plantas medicinais

Upload: glenia-moura

Post on 07-Jul-2015

664 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIOPor Suelma Ribeiro Silva, Ximena Buitrn, Lcia Helena de Oliveira e Marcus Vincius M. Martins A pesquisa para este relatrio foi financiada pelo Ministrio de Cooperao Econmica e Desenvolvimento da Alemanha (Bundesministerium fr Wirtschaftliche Zusammenarbeit BMZ) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis (IBAMA).

Foto: Slvia Marina Ribeiro Silva

Vendedor de plantas medicinais e produtos derivados. Feira VER O PESO. Belm -PA.

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

ii

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

NDICEABREVIATURAS AGRADECIMENTOS RESUMO ANTECEDENTES INTRODUO METODOLOGIA ASPECTOS GERAIS DA LEGISLAO AMBIENTAL Instrumentos legais relacionados s plantas medicinais: Pesquisa Acesso a Recursos Genticos Lei de Crimes Ambientais Explorao, produo, transporte e comrcio Sistema Integrado de Comrcio Exterior SISCOMEX Comrcio e conservao Acordos internacionais: CDB, CITES Plantas medicinais e listas de espcies de flora ameaadas Iniciativas relacionadas com o comrcio e a conservao de plantas medicinais ASPECTOS DA LEGISLAO SANITRIA PARA FITOTERPICOS COMRCIO DE PLANTAS MEDICINAIS Espcies, partes e produtos comercializados Comrcio interno e externo Exportaes Importaes Extratores, produtores e comerciantes CONCLUSES E RECOMENDAES BIBLIOGRAFIA ANEXOS v viii ix 1 4 7 8 8 8 9 9 9 14 17 17 18 21 26 26 26 27 28 30 32 34 38 I

iii

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

NDICE DE FIGURAS, TABELAS E ANEXOS FIGURA 1FIGURA 2Mapa poltico do Brasil Extratores, produtores e comerciantes de plantas medicinais registrados pelo IBAMA por Estado. Categorias de atividades, relacionadas com plantas medicinais, existentes no Cadastro Tcnico Federal do IBAMA e valores de registro Principais captulos da NCM que incluem os produtos de origem vegetal aplicados a medicamentos Tratamento administrativo para a exportao de plantas medicinais Tratamento administrativo para a importao de plantas medicinais adotado pela Secretaria de Comrcio Exterior Espcies de uso medicinal includas em listas de espcies de flora ameaadas do Brasil Lista oficial das espcies cujos efeitos teraputicos foram comprovados cientificamente Principais plantas medicinais exportadas no perodo de 1994 a 1996 segundo a SECEX Rota de exportao do leo de Pau-rosa (Aniba rosaeodora) Principais plantas medicinais importadas no perodo de 1994 a 1998* vii

31

TABELA 1-

10

TABELA 2-

14 15

TABELA 3TABELA 4-

16

TABELA 5-

20

TABELA 6-

25

TABELA 7-

29 29 30

TABELA 8TABELA 9-

TABELA 10 - Valores de exportao de plantas medicinais realizadas por 36 empresas (1994 a 1998*) TABELA 11- Principais estados brasileiros exportadores de plantas medicinais (1994-1998*) TABELA 12- Principais pases importadores de plantas medicinais do Brasil (19941998*) ANEXO 1aANEXO 1bClassificao de produtos da Erva-mate Tabela de converso: consumo de Erva-mate bruta com relao produo do produto processado "Lista de Espcies da Flora Brasileira Ameaadas de Extino" Plantas medicinais nativas utilizadas e comercializadas pelo Brasil

32

33

33 I

II III VII

ANEXO 2ANEXO 3-

iv

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

ABREVIATURAS AAO-SP AEPAM ANVS ATPF BMZ CEME CDB CIPLAN CITES CNPq CONAFIT CONATEN DECEX DIMED DINAL DIRE DIREN EMATER EMBRAPA FBCN GCTC IBAMA IBGE IBDF MICT MDIC MMA MPSG MS NCM PNUD PPPM RET SBB SCE Associao de Produtores Orgnicos de So Paulo Associao de Extratores e Produtores de Plantas Aromticas e Medicinais Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria Autorizao para o Transporte de Produto Florestal Ministrio de Cooperao Econmica e Desenvolvimento da Alemanha (Bundesministerium fr Wirtschaftliche Zusammenarbeit) Central de Medicamentos Convno de Diversidade Biolgica Comisso Interministerial de Planejamento Conveno sobre o Comrcio Internacional de Espcies Ameaadas de Fauna e Flora Silvestres Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico Subcomisso Nacional de Assessoramento em Fitoterpicos Comisso de Assessoramento Tcnico Cientfico em Medicamentos Departamento de Comrcio Exterior Diviso de Medicamentos Diviso de Vigilncia Sanitria de Alimentos Diretoria da Unidade de Conservao e Vida Silvestre Diretoria dos Recursos Naturais Renovveis Empresa de Assistncia Tcnica e Extenso Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria Fundao Brasileira para a Conservao Grupo Consultor Tcnico Cientfico em Produtos Naturais do Ministrio da Sade Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal Ministrio de Cincia e Tecnologia Ministrio de Desenvolvimento, Indstria e Comrcio Exterior Ministrio de Meio Ambiente Grupo Especialista de Plantas Medicinais (Medicinal Plant Specialist Group) Ministrio da Sade Nomenclatura Comum do Mercosul Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento Programa de Pesquisa de Plantas Medicinais Regime Especial de Transporte Sociedade Botnica do Brasil o SECEX (nome antigo) Secretaria de Comrcio Exterior

v

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

SISCOMEX SISREG SNVS SUS SVS TRAFFIC UFC UICN VS WCMC

Sistema Integrado de Comrcio Exterior Sistema de Registro do IBAMA Secretaria Nacional de Vigilncia Sanitria Sistema nico de Sade Secretaria de Vigilncia Sanitria Anlise de Registros de Flora e Fauna em Comrcio (Trade Records Analysis of Flora and Fauna in Commerce). Universidade Federal do Cear Unio Mundial para a Natureza Vigilncia Sanitria Centro Mundial de Monitoramento de Conservao (World Conservation Monitoring Centre)

vi

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

FIGURA 1. Mapa poltico do Brasil Estados Brasileiros e o Distrito Federal. AC-Acre, AM-Amazonas, AP-Amap, AL- Alagoas, BABahia, CE-Cear, DF-Distrito Federal, ES-Esprito Santo, GO-Gois, MA-Maranho, MG-Minas Gerais, MS-Mato Grosso do Sul, MT-Mato Grosso, PA-Par, PB-Paraba, PE-Pernambuco, PIPiau, PR-Paran, RJ-Rio de Janeiro, RN-Rio Grande do Norte, RO-Rondnia, RR-Roraima, RS-Rio Grande do Sul, SC- Santa Catarina, SE-Sergipe, SP- So Paulo, TO-Tocantins.

vii

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

AGRADECIMENTOS Ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis IBAMA- pelo apoio financeiro e tcnico dado durante o desenvolvimento deste trabalho, principalmente pelos seguintes profissionais: Ademar Takeo Matsunaga-DIREC, Fernando DalAva-DIREC, Francisco de Assis No-DIREC, Maria Iolita Bampi-DIREC, Lus Mrcio Haddad Pereira-DIREC, Ricardo Soavinski-MMA (ex funcionrio do IBAMA), Vanda Ferreira Carvalho-DIREN, Marco Antnio Martins Mendoa-DIREN, Francisco Carlos Ramos-DIREN e Randolf Zachow-DIREN. TRAFFIC Amrica do Sul pelo apoio realizao deste trabalho, atravs do Projeto Apoio para um manejo mais eficaz do comrcio de plantas medicinais na Amrica do Sul, financiado pelo Ministrio de Cooperao Econmica e Desenvolvimento da Alemanha - BMZ. A Clara Alcione Martins, Presidente da Comisso de Plantas Medicinais do Distrito Federal (Centro de Desenvolvimento Sustentvel da Universidade de Braslia CDS/UnB) e Henriqueta T. do Sacramento (Coordenao de Plantas Medicinais em Servios Pblicos - CNPMSP), pela informao referente aos aspectos da legislao sanitria, a ambas por seu valioso tempo e contribuio na reviso do texto. Ao consultor do IBAMA, Joo Bosco Costa Dias, pelas informaes referentes ao Sistema de Comrcio Exterior - SISCOMEX. s consultoras do IBAMA, Elisngela Ribeiro Alves e Renata Correa Martins e, a Anita Sancho, de TRAFFIC Amrica do Sul, pela reviso dos nomes cientficos presentes neste trabalho. Aos estagirios Leandra Resende Tofeti e Eduardo Jorge P. L. Rocha, alunos de Engenharia Florestal da Universidade de Braslia, pelo apoio na compilao de alguns dados apresentados neste trabalho. Aos revisores da minuta inicial do relatrio por seu valioso tempo e contribuio: Roberto Fontes Vieira, Especialista em plantas medicinais e aromticas (CENARGEN-EMBRAPA); Dulce M. De Castro (Universidade Nacional Estadual de So Paulo); Uwe Schippmann (Chefe da Autoridade Cientfica CITES para Plantas da Alemanha); Teresa Mulliken (TRAFFIC International); Nina Marshall (ex-funcionria de TRAFFIC Europe) e Bernardo Ortiz (TRAFFIC Amrica do Sul). Finalmente, a Lorena Hidalgo (TRAFFIC Amrica do Sul) pela reviso de tabelas e anexos, a Ricardo Centeno (Aristos) pelo desenho e diagramao do texto e a Eunice do Carmo (Centro de Estudos Brasileiros) pela reviso do texto em Portugus.

viii

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

RESUMO Atravs do projeto Apoio para uma melhor utilizao e comercializao de plantas medicinais na Amrica do Sul, executado por TRAFFIC Amrica do Sul com o apoio de BMZ, e o projeto Levantamento das Plantas medicinais comercializadas pelo Brasil, executado pelo Setor de Flora e CITES da Diretoria da Unidade de Conservao da Vida Silvestre DIREC, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis IBAMA, comeou a pesquisa sobre as principais espcies de plantas medicinais comercializadas pelo Brasil, com nfase naquelas comercializadas pelas empresas registradas no IBAMA, assim como na legislao relacionada e estratgias para sua conservao e uso sustentvel, com a finalidade de determinar aes prioritrias para promover uma melhor utilizao e comrcio das plantas medicinais e seus produtos derivados. Ainda que seu objetivo no tenha sido alcanado em sua totalidade, at a data desta publicao, no que se refere obteno de informao que reflita a situao real do pas sobre o tema - devido em parte pela falta de sistematizao de dados da atividade comercial e das espcies utilizadas com este fim, assim como dos esforos nacionais no que se refere a estratgias para a conservao, os resultados so importantes e precisam ser difundidos e compartilhados com outros setores, com a finalidade de integrar esforos na busca de maior informao, de soluo e estratgias especficas para os problemas e vazios identificados, assim como para a determinao de prioridades de ao e pesquisa. Este trabalho pretende apresentar e divulgar as informaes referentes aos aspectos gerais relacionados com utilizao e comrcio de plantas medicinais no e desde Brasil, como uma base para aprofundar o estudo sobre o comrcio destes recursos no pas. O IBAMA continua socializando a informao recopilada e realizando um estudo mais detalhado sobre os aspectos especficos do comrcio e impactos relacionados com o estado de conservao das espcies, incluindo estudos de mercados e a obteno de dados que vo alm daqueles registrados pelo IBAMA-Sede, para identificar aes futuras. A utilizao popular das plantas medicinais no Brasil, com fins teraputicos e rituais religiosos, provm de diferentes origens e culturas tradicionais, principalmente de ndios brasileiros e seitas afro-brasileiras, e da cultura e tradio africana e europia. O uso e o comrcio destes recursos, como em outros pases, foram estimulados pelas necessidades de uma crescente populao que demanda cada vez mais plantas medicinais para o cuidado de sua sade e para seus cultos e tradies religiosas; pela facilidade de acesso devido aos custos elevados da medicina ocidental, aos efeitos colaterais provocados pelos frmacos sintticos, alm do crescente interesse nacional e internacional pelo potencial teraputico e econmico que representam e a demanda de novos produtos pela indstria farmacutica (Berg, 1993; Carrara, 1995; Simes et al. 1998). Entre as plantas valiosas do Brasil para fins medicinais podem ser citados o Curare indgena ou Dedaleira (Digitalis purpurea), utilizada na preparao do ch contra a hidropisia provocada pela insuficincia cardaca, antes de ser descoberta a ao da Digitalina sobre o msculo cardaco, a Casca danta (Drimys brasiliensis) com propriedades estomquicas, a Quina (Cinchona calisaya) utilizada na cura da malria, a Ipecacuanha (Cephaelis ipecacuanha) utilizada para tratar diarrias, disenteria amebiana, catarros crnicos, hemorragias e asmas, e a Sapucainha (Carpotroche brasiliensis) com efeitos antiinflamatrios comprovados cientficamente e cujo leo extrado da semente empregado no tratamento da lepra (Carrara, 1995). Os instrumentos legais relacionados com as plantas medicinais se encontram includos em legislaes gerais e no permitem um controle adequado para as atividades de extrao, uso e comrcio das mesmas. Isto se deve, em parte, falta de maior claridade e especificidade em determinados instrumentos legais, nos sistemas de registro, seja de atividades relacionadas ou de categorias para os recursos utilizados e, principalmente, falta de difuso e conhecimento sobre as normas existentes e de monitoria e fiscalizao sobre sua aplicao. As causas destes problemas tambm obedecem a outros fatores como a carncia de pessoal especializado e de infra-estrutura, assim como a falta de coordenao entre os diversos rgos de controle.

ix

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

A pesar de existirem decretos que regulamentan as atividades de explorao e comrcio em alguns biomas especficos como Amaznia, Mata Atlntica e Caatinga, as ferramentas ou instrumentos para sua correta aplicao ainda possuem vazios quanto a definies claras e critrios especficos, como o caso dos Planos de Manejo requeridos. Algumas disposies no so cumpridas e tambm no est claro a existncia ou no de monitoramento, ou se as medidas exigidas so ajustadas realidade local para serem corretamente implementadas. As categorias de registro para as atividades relacionadas com a extrao, produo e comercializao correspondem a categorias muito gerais, o que torna difcil determinar as atividades especficas que se relacionam exclusivamente a plantas com fins medicinais. As plantas medicinais eram registradas, em geral, como Plantas vivas ou dentro de outras categorias incluindo plantas ornamentais, frutos, resinas, etc., o que torna difcil determinar as espcies medicinais comercializadas. Desde 1999 feita uma distino entre as categorias Plantas Medicinais/Aromticas e Plantas Ornamentais. Algumas espcies como Aroeira legtima (Astronium urundeuva), as Baranas (Melanoxylon brauna y Schinopsis brasiliensis), Gonaloalves (Astronium fraxinifolium), Erva-mate (Ilex paraguariensis), Castanheira (Bertholletia excelsa), Seringueira (Hevea spp.), o Pequizeiro (Caryocar spp.) e Pau-rosa (Aniba rosaeodora) apresentam instrumentos legais especficos que regulamentam sua explorao e comrcio. No entanto, no existem dados disponveis que permitam analisar se so cumpridos os requerimentos estabelecidos ou a pertinncia das medidas existentes e sua eficcia. O avano da parte legal depender, em grande medida, dos resultados que se alcancem uma vez sejam definidas leis e regulamentaes que esto em processo como aquela relacionada com o Acesso aos Recursos Genticos que ainda se encontram em discusso e que se espera que regulamente em grande medida as atividades relacionadas com o comrcio de plantas medicinais, desde a pesquisa at a exportao e fortifique outras medidas existentes consideradas ainda frgeis e pouco claras. Ainda existem normativas que fornecem linhas de ao, estas no so muito especficas com relao a mecanismos de implementao e critrios de avaliao e sua relao com as medidas provisrias que incluem temas e conceitos relevantes relacionados com a proteo e acesso ao conhecimento tradicional associado, distribuio de benefcios e utilizao de patrimnio gentico. Por outro lado, no claro se estas medidas so suficientes e se so aplicadas adequadamente, se requer uma avaliao a respeito. A pesar de existir instrumentos legais que permitem a penalizao de crimes ambientais, os dados registrados so insuficientes ou so manejados de modo muito geral para obter informao concreta sobre os delitos relacionados. Existem sistemas de controle estabelecidos, com nfase no comrcio exterior. Desta forma, se explica porque existe maior informao relacionada com plantas medicinaies para exportao e importao. Ainda assim, so considerados sistemas insuficientes para gerar dados mais transparentes sobre o comrcio de plantas, sendo uma das causas principais o sistema de registro realizado pelo nome popular e no pelo nome cientfico, o que dificulta o conhecimento real das espcies comercializadas. Se requer maior coordenao e consulta entre os diferentes organismos de controle, neste caso entre a SECEX e o IBAMA e com outros rgos relacionados, alm de intercmbio de informao entre os escritrios estaduais do IBAMA com a Sede em Braslia. Com relao legislao sanitria para fitoterpicos, existe uma Farmacopia Brasileira desde 1929 com espcies botnicas brasileiras e estrangeiras que at hoje geram dvidas sobre sua validade. Desta Farmacopia foram excludas numerosas espcies da flora brasileira devido ausencia de ao teraputica e desuso de drogas, fato contraditrio com a utilizao atual destas plantas, presentes em medicamentos fitoterpicos utilizados pela indstria farmacutica brasileira. A lei 5.991 de 1973 rege sobre o controle sanitrio do comrcio de drogas de modo que sua venda seja somente por farmcias e ervanrios. Nos anos 90, ocorrem mudanas nas normativas de medicamentos fitoterpicos devido a avaliaes tcnicas, proibindo, entre outras, o uso do Confrei (Symphytum officinale), identificado como hepatotxico. At 1996, os produtos fitoterpicos podiam ser vendidos como produtos naturais sem requerer estudos pr-clnicos nem de toxicidade. Atualmente estes e outros estudos so exigidos pelas Secretarias de Sade

x

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Estaduais e Municipais que se tornaram responsveis de realizar a vigilncia sanitria de produtos fitoterpicos comercializados no pas. Em 1998, criada a CONAFIT - Subcomisso Nacional de Assesoramento em Fitoterpicos pela Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria onde o Ministrio da Sade se interessa em trabalhar com a especificidade dos fitoterpicos, nomeando especialistas para assessorar em aspectos tcnicos, normativos e cientficos para a eficcia e segurana de seu uso, estabelecendo uma nova norma publicada por concenso em 2000 (R:D:C: N.17), atravs da qual criado o Produto Fitoterpico Tradicional e apresentada uma Lista de Medicamentos Tradicionais elaborada com base na literatura cientfica mundial de carter acadmico. Atualmente, a Agncia trabalha em uma anlise de processos de registro e existe maior empenho por parte do industrial em obter este registro para comercializar, ainda que houve um comrcio desordenado por desconhecimento da origem e das novas exigncias. Ante a dificuldade de oferecer assistncia farmacutica integral, ainda fica o espao aberto para que a populao continue utilizando tratamentos com raizeiros e curandeiros em busca de alvio imediato, mas com carncia de viso sobre os aspectos sanitrios. Se reconhece o esforo na regulamentao do tema, apesar de tantas mudanas ocorridas e de experincias valiosas para o pas quanto ao desenvolvimento da pesquisa e ao controle de fitoterpicos, como o Programa de Pesquisa de Plantas Medicinais de 1983, que permitiu comprovar a eficcia teraputica de espcies nativas como a Espinheira-santa (Maytenus ilicifolia) e a publicao, em 1994, do Manual de Boas Prticas de Fabricao. A discusso sobre o tema cresce, em parte, pelo potencial econmico que representa e como alternativa na gerao de emprego e ingressos de forma sustentvel, elevando a discusso da fitoterapia ao plano das polticas nacionais de sade. O comrcio de plantas medicinais envolve vrias espcies e inclui partes, produtos e subprodutos de plantas, sendo a maioria comercializadas somente pelo nome popular. O comrcio local no est controlado, inclui plantas medicinais muitas vezes no estudadas ou ainda no identificados seus princpios ativos para valid-las como medicamentos ou aproveitlas adequada e econmicamente. As plantas so utilizadas por uma variedade de usurios localizados em qualquer lugar do pas. Algumas plantas possuem grande importncia comercial como o Jaborand (Pilocarpus spp.) e a Fava danta (Dimorphandra mollis) (Ferreira, 1998). Existem redes extensas de comerciantes que abastecem feiras livres e ervanrios. O comrcio crescente, notando-se nos grupos de comerciantes atacadistas responsveis pelo abastecimento de todas as feiras livres por regio. Os praticantes e comerciantes se denominam de diferentes maneiras segundo sua atividade, como os mateiros (comerciantes de plantas medicinais em feiras livres), rezadores (utilizam ch e outros "medicamentos" em rezas), parteiras, umbandistas (praticantes de medicina vinculada religio, incorporando tradies culturais, rituais) e raizeiros (curandeiros, utilizam medicina popular). At o momento somente 119 espcies de plantas medicinais utilizadas e comercializadas foram identificadas e reportadas pelo IBAMA (Sede), das cuais 88 citam-se.como nativas. Em geral, a qualidade das informaes oficiais relacionadas com o comrcio das espcies insuficiente para determinar a dimenso real desta atividade e seu impacto sobre os recursos utilizados. Para citar um exemplo, vrias espcies so usadas, comercializadas e registradas somente com o nome popular ou comum, ou com o nome cientfico incorreto. Desta forma, nem todas as plantas utilizadas e comercializadas so necessariamente aquelas assinaladas nos reportes oficiais; somente a observao nos mercados locais e lojas de venda demonstra que so muitas mais. Informaes tais como a localidade de coleta, destino e preo da planta comercializada tm sido omitidas e/ou no requeridas durante a obteno de dados oficiais. Algumas espcies de uso medicinal esto relatadas como espcies ameaadas em livros e listas de espcies raras ou ameaadas publicados no Brasil (Klein, R., 1996), comprovando-se sua venda em mercados e farmcias locais de produtos naturais. A pesar de que uma das causas de ameaa se atribui presso exercida pelo extrativismo excessivo de algumas espcies, foi possvel verificar que para a maioria das espcies conhecidas e/ou registradas como utilizadas e comercializadas, no esto disponveis as informaes sobre o estado de conservao das mesmas e que foram desenvolvidos poucos trabalhos nesta direo.

xi

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Somente 107 espcies de plantas esto listadas oficialmente como ameaadas no Brasil, das quais somente 4 coincidem com aquelas indicadas nas listas da UICN: Aniba rosaeodora, Brosimum glaziovii, Caesalpinia echinata e Ocotea pretiosa e 16 so citadas como utilizadas e comercializadas para fins medicinais na informao registrada pelo IBAMA. Nas listas de espcies ameaadas do Brasil, realizadas por diferentes estados, 54 espcies se reportan com uso medicinal, das quais 33 se citam tambm como comercializadas, sem especificar se comrcio local ou internacional. As cifras so baixas considerando a dimenso e realidade do pais. Outras espcies consideradas como raras e em perigo de extino so a Lngua de Vaca (Plantago guilleminiana), utilizada como antiinflamatrio e depurativo do sangue, P. commersonina, febrfuga, tnica, utilizada para a cura de anginas; P. australis, desinflamatrio e P. catharinea, para a cura do cncer de prstata (Klein, 1996). As cifras so baixas considerando a dimenso e realidade do pas. Espcies ameaadas principalmente pela destruio de habitat so a Duguetia glabriuscula, Krameria tomentosa e a Dimorphandra wilsonii. Aquelas ameaadas por sobreexplorao para fins medicinais so os Carapis: Dorstenia arifolia, D. cayapia, D. elata e D. sucrei, seus rizomas so extrados para a aromatizao da fumaa de cachimbo (Brando, 2000), assim como as espcies conhecidas como Jaborand (Pilocarpus spp.) e Arnica (Lychnophora ericoides). Dez espcies daquelas listadas como ameaadas em diferentes listas do Brasil, so tambm reportadas como exportadas: Anemopaegna arvense, Aniba rosaeodora, Astronium urundeuva, Bertholletia excelsa, Hymenaea courbaril, Maytenus ilicifolia, Pilocarpus microphyllus, Psychotria ipecacuanha, Stryhnodendron adstringens e Tabebuia heptaphylla, e destas, somente A. rosaeodora, A. rurundeuva, B. excelsa e S. adstringens apresentam legislaes especficas para sua explorao e/ou comercio. Apesar de estar proibida sua exportao, o Jaborand (Pilocarpus spp.) e a Fava dnta (Dimorphandra mollis) ainda so exportadas. Esta ltima associada Rutina, um fitofrmaco utilizado para provocar as contraes uterinas que, associada vitamina C, confere resistncia e permeabilidade s paredes dos vasos capilares (Rizzini & Mors, 1976); Pilocarpus tem uso medicinal relacionado com a oftalmologia, no tratamento de glaucoma. Ambos so os responsveis pelas maiores vendas ao exterior (Ferreira, 1998). Dados reportados de 1991 a 1998 indicam a exportao de vrias plantas includas dentro de categorias mais gerais como "Material Vegetal do Brasil" e, dentro desta, "Vrios", "Sucos e Extratos Vegetais", "leos Essenciais", "Blsamos, sucos e extratos", "Outros", "Outros sucos e Extratos Vegetais", "Outras Plantas p/perfumaria/medicina e similares", destacando-se a Copaba (Copaifera multijuga), Pau-Rosa (Aniba rosaeodora), Ipecacuanha (Cephaelis ipecacuanha), Guaran (Paullinia sp.), Sene (Senna sp.), Ginseng brasileiro (Pfaffia paniculata), Jaborandi (Pilocarpus spp.), Arnica (sem especificar espcie), Boldo (Peumus boldus), Casca sagrada (Rhamnus purshiana) e algas (Estrella, 1995; Ferreira, 1998 e Almeida et al., 1998). Entre as plantas importadas se encontram vrias das que o Brasil exporta, indicando possveis re-exportaes, como Arnica, Boldo, Sene, Ginseng, Guaran, Ipecacuanha e algas frescas para medicina, alm de produtos como "blsamos, resinas, extratos vegetais e outros" (Ferreira, 1998). A maioria dos extratores de plantas medicinais registrados se encontram no estado do Maranho e a maioria dos produtores se encontram no estado do Acre. Os estados do Paran e So Paulo se destacam como os maiores exportadores, enquanto os Estados Unidos o maior importador de plantas medicinais do Brasil, seguido da Alemanha. O relatorio constitui uma contribuio preliminar sobre as espcies de plantas medicinais comercialidas pelo Brasil, com nfase naquelas reportadas pelo IBAMA, espcies ameaadas e sobre a legislao relacionada tanto na rea ambiental como na de sade, refletindo a complexidade do tema. Esta informao serve como base para o desenvolvimento de estudos mais detalhados a respeito, como insumo em discusses relacionadas e para ser compartilhada com outros setores e especialistas trabalhando no tema. A mesma dever ser verificada, validada e complementada com estudos de campo e com outra informao a respeito existente no pas, com a finalidade de discutir e definir as prioridades de ao e pesquisa.

xii

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Se requer maior pesquisa sobre aspectos especficos relacionados com a recoleo e comrcio para o consumo nacional e internacional e os impactos destas atividades que influem no estado de conservao das espcies utilizadas. Faz falta uma anlise mais profunda sobre a aplicao de leis e regulamentaes relacionadas, assim como a de ferramentas de controle existentes para poder promover melhorias ou reformas nas atuais. A partir da informao preliminar compilada, o IBAMA conta com uma viso geral sobre a problemtica desta atividade e sobre os vazios existentes que oferecem obstculos a um adequado manejo, comrcio e controle dos recursos utilizados. Atravs de uma maior compreenso e conhecimento sobre o tema e de uma melhor e maior integrao com os setores envolvidos se conseguir definir conjuntamente aes necessrias para promover polticas e estratgias adequadas que permitam melhorar o manejo, comrcio e conservao das espcies de plantas medicinais. Para a TRAFFIC, o tema das plantas medicinais continua sendo de importncia global e uma prioridade dentro de sua agenda de trabalho, com nfase em reforar a segurana e conservao destes recursos cultural e econmicamente significativos, sua contribuio sade humana e desenvolvimento rural, atravs de medidas efetivas de manejo. TRAFFIC continuar trabalhando e apoiando esforos e iniciativas relacionados desta e de outras instituies e setores.

xiii

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

ANTECEDENTES O uso de plantas medicinais uma prtica comum no pas, a qual tem sido transmitida de gerao em gerao (FNP Consultoria e Comrcio, 1999) e realizada por meio do extrativismo 1 (WWF, 1998). Tem sua origem na cultura dos diversos grupos indgenas que habitavam o pas (Simes et al. 1998), misturada, ainda, com as tradies de uso dos europeus e africanos que chegaram posteriormente e constitui a atual farmacopia local, despertando grandes interesses nacionais e internacionais pelo potencial teraputico e econmico que representa (Berg, 1993). A utilizao e comercializao de plantas medicinais tem sido estimuladas, em parte, pela crescente demanda da indstria por novas fontes naturais de medicamentos e, por outro lado, devido aos efeitos colaterais causados pelos frmacos sintticos que estimulam o aproveitamento de medicamentos de origem vegetal ou, em muitos casos, porque representam a nica fonte de medicamentos, especialmente nos lugares mais isolados e distantes (Berg, 1993) e como resposta aos problemas imediatos de sade (DeFilipps, 2001). Segundo Carrara (1995), em certas seitas, as necessidades da massa rural, privada de socorros mdicos, impulsa a criao de templos onde "o sacerdote se transforma em curador e o culto em uma consulta aos espritos". Muitas plantas frequentemente utilizadas por populaes locais ainda no foram estudadas ou seus princpios ativos ainda no foram identificados para valid-las como medicamentos ou para aproveit-las econmicamente (Berg., 1993). Ainda assim, muitas plantas so utilizadas e comercializadas na atualidade e o Brasil, um dos pases com maior biodiversidade do mundo, se revela como um importante e potencial provedor de um recurso to valioso como as plantas medicinais. Como exemplos de plantas valiosas do Brasil se pode citar o Curare indgena ou Dedaleira (Digitalis purpurea) utilizada na preparao de ch contra a hidropisia, provocada pela insuficincia cardaca antes de ser descoberta a ao da Digitalina sobre o msculo cardaco, Casca dnta (Drimys brasiliensis) com propriedades estomquicas, a Quina (Cinchona calisaya) utilizada na cura da malria, a Ipecacuanha (Cephaelis ipecacuanha) utilizada para tratar diarrias, disenteria amebiana, catarros crnicos, hemorragias e asmas, e Sapucainha, (Carpotroche brasiliensis) com efeitos antiinflamatrios comprovados cientificamente e cujo leo extrado da semente empregado no tratamento de lepra (Carrara, 1995). As prticas mdicas populares no Brasil esto dispersas numa infinidade de praticantes e usurios e podem ser localizadas em qualquer regio do pas, sobrevivendo ao constante assdio do saber mdico oficial, sem adquirir a uniformidade da medicina cientfica j que, devido sua mesma origem, a uniformidade radica na dificuldade de transmisso do saber, isolamento entre usurios e praticantes e proibies rituais e a influncia do regionalismo, criando subsistemas delimitados (Carrara, 1995). Um estudo de Carrara (1995), realizado no municpio de Mag, no Estado do Rio de Janeiro, e que tambm contm dados de outras regies como Bahia, Minas Gerais, Gois e Par, assinala que das plantas estudadas, vrias estavam legitimadas pela Farmacopia brasileira de 1929. Uma delas, de grande importncia comercial como a Sarsaparrilla, empregada na sfilis e dermatosis, e como depurativo do sangue (Carrara, 1995). A maioria de praticantes e usurios entrevistados no estudo de Carrara (1995), so predominantemente camponeses que consideram a medicina popular menos prejudicial para a sade que a medicina "dos mdicos", referindo-se assim prtica mdica oficial. Consideram que os medicamentos alopticos conhecidos como "remdios de farmcia", a pesar de serem preparados com produtos de origem vegetal, produzem efeitos colaterais negativos e prejudiciais para a sade j que, para curar um rgo, terminam produzindo sequelas em outros (ex.: na dcada dos 40 houve uma campanha contra a malria com um remdio cuja base devia ser a Quinina, mas as mulheres grvidas abortavam e logo comearam a praticar os abortos com esse remdio). Se reclama do alto custo da medicina aloptica e da superficialidade, mercantilismo e relao autoritria mdicopaciente na ateno mdica.1 "A extrao na Amaznia tem sido historicamente associada com o esgotamento do recurso, degradao ambiental e distrbios sociais", o termo extrativismo atualmente mais prometedor, emergindo as Reservas extrativistas do Brasil como uma das estratgias de desenvolvimento mais prometedoras da Amaznia, representando uma forma socialmente justa de uso da terra que pode reconciliar o desenvolvimento econmico e a conservao do ambiente (Allegreti, 1990 e Anderson, 1992 em Elisabetsky In Balick, Elisabetsky e Laird, 1996).

1

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

A medicina das ervas e raizeiros irnicamente denominada a "medicina do atraso". No entanto, o pensamento mdico popular no est isolado nem independente das influncias cientficas, nem deixa de contribuir aos grandes descobrimentos teraputicos que tem servido de base para o desenvolvimento farmacutico. A medicina aloptica ou "medicina capitalista", como denominada tambm na obra de Carrara (1995), se especializou em descobrir medicamentos de efeito imediato, eliminadores de sintomas incmodos, de eficcia rpida e, especialmente, silenciadora de sintomas e que se constitui em analgsicos, laxantes, antigripais, tranqilizantes, etc., onde o mdico, por tentar corrigir os sintomas de maneira farmacolgica, se esquece de observar as condies de trabalho do paciente, de moradia, alimentao e higiene. O exerccio das medicinas paralelas e, especialmente a medicina popular, que por sua legitimidade junto populao atende melhor as exigncias de um tratamento mais ligado s tradies culturais do usurio, obtm um auge cada vez maior. O autor cita no seu livro uma ampla lista de bibliografia consultada, que serve como referncia, de documentos sobre uso de plantas medicinais no Brasil. Existe uma extensa rede comercial de plantas medicinais que abastece feiras e ervanrios. O comrcio crescente, o demonstra a existncia de grupos de comerciantes atacadistas responsveis pelo abastecimento de todas as feiras livres das regies, como menciona Carrara (1995) para a regio da Grande Rio. Os praticantes de medicina popular e comerciantes locais de plantas medicinais se denominam de diversas formas nas regies brasileiras. Carrara (1995) os classifica segundo sua atividade real, ainda que s vezes as categorias se combinem em um s indivduo, por exemplo: Mateiro: o que recolhe ervas ou comerciante de ervas medicinais, geralmente encontrado nas feiras livres. Trabalha para comerciantes ou possui seu prprio negcio em feiras de grandes cidades. Nem sempre conhecem as propriedades das plantas medicinais que comercializam, identificam as plantas e prescrevem algumas a seus clientes. Existem muitos mateiros nas feiras do Rio de Janeiro, comercializando as plantas nas caladas, em um tabuleiro ou uma lona estendida no cho, onde colocam pequenos pacotes de plantas amarradas, geralmente frescas. Obtm suas plantas medicinais de comerciantes atacadistas ou de outros mateiros ou eles mesmos as trazem dos lugares onde vivem. Seu posto de trabalho no est legalizado e, portanto, no est habilitado para comercializar produtos mais lucrativos.

Foto: Slvia Marina Ribeiro Silva

Vendedor de plantas medicinais Feira VER O PESO. Belm -PA.

Rezador: praticante, que trata seus pacientes exclusivamente com rezas e rituais de cura, a maioria de rezadores so do sexo feminino. No ligado necessariamente a uma religio, mas sim a atribuies mgicas. Tem um papel teraputico com certas especialidades em dolncias conhecidas. Utiliza, entre as rezas, chs ou medicamentos. Esta tradio muito antiga no Brasil. A medicina colonial complementava suas medicaes com rezas. No entanto, continua sendo uma tradio qualificada como supersticiosa ou inculta, desconhecendo a realidade cultural que pode explicar ou justificar essa prtica. A parteira: praticante do sexo feminino que assiste a parturientes; se diferencia da parteira de profisso denominada como "diplomada" sob o sistema mdico oficial. Cada vez mais, a parteira deixa essa atividade na cidade, mas nas zonas rurais a atividade aumenta e adquire maior prestgio que os hospitais, devido ao tratamento carregado de afeto e a forma de pagamento flexvel. Utilizam a conhecida Erva de So Joo (Ageratum conyzoides), para acelerar as contraes.

2

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Umbandista: praticante que somente trata seus pacientes atravs de entidades espirituais, proporcionando tambm receitas com medicamentos de medicina popular. Prtica mdica vinculada s religies de diferentes seitas afro-brasileiras da regio, se realiza atravs de entidades espirituais e posse, incorporando mitos e tradies culturais diversas, onde as plantas medicinais exercem um papel importante desde os pontos de vista religioso e farmacolgico. Em todos os rituais das seitas afro-brasileiras, envolvem uma grande quantidade de rituais mgico-religiosos. Entre os rituais predominantes da regio, que se caracterizam pela utilizao freqente de diferentes substncias medicinais, se encontram a umbanda, o candombl e a magia negra. Entre as ervas utilizadas em rituais de "iniciao dos nefitos" por virtudes mgicas atribudas esto a Maconha (Cannabis sativa) e a semente de Obi ou Noz de cola (Cola acuminata), com propriedades estimulantes e de resistncia fadiga, utilizadas no candombl. Certas sementes, folhas e cascas adquirem significados que exercem funes mgicas desde o ponto de vista cerimonial, se confundem com suas propriedades farmacodinmicas. Por exemplo, o uso de uma raiz conhecida como Jurema (Mimosa verrucosa), em uma cerimnia de "catimb" (da regio do nordeste), tem efeitos narcticos semelhantes aos do pio ou da Maconha. Nos banhos de purga se utilizam misturas de plantas, variveis de acordo com a seita ou a entidade de afiliao escolhidas entre aquelas tradicionalmente incorporadas matria mdica popular e, portanto, tm uma tradio teraputica muita antiga, e que nem sempre podem ser confirmadas pela farmacologia porque se trata de plantas ainda no estudadas. Predominam nestes banhos a utilizao de folhas de Erva de Santa Brbara (Solanum argenteum), de Negamina (Siparuna apiosyce) de Alecrim do Mato (Baccharis dracunculifolia) e de Cip-Cabeludo (Mikania hirsutissima); folhas e raiz de Guin-Pipiu (Petiveria alliacea) e as flores de Capim saco-saco (Andropogon nardus), mescladas. Para fins similares, se utilizam defumadores ou perfumadores fabricados com plantas medicinais e aromticas que tambm so utilizados para proteger residncias. Com este fim, as plantas mais utilizadas so Guin Caboclo (Annona acutiflora), Cip-Caboclo (Davilla rugosa), Arruda (Ruta graveolens), Abre caminho (Lygodium volubile), Guin-pipiu, Alecrim do mato, Capim saco-saco, Pau de Alho (Gallesia gorazema) e Cravo da ndia (Syzygium aromaticum). Raizeiro: Ex-campons que vendeu ou perdeu suas terras e passou a dedicar-se ao curanderismo. Praticante que utiliza exclusivamente a medicina popular para tratar seus pacientes. o depositrio das observaes populares sobre a ao farmacodinmica de diversas substncias sobre o organismo humano e animal. As indicaes que fornecem coincidem com a histria teraputica de cada substncia, longe da imaginao, isto , sem engano. Os enganos provm em sua maioria da dificuldade de identificao das espcies, nomes verdadeiros ou falsos das mesmas (j que os raizeiros tendem a determinar por conta prpria o nome mais adequado), dos nomes provenientes de distintas regies para espcies idnticas ou parecidas e, pela confuso promovida pelos manuais de divulgao de medicina popular de orientao exclusivamente comercial, que na realidade so compilaes incompletas e incorretas de autores clssicos sobre plantas medicinais. Estes manuais, em geral, renem os nomes de todas as plantas medicinais do Brasil, tambm de plantas europias no cultivadas no Brasil e seus nomes populares ordenados com indicaes teraputicas de vrios autores sem respeitar regionalizao de nomes e indicaes, forjando uma deformao do conhecimento tradicional do raizeiro alfabetizado, sendo os melhores informantes justamente os analfabetos que obtiveram seus conhecimentos por tradio oral, de seus antepassados ou de sua prpria experincia com diversas substncias medicinais. Os raizeiros identificam facilmente as diversas substncias medicinais de origem vegetal, atravs de um exame das partes da planta e dos cheiros da mesma e conhecem o habitat especfico de cada espcie, o tamanho, a idade, procurando estabelecer um mtodo prprio de identificao, elaborado a partir de suas prprias observaes a fim de evitar os riscos a que esto sujeitos em caso de confuso com uma espcie txica. Assim, podem diferenciar espcies parecidas pelo habitat, colorao, sabor, pelo que se diz que o raizeiro tem uma preocupao sistemtica ainda que trabalhe isoladamente, sem tomar em conta os critrios de outro raizeiro. Os nomes diferentes provm de influncias religiosas, legitimando ou impedindo a utilizao de certos nomes. Ex: a Siparuna apiosyce, nas seitas afro-brasileiras se utiliza nos banhos de purga pelos poderes mgicos atribudos planta, enquanto os umbandistas a identificam como Nega-mina, os demais usurios a identificam como Erva-santa. Portanto, no

3

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

existe uniformidade taxonmica, mas sim uma base comum, no sujeita a divergncias, que serve para manter a botnica popular dentro de um padro de coerncia. Do ponto de vista da botnica popular, o raizeiro um ilustre taxnomo, com um domnio profundo da natureza, e um experimentador das drogas que utiliza em sua teraputica. Consideram as plantas medicinais como benficas para o organismo e preventivas, e selecionam entre as plantas mgicas, as de efeitos farmacodinmicos e as txicas tanto para o homem como para os animais. Conhecem ainda as doses para atenuar efeitos. Os padres de medida utilizados so pessoais: um dedo, um punhado, uma quarta parte, entre outros. Sabem a poca exata para realizar coletas, a poca de florao e frutificao, respeitando as fases da lua para obter melhores efeitos. A remunerao financeira para os praticantes de medicina popular vista de forma negativa por parte dos usurios, pelas conotaes divinas atribudas s origens dos conhecimentos atuais sobre as diversas substncias medicinais. So comuns as proibies de mercantilizao de conhecimentos de ordem religiosa. No entanto, os raizeiros recebem remunerao, no exigida formalmente, de seus pacientes ou na forma de presentes e, alm do mais, exercem outras atividades paralelas que lhes propicia rendimento financeiro. Os males ou doenas mais comuns tratadas atravs de rezas so asma, bronquite, incolao, erisipela, mal olhado, mordida de cobra, verrugas, anemia, cncer, catarata, cistitis, clicas, diabete e, por ao farmacodinmica das substncias medicinais: cicatrizante, abortiva, anestsica, calmante diurtica, depurativa (Carrara, 1995). De modo geral, a informao que pode ser encontrada sobre o comrcio de espcies de plantas medicinais a nvel mundial escassa ou no est sistematizada e o Brasil no a exceo. No entanto, a discusso sobre o tema cresce no somente devido o aspecto cientfico j comprovado em muitos estudos de eficcia teraputica de medicamentos fitoterpicos, mas tambm pelo potencial econmico que estes representam para a gerao de ingressos e emprego e, ltimamente, pela preocupao sobre o uso e comrcio dos recursos naturais e a conservao dos mesmos. Algumas espcies de uso medicinal esto registradas como ameaadas em livros e listas de espcies raras ou ameaadas publicadas no Brasil (Klein, R., 1996) e uma das causas se atribui presso exercida pelo excessivo extrativismo. Existe a preocupao de que esta sobrexplorao caracterize o proceso de explorao de espcies medicinais no pas. Apesar de se observar certos avanos no desenvolvimento de legislaes relacionadas atividade comercial do recurso, em geral e especialmente no campo da fitoterapia, ainda assim o comrcio domstico e internacional de plantas medicinais do Brasil continua subestimado e seus produtos seguem sendo extrados e comercializados em grandes quantidades sem conhecimento sobre sua dimenso real, origem, destino, volumes, preos, espcies, etc. As informaes ainda se encontram dispersas para efeitos de um melhor direcionamento desta atividade em aras de promover sistemas de controle efetivos, assim como um melhor manejo, comrcio e conservao.

INTRODUO O Brasil, com uma rea territorial extensa de 8.5 milhes de quilmetros quadrados e vrios biomas (Mata Atlntica, Cerrado, Pantanal, Amaznia e Caatinga), apresenta uma grande diversidade de solos e climas que favorece a riqueza e variedade de tipos de vegetao e espcies de flora distribudas nos diversos ecossistemas brasileiros (Dias, 1995). Mundialmente, existem aproximadamente 250,000 espcies de plantas vaculares e brifitas (Wilson, 1997). No Brasil se estima uma existncia de cerca de 60,000 espcies de um total de mais de 155,000 reconhecidas entre as angiospermas tropicais (Prance, 1977; Giulietti & Forero, 1990). A Organizao Mundial da Sade estima que 80% da populao mundial depende da medicina tradicional para suas necessidades bsicas de sade, e que quase 85% da medicina tradicional envolve o uso de plantas medicinais, seus extratos vegetais e seus princpios ativos (IUCN, 1993).

4

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Espcies de plantas medicinais so exploradas por vrios setores da sociedade, tais como comunidades tradicionais, curandeiros, centros espirituais, empresas fabricantes de essncias e aromas, laboratrios farmacuticos, homeopticos, fabricantes de extratos e tinturas para fins farmacuticos, indstrias alimentcias, ervanrios e feiras, atacadistas e outros intermedirios (FNP, 1999). A demanda existente por estes recursos criou preocupao na medida em que populaes nativas das espcies originrias de matria prima se vm ameaadas, principalmente quando partes destas plantas, tais como raizes, sementes e flores, essenciais para sua reproduo, so bastante coletadas, utilizadas e comercializadas de forma no sustentvel. Algumas espcies tradicionalmente coletadas e sobrexploradas no Brasil se encontram includas na lista oficial de espcies da flora brasileira ameaadas como o caso da Arnica (Lychnophora ericoides) e as espcies conhecidas popularmente como Jaborandi (Pilocarpus jaborandi, P. microphyllus e P. trachylophus) (SBB, 1992). Outras espcies, que no se encontram nesta lista, tambm tem sido objeto do extrativismo excessivo, como o caso da Espinheira-santa (Maytenus ilicifolia) (Silva, 1999) e do Ginseng- brasileiro (Pffafia paniculata) (Silva, 1999; Ferreira, 1998), entre outras.

Foto IAPAR-Instituto Agronmico de Paran

Espinheira santa (Maytenus ilicifolia)

A incios do sculo XIX foram escritas vrias obras sobre as plantas medicinais do Brasil, incluindo estudos taxonmicos (Martius, 1843 en Berg, 1993). No sculo XX, j se contava com obras sobre a importncia econmica e utilidades das plantas medicinais (Hoehne, 1930 em Berg, 1993), assim como sobre a fitoterapia nacional (Coimbra & Silva, em Berg, 1993) e, nos incios do sculo XXI, sobre a utilizao medicinal e farmacolgica de 1,500 espcies e variedades de plantas desde lquens, samambaias at gimnospermas e plantas com flores na obra Plantas Medicinais do Brasil (Medicinal Plants of Brazil) de Mors, Rizzini y Pereira (2000), como parte da srie Plantas Medicinais do Mundo (DeFilipps, 2001) e tambm com informao sobre a importncia da pesquisa e da etnobotnica nas decises sobre o comrcio dos recursos do bosque chuvoso tropical (Elisabetsky In Balick, Elisabetsky e Laird, 1996), para citar algumas delas. Apesar do extenso conhecimento que possa existir sobre o uso das plantas medicinais do Brasil, pouco se sabe sobre quais so as espcies medicinais nativas que so objeto de uso e comrcio significativos, tanto a nvel local como internacional e sobre o impacto que a atividade comercial est causando sobre estes recursos naturais e, finalmente, sobre a populao humana. Um dos programas de TRAFFIC se enfoca sobre o tema do comrcio de plantas medicinais e, com a finalidade de garantir a segurana e conservao de recursos, cultural e econmicamente significativos e de importncia para sade humana. Busca melhorar o conhecimento sobre a atividade comercial dos mesmos e sobre os fatores que influem numa utilizao insustentvel, assim como promover um manejo adequado e a integrao de esforos entre diferentes interessados. O IBAMA um dos rgos competentes no controle das atividades de comrcio de plantas medicinais com respeito aplicao das polticas de meio ambiente e normas relacionadas. Seu interesse no tema de comrcio de plantas medicinais comeou h alguns anos dada a preocupao sobre a informao de quantidades de ervas que saam mensalmente para mercados regionais e internacionais e sobre a ilegalidade da extrao refletida na ausncia de registro no IBAMA. Surgiram projetos que pretendiam conhecer melhor esta atividade e gerar normas compatves entre a utilizao e a conservao destes recursos e a importncia ambiental, econmica e de sade pblica que representam (Marcon, s.d.). O primeiro projeto realizado pelo IBAMA, em 1994, reflete uma tentativa de sistematizar a informao existente a respeito, com iniciativas concretas realizadas em So Paulo, autorizadas pela Superintendncia do IBAMA no Estado de So Paulo, para identificar o papel do IBAMA no

5

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

controle desta atividade e iniciar discusses sobre a problemtica. Surgiu, ento, um primero relatrio sobre o tema reunindo informao sobre legislao e dados de extrao e comrcio de plantas medicinais (Marcn, s.d.), com informao compilada desde So Paulo. Um novo trabalho na mesma direo foi iniciado em 1988 na Sede do IBAMA, em Braslia, atravs da Diretoria da Unidade de Conservao da Vida Silvestre, Setor de Flora e CITES com o projeto Levantamento das plantas medicinais comercializadas pelo Brasil 2 que, juntamente com o Projeto de TRAFFIC: Apoio para um melhor uso e comrcio de plantas medicinais na Amrica do Sul, comearam a desenvolver um levantamento de informao a respeito, com o objetivo de identificar a legislao relacionada com a atividade comercial destes recursos, as principais espcies medicinais nativas que so objeto de comrcio local e internacional e as estratgias para sua conservao e uso sustentvel, alm do fortalecimento sobre o tema por parte do IBAMA, como uma das prioridades de sua gesto. Dada a escassa informao disponvel e sistematizada sobre o comrcio de plantas medicinais, o estudo inicial consistiu na identificao e determinao dos aspectos gerais da legislao e comrcio de plantas medicinais no Brasil, tanto na rea de meio ambiente como na de sade e fitoteraputicos relacionados com o comrcio de plantas medicinais. Foi realizado um levantamento de informao sobre as espcies comercializadas, com nfase naquelas registradas nas bases de dados e relatrios do IBAMA (Sede) como exportadas e importadas, com dados referentes a nomes cientficos e populares, uso, parte utilizada, origem, distribuio geogrfica e categoria de ameaa. Tambm se apresentam dados disponveis sobre as extraes, produtores e comerciantes registrados no IBAMA, sobre os Estados brasileiros exportadores e sobre os principais pases importadores reportados pelo IBAMA. Finalmente, se realizam uma srie de recomendaes com base nos resultados obtidos e com a finalidade de promover estudos adicionais que permitam dar uma viso mais completa e compreenso deste tema no Brasil. A metodologia incluiu a consulta de documentos disponveis, com nfase nos relatrios sobre comercializao apresentados pelo IBAMA, listas oficiais de espcies ameaadas, visitas a mercados e feiras, coleta e identificao de algumas amostras de plantas comercializadas nativas e exticas, consultas com alguns especialistas, principalmente, aqueles aspectos relacionados com a legislao sanitria. Inicialmente, foram planificadas duas fases de desenvolvimento da pesquisa. No entanto, os recursos disponveis no foram suficientes para cobr-las, devendo definir somente a realizao de um estudo inicial que se concentre na pesquisa desenvolvida internamente pelo IBAMA, assinalando a necessidade de indentificar colaboradores e de conseguir maior financiamento para sua continuidade. O presente relatrio reune a informao compilada e registrada, principalmente na Sede do IBAMA (Braslia), sobre o comrcio de plantas medicinais e as regulamentaes existentes na rea de meio ambiente e sade, com os seguintes objetivos: Apresentar brevemente e ressaltar aspectos relevantes da legislao atual relacionada com as plantas medicinais e fitoterpicos, com nfase nos aspectos da legislao ambiental e sanitria; Apresentar uma reviso preliminar dos dados, principalmente do IBAMA (Sede), sobre as principais espcies de plantas medicinais comercializadas oficialmente e a informao registrada nas suas bases de dados e relatorios, assim como sistemas de controle. Recomendar algumas prioridades de pesquisa e ao relacionadas com o comrcio de plantas medicinais com base nos resultados obtidos. Melhorar a informao e o conhecimento do IBAMA sobre esta atividade e os fatores relacionados com o manejo e controle atual do uso e comrcio destes recursos, com a finalidade de fortalecer sua gesto no tema de plantas medicinais e promover sua integrao com outros setores e instituies relacionados.

Atualmente, com a nova estrutura do IBAMA, o projeto continua desenvolvendo-se pelo Ncleo de Plantas Medicinais e Aromticas (uma estrutura dentro do Centro ao qual se faz referencia na pgina 23) que encontra-se ligado Diretoria de Florestas, ja no a DIREC.2

6

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

METODOLOGIA Desde 1998 e 1999 se desenvolveu a pesquisa sobre as espcies de plantas medicinais comercializadas pelo Brasil e da legislao de meio ambiente e sade relacionada com o uso e o comrcio de plantas medicinais. A escassa informao existente e fundos disponveis nos levaram a compilar informao geral sobre os aspectos mencionados para apresent-la de maneira preliminar com o objeto de buscar apoio em entidades interessadas e relacionadas para efetuar uma pesquisa mais profunda sobre o tema, que inclua trabalho de campo e validao dos dados oficialmente registrados, assim como uma anlise do cumprimento da legislao vigente relacionada, a fim de realizar recomendaes pertinentes, ajustadas realidade, para um melhor uso, manejo e comrcio destes recursos. Estudos mais detalhados continuam sendo feitos por parte do IBAMA (desde agosto de 1999), com o apoio do PNUD. Ainda que essa informao no esteja completamente processada, consideramos necessrio e importante publicar a informao inicial compilada e parte da informao de campo efetuada pelo IBAMA durante 2001 para que possa servir de insumo em reunies e discusses com relao ao tema, principalmente a nvel nacional e setorial. Para efeitos deste trabalho, o termo "plantas medicinais" utilizado em forma ampla, incluindo espcies utilizadas como aromticas e para cosmticos. O termo comrcio inclui as atividades de comcio domstico e internacional (exportao e importao). Levantamento de informao sobre as leis relacionadas no mbito do meio ambiente e da sade Foi realizado um levantamento bibliogrfico sobre os instrumentos legais vigentes sobre o tema. Foram consultadas Leis, Decretos-Leis, Decretos, Resolues e Portarias, alm de informaes contidas em Pinto (1996), Marcon (s.f) e os Acordos Internacionais ratificados pelo Brasil. Tambm foram realizadas consultas com especialistas, principalmente na rea relacionada a regulaes e aspectos de sade e fitoterpicos. Levantamento de informao disponvel no IBAMA (Sede) sobre as plantas comercializadas Foi elaborada uma lista preliminar das espcies oficialmente comercializadas. Foram includas nas tabelas espcies comercializadas com autorizao do IBAMA, consultando diversos documentos, processos e relatrios existentes nas oficinas do IBAMA em Braslia, principalmente aqueles provenientes do Estado do Paran-PR e So Paulo-SP, assim como aquelas espcies citadas como comercializadas em outras obras conhecidas pelo IBAMA. Apesar de existirem muitas outras espcies comercializadas pelo Brasil, o nmero e informao sobre seu comrcio ainda no se considera real j que no existe um levantamento ou sistematizao nem geral nem especfico desta informao. Devido a isto, a informao apresentada neste trabalho no definitiva, citando-se sobretudo aquelas espcies registradas e com sua equivalncia de nome cientfico para as quais existem referncias claras e disponveis; existindo certamente um nmero maior de espcies que ser analisado e estimado atravs das pesquisas realizadas em uma etapa posterior por parte do IBAMA. Foram consultados documentos que citam as espcies envolvidas no comrcio com o objetivo de obter informaes sobre a origem, a parte utilizada da planta e formas de utilizao. Tambm foram revisadas publicaes relacionadas com a medicina popular, plantas medicinais e trabalhos sobre espcies raras e ameaadas. As informaes sobre nome popular, parte utilizada e distribuio geogrfica das espcies assinaladas foram obtidas atravs dos relatrios existentes no IBAMA, corroborados por outra literatura. Os nomes cientficos foram corroborados utilizando a base de dados TRPICOS, do Missouri Botanical Garden, O Livro das Plantas de Mabberly (1989) e o Dicionrio de Willis (1973).

7

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Constam nomes cientficos no reconhecidos ou includos nesta base e nestes livros, para os quais se mantm o nome tal como foi citado na publicao consultada e se cita a referncia do dado obtido. Nomes cientficos escritos incorretamente na fonte original foram corrigidos, exceto em documentos legais (Portaria No. 37-N de 3 de abril de 1992), para os quais se coloca uma nota ao p da pgina. Na maioria do texto se cita primeiro o nome comum e logo o nome cientfico, quando se cita somente um dos dois porque no se especificava o outro na fonte referencial. O nomes populares ou comuns so mantidos em Portugus na verso em Espanhol deste documento, exceto para os que existe uma traduo exata e, alm do mais, so conhecidos. Levantamento de informao disponvel no IBAMA sobre as empresas e o comrcio Inicialmente, se realizou um levantamento de informao sobre as empresas registradas no IBAMA que comercializam plantas medicinais, buscando conhecer sua localidade, nmero de registro no IBAMA e as espcies comercializadas. Neste relatrio so apresentados os dados sobre nmero de extratores, produtores e comerciantes de plantas medicinais registrados no IBAMA, obtidos a partir de informaes disponveis no Sistema de Registro - SISREG3 . Aqueles no registrados ou que tenham registro em outros rgos estatais devero ser identificados numa etapa posterior. As informaes sobre os principais Estados brasileiros exportadores e importadores e pases importadores foram obtidas a partir de uma consulta base de dados do Departamento de Comrcio Exterior - DECEX. Os dados apresentados sobre exportao e importao incluem os proporcionados pelo IBAMA, obtidos da base de dados do DECEX e tambm aqueles obtidos da literatura disponvel e correspondem em sua maioria ao perodo de 1994 a 1998. Para alguns anos no foi possvel obter dados completos por no estarem sistematizados durante o desenvolvimento deste trabalho. Os principais lugares de sada de plantas do pas foram identificados tambm por meio da anlise de relatrios e documento apresentados ao IBAMA.

ASPECTOS GERAIS DA LEGISLAO AMBIENTAL Instrumentos legais relacionados com as plantas medicinais A legislao relacionada com plantas medicinais j foi recopilada e analisada anteriormente por Marcon (s.d.), funcionria do IBAMA. Aqui se pretende reunir, atualizar e difundir a mesma, sobretudo para resgatar as recomendaes desse trabalho, j que constituem uma valiosa contribuio e som-las s recomendaes dos responsveis atuais sobre o tema. Pesquisa No que se refere participao do pesquisador estrangeiro em expedies cientficas no pas, estas devem ser autorizadas pelo Ministrio de Cincia e Tecnologia-MCT, atravs do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico-CNPq (Decreto n. 98.830/1990, Portaria n. 55/1990). Este rgo avalia e autoriza as atividades de campo exercidas pela pessoa natural ou jurdica estrangeira em todo o territrio nacional que impliquem traslado de espcimes biolgicos nativos. Tambm responsvel pelas autorizaes da remessa de material cientfico3 O SISREG consiste em um Sistema do IBAMA que registra as pessoas fsicas e jurdicas includas no Cadastro Tcnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais.

8

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

coletado para o exterior. No entanto, a pesquisa tambm dever ser regulada por aquela lei que regulamentar o acesso aos recursos genticos e que est em discusso. Acesso a Recursos Genticos Se encontram em discusso os projetos de Lei n. 306, 4579 e 4751. Tais projetos surgem ante a expectativa de adotar uma poltica de acesso aos recursos naturais, buscando, principalmente, garantir s populaes locais os direitos e beneficios provenientes do uso destes recursos. Enquanto isso, foi publicada recentemente a Medida Provisria n. 2.052/2000 que rege sobre o acesso ao patrimnio gentico, proteo e ao acesso ao conhecimento tradicional associado, repartio de beneficios e ao acesso e transferncia de tecnologia para sua conservao e utilizao. Esta medida introduz conceitos como o contrato de utilizao de patrimnio gentico e de repartio de benefcios e termos de transferncia de material. De acordo com esta Medida, o poder executivo dever criar por Decreto um Conselho Interministerial, vinculado Casa Civil da Presidncia da Repblica, que ser responsvel por conceder autorizao para o acesso da amostra do componente do patrimnio gentico, acesso ao conhecimento tradicional associado, remessa da amostra do componente do patrimnio gentico e do conhecimento tradicional para o exterior, fiscalizar essa remessa, entre outras. Se criar tambm uma Secretaria Executiva no mbito do Ministrio do Meio Ambiente com o aval de vrias instituies que tenham competncia na matria. Lei de Crimes Ambientais Um avano na legislao ambiental consiste na publicao da Lei de Crimes Ambientais (Lei n. 9605/98) que estabelece penalidades para pessoas fsicas ou jurdicas que cometem crimes contra os recursos naturais. Apesar disso, se considera que a penalizao dos infratores continua ocorrendo raramente ou no ocorre, mas no existem cifras ou dados disponveis para conhecer seu funcionamento e analisar a eficcia dos controles a respeito. Explorao, produo, transporte e comrcio A coleta, transporte, comercializao e industrializao de plantas medicinais, aromticas ou txicas nativas, com fins comerciais, se regem pela Portaria n. 122, de 19 de maro de 1985 (Arts. 43 al 51), ainda em vigncia, do extinto Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal - IBDF. De acordo com esta Portaria, essas atividades dependem do registro e da autorizao do IBAMA e so autorizadas mediante o Regime de Reposio Florestal da espcie utilizada, proporcionalmente quantidade coletada, isto , obrigam reposio de indivduos da espcie botnica utilizada. Tal reposio no tem sido realizada no pas devido a que os responsveis envolvidos no cumprem com estas exigncias (IBAMA, 1997) e, por outro lado, no considerada por si s uma boa estratgia para a conservao, sem um manejo adequado in situ. Segundo Marcon (s.d.) esta Portaria precisa ser analisada na sua aplicao e se necessrio ser reformulada. As pessoas naturais e jurdicas que se dedicam s atividades de extrao, produo (com fins comerciais), transporte e comercializao de plantas medicinais devem ser registradas no Cadastro Tcnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais (Portaria n. 113/97-25.09.97) em categorias especficas. As categorias e atividades, relacionadas com plantas medicinais, existentes neste Cadastro e seus respectivos valores de impostos cobrados para registro so apresentadas na Tabela 1.

9

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

TABELA 1 - Categorias de atividades, relacionadas com plantas medicinais, existentes no Cadastro Tcnico Federal do Ibama com seus valores para registro Valores em R$ (reales)

Cdigo0210 0406 0502 0707 0901 0902

Descrio da Categoria1- Extrator de plantas medicinais/ aromticas / partes 2- Produtor de Plantas medicinais/ aromticas nativas 3- Comerciante de plantas medicinais/ aromticas nativas/ partes 4- Indstria de aperfeioamento de plantas medicinais / aromticas 5- Exportador de plantas vivas, produtos e subprodutos da flora. 6- Importador de plantas vivas y subprodutos de flora.

Pessoa Micro Demais Fsica Empresa Empresas100 100 125 110 125 125 125 125 200 125 250 500 200 200

Fonte: Portaria-IBAMA. 113, de 25.09.97

A validao do registro deve depender da anlise tcnica baseada na legislao que regulamenta determinada atividade (Portaria n. 113/97, Art. 4, Prrafo 1o). Dessa forma, baseada na legislao, o solicitante dever fornecer informaes especficas mencionadas na Portaria 122 e cumprir as exigncias estabelecidas em instrumentos legais que disciplinam a explorao em biomas especficos, tais como a Mata Atlntica, Amaznia e Caatinga. Os valores dos impostos recolhidos para o registro nas categorias especficas so fixados por instrumentos legais (Portaria n. 113/97), podendo ser atualizados de acordo com as mudanas econmicas do pas. No cadastro tcnico no consta a categoria especfica "exportador ou importador de plantas medicinais e suas partes". Dessa forma, o interessado em exportar ou importar plantas medicinais dever registrar-se nas categorias 5 ou 6 (Tabela 1). As atividades mencionadas nos itens 3, 4 e 5 requerem do interessado uma comprovao de origem do produto. As seguintes so as informaes bsicas, exigidas pela Portaria 122/1985, no momento da solicitao para o registro (Art. 44) das atividades 1, 3, 4 e 5 assinaladas na Tabela 1: 1- Identidade do responsvel, endereo e capacitao tcnica. 2- Razo social, atividade principal, produto final a ser obtido e previso econmica. Na solicitao de autorizao para coleta, transporte, comercializao ou industrializao devem constar os seguintes dados (Art. 45): 1- rea fsica ou territorial abrangida pela coleta localizao; extenso e limites; topografia (relevo) e acidentes geogrficos; altitude e clima; tipo de vegetao dominante; via de acesso e meios de transporte e modalidade da justa posse ou autorizao do proprietrio

10

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

2- Material botnico a ser utilizado nome vulgar e nome cientfico; porte (arbreo, arbustivo, herbceo); ciclo vegetativo; nmero mdio de espcimes, por hectre; rgo da planta a ser utilizado; substncia a ser obtida e peso seco/ha da parte vegetal a ser utililizada.

A renovao do registro deve ser realizada anualmente mediante solicitao do interessado. Tal renovao deve ser efetuada somente se o usurio estiver cumprindo as exigncias estabelecidas. Portanto, a solicitao de registro numa das categorias pelo interessado deve consistir em um passo para o processo de autorizao de uma das atividades. A explorao florestal, incluindo qualquer produto de origem vegetal, uma atividade prevista pela legislao brasileira na Lei n. 4.771/67 que instituiu o Cdigo Florestal brasileiro e que sofreu posteriormente algumas alteraes. Entre os principais instrumentos legais que normatizam a explorao florestal se encontram: Decreto n. 750/93 que rege sobre o corte, a explorao e a eliminao da vegetao da Mata Atlntica. Decreto n. 1.282/94 que trata sobre a explorao dos bosques primitivos (primrios) e demais formas de vegetao arbrea na Amaznia. Instruo Normativa n. 1 de 25 de fevereiro de 1994 que regulamenta a explorao sustentvel da Caatinga. Portara n. 113/95 que norma a explorao dos bosques primitivos (primrios) e demais formas de vegetao arbrea nas regies Sul, Sudeste, Centro-oeste e Nordeste. A autorizao para explorao comercial dos recursos da flora, na Amaznia, seja para uso medicinal, ornamental, aromtico, comestvel e outros, encontra-se regulada na Portaria n. 48, de 10 de julho de 1995 (Art. 40). Tal medida estabelece a necesidade de atender os Princpios Gerais e Fundamentos Tcnicos detalhados a seguir: Princpios gerais: 1- Conservao dos recursos naturais; 2- Preservao do ecossistema; 3- Manuteno da diversidade biolgica; e 4- Desenvolvimento scio-econmico da regio Fundamentos Tcnicos: 1- Inventrio dos recursos disponveis; 2- Mtodos de explorao e produo compatveis para assegurar a existncia e a sustentabilidade da espcie explorada; 3- Sobrevivncia da espcie no seu ecossistema, obedecendo o critrio tcnico-cientfico para garantir sua reproduo e variabilidade gentica, e, 4- Estabelecimento de rea de mxima recoleo anual dos recursos. Recentemente foi publicada a Instruo Normativa n. 1 de 10 de maio de 2001, que define no seu art. 1 que a explorao econmica dos bosques, nas propriedades rurais localizadas na Amaznia legal, incluindo as reas de reserva legal e excluindo as de preservao permanente estabelecidas na legislao vigente, ser realizada mediante prticas de Manejo Florestal Sustentvel de Uso Mltiple, isto , a administrao do bosque para a obteno de beneficios econmicos, sociais e ambientais, respeitando os mecanismos de sustentao do ecossistema objeto do manejo e considerando acumulativamente ou alternativamente, a utilizao de mltiplas espcies madeireiras, de mltiples produtos e subprodutos no madeireiros e de

11

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

outros bens e servios do bosque. Existem quatro modalidades de acesso ao manejo: empresarial, comunitrio, individual e no madeireiro. O Plano de Manejo Florestal Sustentvel de Uso Mltiplo No Madeireiro uma das modalidades de acesso ao manejo, para fins de consumo, comercializao ou suplemento industrial e se caracteriza pela execuo de atividades de explorao de uma ou mais reas, para extrao de produtos no madeireiros (medicinais/aromticas e ornamentais), por uma ou mais pessoas naturais ou jurdicas, associadas ou no (Art. 2, prrafo IV). Esta Instruo est sendo regulamentada. O Art. 14 menciona a criao de portarias especficas e estabelecimento de procedimentos para a implementao das distintas modalidades de manejo e o Art. 15 sobre a realizao de campanhas de incentivo ao manejo florestal em associao com instituies governamentais, setor produtivo e a sociedade civil. Quanto ao transporte de produtos florestais de origem nativo, o mesmo somente deve ser permitido mediante a obteno da Autorizao para Transporte do Produto Florestal (ATPF) concedida para o transporte, entre outras, de plantas medicinais e suas partes (folhas, frutos, etc.), emitida pelo IBAMA aos portadores da autorizao de desmatamento4 ou planos de manejo aprovados (Portaria n. 44-N/93) e, at pouco tempo, tambm do Regime Especial de Transporte RET, que consistia num carimbo no verso da nota fiscal e era concedido na fase do produto processado e/ou industrializado. O carimbo apresentava dados exigidos pelo IBAMA, correspondendo a esta instituio o controle e a fiscalizao do uso adequado destes instrumentos. Atravs da Instruo Normativa No. 1, de 10 de maio de 2001- Art. 10, fica extinto o RET, passando a ser substitudo pela ATPF at a emisso de um novo instrumento de controle de transporte. Na prtica, esta Portaria devia ser integrada ou unificada com a Portaria n. 122-p, de 19 de maro de 1985, mencionada anteriormente e que tambm rege sobre o transporte, o que atualmente no est ocorrendo (Marcon, s.d.). importante destacar que algumas espcies medicinais esto protegidas, de alguma maneira, por instrumentos legais especficos: Portaria - IBAMA n. 83-N/91, de 26 de setembro de 1991 - probe o corte e a explorao de Aroeira legtima (Astronium urundeuva), das Baranas (Melanoxylon brauna e Schinopsis brasiliensis) e de Gonalo-alves (Astronium fraxinifolium) em bosque primrio5. Para explorao destas espcies em bosque secundrio6 se exige um Plano de Manejo Florestal de Rendimento Sustentvel. Nos sistemas de vegetao denominados Cerrado, a explorao somente poder ser realizada se executada atravs de Planos de Manejo Sustentvel previamente aprovados pelo IBAMA. Essa Portaria tambm probe a explorao destas espcies em qualquer tipo de formao florestal em reas de proteo permanente. Portaria - IBAMA n. 118-N, de 12 de novembro de 1992 - regulamenta a explorao, processamento e/ou comercializao de Erva-mate (Ilex paraguariensis). A explorao da ErvaAutorizao de explorao, sem Plano de Manejo.

4

5 Se entende por bosque primrio a vegetao arbrea denominada bosque estacional semidecidual, onde esto caracterizados os bosques aluviais e submontanhosos. Esto estruturalmente compostos de rvores altas e fustes normalmente finos e retilneos. Nessa formao existe uma densa subselva de arbustos e uma enorme quantidade de plntulas de regenerao. Entre os arbustos se destacam representantes das famlias Myrtaceae, Melastomataceae e Rubiaceae (Art. 1, Pargrafo nico). 6 Se entende por bosque secundrio, aquele onde existe o surgimento de espcies arbreas, tais como Sucupira (Bowdichia spp. e Pterodon spp.), Carvoeiro (Sclerolobium spp.), Piqui (Caryocar spp.), Aroeira (Astronium spp.), Baranas ou Branas (Melanoxylon brauna y Schinopsis brasiliensis), Gonalo-alves (Astronium spp.), entre outras. uma formao de porte e estrutura diversa onde se constata modificaes em sua composio que, na maioria das vezes, devido atividade do homem, pode apresentar-se em processo de degradao ou em recuperao (Art. 2, Pargrafo nico).

12

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Mate deve obedecer a adoo de tcnicas de conduo de manejo, destinadas a minimizar a ocorrncia de provveis danos aos ervais e buscando compatibilizar o rendimento sustentvel com a conservao da espcie (Art. 2). A comercializao de Erva-mate em estado bruto, semi-elaborada ou processada obedece os tipos de padres da Classificao de Produtos da Erva-mate (Anexo 1a) (Art. 3). Quando o comrcio se destina ao mercado interno, deve ser realizado em embalagem com a identificao do fabricante, o nmero de registro do IBAMA, a meno do nome, tipo e padro do produto. Quando se trata de comrcio externo devem ser obedecidas, alm da legislao nacional, as regras comerciais internacionais. As pessoas envolvidas no processamento e/ou comercializao de Ervamate devem fornecer, anualmente, informaes sobre o consumo e produo para que possam manter seus direitos de explorao. Se instituem parmetros para fins de converso de volume de consumo de Erva-mate bruta verde destinada produo do produto processado (Anexo 1b). Portaria - IBAMA n. 48, de 10 de julho de 1995 (Art. 10) - probe o corte e a comercializao de Castanheira (Bertholletia excelsa) e de Seringueira (Hevea spp.) em bosques nativos, primrios ou regenerados, excetuando os casos de projetos para a realizao de obras de relevante interesse pblico. Portaria - IBAMA n. 112, de 29 de dezembro de 1995 - regulamenta o transporte e o comrcio de madeira aserrada da espcie B. excelsa oriunda do reservatrio da Hidroeltrica de Tucuru, Estado do Par. Permite o comrcio, para qualquer finalidade, de madeira aserrada da espcie oriunda do reservatrio da Usina Hidroeltrica de Tucuru, exceto para exportao (Art. 2) Portaria - IBAMA n. 113, de 29 de dezembro de 1995 (Art. 16) - probe o corte e a comercializao do Pequizeiro (Caryocar spp.). Portaria IBAMA no. 001/98, de 18 de agosto de 1998 - regulamenta a exportao, industrializao e comercializao de Pau-rosa (Aniba rosaeodora), no Estado do Amazonas. As pessoas fsicas ou jurdicas que exploram, comercializam ou industrializam sob qualquer forma a espcie, esto obrigadas a declarar seus estoques de essncia, toras ou toretes.

No existe informao disponvel que permita realizar uma anlise sobre a extrao, comrcio e conservao destas espcies em particular e sobre o cumprimento das medidas e requerimentos mencionados. Estes instrumentos legais, em geral, regulam a explorao dos bosques com fins comerciais a partir de produtos florestais, mediante o desenvolvimento de um Plano de Manejo Sustentvel. Estas legislaes exigem, alm do mais, que o Plano de Manejo seja fundamentado em estudos tcnicos, com o fim de apoiar o desenvolvimneto de estratgias para a conservao desses recursos, preservao de ecossistemas, manuteno da diversidade biolgica e buscar o desenvolvimento scio-econmico de cada regio. No entanto, no existe uma definio clara na legislao com respeito a quais so tais critrios tcnico- cientficos. A Portaria IBAMA n. 122/85 e o Decreto n. 750/93, por exemplo, que trata da explorao da Mata Atlntica, no fixam parmetros com bases tcnico-cientficas para a autorizao da atividade de manejo sustentvel de espcies nativas (Heck, 1996; Marcon, s.d.). Com a finalidade de aprofundar as discusses com respeito ausncia de parmetros tcnicocientficos para orientar os extratores foi criado, atravs da Portaria IBAMA n. 321, de 21 de fevereiro de 1995, um Grupo de Trabalho constitudo por funcionrios do IBAMA, sob a coordenao da Superintendncia de So Paulo e com possibilidade de convidar pesquisadores do tema, com a finalidade estabelecer instrumentos mais eficientes para o controle da explorao, transporte e comercializao de plantas medicinais nativas ou suas partes, que possibilitem o acompanhamento desde a origem at o destino final (Scheffer, 1995; Marcon, s.d.). Em uma reunio posterior, o grupo elaborou uma Minuta de Portaria constatando que o grande problema com relao a este tema se devia deficincia de informaes sobre as prcticas de manejo e de cultivo (Marcon, s.d.).

13

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Sistema Integrado de Comrcio Exterior-SISCOMEX O Sistema Integrado de Comrcio Exterior um instrumento administrativo que integra as atividades de registro, seguimento e controle das operaes de comrcio exterior, tendo como objetivo simplificar e agilizar as operaes de importao e exportao e os controles exercidos pelos diversos rgos Federais. Foi implantado em todo o territrio nacional a partir de janeiro de 1997, por meio de um trabalho desenvolvido em conjunto com vrios rgos do governo federal envolvidos com as atividades de Comrcio Exterior (como por exemplo IBAMA, Departamento de Polcia Federal, Ministrio de Agricultura e de Abastecimento, Ministrio de Sade, Banco Central do Brasil, Banco do Brasil) (Dias, 2000). A Secretaria de Comrcio Exterior- SCE (SECEX) pertencente ao Ministrio de Desenvolvimento, Indstria e Comrcio Exterior o organismo responsvel pelo controle das operaes de comrcio exterior brasileiras. Os produtos de origem vegetal esto classificados no Sistema por diferentes cdigos includos dentro de Captulos. Os captulos mais importantes para este trabalho esto assinalados na Tabela 2. Algumas matrias vegetais, tais como raizes de Ginseng (cdigo n. 1211.20.00) possuem uma nomenclatura (NMC) especfica que permite a obteno de dados sobre exportao, enquanto que outras plantas como Ipecacuanha (Cephaelis ipecacuanha) e Fava-danta (Dimorphandra mollis) tm outra nomenclatura e esto includas no cdigo 1211.90.90, que corresponde a Outras (Outras plantas e partes, para perfumaria, medicina e semelhantes). TABELA 2CAP. 12 CAP. 13 CAP. 14 CAP. 29 CAP. 30 CAP.33

Foto: Suelma R. Silva

Fruto de Fava danta (Dimorphandra mollis)

Principais Captulos da NCM onde esto inseridos os produtos de origem vegetal aplicados a medicamentos Sementes e frutos oleaginosos; gros, sementes e frutos diversos; plantas industriais ou medicinais; palhas e forragens Gomas, resinas e outros sucos e extratos vegetais Matrias para entranar e outros produtos de origem vegetal no especificados nem compreendidos em outros captulos Produtos qumicos orgnicos Produtos farmacuticos leos essenciais e resinides; produtos de perfumaria ou de toucador, preparados e preparaes cosmticas

Fonte: Ferreira, 1998 e SCE n. 02/92

Para a realizao de controle de comrcio, o SISCOMEX utiliza instrumentos legais como a Portaria - IBAMA n. 83, de 15 de outubro de 1996, que define o tratamento administrativo para a exportao e importao de plantas medicinais (Tabelas 3 e 4). Esta Portaria estabelece a regulamentao da exportao de produtos e subprodutos oriundos da flora brasileira nativa e extica, onde se estabelecem quatro categorias de exportao, tomando-se em considerao a origem, natureza, espcies, quantidade, qualidade, grau de industrializao e outras, conforme a poltica de proteo e conservao dos recursos naturais renovveis (Art. 2):

14

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

1- Livre: se refere a mercadoria sem restrio para comercializao. 2- Limitada: se refere a mercadoria sujeita a procedimentos especiais ou a contingenciamento, observando no que cabe, as normas gerais e/ou tratamento administrativo que orientem a sua explorao. 3- Suspensa: se refere a mercadoria impedida temporariamente de ser exportada; e 4- Proibida: se refere a mercadoria cuja sada do territrio nacional vedada, considerando-se como tal aquela que assim esteja na lei e tratados ou em convenes internacionais reconhecidos pelo Brasil. O sistema SISCOMEX dava destaque somente para Ipecacuanha, Jaborandi, Fava-danta e Barbatimo (Marcon, s.d.). Desde 1999 o IBAMA solicitou mudanas no sentido de inlcuir destaque para outras plantas medicinais nativas y hoje h um destaque para outras espcies de plantas medicinais nativas e outro para exticas. A anlise dos relatrios de exportao atualmente disponveis, produzidos pelo SISCOMEX, indica que este sistema insuficiente para gerar dados mais transparentes sobre o comrcio de plantas. Por exemplo, na maioria de casos os nomes cientficos das espcies comercializadas no eram especificados ou estavam escritos de maneira confusa nos formulrios de exportao. O registro para controle se faz, em geral, com o nome popular, o que inviabiliza um conhecimento real das espcies comercializadas. A descrio da NCM tambm no especifica espcies e vrias plantas comercializadas como medicinais esto includas em categorias tais como: Outras Plantas e Partes para Perfumaria, Medicina e Semelhantes.

TABELA 3- Tratamento administrativo para exportao de plantas medicinais.1- Sementes e frutos oleaginosos; gros, sementes e frutos diversos; plantas industrias ou medicinais; palhas e forragensNCM* Descrio da NCM Outras plantas e partes, para perfumaria, medicina e semelhantes Destaque da NCMExclusivamente Ipecacuanha, na forma de sementes, mudas, raizes verdes e folhas.

Tratamento Administrativo Exportao proibida (Decreto n 264, de 30.11.61)***

1211.90.90**

Exclusivamente folhas de Exportao suspensa Jaborandi (Pilocarpus spp. Vahl.).

Exclusivamente Fava danta (Dimorphandra mollis Benth.), em mudas, sementes e frutos, ou qualquer outra parte da planta. Exclusivamente folha de Coca, Cnhamo-da-India (Cannabis L.) e outras plantas das quais se possa extrair substncias entorpecentes ou que determinem dependncia fsica ou psquica.

Exportao suspensa

Sujeita a autorizao prvia do rgo competente do Ministrio da Sade e Delegacia de Preveno e Represso a Entorpecentes do Departamento de Polcia Federal (Decretos-lei n 891, de 25.11.38, e n 753, de 11.08.69, e Lei n 6.368, de 21.10.75)

2- Matrias para entranamento e outros produtos de origem vegetal no especificados nem compreendidos em outros captulos. Destaque da NCM Descrio da NCM Tratamento Administrativo NCM1404.10.00 Barbatimo Exportao suspensa

Fonte: Portaria .n. 83/96-IBAMA * NCM- Nomenclatura Comum do MERCOSUL ** Cdigo utilizado para identificar a mercadoria *** Decreto revogado pelo Decreto s.n de setembro, 1991

15

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

Os relatrios utilizados esto elaborados com informao parcial e as categorias requeridas so muito gerais, gerando um processo ineficiente, devido a que duas agncias tratam de controlar o registro de exportaes com diferentes propsitos e no existe uma consulta nem coordenao com outros rgos relacionados. Muitas das informaes (como por exemplo, quais espcies apresentam restries para o comrcio ou requerem controle) que alimentam o sistema so geradas pelo IBAMA, ento a participao do mesmo fundamental para um melhor controle dessa atividade. Se requer uma melhor coordenao entre os diferentes organismos que manejam os sistemas de controle estabelecidos e faz falta uma anlise quantitativa mais precisa para determinar a magnitude dos problemas mencionados. TABELA 4Tratamento administrativo para importao de plantas medicinais, adotado pela Secretaria do Comrcio Exterior

1- Sementes e frutos oleaginosos; gros, sementes e frutos diversos; plantas industriais ou medicinais; palhas e forragens NCM Descrio da NCMOutras plantas e partes, para perfumaria, medicina e semelhantes

Destaque da NCM

Descrio do destaque da NCMCnhamo-da-ndia Cannabis L.

Tratamentos AdministrativosImportao sujeita a licenciamento no automtico a ser outorgada pelo Departamento da Polcia Federal e pelo Ministrio da Sade.**

1211.90.90

001*

002 003 004

Folhas de coca Espcies Claviceps paspali ou Datura suaveolens Willd Espcies: Cacto petote Lophophora willamsii (Lem.) J. M. Coult ou Prestonia amazonica (Benth. ex Mll. Arg.) J. F. Macbr.

** **

**

006

Quando trata-se de plantas vivas

Importao sujeita a licenciamento no automtico, a ser analisada pelo Ministrio da Agricultura e do Abastecimento.

Fonte: Port. N. 2-DECEX * Cdigo de destaque ** Aplica a especificao NCM do 001 ao 004

Com relao importao de plantas, o controle de sua entrada no pas realizado pelo Ministrio de Agricultura no que respeita aos aspectos fitosanitrios. Enquanto isso, preocupa o impacto das espcies exticas sobre a biodiversidade. No que se refere a plantas medicinais, os dados preliminares mostram que a Arnica (Arnica montana) uma das espcies exticas mais importadas. Outras encontram-se tambm includas dentro de categorias gerais que tem impedido a identificao das espcies. Marcon (s.d.), em sua anlise sobre a legislao relacionada com as plantas medicinais concluiu que a legislao federal pertinente a esta matria no correspondia plenamente s exigncias do setor. Em seu documento assinala algumas Diretrizes para a Gesto Ambiental/Plantas Medicinais onde prope a administrao destes recursos buscando seu desenvolvimento sustentvel e uma gesto participativa e integrada com outros setores, incluindo os usurios. Tambm prope o apoio tcnico e financeiro a projetos de pesquisa com o objetivo de garantir o aporte de conhecimentos necessrios aos processos de gesto; incentivar os cultivos; determinar espcies de maior interesse para a conservao a curto,

16

PLANTAS MEDICINAIS DO BRASIL: ASPECTOS GERAIS SOBRE LEGISLAO E COMRCIO

mdio e longo prazo; desenvolver processos de associaes intra e interinstitucionais que viabilizem a descentralizao do processo de gesto e promova aes encaminhadas a compatibilizar a utilizao racional dos recursos com a conservao do bosque nativo, melhorando as condies de vida das populaes locais. A proposta tambm contempla indicadores de desempenho e obstculos entre os que assinala a falta de pessoal e recursos financeiros, de difuso de informao a distintas instituies, o acelerado processo de extrao, a problemtica scio-econmica que envolve a temtica, a dificuldade de obteno do nome cientfico verdadeiro, a clandestinidade dos extratores e a falta de incentivo para a pesquisa. As alternativas ou solues propostas para vencer estes obstculos so: uma maior integrao intra e interinstitucional, contratao de pessoal especializado, concientizao dos extratores, monitoramento do comrcio por meio de um melhor conhecimento das presses econmicas que determinam os ndices de explorao, determinao de prioridades de pesquisa de manejo e cultivo de espcies que sofrem presso, incrementar o cultivo, melhorar os mtodos de processamento para buscar um mximo benefcio da matria prima e melhorar a qualidade e preo dos produtos (Marcon, s.d.). As atividades de controle e fiscalizao so mecanismos importantes no processo de proteo biodiversidade. O incumprimento das normas como consequncia da falta de conhecimento e a deficincia de fiscalizao so as principais causas dos problemas relacionados com a proteo da vida silvestre no Brasil. Esta deficincia determinada por vrios fatores mencionados anteriormente, tais como a carncia de pessoal especializado e infra-estrutura, o que dificulta a disponibilidade de informaes sobre a biodiversidade, o estabelecimento de estratgias mais eficientes de controle e a falta de penalizao aos infratores. Apesar da existncia de instrumentos legais relacionados