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ROMANCE DE AVALOR
PAGE 2POEMAS DA MEDIDA VELHA
BERNARDIM RIBEIRO
Romance de Avalor (Menina e Moa)Pola ribeira dum rio
que leva as goas ao mar,
vai o triste de Avalor;
no sabe se h-de tornar.
As goas levam seu bem,
ele leva o seu pesar.
S vai e sem companhia,
que os seus fora leixar;
que quem no leva descanso,
descansa em s caminhar.
Descontra onde ia a barca,
se ia o sol abaixar;
indo-se abaixando o sol,
escorecia-se o ar.
Tudo se fazia triste
quanto havia de ficar.
Da barca levantam remos
e, ao som do remar,
comearam os remeiros
do barco este cantar:
Que frias eram as goas!
Quem as haver de passar!
Dos outros barcos respondem:Quem as haver de passar,
seno quem a vontade ps
onde a no pode tirar.
Trs a barca o levam olhos
quanto o dia d lugar;
no durou muito, que o bem
no pode muito durar.
Vendo o sol posto contra ele,
soltou os olhos ao chorar,
soltou rdea a seu cavalo
deu beira do rio a andar.
E a noite era calada
pera mais o magoar,
ca o compasso dos remos
era o do seu sospirar.
Queres contar suas mgoas
seria areas contar.
Quanto mais se ia alongando,
se ia alongando o soar;
de seus ouvidos aos olhos
a tristeza foi igualar.
Assi como ia a cavalo
foi pela goa dentro entrar,
e dando um longo sospiro,
ouvira longe falar:
Onde me goas levam alma
vo tambm corpo levar.
Mas indo assi por acerto
foi cum barco ngoa dar
que estava amarrado terra
e seu dono era a folgar.
Salta assi como ia dentro
e foi a amarra cortar;
a corrente e a mar
acertaram-no ajudar.
No sabem mais que foi dele,
nem novas se podem achar.
Sospeitou-se que era morto,
mas no para afirmar,
que no no embarcou ventura
para isso o s aguardar.
Mas so as goas do mar
de quem se pode fiar.
Cantiga sua senhora Maria Quaresma (Cancioneiro Geral de Garcia de Resende)s esperam a Quaresma
pera se nela salvar,
eu perdi-me nela mesma
pera nunca me cobrar.
Mas com esta perda tal
eu mhei por mui bem guanhado,
porque o milhor de meu mal
estaa todo no cuidado.
Os que cuidam qua Quaresma
nam pera condenar,
se a virem ela mesma,
mal se poderam salvar.
BERNARDIM RIBEIROVilancete seu(Canc. Geral de Garcia de Resende)Antre mim mesmo e mim
nam sei que salevantou
que tam meu imigo sou.
s tempos com grandengano
vivi eu mesmo comigo,
agora no mor perigo
se me descobre o mor dano.
Caro custa desengano
e pois meste nam matou
quam caro que me custou.
De mim me sou feito alheo,
antro cuidado e cuidado
estaa mal derramado,
que por mal grande me veo.
Nova dor, novo receo
foi este que me tomou,
assi me tem, assi estou.
S DE MIRANDACantiga(Canc. Geral de Garcia de Resende)Comigo me desavim,
vejo-mem grande perigo:
no posso viver comigo,
nem posso fogir de mim.Antes queste mal tevesse
da outra gente fugia;agora j fugiriade mim, se de mim podesse.
Que cabo espero, ou que fim,
deste cuidado que sigo,
pois trago a mim comigo
tamanho imigo de mim?
CAMES
RimasMOTEDe que me serve fingir
de morte, dor e perigo,
se me eu levo comigo?VOLTASTenho-me persuadido,por rezo conveniente,
que no posso ser contente,
pois que pude ser nascido.
Anda sempre to unido
o meu tormento comigo,
que eu mesmo sou meu perigo.E, se de mi me livrasse,nenhum gosto me seria,
que, no sendo eu, no teria
mal que esse bem me tirasse.
Fora logo que assi passe:
ou com desgosto comigo,
ou sem gosto e sem perigo.
Mas porm a que cuidados
A dona Francisca de Arago, mandando-lhe esta regra, que lha glosasse.
MOTE
Mas porm a que cuidados.
GLOSA
Tanto maiores tormentos
Foram sempre os que sofri,
Daquilo que cabe em mim,
Que no sei que pensamentos
So os pera que naci.
Quando vejo este meu peito
a perigos arriscados
inclinado, bem sospeito
que a cuidados sou sojeito:
mas porm a que cuidados?OUTRA [VOLTA] AO MESMO
Que vindes em mim buscar,
cuidados, que sou cativo
e no tenho que vos dar?
Se vindes a me matar,
j h muito que no vivo;
se vindes, porque me dais
tormentos desesperados,
eu, que sempre sofri mais,
no digo que no venhais:
mas porm a qu, cuidados?OUTRA [VOLTA] AO MESMO
Se as penas que Amor me deu
vm por to suaves meos,
no h que temer receos,
que val um cuidado meupor mil descansos alheos.
Ter nuns olhos to fermosos
os sentidos enlevados,
bem sei quem baixos estados,
so cuidados perigosos.Mas porm, ah! que cuidados!Carta que Lus de Cames mandou
a Dona Francisca de Arago,
com as glosas acima:Senhora
Deixei-me enterrar no esquecimento de vossa merc, crendo me seria assi mais seguro; mas agora que servida de me tornar a ressuscitar, por mostrar seus poderes, lembro-lhe que a vida trabalhosa menos de agradecer que a morte descansada. Mas se esta vida, que agora de novo me d, for para ma tornar a tomar, servindo-se dela, no me fica mais que desejar que poder acertar com este mote de vossa merc, ao qual dei trs entendimentos, segundo as palavras dele puderam sofrer: se forem bons, o mote de vossa merc; se maus, so as glosas minhas.
JOO RODRIGUES DE CASTELO BRANCOCantiga sua, partindo-se(Canc. Geral de Garcia de Resende)Senhora, partem tam tristes
meus olhos por vs, meu bem,
que nunca tam tristes vistes
outros nenhs por ningum.
Tam tristes, tam saudosos,
tam doentes da partida,
tam cansados, tam chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tam triste os tristes,
tam fora desperar bem
que nunca tam tristes vistes
outros nenhs por ningum.