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PAULO FREIRE: UM HOMEM SÍNTESE DO SEU TEMPO Por José Ramos Barbosa da Silva – Professor do DME/CE/UFPB.

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Descreve o tempo social e político do Brasil nos anos de 1940 a 1960 e as influências que determinaram o método de alfabetização desenvolvido por Paulo Freire.

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PAULO FREIRE: UM HOMEM SÍNTESE DO SEU TEMPO

Por José Ramos Barbosa da Silva – Professor do DME/CE/UFPB.

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Paulo Freire nasceu no Bairro de Casa Amarela, em Recife, no dia 19 de setembro de 1921. Filho de Edeltrudes Neves Freire e do capitão da Polícia Militar de Pernambuco, Joaquim Temístocles Freire.

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Já morando em Jaboatão, aos 13 anos, Paulo Freire perdeu o pai. Isso mudou a qualidade de sua vida. Sua irmã, Stela, tornou-se professora primária do Estado. Seus dois irmãos, Armando e Temístocles, tiveram que trabalhar para ajudar no sutento da família. Armando tornou-se funcionário da Prefeitura. Temístocles entrou para o Exército.

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Freire começou a estudar desde cedo. Na casa onde nasceu, sua mãe, debaixo das mangueiras, escrevia com gravetos algumas palavras no chão. Assim, aprendeu que ler era lúdico. Em Jaboatão, aprendeu a jogar futebol, a nadar no rio, a cantar, a assoviar. Foi em Jaboatão que Paulo concluiu a escola primária.

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Paulo Freire, a partir dos 16 anos, passou a estudar no Colégio Oswaldo Cruz, onde mais tarde foi professor.Freire reconhece que os tempos vividos nesta escola e as pessoas com quem conviveu foram marcantes para a sua vida.

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Depois dos estudos secundários, Freire, aos 22 anos, ingressa na Faculdade de Direito do Recife. Enquanto estudava, casou-se com a professora primária Elza Maria Costa Oliveira, com quem teve cinco filhos. Foi nesse tempo que se tornou professor de Português do Colégio Oswaldo Cruz, lugar onde estudou na adolescência.

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Em 1947, Freire foi convidado a dirigir o Setor de Educação e Cultura do SESI, órgão da Confederação da Indústria. Foi aí que teve contatos com a educação de adultos trabalhadores. De 1954 a 1957, tornou-se o superintendente do SESI.

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Em 9 de agosto de 1956, o prefeito progressista Pelópidas Silveira convida Freire e mais oito notáveis educadores para constituírem o Conselho consultivo de Educação do Recife. Freire, quatro anos depois, foi designado a assumir a Direção da Divisão de Cultura e Recreação do Departamento de Documentação e Cultura da Prefeitura Municipal do Recife.

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Em 1959, Freire presta concurso e obtém o título de doutor em Filosofia e História da Educação. Com isso tornou-se professor efetivo de Filosofia e História da Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade do Recife.

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Enquanto Freire vivia sua juventude e iniciava sua fase adulta, vários acontecimentos mundiais influenciavam a vida política e social brasileira, afetando a economia, a educação e a cultura. A decisão de cada Estado seguia as decisões nacionais e as decisões nacionais obedeciam às cobranças internacionais. De modo que se vivia numa rede de interligação e dependência política.

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• Ilustrando isto, desde o inicio do século XX, O Brasil começou a sofrer influências de um movimento internacional que se colocava contra o ensino tradicional das escolas.

• Esse movimento pregava a valorização das crianças, a liberdade e a iniciativa dos estudantes, valorizando mais o seu ato de aprender e não o ensino do professor.

• Um movimento inspirado em Jean Jacques Rousseau, que mundialmente recebeu diversas denominações: escola nova, pedagogia ativa, escola do trabalho. Essas escolas disseminavam métodos ativos de aprendizagem. O aluno seria o sujeito de sua própria aprendizagem, ainda que auxiliado pelo trabalho cooperante de um professor.

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No campo cultural, após o final da segunda Guerra Mundial, a Organização das Nações Unidas desencadeou um processo de recomendação aos países do terceiro mundo para investirem na educação dos adultos.Este trabalho visava a formação técnica para comunidades camponesas e também a alfabetização dos adultos.É desta recomendação que os países considerados pobres começaram a idealizar campanhas de alfabetização de massa para a população acima dos 15 anos.

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A década de 1940 trouxe também grandes mudanças políticas para o Brasil.É o tempo da abertura política decretada por Getúlio Vargas que a partir de 1943 permite a atuação do Partido Comunista no Brasil, decorrendo deste a criação dos Comitês Democráticos nos municípios e bairros das grandes cidades.É o tempo do pós-II guerra mundial, onde, depois de 1945, a Guerra Fria atua junto aos governos, recomendando alianças, proibindo a atuação de comunistas no lado ocidental do planeta.É o tempo onde o Brasil tenta também desenvolver sua própria indústria, tempo de desenvolvimento, considerado como tempo desenvolvimentista e nacionalista.

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• Tempo de luta entre correntes contrárias, de emergência de novas ideias pedagógicas, da busca da fórmula brasileira para a educação popular, ligada às artes, à cultura do povo e suas atividades cotidianas.

• Tempo da organização das escolas como Associações da Cultura Popular. Movimento que reunia intelectuais, sindicalistas, religiosos, políticos e povo. Tempo rico de ideias, que vai até o ano de 1964.

• Mas também um tempo próprio ao populismo, que permitia a organização das classes populares, sem reprimir a atuação dos capitalistas na rearrumação dos seus negócios lucrativos.

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Entre 1947 e 1964 surgem, de diferentes segmentos da sociedade, várias propostas para a educação de adultos:

• a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo, criada em 1958, em Leopoldina (RJ), que misturava alfabetização com serviços assistenciais de saúde e puericultura;

• os Serviços de Assistência Rural, de 1955 a 1958, no Rio Grande do Norte; • os Centros Populares de Cultura, que florescem em todo país, de 1961 a 1964; • o Movimento de Educação de Base, de 1960, sob a responsabilidade da CNBB; • a campanha “De pé no chão também se aprende a ler”, no Rio Grande do

Norte; • o Sistema Paulo Freire, através dos Círculos de Cultura e dos Centros de

Cultura, como extensão cultural da Universidade de Recife; • a Campanha de Educação Popular, na Paraíba; • entre outros.

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• Pelos envolvimentos que Paulo Freire começou a ter, ele já era considerado um homem da Esquerda. E como militante de Esquerda, seguiu um dos caminhos políticos existentes à época: o que resgatava a participação popular na construção do próprio país.

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• Esse movimento que trazia o povo a ser coautor do seu destino era também vivenciado por artistas e intelectuais de Esquerda e por uma pequena parte da Igreja Católica, mais tarde batizada de Igreja progressista ou Teologia da Libertação. Freire era católico, ligado a pessoas dessa Igreja de Esquerda.

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Essa aproximação de Freire com comunistas, que queriam um mundo justo e sem classes sociais e com Cristãos que pregavam um mundo justo e sem classes sociais, para que possamos de fato ser cristãos irmãos, permitiu que Freire não diferenciasse a pregação comunista da pregação cristã, tornando-se assim uma pessoa de fé, que conjugava as ideias cristãs com as ideias comunistas.

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• A sua preocupação com a alfabetização, combinada com sua crença política que desejava transformar o mundo, gerou o que mais tarde chamou-se de Método Paulo Freire de Alfabetização. Método que utilizava frases e palavras, caminho pelo qual ele, na infância, fora alfabetizado.

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• O Método Paulo Freire de Alfabetização utilizava-se da palavra que seria desmembrada em sílabas, através do método da silabação.

• Essa palavra deveria ser muito significativa para os educandos, pois enquanto ia-se estudando sua composição de letras e sílabas, ia-se discutindo o lugar daquela palavra na vida das pessoas e acerca do seu significado prático e político.

• Essas palavras, por sediarem uma discussão, eram chamadas de palavras geradoras.

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Aprendiam-se as sílabas das palavras e também as derivações dessas sílabas, chamadas de “família das silabas”. Por exemplo, da palavra LABUTA, separavam-se as sílabas: LA, BU, TA e, a seguir, estudava-se a família do LA: LA, LE, LI, LO LU, LÃO; do BU: BA, BE, BI, BO, BU, BÃO; e do TA: TA, TE, TI, TO, TU, TÃO. Dessas novas sílabas formavam-se novas palavras: LUTA, TATU, BALÃO, BAITOLA, BITOLA, TABU etc.

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• Assim sendo, a alfabetização freireana era política, mas também técnica. Não se alfabetiza alguém se a questão técnica da alfabetização não for bem tratada.

• Só é alfabetizado quem identifica frases, palavras, sílabas e letras. Isso por qualquer método, isso por qualquer caminho pedagógico.

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• As palavras escolhidas como palavras chaves da alfabetização eram discutidas antes do processo da alfabetização começar. Havia uma pesquisa prévia no local onde seria implantada a escola de alfabetização.

• Essa pesquisa se dava de modo tranquilo: passeando-se na feira, nas bodegas, nos locais onde as pessoas ficavam reunidas.

• Ia-se ouvindo as conversas, perguntando-se sobre as preocupações das pessoas, ia-se conhecendo pouco a pouco o universo de mundo das pessoas.

• Isso permitia a escolha das palavras certas, as mais significativas para uma boa conversa. Por isso eram palavras geradoras.

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• A escolha das palavras de acordo com os interesses locais não permitia a criação de uma cartilha. Mas isso não significava dizer que o método Paulo Freire não tivesse direção.

• Havia em combinação com o lado técnico do alfabetizar, uma direção política que permitia dar voz e vez ao aluno nas discussões travadas em sala de aula, tudo em combinação com a palavra chave estudada naquele momento, que tratava da realidade vivida.

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• O método Paulo Freire não era solto, sem direção, nem também baseado no disse-me-disse, a partir da vontade de cada um... Isso é perder o rumo.

• Toda ação da escola freireana era planejada, pois todo ensino persegue objetivos. Cada aula perseguia os objetivos de ensinamento previamente traçados.

• Se era para aprender a ler a palavra LABUTA e dela formar novas palavras, esse objetivo era mantido, mesmo que a participação de todos trouxesse novos elementos de aprendizagem não previstos no planejamento.

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• Esse cuidado com o lado técnico e também político da alfabetização permitiu o sucesso alcançado em Angicos, no Rio Grande do Norte, quando foram alfabetizados 300 cortadores de cana em apenas 40 horas.

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• Ora, se Paulo Freire e sua equipe de trabalho tiveram sucesso nas décadas de 1950 e 1960, por que nós, agora, não podemos ter sucesso no nosso trabalho de alfabetização?

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• Para obtermos sucesso, precisamos planejar o que queremos ensinar durante o curso de alfabetização.

• Depois disso, é necessário planejar aula por aula. No ensino, sem planejamento, quase nada dá certo.

• Mesmo com o planejamento, de quando em quando, precisamos reajustar as ações planejadas. O planejamento é ação prévia, mas é a ação quem vai nos informar sobre os necessários ajustes da ação diária da alfabetização.

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• “Se pela educação não transformaremos o mundo, por ela podemos transformar pessoas. E se podemos transformar pessoas, através destas podemos transformar o mundo”.

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Texto e escolha de imagens: José Ramos Barbosa da Silva.

Obras consultadas:

• PAIVA, Vanilda Pereira. Educação popular e educação de adultos. São Paulo: Loyola, 1983.

• ACO DO BRASIL. História da classe operária no Brasil: idade difícil 1920-1945. 3º caderno. São Paulo: Loyola, 1978.

• GADOTTI, Moacir. Paulo Freire: uma bibliografia. São Paulo: Cortez/Instituto Paulo Freire; Brasília: UNESCO, 1996.

• LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1992.• Dewey, John. Experiência e educação. 2 ed. Petrópolis (RJ):

Vozes, 2011.João Pessoa, Maio de 2013.