pedro pinote e o velocino

Upload: rayom-ra

Post on 05-Apr-2018

227 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    1/60

    PEDRO PINOTE

    *

    O VELOCINO

    * SRIE HISTRIAS MGICAS

    3. TOMO

    RAYOM RA

    [Direitos Autorais No. 75011]

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    2/60

    2

    PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    CAPTULO I

    NOTCIAS DE TIO

    Tio no aparecera nas costumeiras reunies de incio de noite, aps o jantar, e nofora escola, o que agora causava estranheza.

    - Algum viu o Tio hoje? perguntou Edu.- Eu no! respondeu prontamente Jorge.- Tambm no! respondeu igualmente Antnio Carlos, enquanto os demais faziam

    sinal negativo de cabea.- Que ser que aconteceu! indagava ainda Edu.- Vai ver ele saiu! aventurou-se Jorge.- Mas assim sem avisar e nem ir pra escola? Edu insistia.

    - U! E precisa avisar? - perguntou Zeco, fingindo desinteresse - s vezes acontecede repente e no d tempo.

    - ...! - concordou Dino - E depois, como que ele ia avisar pra todo mundo. Ia serum trabalho danado!

    - Avisava um e aquele ia avisando todo mundo! ensinou Jorge.- Quem, por exemplo? a curiosidade de Edu era agora maior.- O Zeco! apontou secamente Jorge.- Eu? Por que eu? reclamou alto.- Voc no vive dizendo que o lder do grupo? Ento tinha de ser voc continuou

    Jorge.- Eu no sou empregado do Tio! respondeu bruscamente comeando a ficar

    vermelho - Tem graa sair por a, de casa em casa, ou l na escola: olha o Tio viajou.Fulano, o Tio mandou dizer..., tem graa! j se indignava

    - Tem nada de mais comentou Antnio Carlos, sentando-se e encostando-se aomuro.

    - Tem sim, eu no sou empregado de ningum! Zeco fazia questo de repetir,desta vez falando mais alto.

    - Calma, Zeco, assim a rua inteira vai ouvir que voc no quer ajudar o Tio disseDino debochando da situao.

    - Dane-se, no quero mesmo! gesticulou jogando a mo adiante.- Vai ver por isso que ele no avisou que ia viajar falou Antnio Carlos na mesma

    posio, olhando para o cho, evitando encarar Zeco.- Isso o qu? fingiu-se de desentendido Dino.- Que ningum ia mesmo ajudar, nem o Zeco completou Antnio Carlos. Zeco

    no se conteve e esbravejou:- At voc, Tonho, que quase no fala, resolveu hoje pegar no meu p? Antnio

    Carlos levantou os olhos e deu um riso meio amarelo.- Oi, turma! saudou Japons, se aproximando.- Oi! responderam dois deles.- J souberam do Tio? ele passou os olhos em todos.

    - ..., ele viajou e nem quis avisar pro... - Dino parou de repente, mas completourapidinho - pra ningum.

    - Viajou? - Japons conseguiu franzir a testa - Viajou?- Mas ningum sabe direito pra onde explicou Jorge.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    3/60

    3

    - Como que pode? Japons se mostrava pra l de surpreso.- Podendo, u! Dino deu de ombros.- Mas..., mas como que ele no me disse nada? Japons parecia inconformado e

    coava a cabea.- Pra ns tambm no, aquele careta prosa. Vai ver at pegou um trem l pro interior

    e est agora numa boa. Ele no dizia que era da roa? afirmava e perguntava Jorge.- Dizia - respondeu Edu - contou umas mentiras por a; disse que o pai dele antes demorrer era fazendeiro e outras coisas.

    - Mas..., mas... gaguejava Japons.- Que nada! - interferiu Dino - vai ver ele foi mesmo de nibus. E j deve ter

    chegado!- nibus anda menos do que trem. O meu pai falou que por estrada de ferro mais

    rpido afirmou Edu.- A depende - intrometeu-se Zeco, parecendo ter um coelho na cartola - se o trem

    tiver de subir montanha ele vai quase parando. Neste caso o nibus pode andar maisdepressa.

    - Nem sempre. Tem nibus que sobe tambm muito devagar informou Jorge.- Mas na hora de descer o trem se manda e deixa o nibus, , longe! afirmou de

    novo Edu, fazendo gesto com a mo e estalando os dedos.- Ele vai contar que at caou ona disse Zeco, voltando Tio.- Que tomou banho no aude e mergulhou sei l quantos metros adivinhava Dino.

    - Mas..., ele no pode! Ele... - Japons tentou informar qualquer coisa, movendonegativamente o dedo indicador da mo direita.

    - Por que no? Ele sabe nadar. Bem, quer dizer..., pelo menos vive contando que sabe lembrou Edu.

    - Conversa, ele nada mal pra burro! - Zeco voltou a criticar - Eu j vi l no lago, umdia. Ele quase afundou. Eu tive que tirar ele de dentro dgua.

    - No lago, Zeco? Mas no proibido? Tem at guarda tomando conta, por causa dospeixes admirou-se Jorge e confirmando o motivo.

    - que..., bem, foi num dia desses a, na hora do jogo do Brasil. Tinha ningum,nenhuma alma viva respondeu sem graa.

    - Viva alma! corrigiu Antnio Carlos de seu canto. Zeco j ia de novo protestar,mas Japons interrompeu:

    - Ele no foi, turma, eu...- Foi sim! No sou mentiroso, no, ouviu! Zeco reagiu novamente.

    - Desta vez verdade sim. O Tio me contou que j tinha mergulhado no lago -confirmava Dino - mas esta histria de se afogar ele no me contou.

    - Que afogar? Quem falou em afogar? - Zeco j estava pra l de irritado - Eu disses que ele quase afundou, no falei nada de afogar!- Ah bem...! fez Dino com cara fingida, como se somente agora tivesse entendido

    tudo.- Quando ele voltar de viagem vai ter tanto l-l-l, que eu no vou querer nem ouvir

    afirmou Jorge com certo desnimo.- Mas ele no viajou!!! berrou Japons, assustando todos, logo tentando retomar o

    tom de voz normal - Quero dizer..., se viajou antes j voltou, mas no me disse nada Japons se atrapalhava nas explicaes.

    - Como que voc sabe? perguntou Zeco.- Eu estou vindo da casa dele. Ele est doente, l na cama falou finalmente, se

    aliviando.- Doente? surpreendeu-se Edu.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    4/60

    4

    - ..., com problemas gastos... tentava explicar.- Gastos? Que isso? perguntou Dino.

    - aqui, ..., na barriga, di muito n! mostrou batendo com a mo aberta noestmago.

    - gstricos, seu burro! corrigiu Antnio Carlos.

    - Ento ... Ele pediu pra eu avisar todo mundo, e a professora dele na escola, s queamanh no tem aula.

    Silncio. Zeco olhou para o cho e coou a orelha. Edu lanou olhar para AntnioCarlos e depois tambm para o cho. Jorge e Dino somente miravam Japons. Comoningum falasse Japons recomeou:

    - A me dele disse que ele vai precisar ir ao mdico, mas ela no pde ainda levar ele. os meninos voltaram todos a encarar Japons.

    - Por que no? perguntou Jorge.- Porque ela no pode faltar ao trabalho. Alis, ele ficou sozinho na casa todo o dia.

    Antnio Carlos pensou em corrigir as ltimas palavras de Japons, mas diante da situao

    perdeu o nimo.- Mas eu acho que outra coisa prosseguiu Japons.- O qu perguntou Dino.

    - Ela no tem dinheiro pra pagar o doutor completou, olhando novamente paratodos.

    - Chi.... lamentou Dino.- Mas no tem o hospital do I..., INES... gaguejava Jorge- INSS! ajudou Antnio Carlos.- , esse da! apontou para o colega.- J se esqueceu da greve? Est dando na televiso. Tem cada fila que no tem mais

    tamanho! lembrou Edu.- mesmo! concordou Jorge desanimado.

    Novamente silncio. Ningum tinha qualquer outra idia. Passou quase um minutoat que Dino quebrou aquele vazio:

    - Ser que isto mata?- O que? O problema do Tio? No sei! perguntou e respondeu Jorge.- Acho que no respondeu Edu.- Acho que sim Japons surpreendeu a todos.- Como que voc sabe? perguntou Jorge.- Saber direito eu no sei, mas pela cara dele... ele encolheu os ombros, afundando

    mais ainda o pequeno pescoo, passando uma idia muito dramtica.- Que que tem a cara dele? Jorge hoje estava realmente muito curioso.- Bem..., tava esquisita, n!- Esquisita, como? a curiosidade era geral, mas Dino perguntou primeiro.- Assim..., parada. Depois ele me disse que doa a barriga quando comia, e no podia

    comer.- S por isso? A pergunta de Dino simplificava tudo.- , n..., quem no come morre! Japons de novo complicava o problema.- Mas demora - resolveu Edu - meu pai disse que pra morrer de fome a pessoa precisa

    ir desfinando.- Desfinando? Como ? interrogou Jorge.

    - ir ficando fino, ora! respondeu Edu com absoluta certeza.- definhando, cavalgadura! Antnio Carlos mais uma vez no aguentou.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    5/60

    5

    - Coitado do Tio... lamentava Jorge ignorando o resto.- Olhe Turma, eu tive uma idia - falou Dino subitamente - topa a gente ir l agora

    visitar o Tio?- mesmo, a gente at que podia Edu gostou da idia.- Ento vamos? convidava Dino.

    - Pra a, pra a! - interrompeu Jorge com energia - todos o olharam. Ele ficou semgraa, mas continuou - a gente no sabe se a doena dele pega. E se pegar...? Eles seentreolharam. Jorge podia ter razo.

    - mesmo! concordou meio desanimado Dino, o autor da idia da visita.- Se todo mundo pegar podemos morrer! A lembrana de Edu j era uma ameaa.- O Japons teve l e no pegou! lembrou Dino, embora antes tivesse concordado

    com Jorge.- cedo ainda pra saber, ele j pode estar contaminado - continuava Edu - depois,

    tm certas doenas que aparecem mais tarde. A pessoa ta toda ruim e no sabe. Meu paique falou.

    - Besteira! - interrompeu Zeco depois de seu longo silncio, talvez com um pouco de

    remorso por ter criticado Tio.- Besteira nada! Pode perguntar pra quem sabe confirmava Edu.

    Japons, agora assustado, perdera a fala. Olhava de um para outro dos meninosenquanto discutiam, j comeando a sentir alguma coisa estranha que no sabia direito oque era. Zeco resolveu explicar seu pensamento:

    - A gente s se contamina se fica muito tempo no quarto com o doente, ou se comecom ele. Assim, de uma vez s difcil.

    - Ser? duvidava Jorge.- Claro, continuou Zeco, no assim tambm no sua certeza parecia infalvel -

    escute, Japons, quanto tempo voc ficou l com o Tio?- Ah..., eu..., meia hora! respondeu nervoso.- Meia hora? repetiu interrogativamente Zeco.- A j d! afirmou Dino com segurana.- ..., meia hora - repetia pensativo Zeco - mas s no quarto?- n... - mordia o dedo Japons - mas..., mas - gaguejava e no conseguia explicar -

    a me dele tambm estava l! finalmente completou.- U, e que que tem a me dele? - interferiu Edu - Me me. Nelas essas coisas

    no pegam. Pegam mesmo na gente!- Ser que eu vou morrer tambm? Japons j mostrava certo desespero. Eles todos

    deram um passo atrs e Japons se sentiu definitivamente morto.

    - Se eu fosse voc, Japons, corria pra casa e contava tudo pra sua me - aconselhouAntnio Carlos.- , de repente ela tem um remdio l pra ajudar Edu mostrava imensa

    camaradagem. No precisou mais nada. Japons rodopiou nos calcanhares e saiu emgrande carreira, quase atropelando Magria que neste instante chegava.

    - Que houve com o Japons? Por que ele est com cara de choro?- Ele foi pra casa se tratar, coitado, pegou a doena do Tio respondeu Dino.

    - Ningum sabe ainda. Pode ter pegado e pode no ter! Jorge no tinha tantacerteza.

    - Que doena? O Tio est doente?- , com problemas gs..., no estmago, pode at morrer. No est comendo nada

    tentava explicar Edu.- Chi... Magria fez careta.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    6/60

    6

    De novo silncio. Jorge foi sentar-se ao lado de Antnio Carlos, se encostando aomuro, e os demais o seguiram, exceto Magria. Este olhava para o extremo da ruatentando enxergar Japons. Mas ele j havia desaparecido.

    - Sabem quem eu vi inda pouco? recomeou Magria. Ningum respondeu, talvez

    achando que no era mais importante do que a doena do Tio.- Seu Leal! resolveu ento dar a notcia.- Seu Leal? Ele j est de volta? animou-se Dino.- ... confirmou simplesmente Magria. Porm nada mais falaram. Magria ainda

    meio sem ambiente olhava de novo para a distncia e murmurava:- Coitado do Tio, ser que grave mesmo?

    CAPTULO IIA VISITA

    Dia seguinte pelas nove da manh eles de novo se encontraram. S que desta vez

    pelos lados da casa velha, sem que houvessem combinado. Cumprimentavam-se com umoi, desconfiado e ficavam por ali. O ltimo a juntar-se foi Dino. Somente faltava Tio e,naturalmente, Japons.

    A casa velha, por sinal, no era mais velha. O nome permanecera, mas ela houverarejuvenescido. Naqueles trinta dias em que Leal se ausentara, a casa passara por reformas.Todos os dias bem cedo um grupo de homens chegava e comeava a trabalhar. s tardes,

    perto das seis horas, largavam tudo, tomavam banho e se iam, voltando na manhseguinte. Como o tempo ajudasse, no chovesse neste ms, exceto por uma ou outra garoarpida e no houvesse interrupes, o trabalho fora concludo. A casa agora, com tbuasnovas substituindo as velhas e apodrecidas, com portas, janelas e telhado recuperados,fora pintada.

    E no ficara somente nisto: uma nova calada fora feita em redor da casa; criaramjardins com tijolos decorativos e pintados mo, margeando o muro; aplanaram o cho,plantaram grama, fizeram pequenos alpendres para trepadeiras e estenderam a calada ato porto principal. O muro, da mesma forma, passara por reforma de cabo a rabo: buracostinham desaparecido. Ganhara maior altura e recebera excelentes demos de tinta. Tudocheirava a novo..., ou a novidade!

    O dia estava claro e o sol gostoso; isto dava um sabor especial ao sbado. Mas eles j

    comeavam a inquietar-se com aquela situao de calma e tranqilidade.- Voc tem certeza que era mesmo o seu Leal? finalmente perguntou Jorge, olhandopara Magria.

    - Claro! Ento eu no conheo ele?- Podia se enganar; prosseguiu Jorge, foi de dia ou de noite?- De tarde respondeu simplesmente.- Ele lhe viu? indagou agora Edu.- No, ele estava com pressa.- E nem falou com voc? a pergunta agora vinha de Dino.- Se ele no me viu como que ia falar comigo? Voc faz cada pergunta!- Sei l... desculpou-se - podia ter visto e voc no saber.

    - Ah...! fez Magria mal humorado.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    7/60

    7

    - Bom dia, garotada! - eles se viraram e para surpresa geral era Leal, bem atrs deles,como uma saca de compras mo.

    - Bom dia! responderam timidamente.- Esto passeando? perguntou sorrindo.- ..., a gente passava por aqui respondeu Edu, bastante embaraado.

    - Ento vamos entrar, l a gente conversa. Depois de um ms de ausncia deve termuita novidade. Vamos! insistiu gentilmente, encaminhando-se para o porto.

    Eles o seguiram. Leal adiantou-se em direo da casa a fim de levar as compras. Osmeninos se instalaram nos bancos do Teatro Jornada do Amanh. Logo Esmeralda surgiu porta, de vestido azul, acenando-lhes. Zeco ficou vermelho, os outros se coavam apsresponderem ao aceno. Havia mais gente na casa, podiam perceber isto pelas vozes queouviam.

    No demorou e Leal retornou, sentando-se num dos bancos, procurando coloc-los vontade:

    - Ento, o que me contam de novidade?- O Tio est doente, pode morrer! informou Edu de supeto.- capaz do Japons ter pego a doena dele! Dino completou a informao.- Nossa! - surpreendeu-se Leal - O Tio, aquele escurinho? Mas o que ele tem de to

    grave?- ... Edu tentou, mas no falou.- Problemas gstricos! ajudou Antnio Carlos.

    Leal solicitou-lhes para que relatassem tudo. Eles foram falando s pressas, s vezesjuntos, fazendo com que Leal pedisse-lhes calma. At Zeco, tmido diante de adultos,falou e explicou. Ao final, Leal ficou pensativo. Depois lhes disse que aguardassem eentrou na casa.

    Minutos depois estava de volta, desta vez acompanhado de outro homem eEsmeralda. Os meninos se sentiram de novo envergonhados.

    - Meninos, este aqui meu irmo que mora comigo; pai de Esmeralda.- Bom dia, garotada, meu nome Joo Leal. Eles responderam ao cumprimento e

    ficaram atentos. O homem no se parecia nem um pouco com Leal. Era mais jovem, decabelos pretos e lisos e de bigode bem cheio. Leal prosseguiu:

    - Meu irmo mdico e estudioso da natureza. Contei-lhe o que se passa com o Tioe ele aceitou ir dar-lhe uma olhada. Vamos l agora?

    Os meninos se entreolharam meio sem graa, mas nenhum se recusou. O mdicoentrou e rapidamente voltou, trazendo uma valise abaulada. Saram. Esmeralda no osacompanhou, o que de certa forma aliviava os meninos. J na rua Leal ordenou:

    - Algum de vocs, v procurar o Japons e dizer-lhe para ir casa do Tio. Meuirmo ir examin-lo tambm!

    - Eu vou! prontificou-se de imediato Edu, saindo em disparada.Pouco depois chegavam casa do Tio - uma casa humilde, porm de material,

    conservada com algum capricho. Ao porto pararam e Leal perguntou-se:- Ser que ele est sozinho em casa?

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    8/60

    8

    Resolveu bater palmas. Logo a porta da frente abriu-se e Sebastiana apareceu. Ao veraquela gente toda se espantou, mas sorriu meio nervosa ao reconhecer Leal, que foi logofalando:

    - Bom dia, dona Sebastiana, desculpe incomodar, mas soubemos que seu filho estdoente e viemos c fazer uma visita. A senhora nos d licena?

    Ela veio abrir o porto e Leal apresentou-lhe o irmo, explicando-lhe a verdadeirainteno da visita. Ela, satisfeita, mandou-os entrar, indo os adultos frente e os meninosressabiados, atrs, em fila.

    - Tio, tem visita pra voc informou-o da porta do quarto. Tio rapidamenteajeitou-se, encostando-se cabeceira da cama. Eles foram entrando e se espalhando peloquarto. Os meninos procuravam ficar o mais longe possvel. Ao ver aquele homem queno conhecia Tio arregalou os olhos.

    - Bom dia, Tio, como est hoje? - Leal foi logo perguntando. Ele ainda de olhosarregalados fez gesto com a mo de mais ou menos, passando a olhar fixamente para avalise do doutor Joo.

    - Este aqui meu irmo, doutor Joo, prosseguiu Leal, veio para examin-lo. Vamossaber agora o que voc tem.

    Tio continuava mudo. Sebastiana chegou-se rapidamente, estendendo-lhe as mos efalando com tal rapidez que quase atropelava todas as palavras:- Ande, menino, se arrume logo, o doutor vai lhe examinar - ela puxou-o fazendo-o soltarum i - senta na beira da cama que eu vou buscar uma cadeira pro doutor.

    Voltou logo com a cadeira colocando-a junto ao mdico. Ia sair para buscar outra,para Leal, mas ele no quis. O mdico ento se sentou, pondo a valise sobre a cama,abrindo-a e retirando o estetoscpio, o termmetro e pequena p de ao. Os meninos, aos

    ps da cama, acompanhavam tudo com a maior ateno. Tio se encolhia apertando osbraos contra o corpo.

    O mdico passou a examin-lo, mandando-o abrir a boca, introduzindo nela apequena ferramenta. Os olhos de Tio se arregalaram ainda mais.

    - Calma, relaxe, - falava doutor Joo, - ponha agora a lngua para fora. Tio obedeciaporque no havia outro jeito, porm mais parecia um sapo apertado.

    Doutor Joo fez exames completos: garganta, olhos, corao. Examinou-lhe a pele,apertou-lhe o estmago, o fgado, colocou-lhe o estetoscpio aos pulmes, mandando-o

    dizer trinta e trs por trs vezes, o que causou aos meninos no conter o riso. Depoisverificou os ouvidos e colocou-lhe o termmetro sob a axila direita, olhando para orelgio. Passados trs minutos retirou-o e constatou:

    - Est com febre: trinta e sete e meio; pouca, mas precisa ser cuidada - arcou-seento e remexeu dentro da valise. Tio no suportando mais aquela expectativafinalmente indagou assustado:

    - injeo, doutor?- Sossegue. No injeo, s um antitrmico que trago comigo, so comprimidos.

    Tio pela primeira vez relaxou de verdade e at sorriu olhando para os amigos.

    Doutor Joo voltou-se para Sebastiana fazendo-lhe perguntas sobre o filho. Ela,

    nervosa, respondia a tudo, s vezes at repetindo. Depois ele retirou um bloco da valise ecomeou a escrever. Sebastiana nem o esperou terminar:

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    9/60

    9

    - grave, doutor?- No nada grave, ele vai ficar bom - respondeu tranqilamente sem desviar os

    olhos do que escrevia.- Graas a Deus! - exclamou Sebastiana juntando as mos. Neste exato instante

    surgem porta Edu e Japons, este ltimo de cabea baixa, olhando por cima.

    - Oi, turma, chegamos - saudou Edu com ar vitorioso, como algum bem sucedidonuma importante misso.- Muito bem, Edu, que bom ter trazido Japons - falou Leal, logo apontando de mo

    aberta em direo aos outros meninos - entrem, juntem-se aos demais.- Qual a doena dele, doutor? - voltava a perguntar Sebastiana.- No doena. Ele deve ter comido ou bebido qualquer coisa que lhe fez mal: frutas

    cidas ou verdes, refrigerantes, guloseimas em geral - coisas em excesso. Isto lhe atacou oestmago causando-lhe problemas em todo o aparelho digestivo. Como a flora intestinaldele ficou prejudicada, precisamos dar-lhe medicamentos para recuper-la. Porm, nadafabricado, exceto um purgante logo de incio. Os remdios ns mesmos vamos preparar.

    O que Sebastiana entendeu de verdade foi que Tio comera demais, de gulodice,tivera uma baita dor de barriga, que estava tudo preso e precisava botar para fora. Agoradoutor Joo ia fazer os remdios para cur-lo de vez. Joo comeou a explicar-lhe o quefazer, lendo para ela o que escrevera. Disse que iria arranjar os ingredientes para que elamesma fizesse os remdios. No ia gastar nada.

    Tio voltara a encostar-se cabeceira da cama e observava os companheiros quecochichavam algo. Terminada a conversa entre o mdico e Sebastiana, o doutor levantouse dirigindo a Tio:

    - Quanto a voc, menino, permanea ainda em repouso por uns dois dias. Logo estarbom de novo!

    - Seu Leal! - chamou Dino, mal o mdico encerrara as recomendaes a Tio -quando o senhor vai contar outra histria do Pedro Pinote? Leal sorriu como sempre, istolhe causava satisfao.

    - Bem, podemos combinar de novo, que tal neste domingo?- Oba, legal! - aplaudiu Dino. Todos riram e se alegraram, menos Tio. Ele cruzou os

    braos e ficou carrancudo. Leal percebeu de imediato.- Bem, um momento - coou o queixo e pensou. Eles aguardaram em silncio - como

    o Tio est doente e no vai poder ir ao teatro, eu tenho outra idia. Tio j se animava,descruzando os braos e abrindo bem os olhos. - Dona Sebastiana, a senhora se incomodada gente ficar aqui conversando um pouco sobre o Pedro Pinote?

    - Virgem Maria! Claro que no seu Leal, pode ficar vontade, o senhor, o doutor e osmeninos!- timo. Joo fica? - perguntou ao mdico.- No, obrigado. J conheo as histrias do Pinote. E como no preciso examinar o

    Japons porque o problema do Tio no pega em ningum, eu vou indo. At logo pratodos! Japons voltou a sorrir. Doutor Joo os deixou acompanhados de Sebastiana. Elavoltou, logo falando da porta:

    - Escute seu Leal, tem um banco de madeira ali na varando do fundo, s buscar qued pros meninos sentar.

    - Boa idia. Venham, garotada, vamos l buscar!

    O banco foi trazido e cinco dos meninos o ocuparam. Japons e Zeco sobravam, masno se importaram, indo sentar-se no cho, encostando-se parede. Sebastiana trouxe

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    10/60

    10

    uma cadeira para ela e Leal sentou-se na mesma que seu irmo utilizara. A janela estavaaberta, o sol entrava e iluminava. Leal ento comeou:

    CAPTULO IIIDE NOVO ARMOU

    Tendo cumprido com sucesso a misso que lhe confiara Armou, o Mago do Tempo,Pedro Pinote voltara vida normal. Ia escola, fazia os deveres de casa e descansava.Sossegara um pouco de sua vontade de viajar pelos espaos. Talvez se recuperasse daltima aventura em que passara por maus bocados.

    Quinze dias decorreram sem qualquer novidade. Certa noite, porm, Pedro sonhouque o Mago do Tempo acenava-lhe, chamando-o. Dizia-lhe algo de certa distncia, masno conseguia entender. Ao acordar, recordou-se do sonho e na escola a todo o momentose lembrava.

    Na noite seguinte teve outro sonho com Armou. Mas ele agora o trazia para uma altamontanha, colocava-lhe o dedo na testa e o menino passava a ver um vale ao longe.Comeou a perceber uma tempestade de areia. Na medida em que se concentrava nistoum vo ia se abrindo atravs da tempestade. Ele, cada vez mais se aprofundando nestevo, passou a ver imagens que se moviam. Eram homens que lutavam numa guerra..., eacordou!

    As estranhas imagens o acompanharam durante o dia na escola, como acontecido daoutra vez. noite, em casa, tomou ento uma deciso, comunicando-a aos companheirosTeovaldo e Petisco:

    - Amanh tarde viajaremos novamente. Aps fazer os deveres, darei uma desculpapara sair e partiremos. Acho que Armou me chama!

    - Currupco! - fez somente Teovaldo, andando de um lado para outro no puleiro.Petisco latiu e pulou alegremente.

    Na tarde seguinte ele lanou mo de seu cofre, abriu-o e retirou do estojo o cinto queguardava o disco. Apesar de ser um cofre, Pedro sentia que no era o lugar mais seguro

    para guardar aquelas coisas to importantes. Mas no momento no podia fazer nada,nenhuma outra idia o socorria. Aproveitou e tomou tambm o peixe de prata que lhe deraDjayan, colocando-o no bolso, afinal poderia necessit-lo! Em seguida, foi at o armrio,abriu a gaveta e retirou dali outro objeto, guardando-o consigo.

    Saiu com seus amigos. Na primeira oportunidade, pelas imediaes da mata, tomouPetisco num brao, tendo Teovaldo no ombro, e colocou o disco sobre o plexo, recitando:

    - Senhor do Espao, eu quero viajar, me leve no tempo pra outro lugar, me leve praArmou! E foram surgir no salo de enorme castelo

    - Chegamos!- Currupco!- Que lugar bonito, Cabelos de Ouro! - admirou-se Petisco, chamando pelo nome que

    atendia neste lado, devido a cor de seus cabelos.- um castelo de cristal explicou-lhe o menino enquanto o soltava no cho e

    guardava o disco de ouro no estojo preso ao cinto.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    11/60

    11

    O castelo era realmente magnfico. As paredes, o teto, o cho, tudo era cristal devrias tonalidades. Brilhavam e iluminavam. Havia ali alguns mveis: mesas, cadeiras,armrios, quadros nas paredes e um trono tambm de cristal, que brilhava muito. Nohavia guardas ou empregados pelos arredores.

    - Cabelos de Ouro, sinto uma energia estranha no meu corpo falou Petisco.- Tambm sinto, porm fico mais forte e com leveza. algo gostoso! Cabelos deOuro abria os braos e se examinava.

    - Eu tambm, currupco!

    Os cristais vibravam diversos e agradveis sons. Sbito, os sons pararam, mas emseguida recomearam. A corrente de energia que os visitantes tinham sentido, parecia

    percorrer o interior de todos os cristais do salo.

    Din-don, din-don, din-don! Ding-ding-don, din-don, din-don! Ding-ding-don,

    din-don, din-don!

    - Armou! exclamou o menino.

    Eis que diante deles surge o Mago do Tempo, naquelas mesmas vestes negras e como mesmo cajado onde as pedras verdes rebrilhavam.

    Venho saudar-vos amigos leais,Hoje chegando pra me visitar,Alegre estou, pois aqui j estais,Neste humilde castelo, a casa, meu lar!

    Comigo sonhaste sei disto daqui,Menino esperto, valente, audaz,Chamei-te, mostrei-te, e outra vez insisti,Nova luta vencer, por que sei, s capaz!

    - Nova luta senhor Armou? interessou-se Cabelos de Ouro.

    Milnio se vai sem qualquer soluo,Homens lutando e nada a fazer,Por que velocino algum lanou mo,

    Guerras e guerras isto veio trazer!- Velocino? Que isto? perguntou Petisco.- um smbolo da antiga mitologia. Uma esttua de carneiro - explicou o menino a

    sua maneira - que mais senhor Armou?

    Grande importncia um povo lhe dera,Riqueza, afirmavam, viera existir,Outro povo acusaram, o roubo fizera,A paz l se foi nada pde impedir!

    Lutaram e lutam a mais no poder,Para a Terra do alm o seu dio carregam,

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    12/60

    12

    Renascem pra guerra at sem querer,E voltando se juntam pra quem os esperam!

    - O que o senhor acha que eu deveria fazer, se puder claro? perguntou abrindo asmos.

    Menino valente perigos ters,Se a misso aceitares e fores saber,A razo disto tudo, e ali estars,E a guerra, enfim, a puderes conter!

    - Isto quer dizer que terei de me meter na luta para descobrir quem tem razo? Eainda acabar com a guerra? Armou somente assentiu com a cabea e seus olhos lanaramfascas. Cabelos de Ouro continuou a perguntar com certa agitao:

    - Mas onde isto? Como chegar l? O que terei de fazer exatamente?

    Ao local de batalhas a ti enviarei,E a teus companheiros contigo tambm,Dali em diante nada mais eu farei,L no posso, no devo, somente outro algum!

    No tempo eu reino aqui meu reinado,Nenhum fato j disse nada posso mover,Se por obra de ti possa ser alterado, por que conquistaste em teu mundo poder!

    Como noutra jornada que aqui tu tiveste, direito s teu de tambm recusar,De sair, de voltar, o poder te investe,E ningum vai por isto a ti condenar.

    - Eu quero! afirmou bravamente Cabelos de Ouro.- Eu tambm! afirmou em seguida Petisco. Teovaldo nada falou, Cabelos de Ouro

    olhou-o virando o rosto sobre o ombro. Os olhos de Armou novamente brilharam desatisfao, e recomeou:

    Dos perigos, falei-te, tu enfrentars,

    Se por mim tu gritares contigo serei,Uma vez e somente o poder te trar,Mas levar-te de volta isto no poderei!

    O teu disco de ouro s a ti servir,Se demais no entrares no tempo pra trs,Pois assim to distante poder no ter,S Armou, - estarei, - onde tu estars!

    - Como da outra vez a misso estar perdida se voltar antes do tempo. - comentouCabelos de Ouro - Estou pronto senhor Armou, pode me enviar para o local da misso!

    - Eu tambm! confirmou Petisco.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    13/60

    13

    Lendo teu pensamento uma coisa eu vi,Por isto algo bom, tenho c, te darei,O teu disco me empresta - d-me o disco aqui,Olhe bem, veja s, o que ento eu farei!

    Cabelos de Ouro de imediato puxou o disco do estojo e o estendeu ao Mago doTempo. Ele o tomou e o observou. As pedras comearam a rebrilhar por que uma correntepassava de uma para outra pedra. Armou passou o disco da mo direita para a esquerda, eem movimento rpido elevou o brao direito acima da cabea. Fez outros movimentos etrouxe a mo adiante, aberta, altura do peito. Surpresa, um objeto surgira em sua mo!

    - Um cinto de ouro! - exclamou o menino, admirando-se daquele ato mgico.

    Sem distrair-se Armou juntou o disco de ouro ao cinto e comeou a esfregar os dedossobre ambos. Fazia isto com tal rapidez que os trs mal conseguiam acompanhar osmovimentos. Tendo terminado, viram que o disco havia se encaixado perfeitamente nocinto. No havia sinal ou marcas; era como se um tivesse derretido no outro!

    Armou fez sinal com a cabea e Cabelos de Ouro se aproximou. O mago ento searcou e envolveu o cinto cintura do menino. Ao encostar uma extremidade outra, ocinto ligou-se e se mostrou uma nica pea, totalmente lisa, sem a menor separao.

    Neste exato instante Cabelos de Ouro sentiu uma corrente de energia percorrer todo o seucorpo.

    Ele baixou o rosto e passou a examinar o que recebera. O cinto era largo frente,afinando nas laterais e fechando atrs com menor largura. Tinha linhas em ambos oslados, que distncia ele no pudera notar. Pareciam sinais ou smbolos. O disco ficaraexatamente sobre seu umbigo. O menino voltou a olhar para o Mago do Tempo. Armoulogo levantou o dedo indicador da mo direita adiante do rosto e pronunciou:

    Alah-bha-thar!

    Com espanto o menino e seus companheiros viram o cinto desaparecer.- Sumiu! disse simplesmente Cabelos de Ouro, passando a mo onde o cinto

    estivera. Armou sorriu e novamente levantou o dedo indicador, pronunciando:

    Rah-tah-bha-l!

    E o cinto surgiu novamente na exata e anterior posio com o disco de ouro.- Voltou! exclamou o menino novamente maravilhado.

    O cinto de ouro de ti sumir,Bastando somente a palavra falar,Ao contrrio dirs e outra vez surgir,Muito embora em ti para sempre h de estar!

    - Deixe-me experimentar! Cabelos de Ouro ento pronunciou a palavra e o cintosumiu. Pronunciou-a ao contrrio e o cinto reapareceu.

    - Funcionou! Viva! Acabaram-se minhas preocupaes. No preciso mais esconder o

    disco! - ele voltou-se para Armou - Estou muito satisfeito com o presente, senhor Armou,no sei como agradecer! Armou somente sorriu.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    14/60

    14

    - Estamos prontos, falou novamente, pode nos mandar para o local das batalhas.Faremos todo o possvel para cumprir a misso com sucesso!

    Armou levantou o brao direito e o cajado surgiu em sua mo. Eles notaram comsurpresa que o cajado houvera sumido sem que tivessem percebido. O Mago do Tempo

    sacudiu-o sobre suas cabeas e as pedras verdes soltaram uma poeira de mesma cor. Eleento invocou:

    Oh! Seres do ar que agora invoco,Pelo espao aos amigos convosco levai,Deixai-os pousar onde ali os coloco,E no tempo, ordeno, vigilantes ficai!

    Imediatamente desapareceram dali, indo reaparecer noutro lugar.

    CAPTULO IV

    A MISSO SE INICIA

    - Chegamos! falou Cabelos de Ouro, soltando Petisco ao cho. O cozinhorapidamente correu pelo local farejando tudo.

    - No vi nada, Cabelos de Ouro, estamos ss falou voltando.- Lugar deserto, lugar deserto! resmungava Teovaldo.

    - Vejo algo ali adiante, olhem! o menino apontou para o meio de dois altosarbustos.

    - Uma cidade! admirou-se Teovaldo.- Uma cidade? - perguntou Petisco, que do cho nada podia enxergar. Cabelos de

    Ouro tomou-o nos braos mostrando-lhe o que vira.- Vamos at l. Usemos o disco de ouro, pois me parece distante daqui!

    O cu estava nublado e no viam o Sol. Cabelos de Ouro virou-se para um ladopronunciando as palavras que os fariam viajar.

    - Falhou! disse Petisco vendo que no saiam do lugar.- Esperem! disse o menino colocando Petisco no cho e remexendo num dos

    bolsos, trazendo na mo um objeto.- Que isto? perguntou Teovaldo.- Uma bssola - achei que nos serviria - explicou-lhes ao mesmo tempo em que abria

    a tampa redonda e a observava atentamente. Comeou ento a girar procurando a posio

    leste, que o nascente.- Pronto, creio que agora poderemos viajar - informou guardando o objeto, tomandoPetisco novamente nos braos, pensando no lugar, e sem mesmo saber por que resumiutudo simplesmente em:

    - Senhor do Espao, a cidade desconhecida!

    Sumiram dali, aterrissando no meio de uma praa.- No h ningum falou Petisco.

    - Realmente, olhando daqui parece uma cidade deserta confirmou o meninocolocando Petisco no cho.

    Vaaapt! De repente algo caiu a dois passos deles.- Uau! Cuidado! espantou-se Teovaldo.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    15/60

    15

    - Uma flecha! Mas quem...? Nem bem Cabelos de Ouro se perguntava, vaaapt! Outrae mais outra!

    - Vamos! Corra Petisco! gritou assustado. Mais flechas continuaram a ser lanadas.Eles corriam desesperados, mas no achavam sada. E as flechas caam de todos os lados.

    - O disco, o disco! falava Teovaldo.

    - No h tempo..., no consigo! tentava explicar o menino enquanto corria.

    Eles corriam em torno da praa, contornando um enorme monumento com muitosdegraus circundantes. Era a esttua de um guerreiro de saiote como os antigos gregos,trazendo uma lana na mo direita, um escudo retangular na outra mo, e s costas umarco com um saco de flechas.

    - Petisco..., procure... uma sada, fareje! Seno..., caire...mos de can...sa...dos! falava Cabelos de Ouro ainda correndo.

    Petisco saiu em disparada em direo dos prdios ao redor, recebendo uma saraivadade flechas, porm nenhuma o atingiu. Chegando ao outro lado, comeou rapidamente a

    farejar e a procurar. Ainda assim se desviava das flechas.- Cuidado! Cuidado! era s o que dizia Teovaldo, enquanto novas flechas caiam

    sobre ambos na praa. Petisco latiu do outro lado, junto a um prdio.- Petisco est nos chamando, temos de ir. a nossa nica chance. Segure-se! disse

    o menino partindo a toda velocidade em direo de Petisco. Dezenas de flechas foramarremessadas sobre eles; uma atingiu de raspo o brao de Cabelos de Ouro, rasgando suacamisa. Ele nem teve tempo de olhar, chegando junto a Petisco.

    - Ali tem uma sada! indicou-lhe o co.- Uma...rua...estreita! Estamos...salvos! comemorou Cabelos de Ouro ainda

    cansado, correndo para l.

    A rua era de paraleleppedos. Comeava sob um arco entre dois prdios,prosseguindo espremida entre vrios outros prdios, passando debaixo de novos arcos epassarelas. Mas eles no seguiram imediatamente. Cabelos de Ouro sentou-se ali mesmo,encostando-se numa parede, esticando as pernas para frente, procurando recuperar oflego. Petisco ficou ao seu lado, jogando as patas adiante, soltando o corpo no cho.Teovaldo voou do ombro de Cabelos de Ouro e foi pousar aos seus ps, andando de umlado a outro, resmungando:

    - Quase morremos, quase. S entramos pelo cano, s isso!

    O menino e o co no lhe davam ouvidos. Passados minutos Petisco perguntou:

    - Quem eram, afinal?- No sei, mas pelo jeito no nos querem aqui! respondeu Cabelos de Ouro.- Ou querem acabar conosco de vez, currupco!- Estranho - comeou Cabelos de Ouro se levantando, olhando para a praa e para o

    alto dos prdios - por que no aparecem e no vm atrs de ns? E onde estar o povo dacidade?

    - Currupco.- Precisamos sair daqui. Sigamos por esta rua tentando descobrir algo.

    - No, no! Vamos embora de vez! reagiu Teovaldo, voando para o ombro domenino.

    - Antes me deixem providenciar uma coisa - disse Cabelos de Ouro, sem prestar

    ateno Teovaldo, metendo a mo no bolso e retirando a bssola. Tendo se orientado

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    16/60

    16

    para o lado certo fechou-a na palma da mo esfregando o cinto de ouro para ter a certezade que ele ali estava. - Prossigamos! - ordenou.

    - Uau! Pensei que amos viajar, mas voc diz prossigamos. perigoso, muitoperigoso, currupco!

    - Quieto, Teovaldo! Vamos caminhar em silncio. Petisco v farejando tudo o que

    puder, mas no se distancie muito!

    Petisco entrou logo pela rua e Cabelos de Ouro vinha dois passos atrs. Olhavam paratodos os lados e para o alto, mas no percebiam qualquer movimento. Estava tudo quietosem qualquer sinal de vida; isto os deixava cismados. A rua era comprida e ensombreada;os paraleleppedos no eram do tipo conhecido, porm mais largos e irregulares:lembravam placas de pedra. Havia espao entre alguns deles, embora a maioria se

    juntasse e lhes permitisse andar sem problemas. Estavam lisos e gastos!- Cabelos de Ouro, farejo algo! parou de sbito o co.- O qu?- Gente, muita gente!

    - Pra que lado?- Pro final da rua respondeu fungando e deixando aparecer alguns dentes.- Que mais Petisco? ao mesmo tempo em que perguntava, o menino encostava-se a

    um prdio, apoiando o ombro, procurando enxergar melhor.- S isso, nada mais.

    Cabelos de Ouro permaneceu nesta posio por alguns segundos; em seguidaendireitou-se esfregando o rosto no corpo de Teovaldo, levantando um pouco o ombro e osacudindo.

    - Teovaldo, precisamos de seu auxlio.- J sei, j sei, l vem abacaxi. Vou ter de voar l pra frente pra contar o que tem; a

    mesma histria de sempre, currupco, ...- Psiu! - fez Cabelos de Ouro trazendo o dedo aos lbios - no esbraveje tanto, podem

    nos escutar!- Currupco fez ele baixinho.- V, Teovaldo, mas cuidado, no se exponha muito. V!

    Teovaldo bateu asas e partiu. Cabelos de Ouro abaixou-se ficando de ccoras, comcalcanhares levantados, estendendo a mo e trazendo Petisco, colocando-o ao seu lado.Poucos minutos depois Cabelos de Ouro j estava de p, percebendo que Teovaldovoltava com rapidez.

    - Nada, nada, tudo deserto, ningum vista!- Mas eu sinto o cheiro! confirmou Petisco.- Devem estar dentro das casas. Mas sero os mesmos que nos atacaram?

    perguntava-se o menino, voltando-se de novo para Teovaldo - Que existe adiante?- A rua termina logo ali; depois tem outra praa tambm redonda. Tem um prdio

    enorme bem no meio dessa praa, mas todo fechado. Eu voei por tudo e me escondi. Estsilncio, no ouvi nenhum barulhinho. Fiquei com medo e voei de volta. Parece atcemitrio, currupco!

    Cabelos de Ouro trocou a bssola de mo, enxugando-a na roupa. Depois abriu efechou a mo livre para ajudar na circulao e se decidiu:

    - Temos de continuar at descobrirmos por que se escondem.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    17/60

    17

    Continuaram a avanar. Na medida em que se adiantavam naquela rua estreita Petiscomais ainda se agitava, farejando sem parar.

    - Esto perto, muito perto! repetia nervosamente o co.- Depois desta curva termina a rua e vem a praa, cuidado! alertou Teovaldo.- Esperem! - falou Cabelos de Ouro parando e abrindo novamente a bssola, virando-

    se para o lado onde seria o nascente - Petisco venha! - chamou-o e o abraou, colando-ocontra o corpo. O corao de Petisco batia mais rpido e seu corpinho tremia denervosismo. Teovaldo, descontrolado, andava sobre o ombro de Cabelos de Ouro, abria efechava as asas, mexendo a cabea com enorme rapidez.

    - Agora vamos! - falou Cabelos de Ouro com disposio, reiniciando os passos,chegando ao final da estreita e descolorida rua, frente praa mencionada por Teovaldo.

    Os prdios em volta eram parecidos com aqueles que os amigos haviam visto daprimeira praa onde foram atacados com flechas. Eram, porm, todos brancos e bemcuidados. No centro desta praa havia longos patamares em pedra formando degraus e

    bem no meio dos patamares tinha o enorme prdio de que Teovaldo falara, mas diferente

    de todos os demais. Este era alto e comprido, possuindo colunas adiante.- Um templo! - exclamou Cabelos de Ouro - E belssimo! Sem mais distrair-se,

    Cabelos de Ouro olhou de novo a bssola reorientando-se. Depois colocou Petisco nocho, dizendo-lhe:

    - Ande sempre ao meu lado nesta posio, nem frente nem atrs, exatamente aqui.Petisco entendeu e foi colocar-se onde o menino indicara.

    - Que fazemos? - mexia-se ainda nervosamente o papagaio.- Vamos caminhar em direo do templo, mas prestando ateno a todos os lados.

    Entretanto, mal tinham dado trs passos, ouviram:- ele! Peguem-no! Agarrem-no!

    De todos os lados comearam a surgir homens correndo em sua direo, com armas epaus mo. Eram tantos que pareciam formigas saindo de formigueiros.

    - Petisco, venha! - gritou Cabelos de Ouro. O co pulou-lhe aos braos e ele gritou:- Senhor do espao, a floresta! E sumiram, deixando aqueles que haviam pulado

    sobre os trs, com caras de tolos sem saber o que tinha acontecido.

    CAPTULO VA CABANA

    - Ufa, escapamos por um triz! - falou Cabelos de Ouro colocando Petisco no cho.

    - Por pouco, muito pouco mesmo, currupco!- Estamos noutra parte da floresta, no mais aquela. - farejou Petisco, se afastandopara fazer novo reconhecimento.

    - verdade, aqui a mata mais fechada e escura, mal se consegue enxergar o cu.Alguns segundos depois Petisco voltou.

    - Nada de estranho, tudo normal - disse simplesmente.- Ento vamos caminhar um pouco, talvez achemos algo interessante - falou o

    menino j comeando a se movimentar.

    A floresta ali era realmente fechada; em certos trechos o co e o menino andavamcom dificuldade. Chegaram a um rio num local mais aberto com grama espalhada,

    sentando-se margem, e Cabelos de Ouro molhou a testa e a nuca. Isto provocou

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    18/60

    18

    respingos em Teovaldo que se arrepiou e se sacudiu reclamando. Petisco descobriu lugarmelhor e meteu-se por ali, indo beber gua. Depois se juntou aos dois, perguntando:

    - Que lugar esse? Que fazemos?- No sei, Petisco, mas se para aqui viemos por algum motivo.- Cuidado, cuidado, ele mau! - alertava e se agitava Teovaldo.

    Eles se viraram, vendo surpresos, bem atrs deles, um pigmeu com uma lana enorme mo. Apontava-a em posio de arremesso, chegando passo a passo. Era negro, vestia-se to somente com uma tanga escura e tinha braceletes feitos de pequenos dentes deanimais. Ao pescoo, trazia um colar de conchas com um dente maior parecendo de

    javali; nos tornozelos tinha adornos de palha entrelaada. Petisco rosnou, mas Cabelos deOuro acalmou-o:

    - Quieto, Petisco, no faa nenhum movimento, ele pode atirar-nos a lana - e foi selevantando lentamente, sorrindo para o pigmeu - ei, somos amigos, no lhe queremosmal! Mas o pigmeu parecia no escutar, continuava a avanar com a lana apontada.

    - Ele quer nos matar, currupco!

    O pigmeu parou a trs metros fazendo sinal com a outra mo, indicando para um ladoe fazendo gesto para que caminhassem.

    - Oua, amigo, ns... Porm o pigmeu no deixou Cabelos de Ouro continuar, mexeua lana nervosamente e trouxe o brao mais para trs, como se fosse atir-la.

    - Est bem, est bem! - Cabelos de Ouro mostrou-lhe as mos abertas - vamoscaminhar!

    - Use o disco, Cabelos de Ouro! lembrou-lhe Teovaldo.- Ainda no, esperemos para saber o que ele deseja.- nos matar, fazer churrasco. Droga de curiosidade!- Ser que ele canibal? perguntou Petisco.- No sei, mas agora melhor obedecer e andar.

    Assim fizeram saindo do lugar, entrando por um caminho de terra batida. Isto fezCabelos de Ouro concluir que deveriam existir muitas pessoas vivendo por aqueles lados,usando aquela trilha. Continuaram. Petisco caminhava ligeiramente adiante. Teovaldo iadando a Cabelos de Ouro a posio do estranho, virando-se a todo o momento em seuombro, falando-lhe ao ouvido:

    - Ele continua com a lana apontada. Baixinho atrevido, currupco!

    Em certo instante, ouviram um rudo atrs, se voltando. O pigmeu batera a lana trs

    vezes num tronco para chamar-lhes a ateno. Em seguida, indicou-lhes para queentrassem direita. Eles assim fizeram, indo Petisco sem dificuldade, mas Cabelos deOuro afastava com ambas as mos os finos galhos de rvores ou arbustos que pendiam

    pela trilha; s vezes se arcava ligeiramente.

    Deram mais alguns passos e pararam ao perceber uma cabana de palhas. Era comouma tenda que possusse somente duas partes, uma apoiada na outra, formando duas

    paredes inclinadas. O pigmeu pulou-lhes adiante como um felino, fazendo sinal para queesperassem. Comeou a andar de costas, sempre apontando a lana, e parou to logosentiu que estava sob a proteo da cabana. Algum l dentro falou-lhe alguma coisa e eleimediatamente saiu indicando para que entrassem.

    - No devemos! temeu Teovaldo.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    19/60

    19

    - No temos escolha, ele nos aponta a lana, temos de ir. Petisco venha! Petiscopulou-lhe aos braos e Cabelos de Ouro entrou naquela estranha construo.

    Estava um tanto escuro ali dentro e o menino teve de forar um pouco as vistas paraenxergar melhor. No fundo da cabana notaram uma pessoa sentada e pararam.

    - Aproxime-se, no tema! disse a voz cansada e meio rouca.

    Cabelos de Ouro carregando os companheiros aproximou-se e de perto pode v-lomelhor. Era um negro e velho. Sentava-se num cepo de rvore, tendo adiante, no cho,uma peneira de palha. Segurava s mos uma espiga de milho que parecia ter parado dedebulhar. No interior da peneira havia alguns gros. O velho estava de cabea baixa e noconseguiram ver-lhe a fisionomia.

    - Sente-se apontou para o outro cepo a sua frente sem levantar o rosto. Cabelos deOuro obedeceu, colocando Petisco no cho, ao seu lado.

    - Ento voc o menino que veio para descobrir o mistrio do roubo do velocino falou com a mesma voz cansada, porm agora menos rouca.

    - Como sabe, senhor?- Eu sei, eu sei..., eles me contam respondeu sem se mexer.- Eles quem?- Currupco! fez Teovaldo impaciente.- Os gros! respondeu simplesmente.- Os gros? surpreendeu-se o menino, olhando-os dentro da peneira.- Os gros? repetiu Teovaldo.- Sim, menino, os gros me contam tudo o que eu desejo saber.- Eu heim! Cada uma, gro que fala, ora essa! Teovaldo comeou a ficar nervoso.

    Petisco somente ganiu.- Esses gros de milho da? Como podem? insistiu Cabelos de Ouro.

    - No acredita? perguntou o velho levantando o rosto pela primeira vez e osassustando. Era cego e tinha os olhos completamente brancos.

    - Currupco! assustou-se o papagaio.- Eu..., bem... gaguejava o menino, ainda surpreso.- Eu no acredito, conversa! disse logo Teovaldo, j recuperado do meio susto.

    Cabelos de Ouro tentou explicar:- que..., eu nunca vi nada disso antes. Como eles fazem pra contar?- Magia, meu filho, magia respondeu delicadamente o velho. Alis, aquele velho

    falava de maneira amigvel e aps o susto causado pelos seus olhos, Cabelos de Ouro jse recuperava.

    - Poderia mostrar-nos, senhor?- , mostre que eu quero ver, currupco!- Menino e seus companheiros - comeou o velho levantando o dedo indicador

    direito, movendo-o - como passaram no teste de coragem vou provar-lhes o que digo.- Teste de coragem?- Sim menino. O pigmeu os assustou de propsito. Ele manso, mas fingiu que era

    feroz para ver-lhes a reao. Sei que podia ter usado este disco a e desaparecido nomomento em que desejasse, mas preferiu ficar at o final. Parabns pela coragem!

    - Isso mesmo, ficamos at o final, currupco!- Ento prestem ateno e observem! - Ele apertou a espiga de milho que segurava e

    liberou um gro. Tendo-o na mo direita falou:

    Poderes da luz que na luz se refletem,

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    20/60

    20

    Ao gro outra vez faam a luz penetrar,Para o ar lano o gro bem aqui no espaoE no ar quero ver os amigos andar!

    E o lanou para cima, soprando-o. Imediatamente formou-se um globo de luz branca,

    explodindo. Os trs amigos comearam ento a ver um desfile de suas prprias imagens,desde o momento em que haviam chegado cidade desconhecida. Ouviam suas prpriasvozes, mal conseguindo acreditar naquilo. Assim, as cenas foram se passando e reviram oataque de flechas, a corrida para tentar escapar, a caminhada pela estreita rua e tudo maisque lhes tinha acontecido at este momento. Estas cenas no duraram mais que umminuto, sumindo tudo ao final.

    - Incrvel, como isto pode acontecer?- Magia, j disse. A magia capaz de coisas realmente incrveis. Mas diga-me filho:

    est ainda disposto a tentar acabar com esta guerra absurda?- Sim senhor, estou!- , estamos! enchia-se de coragem Teovaldo.

    - Eu tambm! afirmou Petisco.- Ento ter muitas coisas a fazer. No lhe sero fceis, enfrentar muitas dificuldades

    e perigos, voc e seus companheiros.- Quais perigos e dificuldades?- Vrios, mas estas coisas voc ter que descobri-las sozinho. Porm, vou ajud-lo -

    dizendo isso ele passou a mo no fundo da peneira e trouxe um punhado de gros domilho. Abriu a mo e os mostrou, eram sete! - guarde estes gros com muito cuidado porque so mgicos. Lance-os ao ar, um de cada vez a cada situao de perigo, sopre-os evir imediata ajuda sempre que precisar. Em sete ocasies poder ser salvo, aps istosomente voc prprio ter de resolver.

    Cabelos de Ouro os tomou da mo do velho e os examinou: eram comuns, nopossuam nada de especial..., ento os guardou num bolso das calas.

    - Somente posso adiantar-lhe uma coisa - o velho prosseguiu com o rosto voltadopara ele como se o estivesse enxergando - quem possui o velocino est ao sul. Andesempre para o sul se quiser chegar onde vive tal personagem. Agora v e boa sorte!

    Ao sair da cabana com seus amigos o pigmeu os aguardava. Estava parado com alana apoiada no cho, como uma sentinela. Ao ver o menino sorriu e arcou a cabea emsaudao. Cabelos de Ouro respondeu da mesma maneira, mas Teovaldo reclamou:

    - Agora faz gentileza, quase nos matou. Este baixinho...

    - Quieto, Teovaldo, ele s estava cumprindo ordens. J passou tudo.O pigmeu indicou-lhes a sada e foi caminhando atrs. Ao alcanarem de novo

    trilha por onde haviam chegado ele se adiantou, parou e passou a mostrar com a lanaqual direo Cabelos de Ouro deveria tomar. s vezes se arcava indicando com a outramo. Como no pronunciasse uma nica palavra, o menino concluiu que ele seria mudo.

    Prosseguiram sem o pigmeu. Petisco ia um pouco frente farejando, e assim seembrenhavam cada vez mais na floresta. Aps algum tempo, sentindo-se meiodesorientado, Cabelos de Ouro resolveu conferir se continuavam na direo certa. Meteua mo no bolso e tirou a bssola. Abriu-a e girou lentamente, verificando que estava fora

    do rumo, caminhando quase a leste. Reorientou-se e reiniciou os passos em direo aosul.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    21/60

    21

    - Socorro, ajudem!- Que foi isto? - ele parou.- pedido de socorro, mas nada consigo farejar! agitou-se Petisco.- Socorro, ajudem! De novo ouviram. Cabelos de Ouro desta vez conseguiu localizar

    de onde vinha a voz, entrando pelo mato, seguido de Petisco. Um pouco adiante comeou

    a ouvir rudo de guas.- Socorro, ajudem! Voltaram a ouvir o mesmo apelo.- por aqui, vamos! - indicou Petisco j frente, correndo ligeiro.

    Chegaram numa clareira e viram uma bonita jovem com longo vestido branco,amarrada a uma rvore. Ao ver Cabelos de Ouro pediu-lhe:

    - Por favor, tire-me daqui! Ele se aproximou e comeou a desamarr-la. - Pensei queia morrer - disse como quem vai desmaiar, abraando-se ao menino e quase caindo.

    - Calma moa! - disse Cabelos de Ouro sem saber direito o que fazer. Petisco ganiu eTeovaldo foi pousar num galho da rvore - Que houve, quem a prendeu aqui?

    - Foram eles! - a moa apontou para adiante e ele se virou para a direo indicada,

    nada vendo seno a beirada de um abismo.- Eles quem?- Eles, que moram l embaixo! - ela continuava a apontar j se afastando do menino.

    Petisco latiu e falou:- Alguma coisa me cheira mal. No gosto disto, Cabelos de Ouro!- Mas quem so? O que fazem? insistiu o menino.- Venha, vou mostrar-lhe - ela se adiantou um passo, segurando-lhe a mo, levando-o

    para a direo do abismo.

    Teovaldo veio de novo pousar em seu ombro e Petisco caminhava ao lado, ganindo.O rudo de guas tornava-se cada vez mais forte medida que se aproximavam doabismo.

    - L no fundo, veja! - ela apontou para o rio, j a dois passos do abismo. Cabelos deOuro deu mais um passo e olhou para baixo. Viu um redemoinho que subia e descia,

    provavelmente formado pelas correntezas.- Somente vejo o redemoinho. Cabelos de Ouro forava as vistas tentando enxergar

    para onde ela apontara.- Olhe bem, concentre-se - disse a jovem largando-lhe a mo e dando um passo atrs,

    se colocando s suas costas. Cabelos de Ouro procurava concentrar-se conforme elasolicitara, mas de repente ela levou as mos adiante e o empurrou para baixo. Em seguidadeu um pontap em Petisco, lanando-o tambm ao abismo.

    - Uaauuu! - gritou o menino enquanto caia junto com o co e eram devorados pelasrodopiantes guas.- Currupco, currupco! - gritava desesperado o papagaio se equilibrando no ar e

    vendo os dois amigos desaparecerem.

    CAPTULO VIGUAS E VENTO

    As guas giravam violentamente formando um buraco que aparecia e desaparecia. Oredemoinho movia-se assustadoramente. Teovaldo voando sobre ele recebia respingos eresmungava. De repente, Cabelos de Ouro reapareceu lutando ferozmente, batendo os

    braos e tentando nadar. Mas o giro do redemoinho era muito forte e o menino logo

    afundava. J perdia as foras, cuspia gua, mal se agentava. Petisco vinha atrs dele,lutando com a mesma dificuldade.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    22/60

    22

    Teovaldo tentava se aproximar, mas a violncia das guas no permitia e subianovamente. Sbito lembrou-se de algo e tentou falar com Cabelos de Ouro. Intiltentativa, pois o menino preocupado em manter-se sobre as guas nem lhe percebeu a

    presena. E ambos comearam a afundar, girando e descendo com maior velocidade.

    - Eles vo morrer, preciso tentar e novo!

    Teovaldo ento subiu com enorme velocidade e com incrvel valentia mergulhou deasas fechadas em direo dos amigos. Conseguiu encontrar a cabea de Cabelos de Ouroantes que afundasse completamente, agarrando-se aos seus cabelos.

    - O peixe de prata..., o peixe de..., glub! Uma quebrada violenta de gua lanou-o forada cabea do menino, vindo cair na correnteza a se debater.

    Cabelos de Ouro mal se aguentava, entretanto ouvira o que lhe dissera Teovaldo.Meteu a mo no bolso conseguindo tocar no pequeno peixe de prata que lhe dera Djayan.Porm, afundou e rodopio para o interior do redemoinho, bebendo mais gua, quase

    desfalecendo. No entanto, teve ainda foras para trazer o peixe aos lbios e sopr-lo.

    Como num passe de mgica surgiram em torno deles alguns peixes-cavalos, enormese belos. Tinham cores esverdeadas, com largas listas douradas pelos corpos.Imediatamente comearam a girar em sentido contrrio ao movimento das guas, comvelocidade extraordinria, provocando estabilidade na correnteza e acalmando tudo. Ostrs heris ficaram ainda girando lentamente, levados agora pelo fraco deslocamento dasguas, movendo-se feito astronautas no espao.

    Surgiram sereias colocando sobre suas cabeas redomas transparentes, cheias de ar, eeles comearam a respirar. Tossiam e cuspiam expelindo alguma gua pelas bocas enarizes.

    Tendo se recuperado, as sereias ajudaram Cabelos de Ouro montar no dorso de umdos peixes-cavalos. Ele chamou Petisco colocando-o diante de si, com as patinhasapoiadas no pescoo de sua montaria. Teovaldo veio apoiar-se na ponta de seu ombro,enfiando as unhas em sua camisa xadrez, se encolhendo todo. A sereia que comandava asdemais apontou para o fundo das guas e os peixes-cavalos mergulharam rapidamente. Navelocidade com que viajavam Cabelos de Ouro mal conseguia observar as coisas que iamencontrando. Em certo instante, Teovaldo comeou a soltar as garras da camisa domenino, ameaando largar-se. Cabelos de Ouro ento o trouxe com uma das mos,

    enquanto a outra segurava uma das corcovas do peixe-cavalo, e o apoiou de encontro aopeito, mantendo-se curvado para frente.

    Aps certo tempo os peixes-cavalos pararam. Aquele em que montavam prosseguiulentamente em linha reta e parou mais adiante, com parte do corpo j fora dgua. Asredomas que tinham envolvido as cabeas dos trs passageiros de imediato sumiram eeles comearam a respirar normalmente. Vieram ento para a direo da margem do rio,antecedida por um banco de areia. Desmontaram. As guas mansas alcanavam a cinturade Cabelos de Ouro e ele agarrou Petisco, trazendo-o para debaixo do mesmo brao cujamo segurava Teovaldo. Com a mo livre ele alisou a cara do peixe-cavalo dizendo-lhe:

    - Muito grato amigo e a todos vocs que nos salvaram na hora exata.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    23/60

    23

    O peixe-cavalo somente piscou os grandes olhos e girou se afastando, desaparecendode vista.

    - Vamos para a margem, estou exausto - falou o menino colocando Teovaldo noombro, dando alguns passos, mas parando no banco de areia. Largou Petisco e se deitoude costas, fazendo com que Teovaldo pulasse de seu ombro.

    Um forte vento o despertou minutos depois, e a Petisco. Teovaldo no dormira,ficando o tempo todo a vigiar.

    - Dormimos Petisco. No devemos nos atrasar mais, precisamos ir em frente! Ele seps de p e seus cabelos ainda molhados se levantaram ante a fora do vento. Teovaldo jno ar tentava alcanar o ombro do menino, mas o vento dobrou em fora e lanou-olonge. Ele rodopiou e caiu mais adiante, na areia da margem do rio.

    - Socorro, socorro! - gritava

    Cabelos de Ouro lanou-se em sua direo, espalhando com os ps os pequenos lagosde gua rasa aps o banco de areia. Desequilibrava-se ante o vento e quase caia. Petisco,

    mais a frente, comeou a ser arrastado na areia, fechando os olhinhos que no conseguiamant-los abertos.

    - Segure-se, Teovaldo, estou indo! gritou o menino, mais preocupado com opapagaio.

    Teovaldo bem que tentava segurar-se, mas no conseguia. Ainda mais que folhas,galhos secos, poeira e areia, vinham voando de todos os lados atrapalhando-lhe osmovimentos. Ele procurava abrir as asas a fim de se equilibrar, mas o vento o empurrava

    para trs e ele de novo era arrastado e rolava.

    Nesta luta veio chocar-se de encontro a um tronco de rvore cado e ali parou. Istodeu tempo para Cabelos de Ouro alcan-lo, tomando-o nas mos. Entretanto, o ventotornou-se mais forte e o menino tinha maior dificuldade de se equilibrar. Teve ento aidia de colocar Teovaldo dentro de sua camisa, fazendo isto rapidamente. Seu corpo erasacudido e seus cabelos arremessados. Ele, porm, nada quis com o disco de ouro e aoinvs de us-lo ainda pronunciou:

    - Alah-bha-thar! E o cinto desapareceu. Petisco neste instante rolou e se embaraouem seus ps. Ele arcou-se e o tomou nas mos.

    - Precisamos sair daqui! - gritou.- Mas pra onde? - gritou tambm Petisco.

    As rvores da floresta balanavam furiosamente; algumas estalavam e se quebravam,caindo umas sobre as outras. Grossos e enormes galhos se soltavam, arrastavam-se ouficavam presos nos troncos e galhos de outras rvores. Milhares de folhas j cobriam

    parte do banco de areia e margem do rio. O vento uivava e uivava!

    Cabelos de Ouro olhou para o rio e no teve coragem de voltar, ainda mais que suasguas estavam revoltas levantando perigosas e altas ondas. Tudo estava contra eles! Semoutra escolha resolveu procurar terra firme, caminhando na mesma direo do vento.

    Conseguiu agarrar-se ao tronco de uma rvore com um dos braos, enquanto o outrosegurava Petisco. Teovaldo, dentro de sua camisa, o arranhava por que era tambm

    arremessado de um lado para outro, e resmungava. Mais forte ainda tornou-se o vento, umverdadeiro tufo. Cabelos de Ouro tropeou, caindo de joelhos e na queda largou Petisco

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    24/60

    24

    que saiu rolando. Teovaldo subiu-lhe pela camisa e meteu a cabea para fora docolarinho. Cabelos de Ouro rolou e virou, ficando estatelado de costas no cho. Teovaldocomeou a gritar:

    - Cuidado, cuidado, ela vai cair!

    Gigantesca rvore de grossssimo tronco balanava e ameaava tombar bem em cimadeles. Cabelos de Ouro a viu, mas estava sem foras para se levantar. Ela se moveu parafrente e veio despencando, trazendo junto outras altas rvores que encontrava pelocaminho.

    - Est caindo, socorro! gritou Teovaldo.

    CAPTULO VIIPRISIONEIROS DOS ANES MACACOS

    E aqui terminamos por hoje! - falou Leal olhando para o relgio, verificando quefaltavam cinco minutos para o meio dia.

    - Ah, logo agora! reclamou Edu.- Conte mais, seu Leal! pediu Jorge.- No, no! - fez sinal negativo com a mo aberta - por hoje chega. Precisamos deixar

    dona Sebastiana sossegada para tratar da vida dela e cuidar da sade do Tio.- Vige, como o tempo correu. Que histria mais perigosa, gente! ela comentou.- Perigosa no, me, cheia de perigos corrigiu Tio.- U, e no d no mesmo, menino? Leal riu e se levantou.- Amanh tem mais, seu Leal? perguntou Japons.- Bem... - olhou para dona Sebastiana - depende da dona da casa, se ela deixar tem,

    seno vamos ter de resolver.- Deixa aqui, me, amanh! implorou Tio.- Mas claro, ui! s combinar a hora pra eu fazer um cafezinho antes. A casa sua

    seu Leal, pode abusar.- Tio Leal! Esmeralda o chamou da rua. Ele foi atender. Ela lhe entregou um

    embrulho - papai mandou, pra me do menino fazer remdios.

    Leal o levou para Sebastiana informando-lhe do que se tratava. Os meninos nosaiam do quarto e conversavam acerca desta aventura de Cabelos de Ouro. Leal da porta

    perguntou:- Vamos combinar um novo encontro para amanh s trs da tarde?

    - Pode ser de manh, seu Leal? Estou morto de curiosidade pra saber o que vai

    acontecer pediu Edu.- morrendo de curiosidade! corrigiu Antnio Carlos, fazendo beio.- Os chineses j diziam que o melhor da festa a sua espera. Alm do mais amanh

    domingo. Trs da tarde um horrio ideal, est bem assim?- Ta!- Ta bem! Leal ento se despediu e se foi com Esmeralda.

    Os meninos comentaram com seus familiares da reunio acontecida na casa do Tio eda nova marcada para domingo. Houve surpresa de parte dos adultos que Leal no ostivesse chamado ao Teatro Jornada do Amanh, como noutras oportunidades. Os meninosexplicaram-lhes porque Leal mudara de local, pois Tio no tinha condies de ir ao

    Teatro. Seu Vincenzo no aceitou as explicaes e reclamava:- Mesmo assim. Ele devia ter dado outro jeito!

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    25/60

    25

    Leal casualmente pela manh do domingo, ao voltar da banca de jornal, tomouconhecimento da decepo dos adultos atravs dos meninos que se encaminhavam a umterreno baldio para jogar bola.

    - Digam-lhes para no ficarem assim. Prximo final de semana nos reuniremos todos

    no Teatro Jornada do Amanh para nova histria.

    Esta promessa abrandou um pouco seu Vincenzo, que mesa, diante da travessa demacarronada, ainda assim reclamava:

    - Que pena no poder ser hoje. Adoro ouvir as histrias daquele moleque!- No faz mal, v. Depois ele conta outra! Dino tentava consol-lo.

    Chegava finalmente a hora. Os meninos l estavam desde mais cedo. Uma novidade:Sebastiana arrumara a sala, espalhara cadeiras e colocara o banco ao canto. Deixara ocoador preparado com p de caf e j fervia gua na chaleira. Eram trs e dez quandoLeal apontou no porto. Viera acompanhado de Esmeralda e isto alegrou Sebastiana.

    - Que bom que a menina veio. Entrem, por favor, e no reparem - disse indicando aporta que dava acesso sala. Ao entrar, Leal cumprimentou os meninos:

    - Boa tarde pessoal!- Boa tarde! - responderam.

    - Boa tarde - cumprimentou-os tambm Esmeralda, ao que eles responderam seentreolhando.

    - Vejo que o Tio est melhor, at levantou da cama!- verdade seu Leal - falou Sebastiana - graas aos remdios do doutor Joo.

    Graas a Deus. Eu preparei tudinho como ele ensinou. Est dando certo, o Tio at comeuhoje e no sentiu mais nada.

    - timo, timo! - falou Leal satisfeito. Sebastiana apontou para as cadeiras.- Vo se sentando, por favor, eu vou trazer um cafezinho pro senhor e pra menina.

    Num instantinho.Leal ficou conversando com os meninos at que Sebastiana trouxesse os cafezinhos e

    os servisse.- Pros meninos eu fiz refresco de maracuj, menos pro Tio que no pode ainda. E

    saiu novamente para buscar o refresco.Terminada a gentileza, e tendo recolhido a loua e os copos ela veio sentar-se ao lado

    do filho. Leal, tendo Esmeraldo direita, sentava-se bem adiante. Fazia calor e a dona dacasa houvera aberto a porta e a janela. O ambiente na sala ficara bastante claro; a luz solarespichava-se pelo assoalho em larga faixa, comeando a tocar os ps de Esmeralda. Leal

    ento recomeou a histria:- A gigantesca rvore despencava sobre Cabelos de Ouro. Descia arrancando cips,

    galhos e tudo o que encontrava. No havia como escapar. Deitado de costas no cho, ovento o empurrava fortemente, mas assim mesmo, sem conseguir levantar-se, Cabelos deOuro lanara mo de um dos gros que lhe dera o velho da cabana, trazendo-o junto

    boca. Com imensa dificuldade o soprou.- o fim! o fim! - gritava Teovaldo no peito de Cabelos de Ouro, vendo a rvore a

    dois metros deles.

    Imediatamente, aps o sopro, aconteceu uma exploso de luz e viram com espanto

    um gigante azulado sair de dentro da claridade. Ele abriu os enormes braos, agarrou aimensa e grossssima rvore que caia e a sustentou no ombro. Tendo-a firme, fez sinal

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    26/60

    26

    para Cabelos de Ouro com o outro brao a fim de que se retirasse imediatamente. Cabelosde Ouro virou-se e comeou a se arrastar. O vento uivava; os pequenos galhos, folhas e aterra doiam-lhe ao chocar-se contra seu corpo. Mas assim mesmo se arrastou, afastando-se dali.

    Teovaldo se debatia dentro da camisa do menino e o arranhava. Ele procurou porPetisco, tentando enxerg-lo, mas no conseguiu. Outra rvore estalou e despencou ao seulado quase o atingindo. Onde estaria Petisco?

    Sbito ouviu um grande estrondo e sentiu a terra tremer. Virou-se para trs, ainda nocho, se apoiando sobre as mos e joelhos, mal conseguindo perceber que a gigantescarvore finalmente despencava no exato lugar onde h pouco estivera. No agentando afora do vento ele protegeu Teovaldo, caindo novamente e batendo o ombro no cho,assim ficando.

    O gigante se aproximou dele e criou ao seu redor um muro de proteo. O muro no

    deixava o vento passar e ele conseguiu levantar-se.- Petisco, onde est voc? Sua voz era abafada pelos uivos do vento, pelos rudos de

    folhas e arrastar de galhos que rolavam ou voavam. Petisco no respondia. Angustiado,ele saiu correndo e se enfiou pelos galhos e folhas no cho, procurando desesperadamenteao amigo.

    - Petisco! Petisco!

    Nada. No via nem ouvia nenhum sinal do cozinho e comeou a sentir uma grandetristeza. De repente, um jato de luz azul foi lanado do muro, se enfiando l na frente,debaixo de um galho pesado de uma rvore cada. A luz abriu-se sobre um monte defolhas, formando um pequeno tubo. Cabelos de Ouro correu para l e passou a remexer na

    pilha de folhas. Alegrou-se quando finalmente viu a pata do amigo.- Petisco, voc est bem? - gritou puxando-o.- Estou, Cabelos de Ouro respondeu fechando os olhinhos por causa do vento e da

    poeira - tive de ficar quieto por que no conseguiria mesmo caminhar. Ento as folhas mecobriram e o galho que caiu sobre elas me prendeu. Mas o que isto? - perguntou sereferindo ao muro de luz.

    - O gro de milho trouxe um gigante que nos salvou. Mas vamos sair logo daqui! falou, retirando o co daquele emaranhado de galhos e folhas e se levantando. Teovaldosubia-lhe ao pescoo tentando se libertar da camisa. Cabelos de Ouro o colocou noombro, uma vez que ali o vento os alcanava com menos fora.

    Um brao estendeu-se do muro e a mo apontou para adiante. Cabelos de Ouroseguiu naquela direo se afastando do local. No entanto, mesmo com a proteo do murono lhe era fcil caminhar entre as coisas que o tufo derrubara. Tinha de pular sobretroncos, arrastar-se sob rvores cadas e desviar-se de galhos. De novo a mo apontou

    para a direo de um caminho dentro da floresta. Ele o tomou e viu mais adiante umapedreira. Ao chegar mais perto pde perceber uma pequena entrada de caverna que oobrigou a arcar-se para nela entrar.

    Fim da ventania. L dentro tudo cessava. A caverna, entretanto, era escura e elecaminhou devagar com todo o cuidado. Estavam de novo sozinhos.

    - No enxergo um palmo, currupco.- Nada farejo.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    27/60

    27

    O menino foi andando meio arcado, pois ao tentar levantar o corpo batera com acabea no teto. Ele deu mais alguns passos e finalmente percebeu uma luz l adiante.

    Ao alcanar a claridade viu que a estreita caverna terminava numa enorme gruta.

    Uma vez dentro da gruta, Cabelos de Ouro sentou-se e descansou.- Cabelos de Ouro isto aqui um grande salo - disse Petisco no cho, aps terobservado em redor. Sua voz ecoava, o que os surpreendia.

    - , Petisco, parece um santurio, que estranho! Vamos examinar melhor - disse selevantando.

    Entraram para o meio da gruta. Cabelos de Ouro viu que existiam vrias aberturas noteto, por onde entrava luz. No havia mais nada, exceto a parede arredondada construdada prpria pedra e o cho liso.

    - Tudo aqui foi muito bem trabalhado - mostrou o menino para Petisco que procuravafarejar.

    - Sinto cheiro de complicaes - disse Teovaldo.- No sinto nada - disse Petisco.- No vejo sada alguma, como pode?

    Realmente era algo misterioso. Teriam de retornar pela estreita caverna? E aventania, teria passado? Nestas dvidas, eles percorreram todo o salo circular, andandorente a parede, mas nada encontravam. Em certo local, porm, Cabelos de Ouro viu uma

    pedra triangular, como um pequeno assento colado parede e nela sentou-se. A pedramexeu-se e ele se levantou rapidamente temendo cair.

    - Est solta, quase caio. Vou coloc-la no lugar. Ao fazer fora para recoloc-la nasua posio inicial a pedra comeou a deslizar para dentro da parede. Para seu espanto um

    pedao da parede comeou tambm a deslizar.- Uu! A parede tambm se move! - falou Petisco igualmente surpreso.- Exatamente. Aqui existe uma porta secreta. A pedra onde sentei uma alavanca!

    Quando aquela parte da parede j havia inteiramente deslizado para dentro, ligou-se auma ponte. O menino e o co caminharam pela abertura que se formou, pararam, e viramo que ali havia.

    - Vejo rvores e um gramado. Parece uma nova floresta - observou Cabelos de Ouro -venha Petisco, vamos ver que lugar este. - ele estendeu as mos para o co e o segurou.

    Cabelos de Ouro ento saiu andando lentamente, alcanando a ponte. Ao dar osprimeiros passos verificou que a ponte se deitava sobre um rio, cujas guas corriamalguns metros abaixo. Atravessou sem problemas. Chegando outra margem pisou emverde relva e prosseguiu entrando por uma larga trilha, ladeada de rvores e mais grama.Pouco adiante encontrou uma nvoa azul.

    - Que fumaa esquisita! reclamou Teovaldo.- No fumaa, nvoa explicou o menino.- Pra mim d no mesmo, no posso enxergar - insistiu o papagaio.- Petisco, fareja algo?- Nada at agora, Cabelos de Ouro.

    O menino foi penetrando naquela forte nvoa sem nada conseguir enxergar.Caminhava com todo o cuidado. De repente, uma ave bateu as grandes asas prximo

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    28/60

    28

    deles, soltando estridente guincho. Levaram tamanho susto que seus coraes dispararam.Mas no se intimidaram, e passado o susto Cabelos de Ouro prosseguiu. No demorou,ouviram vozes e risos. As vozes aumentaram e os risos tambm. Eles no entendiam oque diziam, mas pareciam estar cada vez mais prximos. Os risos se transformaram emgargalhadas e as vozes viraram em vaia, fazendo: uuuuu!

    - Quem so? perguntou nervosamente Teovaldo.- No sei, nada vejo!

    Aquilo continuou a aumentar e os perturbava. De tal forma aumentaram as vaias queCabelos de Ouro se encolheu, ajeitando Petisco entre os braos, procurando tapar osouvidos com os dedos. Teovaldo enfiava a cabea sob uma asa e Petisco colocava as

    patinhas sobre as orelhas.

    Assim mesmo, meio tonto, Cabelos de Ouro continuou a caminhar, mas tropeou equase caiu. Porm, equilibrou-se e tentou novamente caminhar. Os risos e as vaiascontinuavam e o menino mais tonto caiu ao cho, soltando Petisco.

    - Ui, minha cabea parece que vai estourar, no agento mais...

    - UUUUUUUUUUUUUUUUU!!!! Aquilo no parava. Petisco e Teovaldo rolavampelo cho tapando os ouvidos.

    - Calem-se! Parem com isso! gritou desesperado Cabelos de Ouro. Eles riram maisfortes e gritaram mais alto. Cabelos de Ouro sentiu que tudo girava; tentou manter-se de

    joelhos, mas caiu novamente e desmaiou.

    Dezenas de anes com caras velhas e enrugadas, semelhantes s caras de chipanzs,rindo e dando vivas, os cercaram. Vestiam-se como nos tempos dos reis e foram logoagarrando Cabelos de Ouro e o virando de costas para o cho. Teovaldo e Petiscolevantaram-se. Petisco comeou a latir ferozmente, tentando morder os anes. Teovaldovoava sobre suas cabeas, atacando-os com as garras.

    Mas eles eram muitos; se movimentavam com facilidade pela nvoa e rapidamentecercaram Petisco, chutando-o e batendo nele. Uma rede foi lanada sobre o co e outraem Teovaldo. Petisco foi envolvido, mas Teovaldo se desviou e passou a voar ora emcrculos ora subindo e descendo com rapidez. Eles lanaram outra rede que passou deraspo.

    - Fuja, Teovaldo, no deixe que lhe peguem...,ui! Um pontap fez Petisco se calar eos anes soltaram pragas e grunhidos. Teovaldo desapareceu deixando-os enraivecidos,

    esmurrando o ar.Os anes examinaram os bolsos de Cabelos de Ouro, retirando a bssola. O peixe de

    prata ele havia perdido no redemoinho. Depois o puxaram dali segurando-o pela camisa,calas, braos e ps, quase lhe rasgando a roupa. Levaram ambos para fora dali a um

    povoado na floresta, onde a nvoa era mais suave. As pequenas casas eram feitas detroncos e partes de rvores, distribudas em vrios crculos. Ainda arrastando-os, os anesos deixaram no meio de uma rea livre. Eles gritavam e festejavam. Os outros moradoresque vieram receb-los, tambm pulavam, gritando feito macacos.

    Cabelos de Ouro foi amarrado em p num poste de rvore e Petisco num cepo ao

    lado, preso a uma coleira. Os feios e disformes anes ento se chegaram formandopequena multido. Um deles, parecendo o chefe, com uma comprida vara comeou a

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    29/60

    29

    cutucar o peito e a barriga de Cabelos de Ouro. Ao ver que o menino no se mexia, fezsinal a outro e grunhiu. Aquele saiu rapidamente furando a multido logo voltando comum balde cheio dgua. Enquanto isso, o outro ano ficou a atiar Petisco, batendo-lhecom a vara, provocando risos em todos.

    - Grrr! Seu ano covarde! Petisco latia e rosnava e isto os fazia rir mais.

    O ano do balde atirou a gua na cabea de Cabelos de Ouro. Ele despertou assustadono entendo o que acontecia. Mas ao ver Petisco tambm amarrado entendeu tudo.

    - Teovaldo, onde est?- Fugiu! respondeu simplesmente o co. Cabelos de Ouro gritou-lhes:- Ouam, no sabemos quem so vocs, mas somos amigos. Soltem-nos, s queremos

    seguir em frente!

    Uma onda de risos, vaias e grunhidos novamente aconteceu. O ano da vara aindarindo, avanou dois passos e cutucou a barriga do menino.

    - Uiii! Fez Cabelos de Ouro e ele riu e pulou. Depois o cutucou no peito e pernas.

    Vendo que o prisioneiro se contorcia, ele pulava mais e se divertia. De repente parou derir e cutuc-lo, chamando dois outros anes. Um deles ficou de quatro no cho enquanto ooutro virava de costas. Ento ele subiu nas costas de um e pulou para os ombros do outro.O ano debaixo andou at prximo de Cabelos de Ouro. O que lhe subira aos ombros seespichou, apoiando-se na vara, e segurou uma mecha de cabelos do prisioneiro. Examinoua mecha com curiosidade, depois a camisa. Mandou que o descesse ao cho e passou aexaminar tambm as calas do menino. Fez sinal para o outro, grunhindo e apontando

    para Cabelos de Ouro. Um ano subiu tambm aos ombros de um terceiro e comeou adesabotoar a camisa do menino.

    Nisto, outro deles se aproximou correndo e jogou ao cho os dois que tentavamdesabotoar a camisa do prisioneiro. Bateu no peito, grunhiu e apontou para Cabelos deOuro. O ano da vara se aproximou dele e o empurrou. Ele reagiu e se prepararam paralutar.

    - Esto brigando por causa de suas roupas falou Petisco.- Sim, que coisa esquisita!

    Engalfinharam-se e rolaram pelo cho. A multido pulava e gritava, dividindo-se natorcida. Nesta confuso, Teovaldo apareceu e pousou no ombro de Cabelos de Ouro semque ningum o visse. Cabelos de Ouro cochichou-lhe virando ligeiramente o rosto:

    - Entre no meu bolso e retire um gro mgico! Ele sacudiu a perna direita mostrando

    qual era o bolso.Teovaldo assim fez e desapareceu dentro do seu bolso. Mas de repente, tocados por

    uma desconfiana, eles pararam de lutar e olharam para o prisioneiro.- Quieto agora, Teovaldo, no se mexa! Teovaldo obedeceu e parou seus

    movimentos.

    O ano da vara, parecendo ser maior mandante que o outro, fez sinal com a momandando que abrissem espao. A multido obedeceu em silncio. Ele grunhiu e fez sinal

    para que trouxessem alguma coisa. Logo surgiram vrios anes puxando cordas. O rudode rodas fez Cabelos de Ouro entender que traziam um veculo.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    30/60

    30

    Um rugido feroz fez todos tremerem e se afastarem. Cabelos de Ouro assustou-sepensando no pior. E realmente o pior estava por vir, pois os anes puxavam uma grandejaula feita de paus tendo dentro dela um nervoso tigre.

    - Rpido, Teovaldo, continue, acho que nos querem dar de comer para esta fera.Teovaldo continuou a mexer-se no bolso de Cabelos de Ouro em busca de um gro.

    Os anes abandonaram a jaula a trs metros dos prisioneiros e dois deles apoiaramnela uma escada, subindo no teto. O animal vendo aquilo saltava ferozmente tentandoagarr-los. Os dois anes comearam ento a levantar a porta da jaula. Na medida em quefaziam isto a multido ia se afastando. Em redor, vrios outros anes se preparavam comredes nas mos, prontos para qualquer emergncia. A porta subia diante de Cabelos deOuro. No havia dvida, a fera se lanaria sobre ele e o comeria.- Vamos, Teovaldo, rpido! dizia nervoso o menino.

    A porta da jaula abriu-se completamente e o tigre veio se encaminhando para fora.Ao ver Cabelos de Ouro ali, indefeso, rugiu e apoiou o corpo nas patas traseiras,

    calculando o pulo.- No vai dar tempo, Cabelos de Ouro, o tigre vai pular! gritou Petisco

    CAPTULO VIIIA GEMA DE CRISTAL

    O tigre trouxe o corpo mais para trs e preparou o bote. Teovaldo conseguiraencontrar um gro, colocando a cabea para fora do bolso. Cabelos de Ouro gritou:

    - Para cima, Teovaldo! Ao ver o tigre preparando o bote, Teovaldo voou sobre acabea de Cabelos de Ouro e soltou o gro de milho mgico. A fera pulou, mas o meninosoprou e buuum! Uma luz explodiu.

    Um tigre maior surgiu no espao e lanou-se sobre o outro feito um raio, agarrando-ono ar. Caram ambos diante de todos, iniciando terrvel luta. Como a luz ainda brilhasseintensamente, os anes se afastaram apavorados, correndo e se jogando ao cho, chorandofeito crianas.

    O tigre da luz arremessou seu adversrio longe, fazendo-o chocar-se de encontro jaula. Ao sentir que no podia vencer a luta, o tigre dos anes disparou para o interior dafloresta, fugindo covardemente. O tigre da luz aproximou-se de Cabelos de Ouro e roeu-lhe a corda com tal facilidade que parecia de acar. O menino, livre, correu para libertar

    Petisco da coleira. Teovaldo veio pousar-lhe no ombro. O tigre agachou-se e Cabelos deOuro entendeu que deveria mont-lo. E assim fez com Petisco j em seus braos.

    O tigre com os passageiros s costas levantou-se e rugiu, girando em todas asdirees. E foi to alto e vigoroso o rugido que os anes saram correndo e rolando.Gritavam desesperadamente e abandonaram o local.

    O tigre carregou-os a salvo pelo interior da floresta, a largos pulos, porm comsuavidade. Num local aberto e agradvel parou e deixou Cabelos de Ouro escorregar desuas costas, voltando por onde viera.

    - Desta escapamos por pouco! aliviava-se Cabelos de Ouro, virando-se para

    examinar o lugar.

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    31/60

    31

    - Aqueles anes macaquinhos. No toa que no gosto de macacos! desabafouTeovaldo.

    A camisa de Cabelos de Ouro ainda estava fora das calas e ele comeou a arrumar-se. Ao meter a mo nos bolsos, surpreendeu-se:

    - A bssola no est comigo!- Os anes roubaram, currupco.- Oh! exclamou decepcionado.- Para onde vamos agora, Cabelos de Ouro? perguntou Petisco.- No cheguei ainda a nenhuma concluso sobre o nosso trabalho aqui. At agora s

    tivemos obstculos e passamos por perigos. Por isso acho que no faz nenhuma diferenase caminharmos para qualquer direo. Vamos em frente!

    Ele reiniciou os passos por aquele trecho da floresta. Petisco veio caminhar ao seulado. Em determinado ponto viram no horizonte uma forte claridade na cor rosa.

    - Que ser aquilo? perguntou-se Cabelos de Ouro.

    - Nem desconfio falou Petisco.- Currupco fez somente Teovaldo.- No parece estar muito distante, vamos verificar.

    Enquanto andava Cabelos de Ouro pensou em usar o disco de ouro para chegar maisrpido, porm logo desistiu. Se viajasse pelo espao poderia deixar de ver alguma outra

    pista ou descobrir algo importante. Na medida em que avanavam a claridade se tornavamaior esparramando em tudo. Ele sentiu que se aproximavam rpido demais. Mas quando

    pensou estar chegando a claridade diminuiu e todas as coisas em redor voltaram a ter suascores naturais. Por que aquilo?

    - Que coisa estranha, Cabelos de Ouro, a luz est quase sumindo. At parece quecorre pra trs! observou Petisco.

    - Creio ter havido um movimento da claridade em nossa direo. Por isto pareceu queandvamos rpido demais. Mas por que agora diminuiu?

    Prosseguiram seguindo a claridade que agora parecia estar escapando. O caminho erafcil de percorrer; havia muito espao entre as rvores e arbustos em geral, porm emcerto instante Cabelos de Ouro parou, estranhando um fato.

    - No vi qualquer ave ou animal desde que o tigre nos deixou. O silncio aqui completo.

    - mesmo, s ns! concordou Teovaldo.

    - No farejo nada completou Petisco.A claridade continuava a se afastar rapidamente. O menino resolveu apressar-se: ora

    andava a largos passos ora corria. Teovaldo ia se segurando em seu ombro como podia,abrindo e fechando as asas. Petisco s vezes pulava adiante, s vezes corria a seu lado.

    - Ela agora est novamente se tornando mais forte, mas no avana! apontouCabelos de Ouro, parando a fim de tomar flego, logo reiniciando os passos.

    Poucos metros dali a vegetao terminava, iniciando-se largo patamar de pedra. Elesse lanaram sobre o patamar que adiante se fechava como uma ponta de lana. Ficaramsem escolha diante de um estreito desfiladeiro onde somente uma pessoa a cada vez

    poderia caminhar. Cabelos de Ouro tomou Petisco nos braos e penetrou por aquela

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    32/60

    32

    passagem. A claridade havia quase desaparecido completamente, s uma fraca luziluminava o caminho.

    Mais adiante Cabelos de Ouro se viu ante uma passagem mais larga, pois asaltssimas paredes se afastavam permitindo que andasse com desembarao. Mal tinha

    dado poucos passos levou grande susto. Detrs de duas rochas, surgiram duas gigantescasserpentes najas, uma de cada lado da passagem. Levantaram-se sobre seus corpos,movendo as cabeas ameaadoramente, mostrando suas finas lnguas de duas pontas.

    - Currupco, currupco! gritou nervosamente Teovaldo.- Cuidado, Cabelos de Ouro, elas vo atacar! alertou Petisco.

    Quando isto ia acontecer a claridade espalhou-se com incrvel rapidez alcanando-ose os obrigando a proteger os olhos. Entretanto, to rpido quanto surgira, a claridade serecolheu, voltando novamente a ser fraca. Quando os trs de novo conseguiram enxergarno viram mais as gigantescas e ameaadoras serpentes najas.

    - Sumiram! exclamou o menino

    - Cuidado, pode ser uma cilada, currupco!- Irei com cuidado. Petisco fique atento, se perceber alguma coisa estranha avise.

    Mais adiante viram que a luz rosada tinha incio depois de pequena curva de uma dasparedes.

    - dali que ela sai - Cabelos de Ouro apontou para a direo. Mas no podeprosseguir alm de trs passos por que a luz se tornou novamente intensa, jorrando paratodos os lados.

    - Uiii! No consigo enxergar, meus olhos doem! Ele tentava proteger-se colocando obrao adiante. Petisco e Teovaldo tambm protegeram seus olhos. A luz era muito forte eCabelos de Ouro ficou de costas. A luz cessou e ele pode novamente se virar, caminhandoe circundando a pequena curva.

    - Um... monlito...de cristal! espantou-se, parando e vendo diante de si aquelaforma.

    Era como uma caixa retangular, branca, transparente e em p; um cristal puro deincrvel beleza. Era grande, pois se o abraasse o menino no conseguiria tocar as mosno lado oposto. A luz, embora fraca, ainda brilhava.

    - Tem uma pedra l dentro, Cabelos de Ouro, ela que brilha! falou Petisco e omenino o soltou ao cho.

    - outro cristal. Mas com este tamanho e sendo branco como que pode lanar tanta

    luz rosa? E para que servir?Sobre o monlito havia algo e Cabelos de Ouro se aproximou para ver. Era um papiro

    enrolado. Ele o tomou e o abriu.- No entendo nada. Est escrito com figuras e smbolos. Como descobrir o que diz?

    Neste instante o cristal do interior do monlito brilhou mais e lanou um raio rosasobre a testa de Cabelos de Ouro. Ele sentiu o local esquentar, descobrindo que podiaagora ler o que estava escrito no papiro. Dizia o seguinte:

    Aquele que aqui chegar no deve mais voltar sem o que busca. Ter de lutar mais

    para obter a chave que o conduzir ao objetivo. At agora venceu os desafios da gua, doar e da terra. Eis que chegar o desafio do fogo. Vencendo-o ter a chave do segredo da

  • 7/31/2019 PEDRO PINOTE E O VELOCINO

    33/60

    33

    gema de cristal, guardada no monlito. a nica capaz de ajud-lo definitivamentenaquilo que deseja. Boa sorte. E o raio de luz apagou-se.

    - Conseguiu ler, Cabelos de Ouro?- Sim, Petisco. Tudo o que passamos at o momento foram desafios, provas de

    coragem. Agora a vez do fogo, se o vencermos teremos a chave que abrir este monlito

    e nos dar esta gema. Ela a nica que pode nos ajudar na busca do velocino!- Gema? Pensei que s ovo tinha! falou Teovaldo.- Que dificuldade! reclamou Petisco.- verdade, porm prometemos ao senhor Armou que tentaramos. Estamos inteiros,

    nada em realidade nos aconteceu de mal Cabelos de Ouro olhou para o prprio corpocomo a mostrar-lhes.

    - Mas j no chega o fogo dos twitchz? Teovaldo estava inconformado, lembrando-se da outra aventura.

    - Pelo jeito no. Mas creio que teremos agora um desafio diferente. Vamos emfrente?

    - Para onde? Currupco!

    Cabelos de Ouro olhou em redor e descobriu algo: duas grandes pedras lado a lado.Eram bojudas em cima e finas embaixo. Depois delas somente vinha a pedreira. Ele seaproximou e colocou a mo numa delas procurando gir-la. A pedra comeou a se