percepÇÃo ambiental de uma comunidade quilombola ... · demonstram uma diferença visual de matas...
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1, 2 Graduandas do curso de Geografia licenciatura pela Instituição GSF (Grupo Santa Fé). 3Graduação em engenharia agrônoma pela UEMA – Universidade Estadual do Maranhão; mestrado em agroecologia (UEMA) e Doutoranda em biotecnologia e biodiversidade pela rede Bionorte.
PERCEPÇÃO AMBIENTAL DE UMA COMUNIDADE QUILOMBOLA
PERTENCENTE AO MUNICÍPIO DE MORROS-MA
Raymara Fernanda Dutra Martins¹
Luisa Carolina Ramalho Martins²
Georgiana Eurides de Carvalho
Marques³
INTRODUÇÃO
As bacias hidrográficas desempenham um papel importante para a
manutenção do equilíbrio da natureza. Nas superfícies subterrâneas existe uma
abundância de água nas áreas banhadas por essas bacias. A água que ocorre abaixo da
superfície da terra preenche os poros ou vasos intergranulares das rochas sedimentares,
desempenham um papel essencial na manutenção e umidade do solo; dos fluxos dos
rios, lagos e brejos (LOUSADA apud Campos et al 1998. não paginado). Nos domínios
rochosos a água subterrânea está armazenada em fraturas, falhas e juntas, caracterizando
o meio de porosidade secundária. Da superfície provem os afluentes, fontes que
deságuam nos rios.
O homem sempre esteve ligado às bacias hidrográficas, como exemplo
temos a bacia do rio Nilo que é o berço da civilização egípcia. O rio Nilo é o rio mais
longo do mundo, percorrendo 6.700Km e drenando uma área de aproximadamente 3
milhões de Km², cerca de 10% do continente africano (Howell & Allan 1995 não
paginado). No entanto ao longo dos anos a humanidade tem aumentado o potencial
populacional, tendo novas descobertas e modos de vida. Como conseqüência de toda
essa evolução, a natureza está num estado critico, os rios vêm sofrendo durante séculos
a ação humana e econômica das regiões onde circulam.
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No corrente século observa-se uma grande demanda por água, a partir dessa
ocorrência países exercitam a guerra na busca pela sobrevivência. Entretanto há lugares
em que a população é privilegiada por esse bem, é caso do povoado de Mato Grosso,
onde se observou uma quantidade significativa de fontes provenientes do rio Una que
abastece a população.
O município de Morros está localizado na mesorregião norte maranhense e na microrregião de Rosário e faz parte da Bacia Hidrográfica do Rio Munin. “O povoado Mato Grosso pertencente a este município encontra-se próximo ao Igarapé São Benedito e está localizado na coordenada geográfica 44º 01’ 11.09” de longitude oeste e 02º 50’ 28.42” de latitude sul ou UTM 608959.6342E e 9685909.2361N e fica aproximadamente a 4km da sede do município de Morros”(UEMA, 2014).
A fonte igarapé São Benedito é um afluente, contribuinte da bacia do rio
Una, formando a bacia hidrográfica do rio Munim que se estende desde o município de
Aldeias Altas, banha 19 municípios maranhenses e desemboca na Baia de São José de
Ribamar.
A bacia do Rio Munim situa-se ao Nordeste do Estado do Maranhão e abrange 26 dos 217 municípios maranhenses, totalizando uma área estimada de 15.926,94 Km², o que corresponde a 4,8% do Estado, onde vive uma população de aproximadamente 400 mil habitantes (JÚNIO 2008, p.57 apud Maranhão, 2006).
O riacho Mato Grosso como também é conhecido, está sendo vítima de
ações antrópicas dos moradores do povoado e da região, que provocam uma mudança
no equilíbrio fluvial de maneira descontrolada. As queimadas agressivas geradas pela
agricultura também interferem na destruição das matas ciliares, provocando e
acelerando o processo erosivo, resultando na diminuição da vazão do igarapé. Outra
ação é a grande quantidade de lixo sólido de origem doméstica jogada dentro e na
margem do riacho, que auxilia no assoreamento do rio. Além disso, na tentativa de gerar
lucros, os moradores estão desmatando a mata ciliar para melhorar o aspecto visual do
rio, o tornando mais atrativo para o turismo.
Assim este trabalho teve por objetivo pesquisar a situação atual do riacho
localizado no povoado de Mato Grosso, Morros-Ma, a partir da percepção dos seus
moradores.
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METODOLOGIA
A pesquisa foi realizada no período de agosto a setembro de 2013 no
povoado de Mato Grosso pertencente ao município de Morros- MA. Analisando a
melhor forma de obter as respostas cabíveis para a entrevista, os métodos utilizados para
analise das respostas foram quantitativos e qualitativos, baseados em pesquisas
bibliográficas, aplicação de questionários, com questões abertas e fechadas, aos
moradores do povoado. De acordo com o método da entrevista afirma-se que.
De acordo com SOUZA pag.31 apud Selltiz et al (1987) segundo as quais ela auxilia no levantamento de aspectos afetivos e valorativos das respostas dos entrevistados e na determinação do significado pessoal e de suas atitudes, favorece a emergência de contextos sociais e pessoais de crenças e sentimentos, a medida que as respostas são auto-reveladoras.
Além disso, foi construído um acervo fotográfico para futuras comparações
ao longo do tempo em relação à aspectos qualitativos do rio. Ao final foram
sistematizados os dados e analisados através de percentagem para construção de tabelas.
Povoado Mato Grosso
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Figura 01: Localização do Povoado Mato Grosso, Morros-MA
RESULTADOS E DISCUSSÕES
De acordo com a visão de como era o riacho antes, para os entrevistados o
riacho era “mais fundo” ou “mais cheio”, sendo percebido que há uma diferença no
nível de água para as condições atuais. Além disso, retratam outras características que
demonstram uma diferença visual de matas ciliares e desenvolvimento urbano para à
atualidade.
Cada indivíduo percebe, reage e responde diferentemente às ações sobre o ambiente em que vive. As respostas ou manifestações daí decorrentes são resultado das percepções (individuais e coletivas), dos processos cognitivos, julgamentos e expectativas de cada pessoa (FERNANDES et al, 2004 pág.1).
Quando questionados se o rio está melhor ou pior, 90% dos entrevistados
responderam que está “melhor”. Este dado traz vários questionamentos, pois como um
rio com uma vazão maior anteriormente pode ser pior que um rio dito pelos
entrevistados como seco atualmente.
Dentre as qualidades que o rio oferecia a “grande quantidade de peixes” e
“água saudável” se destacou. A percepção dos entrevistados mostra uma série de
valores e atributos que o rio oferecia, sendo assim constata-se a relação entre o
sentimento de insatisfação relacionada à falta de interesse expressada na relação
estabelecida pelas pessoas com seu ambiente.
De acordo com a classificação do riacho, para 33.3% responderam que o rio
está “bom”, 3.3% responderam “muito bom”, 43.3% “regular”, e 20% “ruim”. Contudo,
os entrevistados ressaltam melhorias para o rio, como: “não desmatar as árvores que
tem” ou “preservação, iniciativa, consciência, colaboração” para outros o rio “não há
solução, pois não tem preservação” ou “só Deus mandando água da chuva” e para os
demais a honradez de “não jogar lixo”.
As respostas evidenciaram uma intensidade de comprometimento que se
avalia de geração a geração. Cabe a cada um adquirir e adaptar-se ao hábito da leitura
visual, produzindo assim a relação morador-ambiente para uma maior percepção e
sensibilidade com os recursos naturais. De acordo com Arruda (1999 pág.89) apud,
Morros
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Diegues (1996b: 97) afirma que “mais do que repressão, o mundo moderno necessita de
exemplos de relações mais adequadas entre homem e natureza”.
De acordo com os entrevistados os impactos atualmente observados no rio
foram “poluição” e “desmatamento” , assim como, “queimadas” e “diminuição da
água”. Perceberam-se uma consciência dos fatores prejudiciais ao rio, compreensões
diversas e individuais. De acordo com Prudente (2010) apud Leff (2000, pág.3) as
práticas agrícolas habituais foram trocadas pela monocultura que trouxe problemas
como erosão, infertilidade do solo e houve uma enorme destruição dos recursos naturais
dessas áreas.
Em relação aos prejuízos causados aos moradores com a atual situação do
riacho, a questão da “água poluída” foi o maior prejuízo, seguido de “prejuízos a
saúde”, “mortes dos peixes” e “dificuldade de banhar”. Segundo Moraes e Jordão
(2002, pág.372) observa-se na atualidade que 80% das moléstias e mais de um terço dos
óbitos dos países em desenvolvimento sejam causados pelo consumo de água
contaminada. Estes dados indicam que a maior parte dos entrevistados se sentiriam
prejudicados. A falta do rio significaria mudanças no cotidiano, moldando e
reconstruindo com a experiência os hábitos instituídos na cultura do lugar.
Acerca da geração de impactos ambientais no rio, o principal motivo é a
“ignorância”, seguido da “maldade” e “queimadas constantes”. O teor das respostas
indica que os entrevistados afirmam saber da ação geradora de impactos ambientais no
riacho, a falta de interesse, expressado pelas pessoas reafirma que uma parcela da
população indistinta, e o pouco envolvimento não contribuem para geração de
mudanças. No entanto a outra parcela significativa da comunidade que totaliza cerca de
20% mostrou-se dispostos a tomar novas ações, ampliando e melhorando de acordo com
a percepção dos moradores em prol de melhorias.
A atenção para a necessidade de se articularem ação de educação ambiental baseadas nos conceitos de ética e sustentabilidade, identidade cultural e diversidade, mobilização e participação e práticas interdisciplinares (JACOBI, 2003 apud Sorrentino, 1998, pág. 190)
Mesmo assim, questionou-se sobre quais ações que cada um desenvolve no
riacho, sendo que 36.6% responderam “lavagem, turismo, banho e lazer”, 23,3%
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“lavagem, turismo e banho”, 20% “lavagem e banho”, 3.3% “namorar”, 10%
“lavagem, banho e lazer”, 3.3% “lavagem e banho” e 3.3% “banho”. Logo, para todos
os entrevistados o rio é muito importante para a comunidade, sendo que 70%
responderam que é de extrema importância.
Acerca da preservação do rio, de acordo com os entrevistados a melhor
forma é “não jogar lixo”, “dar um conselho” ou “limpar”. Observou-se, entretanto que
os próprios usuários com seu conhecimento empírico e tradicional contribuíram para
encontrar uma série de pequenas ações que farão um enorme diferencial para diminuir o
índice de degradação ambiental no rio.
JACOBI (2003, pág. 190) apud Leff (2001) fala sobre a impossibilidade de se resolver os crescentes e complexos problemas ambientais e reverter suas causas em que ocorra uma mudança radical nos sistemas de conhecimento dos valores e dos comportamentos gerados pela dinâmica de racionalidade existente fundada no aspecto econômico do desenvolvimento.
Quando questionados sobre se o riacho secasse o que seria da comunidade,
16.6% dos entrevistados responderam que “todos morreriam, perda muito grande”,
13.3% “era uma tristeza”, e 10% “a vida da comunidade iria mudar radicalmente”. As
respostas dadas pelos entrevistados demonstram o sentimento de angustia e tristeza na
falta do riacho, a importância inquestionável desse bem natural na preservação da
identidade, práticas e hábitos socioculturais de um povo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observou-se um elo muito afetivo e de grande importância da existência do
riacho com os moradores da comunidade pesquisada. Entretanto, reconhecem que
existem várias mudanças ao longo do tempo no riacho, que foram construídas com
impactos ambientais que futuramente podem prejudicá-los. Além disso, para uma
significativa parte dos moradores estas mudanças atuais são positivas, não estando
atrelado seu pensamento em conservação, mas no desenvolvimento de suas atividades
econômicas e sociais. Logo, percebe-se a necessidade de transmissão de informações
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sobre as questões ambientais aos moradores e uma ampla sensibilização ambiental, para
que estes reconheçam seu papel diante da melhoria de sua comunidade.
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ANEXOS
Figura 2: lixo na flora local de Mato Grosso
Figura 3 e 4: área de lazer para banho e outros fins.
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