paulo hamilton siqueira junior - teoria do direito - 3º edição - ano 2012

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Paulo Hamilton Siqueira Jr. T eoria do D ireito 3- edição Editora Saraiva

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Hamilton. Um grande livro para quem busca nas entrelinhas do Direito tirar todas as suas dúvidas e galgar sua aprovação. Que possam se utilizar desta obra única e peculiar. Um abraço e bons estudos e boa leitura. Direito Penal Hamilton, Editora.

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  • Paulo H am ilton Siqueira Jr.

    T e o r ia d o D ir e it o3- edio

    EditoraSaraiva

  • T e o r ia d o D ir e it oDogmtica (Ps-Positivismo)

    Sociologia (Sociedade da Informao)

    Filosofia (Ps-Modernismo)

    saraivajur.com.br

  • S u m r i o

    PREFCIO ......................................................................................................

    NOTA DO AU TO R .......................................................................................

    I IN T R O D U O ....................................................................................

    1 O QUE O D IR E IT O .........................................................................

    2 DEFIN I O DO D IR E IT O ..............................................................

    II D O G M T IC A D O D I R E I T O ..................................................

    1 INTRODUO A DOGMTICA DO D IR E IT O ...................

    1.1 Direito Norma.................................................................................

    1.1.1 Direito Estatal e Direito No Estatal.........................

    1.1.2 Direito Positivo e Direito Natural................................

    1.1.3 Ordem Jurdica..................................................................

    1.2 Direito Faculdade..........................................................................

    1.2.1 A Relao entre Direito Objetivo e Direito Subjetivo .

    1.3 Objeto de Estudo da Dogmtica do D ireito .........................

    2 TEO RIA DA NORMA JU RD ICA ...................................................

    3 FO N T ES DO D IR E IT O .....................................................................

    3.1 Conceito............................................................................................

    3.2 Teoria das Fontes do Direito.......................................................

    3.3 Espcies de Fontes do Direito....................................................

    3.4 As Fontes No Estatais..................................................................

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    3.5 Poder Negociai................................................................................

    L E I ...............................................................................................................

    4.1 Sentido e Acepes da Palavra L e i...........................................

    4.2 Definio dc Lei Jurdica.............................................................

    4.2.1 Elemento Material............................................................

    4.2.2 Elemento Formal..............................................................

    4.2.3 Elemento Instrumental..................................................

    PRO CESSO LEG ISLA TIV O .............................................................

    5.1 Conceito............................................................................................

    5.2 Tipos de Processo Legislativo.....................................................

    5.3 Procedimento Legislativo.............................................................

    5.4 Diviso do Processo Legislativo.................................................

    5.4.1 Iniciativa...............................................................................

    5.4.2 Discusso e Aprovao.....................................................

    5.4.3 Execu o ............................................................................

    5.5 As Espcies Normativas Previstas no Texto Constitucional

    5.5.1 Emendas Constituio.................................................

    5.5.2 Leis Complementares......................................................

    5.5.3 Leis Ordinrias...................................................................

    5.5.4 Leis Delegadas...................................................................

    5.5.5 Medidas Provisrias.........................................................

    5.6 Decretos Legislativos.....................................................................

    5.7 Resolues........................................................................................

    C O ST U M E JU R D IC O .......................................................................

    6.1 O Costume como Fonte do Direito..........................................

    6.2 Elementos do Costume Jurdico................................................

    6.3 Espcies de Costume Jurdico...................................................

    JURISPRUDNCIA...............................................................................

    7.1 A Jurisprudncia como Fonte do Direito................................

    7.2 As Smulas dos Tribunais............................................................

    7.2.1 Espcies de Smulas........................................................

  • 8 D O U TRIN A ............................................................................................. 117

    8.1 A Doutrina como Fonte do D ireito.......................................... 118

    9 SISTEM A JU R D IC O ........................................................................... 121

    9.1 Classificao do Sistema Jurdico.............................................. 124

    9.2 Diviso do Sistema Jurdico........................................................ 129

    9.2.1 Direito Pblico e Privado............................................... 129

    9.2.2 Ramos do Direito Pblico............................................. 131

    9.2.3 Ramos do Direito Privado............................................... 134

    10 CLASSIFICAO DAS NORMAS JURD ICA S........................ 135

    10.1 Quanto Hierarquia................................................................ 136

    10.2 Quanto s Fontes........................................................................ 137

    10.3 Quanto Imperatividade......................................................... 138

    10.4 Quanto Eficcia (obrigatoriedade) ou Vontade das Partes 138

    10.5 Quanto Flexibilidade............................................................. 140

    10.6 Quanto O rigem ....................................................................... 140

    10.7 Quanto ao mbito ou Extenso Espacial.......................... 140

    10.8 Quanto ao Destinatrio ou Extenso Pessoal..................... 141

    10.9 Quanto Sano........................................................................ 142

    10.10 Ouanto Natureza das Disposies..................................... 143

    10.11 Quanto Sistematizao........................................................... 14311 DOGMTICA 1IERM EN U TICA................................................. 144

    11.1 I Icrmcnutica, Interpretao e Exegese.............................. 145

    11.2 Elementos da Interpretao Jurdica..................................... 14,

    11.3 Espcies de Interpretao Jurdica......................................... 14"

    11.4 Necessidade de Interpretao ................................................ 150

    11.5 Integrao da Norma Jurdica................................................. 1 51

    11.6 A Nova I Iermenutica............................................................... 1 53

    12 ZETTIC A DA APLICAO D O G M TICA............................ 1 55

    12.1 Existncia, Vigncia, Validade e Eficcia............................ 1 5

    12.1.1 Existncia .................................................................... 158

    12.1.2 V igncia........................................................................ 158

    12.1.3 Validade......................................................................... 161

    11

  • 12.1.4 E ficcia ................................................................................ 165

    12.2 mbito dc Aplicao das Normas Jurdicas........................... 171

    12.2.1 A Norma 1 1 0 mbito Temporal..................................... 172

    12.2.1.1 Retroatividade ou Irretroatividadc das Norm as....................................................................... 176

    12.2.2 A Norma no mbito Espacial........................................ 177

    12.2.3 A Norma no mbito M aterial...................................... 182

    12.2.4 A Norma no mbito Pessoal.......................................... 183

    13 TEO RIA D O S D IREITO S S U B JE T IV O S .................................... 183

    13.1 Direito Subjetivo............................................................................ 183

    13.2 Relao Jurdica.............................................................................. 184

    13.2.1 Elementos da Relao Jurdica..................................... 185

    13.2.1.1 Sujeitos de D ireito .......................................... 186

    13.2.1.2 Vnculo de Atributividade............................. 186

    13.2.1.3 Objeto.................................................................. 186

    13.2.1.4 Fato Propulsor.................................................. 187

    13.2.1.5 Proteo Jurdica.............................................. 190

    13.3 Natureza Jurdica do Direito Subjetivo.................................. 191

    13.3.1 Icoria da Vontade (Bernard Windscheid)................. 191

    13.3.2 Teoria do Interesse (RudolfVon lhering).................. 192

    13.3.3 Teoria Ecltica (Georg Jellinek)................................... 193

    13.3.4 Teoria da Vontade-Potncia (Giorgio Del Vecchio).. 194

    13.3.5 Teoria Normativa (I lans Kelsen).................................. 194

    13.3.6 Teoria da Situao de Fato (Lon Duguit)................ 194

    1 3.3. Situaes Subjetivas (Autores Modernos)................. 195

    13.4 Situao Subjetiva.......................................................................... 196

    13.5 Classificao dos Direitos Subjetivos....................................... 199

    14 P S-PO SITIV ISM O .............................................................................. 201

    III S O C IO L O G IA D O D IR E IT O .................................................... 213

    1 A SO C IED A D E E O D IR E IT O ........................................................ 215

    12

  • 1.1 A Sociedade.................................................................................... 215

    1.2 Conceito de Sociedade............................................................... 216

    1.3 Espcies de Sociabilidade........................................................... 219

    2 SOCIOLOGIA JU RD ICA .................................................................. 223

    2.1 O Direito como Fato Social....................................................... 223

    2.2 Macrossociologia Jurdica........................................................... 225

    2.3 Microssociologia Jurdica............................................................ 22

    2.4 Sociologia Gentica do Direito................................................ 230

    2.4.1 A Influncia da Sociedade sobre o Direito............... 230

    2.4.2 A Influncia do Direito sobre a Sociedade............... 231

    2.5 Necessidade das Normas............................................................. 233

    2.5.1 Controle Social................................................................. 233

    3 SO CIEDA D E DA INFORM AO................................................. 235

    3.1 Da Sociedade Agrcola Sociedade da Informao............. 2--8

    3.2 Direito, Informao e Conhecim ento..................................... 243

    3.3 Direito Informacional ................................................................. 24

    3.3.1 Conceito.............................................................................. 249

    3.3.2 Objeto de Estudo.............................................................. 250

    3.3.3 Mudana de Paradigma no Fstudo do D ireito ....... 253

    3.3.3.1 Novas Questes................................................ 254

    3.4 O Papel do Estado na Sociedade da Informao.................. 255

    3.4.1 Cidadania D igital............................................................. 25,

    3.5 Direito e Informtica..................................................................... 258

    3.5.1 Informtica do Direito.................................................... 259

    IV F IL O S O F IA I X ) D I R E I T O ...................................................... 265

    1 FILO SO FIA .............................................................................................. 267

    1.1 A Filosofia a Cincia das Inutilidades?............................... 268

    1.2 Conceito de Filosofia.................................................................. 270

    1.3 Conhecim ento.............................................................................. 275

    1.4 Partes da Filosofia.......................................................................... 27/

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    1.5 Diviso da Filosofia............................................

    FILOSO FIA DO D IR EITO .....................................

    EPISTEM O LO G IA JU RD ICA .............................

    3.1 Ontologia Jurdica...............................................

    3.2 Gnoscologia Jurdica..........................................

    CLASSIFICAO DAS C I N C IA S...................

    4.1 Augusto Com te....................................................

    4.2 Ampre - Wilhelm Dilthey.............................

    4.3 Aristteles..............................................................

    4.4 Outras Classificaes.........................................

    4.4.1 Spencer....................................................

    4.4.2 Karl Pearson............................................

    4.4.3 Hermann Ulrich Kantorowicz...........

    4.4.4 Carlos Cossio..........................................

    4.4.5 Wilhelm Windelband..........................

    4.4.6 I lans Kelsen............................................

    4.5 Classificao Contempornea das Cincias

    4.5.1 Cincia Terica ou Especulativa......

    4.5.2 Cincia Prtica ou Normativa...........

    CIN CIA DO D IR E IT O ..........................................

    5.1 O Direito no Ouadro das Cincias...............

    5.2 Cientificidade do Direito.................................

    5.3 Cincias Auxiliares do D ireito........................

    SEM I TICA JU RDICA...........................................

    6.1 AInguagem do Direito...................................

    6.2 Partes da Semitica Jurdica.............................

    6.3 Espcies de Linguagem Jurdica....................

    LGICA JU R D IC A ...................................................

    7.1 Metodologia da Cincia do D ireito .............

    7.1.1 Operaes Intelectuais do Jurista......

  • 7.1.1.1 Termos................................................................ 312

    7.1.1.2 Proposies....................................................... 313

    7.1.1.3 Argumento........................................................ 313

    7.2 A Deduo como Mtodo da Cincia do Direito - Silogismo Jurdico....................................................................................... 316

    7.2.1 Silogismo............................................................................. 316

    7.2.2 Espcies de Silogismo..................................................... 317

    7.2.3 Regras do Silogismo Categrico.................................. 318

    7.2.4 Regras do Silogismo C ondicional............................... 321

    7.2.5 A Deduo como Mtodo da Cincia do Direito... 322

    7.3 A Induo como Mtodo da Cincia do D ireito ............... 323

    7.3.1 A Induo............................................................................ 323

    7.3.2 A Induo como Mtodo da Cincia do D ireito.... 324

    7.4 A Intuio como Mtodo da Cincia do D ireito ............... 326

    7.4.1 A Intuio............................................................................ 326

    7.4.2 A Intuio no Campo do D ireito................................ 327

    8 AXIOLOGIA JURDICA...................................................................... 328

    8.1 O Mundo da Cultura................................................................... 330

    8.1.1 Natureza e Cultura.......................................................... 330

    8.1.1.1 A Negao da Dicotomia Mundo da Natureza e Cultura.................................................. 333

    8.1.2 Acepo da Palavra Cultura......................................... 333

    8.1.3 Caractersticas da Cultura............................................. 336

    8.1.4 Explicao e Compreenso........................................... 337

    8.1.5 Juzo de Valor e Juzo de Realidade........................... 338

    8.1.6 Leis Fsicas, Culturais e ticas..................................... 341

    8.1.6.1 Leis Fsicas........................................................ 342

    8.1.6.2 Leis Culturais................................................... 342

    8.1.7 A Impossibilidade de uma Anlise Avalorativa noMundo da Natureza e Cultura..................................... 343

    8.2 O Mundo tico.............................................................................. 345

    15

  • 8.2.1 Conceito de E tica....................................

    8.2.2 Direito e M oral.........................................

    8.3 Teoria da Justia - Fundamento do Direito..

    8.3.1 Justia como Fundamento da Norma

    8.3.2 Conceito de Justia.................................

    8.3.3 Acepes de Justia..................................

    8.3.4 Sentidos de Justia...................................

    8.3.5 Caractersticas Essenciais da Justia...

    8.3.5.1 Espcies de Igualdade...........

    8.3.6 Princpio da Igualdade...........................

    8.3.7 Espcies de Justia...................................

    8.3.7.1 Justia Comutativa.................

    8.3.7.2 Justia Distributiva.................

    8.3.7.3 Justia So cia l...........................

    9 P S-M O D ER N ISM O .................................................

    V C O N C L U S O ..........................................................

    BIBLIOGRAFIA................................................

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  • P r e f c i o

    Paulo I Iamilton Siqueira Jr., em momento de rara felicidade, presenteia a todos os estudantes e profissionais do Direito com uma obra de carter terico e prtico intitulada 'leoria do D ireito: dogmtica (ps-positivismo), sociologia (sociedade da informao) e filosofia (ps-modernismo), pela qual o autor, atualizando e reformulando por completo sua obra anterior, denominada Lies cie introduo ao Direito, lana, podemos assim afirmar, um desafio: estudar o Direito para alm da dogmtica jurdica.

    Desde os primeiros apontamentos introdutrios percebe-se a constante preocupao do Autor em direcionar a obra para alm de uma mera propedutica jurdica. Se, num primeiro momento, so enfrentadas, dc maneira clara, simples e precisa, as questes propeduticas relativas dogmtica jurdica (o problema das fontes; a lei, seu processo de elaborao, sua aplicao 1 1 0 tempo e 1 1 0 espao; os sistemas jurdicos; o costume; a Jurisprudncia; o Direito em seus aspectos objetivo e subjetivo e as questes relacionadas hermenutica e aplicao do Direito), todas to necessrias aos alunos ingressantes no curso de graduao e que iniciam seus estudos jurdicos, num segundo momento, constata-se o cuidado do Autor, ainda uma vez de forma clara e precisa, conforme, frisc-sc, a caracterstica de suas obras, em analisar o fenmeno jurdico em seus aspectos sociolgico e filosfico, emprestando obra um vis investigativo, mais ao gosto dos alunos e mestres dos cursos de ps-graduao, lato e estrito sensu.

    No dizer de Paulo I Iamilton Siqueira Jr., conhecer o direito no conhecer a norma, mas, tambm, a sua insero 11a sociedade (sociologia), sua natureza cientfica e seu valor (filosofia). E, como bem ressalta, uma teoria do direito no se resume ao aspecto dogmtico, mas abraa e engloba o estudo do Direito como algo mais abrangente, ou seja, nos aspectos sociolgico e filosfico.

    17

  • Assim, se importante oferecer ao aluno ingressante nos cursos jurdicos uma viso geral da dogmtica jurdica (o Direito em seu aspecto in- tertemporal), no menos importante estimul-lo a compreender esse mesmo Direito para alm da norma, permitindo-lhe descobrir a implicao recproca e intrnseca existente entre Sociedade e Direito.

    Neste aspecto, louve-se a inovao trazida pelo jovem e talentoso Coordenador do Curso dc Direito das Faculdades Metropolitanas Unidas, Paulo Hamilton Siqueira Jr., que insere as questes relacionadas Sociedade da Informao no mbito de estudo da Icoria do Direito.

    Com a mesma linguagem objetiva e precisa, o Autor, com fecho de ouro, finaliza sua leoria do Direito analisando o fenmeno jurdico em seu aspecto filosfico.

    Sob essa tica analisa, de forma clara, precisa e agradvel, o Direito em seu aspecto Epistemolgico c Axiolgico, alm de debater as questes importantes relacionadas Linguagem e Lgica Jurdicas, to caras e imprescindveis formao dos alunos dos cursos jurdicos, em seus diversos nveis, visto que o ser" do Direito se manifesta por meio da linguagem, lgica e precisa, como aquela utilizada por Paulo Hamilton Siqueira Jr. para formular sua leoria do Direito: dogmtica (ps-positivismo), sociologia (sociedade da informao) e filosofia (ps-modernismo).

    Por esses e por quaisquer outros aspectos que se queira analisar, a presente obra prima pela simplicidade e preciso conceituai, que a tornam imprescindvel e de estudo obrigatrio, no apenas para os alunos dos cursos jurdicos, mas por todos aqueles, operadores do Direito, que privilegiam um estudo sistemtico e preciso, porm, apresentado em linguagem clara, simples e agradvel.

    Nivaldo Sebastio Vcola

    Professor e Chefe do Departamento de I Iumanidades do Curso de Direito da FMU. Mestre em Direito pela Faculdade de

    Direito da Universidade de So Paulo. Advogado em So Paulo.

    18

  • N o t a d o a u t o r

    A teoria do direito se inseriu rapidamente nos cursos de graduao

    e ps-graduao. O esgotamento da edio forou-nos a rever integral

    mente o trabalho, revisando temas e conceitos fruto da experincia

    docente.

    O exerccio do magistrio e a atividade de pesquisa acadmica deram

    origem, em 1998, ao nosso primeiro trabalho editorial, Lies de introduo

    ao direito, contando com a 5- edio, esta com duas tiragens.

    Aps ministrar aulas 1 1 0 quarto e quinto semestre 1 1 0 curso de gradu

    ao, ps-graduao e mestrado, em 2008 retomamos o ensino de gradu

    ao no primeiro semestre do curso, com a disciplina Teoria do Direito, e

    sentimos a necessidade de atualizar e reformular integralmente as Lies

    de introduo ao direito. Mas entendemos que a obra no poderia ser

    voltada apenas aos alunos ingressantes. Assim, a reformulao trouxe as

    pectos que so importantes nos cursos de graduao e ps-graduao (lato

    c stricto sensu).

    Surge ento a obra Teoria do Direito: dogmtica do direito (ps-posi-

    tivismo), sociologia do direito (sociedade da informao) e filosofia do di

    reito (ps-m od e rn ismo).

    No trabalho defendemos uma leitura da teoria do direito, que no se

    resume ao aspecto dogmtico. Teoria significa exame, estudo, conhecimen

    to. Conhecer o direito no conhecer a norma, mas tambm a sua insero

    na sociedade (sociologia), sua natureza cientfica e seu valor (filosofia).

    Assim, investigamos a dogmtica, a sociologia e a filosofia. Em suma, a

    presente obra tem por finalidade estudar a Teoria do Direito em seus trs

    planos.

    1 9

  • Esperamos com o livro Teoria c/o Direito contribuir para o conhecimento dc nossos alunos e dos pesquisadores e professores, de quem aguardamos as sugestes, com o intuito de continuar a melhorar as futu- ras edies.

    So Paulo, agosto de 2010.

    Paulo Hamilton Siqueira Jr.

    e-mail: paulohamiltonjrfa uol.com.br

  • IIn t r o d u o

    O vocbulo teoria provm do grego theoria, que significa estudo, exame, designando a ao de contemplar, examinar. E o prprio conhecimento especulativo. Por teoria entendemos o conjunto de partes e princpios fundamentais de determinado ramo do conhecimento humano, buscando sua sistematizao.

    A teoria do direito como o prprio nome determina estuda todas as realidades do direito, buscando sua sistematizao. A teoria do direito de cunho filosfico, na medida em que se preocupa com o conhecimento amplo e geral. A teoria do direito tem como fulcro o conhecimento amplo, geral e real da cincia jurdica, no apenas no seu aspecto dogmtico. A teoria do direito investiga as estruturas lgicas da experincia jurdica, analisando as normas e os princpios gerais do direito, o conceito, a diviso e a natureza do direito, buscando concluir com a sistematizao de todo o fenmeno jurdico.1

    C onhecer direito conhecer a natureza cientfica da cincia jurdica (epistemologia), o seu valor fundamental (axiologia) e sua insero na sociedade (realidade social - sociologia), no sc esquecendo da cincia dogmtica 0 1 1 dogmtica jurdica ou do direito, como preferimos, que se

    1 C R IS P IM , Luiz Augusto. E s tu d o s p r e l im in a r e s dc* d ir e i t o . So Paulo: Saraiva. 1997 , p.

    28 : A Teoria Geral do Direito tem por fim, co m o se v, a d eterm inao das estruturas

    lgicas da experincia jurdica em geral. PA ES, P. R. Tavares, i n t r o d u o a o e s t u d o do

    d ir e ito . 2 ed. rev. c am p ., So Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 30 : A 'leo ria Geral

    do Direito a cin cia que determ ina os princpios do direito. Ela b u sca o co n ceito do

    direito, form ulando conceitos m ais estritos. E la , a leoria G era! do D ireito, p ro cu ra en

    contrar a consistncia do fenm eno jurdico, bem co m o sua etiologia e realizao. In

    confundvel co m a Filosofia do D ireito, em bora muitos autores as tenh am confundido,

    pois 0 dom nio desta filosfico, c o da Teoria Geral do Direito positivo".

  • divide em estudo da norma agendi (estudo da norma) e facultas agendi (estudo dos direitos subjetivos).

    Em resumo, a teoria do direito busca o conhecimento que no campo cientfico-jurdico se d por intermdio do estudo da dogmtica, sociologia e filosofia. Dessa forma, segundo nosso entendimento, a realidade jurdica e consequentemente a teoria do direito pode ser vislumbrada em trs planos: dogmtico, sociolgico c filosfico.

    1 D QUE 0 DIREITO

    O estudo da teoria do direito requer uma indagao preliminar: O que o direito? A palavra direito no tem apenas um significado, sendo empregada em vrios sentidos ou acepes.

    Na linguagem comum e cientfica, o vocbulo direito empregado com significaes diferentes. A doutrina distingue dois sentidos fundamentais da palavra direito: 1. o direito norma, lei ou regra de ao (norma agendi); e 2. o direito faculdade, poder dc ao, prerrogativa (facultas agen d i).2

    RudolfVon Ihering em sua obra A I A l t a pelo Direito, prescreve que a palavra direito emprega-se num duplo sentido: no sentido objetivo e no sentido subjetivo. O direito no sentido objetivo c o conjunto de princpios jurdicos aplicados pelo Estado ordem legal da vida. O direito no sentido subjetivo a transfuso da regra abstrata no direito concreto da pessoa interessada.

    Para Thomas Marky o termo direito, entre outros, tem dois sentidos tcnicos. Significa, primeiramente, a norma agendi, a regra jurdica. Assim, falamos dc direito romano, dc direito civil brasileiro, como complexo de normas. Noutra acepo, a palavra significa a facultas agendi, que o poder de exigir um comportamento alheio. Assim, a entendemos quando falamos em direito nossa casa, direito aos filhos, direito remunerao do nosso trabalho. No primeiro sentido, trata-se do direito objetivo e no segundo, do direito subjetivo.4

    BEV IL A Q U A , Clvis. l e o r i a g e ra l d o d ir e i t o c iv i l . 4 a ed., Braslia: M inistrio da Justia, 1972, p. 7-10.

    II1K R IN G , R u d olfV on . A lu ta p e lo d ir e i t o . Trad. Joo Vasconcelos. Rio dc Janeiro: Forense, 1999 , p. 3.

    4 M A R K Y , Thom as. C u r s o e le m e n t a r d e d ir e i t o r o m a n o . 7 a ed.. So Paulo: Saraiva. 1994, p. 13.

    24

  • Paulo Dourado de Gusmo alude que, de modo muito amplo, pode- se dizer que a palavra direito tem trs sentidos:

    1. regra de conduta obrigatria (direito objetivo);

    2. sistemas de conhecimentos jurdicos (cincia do direito);

    3. faculdade ou poderes que tem ou pode ter uma pessoa, ou seja, o que pode uma pessoa exigir de outra (direito subjetivo).

    Miguel Reale, ao tratar das acepes da palavra direito, concluindo pela estrutura tridimensional do direito, entende que uma anlise em profundidade dos diversos sentidos da palavra Direito veio demonstrar que eles correspondem a trs aspectos bsicos, discernveis cm todo e qualquer momento da vida jurdica: um aspecto normativo (o Direito como ordenamento e sua respectiva cincia); um aspecto ftico (o Direito como fato, ou em sua efetividade social e histrica) e um aspecto axiolgico (o Direito como valor dc Justia).6 Assim, para o citado autor, havendo um fenmeno jurdico, h um fato subjacente (fato econmico, geogrfico, demogrfico etc.); um valor, que conferido ao referido fato, e uma norma ou regra que integra o fato ao valor. Dessa forma, os trs elementos (fato, valor e norma) coexistem numa unidade concreta.

    Por meio de uma pesquisa mais rigorosa, Andr Franco Montoro, em seu livro Introduo C incia do Direito, destaca cinco realidades fundamentais, dentro da pluralidade de significaes do direito no sentido cientfico jurdico:

    1. o direito norma;

    2. o direito faculdade;

    3. o direito justo;

    4. o direito cincia;

    5 G U S M O . Pauto D o u rad o d e. In t r o d u o a o e s tu d o d o d ir e ito . ^2- ctl.. R io de Janeiro:

    Forense, 2 0 0 2 , p. 4 7 .

    '' RF.ALK, M iguel. I . i e s p r e l im in a r e s d e d ir e ito . 2 - i ed., So Paulo: Saraiva, 2002 , p.

    64 -65 .M O N T O R O , Andr Fran co . I n t r o d u o c i n c ia d o d ir e ito . 2^ - cd ., So Paulo: Rev is

    ta dos Tribunais, 1995 , p. 29-60 .

    25

  • A palavra direito tem sentido nitidamente diverso nas seguintes expresses:

    1. o direito brasileiro pune o crime de estupro;

    2. o locador tem o direito de cobrar o aluguel;

    3. o salrio direito do trabalhador;

    4. o estudo do direito requer mtodo prprio;

    5. o direito um setor da realidade social.

    Ao atentarmos para a significao do vocbulo direito no sentido empregado em cada uma das referidas frases, verificamos ntidas diferenas. Assim, no primeiro caso, direito significa a norma jurdica, a lei, a regra social obrigatria (Norma). Na segunda expresso, direito significa a faculdade, o poder, a prerrogativa que o locador tem dc cobrar o aluguel (Faculdade). Na terceira expresso, direito significa o que devido por justia (justo). Ora, o trabalho sem remunerao escravido. A escravido ofende os anseios da justia. Na quarta expresso, direito significa cincia ou, mais exatamente, a cincia do direito (Cincia). Na ltima expresso, direito considerado como fenmeno da vida coletiva. Ao lado dos fatos econmicos, artsticos, culturais c esportivos, tambm o direito um fato social (Fato Social).

    Cada realidade do direito d origem a estudos sistemticos, para que seja verificada de forma minuciosa cada uma das referidas significaes, que na esteira de Andr Franco Montoro podem ser divididas em: 1. teoria da norma jurdica (norma); 2. teoria dos direitos subjetivos (faculdade); 3. epistemologia jurdica (cicncia); 4. axiologia jurdica (justo); e 5. sociologia jurdica (realidade social):

    Segundo nosso entendimento, o conhecimento do direito encontra-se em trs planos: dogmtico (norma), sociolgico (fato) e filosfico (cincia e valor). Nesse sentido, a investigao da cincia do direito surge por meio do estudo da dogmtica, sociologia e filosofia do direito.

    2 DEFIIIRO DO DIREITO

    Cremos que se encontra clara a resposta ao questionamento formulado: O que o direito? Mas, o seu enunciado surgir da definio de

    5. o direito fato social.

    26

  • direito. Ora, o nosso objeto de estudo o direito, havendo, pois, a necessidade de buscar a sua definio. Essa tarefa rdua pertence filosofia, mais especificam ente epistemologia jurdica - (ep istem e ) cincia e (logos) estudo - estudo da Cincia do Direito.

    Como definir o Direito? Preliminarmente, o que definir? A palavra definir vem do latim definitione, definire, que significa limitar. Assim, definir limitar o objeto definido. Definir explicar o sentido de um vocbulo ou a natureza dc uma coisa, ou ainda, a operao que analisa a com preenso dc um conceito.8 Para Aristteles, a definio a frmula que exprime a essncia de uma coisa, sendo composta dc gnero (prximo) e das diferenas (especficas). Marcus Cludio Acquaviva ensina que Definir revelar a essncia do objeto definido.4 Essncia tudo o que identifica o objeto a definir. Sem seus elementos essenciais, o ser ou a coisa careceriam de existncia.

    Na definio somente devem participar as causas essenciais do objeto definido, porque sem estas o objeto sequer existiria. Na configurao dos objetos e das coisas, existem causas essenciais e acidentais. Somente as causas essenciais devem figurar nas definies, sob pena de acidental idade ou impreciso. E nesse sentido que Aristteles ensina que a definio perfeita consiste em exprimir a essncia do objeto ou da coisa pelo gnero prximo e pela diferena especfica. Tomemos como exemplo a definio de homem. O homem o animal racional. Assim, para definir o homem utilizamos o gnero prximo animal" e a diferena especfica racional. De outra feita, se definirmos o homem como o animal racional vivente, a definio torna-se imperfeita ou imprecisa, na medida em que o homem no c o nico ser vivente. No se trata de causa essencial. Ainda, sc definirmos o homem como animal racional que usa culos, a definio peca por acidentalidade, pois existem homens que no usam culos.

    Em resumo, definir explicar o sentido de um vocbulo ou a natureza, a essncia de uma coisa ou objeto. Dessa forma, segundo a lgica (Captulo da Filosofia), h duas espcies de definies:

    8 F O N TANA, P in o K H is t r ia da f i lo s o f ia , p s ic o lo g ia e l g ic a . 3 -e d ., So Paulo: Sarai

    va, 1969 , p . 3 8 4 .

    '* ACQUAVIVA, Marcus Cludio. Notas introdutrias ao estudo do direito. 24cd., SoPaulo: cone, 1990, p. 21.

  • 1. nominal; e

    2. real.10

    A definio nominal designa o que uma palavra ou nome significa, por meio da etimologia11 e da semntica.12 A definio real expressa o que uma coisa ou realidade, indicando a natureza do objeto ou da coisa a ser definida.

    No existem dificuldades em estabelecer uma definio nominal da palavra direito. A palavra direito provm do latim directum, rectum, que significa direito, reto, aquilo que conforme a uma rgua, e sucessivamente, designando aquilo que conforme a lei, a prpria lei, conjunto de leis, cincia que tem por objeto as leis.1' O vocbulo latino directum, rectum apresenta variaes semnticas em quase todas as lnguas - Derecho (espanhol), Diritto (italiano), Droit (francs), Recht (alemo), Right (ingls), Drcptu (romeno), dret (catalo), ret (dinamarqus), riitt (sueco), rett (noruegus) e rtt (islands).H

    10 D efinio N om inal - a que explica o sentido de um a palavra, distinguindo a ideia que

    ela exprim e das dem ais ideias co m as quais poderia confundir-se. Pode ser: Sem n tica

    - quando explica o sentido usual que se d a um a palavra; por exem plo : Filosofia a

    cincia dos prim eiros princpios e das prim eiras causas. Etin io l g ica 6 a definio

    que explica o sentido da palavra segundo sua origem , quer na prpria lngua que se em

    prega, quer na lngua da qual deriva: Filosofia" de origem grega, com posta de dois ele

    m entos /i/o e sopa, significa am igo da sabedoria. D efinio Real - a que explica a es

    sncia de um a coisa e deve ser considerada co m o verdadeira definio ou definio lgi

    ca. Segundo I,ahr: A definio nom inal tem por fim tom ar a ideia clara; e a definio

    real, tornar a ideia distinta. F. o que ensina D ino F. Fontana (obra citada, p. 384-> 87).

    11 Etim ologia (do grego etymologia, co m derivao etym ologicu) a parte da gram tica que

    sc ocup a do estudo da origem das palavras.

    i: Sem ntica (do grego setnantik, semantiks, relativo quilo que indica, assinala). A filo

    sofia encara a sem ntica co m o a arte da significao (tclm e, sem antik), ou seja, o es

    tudo sistem tico das m udanas ou translaes sofridas no tem po e no espao, pela signi

    ficao das palavras. A lngua enten de que c a parte da gram tica que estuda o significa

    do das palavras.

    l' A etim ologia (origem , genealogia) da palavra direito c directum , rectum e a sem ntica

    (significado) direito, conform e a reta, significando, posteriorm ente, aquilo que con

    form e a lei.

    M Da palav ra directum , derivou direito, derecho. diritto. droit etc. Da palav ra rectum . derivou

    Recht. right etc.

    28

  • Ao lado da expresso directum , do baixo latim, existe a expresso jus do latim clssico, menos expressiva e suplantada pela primeira. O termo jus, ligado na origem jussum, significa direito, sendo representado por uma srie de vocbulos: jurdico, jurisconsulto, judicial, judicirio, jurisprudncia etc. C) termo jus designa ainda a ideia de poder, comando. Jubere ordenar, mandar, comandar. Jus ou jussum aquilo que ordenado. Em Roma havia o jus e o fas. O jus era o conjunto de normas formuladas pelos homens, destinadas a dar ordem vida cm sociedade; fas era o conjunto de normas de origem divina, religiosa, que regeriam as relaes entre os homens e as divindades.1' Para os romanos o jus era o direito propriamente dito, apresentando sentido diverso de justitia, que significa Justia, conceito que conhecemos, ou seja, a qualidade ou fundamento do direito. Justitia (Justia) indica a ideia de justum (justo).

    Quanto s origens do vocbulo direito, cabe ainda meno palavra grega dik, que significa indicar. No h, entretanto, nas lnguas modernas, palavras vinculadas ao dik grego. Esse fato confirma a supremacia do direito romano sobre o direito moderno, ao lado da influncia, quase nula, da cultura grega, nesse particular. Em outros setores, como na filosofia, nas artes e nas cincias especulativas, foi profunda a influncia da cultura he- lnica. Mas, no campo do direito, quase nada encontramos que nos ligue Grcia. A influncia decisiva nesse campo foi dc Roma. O gnio prtico dos romanos contrasta com a sabedoria terica dos gregos. No campo do pensamento puro os gregos foram notveis. Pode-se dizer que no houve em Roma filsofo que merea ser posto ao lado de Scrates, Plato ou Aristteles. Mas, do ponto de vista prtico - e o direito se situa neste campo -o s romanos foram insuperveis. O monumento jurdico que eles deixaram humanidade, o direito romano, comunicou-se at ns c ainda influi poderosamente no direito contemporneo.K

    Dessa forma, podemos concluir que a definio nominal de direito aquilo que conforme a regra. Assim, direito passou a ser sinnimo dc regra, de norma obrigatria.

    *' A C Q U A V IY A , M arcus Cludio. N o ta s in tr o d u t r ia s a o e s tu d o d o d ir e ito . 2~ ed ., So

    Paulo: cone, 1990, p. 43.M O N K ) R ( ), Andr Tranco. I n t r o d u o c i c n c i a d o d ir e i to . 2 3 - e d ., So Paulo: Revis

    ta d os Tribunais, 1995 , p. 32-33.

  • Estabelecer uma definio real do termo direito torna-se por demais difcil, na medida em que esse vocbulo apresenta vrias realidades, sendo praticamente impossvel estabelecer uma nica definio que corresponda a essa diversidade.

    A palavra direito apresenta, do ponto de vista jurdico, cinco acepes fundamentais, que correspondem a cada realidade distinta: norma, faculdade, cincia, justia e fato social. Luiz Antonio Rizzatto Nunes conseguiu com muita propriedade resumir o que o direito, conforme elencamos, ao ditar que sob o aspecto etimolgico possvel ligar o termo direito, dentre outros, a reto (do vocbulo cm latim rectum), a mandar, ordenar (do latim jus, ligado na origem jussum), ou ao termo indicar (do grego dik). Observando o Direito luz da realidade dos estudos jurdicos contemporneos, pode-se vislumbrar que o termo direito comporta pelo menos as seguintes concepes: a de cincia, correspondente ao conjunto de regras prprias utilizadas pela Cincia do Direito; a de norma jurdica, como a Constituio e as demais leis e decretos, portarias etc.; a de poder ou prerrogativa, quando se diz que algum tem a faculdade, o poder de exercer um direito; a de fato social, quando se verifica a existncia de regras vivas existentes no meio social; a de Justia, que surge quando se percebe que certa situao dc direito porque justa.1

    Segundo o nosso entendimento, o direito se exterioriza em trs aspectos: dogmtico, filosfico e sociolgico. Assim, para compreender a realidade jurdica dividimos o nosso estudo em trs partes: 1. dogmtica do direito, 2. sociologia do direito e 3. filosofia do direito.

    A dogmtica do direito estuda a norma jurdica. Esse objeto investigado sob o prisma da norma abstrata (norma) e o poder de invocar a regra (faculdade). Nesse sentido, a dogmtica do direito dividida em dois captulos: teoria da norma jurdica e teoria dos direitos subjetivos. O primeiro captulo estuda a norma jurdica e sua aplicao e a segunda parte se preocupa com o direito subjetivo.

    A sociologia do direito investiga o direito como fato social. No estudo da sociologia, distinguimos diversas espcies de fenmenos sociais, como,

    NUNKS, Luiz Antonio Riz/atto, Manual de introduo ao estudo do direito SoPaulo: Saraiva, 1996, p. 35.

    30

  • por exemplo, os fatos religiosos, econmicos, culturais e, entre eles, o direito O direito um setor da vida social, devendo ser estudado sociologicam ente. dentro dessa perspectiva que se situa a sociologia do direito. Nesse prisma o direito encarado como o conjunto das condies de existncia e desenvolvimento da sociedade coativamente assegurados. O direito como fato social verifica-se por meio das regras que se encontram no seio da sociedade.

    A filosofia do direito investiga os princpios fundamentais e a natureza cientfica do direito. Para atingir esse objetivo dividimos o estudo em dois captulos: epistemologia jurdica e axiologia jurdica. A epistemologia jurdica tem por objeto a cincia do direito, direito um setor do conhecimento humano. O direito na acepo de cincia a exposio sistematizada do fenmeno jurdico. A cincia do direito na prtica o conjunto sistematizado das regras c dos princpios jurdicos. A cincia do direito investiga e sistematiza o fenmeno jurdico, constituindo a prpria cicncia. A axiologia jurdica estuda os valores do direito, em especial a justia. O direito empregado no sentido do justo objetivo.

    A teoria do direito surge da sistematizao do estado atual do conhecimento jurdico.

    Em suma:

    C o n h e c im e n t o da

    C incia do D ireito

    D ogm tica do Direito

    Sociologia do D ireito

    Filosofia do Direito

    Teoria da N orm a Jurdica

    leoria dos Direitos Subjetivos

    A Sociedade e o D ireito

    O Direito co m o Fato Social (Sociologia

    Jurdica)

    Epistem ologia Jurdica

    Axiologia Jurdica

    31

  • II DOGMTICA DO DIREITO

    r

  • D o g m t i c a d o D i r e i t oU v.) v i M A I 1 A L) v ) I / I K L " . ! I w

    1 llTRODUflO DOGTITICH DO DIREITO

    A dogmtica, do grego dokin, significa ensinar, doutrinar, designando em seu sentido cientfico uma funo diretiva combinada com uma funo informativa, ao acentuar o aspecto resposta de uma investigao. Assim, a dogmtica jurdica enquanto cicncia apresenta uma faceta diretiva (norma) e outra investigativa (cincia).

    A Dogmtica Jurdica aquela parte da C incia do Direito que estuda o direito enquanto norma. No h qualquer questionamento sobre justia ou aspectos polticos-sociais do direito: o que importa o conjunto de normas posto. Estudam-se, assim, os elementos componentes deste conjunto c o funcionamento do todo. Trata-se de terreno altamente tcnico. 1

    O objeto de estudo da Dogmtica do Direito a norma jurdica. Logo, esse estudo cientfico verificado pela sistematizao do fenmeno normativo. A norma jurdica a prpria essncia da Dogmtica Jurdica, parte da Cincia do Direito que trata da sua sistematizao.2

    A palavra norma vem do latim norma (esquadro, rgua), e revela, no campo da conduta humana, a diretriz de 11111 comportamento socialmente estabelecido. A norma jurdica nada mais do que o preceito de direito estabelecido pela sociedade e que num dado momento da dinmica social transforma-se em conduta obrigatria. A conduta social estabelecida como

    1 M ARQl IMS, Kduardo Lorenzetti. In t r o d u o a o e s tu d o d o d ir e ito . So Paulo: IT r, 1999 ,

    p. 7 6 .

    M A C A U ll .S, Rui Ribeiro dc. In t r o d u o a o e s tu d o d o d ir e ito . So Paulo Juarez dc

    Oliveira, 2 0 0 1 , p. 95 .

  • obrigatria erigida categoria de norma jurdica, a lei. A norma jurdica (praeceptum juris) o preceito de direito transformado em lei, e que comumente denominamos de direito. A norma c comando (praeceptum) e no um conselho (consilium).

    O direito 1 1 0 sentido dogmtico pode ser vislumbrado em dois sentidos fundamentais: norma e faculdade.

    1.1 Direito Poema

    O direito norma significa a lei, a regra social obrigatria. Vrios autores o denominam como o aspecto primordial do direito, em oposio ao direito subjetivo. Assim, o direito norma a regra social obrigatria* ou a regra social obrigatria garantida pelo Estado.

    O direito 11a acepo de norma apresenta, ainda, significados e realidades diversas, quando se refere:

    1. ao direito estatal e ao direito no estatal;

    2. ao direito positivo e ao direito natural;

    3. ordem 0 1 1 ao sistema jurdico (direito objetivo, direito positivo).

    Alguns autores dividem o direito norma em direito objetivo e subjetivo. Entretanto, conforme verificamos, o direito subjetivo diz respeito ao direito faculdade.

    Preliminarmente, podemos dividir o direito norma em direito estatal e direito no estatal, tambm chamado de direito grupai 0 1 1 direito social. O direito estatal confunde-se com a ideia de direito positivo, que se contrape ao direito natural. Cabe examinarmos, neste tpico, o que seja direito estatal e direito no estatal, direito positivo e direito natural e o sistema jurdico, no qual esto inseridos o direito objetivo e o direito positivo e, ainda, segundo o nosso entendimento do direito natural.

    1.1.1 Direito Estata l e Direito No Estatal

    Entende-se por direito estatal as regras jurdicas emanadas do Estado,

    B E V I L Q U A , C lvis. T e o r ia g e ra l d o d ir e i t o c iv i l . 4 a cd ., Braslia: M inistrio da Justia,

    1972, p. 10.

    36

  • com a finalidade dc reger a vida social (Constituio, Cdigo Penal e Cdigo Civil). Mas, ao lado do direito estatal, caminha o direito no estatal, que so as normas obrigatrias elaboradas por diferentes grupos sociais particulares institucionalizados e destinadas a reger a vida interna corporis desses grupos (Direito Universitrio, Direito Religioso e Direito Esportivo). O direito estatal dirigido a toda a coletividade, ao passo que o direito no estatal dirigido aos membros de determinado grupo social particular institucionalizado.

    1.1.2 Direito Positivo e Direito Natural

    Toda a tradio do pensamento jurdico dominado pela distino entre o direito positivo e o direito natural. Das referidas locues surgem duas principais maneiras dc encarar o mundo jurdico: o positivismo e o naturalismo jurdico. Em linhas gerais, o jusnaturalismo ou naturalismo jurdico considera o direito natural como superior ao direito positivo. O direito natural prevalece sobre o direito positivo sempre que entre ambos ocorrcr um conflito. Para o positivismo jurdico no existe outro direito seno o positivo. O positivismo jurdico, ao excluir o direito natural, procura reconhecer o direito positivo como o nico direito vigente, limitando o estudo cientfico-jurdico ao estudo das legislaes positivas.

    A dicotomia entre direito positivo e natural pode ser tida como antiga. Para alguns, na acepo do direito romano, o direito natural (jus naturale) era o direito comum a todos os homens e animais, em oposio ao jus gentium, que era o direito comum a todos os homens. Em Roma o direito natural era aquilo que a natureza ensina aos seres. Ulpiano afirmou que o direito natural era aquilo que a natureza ensinava aos homens e aos animais (ius naturale est quod natura om nia an im alia docuit) e o direito das gentes, aquele comum a todos os povos (ius gentium est quo gentes hum anae utun- tur). No latim da poca romana verifica-se o termo positivus empregado em sentido anlogo de direito positivo. Na verdade a doutrina aponta a trilogia existente em Roma: jus naturale (direito natural), jus gentium (direito das gentes) e jus civile (direito do cidado). Nessa esteira, o direito natural correspondia ao jus gentium (direito comum a todos os homens) em contraposio ao jus civile (direito dos cidados romanos), correspondente ao

    37

  • nosso conceito de direito positivo.4 Neste sentido, o Digesto de Justiniano fazia referncia ao direito natural {ius naturale), ao direito das gentes (ius gentium) c ao direito civil (ius civile).'

    O jus gentium e os jus civile correspondem nossa distino entre direito natural e direito positivo, visto t|iie o primeiro se refere natureza (naturalis ratio) e o segundo, s estatuies do populus. Das distines ora apresentadas, temos que so dois os critrios para distinguir o direito positivo (jus civile) do direito natural (jus gentium): a) o primeiro limita-se a um determinado povo, ao passo que o segundo no tem limites; b) o primeiro posto pelo povo (isto , por uma entidade social criada pelos homens), enquanto o segundo posto pela naturalis ratio".6

    Km Roma, o direito positivo era o direito civil. () direito que cada povo estabeleeia para si chamava-se direito civil, porque o direito da cidade. Km contraposio, o direito das gentes {jus gentium) c o direito de todas as naes.

    O 1.1.1.3 Ius naturale est. quod natura omnia animalia docuit: nam ius istud non humani generis proprium, sed omnium animalium, quae in terra, quae in mari nascuntur, avium quoque commune est. Hitic descendit maris atque feminea coniunctio, quam nos matrimonium appellamus, hinc liheromm procreatio, hinc educatio: videmus etenim cetera quoque animalia. feras etiam istius iuris peritia censeri. (O direito natural o que a natureza ensinou a todos os animais. Pois este direito no prprio do gnero humano, mas dc todos os animais que nascem na terra ou no mar, comum tambm das aves. Da deriva a unio do macho e da fmea, a qual denominamos matrimnio; da a procriao dos filhos, da a educao. Percebemos, pois, que tambm os outros animais, mesmo as feras, so guiados pela experincia deste direito.)

    D 1.1.1.4 Ius gentium est, quo gentes humanae utuntur. Quod a naturali recedere facile intellegere lieet. quia illud omnihus animalihus, lioc solis hominibus inter se commune sit. (O direito das gentes aquele do qual os povos humanos sc utilizam. C) que permite facilmente entender que ele se distancia do natural, porque este c o comum a todos os animais e aquele comum somente aos homens entre si.)

    D. 1.1.6 Ius civile est, quod neque in totum a naturali vel gentium recedit nec per omnia ei sen it: itaque cum aliquid addimus vel detrahimus iuri communi, ius propium, id est civile efficimus (O direito civil c o que no sc afasta no todo do direito natural ou do direito das gentes, bem como no serve a este cm todas as coisas. Assim, quando acrescentamos ou subtramos algo do direito comum, tornamo-lo um direito prprio, isto , um direito civil), in Hclcio Macial Frana Madeira, Digesto de Justiniano, liber primus: introduo ao direito romano. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 18-20.

    BOBBIO, Norberto. O positivismo jurdico: lies de filosofia do direito So Paulo: cone, 1995, p. 18.

    38

  • Nas Institutas de Gaio no havia a classificao tricotmica, mas uma dicotomia, em que ao jus civile se contrapunha ao jus naturale, confundido com o j u s gentium. Assim, podemos afirmar cjue para o Direito Romano o direito natural era o jus naturale e o jus gentium, o direito conhecido por todos os povos, em oposio ao jus civile, ou seja, aquele direito posto e imposto pelo Estado.

    Ccero encarava o direito natural como uma norma jurdica, dotada de obrigatoriedade pela natureza, universal, imutvel e eterna (Est quaedam vera lex, naturae congruens, diffusa in omnes, constans, sempiterna).

    No Direito Romano j se verificava uma srie de interditos, que tinha como finalidade tutelar os direitos individuais em face do direito estatal.

    A Lei das Doze Tbuas, como texto escrito, j consagrava a liberdade, a propriedade e a proteo de direitos individuais.

    No mundo grego havia a distino entre aquilo que natural (physis) e aquilo que estabelecido por conveno humana (thsis). Na Grcia houve o desenvolvimento das ideias de um direito natural e de direitos humanos bsicos, como a participao poltica dos cidados (democracia direta de Pricles). J se despontava a existncia de um direito natural no pensamento dos sofistas" e estoicos,8 como, por exemplo, o dramaturgo

    Uma caracterstica marcante do sofisino c o subjetivismo eternizado na proposio cie Protagras: O homem a medida de todas as coisas.

    H BLACKBURN, Simon. Dicionrio Oxford dc filosofia. Rio de Janeiro: Jorge /aliar, 1997, p. 128: (...) o ponto crucial da filosofia estica era uma tica do consolo atravs da identificao com a ordem moral imparcial e inevitvel do universo. K uma tica da serenidade autossuficiente e benevolente, em que a paz do homem sbio o deixa indiferente pobreza, dor e morte, assemelhando-se assim paz espiritual de Deus (...); COMPARATO, Fbio Konder. A afirmao histrica dos direitos humanos. 2d ed. rev. e ampl., So Paulo: Saraiva, 2001, p. 15-16: Muito embora no se trate de um pensamento sistemtico, o estoicismo organizou-se em torno de algumas ideias centrais, como a unidade moral do ser humano e a dignidade do homem, considerado filho de Zeus e possuidor, em conseqncia, de direitos inatos e iguais em todas as partes do mundo, no obstante as inmeras diferenas individuais e grupais. Foi, justamente, para explicar essa unidade substancial do ser humano, distinta da aparncia corporal, ou das atividades que cada qual exerce na sociedade, que os esticos lanaram mo dos conceitos clc liypstasis e de prsopon. O primeiro, correlato de ousa, que na lngua latina traduziu-se porsubstantia, significava o substrato ou suporte individual dc algo"; IA FFR, Celso. A reconstruo

  • Sfocles, que na obra Antgona (441 a.C.) defende a existncia de normas superiores e imutveis, ou seja, a existncia de um direito natural.9 Iler- clito de Efeso encarou a natureza em seu aspecto dinmico, afirmando que todas as leis encontram seu fundamento na lei divina, surgindo uma norma universal, imutvel e eterna.

    Plato vislumbrava a lei natural como fonte de produo da lei positiva. Para Aristteles, se a lei positiva no consagra a justia, deve-se buscar a lei natural e a equidade. Na Retrica, Aristteles estabelece uma distino entre lei particular e lei comum. A primeira aquela inerente a cada povo. A segunda aquela comum a todos, conforme a natureza.

    No judasmo verifica-se a existncia de lei comum a todos, que se estabelecia com as alianas que Deus celebrou com seu povo (Alianas com No, Abrao, Isaque e Jac). No cristianismo surge a ideia de que todos so chamados, no havendo distino entre os gentios, judeus e gregos.1" Dessa feita, 11a cultura judaico-crist se verifica a existncia de uma lei natural.

    dos direitos h u m an os: um d ilogo co m o p en sam en to de Ila n n a h A rendt. So Paulo: Companhia das Letras, 1988. p. 119: Na vertente grega da tradio cabe mencionar o cstoicismo, que 11a poca helenstiea, com o fim da democracia c das cidadcs-estado, atribui ao indivduo que tinha a qualidade dc cidado, para se converter cm sdito das grandes monarquias, lima nova dignidade. Esta dignidade resultou do significado filosfico conferido ao universalismo de Alexandre. O mundo uma nica cidade - cosrno- polis - da qual todos participam como amigos e iguais. A comunidade universal do gnero humano corresponde tambm um direito universal, fundado num patrimnio racional comum, da derivando um dos precedentes da teoria cristo da lex aetewa e da lex natu- ralis, igualmente inspiradora dos direitos humanos.

    l' SFOCLES. A n tgona, trad. Millr Fernandes. 3* ed. Rio dc Janeiro: Paz e Icrra. 1996, p. 22: Tu o compreendeste. A tua lei no a lei dos deuses; apenas o capricho ocasional de um homem. No acredito que tua proclamao tenha tal fora que possa substituir as leis no escritas dos costumes e os estatutos infalveis dos deuses. Porque essas no so leis de hoje, nem de ontem, mas de todos os tempos: ningum sabe quando apareceram. No, eu no iria arriscar o castigo dos deuses para satisfazer o orgulho de um pobre rei. Eu sei que vou morrer, no vou? Mesmo sem teu decreto. E sc morrer antes do tempo, aceito isso como uma vantagem. Quando se vive como eu, em meio a tantas adversidades, a morte prematura grande prmio. Morrer mais cedo no uma amargura, amargura seria deixar abandonado o corpo de um irmo. E sc disseres que ajo como louca eu te respondo que s sou louca na razo de 11111 louco.

    1,1 Pois no h distino entre judeu e grego, uma vez que o mesmo o Senhor de todos, rico para com todos os que o invocam (Rm. 10:12). Dessarte, no pode haver judeu

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  • Na Idade Mdia o direito natural passou a confundir-se, sob a influncia da teologia, com a moral, cuja origem era a Lei Divina. ( ) direito natural era o contido na Lei Mosaica e nos Evangelhos.11 A prpria lei escrita por Deus no corao dos homens. Nessa poca, o direito natural passou a ser considerado superior ao positivo, na medida em que no era mais visto como um simples direito comum, mas como norma fundada 11a vontade divina. Desta viso teolgica do direito natural derivou a tendncia permanente no pensamento jusnaturalista, de considerar o direito natural superior ao direito positivo, em oposio ao positivismo jurdico, que considera que no existe outro direito seno o positivado.

    Santo Agostinho pregava a existncia do direito natural fundado por Deus, imutvel e universal. Esse telogo afirmava a existncia de duas leis:

    1. lex aeterna - lei divina; e

    2. lex temporalis - direito positivo.

    nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vs sois um em Cristo Jesus (Gl. 3:28).

    11 Em vrias passagens bblicas verifica-se a existncia dc uma lei esculpida 11a conscincia c 110 corao dos homens: A boca do justo profere a sabedoria, e a sua lngua fala o que justo. No corao tem ele a lei do seu Deus; os seus passos no vacilaro (Salmo 37:30- 31); Eis aqui estou, no rolo do livro est escrito a meu respeito; agrada-me fazer a tua vontade, Deus meu; dentro em meu corao est a tua lei (Salmo 40:7-8); Porque esta a aliana que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o Senhor. Na mente lhes imprimirei as minhas leis. tambm 110 corao lhas inscreverei; eu serei o seu Deus, e eles sero o meu povo (Jeremias 31:33); Farei com eles aliana eterna segundo a qual no deixarei de lhes fazer o bem; e porei o meu temor 110 seu corao, para que nunca se apartem de mim (Jeremias 32:40); Estes mostram a norma da lei gravada nos seus coraes, testemunhando-llies tambm a conscincia, e os seus pensamentos mutuamente acusando-se ou defendendo-se (Romanos 2:1 5); Porque, no tocante ao homem interior, tenho prazer 11a lei dc Deus (Romanos 7:22); Vs sois a nossa carta, escrita em nossos coraes, conhecida e lida por todos os homens, estando j manifestos como carta dc Cristo, produzida pelo nosso ministrio, escrita no com tinta, mas pelo Esprito do Deus vivente, no em tbuas de pedra, mas em tbuas de carne, isto , nos coraes" (II Corntios 3:2-3); Porque esta a aliana que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz. o Senhor. Nas suas mentes imprimirei as minhas leis, tambm sobre os seus coraes as inscreverei; e eu serei o seu Deus, e eles sero o meu povo (I lebrus 8:10); Esta a aliana que farei com eles, depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei nos seus coraes as minhas leis, c sobre as suas mentes as inscreverei ( I lebreus 10:16).

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  • Segundo Toms de Aquino, em sua Sumiria T heologica , existem trs espcies de leis:

    1. lex aeterna - a lei da razo divina;

    2. lex naturalis - a lei natural; e

    3. lex hum ana - a lei do homem.

    Para John Locke, todos os homens possuem, por natureza, os direitos inerentes, devendo o Estado apenas tutelar tais prerrogativas naturais por intermdio do direito positivo. Dessa forma, podemos distinguir o direito natural do direito positivo, como sendo o primeiro os direitos inatos ao homem e, o segundo, os direitos adquiridos.

    Modernamente, o direito natural pode ser entendido como fundamento ao direito positivo, tais como: dar a cada um o que seu, no lesar ningum, viver honestamente, deve se fazer o bem etc. Nesse sentido, lembramos das expresses honeste vivere (viver honestamente); alterum non laedere (no lesar ningum); suum cuique trihuere (dar a cada um o que seu), que so princpios formulados na Instituta de Justiniano, considerada como a definio romana dc Direito.12

    Segundo nosso entendimento, o direito natural o conjunto mnimo de preceitos dotados de carter universal, imutvel, que surge da natureza humana e que se configura como um dos princpios de legitimidade do direito. Os direitos naturais so inerentes ao indivduo, devem estar em qualquer sociedade e precedem a formao do Estado c do direito positivo.

    Ante as vrias concepes estabelecidas na dicotomia direito positivo e direito natural, podemos estabelecer as principais distines:

    1. O direito natural universal (tem eficcia em qualquer parte). O direito positivo singular ou particular sociedade poltica de que surge (tem eficcia em determinado local).

    Digesto 1.1.10 lustitia est constans et perpetua voluntas ius suum cuique tribuendi. (Justia a vontade constante e perptua de dar a cada 11111 o seu direito.) Digesto 1.1.10.1 luris praecepta sun haec: honeste vivere, alterum no laedere, suum cuique trihuere (Os preceitos de direito so estes: viver honestamente, no lesar ningum, dar a cada 11111 o que seu), in 1 llcio Maciel Frana Madeira, Digesto dc Justiniano, liher primus: uma introduo ao direito romano. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 21.

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  • 2. O direito natural imutvel (no tempo e 1 1 0 espao). O direito positivo mutvel (no tempo e no espao). Cabe aqui anotar que alguns e n te n d e m que o direito natural pode mudar com o tempo.

    3. O direito natural surge da natureza humana, por intermdio da razo, intuio ou da revelao. Por isso, se afirma que o direito natural dado e no estabelecido por normas ou estatutos. O direito positivo surge do Estado.

    Das referidas assertivas, extramos as caractersticas fundamentais do jusnaturalismo:

    1. A origem dos direitos do homem no o direito positivo, mas uma ordem jurdica superior c suprema, denominada direito natural.

    2. Os direitos naturais so a expresso da natureza humana presente em todos os membros da famlia humana (comum e universal); no uma concesso graciosa do direito positivo.

    3. O direito natural existe independentemente de ser reconhecido 011 respeitado pelo direito positivo.1

    O direito positivo o conjunto de normas estatais em vigor em determinado pas numa determinada poca. Representa o regime da vida social corrente. E o direito posto, imposto, positivado pelo Estado. O direito natural o ordenamento ideal correspondente a uma justia superior e suprema. E o conjunto de princpios preexistentes e dominantes. O adjetivo natural, aplicado a 11111 conjunto de normas, j evidencia o sentido da expresso, qual seja, o de preceitos de convivncia criados pela prpria Natureza e que, portanto, precederiam a lei escrita ou o direito positivo, normas postas, impostas pelo Estado (jus positum ).14 O direito natural constitudo pelos princpios que servem de fundamento ao direito positivo. So os preceitos de convivncia criados pela prpria natureza e que, portanto, precedem o direito positivo. Na histria verifica-sc claramente que os sistemas jurdicos que no foram embasados 1 1 0 direito natural trouxeram conseqncias desastrosas. O reconhecimento do direito natural no im-

    n LOPKS, Ana Maria D vila. O s direitos fund am en tais c o m o lim ites ao p od er d e legislar. Porto Alegre: Srgio A. f abris, Kditor, 2001, p. 67-69.

    14 ACQUAVIVA, Marcus Cludio. N otas in trodutrias ao estu do tio direito. 2- ed. So Paulo: cone, 1990, p. 45.

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  • plica a excluso de outros fatores e valores sociais que influenciam a realidade jurdica, que verificaremos no estudo da sociologia.

    1.1 .3 Ordem Jurdico

    Entende-se por Ordem jurdica o conjunto de todas as normas em vigor no Estado, completadas pelas tcnicas de interpretao e integrao do direito. A ordem jurdica pode ser definida como o conjunto harmnico de normas jurdicas vigentes em dado momento histrico, numa sociedade determinada. Podemos afirmar que, nesse ponto, confundimos ordem jurdica com sistema jurdico, trazendo ao conceito no apenas as normas legislativas estatais, mas tambm o direito no estatal, bem como as normas consuetudinrias, a jurisprudncia, 0 1 1 seja, os princpios gerais do direito, vigentes em determinado momento histrico, como, por exemplo, Ordem Jurdica da Roma Antiga, Sistema Jurdico Norte-Americano.

    O vocbulo ordem, do latim ordine, apresenta radical or, designando diretriz, rumo a seguir. Ordem pode ser conceituada como a unidade na multiplicidade 0 1 1 a conveniente disposio de elementos para realizao de um fim. Na ordem jurdica verificamos uma estrutura escalonada de normas que formam uma unidade. As normas formam 11111 sistema que se reduz a uma unidade. Nessa esteira, a definio de Paulo Nadcr, Ordem Jurdica expresso que coloca em destaque uma das qualidades essenciais do Direito Positivo, que a de agrupar normas que se ajustam entre si e formam um todo harmnico e coerente de preceitos.15

    O nosso sistema jurdico hierarquizado, verificando-se normas superiores e inferiores. As normas de hierarquia inferior no podem ampliar os termos da norma superior. As normas jurdicas se encadeiam dando origem a 11111 complexo sistema normativo. Este sistema escalonado, ou seja, as normas jurdicas apresentam-se hierarquicamente dentro do sistema jurdico 0 1 1 da ordem jurdica. Forma-se uma pirmide jurdica, em que na base esto as normas contratuais, declaraes unilaterais de vontade e outros documentos particulares at a Constituio Federal que se encontra no

    NADER, Paulo. Introduo ao estudo do direito. 22d ed. rev. e atual.. Rio de Janeiro:Forense, 2002, p. 78.

    44

  • pice. A validade de cada norma verificada pela compatibilidade com o preceito superior hierarquicamente.

    Nesse sentido a doutrina dc Hans Kelsen, que construiu a ideia de que no pode haver conflito entre a norma de escalo superior e uma norma de escalo inferior, pois esta possui seu fundamento de validade na norma superior. Assim, se a norma hierarquicamente inferior valida, pressupe-se que se encontra em harmonia com norma superior.16

    Celso Bastos, sobre a matria, diz que aquelas normas que fundam outras normas ganham uma posio de superioridade, de preeminncia, resultando no fato de as normas subordinadas, as que delas tiram seu fundamento, no as poderem contrariar: as normas inferiores tm que estar em consonncia com as superiores. Se tal no ocorre, elas deixam de possuir validade em face do ordenamento jurdico.1

    Cabe anotar que o conjunto uniforme dc regras e princpios jurdicos, com a finalidade de reger determinada matria, forma um instituto jurdico. O instituto jurdico o estudo sistemtico de parte do ordenamento jurdico, que devido sua importncia no meio social enfocado pelos estudiosos e operadores do direito. Ex.: Unio Estvel, Propriedade e Direitos da Personalidade. Paulo Nader anota que o Instituto Jurdico a reunio de normas jurdicas afins, que rege um tipo de relao social ou interesse e que se identifica pelo fim que procura realizar. E uma parte da ordem jurdica. Diversos institutos afins formam um ramo, e o conjunto destes, a ordem jurdica.18

    Dentro do sistema jurdico vislumbramos a existncia do direito objetivo e do direito positivo. O direito objetivo o conjunto de todas as normas em vigor no Estado. Abrange as normas de direito estatal e no estatal. O direito positivo o conjunto das normas em vigor e emanadas

    16 KELSEN, Hans. leoria pura do direito: introduo problemtica cientfica do direito. Trad. Josc C rctclla Jr., Agnes C retella. 3* ed. rcv. da traduo. S o Paulo: Revistados Tribunais, 2003.

    1 BASTOS, C elso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 19a ed. atu al., So Paulo: Saraiva. 1998, p. 385.

    18 NADER, Paulo. Introduo ao estudo do direito. 22* ed. rcv. e atual.. Rio dc Janeiro:Forense, 2002, p. 82.

    45

  • pelo Estado. O direito positivo o direito posto, imposto, positivo. O direi

    to positivo o direito imposto pelo Estado, podendo ser promulgado (legis

    lao) ou declarado (precedente judicial, direito anglo-americano). E o

    direito institucionalizado pelo Estado por meio de sua chancela. Paulo

    Dourado de Gusmo ensina que o Direito Positivo o direito histrico e

    objetivamente estabelecido, efetivamente observado ou, ento, passvel de ser imposto coercitivmente.19

    Jos Geraldo Brito Filomeno ensina que o ordenamento jurdico

    no deve ser confundido com uma s norma, como, por exemplo, a Cons

    tituio de um determinado Estado, mas sim o conjunto de normas por ele

    ditadas e de variedade complexa e abrangente. O direito positivo aquele

    que revelado, posto, pelo Estado, por intermdio dc seus rgos compe

    tentes. Direito objetivo, a seu turno, vem a scr o conjunto de todas as normas

    constitutivas e eomportamentais em geral, quer oriundas do Estado, quer

    das sociedades comuns 0 1 1 contigentes.20

    Podemos estabelecer o seguinte quadro:

    Ordemou

    SistemaJurdico

    Direito Objetivo = Direito Estatal + Direito No Kstatal

    Direito Positivo = Direito Kstatal

    12 Direito Faculdade

    O direito faculdade nada mais do que o direito subjetivo. O vocbulo direito com frequncia empregado para designar o poder de uma

    '' GUSMO, Paulo Dourado de. In tro d u o ao estudo do direito . 32a ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 51.

    FII.OMKNO. Jos ('.eraIdo Brito. M anual de teoria geral do estad o c cin cia poltica.2a ed., So Paulo: Forense Universitria, 1997, p. 80-81.

  • pessoa, individual ou coletiva, em relao a determinado objeto. E, uma prerrogativa 0 1 1 faculdade de agir. F, a facultas agendi, em oposio ao di- reito-lei 0 11 norma, que a norma agendi. Assim, o direito faculdade a prerrogativa concedida pela lei. No dizer dc Goffredo Telles Junior, a norma autorizante, 0 1 1 seja, a autorizao concedida pela norma para que o sujeito possa agir: Os direitos subjetivos se definem: permisses dadas por meio de normas jurdicas. So autorizaes, fundadas no direito objetivo, para uso das faculdades humanas. O que caracteriza e distingue , precisamente, o meio pelo qual as permisses so dadas. Por serem dadas por meio de normas jurdicas, essas permisses so permisses jurdicas. Logo, os direitos subjetivos podem tambm ser definidos com estas precisas palavras: permisses jurdicas. (...) Em suma, uma permisso s jurdica quando ela dada por meio de norma autorizante. A norma autorizante o instrumento pelo qual so outorgadas as autorizaes constitutivas dos direitos subjetivos. :|

    1.2.1 A Relao entre Direito Objetivo e Direito Subjetivo

    O direito objetivo a norma jurdica (norma agendi). O direito subjetivo a faculdade do titular da norma. F o prprio direito faculdade [facultas agendi). O direito subjetivo o reconhecimento pelo direito objetivo de um interesse, seja ele qual for. O direito subjetivo a faculdade, a prerrogativa concedida pelo direito objetivo. A expresso direito subjetivo se explica e se justifica, porque o direito nessa acepo c realmente 11111 poder do sujeito. E uma faculdade reconhecida ao sujeito 011 titular do direito. L a possibilidade de agir. O art. 7- do Cdigo de Processo Civil reza que Toda pessoa que se acha no exerccio dos seus direitos tem capacidade para estar em juzo. Esse 11111 exemplo de direito subjetivo, 0 11 seja, a faculdade que o Cdigo de Processo Civil confere a algum para fazer valer 11111 direito de que titular.

    O direito objetivo a regra. O direito subjetivo a transfuso chi regra abstrata no direito concreto de cada pessoa.

    I Kl-I,KS jl \ I ( )R , Goffredo. In iciao 11:1 cin cia d direito . So Paulo: Saraiva, 2001, p. 255 e 268.

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  • 1.3 Objeto de Estudo da Dogmtica do Direito

    O objeto de estudo da dogmtica do direito, conforme afirmamos, a norma jurdica. Esta pode ser vislumbrada de duas formas: norma c faculdade. Assim, a investigao dogmtica pode ser dividida em dois captulos: Teoria da Norma Jurdica e Teoria dos Direitos Subjetivos.

    Na leoria da Norma Jurdica a investigao recai sobre a norma abstrata e consequentemente sua interpretao c aplicao. Na Teoria dos Direitos Subjetivos a preocupao encontra-se nos direitos subjetivos.

    2 TEORIfl Dfl nORTlfl JURDICR

    A Teoria da Norma Jurdica preocupa-se precipuamente com a norma jurdica, sua interpretao e aplicao. A investigao parte do preceito abstrato que o direito objetivo. O direito se forma e se manifesta na vida social, sendo certo que existem dois momentos fundamentais na gnese do direito: o de sua formao e o de sua manifestao.

    A j verificamos o primeiro ponto de contato com a Sociologia G entica do Direito, pois o direito nasce da sociedade, sendo resultado de um complexo dc fatores e valores sociais. Conforme assevera Andr Franco Montoro, o direito emana da sociedade sob mltiplos aspectos: 1. como resultado do poder social; 2. como reflexo dos objetivos, valores e necessidades sociais; 3. como manifestao ou efeito de fatores sociais: histricos, geogrficos, tcnicos, econmicos, culturais, psicolgicos, morais e religiosos etc..22

    Dessa forma, podemos concluir que na formao do contedo das normas concorre todo um conjunto de fatores e valores sociais. No que tange manifestao do direito, o mesmo surge na vida social atravs de certos meios ou formas de manifestao ou expresso: a legislao, o costume jurdico, a jurisprudncia. A partir dessa premissa, o ponto de partida do estudo da Teoria da Norma Jurdica o que a doutrina denomina Fontes do Direito.

    MONTORO, Andr 1'ranco In tro d u o cin cia do direito. 23d ed., So Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 581.

    48

  • 3 FORTES DO DIREITO

    3.1 Conceito

    A palavra fonte deriva do latim fons, fontins, que significa nascente, designando tudo o que origina, produz algo. A expresso fontes do direito trata-se de uma metfora, para designar a prpria gnese do direito, pois em sentido prprio fonte a nascente de que brota uma corrente de gua. Assim, a expresso fontes do direito denomina as prprias origens, causas do direito positivo. Maria Helena Diniz anota que fonte jurdica seria a origem primria do direito, confundindo-se com o problema da gnese do direito. Trata-se da fonte real ou material do direito, ou seja, dos fatores reais que condicionaram o aparecimento de norma jurdica.r

    Segundo a definio de Jos Cretella Jnior as fontes do direito so os diversos modos de formao do direito, significando toda a espcie de documento ou monumento que serve para revelar o direito.24 Nesse sentido, fonte do direito todo o modo de formao do direito, todo o documento, monumento, pessoa, rgo ou fato donde provm a norma jurdica.

    Em termos tenico-jurdicos so fontes do direito aqueles fatos ou aqueles atos aos quais um determinado ordenamento jurdico atribui a competncia ou a capacidade de produzir normas jurdicas.2

    3.2 Teoria das Fontes do Direito

    O estudo da Dogmtica do Direito est intimamente ligado s fontes do direito, na medida em que a validade das normas jurdicas encontra-se aliada ao problema das fontes do direito. Assim, uma norma jurdica tida

    D IN IZ, M aria H elena. Compndio de introduo cincia do direito. 8a ed. atual., So Paulo: Saraiva, 1995, p. 255.

    C R E IE L L A JR., Jos. Primeiras lies dc direito. Rio d c Janeiro: Forense, 1997 , p.132.

    BOBBIO, N orberto. ( ) positivismo jurdico: lies de filosofia do direito. So Paulo: cone, 1995, p. 161.

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  • Icomo vlida quando surge de fatos ou atos competentes ou capazes de produzir normas jurdicas, segundo o sistema jurdico. A validade e a existncia da norma jurdica dependem do reconhecimento da fonte pelo sistema jurdico. ( ) fundamento da norma jurdica encontra-se na fonte de que ela promana.

    Norberto Bobbio ensina que os ordenamentos jurdicos que atingiram certa complexidade e certa maturidade, como os modernos, estabelecem eles mesmos quais so as fontes do direito, o que significa que estabelecem os critrios de validade das prprias normas.26 Os citados sistemas jurdicos no contm apenas normas que regulam o comportamento dos membros da sociedade, mas tambm normas que regulam a produo jurdica. A doutrina jurdica distingue essas duas categorias de normas, qualificando-as respectivamente como regras de comportamento e como regras de estrutura ou de organizao.

    O positivismo jurdico reduz o direito a um conjunto de normas emanadas do Estado. Dessa forma, o Estado seria a nica fonte do direito, vez que as fontes da norma jurdica so unicamente aquelas elaboradas e formalizadas pelos rgos do Poder Pblico. Nessa concepo, o problema das fontes do direito pode ser simplificado, afirmando, dogmaticamente, que o Estado a nica fonte do direito.

    Parte da doutrina juspositivista baseada no princpio da prevalncia dc uma determinada fonte do direito, ou seja, aquela que emana diretamente do Estado (lei) sobre todas as outras. Para que seja verificada a referida possibilidade, urge a necessidade de duas condies: 1. sistema jurdico complexo; e 2. sistema jurdico hierarquicamente estruturado.

    O sistema jurdico simples aquele que possui uma nica fonte de produo do direito. O sistema jurdico complexo aquele que possui vrias fontes de produo do direito. Ainda, o sistema jurdico hierarquicamente estruturado, na medida em que encontramos fontes que esto dispostas hierarquicamente subordinadas umas s outras.

    A doutrina juspositivista ao estudar as fontes do direito vislumbra a existncia de um sistema jurdico complexo c hierarquizado, entendendo

    BOBBIO, N orberto. O positivismo jurdico: lies dc filosofia do direito. So Paulo: co n e , 1995 , p. 162.

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  • que a fonte que se encontra no plano hierrquico mais alto a lei, pois esta a manifestao direta do poder soberano do Estado e que os outros fatos ou atos produtores de normas so apenas fontes subordinadas.

    Para o positivismo, as fontes subordinadas so fontes de conhecimento jurdico e as hierarquicamente superiores so fontes de qualificao jurdica. Assim, parte do positivismo jurdico admite uma pluralidade de fontes, entretanto, fundamentam essa assertiva, ponderando pela existncia de uma pluralidade de fontes de conhecimento, sustentando a existncia de uma nica fonte de qualificao e identifica esta ltima com aquela que emana do Estado (lei).

    Em que pese o esforo do positivismo jurdico, no h como negar a existncia da pluralidade de fontes 1 1 0 sistema jurdico, no havendo como reduzir sua importncia no mundo jurdico.

    Assim, a importncia do problema das fontes do direito uma realidade solar, vez que constitui o ponto de estudo da filosofia e da sociologia do direito, e constitui objeto crucial de toda reflexo jurdica, em especial0 estudo da dogmtica do direito.

    3.3 Espcies de Fontes do Direito

    Segundo Marcus Cludio Acquaviva, a doutrina tradicional enumera trs espcies de fontes do direito: 1. fontes materiais; 2. fontes histricas; e3. fontes formais.2

    As fontes materiais so todos os fatores sociais representados pelas necessidades polticas, econmicas e culturais, bem assim fatores naturais, como o clima e o relevo. Constituem a matria-prima da elaborao do direito.

    As fontes histricas so todos os documentos jurdicos e colees legislativas do passado que, devido sua importncia e sabedoria, continuam a influenciar as legislaes do presente, como, por exemplo, a I -ei das Doze1 buas, o Cdigo de I lamurbi.

    ACQUAVIVA, Marcns Cludio. Notas introdutrias ao estudo do direito. 2- ed., SoPaulo: cone, 1990, p. 51-54.

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  • As fontes formais so a lei, os costumes, a doutrina e a jurisprudncia.

    Andr Franco Montoro ensina que os autores costumam distinguir as fontes formais, isto , os fatos que do a uma regra o carter dc direito positivo e obrigatrio, das fontes materiais, representadas pelos elementos que concorrem para a formao do contedo ou matria da norma jurdica. Como fontes formais do direito, indicam-se tradicionalmente: a) a legislao; b) o costume jurdico; c) a jurisprudncia; d) a doutrina. Como fontes materiais podem ser mencionadas: a) a realidade social, isto , o conjunto de fatos sociais que contribuem para a formao do contedo do direito; b) os valores que o direito procura realizar, fundamentalmente sintetizados no conceito amplo de justia.28

    Para a maioria dos doutrinadores, duas so as classes de fontes do direito: 1. fontes de produo, materiais ou substanciais; e 2. fontes de conhecimento, cognio ou formais.

    Como fonte de produo, colocada basicamente o Estado. Cabe anotar, entretanto, que o Estado no legisla arbitrariamente ou em causa prpria. E a vida social por meio dos valores e fatores sociais, que impulsionam o ditar do direito. Outra importante fonte de produo do direito so os grupos sociais particulares. So as chamadas fontes de direito no estatal, que surge dos anseios do grupo social particular. As fontes formais revelam o direito, sendo a maneira pela qual a norma se exterioriza e se objetiva.

    A fonte material ou real aponta a origem do direito, configurando sua gnese, da ser fonte de produo, aludindo a fatores ticos, sociolgicos, histricos, polticos etc.. que produzem o direito, condicionam o seu desenvolvimento e determinam o contedo das normas. A fonte formal lhe d forma, fazendo referncia aos modos de manifestao das normas jurdicas, demonstrando quais os meios empregados pelo jurista para conhecer o direito, ao indicar os documentos que revelam o direito vigente, possibilitando sua aplicao a casos concretos, apresentando-se, portanto, como fonte cognio. As fontes formais so os modos de manifestao do direito

    :s MONTORO, Andr Franco, introduo cincia do direito. 23a cd., So Paulo: Revistados Tribunais, 1995, p. 323.

  • m ediante os quais o jurista conhece e descreve o fenmeno jurdico. Logo, quem quiser conhecer o direito, dever buscar a informao desejada nas suas fontes formais, ou seja, na lei, nos arquivos de jurisprudncia, nos tratados doutrinrios. O rgo aplicador, por sua vez, tambm recorre a elas invocando-as como justificao da sua norma individual.29

    Parte da doutrina divide as fontes formais em mediatas e imediatas. C o m o fonte imediata, grande nmero de autores aponta a lei e o costume, pontes mediatas so a doutrina e jurisprudncia. Dessa forma, pode ser estabelecido, com fulcro na doutrina tradicional, o seguinte quadro:

    Na verdade podemos estabelecer a seguinte diviso para as fontes do direito:

    Materiais Estado

    Fontes do DireitoForm ais

    | Estado > Fatores e Valores Sociais

    Materiais j Grupos Sociais Particulares > Anseios do Grupo

    Fontes do Direito

    CostumeFormais

    Mediatas 011 Secundrias

    3.H Rs Fontes flo Estatais

    O direito contemporneo concluiu que o Estado no detm o monoplio da elaborao das normas jurdicas, visto que estas emergem dos vrios

    DINIZ, Maria Helena. Compndio dc introduo cincia do direito. H11 ed. atual., So Paulo: Saraiva, 1995, p. 256-257.

  • grupos sociais particulares contidos 1 1 0 Estado, muito embora limitado em seu mbito.

    Nesse prisma, 1 1 0 estudo das fontes do direito, deve ser ressaltado o poder normativo dos grupos sociais particulares, que nos dias de hoje se configuram como uma realidade solar. Assim, existem vrios ordenamentos jurdicos, sendo certo que cada grupo social particular possui normas prprias. Esses grupos sociais so fontes de normas, pois tm o poder de criar suas prprias ordenaes jurdicas que garantem a consecuo dos fins que pretendem atingir.

    Conforme anota Andr Franco Montoro, ao lado das normas jurdicas elaboradas pelo Estado, existem outras normas efetivamente obrigatrias e exigveis, de origem no estatal. So elaboradas pelos diferentes grupos sociais e destinadas a reger a vida interna desses grupos. Fsses ordenamentos jurdicos, elaborados por diferentes grupos sociais c no pelo Estado, constituem tambm fontes do direito, embora cm carter subsidirio e, em regra, desde que no colidam com a legislao em vigor.'"

    Nessa esteira de pensamento, salutar o ensinamento de Maria 1 lelena Diniz, ao explicar que vrios so os grupos, mas todos pertencem a uma sociedade global, que a sociedade poltica; mltiplas so as ordenaes jurdicas (direito estatutrio, direito esportivo e direito religioso), mas todas so vistas como partes de uma mesma ordem jurdica. Assim sendo, necessrio que as normas dos agrupamentos sociais ocupem um lugar apropriado 11 0 ordenamento jurdico da sociedade poltica. Uma norma s ter juridicidadade se estiver apoiada na ordenao da sociedade poltica; portanto o Estado desempenha o papel de fator de unidade normativa da nao. De 11111 lado se tem 11111 pluralismo de ordenaes jurdicas e, de outro, a unidade da ordem normativa. '1

    Dessa forma, podemos concluir que os grupos sociais particulares possuem um poder normativo, sendo certo que o Estado no o nico criador c elaborador de normas. Os grupos sociais particulares, como a Igreja, Sindicato, Clubes, Universidades etc., estabelecem ordenamentos jurdicos prprios, desde que coesos com a ordem jurdica do Estado. Como

    MONTORO, Andr Franco. In tro d u o cin cia d o direito. 23- ed., So Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 358.

    M DINIZ. Maria Helena. C o m p n d io de in tro d u o cin cia d o d ireito . S- ed. atual-. So Paulo: Saraiva. 1995, p. 296.

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  • exemplo de ordenamentos jurdicos dos grupos sociais particulares, podemos citar 1 0 direito estatutrio; 2. o direito esportivo; 3. o direito social nas re la es de trabalho; 4. o direito religioso ou eclesistico; e 5. o direito co stu m