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PONTIFíCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TECNOLOGIAS DA INTELIGÊNCIA E DESIGN DIGITAL LUCIANO LAURI PIRES FELICIDADE, EMOÇÃO E HÁBITO: NOVAS ABORDAGENS DO DESIGN DIGITAL COM FOCO NO BEM-ESTAR SUBJETIVO DO USUÁRIO SÃO PAULO 2017

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PONTIFíCIAUNIVERSIDADECATÓLICADESÃOPAULOPROGRAMADEPÓS-GRADUAÇÃOEMTECNOLOGIASDAINTELIGÊNCIAEDESIGN

DIGITAL

LUCIANOLAURIPIRES

FELICIDADE,EMOÇÃOEHÁBITO:NOVASABORDAGENSDODESIGNDIGITALCOMFOCONOBEM-ESTARSUBJETIVO

DOUSUÁRIO

SÃOPAULO2017

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LUCIANOLAURIPIRES

FELICIDADE,EMOÇÃOEHÁBITO:NOVASABORDAGENSDODESIGNDIGITALCOMFOCONOBEM-ESTARSUBJETIVO

DOUSUÁRIO

DissertaçãoapresentadaàBancaExaminadoradaPontifíciaUniversidadeCatólicadeSãoPaulo,comoexigênciaparcialparaobtençãodotítulodeMESTREemTecnologiasdaInteligênciaeDesignDigital,sobaorientaçãodoProf.Dr.SergioRoclawBasbaum

SÃOPAULO2017

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LUCIANOLAURIPIRES

FELICIDADE,EMOÇÃOEHÁBITO:NOVASABORDAGENSDODESIGNDIGITALCOMFOCONOBEM-ESTARSUBJETIVO

DOUSUÁRIO

DissertaçãoapresentadaàBancaExaminadoradaPontifíciaUniversidadeCatólicadeSãoPaulo,comoexigênciaparcialparaobtençãodotítulodeMESTREemTecnologiasdaInteligênciaeDesignDigital,sobaorientaçãodoProf.Dr.SergioRoclawBasbaum

Bancaexaminadora:____________________________________________________________________________________________________________

SÃOPAULO2017

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AlunobolsistadaCAPES/PROSUP,comapoiodaFUNDASPnoanoletivode2016.

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AoDavi,minhafonteinesgotáveldefelicidade.

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AGRADECIMENTOS

Àminhairmã,portodoocarinho.Aosmeuspais,pelaminhafelicidadegenética.AoCélioMonção,pelocompanheirismo.ÀMarianaBernaleVivianeMizuno,pelacompreensãoeincentivo.ÀEllenKiss,pelainspiração.

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RESUMO

Estadissertaçãodemestradopretendedebater,deformaexploratória,opapeldo

designernaconstruçãodeexperiênciasdigitaisquepromovemobem-estarsubjetivodo

usuário.Lidacomahipótesedequeexisteumapreocupaçãocrescentenacomunidade

dedesignsobreoseupapelcomoáreadeatuação,causadapelaatualmaturidadedos

processos de design centrado no usuário e pelo surgimento de novas pesquisas

científicasnas áreasda infocognição,PsicologiaPositiva eEconomiaComportamental.

Consideraabordagensparalelascomoodesignemocionaleosmodelosdeconstrução

de hábito através do design. Justifica-se pela necessidade de evolução dos métodos

vigentesdedesign,nummomentoemqueousuárioencontra-secercadoporambientes

digitaisultradesenhadosequepriorizamfatoresdaexperiênciavoltadosàusabilidade

eaodesempenho,ao invésde fatoresquecontribuemparaaconstruçãoda felicidade.

ConcluiqueoexercíciodoDesignPositivo,umaabordagemdedesignparaobem-estar

subjetivo fundamentada nos conceitos da Psicologia Positiva e da eudaimonia de

Aristóteles, pode trazer uma importante evolução na prática do design digital. Ao

demonstrar que a busca do bem-estar subjetivo está vinculada a três componentes

principais (prazer, significado pessoal e virtude), esta abordagem apresenta um

framework consistente e diversas oportunidades de design para a felicidade,

provocandodiscussõesalémdacomunidadededesign.

Unitermos:designdigital,DesignPositivo,designemocional,hábito,eudaimonia

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ABSTRACT

This work aims to discuss and investigate the role of the designer in the

constructionofdigitalexperiencesthatpromoteusersubjectivewell-being.Itdealswith

thehypothesisthatthereisgrowingconcerninthedesigncommunityoveritsroleinits

field of work. That is due to the current level of maturity of user-centered design

processes and due to new research covering infocognition, positive psychology and

behavioral economy. It considers parallel approaches, such as emotional design and

habit-building models through design. It is relevant due to the need to make evolve

currentdesignmethodsatatimewhenusersaresurroundedbyultra-designeddigital

environmentsthatprioritizeexperiencefactorsdedicatedtousabilityandperformance

instead of factors that contribute to the construction of happiness. It draws the

conclusion thatPositiveDesign, adesignapproach for subjectivewell-beinggrounded

on concepts of Positive Psychology and Aristotle’s eudaemonia, may present amajor

evolution in thedigitaldesignpractice.Bydemonstrating that thequest forsubjective

well-being is connected to three main components (pleasure, personal meaning and

virtue), this approach introduces a consistent framework and several design

opportunitiesforhappinesswhileleveragingdiscussionsbeyondthedesigncommunity.

Keywords:digitaldesign,positivedesign,emotionaldesign,habit,eudaemonia

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LISTADEFIGURAS

Figura1-AProgressãodoValorEconômico......................................................................................15Figura2–OsQuatroDomíniosdaExperiência..................................................................................17Figura3–Frameworkinicialdaexperiência.......................................................................................19Figura4–Adinâmicadaexperiênciadeinteraçãoindividualesocial...................................22Figura5-ProcessodeDesignThinkingdaIDEO..............................................................................28Figura6-DuploDiamante..........................................................................................................................29Figura7-LoopdoHábito.............................................................................................................................40Figura8-ModelodoGancho......................................................................................................................42Figura9-ModelodeComportamento...................................................................................................43Figura10–Asseisfontesbásicasdeemoçõespositivasnasinteraçõeshomem-objeto 49Figura11–TipologiaGeraldas25EmoçõesPositivas...................................................................51Figura12–EscalaMultidimensionalcomasCategoriasdeEmoções.....................................52Figura13-ArodadasemoçõesdePlutchik........................................................................................55Figura14–ModeloCircumplexodeEmoções....................................................................................61Figura15–OPANAS(WATSONetal,1988,p.1070).....................................................................62Figura16–PEGCards-PositiveEmotionalGranularityCards....................................................67Figura17-PirâmidedeMaslow...............................................................................................................71Figura18–TeladoaplicativoTrackyourhappiness.......................................................................85Figura19–TeladoaplicativoMappiness.............................................................................................87Figura20-PirâmidedeHierarquiadasNecessidadesdoUsuário............................................96Figura21-MatrizdeDesignparaoSignificadoSimbólico............................................................99Figura22-ExemplodecartadoSIMToolkit......................................................................................101Figura23–Framework-DesignPositivo...........................................................................................102Figura24-“WhatistheClassificationofCharacterStrengthsandVirtues?”.....................105Figura25–CapturadateladopáginaoficialdoAppleWatch..................................................107Figura26–ImagemdoaplicativoGoodGuide...................................................................................108Figura27–ImagemdoInclusiveMicrosoftDesignManual.......................................................109

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SUMÁRIO

1INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................11

1.1JUSTIFICATIVA...........................................................................................................................................11

1.2PROBLEMAS................................................................................................................................................11

1.3OBJETIVOETEMAS..................................................................................................................................12

1.4HIPÓTESESEMETODOLOGIADEPESQUISA...............................................................................12

2AERADAEXPERIÊNCIAEONOVOPAPELDODESIGNER........................................................14

2.1MODELOINICIALPARAENTENDIMENTODAEXPERIÊNCIA..............................................18

2.2INTERAÇÕESFLUENTES,COGNITIVASEEXPRESSIVAS........................................................20

2.3NOVOSHUMANOS,NOVASFORMASDEINTERAGIR...............................................................23

2.4AEVOLUÇÃODOPAPELDODESIGNER..........................................................................................26

2.5DESIGNTHINKING....................................................................................................................................27

3DESIGNDOHÁBITO.....................................................................................................................................31

3.1OSPAPÉISPERSUASIVOSDOSMARTPHONE...............................................................................31

3.2OHÁBITO.....................................................................................................................................................34

3.3ESTÍMULO-RESPOSTA............................................................................................................................35

3.4CONTEXTO-RESPOSTA...........................................................................................................................36

3.5DESENHANDOHÁBITOS........................................................................................................................40

4DESIGNEMOCIONAL...................................................................................................................................46

4.1EMOÇÕESPOSITIVASEEXPERIÊNCIA...........................................................................................47

4.2LÉXICOEMOCIONAL...............................................................................................................................50

4.3GRANULARIDADEEMOCIONAL.........................................................................................................52

4.4ARODADEEMOÇÕESDEPLUTCHIK..............................................................................................54

4.5INFORMÁTICAPESSOAL:RASTREANDOEMEDINDOEMOÇÕES.......................................56

4.6NOVASTECNOLOGIASDERECONHECIMENTOEMOCIONAL...............................................63

4.7AIMPORTÂNCIADOSAUTORRELATÓRIOS.................................................................................65

4.8PEGCARDS:UMAFERRAMENTAPARAODESIGNEMOCIONAL........................................67

4.9ESCALABILIDADEDAEXPERIÊNCIA...............................................................................................68

5FELICIDADE....................................................................................................................................................69

5.1APSICOLOGIAPOSITIVAEASABORDAGENSTEÓRICASACERCADAFELICIDADE..69

5.2FELICIDADEVIVENCIADAESATISFAÇÃOCOMAVIDA.........................................................75

5.3MEDINDOAFELICIDADE......................................................................................................................78

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5.4MÉTRICASAVALIATIVAS/COGNITIVASDEFELICIDADE....................................................79

5.5MÉTRICASHEDÔNICASDEFELICIDADE.......................................................................................82

5.6TRACKYOURHAPPINESS–DEMATTKILLINGSWORTH........................................................84

5.7MAPPINESSEAFELICIDADENOTRABALHO..............................................................................86

5.8MÉTRICASEUDEMÔNICAS...................................................................................................................88

5.9ENTENDENDOAPSICOLOGIAPOSITIVA.......................................................................................90

6DESIGNPOSITIVO:DESENHANDOOBEM-ESTAR.........................................................................94

6.1AHIERARQUIADASNECESSIDADESDOUSUÁRIO...................................................................95

6.2POSITIVEDESIGN......................................................................................................................................97

6.3DESIGNPARAAFELICIDADEATRAVÉSDOSIGNIFICADOSIMBÓLICO...........................98

6.4FRAMEWORKPARAODESIGNPOSITIVO....................................................................................101

7CONCLUSÃO.................................................................................................................................................111

REFERÊNCIASBIBLIOGRÁFICAS............................................................................................................114

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1INTRODUÇÃO

“Nósnoscercamosdecoisasquenosfazemsentirbemmasseráqueelasestãonosfazendofelizes?”(POHLMEYER,2014)

Com esta frase, a pesquisadora Anna Pohlmeyer, do Delft Institute of Positive

Design,abriuasuapalestranoeventoUXWeekrealizadoem12deSetembrode2014

emSãoFrancisco,nosEstadosUnidos.Foiomeuprimeirocontatocomaabordagemdo

DesignPositivoeaquilomedeixoufascinadodesdeentão.Veiodeencontroàsminhas

inquietações sobre o sentido e o futuro do design da experiência do usuário, área de

conhecimentoquesetransformounaminhaprincipalatividadeprofissionalnosúltimos

20anos.Desdeentão,tenhoestudadoosconceitosfundamentaisdessanovaabordagem

e tentado adaptar algumas de suas ferramentas ao meu processo de design. Esta

dissertaçãodemestradoregistraaminhajornadadepesquisasobreoDesignPositivo,

mostrandotodasasconexõesdotemacomdisciplinasadjacentesefazendoumaanálise

dasprincipaisferramentasdisponíveisparaasuapráticanodesigndigital.

1.1Justificativa

Oobjetodeestudodo trabalhoéaevoluçãododesigndigital.Novaspesquisas

científicas nas áreas da infocognição, Psicologia Positiva e Economia Comportamental

trazempossibilidades teóricas para o design comodisciplina e práticas para o design

comoofício.

A importância de uma suplementação nos métodos vigentes de design ocorre

num momento em que o usuário encontra-se cercado por ambientes digitais ultra

desenhados e que priorizam fatores da experiência voltados à usabilidade e ao

desempenho. Estamos criando hábitos e transformando comportamentos individuais

muitas vezes discordantes de umameta comuma todos os usuários: a construção da

felicidade.

1.2Problemas

Comoodesignerpodeampliaroseuescopodeatuaçãoparacuidardequestões

maishumanasrelacionadasaousodedispositivosdigitais?

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Quais conceitos, teoriasemetodologiaspodemapoiarumanovaabordagemde

designcomfoconafelicidadedousuário?

1.3Objetivoetemas

O objetivo da pesquisa é entender o papel do designer na construção de

experiências digitais que promovem o bem-estar subjetivo através da construção e

modificaçãodehábitos.

Dentreostemasaseremestudadosestão:

• DesignPositivo: abordagemdodesignque tem como focoodesenhode

experiências que promovem o bem-estar subjetivo. Novas disciplinas

científicas como a Economia Comportamental e a Psicologia Positiva

suportam a construção do Design Positivo e serão exploradas nesse

estudo

• Eudaimonia: a felicidade na visão de Aristóteles como inspiração para

novosframeworksdedesign

• Design emocional: abordagem que explora os conhecimentos da

neurociênciaedapsicologiadasemoções

• Persuasãoeconstruçãodehábitosemambientesdigitais

• Osobjetosvestíveiseamenteestendida

• Personalinformatics:bigdata,sensoreseohomemquantificado

1.4Hipótesesemetodologiadepesquisa

Aprincipalhipótesedestapesquisaéadequeexisteumapreocupaçãocrescente

na comunidade de design sobre o seu papel como área de atuação. A prática

amplamentedisseminadadodesigncentradonousuárioatingiuumaaltamaturidadeno

mercado digital provocando discussões sobre o propósito e a evolução do próprio

design.

Comometodologia, por se tratar de uma pesquisa exploratória, realizamos um

levantamento das publicações teórico-filosóficas para embasar a dimensão teórica do

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trabalho. Em paralelo, realizamos uma investigação de métodos e técnicas de design

aplicadosporprofissionaisnomercadodigital.

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2AERADAEXPERIÊNCIAEONOVOPAPELDODESIGNER

“Onovohomemnãoquerteroufazer,elequervivenciar.Eledesejaexperimentar,conhecere,sobretudo,desfrutar.”

(FLUSSER,2007)

Em nenhum outro momento da nossa história recente falamos tanto sobre a

experiência humana. Se antes era um assunto restrito a psicólogos e antropólogos, o

entendimentodaexperiênciapassouaserumaquestãodesumaimportânciaparaum

grande número de profissionais. De taxistas amédicos, todo o profissional que antes

entregava serviços passou a entregar experiências. Mesmo que a mudança tenha

acontecido de forma superficial e que, na verdade, o serviço ainda seja o foco da

operação, todos passaram a considerar aspectos mais humanos na sua oferta:

expectativas,emoções,frustrações,dores,segurança,medo,surpresa,etc.

Para os designers essa relação com o humano é um pouco diferente. O design

tradicionalmente explora os fatores humanos e foi um grande impulsionador da

chamada economia da experiência. A crescente adoção demétodos etnográficos pelo

design, tanto em estudos acadêmicos quanto nas empresas, permitiu que esses

profissionaispudessemseaprofundarnoentendimentodessesfatoresparaconduzirem

o desenvolvimento de produtos com uma abordagem mais ampla da experiência do

usuário. Além dos métodos de pesquisa adaptados da antropologia, conceitos da

sociologia edapsicologia comportamental foram trazidosparaapráticadodesignna

exploraçãoda forma, funçãoe conteúdodeprodutos.Novas ferramentasentraramno

cotidiano desses profissionais que precisam desconstruir desejos e sentimentos para

moldarsatisfaçãoeusabilidade:mapasdajornadadocliente,personas,cenários,mapas

de empatia ementais complementam ferramentas tradicionais como: lápis, borracha,

AutoCAD, Photoshop e Illustrator 1 . Novos cargos surgiram em resposta a essas

necessidadesespecíficasdomercado:designerdeexperiênciadousuário(UXdesigner),

pesquisador de experiência do usuário, designer de interação, designer de serviços

centradosnousuário,especialistaemfatoreshumanos,entreoutros.

Em agosto de 1998 a revista Harvard Business Review publicou um artigo

intitulado “Bem-vindosàEconomiadaExperiência”,queregistroupelaprimeiravezo

1AutoCAD,PhotoshopeIllustratorsãosoftwaresdecriaçãoemanipulaçãodeimagenscomumenteutilizadospordesignersearquitetos.

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movimentodevalorizaçãodaexperiênciapelasáreasdenegóciosdasempresas.PineII

e Gilmore escreveram também um livro homônimo, onde traçam uma escala de

progressãohistóricadovaloreconômico.Aescalaseinicianaeconomiaagrária,focada

na extração de bens, sem uma necessidade de diferenciação competitiva entre os

membros da economia. Em seguida veio a economia industrial, com amanufatura de

produtos,edepoisaeconomiadeserviços,ondeaentregadeserviçoseraaatividade

econômica quemais gerava recursos. Hoje, a experiência do cliente está no cerne da

economia. O valor de uma empresa está em proporcionar experiências desejáveis e

memoráveisaosclientes.Nãobastaserumbem,umamercadoria,umserviço.Oproduto

demaior valor na nova economia é bastante intangível. Está na interação do usuário

comamarcaduranteasuajornadadedescobertaeuso.

Figura1-AProgressãodoValorEconômico2

A experiência, curiosamente, sempre foi a principal matéria prima de uma

indústria específica: a do entretenimento. Bem antes da economia da experiência ter

sido declarada, o cinema, o teatro e, de forma exemplar, os parques de diversões já

conseguiam orquestrar jornadas imersivas e atraentes para o seu público. Cada

momentodeinteraçãoemumparquedediversõeséestudadoedesenhadonosmínimos2TraduzidopeloautordePineIIeGilmore(1998).

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detalhes para surpreender os visitantes. Desde a chegada no estacionamento até o

embarquenumaatração,todasasetapassãopreparadascomoumacena,comroteiros,

marcações e regras. Essemodo de pensar no atendimento ao cliente inspirou outros

setoresdomercadoareavaliaremoproduto finaldesuasempresas.Anovaeconomia

coloca suas lentes sobre o desejo humano e usa o design centrado no usuário para

viabilizaroseunovoproduto:aexperiência.

Cinco diretrizes são sugeridas para o desenho de experiência pelos autores do

artigo:

1. Tematizeaexperiência

2. Complete-acomtodososdetalhes

3. Harmonizeasimpressõescompontospositivos

4. Elimineospontosnegativos

5. Adicioneelementosmemoráveis

Para a nova economia, a memória da experiência é objetivo principal dos

investimentosderecursos:Umaexperiênciaocorrequandoumaempresautilizaintencionalmenteserviçoscomopalcoeprodutoscomoadereçosparaenvolverconsumidoresecriarumevento marcante. Bens são fungíveis, produtos são tangíveis, serviços sãointangíveiseexperiências,memoráveis(PINEIIeGILMORE,2016).

Experiênciassãomanifestaçõespessoais,internasdecadaindivíduo.Existemna

formadeemoções,expectativas,desejosepensamentos.Umanuncaéigualaoutra,pois

cada indivíduo apresenta uma predisposição e um estado emocional diferente ao

engajar-seemumajornadadeexperimentação.Osautorespropõemumdiagramacom

quatrodomínios como formade entender essas diferenças.Odiagrama é estruturado

com base em dois eixos relacionados à predisposição do consumidor: participação e

conexão:Uma forma para refletir a respeito das experiências é por meio de duasdimensões. A primeira delas corresponde à participação do consumidor. Emumadaspontasdoespectroestáaparticipaçãopassiva,naqualoconsumidornão influencia em nada a performance. Entre esses participantes estão, porexemplo, espectadores de uma sinfonia, que vivenciam o evento comoobservadores ou ouvintes. Na ponta oposta do espectro está a participaçãoativa, na qual o consumidor tem um papel fundamental na performance ouevento do qual emergirá a experiência. Entre eles estão os esquiadores, porexemplo.Asegundadasdimensõesdaexperiênciaestárelacionadaàconexãoourelaçãoambientalqueuneoconsumidoraoeventoouperformance.Emumapontadoespectrodaconexãoestáaabsorção,ea imersãoestánapontaoposta.Quemassiste ao Kentucky Derby da arquibancada principal consegue absorver o

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evento que está acontecendo à sua frente e abaixo de si. Por outro lado, osespectadoresempénomesmoníveldapistaestãoimersosnasimagens,sonsecheiros que os circundam. Fazer anotações freneticamente durante umapalestrageramuitomaisabsorção (ouseja, émuitomaisenvolvente)que lerum livro-texto;assistiraum filmenocinemaemmeioaumaenormeplateia,com uma enorme tela e som estéreo é muito mais imersivo que assistir aomesmofilmeemvídeonasaladecasa(PINEIIeGILMORE,2016).

Figura2–OsQuatroDomíniosdaExperiência3

O diagrama proposto por Pine II e Gilmore (1998) revela quatro possíveis

categoriasdeexperiências,aquidenominadasdomínios:

1. Entretenimento: as experiências onde a participação do indivíduo é

passiva e sua conexão é assimilativa. Enquadram-se nessa categoria

atividadescomoassistirtelevisãoouiraumconcerto.

2. Educativas:caracterizam-seporumaparticipaçãomaisativadoindivíduo,

ainda que mantenham um distanciamento do evento. Exemplos de

atividadeseducativas:assistiraumaaula,fazerumcursodedança.

3. Escapistas:essasexperiênciaspodemsereducativasedivertidascomoas

categorias anteriores,mas trazem o indivíduo para dentro do evento. O

3TraduzidopeloautordePineIIeGilmore(1998).

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mesmo fica imerso na experiência, como quando atua em uma peça de

teatro,tocauminstrumentooufazumaescalada.

4. Estéticas: são experiências de imersão em uma atividade ou ambiente,

massemqueoindivíduotenhaumaparticipaçãoativa.Comoumavisitaa

umagaleriadearte,umasessãodecinema3D.

A progressão do valor econômico, da extração de bens à encenação de

experiências, representa também a progressão do design. Assim como os objetos, as

experiênciasprecisamserdesenhadasparaatenderumanecessidadehumana.Precisam

de estrutura, forma e função. Dependem de um processo de pesquisa, desenho,

desenvolvimento e constante refinamento. Precisam contar uma história, criar uma

conexãoemocionalcomoconsumidor.

Osdesafiosdodesigndaexperiênciapassaramaserinvestigadosnasempresase

na academia.Umadas correntes filosóficasmais importantesparao entendimentoda

experiêncianouniversoacadêmicoéafenomenologia.Apesquisafenomenológicatem

umarelaçãodiretacomodesignpoisestudaaexperiênciaafetiva,estéticaeintencional

do homem e seu corpo nomundo. Explora amaneira como os instrumentos, objetos,

nossoambientefísicoesocialinfluenciamaexperiência,acogniçãoeapercepção.Essa

forma direta de pensar as interações do homem com o mundo e, principalmente, a

importânciada intençãonoprocessocognitivo, influenciouváriosestudosacadêmicos

acercadodesign.

2.1Modeloinicialparaentendimentodaexperiência

Um estudo importante para o entendimento da experiência como objeto de

designfoirealizadonamesmaépocaemqueomundocorporativodiscutiaaeconomia

da experiência. Duas pesquisadoras da Escola de Design da Universidade Carnegie

Mellon nos Estados Unidos, construíram um framework inicial para designers de

interaçãocombasenumateoriadaconsciênciaconhecidacomocogniçãoexperimental,

criadaporRichardCarlsonemlivrohomônimo:O ponto de vista da cognição experimental defende que os objetivos dedeterminada pessoa a qualquer momento afetam o conteúdo do que évivenciadoequaispossibilidadesdoambiente,dosartefatoseoutraspessoassetornammaisdestacados.O ineditismodasituaçãomoldarácomoousuário“sairá da história” e passará a ver e sentir algo que lhe é novo (FORLLIZZI eFORD,2000,p.421).

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ApropostadaspesquisadorasForllizzieFord(2000),denominadaThebuilding

blocks of experience: an early framework for interaction designers, pretende criar uma

forma sistemática de se falar sobre a experiência, facilitando a discussão e o

entendimentodotemapelosdesigners.Começandopordefinirtrêsformasdesereferir

àela:experiência,umaexperiênciaeexperiênciacomohistória.

1. Experiência:a formamaissimples,caracterizadapelo fluxoconstantede

pensamentosqueacontecemnumperíododetempo.Podemosidentificar

esse tipo de experiência quando realizamos uma narração interna das

nossasações.

2. UmaExperiência: temum começo e um fim. Provoca emoções, ocasiona

mudançasnoindivíduo,influenciasuasatitudesecontexto.

3. Experiênciacomohistória:estárelacionadaànossacomunicação,ànossa

intenção de condensar, lembrar e compartilhar momentos. São aquelas

experiências mais memoráveis, que conseguimos articular em uma

conversacomoutraspessoas.

Figura3–Frameworkinicialdaexperiência4

Quatrocomponentessãoadicionadosaoframework,chamadosdedimensõesda

experiência:subconsciência,cognição,narrativaerelatodahistória(storytelling).

Experiências subconscientes são descritas como aquelas que não exigem a

atençãodoindivíduo,nãodemandamesforçocognitivo,acontecemdeformaautomática

oufluente.Sãoaçõesaprendidaseexecutadasdeformahabitual.

4TraduzidopeloautordeForllizzieFord(2000,p.421).

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A dimensão da cognição representa as experiências que demandam a reflexão

sobre a ação: interações com novos sistemas, ambientes não familiares e tarefas que

exigematenção,deduçãoouresoluçãodeproblemas.Todoprimeiroacessodousuárioa

um produto ou sistema é uma experiência cognitiva, podendo ser desenhada para

proporcionaraprendizadoefacilitaroseuusohabitual.

Anarrativatraduzasexperiênciasqueforamformalizadasnamentedoindivíduo

após um esforço analítico. É a síntese através da linguagem, o discurso das ações e

percepções experimentadas. Todoprodutoofereceumanarrativadeuso ao indivíduo

pormeiodesuaspropriedadesepossibilidadesdeinteração.Oindivíduo,porsuavez,

usaoprodutode formapessoal, selecionandoaspropriedadesmaisadequadasaoseu

contexto, seu estado emocional e expectativas. Podemos dizer que o indivíduo, agora

usuário do produto, cria um roteiro único, uma história pessoal. A dimensão

denominadarelatodahistóriarepresentaoroteiroformalizadodaexperiênciadeuso,

carregadodesignificadopessoalecompartilhadocomoutrosindivíduos.

Apropostadoframeworképrovocarareflexãodosdesignersdeinteraçãosobre

asdimensõesdaexperiência.Comoumaexperiênciaeducativa,porexemplo,passada

dimensão cognitiva, onde o aluno se empenha em aprender uma tarefa, para uma

dimensão subconsciente, onde o aluno realiza a mesma tarefa de forma habitual,

automática. Ao observar essas transições pelas dimensões da experiência podemos

entender os requisitos para o design de interação. Quais são as técnicas ideais para

provocarmudanças na experiência a fimde torná-lamemorável, digna de um roteiro

pessoaldeuso.Afinal,esteéomovimentoquemaisinteressaaodesign:Épossívelentenderqueumbomprodutoéaquelequeofereceumanarrativaconsiderada boa ou memorável que envolverá o usuário, a qual ele irátransmitir para outras pessoas seja compartilhando o artefato, seja falandosobreele(FORLLIZZIeFORD,2000,p.422).

2.2Interaçõesfluentes,cognitivaseexpressivas

Alguns anos depois, Forlizzi J., uma das autoras do The building blocks of

experience: an early framework for interaction designers, evoluiu a abordagem do

framework em um estudo em parceria com outra pesquisadora, Battarbee K., da

Universidade de Arte e Design de Helsinki. A nova proposta mantém o foco nas

interaçõeshomem-objetocomoaprincipallentedeentendimentodaexperiênciapelos

designers.

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Omodeloanteriorémodificadopara três formasde interaçãousuário-produto

(FORLLIZZIeBATTARBEE,2004):

1. Fluentes: antes chamadas de subconscientes, são as interações mais

automáticasehabituaisderivadasdeaprendizadosepráticasanteriores.

Nãocompetempelanossaatenção,liberandoofocoparaoutrosprocessos

cognitivos.

2. Cognitivas: são as interações que demandam foco no uso do produto.

Podem resultar em aprendizado, confusão ou erro, dependendo do

contextoedasreferênciasdousuário.

3. Expressivas: são as interações onde o usuário cria uma história sobre a

sua experiência com o produto. O produto é modificado, adaptado e

personalizadopelousuárioparaproporcionarummelhorencaixeàssuas

necessidades. Este esforço criativo espontâneo do usuário acontece

quandooproduto favorece este tipode interação.A consequência é um

vínculomaiorentreousuárioeoobjetodeinteração.

Comonomodeloinicial,aexperiênciaédivididaemtipos.Osdoisprimeirossão

os mesmos: experiência e uma experiência. No novo modelo o contexto social da

experiênciaévalorizadoeredefineoqueanteseraclassificadocomonarrativaerelato

da história (figura 4). Passamos a considerar um terceiro tipo de experiência

denominadocoexperiência.Acoexperiênciaéumaterceiraformadesefalarsobreexperiência.Elaenvolveaexperiênciadousuárioemcontextossociaiseacontecenamedidaemqueasexperiências são criadas conjuntamente ou compartilhadas com terceiros. Aspessoasconsiderarãoquevaleapenacompartilhardeterminadasexperiênciase as ‘melhorarão’ para os outros. As experiências compartilhadas permitemdiversas interpretações por parte das pessoas – podem considerá-lasprevisíveis e agradáveis ou surpreendentes e até mesmo fora da curva. Porexemplo, uma pessoa pode retribuir, rejeitar ou ignorar uma experiência.Portanto,aexpressãodossignificadoséestimulada–eosprópriossignificadossãoelaborados–pelacoexperiênciapormeiodainteraçãosocial(FORLLIZZIeBATTARBEE,2004,p.263).

Onovomodelomostra-semaisaderenteàatualidadedasexperiênciashumanas,

cadavezmaispermeadaspelatecnologia.Ossistemasdeinteraçãohumano-computador

sustentam e impulsionam a coexperiência ao disponibilizarem canais acessíveis de

comunicaçãoefacilitaremacriação,ediçãoecompartilhamentodeconteúdocomoutros

indivíduosatravésdarede.

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Figura4–Adinâmicadaexperiênciadeinteraçãoindividualesocial5

Quando um indivíduo interage com um produto, suas experiências fluemdinamicamente entre tipos de interação fluentes, cognitivos e expressivos àmedida que elas acontecem. A coexperiência é o processo de melhorarexperiênciasparaapercepçãodosoutros,quandoelassetornampartedeumprocessosocialdeinterpretaçãoquepodeinfluenciaroqueaexperiênciaviráarepresentarparacadapessoa(FORLLIZZIeBATTARBEE,2004,p.264).

OmodelodeForllizzieBattarbee(2004)permiteentenderarelaçãodiretaentre

o conceito de experiência, amplo e muitas vezes intangível, e as interações homem-

objeto. Surgiu num momento da história onde os designers precisavam criar novas

ferramentas de trabalho para atender às demandas de uma indústria tecnológica em

expansãoedeumaeconomiatotalmentevoltadaparaoconsumidordigital.

As interações do homem com o mundo passaram a ser intermediadas por

aparatosdigitais.Nãosomosmaisosmesmospoisnossaslimitaçõesdecorpoemente

foramredefinidasapósoacoplamentodatecnologiamóvelaonossocorpofísico.Nesse

contexto,queexperiênciasdevemosentregarparaessenovohumano?

5TraduzidopeloautordeForllizzieBattarbee(2004,p.264).

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2.3Novoshumanos,novasformasdeinteragir

Em seu livroOmundo codificado, publicado em 2007, o filósofo Vilém Flusser

relataaevoluçãohistóricadasinteraçõeshomem-máquina.Numprimeiromomentoera

o homem cercado de suas ferramentas, numa economia baseada namanufatura e na

extraçãodebensdanatureza.ARevoluçãoIndustrialinverteuessarelação:oshomens

cercaramasmáquinas,foramatéasfábricasparaoperá-lasemlinhasdeprodução.Hoje,

graçasà interneteaosavançostecnológicosestamosnosacoplandoàsmáquinaspara

vivernummundoultraconectado.

Vivemosummomentoondeocontextotecnológicoinfluenciaemodificaanossa

forma de pensamento. Existe umamudança na forma de perceber omundo real por

conta do mundo virtual. Todos estão conectados. Tudo está conectado e é smart: o

celular,orelógio,osóculos,aroupa,acasa,acidade.Estamoscercadosdedispositivos

digitaisaltamentefuncionaiseminuciosamentedesenhados,queentregamexperiências

interativas cada vezmais inteligentes e íntimas. Os dispositivos transformam-nos em

pós-humanos, indivíduos integrados a sistemas de informação de forma contínua. A

nossa realidade não é mais a mesma, ela é aumentada. Nosso corpo se adapta e se

calibra aos dispositivos acoplados que, por sua vez, sentem o corpo e interpretam os

dadosrecebidospelossensores.

Ofascinanteconceitodocorpoedamenteestendidafoibastanteexploradopor

pesquisadoreseautoresdosmaisdiversosestilos.Deobrasdeficçãocientíficaaartigos

acadêmicos. Um dos principais trabalhos sobre o tema, de Andy Clark e David J.

Chalmers (2000), define a influência do meio-ambiente na condução dos processos

cognitivoscomoexternalismoativo.Nessescasos,oorganismohumanoestáconectadoaumaentidadeexternaemuma interação de duas vias criando um sistema em par que pode serinterpretado como um sistema cognitivo em si. Todos os componentes dessesistema representam um papel causal ativo e governam conjuntamente ocomportamentodamesma formaque a cogniçãonormalmente o faz.Quandoremovido o componente externo, a competência comportamental do sistemairá decair damesma formaque ocorreria se removêssemos parte do cérebro(CLARKeCHALMERS,2000,p.62).

A ideia de que a cognição é uma atividade do corpo tem sido enfatizada por

cientistascognitivosnosúltimosanos.ComoapontaDanielKahneman(2015,p.68),“A

cogniçãoécorporificada;vocêpensacomoseucorpo,nãoapenascomoseucérebro”.A

cognição se estende alémdo corpo, até os processos que ocorremnomundo à nossa

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volta,atéosinstrumentosqueusamosparaapoiarasnossasatividadescognitivas.Papel

elápis,porexemplo,nãosãoapenasinstrumentosquefacilitamumatarefadedesenho;

elespodemservistoscomocomponentesdonossoprocessocognitivo.Umsmartphone

podesertãoessencialparaamemóriaquantooprópriohipocampo.Nossahabilidadede

locomoção pela cidade melhorou muito depois que incorporamos o GPS (The Global

PositioningSystem–SistemadePosicionamentoGlobal)ànossarotina.Aoinstalaresses

instrumentosnonossocotidianoestamostambémnosinstalandoneles.Podemosfazer

aquiumreferênciaàsinteraçõesfluentes,tratadasanteriormentenomodelodeForllizzi

eBattarbee(2004).Nossousoconstantededispositivoseinstrumentosanexosaocorpo

criaumaconexãocognitivaautomática,gerandohábitos.

Numainterpretaçãoextremadoconceitodamenteestendidapodemosimaginar

que tudo o que está na internet, está na mente do usuário. Uma vez acoplado a um

smartphone,o indivíduotemasuamemóriaestendidaatodososregistrosdisponíveis

narede,podendopouparesforçocognitivoparaoutrasatividadesmaisimportantes.

ParaAndyClarkeDavidJ.Chalmers(2000),alinguagemtemumpapelcentralna

extensãodonossocorpoementecognitivosnomundo.Éatravésdalinguagemquenos

comunicamoseestendemosonossoestadointernoaomundo:A linguagem parece ser uma das principais formas por meio da qual osprocessos cognitivos são estendidos para o mundo. Imagine um grupo depessoas realizandoumbrainstorming ao redordeumamesa, ouuma filósofaquepensamelhorpormeiodaescrita,desenvolvendosuasideiasàmedidaqueelasocorrem.Podeserquealinguagemtenhaevoluídotambémparapermitirtais extensões dos nossos recursos cognitivos dentro de sistemas em paresativos(CLARKeCHALMERS,2000,p.67).Alinguagem,nestaconcepção,nãoéumespelhodenossosestadosmentais,elaos complementa. Ela funciona como uma ferramenta cujo papel é estender acognição como os dispositivos embarcados não conseguem fazê-lo (CLARK eCHALMERS,2000,p.74).

Uma outra questão interessante na hipótese da mente estendida é a extensão

social da cognição. Como o estado mental das outras pessoas pode influenciar um

indivíduo? Num contexto de relações baseado em redes sociais, como a cognição

individualseestabelecemediantetantasinterações?E a cognição socialmente estendida? Osmeus estadosmentais poderiam serparcialmente constituídos pelos estados de outros pensadores? Não vemosmotivos pelos quais isso não aconteceria, a princípio (CLARK e CHALMERS,2000,p.72).

A cognição socialmente estendida sugere a ideia de uma mente universal

interligada pela tecnologia e expõe a vulnerabilidade do nosso sistema cognitivo.

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Retornamos a um debate clássico relacionado à integração corpo-tecnologia: afinal, é

bom ou ruim? Está muito claro que o acoplamento do nosso corpo aos aparatos

tecnológicos facilita os nossos processos cognitivos, mas muitos debates surgem a

respeito dos limites saudáveis desse acoplamento. Estamos ficando dependentes?

Viciados?Quaisoslimiteséticos?Quaisoslimitescomerciais?

Não se trata de um debate simples, pois devemos considerar que existem

diferentestiposdeacoplamento.Algunsestruturais,outroscomplementares.Comoexatamentesomospareadoscomferramentas,tecnologiaseambientes?Ou seja, o processo cognitivo é, algumas vezes, constituído e, algumas vezes,apenas facilitado, dependendo da natureza do pareamento entre o corpo e oambiente. É importante notar que isso dependerá tanto dos diversos hábitoscorporais, da condição do corpo e da natureza das práticas corporaisenvolvidas,bemcomodaconformaçãoecondiçãodoambiente(GALLAGHER).

Odebatesefortalecequandovemosatecnologiaevoluindoehabitandocadavez

maisasnossasinteraçõescomomundo.Osdispositivosficamcadavezmaisíntimose

passam a sentir e interpretar o nosso corpo. Aplicativos conectados a sensores e

assistentes virtuais inteligentes sabemmais de nós do que qualquer outra pessoa já

soube,poisacessamnossosdadosdeformacontínuaeininterrupta.Osdadosextraídos

doindivíduosãoutilizadosparagerarumainterpretaçãobemcomoumarepresentação.

Olimiteentreoindivíduoeasuaextensãoficacadavezmaistênue.

O ambiente também afeta nossomodo de pensar e pode ser considerado uma

extensãodonosso corpo.Amaneira comodesenhamoso espaço físico e dispomos as

ferramentas ao nosso redor influenciam nossos processos cognitivos. Nossa

criatividade, aprendizado e resolução de problemas podem ser estimulados ou

prejudicados pelo ambiente. Dessa forma, assumimos diferentes papéis emdiferentes

espaços, com diferentes ferramentas. Somos mutantes, e isso é uma importante

característicaquenosfazhumanos.Agregamosobjetos,pessoas,animaisedispositivos

à nossa vida para evoluir. Talvez a nossa história de evolução esteja diretamente

atreladaaonossoacoplamentocomomeioambiente.Talvez haja outros casos em que a evolução viu vantagem em explorar apossibilidadedo ambiente estar no ciclo cognitivo.Nesse caso, o pareamentoexternoépartedopacoteverdadeiramentebásicodosrecursoscognitivosqueutilizamosparavivenciaromundo(CLARKeCHALMERS,2000,p.66).

Nesse contexto, onde o homem se funde com a tecnologia e tem novas

experiênciasdemundo,odesign temumpapeldecisivo.Ademandaporexperiências,

reais ou virtuais, meticulosamente desenhadas cresceu com contexto econômico e

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tecnológico.Oqueoconsumidoresperadasgrandesmarcasnãoéapenasumproduto

bemdesenhado,masumasériede serviços surpreendentes juntoaele.O consumidor

passou a se denominar usuário, pois interage com a marca em múltiplos pontos de

contato,criaconexão,expectativaseumahistória.Odesignernãopodepensarapenas

noproduto,naformaefunção.Precisapensarnasinteraçõesdousuáriocomamarca.

Precisapensarnosaspectosemocionaisdaexperiência.Precisapensarna intençãodo

usuárioerefletirsobreasuaprópriaintençãocomodesigner.

2.4Aevoluçãodopapeldodesigner

Naúltimadécada,odesenhodaexperiênciadocliente,ouuserexperiencedesign

(UXdesign), emergiu rapidamente comoumnovoparadigmanodesign de interações

homem-computador (HCI – Human Computer Interaction). O UX design expande a

atuação focada em usabilidade e desempenho dos sistemas, puramente orientada a

tarefas, para uma atuação além do instrumental, que considera as emoções como

qualidades centrais da interação e enfatiza a experiência como um todo. OUX design

tem uma abordagem mais global das interações homem-computador pois busca a

construçãodeexperiênciasricasenãoapenasaresoluçãodeproblemas.Solucionaras

falhas de um produto pode resolver um problema imediato, mas não garante uma

experiênciarealmenteboa.EspecialmenterelevantenestecontextoéosurgimentodosFatoresHumanos,ouergonomia,adisciplinaquebuscaentendera interaçãoentrehumanoseatecnologia na qual a colaboração entre a psicologia e os designers levou aodesenvolvimento de diversas novas práticas para tornar as tecnologias maisseguras, eficientes e fáceis de seremutilizadas, otimizandode forma ampla odesempenhoeaprodutividade(...). “Fatores”,nestadisciplina, serelacionaàspropriedades físicas, cognitivas ou comportamentais dos indivíduos e gruposquepodeminfluenciaraqualidadedeumatecnologia.Porexemplo,imagineaspropriedades do nosso próprio corpo que precisam ser consideradas ao seprojetar uma cadeira confortável, ou as habilidades cognitivas que limitam aquantidade de informações que conseguimos absorver no curto prazo. Apesquisa nesta área de interface entre ciência comportamental, psicologia etecnologialevouaavançosfundamentaisnodesigndeequipamentos,sistemase métodos de trabalho de forma a aumentar o conforto, saúde, segurança,confiabilidadeeprodutividade.Elaexemplificacomoodesignpodesededicaràmelhoriadobem-estaredafuncionalidade(CALVOetal.,2016,p.2)

O indivíduopós-informacional, inseridonumcontextoultraconectado, temuma

relação íntima coma tecnologia.Apredominância e a grande adoçãodosdispositivos

móveis sãoosgrandes impulsionadoresdessaeramóvel.Paraumagrandeparcelada

populaçãoeconomicamenteativa,sãorarososmomentosemqueatecnologianãoesteja

presente ou acoplada ao corpo. Seja durante o trabalho, o tempo de lazer oumesmo

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duranteosono,temosdispositivosemconstantevigília,observando-noserespondendo

aosnossoscomandos.

Umaexperiência fluídacoma tecnologiapressupõeummundoultradesenhado,

constantemente atualizado e disponível. Muitas empresas tradicionais, com seus

processos e burocracias, falham ao acompanhar o ritmo das demandas dessa nova

geraçãodeclientes.Alémdedomíniosobrenovastecnologiasecapacidadedeentrega

rápida, é fundamental o entendimento dos fatores humanos para o desenho da

experiência do cliente. O ofício do designer nesse contexto é essencial para a

transformaçãodaempresaaoestabelecerumanovaprioridadenoprocessoprodutivo:

oclienteprimeiro.

Deumacertaforma,aabordagemcentradanousuáriosempreestevenoDNAdo

design.Odomínio sobre osmateriais e sobre a tecnologia permitiramque o designer

pudesse, cada vez mais, focar seus esforços no entendimento do humano. Para isso,

criou métodos, processos e ferramentas. Escolas de design formalizaram essa

abordagem em disciplinas quemesclam conhecimentos da Psicologia, Antropologia e,

maisrecentemente,EconomiaComportamental.Todosprecisaramaprenderaformade

pensardodesigner.

2.5DesignThinking

No passado, os designers focavam apenas no desenvolvimento do produto – e

iammuito pouco além disso.Mais recentemente, passaram a aplicar os princípios do

design não só a produtos físicos mas também à experiência do consumidor, aos

processos de produção e interação e àsmelhorias que tornam produtos já existentes

mais atraentes ou funcionais. Tim Brown, sócio de um dos principais escritórios de

designdoValedoSilício,foiumdosprincipaispropagadoresdessemododepensardo

designer,denominadoDesignThinking.JuntocomDavidKelley,seusócioeprofessorda

escoladedesigndeStanford,aplicouumavisãodenegóciosaosconceitosacadêmicos

dedesigncentradonohumanoefezdaIdeo6umareferênciamundial.

6AIDEOéumadasprincipaisconsultoriasinternacionaisdeDesigndaexperiênciaedeinovação.Fundadaem1991emPaloAlto–CA,nosEstadosUnidos,hojepossuiescritóriosnasprincipaiscapitaisdomundo.

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Figura5-ProcessodeDesignThinking7daIDEO

Desenhar com foco no usuário pressupõe começar por ele: falar com ele,

observar suasações,mergulharemseumundoeentender suasexpectativas,medose

motivações.Apalavra-chaveparaessaetapainicialéempatia,acapacidadepsicológica

de sentir o que sentiria o outro, tentar compreender sentimentos e emoções,

procurando experimentar de forma objetiva e racional o que sente o outro. Assim, o

pontodepartidadodesignersãoassuasdescobertasconcretasarespeitodousuário.

Para abstrair, analisar, categorizar e recolocar essas descobertas, os designers

contam com um arsenal demétodos de síntese e ideação. Eventualmente, chega-se a

umavisãoquepodeserformalizadaemprincípiosdedesignouemumaestratégia.

Parasairdoabstrato,odesignerprecisarealizarasuavisãoemoportunidades

concretas,quevenhamaatenderoseuusuário.Doconcretoaoabstratoedevoltaao

concreto.Esteéofluxobásicodopensamentododesigner(figura5).

VáriosmodelosgráficosforamcriadospararepresentaraabordagemdoDesign

Thinking. Um dos mais utilizados é o Duplo Diamante, criado por uma entidade

7AdaptadoetraduzidopeloautordoprocessodedesignthinkingdaIDEO,disponívelem:https://www.ideo.com/post/design-kit

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internacional de design chamada Design Council8, que evidencia os estados mentais

convergentesedivergentesdoprocesso(figura6).

Como apresentado por Brown (2009) em seu livro ChangebyDesign, ao fazer

Design Thinking, nos movemos ao longo de quatro estados mentais. O pensamento

divergentegeraalternativasparaarealidadeatualeapresentamaisopções.Emseguida,

opensamentoconvergenteajudaaorganizarasopçõeseescolheroqueémelhor.Então,

vem análise e síntese. A análise detalha os padrões e a síntese identifica padrões

relevantes, à medida que eles são reorganizados. Mova-se ciclicamente avançando e

retornandoaolongodessesestadosparageraronovo,analisá-lo,selecioná-loe,então,

examiná-lonaprática–frequentementereiniciandotodoprocessodesdeoinício.

Figura6-DuploDiamante9

ODesignThinkingpassouaserutilizadoumprocessoobrigatórioemempresase

projetoscomcarátertecnológicoedeinovação.

Inovadores usam o Design Thinking para se mover ao longo de três fases

principais:durantea inspiração,elesvivenciamumproblemaouoportunidadequeos

colocaemação;duranteaideação,elesgerametestamideias;duranteaimplementação,

eles transpõema inovaçãodasaladeprojetosparaomercado.Emboracirculedentro

8ODesignCounciléumaentidadedeDesignreconhecidacomoumaautoridadeinternacionalnousodedesignestratégico.Fundadaem1944parademonstrarovalordodesignindustrialnaInglaterrapós-guerra,oDesignCouncilhojetrabalhaparamelhoraravidadaspessoasatravésdodesign.9TraduzidopeloautordowebsitedaDesignCouncil:http://www.designcouncil.org.uk/news-opinion/design-process-what-double-diamond

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dessas fases, o Design Thinking opera dentro de uma estrutura com três limitações

sobrepostas:praticabilidade,ouoqueefetivamentepodeserrealizado;viabilidade,ouo

quepode ser executandodentrodo contextodenegócios; desejabilidade, ouoque as

pessoasdesejamouirãodesejar.

Comotempo,oUXDesignsedesdobrouemDesigndeServiços(ServiceDesign-

SD) e Design de Experiência do Consumidor (Customer Experience Design - CX),

variaçõesdamesmaabordagemsobreescoposdeprojetodiferentes.Paraosdesigners

de serviço (SD), por exemplo, é preciso aplicar o Design Thinking para construir não

apenas os pontos de contato com o usuário, mas também todos os sistemas que

suportamoserviçoqueentregaaexperiência.ParaosdesignersdeCX,atarefaseaplica

também aos pontos de contato além dos ambientes proprietários da empresa. Mas,

apesardatentativadediferenciação,sãodenominaçõesmuitosemelhantesequegeram

confusão dentro da própria comunidade de design. Émais fácil pensar numa grande

convergênciadeabordagens(UX,SD,CX).

Os UX designers provaram sua importância na entrega de experiências para o

novocontextoeconômico.Produtosfáceisdeusar,serviçoscativanteseinteraçõeslivres

de fricção são os subprodutos de experiências fluídas e prazerosas. Mas o designer

precisa continuar o seu processo de evolução aprofundando o seu entendimento dos

fatores comportamentais e emocionais do usuário. E,mais importante, analisar a sua

intenção. Somente através do alinhamento das intenções do designer e do usuário

teremosumapráticadedesignrealmentecentradanohumano.

Nospróximoscapítulosvamosexplorartrêslinhasdeestudoquetêminspiradoa

evoluçãodotrabalhodosdesignersdeUX:designdohábito,designemocionaleDesign

Positivo.

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3DESIGNDOHÁBITO

3.1Ospapéispersuasivosdosmartphone

O futuro da persuasão émóvel. Eu acredito que os telefonesmóveis logo setornarão a plataforma mais importante para a mudança de comportamento.Dentrode15anos,nenhumoutromeio–TV,boca-a-boca,a rede–serámaiseficaz em mudar o que nós humanos acreditamos e o que fazemos. (FOGG,2007,p.05)

BJ Fogg, criador do Laboratório de Tecnologia Persuasiva da Universidade de

Stanford,escreveuestafrasenolivroMobilePersuasionem2007,exatamenteoanoem

que a Apple lançou seu primeiro iPhone e marcou o início da era de ouro dos

smartphones. Na época, as evidências do crescimento dessa nova plataforma de

interação apontavam para um futuro em que os usuários estariam intimamente

conectadosaosseusminicomputadorespessoaisportáteis,deformaquaseobsessiva.

De fato,estaprevisãode futuroseconcretizou.A interaçãohomem-smartphone

pode hoje ser comparada a um intenso relacionamento interpessoal, talvez o mais

duradouro de todos. A tecnologia móvel nos acompanha o tempo todo, em nossas

tarefasdiárias,lazer,descanso,decisõesedúvidas.Étestemunhaonipresentedasnossas

emoçõesecúmplicedenossasações.Etemnossoavalparaisso.

O cenário atual permite uma compreensão mais consistente dos três papéis

persuasivos relacionados aos smartphones descritos por Fogg (2007): o concierge, o

instrutoreobobodacorte.

1. Concierge: quando precisamos de informação ou orientação, buscamos

respostasnocelular.Ali seencontraomaior registrode informaçõesdo

mundo, condensado e disponível através de uma conexão à internet.

Desde saber o melhor e mais rápido caminho para casa até descobrir

instantaneamenteonomedamúsicaqueestátocandonorádio.Centenas

deaplicativos e serviços automatizadosde informaçãoestãodisponíveis

para que o papel do concierge virtual seja o mais eficiente possível. A

posturadousuárioéativaesódemandaumaaçãodeinput(digitaçãoou

voz) para que uma resposta precisa e personalizada do concierge seja

emitida.

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2. Instrutor: quando precisamos de um estímulo para tomar uma ação, o

smartphone pode assumir o papel de um instrutor. De posse de dados

sobrenossa rotinae agendapessoal, o smartphone assumeumapostura

ativa, alertando-nos sobre compromissos importantes e controlando o

nossotempo.Nãohámaisdesculpaplausívelparaoesquecimentodeum

eventoimportante,sejaumareuniãodenegóciosouoaniversáriodeum

amigo. Aplicativos especialmente desenhados para explorar os sensores

embutidos no aparelho permitem que nosso comportamento seja

rastreado e interpretado. Os nossos movimentos são registrados e

classificadosempadrõesdeatividadefísicaerepouso.Comoinstrutor,o

celular pode agora nos incentivar a fazer exercícios ou dormir na hora

certa.Aposturadousuárioépassiva,eleesperaumestímuloqueesteja

intimamenteconectadoaoseucontexto,àssuasmetaspessoais.

3. Bobo da corte: quando queremos nos divertir, nos distrair com jogos e

informações engraçadas ou interagir com amigos em redes sociais o

smartphoneestáali,prontoparanosajudar.Àsvezesprocuramosobobo

da corteparanos livrardo tédio, outras vezespara aliviar a pressãoda

rotina ou preencher o tempo. A indústria de jogos para dispositivos

móveisencontrouumterrenofértilnessanovarealidadehiperconectada.

O smartphone representa uma janela para essa realidade paralela de

diversãoedesafiosconstruídospixelapixel.Umescapefácildecontextos

vaziosedesinteressantescomoquandoestamosemtrânsitoouesperando

na filadomercado.Osmartphone comobobodacorteassumeseupapel

persuasivomaisperigosoemaispotencialmenteviciante.

Anossarotinaestárepletademomentosvazios,quesãoosgatilhosmaiscomuns

paraousodocelular.Seja jogandoCandyCrush10ouconsultandoasúltimaspostagens

dosamigosnalinhadotempodoFacebook,respondemosautomaticamenteaosgatilhos

dotempolivreenosrendemosaumhábitodefugadaociosidade.Mas,porquetemos

essatendênciaafugirdaociosidade?ChristophTürckeemseulivroSociedadeExcitada,

publicado em 2010, relata a análise de Gunther Anders sobre o tempo livre dos

10CandyCrushéumjogolançadopelaempresadejogoseletrônicosKing,em2012.InicialmentedesenvolvidoparaFacebookeposteriormenteparaasdiversasplataformasdesmartphoneséumdosjogoscommaiorsucessonasredessociais.

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americanosnosanos1950edecomoaociosidadesetransformouemalgonegativo.Em

resumo,estarocioso,emumasociedadecapitalista,representaumdesperdíciodaforça

detrabalho:O caso exemplar e mais extremo desse vazio moderno é dado pela força detrabalhodesocupada.Ésabidoqueantesdocapitalismoodesempregoeraumaocorrência esporádica. Ele só se tornou decisivo e uma ameaça à existênciaquandoamaioriadapopulação foiobrigada,paramelhoroupior,a levarsuaforçadetrabalhoaomercadoeaoferecê-laaosproprietáriosdosinstrumentosedascondiçõesdetrabalho.(TÜRCKE,2014,p.42)O medo da ociosidade foi descrito como “horror vacui”: “Seu trabalhoacostumou-otãodefinitivamenteaserocupado,ouseja,aserdependente,que,quandootrabalhoacaba,nãoconsegueestaràalturadatarefadeocuparasipróprio.(TÜRCKE,2014,p.43)

Com um smartphone ao alcance, somos capazes de gerar tarefas

instantaneamente, nos entreter e ocupar o tempo livre com interações ricas e

estimulantes.Oóciodeixadeserumaameaçaapartirdomomentoemqueestajanela

paraa realidadevirtualestáaberta.Umavezconectadosestamosagindo, interagindo,

criandosentidoparaaquelemomentovazioentreumcompromissoeoutro,entreum

assuntoeoutroouduranteumintervalocomercial.

Ainfluênciadaaltadisponibilidadedadistraçãomóvelnonossocomportamento

é brutal. Desde que a indústria cultural e os meios de comunicação de massa

estimularamaproduçãoeoconsumodeinformaçãodesenfreada,nuncaestivemostão

inquietos e ansiosos. As funções do emissor e do receptor, previamente estabelecidas

pela comunicação de massa, passaram por uma transformação irreversível com o

desenvolvimento tecnológico e a convergência da força produtiva em torno dos

computadores.Ele (o computador) já não tende a ser apenas um instrumento geral detrabalho, mas também a representar o entroncamento técnico, o ponto deencontrosocialeonevrálgicoindividual,emqueprocessamentoetransmissãode dados, televisão e telecomunicação, trabalho e atividade de tempo livre,concentração e distração, ser ‘bacana’ e ‘por fora’, observado e ignorado, semisturam até a indiferenciação. Baixar dados, enviá-los e recebê-los passa asignificaraatividadeporexcelência.Acompulsãoàocupaçãoéespecificadaemumacompulsãoàemissão.Ela transforma-se, entretanto, emuma formavitalde expressão. Emitir quer dizer tornar-se percebido: ser. Não emitir éequivalenteanãoser-nãoapenassentirohorrorvacuidaociosidade,massertomado da sensação de simplesmente não existir. Não mais apenas: ‘há umvácuoemmim’,porém‘souumvácuo’-deformaalguma‘aí’.(TÜRCKE,2014,p.44)

Não somos mais apenas receptores do conteúdo veiculado pelos meios de

comunicação.Somososautoresdonossopróprioentretenimento,assumindoa função

decuradoresedeemissoresdeconteúdo.Ainternetfacilitouaescolhaeaemissãoda

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informação, disponibilizando ferramentas de fácil compartilhamento e publicação

imediatadeconteúdo.Oespectadorpodeagoratransformaracontemplaçãopassivaem

umainteração,umaoportunidadedeseposicionarperanteamensagememanipulá-la.

Basta“curtir”paraemitirumamensagemeseexpressarnomundo,simplesassim.

Não estamos apenas combatendo o “horror vacui”. Mas sim obcecados pela

otimizaçãodonossotemponomundo,procurandodarcontadetodaainformaçãoque

nos é dada. A tecnologia móvel possibilitou que desenvolvêssemos comportamentos

híbridos em resposta a essa inquietação motora e cognitiva. Tuitamos enquanto

assistimostelevisão,mandamose-mailenquantoouvimosumanovaplaylistdoSpotify,

pagamos contas online enquanto assistimos à aula. Temos essa percepção de que

podemosserindivíduosmultitarefa,semelhantesaosdispositivosqueusamos.Poressa

razão, incorporamos as funções dos aparelhos às nossas rotinas mais básicas,

transformando nossos hábitosmaismundanos emmomentos intensos de interação e

sentido.

3.2OHábito

Smartphones, conectados continuamente à rede e com suporte a aplicativos,

podemcriarhábitos fortes.Homemecomputadornuncaestiveramtãoconectados,de

forma tãopróxima.Este forte vínculo entreousuário eodispositivomóvel forneceo

substrato perfeito para amodificação e a criação de novos hábitos. Basta analisar as

centenasdeaplicativosdisponíveisnas lojasdeaplicativos(appstores)queprometem

ajudar o usuário em suasmetas pessoais através damudança comportamental. Como

fazermaisexercícios,perderpeso,aumentaraprodutividade,ofoco,dormirmelhorsão

exemplosdaspromessasmotivacionaisdas altas tecnologiasdisponíveisnasgôndolas

digitais.MaxOgles(2016)autordolivro“Boost:HowtoCreateHabitsUsingPsychology

andTechnology” criouumguia online com117 aplicativos para smartphones voltados

paraacriaçãodebonshábitospessoais.Osaplicativossãoagrupadosemtemascomo

inspiração, autoestima, metas, saúde, influência social, filantropia, entre outros. A

compilaçãodeOgles, lançadano finalde2014, representaaprodução tecnológicados

últimosanoseéumbomexemplodaatual importânciadocomérciodeaplicativosna

economia e nos negócios. Vivemos neste presente ultraconectado onde qualquer

problema real tem uma solução digital correspondente na forma de um aplicativo

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encantadorefácildeusar.Aprobabilidadedeaderirmosaousodosaplicativoségrande

pois,defato,oapelodamudançadecomportamentooferecidapelosaplicativosémuito

atraente.Osindíciosdequenossoshábitossofremgrandeinfluênciadarelaçãohomem-

smartphone estão evidentes no nosso cotidiano. Já mudamos a forma de acordar,

transitar, fazer compras, pagar contas, ouvir música, fazer ginástica, conversar,

trabalhar,dormir.

Osmartphonepreencheotempo,eliminaaespera,transformaobanal,distraia

mente. Pode ser o melhor instrumento motivacional já construído pelo homem, tão

próximoe íntimoqueé capazde influenciaro comportamentodo indivíduode forma

persistente.Éaplataformaperfeitaparaaconstruçãodehábitosvirtuososoudenovose

perigososvícios.

3.3Estímulo-resposta

Apesquisacientíficaacercadoshábitoshumanosexistedesdeo finaldoséculo

XIX, quando a psicologia se propôs a estudar as manifestações da mente, os

comportamentos passíveis de observação em condições laboratoriais controladas. O

behaviorismo explorou pela primeira vez o processo estímulo-resposta através do

condicionamento. Pavlov, em seu clássico experimento com cães, provou o poder dos

estímuloscondicionadosemsuscitarreflexoscomportamentaisemanimais.Maistarde,

no início do século XX, John B. Watson estudou o processo estímulo-resposta em

humanos e provou que as emoções humanas também eram suscetíveis ao

condicionamento clássico. B. F. Skinner, já por volta dos anos 1950, evoluiu a teoria

behavioristaafirmandoqueumcomportamentoéaprendidoapartirdosresultadosdas

açõesdoindivíduo.Paraele,asconsequênciasdeumaaçãoerammaisimportantespara

a formaçãodo comportamentodoquequalquerestímuloanteriora ela. Sua teoriado

condicionamentooperanteedoreforçopositivotrazluzparaoentendimentodohábito

comoumcomportamentorepetido.

Sob a ótica do behaviorismo, faz sentido pensar sobre os dispositivos móveis

como uma grande máquina de hábitos. O processo estímulo-resposta, nessa relação

homem-dispositivo,podeservistosobdoisângulos:quandoosmartphoneéoestímulo

e quando ele é a resposta. Na primeira abordagem, o dispositivo é responsável por

provocar a nossa ação estando ali, disponível, conectado, obedecendo às nossas pré-

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programaçõeseentregandochamadas,notificaçõesealertas.Nasegundaabordagem,o

acesso ao dispositivo móvel é a resposta automática da nossa mente mediante um

contexto específico, como quando, instantaneamente, tiramos o celular do bolso ao

entrarnoônibus.

Charles Duhigg em seu livro O Poder do Hábito publicado em 2012 relata as

pesquisasrealizadasnosanos1990nodepartamentodeCiênciasCerebraiseCognitivas

doMassachusettsInstituteofTechnologyacercadohábito.Nocomeçodosanos1990,ospesquisadoresdoMITcomeçaramacogitarqueos gânglios basais talvez pudessem ser essenciais para os hábitos também.Notaramqueanimaiscomlesõesnosgângliosbasaisderepentecomeçavamaterproblemascomtarefascomoaprenderaatravessarlabirintosoumemorizarcomoabrirrecipientesdecomida.Decidiramfazerexperimentosusandonovasmicrotecnologias que lhes permitiam observar, nos mínimos detalhes, o queestava acontecendo dentro da cabeça de cada rato enquanto ele realizavadezenasderotinas(DUHIGG,2012,p.31).

Oexperimentoconsistiaem instalarsensorescerebraisemratosesoltá-losem

labirintosemformadeT,comumchocolateemumadaspontas.Aleituradosdadosdos

sensorespermitiulocalizarnosgângliosbasaisasprincipaisatividadesrelacionadasao

processamento da tarefa. Nas primeiras vezes que o rato percorria o labirinto, seus

gângliosbasais trabalhavam intensamente,procurandoentender todasas informações

novas.Depoisdemuitasrepetições,oratopareciarealizaratarefadeformaautomática,

sempensar.Porémessainternalização-correrreto,dobraràesquerda,comerochocolate-dependia dos gânglios basais, como as sondas cerebrais indicavam. Essaminúscula e primitiva estrutura neurológica parecia assumir o comandoconformeoratocorriacadavezmaisdepressaeseucérebro trabalhavacadavez menos. Os gânglios basais eram essenciais para recordar padrões e agircombaseneles(DUHIGG,2012,p.33).

Oestudocomratospossibilitoulocalizarasdiferentesatividadesrelacionadasao

processoestímulo-respostaeajudounoentendimentodoshábitoscomoumaformado

cérebro preservar esforço mental. Toda rotina passível de automação pode ser

incorporada a um hábito em prol da eficiência, liberando energiamental para outras

atividadesmaisimportantesemenosconhecidas.

3.4Contexto-resposta

Uma abordagem mais recente do estudo do hábito, presente no trabalho de

Wendy Wood e David T. Neal intitulado A New Look at Habits and the Habit-Goal

Interfacepublicadoem2007,propõequeoshábitospodemprovocarefeitospositivose

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negativos no nosso comportamento. Segundo essa abordagem, os hábitos são

necessários,poisnospermitemexecutarmúltiplas tarefas automaticamente, aprender

trabalhos mais complexos e garantir o desempenho das nossas ações através da

economiaderecursoscognitivos.Poroutrolado,onossocomportamentopodesetornar

excessivamentesubmissoa fatoreseestímulosexternos,enfraquecendoanossabusca

pormetasepropósitospessoais.Hábitossãodisposiçõesaprendidasdeserepetirrespostasanteriores.Elessãoacionados por elementos do contexto que covariaram frequentemente comdesempenhopassado, incluindo locaisdedesempenho, açõesprecedentesemumasequênciaepessoasparticulares.As pessoas formam hábitos na medida que codificam esses padrões decontexto-resposta na memória processual. Uma vez formada, a respostahabitualvemaserpreparadaouativadapelapercepçãodepistasnocontextodaperformance.Esteprocessopodeseriniciadoaoseentrarnocenárioondeohábitoégeralmentedesempenhado,aosecompletararespostaquegeralmenteoprecedeouaoseencontrarumapessoaquegeralmenteestápresente(WOODeNEAL,2007,p.845).

Oestudoressaltaopapeldocontextoetambémpropõequeosobjetivospessoais

exercem uma grande influência na construção dos hábitos. Os hábitos são o

comportamento residual de uma busca passada por um objetivo; a repetição do

comportamentonumdeterminadocontextofazcomqueohábitoseconsolide.

Como intuitode entender a naturezapersuasivados smartphones e o seu alto

potencial na formação de hábitos, um grupo de pesquisadores do HIIT (Instituto de

TecnologiadaInformaçãodeHelsinki),daUniversidadeAalto,analisouosdadosdetrês

estudos sobre o uso de smartphone entre 2005 e 2010 (OULASVIRTA et al. 2012).

Inicialmente, o trabalho dos pesquisadores propõe uma diferenciação entre

comportamentos frequentes e hábitos: o segundo é um subconjunto do primeiro. Em

uma das pesquisas, foram analisados os registros de uso dos smartphones para

identificaraduraçãodasinteraçõesedasconsultasrealizadaspor136participantesem

seus dispositivos móveis. Depois de várias análises dos dados disponíveis, onde os

pesquisadores tentaram explorar sequências frequentes de interação no telefone, os

resultadosconvergiramparaumcomportamentomuitosimples:ohábitodechecagem.Para recapitular a principal descoberta, os dados fornecem evidências daformação de hábito no uso de smartphones, principalmente atribuídos àcapacidade de prover acesso rápido a recompensas como sociabilização emrede, comunicação e notícias. Hábitos de checagem são comportamentosautomatizados quandoo dispositivo é rapidamente acessadopara verificaçãodateladerepousooudeconteúdos informativosemumaplicativoespecífico.Esteshábitossãoprovocadospordiferentesdeixasexternasaodispositivo,taiscomo situações e estados emocionais. Os comportamentos automatizadoslevam os usuários,muito rapidamente, a diferentes telas que fornecem valor

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informativo ou recompensas. Essas recompensas ajudam os usuários aevitarem o tédio e lidarem com a falta de estímulos em situações cotidianas,assim como os faz cientes de eventos interessantes e redes sociais.(OULASVIRTAetal,2012,p.107).

Mais adiante no estudo, o hábito de checagem é identificado como porta de

entrada para outros comportamentos frequentes no uso de aplicativos. Os usuários

começam acessando conteúdos dinâmicos ou aplicativos de entretenimento de forma

habitual, estimulados por um contexto, e acabam desempenhando outras ações na

sequência.Oacessoaoconteúdopelossmartphonesérápidoeo tempode interaçãoé

relativamente menor que o dispendido em computadores, o que torna os hábitos

relacionados ao smartphone breves e pervasivos. As recompensas relacionadas ao

hábitodechecagemsãodivididasemtrêscategorias:

1. Informacionais: através de conteúdo informativo, não interativo, que o

usuáriopodeapenasconsultar,semmodificar.

2. Interacionais: conteúdo interativo, passível de interferência do usuário.

O melhor exemplo é a interação social através de aplicativos/redes

sociais.

3. Consciência (awareness): corresponde à vontade de controlar as

mudanças da realidade, através da checagem constante de caixas de

mensagensoudestatusdepresençadeoutrosusuários.

O hábito de checagem tornou-se um comportamento quase universal,

provocando várias reflexões e estudos acerca de sua nocividade. Em uma pesquisa

realizadaem2015peloInstitutoGallupnosEstadosUnidos,envolvendomaisde15.000

entrevistados,cercadametadedosdonosdesmartphoneschecaramosseusdispositivos

váriasvezesporhora,incluindo11%quealegaramumhábitodechecagemempoucos

minutos e 41%quedisseram ter umhábito de checagemde algumas vezes por hora.

Outros 20% dos americanos afirmam verificar seus telefones uma vez a cada hora,

deixando 28% dos respondentes que afirmaram checar com menos frequência

(NEWPORT, 2015). Segundodadosdeumaoutrapesquisa, publicadapela consultoria

Kleiner,Perkins,CaufieldeByersem2013,osamericanoschecamseussmartphones150

vezes por dia, em média (KPCB, 2013). Será que nossa relação com os dispositivos

móveis está se tornando uma obsessão? Até que ponto nossa qualidade de vida é

afetada?

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As pequenas intrusões e interrupções cotidianas causadas pelos dispositivos

tecnológicosganharamo títulode technoference emumrecenteestudoconduzidopor

Sarah Coyne, professora de Psychology of Popular Media Culture na Universidade

Brigham Young (MCDANIEL e COYNE, 2014). A principal descoberta da pesquisadora

apontaas interrupçõesrápidasefrequentes,característicasdanossainteraçãocomos

dispositivos móveis, como possíveis interferências negativas nos relacionamentos

românticos.Aopermitirqueatecnologiainterfiraouinterrompaconversas,atividadeseotempo com parceiros românticos, mesmo quando não intencional ou porbrevesmomentos, os indivíduos podem estar enviandomensagens implícitassobreoqueelesmaisvalorizam,levandoaoconflitoearesultadosnegativosnavidapessoalenosrelacionamentos.(MCDANIEleCOYNE,2014,p.12).

Omau uso e o uso excessivo da tecnologia vêm sendo relacionados também a

malefíciosparaasaúde,umacondiçãocomumentereferidacomotecnopatologia.Dentro

dessa categoria, algumas pesquisas médicas investigaram o impacto fisiológico das

nossas atividades cotidianas com os dispositivos. Um estudo publicado no Surgical

TechnologyInternationalXXV,alertouparaoimpactogeradonacolunacervicaldevido

àinclinaçãoinadequadadacabeçaquandovisualizamosateladodispositivo.Desgastee

degeneração precoce da coluna cervical são apontados como consequências do uso

frequentededispositivosmóveisnumaposturainadequada(HANSRAJ,2014).

O termo tech neck foi criado por dermatologistas para descrever um tipo

específicoderuganapele,logoacimadaclavícula,causadapelainclinaçãofrequentedo

pescoçoaoolharparaateladeumdispositivoportátil.

A Síndrome da Vibração Fantasma (Phantom Vibration Syndrom), também

conhecidacomoringxiety (ansiedadedo toque),éum fenômenorecenteecomumente

referido em artigos sobre o uso frequente de smartphones. Trata-se da percepção

enganosadequeocelularestávibrandoquandonaverdadenãoestá.Emumdospoucos

estudos específicos sobre o assunto, realizado por Amrita Deb e publicado na Asia-

Pacific Psychiatry em 2015, sugere-se que a antecipação de um telefonema ou

mensagem leva o córtex cerebral a interpretar mal outros estímulos sensoriais (tais

como contrações musculares, pressão do vestuário, vibrações sonoras), assumindo

comoumavibraçãodotelefone(DEB,2015).Aconexãodestefenômenocomsintomas

de ansiedade e depressão é relatada em uma pesquisa realizada com estagiários de

medicina do Chang Gung Memorial Hospital, publicada no Journal of Psychiatric

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Research (YH et al., 2013). Estagiários que relataram a experiência da síndrome de

vibraçãofantasmadeformaseveraapresentaramtambémmaiorestaxasdeansiedade

subjetivaesomáticaededepressãosomática.

Se por um lado a relação homem-smartphone parece condicionada a uma

interdependência doentia, por outro podemos observar abordagensmais positivas de

usufruto dasmicrotecnologias. O entendimento de como os hábitos são gerados e de

como é possível controlá-los passou a ser um tema recorrente na academia, nas

discussõessobreterapiasmotivacionaisenacomunidadededesign.

3.5Desenhandohábitos

CharlesDuhigg,emOPoderdoHábito,relatasuaextensapesquisasobreohábito

em diversas esferas. Desde os processos neurofisiológicos envolvidos na esfera

individualatéosprocessoseregrasgeradosemempresasenasociedade influenciada

porhábitos.Todasasmanifestaçõesdohábitosãoformalizadasnoqueeledenominouo

LoopdoHábito.

Figura7-LoopdoHábito11

Primeiroháumadeixa,umestímuloquemandaseucérebroentraremmodoautomático,eindicaqualhábitoeledeveusar.Depoisháarotina,quepodeserfísica, mental ou emocional. Finalmente, há uma recompensa, que ajuda seucérebro a saber se vale a penamemorizar este loop específico para o futuro.(DUHIGG,2012,p.36)Ao longo do tempo, este loop – deixa, rotina, recompensa; deixa, rotina,recompensa–setornacadavezmaisautomático.Adeixaearecompensavãoseentrelaçandoatéquesurjaumpoderososensodeantecipaçãoedesejo.Porfim,sejanumlaboratóriogeladodoMITounagaragemdasuacasa,umhábitonasce.(DUHIGG,2012,p.37)

11IlustraçãodesenvolvidapeloautorbaseadaemDuhigg(2012).

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A repetiçãodo loop gera umanseio, que retroalimenta o loop. Anseios comuns

pordistração,aceitação,alívio,diversãoeinformaçãoseriam,portanto,omotordoLoop

doHábito.Paramodificarumhábito,oautorpropõeumaregradeouro,queconsisteem

manteramesmadeixaerecompensa,masinserirumanovarotina.Váriashistóriasreais

contadasduranteolivroexemplificamaregradeouro,comoaquedescreveosistema

deencontrosdosAlcoólatrasAnônimos.‘Há um elemento hedonista no álcool’, disse Ulf Mueller, um neurologistaalemão que estudou a atividade cerebral entre alcoólatras. ‘Mas as pessoastambém usam o álcool porque querem esquecer alguma coisa ou satisfazeroutros anseios, e esses anseios por alívio acontecem em partes do cérebrototalmentediferentesdoanseioporprazerfísico’.(DUHIGG,2012,p.89)Para oferecer aos alcoólatras asmesmas recompensasqueobtêmnumbar, oA.A.montouumsistemade encontros e companheirismoque se esforçaparaoferecertantafuga,distraçãoecatarsequantoumporredesexta-feiraànoite.(DUHIGG,2012,p.89)

NirEyaléprofessordeNegócioseDesignnaUniversidadedeStanfordeautordo

livroHookedpublicadoem2014,umgrandesucessonacomunidadededesigndigital.O

autor é hoje considerado o guru da construção de hábitos no mundo dos negócios

digitais, pois dedicou sua pesquisa acadêmica ao entendimento dos hábitos quase

compulsivosgeradosporredessociaiseaplicativos.Suapesquisaexpõeoutrafórmula

para a criação de hábitos nos ambientes digitais, que ele denominou de Modelo do

Gancho.

O Modelo do Gancho descreve como criar produtos que fidelizam o usuário,

atravésdehábitosqueseconsolidamnasinteraçõesemambientesvirtuais.Aplicativos

queapresentamumelevadoengajamentodeusuários,comooFacebookeoInstagram,

seapoiamnessemodelo.AsemelhançacomoLoopdoHábitodeDuhiggéevidente,mas

omodelopropostoporEyalexploracommaisdetalhesadinâmicadeumaexperiência

engajadora em ambientes digitais. OModelo doGancho é composto por quatro fases:

gatilho,ação,recompensavariáveleinvestimento.

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Figura8-ModelodoGancho12

OGatilhoéoatuadordocomportamento–aveladeigniçãonomotor.Gatilhospodemserdedois tipos: externos e internos. Produtos formadoresdehábitocomeçampor alertar osusuários comgatilhos externos, comoume-mail, umlinkdeumwebsite,ouumíconedeaplicativonotelefone.(...)Aopercorrerogancho sucessivas vezes, os usuários começam a formar associações comgatilhos internos, que se vinculam a comportamentos e emoções existentes.(EYAL,2014,p.7)

Seguindo o gatilho vem a ação, um comportamento desempenhado em

antecipaçãoaumarecompensa,comoocliqueemumafotoexibidanatimelinepessoal

do usuário. O que distingue o Modelo do Gancho de outros loops de feedback é

justamentearecompensavariável,arespostaimprevisívelesurpreendenteaumaação.A pesquisa mostra que os níveis do neurotransmissor dopamina se elevamquandoocérebroestáesperandoumarecompensa. Introduziravariabilidademultiplicaoefeito,criandoumestadodefoco,quesuprimeasáreasdocérebroassociadas com o julgamento e a razão aomesmo tempo que ativa as partesassociadascomavontadeeodesejo(EYAL,2014,p.8).A última fase doModelo do Gancho é onde o usuário desempenha um certotrabalho. A fase de investimento aumenta as chances do usuário fazer outrapassagem pelo ciclo de gancho no futuro. O investimento ocorre quando ousuário coloca algo dentro do produto de serviço, como por exemplo tempo,dados,esforço,capitalsocialoudinheiro(EYAL,2014,p.9).

OModelodoGanchotemumpotencialadmiráveldepromoverhábitossaudáveis

mas na prática, não émuito usado com tal fim.Nir Eyal, ao popularizar oModelo do

Gancho no mercado tecnológico, advertiu sobre as consequências do seu uso mal

intencionado. É possível utilizar gatilhos emocionais negativos para promover12TraduzidopeloautordomodelopropostoporEyal(2014,p.06).

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resultados positivos mas esses são geralmente medidos na forma visualização de

páginas, número de visitas, taxas de cliques ou outras métricas de conversão

relacionadasaolucro.Omodelodenegóciosvigente,quepromoveexperiênciasfocadas

em conversão e dependentes da propaganda, dificilmente prioriza os resultados

pessoaispositivos.

DentrodoLaboratóriodeTecnologiaPersuasivadaUniversidadedeStanford,o

professorB.J.Foggformalizououtromodelorelativamentesimplesparaentenderoque

aciona o comportamento humano. Fogg (2007) afirma que existem três ingredientes

necessáriosparainiciartodoequalquercomportamento(Behavior).Sãoeles:

1. Motivaçãosuficiente(Motivation);

2. Habilidadederealizaraaçãodesejada(Ability);

3. Umgatilhoparaativarocomportamento(Trigger).

Figura9-ModelodeComportamento13

O Modelo de Comportamento de Fogg é representado pela fórmula B = MAT,

postulando que um determinado comportamento só ocorre quando motivação,

habilidadeeumgatilhoestãopresentesaomesmotempoeemníveissuficientes.

13TraduzidopeloautordomodelodecomportamentoapresentadonowebsiteBjFogg'sBehaviorModel(2016).Disponívelem:<http://www.behaviormodel.org/>.Acessoem:10jul.2017.

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GraçasàsimplicidadedosmodelosdeEyaledeFogg,somadaà importânciado

tema para a nova economia digital, cada vez mais designers e estrategistas estão

adotandometodologias abrangentes de design, na tentativa de construir experiências

engajadorasemoldarnovoshábitos.Empreendedoresestudamohábitonatentativade

ganharmaisdinheirocomosseusprodutosdigitais.Timesdeprojeto trabalhamduro

paracativarousuárioeroubaroseutempo.Eacabamcriandovícios.

Émuitocomumquestionarmosousofrequentedatecnologia,principalmentea

tecnologiamóvel.Vícioedependênciasãopalavrasqueentramnaturalmentenanossa

narrativadeusodiáriodesmartphones.Sãopalavrasfortesmaselascaptamalatência

dosnossossentimentoscomrelaçãoàtecnologia.Partedessesentimentovemdanossa

perda de foco. Somos constantemente interrompidos por alertas, mensagens, sinais

sonoroseligações.Pesquisasrecentesacercadafelicidadeprovamquequantomaisnos

distanciamosdomomentoreal,menosfelizessomos.Pesquisas sobre felicidade mostram que, quanto mais nos afastamos domomento,menosfelizesnostornamos.Parecenãoimportarmuitoseatarefaéagradávelounão,apenasqueestejamosfocadosnela.Nossaexperiênciacomatecnologia parece remover esse foco – ou direcioná-lo equivocadamente. Ovício,especialmentequandosetemasensaçãodeperdadecontrole,fazparteda narrativa interna sobre tecnologia que repetimos para nós mesmos eespalhamosaosquatroventos(PAVLISCAK,2017).

Estamos cada vez mais habituados aos nossos smartphones e à realidade

hiperconectada que nos proporcionam. Nunca tivemos um objeto tão conectado ao

nossocorpo,deformatãopersistente.Apercepçãododispositivocomoobjetoacoplado

aocorpocriaumvínculosistêmico,umasemidependênciapsicológicaqueéclaramente

percebida quando, por alguma razão, somos privados do dispositivo. Sentimos a

ausência do objeto como a ausência ou deficiência de um recurso cognitivo. Nossa

memória fica limitada na ausência do aplicativo de busca do Google. Nossa atenção

muda,nãoconseguimosexecutarmúltiplastarefas.Ovínculosefazpercebidoquaseque

fisicamente.

Merleau-Ponty(2011)faladessaapropriaçãodosobjetospelocorpoemseulivro

Fenomenologia da Percepção, e explora a vulnerabilidade dos limites físicos dessa

relaçãohomem-dispositivo:Habituar-seaumchapéu,aumautomóvelouaumabengalaéinstalar-senelesou, inversamente, fazê-los participar do caráter volumoso de nosso corpopróprio.Ohábitoexprimeopoderquetemosdedilatarnossosernomundooude mudar de existência anexando a nós novos instrumentos (MERLEAU-PONTY,2011,p199).

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Ainda segundo Merleau-Ponty, o hábito não seria nem conhecimento, nem

automatismo.Seriaumsaberfísico,palpável,queestánocorpoeseentregaaoesforço

dessecorpo,incapazdeserexplicadodeformaobjetiva.(MERLEAU-PONTY,2011)Naverdade,todohábitoéaomesmotempomotoreperceptivo,porque,comodissemos, reside, entre a percepção explícita e o movimento efetivo, nestafunção fundamental que delimita ao mesmo tempo nosso campo de visão enossocampodeação.Aexploraçãodosobjetoscomumabengala,quehápoucoapresentávamoscomoumexemplodehábitomotor,tambéméumexemplodehábito perceptivo. Quando a bengala se torna um instrumento familiar, omundodosobjetostáteisrecuaenãomaiscomeçanaepidermedamão,masnaextremidadedabengala(MERLEAU-PONTY,2011,p.210).

Os smartphones, como objetos propagadores de hábitos acoplados ao corpo,

expandemanossapercepçãodomundoeanossamente.Osavançosdananotecnologia

e dos objetos vestíveis apontam novas formas de acoplamento, mais orgânicas e

distribuídas em sistemas de funções isoladas. As interfaces digitais darão lugar a

microssensoreseaumaexperiênciamaisfluídacomatecnologia.

O produto da nova economia é a experiência. Assim, como na economia de

mercado,ondealeidaofertaeprocuradátantoespaçoparaprodutossaudáveisquanto

para os nocivos, o novo mercado digital está repleto de produtos com atributos

discordantes.Soluçõesqueestimulamapráticadeexercíciosconcorremcom jogosde

alto potencial persuasivo. Felizmente as ferramentas de persuasão e as técnicas de

gamification14estão disponíveis para todos os participantes ativos da nova economia.

Hábitos virtuosos podem ser estimulados assim como comportamentos obsessivos.

Ainda que às vezes aturdido pela tecnologia e pelo fascínio comomeio, a escolha da

experiênciaésempredoindivíduodepossedeseusdispositivos.

Talvez a discussão sobre o hábito não seja totalmente apropriada quando

falamos de tecnologia e felicidade. Hábitos ajudam a moldar o nosso dia-a-dia mas

podemtambémnosacomodaremumarotinamonótonaesempropósito.Algunsbons

hábitos comoapráticade esportes e o exercícioda gratidãodiária, podemcontribuir

paraobem-estarmasnãonecessariamentetrazemfelicidade,queestámaisrelacionada

ao aprendizado, criatividade e propósito, temas que exploraremos mais adiante ao

tratarmosdefelicidadeebem-estarsubjetivo.Aquestãoparaodesignerdeexperiências

éjustamenteaintençãoportrásdoseuprojeto.

14GamificationouGamificaçãoéaaplicaçãointegradademecanismoselógicasorigináriasdejogosemplataformasdeinteraçãodigitalcomowebsites,aplicativosesistemas.

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4DESIGNEMOCIONAL

Muitojásefalousobreaimportânciadasemoçõesdousuárionasinteraçõescom

produtoseambientesconstruídospelodesign.Aemoçãoéumelementodeterminante

na experiência humana, pois influencia a percepção, cognição, comunicação,

aprendizagem e até nossos processos racionais de tomada de decisão. Junto com a

cognição, o estudo da emoção aplicada ao design ganhou mais adeptos na era da

experiênciadevidoàpropagaçãododesign centradonousuário.Para as empresasda

economiadigitalpassouaser indispensávelentendero impactoqueseusaplicativose

sistemascausamnousuáriofinal.

Cognição e emoção se complementam e se contagiam no nosso processo de

percepçãodomundo.DonNorman,emseulivrode2004,Emotionaldesign:Whywelove

(orhate)everydaythings,exploraexaustivamenteessarelação.Emoçõessãoparte inseparávelenecessáriadacognição.Tudooquefazemos,tudo o que pensamos, tudo é tocado pelas emoções – e grande parte delas ésubconsciente. Consequentemente, nossas emoções mudam nossa forma depensareservemdeguiasconstantesparaoscomportamentosadequados,nosafastandodoqueéruimenosaproximandodoqueébom(NORMAN,200415,KindleLocations144-146).

Elementosgráficosdedesigncomocores, imagens, formasefotografiassempre

foram considerados recursos hedônicos potentes, utilizados para proporcionar apelo

emocional, senso estético e impressões positivas às experiências. Mesmo que já

houvesse um reconhecimento da importância das emoções na interpretação da

experiência, só recentementeapesquisa científica começoua transcenderos aspectos

utilitários e puramente gráficos dodesign e passou a considerar outros elementosdo

designafetivodeumaformaempírica.

Com o Design Thinking vimos novas disciplinas direcionadas ao estudo do

humanosedestacaremnaacademiaenos laboratóriosdedesign.Alémdematérias já

consolidadas como Arquitetura de Informação, Usabilidade e Interação Homem

15Citaçãodeconteúdoeme-book.OKindleéumaplataformapaaaquisiçãoeleituradee-books(livrosdigitais).Ose-books,diferentementedasversõesimpressasdasobras,nãoseguemumapaginaçãofixaadaptando-sedeacordoàtelaeasopçõesdeleituradousuário.OKindleutilizaumsistemadeposicionamento(location)quepermiteaoleitorirdiretamenteaopontodotextoinformado.Aslocationsindependemdostamanhosdetipogradiaetela,oquefazcomquesejamefetivasnabuscadeconteúdonoe-book.Frisa-sequediferentesediçõesimpressastambémnãopossuemcorrespondênciaexataentrepáginas.Portanto,aslocationstornamaacessibilidadeainformaçãomaisacuradaumavezquesediferenciamdofuncionamentodapaginaçãoimpressa.

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Computador (HCI - Human Computer Interaction), os novos cursos de design

incorporaram disciplinas como Psicologia da Interação, Economia Comportamental,

Antropologia e uma série de outras relacionadas ao funcionamento do cérebro e das

emoções.Estaampliaçãodoescopodeestudorefleteaampliaçãodoescopodeatuação

dosdesignersnasempresasdanovaeconomia.Nãobastaserfácildeusar.Assoluções

queafetamasemoçõeshumanas,enãoapenasatendemnecessidadeseresolvemerros,

têm, comprovadamente, um potencial muito maior de conquista e de conversão de

usuáriosemclientesfiéis.Acogniçãointerpretaomundomelhorandooentendimentoeoconhecimento.O afeto, que inclui emoção, é um sistema para julgar o que é bom ou ruim,seguroouperigoso.Elefazjulgamentosdevalorparamelhorarasobrevivência(NORMAN,2004,KindleLocations301-302).

Noentanto,aindústriatecnológicaaindatemdificuldadesemtrabalharaemoção

de forma estruturada nos seus processos de desenvolvimento de produtos. E isso se

deve,emgrandeparte,àdificuldadedemensuraçãoeentendimentodasemoções.Neste

capítulovamosexploraralgumasfrentesdeestudoqueapoiamotrabalhododesigner

nessasduastarefasessenciais:oentendimentoeamensuraçãodasemoções.

4.1Emoçõespositivaseexperiência

Ao se utilizar tecnologias complexas, as emoções positivas diminuem aansiedade da utilização e contribuem para a experiência do conforto dautilização e para a usabilidade de uma forma geral. Ou seja, os produtos queevocamemoçõespositivassãomaisfrequentementecompradoseutilizados,eémaisagradávelutilizá-los.Portanto,éindiscutivelmentemaisvaliosoprojetarprodutosqueevoquememoçõespositivas–produtosquefaçamseususuáriossesentirembem(DESMET,2012,p.1).

Aemoçãoestánocoraçãodequalquerexperiênciahumanaeéumcomponente

essencial nas interações e na experiência do usuário com a tecnologia. Um estudo de

Forlizzi eBattarbee (2004) apontou três principais frentes teóricas sobre a emoção e

seu papel na experiência. Tratam da nossa disposição a agir, da valência positiva ou

negativa dessa disposição e dos fatores biológicos relacionados ao nosso estado

emocional.Podemosatéfazerumaleituramaisfuncionaldasemoçõeseseusaspectos

psicológicos,comoapontadonoestudo:Dopontodevistadapsicologia,aemoçãopossuitrêsfunçõesbásicas:moldarnossosplanoseintenções,organizarosprocedimentosrelacionadosaosplanoseavaliarosresultados.Dopontodevistadodesign,aemoçãomoldaa lacunaqueexisteentrepessoaseprodutosnomundo.Aemoçãoafetaa formacomoplanejamosinteragircomprodutos,comoefetivamenteinteragimoscomeles,enossaspercepçõeseresultadosquecircundamtaisinterações.Aemoçãoserve

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de fonte para o entendimento e comunicação sobre nossa experiência(FORLIZZIeBATTARBEE,2004,p264).

Asemoçõesinfluenciamtodaajornadadousuário:antes,duranteedepoisdeum

eventointerativocomumprodutoousistema.Abuscaporemoçõespositivasemtudoo

que fazemos e experimentamos está no nosso DNA, está programado no nosso

comportamentopadrão.Essamesmabuscaéumgrandecombustívelparaotrabalhode

designdeexperiências.Por que deveríamos investir tempo e energia especificando emoções-alvo ouintenções emocionais nos processos de design? A principal razão é que já sedemonstrou que diferentes emoções possuem diferentes efeitos sobre ocomportamento.Deacordocomateoria“ampliareconstruir”(...),asemoçõespositivassãocaracterizadasporefeitosdistintoseespecíficos:aalegriacriaanecessidade de brincar e ser lúdico no sentido mais amplo das acepções,incluindo não apenas a ludicidade física e social, mas também a ludicidadeintelectualeartística(...).Afascinaçãocriaanecessidadedeexplorar,queestávoltada a aumentar o conhecimento do alvo de interesse (...). A satisfaçãopermitequeindivíduosapreciemoestadoatualdesuasvidaseseussucessosrecentes (...). Espera-se que tais efeitos comportamentais gerais tambéminfluenciemasinteraçõesentrehumanoseprodutos(DESMET,2012,p.13).

As emoções positivas têm uma comprovada habilidade de motivar as nossas

ações no mundo. Agimos e interagimos por que queremos sentir prazer, fascínio,

contentamento e satisfação. Somos atraídos por objetos que prometem nos oferecer

prazer,poraplicativosquenostrazemcontentamentoouambientesqueproporcionam

bem-estar.Apossibilidadedecriaremoçõespositivasatravésdodesignse tornouum

dosgrandesdesafiosdaeradaexperiência,ondeasinteraçõesdousuáriocomomundo

acontecemporintermédiodeaparatosdigitaiscadavezmaisinteligentes.

PieterA.Desmet,doutoremPsicologiaPositivanaUniversidadedeTecnologiade

DelftnaHolandaéumadasprincipaisreferênciasnomeioacadêmicoquandooassunto

édesignemocional.Emumadesuaspesquisas, foramlevantados729estudosdecaso

de interaçõeshomem-objetoemocionalmentepositivas.Combasenesses casos, foram

definidasasseisprincipaisfontesdeemoçõespositivasnasinteraçõeshomem-objeto:o

objetoemsi,osignificadodoobjeto,ainteraçãocomoobjeto,aatividadefacilitadapor

estainteração,nósmesmoseosoutrosenvolvidosnainteração.Cadaumdessesfatores

evocaemoçõesnousuárioepodemservistascomooportunidadesdedesign.

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Figura10–Asseisfontesbásicasdeemoçõespositivasnasinteraçõeshomem-objeto16

As seis fontes básicas apontadas no artigo de Desmet ajudam o designer a

compreender as possibilidades da sua atuação num projeto. Se emoções positivas

podem ser evocadas tanto por características materiais do produto quanto por seus

aspectos subjetivos, devemos rever os métodos tradicionais de design para abraçar

todasessaspossibilidadesedeterminarnovaslinhasdeatuação.Naeradaexperiência

osprodutosnãosãomaiscoisasisoladas,queentregaminteraçõescomcomeço,meioe

fim. Sãoparte integrantedeumecossistemade interações reais e virtuais. Por isso, a

jornadadeinteraçõesdecadausuáriocomumprodutodedesignémaiscomplexa.Uma

mesmaexperiênciajamaisserávivenciadaduasvezespoisapredisposiçãoemocionalde

cada usuário é diferente ao embarcar nela. Um mesmo usuário também terá

experiências diferentes com um produto pois o seu contexto de uso muda a cada

momento,lugarepredisposiçãoemocional.

Visualizar as possíveis fontes de emoções positivas é um bom começo para o

design com foco na emoção.Mas o estudo das emoções humanas e sua influência no

designdeUXesbarranumdesafioaindamaiorrelacionadoàlinguagemeàclassificação

dasemoções.Afinal,comocadaumentendeefalasobreasemoçõesémuitoparticular.

Além de divergências semânticas (o que uma pessoa entende por simpatia não é o

mesmoqueoutra) temosque considerardivergênciasdevocabulário.Aspessoas têm

níveisdiferentesdedomíniosobrealínguaesobreoléxicodisponívelparaexpressaras

16TraduzidopeloautordomodelodecomportamentoapresentadoporDesmet(2012,p.11).

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suasemoções.Enquantoalgumaspessoassabemexpressarumsentimentodebem-estar

apenascomapalavrafeliz,outraspodemsermaisespecíficaseusarempalavrascomo

êxtaseoueuforia.As tipologias emocionais existentes incluem desde opções simples e concisasatélistasexaustivasdecentenasdepalavras.Taldicotomiapodeserexplicadapeloconceitode ‘conhecimentoemocional’.Talconhecimentoéutilizadopelaspessoasparainterpretarsuasprópriasreaçõesemocionaiseaquelasdeoutros,para prever emoções e para compartilhar e falar sobre reações emocionaissobreeventospassadosepresentes(DESMET,2012,p.02).

ApesquisadeDesmetaprofundaaquestãodoconhecimentoemocionalepropõe

umléxicobásicoparaserutilizadocomoferramentanodesigndeexperiências.

4.2Léxicoemocional

Um minucioso estudo de linguagem liderado por Pieter M. A. Desmet tornou

viável a discussão sobre emoções positivas no processo de design pois possibilitou a

criaçãoumconsensolinguísticoesemânticoentreusuáriosedesigners.Oestudopartiu

de um amplo levantamento linguístico das palavras e expressões relacionadas a

emoções positivas, em várias línguas. A partir dessa pesquisa, os pesquisadores

realizaramumasínteseechegarama25 tiposdeemoçõesessenciais,agrupadasem9

categorias.(figura11)Oléxicoemocionaldegrandepartedaslínguasmodernascontémcentenasdenomes de emoções (...), e insinuar que todas elas são meras variações dasemoções básicas marginaliza a riqueza de nosso repertório emocional(DESMET,2012,p.4).

SegundoDesmet,cadaemoçãobásicaenglobaváriasoutrasemoções.Prazer,por

exemplo, é uma emoçãobásica que engloba outras diferentes emoções comoorgulho,

satisfação, alívio e inspiração. Amor é uma emoção básica que engloba simpatia,

admiração,gentileza,desejoerespeito.Algumaspessoaspodemclaramente identificá-

las como emoções diferentes, com condições, sentimentos e manifestações

comportamentaisdistintas.Outrasnãopossuemumdomínioda línguasuficientepara

fazer essas distinções. É justamente nesse desalinhamento de conhecimento que a

propostadoléxicoemocionalpodeajudar.

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Figura11–TipologiaGeraldas25EmoçõesPositivas17

As25emoçõesbásicasforamagrupadasemnovecategorias:Prazer,Gratificação,

Empatia, Afeto, Aspiração, Otimismo, Confiança e Animação. Essas categorias foram

criadasatravésdeumapesquisacomrespondentesqueavaliaramasimilaridadeentre

paresdeemoção.Apósaavaliaçãodosparticipantesdapesquisa,as25emoçõesbásicas

esuasemoçõescomponentesforamrepresentadasnummodelográficobidimensional,

ondepodemosveressasrelaçõesdesimilaridadeeproximidade(figura12).

17TraduzidopeloautorapartirdatabeladeTipologiaGeraldas25EmoçõesPositivasapresentadaemDesmet(2012,p.4).

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Figura12–EscalaMultidimensionalcomasCategoriasdeEmoções18

4.3Granularidadeemocional

Algumaspessoastêmmaisciênciadasdiferençasentreasemoçõeseconseguem

articular melhor seu estado emocional do que outras. Essa diferença é denominada

granularidadeemocional:acapacidadedeumindivíduoeminterpretarearticularcom

precisãooseupróprioestadoemocional,bemcomoodeoutraspessoas.Esteconceito

foi apresentadopor Lindquist eBarrett (2016), no artigoEmotionalComplexity, como

umaspectoqueconferecomplexidadeaoentendimentodasemoções.Os indivíduos que são emocionalmente granulares utilizam adjetivos paradescrever emoções, tais como ‘triste’, ‘satisfeito’, ‘irritado’, ‘amedrontado’,‘alegre’ etc., para representar experiências discreta e qualitativamentediferentes. As pessoas com menores níveis de granularidade utilizam essasmesmas palavras de forma menos precisa para representar estados afetivosmais globais, mais amplos, tais como prazer/desprazer, excitação/calma(LINDQUISTeBARRET,2016,p.6).

18TraduzidopeloautorapartirdaEscalaMultidimensionalcomasCategoriasdeEmoçõesapresentadaemDesmet(2012,p.6).

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Paraumdeterminadoevento,porexemplo,umindivíduocomaltagranularidade

emocionalpoderiadizerqueestásesentindomuitofascinadoeinspirado,enquantoum

indivíduocombaixagranularidadediriaapenasqueestásesentindobem.Porsetratar

de uma abordagem investigativa sobre a percepção das emoções, baseada em relatos

pessoais,agranularidadeemocionalaindanãopodeservalidadacientificamente.Nãose

pode verificar de forma objetiva se um estado emocional relatado por um indivíduo

realmente ocorreu durante a experiência. No entanto, o conceito vai de encontro à

propostadoléxicoemocionaldeDesmete,decertaforma,éresolvidoporele.

Acomplexidadeemocionalvaialémdagranularidadeemocional.Háumagrande

diferença de entendimento e expressão entre emoções positivas e negativas. Na

comparação,percebe-sequeasnuancesentreemoçõespositivassãomuitomaissutis,às

vezes difíceis de serem observadas em gestos ou expressões corporais. É quase

impossível distinguir entre um sentimento de alívio, relaxamento ou satisfação, por

exemplo. Sem que o indivíduo articule o que sente em palavras, essas três emoções

podemserinterpretadasapenaspelasuavalênciapositiva.Emsetratandodavalência

oposta, as emoções negativas provocam uma maior propensão à ação, quando

comparadasàsemoçõespositivas.Estudosevidenciandoessadiferençasãodescritosno

trabalhodeYoonetal.(2014).Comparadas às emoções negativas, as diferenças entre as emoções positivastendem a sermais sutis. Um estudo de Ekman [2003] sobre emoções e suasrelações comas expressões faciaisdemonstrouqueas emoçõespositivasnãosão facilmente diferenciadas entre si, dado que grande parte das emoçõespositivasresultamemumsorriso.“Damesmaforma,atendênciaàação,outrocomponentedaexperiênciaemocional,émenosdistintodasemoçõespositivasquedasaçõesnegativas(...)”.Poroutrolado,podemosidentificarfacilmenteasdiferençasentreasemoçõesnegativas,taiscomoódiooutristeza,observando-seasmanifestaçõescomportamentais.Issopressupõequeadistinçãoentreasnuances das emoções positivas exige um entendimento profundo dosmultifacetados aspectos das experiências emocionais. (YOON et al, 2014, p.644)

Numa visão superficial as diferenças entre as emoções positivas e negativas

parecerem óbvias. Se nos sentimos bem, a emoção é positiva; se nos sentimosmal, a

emoçãoénegativa.Noentanto,umestudodeAverill (DESMET,2012)demostrouque

essadistinçãonãoésimplesediretacomoimaginamos.Devemosconsideraraomenos

duasvariáveisadicionaisparafazeressadistinção:O primeiro é o comportamento que é estimulado pela emoção: estecomportamento é avaliado positiva ou negativamente? Smug (presunção) eSchadenfreude (prazer comadorde terceiros) sãoexemplosdeemoçõesquesão prazerosas mas também carregam uma conotação negativa devido aoscomportamentosassociadosquesãoavaliadoscomodesfavoráveis.Asegunda

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variável é a consequência da emoção, que pode ser positiva ou negativa. Acompaixão, por exemplo, pode não ser prazerosa, mas é frequentementeconsiderada positiva, pois as consequências de se compartilhar um peso sãoconsideradaspositivas.Outroexemploéacoragem.Emborasejasuscitadaemuma situação avaliada como negativa (por exemplo, perigo), a coragemfrequentemente é vista como uma emoção positiva, poismuitas vezes leva aresultadospositivos.Parafiltrarasemoçõesnegativassemexcluirasemoçõesquepossuemelementospositivos,oseguintecritériofoiestabelecido:emoçõesforam incluídas quando acompanhadas de sentimentos agradáveis e/oucomportamentofavorávele/ouconsequênciaspositivas(DESMET,2012,p.03).

4.4ArodadeemoçõesdePlutchik

Umoutro trabalho de classificação das emoções que se tornou uma referência

paraestudantesdepsicologiae,maisrecentemente,designerséaRodadeEmoçõesde

Plutchik.RobertPlutchikfoiumpesquisadorimportanteparaestudodapsicologiadas

emoções,deixandocomolegadoasuateoriadeemoçãopsicoevolutiva.Naconcepçãodo

autor,asemoçõesbásicassãoumtraçodonossodesenvolvimentoevolutivoearesposta

acadaemoçãoestárelacionadaaosnossosinstintosdesobrevivência.

A teoria psicoevolutiva das emoções de Plutchik possui dez postulados

(PLUTCHIK,2003).Asaber:

1. Oconceitodeemoçãoéaplicávela todososníveisevolutivoseseaplica

tantoaoshumanoscomoaosanimais.

2. Asemoçõestêmumahistóriaevolutivaedesenvolveramváriasformasde

expressãonasvariadasespécies.

3. Emoções cumprem um papel adaptativo ao auxiliar os organismos a

lidaremcomosproblemaschaveapresentadospelomeioambiente.

4. Adespeitodasdiferentesformasdeexpressãodasemoçõesnasdiferentes

espécies,existemalgunspadrõesquepodemseridentificados.

5. Existeumpequenonúmerodeemoçõesbásicasouprimárias.

6. Todas as outras emoções são misturas ou estados derivativos das

emoçõesprimárias.

7. Emoções primárias são construções hipotéticas ou estados idealizados

quesópodemserinferidospormeiodediversasevidências.

8. Emoções primárias podem ser conceitualizadas na forma de oposições

polares.

9. Todasasemoçõesvariamemseugraudesimilaridadeentresi.

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10. Todas as emoções variam em seu grau de intensidade ou nível de

surgimento.

A partir dos postulados e da sua teoria psicoevolutiva, Plutchik desenvolveu a

Roda de Emoções com o objetivo de ajudar no entendimento e classificação das

emoções. A roda é construída com base em oito emoções primárias: irritação, medo,

tristeza,nojo,surpresa,antecipação,confiançaealegria.Omodelovisualtemaformade

umaflor,comcírculosepétalasusadaspararepresentarasimilaridadeeaintensidade

das emoções. Emoções similares estão dispostas de forma adjacente, numa mesma

pétala,representandointensidadesdiferentes(êxtase,alegria,serenidade),enquantoas

opostasestãoempétalasdiametralmenteopostas(antecipaçãoxsurpresa).

Figura13-ArodadasemoçõesdePlutchik19

19TraduzidopeloautorapartirdasilustraçãoesdePLUTCHIK(2003,capa).

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O trabalho de Plutchik tornou-se umadas referênciamais conhecidas sobre as

nuances emocionais do homem, sendo amplamente utilizado em projetos de design,

inteligência artificial e robótica. Por sua simplicidade e forma gráfica atraente, é um

conteúdo comum dos cursos básicos de psicologia, marketing e design. Para os

designers, a roda funciona comoumapaletade cores comaqual épossível combinar

diferentes emoçõesprimárias e gerardiferentes respostas emocionais, comdiferentes

intensidades. Trata-se de um modelo de fácil entendimento que possibilita várias

aplicações durante as etapas do design. Em entrevistas com usuários, por exemplo, é

possível atrelar cores/emoções às interações relatadas, ajudando nomapeamento da

jornada emocional do indivíduo. Em sessões de ideação e prototipagem é possível

utilizaromodelopara indicar asmetas emocionaispara cada etapada experiência.O

fatorlúdicoeatraentedomodelosãograndesfacilitadoresparaasuaadoção.

4.5Informáticapessoal:rastreandoemedindoemoções

Entenderetrabalharasemoçõespassouasertambémumobjetivodaindústria

tecnológica.Graçasàpopularizaçãodosdispositivosmóveisedosobjetosvestíveis,uma

nova cultura de dados pessoais se estabeleceu: ficoumuitomais fácil rastrear ações,

medir reações e fazer avaliações com base em dados pessoais. Isso trouxe também

novaspossibilidadesparaamediçãoeentendimentodasemoções.

No passado a única forma de se entender hábitos pessoais como consumo,

práticas esportivas, qualidade do sono e alimentação era através de métodos

quantitativosdeanálisededados,realizadoscombaseemregistrosmanuais,cálculose

abstrações gráficas. Tais métodos de autorrastreamento sempre demandaram muito

rigor técnico e muita disciplina dos participantes. Agora, a maior parte da coleta de

dadospodeserautomatizadacomousodesensores,enquantooregistroeanálisepode

ser delegado para um sistema ou um aplicativoweb. Não estamos falando apenas de

rastreare identificarhábitos.Aspossibilidadesdeaplicaçãodessas tecnologiasparaa

mediçãoecompreensãodasemoçõessãotambémumagrandepromessa.

A ubiquidade dos dispositivos móveis motivou um novo comportamento nos

usuários: a busca pelo autoconhecimento através da tecnologia. Este movimento

tecnológico-comportamental tem sido chamado de o ser quantificado ou informática

pessoal e consiste no registro e uso de dados pessoais por meio de sensores,

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rastreadores e diários digitais. O argumento aqui é o viver por meio de números:

quantificarparaentendereentãomelhoraraspectosdavidapessoal.

A informática pessoal se tornou uma tendência dominante na cultura digital.

Cada vez mais pessoas buscam informações sobre si mesmas em seus aplicativos e

dispositivos. Esse comportamentopode servir vários propósitos, desde os atrelados a

metaspessoais,comoperdadepeso,aumentodeatividadefísicaoucontroledegastos,

até os provocados por mera curiosidade. Vários pesquisadores nas áreas

comportamentais e tecnológicas fizeram estudos sobre a informática pessoal

recentemente. Vamos explorar aqui as pesquisas relacionadas ao uso da informática

pessoalparaentendimentoemensuraçãodasemoçõesedobem-estar.

JohnRooksby,MattiasRost,AlistairMorrisoneMatthewChalmersexploraramo

usoderastreadorespessoaisassociadosàsaúdeebem-estar,emseuartigo intitulado

PersonalTrackingasLivedInformatics:Diversas abordagens podem ser adotadas para acompanhar tal domínio.Acelerômetrossãoutilizadosfrequentementeparasemediromovimentoesãotipicamente incorporadosemdispositivos, taiscomopedômetrosemonitoresde sono. O rastreamento por localização também é utilizado amplamente,especialmenteparademonitorarexercícioscomocorridaeciclismo,nosquaisas pessoas se locomovem geograficamente. Tais sistemas baseados emsensores podem coletar informações sem que o usuário precise se envolverativamente nisso. Diversos pedômetros são projetados para ficarconstantemente ligados, o usuário apenas precisa lembrar de carregar odispositivo. Outros monitores requerem envolvimento ativo, tais comomonitores de alimentos emedicamentos, que requerem que o usuário insiradados manualmente. Isso pode ser trabalhoso, e muitos dos monitores queobtémêxito buscam tornarmais fácil a entradadedados – por exemplo, pormeio da leitura de códigos de barras. Alguns monitores também estãocomeçando amudar domonitoramento ativo para omonitoramento passivo.Por exemplo, as balanças inteligentes, transmitem informações viacomunicaçãosemfiosparaumcomputador.Ossmartwatches(porexemplo,oGarmin)conseguemmonitorarapulsação(ROOKSBYetal,2014,p.1164).

No atual cenário tecnológico, os aparatosmóveis de rastreamento e análise de

dadossedesenvolvemeseproliferamemaltavelocidade.Masdoistiposdedispositivos

sãopredominantesemtermosdealcance:osobjetosvestíveiseossmartphones.

• Objetos vestíveis:dispositivos eletrônicos inteligentes, commicrossensores e

controles que podem ser usados como acessórios ou implantados no corpo. Os mais

popularesvestíveiscomobjetivosderastreamentosãoossmartwatches(AppleWatch,

Galaxy Gear entre outros) e os fitness trackers, ou rastreadores de atividades físicas

(Jawbone,Garmin,TomTomentreoutros).Estessãotambémosprincipaisexemplosda

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Internetdascoisas,objetosquecapturam,interpretametrocamdadospelainternetsem

anecessidadedeintervençãohumana.

• Smartphones: Aplicativos também exercem funções de rastreamento e

tratamento de dados dos usuários. Alguns funcionam interligados a objetos vestíveis,

outros funcionam de forma independente, utilizando os diversos sensores do

dispositivo, como o acelerômetro, giroscópio, bússola, pedômetro e câmera, para

capturareregistrarasaçõesdoindivíduo.

Alémdestesdispositivosmóveis,ouniversodosjogoseletrônicosimpulsionoua

tecnologia de sensores e leitores corporais no intuito de proporcionar experiências

imersivas. Todos os principais fabricantes de jogos adotaram sensores em suas

plataformasecontinuamnumabuscaconstantedeinovação.NintendoWii,XboxKinect

e Playstation Move são os exemplos mais importantes. Graças a esses avanços

tecnológicos é possível que jogos de ginástica, yoga e dança ofereçam uma série de

informações pessoais como quantidade de calorias gasta, desempenho e performance

rítmica. Os Exergames são uma plataforma mista de exercícios físicos e jogos, que

capturamdados comopeso, altura,movimento e temperaturado corpopara entregar

entretenimentoimersivodeúltimageração.Oobjetivoécolocaroindivíduodentrodo

jogo.

Além dos diferentes dispositivos de rastreamento e análise de dados, John

Rooksby, Mattias Rost, Alistair Morrison, Matthew Chalmers (ROOKSBY et al, 2014)

descrevememseuestudocincotiposdiferentesdeautorrastreamento.Monitorespodemserutilizadosdediversas formas.Notamosdiversas formas(que podem se sobrepor) de utilização desses equipamentos:monitoramentodiretivo, documental, diagnóstico, busca de recompensas e monitoramentofetichizado.Monitoramento diretivo: a maioria dos monitoramentos era orientada porobjetivos. Muitos participantes buscavam perder ou manter o peso, entãoestabeleciamumobjetivooulimite(geralmentequeimaouconsumocalórico).Outros participantes seguiam um programa de treinamento e, portanto, seesforçavam para atingir os objetivos definidos por tal programa. Algumasvezes, o objetivo seria recebido pelo próprio monitor, a maior parte dospedômetros,porexemplo,sugereobjetivosadequados.Monitoramento documental: uma outra forma comum para utilização demonitores pode ser chamada de monitoramento documental. Neste tipo, osparticipantes estavammais interessados em documentar suas atividades emvezdealterá-las.Monitoramentodiagnóstico:acapacidadedediagnosticare,atémesmo,evitarumaenfermidadegravepormeiodaanálisededadoséumadasgrandesideiasnodiscursodoQuantifiedSelf.Busca de recompensas: monitoramento para obter pontuação ou registrarconquistas.

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Monitoramentofetichizado:estetipoacontecedevidoauminteressemaispuroem gadgets e tecnologia. Os usuários do Nike Fuelband, por exemplo,percebiam isso como sendo tecnologias “cool” (ou “iradas”) ou “pretty” (ou“bacanas”).

UmtrabalhoconduzidoporDanielA.Epstein,AnPing, JamesFogartyeSeanA.

Munson(EPSTEINetal.,2015)pesquisouousodeautorrastreadoresetrouxeumnovo

modelodeinformáticapessoallevantandoaquestãodainfluênciadosdadoscoletados

pelosdispositivosnoshábitosenarotinadosusuários.Estanovavisãolevaonomede

livedinformatics.Nesseestudo,baseadonoacompanhamentocontínuodeumgrupode

indivíduos, foram identificados três classes demotivações para o autorrastreamento:

mudança comportamental, instrumentação e curiosidade. Cadamotivação esclarece a

formacomoosusuáriosselecionam,usamefalhamnousodeseusdispositivos.Objetivos de mudança comportamental: trabalhos anteriores já descreveramcomo os objetivos de mudança comportamental podem motivar pessoas acomeçar o monitoramento. As ferramentas pessoais de informática apoiamobjetivosdeprogramadeprincípioseníveisnacategorizaçãodeobjetivosdePoder. Objetivos de programas de níveis são relativamente abstratos, e osprincípios orientadores ideais são aqueles que buscam obter objetivos, taiscomo“ficaremmelhorforma”,“termaiscontrolesobresuasprópriasfinanças”,e outras noventa e duas. Os objetivos de programa são mais específicos eimplementáveis(porexemplo,“saindodoburacodasdívidas”,outros).Objetivos de monitoramento instrumental: nós definimos o monitoramentoinstrumental como sendo o monitoramento sem o objetivo de mudançacomportamental.Oobjetivoéregistrarumcomportamentoespecífico,talcomoir a um local específico ou assistir a determinado filme. Os monitores delocalização frequentemente fornecem instrumentos para obter benefíciossociais.Curiosidade: muitas pessoas decidem fazer o monitoramento sem qualquertipo de objetivo comportamental, mas por pura curiosidade sobre como elepossaserouoferecer.

Opredomíniodeumaououtramotivaçãodeautorrastreamentovariadeacordo

como assunto.Metas demudançade comportamento são apontadas no estudo como

razões comuns para rastreamento de atividade física e controle financeiro. Metas

instrumentais foram apontadas como principais motivadoras de rastreamento de

localização.Acuriosidadefoiobservadanostrêsdomíniosmasfoimaismencionadapor

rastreadoresdelocalização.

Apesar de toda a tecnologia disponível ainda há muita controvérsia sobre os

métodoseletrônicosde rastreamentoe identificaçãoemocional.Muitosacreditamque

precisamos perguntar para as pessoas sobre os seus sentimentos para medir e

interpretar suas emoções. Só através dos relatos pessoais seria possível extrair

informaçõesválidassobreaemoçãodousuário.

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Emcontrapartida,vemosqueapesquisatecnológicavoltadaparaadetecçãoda

emoção avançou consideravelmentede sua fase experimental para a realidade.Novos

sensores conectados ininterruptamente com a rede permitem registrar e tratar um

volumededadosantesinimaginável.Dispomosdemuitomaisdadossobrenósmesmos

emuitomaiscapacidadedeanálise.Noentanto,mesmoquenossosdispositivossejam

testemunhasdenossasaçõese saibammuito sobrenós, aindanãosabemosuficiente

sobreoquedefatosentimos.EsteparadoxoéaquestãochaveparaoDesignEmocional

naatualidade.

Paracontextualizaronossoestudo,vamosretomarumaabordagemdemedição

dasemoçõesbaseadanohumordaspessoas.Ahistóriateminícionosanos80,quando

psicólogos começaram a usar um modelo bidimensional para descrever e medir o

humor dos seus pacientes. O artigo principal que deu origem a essa abordagem se

chamaUmModeloCircumplexodaEmoção,deJamesA.Russell,publicadopeloJournalof

Personality and Social Psychology em 1980. Para Russell (POSNER et al., 2005),

devemospensar o nosso espaço emocional comoumagrade comduasdimensões: no

eixoX está avalência positiva ounegativa (agradável/desagradável), no eixoY está a

estimulação ouatividade.Distribuídas em formade círculo ao redordessesdois eixos

estariamtodasasvariaçõesdossentimentoshumanos(figura14).

Quando as pessoas falam sobre suas experiências emocionais, conseguem

facilmente descrever sentimentos de valência (prazer ou desprazer) e estimulação

(sonolênciaouexcitação).EstaéumavantagemdomodelodeRussell.Osrelatosprópriosdeexperiênciapodemserdetalhadosaindamaisnaspartesintegrantes, usem elas palavras para descrever emoções de forma altamentegranular, ou não. Tais componentes são a valência (prazer-desprazer) e, emmenorproporção,aestimulação(ativação-desativação).Valênciaeestimulaçãosão normalmente definidas como propriedades dimensionais da experiência(BARRET,2006,p.25).

Outro aspecto favorável deste modelo é que se adapta a diferentes

granularidades de humor. Seja commuitos tipos de sentimento ou poucos, o formato

circumplexo e os dois eixos sempre estarão presentes. Pode-se, com ele, conduzir

pesquisas mais abrangentes sobre a valência dos sentimentos versus o grau de

estimulação, ou explorar nuancesmais específicas do humor do indivíduo. Omodelo

circumplexoéumaboaferramentadetrabalhoparapsicólogos,quetêmaoportunidade

de interagir com seus pacientes e questioná-los sobre o humor de forma direta e

simples.Comoestáoseuhumor?eComoestáoseuníveldeexcitação?sãoasperguntas

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iniciaisparaoentendimentodasemoçõescombasenomodelocircumplexo.Tambémse

tornou uma referência para o estudo do design emocional ao colocar em ummodelo

quasematemáticoossentimentoscapturadosnosautorrelatóriosdeusuários.

Figura14–ModeloCircumplexodeEmoções20

É de se imaginarqueomodelodeRussell tenha levantado controvérsias entre

psicólogoseestudantesdocomportamentohumano.Forçaroregistrodohumoraum

modelo bipolar, bidimensional, onde os polos não sãonecessariamente opostos, é um

risco.Umdosprincipaisargumentoscontraomodelocircumplexoéodapossibilidade

dos indivíduossentirememoçõesopostasaomesmotempo.Omodelonãodeveriaser

tãoexatoassim,éprecisosermaisflexível.

Explorandoestaideiadequeemoçõespositivasenegativaspodemcoexistirem

ummesmo contexto, DavidWatson, Lee Anna Clark e Auke Tellegen publicaram em

1988umartigoapresentandooPANAS(PositiveandNegativeAffectSchedule–Escalade

EmoçãoPositivaeNegativa),umametodologiadeestudodasemoçõesque registrae

trata separadamente as emoções de valências discordantes. Para os pesquisadores, é20TraduzidopeloautorapartirdoModeloCircumplexodeEmoçõesapresentadoemPOSNERetal.(2005,p.21).

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possível sentir-se bem emal aomesmo tempo, e esses sentimentos variam de forma

independente.

AescalaPANASconsisteemumalistade20diferentesemoções(10positivase

10negativas)quesãoclassificadaspelousuárioemumaescalade5pontos,sendo1o

valorcorrespondenteaausênciadaemoçãoe5àpresençaextrema.

Figura15–OPANAS(WATSONetal,1988,p.1070)

Alémdaescaladevalores,umaoutravariávelaplicadaaoPANASéo tempo.O

questionáriopodeseradaptadoparadiferentesinstruçõesdetempo:desdeomomento

atualatéperíodosmaislongosdetempo.

As conclusões da aplicação do PANAS, em várias circunstâncias diferentes,

mostraramqueosdadoscoletadostraziamfortesevidênciasdebipolaridade.Emoções

consideradasopostasapresentaramfortescorrelaçõesesuadisposiçãoemeixosouno

circumplexo não eram exatas. A oposição entre felicidade e tristeza não é tão clara

assim;abipolaridadeemocionalexiste.Apresentamos informações sobre o desenvolvimento de escalas simples paramedir as duas dimensões primárias do humor – Efeito Positivo e Negativo.Enquanto as escalas existentes são pouco confiáveis, possuem propriedadesconvergentes ou discriminantes ruins ou são excessivamente extensas, essasescalas de 10 itens são consistentes internamente e possuem excelentes

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correlações convergentes e discriminantes com as medidas mais longas dosfatores subjacentes do humor. Elas também demonstram estabilidadeadequada ao longo de um período de dois meses. Quando utilizadas cominstruçõesdecurtoprazo,porexemplo, ‘agoramesmo’ou ‘hoje’,sãosensíveisàsflutuaçõesdohumorexibindoestabilidadedetraçosquandoasinstruçõesdelongo-prazo são utilizadas, por exemplo, ‘no ano passado’ ou ‘normalmente’(WATSONetal,1988,p.1069).

As emoções já são um tema corriqueiro nos ambientes digitais. As reações

emocionais em forma de emojis (representações gráficas simplificadas), integradas às

redes sociais e aplicativos de troca demensagens, formam o nosso novo vocabulário

emocional deveras simplificado mas, ao menos, consistente e universal. Através dos

emojis, milhões de pessoas estão se habituando a expressar seus sentimentos

instantaneamente na forma de símbolos. A linguagem visual certamente facilita a

identificaçãodaemoção,alémdeseramaisadequadaaomeiodigital.Umcontextode

uso tão massificado como esse nos faz pensar em possíveis ferramentas de design

emocionalbaseadasemsímboloscomoosemojis.

Contudo, complexidade emocional e emojis parecem ser dois assuntos

mutuamente excludentes. Caricaturas exageradas, desenhadas em cores primárias,

dificilmente serão capazes de expressar pequenas mudanças de humor ou estados

mentaismais serenos.O exagero faz parte da narrativamelodramática e divertida do

uso dos emojis, que se enquadram perfeitamente à brevidade das interações nos

dispositivos móveis. Além do uso como forma de feedback de postagens em redes

sociais, os emojis viraram um padrão de interação para interfaces de avaliação de

serviçosdigitais.Nessecontexto,normalmenteaparecemjuntoaumaescalasimplesde

satisfação, normalmente de 5 pontos, exemplo: odiei, não gostei, indiferente, gostei,

adorei. A identificação com os emojis torna a avaliação mais automática e breve,

ajudandoaengajarmaisusuáriosnessaetapadeavaliação.

Certamente existem oportunidades não exploradas para o uso de emojis em

etapasdeentendimento,sínteseeideaçãodesoluçõesdigitais.Devemosacompanharde

pertoaevoluçãodesseformatocomoumalinguagemuniversaldeemoções.

4.6Novastecnologiasdereconhecimentoemocional

As tecnologias de detecção de emoção, também conhecidas como computação

emocional, se utilizam de microssensores e dispositivos de leitura para capturar

expressões faciais, tom de voz, temperatura e linguagem corporal entre outras pistas

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físicas para inferir estados emocionais do indivíduo. Incorporadas a smartphones,

assistentespessoaisouvestíveis,essastecnologiasestãocrescendoemprecisãotécnica

e capacidade de análise, graças ao avanço de outras frentes correlatas como a

inteligênciaartificialeananotecnologia.

Pamela Pavliscak adiantou nos primeiros capítulos do seu livro Designing for

Happiness, ainda sem data de lançamento, que existem cinco tipos principais de

tecnologiasdedetecçãodeemoção:1.Aanálise textual identifica frequência, arranjoe, algumasvezes,o contextodaspalavraseasmapeiaparaumacategoriaemocional.2. O reconhecimento de voz identifica padrões no tom de voz, ritmo eintensidadedavozhumana.3.Oreconhecimentofacial identificaasexpressões combasenascincoaseteemoçõesuniversaisdePaulEkmanquesetornamóbviaspelaexpressãofacial.4.Osdadosbiométricosmedembatimentocardíaco,olhar,pressãosanguínea,temperatura da pele ou outros sinais físicos e os traduz em categoriasemocionais.5. No autorrelatório, as pessoas relatam como se sentemde diversas formas,incluindoperguntas,classificaçãodeintensidadeouexpressãodeemoçõespormeiodeimagensoumúsicas.Oautorrelatórionãoéexatamenteumaavaliaçãodasemoções,masaindaénecessária,poisasemoçõesnãosãoumsinalfísico,mas sim uma avaliação cognitiva (PAVLISCAK, 2017, Kindle Locations 894-897).

Estudos onde são combinados diversos tipos de tecnologia de detecção de

emoção chegam a resultadosmais elaborados e detalhados sobre o estado emocional

dos indivíduos.AconsultoriamPath, fundadaporElliottHedmandoMITMediaLab,é

pioneira na combinação de sensores de stress com técnicas mais tradicionais de

pesquisa de observação. A proposta da mPath é desvendar os pequenos momentos

emocionais, quase imperceptíveis, que caracterizam as nossas reações a produtos e

experiências.Seumaempresafabricantedeeletrodomésticosresolvetestarumdeseus

produtos, por exemplo, os sensores podem ajudar a identificar precisamente em que

momentodainteraçãoousuárioficoufrustradocomodesigndoproduto.Osdadosdos

sensores são mapeados junto com os outros registros de observação e engajamento,

fornecendoumainterpretaçãomaisricadoimpactoemocionalprovocadopeloproduto.Baseado na condutividade da pele. Alguém que seja estimuladopsicologicamente (por exemplo, estressado ou excitado) irá começar a suar.Tais variações sutis na transpiração afetam a condutividade elétrica da pele.Avalieacondutividadeevocêconseguirámonitoraraexcitação(VANHEMERT,2014).

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Astecnologiasbaseadasapenasemsensoresdereaçõesperiféricasdocorpotêm

comoprincipaldesafioregistrarasnuancesdasemoções.Issoporqueonossocorpofoi

programado para responder de uma forma específica aos estímulos, acionando os

nervosperiféricosapenasemcontextosemocionaisextremos,ignorandoasnuances:“As respostas do sistema nervoso periférico configuram condições de risco edesafio(...),efeitopositivoversusnegativo(...),masnãodistingueminequívocaeconsistentementeascategoriasdeemoções,taiscomoódio,tristezaemedo.Evidências do comportamento facial mostram os mesmos resultados. Amedição eletromiográfica facial se coordena em torno do efeito positivo ounegativo (...), intensidade ou efeito (...), em vez de categorias de emoçõesdistintas”(BARRETT,2006,p.23)

A dificuldade de detecção e interpretação detalhada é ainda maior para as

emoções de valência positiva, como apontado por Pamela Pavliscak. Uma das razões

para isso é a predominância de pesquisas sobre emoções negativas na área da

psicologia:Contrariamenteàsemoçõesnegativas,asemoçõespositivassãorelativamenteindiferenciadas: alegria, diversão e serenidade não são facilmentediferenciáveisentresiemtermosdeexpressãofacial,jáquetodaselasresultamem um sorriso. Devido às diferenças sutis entre as emoções positivas, osconjuntosdeemoçõesbásicasmaiscomumenteutilizadosincluemumamenorquantidade de emoções positivas que negativas. Portanto, a pesquisa sobreemoções na psicologia foca predominantemente nas emoções negativas. Omesmo pode se aplicar à detecção das emoções (PAVLISCAK, 2017, KindleLocations1026-1029).

Nãohádúvidasdequeessastecnologiasparaoentendimentodasemoçõesvão

ajudarnoprocessodedesign,levandoaexperiênciasmaisinteligentesemaishumanas.

Masistonãodeveacontecerdeimediato.Sentimentos são complicados, desesperadoramente misturados com aidentidade, experiência e contexto. Sem contar as emoçõesmisturadas comapercepçãoecogniçãosensorialecomportamentos.Oreconhecimentodascincoexpressõesfaciaiscanônicasnãoiránostornarmaissensíveiscomonumpassedemágica.Porém,astecnologiasdedetecçãodeemoçõespodemnosinspirarareconsiderar odesign emocional pornos fornecermais informações sobre asemoções(PAVLISCAK,2017,KindleLocations1102-1105).

Aoquetudoindica,apróximaondadastecnologiasdedetecçãodeemoçõesirá

provocarumaabordagemmaisdetalhadaesensívelàsnuancesdosnossossentimentos.

4.7Aimportânciadosautorrelatórios

Todas as evidências disponíveis, quando analisadas em conjunto, sugerem que

nãoexisteumaformaclaraeobjetivadesemediraexperiênciadaemoção.Aindanão

estamos prontos para estabelecer uma medida única, ou um conjunto padrão de

parâmetros,quepossamindicarquandoumapessoaestásesentindotriste,alegre,com

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raivaoumedo.Comovimos,astecnologiasdedetecçãoaindanãosãocapazesdelidar

comas nuances de emoções, o que torna o entendimento raso. Podemos identificar a

valência da comoção de um indivíduo (prazer ou desprazer) mas ainda é impossível

determinarquaissãoassensaçõesquecompõemesseestadoemocional.Em suma, cientistaspodemconseguir avaliar o estado afetivodeumapessoa(prazer e desprazer, por exemplo), de formasmais indiretas (...) ou objetivas(pormeiodafaceoudocorpo,porexemplo).Porém,taisaferiçõesnãopodemserutilizadasparaseavaliarossentimentosdeódio,tristezaoumedo.Orelatoverbal,mesmocomtodasassuasfalhas,podeserumadasúnicasformasdeseavaliar a experiência da emoção. Caso desejemos saber se uma pessoa estásentindo determinada emoção, devemos perguntar a ela (BARRETT, 2006, p.24).

Novamenteesbarramosnaquestãodagranularidadeemocional.Parausardados

provindos de relatos sobre emoções, é importante considerar as diferenças de

vocabulário dos indivíduos, o seu contexto cultural e, principalmente, o humor no

momentodorelato.Indivíduos de baixa granularidade emocional reportam suas experiências emtermosglobais.Elesutilizamrótulosemocionaisdiscretos,taiscomo‘irritado’,‘triste’ etc., para representar apenas os aspectosmais gerais de seus estadosinternos(geralmenteprazeredesprazer). (...)Maiscomumente,os indivíduosdebaixa granularidade emocional utilizampalavras relacionadas às emoções,tais como ‘feliz’ e ‘animado’ para transmitir a ideia de ‘agradável’, e palavrascomo‘triste’e‘irritado’paratransmitiraideiade‘desagradável’.(...)Indivíduosde alta granularidade reportam suas experiências de forma mais precisautilizando palavras mais diferenciadas e utilizando rótulos emocionaisdiscretos de forma a capturar o distanciamento entre os significados dostermos. (...) O fato de que as pessoas possuem diferentes granularidadesemocionaisindicaquenemtodomundosabeadiferençaentreossentimentosdetristeza,ódio,culpaetc.(BARRETT,2006,p.25).

Aparentemente, todos os humanos conseguem distinguir entre um sentimento

positivoeumnegativo,entreprazeredesprazer.Tambémnãoédifícildistinguirentre

os níveis de estimulação. Ao menos essas duas variáveis, valência e estimulação (ou

ativação) podem ser usadas como base para os autorrelatórios. As variações surgem

quando lidamos com indivíduos de maior granularidade emocional, que conseguem

expressarcommaisprecisãosuasexperiênciasemocionais.

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4.8PEGcards:umaferramentaparaodesignemocional

Figura16–PEGCards-PositiveEmotionalGranularityCards21

As PEG Cards (Positive Emotional Granularity Cards – Cartas de Granularidade

EmocionalPositiva)sãoumaferramentadedesign,desenvolvidapeloDelftInstitutefor

Positive Design na Holanda, que tem como objetivo ajudar nos processos de design

focadosnaemoção.Umconjuntode25cartasrepresentativasdas25emoçõespositivas

mapeadas por Desmet ajudam o designer a compreender e explorar as nuances das

emoções em atividades de design. O conteúdo das cartas é composto por definições,

condições,ocorrênciaserepresentaçõesgráficasdecadaemoção.Ascartaspodemser

utilizadas tanto na pesquisa quanto na prática de design como uma ferramenta de

comunicação ou uma fonte de inspiração. A recomendação geral do projeto das PEG

Cardsindicatrêsformasdeaplicaçãonoprocessodedesign:

1. entenderasnuancesdasemoçõespositivas

2. determinaraintençãoemocionaldeumproduto

3. facilitaracriatividadenaetapadeconceituaçãododesign

AsPEGCards sãoa instrumentalizaçãodoestudodas25emoçõesdeDesmete

permitemqueasemoçõessejamreconhecidaseendereçadasnoprocessodedesign.A

propostadascartaspartedeumconceitobásicodeusabilidadequeafirmaseroesforço

cognitivodoreconhecimentomenorqueodamemória.Ouseja,émaisfácilreconhecer

21(YOONeJEONG,2013)

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umaemoçãoespecífica,comoauxíliodascartas,quetentarnomearessamesmaemoção

apartirdamemória.

4.9Escalabilidadedaexperiência

Nummundo onde as experiências são o produtomais importante das grandes

indústrias,é importanteentendercomoasemoçõesevocadasnasmicrointeraçõesdos

clientespodemafetarasatisfaçãogeral.Vimosqueaciênciaeosvárioslaboratóriosde

tecnologiatêmdedicadotempoedinheironodesenvolvimentodesensoresemétodos

dedetecçãoeclassificaçãodasemoções.Entendemosqueexperiênciaseemoçõesnão

sãoeventosisolados.Sãointerligados,frutodeumconjuntodepequenasinterações.A

EscalabilidadedaExperiência é aquantidade infinitadepequenas interaçõesusuário-

produtoesuasrespostasemocionaisquefomentamexperiênciasmaiores.Nos sistemas interativos, o desafio é entender as influências das pequenasexperiênciaserespostasemocionaissobreaspessoas,bemcomoavisãogeral.Cadainteraçãocomoprodutoemumaexperiênciapodesercaracterizadaporuma resposta emocional efêmera, pode ser confirmada por uma expressãoemocional ou humor específico, e é arquivada namemória como um aspectoespecífico de uma experiência. A escalabilidade da experiência também serelaciona à forma comoas experiênciasde cadaumem relação aosprodutospodemmudaraolongodotempo(FORLLIZZIeBATTARBEE,2004,p.265).

Desenharaexperiênciaécuidardosmúltiplospontosdecontatodousuáriocom

o sistema ou produto. Escalar a experiência significa fazer reverberar as reações

emocionaispositivasdecadainteraçãoemumaexperiênciamaior,demaiorsignificado

para o usuário. Como vimos, entender e desenhar para as emoções não é uma tarefa

confortável para a indústria tecnológica. Mas é uma crescente preocupação, que vem

fomentando diversos estudos e avançosmetodológicos. O design emocional tem essa

função genuína de construir emoções positivas e minimizar as negativas através do

design.Essa tarefa,emescala,permitequeodesignalmejeobjetivosaindamaiores:o

designparaafelicidade.

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5FELICIDADE

Antesdeexplorarmososrecentesesforçosdodesignnaconstruçãodafelicidade,

faremos um levantamento das teorias sobre felicidade e bem-estar que mais

influenciaramessaabordagem.Oobjetivodesteestudonãoéfazerumtratadosobrea

felicidade,tarefaquasequeimpossívelparaumregistrodemestrado,massim,pincelar

asopiniões,estudosetrabalhoscientíficosnasáreasdaFilosofia,PsicologiaeEconomia

Comportamental que mais influenciaram o design recentemente. Comecemos pela

filosofiadeAristóteles.

Aristóteles tinha um conceito da felicidade como um fim por si só, o objetivo

máximodabuscadohomemduranteasuavida.Algoque,naturalmente,almejamose

quenoséfundamentalparaasdecisõesquetomamos,paraasescolhasquefazemos.Aristóteles fazda felicidade“aatividadedaalmadirigidapelavirtude”, istoé,pelo exercício da virtude, e não da simples posse. (JAPIASSÚ eMARCONDES,1991,p.96)

Trata-se de uma abordagem mais ampla e mais inclusiva, pois extrapolava a

noção utilitarista da felicidade relacionada simplesmente às sensações de prazer. A

noçãodeAristótelesparaa felicidadeganhouonomedeeudaimonia que significaum

estado de prosperidade da alma, pressupondo um engajamento físico, emocional e

intelectualcomomundo.Sóatravésdoexercíciodavirtudeépossívelatingiropotencial

pleno de realização de cada um. A felicidade aristotélica está relacionada ao que o

indivíduofazdesiedesuavida;éumaexpressãodavirtude,aconsequêncianaturalde

sefazeroquevaleapenaserfeito.

5.1APsicologiaPositivaeasabordagensteóricasacercadafelicidade

Muitas teorias acerca da felicidade foram propostas desde os conceitos de

Aristóteles.Napsicologiaumaabordagemrecentetrazafelicidadecomoprincipalfoco

deestudoseterapias.APsicologiaPositivaconseguiumudaraformacomopsicólogose

terapeutastratamseuspacientes,ajudando-osaprosperaremsuasvidasenãoapenas

tratandodistúrbiospsicológicos.O termo ‘Psicologia Positiva’ foi utilizado pela primeira vez em 1954 porAbrahamMaslowno capítulodeum livronoqual elenotouquea ‘ciênciadapsicologiatevemuitomaisêxitodoladonegativoquedoladopositivo.Elanosreveloumuitomaissobreasdeficiências,malesepecadosdohomemquesuaspotencialidades, virtudes, aspirações realizáveis, ou sua estatura psicológicacompleta. É como se a psicologia se restringisse voluntariamente a apenas

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metadedesuajurisdiçãolegal,àparteobscuraemaismesquinha”(...).Maisde40 anos mais tarde, Martin Seligman reintroduziu o termo e declarou que apsicologiaestavaapenas “parcialmentedesenvolvida”equeprecisavaprestarmais atençãoao ladobomdaspessoas.Empouco tempo, gruposdepesquisasurgiramem todosos cantosdosEstadosUnidos,deFiladélfia aWashington,passandoporLincoln,Colúmbia,echegandoatéemlocaisremotoscomoGrandCaymaneAkumal.ApromessadessanovavertentedaPsicologiaPositivaeramuitoclara:utilizandoasmesmastécnicaseferramentasqueexplicamnossasfraquezas, previnem e tratam doenças, poderíamos melhorar nossoentendimento acerca dos nossos pontos fortes e promover o bem-estar(SNYDEReLOPEZ(eds.),2009,p.3).

NoartigoSubjectiveWell-Being:TheScienceofHappinessandLifeSatisfaction,Ed

Diener, ShigehiroOishi e Richard E. Lucas apresentam três grupos de teorias sobre a

felicidadequeresumemmuitobemasdiferenteslentesdeestudodaPsicologiaPositiva:

(1)teoriasdenecessidadesemetas;(2)teoriasdeprocessoouatividade;e(3)teorias

depredisposiçãogenéticaoudepersonalidade.

(1)Teoriasdenecessidadeemetas

O primeiro grupo de teorias tem como ideia central a felicidade através da

satisfaçãodenecessidadesbiológicasepsicológicasedareduçãodasdores.Oprincípio

doprazerdeFreud,ondeodesejopelagratificaçãoimediatamotivaoindivíduoabuscar

oprazereevitarador,éaprincipalrepresentaçãodesseteoria.

Abraham Maslow também registrou seu entendimento sobre a motivação

humananummodeloque ficoubemconhecidonasescolasdemarketing, chamadode

Hierarquia de Necessidades Humanas. De acordo com a visão de Maslow, as

necessidades humanas podem ser dispostas em uma pirâmide, onde as necessidades

básicas ficam na base (como comida e abrigo) e as mais elevadas ficam no topo. As

pessoas são naturalmente motivadas a satisfazer as necessidades básicas antes de

subiremparapatamaresdenecessidadesmaiselevadascomoautoestimaourealização

pessoal.

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Figura17-PirâmidedeMaslow22

(2)Teoriasdeprocesso/atividade

Segundoessegrupodeteorias,oengajamentodoindivíduoemumaatividadeou

em um processo é capaz de proporcionar felicidade. Um dos representantes mais

notáveis dessa teoria é Csikszentmihalyi, psicólogo e autor de vários livros sobre o

conceito de flow, um estadomental de alta performance individual, altamente focado.

Csikszentmihalyi (2008) sugerequeaspessoas sãomais felizesquandoestão imersas

em atividades interessantes que sejam compatíveis as suas habilidades pessoais. Ele

chamouesteestadomentaldeengajamentocomumaatividadedeflow,argumentando

que as pessoas que experimentam este estado com frequência tendem a ser muito

felizes.

Diz-se que um indivíduo entra em estado de flow quando suas maiores

competênciassãoempregadasparacumprirasmissõesmaisdesafiadorasquesurgem

emsuavida.

22INTERACTIONDESIGNFOUNDATION(2016)

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Aspessoasquevivenciamflowodescrevemcomo‘umestadodeconcentraçãosemesforçonecessário tãoprofundoqueseperdeasensaçãodetempo,desimesmo,deseusprópriosproblemas”,esuasdescriçõesdealegriaemtalestadosãotãoconvincentesqueCsikszentmihalyiodescreveucomouma“experiênciaperfeita’(KAHENEMAN,2015,p.40).

Oconceitodeflowtornou-seumpilarimportanteparaaatualpesquisacientífica

acerca da felicidade, influenciando disciplinas análogas em outras áreas como a

Economiaeoprópriodesign.

Dentrodestegrupodeteoriasdeprocesso/atividadeestãotambémaspesquisas

quefalamdaimportânciadotrabalhoorientadoametasparaafelicidade.Aqueles que pesquisaram sobre objetivos (...) concordam que ter objetivosimportantes e progredir em relação ao seu atingimento são indicadoresconfiáveisdebem-estare,portanto,as teoriasdosobjetivospodemcombinaros elementos de satisfação de necessidades e atividades prazerosas paraexplicarobem-estarsubjetivo(SNYDEReLOPEZ(eds),2009,p.189).

O estado de imersão sem esforço descrito por Csikszentmihalyi pode explicar

tambémarelaçãodiretaentreaatençãoeafelicidade.Estaéumadasteoriasexplorada

pelo professor de Ciências Comportamentais da London School of Economics, Paul

Dolan, em seu livroHappiness byDesign. Dentre os processos cognitivos, a atenção é

apontadacomoaresponsáveldiretapelobem-estarsubjetivodaspessoas.Aatençãoé

umprocessoprodutivocapazdeconverterestímulosemfelicidade.O processo de produção da felicidade é, portanto, como alocamos a atenção.Aquilo que contribui para nossa felicidade está dentro dos mais diversosestímulos que competem por nossa atenção. Eles então são convertidos emfelicidadepormeiodaatençãoquededicamosaeles.Ofoconaatençãoéo“eloperdido”nacadeiadasentradasesaídas.Osmesmoseventosecircunstânciasna vida podem afetar mais ou menos nossa felicidade dependendo daquantidadedeatençãoquededicamosaeles.Duaspessoasquesãoparecidasemmuitossentidospodemficarfelizespordiferentesmotivos,dependendodecomoconvertemsuasentradasemsaídasdefelicidade(DOLAN,2015,p.46).

Esta aproximação entre atenção e felicidade traz consigo uma notável

simplificação do processo individual da busca pela felicidade. Torna hipoteticamente

viável,paraqualquer indivíduo, transformara rotinaemumaplataformaparaobem-

estarsubjetivo.Seafelicidadeédeterminadapelaalocaçãodaatenção,osegredoestaria

nadisciplinaenocontroledanossaconcentração.Noentanto,nãotemostotalcontrole

dosnossosprocessoscognitivos,muitomenosdoquenoschamaaatenção.Aocontrário

doqueseimagina,nãosomoscapazesdeprestaratençãoadoiseventossimultâneos.A

atenção é um recurso limitado e pode ora ser comandada conscientemente pelo

indivíduo,oraserrequisitadaporeventosexternos,interrompendoofoco.

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(3)Teoriasdepredisposiçãogenéticaedepersonalidade

Um terceiro grupo de teorias argumenta que fatores genéticos e traços de

personalidade são determinantes para a felicidade. Alguns estudos que relacionam a

personalidade do indivíduo ao seu grau de bem-estar encontram evidências nas

característicascomportamentaisdosindivíduos.Quandoseexaminamasinfluênciasdapersonalidademaisdetalhadamente,ostraços que são mais consistentemente ligados ao bem-estar subjetivo são aextroversãoeoneuroticismo(...). Emespecial,háuma facetadaextroversão(emoçõespositivas)eumadoneuroticismo(depressão)queexplicammelhoras diferenças individuais na satisfação na vida que os traços globais daextroversãoeneuroticismodeummodogeral(SNYDEReLOPEZ(eds.),2009,p.189-190).

SonjaLyubomirsky,professoradoDepartamentodePsicologiadaUniversidade

da Califórnia, é uma das principais pesquisadoras da felicidade sob o viés da

predisposiçãogenética.EmseulivroTheHowofHappiness,afelicidadeédefinidacomo

aexperiênciadealegria,contentamentooubem-estarpositivocombinadaaosentimento

de que se leva uma vida boa, repleta de sentido e que vale a pena (LYUBOMIRSKY,

2016). Apesar da clara referência ao conceito de eudaimonia de Aristóteles, o livro

exploraasevidênciascientíficasqueembasamateoriadapredisposiçãogenéticaparaa

felicidade.SegundooargumentodeLyubomirsky,aconstruçãodafelicidadeédefinida

portrêscomponentesdepesosdistintos.

A predisposição genética seria responsável por 50% da felicidade de cada

indivíduo.Nossoníveldebem-estarmantém-serelativamenteomesmoduranteanossa

vida,determinadoporaspectoshereditárioseportraçosprematurosdepersonalidade.

Apenas10%daconstruçãodafelicidadeestarianascircunstâncias,noseventos

não voluntários da vida do indivíduo. Situação financeira, estado de saúde e bens

materiaissãoexemplosdessascircunstâncias.

Os40%restantesseriamcompostospelasatividades intencionaisdo indivíduo,

suasescolhas,suasexperiênciasvoluntáriaseseucomportamentoconsciente.Atuando

nestafatia,odesignpodeinfluenciaraconstruçãodafelicidadeatravésdeexperiências

que encantem, forneçam prazer e propósito. É neste contexto que as marcas se

desdobram para conseguir a atenção dos seus potenciais clientes e engajá-los em

experiênciasencantadoras.Omaiordesafiodedesignestá, justamente,nasustentação

doprazerporlongosperíodosdetempo.

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O conceito da adaptação hedônica, derivado das teorias de predisposição

genética,apoia-senaideiadequecadaindivíduopossuiumnívelbásicodefelicidade.As

pessoas,demaneirageral, tendemaconservarem-senessenívelconstante,apesardos

eventosedocontextodesuasvidas.Umenigmaclássiconapesquisadobem-estarsubjetivoenvolveas limitaçõesdos efeitos hedonistas de longo-prazo nos resultados que são amplamentedesejados ou temidos por antecipação e evocam emoções intensas quandoocorrem(...).Emumapesquisarecenteutilizandodadoslongitudinais,Oswalde Powdthavee (2005) descobriram que a satisfação média com a vida decaiapós o surgimento de uma deficiência moderada, mas se recuperacompletamente aos níveis anteriores à deficiência dentro de dois anos. Esseprocesso é conhecido por adaptação ou habituação. Oswald e Powdthaveeacreditam que tal adaptação também acontecemas é incompleta no caso dedeficiências graves. Outros eventos, tais como casamento e luto também têmefeitos de curto-prazo consideráveis sobre a alegria e satisfação com a vida,porém, tais efeitos são geralmente temporários (...). Descobertas como essasnos remetem à ideia de um poderoso processo de adaptação hedonista queeventualmente retorna as pessoas a um ponto pré-determinado por suaspersonalidades(KRUEGER(ed.),2009,p.17).

Aadaptaçãohedônica funcionacomoumacalibragemautomáticada felicidade,

ajustando nossos sentimentos e sensações aos parâmetros básicos determinados pela

nossa genética e personalidade. Este fenômeno, observado e registrado em vários

estudoscientíficossobreobem-estarsubjetivo,fazcomquenosadaptemosaosaltose

baixosdavida.Naprática,oquenostrazfelicidadeagoranãotraráamesmafelicidade

nofuturo.Assimcomooquenosfazsofreragoranãoteráomesmoimpactonegativono

futuro.Pesquisas sobre a alegria nos mostram que adaptamos nossas expectativasrapidamente de forma a nos habituarmos ao que nos alegrava no passado.Existemenorpossibilidadedenoscansarmosdosaspectosdeumaexperiênciaqueapenasvivenciamosumavez,taiscomocriarumaconta,quandoumanovafuncionalidadeéintroduzidaouquandoumaaçãoécompletadapelaprimeiravez.Portanto,aprimeiravezquelemosalgointeressante,provavelmenteserádivertido.Dapróximavez,provavelmentenemtanto(PAVLISCAK,2017,KindleLocations738-741).

Asimplicaçõesdesseconceitoparaodesignsãocruciais.Principalmenteparao

design digital. Atualmente, metabolizamos nossos produtos tecnológicos tão

rapidamentequeafelicidadeproporcionadanãosesustentapormuitotempo.Abusca

pelapróximaversãomelhoradadaquiloque jápossuímosnosmantémemmovimento

nessaesteirahedônica,embuscaconstantepeloprazer.Cadanovaaquisiçãotraznovas

promessas de felicidade e nos mantém nesta busca incessante. O ritmo rápido da

indústria tecnológica nos encoraja a olhar para o futuro, para a próxima grande

inovação,ao invésdenosencorajaraapreciaroque jápossuímos.Aesteirahedônica

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alimenta um ciclo vicioso de antecipação, consumo desenfreado, obsolescência

programadaedescarte.

Durantemuitotempoacreditou-sequeaadaptaçãohedônicaaconteciadeforma

semelhante para eventos de ganho ou de perda de felicidade. Descobertas recentes

apontam para uma revisão desta teoria, afirmando que as pessoas não se adaptam a

mudançasdrásticasdevidadamesmaformaqueeventosnegativosmenosintensos.DesdeofamosotrabalhodepesquisadeCoateseJanoff-Bulmanquecomparouganhadores da loteria com pacientes com lesão na medula espinhal, muitaspessoaspassaramaacreditarqueossereshumanospodemseadaptaraosmaisdiversoseventosnavida(eefetivamenteofazem),equetaiseventosnãotêmum efeito de longo prazo considerável no bem-estar das pessoas. Entretanto,maisrecentemente,talinterpretaçãofoiquestionada(...).Projetoslongitudinaisem grande escala revelaram que as pessoas não se adaptam às mudançasdrásticas nas circunstâncias da vida, tais como se tornar deficiente (...),divorciado (...) ou desempregado (...). Em especial, muitos dessesdesventurados indivíduos que passaram por tais mudanças radicais em suasvidasnãoretornaramaosníveisdefelicidadeanterioresaofatoe,portanto,oconceitodeum“pontodeajuste”nãodeveserconsideradocomofixo(SNYDEReLOPEZ(eds.),2009,p.190).

5.2Felicidadevivenciadaesatisfaçãocomavida

A Psicologia contemporânea reconhece uma variedade de indicadores de

felicidade.Doistiposdeindicadoressecontrapõemesecomplementamnosestudosde

felicidade. De um lado estão os dados capturados sistematicamente durante uma

experiência,dooutroestãoosrelatospessoaissobreaexperiênciaapóssuaocorrência.

Estas duas formas de semedir a felicidade constituemdois conceitos importantes na

teoriadobem-estarsubjetivo:afelicidadevivenciadaeafelicidadereportada.Nossainterpretaçãodaestruturadobem-estarsubjetivoseconcentraemdoisfatores qualitativamente distintos que contribuem ambos para o Bem-EstarSubjetivo.Oprimeirodelesestárelacionadoàformacomoaspessoasencaramavida,oqueserefletenossentimentospositivosenegativosqueacompanhamsuas atividades diárias. Nos referimos a este componente como ‘felicidadevivenciada’, ou amédia de umadimensão de experiência subjetiva reportadaem tempo real sobre um período extenso. O segundo componente estárelacionadoà formacomoaspessoasavaliamsuasvidas.Normalmente, ele éavaliadocommediçõesdesatisfação,taiscomo“Considerandoasuavidacomoumtodo,qualseuníveldesatisfaçãocomasuaprópriavidaatualmente?”Hámuitas formas para se mensurar tais componentes do Bem-Estar Subjetivo,masentendemosquedescrevemaspectossobrepostos–porémdistintos–davidadecadaum(SCHWARZeCLORE1983)”(KRUEGER(ed.),2009,p.16).

Fazerumaavaliação individualdavida,edoníveldesatisfaçãocomela,éuma

tarefadifícilde julgamento.Somosaltamente influenciadospor fatores comoohumor

domomento,o contexto, as açõesprévias, local, tempo.As respostasdeum indivíduo

para a perguntaVocêé feliz? podemmudar dependendo de todos esses fatores. Além

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disso, somos imperfeitos ao fazer julgamentos baseados na razão. Nosso cérebro

trabalhanummodelomentalbaseadoemheurísticas,regrasqueagilizamaresoluçãode

problemasediminuemoesforçocognitivo.Numaoperaçãoanalíticacomoesta,ondeé

necessáriorecuperarvárioseventos importantesdavidaeponderá-losnuma linhado

tempo,o cérebrovai automaticamenteprocurarporatalhospara trazerumaresposta

rápida.Avaliar a própria vida como um todo pode ser uma decisão extremamentecomplicada(...).Damesmaformaqueacontececomoutrasdecisõesdifíceis,aavaliaçãodaprópriavidaaconteceporheurísticaconsultiva–asrespostasquevêm à mente em primeiro lugar (...). Demonstrações experimentais depreparação e efeitos contextuais fornecem evidências do papel de taisheurísticas nos relatórios de satisfação com a vida (...). Duas das perguntasheurísticasquesãoutilizadassão: ‘Oquantoeusouumapessoasortuda?’e ‘Oquanto eu me sinto bem?’. A primeira delas envolve uma comparação dascircunstâncias individuais com parâmetros convencionais ou pessoais,enquanto a segunda direciona a atenção para a experiência emocional maisrecente. Pesquisas indicam que, por exemplo, a satisfação com a vida que éreportada é maior em dias ensolarados que em dias chuvosos de formaconsistente com a influência do clima sobre os humores temporários daspessoas.Seosindivíduossãoquestionadosespecificamentesobreotempoemprimeirolugar,elestendemanotarqueseussentimentosatuaistalvezapenasreflitam uma influência temporária, o que elimina o efeito do clima nasatisfaçãocomavidaqueéreportada.(KRUEGER(ed.),2009,p.16)

Então,comopodemosavaliaremedirumaexperiência?Qualamelhorformade

acessaraspercepçõesdoindivíduosobreasuaprópriavidasemcairnasarmadilhasdos

vieses cognitivos? Daniel Kahneman, em seu livroRápido eDevagar: Duas Formas de

Pensar, exploraoconceitodaUtilidadedaExperiênciacomosendoumamétrica ideal,

capazdeindicarosníveisdeprazeroudorqueumindivíduoexperimentaduranteum

evento.Comoautilidadevivenciadapodesermensurada?Comodeveríamosrespondera perguntas, tais como ‘O quanto Helen sofreu durante o procedimentomédico?’ ou ‘Quanta alegria ela obteve passando 20 minutos na praia?’ Oeconomista francêsFrancisEdgeworthespeculoua respeitodesseassuntonoséculo 19 e propôs a ideia de um ‘hedonímetro’, que seria um instrumentoimagináriosemelhanteaosdispositivosutilizadosnasestaçõesmeteorológicaspara medir os níveis de prazer ou dor que um indivíduo vivencia emdeterminadomomento(KAHENEMAN,2015,p.378).

Aideiadohedonímetroéumautopiaparaqualquerdesignerdeexperiência.Ter

registrostãogranularessobreassensaçõesdoindivíduoemumaexperiência,se fosse

possível, seria tambémumgrandedesafio. Seria possível resolver todos os pontos de

dorapontadospelohedonímetro?Comoumaequipededesignconseguiriadarcontade

múltiplas experiências e usuários? Além disso, a proposta do hedonímetro ainda não

possuiumafundaçãotecnológicaqueasustente.Talvezasnovastecnologiasmóveise

vestíveistragamsoluçõesviabilizandoasuaconstrução.Jávimosmuitosavançosnesse

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sentido, principalmente com os smartwatches repletos de sensores capazes demedir

pequenas alterações fisiológicas e gerar interpretações contextualizadas. Sem dúvida,

estamosmaispróximosdoquenuncademedirautilidadedaexperiênciaededesenhar

soluçõesmaisfluídas,livresdefricçãoedirecionadasaoestímulodoprazer.

Além do hedonímetro, a Utilidade da Experiência pode ser medida através de

outrométodo,sistematicamenteoposto:aavaliaçãoretrospectiva.Paraseavaliaruma

experiência, segundo este método, é necessário resgatar a memória da experiência

depoisde terminada.Desta forma, estaríamos acessandoapercepção final dousuário

sobre a experiência e não todos os pontos de interação conforme elas acontecem. A

avaliaçãoretrospectivarespeitadoisviesescognitivos importantesquando falamosde

experiência:aregradopico-fimeanegligênciacomaduração.Regradopico-fim(peak-endrule):a classificaçãoretrospectivaglobal foibemprevistapelamédiadoníveldedorrelatadonopiormomentodaexperiênciaeemseufim.Negligência com duração (duration neglect): a duração do procedimento nãoexerceuomenorefeitonasavaliaçõesdedortotal(KAHENEMAN,2015,p.474).

Paraonossocérebroenviesado,oníveldesatisfaçãodeumaexperiênciapassada

éamédiadopiorníveldedorpercebidaedoseunívelaofinaldaexperiência.Ouseja,

nãofazmuitosentidogastaresforçosdedesignpararesolvertodosospontosdedorde

uma experiência. Resolvendo apenas o momento mais crítico e, entregando uma

interaçãofinalmuitoboa,estaremosalimentandoumaboamemóriadessaexperiência.

Daniel Kahneman apresenta essas duas abordagens na formade dois eus: o eu

experiencial (aquele que vive a experiência) e o eu recordativo (aquele que usa a

lembrança).Oeuexperiencial(experiencingself)éoquerespondeàpergunta:‘Estádoendoagora?’. O eu recordativo (remembering self) é o que responde à pergunta:‘Comofoiisso,notodo?’(KAHENEMAN,2015,p.476).

De fato, as memórias são tudo o que levamos das experiências vivenciadas e

constituem a nossa principal perspectiva quando tentamos avaliar a nossa vida como

umtodo.Estamosconstantementecriandoearmazenandohistóriasdanossavida,não

nosimportandocomaduraçãodosacontecimentos,mascomsuarelevânciaeimpacto.

Este é o trabalho do eu recordativo, compor histórias memoráveis e guardá-las para

referênciafutura.Háumainconsistência incorporadaaodesigndanossasmentes.Temos fortespreferências acerca da duração de nossas experiências de dor e prazer.Queremosqueadorsejabreveequeoprazerdure.Masnossamemória,umafunçãodoSistema1,evoluiupararepresentaromomentomaisintensodeum

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episódiodedorouprazer(opico)eassensaçõesquandooepisódioestavaemseu final. Umamemória que negligencie a duração não terá utilidade para anossa preferência por longos prazeres e sofrimentos curtos (KAHENEMAN,2015,p.480).

Na nossa ingênua concepção, temos controle racional das escolhas e nossos

processos cognitivos são pautados pela lógica.Nossas avaliações de satisfação geral e

bem-estar subjetivo também estariam embasadas por argumentos racionais. Mas, se

consideramosessasduasrepresentaçõesdoeuetodososviesescognitivos,percebemos

queoeurecordativoexerceumainfluênciamuitomaiornonossocomportamentoena

formacomoavaliamosasexperiências.Confundiraexperiênciacomsualembrançaéumailusãocognitivaconvincente–eéasubstituiçãoquenosfazacreditarqueumaexperiênciapassadapodeserarruinada.Oeuexperencialnãotemvoz.Oeurecordativoàsvezesestáerrado,maséelequeficadeolhonoplacaregovernaoqueaprendemoscomavida–eéelequemtomaasdecisões.Oqueaprendemoscomopassadoémaximizarasqualidadesdenossasfuturaslembranças,nãonecessariamentedanossafuturaexperiência.Essaéatiraniadoeurecordativo(KAHENEMAN,2015,p.476).

5.3Medindoafelicidade

Comomedimosafelicidade,afinaldecontas?Estaéumaquestãocadavezmais

presente na pauta de projetos de design da experiência. A superação de disciplinas

tradicionais do design de interação, como arquitetura de informação e usabilidade,

permitiuqueumpalcofosseconstruídoparanovasfrentesemetodologiasdetrabalho.

O foco continua sendo o usuário,mas agora podemos explorarmais os seus aspectos

cognitivos e emocionais. Quando se fala em felicidade como objetivo de design, como

algo possível de ser desenhado, ainda vemos resistência e um certo desconforto.

Entenderafelicidadeatravésdepesquisaseentrevistascomusuáriosaindapareceuma

abordagem incompleta. Mesmo havendo vários métodos válidos de pesquisa que se

apoiam em relatórios pessoais, os resultados não parecem totalmente confiáveis. As

pessoasnemsempresabemarticularoquesentemoupensam.Poroutro lado,vemos

nascermuitasnovastecnologiasvoltadasparaamediçãoeinterpretaçãodassensações

humanas. Já é possível usar imagens de ressonância magnética para medir o fluxo

sanguíneonocérebro.Ouusareletromiografiaparamonitoraraatividadeelétricados

músculos da face reconhecendo pistas da emoção do indivíduo. Essasmétricas quase

biológicastambémnãosesustentamisoladamenteparaquestõesdefelicidadeedesign.

Osdoisgruposdedadosdevemsercorrelacionados.

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A felicidade sempre foi um assunto polêmico na academia e no mundo dos

negócios,masasnovasabordagensparao registroe interpretaçãoda felicidadeestão

mais e mais sofisticadas. Os dois eus, recordativo e experiencial, precisam ser

considerados no processo de design. Ambos precisam ser observados para que

possamos entender as sensações momento a momento juntamente com a percepção

finaldaexperiência.

EmumartigodenominadoVocêéfelizenquantotrabalha?doisespecialistasem

Economia Comportamental, Alex Bryson e George MacKerron (2006), agrupam os

métodos de mensuração da felicidade em três grandes categorias: avaliativa (ou

cognitiva),naqualaspessoassãoprovocadasa fazeravaliaçõesglobaisdesuasvidas;

hedônica (ou afetiva) na qual as pessoas avaliam seus sentimentos de prazer ou

desprazermomentoamomento;eaeudemônicaqueregistraapercepçãodaspessoas

sobrepropósito,sentido,recompensaeosentimentodequeavidavaleapena.(BRYSON

eMACKERRON,2016).Vamosdetalharcadaumadessascategorias.

5.4Métricasavaliativas/cognitivasdefelicidade

A maior parte dos estudos realizados sobre o bem-estar subjetivo,

principalmentenaPsicologiaenaEconomiaComportamental,sãoestudosbaseadosem

métricas avaliativas. O tirano eu recordativo classifica as experiências com base na

memóriadelas,fazendooquefoidenominadoporKahnemaneKruger(2006,p.6)como

avaliaçãoretrospectivaglobal.Entretanto,osjulgamentosglobaisdasatisfaçãocomavidanãocorrespondemfidedignamenteaohumormédioouaonívelmédiodesatisfaçãovivenciadosaolongo de diversos momentos ou domínios porque tais julgamentosprovavelmenteserãoinfluenciadospelohumoratualdapessoa,suascrençasarespeito da felicidade e a facilidade de obtenção de informações negativas epositivas (...). Portanto, as informações obtidas a partir de aferições globaisprovavelmenteserãocomplementadasporformasadicionaisdeavaliaçãocombase na memória, em relatórios dos informantes e amostras da experiência.(SNYDEReLOPEZ(eds.),2009,p.188).

Como levantado por Kahneman, o estadomental domomento presente ganha

umadimensãoenormequandoaspessoassãoquestionadassobreoquantosãofelizes.

Atendênciaéfazermosumaavaliaçãoretrospectivamuitopositivadavidaseestamos

de bom humor naquele momento. E não tão boa se algo desagradável aconteceu

momentosantes.

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Bom humor e otimismo são grandes influenciadores do bem estar, pois

favorecem uma visão mais positiva das coisas. Muitos estudos tratam dessa

predisposiçãopositivacomumtermodifícildetraduzirparaoportuguês:positiveaffect.

A tradução literal seria emoção positiva mas o conceito é mais específico. Affect é a

experiência da emoção ou do sentimento. Positive Affect refere-se à experiência

subjetivadobomhumor,doprazer,dointeresseedaatenção.Éprovadocientificamente

queopositiveaffectéumgrandefacilitadordafelicidade,promovendoacriatividade,a

intuiçãoeaautoestima.Étambémumótimomotordeatividadessociaisedeprocessos

cognitivosmaiscomplexos.Umaquantidadecrescentementemaiorde trabalhosdepesquisa indicaqueopositive affect suave (sentimentos de felicidade) induzida de forma sutil ecomum que pode ocorrer frequentemente na vida cotidiana facilita diversoscomportamentossociaisimportanteseprocessosdepensamento.Porexemplo,os trabalhosdas últimasduasdécadasmostraramque opositiveaffect leva aumamaiorcriatividade(...),melhoresprocessosdenegociaçãoeresultados(...)e mais flexibilidade, profundidade e abertura nas formas de se pensar eresolver problemas (...). Tudo isso se soma às pesquisas anteriores quemostram que o positive affect promove a generosidade e a responsabilidadesocialnas interaçõesinterpessoais(...).A literaturaindicaque,namaiorpartedascircunstâncias,aspessoasquesesentemfelizessãomaissuscetíveisafazeroquequerem,queremfazeroqueésocialmenteresponsável,útileprecisaserfeito,gostammaisdoquefazem,sãomaismotivadasaatingirosseusobjetivos,sãomais abertas à informação e pensammais claramente (SNYDER e LOPEZ(eds.),2009,p.503-504).Uma parte considerável dos trabalhos de pesquisa nas últimas três décadasdocumentouoimpactodopositiveaffectsobreainteraçãosocial–porexemplo,ajudaegenerosidade(...)(SNYDEReLOPEZ(eds.),2009,p.504)Uma quantidade substancial de obras sustenta a conclusão de que o positiveaffect promove a flexibilidade no pensar. (SNYDER e LOPEZ (eds.), 2009, p.505)

Aconclusãodessesedeoutrosestudoséqueopositiveaffectéumcombustível

paraacriatividade,paraainovaçãoeparaprocessoscognitivosmaisflexíveis.Tantoas

tarefasindividuaiscomoasinteraçõessociaisficammaisfáceiseprazerosas.

Aprincipalexplicaçãoparaesseefeitotransbordantedobomhumornosnossos

processoscognitivosvemdaneuropsicologia.Umadashipóteseséqueadopamina,um

conhecidoneurotransmissor,sejaamediadoradessaatuaçãodasemoçõespositivasnos

processoscognitivos.Essahipótesesugerequeopositiveaffectpodeafetarsobretudoastarefasquesãocontroladaspelasregiõesdocérebroquecontémreceptoresdedopamina.Consequentemente,essasugestãopodenoslevaraformasmaisespecíficasdese definir os tipos de tarefas que possam ou não ser facilitadas pelo positiveaffect(SNYDEReLOPEZ(eds.),2009,p.514).

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Essa e outras hipóteses tentam conectar o humor e opositiveaffect às funções

cerebrais. Ainda temos muito trabalho pela frente para fazer essas relações

neuropsicológicas com mais segurança. A presença ou ausência de um componente

químiconocérebrocertamenteafetanossobem-estar,assimcomováriosoutrosfatores

externos ao nosso corpo. Nosso comportamento, objetivos pessoais e predisposição

genéticasãopeças importantesnaconstruçãodonossohumor. Issosignificaqueuma

visão reducionista talvez não seja apropriada. Ao invés disso, devemos incorporar

conhecimentosedescobertasalémdaneurociênciaedagenética.

Um dos métodos mais relevantes para a medição da felicidade que evoluiu a

partir das métricas avaliativas, é o DRM (Day Reconstruction Method – Método de

ReconstruçãodoDia).CriadoporDanielKahneman,ométodoavalia comoaspessoas

passam o tempo e como experimentam as atividades e configurações de suas vidas,

combinando uma série de indicadores. No DRM, os participantes são convidados a

reconstruírem de forma sistemática suas atividades e experiências do dia anterior. O

instrumento original do DRM é um questionário desenhado para reduzir os vieses

cognitivos comumente encontrados em avaliações baseadas em relatórios pessoais.

Durante o preenchimento, os indivíduos são inicialmente orientados a dividirem as

experiênciasdavésperaemepisódiosquesão,emseguida,classificadosemescalasde

emoção/sentimentos.

Memórias viram relatos e, logo a seguir, episódios. Através desse processo é

possívelobservarasatividadesquesedestacaramnaavaliaçãogeraldoindivíduosobre

odiaanterioretratá-lasdeformaestruturada,ponderandootempodecadaumacom

os sentimentos envolvidos.Asperguntas ainda exploramquestões específicas sobre o

humordoparticipantenomomentodopreenchimento e sobre a satisfação geral dele

com a vida. Todas essas diferentes formas de acessar a percepção de bem-estar do

indivíduoetodoohistóricodeaplicaçãocientíficadoquestionáriofazemdoDRMuma

importanteferramentaparaoentendimentodafelicidade.

Embora os métodos de avaliação global de felicidade baseados em relatórios

sejam mais suscetíveis aos vieses cognitivos, eles oferecem informações importantes

sobreoprocessodeconstruçãodevaloreseobjetivosdevida.Aavaliaçãoretrospectiva

defelicidade,baseadanamemóriadeexperiênciaspassadas,éumimportantesubstrato

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paraasdecisõesfuturasdoindivíduo.Éesseresumoqueelaboramosdavida,cheiode

imperfeições,queconseguimosacessardeformanaturalequemoveasnossasdecisões.

5.5Métricashedônicasdefelicidade

Nestacategoria,osmétodosdemediçãodafelicidadebaseiam-seeminformações

sobre o nível de prazer/desprazer do indivíduo em tempo real. Dois nomes

contribuíramparaodesenvolvimentodessesmétodos:FlügeleCsikszentmihalyi.No começo do século 20, os estudos empíricos do bem-estar subjetivocomeçaramaganhar forma. Jáem1925,Flugelestudavaoshumorespedindoparaaspessoasregistraremseuseventosemocionaiseentãoresumindosuasreaçõesemocionaisaolongodessesmomentos.OstrabalhosdeFlugelforamospioneirosnasabordagensmodernasdeamostragemdeexperiênciaparamedirobem-estarsubjetivoonlinenocotidianodaspessoas(SNYDEReLOPEZ(eds.),2009,p.187).

Considerandotodososviesescognitivoseaforteinfluênciadamemórianonosso

discurso sobre felicidade e satisfação com a vida, apresentado anteriormente, não é

indicado classificar o bem-estar apenas com relatos pessoais. Uma abordagem mais

científica levaria em consideração amostras de emoções conforme ocorrem em cada

eventodaexperiência,duranteumperíododetempo.Denovovoltamosaoconceitodo

hedonímetro.OExperienceSamplingMethod(ESM),tambémconhecidocomoEcological

MomentaryAssessment(EMA),éumametodologiadepesquisaondeosparticipantessão

convidados a interromper suas atividades em momentos específicos para fazerem

anotações sobre aquela experiência em tempo real (agora, não depois; aqui, não em

qualquer lugar). Ao contrário do DRM, que questiona os participantes sobre seus

sentimentos em eventos da véspera – um procedimento dependente da memória e

suscetível a distorções – este método busca respostas instantâneas, em tempo real,

sobresentimentoseemoçõesidentificadosnumaexperiência.

O ESM foi desenvolvido por Csikszentmihalyi e Larson na década de 70. Foi

aplicado pela primeira vez por Csikszentmihalyi e seus colegas na Universidade de

Chicago,utilizando,naépoca,pagerscontroladosporrádioparaalertarosparticipantes

sobreomomentodopreenchimentodapesquisa.Cadaparticipanterecebeuumdiário

onde fez anotações orientadas pelas interceptações do pesquisador. Outra forma de

anotaçãoéatravésdequestionáriospré-confeccionadosedistribuídosaosparticipantes,

contendo escalas psicométricas, perguntas abertas e formulários para a avaliação das

condições psicológicas do participante naquele lugar e momento. Atualmente, com a

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grandeadoçãodosdispositivosmóveis,essemétodotemsebeneficiadoenormemente.

Smartphones são dispositivos que podem transmitir gatilhos via mensagens

instantâneas, apresentar as questões em uma interface gráfica (ou conversacional),

registrarahoraeolocaldarespostaeenviaropacotededadosinstantaneamentepara

opesquisador.

Ométodoécomumenteutilizadoparareunirrespostasdepessoasdurantesuas

atividadesdiárias,repetidamente.Alémdereduzirasdistorçõesdecorrentesdousoda

memóriaparaavaliaçãodaexperiência,oESMtambémreduzaquantidadenecessária

deinteraçõescomopesquisadorduranteacoletadosdados,minimizandoainfluência

dapresençadestenaqualidadedapesquisa.O método de amostragem de experiência, também chamado de avaliaçãomomentânea ecológica (ou ESM na sigla em inglês) é ummétodo comum decoleta de dados. O ESM defende as avaliações in situ (na própria situação),ecologicamente válidas (se aproximando da situação de vida real que estásendo estudada) e ao longo de vários dias, portanto, é adequado para serutilizadonasmaisvariadasaplicaçõesparacomputadorparaosmaisvariadostiposdeambienteecontextos.Nosúltimosanos,oESMvemsendoutilizadoemdiversosprojetosdepesquisaparaentendero comportamentodousuárionocampoecomoformadeseavaliarosmaisdiversossistemasdecomputadores(HSIEHetal.,2008,p.164).

Um estudo conduzido por pesquisadores do Human Computer Interaction

Institute, da Carnegie Mellon University, nos Estados Unidos, defende a aplicação do

ESM combinada com feedbacks visuais, na forma de infográficos, para aumentar a

adesãoeoengajamentodosparticipantes.Nosso estudo de campo demonstrou que o feedback aumenta os índices decompliance em 23%. Além disso, dar feedback sobre um tipo de dado dentretudo o que é coletado no estudo é suficiente paramelhorar a compliance detodos os dados, portanto, o tempo de desenvolvimento não é aumentadoconsideravelmente. Acreditamos que ES+feedback podem ser utilizados paramelhorar a participação nas avaliações das mais variadas tecnologiascomputacionais(HSIEHetal.,2008,p.167).

Um outro estudo recente, conduzido por pesquisadores de diversos institutos

ligadosàtecnologiaepsicologiadainteração,investigouaaplicaçãodoESMatravésde

smartwatchesesmartphones.Descobrimos que, de um modo geral, os telefones que foram comumenteutilizados para ESM receberam pontuações mais positivas em termos defacilidade de interação, potencial de uso futuro e exatidão percebida dosrelatórios. (...)OWatch recebeumais pontuaçõespositivasnosmais diversosfatores de usabilidade e superou ligeiramente o desempenho do telefone emtermosde confortododispositivo. Entretanto, o tamanho limitadoda tela doWatchpodeinfluenciarousocompletodealgunstiposdeescalasderesposta(HERNANDEZetal.,2016).

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OmétodoESM,baseadonasamostrasdeexperiência,éconsideradoumdosmais

confiáveis na investigação da felicidade pois consegue informações do indivíduo no

exatomomentodesuasatividadesdiárias.Asinterceptaçõesemtemporealconseguem

extrairdosparticipantesrelatossobreseuspensamentos,sentimentoseaçõesnaquele

momento.Antesdaexpansãodeusodossmartphones,oESMeraummétodolimitadoa

pequenasamostrasdeparticipantes,peloaltocustodeexecuçãoeindisponibilidadede

uma tecnologia de grande alcance. Hoje, é possível utilizar telefones celulares como

dispositivosgatilho,aumentandoconsideravelmenteopotencialdealcancedométodo.

Há várias iniciativas no meio digital, principalmente no formato de aplicativos para

smartphones,baseadasnomodelodoESMpararastreareentenderafelicidade.Vamos

aquifalardeduasexemplares:osaplicativosTrackyourhappinesseMappiness.

5.6TRACKYOURHAPPINESS–deMattKillingsworth

TrackYourHappinessouRastreieasuaFelicidade éumprojetoquese inicioua

partirdatesededoutoradodeMattKillingsworth,naUniversidadedeHarvard.Trata-se

deumaplicativowebparasmartphonesqueenviade3a5mensagensdetextoparao

usuárioduranteodia,emhoráriosaleatórios,comumasériedequestões.Coisascomo

“Quãofelizvocêestáagora?”, “Oquevocêestáfazendo?”, “Vocêtemquefazeroqueestá

fazendo?”, “Onde você está?”, “Você está falando ou interagindo com alguém?”, etc. As

perguntas seguem uma sequência lógica e são condicionalmente interligadas. Dessa

forma,sevocêdizqueestáinteragindocomalguém,logoemseguidavemumapergunta

sobre“comquantaspessoasvocêestáinteragindo?”,paraaprofundaroentendimentodo

contexto.

O projeto Track your happiness investiga a hipótese da felicidade estar

relacionadaaoteordanossaexperiênciamomentoamomento.Oqueestamosfazendo,

comquem,noqueestamospensandosãofatoresquetêmgrandeinfluênciaemnossas

vidas. Eventos que, até então, eram quase impossíveis de serem monitorados

cientificamente.O formatoaplicativowebpermitequeuma imensabasederelatosde

pensamentos,sentimentoseações,deumgrandenúmerodepessoas,sejacoletadaem

temporealedeformalongitudinal.

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Figura18–TeladoaplicativoTrackyourhappiness23

Após algum tempo de uso do aplicativo, os participantes têm acesso a um

relatório analítico sobre os eventos reportados e a sua relação com a felicidade. A

síntesedessegrandevolumededadospessoaisfazcomqueorelatóriosejaumaótima

ferramenta de autoconhecimento, mantendo o usuário engajado no uso do aplicativo

porumlongoperíodo.

Além de valor para os usuários, oTrack yourHappiness contribuiu com dados

muito importantes para a pesquisa sobre a felicidade. Em Julho de 2013, Matt

Killingsworth escreveu um artigo para a revista Greater Good Magazine fazendo um

balançodoestudo.Apresentouumresultadorevelador,baseadonaanálisededadosde

mais de 650.000 relatos, envolvendo cerca de 15.000 pessoas de idades, renda, nível

educacionaleestadocivilvariados,emmais80países.Nos resultados que descreverei, focarei nas respostas que as pessoas derampara três perguntas. A primeira delas era sobre felicidade: ‘Como você sesente?’emumaescalade‘muitomal’até‘muitobem’.Asegunda,umaperguntasobre atividade: ‘O que você está fazendo?’ e uma lista de 22 atividadesincluindo ‘comendo’, ‘trabalhando’ e ‘assistindoTV’. A terceira, umaperguntasobrementes divagadoras: ‘Você está pensando sobre alguma coisa além doque está fazendo agora?’ As pessoas poderiam responder ‘não’ (ou seja,estavam focadas apenas na atividade atual) ou ‘sim’ (estavam pensando emmais alguma coisa). Tambémperguntamos se o assunto de tais pensamentosera agradável, neutro ou desagradável. Qualquer ‘sim’ para essas perguntasseriaoquechamamosde‘mentesdivagadoras’(KILLINGSWORTH,2013)

23Telacapturadaem17/07/2017doaplicativo“TrackYourHappiness”,paraiPhones

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Nocomeço,asmentesdaspessoasdivagavamfrequentemente,não importaoqueestivessemfazendo,issoocorreuem46,9%dasamostraseempelomenos30%dasamostrasfeitasdurantequalqueratividade–exceto“fazendoamor”.Em segundo lugar, a regressão multinível revelou que as pessoas estavammenos felizes quando suasmentes estavam divagando emais felizes quandonão estavam divagando [declive (b) = –8,79, P < 0,001], e isso se mostrouverdadeiroemtodasasatividades,incluindoasmenosagradáveis.Em terceiro lugar, a coisa na qual as pessoas estavam pensando semostrouuma melhor previsão de sua felicidade do que a atividade que estavamexecutando.Anaturezadasatividadesdaspessoasexplicou4,6%dasvariaçõesintrapessoaise3,2%dasvariaçõesinterpessoaisnafelicidade,masadivagaçãoda mente explicou 10,8% da variação intrapessoal e 17,7% da variaçãointerpessoalnafelicidade(KILLINGSWORTHeGILBERT,2010)

Aconclusãodoestudomostraagrandeinfluênciadamentenonossobem-estar

subjetivo.Umamentedispersa empensamentos é umamente infeliz. A habilidadede

anteciparacontecimentos,depensar sobreoquenãoestáacontecendo, apesarde ser

umaincrívelevoluçãocognitivadohomem,trazumcustoemocionalalto.

Seamentedispersafereonossobemestarsubjetivo,porquenãotransformara

buscapelofocoemumdesafiodedesign?

5.7MAPPINESSeafelicidadenotrabalho

Um outro aplicativo para smartphones, denominado Mappiness, baseia-se no

métodoESMde amostrasde experiênciaparamapear a felicidade comumadinâmica

semelhante: indivíduos que baixaram o aplicativo recebem alertas randômicos

chamados dings convidando-os a responder uma pequena pesquisa. A pesquisa pede

umaautoavaliaçãocombaseemtrêsdimensõesdebem-estar:felicidade,relaxamentoe

despertamento. A avaliação é feita numa interação simples com sliders entre dois

extremos:DemodonenhumeExtremamente.

Numasegundaetapadoquestionário,oindivíduorespondeperguntassobresuas

atividadesnomomentoeoseucontexto. Juntoaorelatofornecidopeloparticipante,o

sistemacapturadadosdegeolocalização,horaexatadoenviodoalerta,atrasoentreo

alertaearespostaaoquestionárioeahoradoenviodoquestionário.

Osusuáriosengajadosdoaplicativotêmacesso,apósdeterminadotempodeuso,

a um relatório comuma visão global sobre os sentimentos reportados e os contextos

quepossivelmenteosinfluenciaram.

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Figura19–TeladoaplicativoMappiness24

ParaospesquisadoresGeorgeMacKerroneSusanaMourato,daLondonSchoolof

Economics,desenvolvedoresdoprojeto,asdescobertasvãoalémdoâmbitopessoal.O

Mappinesstrouxeinformaçõesvaliosasparaentendermosarelaçãoentreotrabalhoea

felicidade.Concluímosqueotrabalhoremuneradoestápiorcolocadoquequaisquerumadas outras 39 atividades individuais que as pessoas executam – exceto ficardoentedecama.Permanecemoscomaquestãorelativaàrazãopelaqualotrabalhopareceterum efeito tão adverso no bem-estar momentâneo individual. Sabemos quepartedarespostaestárelacionadaàansiedadenotrabalho.Mesmoquandoaspessoas são positivas sobre o trabalho remunerado ao refletir sobre osignificadoevalordesuasvidas,oenvolvimentocomo trabalhoremuneradosempre tem um custo pessoal em termos de pressão e estresse enfrentadosduranteotrabalho.(...) o trabalho continua a ser correlacionadonegativamente coma felicidade,mesmo quando está associado a outras atividades agradáveis. Em segundolugar,mesmoquandoseestácondicionadoaossentimentosderelaxamento,otrabalhocontinuaserassociadonegativamentecomobem-estarmomentâneo.Em vez disso, parece que o trabalho em si está negativamente associado aobem-estarhedonista,deformaquepreferíamosestarfazendooutrascoisas.Emoutraspalavras,otrabalhorealmenteéumadesutilidade,comooseconomistasvemdefendendotradicionalmente(BRYSONeMACKERRON,2016,p.124).

OestudoconduzidoatravésdoMappinessconfrontaosdoismétodosdepesquisa

de felicidade que abordamos aqui: uma avaliação retrospectiva/reflexiva sobre o

trabalho e outra baseada em amostras de experiência momento a momento. A

comparaçãorevelaresultadosdiscordantessobreapercepçãodefelicidadenotrabalho

epodese transformaremum interessantedesafiodedesign: comoutilizarosvalores

24TeladoaplicativoparasmartphoneMappiness,capturadaem17/07/2017-http://www.mappiness.org.uk/

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positivosrelacionadosaotrabalhoparatransformararotinadoempregoemalgomais

prazeroso?

5.8Métricaseudemônicas

Oterceirogrupodemétricasdefelicidadebaseia-senoconceitodeeudaimonia,

deAristóteles.Osmétodosdepesquisadessegrupoprocuramregistrarapercepçãodas

pessoas sobre propósito, sentido, recompensa e o sentimento de que “a vida vale a

pena”.

Um dos mais importantes estudos sobre felicidade realizados no mundo, o

Gallup-HealthwaysWell-BeingIndex,partedaabordagemeudemônicaparaentendera

felicidadedosnorte-americanos.

Desde 2008, o Gallup, conhecido instituto de pesquisas norte-americano, faz

ligaçõestelefônicasdiáriasparacercade1000adultosresidentesnosEstadosUnidosa

fimdeentenderaspectosdesuasvidascomostatusemocional,satisfaçãonotrabalho,

hábitosalimentares,doenças,níveldestressentreoutros indicadoresdequalidadede

vida. Trata-se de um esforço notório para medir os componentes do bem-estar

subjetivo,daboavida,calculadosedivulgadosatravésdoGallup-HealthwaysWell-Being

Index.NavisãodoGallup,bem-estaréumconceitoquecapturaaspectosimportantesda

experiência e dos sentimentos das pessoas no seu dia-a-dia – em outras palavras,

envolvemaisdoquesaúdefísicaouindicadoreseconômicos(RATHeHARTER,2011).Bem-estar consiste na combinação de nosso amor pelo que fazemosdiariamente, a qualidade de nossos relacionamentos, a segurança de nossasfinanças, a vitalidade de nossa saúde física e o orgulho que temos pelo quecontribuímos às nossas comunidades. E omais importante, trata-se de comoessescincoelementosinteragementresi.(RATHeHARTER,2011,p.17).

OGallup-HealthwaysWell-BeingIndexéconsideradohojeoíndicedebem-estar

subjetivomaiscomprovado,maduroecompletonomundo.Ametodologiadepesquisa

adotadapeloGallupsebaseiaemumaperspectivapsicológicadobem-estarsubjetivoe

no método de amostras da experiência (Experience Sampling Method) para medir a

satisfaçãodepessoascomsuasvidas.

Dentre os cinco elementos essenciais para o bem-estar subjetivo, o mais

importanteéochamadoBem-estarProfissional.Aspessoasnormalmentesubestimamainfluenciadesuacarreiraemseubem-estargeral.MasoBem-estarProfissionalé indiscutivelmenteomaisessencialdos cincoelementos. Sevocênão tiveraoportunidadede fazer regularmente

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algodequegoste–mesmoquesejamaisumapaixãoouinteressedoquealgoque lhe paguem para fazer -, a probabilidade de que tenha um bem-estarelevado em outras áreas diminuirá rapidamente. (RATH e HARTER, 2011, p.27).

O Bem-estar Social, segundo elemento explorado pelo Gallup, discute a

importância dos nossos relacionamentos interpessoais para o humor e a felicidade

individual.De acordo com um estudo de Harvard, nosso bem-estar depende de toda anossa rede. Essa pesquisa, que se baseou em um estudo longitudinal paramaioresdetrinaanoscommaisde12milpessoasintegrantesdeumamesmarede interligada,descobriuqueasuaprobabilidadedeser felizaumenta15%seumaconexãodiretaemsuaredesocialestiverfeliz(RATHeHARTER,2011,p.47).ConformeopesquisadordeHarvard,NicholasChristakis,resumiu:“Aspessoasestãoinseridasemredessociaiseasaúdeeobem-estardeumapessoaafetaasaúdeeobem-estardeoutras…Afelicidadehumananãoésomentedaalçadadeindivíduosisolados(RATHeHARTER,2011,p.48).

Obem-estarfinanceironãoédiretamenteproporcionalàquantidadededinheiro

de um indivíduo. Se utilizado apenas como shopping terapia, para aquisição de bens

materiaisembenefíciopróprio,garanteapenasumganhotemporáriodefelicidade.Odinheiropodeaumentarafelicidadenocurtoprazo,dando-nosmaiscontrolesobre como gastamos o nosso tempo, quer isso signifique uma viagemmaiscurtaparaotrabalho,maistempoemcasacomafamíliaouumtemposocialamaiscomosamigos.(RATHeHARTER,2011,p.65).Mas,seusarmosnossodinheiroparacomprarexperiênciasagradáveis,temosobenefíciodeficarmosansiososcomoevento,daexperiênciareale,emalgunscasos,dedécadasdeboaslembranças.(RATHeHARTER,2011,p.67).

O Bem-estar Físico depende de nossas escolhas relacionadas ao nosso corpo

físico. A forma como cuidamos de nossa saúde através de atividade física e hábitos

alimentares.Edecomoadiamosasatisfaçãomomentâneaemproldeobjetivosdelongo

prazo.

OBem-estarnaComunidadeestá relacionadoao sentimentodepertencimento,

segurançaecomprometimentoaumgrupoouorganizaçãocomunitária.

O Gallup Well-Being Index mostra toda a complexidade de uma pesquisa

estruturada, rigorosa e abrangente sobre a felicidade. Mais próximo do que seria

necessárioparaaferirtodososaspectoslevantadospelateoriadeAristóteles.

Numcenárioideal,amediçãodobemestarsubjetivodaspessoasaconteceriade

forma abrangente e fluída. As amostras de experiências seriam registradas sem

interrupções,paraquenãohouvessemdistorçõesnosdadosprovocadosporpequenas

variações de humor. Para as experiências cognitivas e expressivas é importante que

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também seja feita uma análise de relatos pós-eventos, respeitando a forma como os

indivíduosarticulamsobreamemóriadosfatos.

Durante este trabalho, temos usado os termos felicidade e bem-estar subjetivo

com a mesma intenção. Mas precisamos aqui fazer a devida distinção entre os dois

conceitos, seguindo a abordagem da Psicologia Positiva apresentada porMartin E. P.

Seligman.

5.9EntendendoaPsicologiaPositiva

“Obem-estaréumaconstrução,eafelicidadeéumacoisa”(SELIGMAN,2011,p.14).

Como falamos anteriormente, a Psicologia Positiva é um contraponto à

abordagem da psicologia tradicional focada em diagnosticar e tratar os distúrbios

psicológicos.Elasepreocupacomaconstruçãodobem-estarsubjetivodoindivíduo.Um

dos nomes mais proeminentes da Psicologia Positiva é Martin E. P. Seligman, que

escreveuumtratadosobreobem-estarsubjetivonoseulivroFlourish:AVisionaryNew

UnderstandingofHappinessandWell-being.IssoédiametralmenteopostoaosconhecimentosqueSigmundFreudtrouxedoMonteSinai:queasaúdementaléapenasaausênciadedoençasmentais.Freudera um seguidor do filósofo Arthur Schopenhauer (1788– 1860). Ambosacreditavam que a felicidade é uma ilusão, e que, na melhor das hipóteses,podemosesperarmanternossadesgraçaesofrimentoemníveismínimos.Quenãohajadúvidasacercadisto:apsicoterapiatradicionalnãofoiconcebidaparaproduzirobem-estar,elafoiconcebidaparalimitarosofrimento–oque,porsisó,jáéumatarefabemambiciosa(SELIGMAN,211,p.183).

Para explorarmoso conceitodebem-estar que vamosdesenvolvernopróximo

capítulo,énecessárioantesresgatarateoriadaFelicidadeAutêntica,tambémpostulada

porSeligman,quedeuorigemàatualabordagemdaPsicologiaPositiva.

A visãoda felicidade comouma coisa, explicadapelo nível de satisfação coma

vida, é o princípio da teoria da Felicidade Autêntica. Segundo esta teoria, três

componentes seriam responsáveis por determinar a felicidade: emoções positivas,

engajamentoepropósitonavida.O indivíduopossuindomaisdesses trêspilares será

maisfeliz.

Para a Psicologia Positiva, o bem-estar subjetivo não pode ser reduzido a uma

coisa. É uma construção, formadapor vários elementosmensuráveis, coisas reais que

contribuemparaobem-estar,masnãoodefinem.

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O bem-estar é exatamente como ‘o clima’ ou como ‘a felicidade’ em suaestrutura: não há uma forma única de ser definido peremptoriamente (emjargão, ‘definir peremptoriamente’ é chamado de ‘operacionalizar’), masdiversos fatorescontribuempara isso.Sãooselementosdobem-estar,ecadaumdeleséumfatormensurável(SELIGMAN,211,p.15)

A discussão principal da Psicologia Positiva, portanto, é a construção do bem-

estar subjetivo, não apenas o entendimento da felicidade como produto da satisfação

com a vida. Dado esse propósito, dois elementos foram adicionados ao composto da

Felicidade Autêntica, somando 5 elementos determinantes do bem-estar: emoções

positivas, engajamento, relacionamentos positivos, propósito e realização. Em inglês

essescincoelementos formamasiglaPERMA-Positiveemotions,Engagement,Positive

Relationships,Meaning,Achievement.

Positive Emotion - Emoções positivas: sensações positivas que amamos sentir

comocalor,prazer,conforto,êxtase,saciedade,etc.Sentimentosbons,avidaagradável.

Asemoçõessãoumaparte importantedesteedeoutrosmodelosde felicidade,

pois são as que nos afetam num nível mais profundo. Emoções positivas podem ser

reflexos do passado na forma de satisfação, orgulho, contentamento ou serenidade.

Podem ser parte domomento presente na forma de prazeres sensoriais ou conforto.

Podem estar projetadas no futuro na forma de esperança, otimismo, confiança e

convicção.

Engagement - Engajamento: a experiência que temos ao estar completamente

absortosnuma tarefa.O chamadoestadode flow, definidoporCsikszentmihalyi como

um estado de consciência onde o indivíduo se funde com o objeto. Quando estamos

fazendo algo que amamos, seja jogar um videogame, praticar esportes ou tocar um

instrumento,oflowfazcomqueotempopassesempercebermos,podemosatéesquecer

denósmesmos.Emoçãopositivaeengajamentosãoduascategoriasdateoriadobem-estarnasquaistodososfatoressãomedidosapenassubjetivamente.Sendoumelementohedonista (ou relacionado ao prazer), a emoção positiva inclui todas asvariáveis comuns do bem-estar subjetivo: prazer, êxtase, conforto, calor etc.Entretanto, é importante considerar que pensamento e sentimentonormalmente estão ausentes durante o estado de flow, e apenasposteriormente costumamos dizer frases, tais como “Que divertido!” ou “Quemaravilhoso!”. Emborao estado subjetivoparaoprazer estejanopresente, oestadosubjetivoparaoengajamentoestáapenasemretrospectiva(SELIGMAN,211,p.17).

Meaning–Propósito:asensaçãodepertenceraumpropósitomaior,deservira

umacausaemqueacreditamos.Sentimentosdecumprimentoeorgulho.

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Accomplishment –Realização:aconquistapelaconquista.Obuscapelosucesso,

pela vitória e pelamaestria por si só, semuma razãodeterminante, é tida comouma

forma de impulsionar o bem-estar. Sucesso, realização pessoal no trabalho, no

relacionamento,nasnossaspaixõesecomunidadessãotodoscombustíveisparaobem-

estar.

Positive Relationships – Relacionamentos Positivos: uma vida social vibrante e

variada, com amigos e pessoas de confiança. Grandes amizades, até para a sabedoria

popular,sãoomelhorantidepressivo.

A importância das conexões interpessoais aparece no cerne de vários estudos

sobrebem-estar.Relacionamentosdequalidadecontribuem,defato,paraumavidamais

saudável e feliz. A internet e os dispositivosmóveis criaram uma plataforma perfeita

para o desenvolvimento de relações humanas, aproximando pessoas e fortalecendo

laçosquepoderiamsermenosprezadosemoutroscontextos.

Umestudorealizadoem2015porRobertKrau,professordoHuman-Computer

InteractionInstitute,CarnegieMellonUniversityeacientistadedadosMoiraBurke,do

Facebook, revelou que o uso diário da internet só traz um ganho de bem-estar

comprovadoquandoassociadoainteraçõescompessoaspróximas(amigoseparentes).

Aanálisecombinoudadosdetrêspesquisasquemediramapoiosocial,depressão

eoutrosaspectosdobem-estarpsicológicocomcontagensagregadasdeatividadesno

Facebook.ArelaçãoentreautilizaçãodoFacebookeobem-estardependeramdecomoaspessoas utilizaram o site e com quem se comunicaram. (...) recebercomunicaçãodirigidae individualizadaapartirdeum interlocutorúnico, taiscomo mensagens privadas, posts no mural ou comentários recebidos decontatos próximos estava associado aos avançosno suporte social percebido,bem como na felicidade, saúde autorreportada, depressão, solidão, influêncianegativaeestresse(todosps<0,05).Ao contrário da comunicação com contatos próximos, a comunicação comcontatos mais distantes, bem como ler conteúdos, tais como atualizações destatus que foram transmitidos para um públicomais amplo (ou transmitir opróprio conteúdo) não estava associado a tais avanços no bem-estar. Alémdisso,aassociaçãoentreacomunicaçãoindividualizadacomuminterlocutoreobem-estareramaisforteparacomunicaçõesmaissubstantivas(porexemplo,comentários escritos) em relação a outras comunicações mais estilizadas debaixoesforço(comoumacurtidanoFacebook,porexemplo).Em termos de conclusões substantivas, as pesquisas revisadas aqui sãoconsistentes com a hipótese de que a comunicação online com amigos oufamiliares próximos pode ter efeitos benéficos no bem-estar psicológicoconformeindicamasreduçõesemíndicesdedepressão,solidãoeestresse,eoaumento na percepção de suporte social, humor e satisfação com a vida. Poroutro lado, muitos outros usos da internet, incluindo sua utilização para

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informação,entretenimentoecomunicaçãoonlinecomcontatosmaisdistantesnãoparecemterasmesmasassociaçõespositivascomobem-estarpsicológico(KRAUTeBURK,2015,p.99)

A Psicologia Positiva busca elementos científicos mensuráveis nesse rico

conjuntodevariáveisparadesvendaranaturezarealdobem-estar.Oobjetivofinalestá

relacionado ao aumento do bem-estar do indivíduo e ao conceito de prosperidade

pessoal. Para Seligman, a prosperidade, ou flourishing, refere-se ao funcionamento

humanoperfeito,vivendoavidaemseupotencialmáximo.Englobaodesenvolvimento

pessoal(autofocado)eumavidavirtuosaemproldasociedade(focadanooutro).Sera

melhorpessoapossível.

Éhoradeolharparaodesign comoum facilitadordaprosperidadehumana.A

abordagemvigentedodesigndaexperiênciaempenha-seemtrabalhardeformaefetiva

asemoçõesnajornadadousuário.Odesignemocionalaindatendemuitoaohedonismo,

aobenefícioatravésdoprazeredasatisfação.Maséinsuficiente.Atecnologiafazparte

detudooquefazemos,oquenospossibilitainfluenciar,atravésdodesigntecnológico,a

vidadeformamaisabrangente.Precisamosbuscarumequilíbrioentreohedonismoea

eudaimonia.Precisamosprovocaraprosperidadehumana.

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6DESIGNPOSITIVO:DESENHANDOOBEM-ESTAR

Arelaçãoentreatecnologiaeobem-estarpassaaterumproporçãomaiornos

últimosanos.Algunsprofissionaisquetrabalhamcomtecnologiacomeçamaconsiderar

obem-estardousuáriocomoumpré-requisitodeprojeto.Tantoosestúdiosquantoas

escolasdedesign têmprocuradoadotarabordagensmaishumanistas,voltadasparao

aprimoramentodoserhumanoedasociedade.Entendemosessamudançadefococomo

umaevoluçãodopróprioprocessodedesigncentradonousuário.

Apesardisso,aindaestamosmuitopreocupadosemresolverasdoresdocliente,

emoferecersoluçõesdigitais fáceisdeusar,produtivas,atraentesecomaltopotencial

decriarhábitos.Naverdade,nuncadesenhamosa tecnologia tendoemmenteobem-

estar de forma mais ampla. Já é hora de dedicarmos mais esforços na felicidade da

pessoadooutroladodainterface.Nãoapenascomousuáriosdatecnologia,mascomo

indivíduos vivendo vidas complexas, em busca de saúde, conquistas e bons

relacionamentos. Não apenas como pessoas em busca de posses e trabalho, mas em

buscadetransformação.Apráticadodesigndaexperiênciadousuário(UXDesign)eas

disciplinasdeHumanComputerInteraction (HCI) já atingiramumgraudematuridade

quepedeporumaevolução:odesenhoparaafelicidade.

Umdosprimeirostrabalhosteóricosatratarotemacomconsideráveladesãoda

comunidade de design foi o apresentado por Don Norman em seu livro Emotional

Design, de 2004. Segundo Norman, as pessoas produzem respostas emocionais aos

estímulos que recebem do mundo de acordo com três níveis de processamento de

informação no cérebro: visceral, comportamental e reflexivo. Esses três níveis são

correspondentesàprópriafisiologiadocérebrohumanoeseuentendimentocrianovas

oportunidadesdepromoçãodafelicidadeatravésdodesign.Quantomaisníveis forem

afetados,maisbemsucedidoseráodesenho.

Paracadaníveldeprocessamentodeinformaçãoexistemrequisitosdiferentes.

O nível visceral é associado ao impacto inicial do design e às nossas reações

automáticas, que acontecem de forma inata e instintiva. As respostas desse nível são

fruto do nosso processamento mental mais primitivo e, por isso, são comuns à raça

humana sendo identificadas em várias pessoas e culturas diferentes. O impulso de

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rejeitar saboresamargos,preferir cores saturadasouoptarpor formas simétricas são

todosexemplosdereaçõesdonívelvisceral.Onívelvisceraléanterioràconsciênciaeaopensamento.Équandoaaparênciaimporta, quando a primeira impressão é formada. O design visceral estárelacionadoaoimpactoinicialdeumproduto,àsuaaparência,aoseutouchandfeel(NORMAN,2004,KindleLocations523-525).

Onívelcomportamentalcorrespondeàexperiênciadeengajamentocomoobjeto,

seu funcionamento, as sensações provocadas durante a interação e as trocas entre

objetoeusuário.O nível comportamental está relacionado ao uso, à experiência comdeterminado produto. Porém, a própria experiência possui diversas facetas:função, desempenho e usabilidade. A função de um produto especifica quaisatividades ele suporta, o que se espera que ele faça. Se as funções foreminadequadas ou desinteressantes, o produto então terá pouco valor. Odesempenhodescrevecomoumprodutosesainasfuncionalidadesdesejadas–seodesempenhoforinadequado,oprodutoiráfalhar.Ausabilidadedescreveafacilidadecomaqualousuáriodeumdeterminadoprodutoconsegueentendercomoelefuncionaecomofazê-lofuncionar(NORMAN,2004,KindleLocations528-532).

Onívelreflexivoéarepresentaçãodoprodutoqueseformanamentedousuário.

Refere-se ao propósito do produto, à mensagem expressa por ele e à forma como é

percebido pelo usuário. Respostas reflexivas são provocadas pelo valor simbólico do

design,graçasàelaboraçãodeumamentecomplexaeevoluída.Aconsciênciaeosmaisaltosníveisdesentimento,emoçãoecogniçãoresidemapenas no nível reflexivo. É apenas nele que o impacto total de ambos, opensamento e as emoções, pode ser vivenciado. Nos níveis mais baixos,viscerais e comportamentais, há apenas influência,mas sem interpretaçãoouconsciência. Interpretação, entendimento e razão vêm do nível reflexivo(NORMAN,2004,KindleLocations534-537).

Oprimeirodesafioparaodesenhodafelicidadeseria,portanto,provocarreações

positivasnostrêsníveisapontadosporNorman.Entregarumaexperiênciadeproduto

prazerosa,fluída,fácilecheiadepropósito.

6.1Ahierarquiadasnecessidadesdousuário

Inspirado na hierarquia das necessidades de AbrahamMaslow, AarronWalter,

emseu livroDesigningforEmotion(2011),propõeumahierarquiadenecessidadesdo

usuário.TambémnapropostaporWalter,asnecessidadessuperioresdousuário(como

prazeredeleite,no topodapirâmide) sópodemser conquistadasdepoisqueasmais

fundamentaisforemsupridas(comofuncionalidadeeusabilidade).

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Figura20-PirâmidedeHierarquiadasNecessidadesdoUsuário25

Alógicadapirâmideésimples:qualquerproduto,realoudigital,deve,antesde

maisnada,satisfazerumanecessidadeeserútil.Senãoexistirumaqualidadefuncional,

asqualidadesestéticasdeumprodutonãoserãoapreciadasdaformaadequada.Ouseja,

umbeloaplicativoquenãosejafuncional,quenãoapresenteumautilidadeclara,nãoirá

satisfazerasnecessidadesbásicasdousuário.

OpróximoníveldaescaladeWalterdizrespeitoàconfiabilidade.Umainterface

de produto que seja útilmas que não execute suas funções da forma esperada não é

confiávelefrustraráseususuários.

Em seguida, a interface deve ser fácil de usar e de aprender. Deve facilitar a

descobertadetodasasfunçõesdoobjeto.Sóquandoumprodutoéfuncional,confiávele

fácildeusaréqueosusuáriospoderãoperceberosaspectospositivosdaexperiência

relacionadosaoprazer,àestéticaeàemoção.

Segundo o modelo hierárquico de Walter, à primeira vista, uma experiência

prazerosa estaria no topo da hierarquia de necessidades do usuário, sendo a última

prioridadeemumcronogramadeprojeto.Oproblemadessavisãovemdaideiadeque

precisamoscomeçaradesenharpelabasee,progressivamente,atingirotopo.Primeiro

oprodutoprecisaterumaboarazãoparaexistir.Depois,precisaserconfiávelefácilde

usar. Ao final de todos esses esforços, o designer pode se ocupar dos detalhes que

25TraduzidopeloautorapartirdaPirâmidedeHierarquiadasNecessidadesdoUsuárioapresentadaporWalter(2011,p.06)

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surpreenderãoousuário:acabamentosgráficosdainterface,asmicrointerações,efeitos

de animação, etc. Essa visão progressiva e encadeada do processo de design, tende a

colocarodesignemocionalnomomento finaldoprojeto,quando,naverdade,deveria

serapreocupaçãoinicial.

Outra interpretação permite considerar dois tipos de prazer: superficial e

profundo.

O prazer superficial é local e contextualizado. É provocado por elementos

isolados da interface como por exemplo belas imagens, microinterações, animações,

respostas táteis, comandos gestuais, efeitos de som, etc. São aspectos perceptíveis da

experiênciaque,sebemdesenhados,produzemsensaçõesmomentâneasdeprazer.

O prazer profundo é holístico e ocorre quando todas as camadas das

necessidadesdousuáriosãoatendidas.Estárelacionadoaoestadodefloweébemmais

difícil de conseguir. Depende de um processo centrado no usuário e de constantes

iterações de produto. Usuários que experimentam um estado de prazer profundo

estarãomaisaptosarecomendaroprodutoouserviçoàoutrapessoa.

Priorizaroprazersuperficialpodeparecerocaminhomaisfácilerápidodedar

prazeraousuário.Masosusuáriosseadaptamrapidamenteaonovoeàquiloquelhes

proporciona prazer repetidamente. É a adaptação hedônica funcionando. Os detalhes

encantadores de uma experiência perdem o apelo com o passar do tempo. O prazer,

comoobjetivoisoladododesign,temprazodevalidade.

6.2PositiveDesign

Amaioria de nós provavelmente concorda que viver uma vida feliz, repleta de

realizaçõeséumdesejodetodos.Enãofaltamevidênciasnaliteraturacientíficadeque

pessoas felizes são mais saudáveis, ativas, sociáveis, altruístas, possuem

relacionamentosmais fortes,sãomaiscriativaseprodutivasemseustrabalhos.Então,

por que não transformar essa busca no objetivo principal do design? Por que não

desenharparaafelicidade?

O Design Thinking avançou de forma surpreendente dentro da indústria

tecnológica com sua abordagem de resolução de problemas com foco no usuário. Os

novos designers saíram à caça de fricções e dores do cliente nas interações com

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produtos,seguindoanobremissãodedesenharexperiências fluídase fáceis.Umrisco

que corremos com uma abordagem tão orientada a problemas é, justamente,

desacostumarosusuáriosàsfricções,removermomentosdeaprendizado,tolerânciaou

autoanálise. Estamos criando usuários impacientes e mais exigentes em relação aos

serviços.Emescala,podemosestarcriandopessoassemresiliênciaeinaptasalidarcom

mudanças. O que é totalmente contraditório à busca pela felicidade que todos

compartilhamos.

6.3Designparaafelicidadeatravésdosignificadosimbólico

Comoexploramosnocapítuloanterior,a teoriadobem-estarsubjetivo,queéa

base da Psicologia Positiva desenvolvida por Seligman, afirma que o homem deve

almejar mais do que a satisfação com a vida. A felicidade do indivíduo está no seu

funcionamento otimizado, no aproveitamento total do seu potencial e no seu

desenvolvimento como ser humano. Essa perspectiva é condizente com a visão

eudemônicadafelicidade,orientadaàvirtudeeaoutrosvalorespositivos.

Oscincoelementosquepromovemobem-estarsegundoaPsicologiaPositiva–

emoções positivas, engajamento, relacionamentos positivos, significado e realização –

sãoconsideradosmetasdevidaporsisó.Sãoobjetosdebuscapessoal, independentes

unsdosoutros, cadaumcapazde incrementarobem-estar subjetivo. Umaconclusão

prática para o design é que cada elemento pode ser trabalhado separadamente na

tentativadesecriarexperiênciasqueapoiemafelicidadedohomem.

OdesignparaoSignificadoSimbólicoéumaabordagemdedesignderivadados

cincoelementosdaPsicologiaPositivaquedefinediferentes funçõesparaodesignna

construçãoda felicidade.Elepode seruma fonte direta,um símbolo, um facilitador ou

umapoioparaafelicidade.Cadaumadasfunçõespodeserrelacionadaaoselementosdo

bem-estarsubjetivodefinidospelaPsicologiaPositiva(PERMA),formandoumamatriz:

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Figura21-MatrizdeDesignparaoSignificadoSimbólico26

Alguns produtos podem ser uma fonte direta de prazer. Além disso, alguns

produtos podem afetar indiretamente nosso bem-estar por facilitarem experiências e

atividades positivas. Ou por apoiarem um comportamento virtuoso, de grande

significado. Efeitos positivos podem também ser causados por representações

simbólicasrelacionadasaoproduto.O significado do produto pode ser tanto concreto quanto simbólico (...).Produtos possuem determinadas funções e possibilidades específicas quepermite que usuários os categorizem, utilizem e divulguem. Nesse sentido, osignificado do produto é normalmente entendido e compartilhado. Por outrolado, o significado simbólico de um produto emana dos filtros individuais eculturais que transferem uma conotação para um produto, seu uso edivulgação.Osignificadosimbólicoquedescrevemosnesteartigose refereàsabstrações que fazem sentido individualmente (por exemplo, lembranças,conquistasedesejos).Taissignificadossimbólicosdãoaosprodutosassociadosa qualidade de ter valor e relevância consideráveis para seu proprietário(CASAIS,M.etal.2016,p.581)

Produtos com fortes significados simbólicos têm o potencial de concretizar as

intenções do usuário, lembrá-lo de seus sonhos e manter vivas as suas conquistas,

contribuindo para a felicidade. A abordagemdo significado simbólico tenta explicar a

forte influênciadosbensmateriaisna felicidadedosusuários.Temosqueextrapolara

visão clássica da função x forma e procurar as evidências emocionais atribuídas aos

objetos.Seráqueosobjetosquecompramosequehojenoscercamnos fazemde fato

felizes? A riqueza e os bens materiais afetam o nosso bem-estar da forma como

acreditamos?As pesquisas anteriores sobre a felicidade sugeriram que, de forma geral, osbens materiais têm um impacto limitado no bem-estar subjetivo, pois aspessoas tendem a se adaptar rapidamente aos produtos, o que pode resultar

26TraduzidopeloautordaMatrizdeDesignparaoPropósitoSimbólicodePOHLMEYER(2001,p.11).

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em um efeito de adaptação hedonista (...). Entretanto, alguns bens com fortecargasimbólicapodemdesafiartaispremissas(...),especialmentequandotaisbensprolongamepermitemo reconsumodedeterminadasexperiências (porexemplo,souvenires)(CASAIS,M.etal.2016a,p.581).

Bensdeconsumopodemservistoscomorecursosparaafelicidade,masnãopelo

valor material do objeto, mas sim pelo valor das ações possibilitadas por eles. Um

smartphone, por exemplo, oferece uma fonte inesgotável de ferramentas para

entretenimento, trabalho e relacionamento. Atividades que podem ter alto significado

simbólicoaoestimularemaalegria,aorientaçãopessoaleatéavirtude.“Trabalhos anteriores de pesquisa forneceram evidências sobre a conexãoentre produtos e felicidade e identificaram seis significados simbólicosrelacionadosàfelicidadeemprodutos(CASAIS,MUGGEeDESMET,2016)combase nas determinantes do bem estar psicológico de Ryff (1989).” A saber,relações positivas com outras pessoas, crescimento pessoal, sentido na vida,domínioambiental,autonomiaeautoaceitação(CASAIS,M.etal.2016b,p.02).

Alguns bens materiais carregados de significado simbólico podem contribuir

para a felicidade do indivíduo. Trazem memórias pessoais positivas, histórias de

conquistaesonhos.Sãoobjetosâncoraqueajudamnaconstruçãoenacomunicaçãode

nossa identidadepessoal,denossosvaloresedenossashistórias.Por seremaspectos

tãopessoaisedependentesdocontexto, ficadifícil trabalhá-losnoprocessodedesign.

Precisamos de umametodologia para trabalhar o significado simbólico dos produtos

comodesignersdeexperiência.

Com esse desafio em mãos, Desmet se juntou a Casais e Mugge, duas outras

pesquisadoras da Industrial Design Engineering, Delft University of Technology, para

sintetizarem significados simbólicos relacionados à felicidade. A partir dessa síntese,

desenvolveram16direçõesdedesigncomoreferênciasparaodesignparaafelicidadee

criaramoSIMToolkit(DesignwithSymbolicMeaningforUserHappiness).

O SIM Toolkit é uma caixa de ferramentas de design, criada a partir dos 6

princípiosedas16direções,capazdetrazerparaapráticaosconceitosdosignificado

simbólico.Produzidana formadecartaseumwebsite,a ferramentaajudaacolocara

emoçãoeafelicidadenasváriasetapasdodesigncentradonousuário.

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Figura22-ExemplodecartadoSIMToolkit27

Todaaquestãodosignificadosimbólicoéapenaspartedeumframeworkmais

completo para o design da felicidade, denominado Design Positivo, e desenvolvido

tambémporpesquisadoresdaDelftUniversity,naHolanda.

6.4FrameworkparaoDesignPositivo

O Design Positivo é orientado por possibilidades e vai além da abordagemtradicionalvoltadaaosproblemas.Emvezdisso,elesededicaàsoportunidadesparamelhorarobem-estardosindivíduosedasociedade.DesmetePohlmeyer(2013)propuseramummodeloquedescreveos trêsprincipais componentesdoDesignPositivo:designparaoprazer,designparaavirtudeedesignparaosignificadopessoal.Osautoresdefendemque todoseles são fundamentaisnosuporte ao design com impacto positivo nas vidas das pessoas, oferecendodiferentesoportunidadesdefoco(CASAIS,M.etal.2016b,p.01).

Baseada também na Psicologia Positiva, a abordagem do Design Positivo tem

como objetivo central apoiar a prosperidade humana. Cada componente deste

frameworkrepresentaum ingredientededesignparaa felicidadeeacombinaçãodos

trêsingredientespromoveaprosperidadehumana.As iniciativas de Design Positivo buscam deliberadamente melhorar o bem-estar subjetivo das pessoas e, portanto,melhorar o apreço por suas vidas deforma duradoura. É importante notar que tal objetivo é a razão principal eexplícita no início de um processo de Design Positivo, sua raison-d’être (ou

27Imagemretiradade(CASAIS,M.etal.2016,p.14).

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razão de existir) é determinada por seu efeito no bem-estar subjetivo(POHLMEYEReDESMET,2013,p.07).

Figura23–Framework-DesignPositivo28

Os vértices do triângulo da figura acima representam os três ingredientes do

Design Positivo: design para o prazer, design para significado pessoal e design para

virtude. Cada ingrediente isolado tem o potencial de estimular o bem-estar subjetivo

masoDesignPositivoestánaintersecçãodostrês.Énesteponto,ondeaexperiênciaé

completaemprazer,significadoevirtude,ondeoindivíduoprospera.(1)DesignparaoprazerOprimeiro ingredienteestárelacionadoàfelicidadequeemanadaapreciaçãodomomento,porexemplo,obem-estar subjetivoqueéobtidopela somadosprazeresmomentâneosdealguém.Ofocoestánoaquienoagora,napresençada influência positiva na ausência de influência negativa: estar relaxado, sedivertir, estar livre de problemas. Os produtos podem evocar sentimentospositivos (maximizando o prazer e o conforto) ou reduzindo sentimentosnegativos(minimizandoadoreodesconforto).Odesigntambémpodeserumafontediretadeprazer(porexemplo,apreciarosfinosdetalhesdeumabolsadecouro feitaàmão)ou facilitaratividadesagradáveis (porexemplo,aproveitarumdiaemaltomar,oqueéfacilitadoporumveleiro)(POHLMEYEReDESMET,2013,p.08).

28FrameworktraduzidopeloautordePOHLMEYEReDESMET(2013,p.07)

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(2)DesignparaosignificadopessoalOsegundoingredienteestárelacionadoàfelicidadequeemanadeumsensodesignificadopessoal.Ofoconãoestánoefeitomomentâneo,masnosobjetivoseaspirações (de longo oumédio prazo), tais como se formar em alguma coisa,construir uma casa na árvore, ter um palácio ou correr uma maratona. Osignificado pessoal também pode derivar da consciência das conquistaspassadas ou de um senso natural de progresso na direção de um objetivofuturo. Com isso emmente, os produtos podem ser recursos que as pessoasutilizam para atingir tais objetivos. Por exemplo, os instrumentos musicaispermitemquemúsicosdesenvolvamseutalento,enquantotênisdecorridadãosuporteaodesenvolvimentoda técnicadecorrida individualdeumatleta.Osprodutos também podem lembrar usuários de seus objetivos atuais, (...) ousimbolizaro atingimentodeobjetivospassados (porexemplo,um termostatoqueeconomizaenergiasimbolizandooatingimentodoestilodevidaecológico).(3)DesignparaavirtudeOterceiroingredienteestárelacionadoàfelicidadequeéo(sub)produtodeumcomportamento virtuoso.Nesteponto, a questão se elevaparaonívelmoral:“Eu estou me comportando de forma honrada?” A simples pergunta em siimplica em uma distinção normativa entre o que é bom (por exemplo, odesenvolvimentodecapacidades,oaltruísmo)eoqueéruim(porexemplo,aperdadadignidade,oprazersádico)independentementedoquenosdáprazeroudas coisaspelasquais lutamos. Ele sebaseianaproposiçãodequeháummodo ideal de comportamento ou um senso de excelência ou perfeição quedeve nortear as pessoas, o caminho da vida virtuosa. A virtude é um valorhumanoidealizadoqueéoperacionalizadodediversasformas.(POHLMEYEReDESMET,2013,p.09).

Umexemplo clássicodeDesignPositivoéo instrumentomusical. Imagineuma

guitarra:tocá-lapodeproporcionarprazerparaummúsicotreinado,aomesmotempo

quepromoveapercepçãodesignificadopessoal,atreladaaodomíniodatécnica.Tocar

um instrumento também é um exercício de autoexpressão e de apreciação da beleza,

quesãovirtudesrelacionadasàmúsica.

OutrosobjetospodemconterostrêsingredientesdoDesignPositivo,mesmoque

sem intenção. Talvez tenham sido concebidos com apenas um dos ingredientes em

menteeacabaramgerandocomportamentospositivoscompassardotempo.Outenham

passado por repetitivos processos de melhoria para chegar numa versão final mais

aderente às necessidades do cliente e, consequentemente, mais importante para ele.

Podemosnosinspirarnessesobjetosparacriarsoluçõesdigitaisquetragamosmesmos

valores para a vida do usuário. O que diferencia a abordagem do Design Positivo de

outras iniciativasemétodosdedesignemgeraléo focoexplícitonodesenvolvimento

humano. A intenção de promover a prosperidade do indivíduo surge com a própria

necessidadededesign.

Outrasabordagensdodesignqueexploramosneste trabalho, comoosmodelos

de persuasãode Fogg e deEyal, o design emocional deNorman, entre outras, podem

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também ser plataformas doDesignPositivo.Quandouma abordagemé utilizada para

criar hábitos ou estimular comportamentos que promovam o bem-estar de forma

intencional,elatambéméDesignPositivo.

Semdúvidaocomponentedatríademaisdifícildesertrabalhadoéavirtude,um

conceitoexploradopelafilosofiadesdePlatão,queaconsideravaumaqualidadeinatado

indivíduo,impossíveldeserensinada.ParaaéticadeAristóteles,avirtudeéoopostodo

vícioepode,sim,seradquiridaatravésdeumhábito:Avirtudeéumadisposiçãoadquiridavoluntariamente,consistindo,emrelaçãoanós,emumamedida,definidapelarazãoconformeaconsultadeumhomemqueagerefletidamente.Elaconsistenamedida justaentredoisextremos,umpeloexcessooutropelafalta.(ÉticaaNicômano,6).(JAPIASSÚeMARCONDES,1991,p.243)

Nafilosofiamoderna,avirtudeadquiriuumsentidomoral,sendorelacionadaà

vontadedoindivíduoderealizarobem.“Avirtudeéaforçaderesoluçãoqueohomem

revelanarealizaçãodeseudever”(Kant)(JAPIASSÚeMARCONDES,1991).Nessalinha

depensamento,algumasvirtudes jásãodefinidascomoformasespecíficasdessa força

deresolução,dessadisposiçãoparaobem.

Para o Design Positivo, as virtudes têm um valor moral que transcende o

indivíduoeatingeobemcomum:Virtudes são qualidades consideradas moralmente boas e inerentementevaliosas. São consideradas como promotoras do bem individual e coletivo,vistascomoalgoquecontribuiparaobem-estar,mesmoquenãoodesejemosoumesmoqueobtenhamosprazerdele(POHLMEYEReDESMET,2013,p.13).

Martin Seligman conduziu um amplo estudo das virtudes através de um

levantamentodereferênciasecitaçõespresentesnaliteraturadasprincipaisreligiõese

tradições filosóficas. Para surpresa de Seligman e Dr. Christopher Peterson, um

especialista no estudo do otimismo, seis virtudes foram encontradas de forma

consistenteeduradouraemmuitasculturas.Seligman (2002) propôs três critérios para definir uma virtude: deve servalorizada por quase todas as culturas, deve ser valorizada por si só (nãoapenas comoummeioparaatingirum fim)edeve sermaleável.Ele tambémpropôsseisvirtudesprincipais,todasasquaissãoreconhecidasnasprincipaisreligiões e tradições culturais: sabedoria e conhecimento; coragem; amor ehumanidade; justiça; moderação; espiritualidade e transcendência(POHLMEYEReDESMET,2013,p.13).

Para explorar as virtudes de uma forma estruturada e mais científica, os

profissionaisdaPsicologiaPositivafocamaatençãonoquechamamdeforçasdecaráter

adquiridas através das virtudes. São evidências comportamentais e de conduta

observáveisatravésdemétodosdepesquisaeinvestigação.

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Figura24-“WhatistheClassificationofCharacterStrengthsandVirtues?”29

Incluir a virtude como um componente do Design Positivo alimenta um certo

julgamento moral do que seria considerado bom design. A princípio, qualquer

experiênciadedesignqueentregueprazerousignificadopessoalpodeserconsiderada

promotora do bem-estar. No entanto, nenhuma virtude pode ser negligenciada nesse

processo.Nos últimos anos, diversas abordagens voltadas ao aspecto comportamentalutilizando design e tecnologia para estimular pessoas a serem virtuosas (...)foram introduzidas. Um exemplo delas é a arquitetura da escolha (ou nudgetheory, no inglês), um conceito baseado na distinção entre dois sistemas depensamento humano: o sistema automático, que é rápido e instintivo, e oreflexivo, que é deliberado e consciente. De acordo com a arquitetura daescolha, as decisões automáticas de um indivíduo podem ganhar um“empurrãozinho”(ouumnudge)alterando-seoambientenoqualtaisdecisõessão tomadas (...). (...) Em seu livro sobre a arquitetura da escolha, Thaler eSunstein (2008) tipificam o “empurrãozinho” como um “paternalismolibertário”, pois busca estimular melhores escolhas sem forçar as pessoas afazê-lo (por exemplo, elas ainda sim poderão escolher um lanche menossaudável)(POHLMEYEReDESMET,2013,p.09).

A busca pela felicidade, o foco em metas de alto significado pessoal e a vida

virtuosasão,aprincípio,fatoresintrínsecosàexistênciahumana.ApropostadoDesign

Positivo é facilitar e motivar esses comportamentos através de fatores externos,

construídos pelo design. Para isso, devemos desenhar experiências que sejam

orientadas a possibilidades e não simplesmente orientadas a problemas. Experiências

que apoiem o equilíbrio, que sejam adaptáveis ao indivíduo, que promovam o seu

envolvimentoativoeduradouro.

29Extraídodehttps://positivepsychologyprogram.com/classification-character-strengths-virtues/

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Muitasiniciativaspodemserencontradasnaslojasdeaplicativosparacelulares

que entregam experiências aderentes aos princípios do Design Positivo. Uma das

categoriasdeappsmaisengajadasnodesenvolvimentohumanoéadeSaúdeeGinástica

(HealthandFitness). A prática de exercícios físicos, quando rotineira, é uma fonte de

prazer incomparável,assimcomoumaatividadedealtosignificadopessoal.Somadoa

isso, os aplicativos trazem funcionalidadesde criação e compartilhamentodemetas e

resultados que elevam a experiência a um nível social, gerando mais engajamento e

incentivando atitudes virtuosas como persistência, bondade, sentimento de time e

autocontrole. Os dispositivos móveis são excelentes plataformas motivacionais de

mudança de hábitos relacionados à saúde. Um dos primeiros experimentos a utilizar

telefonescelularescomoferramentasmotivacionaisdemudançadehábitosfoirealizado

por um grupo de pesquisadores da Universidade de Washington e do Instituto Intel

Research de Seattle. O estudo salienta a importância do apoio social e do feedback

constante sobre a performance do indivíduo durante a sua jornada de mudança

comportamental.Acreditamosque,defendendo-seaativaçãocognitivapersistentedosobjetivosde saúde, estimulando-se diversos comportamentos saudáveis relevantes,focando-senospadrõesdeatividadedelongoprazoefacilitando-seosuportesocialcomoumopcional(enãooseumotivadorprimário),ossistemaspodemser desenvolvidos de forma a efetivamente motivarem a mudançacomportamentaledaremsuporteaolocaleàoportunidadenaqualaspessoastomarãodecisõesqueafetarãosuasaúde.(KLASNJAetal.,2009,p.338)

OsvideogamessãooutraplataformadegrandepotencialparaoDesignPositivo.

DesdeacriaçãodoNintendoWii,osegmentodejogosqueestimulamatividadesfísicas

ganhou espaço na preferência dos jogadores. A última febre mundial no mundo dos

jogosparasmartphones,oPokémonGo,éconsideradopormuitosomaioraplicativode

exercícios físicos da história. Tudo porque consegue transformar uma atividade física

simples (andar na rua) em uma experiência altamente impactante, atraente, cheia de

desafioserecompensas.

Osobjetosvestíveis,intimamenteligadosaonossocorpoeconectadosàredede

forma ininterrupta, tornam-se também potentes objetos de Design Positivo. Seus

sensores reconhecem padrões fisiológicos, interpretam nossas interações e revelam

informaçõessobrenossoshábitosquetemopotencialdemudarnossocomportamento

para um estilo de vidamais saudável. Uma das interfaces chave do AppleWatch é o

aplicativodeAtividades, representadapor círculosdedesempenhoquemonitoramas

atividades físicas do usuário durante o dia e estimulam atividadesmotoras. Segundo

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TimCook,CEOdaApple,numeventomundialdaempresaem2105,muitosusuáriosdo

Apple Watch dizem que preencher os círculos de atividade se tornou uma obsessão

pessoal.

Figura25–CapturadateladopáginaoficialdoAppleWatch30

Outra categoria de aplicativos bem intencionados e condizentes com os

princípios do Design Positivo é a do consumo consciente. Através de análises de

especialistasedeconteúdosproduzidospelosprópriosusuários,essesserviçosajudam

o consumidor a realizar escolhas certas de produtos, respeitando critérios pré-

determinados por ele como uso de ingredientes saudáveis, impacto social e impacto

ambiental.

30CapturadateladapáginaoficialdoAppleWatch,disponívelem<https://support.apple.com/pt-br/HT204517>Acessoem:10jul.2017.

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108

Figura26–ImagemdoaplicativoGoodGuide31

AMicrosoftrecentementedivulgouseusesforçoscorporativosparaainclusãode

usuários com necessidades especiais em suas plataformas, numa ação que foi

consideradaumaevoluçãoradicaldoDesignThinking.Sobabandeiradodesignparaa

diversidade,aempresadefendeaadoçãodeprincípiosinclusivosevirtuososdedesign

como forma de expandir seu alcance, sob a máxima “Resolva para um, estenda para

muitos”.Mais do que abrir nossos produtos e experiências para mais pessoas comoutras habilidades, o designpara a inclusão também reflete como as pessoasrealmentesão.Todososhumanosestãoemcrescimento,mudançaeadaptaçãoaomundoaoseuredor todososdias.Queremosquenossosprojetosreflitamtaldiversidade.Todasasnossasdecisõesdeprojetopodemaumentaroureduzirasbarreirasparaparticipaçãodasociedade.Énossaresponsabilidadecoletivareduzir taisbarreiraspormeiodeprodutos, serviços, ambienteseexperiências inclusivas(MICROSOFT)

31ImagemcapturadadoaplicativoGoodGuide.GoodGuideéumaplicativoquecolocanasmãosdoconsumidorumaclassificaçãodebensdeconsumodeacordocomtrêscritérios:saúde,impactoambientalesocialDisponívelem:<http://ecowarriorprincess.net/2016/03/5-apps-online-tools-for-conscious-shopping/>Acessoem:10jul.2017.

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Aformadeendereçarumassuntotãodelicadoquantooacessoàtecnologiapor

pessoas comdeficiências é semdúvidasumaatitudenobreda empresa, que tem sido

reconhecida pela comunidade de design no mundo todo. O próprio conceito de

deficiência foi redefinido para significar uma inabilidade temporária, uma interação

humanaincompatível.Oônusdequalquerexperiênciaruimpassaaserdoprovedorda

solução, não do usuário, independente do seu contexto. Além da livre divulgação dos

princípiosdedesigninclusivo,aMicrosoftcriouferramentasetécnicasespecíficaspara

otrabalhodosdesignersdeexperiência.

Figura27–ImagemdoInclusiveMicrosoftDesignManual32

OMicrosoftDesignToolkitécompostoporummanualeumconjuntodecartões

deatividadesquepodemserintegradosaqualquerprocessodedesignpré-existente.

Se a tecnologia é um meio importante para a busca da felicidade, expandir o

acessoàelaéuma formadepromoverobem-estarnumâmbito social.No individual,

percebemosatecnologiacomoparteintegraldenossasvidase,cadavezmais,donosso

corpoementeexpandidos.Obem-estarsubjetivoestánaexperiênciadatecnologiaque

nospossibilitaaprender,comunicar,socializar,prosperareaproveitaravida.

ODesignPositivoécertamenteumaabordagemmaismaduradodesign,frutoda

buscadosprópriosdesignersporformasdeinfluenciaravidadaspessoasdemaneira

mais contundente. Cada dia mais ferramentas e métodos surgem para ajudar nesse

desafio de design. Precisamos usar nossa imensa capacidade de comunicação para

32ImagemdomanualdesenvolvidopelaMicrosoft,oInclusiveMicrosoftDesign,p.54.

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propagar e testar essas ferramentas nos mais diversos projetos. É a única forma de

disseminar essamentalidade pelas áreas parceiras do design até que todo projeto de

designsejaumprojetoparaafelicidadedoindivíduo.

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7CONCLUSÃO

Desenhar para a felicidade, de certa forma, sempre foi um dos objetivos

intrínsecos do design. O que o Design Positivo propõe é a priorização intencional do

bem-estar subjetivo nos projetos de design. É treinar aindamais o olhar do designer

paraumajornadaqueécomumatodoequalquerusuário:abuscapelafelicidade.

Omomentoéoportuno.Naúltimadécadaosdesignersevoluíramseuescopoea

sua visão sobre a função do design. Passaram a olhar além da ergonomia e da

usabilidade de uma interface para buscar os aspectos mais humanos da experiência.

Possuemhojeumaoportunidadelatentedeconstruirexperiênciasmaishumanasericas

emsignificadoatravésdatecnologia.

Muitas iniciativas já podem ser identificadas na comunidade de design que

buscam discutir e capacitar uma nova geração de profissionais para os desafios

relacionadosaoDesignPositivo.Écomumpalestras,workshopseartigossobreotema

seremapresentadosnasprincipaisconferênciaseencontrosdedesignpelomundo.Às

vezes sob o título deDesignEmocional, outras vezes sob o chapéu FatoresHumanos,

assuntoscomocognição,percepção,psicologiadainteração,EconomiaComportamental,

PsicologiaPositivaefelicidadesãotratadoseexercitadospordesignersnesseseventos.

Nas universidades e institutos de pesquisa também encontramos pesquisadores e

teóricos da experiência trabalhando para embasar e gerar evidências sobre novos

métodos, ferramentas e plataformas tecnológicas envolvidas no Design Positivo.

Contudo, a aplicaçãoprática emprojetos reais aindaprecisa demais incentivos para

ganharescala.Poucasiniciativasdenegóciocolocamodesenvolvimentohumanocomo

prioridadededesign.

Mesmoemumaeconomiaversadaemdesenharparafatorescomosatisfaçãodo

clienteeprazer,aprodutividadeaindapredominacomométricadesucessodassoluções

de design. De fato é mais fácil analisar dados como “tempo na tarefa” e “número de

erros” em uma jornada do que levantar as emoções e o impacto no bem-estar do

indivíduo.Estamoshabituadosaavaliarasexperiênciasusandocomobaseosatributos

deperformanceeprodutividade.Aeconomiadaexperiênciaaindaestásustentadaem

métricasquantitativasquerefletemomodelodenegóciostradicional,comsuastaxasde

conversão,eficiênciae satisfaçãodocliente.Por issoadiscussãosobreosmétodosde

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medição das emoções e da felicidade é tão importante para o avanço da abordagem

positiva.

Temos uma preocupação genuína com o nosso próprio bem-estar e com o de

pessoasdonossoconvívio,parenteseamigos.Outraformadeavançarcomaabordagem

doDesignPositivoéjustamentesalientaressapreocupaçãocomumcomafelicidadenas

conversas que temos com áreas parceiras do design, principalmente com os

desenvolvedores e engenheiros de softwares. A prática constante da empatia com o

cliente, institucionalizada nas empresas por meio do design thinking, fez com que

profissionais de outras áreas também se envolvessem com os fatores humanos que

movemoprocessodedesigncentradonousuário.Aculturadasstartups,quejánascem

extremamente focadas no usuário, também colocou os fatores humanos no cerne das

discussões tecnológicas. Novas abordagens de disciplinas tradicionais surgiram nas

escolas de administração, como o Neurobusiness e o Neuromarketing, trazendo a

neurociência para a sala de aula e para reuniões que antes só discutiam orçamentos,

cronogramas, P&L, ROI, etc. Temos parceiros e um terreno fértil para defender uma

abordagemaindamaishumananosprojetosdedesign.

Duas vertentes da ciência da computação surgiram recentemente com

abordagens semelhantes ao Design Emocional e ao Design Positivo. A Computação

Emocional (AffectiveComputing) é uma áreade concentraçãoque combinadisciplinas

como engenharia, ciência da computação, psicologia, ciências cognitivas, neurociência,

sociologia, design e ética para explorar de forma colaborativa as experiências

emocionais na interação entre o homem e os aparatos tecnológicos. A Computação

Positiva (Positive Computing) bebe das mesmas fontes e compartilha os mesmos

objetivos com o Design Positivo: entender as oportunidades existentes no uso da

tecnologiaparafacilitareelevaraprosperidadehumana.Avitóriadodigitalsobreoreal

e a crescente competitividade no meio digital provocaram uma aproximação maior

entreoDesigneatecnologia,quese formalizouemmétodoseprocessosdeprodução

comooLeaneoAgile.Os limitesdeatuaçãodeumoudeoutro ficarammais tênues,

colaborando para times mais colaborativos em prol da produtividade. O que vemos

surgir agora, com a Computação Emocional e a Positiva, é uma admirável união de

intenções.Designe tecnologia têmopotencialdedesvendaromundoamorfoequase

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inquantificáveldafelicidadehumanapara,enfim,influenciarocompetitivomercadode

soluçõesdigitais.

A promessa da felicidade vende. Muito. De várias formas: terapias, livros,

músicas,medicamentos,objetose,numaescalacrescente,interfacesdigitaisinterativas.

O sucesso do tema nomercado digital é reflexo dos avanços conquistados nomundo

acadêmicoenosêxitosdaabordagemdedesigncentradoousuário.Háumgranderisco

do tema ser tratado com superficialidade, como uma estratégia de maximização de

lucros,oqueétotalmentediscordantedaprópriaconcepçãodafelicidade.Afelicidadeé

um fim em simesmo e não ummeio para se atingir lucro, status, poder ou qualquer

outracoisa.UmdosingredientesdomodelopropostopeloDesignPositivo,avirtude,é

capaz de proteger a integridade do modelo de possíveis interpretações rasas e

aplicações enviesadas. Como salientamos antes, o bem-estar pode ser estimulado por

cada uma das dimensões do Design Positivo: design para o prazer, design para o

significadopessoaledesignparaavirtude.Aprosperidadehumana,queéamáximado

DesignPositivo,sóocorrenainterseçãodastrêsdimensões.

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