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Texto integrante dos Anais do XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP – USP. São Paulo, 08 a 12 de setembro de 2008. Cd-Rom. Paula Botafogo Caricchio Ferreira, O Federalismo luso-americano revisitado: o balanço das autonomias nas Cortes de Lisboa. (FFLCH-USP – pós-graduando, mestrado, orientanda da Profª Drª Márcia Regina Berbel). O artigo compreende o mapeamento do uso do vocábulo “federação” no Diário das Cortes de Lisboa. O objetivo é dialogar com a historiografia da década de 1930 que afirmava a existência de um federalismo arcaico, fruto do mandonismo local para a experiência luso- americana. Na verdade, o artigo mostra que essa perspectiva foi consagrada a partir da vitória política de um discurso de contestação à “federação” como organização viável aos princípios monárquicos. Mas, foi uma vitória posterior. Apesar das nuances, na negação da federação, os exemplos em mente eram o estadunidense e o das repúblicas hispano-americanas. Por sua vez, na defesa, o grande exemplo legitimador era o da Inglaterra, mantenedora de um Império colonial com ampla autonomia de suas colônias. RESUMO AMPLIADO: O artigo compreende o mapeamento do uso do vocábulo “federação” no Diário das Cortes de Lisboa. O objetivo é dialogar com a historiografia da década de 1930 que afirmava a existência de um federalismo arcaico, fruto do mandonismo local para a experiência luso- americana. Não se pode negar o papel de precursores de Holanda e Prado Jr. para conceitos que revolucionaram a historiografia brasileira, porém o que esse estudo se propõe é rever a idéia de federalismo conceitualizada por esses autores. A argumentação das defesas ou contestações à “federação” no início do século XIX se aglutinava em torno da questão central da relação viável ou não dessa organização política com os princípios monárquicos. Apesar das nuances, na negação da federação, os exemplos em mente eram o estadunidense e o das repúblicas hispano- americanas. Esses paradigmas tinham como pano de fundo a relação implícita e necessária entre a organização federativa e os princípios republicanos, incongruentes com a constituição da monarquia constitucional. Por sua vez, a defesa da federação na mesma época tinha como meta principal mostrar que os princípios monárquicos eram conciliados e, mais, melhor combinados, com uma organização federativa. O grande exemplo legitimador nesses casos era o da Inglaterra, mantenedora de um Império colonial com ampla autonomia de suas colônias. A discussão sobre a autonomia nas Cortes de Lisboa forneceu bases para que o vocábulo federação não fosse mais entendido como um signo de uma tamanha autonomia incompatível com a monarquia, mas como uma forma de pacto que administra várias esferas de poderes. O objetivo é atestar que nas Cortes de Lisboa com o projeto dos artigos adicionais da Comissão de

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Texto integrante dos Anais do XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP – USP. São Paulo, 08 a 12 de setembro de 2008. Cd-Rom.

Paula Botafogo Caricchio Ferreira, O Federalismo luso-americano revisitado: o balanço das

autonomias nas Cortes de Lisboa. (FFLCH-USP – pós-graduando, mestrado, orientanda da

Profª Drª Márcia Regina Berbel).

O artigo compreende o mapeamento do uso do vocábulo “federação” no Diário das

Cortes de Lisboa. O objetivo é dialogar com a historiografia da década de 1930 que afirmava a

existência de um federalismo arcaico, fruto do mandonismo local para a experiência luso-

americana. Na verdade, o artigo mostra que essa perspectiva foi consagrada a partir da vitória

política de um discurso de contestação à “federação” como organização viável aos princípios

monárquicos. Mas, foi uma vitória posterior. Apesar das nuances, na negação da federação, os

exemplos em mente eram o estadunidense e o das repúblicas hispano-americanas. Por sua vez,

na defesa, o grande exemplo legitimador era o da Inglaterra, mantenedora de um Império

colonial com ampla autonomia de suas colônias.

RESUMO AMPLIADO:

O artigo compreende o mapeamento do uso do vocábulo “federação” no Diário das

Cortes de Lisboa. O objetivo é dialogar com a historiografia da década de 1930 que afirmava a

existência de um federalismo arcaico, fruto do mandonismo local para a experiência luso-

americana. Não se pode negar o papel de precursores de Holanda e Prado Jr. para conceitos que

revolucionaram a historiografia brasileira, porém o que esse estudo se propõe é rever a idéia de

federalismo conceitualizada por esses autores. A argumentação das defesas ou contestações à

“federação” no início do século XIX se aglutinava em torno da questão central da relação viável

ou não dessa organização política com os princípios monárquicos. Apesar das nuances, na

negação da federação, os exemplos em mente eram o estadunidense e o das repúblicas hispano-

americanas. Esses paradigmas tinham como pano de fundo a relação implícita e necessária entre

a organização federativa e os princípios republicanos, incongruentes com a constituição da

monarquia constitucional. Por sua vez, a defesa da federação na mesma época tinha como meta

principal mostrar que os princípios monárquicos eram conciliados e, mais, melhor combinados,

com uma organização federativa. O grande exemplo legitimador nesses casos era o da

Inglaterra, mantenedora de um Império colonial com ampla autonomia de suas colônias.

A discussão sobre a autonomia nas Cortes de Lisboa forneceu bases para que o vocábulo

federação não fosse mais entendido como um signo de uma tamanha autonomia incompatível

com a monarquia, mas como uma forma de pacto que administra várias esferas de poderes. O

objetivo é atestar que nas Cortes de Lisboa com o projeto dos artigos adicionais da Comissão de

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Texto integrante dos Anais do XIX Encontro Regional de História: Poder, Violência e Exclusão. ANPUH/SP – USP. São Paulo, 08 a 12 de setembro de 2008. Cd-Rom.

negócios do Brasil e a posterior convocação da Assembléia Constituinte do Brasil em junho de

1822 se funda um pacto entre as províncias da América Portuguesa de garantia de autonomia em

prol da Independência do Brasil.

Introdução

No contexto dos Impérios coloniais Atlânticos, o período de 1770 até 1850 corresponde

a uma época revolucionária fundada na contestação ao Antigo Regime e na suplantação das

relações coloniais, a denominada “Era das Revoluções”1. O controle metropolitano dos Impérios

na América se enfraqueceu pela série de convulsões revolucionárias na Europa e no Novo

Mundo. O poder crescente das elites coloniais no enquadramento do Sistema Colonial exigia um

quadro de reformas “modernizadoras”, visto como exigência para a conservação da aliança

política entre o poder imperial e as classes proprietárias das colônias. O desenvolvimento de

instituições e recursos reduziu a dependência colonial para com a metrópole. O vigor do

comércio transatlântico desafiava a manutenção dos monopólios comerciais2. O marco inicial

dessa crise foi a independência das treze colônias, seguida de outros exemplos emancipatórios

na América3.

O movimento português era parte da onda revolucionária e do liberalismo do início do

século XIX. O ideal regenerador estava colocado e inspirou os sinedristas a iniciar o movimento

revolucionário em agosto de 1820. O fundamento dos revolucionários portugueses, à primeira

vista contraditório, era a reafirmação da fidelidade aos reis (espanhol ou português), prática

característica do Antigo Regime, ao mesmo tempo, que ansiavam por um espaço político para a

redefinição de seus direitos. A intenção era conciliar as diversas demandas das inúmeras regiões

do Império português em um espaço ordenador, definido pela nova idéia de soberania da nação.

Este estudo se propõe a compreender na formação do espaço público luso-português a

negociação política desse novo arranjo na América Portuguesa, o qual fundou bases para o

mesmo no Império do Brasil. Mais do que isso, verificar, pelo uso do vocabulário político, como

os atores entendiam sua participação como um movimento revolucionário liberal irrestrito a sua

própria experiência, como algo influenciado por uma práxis parlamentar ocidental.

Na historiografia brasileira, o estudo da independência que presa por um quadro analítico

da chamada “dimensão atlântica” é algo recente. O ponto de partida foi a década de 1930. O

rigor teórico e a formação acadêmica dos estudiosos desse decênio, na maioria em universidades

européias e norte-americanas, forneceram instrumentos suficientes para rever as fontes e

1 HOBSBAWN, Eric. A Era das Revoluções. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1962. 2 BLACKBURN, Robin. Introdução. In: A queda do escravismo colonial: 1776-1848. Rio de Janeiro: Record, 2002. 3 GODECHOT, Jacques. As Revoluções (1770-1799). São Paulo: Livraria Pioneira, 1976, pp. 03-04.

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produzirem novos modelos interpretativos. O contexto sofreu forte influência do período da

Primeira Guerra Mundial. O pensamento brasileiro concentrava-se na investigação e reflexão

sobre a inserção do Brasil na divisão internacional do trabalho, no alcance e nos limites do

processo de industrialização e em outros temas relacionados à formação e difusão da economia

de mercado. O IHGB não tinha mais o monopólio da memória da história nacional como o era

na época da predominância da matriz de Varnhagen4, no início do século. O período foi de

fecundidade notável de ensaios históricos. Os exemplos mais patentes desse novo olhar para

uma crise de todo um Sistema Colonial são os trabalhos de Caio Prado5 e Sérgio Buarque de

Holanda6.

A inserção da Luso-américa em quadros políticos e econômicos mais abrangentes

permite a identificação da especificidade de um federalismo que Prado Jr.7 chama de “à

brasileira”. Tal formulação política legitimava as oligarquias regionais no conflito pela defesa

das demandas autonomistas que se opunham à prerrogativa do centro político do Rio de Janeiro,

consagrado pela transferência da sede da Corte portuguesa. O caráter negativo desse federalismo

residia na sua fundamentação em valores retrógrados quando cotejado com a teorização de

mesmo nome feita nos Estados Unidos. O federalismo das treze colônias teria ampliado o

campo democrático e contribuído com novas idéias para a “evolução” política do mundo

contemporâneo.

Sérgio Buarque de Holanda8 retoma a idéia de Caio Prado sobre um federalismo “à

brasileira” e também reflete sobre a presença da escravidão. O federalismo no Brasil teria raízes

nas tradições de mando localistas formadas já na vida colonial. Por sua vez, a teorização e a

prática liberal se moldavam à Monarquia, às ordens nobiliárquicas, aos privilégios eclesiásticos

e à escravidão. Novamente, a ampliação do quadro analítico propiciou a abordagem da

independência e da formação dos Estados Nacionais em um sistema de relações políticas capaz

de propiciar novas respostas a antigas questões.

Não se pode negar o papel de precursores de Holanda e Prado Jr. para conceitos que

revolucionaram a historiografia brasileira, porém o que esse estudo se propõe é rever a idéia de

federalismo conceitualizada por esses autores. A argumentação das defesas ou contestações à 4 VARNHAGEN, Francisco Adolfo. História da Independência do Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, 1916. 5 PRADO Jr., Caio. Evolução Política do Brasil e Outros Estudos. São Paulo: Brasiliense, 1953 e PRADO Jr., Caio.Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo: Brasiliense, 1957. A diferença de contextos e idéias em relação às duas principais obras do autor é muito bem explorada por Wilma Peres em seu artigo (PERES, Wilma. A Independência na historiografia brasileira. In: JANCSÓ, István (org.). Independência: História e Historiografia. São Paulo: HUCITEC, 2003, pp. 76-81). 6 HOLANDA, Sérgio Buarque de. A herança colonial – sua desagregação. In: (org.). História Geral da Civilização Brasileira. Tomo II: O Brasil Monárquico. Vol. 1: O Processo de Emancipação. São Paulo: Difel, 1962. 7 Op. Cit., Prado Jr., 1953. 8 Op. Cit., Holanda, 1962.

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“federação” no início do século XIX pelos atores políticos se aglutinava em torno da questão

central da relação viável ou não dessa organização política com os princípios monárquicos.

Apesar das nuances, na negação da federação, os exemplos em mente eram o estadunidense e o

das repúblicas hispano-americanas. Esses paradigmas tinham como pano de fundo a relação

implícita e necessária entre a organização federativa e os princípios republicanos, incongruentes

com a constituição da monarquia constitucional. Por sua vez, a defesa da federação na mesma

época tinha como meta principal mostrar que os princípios monárquicos eram conciliados e,

mais, melhor combinados, com uma organização federativa. O grande exemplo legitimador

nesses casos era o da Inglaterra, mantenedora de um Império colonial com ampla autonomia de

suas colônias.

A historiografia do decênio de 1930 parece admitir a relação da federação com a

república como um pressuposto. Nesse ponto, os autores admitem o que era argumento político

dos atores do início do século XIX, como fato historiográfico9. A defesa vitoriosa no debate

político de que a unidade de um grande território apenas era possível com uma monarquia

centralizadora, em contraposição, à federações republicanas possíveis somente em pequenos

territórios, criou uma espécie de modelo ideal, a partir do qual os historiadores compreenderam

o federalismo no Brasil como algo arcaico e fruto do mandonismo local e não como um possível

projeto de nação e Estado. Essa perspectiva não destaca a ampla negociação acerca da

autonomia das “partes” da nação definida no novo pacto em diversos momentos. No mínimo, se

ignora a regulamentação sobre tal ponto e seus desdobramentos manifestados em cartas de

câmaras, artigos em periódicos e prisões10. A discussão sobre a autonomia nas Cortes de Lisboa,

mapeada nesse estudo, forneceu bases para que o vocábulo federação não fosse mais entendido

como um signo de uma tamanha autonomia incompatível com a monarquia, mas como uma

forma de pacto que administra várias esferas de poderes.

9 Vesentini (VESENTINI, Carlos Alberto. A teia do fato: uma proposta de estudo sobre a memória histórica. São Paulo: HUCITEC, 1997.) nos dá uma definição para o “fato” muito pertinente para a reflexão da historiografia. O fato é algo construído em determinado momento histórico e pelos "vencedores" de uma luta política. Nesse sentido, a dominação política também significa a de pensamento. Como “vencedores”, a eles é garantida a escrita da História. O “fato” como parte de um argumento interior às disputas políticas e aos embates ideológicos são deixados de lado, esvaecem de maneira interessada na História dos “vencedores”. Isto é, se estabelece o "fato" de forma que ele pareça a origem de uma luta comum. 10 Andréa Slemian (SLEMIAN, Andréa. Sob o império das leis: constituição e unidade nacional na formação do Brasil (1822-1834). São Paulo: tese de doutorado defendida em 2006, pelo programa de História Social da USP, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.) explora de maneira detalhada esses documentos e eventos. Um caso exemplar é o de Cipriano Barata. Bacharel em Filosofia pela Universidade de Coimbra. Em 1790, começou sua atuação política. Participou da Conjuração Bahiana de 1798 e na Revolução de Pernambuco em 1817. Em 1821, foi eleito deputado pela província da Bahia para os trabalhos constituintes de Lisboa. Em 1823, iniciou a publicação do periódico “Sentinela da Liberdade”, nesse ano se recusou a tomar acento na Assembléia Constituinte instalada no Rio de Janeiro. Foi preso em 1824 pelo envolvimento na Confederação de Pernambuco, libertado apenas em 1830. Um ano depois da volta à Bahia, foi novamente preso, mandado para o Rio de Janeiro e solto somente em 1834. Na prisão mantinha a publicação do Sentinela.

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Essa perspectiva se fundamenta em grande parte no estudo de Miriam Dolhnikoff11. A

autora nos abre novas perspectivas para o debate sobre o federalismo no Brasil, mostrando que a

grande questão não é relativa a oposição entre centralização e federação, mas sim a da

negociação da divisão de competências entre os governos provinciais e o central. A partir desse

pressuposto, ela afirma que é justamente isso que o Ato Adicional institui. Nesse sentido, a

Câmara de deputados será o espaço privilegiado de negociação tanto com o governo central,

como inter-provincial, feito com a representação das políticas das diversas elites provinciais.

Mesmo depois de 1840, centralizou-se apenas o aparato judiciário12. Afinal, na medida em que

as leis provinciais eram julgadas pela Câmara de deputados e não pelo poder judiciário, não se

desapropriou as elites de seus poderes de decisão. A coerção não era feita às elites provinciais,

mas apenas às facções marginalizadas dentro da elite de cada unidade, ou quando os conflitos

transbordavam ao ponto de não conseguirem se resolverem no espaço de negociação

institucional, por exemplo, o caso da farroupilha. Logo, havia o convencimento como

construção do Estado, concomitante com a da nação.

Para a autora, as elites provinciais não eram destituídas de um projeto de pretensões

nacionais, com interesses restritamente econômicos como afirma, por exemplo, José Murilo de

Carvalho13. Pelo contrário, a negociação do pacto constitucional teve que se fazer entre os

diversos projetos, de forma a criar uma aliança que só foi capaz de manter a unidade do Estado

através da divisão de atribuições entre o centro e as províncias. Portanto, ela admite uma

diferença entre a elite econômica e a política, a última imbuída de uma Razão de Estado, porém,

a visão do “todo” não era contraditória com os interesses de autonomia regional ou provincial.

Além disso, Dolhnikoff aponta para uma relação direta entre a construção da idéia da federação

e a experiência política dos deputados americanos acumulada nas Cortes de Lisboa.

A tentativa é através do uso político do vocábulo federalismo e outras palavras atribuídas

ao seu uso, identificar o que os atores contemporâneos aos acontecimentos entendiam por

federalismo. Assim, o enfoque se dá na questão da conciliação das autonomias em um pacto

fundado na soberania da nação. Essa é uma questão principal que permeou todos os debates

parlamentares. Com esse mapeamento se mostrará que essa discussão foi fundamental para a

definição do significado de federalismo no Brasil. O objetivo é atestar que nas Cortes de Lisboa

com o projeto dos artigos adicionais da Comissão de negócios do Brasil e a posterior 11 DOLHNIKOFF, Miriam. O pacto imperial: origens do federalismo no Brasil. São Paulo: Globo, 2005. 12 Uma questão que a autora não resolve por completo são as motivações das revoltas liberais de 1842. Há um consenso na historiografia de que a resposta para tais causas está na restrição da autonomia provincial, porém a autora justamente refuta tal argumentação mostrando que a centralização ou descentralização não era algo que colocava em oposição campos de interesses a ponto da conformação de partidos com programas distintos nesse ponto. 13 CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem. A elite política imperial. Brasília: UNB, 1981.

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convocação da Assembléia Constituinte do Brasil em junho de 1822 se funda um pacto entre as

províncias da América Portuguesa de garantia de autonomia provincial. Esse pacto foi o que

aglutinou os interesses das várias províncias do reino em prol da Independência do Brasil.

Primeira fase: primeiros passos constitucionais

Depois do início da Revolução do Porto em agosto de 1821, a primeira providência para

o início dos trabalhos constituintes era a definição de instruções eleitorais para a eleição dos

deputados. Em 31 de outubro de 1820 foram publicados 38 artigos dessas instruções atribuídos

apenas ao reino de Portugal. Depois de fortes pressões da opinião pública14 em prol da adoção

dos critérios espanhóis definidos na Constituição de Cádiz (1812), em 23 de novembro de 1820

foram publicadas novas instruções que seguiam o método espanhol e inclusive aventava-se a

possibilidade de união das duas monarquias ibéricas. Nesse momento, se deu a primeira vitória

liberal. Os artigos estabeleciam por um lado, a proporcionalidade de representação em relação

ao total de indivíduos que integravam a nação portuguesa em detrimento da divisão tradicional

da sociedade em três ordens e por outro, definia que “a base da representação nacional é a

mesma em ambos os hemisférios”15, isto é, os habitantes de Ultramar foram compreendidos no

processo eleitoral.

Nas definições de Cádiz, as províncias eram as últimas instâncias para a escolha dos

deputados. Assim, outra transformação que as instruções proporcionaram foi a elevação das

tradicionais capitanias do Brasil à condição de unidades provinciais, assim que declarassem a

adesão às Cortes. Como províncias, a elas eram conferidas certo grau de autonomia na escolha

de deputados. Em 1º de janeiro de 1821, os representantes do Pará anunciaram sua adesão, mas

as representações das restantes províncias se mantinham caladas. O pronunciamento do Pará

recebido nas Cortes em 26 de março daquele ano transformava a capitania em província,

reconhecida como governada localmente por uma Junta diretamente subordinada às Cortes de

Lisboa. Neste momento, extinguia-se o sistema baseado na existência de capitães gerais locais

que eram nomeados pelo Rei e significavam a única autoridade nas antigas capitanias até ali:

“Tendo as bases da Constituição Portuguesa estabelecido igual liberdade em todas as partes da Monarquia, feito cessar inteiramente o sistema colonial, e construído todos os domínios ultramarinos em Províncias do mesmo reino, fica sendo por conseqüência incompatível com as sobreditas Bases o Governo absoluto em qualquer das mesmas Províncias. Não podem portanto existir mais as capitanias Gerais, e deve acaba por uma vez o título e atribuições dos antigos Governadores e Capitães Generais, que, como todos sabem, tinham os poderes mais absolutos e ilimitados, de que infelizmente não poucas vezes abusaram”16

14 Op. Cit., Vargues, 1997. 15 Em abril de 1821 enviaram as instruções eleitorais preferencialmente para os habitantes do Brasil. Mas, não foi feito o mesmo com os que residiam nas colônias da África ou da Ásia, mesmo que esses critérios eleitorais fossem atribuídos “aos portugueses de ambos os hemisférios”. 16 Diário das Cortes Constituintes de Lisboa, sessão de 4 de junho de 1821.

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Esta modificação revela um claro anseio por uma adequação dos canais de representação

política às necessidades locais, a tentativa era a de equilibrar a monarquia e a participação do

“povo” nas decisões políticas, o que Rosanvallon chama de construção de “mecanismos da

formação política da vontade geral”17. Essa era uma das tarefas primordiais na construção de um

sistema de monarquia constitucional, já vividos nos primeiros anos da Revolução Francesa e

depois na França em 1814-1815 e da Espanha nos movimentos de Cádiz de 1810 e 1820. Com

isso, a intenção era acelerar o pronunciamento das demais capitanias do Brasil pela adesão as

Cortes Constituintes.

Do dia 26 de janeiro de 1821 quando se iniciaram os trabalhos constituintes em Lisboa

até agosto do mesmo ano, marcada pela chegada no mês julho do rei em Lisboa, podemos

definir uma primeira fase das discussões. O campo liberal se dividia em duas vertentes: os

moderados propunham o envio de tropas para o controle das revoltas e do governo do Rio de

Janeiro e os integracionistas sustentavam a plena integração política constitucional como forma

de governo. É a partir de 20 de agosto que se inicia a utilização do vocábulo “federação”. O

tema do debate é o artigo 29 da Constituição onde se definem os poderes que constituem a

nação.

A proposta base do artigo era formada por quatro poderes: o Legislativo, o Executivo, o

Judicial e o Administrativo. A separação dos poderes respeita a idéia da diferenciação da

natureza de cada um. Assim, o debate se concentra no esclarecimento da qualidade de cada

poder em relação ao equilíbrio entre eles. O ponto em que a utilização de “federação” se faz

revela uma vinculação necessária entre o estudo do Judiciário e da autonomia provincial. O

deputado Castelo Branco depois de defender a autoridade da lei como reguladora dos poderes,

afirma que o Poder Judiciário deve ser um poder separado, independente, por ser um executor da

lei geral aos casos particulares, preservando, com isso, a liberdade e a propriedade do Cidadão.

Entretanto, toda essa argumentação é feita com o fim de mostrar que a Administração não deve

ser um Poder diferenciado, mas sim unido a algum dos outros três poderes, um “arranjamento

político”18.

O deputado Moura toma a palavra e nos revela o que está por trás da questão da

diferenciação do Poder Judiciário. O equilíbrio dos poderes depende da relação entre a

independência do Poder Judiciário e a do Administrativo – já que já haviam concordado que o

poder Legislativo controlaria o Executivo. Com a defesa da independência do Judiciário feita

17 RONSAVALLON, Pierre. La consagración del ciudadano. Historia del sufrágio universal em Francia. Cidade do México: Instituto Mora, 1999. 18 Diário das Cortes Constituintes de Lisboa, sessão de 20 de agosto de 1821, p. 1950.

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por Castelo Branco, Moura entende a necessidade da existência de um Poder independente para

a administração, o que para ele significa a gestão do governo da localidade. Apenas dessa

maneira se garantiria, diante dos juizes e do Executivo, a autonomia das Câmaras e das Juntas

provinciais19.

Nesse momento, os deputados Serpa Machado e Margiochi negam a autonomia de

poderes às municipalidades pela defesa do bem público. Para eles, a defesa ferrenha da

autonomia representava o privilégio do interesse particular, patente na constituição francesa em

que, segundo Margiochi, o governo era paralisado pela ingerência das Juntas e Câmaras.

O deputado Moura retoma a idéia do Poder Administrativo como parte do Poder

Judiciário a fim de negá-la para revelar o que estava por trás do exemplo francês dado por

Margiochi: a idéia de que a existência de um Poder Administrativo configuraria uma autonomia

às Juntas e Câmaras identificada com uma federação. Curiosamente, a experiência francesa é

reinterpretada pelo deputado com a denominação de federalismo, a fim de identificar o vocábulo

com o exemplo francês, mas negá-lo em relação à América portuguesa, para com isso defender a

implementação de um Poder Administrativo independente do Judiciário. O tom pejorativo da

palavra e o medo da desagregação que ela significava se mostram patentes.

Segundo o deputado Moura, o federalismo francês é caracterizado por uma diferença

completa de legislação, em que não haveria uma legislação geral regulando todos os

Departamentos franceses que por sua vez, tinham, cada um, uma legislação particular. Esse era o

significado do federalismo. O poder administrativo não teria na constituição portuguesa o poder

de legislar, apenas seria uma “(...) authoridade encarregada de executar as leis, que o corpo

legislativo promulga: isto he que he, e mais nada. (...)”. Assim, o centro aglutinador da nação era

localizado nas Cortes, lugar da soberania da feitura das leis. Nas leis estaria a unidade da nação.

As Câmaras e Juntas teriam a liberdade de regular os negócios particulares, mas apenas isso.

Além do mais, negar-lhes isso seria retroceder, assemelhando-se ao Antigo Regime20. Assim, o

medo do federalismo, da palavra, estaria levando apenas ao retrocesso:

“(...) se nega às Câmaras o poder de regularem seus negócios particulares, nega-se no Governo da liberdade o que se não negava no tempo do despotismo. No tempo do despotismo tiverão sempre as câmaras esse direito; e se nós lho negamos, deverão as Câmaras ficar em huma tal sujeição? Então, quando ellas quizerem legislar obre os pactos irão ao Rei, e o Rei dirá, ‘sim, ou não?’ e etc. etc. Eis-aqui a que nos quer conduzir o sonhado medo do Federalismo. He hum absurdo total o supor-se que isto possa acontecer. Por conseguinte já, como diz o ilustre Propinente, já o incoveniente não está na palavra, está na cousa (...)”21

A questão que permeia todo o debate é a da divisão de soberania no pacto político a ser

estabelecido. A natureza diferenciada de cada poder refere-se a uma parcela de soberania nele 19 Ibidem, p. 1951. 20 Ibidem, pp. 1951-1952. 21 Idem.

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depositada pela nação. A idéia de um Poder representante apenas do governo local significaria a

confiança de uma porção muito grande de soberania às Juntas e Câmaras que poderiam, por sua

vez, virem a legislar – ato máximo de soberania. O limite da concessão de autonomia no debate

estava colocado no poder de legislar, a idéia de legislações particulares para as Províncias e

municipalidades, caso não reguladas pelo Executivo e o Congresso Geral, significava a

organização federal. A autonomia seria regulada pelo Executivo que, por sua vez, era garantido

pela independência dos magistrados da administração local, ao mesmo tempo em que sua

responsabilidade seria definida pelo Legislativo, “(...) Ao Congresso pertence fazer as leis para

se verificar a responsabilidade, e para se fazer effetiva. (...)”22. A criação do Poder

Administrativo tornaria as Juntas e Câmaras independentes a tal ponto que se arriscaria a

produzir um poder irresponsável e desobediente.

Segunda fase: predomínio integracionista

A chegada em 29 de agosto de 1821 da bancada pernambucana iniciou uma nova fase, a

da prevalência da política integracionista, vitoriosa até dezembro do mesmo ano. Para os

integracionistas, liderados por Manuel Fernandes Tomás, o pacto era fruto de laços tradicionais

imemoriais de uma nação portuguesa. Esta deveria ser plenamente integrada por vínculos

político-administrativos: o Legislativo unificado em uma Câmara, reunida em Lisboa; o

Executivo exercido pelo Rei, residente em Lisboa e o Judiciário com todas as últimas instâncias

de julgamento realizadas na capital lisboeta. No ultramar, as Juntas obedeciam a essa lógica. Os

presidentes de cada governo provincial eram subordinados às Cortes e ao Rei e a administração

da província não teria nenhuma autoridade militar, apenas seria formado um governo de armas

em cada província, mas submetido à Lisboa. No mesmo momento, todos os órgãos de governo

instalados no Rio de Janeiro foram extintos e o príncipe regente deveria retornar à Europa.

Neste contexto, o vocábulo “federação” foi utilizado em duas outras sessões, a de 12 e

14 de novembro de 1821. A discussão é sobre a formação da Junta Permanente das Cortes. O

ponto de atrito entre os deputados reside na divisão de membros para a Junta entre os

portugueses da Europa e os deputados americanos. Na Constituição se definiu que seriam sete

membros, três do ultramar e três da Europa, sendo o último escolhido por sorteio entre ambos. O

uso político do vocábulo federalismo se faz pelo deputado Miranda. Este nega a divisão entre

deputados europeus e ultramarinhos, pois identifica isso com o princípio de federalismo,

colocando o termo em contraponto com a idéia integracionista de representação. Assim, o

federalismo nega a unidade do Império, pois significa a fragmentação das “partes”:

22 Ibidem, p. 1953.

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“Não sei para que havemos de fazer distincção entre os Deputados de Portugal, e Deputados do Brazil. Esta distincção deve desaparecer diante de nós. Deve-se dar toda a liberdade nas eleições. Nem eu sei como os redactores do projeto se lembrarão de estabelecer similhante divisão, o que importa he, que a deputação permanente seja formada de homens que mereção toda a confiança da Nação, e assento que nem os Brazileiros, nem os Europeus poderão jamais levar a mal, que na deputação permanente existão aquelles que merecem o maior número de votos da Assembléa, que sejão mais capazes de vigiar sobre o Governo, e sobre a segurança publica. Por isso o meu voto he, que não se faça distincção alguma entre Deputados Europeus, e Deputados Ultramarinos; e que se faça desapparecer das paginas da Constiuição tudo o que for principio de federalismo.”23

Outros deputados retomam a idéia de federalismo de Miranda. A luta política pela semântica se

dá entre o projeto integracionista e a idéia da federação como sinônimo da desunião. O termo é

usado pelos integracionistas de maneira pejorativa, para denegrir seus adversários. O deputado

Miranda afirma que a distinção entre os membros da Comissão se encontra na Constituição

apenas porque esta estava na Constituição espanhola. Isso reforça a idéia de que a experiência

hispânica tinha que ser interpretada diante dos acontecimentos do momento: não se podia

colocar um principio dela apenas por ser uma experiência política fundadora24, a idéia é superá-

la. Isto é, não cometer os mesmos erros políticos que levaram à independência das colônias

hispano-americanas.

No dia 14 de novembro as discussões sobre a matéria continuaram. Novamente, o

deputado Miranda retoma o uso político do federalismo em referência à constituição espanhola.

A distinção da representação é lida como uma experiência política que culminou na

fragmentação do Império espanhol e é isso o que se quer evitar25. Há um consenso entre os

deputados de que o termo federalismo equipara-se a fragmentação. A divergência política em

relação ao vocábulo não está no seu significado, mas na sua vinculação ou não à experiência

constituinte espanhola. O deputado pernambucano Moniz Tavares retoma a idéia da

Constituição gaditana e reinterpreta a experiência, mostrando o artigo como uma prova de

inclusão dos americanos no pacto político em prol da unidade de um vasto Império,

diversificado e único, não como um passo ao federalismo – a fragmentação do Império – como

afirmou Miranda.

O embate em torno da identificação da experiência gaditana com o federalismo tinha

como pano de fundo a questão da representação. Os deputados ibéricos integracionistas

defendiam que a partir do momento que os deputados ocupavam acento no Congresso esses

estavam imbuídos da soberania da nação, não mais distintivos da província pela qual foram

eleitos, mas indiferenciados como representantes da nação portuguesa, una e indivisível.

Outros deputados americanos, conciliados com as idéias de Borges Carneiro, por sua

vez, reafirmavam sua distinção como defensores em um âmbito dos interesses provinciais ou

23 Ibidem, sessão de 12 de novembro de 1821, p. 3046. 24 Ibidem, p. 3048. 25 Ibidem, p. 3072.

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mesmo, em última instância, de interesses americanos. Nessa defesa estava o princípio de que o

pacto era algo construído politicamente naquela arena, não fruto de laços tradicionais e uma

história comum dos quatro cantos da nação portuguesa. Para eles, no Parlamento deviam se

reunir deputados próximos das realidades locais provinciais, capazes de interpretar interesses

especificamente ultramarinos e defender uma legislação apropriada. Nesse sentido, não poderia

haver a completa liberdade de eleição. Os interesses da Nação eram gerais por se constituírem

de “partes”, onde cada “parte” não podia ser plenamente compreendida por qualquer deputado.

A idéia de representação provincial foi o ponto de atrito que impediu uma aliança plena

entre os integracionistas portugueses e os pernambucanos. Até o momento, a defesa dos decretos

das Cortes de setembro pelos delegados de Pernambuco garantiu a eles o afastamento do

governo da província do capitão general Luís do Rego Barreto. Ele representava a repressão

enviada pelo governo de D. João VI contra o movimento revolucionário de 181726. O pedido dos

pernambucanos pela espera dos delegados fluminenses a fim de discutir o envio de tropas para o

Rio de Janeiro significava a incapacidade dos deputados ali presentes de decidirem medidas que

ultrapassavam suas unidades eleitorais. No Brasil, os decretos das Cortes não davam conta da

situação e as tensões apenas aumentavam.

O deputado Villela, delegado do Rio de Janeiro, depois de se colocar a favor do artigo

com a distinção da representação entre ibéricos e ultramarinhos, se indaga da diferença entre a

teoria política e a sua prática:

“Tudo he mui fácil de dizer-se, mas não de sentir-se, e se nós o sentimos, como he justo que o sintamos, talvez o não sintão assim os povos, que não são tão filósofos, metafysicos. (...) Que se espera que elles pensem [caso uma Deputação Permanente não tenha membros ultramarinhos eleitos], ainda sem isto acontecer, comparando o artigo da Constituição de Hespanha com o que se pretende aqui substituir? (...)”27

Em teoria o representante da província o é da Nação, mas na prática o deputado admite uma

preocupação com o resto da população, a que não é ilustrada, por isso incapacitada de

compreender a idéia abstrata da representação. Isso mostra que o espaço público e as discussões

políticas abrangiam grande parte da sociedade. Mais ainda, o deputado acreditava que as

informações sobre as outras experiências constitucionais estavam na mente dos “povos”. Neste

momento, é visível que os trabalhos dos deputados eram acompanhados da preocupação com a

opinião pública, diretamente ligada a idéia de representatividade.

A discussão sobre o espaço de Opinião na América portuguesa e depois no Império do

Brasil foi aventada pela historiografia já a partir da década de 1970 e em geral fundamentada na

afirmação da vinda da Corte portuguesa para a América como momento de “modernização”. As

26 Op. Cit., Berbel, 1999. 27 Diário das Cortes Constituintes de Lisboa, sessão de 14 de novembro de 1821, p. 3075.

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análises aparecem nos trabalhos de Maria Odila Silva Dias, Emilia Viotti, Fernando Novais,

entre outros28. No entanto, foi na década de 1990 que o olhar para o espaço público ganhou

reconhecimento na historiografia como um tema imprescindível, devido às contribuições feitas

por Cecilia Helena de S. Oliveira29, István Jancsó30, João Paulo Garrido Pimenta31, Andrea

Slemian32, Marco Morel33, entre outros. Esses autores teorizaram e mapearam o espaço público,

formulando idéias importantes para a elaboração dessa proposta de investigação.

O conceito de Opinião Pública a que esse estudo se refere faz parte da idéia de

modernidade do espaço público34. Isso diz respeito à afirmação de um circuito de participação

política dinâmico, inexistente no Antigo Regime e que compreende mecanismos de

“(...) pertencimento às sociabilidades (institucionalizadas ou não), lutas eleitorais e parlamentares, exercício de coerção governamental, movimentações nas ruas, mobilização de expressivos contingentes da população, recursos à luta armada (por meio de motins, rebeliões, etc.) e, sobretudo, formas de transmissão oral e manuscrita tão marcantes nas sociedades daquela época. (...)”35

Portanto, a palavra escrita estava inserida em um circuito de transformações políticas,

econômicas e sociais que não dizia respeito apenas à “elite”, mas reunia senhores, escravos e

homens livres pobres. Além disso, não era um movimento restrito à América portuguesa, pois

fazia parte de um movimento atlântico de circulação de pessoas e idéias.

A concepção do conceito de opinião pública entre os deputados flutuava entre a opinião

da razão, dos ilustrados, e a opinião do público não ilustrado. Havia uma opinião pública por

vezes associada diretamente à razão ou moral, e por outras, uma “Opinião” ainda imatura, ou

seja, não devidamente ilustrada. A variação desse entendimento influenciava a própria idéia de

representação. A preocupação com essa diferença de graus de ilustração presente na sociedade

28 MOTA, Carlos Guilherme (org.). 1822: Dimensões. São Paulo: Perspectiva, 1972. 29 OLIVEIRA, Cecília Helena de S.. A Astúcia Liberal: Relações de Mercado e Projetos Políticos na Corte do Rio de Janeiro, 1820-1824. São Paulo: USF, 1986. 30 JANCSÓ, I. (org.). Independência: História e Historiografia. São Paulo: HUCITEC, 2003 e JANCSÓ, I. (org.). Brasil: Formação do Estado e da Nação. São Paulo: HUCITEC, 2005. 31 PIMENTA, João Paulo Garrido. O Brasil e a América Espanhola (1808-1822). São Paulo: HUCITEC, 2005 e PIMENTA, João Paulo Garrido. Nas origens da imprensa luso-americana: o periodismo da província cisplatina (1821-1822). In: FERREIRA, Tânia; MOREL, Marco; NEVES, Lucia Maria Bastos Pererira das. História e Imprensa. Rio de Janeiro: DP&A, 2006, pp. 19-36. 32 Op. Cit., Slemian, 2006. 33 MOREL, Marco. As Transformações dos Espaços Públicos. Imprensa, Atores Políticos e Sociabilidades na Cidade Imperial (1820-1840). São Paulo: HUCITEC, 2005 e MOREL, Marco. Independência no papel: a imprensa periódica. In: JANCSÓ, István (org.). Independência: História e Historiografia. São Paulo: HUCITEC, 2003, pp. 617-636. 34 Há duas correntes principais na historiografia contemporânea para a abordagem do papel da imprensa no Brasil. Uma formada por nomes como Lúcia Maria Bastos Pereira das Neves (NEVES, Maria Bastos Pereira das. Corcundas e Constitucionais – A Cultura Política da Independência (1820-1822). Rio de Janeiro: Revan, 2003.) e Isabel Lustosa (LUSTOSA, Isabel. Insultos Impressos: A Guerra dos Jornalistas na Independência (1821-1823). São Paulo: Companhia das Letras, 2000.), afirma a marca do “elitismo” no periodismo e, por conseguinte, limita a idéia da formação de um amplo espaço de opinião pública. Outra defendida, principalmente, por Cecília Helena de Salles Oliveira (Op. Cit., Oliveira, 1986), Marco Morel e Mariana Monteiro de Barros (BARROS, Mariana Monteiro de e MOREL, Marco. Palavra, Imagem e Poder – O Surgimento da Imprensa no Brasil do Século XIX. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.), recusa essa restrição e, por isso, enfatiza a existência da circulação de idéias como elemento de transformação não apenas da comunicação, mas, sobretudo, para a definição de uma nova legitimidade política baseada na Opinião pública e em práticas políticas ligadas a ela. 35 Op. Cit., Morel, 2005, p. 617.

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em geral, demonstra que os deputados acreditavam e estavam imbuídos da construção de uma

monarquia constitucional como um governo representativo. Essa perspectiva contradiz a

historiografia referenciada grandemente nas definições de Raymundo Faoro36, em que se afirma

um falseamento das instituições, como importações inadequadas de modelos estrangeiros37.

F. Martinez Perez38 no estudo do Judiciário na experiência constitucional gaditana nos

mostra como um olhar histórico da gênese do liberalismo do início do século XIX pode dar

novas respostas a velhas questões. Ele implementa um método de análise que prima por

considerar o liberalismo como algo não unívoco, na verdade, um híbrido de valores do Antigo

Regime e conceitos modernos, derivados de transformações de experiências revolucionárias.

Dessa maneira, o autor nega um dito descompasso da teoria e da prática, identificado por

historiadores como algo contraditório e ambíguo, da prática como uma “patologia”, para primar

pela compreensão da relação da teoria e da prática como se por um lado, a teoria não fosse

operativa pela sua simples enunciação e por outro a prática, entendida como a forma de tornar

orgânicas as funções da teoria judiciária, como algo imprescindível na análise histórica.

A principal contestação as idéias de Faoro e seus discípulos intelectuais é uma espécie

de anacronismo no que toca a sua afirmação de que elementos como a vitaliciedade do senado

nomeado pelo Imperador, o Poder Moderador, a fraude eleitoral e a escravidão eram

incompatíveis com a idéia de representação, pautada na divisão do público e do privado. A

gênese histórica do governo representativo permite diferenciar a democracia contemporânea dos

modelos de representação existentes no século XIX. Ao historiar, evitamos analisar formas

representativas do século XIX conforme padrões historicamente posteriores, presentes apenas no

século XX. Mais do que isso, autores como Bernard Manin39 e Ronsavallon40 nos mostram que

países fundadores do regime representativo (Inglaterra, França e Estados Unidos) possuíam

esses mesmos elementos na época.

36 FAORO, Raymundo. Donos do poder: formação do patronato brasileiro. Porto Alegre: Globo, 1975. 37 Textos que marcaram esse debate e são referências até hoje são o de Schwarz (SCHWARZ, Roberto. As idéias fora do lugar. In: Ao vencedor as batatas. Forma literária e processo social nos inícios do romance brasileiro. São Paulo: Duas Cidades, 1992, pp. 425-429.) e Franco (FRANCO, Maria Sylvia de Carvalho. As idéias estão no lugar. Cadernos de Debate. São Paulo: Brasiliense, Nº 01, 1976.). Hebe Mattos (MATTOS, Hebe. Escravidão e cidadania no Brasil. São Paulo: Topbooks, 1996.) rediscute esse debate focando na questão da cidadania e da representatividade. Para a autora o liberalismo foi personificado no regime representativo da monarquia constitucional, em nome das idéias liberais as eleições foram efetivadas. A participação política é vista constando de duas fases: 1. a do “liberalismo da independência” e 2. o “liberalismo de 1830”. A primeira fase teve fundamentação na idéia de civilização, justificando a exclusão dos escravos da participação política por serem considerados “bárbaros”. A elite seria a portadora do projeto civilizador que construía a imagem de nacionalidade. Assim, a “modernização conservadora” ocorreu de cima para baixo. A segunda fase, a da geração de 30 era mobilizada pela reivindicação da participação política, pela maior autonomia para os governos provinciais. 38 PÉREZ, Fernando Martinez. Entre Confianza y Responsabilidad: la Justicia del Primer Constitucionalismo Espanol. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 1999. 39 MANIN, Bernard. Los princípios del gobierno representativo. Nova Iorque: Cambridge University Press, 1997. 40 Op. Cit., Ronsavallon, 1999.

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B. Manin considera alguns elementos fundamentais para identificar a natureza

representativa de um governo. Entre eles está a independência dos representantes – elegidos -

em relação aos representados – eleitores41. Diferentemente da democracia contemporânea, os

deputados não eram incumbidos dos interesses restritos de seus eleitores, mas sim agir conforme

o bem público da nação. Os deputados detinham a autoridade de que a sua ilustração imputava.

Eles eram portadores de uma Razão de Estado que não se submetia aos interesses particulares.

Essa organização se opunha à da democracia ateniense. Os políticos no caso Antigo

representavam os interesses próprios, essa representação era definida pela “semelhança”. A

partir dessa ruptura como opção pela “autoridade” imbuída na essência da representação, se

tornou consenso que os representantes teriam que pertencer à elite intelectual da nação42.

As divergências entre os intelectuais e políticos da época se davam em temos das duas

formas de proceder as eleições, ou seja, a escolha desses deputados. Nesse ponto, o tipo de

representação se relaciona ao de Constituição. Para demonstrar isso é exemplar a indicação do

Padre Diogo Antonio Feijó, na época representante da bancada de São Paulo, enunciado na

sessão do dia 25 de abril de 1822. O que depois terá desdobramentos para o significado do

termo federalismo quando da apresentação e discussão dos artigos adicionais à Constituição,

apresentados pela Comissão de Negócios do Brasil.

O deputado relaciona a palavra província à de pátria e povos43. Ele defende o principio

de que o pacto defendido é a junção de todas as partes contratantes da nação. Neste caso, as

variadas províncias do Império luso-americano. A vontade fundadora do pacto é a dos povos, ou

seja, haveria uma coerência entre essa vontade e a dos seus representantes, referentes a cada

província – unidades eleitorais. A união dessas vontades formaria a vontade geral da nação. Essa

idéia que fundamenta toda a Indicação contraria a visão integracionista do pacto da nação,

prenunciando o embate decisivo entre os defensores dessa idéia e a ala das bancadas dos

deputados do Centro-sul do reino do Brasil (Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais), depois

41 Os outros três elementos definidores de um regime representativo para o autor são: o caráter periódico das eleições, a liberdade de opinião pública e a decisão política negociada pelo debate. A liberdade de opinião destaca por Manin coincide com a idéia de um espaço moderno, onde a liberdade de imprensa seria um dos pilares fundamentais. A opinião púbica seria a expressão do direito dos eleitores de emitirem suas opiniões políticas sem nenhum tipo de coerção para o contrário. O espaço institucional do debate político precisa ser público para que os cidadãos/eleitores possam discutir e formular sua vontade a partir da sua apreensão das discussões formais entre os elegidos/representantes. Isso é claro na insistência dos deputados da publicação de um periódico próprio com a descrição dos debates do Congresso. 42 Isso não quer dizer que havia uma elite com interesses e posições políticas homogêneas, havia a negociação política. A idéia de monarquia representativa é conceitualizada e discutida em: DOLHNIKOFF, Miriam Dolhnikoff, MAIA, Francisleide, SAEZ, Hernan Lara, SALES, Pedro Paulo Moreira, GREGÓRIO, Vitor. A revisão da historiografia política: representação política no império. In LAVALLE, Adrian (org), O horizonte da política: questões emergentes e agendas de pesquisa. São Paulo: Cosac e Naif (no prelo), 2008. 43 Essa concepção de pátria é explorada por Villar (VILAR, Pierre. Hidalgos, Amotinados y Guerrileiros. Pueblos y Poderes em la Historia de España. Barcelona: Crítica, 1999.) para o caso da Espanha. Ele também identifica o uso de pátria com o local de nascimento, o qual se refere no caso dos deputados às províncias, suas unidades de representação, pela qual foram eleitos.

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aglutinados com outros representantes americanos na defesa de uma Assembléia Constituinte no

Brasil.

O deputado identifica a relação do eleitor com a de cidadão. O artigo 2144 por ele citado

refere-se à definição de cidadania. A sua crítica ao artigo consiste na não existência de uma

seleção censitária rígida45. Sua censura ao artigo é coerente com sua defesa de uma

representação por semelhança de interesses, como se o elegido fosse o porta voz dos interesses

dos eleitores, pois a restrição dos votantes pelo censo restringiria os votantes a uma porção

ilustrada da província que possuiria interesses ilustrados o suficiente para serem sempre

mantidos pelo deputado eleito:

“(...) Beneméritos da pátria regularão nesta crise arriscada a marcha política do Brazil: os povos a tudo assentirão, porque se lhes assegurava que tudo se fazia para sua felicidade. Chegou porém o tempo de tranqüilidade, elles se unirão, elles nos elegerão, elles nos enviarão, não para receber a lei fundamental do seu futuro governo, mas para fazela. Será tudo isto um erro, mas he erro generalisado no Brazil, e que só a força poderá destruir: erro que o artigo 21 das Bases autorisa, e de que Portugal primeiro lhe tem dado exemplo.”46

A argumentação de Feijó converge com as análises de Ronsavallon47. Como o autor

conclui depois da análise dos graus dos processos eleitorais das constituições francesas da época

da revolução, a representação fundamentada na autoridade do deputado possibilita um maior

número de eleitores, já que independente da ilustração dos eleitores, o elegido será sempre apto

a defender as escolhas políticas mais racionais, ou seja, as que são liberais em prol do bem

público. Mais do que isso, a diferença de graus permite unir a idéia de Feijó – no segundo grau

do processo - com uma ampla gama de participação – no primeiro grau das eleições. A

articulação dos graus eleitorais diz respeito a uma função específica das eleições como uma

forma de controle social48. Ao votar, mesmo que apenas no primeiro grau da eleição, o eleitor se

considera parte do processo, atribuindo-o mais legitimidade do que se não votasse em nenhum

momento das eleições:

44 “Todos os Portugueses são cidadãos, e gozam desta qualidade: I. Os filhos de pai português nascidos no Reino Unido; ou que, havendo nascido em país estrangeiro, vieram estabelecer domicílio no mesmo reino: cessa porém a necessidade deste domicílio, se o pai estava no país estrangeiro em serviço da Nação; II. Os filhos ilegítimos de mãe portuguesa nascidos no Reino Unido; ou que, havendo nascido em país estrangeiro, vieram estabelecer domicílio no mesmo reino. Porém se forem reconhecidos ou legitimados por pai estrangeiro, e houverem nascido no Reino Unido, terá lugar a respeito deles o que abaixo vai disposto em o nº V; e havendo nascido em país estrangeiro, o que vai disposto em o nº VI; III. Os expostos em qualquer parte do Reino Unido, cujos pais se ignorem; IV. Os escravos que alcançarem carta de alforria; V. Os filhos de pai estrangeiro, que nascerem e adquirirem domicílio no Reino Unido; contanto que chegados à maioridade declarem, por termo assinado nos livros da Câmara do seu domicílio, que querem ser cidadãos Portugueses; VI. Os estrangeiros, que obtiverem carta de naturalização.” 45 Essa lógica também foi seguida no Império do Brasil. Hebe Mattos (Op. Cit., Mattos, 1996.) mostra que o voto na época respeitava o modelo europeu baseado na renda, censitário. A aparente restrição intrínseca de tal modelo foi desmentida pelo baixo censo que, portanto, angariava grande número de homens livres votantes. Entretanto, a restrição estava presente nos elegíveis, para os quais era necessário um alto censo. 46 Diário das Cortes Constituintes de Lisboa, sessão de 25 de abril de 1821, p. 952. 47 Op. Cit., Ronsavallon, 1999. 48 “Así, durante la revolución, el procedimiento electivo se remite a funciones sociais y políticas muy diversas. La elección es a la vez um procedimiento de legitimación, uma prueba de confianza, um sistema de nombramientos, um médio de control, um signo de comunión, uma técnica de depuración, um operador de representación, um símbolo de partición. (...)” - Ibidem, p. 179.

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“La elección en segundo grado, inventada para dar a las masas uma participación em las elecciones políticas – señala – era um artifício destinado a volver practicable e ilusório algo que se acercaba al sufrágio universal, uma forma a la vez democrática y mentirosa que podia servir para enmascarar el predomínio de las minorias y para engañar a la multitud por medio de uma apariencia popular. (...)”49

Márcia Berbel e Rafael Marquese discutem a questão da cidadania no que toca as soluções

constitucionais encontradas em relação a escravidão nas experiências constitucionais espanhola,

portuguesa e brasileira. Isso é feito se concentrando nas fontes ibérica e brasileira, mas com uma

perspectiva que pretende comprovar a hipótese de que as três experiências constitucionais –

Americana, Francesa e Inglesa – criaram “(...) balizas para a ação dos atores políticos

envolvidos em seus respectivos processos constitucionais (...)”50. Nesse sentido, a inclusão

inédita dos descendentes de escravos no estatuto de cidadão em Lisboa e no Rio de Janeiro

representava uma forma de manter “(...) todo o edifício escravista brasileiro, coração econômico

do Império ultramarino desde a segunda metade do século XVIII. (...)” já que os incluía na

sociedade institucionalmente e legitimava a ordem social garantindo a “(...) lealdade dessa

enorme massa populacional ao novo Império americano (...)”51.

Além disso, outro ponto relevante que o artigo aponta é a necessidade de levar em conta

os interesses dos atores políticos diante de sua inserção no quadro das relações do Sistema

Colonial. No caso, a inscrição de Cuba no quadro do Império espanhol e o conjunto das

capitanias do Brasil diante do contexto do Império português aproximavam as suas soluções

constitucionais. No entanto, a experiência constitucional em Lisboa e no Rio de Janeiro foram

inéditas, pois incorporaram os livres na cidadania52. No caso espanhol, a pressão para a exclusão

das castas foi defendida pelos delegados cubanos como uma espécie de moeda de troca pela

manutenção do tráfico53:

“O projeto de futuro dos deputados cubanos e brasileiros, enfim, era o mesmo: por um lado, garantir a propriedade privada – sobretudo da mão de obra cativa – como fundamento da ordem constitucional interna; por outro, com base no tráfico negreiro transatlântico, converter os dois países nos maiores exportadores mundiais de artigos tropicais, valendo-se do vácuo criado no mercado mundial pela revolução escrava de São Domingos e aproveitando o empuxo da demanda com o advento da industrialização. Mas, se a solução de continuidade para a escravidão negra e o tráfico

49 Apud: Ibidem, p. 195. 50 BERBEL, Márcia Regina e MARQUESE, Rafael de Bivar. A escravidão nas experiências constitucionais ibéricas, 1810-1824. São Paulo: mimeo, 2005. O artigo foi originalmente apresentado no Seminário Internacional “Brasil: de um Império a Outro (1750-1850)”, organizado pelo Projeto Temático Fapesp “A Fundação do Estado e da Nação Brasileiros (1750-1850)”, no Departamento de História da FFLCH/USP em setembro de 2005, p. 03. 51 Ibidem, p. 38. 52 O caráter original e de mais abrangência da cidadania no Império do Brasil parece contradizer a idéia de Rosavallon sobre o significado mais conservador de eleições em dois graus: uma maneira de incluir a maior parte da sociedade, sem que isso corresponda a uma atuação efetiva no processo eleitoral. No entanto, o estudo de Berbel e Marquese mostra que a inclusão dos alforriados na cidadania não era nem mesmo aventada antes disso. A cidadania é mais inclusiva por inovar nesse ponto, mesmo que seja uma inclusão motivada pela manutenção do tráfico de escravos e da escravidão. – Idem. 53 “(...) Com o aprofundamento da crise do sistema colonial na década de 1810, Cuba e Espanha passaram a depender cada vez mais uma da outra. Em vista das garantias que a metrópole oferecia para a continuidade do tráfico negreiro (contra a pressão inglesa) e para a segurança interna da ilha (contra eventuais levantes dos grupos raciais subalternos), a oligarquia escravista cubana não viu qualquer problema em sacrificar os direitos de cidadania dos negros e mulatos livres em Cádis e Madri.” – Ibidem, pp. 37-38.

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foi igual, no que se refere aos direitos de cidadania para os libertos e demais descendentes de africanos as fórmulas adotadas foram distintas.(...)”54

Questões sobre a cidadania, as eleições, a representação e o envio de tropas se acirraram

com a presença dos fluminenses no Congresso. Entretanto, o cerne do debate pode ser resumido

na dificuldade de se definir, de negociar politicamente, o grau de poder cabível às províncias,

entendido como soberania. A utilização do vocábulo federação paira justamente nessa definição.

Quando o léxico “federação” é utilizado de maneira pejorativa para depreciar um argumento na

luta política, ele era associado à uma pretensa autonomia descabida da experiência gaditana às

“províncias”, o que gerou a fragmentação do Império espanhol. A partir do “espaço de

experiência”55 espanhol, lido conforme o interesse do interlocutor de defender uma maior

centralização política, o termo federação foi imputado de um significado específico: partes

completamente autônomas e republicanas. Essa argumentação política foi em grande parte

considerada como fato na historiografia, ignorando a discussão sobre o federalismo e partindo

do pressuposto comparativo entre unidade brasileira e fragmentação da América espanhola. O

exemplo mais patente dessa imperícia é José Murilo de Carvalho56.

Para compreender a construção da monarquia no Brasil, Carvalho se filia a idéia de

transmigração de um Estado patrimonialista à realidade, conceitualizado por Faoro57. A

oposição entre a manutenção da unidade do Império do Brasil e a fragmentação da América

espanhola em repúblicas é explicada pela formação na porção luso da América de elites

intelectualizadas que conduziram racionalmente a Independência e a construção do Estado

Nacional. Esse processo denominado de “sociabilização” foi único na América portuguesa,

conduzindo à formação de uma elite política homogênea que, com o atributo de uma Razão de

Estado, primava pelo bem público, construindo e mantendo o Império no confronto com as

forças centrifugas das elites regionais, essas imbuídas somente de interesses econômicos que

podiam colocar a perder a unidade do Império.

A idéia de que federalismo, entendido como divisão de atribuições entre o governo

central e os regionais, era parte da argumentação pela defesa dos interesses do mandonismo

local, essencialmente econômicos, se perde ao analisarmos o Ato Adicional da Comissão de

Negócios do Brasil. No Ato, a autonomia provincial é encarada como um projeto nacional do

Império Luso-americano. Nesse sentido, os deputados que defendiam uma maior autonomia

54 Ibidem, pp. 35-36. 55 KOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: Contribuição à Semântica dos Tempos Históricos. Rio de Janeiro: Ed. PUC-RJ/Contraponto, 2006 e KOSELLECK, Reinhart. Crítica e Crise: uma Contribuição à Patogênese do Mundo Burguês. Rio de Janeiro: Ed. UERJ/Contraponto, 1999. 56 Op. Cit., Carvalho, 1981. 57 Op. Cit., Faoro, 1975.

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provincial projetavam ao vocábulo federação o exemplo inglês. O Império inglês era vasto e só

se mantinha pela autonomia dada a suas colônias, inclusive, quanto a atribuições legislativas,

porém, esse uso de “federação” só foi explorado a partir da apresentação daqueles artigos

adicionais à Constituição formulados pela Comissão de Negócios do Brasil. Antes disso, era

consenso a existência de um único Congresso, entendido como a fonte da soberania da nação.

Terceira fase: predomínio moderado

A partir de janeiro até junho de 1822, as políticas predominantes no Congresso foram as

dos moderados. Liderados por Borges Carneiro, a união defendida era pactuada através de uma

relativa autonomia política administrativa do Brasil em relação a Portugal, mantendo-se um

mercado integrado. Inicialmente, a proposta de Carneiro obteve o apoio dos representantes da

Bahia. Em 09 de janeiro, D. Pedro já havia declarado sua permanência no Rio de Janeiro

contrariando o decreto integracionista de setembro de 1821, essa decisão abriu uma frente de

confronto direto entre o governo do Rio de Janeiro e o de Lisboa, a tal ponto que a idéia de uma

integração de mercados ganhou força entre os deputados. Nesse sentido, a conciliação política

seria fundada na autonomia. O campo político era visto como autônomo em relação à esfera

econômica. Os baianos defendiam a existência de um executivo eleito nas províncias, onde

legislariam e seriam responsáveis por sua execução provincial. Nitidamente, o que se esta

desenhando com o decorrer dos debates e ações políticas é uma “federação nacional”, oposta

diretamente à “nação integrada” de Fernandes Tomás.

A idéia de federação foi o ponto de confluência dos interesses das bancadas do Reino do

Brasil. Antonio Carlos de Andrada e Silva afirmava que a união entre o reino de Portugal e do

Brasil somente poderia existir a partir de uma construção política: o pacto das “partes”

soberanas, contratantes, que a “nação separada” incorporava. As bases de funcionamento do

novo pacto supunham um Executivo uno, porém composto de diferentes agentes – rei, em

Portugal, príncipe no Rio de Janeiro e delegados em cada província. O Legislativo possuía três

Cortes: duas especiais – instaladas uma em Lisboa e outra no Brasil - e uma Geral que agruparia

e discutiria sobre as decisões postas no Reino do Brasil e no de Portugal. A relação Brasil e

Portugal se fundamentava na afirmação do Reino do Brasil, ao mesmo tempo, que a tentativa era

a de aglutinar os interesses americanos – atrair principalmente as delegações de Pernambuco e

Bahia - na permanência do Príncipe Regente no Rio de Janeiro e na discussão do princípio da

autonomia provincial durante os trabalhos da Constituinte em solo americano.

O clima político se acirrava ainda mais a partir de junho de 1822. Nesse mês, D. Pedro

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convocou a Assembléia Legislativa do Brasil. O corpo convocado era determinado pela reunião

de delegados eleitos por todos os homens que recebessem determinada renda mínima de terra ou

de alguma profissão liberal. A exigência de uma Assembléia Legislativa para o Brasil

materializava a idéia da distinção entre deputados europeus e deputados ultramarinos e afirmava

a defesa da autonomia do Reino do Brasil na Monarquia Portuguesa. Assim, cada vez mais o

significado de “nação” transformou-se do significado da defesa do Brasil como uma “parte

contratante” para o de o Brasil como nação soberana. Em Lisboa, o maior número dos deputados

reagiu com ameaças, envio de tropas e, por fim, com a condenação da Junta de São Paulo,

seguida da exigência do regresso imediato do Príncipe.

A aliança entre os deputados do Brasil foi várias vezes negociada entre os meses de

fevereiro e junho de 1822. O projeto de integração comercial de Borges Carneiro era tentador, a

ponto de os paulistas cogitarem integrar a esfera econômica arquitetada pelo deputado ibérico na

proposta de autonomia provincial presente no Projeto de São Paulo. Mas, foi o envio de tropas

para a província baiana em 22 de maio de 1822, contra o voto da maior parte dos deputados do

Brasil, a medida que definitivamente aproximou os deputados da Bahia, São Paulo e

Pernambuco.

No dia 17 de junho de 1822, a Comissão de Negócio do Brasil apresentou uma proposta

de Ato Adicional à Constituição Portuguesa que foi discutida em relação a seu significado

federativo em 26 de junho e 03 de julho de 1822. A Comissão era formada pelos paulistas

Antonio Carlos de Andrada e Silva e Fernandes Pinheiro, pelo baiano Lino Coutinho, pelo

pernambucano Araújo Lima e pelo fluminense Vilela Barbosa. O objetivo era manter-se a união

entre os reinos, impossível com um centro único executivo e legislativo, ao mesmo tempo,

contemplar os interesses dos delegados do Brasil58. O artigo 1º define a existência de dois

Congressos, um em Lisboa e outro no Brasil; no artigo terceiro as províncias da África e da Ásia

declarariam a que Congresso se filiariam; o artigo 4º definia a atribuição que caberia ao

Congresso do Brasil, a de legislar “sobretudo especialmente às províncias” e as leis do Brasil

seriam sancionadas e publicadas pelo Regente (artigo 5º). O acordo contempla o resultado de

negociações no âmbito do reino do Brasil, a previsão da Constituinte na América viabiliza a

negociação das autonomias provinciais, além de representar um espaço institucional de controle

do governo do Rio de Janeiro. 58 Nas palavras de Antonio Carlos Andrada: “(...) Nesse estado a Commissão se viu no triste dilema de, ou desmembrar o Brazil em provincias separadas, e ir de fronte contra a vontade daquelle Reino, produzindo assim a separação, ou conceder esse poder legislativo [Congresso no Brasil]; mas como a Commissão queria a união, buscou salva-la de modo que não atacasse defronte a vontade daquelles povos, nem os principios reconhecidos; se porém se acharem outros meios melhores, a Commissão não duvida dicutilos, e por minha parte, sendo convencido, não duvidarei aceitalos.” - Diário das Cortes Constituintes de Lisboa, sessão de 26 de junho de 1822, p. 562.

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O Ato Adicional, formulado pela Comissão de Negócio do Brasil, descreve um tipo de

organização federativa. Preston King59 nos fornece uma definição muito útil que prima pela

diferenciação entre a organização do Estado e a ideologia: a origem do contrato político

nacional não define a federação. Isso permite desvincular os princípios republicanos da

organização federativa e dessa forma compreender uma possível conciliação entre os princípios

monarquistas liberais constitucionais e um pacto de tipo federativo. Como ficou evidente na

análise até aqui, essa é uma das questões aventadas pelos deputados. Entretanto, o historiador

deve analisar essa relação necessária – da federação com as idéias republicanas e, portanto,

qualifica-se como inconstitucional a organização federativa em uma monarquia constitucional -

como um argumento político, não como fato ou conclusão analítica60.

Nesse sentido, King mostra que o cerne da definição de uma federação consiste em três

elementos fundamentais: o primeiro é a divisão constitucional de atribuições entre o centro e as

“partes”, visível no Ato na existência de mais de um Congresso legislativo, mais ainda, no

prognostico de políticas provinciais. O segundo é visível nas atribuições e organização do

Congresso Geral defendido pela Comissão de Negócios Brasileiros (artigo 11º), isto é, em uma

federação deve existir um centro com procedimento decisório, em que todas as “partes” da

nação se reúnam e o constituem de forma que esse faça parte do poder, ao mesmo tempo em que

combine todos os poderes – Legislativo, Judiciário e Executivo. O terceiro e último elemento é a

possibilidade das “partes” contratantes, no caso dos artigos adicionais à Constituição

portuguesa, os Reinos e as províncias, de legislarem na localidade:

“A federation is a state which is constitucionally divided into one central and two or more territorial (regional) governments. The responsibility of the centre is nation-wide while that of the territories (regions) is mostly local. The central government is not sovereign in a manner which excludes the involvemente of the regional units. This is because these units are constitutionally incorporated into the centre for certain purposes, as to do with the way in which the cente’s legialture is constituted or its executive appointed or constitucional amendments enacted. The sovereign element in a federation always consist accordingly of t least three or more bodies – that is the centre plus the two or more regional/cantonal/provincial/states unit. Political (...)”61

Logo, pelos próprios deputados é atribuído ao Ato Adicional o significado de uma federação. O

caráter federativo estaria fundado na divisão de soberania da nação em mais de um Legislativo,

lócus da soberania por excelência. Mas, no preâmbulo do Ato, a afirmação é a de que a

soberania da nação reside no Congresso geral, em que se reúnem todos. Dessa forma, retoma-se

a idéia de uma representação provincial, afirmando que a representação para ser nacional

depende da reunião de suas várias “partes”. A natureza do Congresso em que se decidem as leis

interiores possui outra natureza. A diferença reside na particularidade do regime nos trópicos, 59 KING, Preston. Federalism and Federation. Baltimore: The Johns Hopkins University Press, 1982. 60 Elazar (ELAZAR, Daniel. Exploring federalism. Alabama: the University of Alabama Press, 1987.) não faz essa diferenciação entre a ideologia e a organização do Estado e por isso, acaba reproduzindo a doutrina como organização de Estado. 61 Op. Cit., King, 1982, pp. 139-140.

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considerado em infância em relação à Europa, apontando para a necessidade de um legislativo

na América que funcionaria também como um controlador do Executivo62.

A idéia do pacto como uma construção política era encarada como radicalizada na idéia

de uma federação para as relações do Império português. Essa organização rompia diretamente

com a idéia de uma história comum dos portugueses dos “quatro cantos do mundo” ao

reconhecer uma influência anglo-saxônica em detrimento da fundação por excelência da história

e tradição romana e depois ibérica. Com tudo isso em conta, a idéia do deputado Girão é da

defesa de uma filiação política com experiências parlamentares específicas:

“Ora eis-aqui uma bella união!!! O Brazil he muito grande, e muito rico, mas ninguém me negará que os Estados Unidos ainda são mais, logo se assim se unem as nações, como diz o projecto, podemos unir-nos aos Estados Unidos; lá tem um Congresso, cá temos outro, está a união feita. Igualmente nos podemos unir à Gram-Bretanha, á Hespanha, á França, e até a Turquia; pois que também tem o seu Divan, que he mui similhante ao Governo, e Conselho Excellentissimo do Rio de Janeiro. Em verdade, Sr. Presidente, não sei quem deu taes poderes aos ilustres Autores do projecto, pois as nossas procurações oppõe-se a isto, autorizando-nos para fazer uma Constituição fundada sobre as bases da Hespanhola, e estas bases não admitem dois Congressos, isto seria fazer um monstro com duas cabeças, e pretender que a arvore da liberdade tivesse dois troncos. (...)”63

As objeções ao Ato Adicional se concentram nessa argumentação: a organização

pretendida pelo Ato se refere a uma filiação inglesa – a idéia de uma segunda câmara - que é

inconstitucional com o principio já jurado de uma monarquia constitucional, na qual a soberania

da nação é una e concentrada, oriunda e representada no Legislativo. O deputado Moura prefere

vários executivos e judiciais provinciais do que dois legislativos em cada Reino Unido:

“(...) Se acaso se tratasse de uma confederação [o Ato Adicional] convenho em que não seria opposto a esses principios, mas dizendo-se, que do que se trata he, d´um systema de Monarquia Constitucional, isto he, de um único governo para as distinctas províncias de um reino unido, não posso deixar de apoiar o que diz o Sr. Serpa Machado [afirma a inconstitucionalidade do Ato Adicional] (...)”64

Ele deixa claro o ponto de toda a discussão: “que outra cousa seria isto senão uma pura

federação?”65. Antonio Carlos de Andrada fala em nome de seu Ato. Ele admite a influência

inglesa valorizando-a como a mais liberal, como exemplo de um Império vasto que se mantém.

Além disso, combate a idéia da inconstitucionalidade pela valorização da idéia de opinião

pública:

“(...) se a opinião pública se mostra com energia que costuma, nem um, nem 20 Congressos, he capaz de abaala: a opinião publica, he a rainha do mundo, e ella há de vencer sempre; quem quer mudar de governo, muda sem duvida; a crize poderá ser terrivel, mas ao fim há de vencer a razão, e a constancia da opinião. (...)”66

Assim, o deputado cria uma hierarquização de argumentos no debate. Seus adversários políticos

são considerados menos liberais por primarem pela tradição por si mesma – no caso a romana -,

62 “He de evidência, que as leis geraes, interessando a ambos os Reinos, devem ser feitas por legislaturas communs a ambos, pois de outro modo sería um sujeito ao poder absoluto do outro, o que he contra os princípios constitucionaes admittidos. As leis porem do regimento interior são de outra natureza, e outra deve ser a providencia a seu respeito. (...)” – Diário das Cortes Constituintes de Lisboa, sessão de 26 de junho de 1822, p. 558. 63 Ibidem, p. 569. 64 Ibidem, p. 570. 65 Ibidem, p. 567. 66 Ibidem, p. 568.

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enquanto seu Ato Adicional reavalia as experiências constitucionais precedentes optando

racionalmente por adequá-las às exigências conjunturais do Império Luso-americano:

“(...) O que he de admirar he, que uma Nação que decanta princípios tão liberaes, não queira conceder às suas provincias ultramarinhas o que os Inglezes às colônias Inglezas. Não h colônia Ingleza que não tenha um corpo legislativo particular, sendo sanccionado pelo delegado do poder executivo, e sendo revogado somente no caso em que o Parlamento Britânico assente, que não deve ser executado. As differenças pois, que aqui se propõem, são muito pequenas. He necessário considerar, que as circunstancias dos povos do Brazil pedem que tenhão á mão quem proveja as decisões precisas. (...)”67

A soberania da nação no Ato Adicional se localiza no Congresso Geral, suas atribuições

são o que unificam as várias “partes” da nação e dão unidade a ela (artigo 11º). O Congresso

geral é responsável pela regulamentação das relações comerciais entre os reinos e os paises

estrangeiros (item 1); pela defesa do território na guerra (item 2); por analisar a

constitucionalidade das leis dos regimentos interiores de forma a não ofenderem o bem dos

Reinos (item 3); por fiscalizar a Receita e a responsabilidade dos ministros (item 6 e 7) e por

definir a moeda e pesos e medidas à nação (item 7). A esse tipo de divisão de atribuições é que

Miriam Dolhnikoff se refere como um pacto federativo, por isso, possível em uma monarquia

constitucional.

Antonio Carlos de Andrada deixa claro que a intenção do projeto não é o de unir várias

repúblicas federadas, mas manter a união do Império. A Independência dos Estados Unidos foi

um fantasma separacionista que só podia ser evitado pelo principio da federação. Esse preceito

foi negado às treze colônias e foi por isso que se tornaram republicanas quando independentes.

Dessa forma, o deputado consegue desvincular a idéia de federação da de um regime

republicano. Apesar da insistência de Antonio Carlos na defesa dessa unidade pela autonomia, o

projeto foi tido como personificação da independência para os deputados portugueses. O

Congresso recusou o Ato Adicional por 87 votos. Embora esse número incluísse alguns

deputados da América, a votação mostrou o alinhamento da maioria dos delegados americanos

com o Projeto de São Paulo.

Com a reunião da Assembléia Constituinte do Brasil, o Reino americano teria a garantia

de uma soberania separada de Portugal, como uma nação própria que podia decidir o seu destino

político conforme suas particularidades. Isso não se identificava com a independência, mas dizia

respeito à convenção do nacional como a reunião da totalidade ou da maioria das “partes” da

nação. Nesse ponto que reside a importância do significado de federação. A argumentação que

defendia o Ato Adicional dos deputados americanos não afirmava a independência, mas um

pacto que ligasse as “partes” da nação com menor centralização, isto é, com um pacto que

regulamentasse a divisão de atribuições entre os Congressos “interiores” ou “particulares” e o 67 Ibidem, p. 569.

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“geral”. Quando jurado o pacto político por todas as “partes da nação”, todos os portugueses

pertenceriam a uma mesma nação luso-americana, uma “nação inteira”. Entretanto, a defesa

desse significado de federação é em muitos momentos relativizado, o que mostra que a

interpretação da experiência hispano americana marcou o termo federação com os princípios da

fragmentação e das idéias republicanas:

“(...) O que se vê que o Brazil quer, Senhor Presidente, he uma especie de união. Esta palavra união he vaga. Uns restringem a mais, outros a menos. Em uns he quase o mesmo que federação, n’outros denota, unidade absoluta dos dois poderes sociaes. Entre estas duas opiniões he que o BRazil tem vacillado. Um espectador imparcial, e que olha para a marcha dos negócios do Brazil, vê que ao principio tendeu a uma união mais restricta, e que agora tende a uma casta de união mais frouxa. Mas nunca até agora nenhuma autoridade, nenhuma província falou em independência. (...)”68

Habilmente, o deputado Antonio Carlos de Andrada exemplifica o seu Ato Adicional

com a experiência inglesa quando admite o uso do termo federação, ao mesmo tempo, dessa

forma, ele afasta o exemplo das repúblicas hispano americanas, relativizando o significado de

federação – as vezes até negando-o - e reafirmando a união. Quando a independência do Brasil

já era clara, Andrada ainda defendia o seu Ato Adcional e a união. Nesse momento, o que

parecia ser uma federação, logo foi desmentida pelo deputado, deixando claro que “(...) faz os

povos em tudo soberanos (...) mas no projeto proposto (...) Não pode ser federação, mas sim

união”69. Desse modo, se descartava o modelo estadunidense que pretendia a independência

através da “revolução” e da constituição de uma República. Aliás, rejeitava também o modelo

jacobino que Fernandes Thomaz incorporava ao integracionismo.

Conclusões

Os trabalhos das Cortes chegaram ao fim. Quase a totalidade dos deputados do Brasil

subscreveram a Constituição, com exceção de seis deles: quatro delegados de São Paulo -

Antonio Carlos Andrada, Feijó, Costa Aguiar e Vergueiro – e dois da Bahia – Agostinho Gomes

e Cipriano Barata. No Brasil, D. Pedro recebeu no dia 07 de setembro o comunicado das Cortes

de Lisboa registrando o não reconhecimento da Constituinte brasileira, e ainda, exigindo o

retorno do Príncipe Regente. O famoso grito do Ipiranga simbolicamente marcou a Histórica

com algo que politicamente já era claro a algum tempo: a separação do Império português em

dois Reinos independentes.

O proclamado Império do Brasil se sustentava com o apoio das articulações políticas e

interesses do Centro-sul – Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Nas outras províncias as

adesões foram em muitos casos adquiridas pela coerção armada: Lord Cochrane foi encarregado

68 Ibidem, sessão de 19 de setembro de 1822, p. 496. 69 Ibidem, discurso de Antônio Carlos de Andrada.

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do Maranhã e do Pará e o francês Labatut era responsável pelo controle da Bahia. O Ato

Adicional à Constituição portuguesa, o Projeto da Junta de São Paulo e as articulações nos

bastidores em Lisboa garantiram um ponto de início para as negociações do Império do Brasil e,

mais do que isso, a fundação de uma arena de debate e negociação institucional entre as

províncias. Em maio de 1823, os trabalhos da Constituinte começaram. O empenho era na

construção do governo da província como canal de representação e unidade política de

convergência das regiões do Império do Brasil.

Portanto, o marco inicial para o debate da federação, depois generalizado na política

brasileira do Império, como Miriam Dolhnikoff70 mostra, teve como passo inicial a reflexão

aqui estudada. A partir do estudo aqui realizado, podemos lançar algumas hipótese que

funcionam como prognósticos para pesquisa. Primeiro, o pacto iniciado nas Cortes de Lisboa

entre os delegados americanos é concretizado na lei de 20 de setembro de 1823 que organiza os

governos provinciais. Suas propostas são transformadas com o fechamento da Constituinte e a

outorga da Carta Constitucional em 1824. Uma última hipótese lançada é a de que a Carta

outorgada teve sua legitimidade construída pela definição mais ampla das atribuições

provinciais do que o Projeto da Assembléia de 1823. Por esse caráter a Carta foi jurada nas

Câmaras. A forma federativa e imperial do Estado forneceu meios aos detentores de poderes

locais de manter a estabilidade interna – a unidade – além da manutenção das relações

escravistas. Isso não foi tarefa fácil: as divergências entre a divisão das atribuições entre os

poderes central e locais afetaram até mesmo o Brasil-República.

70 Op. Cit., Dolhnikoff, 2005.

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