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POLTICAS Educacionais POLTICAS Educacionales

Sugestes para melhorar a educao bsica:estudo comparativo entre a Espanha e o Brasil

Sugerencias para mejorar la educacin bsica:estudio comparativo entre Espaa y Brasil Antonio Ibez Ruiz

Sugestes para melhorar a educao bsica:estudo comparativo entre a Espanha e o Brasil

Sugerencias para mejorar la educacin bsica:estudio comparativo entre Espaa y Brasil

Esta obra uma homenagem ao professor Carlos Ramos Mota, pela firme defesa de princpios e opinies, o que contribuiu para que sua vida fosse covardemente interrompida.

Esta obra es en homenaje al profesor Carlos Ramos Mota, por la firme defensa de principios y opiniones, lo cual contribuy para que su vida fuera cobardemente interrumpida.

Polticas EducacionaisPolticas Educacionales

Sugestes para melhorar a educao bsica:estudo comparativo entre a Espanha e o Brasil

Sugerencias para mejorar la educacin bsica:estudio comparativo entre Espaa y Brasil

Antonio Ibez Ruiz

Coordenao Editorial Snia Cunha Edio Maria Estela Heider Cavalheiro Reviso Lara Borriero Milani Luciana Soares da Silva Projeto grfico e capa Kelly Sato / Signorini Produo Grfica Editorao eletrnica Signorini Produo Grfica ISBN 978 85 16 06117-3

Coordinacin Editorial Snia Cunha Edicin Maria Estela Heider Cavalheiro Revisin Deise Mugnaro Proyecto grfico y portada Kelly Sato / Signorini Produo Grfica Editoracin electrnica Signorini Produo Grfica ISBN 978 85 16 06117-3

Dados

Internacionais de Catalogao na Publicao (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Ruiz, Antonio Ibnez Sugestes para melhorar a educao bsica : estudo comparativo entre a Espanha e o Brasil / Antonio Ibnez Ruiz. -- So Paulo : Moderna, 2009. Bibliografia ISBN 978-85-16-06117-3 1. Educao bsica - Brasil 2. Educao bsica Espanha 3. Educao e Estado - Brasil 4. Educao e Estado - Espanha 5. Poltica educacional - Brasil 6. Poltica educacional - Espanha I. Ttulo.

(CIP)

08-07687

CDD-370.11 ndices para catlogo sistemtico: 1. Brasil e Espanha : Educao bsica : Estudos comparativos 370.11

Editora Moderna ltda. Rua Padre Adelino, 758 Belenzinho So Paulo SP Brasil CEP 03303-904 Tel. (11) 2790-1300 Fax (11) 2790-1369 www.moderna.com.br 2009 Impresso no Brasil

Editora Moderna Ltda. Calle Padre Adelino, 758 Belenzinho So Paulo SP Brasil Cdigo postal: 03303-904 Telfono: (11) 2790-1300 Fax: (11) 2790-1369 www.moderna.com.br 2009 Impreso en Brasil

ndiceApresentao ................................................................................ 7Captulo 1

A legislao educacional na Espanha aps a Constituio de 1978 ................................. 9 Alguns aspectos da legislao espanhola .......... 23 O Brasil pode aprender com a experincia da Espanha? ...................................... 35 Sugestes para melhorar a educao bsica no Brasil .................................... 45

Captulo 2 Captulo 3

Captulo 4

Referncias bibliogrficas ......................................................... 59 Biografia ...................................................................................... 63

ndicePresentacin ..........................................................................67Captulo 1

La legislacin educacional en Espaa luego de la Constitucin de 1978 ........................69 Algunos aspectos de la legislacin espaola ........85 Puede Brasil aprender con la experiencia de Espaa? .......................................99 Sugerencias para mejorar la educacin bsica en Brasil ............................109

Captulo 2 Captulo 3

Captulo 4

Referencias bibliogrficas ....................................................124 Biografa ..............................................................................127

Apresentao

A educao brasileira foi marcada, na segunda metade da dcada de 1990, pela implementao de mudanas, consequncia da Lei de Diretrizes e Bases da Educao, sancionada em fins de 1996. No h como ignorar que muitas dessas mudanas foram influenciadas pelas reformas que ocorreram na Espanha nas dcadas de 1980 e 1990. No perodo, figuras importantes ligadas formulao da reforma espanhola, como Csar Coll e lvaro Marchesi, alm de colaboradores deles, prestaram assessoria direta ao governo de Fernando Henrique Cardoso. Posteriormente, j no incio de 2000, diversos meios de comunicao e diferentes entidades deram destaque ao xito alcanado pela educao espanhola, entre elas a Confederao Nacional da Indstria (CNI) e a Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura (Unesco). Em 2006, a CNI apresentou a todos os candidatos Presidncia da Repblica do Brasil um documento com propostas para a educao que citava explicitamente a evoluo que a Espanha, a Finlndia, a Irlanda e a Coreia do Sul tinham experimentado nos ltimos 30 anos. A Unesco, por sua vez, realizou um seminrio, em 2003, em que esses quatro pases foram convidados a expor suas bem-sucedidas polticas para a educao bsica.

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Tendo como objetivo apresentar os principais aspectos responsveis pelo sucesso das reformas educacionais implantadas na dcada de 1980 na Espanha, publicamos recentemente um livro (1), em que destacamos dois tpicos: aperfeioamento ou educao continuada dos professores da educao bsica e gesto democrtica das escolas. luz desse estudo, possvel chegar a algumas concluses a respeito da poltica de educao bsica implementada no Brasil, na dcada de 1990, e apresentar sugestes que podem contribuir para melhorar a qualidade da educao bsica do pas hoje, em especial no ensino mdio. No primeiro captulo da presente obra oferecemos um panorama do sistema educacional que passou a vigorar aps a ditadura militar na Espanha e das duas primeiras leis da reforma educacional aprovadas durante o primeiro governo do Partido Socialista Operrio Espanhol (PSOE). O segundo captulo dedicado ao detalhamento dos dois tpicos da reforma educacional espanhola acima destacados. No terceiro captulo so apresentadas as polticas educacionais brasileiras relativas a esses dois tpicos. O aperfeioamento dos professores e a gesto democrtica foram tambm temas de destaque nas mudanas educacionais introduzidas no Distrito Federal entre 1995 e 1998 e, por essa razo, so discutidos nesse captulo. O ltimo captulo traz sugestes para a melhoria da educao brasileira.

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Captulo 1

A legislao educacional na Espanha aps a Constituio de 1978

Depois de 40 anos de durssima ditadura, a sociedade espanhola conseguiu voltar ao exerccio do dilogo durante a transio democrtica, quando foram assinados os Pactos de Moncloa (1977). A consolidao desse dilogo se deu com o acordo dos partidos polticos no Parlamento, estabelecendo as regras do convvio democrtico e dando vida Constituio de 1978. Segundo Puelles (2):Esses pactos so de notvel importncia porque assinalam o comeo de uma poltica de acordo social entre o governo, o sindicato empresarial e os sindicatos de trabalhadores para enfrentar, conjuntamente e de forma consensual, os graves problemas derivados da crise econmica (...) Uma das finalidades principais dos Pactos de Moncloa foi a implementao de uma poltica de conteno salarial. A oposio solicitou, em troca, uma srie de contrapartidas sociais que, em relao educao, centraram-se fundamentalmente nas seguintes: programa especial de criao de escolas pblicas; elaborao do estatuto das escolas privadas, subvencionadas pelo governo; aprovao do estatuto do professor; melhoria da qualidade do sistema educacional e incorporao das lnguas nacionais no currculo. De todas as contrapartidas exigidas, somente a primeira e a ltima foram cumpridas. De fato o ensino pblico foi beneficiado com investi-

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mentos no valor de 40 bilhes de pesetas, entre 1977 e 1979, o que significou praticamente duplicar os oramentos de investimento durante esses trs anos.

Era de se esperar que o fim dos 40 anos de ditadura fosse marcado por algum sinal que servisse de alerta para as geraes futuras sobre o sofrimento experimentado pelo povo espanhol em razo de decises anteriores cuja discusso no caberia aqui que acabaram privando a nao do grau de desenvolvimento social e cultural alcanado pela maioria dos pases democrticos, em especial os europeus. Esse sinal, que deveria marcar a posio de repdio situao da qual a sociedade estava se libertando, veio com muita fora e de forma radical: a intransigente reivindicao de democratizao da sociedade. Mas a democratizao da sociedade passava tambm pela democratizao da educao. Nas palavras de Llorente (3):O fio condutor da escola durante as ltimas trs dcadas no foi outro seno o vigoroso esforo pela democratizao do sistema educacional. Esse propsito de democratizar o ensino se inseriu, como bvio, num projeto que passa por vrias geraes, se encontra de certa forma inacabado, e mais amplo: a democratizao do pas. Tornar finalmente realidade a antiga aspirao, tantas vezes frustrada, de europeizar a Espanha.

A aspirao de europeizar a Espanha estava muito presente nos anos 1960 e incio de 1970. A chegada macia de estrangeiros ao territrio espanhol, com o incio da exploso do turismo, e a impossibilidade da maioria dos espanhis de fazer essa viagem em sentido contrrio marcaram muito fortemente a gerao dos jovens (ao redor dos 20 anos) da dcada de 1970. Mas no era s a questo do turismo; a aspirao de europeizar a Espanha se concretizava no desejo de construir um Estado de Bem-Estar Social semelhante ao dos pases da Unio Europeia, de garantir uma democracia representativa estvel, de conseguir uma convivncia respeitosa e independente entre o Estado e a Igreja Catlica e no reconhecimento, sem grandes tenses, da necessidade de elaborar os estatutos das regies autnomas. Resumindo: ingressar na antiga Comunidade Europeia e deixar de ser um pas perifrico europeu, essa era a grande aspirao! Essas aspiraes tpicas da classe mdia eram aparentemente partilhadas por muito mais pessoas nos ltimos anos do governo Franco e durante a transio. claro que isso no eliminava os conflitos de classe que existiam e ainda existem e, sobretudo, as tenses polticas que

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emergiam constantemente na discusso sobre o grau de autonomia que teriam as Comunidades Autnomas. Para que a aspirao se tornasse realidade, a palavra mgica era modernizar. No caso da educao e tomando como referncia os pases europeus, seria necessrio melhorar muito os indicadores educacionais, aumentar a escolarizao, que ainda apresentava nveis muito baixos, e obviamente democratizar a educao. O ndice de analfabetismo atingia 11% da populao total, em 1975, enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) do pas ocupava a nona colocao no ranking mundial. Essas eram as tarefas mais importantes que os governantes tinham pela frente: partir de um modelo poltico, econmico, social e cultural muito atrasado, apesar da modernizao da ditadura durante os ltimos anos de sua existncia, e chegar ao estgio de desenvolvimento dos pases europeus. A seguir so apresentados os problemas existentes na poca da transio na viso do professor Puelles (4):O problema da escolarizao das crianas De todos os nveis indicados na Lei Geral da Educao, de 1970, a educao pr-escolar tem sido, sem dvida, a mais desprezada e a mais necessitada de ateno imediata. Superada aquela concepo pedaggica tradicional, que indicava os seis anos como a idade mais propcia para iniciar o processo de aprendizagem, a tendncia atual tem imposto, de fato, a escolarizao da criana mais cedo, como consequncia de fatores sociolgicos novos: a urbanizao crescente, a incorporao da mulher casada ao mercado de trabalho e o aparecimento da famlia nuclear e monoparental. Alm disso, a pedagogia atual insiste em que s a educao pr-escolar pode compensar as desigualdades culturais de origem familiar, intimamente ligadas ao nvel de renda. (...) O certo que, pressionado pelas obrigaes derivadas da ampliao da educao bsica, o Estado pouco fez para implementar essa medida. (...) Com efeito, a escolarizao pblica, acelerada a partir de 1968, teve de recorrer a medidas excepcionais, como adaptao de locais comerciais, galpes industriais, escolas pr-fabricadas de m qualidade, sistema de turno duplo etc. O problema da qualidade da educao Talvez o problema da qualidade do ensino tenha sido o mais importante para a Espanha no ano 2000. At 1974, a administrao educacional se viu sobrecarregada pelo problema da escolarizao em nvel obrigatrio da educao geral bsica. Resolvida a escolarizao e atacado o dficit funcional pelos Pactos de Moncloa, a qualidade do ensino apareceu como um objetivo prioritrio. Como sabido, no fcil hoje medir a qualidade do produto educao. No entanto, existem indicadores que podem lanar alguma luz sobre o ensi-

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no das escolas. Referimo-nos relao alunos/professor, situao fsica das escolas, s taxas de evaso escolar, ao nmero e qualidade dos professores, aos planos e programas de estudo etc. A esse respeito parecia haver, em 1975, um consenso generalizado da opinio pblica sobre o baixo rendimento escolar, dos estabelecimentos de educao pblicos, em primeiro lugar, mas dos privados, tambm. Em outras palavras, a qualidade do ensino no sistema educacional espanhol era insuficiente.

importante registrar que, nos anos da transio, o mundo estava imerso em uma crise econmica de grandes propores, em consequncia do primeiro grande choque do petrleo, ocorrido em 1973. Por isso, um dos objetivos desses pactos era criar uma poltica de conteno salarial mediante contrapartidas sociais. Apesar das dificuldades havidas durante a transio, podemos dizer que ela foi extremamente eficiente do ponto de vista poltico, pois serviu para trabalhar consensos, muito teis na elaborao da Constituio de 1978. As duas leis aprovadas durante o primeiro governo do PSOE, iniciado em 1982, a Lei Orgnica do Direito Educao (Lode) e a Lei Orgnica de Ordenao Geral do Sistema Educacional (Logse), corresponderam ao conjunto de propostas de mudanas para a educao, dentro do programa de governo apresentado durante a campanha eleitoral. Posteriormente, aps a sada do primeiro governo socialista e durante o governo do Partido Popular, foi aprovada a Lei Orgnica da Qualidade da Educao (Loce), que no chegou a entrar em vigor em razo da vitria dos socialistas. Durante o primeiro mandato destes, entre 2004 e 2008, uma nova lei foi aprovada, com o nome de Lei Orgnica da Educao (LOE).

Lei Orgnica do Direito Educao (Lode)A Lode tem importncia fundamental porque regula a participao dos diversos atores envolvidos na educao professores, pais, alunos e funcionrios no docentes nos vrios rgos criados com o objetivo de democratizar a educao. A participao se inicia no Conselho Escolar da escola e chega ao Conselho Escolar do Estado. A lei estabelece tambm, pela primeira vez, a participao, no ensino, dos atores envolvidos, considerando-o uma competncia compartilhada entre o Estado e as Comunidades Autnomas. A Lode tambm estabelece o direito escolha da escola, por parte dos pais, e o direito de seus filhos receberem uma formao religiosa de acordo com suas convices.

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Com essa lei, o governo tenta garantir uma formao para a cidadania, em que o aluno comea a conhecer suas responsabilidade na eleio dos dirigentes. Ao mesmo tempo tenta garantir uma espcie de autogoverno das instituies, ainda que muito tnue e sobretudo porque a lei no faz meno a recursos financeiros nem a recursos humanos.

Lei Orgnica de Ordenao Geral do Sistema Educacional (Logse)A Logse foi publicada em 1990, oito anos aps o governo socialista chegar ao poder. Na realidade, essa demora, se que se pode cham-la assim, se deveu a dois diferenciais, que precisam ser registrados. O primeiro refere-se opo dos socialistas por fazer uma experimentao, antes de elaborar a lei, com aquilo que pretendiam que a reforma fosse. O segundo diferencial o debate que precedeu a elaborao da lei. No cabe discutir neste espao os dois diferenciais, pois a proposta desta publicao outra, j definida na apresentao. No entanto, o processo utilizado para implantar as reformas foi bastante pedaggico, e muito ricas as discusses que ele engendrou. Para efeito de esclarecimento, no caso espanhol, a educao bsica compe-se do ensino fundamental e do ensino mdio obrigatrios. Ela corresponde educao obrigatria, com durao de 10 anos, que comea aos 6 e se estende at os 16 anos de idade. J no caso brasileiro, a educao bsica compreende a infantil, a fundamental e o ensino mdio, aqui includa tambm a formao profissional. A educao obrigatria se inicia aos 6 e se estende at os 14 anos e gratuita. A Logse determina ao governo que fixe os contedos mnimos para garantir uma formao comum a todos os alunos e a validade em todo o territrio dos ttulos correspondentes. Esses contedos mnimos no podem exceder 55% dos horrios escolares no caso das Comunidades Autnomas que tm lngua diferente do castelhano e 65% no caso daquelas que no a tenham diferente. A garantia da existncia de um programa comum a todos os estudantes, embora com ligeira diversificao de contedos nos ltimos anos, propiciar a existncia de uma escola unificada (expresso adaptada para traduzir a expresso espanhola escola compreensiva, que por sua vez tem origem na expresso inglesa comprehensive school. Essas expresses indicam uma escola que no segrega (5), que no seleciona prematuramente e na qual, portanto, o ensino comum a todas as crianas).

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Embora a educao obrigatria se prolongue at os 16 anos, permitido que os alunos permaneam at os 18 para concluir essa etapa. Essa diferena marcante em relao ao Brasil, pois aqui no h limite de idade para concluir qualquer etapa de ensino, uma das causas da enorme defasagem entre idade e srie nos estabelecimentos escolares. As maiores diferenas entre a estrutura do ensino brasileiro e a do ensino espanhol acontecem no ensino mdio. Por essa razo procuraremos detalhar mais essa etapa.

Ensino mdioEssa etapa compreende o ensino mdio obrigatrio, entre os 12 e os 16 anos de idade, a qual completa a educao bsica aps o ensino primrio; o ensino mdio ps-obrigatrio, a partir dos 16 anos; e a formao profissional especfica. O quadro das pginas 16 e 17 mostra um esquema da educao bsica relacionada com a idade. O que interessa, no quadro, para este trabalho, o que est debaixo de regime geral.

Ensino mdio obrigatrioO ensino mdio obrigatrio tem como finalidade transmitir aos alunos os elementos bsicos da cultura e form-los para assumir seus deveres e exercer seus direitos e prepar-los para que se incorporem vida ativa ou se submetam formao profissional especfica de nvel mdio ou ao ensino mdio ps-obrigatrio. Essa etapa dura quatro anos letivos, formada por dois ciclos de dois anos e oferecida por rea de conhecimento. No segundo ciclo, especialmente no ltimo ano, algumas reas podem ser optativas, bem como sua organizao em disciplinas. A organizao dos docentes deve atender pluralidade de necessidades, aptides e interesses dos alunos. As autoridades educacionais dos governos regionais, dentro da legislao em vigor, devem favorecer a autonomia das escolas no que tange definio e ao programa das disciplinas optativas. A avaliao do ensino mdio obrigatrio continuada, isto , no h exames ou testes ao longo do ciclo. O aluno que no aprovado no primeiro ciclo dessa etapa deve permanecer nele mais um ano e, se reprovado no segundo ciclo, s poder ficar um ano a mais para tentar obter aprovao. Os alunos que atingem os objetivos da etapa se gra-

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duam no ensino mdio e podem frequentar o ps-obrigatrio e a formao profissional de nvel mdio. Para os alunos que no atingem os objetivos do ensino mdio obrigatrio so organizados programas de garantia social, conforme indicado no quadro, que nada mais so do que cursos especficos de iniciao profissional que lhes proporcionem integrao vida ativa e posteriormente a continuao dos estudos, especialmente de formao profissional.

Ensino mdio ps-obrigatrioEle no est includo na educao bsica, mas condio para o ingresso na universidade. Compe-se de dois anos letivos, com modalidades diferentes, que proporcionam aos alunos uma preparao especializada. As modalidades possveis so: Artes, Cincias da Natureza e da Sade, Humanidades e Cincias Sociais e Tecnologia. O ensino mdio ps-obrigatrio est organizado em matrias comuns, matrias prprias de cada modalidade e matrias optativas. As matrias comuns so: Educao Fsica, Filosofia, Histria, Lngua Castelhana, lngua oficial prpria da Comunidade Autnoma correspondente e Lngua Estrangeira. Caso sejam aprovados em todas as disciplinas, os alunos recebem o ttulo de bachiller e estaro aptos a fazer a prova de acesso aos estudos universitrios, a qual, junto com as notas obtidas no bachillerato, determina se o candidato est ou no apto a cursar a universidade. O aluno tambm pode iniciar a formao profissional de nvel superior, que dura menos que os cursos de graduao e qualificada como tcnica. o caso, por exemplo, do curso de Engenharia Tcnica Industrial. Os professores que lecionam nessa etapa de ensino so os mesmos da etapa anterior.

Formao profissionalPara a Logse, a formao profissional capacita o aluno ao desempenho de distintas profisses. Inclui, tambm, cursos correspondentes formao profissional inicial e atividades de insero e reinsero de trabalhadores. A formao profissional especfica compreende um conjunto de ciclos de organizao modular e durao varivel, constituda por reas de conhecimento terico-prticas em consonncia com os diversos campos profissionais. Os ciclos tm correspondncia no nvel mdio e

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superior. possvel, mediante equivalncias entre as disciplinas cursadas nessa etapa e as disciplinas do bachillerato, continuar estudos voltados para a universidade. possvel tambm ingressar na formao profissional especfica sem cumprir os requisitos acadmicos estabelecidos, mediante uma prova regulamentada pelas administraes educacionais, que avalia o preparo dos candidatos.

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01 2 1 ciclo Formao Profissional Especfica Artes Plsticas e Desenho Msica e Dana Arte Dramtica

6

34 Educao 3 Infantil 5 2 ciclo 6

1

1 1

3 Ensino Secundrio 2 Obrigatrio

4

2

4 Ensino 3 Primrio 2 ciclo Nvel Elementar 2 3

5

6

Diploma de Ensino Secundrio

1 ciclo

2 ciclo

1 ciclo

3 ciclo 4

Certificao

Programas de Proteo Social 1 ciclo Nvel Mdio 1 2

3

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Dos professores de formao profissional especfica so exigidos os mesmos requisitos daqueles do ensino mdio. Para determinadas reas ou disciplinas, podem ser contratados profissionais que atuem na rea. O sistema educacional dispe dos recursos necessrios para que os alunos com necessidades especiais, transitrias ou permanentes, alcancem os objetivos estabelecidos.

ESTRUTURA DO ENSINO NA ESPANHAREGIME GERAL

REGIME ESPECIAL

IDADE

Educao Artstica3 ciclo Ensino Superior 2 cicloDiploma equivalente ao Nvel Superior Estudos superiores de preservao de bens culturais, cermica, desenho e vidro

Diploma equivalente a uma licenciatura

Diploma equivalente a uma licenciatura

1 ciclo

Nvel Superior

Nvel Superior

*Desde que tenha disciplinas comuns com o Ensino Mdio Acadmico.

Diploma de Tcnico de Nvel Superior Formao Profissional Especfica de Nvel Superior

Diploma de Tcnico de Nvel Superior Formao de Nvel Superior em Artes Plsticas e Desenho

Diploma de Ensino Mdio* Diploma de Ensino Mdio Acadmico

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Diploma de Formao Profissional 1 Cincias da Natureza e da Sade Bachillerato Tecnologia 2 Humanidades e Cincias Sociais Artes 2 ciclo Diploma de Tcnico Formao Profissional de Nvel Mdio Diploma de Tcnico Formao de Nvel Mdio em Artes Plsticas e Desenho 3 ciclo

6

5

Nvel Mdio

4

16

Diploma de Ensino Secundrio

3 Certificao

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Lei Orgnica da Educao (LOE)A Lei Orgnica da Educao (LOE) no se diferencia muito da Logse, mas incorpora parte da Lode, alguns pontos da legislao proposta pelo governo anterior ao do primeiro-ministro, Jos Luis Zapatero, e mudanas promovidas por este ltimo. Muitas delas referem-se avaliao dos alunos, mas sempre mantendo o processo de avaliao continuada, que por essa razo no ser aqui mencionada. Com relao educao bsica, enfatiza-se a ateno diversidade: Sem prejuzo da garantia de uma educao comum ao longo da educao bsica para todos os alunos, se adotar a ateno diversidade como princpio fundamental. Quando a diversidade requeira, sero adotadas medidas organizativas e curriculares pertinentes, segundo o disposto na presente Lei. Ressaltamos algumas das principais mudanas relativas ao ensino mdio: Todos os alunos devem cursar, ao longo dos trs primeiros anos, a disciplina Educao para a Cidadania e os Direitos Humanos, em que se d ateno especial igualdade entre homens e mulheres; Os alunos tambm podem cursar, ao longo dos trs primeiros anos, alguma disciplina optativa, dentre elas uma segunda lngua estrangeira e cultura clssica; No quarto ano, todos os alunos tm de cursar uma srie de disciplinas obrigatrias e mais trs de uma lista, alm de pelo menos uma disciplina optativa; Com a finalidade de promover o hbito da leitura, dedica-se algum tempo a essa prtica no ensino de todas as disciplinas; As administraes educacionais devem organizar programas de qualificao profissional inicial, dirigidos aos alunos maiores de 16 anos que ainda no tenham obtido o certificado de concluso do ensino mdio obrigatrio; Para o caso citado no item anterior, os programas de qualificao profissional inicial tm como objetivo levar os alunos a atingir as competncias correspondentes ao nvel mais elementar da atual estrutura do Catlogo Nacional de Qualificaes Profissionais (o Catlogo Nacional de Cursos Tcnicos que est sendo introduzido agora, pelo Ministrio da Educao MEC , na educao profissional brasileira, muito semelhante a ele); Os programas de qualificao profissional inicial incluem trs tipos de mdulos: a) Mdulos especficos que se referem s unidades de competncia correspondente s qualificaes do nvel mais elementar do citado Catlogo;

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b) Mdulos formativos de carter geral, que ampliem competncias bsicas e favoream a transio para o mundo profissional; c) Mdulos de carter voluntrio, para os alunos que se encaminham para a graduao na educao secundria obrigatria, que podem ser cursados simultaneamente com os mdulos dos dois itens anteriores; Os alunos que passam nos mdulos obrigatrios desses programas recebem um certificado reconhecendo as competncias profissionais adquiridas em relao ao Sistema Nacional de Qualificaes e Formao Profissional; No caso do ensino mdio ps-obrigatrio, os alunos tm, no mximo, quatro anos para obter aprovao nos dois anos de que se compe essa etapa; Essa etapa abrange as seguintes modalidades: Artes; Cincias e Tecnologia; Humanidades e Cincias Sociais. Apesar das diversas mudanas aqui apresentadas entre a Logse e a LOE, perceptvel que nenhuma delas altera a estrutura estabelecida na implantao da primeira lei. A diferena, no caso da educao profissional, que a Logse no traz as competncias profissionais dentro da estrutura do Catlogo Nacional de Qualificaes Profissionais.

Evoluo do sistema educacionalAnalisando dados da educao bsica e superior na Espanha num perodo de 35 anos, verificamos avanos significativos, o que justifica plenamente o interesse de alguns setores da sociedade brasileira pela educao espanhola. De pas atrasado que era, na dcada de 1970, se comparado com os pases da Europa, chama a ateno hoje seu grau de desenvolvimento. Isso no significa que inexistam problemas na educao, sejam eles de financiamento ou de qualidade, ou mesmo de escolarizao. Certamente os problemas atuais so muito menores que os de antigamente, embora as solues requeridas no sejam simples. Comearemos mostrando uma comparao de dados entre a educao na Espanha na dcada de 1970 e a de hoje.O sistema educacional nos anos finais da dcada de 1970 se apresentava da seguinte maneira: o nmero de alunos que concluam a educao obrigatria, aos 14 anos, nas escolas pblicas, era de 70,2%, e a taxa de evaso escolar, de 14,3%. Nos estudantes que optavam pelo ensino mdio unificado (etapa existente na antiga Lei Geral da Educao, de 1970), a evaso atingia

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cerca de 48%. J o abandono entre aqueles que iniciavam a educao profissional no primrio (na citada Lei Geral da Educao, existia essa opo no primrio) era de 57,7%, e os que abandonavam a formao profissional de nvel mdio era de 31,8%. Foi essa a situao apresentada ao governo do PSOE quando este chegou ao poder. (6)

No perodo da transio democrtica, a educao experimentou um grande impulso, fruto dos acordos polticos firmados na poca. Mediante os Pactos de Moncloa, o investimento em educao passou a 2,5% do PIB, em 1975, e de 3,7% do PIB, em 1979, o que representou um aumento de quase 50%. Segundo Tiana (7), a educao infantil, no ciclo de trs a seis anos, teve um crescimento muito significativo durante a dcada de 1980. Em 1985, praticamente todas as crianas de cinco anos frequentavam a escola; em 1991, perto de 95% das crianas de quatro anos j eram escolarizadas. Em 2003, a taxa de escolarizao em crianas de trs anos estava prxima de 95%. No ensino mdio, o progresso tambm foi significativo: em 2000, a parcela da populao entre 15 e 19 anos que estudava era de 79,5%; em 1960, era somente de 13%. A ttulo de exemplo, apresentamos alguns dados mais recentes (tabela 1), que mostram os resultados da estratgia para o desenvolvimento educacional: investimento na escolarizao de crianas a partir dos 3 anos.Tabela 1 Taxa de escolarizao (%) de crianas e jovens sem atraso escolar Ensino mdio ps-obrigatrio

3 4 5 10 14 17

95,8 99,8 99,6

0,1 0,2 0,2 99,6 0,0

0,2 0,4 0,5 0,5

99,5 10,7

50,9

12,9

Fonte: Dados Estatsticos e Indicadores do MEC (Espanha), 2006, ano 2003-2004.

Os dados apresentados na tabela impressionam, pois mostram a quase total universalizao escolar das crianas de trs anos e a universalizao das de quatro e cinco anos. evidente que esse resultado tem uma influncia muito grande no desempenho dos alunos em anos subsequentes, no ensino fundamental e no mdio.

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Ensino profissional nvel superior 0,1

Ensino mdio obrigatrio

Idade (anos)

Ensino profissional nvel mdio

Educao infantil

Educao primria

Educao especial

Resultados em avaliaes internacionaisO Programa Internacional de Avaliao de Estudantes (Pisa), de 2003 (8), conclui o seguinte, sobre os resultados apresentados pelos alunos espanhis: a) correspondem ao nvel de desenvolvimento econmico e cultural e ao nvel de investimento, nos ltimos anos, na Espanha. b) esto um pouco abaixo da mdia da Organizao para a Cooperao e o Desenvolvimento Econmico (Ocde) (485 contra 500), sendo parecidos com os de Eslovquia, Noruega, Luxemburgo, Polnia, Hungria, Letnia e Estados Unidos e superiores aos de Itlia, Grcia e Portugal. c) o sistema educacional espanhol mostra um bom grau de equidade, pois produz entre os alunos diferenas de rendimento menos marcantes que outros sistemas educacionais de pases desenvolvidos. d) a Espanha encontra-se bem situada quanto equidade conseguida no seu sistema educacional e deveria se esforar por melhorar o rendimento para obter maior excelncia. Gimeno Sacristn (9) faz a seguinte avaliao das crticas surgidas na imprensa espanhola, em razo dos resultados obtidos pelos estudantes espanhis, no teste Pisa:As dificuldades detectadas no revelam nada de novo. De nada vale lembrar um passado idlico que no existiu [o autor refere-se s lembranas das escolas boas que existiam antigamente, mas que, na realidade, s eram boas porque atendiam a pouqussimas pessoas, sempre oriundas da elite], perdendo a memria da realidade que existiu. O fracasso escolar no foi descoberto agora, nem exclusivo do nosso sistema. Apesar dele, o nvel educacional da populao aumentou. Mais gente educada, menos analfabetos, maior grau de escolarizao. A consequncia que, se o ensino mdio atinge uma populao maior, a qualidade da educao, no conjunto da sociedade, no pode ter deteriorado. O que pode ter deteriorado a imagem que alguns tinham do sistema, e tambm pode ter aumentado a frustrao de quem esperava que a expanso da escolarizao transcorresse natural e automaticamente, como uma resposta do sistema da poca em que ele era muito mais seletivo.

Podemos concluir que houve uma melhoria significativa no sistema educacional espanhol; apesar de a qualidade ser considerada mediana, quando comparada com a dos pases mais desenvolvidos, seu nvel de igualdade equipara-se ao dos pases que obtiveram os melhores resultados.

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Um relatrio da Ocde (10), posterior ao Informe Pisa 2003, relativo ao investimento dos pases em educao, diz o seguinte, sobre a educao espanhola: H um investimento, por aluno, menor do que a mdia dos pases da Ocde, por etapa e nvel de educao; Houve uma diminuio do percentual de investimento em relao ao PIB, entre os anos de 1995 e 2003; O investimento em professores maior do que a mdia dos pases da Ocde. J em relao qualidade, o relatrio afirma: As novas geraes de jovens esto recebendo mais educao do que as geraes mais velhas; Os nveis obtidos na educao secundria ainda so mais baixos do que os da mdia dos pases da Ocde, embora essas diferenas estejam diminuindo; Os nveis da educao superior so maiores do que aqueles da mdia dos pases da Ocde. O informe da Ocde confirma que a educao espanhola avanou muito nos ltimos 30 anos, embora ainda apresente ndices inferiores aos da mdia dos pases daquela entidade.

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Captulo 2

Alguns aspectos da legislao espanhola

Na legislao apresentada no captulo anterior, dois aspectos merecem destaque, fruto do estudo desenvolvido no trabalho de pesquisa citado em (1): a formao permanente dos professores, por meio da implementao dos Centros de Professores, e a institucionalizao da participao de pais, alunos, professores e servidores na gesto escolar. O fato de ressaltarmos somente esses dois aspectos no significa que vrios outros no pudessem ser includos, caso da obrigatoriedade da escola at os 16 anos, da avaliao dos alunos e do tratamento diversidade. No nosso entender, no entanto, esses dois so prioritrios.

Formao permanente dos professoresSeria muito mais lgico que, antes de apresentar a formao permanente dos professores, apresentssemos sua formao inicial. Acontece que essa era e continua sendo mesmo depois da nova legislao um dos pontos fracos da educao espanhola, especialmente no caso do ensino mdio. Muitas mudanas foram feitas, mas nenhuma afetou de modo significativo os fundamentos da formao inicial. Antes, as licenciaturas eram baseadas no conhecimento especfico (Matemtica, Fsica, Qumica, por exemplo), sendo posteriormente complementadas com um cursinho que no contemplava sequer a for-

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mao prtica dos futuros professores. Com a adequao da educao superior ao Espao Europeu Universitrio, as novas licenciaturas para a formao de professores passam a ter durao de quatro anos e, para assumir uma sala de aula, necessrio frequentar ainda um curso de ps-graduao, com durao de um ano, que inclui a prtica docente. possvel que os legisladores, conhecendo a fragilidade dessa formao inicial, tenham dado especial ateno formao permanente. A formao permanente ou continuada tratada na lei como um direito e uma obrigao de todos os professores e uma responsabilidade das administraes educacionais e das escolas. Isso significa que os professores devem realizar periodicamente atividades de atualizao cientfica, didtica e profissional em centros docentes, em instituies formativas especficas, em universidades e, no caso da formao profissional, tambm em empresas. Para isso, as administraes educacionais devem planejar as atividades necessrias formao permanente dos professores e garantir uma gama diversificada e gratuita de opes. Devem ser estabelecidas medidas para facilitar a participao dos professores nessas atividades. As administraes programaro projetos especficos, mediante acordos com as universidades, para facilitar o acesso a cursos de ps-graduao, que permitam a mobilidade entre os diferentes nveis educacionais, includo o universitrio. A lei ainda prev que as administraes educacionais fomentem os programas de formao permanente dos professores mediante a criao de centros ou institutos, contando com a colaborao das universidades, da administrao local e de outras instituies. A importncia que a Logse d formao continuada dos docentes fruto da experincia feita durante o primeiro governo socialista, de 1982 a 1986, quando foram consideradas as reivindicaes de grupos de professores que tinham realizado uma renovao pedaggica durante os ltimos anos da ditadura. Tais prticas foram reconhecidas e mesmo incentivadas, trazendo enorme motivao para os professores. Foram ento criados os Centros de Professores, que so uma adaptao das instituies de mesmo nome que proliferaram no Reino Unido durante a dcada de 1970 e se espalharam por diversos pases. Essa forma de legislar tambm uma grande novidade, pois a lei est consolidando uma experincia positiva, contrariamente ao que fazem muitas leis, que so elaboradas sem que se saiba se podero ser implementadas ou ento permanecem como letra morta.

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Centros de Professores (CEPs)O Real Decreto 2.112/1984 (11) faz referncia experincia citada:A experincia dos ltimos anos e a prpria evoluo de nosso sistema educacional e das orientaes que o presidem aconselham conciliar e superar as duas vias pelas quais se desenvolvia o aperfeioamento dos professores, baseada, uma, na iniciativa autnoma de diversos grupos de docentes preocupados com a qualidade da educao, e constituda, a outra, por programas institucionais nem sempre sensveis quelas inquietudes: duas vias paralelas, porm sem conexo e dissociadas quanto a objetivos e mtodos.

Os Centros de Professores so instrumentos voltados para o aperfeioamento dos professores e o fomento da profisso, bem como para o desenvolvimento de atividades de renovao pedaggica e divulgao de experincias educacionais, direcionados para a melhoria da qualidade do ensino. Os Centros de Professores, conforme indicado no citado decreto, tm tambm as seguintes funes: Executar os planos de aperfeioamento dos professores aprovados pela administrao educacional; Realizar atividades de participao, discusso e difuso das reformas educacionais propostas pela administrao; Desenvolver iniciativas de aperfeioamento e atualizao propostas pelos professores ligados ao Centro; Promover a equilibrada adequao dos contedos dos planos e programas de estudo s particularidades do meio; Promover o desenvolvimento de estudos aplicados, dirigidos ao conhecimento da realidade educacional e dos recursos pedaggicos e didticos disponveis. O Centro tem um diretor, nomeado pelo Ministerio de Educacin y Ciencia (MEC), por indicao de um conselho, do qual fazem parte: representante dos professores do Centro, representantes da administrao educacional e das administraes autonmicas ou locais. O diretor ser o presidente e ter um mandato de trs anos. Dentre as funes do conselho esto: Elaborar os planos anuais das atividades do Centro, estimular e supervisionar sua realizao e avaliar seus resultados; Elaborar e aprovar o oramento do Centro, bem como controlar sua execuo;

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Propor a nomeao do diretor do Centro; Elaborar regimento do Centro; Estabelecer relaes de colaborao com outros Centros de Professores e com centros docentes para o cumprimento de seus objetivos. O MEC poder estabelecer convnios com comunidades autnomas e entidades locais e tambm com outras entidades pblicas e privadas para efeitos de criao e funcionamento dos Centros de Professores. A criao dos Centros de Professores se efetuar de acordo com as disponibilidades estabelecidas no oramento anual para essa finalidade.

A experincia dos Centros de ProfessoresEmbora o decreto de criao dos Centros no tenha sido acompanhado de uma proposta financeira, o Estado garante um Centro para a administrao regional e um bom apoio, que inclui bibliotecas, recursos audiovisuais e professores para a criao da estrutura e do funcionamento. Ou seja, se apostou bastante nesses Centros como forma de oferecer uma boa formao permanente. Nos primeiros anos de governo, entre 1984 e 1987, uma centena de Centros chegou a ser construda. No entanto, com a crise financeira enfrentada pelo governo socialista, de 1990 a 1994, e com a entrada no poder do Partido Popular e, principalmente, com a descentralizao da educao para as administraes autnomas, em 2000, as atividades desses Centros passaram a ter finalidades diferenciadas, o que dificulta uma viso global deles no momento. Em relao aos CEPs, o professor Eustquio Martn, em entrevista, assim se expressa (12):(...) Os socialistas perceberam que seria muito difcil implementar uma reforma da formao inicial dos professores; por essa razo comeou a ser trabalhada uma formao permanente dos professores (...). (...) Com o passar do tempo, em 1989, houve deteriorao dos Centros, principalmente pela falta de recursos, porque o Ministrio no percebeu que era necessrio muito dinheiro para investir na formao e que, ainda assim, no havia gente preparada no pas para assumir a direo dos Centros. (...) A partir da, o MEC pretendeu ter maior controle sobre os Centros e estabeleceu um marco referencial, quando primeiro articulou um planejamento da formao, em que o Ministrio definiu as linhas bsicas, sendo uma parte obrigatria e cabendo aos prprios Centros elaborar a outra parte, dentro da autonomia institucional.

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(...) A proposta da reforma era vincular os Centros s universidades, mas (...) os Centros argumentavam que da forma anterior era muito melhor, j que eles conheciam de forma concreta as necessidades de cada um para a formao dos professores, enquanto as universidades, que desconhecem os problemas, esto mais longe da realidade e, portanto, no atendem aos desafios que se apresentam no dia-a-dia dos Centros. (...) A partir dos anos de 1990, a formao continuada comeou a ser implantada nas prprias escolas e logo depois comeou a ficar descaracterizada, pois comearam a ser oferecidos cursos conforme o menu apresentado por elas. No incio, as escolas se reuniam para fazer uma reviso crtica do que era feito, como estavam sendo avaliadas, quais eram os avanos, as deficincias e, a partir da, se fazia o modelo de formao que era necessrio. Com o passar do tempo, a realidade mudou, e as solicitaes se tornaram individualizadas, o que contrastava com o que se pretendia. (...) Embora os efeitos desse tipo de poltica sejam muito lentos, a imagem dos Centros de Professores ficou marcada na mente das pessoas. Tem gente que trabalha de forma diferente, que aprendeu a necessidade de questionar ou que percebeu tambm que poderia ser mais criativo, enfim, tudo isso est comeando a surgir agora. (...) O que faltou, por parte da administrao, foi uma avaliao tanto do processo quanto da situao em que iam ficando os Centros. (...) De fato, os efeitos no so imediatos e necessrio esperar oito, dez ou doze anos para que eles apaream, mas numa atividade poltica muito difcil haver pacincia e, ainda mais, tempo suficiente para ver os resultados onde se realizou o trabalho, onde se investiu ou se realizou a obra. Provavelmente, eles sero colhidos por outros que no os que puseram as polticas em jogo. Depois caber a estes a deciso sobre a continuidade ou no das polticas. No caso do Partido Popular, ele no teve coragem de fechar os Centros, o que um sinal de que estes tm fora. No entanto, aconteceram mudanas, como aqui em Madri, onde todos os diretores e suas equipes foram mudados. J no existe eleio de diretor. Hoje, em Madri, o Conselho do Centro que escolhe o diretor, em funo do mrito, e com isso se tem uma poltica de maior interveno e controle. Na realidade foi esquecida a cultura que existia nos Centros, de planejamento, de avaliao, de prestao de contas. Foi mudando tudo, at o nome, hoje Centro de Apoio. Os professores tambm reclamam porque antes era Centro de Professores, o Centro deles.

Segundo Zabaleta (13), seria preciso vencer algumas dificuldades para que os Centros pudessem sobreviver. Uma delas, a preocupao das administraes de juntar as atividades de formao com a evoluo da carreira profissional. Outra, seria a mudana que a reforma prope

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para que os professores passem de um ensino reservado s elites a um ensino destinado a 100% dos adolescentes at uma determinada idade, como o caso espanhol, que a lei obriga a estudar at os 16 anos. Esses desafios justificam a defesa da proposta de os Centros de Professores serem organizados por professores da educao bsica e sob sua coordenao, pelo fato de que eles possuem mais conhecimento dos desafios e das dificuldades a serem enfrentados nas escolas do que os intelectuais e acadmicos das universidades. A discusso entre a formao permanente, baseada nas aspiraes individuais dos professores, e a formao permanente centrada na escola abordada por Gutirrez (14):A formao permanente, entendida como direito e dever dos professores, tem de ser necessariamente um meio para a melhoria do trabalho docente e, portanto, da qualidade da educao. As necessidades educacionais dos alunos devem determinar quais conhecimentos e quais habilidades so requeridos dos docentes para responder a elas. So essas as necessidades que tm de condicionar e dar sentido sua formao permanente. O modelo formativo baseado em atividades, geralmente cursos, em que o professor recebe uma srie de conhecimentos mais ou menos prximos sua realidade como docente tem demonstrado absoluta falta de eficcia. preciso defender a ideia de que a unidade de formao deve ser a escola. No se trata de uma mudana na situao fsica da formao, mas uma mudana em sua metodologia, em seus objetivos e em seus protagonistas. A escola no s um lugar onde os professores ensinam, mas tambm um lugar onde eles aprendem, j que o processo de ensino deve ser entendido como um processo de investigao dos professores, que em si mesmo formativo e que os agentes externos devem favorecer. A formao centrada na escola, como aconteceu em outros pases onde foi aplicada anteriormente, demonstrou sua eficcia e seu enorme potencial para gerar mudanas dirigidas a uma melhoria da qualidade do ensino, mas sua generalizao exige recursos materiais e humanos.

claro que nada disso ir funcionar se o professor no tiver vontade de participar da formao ou no houver um plano de formao elaborado pela direo da escola com a participao dos professores. A experincia mostra que a grande maioria dos professores procura a formao permanente caso ela esteja relacionada a uma melhoria de seu desempenho na sala de aula. Tambm no desprezvel a quantidade de professores que participam de cursos rpidos, s vezes de final de semana, se com isso puderem incrementar seus rendimentos. A respon-

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sabilidade por essa opo deve ser creditada aos administradores educacionais, que incentivam esse tipo de cursinho, muitas vezes mais por ignorncia e para diminuio de gastos do que pelos professores. Em muitos casos, os gastos com a formao saem do bolso deles. O mais relevante no processo de formao permanente de professores conhecer seus resultados em termos das mudanas na sala de aula. saber se houve alguma alterao na prtica cotidiana do professor e se ela teve consequncias no aprendizado dos alunos. Se a resposta for positiva, poderemos dizer que a formao permanente teve sucesso. No ser simplesmente avaliando o que o professor aprendeu ou aproveitou do curso que poderemos avaliar a formao permanente. De acordo com o trabalho de avaliao do MEC, elaborado pelo Instituto Nacional de Qualidade da Educao (Ince) (15), de 1988, especificamente a respeito da formao permanente, conclui-se o seguinte: Os cursos de curta durao foram os mais frequentados pelos professores, apresentando uma avaliao positiva por dois teros dos consultados; os cursos longos, presenciais, dirigidos por conferencista e com trabalho prtico tambm foram avaliados positivamente por quase dois teros dos professores consultados; a participao em congressos ou seminrios muito apreciada; porm, o meio de formao mais valorizado foi a autoformao nas escolas, refletindo com os colegas, aproveitando o espao e o tempo de trabalho, assim como os projetos de inovao e investigao, ambos avaliados positivamente por trs quartos dos professores consultados. Hoje, a maioria dos pases europeus trabalha com programas de formao permanente de professores e, em alguns pases, ela condio para a melhoria da qualidade da educao.

Democratizao da escolaEm pases em que regimes autoritrios tiveram vida longa, frequente que, ao trmino destes e ainda numa fase de transio, haja um enorme anseio da sociedade por democratizar as instituies, sejam elas polticas, sociais ou profissionais. Isso aconteceu na Espanha, em Portugal e no Brasil. Esse anseio, plenamente justificvel, no est em contradio com o anseio por melhoria na qualidade do sistema educacional. Por esse motivo, as sociedades feridas e massacradas pelo autoritarismo priorizam, na volta democracia, a democratizao das instituies, j que essa a nica forma de abrir as portas para uma discusso sobre sua qualidade e outros assuntos de interesse da sociedade.

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No caso espanhol no se pode esquecer a grande contribuio que os Pactos de Moncloa representaram na transio e na criao das bases para a Constituio de 1978. Foi nesse ato que ficou assegurada a participao de professores, pais e alunos no controle e na gesto dos centros mantidos com recursos pblicos, caso das escolas pblicas e das privadas, desde que conveniadas. Na ocasio foram envolvidos nessa ao todos os grupos polticos com representao parlamentar, alm de governo, sindicatos patronais e sindicatos de trabalhadores. Dessa forma se definiu pela primeira vez um modelo alternativo de administrao dos estabelecimentos educacionais. A sociedade absorveu esse acordo, pois toda a legislao posterior a respeito da participao nas escolas est sendo mantida, embora existam avanos e retrocessos, dependendo dos partidos instalados no governo, especialmente quando se aborda a questo da escolha do diretor da escola. importante destacar que, apesar de o tema da descentralizao poltica da Espanha, com todas as suas consequncias, ser um dos maiores e mais delicados problemas enfrentados por todos os governos, curiosamente a gesto, ou o governo das escolas, como se diz na Espanha, levada ao nvel decisrio do governo central, e isso independentemente do partido que esteja no poder. Esse acordo, originrio dos Pactos de Moncloa, transmite a firmeza da sociedade espanhola na democratizao das instituies. um princpio que transita horizontal e verticalmente, e no se questiona se deve ou no haver participao na administrao das escolas. A longa ausncia de vida democrtica na Espanha parece que reforou nos espanhis a ideia de que era necessrio garantir uma democracia estvel e duradoura. Para assegurar essa condio, nada melhor do que educar na democracia, ou seja, aprender e praticar a democracia para que ela se enraze e se transforme em um valor pelo qual as pessoas achem que vale a pena lutar. Puelles (16) apresenta sua viso acerca do problema: possvel uma democracia slida e estvel sem o apoio de uma populao instruda? Essa indagao, que j se fizeram com toda a profundidade nossos liberais de Cadiz [os deputados das Cortes, ou Parlamento, instaladas inicialmente na cidade de Cadiz], tem de ser respondida, hoje, negativamente luz da nossa prpria histria. Ainda mais que hoje, a democracia, o regime poltico que iluminou um novo reinado, o da liberdade e o da igualdade, necessita mais do que nunca da educao. Porque as exigncias atuais demandam imperativamente no s uma democracia formal, mas tambm uma

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democracia real. Nesse sentido, um modo de viver que no se esgote na pura emisso do voto abandonando todo o interesse posterior pelos assuntos pblicos , mas que suponha, ainda, a participao do cidado em tudo aquilo que mais diretamente lhe diga respeito e lhe interesse. Trata-se, assim, de uma concepo ativa do cidado como sujeito autnomo que, obviamente, emite seu voto, mas que tambm participa dos assuntos pblicos. Dentro dessa perspectiva, a democratizao da educao era, talvez, um dos problemas mais urgentes e prioritrios da transio. Pressupunha, em primeiro lugar, a democratizao dos contedos do ensino. O exerccio da democracia exige, por parte do cidado, a aquisio de alguns saberes a respeito da coisa pblica. A educao deve propiciar ao futuro cidado os elementos suficientes e a preparao necessria para que ele possa julgar os acontecimentos polticos, econmicos, sindicais etc., e, em consequncia, possa decidir plenamente a respeito dos assuntos diversos da comunidade onde mora. Em segundo lugar, se a democracia uma forma de vida baseada fundamentalmente na tolerncia como virtude cvica e no esprito de convivncia, de dilogo e de respeito opinio alheia, se faz necessria e urgente uma pedagogia da democracia. Tais virtudes cvicas podem e devem ser ensinadas desde o bero, na famlia e na escola. Dessa forma, a escola se converte, paralelamente famlia, em um instrumento adequado que no s transmite saberes, mas tambm atitudes democrticas, vividas na prpria escola. As crianas aprendero ento a conviver, a se tolerar umas s outras, a respeitar a opinio dos demais, a buscar solues no dilogo e no na fora. S assim a cultura se converter em um motor de transformao social e de progresso. Em terceiro lugar, a escola no pode continuar sendo uma ilha separada da comunidade onde se situa ou manter um comportamento estanque e alheio a todos aqueles que, de uma forma ou de outra, tm interesse na educao. A escola deve cumprir a funo que lhe atribuda pela sociedade democrtica; deve ser uma comunidade aberta a todos os interessados no sistema educacional: alunos, pais, professores, foras sociais, autoridades pblicas. S quando se transformar em uma comunidade democrtica, a escola poder educar para a vida. Por ltimo, a democratizao da educao deve levar em conta a participao de todos os elementos que integram o sistema educacional. Participao, portanto, no governo e na administrao das escolas, participao que em nossos dias significa direo colegiada: determinao dos objetivos educacionais, regime interno dos Centros, distribuio dos recursos financeiros, seleo de professores etc. Participao, tambm, no planejamento educacional, que deve deixar de ser um assunto exclusivo dos especialistas para ser um assunto comum a todos (os especialistas seriam agora os assessores

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ou estimuladores de todo o processo, sendo a deciso ltima dos poderes pblicos). Participao, por ltimo, nos prprios rgos da administrao educacional a fim de que, efetivamente, a educao, como processo, seja uma tarefa comum a todos os que, de uma forma ou de outra, intervm nos diferentes nveis de aplicao.

Consideraes a respeito da participao na gesto escolarAo analisar as modificaes havidas na legislao que regulamenta a organizao e o funcionamento das escolas, podemos afirmar que a legislao que dava mais autonomia escola era a inicial, a da Lode. Mas ela foi modificada para tentar garantir uma melhor participao dos diversos segmentos. Isso parece no ter surtido efeito, conforme constatao feita pelo Conselheiro Tcnico do Conselho Escolar do Estado, Frias Del Vall (17):A participao dos professores na vida da escola e em particular no Conselho Escolar parece apresentar nveis razoavelmente elevados, sobretudo no que diz respeito nomeao de representantes no Conselho Escolar, o que produz, sem dvida, alguma satisfao. Em relao aos pais, sua participao nas escolas muito pequena devido ao pouco envolvimento associativo que existe na nossa sociedade. A cultura do individualismo tem forte implantao e joga contra a presena do setor de pais e mes nos Conselhos Escolares. Alm disso, a falta de tempo dos pais para dedicar s tarefas especficas como integrantes dos Conselhos Escolares dificulta sua participao. Isso gera baixa participao dos pais nas eleies para representantes nos Conselhos Escolares, situao que dever ser corrigida no futuro, dada sua gravidade.

O segmento dos alunos tem maior participao nas eleies para os Conselhos Escolares do que o segmento de pais, mas mesmo assim se percebe que h setores de alunos que esto fora dessa dinmica. Todas as dificuldades encontradas para a participao dos diversos segmentos no podem reduzir a importncia dada a esse envolvimento como forma de: (...) impedir que a educao se transforme em patrimnio de um grupo social ou poltico qualquer, pois a formao da personalidade dos alunos requer o contato com os diferentes enfoques inseridos na sociedade, para que os processos de conhecimento, avaliao e posicionamento do aluno sejam um componente fundamental na construo da sua personalidade, conforme Del Vall (17).

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De acordo com o mesmo autor (17): A participao de professores, pais e alunos no rgo colegiado mximo um fator que melhora a qualidade da educao oferecida nas escolas, uma vez que facilita a coordenao de aes entre a famlia e a escola e serve de instrumento didtico para o aluno, ao favorecer a sensao de fazer parte de uma ao educativa comum em torno da escola. Finalizamos essas consideraes com a opinio da professora Teresa Bardisa, especialista em organizao escolar e participao da comunidade na gesto escolar, durante entrevista a respeito da organizao das escolas (18):O modelo de organizao da eleio democrtica dos diretores contido na Lode era bom, mas trouxe tambm alguns problemas. Houve pouco trabalho na formao das equipes dirigentes e na direo da formao continuada. Era dado um curso e imediatamente comeavam a executar. Hoje, muitos professores no querem ser diretores. uma situao conflitante na medida em que qualquer atitude que mostre a presena de autoridade, que mais do que necessria num centro escolar, constrange os diretores porque a palavra autoridade est muito desgastada depois de um perodo de quase 40 anos de ditadura. Os professores costumam delegar todas as funes ao diretor. No difcil ouvir dos professores, dirigindo-se ao diretor: Mas para isso que voc recebe!. O trabalho de colaborao que toda reforma exige no conseguido nem pelos professores nem pelas equipes dirigentes. A participao da comunidade deixa a desejar. Mas, eu pergunto, como se d a participao social na sociedade civil? Ento, como queremos que saia dos centros escolares um ncleo de vida poltica, que no existe na sociedade civil como um todo? Nos anos prvios transio, durante a mesma e at pouco tempo depois, se travava uma luta pela democratizao do ensino e das instituies. Ento, todos os atores sociais queriam estar nos Conselhos Escolares e, no resta dvida, gente muito ativa e politizada participou deles. E, realmente, houve um caldeiro de atividades extracurriculares com grande participao, mas os professores no gostavam da participao externa dentro da escola, gostavam dela, mas fora dos muros da escola. Ento no se planeja espao nem tempo para que os alunos aprendam a debater, a negociar, a estabelecer consensos. A nica coisa que eles fazem , no dia da votao, depositar o voto na urna, como uma mera formalidade. No conselho, a queixa de alunos e pais que falta debate, pois a pauta da reunio distribuda na hora, deixando pais e alunos sem material para discusso e sem a posio do setor. Essa queixa tem a ver com outra, de alunos e professores, que o abuso dos professores em relao linguagem

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utilizada nos debates. Essa prtica utilizada para bloquear o debate democrtico, mas isso, evidentemente, nunca explicitado. Resumindo, os pais, de forma geral, priorizam dar algum dinheiro para atividades extracurriculares, nesse caso, os professores gostam da participao. Os alunos so excludos do debate e assim, salvo raras excees, os conselhos ficam despolitizados. No cotidiano da vida, tambm assim, falamos de poltica, mas dela participamos pouco.

Comentrios sobre o captuloConsiderando a estagnao, com sinais de piora, nos resultados dos alunos espanhis no ltimo Informe Pisa de 2007, e muito embora haja necessidade de mais pesquisas, podemos aventar a ideia de que a interrupo do trabalho dos Centros de Professores teve uma influncia negativa sobre os resultados qualitativos. Isso no impede que existam outras causas, mas considerando o quanto esses Centros contriburam para a formao permanente dos professores e sabendo como isso foi positivo para o aprendizado dos alunos, a hiptese aqui levantada no deve estar muito longe da realidade. A baixa participao da comunidade na gesto da escola e a desmotivao dos professores para serem candidatos gesto mostram que o Estado est perdendo uma parcela importante dos imprescindveis atores da gesto e que essa perda pode estar influenciando tambm a estagnao revelada nos resultados do Informe Pisa 2007.

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Captulo 3

O Brasil pode aprender com a experincia da Espanha?

H uma opinio generalizada entre os estudiosos da educao de diversas partes do mundo de que a formao inicial e o aperfeioamento dos professores so importantssimos para a qualidade da educao. essa a razo que nos motivou a comparar os aspectos da educao espanhola que analisamos no captulo anterior com as polticas especficas do Brasil para a educao continuada e a gesto democrtica da escola. No caso da gesto democrtica, ela foi includa porque diversos estudos e pesquisas, no Brasil, mostram que a participao dos pais na vida escolar dos filhos repercute positivamente no aprendizado deles. Da mesma forma que Espanha e Portugal, o Brasil precisa reafirmar, como formao para a cidadania, que est educando para a democracia e, como tal, precisa coloc-la em prtica. A seguir so apresentadas as polticas especficas para a formao continuada de professores e a gesto democrtica da escola.

Formao dos professoresNo Brasil, o motivo de maior preocupao ainda a formao inicial. necessrio formar os professores que esto em sala de aula mas no possuem a titulao necessria para serem professores, sobretudo na educao infantil e nas sries iniciais da educao fundamental. Para

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esses casos, o MEC tem vrios programas em andamento, em colaborao com os estados. No caso do ensino mdio, ainda existem professores que esto ensinando em sala de aula sem possuir licenciatura. Para esses, o MEC tambm tem programas especficos, em colaborao com estados e universidades. A questo mais difcil suprir a carncia de professores nas reas especficas de Fsica, Qumica, Matemtica e Biologia, tanto nos anos finais do fundamental quanto no ensino mdio, conforme trabalho divulgado pelo Conselho Nacional de Educao (CNE) (19). Um dos projetos colocados em prtica pelo governo para tentar solucionar essa grave crise que atinge todos os estados a criao da Universidade Aberta (UA), que comeou a funcionar em 2007, oferecendo cursos a distncia. uma tentativa de soluo que depender de tempo (pelo menos quatro anos para a formatura de uma turma), do comportamento dos alunos nessa modalidade de ensino (por exemplo, a taxa de evaso) e do funcionamento dessa nova instituio, uma vez que os recursos financeiros no esto totalmente garantidos. Um programa de bolsas para alunos de licenciatura nas reas mais crticas tambm foi estabelecido, dentro do Plano de Desenvolvimento para a Educao (PDE). A lei que estabelece o piso nacional salarial do professor poder atrair mais alunos para as licenciaturas. O que est faltando um plano emergencial para evitar que crianas voltem para casa sem aulas dessas disciplinas especficas, devido falta de professores. No h como falar em qualidade de ensino se no h professores para lecionar. incompreensvel que nenhum governo federal, desde a democratizao, tenha qualquer projeto pelo menos para atenuar essa situao. O governo estadual e o federal tm condies e competncia para elaborar um plano, emergencial e transitrio, de isenes fiscais e outros benefcios, para ativos e aposentados, podendo assim garantir a presena de professores em sala de aula. S assim poderemos pensar em outras medidas que melhorem a qualidade do nosso ensino.

Diretrizes curriculares para a formao de professoresQuanto normatizao da formao inicial de professores de educao infantil e dos primeiros anos do ensino fundamental, o CNE j elaborou as Diretrizes. Os cursos de licenciatura destinados formao de professores para os ltimos anos do ensino fundamental, do ensino

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mdio e da educao profissional de nvel mdio esto organizados em habilitaes especficas por campo de conhecimento, conforme indicado nas Diretrizes Curriculares pertinentes.

Formao permanenteAs novas Diretrizes Curriculares para o ensino mdio (20) foram aprovadas em 1998 e introduziram mudanas radicais, tanto nos princpios quanto nos fundamentos e nos procedimentos. Por exemplo, o artigo 6 da resoluo diz: Os princpios pedaggicos da Identidade, Diversidade e Autonomia, da Interdisciplinaridade e da Contextualizao sero adotados como estruturadores dos currculos do ensino mdio. Tudo isso uma grande novidade para os professores, pois ao longo da formao inicial quase certo que esses temas no tenham sido abordados e, se foram, isso constituiu exceo. Portanto, nada mais apropriado, no caso de uma administrao federal, que recursos importantes sejam destinados formao permanente dos professores para garantir o conhecimento necessrio implementao dessas mudanas. J que isso at hoje no aconteceu, significa que as reformas foram introduzidas apenas formalmente e, em consequncia, nada mudou na sala de aula. No h polticas pblicas para a formao permanente. O que existe so programas em nvel federal, estadual e municipal, que tm como objetivo melhorar e atualizar o conhecimento dos professores. Em alguns estados, o governo oferece cursos voltados especificamente para eles. De forma geral, os estados e municpios realizam convnios com instituies de nvel superior, pblicas e privadas, e com Organizaes No-Governamentais (ONGs) para a realizao de cursos de qualificao e aperfeioamento. s vezes, as escolas procuram cursos oferecidos pelas instituies citadas ou os professores, mesmo em carter pessoal, participam de cursos, rotineiros ou no, dessas instituies. Seria muito mais proveitoso para a qualidade da educao, sobretudo do ensino mdio, mas tambm de toda a educao bsica, ter recursos voltados exclusivamente para a formao permanente de professores, dentro de uma poltica pblica estabelecida pelo governo federal, em colaborao com os estados. Recentemente, foi aprovada uma nova lei dando novas atribuies Coordenao de Aperfeioamento do Pessoal de Nvel Superior (Capes). Essas atribuies referem-se formao inicial e continuada dos profes-

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sores da educao bsica. De acordo com o novo Estatuto da Capes e no mbito da educao bsica, cabe a ela induzir e fomentar, em colaborao com estados, municpios e o Distrito Federal, e exclusivamente mediante convnios com instituies de ensino superior, a formao inicial e continuada de profissionais do magistrio da educao bsica. um bom comeo, sendo desejvel que isso evolua para a rpida elaborao de Diretrizes Gerais de Formao Permanente, a fim de que as escolas possam elaborar seus projetos poltico-pedaggicos com a incluso da poltica para a formao permanente dos professores da escola. Se for respeitada essa poltica da escola, e as instituies de ensino superior organizarem os cursos e outras atividades para atender essas polticas locais, a qualidade da educao bsica poder dar um grande salto.

A experincia de BrasliaEm 1995, a Secretaria de Educao do governo do Distrito Federal instituiu uma comisso para elaborar o projeto da criao de uma escola cujo objetivo fosse o aperfeioamento dos professores da rede pblica, visando uma melhoria do ensino. Tentava-se assim resgatar a antiga Escola de Aperfeioamento, criada em 1985 e extinta dois anos depois, por um novo governo. Em 1997, foi aprovado pela Cmara Distrital um projeto de lei oriundo do Executivo, criando a Escola de Aperfeioamento dos Profissionais da Educao (Eape). Em 1998, quando o governo findou, a escola estava toda estruturada, contando, entre outros, com departamentos de pesquisa, pedagogia, biblioteca e recursos multimdia e com quase 80 profissionais integrando o quadro de professores e apoiadores da escola. O segundo Seminrio sobre Poltica de Aperfeioamento Profissional da Educao, realizado pela Escola de Aperfeioamento dos Profissionais de Educao (Eape), no incio de 1998, definiu a principal diretriz daquele ano: focar a escola, levando para o dia-a-dia das escolas a prtica aprendida, buscando estar ao lado dos educadores em seu trabalho pedaggico, fortalecendo esse senso coletivo e, consequentemente, a gesto democrtica nas escolas. Com essa viso foi ento criada a Rede de Aperfeioamento dos Profissionais da Educao. A Eape teve papel fundamental no fortalecimento da gesto democrtica nas escolas. Os diretores eleitos por meio da Lei da Gesto Democrtica, aprovada em 1995, tinham de frequentar um curso de 180 horas para adquirir os conhecimentos mnimos necessrios para dirigir uma escola. Esses cursos eram organizados e ofertados pela Eape.

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O quadro dirigente da escola era formado por 11 professores, um dos quais era o diretor, nomeado pelo governador e indicado pelo Conselho Escolar da Eape. Desse Conselho participavam representantes de todas as diretorias regionais e da Secretaria de Educao. Nesse perodo, o Distrito Federal contava com cerca de 20 mil professores; 10 mil servidores no docentes; 550 mil alunos e 560 escolas, na rede pblica. Com esses mesmos objetivos, salvaguardando as especificidades, foi criado o Centro de Professores da Prefeitura de Belo Horizonte, anterior Escola de Braslia, que teve uma influncia grande na concepo da ltima. necessrio salientar que, embora haja um intervalo grande entre a fundao dos Centros de Professores, na Espanha, na dcada de 1980, e a implantao da Eape, em Braslia, em 1996, existe uma estrutura semelhante de objetivos e meios entre as duas instituies. possvel que a criao da Eape, em 1985, tenha tido inspirao ideolgica nos Centros, pois nessa poca surgiu em Braslia um forte movimento de renovao pedaggica que muito influenciou o movimento docente, embora os governos que se sucederam tenham retroagido no tempo. S em 1995 foram resgatadas as boas ideias do passado e, com isso, avanaram bastante as mudanas, em especial no mbito da educao. Dentro do regime de colaborao que a Lei de Diretrizes e Bases da Educao contempla, no temos dvidas de que a implantao de uma rede de Centros de Formao Permanente de Profissionais da Educao (numa parceria entre os estados e a Unio) permitiria dar um salto qualitativo que teria efeitos muito positivos na qualidade da educao bsica. Diretrizes gerais nacionais e orientaes para o trabalho dos Centros seriam elaboradas pelo governo federal, tendo a colaborao dos estados, estabelecendo-se uma coordenao, a qual, semelhantemente Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (Capes), poderia ser chamada de Coordenao de Aperfeioamento do Pessoal da Educao Bsica (Capeb).

Gesto democrtica nas escolasO projeto de participao da comunidade escolar (professores, alunos, servidores e pais) na gesto das escolas uma consequncia do que estabelece a Constituio de 1988 em relao gesto democrtica. A Lei de Diretrizes e Bases da Educao tambm inclui a participao, sem explicitar, porm, de que forma ela ocorreria. Os governos federais

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optam por manter a forma genrica e deixar que os estados decidam como ela se dar. Alguns governos de estados e municpios entendem que a nomeao poltica do diretor de uma escola, ainda que por critrios tcnicos, lhes garante uma parcela de poder no estado ou no municpio. por essa razo, entre outras, que as solues a respeito da participao, e em particular a escolha do diretor, so o mais variadas possvel. O que consta na Constituio brasileira no o que os legisladores e os governos almejavam como princpio democrtico. A democratizao das escolas parece ser uma reivindicao isolada dos sindicatos dos profissionais da educao e de algum partido poltico, no caso o Partido dos Trabalhadores, quando na verdade deveria ser uma reivindicao de toda a sociedade. possvel que a ausncia de uma transio poltica, ao final da ditadura, tenha deixado algumas lacunas democrticas em parte da sociedade brasileira, como o caso aqui assinalado. A prtica de nomear os diretores das escolas estava muito arraigada nos governantes, porque era entendida como uma demonstrao de poder e fora poltica. Mesmo agora, aps 20 anos da promulgao da Constituio, quando se fala em democratizao das escolas, a maioria da populao e principalmente os governantes entendem isso como sinnimo de eleio do diretor. No se pensa em Conselho Escolar, nos Conselhos Municipais ou Estaduais de educao, na participao dos alunos, em uma forma institucional de participao dos pais, no mais como quebra-galho ou apenas resolvendo as dificuldades enfrentadas pelas escolas. Por conseguinte, essa participao se d de forma espordica e s vezes nada institucionalizada. De acordo com um levantamento do Conselho de Secretrios Estaduais de Educao (Consed) (21), as prticas adotadas pelos estados podem ser resumidas em quatro categorias: eleio direta pela comunidade, praticada desde a dcada de 1980, atualmente em curso nos estados do Acre, Alagoas, Gois, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Par, Piau, Rio Grande do Norte (bem recente), Paran, Rio Grande do Sul e Paraba (s nas sedes de regio). Em geral, esses estados tm procurado aperfeioar o processo, pelo estabelecimento de um perfil a ser preenchido pelo candidato (titulao, experincia, apresentao de plano, obrigatoriedade de cumprir uma capacitao etc.) para que concorram ao processo eletivo; eleio direta pela comunidade, aps o cumprimento de uma prova de competncia tcnica elaborada normalmente por instituio externa. Nesse caso, encontram-se os estados de Minas Gerais, Cear (h cinco ou seis anos) e Pernambuco;

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seleo

tcnica, adotada nos estados de So Paulo (a nica realizada por concurso pblico), Bahia (por meio de processo de certificao), Distrito Federal, Rio de Janeiro (os dois ltimos desistiram da eleio para adoo de seleo tcnica com proposio de lista trplice) e Tocantins (seleo tcnica); indicao tcnica ou poltica, envolvendo oito estados: Amap, Amazonas, Rondnia, Roraima, Sergipe e Maranho (que sempre adotaram essa modalidade), Esprito Santo e Santa Catarina (que recuaram da eleio para a indicao). H tambm o caso da Paraba, que adota dois sistemas: o de eleio j referido e a indicao para escolas localizadas fora dos municpios-sede de regies educacionais.

O caso de BrasliaEntre 1995 e 1998 foram realizadas, no Distrito Federal, diversas experincias no mbito da educao. Uma delas, j relatada, corresponde Escola de Aperfeioamento dos Profissionais da Educao. Relataremos neste captulo outra, referente escolha de diretor nas escolas do DF e criao de Conselhos Escolares e sua organizao. A lei que embasou essa experincia, denominada Lei da Gesto Escolar, foi elaborada mediante uma negociao conjunta entre a Secretaria de Educao, os dois sindicatos de professores e de servidores , estudantes, representados pela Unio Municipal dos Estudantes de ensino mdio, e parlamentares da rea da educao da bancada do governo e representante do gabinete do governador. O anteprojeto de lei foi conseguido nessa negociao por unanimidade, o que facilitou muito sua tramitao, pois, quando ele chegou Cmara, a aprovao se deu rapidamente e tambm por unanimidade. A Lei n. 957, de 22 de novembro de 1995, aprovada pela Cmara Distrital do DF, previa a eleio direta dos diretores das escolas de educao infantil, educao fundamental, ensino mdio, escolas normais e centros de estudos supletivos. Todas, sem exceo, teriam eleies diretas, com participao de todos os segmentos. A participao se daria de forma paritria, considerando-se 50% de pais e responsveis de alunos e alunos e 50% de professores e servidores de escolas. Para ser nomeado, o candidato eleito teria de ser professor h dois anos, pelo menos, na regional de ensino qual pertencesse a escola, ser professor de carreira e possuir diploma de graduao, ou de ensino mdio no caso das escolas de educao infantil. Excepcionalmente, nessas

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escolas se aceitaria o certificado de ensino fundamental se o vice-diretor tivesse diploma universitrio. O candidato a diretor teria de apresentar para debate, durante o perodo eleitoral, seu projeto poltico-pedaggico, que seria implementado caso ele fosse eleito. O mandato de diretor seria de dois anos, com possibilidade de uma renovao. A eleio do diretor e do Conselho Escolar no se daria de forma casada: primeiro aconteceria a do diretor e, depois, a do Conselho. A comunidade escolar participaria dos Conselhos Escolares, tambm com representaes paritrias: 50% de professores e servidores e 50% de alunos e pais e responsveis escolhidos nas respectivas assembleias setoriais. Nas eleies, o qurum mnimo para a participao seria de 50% para cada segmento, com exceo de pais e responsveis e alunos de supletivo, para os quais o qurum seria de 10%. Entre as atribuies do Conselho Escolar estariam: elaborar o regimento; incluir nele os adendos necessrios, modificar e aprovar o plano administrativo anual, elaborado pelo diretor aps focar a programao de recursos necessrios para a manuteno e a conservao das instalaes escolares; criar mecanismos de participao efetiva dos segmentos no Conselho Escolar e divulgar periodicamente o uso dos recursos financeiros, a qualidade dos servios prestados e os resultados obtidos. Entre os princpios da gesto democrtica estaria a autonomia das escolas na gesto pedaggica, administrativa e financeira de seu projeto educativo. As primeiras eleies para diretor, em 1995, aconteceram em 525 escolas das 531 existentes. Participaram 269.960 eleitores. J em 1997, a eleio aconteceu em 551 escolas, com participao de 293.697 eleitores. interessante notar que, em 1995, o nmero de eleitores para as eleies gerais do DF foi de quase um milho e o nmero de votantes nas eleies de diretor foi de aproximadamente 30%. Houve grande mobilizao, que se manteve em 1997, como indicam os nmeros. A eleio dos diretores e dos Conselhos no se dava de forma casada, acarretando prejuzo do ponto de vista da mobilizao para as eleies dos Conselhos. Na segunda eleio, o qurum dos pais e responsveis foi modificado, para evitar o risco de no se conseguir realiz-la. A proposta da Secretaria era fazer as eleies ao mesmo tempo, mas ela foi derrotada durante o processo de negociao. O Sistema de Educao do DF composto por 19 Direes Regionais, que administram as escolas pblicas localizadas dentro de cada direo.

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Em cada uma dessas regies foi criado um Frum Regional de Conselhos Escolares, congregando todos os Conselhos Escolares da regio. O conjunto desses diversos Fruns formou a Federao de Conselhos Escolares. Em 1997 realizou-se um encontro de Conselhos Escolares, e em 1996 foi realizado o primeiro Congresso de Educao do DF, com 2.500 participantes, representando os quatro segmentos: professores, servidores, pais de alunos e alunos. A experincia de democratizao das escolas e sua gesto foi extremamente rica, havendo significativa participao dos profissionais ligados s escolas, porm fraca participao de pais de alunos e alunos. As falhas e as crticas apresentadas na Espanha, a respeito do funcionamento dos Conselhos Escolares, so muito semelhantes quelas feitas no DF. Considerou-se que a construo de uma estruturao slida para os Conselhos no foi possvel devido falta de pessoal preparado para administrar essa grande iniciativa. Na realidade ocorreram dificuldades pelo despreparo do pessoal para administrar todas as mudanas implementadas no sistema educacional do DF, embora existissem pessoas de grande competncia e dedicao. As principais mudanas colocadas em prtica dizem respeito ao currculo e avaliao de alunos, alm das j apresentadas Eape e gesto democrtica do sistema.

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Captulo 4

Sugestes para melhorar a educao bsica no Brasil

No captulo anterior mostramos as diferenas existentes entre os sistemas educacionais na Espanha e no Brasil, no que se refere ao aperfeioamento dos professores e gesto democrtica da escola. Ressaltamos tambm que isso no significa que s esses dois aspectos tenham sido responsveis pela melhoria nos resultados dos alunos espanhis. Neste captulo apresentaremos outros aspectos da legislao espanhola, a experincia de Braslia em relao avaliao em processo ou progresso continuada, e daremos mais algumas sugestes que podem ajudar a melhorar a educao e servir de exemplo para o Brasil. Iniciamos com a avaliao dos estudantes segundo a legislao espanhola.

O processo de avaliao: comparao entre a legislao espanhola (LOE) e a experincia de BrasliaPoucas mudanas foram introduzidas pela Lei Orgnica da Educao em relao Logse. Abordaremos a situao atual. O ensino fundamental compreende seis anos letivos, iniciando-se aos 6 e terminando aos 11 anos. Ele corresponde a trs ciclos de dois anos cada, que so organizados em reas obrigatrias e tm carter global e integrador.

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A avaliao da aprendizagem nessa etapa contnua, e o aluno s passa de um ciclo a outro quando atinge os objetivos correspondentes. Caso isso no ocorra, ele permanece mais um ano no mesmo ciclo. Essa situao s pode acontecer uma vez nos ciclos do ensino fundamental, ocasio em que o aluno tem atendimento, mediante um plano especfico de recuperao e de reforo das competncias bsicas. Ao trmino do segundo ciclo do ensino fundamental, as escolas tm de fazer uma avaliao das competncias bsicas atingidas pelos alunos. O ensino mdio obrigatrio formado por dois ciclos de dois anos e oferecido por rea de conhecimento. A avaliao do ensino mdio obrigatrio contnua. Os alunos que cursaram o segundo ano e no tm condies de passar para o terceiro (segundo ciclo), mas j repetiram uma vez, podem ser incorporados a um programa de diversificao curricular, aps avaliao adequada. O aluno pode repetir o mesmo ano uma nica vez e duas vezes, no mximo, em cada etapa. Se isso acontecer, o aluno ir para programas especiais, tendo por base uma qualificao inicial profissional. Ao final do segundo ano, todas as escolas devem realizar uma avaliao das competncias bsicas de seus alunos, de carter formativo e orientador para as escolas e informativo para as famlias e toda a comunidade. O fato de ser uma avaliao continuada como, alis, na grande maioria dos pases que tm bom desempenho educacional , porm com as limitaes apresentadas, mais uma demonstrao de que esse tipo de avaliao deve ser considerado e analisado, antes de ser desqualificado, como s vezes acontece no Brasil. J se passou muito tempo desde que grandes redes de ensino, como as existentes em Belo Horizonte, Porto Alegre, Braslia, Rio de Janeiro, e muitas outras, menores, implantaram a avaliao processual ou progresso continuada dos alunos. Algumas delas ainda continuam, outras comearam, e outras, ainda, voltaram antiga seriao. Quase 20% dos alunos matriculados no ensino fundamental estudam em regime de progresso continuada. A omisso do MEC, no Brasil, em no optar por outra forma de avaliao, alegando que a deciso cabe exclusivamente a cada sistema de ensino, traz um prejuzo enorme aos estudantes e ao pas em geral. O mnimo que se pode esperar um estudo avaliativo das experincias acontecidas e que esto acontecendo, para subsidiar os diversos sistemas de ensino. Recentemente, uma pesquisa do Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea) (22), rgo do governo federal, avaliou a poltica educacional de 49 pases e concluiu que as melhores notas e os resultados mais efeti-

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vos obtidos no ensino bsico foram observados exatamente nos [pases] que adotaram o regime de progresso continuada. A omisso do MEC em relao avaliao continuada pode ser entendida como uma poltica implcita que tem por base a manuteno da cultura da repetncia. Uma criana que persiste na repetncia fica completamente desmotivada e com baixa auto-estima, o que estimula nela e nos seus pais a vontade de procurar outros caminhos, abandonando a escola. Essa uma das causas da evaso. Entre 1997 e 1998, a experincia da progresso continuada foi adotada em quase um tero das escolas do Distrito Federal, por opo delas. No entanto, a partir de 1999, um novo governo interrompeu essa experincia, sem dar tempo suficiente para haver uma avaliao isenta. Basicamente, as mudanas que a escola candanga trouxe esto sintetizadas na comparao com a escola tradicional seriada aqui apresentada.Tabela comparativa entre a escola tradicional e a escola candanga Escola tradicional (seriada) Ensino versus aprendizagem Processo centrado no professor e na mera transmisso e aquisio de informaes Centrada apenas no aspecto cognitivo (provas e exames); objetiva classificar e medir o que foi aprendido; tem um fim em si: aprovao ou reprovao Escola candanga (organizada em fases de 3 anos) Todo aluno tem potencial para aprender e possibilidades de se realizar; centrada em situaes de trabalho coletivo Centrada no processo; considera todos os aspectos educativos: cognitivo, cultural, social, afetivo, motor, priorizando os aspectos qualitativos; tem funo diagnstica (todos sero avaliados: aluno, professor, escola etc.) Organizao em fases, que consideram os vrios ciclos do desenvolvimento humano: infncia (1a fase), pr-adolescncia (2a fase) e adolescncia (3a fase); sequncia flexvel, centrada na formao do educando Respeita o ritmo e as diferenas individuais; viso global de conhecimento; preocupao em formar cidados dentro do eixo tico-ecolgico, dando significado aos contedos

Avaliao

Currculo

Sequncia rgida das sries; todos devem aprender no mesmo ritmo/tempo; centrada na instruo/formao

Conhecimento

Fragmentado, seriado, descontextualizado; o livro a nica fonte

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Metodologia

Aula expositiva, repetio mecnica, deveres enfadonhos; centrada na transmisso de conhecimento e modelos

nfase em vivncias, situaes-problema, experincias, investigaes, pesquisas; considera o conhecimento que o aluno possui, privilegia a interdisciplinaridade e a pedagogia de projetos (centrada na construo coletiva do conhecimento) Conceito amplo de sala de aula: todos os espaos so educativos; lcus de formao respeita o aluno como ser em formao, crtico, reflexivo e cidado participativo Um coordenador pedaggico para at 7 turmas, sendo: 10h de coordenao para formao prpria, 15h de coordenao com seus pares, 15h de coordenao do laboratrio de aprendizagem Trabalho coletivo; um professor exclusivo para cada turma (5h com aluno e 3h em coordenao); 25h de direo; 15h de coordenao pedaggica Mediador e organizador do processo educativo; relao dialgica de cooperao e respeito Dialgica; cooperativa; participativa e interativa

Tempo-espao (escola)

Espao educacional restrito sala de aula

Recursos humanos (coordenador pedaggico)

Um coordenador para cada 20 turmas, sendo 20h de direo e 20h de coordenao pedaggica

Recursos humanos (direo)

Trabalho individual; um professor para 2 turmas (matutino e vespertino)

Relao professor-aluno Relao escola-comunidade

Unilateral: professor ensina, aluno aprende

Unilateral: participao apenas em eventos

Apesar de ter sido uma experincia muito curta, ela deixou impresses bastante positivas, conforme pesquisa realizada em 1999, por solicitao do novo governo, de posio radicalmente contrria utilizao das fases em lugar das sries convencionais. Alguns dados da pesquisa realizada pela Fundao Cesgranrio, encomendada pela Secretaria de Educao do Distrito Federal, no mbito da rede pblica, so aqui apresentados. 1. Na sua opinio, a escola que voc frequenta: a) favorece a aprendizagem, pois h um esforo coletivo para que todos aprendam?Respostas dos alunos:

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No (13,6% escola seriada e 9,9% escola candanga) Sim (80,2% escola seriada e 84,2% escola candanga) Sem informao (5,6% escola seriada e 6% escola candanga)

b) favorece a aprendizagem, pois a boa disciplina dos alunos permite que se preste ateno s aulas?Respostas dos alunos: No (39% escola seriada e 28% escola candanga) Sim (53% escola seriada e 67% escola candanga) Sem informao (8% escola seriada e 5% escola candanga)

c) dificulta a aprendizagem, pois o ambiente de violncia cria insegurana?Respostas dos alunos: No (58% escola seriada e 67% escola candanga) Sim (35% escola seriada e 28% escola candanga) Sem informao (7% escola seriada e 5% escola candanga)

2. Voc entende o que o(a) professor(a) ensina nas aulas de matemtica e portugus?Respostas dos alunos: Matemtica: sim (76% escola seriada e 82% escola candanga) Portugus: sim (74% escola seriada e 84% escola candanga)

A pesquisa abrangeu um universo de 40.241 alunos 31.498 da segunda fase e 12.426 da seriao (5a srie). Esses dados tornam-se extremamente significativos se analisados do ponto de vista histrico, haja vista que a implantao das turmas de 11 anos da 2a fase s ocorreu em 1998. Portanto, essa estrutura, considerada pela pesquisa como no seriada, contava com apenas um ano e meio de implantao. Em contrapartida, a estrutura seriada contava com pelo menos 39 anos, s no Distrito Federal. Esses dados esto apresentados em Mota e outros (23). Para finalizar o relato da experincia de Braslia sero apresentados alguns dados referentes ao sistema de ensino pblico, no incio e no final da administrao. Em 1994, o abandono no ensino fundamental foi de 7,4% e, em 1997, caiu para 6,8%. No ensino mdi