RECIFE
ANEXO C- PANFLETO INFORMATIVO DOADOR/RECIFE
ANEXO D- PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA/LISBOA
ANEXO E- PARECER DO COMITÊ DE CIENTÍFICO/LISBOA
ANEXO F- FORMULÁRIO DE INSCRIÇÃO DOADOR/LISBOA
ANEXO G- INQUÉRITO DE SATISFAÇÃO DOADOR/LISBOA
ANEXO H- CARTA DE ANUÊNCIA DO CEDACE/LISBOA
ANEXO A – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA/RECIFE
ANEXO B – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO
DOADOR/RECIFE
ANEXO C – PANFLETO INFORMATIVO DOADOR/RECIFE
ANEXO D – PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA/LISBOA
ANEXO E- PARECER DO COMITÊ DE CIENTÍFICO/LISBOA
ANEXO F- FORMULÁRIO DE INSCRIÇÃO DOADOR/LISBOA
ANEXO G- INQUÉRITO DE SATISFAÇÃO DOADOR/LISBOA
\
APÊNDICES
APÊNDICE A- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-
DOADOR/ RECIFE
APÊNDICE B- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-
RECEPTOR/ RECIFE
APÊNDICE C- QUESTIONÁRIO DOADOR/ RECIFE
APÊNDICE D- QUESTIONÁRIO RECEPTOR/ RECIFE
APÊNDICE E- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-
DOADOR/ LISBOA
APÊNDICE F- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-
RECEPTOR/ LISBOA
APÊNDICE G- QUESTIONÁRIO DOADOR/ LISBOA
APÊNDICE H- QUESTIONÁRIO RECEPTOR/ LISBOA
APÊNDICE A- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO DOADOR/RECIFE
APÊNDICE B- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-
RECEPTOR/ RECIFE
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Nome da Pesquisa: Doação de Medula Óssea: voluntários e devedores
Informações importantes aos sujeitos da pesquisa
Meu nome é Maria de Fátima Patu da Silva, sou assistente social (CRESS nº 2827),
aluna da Pós-Graduação em Sociologia, responsável pelo projeto de pesquisa acima
citado. Trabalho no projeto Doadores voluntários de Medula Óssea desde sua
implementação em 2002. Necessito da sua colaboração para participar da pesquisa
que será meu trabalho de conclusão do doutorado. Comprometo-me em lhe informar
a respeito do projeto e de seus direitos e, em caso de aceitação, solicito sua
assinatura no local determinado ao final do termo. A orientadora do projeto é a
professora Drª Maria Helena Villas Boas Concone, antropóloga da PUC/SP.
O objetivo da pesquisa é analisar a doação de medula óssea na perspectiva da
representação dos doadores, profissionais, receptores e dos familiares a estes
associados.
Gostaríamos de contar com sua colaboração, como receptor de medula e tudo o que
você falar será mantido em sigilo (anonimato). A qualquer momento poderá deixar
de participar da pesquisa sem prejuizo do tratamento. As informações que serão
fornecidas poderão ser utilizadas em trabalhos científicos, porém sua identidade
será preservada. Caso aceite, será realizada entrevistas sobre algumas questões
relativas após o transplante de medula óssea. Os resultados dessa pesquisa
ajudarão a compreender a lógica da doação de medula óssea e poderá contribuir na
política de captação de doadores. Após tomar conhecimento, aceito participar da
pesquisa assumindo não ter sofrido nenhuma pressão para tanto:
Eu, _______________________ aceito participar da entrevista do projeto de
pesquisa intitulado Doação de Medula Óssea: voluntários e devedores, em data e
local marcado antecipadamente. Estou ciente que a entrevista será espontânea, as
informações serão tratadas sigilosamente e caso decida não mais participar, tenho a
liberdade de retirar meu consentimento. Eu recebi uma cópia desse termo e a
possibilidade de poder lê-lo a qualquer momento.
Assinatura do voluntário: _______________________________________________
Assinatura do responsável pela criança/adolescente: _______________________
Assinatura do pesquisador responsavél: __________________________________
Testemunha: ________________________________________________________
Data: ___/____/____
Endereço para contato: Rua Azeredo Coutinho, 121, Bl 08 Aptº 302, Várzea,
Recife/PE.
APÊNDICE C- QUESTIONÁRIO DOADOR/ RECIFE
QUESTIONÁRIO PARA DOADORES VOLUNTÁRIOS DE MEDULA ÓSSEA/RECIFE
DADOS PESSOAIS
NOME
COMPLETO____________________________________________________________
TELEFONES______________________________
1. RELIGIÃO____________________________
IDADE: 18‐28( ) 29‐39( ) 40‐49( ) 50‐59( )
2. NÍVEL DE ESCOLARIDADE
2.1 ENSINO FUNDAMENTAL( ) ENSINO MÉDIO( ) ENSINO SUPERIOR( )
ANALFABETO( )
2.2 COMPLETO ( ) INCOMPLETO ( )
3. PROFISSÃO______________________________
3.1 DESEMPREGADO? SIM ( ) NÃO ( )
4. RENDA
4.1 RENDIMENTO MÉDIO MENSAL
ATÉ UM SALÁRIO ( )
2 A 4 SALÁRIOS ( )
5 A 7 SALÁRIOS ( )
8 A 10 SALÁRIOS ( )
QUANTO AO CONHECIMENTO SOBRE DOAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA
5. COMO VOCÊ FICOU SABENDO SOBRE A DOAÇÃO VOLUNTÁRIA DE MEDULA ÓSSEA?
NO HEMOPE( )
NA CENTRAL DE TRANSPLANTES( )
POR AMIGOS, PARENTES OU CONHECIDOS( )
PALESTRAS, FEIRA DE CONHECIMENTO( )
VOCÊ PROCUROU INFORMAÇÕES( )
PELOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. QUAIS?
RÁDIO ( ) TELEVISÃO( ) REVISTA( ) JORNAL ( ) INTERNET( )
OUTROS MEIOS, QUAIS?______________________________________________
QUANTO AOS FATORES MOTIVACIONAIS PARA A DOAÇÃO
6. QUAL O PRINCIPAL FATOR QUE O MOTIVA A SE TORNAR UM DOADOR DE MEDULA ÓSSEA?
A PEDIDO DE UM AMIGO(A) ( )
UM PARENTE ESTÁ PRECISANDO ( )
INFLUÊNCIA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. QUAL?
RÁDIO ( ) TELEVISÃO( ) REVISTA( ) JORNAL ( ) INTERNET( )
PREOCUPADO COM O PROBLEMA DOS PACIENTES QUE PRECISAM DE TRANSPLANTE
/SALVAR VIDAS ( )
DOENÇA GRAVE OU MORTE NA FAMÍLIA NO ÚLTIMO ANO ( )
MOTIAVAÇÃO RELIGIOSA ( )
AJUDAR AOS OUTROS/ HUMANISMO/ SOLIDARIEDADE ( )
DOAR HOJE PORQUE PODE PRECISAR AMANHÃ ( )
DEVER DE CIDADANIA/ OBRIGAÇÃO DE QUEM TEM BOA SAÚDE ( )
OUTROS MOTIVOS. QUAIS?_________________________________
QUANTO AOS FATORES QUE DESMOTIVAM E IMPEDEM A DOAÇÃO
7. O QUE VOCÊ CONSIDERA SER A PRINCIPAL RAZÃO QUE IMPEDE UMA
PESSOA DE SE TORNAR UM DOADOR DE MEDULA ÓSSEA?
APATIA/DESINTERESSE ( )
FALTA DE ESCLARECIMENTO SOBRE A DOAÇÃO ( )
FALTA DE CONHECIMENTO SOBRE A IMPORTÂNCIA DA DOAÇÃO ( )
NÃO GANHAR NADA EM TROCA
SÓ DOARIA SE FOSSE PRA SALVAR A VIDA DE ALGUÉM PRÓXIMO ( )
O DOADOR SENTE MEDO ( )
MOTIVAÇÃO RELIGIOSA ( )
OUTROS. QUAIS?_____________________________________________
QUANTO A DOAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA
8. QUAL A SUA EXPECTATIVA EM RELAÇÃOO AO SENTIMENTO DA PESSOA
QUE RECEBERÁ SUA DOAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA?
QUE SINTA GRATIDÃO
QUE SEJA INDIFERENTE
QUE PAGUE EM FUNÇÃO DO SEU ATO A DOAÇÃO
OUTROS.________________________________
9. COMO SUA FAMÍLIA E SEUS AMIGOS REAGIRAM AO SABER QUE VOCÊ É UM
CANDIDATO À DOAÇÃO DE MEDULA ÓSSEA?
APOIARAM SUA DECISÃO DE SER DOADOR ( )
CONCORDARAM, POIS ALGUÉM DA FAMÍLIA OU UM AMIGO PODE PRECISAR ( )
NÃO DERAM OPINIÃO ( )
NÃO SABEM QUE VOCÊ É UM CANDIDATO ( )
NÃO CONCORDAM COM SUA DECISÃO ( )
ACHAM A DOAÇÃO PERIGOSA ( )
POR MOTIVOS RELIGIOSOS ( )
OUTROS___________________________________________
10. NA SUA OPINIÃO, QUEM SERIA O RESPONSÁVEL POR ESTAR
INCENTIVANDO AS PESSOAS A SEREM DOADORES VOLUNTÁRIOS DE MEDULA
ÓSSEA?
O PRÓPRIO ( )
A SOCIEDADE ( )
OS FAMILIARES DA PESSOA QUE PRECISA DE DOAÇÃO ( )
O GOVERNO FEDERAL, ESTADUAL E MUNICIPAL ( )
OUTROS________________________________________________
APÊNDICE E- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-
DOADOR/ LISBOA
Termo de Consentimento
Declaro que foi solicitada a minha participação num estudo sobre Doação de Medula Óssea
realizado por Dra. Maria de Fátima Patu da Silva, no âmbito de colaboração entre Instituto
Português de Oncologia e a Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de
Lisboa e fui informado que:
1.A participação é voluntária e consiste em que responda a um questionário semi-
estruturado;
2.Trata-se de um estudo sobre Doação voluntária de medula óssea com o objectivo de
analisar a doação na perspectiva do reconhecimento social na visão dos dadores voluntários
efectivos e receptores em Recife (Brasil) e Lisboa (Portugal);
3.Os dados referentes à minha identidade, morada, telefone e quaisquer outros que
permitam identificar-me serão mantidos confidenciais e só existirão em ficheiro do CHSul
(não constarão dos impressos e das bases de dados do/s estudos e não serão revelados a
quaisquer outras pessoas ou entidades ligadas ou não ao/s estudos);
4. A divulgação dos resultados, a sua discussão científica a fim de contribuir para uma
melhor eficácia futura, será sempre feita na globalidade, garantindo por isso o anonimato de
cada participante;
5. Considerando-me suficientemente esclarecido sobre o estudo e sobre as medidas de
salvaguarda da confidencialidade dos meus dados pessoais, declaro que consinto em
participar.
Data: ------/-------/-------
Assinatura do/a receptor/a (legível) ---------------------------------------------------------------------
BI/Cartão do Cidadão----------------------------------------------------------------------------------
Assinatura do/a entrevistador/a (legível) -----------------------------------------------------------.
APÊNDICE F- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO-
RECEPTOR/ LISBOA
Termo de Consentimento
Declaro que foi solicitada a minha participação num estudo sobre Doação de Medula Óssea
realizado por Dra. Maria de Fátima Patu da Silva, no âmbito de colaboração entre Instituto
Português de Oncologia e a Faculdade de Motricidade Humana da Universidade Técnica de
Lisboa e fui informado que:
1.A participação é voluntária e consiste em que responda a um questionário semi-
estruturado;
2.Trata-se de um estudo sobre Doação voluntária de medula óssea com o objectivo de
analisar a doação na perspectiva do reconhecimento social na visão dos dadores voluntários
efectivos e receptores em Recife (Brasil) e Lisboa (Portugal);
3.Os dados referentes à minha identidade, morada, telefone e quaisquer outros que
permitam identificar-me serão mantidos confidenciais (não constarão dos impressos e das
bases de dados do/s estudos e não serão revelados a quaisquer outras pessoas ou
entidades ligadas ou não ao/s estudos);
4. A divulgação dos resultados, a sua discussão científica a fim de contribuir para uma
melhor eficácia futura, será sempre feita na globalidade, garantindo por isso o anonimato de
cada participante;
5. Considerando-me suficientemente esclarecido sobre o estudo e sobre as medidas de
salvaguarda da confidencialidade dos meus dados pessoais, declaro que consinto em
participar.
Data: ------/-------/-------
Assinatura do/a receptor/a (legível) ---------------------------------------------------------------------
BI/Cartão do Cidadão----------------------------------------------------------------------------------
Assinatura do/a entrevistador/a (legível) -----------------------------------------------------------.
APÊNDICE G- QUESTIONÁRIO DOADOR/ LISBOA
Informação para consentimento da entrevista
Chamo-me Maria de Fátima Patu da Silva, sou assistente social, epidemiologista e pesquisadora, tenho como objectivo fazer um estudo que se integra no Doutorado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Brasil). Com ele, pretendo compreender como os doadores efectivos expressam as principais razões para fazer doação de medula óssea na perspectiva do reconhecimento social. Estou a entrevistar pessoas e a pedir-lhes que relatem as suas motivações o que será concretizado através do preenchimento de um questionário semi-estruturado. Naturalmente, só será integrado neste estudo se assim o desejar e poderá rever a sua decisão em qualquer altura. COLETA DE DADOS PARA O PERFIL SÓCIO DEMOGRÁFICO E MOTIVACIONAL Caracterização do (a)participante: 1) Sexo: Masculino Feminino 2) Idade: 18- 28 Anos 29- 39 anos 40- 49 anos 50- 59 anos 3) Naturalidade:____________________________________ 4) Nível de Ensino Frequentado 1º Ciclo (primária) 2º/ 3º Ciclo (9º ano) Secundário Licenciatura Grau Académico Mestrado Doutoramento 5) Estado Civil Solteiro/a Casado/a e ou união de facto Viúvo/a Divorciado/a 6. Agregado familiar Com quem habita? Marido/Mulher ou Companheiro/Companheira Filhos Pais/Sogros Outros 7. Situação profissional Empregado Exerce funções Baixa Desempregado Reformado Por idade Por doença Doméstica 8) Qual sua faixa salarial? ____________________________________ 9) Qual é a sua religião? Católica Protestante
Judaica Islâmica Budista Hindu Outra Não sou religioso 10) No caso de ser religioso, até que ponto pratica a sua religião? Não sou praticante Ocasionalmente Activamente QUANTO AOS FACTORES MOTIVACIONAIS 11) Qual o principal factor que o motiva a tornar-se um doador de medula óssea? O pedido de um amigo Um parente está a precisar Preocupado com os doentes que precisam de transplante Doença ou morte na família no último ano Motivação religiosa Ajudar os outros, solidariedade, generosidade, altruísmo Dever de cidadania, obrigação de quem tem boa saúde Doar hoje, porque pode precisar amanhã Outros motivos Quais:____________________________________________________________________ 12) Qual a sua expectativa em relação ao sentimento da pessoa que receberá sua medula óssea? Que seja indiferente Que tenha gratidão Que retribua socialmente Outros___________________________________________________________________ 13) Como reagiram a sua família e amigos ao saber que você é candidato a doação de medula óssea? Não concordaram Acham a doação perigosa Não manifestaram opinião Apoiaram a sua decisão Não sabem que você é candidato Concordaram, por pensar que a família ou um amigo pode precisar mais tarde Outros: __________________________________________________________________ 14) Na sua opinião quem é responsável por incentivar a doação voluntária de Medula Óssea? O governo central, Ministério da Saúde A sociedade em geral Os familiares de pacientes que precisam da doação 15) Considera dolorosa a doação de medula óssea? Que tipo: 1.Veias do Braço 2.Catecter 3.Medula óssea Sim Não Caso, sim, descreva o que pensa ou sente. ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 16) Após a doação, considera poder existir alterações no seu próprio corpo? Sim Não
Caso,sim,descreva__________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 17) E no receptor? Sim Não Caso, sim. Quais?
18) Considera a existência de semelhança entre a doação de medula óssea e a doação de sangue? Sim Não Caso, sim. Quais? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 19) Ao proceder a doação de medula óssea considera estar a dar uma parte de seu corpo? Sim, Não Caso, sim. Qual? ___________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________ 20) Ao fazer a doação de medula óssea espera algo em troca? Sim O quê? ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Porquê? --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Não Porquê?___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
APÊNDICE H- QUESTIONÁRIO RECEPTOR/ LISBOA
Informação para consentimento da entrevista
Chamo-me Maria de Fátima Patu da Silva, sou assistente social, epidemiologista e pesquisadora, tenho como objectivo fazer um estudo que se integra no Doutorado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Brasil). Estou a entrevistar pessoas e a pedir-lhes que relatem as suas experiências quanto ao recebimento da doação, o que será concretizado através do preenchimento de um questionário semi-estruturado. O Director do Serviço de Transplantação de Progenitores Hematopoiéticos deu o seu acordo para esta investigação. Naturalmente, só será integrado neste estudo se assim o desejar e poderá rever a sua decisão em qualquer altura. COLETA DE DADOS PARA O PERFIL SÓCIO DEMOGRÁFICO Caracterização do (a)participante: 1) Sexo: Masculino Feminino 2) Idade: 18- 28 Anos 29- 39 anos 40- 49 anos 50- 59 anos 60- 69 anos 3) Naturalidade:____________________________________ 4) Nível de Ensino Frequentado 1º Ciclo (primária) 2º/ 3º Ciclo (9º ano) Secundário Licenciatura Grau Académico Mestrado Doutoramento 5) Estado Civil Solteiro/a Casado/a e ou união de facto Viúvo/a Divorciado/a 6. Agregado familiar Com quem habita? Marido/Mulher ou Companheiro/Companheira Filhos Pais/Sogros Outros 7. Situação profissional Empregado Exerce funções Baixa
Desempregado Reformado Por idade Por doença Doméstica 8) Qual sua faixa salarial? ____________________________________ 9) Qual é a sua religião? Católica Protestante Judaica Islâmica Budista Hindu Outra Não sou religioso 10) No caso de ser religioso, até que ponto pratica a sua religião? Não sou praticante Ocasionalmente Activamente QUANTO AO TRANSPLANTE 11) O que você sabe sobre transplante de medula óssea e como foi realizado? _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 12) Qual foi a sua expectativa em relação ao transplante? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13) Que tipo de doação recebeu? Veias de braço Cateter Medula óssea 14) Ao receber o comunicado que tinha um doador voluntário, qual o impacto da notícia na família? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 15) Ao submeter-se a um transplante de medula óssea – torna-se um receptor, como retribuir semelhante dádiva? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 16) Considera vir a estabelecer um vínculo com o dador? Sim Não Caso sim, que tipo? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 17) Considera vir a fazer algo para a promoção da doação de medula óssea? Sim Não Caso sim, de que formas: Informar sobre o seu caso e benefícios decorrentes da doação
conselhar a doação Participar de acções de formação como agentes multiplicadores Contactar outros receptores de modo a criar uma rede de relações Promover aspectos positivos/ negativos ligados a doação/ recepção Reunir conhecimento do que é comum entre todos os receptores