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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO ACR Nº 11935 PE (0012994-93.2012.4.05.8300) APTE : GIL TEOBALDO DE AZEVEDO ADV/PROC : RODRIGO JOSÉ DA COSTA SILVA APDO : FRANCISCO RODRIGUES DOS SANTOS SOBRINHO ADV/PROC : LÍTIO TADEU COSTA RODRIGUES DOS SANTOS E .....................................OUTROS ORIGEM : JUÍZO FEDERAL DA 13ª VARA PE RELATOR : DES. FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIRO (CONVOCADO) EMENTA PENAL. CRIME CONTRA A HONRA. CALÚNIA. ATRIBUIÇÃO DE FATOS CONFIGURADOS COMO CRIME A PROCURADOR DA REPÚBLICA NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO PÚBLICA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. EXISTÊNCIA DE AÇÕES PENAIS EM CURSO. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. IMPOSSIBILIDADE. MULTA APLICADA. MANUTENÇÃO. 1. Ação penal privada promovida por Procurador Regional da República contra Advogado (queixa-crime), tendo o réu sido condenado à pena de 1 ano, 10 meses e 20 dias de detenção (pena-base de 1 ano e 9 meses com redução de 4 meses - art. 65, I e III, d, do CP - e aumento de 1/3 - art. 141, IV, do CP), em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos, e multa (60 salários mínimos), por ter imputado falsamente ao ofendido fato definido como crime (art. 138 do Código Penal). 2. Não há de se falar em deserção da queixa-crime, diante do comprovante de pagamento das custas processuais, ocorrido antes de o Juízo Estadual declinar de sua competência em favor da Justiça Federal. 3. A cautela recomenda que o artigo 806 do CPP não seja aplicado ao querelado, uma vez beneficiário da regra constitucional da ampla defesa. Pedido de não conhecimento do recurso por falta de preparo que se rejeita. 4. Afastado o argumento do apelante de que o Juízo de origem não poderia, para embasar a condenação, valer-se de fatos expostos em documentos não relatados na queixa-crime (documentos estes em que o advogado sugere que o querelante estaria envolvido na prática de crime de apropriação indébita e em irregularidade na aquisição de prédio da Procuradoria Regional da República), considerando que tais peças faziam parte da Representação ofertada no CNMP. 5. Oferecida a queixa-crime dentro do prazo legal de 6 meses (art. 38 do CPP), não há de se falar em decadência.

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PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO

ACR Nº 11935 – PE (0012994-93.2012.4.05.8300)APTE : GIL TEOBALDO DE AZEVEDOADV/PROC : RODRIGO JOSÉ DA COSTA SILVAAPDO : FRANCISCO RODRIGUES DOS SANTOS SOBRINHOADV/PROC : LÍTIO TADEU COSTA RODRIGUES DOS SANTOS E.....................................OUTROSORIGEM : JUÍZO FEDERAL DA 13ª VARA – PERELATOR : DES. FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIRO(CONVOCADO)

EMENTA

PENAL. CRIME CONTRA A HONRA. CALÚNIA.ATRIBUIÇÃO DE FATOS CONFIGURADOS COMO CRIMEA PROCURADOR DA REPÚBLICA NO EXERCÍCIO DAFUNÇÃO PÚBLICA. AUTORIA E MATERIALIDADECOMPROVADAS. EXISTÊNCIA DE AÇÕES PENAIS EMCURSO. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE.IMPOSSIBILIDADE. MULTA APLICADA. MANUTENÇÃO.1. Ação penal privada promovida por Procurador Regional daRepública contra Advogado (queixa-crime), tendo o réu sidocondenado à pena de 1 ano, 10 meses e 20 dias de detenção(pena-base de 1 ano e 9 meses com redução de 4 meses - art. 65,I e III, “d”, do CP - e aumento de 1/3 - art. 141, IV, do CP), emregime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos,e multa (60 salários mínimos), por ter imputado falsamente aoofendido fato definido como crime (art. 138 do Código Penal).2. Não há de se falar em deserção da queixa-crime, diante docomprovante de pagamento das custas processuais, ocorridoantes de o Juízo Estadual declinar de sua competência em favorda Justiça Federal.3. A cautela recomenda que o artigo 806 do CPP não sejaaplicado ao querelado, uma vez beneficiário da regraconstitucional da ampla defesa. Pedido de não conhecimento dorecurso por falta de preparo que se rejeita.4. Afastado o argumento do apelante de que o Juízo de origemnão poderia, para embasar a condenação, valer-se de fatosexpostos em documentos não relatados na queixa-crime(documentos estes em que o advogado sugere que o querelanteestaria envolvido na prática de crime de apropriação indébita eem irregularidade na aquisição de prédio da ProcuradoriaRegional da República), considerando que tais peças faziamparte da Representação ofertada no CNMP.5. Oferecida a queixa-crime dentro do prazo legal de 6 meses(art. 38 do CPP), não há de se falar em decadência.

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6. O eg. STJ tem precedentes no sentido de que o defeito derepresentação na queixa-crime, à míngua do preenchimento dosrequisitos do art. 44 do CPP, pode ser sanado até mesmo após odecurso do prazo decadencial.7. Inocorrência da prescrição, tendo em vista a pena in concreto(1 ano, 10 meses e 20 dias), porquanto o lapso temporalobservado entre o recebimento da queixa-crime (10/10/12) e asentença (03/09/14) não excede o prazo legal (que, reduzido demetade por conta do disposto no art. 115 do CP, passou de 4anos para dois anos).8. O querelado, ao ofertar Representação perante o ConselhoNacional do MPF, asseverou que o querelante seria o autor decrimes contra o erário e teria quebrado o “decoro da função” e“a improbidade funcional”, sustentando, de forma gratuita ereprovável, que ele estaria envolvido em irregularidade naaquisição de prédio da Procuradoria Regional da República e nocometimento do ilícito de apropriação indébita.9. Inexistência de qualquer elemento apto a comprovar asacusações, o que caracteriza a conduta criminosa, fazendo incidirna espécie o delito tipificado no art. 138 do Código Penal. Dignode nota o fato de que, ao ser interrogado, o querelado reiterouexpressamente todas as afirmações caluniosas, esclarecendo,porém, naquela oportunidade, que não possuía nenhumdocumento para demonstrar tais alegações.10. Comprovada a materialidade e a autoria delitiva, em face doconjunto probatório dos autos, há de se manter a condenação doréu pela prática do crime de calúnia.11. Em atenção às regras dispostas no art. 59 do Código Penal,nortes do juiz na individualização da pena, impõe-se amanutenção da pena-base fixada na sentença acima do mínimolegal, merecendo valoração negativa, como bem asseverou oJuízo de origem, os seguintes fatos: a) advogado com váriosanos de carreira, o qual utilizou seus conhecimentos técnicospara cometer o crime sem nenhuma provocação do querelante;b) repetição das ofensas no interrogatório, referindo-se,inclusive, a outras pessoas de maneira pejorativa; c) calúnia quefoi encaminhada ao CNMP, com a intenção de prejudicarprofissionalmente o querelante.12. Inquéritos policiais ou ações penais em curso ou, ainda,condenações não transitadas em julgado não podem serconsiderados como maus antecedentes, má conduta social oupersonalidade voltada ao crime, sob pena de lesão ao princípioconstitucional da presunção de não-culpabilidade (v. Súmula nº444 do STJ).

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13. Diminuição da pena-base de 1 ano e 9 meses para 1 ano e 7meses, de modo que, uma vez consideradas as atenuantes (art.65, I e III, “d”, do CP) e a causa de aumento (art. 141, IV, doCP), a sanção definitiva há de ser fixada em 1 ano e 8 meses,sendo digno de registro o fato de que, com a diminuição, não hámudança no critério de contagem do prazo prescricional.14. A despeito da redução da pena-base, deve ser mantida amulta imposta na sentença (60 salários mínimos), prestigiando-seo critério de fixação que tem como norte a situação econômicado réu, inclusive declarada por ele em audiência.15. Pleito do querelado de modificação da pena restritiva dedireitos estabelecida na sentença que não merece acolhimento(prestação de serviço a entidade pública à razão de uma hora pordia de condenação), à míngua de comprovação das limitaçõesfísicas por ele alegadas para o seu cumprimento.16. Apelação parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que figuram comopartes as acima identificadas,

DECIDE a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ªRegião, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do Relatório,do Voto do Relator e das Notas Taquigráficas constantes dos autos, que passam aintegrar o presente julgado.

Recife, 29 de janeiro de 2015 (data de julgamento).

PAULO MACHADO CORDEIRO Relator Convocado

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ACR Nº 11935 – PE

RELATÓRIO

DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADOCORDEIRO (CONVOCADO):

Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgouparcialmente procedente a queixa-crime formulada por FRANCISCO RODRIGUESDOS SANTOS SOBRINHO (Procurador Regional da República), para condenar GILTEOBALDO DE AZEVEDO (Advogado) à pena 1 ano, 10 meses e 20 dias de detenção(pena-base de 1 ano e 9 meses com redução de 4 meses - art. 65, I e III, “d”, do CP - eaumento de 1/3 - art. 141, IV, do CP), em regime inicial aberto, substituída por duasrestritivas de direitos (prestação de serviço a entidade pública à razão de uma hora pordia de condenação e prestação pecuniária de R$ 500,00 mensais), e multa (60 saláriosmínimos), por ter imputado falsamente ao ofendido fato definido como crime (art. 138do Código Penal).

O apelante sustenta, em síntese, que:

a) diante da ausência do recolhimento das custas devidas àJustiça Federal, há de ser reconhecida a deserção da presente ação penal;

b) quando da condenação, o Juízo a quo não poderia apreciar ocontido nas petições de fls. 29/34 e 56/61, pois não abrangidas pelas procurações nempela queixa-crime;

c) a peça de fls. 29/34 não deve ser considerada para acondenação, por ser apócrifa;

d) houve violação ao disposto no art. 44 do CPP, uma vez nãopreenchidos os requisitos ali estabelecidos, respeitantes à outorga de poderes especiais eindicação do fato delituoso na procuração;

e) ocorreu a decadência do direito de queixa;

f) deve ser decretada a prescrição, tendo em vista a data dosfatos;

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g) as afirmações feitas são verídicas, não havendo calúnia a serpunida;

h) como as suas declarações configuram em tese os crimes deinjúria e difamação (e não o delito de calúnia), está acobertado pela imunidade judiciária.

Por fim, pugna, caso mantida a condenação: a) pela redução dapena-base, asseverando que não possui maus antecedentes, e da multa aplicada; b) pelamodificação das penas restritivas de direitos, não tendo o Juízo de origem considerado aslimitações decorrentes da sua idade avançada.

Contrarrazões, pugnando pelo não conhecimento do recurso.

Manifestação do Parquet, em que opina pelo não provimento daapelação, ratificando o parecer de fls. 268/272.

Dispensada a revisão, tendo em vista o disposto no art. 29, IV,do Regimento Interno desta Corte.

É o relatório.

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1 Art. 806. Salvo o caso do art. 32, nas ações intentadas mediante queixa, nenhum ato ou diligência se realizará, sem que seja depositada em cartório a importância das custas.

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ACR Nº 11935 – PE

VOTO

DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADOCORDEIRO (CONVOCADO):

Pretende o apelante a reforma da sentença que julgouparcialmente procedente a queixa-crime formulada por FRANCISCO RODRIGUESDOS SANTOS SOBRINHO (Procurador Regional da República à época dos fatos),para condená-lo à pena 1 ano, 10 meses e 20 dias de detenção (pena-base de 1 ano e 9meses com redução de 4 meses - art. 65, I e III, “d”, do CP - e aumento de 1/3 - art.141, IV, do CP), em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos(prestação de serviço a entidade pública à razão de uma hora por dia de condenação eprestação pecuniária de R$ 500,00 mensais), e multa (60 salários mínimos), por terimputado falsamente ao ofendido fato definido como crime (art. 138 do Código Penal).

Inicialmente, não há de se falar em deserção da queixa-crime,diante do comprovante de pagamento das custas processuais, ocorrido antes de o JuízoEstadual declinar de sua competência em favor da Justiça Federal (v. fl. 12).

Quanto ao pedido de não conhecimento do apelo por falta depreparo formulado nas contrarrazões, tenho que não merece amparo. A esse respeito,Guilherme de Souza Nucci, comentando o art. 806 do CPP1, pontua que “háentendimentos de que o disposto neste artigo somente poderia ser aplicado aoquerelante, pois o querelado seria beneficiário da regra constitucional da ampla defesa”,nada lhe podendo “obstar a realização de diligência para provar sua inocência ou mesmopara garantir o seu direito ao recurso” (in Código de Processo Penal Comentado, 11ªedição, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 2012, p. 1190).

Por outro lado, é de se rejeitar o argumento de que o Juízo deorigem não poderia, para embasar a condenação, valer-se do contido nas petições de fls.29/34 (contestação da ação de reintegração de posse ajuizada por LUCENA S/AINDÚSTRIAS METALÚRGICAS E JJ PATICIPAÇÕES E PROJETOS LTDA) e56/61 (ação popular promovida por Gil Teobaldo, em que sustenta a ocorrência de“negociata” havida para aquisição de prédio da Procuradoria Regional da República),uma vez não abrangidas pelas procurações nem pela queixa-crime. Na inicial e na

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2 Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas no juízo criminal.

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procuração de fl. 287, o querelante faz alusão aos ataques à sua pessoa pelo advogadoGil Teobaldo por meio de Representação perante o Conselho Nacional do MinistérioPúblico. Pois bem. Pela leitura da Representação, vê-se que ali foram anexadosdocumentos, dentre os quais se incluem as peças de fls. 29/34 e 56/61 (v. fl. 23).

Registre-se que não merece relevo o fato de a peça de fls. 29/34não estar assinada, uma vez que, em seu interrogatório, o próprio querelado reiterou asafirmações ali contidas, suprindo a falta.

Melhor sorte não assiste ao apelante quanto à alegação dedecadência. Explico.

Sobre o tema, assim dispõe o art. 38 do CPP:

Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representantelegal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercerdentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é oautor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo parao oferecimento da denúncia. (grifei)

In casu, o querelante tomou, através do Ofício nº 914/2011CGMPF, ciência da Representação ofertada contra ele pelo Advogado Gil Teobaldo em13/07/11, consoante se verifica à fl. 18. Considerando que a queixa-crime foi ajuizadaem 09/01/12, não está caracterizada a decadência.

A alegação de violação ao disposto no art. 44 do CPP2 tambémdeve ser rechaçada, pois, ao ser dada oportunidade para regularização da procuração, oquerelante sanou o vício trazendo novo instrumento de mandato (v. fl. 287).

Impende realçar que o eg. STJ tem precedentes no sentido deque o defeito de representação na queixa-crime pode ser sanado até mesmo após odecurso do prazo decadencial.

A propósito, observem-se os julgados a seguir:

CRIMINAL. RHC. INTEMPESTIVIDADE. EXAME DAPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE WRIT DE OFÍCIO. ESTUPRO.ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. TRANCAMENTO DA AÇÃOPENAL. NULIDADES. PROCURAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE OUTORGADE PODERES ESPECIAIS. AUSÊNCIA DE MENÇÃO AO FATO

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DELITUOSO. VÍCIOS SANÁVEIS A QUALQUER TEMPO. QUEIXA-CRIME. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. ALEGAÇÃO DEFALSIDADE DE DOCUMENTO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.RECURSO NÃO CONHECIDO.I. O recurso ordinário em habeas corpus interposto após o quinquídio legalprevisto pelo art. 30 da Lei n.º 8.038/90, é intempestivo, porém, emhomenagem ao princípio da ampla defesa e precedentes desta Corte,examina-se a possibilidade de concessão de writ de ofício.II. Hipótese em que foi apresentada queixa-crime contra o paciente pelasuposta prática dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor.III. A falta de menção do fato delituoso na procuração, bem como do nomedos querelados, configura defeito sanável a qualquer tempo, pois nãointerfere na legitimatio ad causam. Precedentes.IV. Não procede a alegação de decadência do direito de queixa, pois, comojá ressaltado, o vício do instrumento procuratório pode ser sanado a qualquertempo, sendo independente do prazo decadencial determinado pela leiprocessual para a propositura da queixa-crime.V. A alegação de ausência de justa causa para o prosseguimento do feito sópode ser reconhecida quando, sem a necessidade de exame aprofundado evalorativo dos fatos, indícios e provas, restar inequivocamente demonstrada,pela impetração, a atipicidade flagrante do fato, a ausência de indícios afundamentarem a acusação, ou, ainda, a extinção da punibilidade –hipóteses não verificadas in casu.VI. A questão relativa à falsidade do documento de procuração apresentadopelo querelante não foi apreciada em 2º grau de jurisdição.VII. A análise do tema por esta Corte ocasionaria indevida supressão deinstância.VIII. Não sendo caso de concessão de habeas corpus de ofício, não seconhece do recurso ordinário.IX. Recurso não-conhecido. (STJ, 5ª T., RHC 16221, rel. Min. Gilson Dipp,DJ 06/09/04) (grifei)

AÇÃO PENAL PRIVADA. QUEIXA-CRIME. PROCURAÇÃO.REQUISITOS DO ART. 44 DO CPP. VÍCIO SANÁVEL A QUALQUERTEMPO. CRIME DE INJÚRIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.PRESCRIÇÃO. 1. É despiciendo, para fins de oferecimento da queixa-crime, a descriçãominuciosa do fato criminoso e de suas circunstâncias, bastando parasatisfazer as exigências do art. 44 do Código de Processo Penal a indicaçãodo artigo de lei em que se encontra capitulada a conduta do agente.2. Omissões ou irregularidades da procuração outorgada pelo querelante,com exceção daquelas que se refiram à legitimatio ad causam, podem sersanadas a qualquer tempo, consoante dispõe o art. 569 do Código deProcesso Penal. Precedentes do STJ e do STF.3. Quanto ao crime de injúria, vislumbra-se a ocorrência da extinção dapunibilidade pela prescrição da pena in abstrato, por já haver transcorrido olapso prescricional de dois anos, contado da última causa interruptiva, qualseja, a data do recebimento da queixa-crime.4. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido apenas paradeclarar a extinção da punibilidade estatal pela prescrição relativamente aocrime tipificado no art. 140, nos termos do art. 109, inciso VI, ambos do

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Código Penal. (STJ, 5ª T., REsp 299284, rel. Min. Laurita Vaz, DJ17/11/03) (grifei)

Noutro turno, não há de se falar em prescrição. Com efeito,tendo em vista a pena in concreto (1 ano, 10 meses e 20 dias), o lapso temporalobservado entre o recebimento da queixa-crime (10/10/12 – v. fls. 148/151) e a sentença(03/09/14 – v. fls. 298/306) não excede o prazo legal (que, reduzido de metade nostermos do art. 115 do CP, passou de 4 anos para dois anos), de acordo com o dispostonos arts. 109, V, 110, § 1º, e 115, todos do CP, os quais ostentam o seguinte teor:

Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvoo disposto no § 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da penaprivativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendosuperior, não excede a dois;(...)

Art. 110. A prescrição depois de transitar em julgado a sentençacondenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados noartigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado éreincidente.§ 1º. A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgadopara a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela penaaplicada.

Art. 115. São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando ocriminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, nadata da sentença, maior de 70 (setenta) anos.

Tecidas essas considerações, observo que o réu, ao ofertarRepresentação perante o Conselho Nacional do MPF, asseverou que o querelante seria oautor de crimes contra o erário e teria quebrado o “decoro da função” e “a improbidadefuncional”, sustentando, de forma gratuita e reprovável, que ele estaria envolvido emirregularidade na aquisição de prédio da Procuradoria Regional da República e nocometimento do ilícito de apropriação indébita.

Notem-se, a exemplo, excertos da Representação e dedocumentos a ela anexados, os quais revelam as acusações do Advogado Gil Teobaldocontra o querelante:

GIL TEOBALDO DE AZEVEDO (...) vem (...) promover, como promovidofica, REPRESENTAÇÃO contra o Procurador Regional da República,FRANCISCO RODRIGUES DOS SANTOS SOBRINHO (...), tudo comfundamento na prova documental em anexo, constante de um MemorialDescritivo (...), Protesto contra uma ação que lhe promove a empresa JJPARTICIPAÇÕES E PROJETOS LTDA e mais a cópia de uma AçãoPopular promovida pelo Representante contra FRANCISCO RODRIGUES

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3 Calúnia�Art. 138. Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:�Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.�§ 1º. Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.�§ 2º. É punível a calúnia contra os mortos.�

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DOS SANTOS SOBRINHO (...), em razão de “NEGOCIATA” havida paraaquisição do atual prédio da Procuradoria Regional da República (...).

(...) em termos de ética, de moral, a denunciação caluniosa não pode seradmitida naqueles que são autores de crimes contra o erário, contra oMinistério Público, quer Federal, quer Estadual, quer contra a Justiça, comovêm fazendo os representados.

(...) a presente Representação que se oferece a V. Exa, nobre Procurador ePresidente do Conselho Nacional do Ministério Público, prova existir aquebra do decoro da função que exercem os representados, a improbidadefuncional dos representados, eles que são fiscais da Lei, quando as atuaçõesdos representados dão causa à instauração do procedimento criminal paraque a sociedade, mesmo neste mar de lama, onde se encontra atolada apátria brasileira, veja que ainda há os que pugnam pela moralidade pública.

(...) os representados que são os agentes criminosos, sabem, têm consciênciaprópria, em razão dos seus cargos, que seus procedimentos são,efetivamente, um crime definido, de omissão pela conveniência, ou até pelaconivência, que são os elementos constitutivos, que mais se agravam para aconstituição do crime, no fato de serem praticados, em procedimento doloso,contra a seriedade do cargo, além do compromisso assumido de zelo peloerário e pela sociedade, quando suas práticas vêm causando graves prejuízosao erário e à moral dos homens. (...) (v. fls. 22/26 e 29/34)

É importante registrar que, conforma se infere da fl. 31 dosautos, o querelado afirma que EULER FRADIQUE teria se apropriado indevidamenteda quantia de R$ 580.000,00, com a cobertura que passou a ter do querelante.

Em que pesem as afirmações do querelado, inexiste nos autosqualquer elemento apto a comprovar as suas acusações, o que caracteriza a condutacriminosa, fazendo incidir na espécie o delito tipificado no art. 138 do Código Penal3.

Sobreleva consignar que, ao ser interrogado, o quereladoreiterou expressamente todas as afirmações caluniosas. Na oportunidade, esclareceu quenão possuía nenhum documento para comprovar tais alegações (v. fls. 201/202 e 302).

Desse modo, comprovada a materialidade e a autoria, tendo emvista o conjunto probatório constante dos autos, há de se manter a condenação do réupela prática do crime de calúnia.

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PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO

Em atenção às regras dispostas no art. 59 do Código Penal,nortes do juiz na individualização da pena, impõe-se a manutenção da pena-base fixadana sentença acima do mínimo legal, merecendo valoração negativa, como bem asseverouo Juízo de origem, os seguintes fatos: a) advogado com vários anos de carreira, o qualutilizou seus conhecimentos técnicos para cometer o crime sem nenhuma provocação doquerelante; b) repetição das ofensas no interrogatório, referindo-se, inclusive, a outraspessoas de maneira pejorativa; c) calúnia que foi encaminhada ao CNMP, com a intençãode prejudicar profissionalmente o querelante. (v. fl. 304)

Entretanto, inquéritos policiais, ações penais em curso oucondenações não transitadas em julgado não podem ser considerados como mausantecedentes, má conduta social ou personalidade voltada ao crime, sob pena de lesão aoprincípio constitucional da presunção de não-culpabilidade. Tendo o Juiz consideradopara aferição da pena-base os documentos de fls. 207/213, merece retoque a sentençanesse ponto (v. fl. 304).

Vale conferir:

PENAL. CRIME DE ROUBO QUALIFICADO (ARTIGO 157, § 2º, I E II,CÓDIGO PENAL). PARTICIPAÇÃO. COMPROVAÇÃO INSUFICIENTE.PRINCÍPIO "IN DUBIO PRO REO". DOSIMETRIA. ANTECEDENTESCRIMINAIS. NÃO CONFIGURAÇÃO. MANUTENÇÃO DAS PENASFIXADAS. "REFORMATIO IN PEJUS".1. Não tendo ficado demonstrado nos autos, com a segurança necessária, aparticipação do acusado LEANDRO VENTURA no crime objeto dadenúncia, não há como lhe impor condenação pela conduta delitiva que lhe éimputada, em face do princípio in dubio pro reo.2. Inquéritos policiais ou ações penais em andamento ou sem certificação dotrânsito em julgado, ou mesmo condenações ainda não transitadas emjulgado, não podem ser considerados como maus antecedentes, má condutasocial ou personalidade desajustada, sob pena de malferir o princípioconstitucional da presunção de não-culpabilidade. Precedentes STF e STJ.3. Em que pese o MM. Juízo a quo ter reduzido abaixo do mínimo legal,pelo reconhecimento das atenuantes do art. 65, I e III, 'd', do Código Penal,em desacordo com a Súmula nº 231 do Superior Tribunal de Justiça, amesma não pode ser majorada nesta instância, em prejuízo do réu, emvirtude da ausência de recurso específico da acusação.4. Recurso do Ministério Público Federal não provido. Recurso de apelaçãode ALAN BISPO ANDRE provido para reduzir-lhe as penas-bases aomínimo legal, sem alterar o quantum das penas, em face do princípio da nonreformatio in pejus. (TRF-1ª R., 4ª T., ACR 200638000281475, Juiz FederalKlaus Kuschel (Convocado), DJ 16/09/10) (grifei)

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Page 12: PODER JUDICIÁRIO - trf5.jus.br · Oferecida a queixa-crime dentro do prazo legal de 6 meses (art. 38 do CPP), não há de se falar em decadência. laf23 ACR 11935 – PE PODER JUDICIÁRIO

laf23 ACR 11935 – PE

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Nesse sentido, é a Súmula nº 444, do STJ, segundo a qual “Évedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”.

Assim, ao observar as regras dispostas no art. 59, do CódigoPenal, verifico que a pena-base deve ser reduzida de 1 ano e 9 meses para 1 ano e 7meses, de modo que, uma vez consideradas as atenuantes (art. 65, I e III, “d”, do CP) ea causa de aumento (art. 141, IV, do CP), a sanção definitiva há de se fixar em 1 ano e 8meses, sendo digno de registro o fato de que, com a diminuição, não há mudança nocritério analisado neste voto de contagem do prazo prescricional.

A despeito da redução da pena-base, deve ser mantida a multaimposta na sentença (60 salários mínimos), prestigiando-se o critério de fixação que temcomo norte a situação econômica do réu, inclusive declarada por ele em audiência.

Por fim, não merece amparo o pedido do querelado demodificação da pena restritiva de direitos estabelecida na sentença (prestação de serviçoa entidade pública à razão de uma hora por dia de condenação), à míngua decomprovação das limitações físicas por ele alegadas para o seu cumprimento.

Posto isso, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO,apenas para fixar a pena privativa de liberdade em 1 ano e 8 meses de detenção,mantendo-se os demais termos da sentença.

É como voto.

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