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Perseguidos e Esquecidos? Relatório Sobre a Perseguição aos Cristãos por Causa da Sua Fé 2011-2013 Sumário

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Perseguidos e Esquecidos?Relatório Sobre a Perseguição aos Cristãos por Causa da Sua Fé

2011-2013

Sumário

Perseguidos e Esquecidos?

2

Original

Edited by John Pontifex and John Newton.

Published by Aid to the Church in Need, 12-14 Benhill Avenue,

Sutton, Surrey SM1 4DA.

ACN is a Pontifical Foundation of the Catholic Church and a

registered charity in England & Wales (1097984) and Scotland

(SC040748).

Cover image shows the destruction of the Virgin Mary Church

in Imbaba, Cairo, Egypt, May 2011. Most photos © ACN (UK),

but the charity gratefully acknowledges permission to use the

following images: cover, EPA; p. 6, Zenit; p. 10, The Express

Tribune; p.11, Lauren E. Bohn; p. 13, Reuters; p.16, EPA/LUSA; p.

17, Assyrian International News Agency; p. 23, MEMRI TV; p.26,

AsiaLink and Andy Harrison. Every effort was made to trace and

contact copyright holders. For all enquiries relating to images

please contact John Newton at the above address.

Printed and designed by The Graphic Design House, Walton Road,

Farlington, Portsmouth, Hants PO6 1TR.

Portugal

Editado e publicado pela Fundação AIS

A imagem da capa mostra a destruição da igreja da Virgem Maria

em Imbaba, Cairo, no Egipto, Maio de 2011.

Maioria das fotografias © Fundação AIS. Um especial agradeci-

mento à colaboração da Agência LUSA.

Paginação de João Sotomayor Design

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

3

Perseguidos e Esquecidos?Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé

2011-2013

Resumo

Perseguidos e Esquecidos?

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Índice

1. Introdução. Cristianismo, perseguição e êxodo 5

2. Perspectivas globais: 75% da perseguição no mundo é contra os Cristãos 7

3. Metodologia de investigação – chegar ao fundo da questão 8

4. Perseguidos e Esquecidos? – os principais resultados 11

5. Médio Oriente – Primavera Árabe, Inverno Cristão 11

6. O Islamismo Militante – uma ameaça inter-continental 14

7. Minorias na mira das religiões maioritárias 18

8. Comunismo versus Cristandade – uma crise contínua 19

9. Estados socialistas – Sinais de Esperança e sinais de desespero 20

10. Conclusão – liberdade religiosa: “o teste decisivo” dos direitos humanos 21

11. Mapa 23

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

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ResumoIntrodução. Cristianismo, perseguição e êxodo“O nosso povo está muito aterrorizado. Con-

távamos com problemas, mas não com este

grau de violência”. Foi com forte emoção na

voz que o Bispo Kyrillos William de Assiut falou

aos colaboradores da Ajuda à igreja que Sofre,

um dia depois de uma vaga de actos violen-

tos contra os Cristãos que durou menos de 48

horas. O bispo explicou que cerca de oitenta

igrejas e outros centros Coptas, incluindo con-

ventos, escolas e clínicas, tinham sido ataca-

das em todo o país e que o medo fez com que

milhares de cristãos não se atrevessem a sair

de suas casas. “Muitos cristãos estão a sofrer”,

disse. “De algumas vilas chegam-nos gritos de

socorro de pessoas pedindo ajuda porque não

podem sair de suas casas”.1 Chocados com a

magnitude da violência, pedimos ao bispo que

nos explicasse porque é que a Igreja foi a prin-

cipal afectada, ao que nos disse: “Os atacan-

tes julgavam que os Cristãos eram os culpados

dos seus problemas. Estavam a castigar-nos e

transformaram-nos em bodes expiatórios”.

Os eventos de 14 e 15 de Agosto descritos

pelo Mons. Kyrillos demonstram o principal

objectivo da edição de 2013 de Perseguidos

e Esquecidos? Um relatório sobre os Cris-

tãos oprimidos por causa da sua fé. O re-

latório completo, disponível em www.acnuk.

1 ACN News, 19/08/2013

org/persecution, demonstra que os Cristãos

se transformaram em vítimas de prolongados

e intensos actos de violência, motivados, em

parte, pelo ódio religioso. Ao mesmo tempo,

no período em análise – de 2011 a 2013 -, as

fontes tanto directas como indirectas sugerem

que a violência e a intimidação são agora mais

sérias e graves que nos anos anteriores. No

seu conjunto, a opressão leva à questão da

sobrevivência a longo prazo do Cristianismo

em regiões onde, até há pouco tempo, a Igre-

ja tinha numerosos fiéis e desempenhava um

papel activo na vida pública. No entanto, se

olharmos para os diferentes locais de conflito

no mundo nos últimos três anos fica claro que

os Cristãos não têm sido sempre o principal

objectivo dos ataques, e que nem sempre tem

havido uma agenda religiosa por detrás dos

motivos que orientavam os agressores. Pes-

soas com e sem religião sofreram durante o

período da revolução, guerra civil e convulsão

internacional que tem acompanhado a Prima-

vera Árabe e a ultrapassa bastante. A compa-

ração do impacto da violência nos grupos reli-

giosos afectados revela dois factores-chave de

mudança: o primeiro, que como comunidades

numerosas bem estabelecidas e muitas vezes

com uma longa tradição, os Cristãos são des-

proporcionalmente vulneráveis a ataques; e,

em segundo ligar, que a sua reação foi fugir de

regiões de conflito com poucas probabilidades

de regresso, pelo menos a curto prazo. Estes

problemas similares – vulnerabilidade e êxodo

Perseguidos e Esquecidos?

6

Paquistão: casas incendiadas após acusações de blasfémia

Março 2013: 178 casas de cristãos e duas igrejas foram incendiadas quando uma multidão de 3.000 pessoas atacou Joseph Colony, perto de Badami Bah, Lahore, após a acusação de que Sawan Masih, jovem cristão de 26 anos trabalhador sanitário, difamou o Profeta Maomé. A acusação seguida de uma discussão com um barbeiro muçulmano, Imran Shahi, que se recusou a servi-lo. A polícia prendeu o jovem cristão Masih após Shahid acusá-lo de blasfémia, afirmando que o jovem insultou o Profeta Maomé enquanto bêbado. Na manhã seguinte, a multidão atacou a vila cristã. Um morador, Salamat Masih disse à AsiaNews, “Nós estávamos a trabalhar como todos os dias, quando começámos a ouvir barulho e de repente uma multidão de pessoas invadiu a vila. Eles atiraram ácido e apedrejaram as nossas casas e depois incendiaram-nas. As autoridades só intervieram depois de tudo destruído.” Os moradores fugiram e pelo menos trinta e cinco pessoas ficaram feridas. Ninguém foi morto.

O Bispo Sebastian Shaw de Lahore culpou o Governo do Es-tado do Punjab por não agir. O Bispo disse à AIS que o ataque de sábado, dia 9 de Março, foi “bem organizado” e poderia ter sido evitado pela adequada protecção policial, uma vez que o Governo “sabia…acerca da ameaça deste ataque acontecer.” O activista muçulmano de direitos humanos, Ameena Zaman, concordou com as declarações do Bispo: “A polícia ordenou aos cristãos de Joseph Colony para evacuarem as suas casas 12 horas antes do incidente. Se a polícia sabia que iria haver um ataque porque não fez nada para salvar os Cristãos?” Os líderes islâmicos condenaram a violência. O clérigo muçulma-no Shia Allama Zubair descreveu o ataque anti-cristão de ser “contra o Islão” acrescentando “apenas a paz e a harmonia poderá criar uma nação próspera.” O Padre Francis Nadeem homenageou os líderes muçulmanos agradecendo-lhes as suas mensagens de solidariedade e acrescentou, “Estou realmente muito feliz que o Governo do Punjab tenha ajudado as vítimas de imediato.”

Fonte: ACN (UK) News, 11/03/13; AsiaNews, 09/03/13, 11/03/13, 21/03/13.

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

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– também não são um fenómeno temporário,

mas que se foram aprofundando ao longo de

anos, décadas e, em alguns casos, séculos, e

que se tornaram tão pronunciados que levaria

muito mais do que uma mudança de Governo

para restaurar a confiança tão profundamente

destruída. O Cristianismo poderá continuar a

ser a maior religião do mundo, mas a sua bus-

ca de universalidade - uma verdadeira presen-

ça global nos cinco continentes - poderá desa-

parecer em breve, se ela se tornar a principal

vítima do aparecimento de estados teocráticos

onde grupos religiosos minoritários, especial-

mente os Cristãos, não são aceites ou, na me-

lhor das hipóteses, tolerados como cidadãos

de terceira classe.

Perspectivas globais: 75% da perseguição no mundo é contra os CristãosSe este prognóstico é alarmante, o início do

período de análise que é objecto neste relató-

rio – Primavera de 2011 - começou com uma

constatação sombria. Mesmo antes do início

da Primavera Árabe, evento que trouxe conse-

quências devastadoras para os Cristãos, espe-

cialistas nos direitos humanos declararam algo

de que suspeitavam há muito, mas nunca fora

provado, pelo menos até hoje: que o Cristia-

nismo é a religião mais perseguida no mundo.

Em Outubro de 2010, um relatório publicado

pela Comissão das Conferências Episcopais

Perseguidos e Esquecidos?

8

da Comunidade Europeia (COMECE) concluiu

que pelo menos 75% das perseguições religio-

sas do mundo são contra os Cristãos. De acor-

do com este relatório, cerca de 100 milhões

de Cristãos foram vítimas de alguma forma de

discriminação, opressão ou perseguição.2 Em-

bora o relatório COMECE tenha sido recebido

com cepticismo por alguns círculos, no entanto

os acontecimentos posteriores demonstraram

amplamente o grau de ameaça que existe con-

tra a Igreja. E, em Novembro de 2012, a chan-

celer alemã, Angela Merkel, declarou antes do

Sínodo da Igreja Protestante Alemã: “O Cris-

tianismo é a religião mais perseguida no mun-

do”.3 O que mudou desde a última edição de

Perseguidos e Esquecidos? publicado em

Março de 2011, é que grande parte dos mé-

dia aceitaram a gravidade da perseguição aos

Cristãos. As agências de notícias e outras or-

ganizações dos média têm informado sobre a

perseguição aos Cristãos como nunca tinham

feito antes. Têm divulgado estas notícias ape-

sar de terem sido acusados por alguns, incluin-

do o jornalista de assuntos de religião Rupert

Shortt, de não verem o problema, devido a um

falso sentimento de culpa em relação à evan-

gelização dos nativos em locais remotos pelas

potências coloniais do século XIX.4

2 Mark Greaves, “ O Cristianismo é a religião mais perseguida, afir-mam os Bispos Europeus”, Catholic Herald, 07/10/103 Andrew E. Harrod, “Angela Merkel qualifica o Cristianismo como ‘religião mais perseguida no mundo’”, The Institute of Religion and Democracy (página web), 12/11/12, http://www.theird.org/issues/religious-liberty/12-11-12-rl-angela-merkel-citeschristianity- as-the-worlds-most-persecuted-faith.

4 Cf. Rupert Shortt, Christianaphobia (Londres: Routledge, 2012).

Metodologia de investigação – chegar ao fundo da questãoPartindo da investigação da extensão das viola-

ções dos direitos humanos contra os Cristãos,

a edição de 2013 de Perseguidos e Esqueci-

dos? apresenta a situação vivida pelos mem-

bros da Igreja em trinta países onde o problema

é especialmente grave ou tem sido até recen-

temente. Os relatórios sobre cada país, mais

selectivos do que no geral, dividem-se em duas

partes. Uma primeira parte fornece uma análise

dos principais factos e números que compõem

o essencial de qualquer avaliação da liberdade

religiosa. Esta visão geral dos fenómenos po-

líticos (constitucional), económicos e culturais

é a base para uma avaliação dos indicadores

muito importantes de mudança e continuidade,

que representam a essência final do relatório.

Esta análise por países é, em cada caso, se-

guida por relatórios de incidentes específicos,

que variam consideravelmente em detalhe e

em extensão. Os critérios para a inclusão de in-

cidentes incluem qualquer forma de assédio ou

opressão (ou pior) exercida contra indivíduos

ou grupos, de modo a limitar o seu acesso à

liberdade religiosa. Os relatórios de incidentes

cobrem todos os principais grupos cristãos: Ca-

tólicos, Ortodoxos e Protestantes. Perseguidos

e Esquecidos? evita incluir grupos que se inti-

tulam cristãos com um enfoque excessivamen-

te materialista e que pregam um “evangelho da

prosperidade”, ou aqueles cujo conceito da fé

cristã se afasta dos valores aceites.

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

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Arábia Saudita: Chamada para destruir todas as igrejas

Março 2012: O Grande Mufti, Sheik Abdul Aziz ibn Abdullah, a maior autoridade religiosa na Arábia Saudita, declarou que todas as igrejas na Península Arábica deveriam ser destruídas. Ele tomou a decisão após a proposta de um membro da Assembleia Parlamentar de Kuwait ter pedido a proibição de construção de novas igrejas no país. A proposta foi rejeitada pelo Parlamento, mas uma ONG do Kuwait, a Sociedade do Renascimento da Herança Islâmica, chamou o Grande Mufti para o esclarecimento de uma posição da lei Islâmica sobre a proibição de novas igrejas. O Grande Mufti, que é também o presidente do Supremo Tribunal Saudita dos Estudiosos Islâmicos, citou o Profeta Maomé, dizendo que o Islão deve ser a única religião existente na Península Arábica. Ele disse que o Kuwait como fazendo parte da Península Arábica deve destruir todas as igrejas.

O Arcebispo Mark de Yegoryevsk, presidente do Departamento das Igrejas Russas Ortodoxas no exterior, disse: “Esta afir-mação é alarmante porque os países do Golfo Pérsico são habitados não só por inúmeros muçulmanos, mas também cristãos. Eles vivem lado a lado em paz, trabalham e contribuem construtivamente para a vida em cada um dos países”. Ele acrescentou que espera que os governos da região “ao serem surpreendidos com apelos deste sheik, o ignorem.”

Fonte: ArabianBusiness.com, 19/02/12; Interfax, 20/03/12; AsiaNews, 21/03/12.

Perseguidos e Esquecidos?

10

A este respeito é importante salientar que a

maioria dos relatórios de incidentes é de fon-

tes externas à AIS; de facto, a AIS tem uma

dívida de gratidão para com outras associa-

ções cristãs e com os meios de comunicação

religiosa (principalmente cristãos) e seculares.

Com a sua informação sobre a perseguição re-

ligiosa, que por vezes choca com resistências

de um Estado que quer evitar má publicida-

de, ou por parte de forças intolerantes do país

em questão que não quer atrair para si uma

atenção negativa contribui significativamente

para destacar a causa da liberdade religiosa.

Os autores de Perseguidos e Esquecidos?

prestaram muita atenção para selecionar ape-

nas fontes de confiança e, quando possível,

os dados foram comparados com a informa-

ção dos especialistas da AIS e com o material

recolhido nas viagens de projecto para países

onde a perseguição é mais grave. Em muitos

dos países analisados foram omitidas infor-

mações específicas e sensíveis que poderiam

colocar os Cristãos e outros em risco. Assim,

algumas das conclusões vão para além do que

a evidência indica. Determinados a defender o

princípio de “falar a verdade perante o poder”,

os autores do relatório tiveram que equilibrar

as responsabilidades, devido às pessoas que

recebem apoio directamente da AIS.

Esta pesquisa cuidadosa e completa com base

em métodos desenvolvidos ao longo de seis

anos e em quatro edições de Perseguidos e

Esquecidos?, mostra que a situação deterio-

rou-se na maioria dos países analisados. Mes-

mo no período desde a publicação do último

relatório, em Março de 2011, tem havido um

agravamento, quase sempre severo, na maio-

ria dos casos.

Analisando os resultados da pesquisa nos trin-

ta países em causa, a AIS comparou as ques-

tões de liberdade religiosa dos Cristãos no final

do período examinado com as relatadas nos

dois anos anteriores ou mesmo antes. Entre

as questões consideradas, destacámos a pre-

valência de violência anti-cristã, especialmen-

te os ataques contra igrejas, casas e lojas de

cristãos, bem como o sequestro de crentes de-

vido à sua fé ou identidade religiosa. Paralela-

mente, existem as acções judiciais que envol-

vem cristãos perseguidos: o número de casos,

a natureza dos (alegados) crimes e o resultado

das deliberações dos tribunais. Estas são par-

ticularmente importantes no que diz respeito

às acusações de blasfémia. Outra questão im-

portante tem sido os acontecimentos políticos

que dificultam ou promovem a causa do aces-

so dos Cristãos à liberdade religiosa, especial-

mente Constituições novas ou modificadas, ou

declarações e políticas governamentais sobre

questões-chave: autorizações para o clero via-

jar, as regras de planificação de projectos de

construção de igrejas, a atitude do Governo

para com os cristãos empenhados no debate

político e o direito de voto. Em quarto lugar,

mas não menos importante, é a tentativa de

acompanhar as mudanças sociais que afec

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

11

tam os Cristãos. Nesta categoria estão, entre

outros, o acesso ao emprego, à educação e à

saúde, onde o estigma social se tornou um há-

bito que impede os Cristãos de reivindicarem

os seus direitos, mesmo quando estão protegi-

dos pela lei. Tomados em conjunto, no entanto,

a avaliação não pode ser considerada exaus-

tiva, devido à escassez de provas. Além disso,

a opressão exercida por um Estado difere, por

natureza, totalmente dos actos esporádicos de

violência e as condições de perseguição que

não são uniformes ao longo do mesmo país.

De facto, a avaliação essencialmente quanti-

tativa da AIS, pela sua própria natureza, não

disponibiliza estatísticas para facilitar a análi-

se comparativa. Consequentemente, a fim de

proporcionar uma visão mais ampla, foram ela-

boradas análises realizadas por outras organi-

zações, reconhecidas pelo seu trabalho nesta

área de investigação da liberdade religiosa.

Perseguidos e Esquecidos? – os principais resultadosÉ neste contexto que Perseguidos e Esque-

cidos? conclui que tem havido uma deterio-

ração evidente e nalguns casos dramática na

maior parte dos países mais preocupantes. A

situação melhorou em apenas quatro dos paí-

ses em análise – melhoria esta marginal em

três dos casos. Em seis outros países não se

verificaram alterações significativas – em mui-

tos casos a situação já era tão complicada que

dificilmente poderia piorar. No meio de todos

estes resultados, a conclusão claramente mais

significativa da edição de Perseguidos e Es-

quecidos? de 2013 é de que em vinte dos trin-

ta países em análise, a situação dos Cristãos

piorou. Destes, apenas sete dos casos a dete-

rioração foi “ligeira”, o que significa que o des-

tino da maioria dos Cristãos tinha sofrido um

declínio tão grave que muitos vivem agora te-

mendo pela sua segurança, são pressionados

a abandonar ou a mudar de religião, ou pelo

menos estão em considerável desvantagem

devido à sua crença. Na maioria dos países

em análise, esta mudança para pior ultrapassa

as deteriorações apresentadas no relatório de

Perseguidos e Esquecidos? de 2011 e de-

monstra que apesar dos esforços para divul-

gar publicamente a situação dos Cristãos, os

passos práticos para enfrentar os problemas

ainda têm de dar algum fruto considerável.

Embora uma análise comparativa do número

de países em todo o mundo onde os Cristãos

enfrentam perseguição seja animador por si

só, é o colapso geográfico que fala mais alto

acerca das questões que dizem respeito à

opressão dos Cristãos.

Médio Oriente – Primavera Árabe, Inverno CristãoO Médio Oriente é a região mais preocupan-

te. Aí, a Primavera Árabe criou pressões sem

paralelo a comunidades cristãs antigas cuja

Perseguidos e Esquecidos?

12

capacidade de resistir a vagas de violência e

discriminação institucionalizada tem sido tes-

tada a um nível nunca visto na era moderna.

Aí, o factor dominante tem sido o êxodo dos

Cristãos em resposta à violência, às desvan-

tagens económicas e às mudanças culturais.

A migração em massa de fiéis também está di-

rectamente relacionada com actos individuais

– e nalguns casos a períodos mais longos – de

perseguição declarada. Estes incluem bombar-

deamentos de igrejas, ataques físicos a casas

e lojas de cristãos, raptos (principalmente de

mulheres e nalguns casos de membros do cle-

ro), bem como declarações públicas nos média

por grupos militantes, com o objectivo específi-

co de atingir os Cristãos. Uma explosão de vio-

lência e intimidação anti-cristã foi um dos fac-

tores, talvez o predominante, num movimento

em massas de Cristãos. Após 2002, a popu-

lação cristã do Iraque rapidamente caiu para

metade à medida que as pessoas emigravam

em massa como resposta ao contínuo conflito

sectário. As últimas estatísticas demonstram

que os Cristãos iraquianos ainda são pelo me-

nos 300.000, impulsionados em parte pelos re-

fugiados que regressam da situação explosiva

da Síria. No entanto, na Primavera de 2013,

D. Sako, o novo Patriarca Caldeu de Bagdade,

alertou os fiéis especificamente sobre as ter-

ríveis consequências da emigração contínua

dos Cristãos. Na sua Missa de tomada de pos-

se, disse à sua comunidade: “Se a emigração

continuar, Deus queira que não, deixará de ha-

ver Cristãos no Médio Oriente. [A Igreja] será

apenas uma memória distante.”5 Um país cuja

população cristã rondava 1,4 milhão – mais do

que o número de Cristãos praticantes em In-

glaterra – está agora à beira de mergulhar na

obscuridade.

A ameaça que agora se aplica ao Iraque corre

o risco de acontecer noutros países do Médio

Oriente, até ao momento com comunidades

cristãs de tamanho e solidez consideráveis.

É este o impacto da Primavera Árabe. A Síria,

até há bem pouco tempo o país de eleição dos

cristãos iraquianos em busca de um templo,

tornou-se agora o pesadelo que os refugiados

julgavam ter deixado para trás. É difícil encon-

trar estatísticas precisas sobre a situação na

Síria, como é de esperar num país em situa-

ção de fluxo prolongado, mas o que consta é

que o número de Cristãos que abandona a Sí-

ria é desproporcionalmente elevado em com-

paração com outros grupos religiosos. Houve

populações inteiras de vilas e aldeias predomi-

nantemente cristãs ao redor de Homs que fu-

giram no início de 2012 para salvarem a vida.

A violência contra os Cristãos é um factor difícil

de ignorar na onda de violência generalizada

que varreu a Síria. Ao assassinato grotesco do

popular Padre Fadi Haddad de Qatana, perto

de Damasco, em Outubro de 2012, seguiu-se

o rapto de dois Arcebispos de Aleppo, Boulos

Yagizi e Yohanna Ibrahim, em Abril de 2012. À

medida que o tempo se arrastava sem quais

5 ACN News, 07/03/13.

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

13

Eritreia: preso por causa da fé

Fevereiro 2012: Uma mulher que chegou ao Reino Unido da Eritreia descreveu a perseguição aos Cristãos no seu país que per-tencem a Igrejas não registadas. A mulher, que escapou pelo Sudão com 16 anos, deu detalhes dos seus amigos e familiares que ainda estão na Eritreia. Ela disse que o seu irmão de “comportamento educado” fez com que os seus superiores militares suspeit-assem que era cristão. Eles descobriram uma carta sob o seu colchão com referências à fé cristã. Após admitir que era cristão foi-lhe pedido que assinasse uma declaração afirmando que pararia de praticar a sua fé mas ele recusou. Ele foi preso por dois anos. Um outro amigo levantou suspeitas após recusar beber numa festa do campo militar e também foi preso após admitir que era cristão. A mulher disse que a saúde mental dos prisioneiros frequentemente fica afectada como resultado de serem forçados a fazerem “coisas ridículas” tais como contar grãos de areia debaixo de um calor extremo do sol do meio-dia. Ela disse ainda que os Cristãos ansiavam pela permissão de ir à Igreja e estavam em risco de detenção caso fossem apanhados com uma Bíblia.

Fonte: Christian Today, 18/02/12

Nota: Cerca de 2 a 3 mil Cristãos ainda estão detidos. Os relatórios descrevem que os presos por motivos religiosos são vítimas de torturas duradouras como sendo pendurados em árvores durante várias semanas, sendo forçados a andar descalços sobre pedras pontiagudas e espinhos ou açoitados com varas.

Perseguidos e Esquecidos?

14

quer notícias, aumentava o receio de que os

prelados estivessem mortos. Mas não foi ape-

nas a hierarquia que sofreu. A AIS encontrou

refugiados na Jordânia que relataram as se-

guintes ameaças: “Não celebrem a Páscoa ou

serão mortos como o vosso Cristo.”6 No Verão

de 2013, o número de refugiados sírios atingiu

os 2 milhões7, entre os quais um número sig-

nificativo de Cristãos. Os que se dispuseram a

contar a sua história descreveram uma situa-

ção desesperada em busca de uma nova vida

no Ocidente.

Depois do desviar da atenção do Iraque para

a Síria – ambos com comunidades cristãs dizi-

madas – foi a vez do Egipto.

Já marginalizados pela agenda islâmica do

presidente Mohammer Morsi, antigo membro

da Irmandade Muçulmana, a esperança dos

Cristãos num novo começo, após a queda do

presidente em Julho de 2013, foi rapidamen-

te esmagada. A violência contra os Cristãos

Coptas do país em Agosto de 2013 assistiu a

quase oitenta igrejas e outros edifícios da Igre-

ja serem atacados num único grande golpe

à maior comunidade cristã do Médio Oriente,

constituída por cerca de 10 milhões de pes-

soas. Desde a queda do presidente Mubarak,

em Fevereiro de 2011, já abandonaram o país

200.000 cristãos. Seguramente, muitos mais

irão sair e os que ficarem muito provavelmen-

te irão ter dificuldades em desempenhar um 6 ACN report, Hope in the Darkness: Keeping Faith alight in the Middle East (February 2013).7 Dados das Nações Unidas em <http://data.unhcr.org/syrianrefugees/syria.php>.

papel significativo no desenvolvimento de um

país cujo futuro está na balança.

Os Cristãos no Médio Oriente estão a sofrer

de uma violência com efeito de dominó, que

começou no Iraque, espalhando-se pela Síria

e agora ensombra o Egipto, deixando a sobre-

vivência da Igreja em perigo. Os Cristãos que-

rem sair, e o fim da presença da Igreja no seu

antigo berço já não é uma possibilidade remota

mas uma ameaça premente muito real. Estas

circunstâncias aplicam-se a todos os países

com uma (anteriormente) grande comunidade

cristã e a países como o Iémen, onde o núme-

ro de fiéis é pequeno.

O Islamismo Militante – uma ameaça inter-continentalMuitos dos problemas enfrentados pelos Cris-

tãos no Médio Oriente são semelhantes, pela

sua natureza e magnitude, a outros do resto

do mundo: a ligação comum, em muitos casos,

é o Islamismo militante. No período em ques-

tão verificou-se um auge sem precedentes

do Islão fundamentalista que tenta erradicar

o Cristianismo onde quer que este se encon-

tre. Ataques dos Muçulmanos, que antes eram

poucos e distanciados entre si, agora são habi-

tuais e os Cristãos pagam-no com a sua vida.

Cada vez mais comunidades têm sofrido com

isso, tendo os meios de comunicação social

internacionais dedicado uma cobertura relati-

vamente escassa a estes casos.

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

15

O Islamismo militante teve um enorme impac-

to no Médio Oriente mas os problemas que

trouxe aos Cristãos têm de ser vistos num

contexto mais generalizado, nomeadamente

no aumento da instabilidade geral, o desca-

labro da lei e da ordem e a pobreza causada,

pelo menos em parte, pelas deslocações for-

çadas. Em termos gerais o mesmo se aplica a

muitas partes de África. Neste caso, a amea-

ça concreta do Islamismo contra os Cristãos

ficou evidente como resultado da sua emer-

gente combinação de problemas: políticos,

económicos e sociais. O exemplo mais óbvio

é a Nigéria. Em Abril de 2011, a Associação

Cristã da Nigéria informou que 430 igrejas

sofreram ataques violentos associados às

eleições presidenciais que levaram ao poder

Goodluck Jonathan, um cristão do sul. Cerca

de 65.000 pessoas foram expulsas de suas

casas e 800 morreram. Após as eleições a

violência continuou, não só contra os Cristãos

mas também contra estruturas de segurança,

edifícios governamentais, mercados e até co-

munidades muçulmanas. Sobretudo no norte,

os Cristãos foram aterrorizados por ataques

contra igrejas superlotadas de crentes que se

sucediam quase todos os Domingos. Os res-

ponsáveis por esta violência, pertencentes ao

grupo militante Boko Haram (que significa “A

Educação Ocidental é proibida), declararam

“guerra contra os Cristãos”. Um porta-voz do

Boko Haram disse: “Faremos todos os esfor-

ços que pudermos para acabarmos com a

presença cristã e assim termos um verdadei-

ro Estado islâmico onde os cristãos não te-

nham lugar”. Na terra natal do Boko Haram no

nordeste da Nigéria, a igreja foi esmagada.

No Verão de 2013 soube-se que metade das

igrejas das trinta d e sete paróquias da Dio-

cese de Maidugun foram danificadas ou des-

truídas num ano. A investigação feita durante

o ano até Outubro de 2012 mostrou que, dos

1.201 cristãos assassinados por causa da

sua fé em todo o mundo, 791 eram da Nigé-

ria. Mas a Nigéria não é o único caso.

O relatório Perseguidos e Esquecidos? de

2013 mostra o impacto do Islamismo militante

nos países africanos, incluindo o Sudão, não

podendo no entanto informar sobre o aumento

repentino do extremismo por causa do poten-

cial impacto que esta cobertura poderia ter na

vida dos cristãos que lá vivem. Um influente

membro do clero sudanês informou que os pro-

blemas que ocorreram durante o período de

2012-2013 foram, em certos aspectos, piores

que os registados durante a guerra civil (1983-

2005). Temos também a Tanzânia, onde mu-

çulmanos armados dispararam contra igrejas

e sacerdotes na Ilha de Zanzibar num ciclo de

violência que só foi conhecido nas primeiras

páginas quando muçulmanos suspeitos dei-

taram ácido sobre duas jovens britânicas de

18 anos que cantavam durante o Ramadão. O

Islão fundamentalista também foi um proble-

ma nas Maldivas, o popular destino turístico

do subcontinente asiático. Por falta de espa-

Perseguidos e Esquecidos?

16

ço, o relatório Perseguidos e Esquecidos? não pode cobrir os ataques islâmicos na

República Centro Africana onde, em Julho de

2013, a menos de seis meses do golpe de Es-

tado, o grupo fundamentalista Seleka organi-

zou ataques contra catorze povoações cristãs,

deixando para trás quinze mortos e quase mil

pessoas desalojadas.

Esta violência desencadeou memórias dos

Muçulmanos no Mali, que em 2012 organiza-

ram um dos ataques mais ferozes de muçulma-

nos fundamentalistas dos tempos modernos.

Em Agosto daquele ano, fontes conhecidas

da Igreja informaram que 200.000 cristãos do

Norte do Mali fugiram da região controlada pe-

los Muçulmanos para a vizinha Argélia.

Poucas regiões de África estavam agora livres

da ameaça dos movimentos militantes islâmi-

cos cujo objectivo era o domínio de todo o con-

tinente e cujo alvo primordial do ódio religioso

eram os Cristãos. A militância, que alcançou

nestes países níveis sem precedentes, su-

geria que a Igreja africana poderia deixar em

breve de registar o crescimento sustentado

de que havia gozado durante tantas décadas.

Esta violência demonstra que África corre tan-

to perigo como aquelas regiões do subconti-

nente asiático que têm uma longa história de

Islamismo fundamentalista e militante, a saber,

Paquistão e Afeganistão. Aqui, os extremis-

tas doutrinados nas madrassas islâmicas, con-

tinuam a exercer uma continuada violência e

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

17

Nigéria: Igrejas bombardeadas

Dezembro 2011 / Janeiro 2012: O presidente Goodluck Jonathan decretou o estado de emergência em zonas do país após os ata-ques do Boko Haram. A medida foi forçada em quatro estados no Nordeste, no Centro e no Oeste do país, com o presidente pro-metendo esmagar o Boko Haram e encerrando as fronteiras durante este período. Seguiu-se uma onda de violência culminando com numerosos ataques no dia de Natal, incluindo igrejas nas cidades de Madalla, Jos, Kano, Damaturu e Gadaka. Num dos ata-ques desse dia, quarenta e quatro pessoas foram mortas e mais de oitenta ficaram feridas quando os extremistas tomaram como alvo os participantes na Missa da Igreja Católica de Santa Teresa em Madalla, próxima da capital da Nigéria, Abuja. A maioria dos mortos eram eram crianças, incluindo um menino de quatro anos Emmanuel Dike, que foi morto ao lado do seu pai, o seu irmão e irmã. Também morreu Chiemerie Nwachukwu, um bebé de oito meses junto da sua mãe. O seu Bispo, Martin Igwe Uzoukwu, de Minna, disse à AIS: “O nosso povo sofreu tanto, mas a nossa resposta não deve ser de raiva mas de procura de paz e justiça.”

Fonte: BBC News (online), 01/01/12; ACN (UK), “Comfort my People”: Nigeria in Crisis report (Spring 2012).

Perseguidos e Esquecidos?

18

intimidação contra os Cristãos humilhando-os

com acusações falsas de blasfémia, que por

sua vez desencadeiam rapidamente violência

contra comunidades cristãs inteiras. A dramá-

tica expansão do Islamismo militante, sobretu-

do desde o início da década de setenta, repre-

senta agora, talvez a mais importante ameaça

para a liberdade religiosa no mundo.

Armados, treinados, altamente motivados e

com sistemas de comunicação altamente so-

fisticados, estes grupos militantes islamitas

têm acesso a importantes recursos económi-

cos, pelo que se torna necessário perguntar

de onde provem o seu financiamento e que

estratégias se podem desenvolver para o re-

duzir. Mas também há um factor compensató-

rio de enorme importância: segundo a expe-

riência dos beneficiários dos projectos da AIS

e de outras associações beneméritas e or-

ganizações religiosas, apesar dos vigorosos

esforços realizados para radicalizar as comu-

nidades onde predomina o Islão ou onde se

está a expandir, grande parte – senão a maio-

ria – das pessoas é resistente ao extremis-

mo e só quer conviver em paz e prosperidade

com os seus vizinhos. Assim foi evidenciado

pelos Muçulmanos que no Verão de 2013 fi-

caram lado a lado com os cristãos egípcios

para mostrar a sua repulsa perante as mul-

tidões extremistas empenhadas em destruir

igrejas, casas e lojas cristãs.

Minorias na mira das reli-giões maioritáriasSempre que uma religião faz parte de uma

identidade nacional homogénea, todos os

membros das outras crenças são considera-

dos estranhos e uma ameaça para a norma.

Tanto no Sri Lanka como em Mianmar, onde

se tenta impor a fé maioritária, o Budismo, a

intolerância religiosa caracteriza-se pelos ata-

ques contra os que professam outras religiões.

Em ambos os países, a religião e a etnia con-

sideram-se, em maior ou menor grau, indisso-

luvelmente unidas. Após a guerra civil no Sri

Lanka, o nacionalismo budista singalês ressur-

giu para que a identidade do país fique estrei-

tamente vinculada à etnia singalesa e à cultura

do Budismo Theravada. Tudo isto conduziu a

um aumento dos ataques violentos contra os

cristãos e outras minorias religiosas. De Janei-

ro a Maio de 2013 registaram-se, pelo menos,

quarenta e cinco incidentes de perseguição

contra cristãos, frente a “apenas” cinquenta e

duas durante todo o ano de 2012. Apesar das

importantes reformas políticas em Mianmar

em 2011 e 2012, a repressão de grupos étnico

-religiosos continua nas áreas tribais do norte.

Ali onde o exército tenta exercer um controle

através da força, sabe-se que as tropas pres-

sionam os habitantes para que se convertam

ao Budismo. “Quando o exército birmanês en-

tra nas povoações, incendeia as igrejas mas

não toca nos pagodes. Querem que sejamos

birmaneses e budistas e que obedeçamos às

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

19

suas ordens” diz Hkanhpa Sadan, secretário

adjunto da Organização Nacional Kachin.8

Entretanto, na Índia, numerosos problemas

enfrentados pelos Cristãos estão ligados à

proeminência dos partidos políticos hindutva

como o partido Bharatiya Janata, presente nos

governos locais de Kamataka e Orissa. O hin-

dutva é uma forma de nacionalismo hindu de

direita que, de um modo geral, considera que a

Índia é um país hindu que não deve tolerar ou-

tras religiões ou culturas. Em alguns estados,

demonstrou-se que o Governo foi cúmplice da

violência perpetrada contra os Cristãos por

hindutva radicais, incluindo mutilações faciais,

destruição de igrejas, bíblias, crucifixo, carros

e profanação de sepulturas.

Comunismo versus Cristan-dade – uma crise contínuaApesar dos problemas crescentes colocados

pelo Islamismo militante e outras formas de ex-

tremismo religioso, não é esta a preocupação

no país onde a perseguição aos Cristãos está

ao rubro: a Coreia do Norte. Neste estado al-

tamente secreto, hermeticamente isolado do

mundo exterior, a actividade religiosa formal

permanece virtualmente ausente e o pouco

que acontece é bastante controlado. Investi-

gações conduzidas pela Human Rights Watch

e pelas Nações Unidas revelaram que as pes-

soas que eram apanhadas a rezar – principal-

mente se envolvesse organizações estrangei-8 World Watch Monitor, 11/03/13.

ras – provavelmente seriam executadas Num

país com 24 milhões de habitantes e uma po-

pulação cristã de cerca de 500.000 pessoas,

existem apenas quatro igrejas (reconhecidas)

no país – uma católica, uma ortodoxa e duas

protestantes. A mudança de líder durante o pe-

ríodo em análise – Kim Jong-un que sucedeu

a Kim Jong-II – nada contribuiu para melho-

rar a situação, muito pelo contrário, se algu-

ma mudança ocorreu foi para pior. O caso da

Coreia do Norte realça o alcance do contínuo

sofrimento atroz dos Cristãos sob os regimes

comunistas ou pseudo-comunistas. A nossa

preocupação vai especialmente para a China,

onde num esforço concertado a fim de forçar

as comunidades de fé a cooperar com as au-

toridades, o regime endureceu a sua resposta

à não-colaboração. Muitas religiões sofreram,

particularmente os Cristãos. De acordo com

a investigação de uma influente organização

cristã americana de direitos humanos, houve

mais de 130 casos de perseguição em 2012

envolvendo quase 5.000 pessoas – mais de

40% do que no ano anterior.9 Os relatórios indi-

cam um aumento significativo na interferência

do Governo na vida religiosa das comunidades

católicas – tanto oficiais (reconhecidas pelo

Estado) como clandestinas (sem a aprovação

do Governo). Sacerdotes e religiosas têm sido

forçados a frequentar programas de “reeduca-

ção” – seminários sobre a política do Governo

acerca da religião. A uma escala nunca vista,

funcionários provinciais confiscaram terrenos 9 ChinaAid, 04/02/13.

Perseguidos e Esquecidos?

20

e imóveis a comunidades protestantes reco-

nhecidas pelo Governo. No caso das igrejas

domésticas, o Governo forçou os Cristãos a

colocar-se sob o controlo do Estado ou a en-

cerrar as suas portas. Determinadas a recusar

um controlo rigoroso, incluindo a apresentação

de listas dos membros da Igreja, muitas comu-

nidades resistiram às ordens governamentais

e sofreram as consequências, incluindo a pri-

são. Outros países com um passado comunis-

ta continuaram a impor graves dificuldades aos

Cristãos, muito especialmente o Vietname. Aí,

em Janeiro de 2013, uma nova lei (Decreto-Lei

92) aumentou o controlo do Governo sobre os

grupos religiosos.

Estados socialistas – Sinais de Esperança e sinais de desesperoMas noutros estados comunistas, a situação

melhorou. No Laos, houve menos detenções

de cristãos e os que foram presos receberam

penas de prisão mais curtas. As autoridades

provinciais pelo menos em algumas áreas pro-

curaram proteger grupos de cristãos perse-

guidos quando os anciãos das vilas e outros

funcionários os oprimiam. Em Cuba, a Igreja

Católica reportou progressos significativos nas

relações com o regime de Raul Castro. Em

parte, estes progressos estiveram relaciona-

dos com a visita do Papa Bento XVI à ilha em

Março de 2012, quando as celebrações religio-

sas em toda a nação avançaram com a total

colaboração do Governo. Tudo isto graças ao

êxito de uma viagem semelhante a Cuba pelo

agora Beato João Paulo II. Outros desenvolvi-

mentos, incluindo a devolução dos edifícios da

Igreja confiscados pelo regime cinquenta anos

antes, ocorreram independentemente da visita

de Bento XVI e apresentavam a marca da re-

conciliação entre o Estado e a Igreja por meio

da qual os líderes católicos desempenharam

um papel chave de mediação entre o regime

e certos grupos descontentes. Mas os proble-

mas continuaram, com algumas comunidades

cristãs, particularmente protestantes, a repor-

tar censura contínua por parte do Governo.

Relativamente aos antigos países marxistas

e comunistas, as restrições do passado ainda

subsistem de certa forma. Na Bielorrússia os

grupos de fé continuam a necessitar da per-

missão do estado para realizar actividades re-

ligiosas, especialmente permissão a fim de ce-

lebrar serviços públicos – e os grupos cristãos

não registados junto do Estado viram as suas

propriedades ser confiscadas e/ou foram mul-

tados por participar em actos de culto não au-

torizados. No Turquemenistão, Usbequistão

e outros países vizinhos, o Estado controla e

investiga todas as actividades. As publicações

religiosas são reguladas estritamente e os ma-

teriais proibidos podem ser confiscados. Em

Novembro de 2012, na região do Tashkent do

Usbequistão, um protestante foi multado em

100 vezes o valor do seu ordenado por dis-

tribuir literatura religiosa – o funcionário que

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

21

apresentou a “análise de peritagem” utilizada

no caso alegadamente conseguiu ler 1.330 li-

vros, 2.100 brochuras, 450 folhetos, cinquenta

revistas bem como assistir a 200 vídeos e ouvir

350 cassetes de áudio – tudo durante um dia

de trabalho. Na Eritreia, onde o actual partido

do poder, Frente Popular para a Democracia e

Justiça, é o sucessor directo da Frente Popular

da Libertação da Eritreia, um grupo marxista,

a perseguição aos Cristãos intensificou-se nos

primeiros cinco meses de 2013 com a deten-

ção de pelo menos 191 cristãos por praticarem

a sua fé. Os relatórios apresentam a Eritreia

como um dos piores países relativamente à

perseguição dos Cristãos. Informação com-

pilada sobre o país descreve como os prisio-

neiros religiosos – cujo crime habitualmente é

nada mais do que tentar praticar a sua fé e

rezar livremente – sofrem tortura, incluindo se-

rem forçados a andar descalços sobre pedras

pontiagudas e espinhos durante uma hora to-

dos os dias. Os Cristãos também foram espan-

cados com varas a fim de fazerem confissões

e ameaçados de morte se não renegassem a

sua fé. Estima-se que cerca de 3.000 cristãos

continuem presos por causa da sua fé.

Conclusão – liberdade religiosa: “o teste decisivo” dos direitos humanosPara a Igreja Católica, a liberdade religiosa é a

pedra angular da liberdade como um todo, ou

como o Papa João Paulo II lhe chamou “o teste

decisivo pelo respeito de todos os outros direi-

tos humanos”.10 Em Janeiro de 2011, no início

do período em análise, o Papa Bento XVI su-

blinhou a questão, afirmando que a liberdade

religiosa “não pode ser negada sem simulta-

neamente lesar todos os direitos e liberdades

fundamentais, uma vez que é a sua síntese e

pedra angular”.11 Daí que Perseguidos e Es-

quecidos? não seja apenas relevante para os

Cristãos ou para as pessoas de fé, mas tem

algo a dizer a toda as pessoas que se preocu-

pam com a questão da liberdade. Assim, é de

enorme importância concluir realçando o resul-

tado chave do relatório, particularmente que a

perseguição dos Cristãos tem piorado – mes-

mo nos últimos três anos – na maioria dos paí-

ses onde a situação é mais grave. Enquanto

tem havido alguns progressos em certos paí-

ses comunistas ou de esquerda, como Cuba

e o Laos, regra geral os Cristãos são vítimas

de um aumento de violência e opressão, em

muitos casos de um nível inimaginável há uma

geração. Noutros países comunistas e ante-

riormente comunistas, muito particularmente a

China, uma renovada repressão aos Cristãos

provocou um regresso ao passado em relação

às perspectivas da liberdade religiosa.

Por muito significativo que isto seja, é a Prima-

vera Árabe que constitui o principal motor dos

acontecimentos. Um movimento que começou

10 Papa João Paulo II, Aos participantes na Assembléia Parla-mentar da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (O.S.C.E.), 10/10/03.11 Papa Bento XVI, Mensagem para o Dia Mundial da Paz,

01/01/11.

Perseguidos e Esquecidos?

22

com muitas promessas em relação ao avan-

ço da democracia provou ter sido desastro-

so para os Cristãos, cuja presença nalgumas

regiões do Médio Oriente está agora por um

fio. O efeito dominó da perseguição e a turbu-

lência anti-cristãs é agora claramente visível,

começando no Iraque, deslocando-se para a

Síria e espalhando-se agora para o Egipto –

três países do Médio Oriente com comunida-

des de tamanho e influência consideráveis. A

população cristã sofreu um declínio rápido a

par com a mudança radical das atitudes po-

líticas no sentido de favorecer um sistema

teocrático. Em termos gerais, com a possível

excepção da Jordânia, nenhum país do Médio

Oriente assistiu nos últimos três anos a outro

cenário para além do declínio do destino dos

Cristãos. Mas os problemas disseminaram-se

para além da Primavera Árabe, com o Islamis-

mo militante representando a principal amea-

ça, principalmente em África mas também em

regiões chave do sub-continente asiático. Aí a

Cristandade é perseguida como nunca antes.

Sendo uma Instituição empenhada no auxílio

aos Cristãos que sofrem por causa da sua fé,

a Ajuda à Igreja que Sofre está determinada

a fazer tudo o que for possível para ajudar. A

ajuda prática de natureza pastoral é o objecti-

vo central da Instituição, apoiando sacerdotes,

religiosas e leigos na proclamação do Evange-

lho e na promoção dos valores cristãos – es-

pecialmente através da formação da fé. Numa

época em que se verifica um aumento da crise

humanitária, sobretudo na Síria e noutros pon-

tos do Médio Oriente, a AIS oferece alimentos,

medicamentos e outras formas de ajuda. Mas

ajudar é uma coisa e combater a ignorância e

a desinformação é outra bem diferente. Uma

e outra vez, os bispos e outros parceiros de

projecto com quem a Instituição trabalha em

mais de 130 países de todo o mundo, contac-

tam a AIS para que faça mais em prol da sen-

sibilização em todo o mundo sobre a situação

dos Cristãos que sofrem. Num mundo cada

vez mais rápido estão cada vez mais cons-

cientes da necessidade de agarrar as poucas

oportunidades que têm para falar do seu povo

perseguido. Foi isto que levou o Bispo Kyrillos

a falar à AIS sobre os ataques de Agosto de

2013 que provocaram tantos danos em igrejas

e outros centros cristãos em todo o Egipto. A

informação tem um valor muito próprio. Mas

também serve um objectivo, uma preocupação

presente entre os bispos, que repetidamente

pedem orações solidárias pelo seu povo sofre-

dor. D. Joannes Zakaria de Luxor, bispo copta

católico, ao descrever como a polícia o salvou

intervindo justamente quando os muçulmanos

invadiam a sua residência, incitou a AIS a man-

ter o contacto, pelo menos para que outros te-

nham conhecimento do testemunho de fé de-

monstrada por aqueles que estão dispostos

a dar a sua vida pela sua fé. Perseguidos e

Esquecidos? é uma homenagem à coragem

e à fé de pessoas como o Bispo Joannes, que

conclui a sua mensagem à AIS partilhando a

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

23

sua opinião pela a harmonia entre as religiões

que permanece mais viva do que nunca

apesar das actuais dificuldades e sofrimento.

E escreve-nos: “Estamos felizes por sofrer e

sermos vítimas, e perder as nossas igrejas,

casas e sustento, a fim de salvar o Egipto

para os Cristãos e o Muçulmanos. Precisamos

de orações de todos para resolver os nossos

problemas. Estamos preocupados com o

nosso futuro, para que as pessoas [de todas

as crenças] possam viver lado a lado.”

Perseguidos e Esquecidos?

24

Bielorrússia

Turquia

or

Zimbabué

Sudão

Egipto

Mali

Bósnia-Herzegovina

Nigéria

Cuba

Israel e Palestina

Perseguidos e Esquecidos? Mapa da opressão/perseguição dos Cristãos, realçando os paísesincluídos no relatório 2011-2013.

Natureza da perseguição/opressão Número de Paísesem cada categoria

= Extrema 9

= Elevada a extrema 5

= Elevada 7

= Moderada a elevada 2

= Moderada 7

= Não incluido nesta análise Não se aplica

= A Situação melhorou 4 ou 5*

= A Situação manteve-se 5 ou 6*

= A Situação piorou 20

Onde as setas estão transparentes, a situação não se alterou signi�cativamente.

*Não é conclusivo se a situação melhorou ou se manteve na Turquia devido a vários factores

Turquemenistão

Usbequistão

Afeghanistão

Paquistão

Mianmar

Laos

Vietname

Índia

Turkey

China

Tanzânia

Iémen

Sri Lanka

Maldivas

ArábiaSaudita

Coreiado Norte

Indonésia

Eritreia

Síria

Irão

Iraque

Relatório sobre a perseguição aos Cristãos por causa da sua Fé | 2011-2013

25

Bielorrússia

Turquia

or

Zimbabué

Sudão

Egipto

Mali

Bósnia-Herzegovina

Nigéria

Cuba

Israel e Palestina

Perseguidos e Esquecidos? Mapa da opressão/perseguição dos Cristãos, realçando os paísesincluídos no relatório 2011-2013.

Natureza da perseguição/opressão Número de Paísesem cada categoria

= Extrema 9

= Elevada a extrema 5

= Elevada 7

= Moderada a elevada 2

= Moderada 7

= Não incluido nesta análise Não se aplica

= A Situação melhorou 4 ou 5*

= A Situação manteve-se 5 ou 6*

= A Situação piorou 20

Onde as setas estão transparentes, a situação não se alterou signi�cativamente.

*Não é conclusivo se a situação melhorou ou se manteve na Turquia devido a vários factores

Turquemenistão

Usbequistão

Afeghanistão

Paquistão

Mianmar

Laos

Vietname

Índia

Turkey

China

Tanzânia

Iémen

Sri Lanka

Maldivas

ArábiaSaudita

Coreiado Norte

Indonésia

Eritreia

Síria

Irão

Iraque

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