poder de policia proporcionalidade e abuso de poder

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Poder de Policia Proporcionalidade e Abuso de Poder

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  • UNIVERSIDADE CATLICA DE GOISDepartamento de cincias jurdicas

    ALUNA: GERMANA DA SILVA LEALORIENTADOR: ARI FERREIRA DE QUEIROZ

    PODER DE POLCIA: PROPORCIONALIDADE E ABUSO DE PODER

    GOINIA2007

    1

    Monografia apresentada Banca Examinadora da Universidade Catlica de Gois, como exigncia parcial para obteno do ttulo de Bacharel em Direito, sob a orientao do professor Ari Ferreira de Queiroz.

  • Banca examinadora

    __________________________

    __________________________

    __________________________

    2

  • Dedicatria

    Aos meus amados e abenoados pais, Ao meu orientador Ari Ferreira de Queiroz.

    3

  • Agradecimentos

    A Deus pela infinita misericrdia e ajuda sempre presente nas madrugadas de estudo;

    Aos meus pais pelo apoio e incentivo constantes; Ao meu orientador Professor Ari Ferreira de

    Queiroz pelo direcionamento e competncia com a qual me conduziu neste trabalho;

    A todas as pessoas que de alguma forma participaram de minha caminhada dando fora e estmulo.

    4

  • Resumo: Como estrutura maior de representao do poder pblico atravs dos trs nveis de Poder, o Estado tem o dever de propiciar sociedade como um todo uma situao em que seja possvel vivenciar o que apregoa o texto legal quanto ao que se refere a uma convivncia coletiva harmnica - um estado de segurana pblica real e presente. Para isso este ente se utiliza, atravs de seus representantes, do poder de polcia. Visto aqui como um poder inerente Administrao pblica, se difunde de forma abrangente por todas as vertentes administrativas e em uma atitude de supresso da vontade individual, quando esta tende a dissuadir-se do bem-estar coletivo, age de maneira coercitiva e discricionria para restabelecer qualquer situao de desvirtuamento da ordem. mais um instrumento limitador, mas tambm limitado, que o poder pblico tem ao seu dispor para imprimir realidade concreta, o desejo maior de uma nao soberana e democrtica, qual seja, um Estado democrtico de direito. Isto , o do bem comum.

    Palavras-chaves: Estado. Sociedade. Poder de polcia. Segurana. Administrao. Bem comum.

    5

  • SUMRIO

    INTRODUO...............................................................................................1

    CAPTULO IORIGEM DO PODER DE POLCIA

    1. ASPECTOS HISTRICOS.......................................................................3

    2. QUESTES CONCEITUAIS....................................................................6

    3. A IGREJA E O PODER DE POLCIA........................................................10

    4. A EXPRESSO PODER DE POLCIA.......................................................14

    5. ATOS DE EXPRESSO DO PODER DE POLCIA.........................................16

    CAPTULO II

    ORDEM PBLICA, SEGURANA PBLICA E PODER DE POLCIA

    1. QUESTES CONCEITUAIS..................................................................19

    2. ADMINISTRAO PBLICA, POLCIA E PODER DE POLCIA.....................22

    3. PODER DE POLCIA E SEGURANA NACIONAL.......................................29

    6

  • 4. POLCIA JUDICIRIA E POLCIA ADMINISTRATIVA................................33

    5. PRESERVAO DA ORDEM PBLICA E APURAO DE DELITOS...............36

    CAPTULO III

    O PODER DE POLCIA NO ESTADO DEMOCRTICO DE DIREITO

    1. CARACTERSTICAS OU ATRIBUTOS DO PODER DE POLCIA....................40

    1.1 NOES....................................................................................40

    1.2 A DISCRICIONARIEDADE DO PODER DE POLCIA............................41

    1.3 A AUTO-EXECUTORIEDADE DO PODER DE POLCIA.........................43

    1.4 A COERCIBILIDADE DO PODER DE POLCIA...................................46

    1.5 O PODER DE POLCIA COMO UMA ATIVIDADE NEGATIVA.................47

    2. ATUAO E MBITO DE INCIDNCIA DO PODER DE POLCIA..................48

    3. A HEGEMONIA DA FACE PREVENTIVA SOBRE A FACE REPRESSIVA..........51

    4. O PODER DE POLCIA E A GARANTIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS......53

    5. FUNDAMENTO E FINALIDADE DO PODER DE POLCIA.............................56

    CAPTULO IV

    LIMITAES AO EXERCCIO E ABUSO DO PODER DE POLCIA

    1. PRINCPIO DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.......................60

    2. CONSIDERAES ACERCA DA SEGURANA E INSEGURANA PBLICA EM MEIO AO COLAPSO DO SISTEMA CRIMINAL BRASILEIRO.......................65

    2.1 ASPECTOS RELATIVOS SEGURANA PBLICA...............................66

    2.2 O SISTEMA CRIMINAL E A REALIDADE DA POLCIA..........................72

    3. POLCIAS MILITAR E CIVIL NO EXERCCIO DO PODER DE POLCIA..........76

    3.1 ASPECTOS HISTRICOS SOBRE A POLCIA MILITAR........................76

    3.2 CONCEITO E CARACTERSTICAS DA POLCIA MILITAR......................77

    3.3 ABUSO DE PODER NO MBITO DA POLCIA MILITAR........................79

    3.4 CONCEITO E ATUAO DA POLCIA CIVIL.......................................80

    7

  • 3.5 ABUSO DE PODER NO MBITO DA POLCIA CIVIL............................82

    4. LIMITES DO PODER DE POLCIA..........................................................85

    5. EXTENSO EXCEPCIONAL DO PODER DE POLCIA.................................86

    6. CONCLUSO.....................................................................................88

    BIBLIOGRAFIA.........................................................................92

    8

  • INTRODUO

    O Estado, responsvel pela preservao e manuteno da ordem e segurana dos cidados em sociedade, busca atravs de seus agentes a concreo de meios sancionadores e coercitivos capazes de restringir condutas particulares que venham a afetar negativamente a coletividade ou o prprio Estado.

    Esta atividade do ente estatal fundamenta-se legalmente tanto na Constituio Federal quanto em normas de ordem pblica e busca precipuamente garantir a proteo ao interesse pblico no seu sentido mais amplo abrangendo valores de ordem material, moral e espiritual do povo.

    A prpria Constituio Federal ao outorgar aos indivduos uma vasta gama de direitos, assegurando-os por meio de diversos dispositivos, deixa claro alm da plena liberdade de exerccio conferida aos cidados, a necessidade de imposio de limites.

    No sendo, portanto, incondicionados os direitos conferidos pela Lei aos indivduos, faz-se necessria a observncia por parte do Estado democrtico de direito garantir o gozo dos mesmos por parte dos cidados de maneira que o interesse coletivo se ache tutelado em face de abusos que venham a feri-lo.

    Com esse intuito, que o Estado atravs de seus Poderes estabelece um mecanismo de frenagem da conduta individual. Inicialmente, tal atividade acha-se cumprida pelo Poder Legislativo, a quem incumbe a formulao de leis que estabeleam condies e limites de exerccio fruio de direitos individuais e coletivos.

    No entanto, como no bastam tais providncias, preciso que a Administrao Pblica de maneira efetiva aja nos casos concretos, intervindo em situaes que destoem do que regulamenta a Lei e, assim, faam-na cumprir.

    Agindo dessa forma, o Estado atravs de seus agentes, estar utilizando dos poderes administrativos, instrumento de trabalho do administrador pblico, especificamente do poder de polcia, evidenciado atravs da preveno e represso da conduta negativa e anti-social, preservando o interesse geral da comunidade em face do abuso do direito individual.

    , portanto, o poder de polcia, faculdade discricionria da Administrao Pblica para condicionar e restringir o uso e gozo de bens e direitos individuais, em benefcio da sociedade ou do prprio Estado.

    9

  • Tendo ento como objeto, todo bem, direito ou atividade pessoal que possa afetar a coletividade ou pr em risco a segurana desta. Ao condicionar direitos e o uso de bens individuais delimita a execuo das atividades por meio de fiscalizao e controle.

    Atualmente, o tema relativo ao poder de polcia largamente discutido principalmente quanto medida de sua aplicabilidade. At que ponto e de que maneira dever atuar o Estado por meio do poder de polcia sem ferir a garantia conferida pela Constituio Federal s liberdades pessoais?

    Como resposta a tal indagao, faz-se necessrio observar dentre outros aspectos, a proporcionalidade imputada ao ente estatal na execuo das medidas coercitivas e, a fuga deste princpio, o que resultar em abuso de poder por parte do Estado.

    Estes e outros pontos sero levantados neste trabalho no af de expor o presente tema de maneira clara e explicativa com o objetivo de situar o poder de polcia na esfera que prope a Lei Maior.

    10

  • CAPTULO I: ORIGEM DO PODER DE POLCIA

    1. ASPECTOS HISTRICOS

    Para se entender o significado do termo poder de polcia, faz-se necessrio

    primeiramente situ-lo historicamente ao longo do tempo, inicialmente, na

    Antigidade e Idade Mdia, em seguida dentro do que se denominou estado de

    polcia e, por fim, dentro do estado de direito compreendido neste o estado liberal,

    o social e o democrtico.

    A palavra portuguesa polcia, representada nas vrias lnguas romnicas e

    anglo-germnicas, origina-se do grego politeia atravs da forma latina politia.

    Ligada etimologicamente ao vocbulo poltica, pois ambas vm do grego plis (=

    cidade, Estado), indicou entre os antigos helnicos a constituio do Estado, o

    bom ordenamento,1 sendo utilizado para designar todas as atividades da cidade-

    estado (plis), sem qualquer relao com o sentido atual da expresso.2

    Na Antigidade, ento, limitou-se organizao do Estado estabelecendo a

    idia de governo e estrutura deste. Durante a Idade Mdia, no perodo feudal, o

    sentido do vocbulo teve nova vertente, tendo sido usado para designar a boa

    ordem da sociedade civil sob a autoridade do Estado, em contraposio boa

    ordem moral e religiosa da competncia exclusiva da autoridade eclesistica. 3

    Nesta poca, havia o jus politiae, poder do qual o prncipe era detentor e

    que designava a este ampla ingerncia na vida particular dos cidados, incluindo a

    1 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 405.2 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 109.3 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 405.

    11

  • vida religiosa e espiritual, sempre com o pretexto de alcanar a segurana e o

    bem-estar coletivo. Compreendia uma srie de normas postas pelo prncipe e que

    se colocavam fora do alcance dos tribunais. Esta fase foi denominada de estado de

    polcia. 4

    Ainda na Idade Mdia, retira-se, a partir do sculo XI, da noo de polcia o

    aspecto referente s relaes internacionais e j se detecta o exerccio do poder de

    polcia, tal como hoje considerado, no mbito das comunas (municpios)

    europias, por seus administradores, contribuindo para fixar a raiz nascente da

    cidade moderna. Saindo aos poucos do mbito da polcia as matrias relativas

    justia e s finanas. 5

    A primeira etapa do estado moderno foi ento caracterizada por uma fase

    de opresso nas vidas dos cidados, com o poder intervencionista do prncipe.

    Uma total intromisso do Estado, caracterizando o direito de polcia do soberano.

    Era a poca do estado iluminista, no qual o governante agia de acordo com a sua

    prpria lei, segundo a sua tica particular e sem limitaes.

    Logo depois vem a segunda fase do estado moderno: o estado de direito, o

    qual se desenvolve sob a gide de princpios, como o liberalismo e a legalidade,

    advindos da Revoluo Francesa ocorrida no sculo XVIII.

    Com o estado de direito, inaugura-se nova fase em que j no se aceita a

    idia de existirem leis a que o prprio prncipe no se submeta. Alm de que a

    preocupao passa a ser a de assegurar ao indivduo uma srie de direitos

    subjetivos, dentre os quais a liberdade. Em conseqncia, tudo o que significasse

    uma interferncia nessa liberdade deveria ter um carter excepcional. A regra era

    o livre exerccio dos direitos individuais assegurados nas Declaraes Universais de

    Direitos, transpostos depois para as constituies.6

    A partir de ento, polcia passa a ser vista como uma parte das atividades

    4 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 109.5 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 10. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 331-332.6 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 109-110.

    12

  • da Administrao, destinada a manter a ordem, a tranqilidade, a salubridade

    pblicas. Momento em que o vocbulo polcia deixou de ser usado isoladamente

    e surgiu primeiramente na Frana, a expresso polcia administrativa;7 sendo esta

    essencialmente uma polcia de segurana.8

    Um outro momento se inicia, ainda com idias liberais, em que a atuao

    estatal no se limita mais segurana, entendendo-se tambm ordem

    econmica e social e, antes mesmo de iniciar-se o sculo XX, fala-se em uma

    polcia geral, relativa segurana pblica, e em polcias especiais, que atuam nos

    mais variados setores da atividade dos particulares.9

    Foi o momento do estado social, no qual a polcia passou a ter nova face,

    preocupando-se com questes relacionadas ao bem-estar da coletividade sempre

    com o objetivo de adequar o exerccio dos direitos individuais a uma situao de

    harmonia com o interesse geral.

    Posteriormente, em um terceiro momento do Estado de Direito, observa-se

    uma preocupao do ente estatal com sua face democrtica, o que refletiu no

    exerccio do poder de polcia. Momento em que a populao obrigatoriamente

    participa das negociaes, relativas sociedade como um todo, em nvel de

    constituio, estando at organizada, muitas vezes, em classes.

    o estado democrtico de direito procurando garantir aos cidados o pleno

    exerccio dos direitos e liberdades pessoais assegurados em Lei e, ainda

    vinculando seus atos ao que esta prope. De maneira que o exerccio do poder de

    polcia no seja mais do que o que esteja definido como suficiente garantia da

    convivncia pacfica da coletividade.

    Assim, a evoluo do poder de polcia ao longo da histria norteou sua

    execuo nos dias atuais e permitiu a consagrao de um Direito Administrativo

    estruturado e embasado em princpios basilares atuao da Administrao

    7 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 10. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 332.8 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 110.9 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 110.

    13

  • Pblica. A qual procura contrabalancear de um lado a garantia de efetivao plena

    dos direitos individuais almejada pelo cidado, e de outro a contenso desse

    mesmo direito quando seu exerccio individual venha sobrepujar o coletivo.

    2. QUESTES CONCEITUAIS

    Grande relevncia tem neste ponto, para esclarecimento pertinente do

    trabalhado realizado, expor por parte de doutrinadores e tambm da legislao, o

    conceito de poder de polcia ao longo dos tempos como requisito primrio e slido

    necessrio compreenso e desenvolvimento do tema.

    Pelo conceito clssico, ligado concepo liberal do sculo XVIII, o poder de

    polcia compreendia a atividade estatal que limitava o exerccio dos direitos

    individuais em benefcio da segurana.10 Sob essa tica, o poder de polcia acha-se

    norteado pela noo que lhe emprestavam os gregos, na qual a polcia significava

    o prprio governo, idia aceita tambm pelos norte-americanos na lio de Paulo

    Almeida Dutra:

    O poder de polcia , entre eles (os americanos), o poder do Estado de promover a sade pblica, a segurana, a moral e o bem-estar geral; ou, como foi mais simples e compreensivamente descrito, o poder de governar homens e coisas.11

    Ainda neste sentido, o poder de polcia, em geral, sempre existiu no Estado,

    qualquer que tenha sido sua natureza e funes, no que diz respeito aos fins da

    sociedade a ele referida, quer tenha tido um carter amplo de poltica interna

    (concepo originria da polcia como governo), quer tenha sido concebido como

    instituio essencialmente administrativa, ou como administrao jurdica, ou

    administrao social do Estado. A idia de Estado inseparvel da de polcia.12

    Modernamente, poder de polcia a faculdade de que dispe a

    Administrao Pblica para condicionar e restringir o uso e gozo de bens,

    atividades e direitos individuais, em benefcio da coletividade ou do prprio Estado.

    10 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 111.11 DUTRA, Paulo de Almeida. Desvio de poder. So Paulo: Max Limonad, 1986. p. 3412 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 419.

    14

  • o mecanismo de frenagem de que dispe a Administrao Pblica para conter os

    abusos do direito individual.13

    Sob esse ngulo, Petrnio Braz conceitua o poder de polcia como um

    poder de vigilncia objetivando o bem-estar social, impedindo que os abusos dos

    direitos pessoais possam perturbar ou ameaar os interesses gerais da

    coletividade.14

    Concordando com esse pensamento, Odete Medauar tem o poder de polcia

    como a atividade da Administrao que impe limites ao exerccio de direitos e

    liberdades. Para ela, uma das atividades em que a Administrao mais expressa

    sua face autoridade e imperativa. Pois, onde existe um ordenamento, este no

    pode deixar de adotar medidas para disciplinar o exerccio de direitos

    fundamentais de indivduos e grupos.15

    Assim expe tambm Odlia Oliveira ao ter o poder de polcia como

    conjunto de atribuies da Administrao Pblica, consistentes em atos

    normativos e atos individuais executrios, de fiscalizao e controle da atividade

    privada, no s mediante a preveno, mas tambm por via da represso de atos

    violadores da ordem jurdica, que tenham repercusso social.16

    Ainda sob este ponto de vista, corrobora Maria Slvia Zanella Di Pietro ao

    afirmar que o poder de polcia tido como a atividade do Estado consistente em

    limitar o exerccio dos direitos individuais em benefcio do interesse pblico.17

    Sem embargo, convm expor segundo a viso de Celso Antnio Bandeira

    de Mello, seu conceito de poder de polcia evidenciando um sentido amplo e estrito

    deste:

    A atividade estatal de condicionar a liberdade e a propriedade

    13 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32. ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 131.14 BRAZ, Petrnio. Manual de direito administrativo. 2. ed. Leme: Editora de Direito, 2001, p. 141.15 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 10. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 331.16 OLIVEIRA, Odlia Ferreira da Luz. Implicaes da distino entre poder de polcia e servio pblico. Revista de direito pblico, n. 74, p. 208-209.17 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 111.

    15

  • ajustando-as aos interesses coletivos designa-se poder de polcia. A expresso tomada neste sentido amplo, abrange tanto atos do Legislativo quanto do Executivo. Refere-se, pois, ao complexo de medidas do Estado que delineia a esfera juridicamente tutelada da liberdade e da propriedade dos cidados.A expresso poder de polcia pode ser tomada em sentido mais estrito, relacionando-se unicamente com as intervenes, quer gerais e abstratas, como os regulamentos, quer concretas e especficas (tais as autorizaes, as licenas, as injunes), do poder Executivo destinadas a alcanar o mesmo fim de prevenir e obstar ao desenvolvimento de atividades particulares contrastantes com os interesses sociais. Esta acepo mais limitada responde noo de polcia administrativa.18

    Noutro aspecto, traz Jos Cretella Jnior que, por informar todo o sistema

    de proteo que funciona atualmente nos estados de direito, o poder de polcia

    deve satisfazer a trplice objetivo, qual seja, o de assegurar a tranqilidade, a

    segurana e a salubridade pblicas.

    Em contrapartida, partindo-se do fato de que o conceito de poder de polcia,

    ao longo dos tempos teve vrias faces, correspondendo realidade histrica de

    cada poca e, que hoje, acha-se dotado de vasta abrangncia, seria estabelecer

    uma grande limitao condicion-lo a um trplice objetivo como o exposto acima.

    Coadunando com esse pensamento Maria Slvia Zanella Di Pietro acrescenta

    que o interesse pblico a que deve atender a execuo do poder de polcia, diz

    respeito aos mais variados setores da sociedade, tais como segurana, moral,

    sade, meio ambiente, defesa do consumidor, patrimnio cultural, propriedade.19

    Ento, no h que se indagar se h no exerccio do poder de polcia o trio:

    tranqilidade, segurana e salubridade pblicas. Principalmente no Brasil, onde

    este poder visto pela maior parte dos doutrinadores como atuante nas mais

    diversificadas esferas da sociedade. Neste sentido, afirma Celso Antnio Bandeira

    de Mello:

    Ocorre que no Brasil s existem regulamentos executivos, isto , para a fiel execuo das leis. Foge alada regulamentar inovar na ordem jurdica. Para ns, ento, no interessa indagar se se trata de segurana, ordem ou salubridade pblicas, ou qualquer outro setor, uma vez que se encontram niveladas todas as intervenes da

    18 MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 718.19 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 111.

    16

  • Administrao.20

    ainda dessa noo que esse autor acentua os sentidos amplo e estrito do

    poder de polcia j expostos em momento anterior. No se limitando, portanto, a

    uma definio rgida do termo. Partindo desse pressuposto, tem-se no artigo 78 do

    Cdigo Tribunal Nacional, referente cobrana de taxa, um conceito para o poder

    de polcia da Administrao:

    Considera-se poder de polcia da atividade da administrao pblica que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prtica de ato ou absteno de fato, em razo de interesse pblico concernente segurana, higiene, ordem, aos costumes, disciplina da produo e do mercado, ao exerccio de atividades econmicas dependentes de concesso ou autorizao do Poder Pblico, tranqilidade pblica ou ao respeito propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

    H tambm na Constituio Federal de 1988, em vrios artigos e incisos,

    abordagem do legislador a cerca do poder de polcia como, por exemplo, o artigo

    5, VI, VIII, XIII, XVI, XXIII e XXIV, artigo 145, II, artigo 170 e artigo 172, entre

    outros.

    Ainda a ttulo de conceituao, mas abordando um outro aspecto

    extremamente relevante, Maral Justen Filho afirma que o poder de polcia

    administrativa a competncia administrativa de disciplinar o exerccio da

    autonomia privada para a realizao de direitos fundamentais e da democracia,

    segundo os princpios da legalidade e da proporcionalidade.21

    A partir deste conceito possvel depreender que alm de zelar pela

    convivncia dos cidados em sociedade, assegurando seus direitos e permitindo o

    livre exerccio deles, a execuo do poder de polcia a que se pautar nos princpios

    que regem a administrao pblica de forma que no se desvie do que prope a lei

    e ainda o realize de maneira ponderada.

    Assim, a partir de todas as definies oferecidas tanto pela legislao

    quanto pelos diversos doutrinadores, possvel observar o carter limitativo da

    conduta individual do ser humano por parte do poder de polcia, em prol de uma

    20 MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 734-735.21 FILHO, Maral Justen. Curso de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Saraiva, 2005, p.385.

    17

  • situao de convivncia social aceitvel e permissiva de benefcios coletividade.

    3. A IGREJA E O PODER DE POLCIA

    possvel observar atravs de registros da histria da humanidade que ao

    longo dos tempos a Igreja e o Estado estiveram ligados. Ora de forma conflitante

    em que o representante poltico e o detentor do poder espiritual interferiam um na

    ao do outro, cada qual buscando a supremacia de seu poder e ora unidos

    estabelecendo laos de fora dos dois poderes. o que se observa, por exemplo,

    no Imprio romano (de 27 a.C. a 476 d.C). Perodo em que os cristos foram

    severamente perseguidos e a Igreja crist no exerceu grande influncia na

    sociedade:

    Ao imperador, supremo mandatrio, cabia exercer totalmente o controle poltico, sobrepondo-se ao Senado. A ele competia nomear magistrados, controlar os exrcitos, interferindo, at mesmo, nas questes religiosas.22

    Somente aps a aceitao do cristianismo promovida pelo imperador

    Constantino (313-337) por meio do Edito de Milo, o qual concedeu liberdade de

    culto aos cristos, j importantes em nmero e influncia23, que a igreja catlica

    passou a ter interferncia direta em todos os setores da sociedade.

    Foi ento na Idade Mdia que se observou a supremacia desta instituio

    feudal, a maior do ocidente europeu. Uma vez que atuando em todos os nveis da

    vida social, a Igreja estabeleceu normas, orientou comportamentos e, sobretudo,

    imprimiu nos ideais do homem medieval os valores teolgicos, isto , a cultura

    religiosa.24

    Essa interferncia direta da Igreja foi decisiva para a aceitao da

    mentalidade de uma sociedade imvel e estratificada que culminou na sustentao

    da realidade poltica vivenciada na poca, necessariamente desigual:

    Coube, assim, ao clero forjar a mentalidade da poca, reforando o predomnio dos senhores feudais (clero e nobreza), justificando os privilgios estabelecidos e oferecendo ao povo, em troca, a promessa do

    22 VICENTINO, Cludio. Histria geral. 8. ed. So Paulo: Scipione, 1999, p. 90.23 VICENTINO, Cludio. Histria geral. 8. ed. So Paulo: Scipione, 1999, p. 93.24 VICENTINO, Cludio. Histria geral. 8. ed. So Paulo: Scipione, 1999, p. 111.

    18

  • paraso celestial.25

    Era, na verdade, uma aliana de cooperao entre o Estado e a Igreja, em

    que esta exercendo sua supremacia, enaltecia a situao poltica e social vigente

    em troca de maior fortalecimento de suas bases. E, a cada medida que tomava em

    prol do fortalecimento do poder do soberano, tornava-se por parte deste mais

    protegida:

    Deus quis que, entre os homens, uns fossem senhores e outros servos, obrigados a venerar e a amar a Deus, e que os servos estejam obrigados a amar e venerar o seu senhor.26

    Em alguns momentos, foi possvel observar confuso entre o papel da Igreja

    e do Estado. Este se estruturando aos poucos, de acordo com as mudanas

    trazidas pelas modificaes ao longo dos tempos, principalmente da economia, e

    aquela devido ao forte poderio que deteve, fazendo as vezes de Estado ao impor

    penalidades ao homem que se achasse contrrio ao seus dogmas:

    Em sua obsesso pelo poder, os papas passaram a intervir sistematicamente em assuntos de poltica e economia, acabando por enfrentar a resistncia da realeza.27

    possvel, portanto, observar que a relao Igreja-Estado tem feito parte

    diretamente da vida do homem e direcionado a conduta deste. Por meio da

    doutrina crist, a qual prega a paz entre os homens, a Igreja tem se relacionado

    com as questes sociais que envolvem o ser humano e, buscado imprimir a

    necessidade do alcance de um bem comum a todos, dado o fato de o homem ter

    sido criado imagem e semelhana de Deus e por isso ser responsvel pelo

    exerccio dos seus direitos individuais com os demais pertencentes ao seu grupo

    social.

    Esse bem comum no seno finalidade social a ser cumprida pelo Estado

    e na lio de Dalmo Dallari de Abreu perfeitamente definido pelo Papa Joo

    XXIII:

    O bem comum consiste no conjunto de todas as condies de vida social que consintam e favoream o desenvolvimento integral da

    25 VICENTINO, Cludio. Histria geral. 8. ed. So Paulo: Scipione, 1999, p. 111.26 ANGERS, St. Laud de. In: FREITAS, Gustavo de. 900 textos e documentos de histria. Lisboa: Pltano, 1975.27 VICENTINO, Cludio. Histria geral. 8. ed. So Paulo: Scipione, 1999, p. 152.

    19

  • personalidade humana. (...) Como se v no feita referncia a uma espcie particular de bens, indicando, em lugar disso, um conjunto de condies, incluindo a ordem jurdica e a garantia de possibilidades, que consintam e favoream o desenvolvimento integral da personalidade humana. Nesta idia de integral desenvolvimento da personalidade est compreendido tudo, inclusive os valores materiais e espirituais, que cada homem julgue necessrio para a expanso de sua personalidade. Ao se afirmar, portanto, que a sociedade humana tem por finalidade o bem comum, isto quer dizer que ela busca a criao de condies que permitam a cada homem e a cada grupo social a consecuo de seus respectivos fins particulares.28

    Dessa forma, necessrio que antes de qualquer lucro pessoal ou interesse

    particular, a sociedade coloque o bem comum frente de suas relaes e todos

    sejam beneficiados.

    Porm, os homens, por si mesmos, individualmente, revelam-se incapazes

    de coordenar seus esforos para a verdadeira construo do bem comum, pois ele

    carreia em seu bojo complexas teias de relaes humanas. Por isso, o Estado e os

    governantes tm a misso de assumir a construo dessa obra monumental.29

    da, ento, que advm a necessidade da atuao do ente estatal atravs

    do poder de polcia, no sentido de controlar, ajudar e regular as atividades

    individuais e, assim, direcion-las de forma harmoniosa ao bem comum.

    Para que esta misso do Estado se concretize imperioso que exista um

    sistema de segurana humana capaz de coibir no caso concreto aes

    desfavorveis ao bem comum e possibilite um mnimo de segurana

    coletividade. A este sistema d-se o nome de polcia, o qual segundo Jos Cretella

    Jnior, a atividade concreta exercida pelo Estado para assegurar a ordem

    pblica atravs de limitaes legais impostas liberdade coletiva e individual.30

    A existncia da polcia como meio de assegurar a ordem pblica, promover a

    segurana necessria coletividade e, assim possibilitar o bem comum coaduna

    com a doutrina social da Igreja. Destarte, a polcia, em si, como concebida, um

    importante elo de ligao entre o Estado e a doutrina social da Igreja.31

    28 Papa Joo XXIII. Pacem in terris (Encclica), I, 58.29 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 19.30 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 414.31 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen

    20

  • 4. A EXPRESSO PODER DE POLCIA

    Tem origem na jurisprudncia norte-americana. A expresso tcnica advm

    do ingls police power. Jos Maria Pinheiro Madeira citando Henrique de Carvalho

    Simas, diz:

    A expresso veio dos Estados Unidos: police power. Criao da jurisprudncia dos tribunais americanos, significa, nada mais nada menos, uma atividade discricionria (no arbitrria) do governo, que age com certa liberdade para aquilatar da convivncia, oportunidade ou alcance da aplicao das medidas limitativas ou disciplinadoras dos direitos individuais.32

    Concordando com esta afirmao Jos Cretella Jnior acentua que a

    expresso bastante moderna e, que aps ter sido criada em pas de lngua

    inglesa, expandiu-se pelo direito pblico de todo o mundo. Faz ainda um breve

    relato da utilizao da expresso:

    Em 1827, no caso Brown versus Maryland, o juiz Marshall, presidente da Corte Suprema dos Estados Unidos, trata do poder de polcia, se bem que a expresso integral, estereotipada - police power ainda no lhe tivesse ocorrido de modo ntido, tanto assim que, em seu voto, nada menos que 10 vocbulos se interpem entre os termos constitutivos da denominao. O mesmo juiz, em caso anterior (1824), Gibbons versus Ogden, empregara os mesmos vocbulos, tambm afastados um do outro, no ocorrendo, ainda, a expresso police power. Em 1853, no caso Commonwealth versus Alger, o juiz Shaw, fez aluso relatividade dos direitos de propriedade, subordinados aos demais interesses particulares e coletivos. No caso Noble, a expresso, agora para sempre consagrada, aparece na ntegra, pela primeira vez: Pode dizer-se, de um modo geral, que o police power se estende a todas as grandes necessidades pblicas.33

    Em outra vertente, acentua Celso Antnio Bandeira de Mello que a

    expresso poder de polcia traz consigo a evoluo de uma poca pretrita, a do

    Estado de Polcia, que precedeu ao Estado de Direito. Carregando consigo a

    suposio de prerrogativas dantes existentes em prol do prncipe e que se faz

    comunicar inadvertidamente ao Poder Executivo. Dessa forma, raciocina-se

    Jris, 2000, p. 22.32 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 10.33 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 420.

    21

  • como se existisse uma natural titularidade de poderes em prol da Administrao

    e como se dela emanasse intrinsecamente, fruto de um abstrato poder de

    polcia.34

    Atualmente, na quase totalidade dos pases europeus, excepcionalmente

    Frana, o tema tratado sob a titulao limitaes administrativas liberdade e

    propriedade, e no mais sob o rtulo poder de polcia.35

    Contudo, como na realidade brasileira a denominao largamente

    empregada, tanto por doutrinadores como pela legislao, ser chamada ento de

    poder de polcia a prerrogativa da Administrao de impor limitaes conduta

    individual do particular em prol do bem comum e, h que se ressaltar a diferena

    entre o poder de polcia e a polcia para que no ocorram conflitos nos atos de

    expresso de um e de outros resultantes de m-definio. o que assinala Jos

    Cretella Jnior:

    A polcia (...), a atividade exercida pelo Estado para assegurar a ordem pblica e particular mediante limitaes impostas liberdade coletiva e individual dos cidados, tem mbito mais restrito do que o poder de polcia que a faculdade atribuda pela Constituio do poder legislativo para regulamentar os direitos individuais, promovendo o bem-estar geral.36

    Neste sentido, na lio de lvaro Lazzarini, podemos dizer que o poder de

    polcia uma potencialidade, algo em potncia, ao passo que a polcia uma

    realidade, algo em ato. O poder de polcia legitima a ao da polcia e sua

    prpria existncia.37

    5. ATOS DE EXPRESSO DO PODER DE POLCIA

    Na lio de Maral Justen Filho, a natureza de poder de polcia conduz, na

    grande parte dos casos, sua exteriorizao por meio de atos administrativos

    unilaterais. A especificao da espcie de ato adequado depende das

    34 MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 717.35 MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 717.36 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 423.37 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 186.

    22

  • circunstncias e da natureza.38

    Neste sentido, tomando-se a atuao do poder de polcia em sentido amplo,

    com abrangncia em atividades dos Poderes Executivo e Legislativo, tem-se o

    exerccio de atos que podem ser normativos em geral, e concretos ou operaes

    materiais. Jos Maria Pinheiro Madeira afirma que:

    (...) pelos atos normativos em geral, que so leis, criam-se as limitaes administrativas ao exerccio dos direitos e atividades individuais, estabelecendo-se normas gerais e abstratas dirigidas indistintamente s pessoas que estejam em idntica situao;e que disciplinando a aplicao da lei aos casos concretos, pode o Executivo baixar decreto, resolues, portarias, instrues.39

    (...) os atos administrativos e operaes materiais de aplicao da lei ao caso concreto compreendem medidas preventivas como fiscalizao, vistoria, ordem, notificao, autorizao, licenas, objetivando adequar o comportamento individual lei, e medidas repressivas (dissoluo de reunio, interdio de atividade, apreenso de mercadorias deterioradas, internao de doente com patologia contagiosa), com a finalidade de coagir o infrator a cumprir a lei.40

    Na lio de Odete Medauar, a licena ato administrativo vinculado pelo

    qual o poder pblico, verificando que o interessado atendeu a todas as exigncias

    legais, possibilita-lhe a realizao de atividades ou de fatos materiais, vedados

    sem tal apreciao. Como exemplo de licena cite-se: licena de construir,

    licena ambiental, licena de localizao e funcionamento.41

    Ainda sob o olhar desta autora, tem-se agora a autorizao como ato

    administrativo discricionrio e precrio, pelo qual a Administrao consente no

    exerccio de certa atividade; no mbito do poder de polcia, diz respeito, ao

    exerccio de atividades cujo livre exerccio pode, em muitos casos, constituir

    perigo ou dano para a coletividade, mas que no importuno impedir de modo

    absoluto. Os exemplos mais comuns so o porte de armas e o comrcio de fogos. 42

    38 FILHO, Maral Justen. Curso de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Saraiva, 2005, p.385.39 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 4840 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 4841 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 10. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 337.42 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 10. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 337-338.

    23

  • Como exemplo de regulamentos ou portarias, tem-se tambm as que

    probem soltar bales em pocas de festas juninas e das normas

    administrativas, as que disciplinam horrio e condies de vendas de bebidas

    alcolicas em certos locais. So disposies genricas prprias da atividade de

    polcia administrativa. 43 Em outra vertente, tem-se:

    (...) as injunes concretas, como as que exigem a dissoluo de uma reunio subversiva, apreenso de edio de revista ou jornal que contenha noticirio ou reportagem sediciosa, imoral ou dissoluta, fechamento de estabelecimento comercial aberto sem a prvia obedincia aos requisitos normativos, interdio de hotel utilizado para explorao de lenocnio, guinchamento de veculo que obstrua via pblica, so atos especficos de polcia administrativa praticados em obedincia a preceitos legais e regulamentares.44

    Digenes Gasparini complementa ainda, que a atribuio de polcia

    administrativa tambm compreende os atos de fiscalizao. Por eles, previnem-se

    os danos decorrentes da ao dos administrados.45 Como exemplo, tem-se:

    (...) a fiscalizao dos estabelecimentos de pasto (restaurantes, bares e lanchonetes), no que concerne higiene e qualidade dos alimentos postos ao consumo pblico; das construes, no que respeita a higiene, segurana, habitabilidade; de atividades (caa e pesca), no que diz respeito poca, ao local e aos equipamentos utilizados; dos txis, no que se refere segurana, higiene e aferio dos taxmetros.46

    Dessa forma, possvel depreender que o poder de polcia est inserido

    por toda a Administrao e seus atos de expresso so, portanto, inmeros e

    repercutem sobremaneira dentro da sociedade.

    CAPTULO II: ORDEM PBLICA, SEGURANA PBLICA E PODER DE

    43 MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 731.44 MELLO, Celso Antnio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. So Paulo: Malheiros, 2006, p. 731.45 GASPARINI, Digenes. Direito administrativo. 12. ed. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 132-133.46 GASPARINI, Digenes. Direito administrativo. 12. ed. So Paulo: Saraiva, 2007, p. 132-133.

    24

  • POLCIA

    1. QUESTES CONCEITUAIS

    A ordem pblica, objeto de profunda necessidade para a convivncia

    saudvel da coletividade, possui conceituao diversa e abrangente na doutrina

    dominante em face da amplitude que possui.

    A atual Constituio Federal no artigo 144, faz meno ordem pblica ao

    afirmar que a segurana pblica, dever do Estado, direito e responsabilidade de

    todos, exercida para a preservao da ordem pblica e da incolumidade das

    pessoas e do patrimnio, mas no oferece definio exata ao termo.

    Por isso, consideramos mais procedente entender que a ordem pblica

    no se limita s noes de segurana e de tranqilidade, mas tambm abrange os

    conceitos de ordem moral, esttica, poltica e econmica.47 neste sentido, por

    exemplo, que age amplamente a jurisprudncia do Superior Tribunal de Justia

    quando menciona questo de ordem pblica:

    PROCESSO CIVIL EXECUO FISCAL EXCEO DE PR-EXECUTIVIDADE ILEGITIMIDADE PASSIVA RESPONSABILIDADE DO SCIO DILAO PROBATRIA PRECEDENTES.1. A controvrsia essencial destes autos restringe-se excluso dorecorrente do plo passivo da relao jurdica, por meio de argio de exceo de pr-executividade.2. A exceo de pr-executividade admitida nas hipteses em que a matria objeto de defesa, pelo executado, seja de ordem pblica e, portanto, cognoscvel de ofcio pelo juiz, a qualquer tempo e graude jurisdio, como, por exemplo, as condies da ao e os pressupostos processuais (artigo 267, 3, do Cdigo de ProcessoCivil).3. Sobre a excluso da responsabilidade do recorrente, na hiptesedos autos, denota-se inexistir respaldo legal. Frise-se que a incluso do co-responsvel execuo, na forma do art. 135 do CTN, origina-se do disposto no art. 4 da LEF. Nesse sentido, independentemente de terem nomes expressamente lanados na CDA, os co-responsveis podem ser citados e, alm disto, terem seus bens penhorados. (...)48

    Assim, por ordem pblica, no se entende somente a ausncia de

    47 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 86.48 BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIA. REsp 787116/SC, relatora ministra Eliana Calmon, julgamento 21/06/2007, DJ 29-06-2007, p. 541.

    25

  • desordem, mas tambm a atuao preventiva que possibilite a no ocorrncia de

    leses convivncia pacfica da comunidade. Da ser necessria a atuao do

    poder de polcia no sentido de promover a situao de ordem pblica, a qual h

    de ser garantida atravs de mecanismos de segurana pblica, que havero de ser

    adotados por rgos especficos.49

    Tais rgos, de acordo com o texto constitucional mencionado acima, nos

    incisos I, II, III, IV, V e 8, so a prpria polcia, organizada em corporaes e

    distinta pela competncia que cada uma possui, ou seja, a polcia federal, a polcia

    rodoviria federal, a polcia ferroviria federal, as polcias civis, as polcias militares

    e corpos de bombeiros militares, alm das guardas municipais que os municpios

    podero constituir.

    Alm destes, conta-se com a polcia administrativa, pois esta na lio de

    Jos Cretella Jnior, tem por objeto a manuteno da ordem pblica e exerce

    atividades a priori, antes dos acontecimentos, procurando evitar que os crimes se

    verifiquem.50

    Ainda sob o ponto de vista deste autor, polcia administrativa ou

    preventiva incumbe, em geral, a vigilncia, a proteo da sociedade, manuteno

    da ordem e tranqilidade pblicas, bem assim, assegurar os direitos individuais e

    auxiliar a execuo dos atos e decises da Justia e da administrao.51

    Neste sentido, inegvel que para a existncia da ordem pblica, faz-se

    necessria a atuao da polcia, esta encarada tambm em sentido amplo e no

    somente sob sua face repressiva, uma vez que na realidade brasileira, polcia

    cumpre tambm a preveno dos delitos.

    Sem embargo, cumpre observar que embora aja distino entre as polcias

    administrativa e judiciria, no Brasil esta diferena no tem integral aplicao,

    porque a nossa polcia mista, cabendo ao mesmo rgo atividades preventivas e

    49 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 85.50 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 416.51 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 416.

    26

  • repressivas.52

    Neste aspecto, Jos Cretella Jnior conceitua polcia como a operao que

    tem por fim assegurar por via geral ou individual, preventivamente e por certas

    medidas apropriadas (que constituem seu objeto), a tranqilidade, a segurana e

    a salubridade pblicas, a fim de prevenir as ofensas aos direitos e propriedades

    dos indivduos que poderiam resultar numa falta de tranqilidade, de segurana ou

    de salubridade.53

    Ainda neste sentido, notrio, que a ordem pblica existe sempre que no

    h desordem, atos de violncia, de que espcie for, contra pessoas, bens ou o

    prprio Estado. Mas ela no pode ser concebida nica e exclusivamente sob esta

    tica. No se trata de figura jurdica, embora dela se origine e tenha a sua

    existncia formal.54 Assim, na lio de lvaro Lazzarini:

    A ordem pblica encerra um contexto maior, no qual se encontra a noo de segurana pblica, como estado antidelitual, resultante da observncia das normas penais, com aes policiais repressivas ou preventivas tpicas, na limitao das liberdades individuais.55

    Dessa forma, mesmo que de forma ampla, a ordem pblica objeto de

    busca e preservao por parte do poder pblico, uma vez que sem ela ser

    impossvel a convivncia social.

    2. ADMINISTRAO PBLICA, POLCIA E PODER DE POLCIA

    A Constituio Federal no artigo 2 acentua que so poderes da Unio,

    independentes e harmnicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judicirio. No

    Estado Moderno ao contrrio do Antigo e Medieval, a existncia dos trs poderes

    tem o objetivo de defender os interesses do povo, colecionados no bem-estar,

    ordem social e bem comum em contraposio aos anseios individuais.

    52 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 92.53 CRETELLA, Jos Jnior. Curso de direito administrativo. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 409.54 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 95.55 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 202.

    27

  • Em concordncia com essa afirmativa, acentua Alexandre de Moraes que

    o objetivo inicial da clssica separao das funes do Estado e distribuio entre

    rgos autnomos e independentes tinha como finalidade a proteo da liberdade

    individual contra o arbtrio de um governante onipotente. 56

    Reis Friede afirma ainda que a diviso do poder de Estado em trs rgos

    distintos (Legislativo, Executivo e Judicirio), independentes e harmnicos entre

    si, representa a essncia do sistema constitucional. Uma Constituio que no

    contenha este princpio no Constituio, como afirmaram os tericos do

    liberalismo.57

    Sob esta tica, to fundamental, na concepo do Estado Moderno, o

    princpio da separao dos Poderes que, no art. 16 da Declarao dos Direitos do

    Homem e do Cidado, promulgada na Frana em 26 de agosto de 1789, foi

    firmado o princpio de que toda sociedade em que a garantia dos direitos no

    assegurada, nem a separao dos poderes determinada, no tem constituio58,

    vale dizer um Estado politicamente no evoludo. 59(...)

    Nesse contexto, imprescindvel salientar que a clssica separao dos

    poderes reconhecida e acatada como dogma dos Estados liberais, teve origem no

    sculo XVIII por Montesquieu a partir da compilao de diversas divagaes de

    filsofos na obra intitulada O Esprito das Leis, a qual exps a necessidade de

    impedir a tirania dos governantes que caracterizou os Estados absolutistas do

    passado.

    Sem embargo, necessrio pontuar que essa separao de poderes no

    pode ser entendida da maneira absoluta como pretendiam, nos primeiros tempos,

    os tericos do presidencialismo puro norte-americano. Nem decorre da doutrina

    de Montesquieu que cada um dos trs clssicos poderes deva funcionar com plena

    independncia, plena autonomia, fechado em departamento estanque. Melhor ser

    56 MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 17. ed. So Paulo: Atlas, 2005, p. 370.57 FRIEDE. Reis. Curso de cincia poltica e teoria geral do estado. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 459.58 FENET, Alain. Les libertes publiques en France. 1. ed. Paris: Presses Universitaires de France, 1976, p. 35.59 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 25-26.

    28

  • falar-se em separao de funes. A diviso formal, no substancial. 60

    Isso tanto mais importante, quando sabe-se que as atividades da

    Administrao Pblica, tpicas do Poder Executivo, coexistem nos dois outros

    Poderes, isto , no Legislativo e no Judicirio.61(...) Salientando-se, entretanto,

    que tal ocorrncia em nada compromete a competncia legtima e especfica de

    cada Poder.

    Sob esta tica, imprescindvel expor o conceito de Administrao Pblica,

    embora nem sempre esta definio seja encontrada de forma bem definida devido

    aos vrios sentidos dados expresso. A saber:

    Poderes criados, distribudos e administrados pelo governo da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios, para atender a necessidades e interesses da coletividade, com execuo de atividades e servios pblicos(...)62

    Na lio de Hely Lopes Meirelles, se administrar gerir interesses,

    segundo a lei, a moral e a finalidade dos bens entregues guarda e conservao

    alheias, e sendo estes bens da coletividade, realiza-se administrao pblica.63

    Sendo assim, para este autor, Administrao Pblica, a gesto de bens e

    interesses qualificados da comunidade no mbito federal, estadual e municipal,

    segundo os preceitos do Direito e da Moral, visando ao bem comum.64 Nesta

    linha, Laubadre, administrativista francs, acentua que:

    Administrao Pblica o ramo do direito pblico interno que compreende a organizao e a atividade daquilo que se denomina corretamente Administrao, isto , o conjunto de autoridades, agentes e organismos encarregados, sob o impulso dos poderes polticos, de assegurar as mltiplas intervenes do Estado moderno.65

    60 MALUF, Sahid. Teoria geral do estado. 23. ed. So Paulo: Saraiva, 1995, p. 205-207.61 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 27.62 GUIMARES, Diocleciano Torrieri. Dicionrio tcnico jurdico. 5. ed. So Paulo: Rideel, 2003, p. 50.63 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32. ed. So Paulo: Mallheiros, 2006, p. 84.64 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32. ed. So Paulo: Mallheiros, 2006, p. 84.65 LAUBADRE, Andr. Manuel de droit administratif. 10.ed. Paris: Ledy, 1977. p. 11.

    29

  • Odete Medauar assinala duas faces de observao para o termo. Sob o

    aspecto funcional, Administrao Pblica significa um conjunto de atividades do

    Estado que auxiliam as instituies polticas de cpula no exerccio de funes de

    governo, que organizam a realizao das finalidades pblicas postas por tais

    instituies e que produzem servios, bens e utilidades para a populao (...)66

    J sob a vertente organizacional, a Administrao Pblica representa o

    conjunto de rgos e entes estatais que produzem servios, bens e utilidades para

    a populao, coadjuvando as instituies polticas de cpula no exerccio das

    funes de governo.67

    Na mesma assertiva, mas com diferentes denominaes, Maria Sylvia

    Zanella Di Pietro atribui um sentido subjetivo e objetivo expresso. Segundo ela,

    subjetivamente a Administrao Pblica compreende as pessoas jurdicas, rgos

    e agentes pblicos incumbidos do exerccio da funo administrativa.

    Objetivamente, a expresso se refere natureza da atividade exercida por estes

    entes, sendo neste caso a prpria atividade administrativa de competncia

    precpua do Poder Executivo.68

    Mormente devido principalmente diversidade conceitual acerca da

    Administrao Pblica, imprescindvel a diferenciao entre esta e Governo.

    A funo poltica ou de governo compreende um dos trs elementos

    necessrios existncia do Estado. Ao longo dos tempos esteve intrinsecamente

    relacionada com a funo administrativa, de forma que sob o aspecto material,

    no se distinguem.

    No entanto, juridicamente h diferena entre os termos, pois aos rgos do

    Governo cabe a competncia de tomar decises polticas, dotadas de forte carga

    de discricionariedade, mas no de arbtrio, em relao comunidade governada,

    enquanto que os rgos da Administrao Pblica tm a seu cargo a aplicao

    66 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 10. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 44.67 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 10. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 44.68 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 54.

    30

  • daquelas decises governamentais, que sejam exeqveis em termos de ao

    concreta.69

    Em outras palavras, Administrao cabe o papel de execuo, de

    operacionalizao aplicada ao caso concreto das ordens emanadas pelo Governo, o

    qual possui atribuio de comando poltico do Estado.

    Maria Sylvia Zanella Di Pietro citando Renato Alessi, afirma que a funo

    poltica ou de governo, implica uma atividade de ordem superior referida

    direo suprema e geral do Estado em seu conjunto e em sua unidade, dirigida a

    determinar os fins da ao do Estado, a assinalar as diretrizes para as outras

    funes, buscando a unidade da soberania estatal.70

    Neste contexto, necessrio acentuar para a devida compreenso da

    atividade administrativa, que esta se acha efetivamente subordinada ao

    governamental, o que obriga o agente administrativo a cumprir a deciso

    governamental.71

    No entanto, muito embora havendo sujeio, tanto os atos de Governo

    dotados de soberania poltica e direo quanto os da Administrao evidenciados

    na execuo, por meio de atos concretos voltados para a realizao dos fins

    estatais, visam a satisfao das necessidades coletivas, ou seja, o fim precpuo do

    Estado, qual seja, o bem-comum da coletividade.

    Neste af, que a organizao e funcionamento da Administrao Pblica

    se acham, no Brasil, alicerados na Lei e em casos excepcionais em decretos

    conforme preceitua o artigo 84, inciso VI, da Constituio Federal.72

    Como bem afirma Hely Lopes Meirelles, a natureza da administrao

    pblica a de um mnus pblico, isto , a de um encargo de defesa, conservao

    69 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 28.70 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 56.71 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 28.72 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 30.

    31

  • e aprimoramento dos bens, servios e interesses da coletividade73, o que obriga o

    administrador pblico ou agente pblico no exerccio de sua atividade, a agir

    conforme os preceitos de Direito e morais inerentes posio que ocupam.

    Consubstanciados ento no que determina a Lei, que se acham tambm

    os administradores pblicos subordinados aos princpios da administrao pblica

    previstos no artigo 37, caput, da Constituio Federal e no artigo 2 da Lei federal

    9.784 de 29.01.1999. Quais sejam: princpio da legalidade, moralidade,

    impessoalidade ou finalidade, publicidade, eficincia, razoabilidade,

    proporcionalidade, ampla defesa, contraditrio, segurana jurdica, motivao e

    supremacia do interesse pblico. Hely Lopes Meirelles explana a respeito:

    Como salientado, por esses padres que devero se pautar todos os atos e atividades administrativas de todo aquele que exerce o poder pblico. Constituem, por assim dizer, os fundamentos da ao administrativa, ou, por outras palavras, os sustentculos da atividade pblica.74

    nesta linha de ao que as atividades administrativas devero se pautar,

    ou seja, com o objetivo maior e principal de alcanar o bem-comum, pois a

    Administrao Pblica dever satisfazer o interesse geral, o que no conseguir se

    estiver em p de igualdade com particulares.75

    Entretanto, como nem sempre as ordens e o interesse pblico so

    plenamente aceitos e atendidos por parte da coletividade, o poder pblico, na

    figura da Administrao, conta com a ao da polcia e com o Poder de Polcia na

    concretizao da vontade geral em detrimento da vontade individual e particular.

    Neste degrau, discusso presente em relao diferenciao entre a

    atuao da polcia e do poder de polcia. Isto, porque ao longo dos anos a noo

    de polcia sofreu mudanas tendo em alguns momentos o propsito de promover o

    bem-estar social e em outros sendo norteada pela idia de que ao Estado somente

    deveria ser reservada a polcia pertinente segurana e a defesa.

    73 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32. ed. So Paulo: Mallheiros, 2006, p. 85.74 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32. ed. So Paulo: Mallheiros, 2006, p. 87.75 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 32.

    32

  • No entanto, depois de eclodirem vrios pontos de vista acerca desta

    discusso, predominante por parte da doutrina a aceitao da polcia bem como

    das aes administrativas decorrentes do Poder de Polcia, de que o bem-estar

    social dever ser o fim ltimo a ser alcanado. Mesmo que em algumas culturas

    ora se verifique com maior nfase a proteo segurana, moralidade e

    salubridade.

    Neste sentido, afirma Jos Maria Pinheiro Madeira que a polcia ,

    portanto, uma atividade estatal com determinado fim, sendo preciso firmar, por

    meio de seus rgos, se essa manifestao uma atividade legislativa ou

    administrativa e em que casos matria prpria do direito constitucional ou do

    direito administrativo.76

    Esclarece ainda que o Poder de Polcia atua restringindo o exerccio do

    direito de propriedade e liberdade, mas que deve limitar-se aos fatos humanos,

    uma vez que, segundo ele, as medidas pertinentes a fatos da natureza no so

    de polcia administrativa, e sim de segurana ou de defesa.77

    Este mesmo autor expe concordantemente com o pensamento de Jos

    Cretella Jnior, idia anteriormente exposta no primeiro captulo deste trabalho,

    de que o Poder de Polcia legitima a si prprio e prpria polcia. Sendo portanto,

    uma possibilidade estatal de fiscalizao e restrio de, atravs da polcia - forma

    organizada limitar as atividades funestas dos cidados.78 Exemplificativamente

    se d tambm o entendimento da douta jurisprudncia, a saber:

    EMENTA: 1. RECURSO. Extraordinrio. Inadmissibilidade. Taxa de Controle e Fiscalizao Ambiental - TCFA. Poder de polcia exercido pelo IBAMA. Lei n. 10.165/2000. Constitucionalidade. Precedente do Plenrio. Ausncia de razes novas. Deciso mantida. Agravo regimental improvido. Nega-se provimento a agravo regimental quando a parte agravante no infirma os fundamentos adotados na deciso agravada.. 2. RECURSO. Agravo. Regimental. Jurisprudncia assentada sobre a matria. Carter meramente abusivo. Litigncia de m-f. Imposio de

    76 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 32.77 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 30-31.78 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 30-31.

    33

  • multa. Aplicao do art. 557, 2, cc. arts. 14, II e III, e 17, VII, do CPC. Quando abusiva a interposio de agravo, manifestamente inadmissvel ou infundado, deve o Tribunal condenar a agravante a pagar multa ao agravado.79

    EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DISTRIBUIO DE COMBUSTVEIS. TRR. REGULAMENTAO DL 395/38. RECEPO. PORTARIA MINISTERIAL. VALIDADE. 1. O exerccio de qualquer atividade econmica pressupe o atendimento aos requisitos legais e s limitaes impostas pela Administrao no regular exerccio de seu poder de polcia, principalmente quando se trata de distribuio de combustveis, setor essencial para a economia moderna. 2. O princpio da livre iniciativa no pode ser invocado para afastar regras de regulamentao do mercado e de defesa do consumidor. 2. O DL 395/38 foi editado em conformidade com o art. 180 da CF de 1937 e, na inexistncia da lei prevista no art. 238 da Carta de 1988, apresentava-se como diploma plenamente vlido para regular o setor de combustveis. Precedentes: RE 252.913 e RE 229.440. 3. A Portaria 62/95 do Ministrio de Minas e Energia, que limitou a atividade do transportador-revendedor-retalhista, foi legitimamente editada no exerccio de atribuio conferida pelo DL 395/38 e no ofendeu o disposto no art. 170, pargrafo nico, da Constituio. 4. Recurso extraordinrio conhecido e provido.80

    3. PODER DE POLCIA E SEGURANA NACIONAL

    Nunca se falou tanto sobre a segurana da sociedade quanto nos dias

    atuais. Assuntos como a exacerbada violncia e criminalidade tm sido discutidos

    nos mais variados meios de comunicao e tm ainda incitado e intrigado

    escritores e leitores das mais diversas classes sociais e nveis culturais.

    Conseqentemente, a grande indagao que se tem feito , se no

    exatamente desta forma, mas neste sentido, sobre o que foi feito de to grave

    para que a segurana falhasse tanto ao ponto de os ndices de violncia terem

    chegado ao nvel em que se encontram, pois at mesmo o mais simples dos civis

    desprovido de qualquer espcie de requinte tem sofrido os efeitos da insegurana,

    uma vez que mesmo no sabendo falar sobre eles, indesejavelmente possvel

    senti-los.

    Talvez a resposta no seja necessariamente afirmativa, ou seja, no se

    trata do que foi feito e sim do que no se fez. E vrias so as teorias e sugestes 79 BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE-AGR 397342/SC, relator ministro Czar Peluso, julgamento 08/08/2006, DJ 01-09-2006 pp- 01424 ement vol-02245-07 pp- 01424.80 BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE 349686/PE, relatora ministra Ellen Gracie, julgamento 14/06/2005, DJ 05-08-2005 pp- 00119 ement vol-02199-06 pp- 01118.

    34

  • que tentam explicar a desordem na qual se acha revestida a segurana nacional.

    H quem defenda a posio norte-americana de que a criminalidade

    diminuir se os criminosos forem tirados de circulao, assim como h quem

    afirme que a eficcia da segurana de um pas no se medir pelo nmero de

    presos que este possua.81

    Neste ngulo, h a grande discusso acerca do real papel de um presdio na

    vida de algum. Ou seja, at que ponto este ser humano ser reeducado para uma

    nova vida em sociedade, curado das anomalias do passado e no transformado em

    um criminoso mais perigoso do que era quando l entrou.

    H tambm quem concorde com a idia de que a soluo est em

    investimento capacitatrio das diversas polcias, como por exemplo, a adoo de

    mtodos de investigao altamente tecnolgicos que permitam aprimorar o

    trabalho de elucidao dos diversos crimes, bem como a integrao da polcia com

    a comunidade e ainda, o rigor nas leis e a celeridade nos processos. Os quais

    possibilitem ao criminoso ter cincia de que por ter cometido um crime, ir

    responder por ele de maneira substancial.82

    No podendo passar por despercebida, h a opinio de que o erro se

    encontra na falta de investimentos no setor educacional esta defendida pelo

    atual presidente do Brasil Lus Incio Lula da Silva uma vez que quando no se

    investe em escolas, necessrio ser investir-se em cadeias.83

    Em outra perspectiva, h quem v mais longe com a afirmao de que o

    colapso da segurana nacional encontra-se na falta de gesto do Estado, ou seja,

    na incapacidade do ente estatal de gerir de forma firme, coerente e produtiva

    aes voltadas no s para a punio de criminosos como para a preveno de

    possveis delitos e, conseqentemente promover uma situao de segurana para

    a populao.84

    81 MAINARDI, D. Vamos soltar os bandidos. VEJA, So Paulo, n. 18, p. 193, maio de 2005.82 MUELLER, R. Crime e castigo. VEJA, So Paulo, n. 44, p. 11, 14-15, novembro de 2005.83 CARNEIRO, M. e PEREIRA, C. Terror em So Paulo. VEJA, So Paulo, n. 20, p. 48, maio de 2006. 84 CARNEIRO, M. e PEREIRA, C. Terror em So Paulo. VEJA, So Paulo, n. 20, p. 48, maio de 2006.

    35

  • Uma vez que a segurana nacional funo do Poder Nacional e, portanto,

    imprescindvel convivncia da populao, necessidade bsica de toda e qualquer

    sociedade e ainda instrumento do poder pblico para que o homem possa realizar

    suas atividades do modo mais perfeito possvel.

    Alm de que, qualquer pas precisa estruturar-se para defender os valores

    nacionais contra ameaas que se manifestem, seja no mbito externo, das

    relaes internacionais, seja no mbito interno.85

    Esta preocupao , por exemplo, verificada no artigo 9 da Constituio

    portuguesa, o qual trata das tarefas fundamentais do Estado portugus:

    So tarefas fundamentais do Estado:(...)e) Proteger e valorizar o patrimnio cultural do povo portugus, defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do territrio;

    Nessa esteira, as atuaes do Estado voltadas para a promoo do bem-

    comum e conseqentemente de uma situao de segurana social, tm-se

    utilizado do poder de polcia como mecanismo de frenagem de direitos e liberdades

    individuais, o que tem demonstrado eficincia e aplausos por parte dos demais

    segmentos da sociedade brasileira.86

    Mormente, no Brasil apesar de os ndices de criminalidade estarem numa

    fase de grande repercusso, os dados que se tm no demonstram que haja uma

    ideologia por detrs das aes criminosas. Trata-se de uma criminalidade comum

    situada no mbito da ordem pblica.

    Entretanto, quando h ocorrncias que ameacem a ordem interna atravs

    de manifestaes pblicas e greves, as quais resultem em depredao de

    patrimnio pblico, so acionados os Servios de Informaes e a polcia de ordem

    poltica e social que buscaro medidas neutralizadoras dos grupos responsveis.87

    85 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 106.86 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 106.87 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 107.

    36

  • Por outro lado, ultimamente o que muito se tem verificado a atuao de

    policiais envolvidos em crimes, na maioria das vezes juntamente com criminosos.

    Alm de inmeras aes autoritrias que acabam por desencadear e confirmar por

    parte da populao o descrdito desta no fator segurana nacional.

    Alguns estudiosos afirmam que as aes autoritrias no mbito de policiais

    so mais comuns por parte da polcia ostensiva ou de segurana, as conhecidas

    polcias militares. Muito se devendo ao fato de que h certa dificuldade nesta fora

    em interpretar adequadamente suas misses e de se estruturar de conformidade

    com elas.88 Sobre este fato, complementa Jos Maria Pinheiro Madeira:

    Como esta polcia pouco investiga, acaba atuando arbitrariamente, passando por cima dos direitos individuais atribudos a todos os cidados pela Constituio Federal. E quando a prpria polcia descumpre a lei, pode-se ter a mais plena certeza de que a ordem interna no est garantida, assim como no est sendo preservada a ordem pblica nem assegurada segurana pblica aos cidados.89

    Sendo assim, o uso do poder de polcia como mecanismo de atuao do

    Estado, no estar atingindo sua finalidade por meio de aes carregadas de

    autoritarismo e, sem dvida, a omisso do ente estatal diante de uma necessidade

    to bsica e ao mesmo tempo de tamanha abrangncia como a segurana

    nacional, urge aes reparatrias de imprescindvel monta.

    4. POLCIA JUDICIRIA E POLCIA ADMINISTRATIVA

    O Poder de Polcia tambm pode ser denominado polcia administrativa.

    Esta sinonmia resulta de alguns ordenamentos, por exemplo, o francs. E, neste

    contexto, tornou-se clssica a diferenciao entre polcia administrativa e polcia

    judiciria.

    Comumente e em um primeiro momento, h uma tendncia predominante

    entre a doutrina de resumir a diferenciao entre as duas polcias atribuindo

    primeira um carter preventivo e segunda, um repressivo. No entanto, de acordo 88 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 107.89 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 109.

    37

  • com a lio de alguns autores, entre eles lvaro Lazzarini, esta diferenciao no

    absoluta, em vista de as duas polcias autuarem tanto preventiva quanto

    repressivamente.

    Exemplificativamente, uma atuao preventiva da polcia administrativa

    seria a proibio do porte de arma ou a direo de veculos automotores por quem

    no estivesse devidamente habilitado, ao passo que uma atuao da mesma

    polcia s que de forma repressiva seria por ocasio da apreenso de arma usada

    indevidamente ou de licena do motorista infrator.90 Jos Maria Pinheiro Madeira

    acentua, neste sentido:

    Mas ainda assim falta preciso ao critrio, pois se pode inferir que a polcia judiciria, embora seja repressiva em relao ao indivduo infrator da lei penal, tambm preventiva em relao ao interesse geral, porque, punindo-o, procura evitar que o indivduo volte a incidir na mesma infrao.91

    Notadamente, a polcia administrativa regida pelo Direito Administrativo,

    atua atravs de agentes credenciados por diversos rgos pblicos e incide sobre

    bens, direitos ou atividades, enquanto a polcia judiciria incide sobre as pessoas,

    regida pelo Direito Processual Penal92, tm como agentes policiais civis e

    militares e est diretamente relacionada com a liberdade de ir e vir.93 Outra

    diferena importante apontada por Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

    A polcia judiciria privativa de corporaes especializadas (polcia civil e militar), enquanto a polcia administrativa se reparte entre diversos rgos da Administrao, incluindo, alm da prpria polcia militar, os vrios rgos de fiscalizao aos quais a lei atribua esse mister, como os que atuam nas reas da sade, educao, trabalho, previdncia e assistncia social.94

    Neste sentido, complementa Jos Maria Pinheiro Madeira ao estabelecer

    ainda uma diferena entre a represso exercida pelas duas polcias. Ou seja, a

    90 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 37.91 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 37.92 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 240.93 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 39.94 DI PIETRO, Maria Slvia Zanella. Direito administrativo brasileiro. 16. ed. So Paulo: Atlas, 2003, p. 113.

    38

  • polcia administrativa age repressivamente quando obsta a uma atividade

    particular j em curso, uma vez que esta tenha se revelado divergente ao

    interesse pblico. A polcia judiciria reprime enquadrando o perturbador nas

    normas penais vigentes em auxlio ao Poder Judicirio.95

    No obstante, o mesmo autor acentua que a represso tpica da polcia

    administrativa somente se justifica enquanto ainda houver proveito na sua ao,

    isto , enquanto da sua aplicao ainda possam ser evitados danos futuros. Pois,

    uma vez que as atividades se encontrarem em fase final, ser considerado abuso

    por parte da Administrao o uso de sua competncia policial. .96

    Nesta esteira afirma lvaro Lazzarini que o fator de diferenciao entre as

    atividades exercidas pelas duas polcias no est relacionado com a qualificao do

    rgo policial em civil ou militar97, bem como no se atm a regras de organizao

    caracterizadas pela presena de coao.98

    Por outro lado, um fator de diferenciao vlido o fato de que os atos da

    polcia administrativa exaurem-se neles mesmos. Por exemplo, fundados em uma

    autorizao ou licena, no precisam buscar solidez em qualquer ato futuro. O

    que, por sua vez, no acontece com os atos da polcia judiciria que embasados

    pela perquirio de um acontecimento s encontram justificativa na inteno

    futura de serem submetidos ao Poder Judicirio.99

    Sendo assim, levando o carter ecltico de atuao das duas polcias no

    sentido de atuarem de modo preventivo e repressivo, necessrio acatar a lio

    de lvaro Lazzarini ao afirmar que o norte diferenciador reside na ocorrncia ou

    no de ilcito penal. Ou seja, quando este existir, tratar-se- com a polcia

    judiciria e quando se tratar de ilcito puramente administrativo, atuar a polcia

    administrativa.100

    95 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 38-39.96 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 41.97 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 241.98 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 42.99 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 41.100 LAZZARINI, lvaro. Estudos de direito administrativo. 2. ed. So Paulo: Revista dos Tribunais,

    39

  • 5. PRESERVAO DA ORDEM PBLICA E APURAO DE DELITOS

    O artigo 144 da Constituio Federal ao dispor sobre a segurana pblica e

    conseqentemente ao definir a competncia das foras policiais, atribui o exerccio

    das polcias civis e militares. O que impulsiona a constatao de atribuies

    previstas constitucionalmente a esses rgos de polcia. Assim dispe o texto

    legal:

    Artigo 144: (...)(...)4. s polcias civis, dirigidas por delegados de polcia de carreira, incumbem, ressalvada a competncia da Unio, as funes de polcia judiciria e a apurao de infraes penais, exceto as militares.5. s polcias militares cabem a polcia ostensiva e a preservao da ordem pblica;(...)

    Segundo essa norma, a polcia militar - forma de atuao da polcia

    administrativa - exerce o carter ostensivo, ou seja, a forma visvel de atuao

    atravs de uniformes, viaturas caracterizadas, equipamentos e armamentos,

    buscando promover a preservao da ordem pblica, e a polcia judiciria, por sua

    vez, atua investigativamente na apurao dos delitos. Acentua neste sentido Jos

    Maria Pinheiro Madeira:

    a) Polcia administrativa (polcia ostensiva e de preservao da ordem pblica, exercida pela autoridade de polcia administrativa), que tem por formas de atuao o policiamento ostensivo, velado e semivelado e a investigao (inteligncia policial: informaes). (...)

    b) Polcia judiciria (autoridade de polcia judiciria), que tem por formas de atuao a investigao criminal (apurao de delitos), polcia judiciria propriamente dita (procedimentos) e custdia de presos.101

    Entretanto, a crtica reside no fato de que na prtica h uma obscuridade no

    mbito de atuao de cada uma das polcias e ainda, entre elas, uma rivalidade,

    conduzindo a populao a um estado de incerteza sobre a quem dirigir suas

    queixas, alm de que a falta de clareza no exerccio das polcias facilita o abuso de

    autoridade por parte de policiais.102

    1999, p. 240.101 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 96-97.102 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 104.

    40

  • A priori, sabe-se que pelo menos at o presente momento, polcia militar

    cabe policiar as ruas na busca de promover a segurana da populao contra a

    ao de criminosos, e polcia civil, incumbe nas delegacias o registro das queixas

    de pessoas contra terceiros que lhe tenham causado algum dano. No entanto, os

    relatos abaixo demonstram consideravelmente a contrria realidade na atuao de

    grande parte da fora policial:

    Joo e Pedro caminhavam, no incio da noite, nas ruas da favela onde residem. Foram surpreendidos por uma viatura da polcia militar. Dois policiais desceram e com armas apontadas disseram aos rapazes para entrar na viatura. Dentro do automvel, receberam diversos pontaps e socos. Na delegacia de polcia, foram colocados numa cela mida com fios eltricos espalhados. Sofreram choques eltricos em vrias partes do corpo. Tudo foi acompanhado por policiais. O delegado fez diversas perguntas. Joo e Pedro desconheciam o assunto objeto das investigaes. Horas mais tarde, foram liberados, depois de muito sofrerem com a violncia policial. Foram constrangidos a ficarem calados.103

    No ltimo sbado, dia 27 de maro, as estudantes Brbara (Cefet- Edificaes) e Carolina (Pedagogia UFMG), sofreram absurda agresso de policiais militares no centro de Belo Horizonte. Quando faziam uma ligao de telefone pblico na esquina de rua Tupinambs com Avenida Afonso Pena, foram repentinamente cercadas por cinco policiais uniformizados, mas sem o velcro de identificao, que lhes deram voz de priso, as algemaram e arrastaram at o camburo da Rotam. Sem entender o despropsito da ao policial, revoltadas as estudantes reagiram e no aceitaram ser levadas para a viatura. Dezenas de camels e pessoas que passavam na rua no momento testemunharam a arbitrria e truculenta ao policial. Vrias delas, indignadas com tal violncia, se solidarizaram com as estudantes e tentaram evitar que as levassem dali, mas foram impedidas pelos policiais. Brbara e Carolina s tiveram conhecimento de que estavam sendo acusadas de fazerem parte de uma mfia de roubo cartes telefnicos quando chegaram na delegacia. De repente tudo que possuam se transformaram em provas contra elas: uma lista de telefone de colegas da faculdade tornou-se uma suposta lista de clientes para compra de cartes; R$ 200 (duzentos reais) do movimento, que se encontrava no bolso de Brbara, foram transformados em dinheiro conseguido com a venda de cartes; os cartes de telefone sem unidades encontrados com Carolina viraram cartes roubados para serem vendidos. Alm disso, diziam estar de posse das estudantes uma chave de telefone nunca vista por elas. O despautrio desta situao s provou o quando eram mentirosas as acusaes, sendo a polcia obrigada a liber-las no final do dia. Havia todo um teatro preparado a espera das companheiras. A imprensa chegou em menos de vinte minutos na delegacia, servindo de porta-voz da verso da PM, respaldando todas as falsificaes e manipulando as informaes. Sem

    103 DHNET (Direitos humanos na internet). Violncia, maus-tratos e tortura. Disponvel em: www.dhnet.org.br/dados/cartilhas/dh/br/cdhcf/cartilha_cdh/03_violenciatortura.htm - 18k. Acesso em 11 de agosto s 23h30min.

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  • nenhuma prova a imprensa deu seu veredicto. O sensacionalista jornal Cidade Alerta (TV Record), com seu reprter de dedo em riste, acusou-as de criminosas, chamou-as de pilantra, expondo sua imagem de forma a desmoraliz-las perante a sociedade. O reacionrio jornal Estado de Minas tambm divulgou as falsas informaes (por exemplo, a de que elas teriam sido presas em flagrante), ocupando mais da metade do espao da matria com uma foto das companheiras. (...)104

    Esses e muitos outros exemplos de arbitrariedade por parte de policiais

    tm contribuindo e incitado a desconfiana e decepo da populao no exerccio

    da atividade policial. Por exemplo, um grande fator de descrdito, a forma como

    agem, principalmente os policiais militares, com emprego de fora, como se a

    criminalidade e violncia somente se combatessem dessa forma.

    Assim, a criminalidade e a violncia, portanto, no ho de ser combatidas

    apenas com o emprego da fora. Esta compreenso no deve impregnar a mente

    nem das pessoas comuns, nem dos integrantes das foras policiais.105

    Entretanto, no Brasil e em muitos outros pases, h a presena da

    impunidade impulsionando as aes dos infratores da lei. E quando se fala em

    infratores da lei, entende-se no somente os criminosos de maneira geral, mas

    tambm os profissionais empregados no combate ao crime, uma vez que no

    atuem da forma devida e, portanto, sendo omissos ou aceitando subornos.106

    A impunidade, portanto, gera a certeza de que nada acontecer aos

    infratores da lei e permite que a criminalidade atinja os nveis assustadores em

    que se encontra. A partir disso, notrio que o combate impunidade de todos,

    inclusive por parte dos policiais, atravs da investigao criminal levada a srio e

    dos servios de inteligncia policial desenvolvidos pelas polcias militar e civil,

    torna-se possvel acreditar no fim ou pelos menos no controle da criminalidade.

    Comunga com esta idia Jos Maria Pinheiro Madeira ao afirmar que:

    Uma polcia que funcione inteligentemente, ou seja, desenvolvendo a investigao, poupar muitas vidas inocentes, solucionar crimes

    104 MEPR (Movimento Estudantil Popular Revolucionrio). Mais um ato de violncia da polcia contra o povo. CMI, Belo Horizonte, abril de 2004. Disponvel em: http://estudantesdopovo.hpg.com.br. e www.midiaindependente.org. Acesso em 11 de agosto s 23h40min.105 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 99.106 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 100.

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  • enigmticos, respeitar o homem e far com que a populao, constituda predominantemente por pessoas de bem, a respeite, em vez de tem-la. No ser a polcia ostensiva apenas que dever estar empenhada na luta contra o crime e, portanto, no ser ela a nica a responder pela preservao da ordem pblica.107

    Sendo assim, ao se contar com duas polcias, cujas atividades

    preceituadas pela Constituio Federal versem precipuamente promoo de uma

    situao de segurana a toda uma populao, seja na investigao e apurao de

    delitos ou ainda na preservao direta da ordem pblica, mister que contemos

    com a ao conjunta e eficaz das duas de maneira que no hajam dvidas sobre o

    papel de cada uma e que o fim a que se propem seja atingido.

    CAPTULO III: O PODER DE POLCIA NO ESTADO DEMOCRTICO DE DIREITO

    1. CARACTERSTICAS OU ATRIBUTOS DO PODER DE POLCIA

    1.1 Noes

    H em torno do poder de polcia, a grande discusso acerca da tnue linha

    de separao entre o seu cumprimento, ou seja, a restrio s aes particulares

    em nome do bem-comum, e ao mesmo tempo da preservao da liberdade

    individual. Por isso, mister que se acentue as caractersticas atribudas a este

    poder, com o objetivo de esclarecer at que ponto legtima a atividade

    administrativa ao exerc-lo.

    Na lio de Hely Lopes Meirelles, os atributos do poder de polcia so a

    discricionariedade, a auto-executoriedade e a coercibilidade.108 Entretanto, alguns

    107 MADEIRA, Jos Maria Pinheiro. Reconceituando o poder de polcia. 1.ed. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2000, p. 101.108 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 32. ed. So Paulo: Mallheiros, 2006, p.

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  • autores entre eles Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Jos Maria Pinheiro Madeira,

    Jess Torres e outros, lecionam que alm dessas caractersticas h ainda o fato de

    o poder de polcia corresponder a uma atividade negativa. Sero aqui expostos os

    atributos do poder de polcia com o intuito de elucidar as nuances destes bem

    como atravs de exemplos que possibilitem uma perfeita compreenso.

    1.2 A discricionariedade do poder de polcia

    No tocante discricionariedade, unnime entre os doutrinadores a

    afirmativa de que sua aplicao deve antes de tudo, ser analisada com cautela.

    Isto, porque o termo discricionrio significa arbitrrio; desptico.109 guisa