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PASTORAIS para o BRASIL Diálogo e reconciliação em tempos de crise

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PASTORAIS para o BRASIL

Diálogo e reconciliação em tempos de crise

PASTORAIS para o BRASIL

Diálogo e reconciliação em tempos de crise

VÁRIOS AUTORES

Copyright © Editora Ultimato

Todos os direitos reservados Primeira edição eletrônica: Maio de 2016Capa e diagramação: Bruno MenezesPreparação: Equipe Ultimato

Publicado no Brasil com autorizaçãoe com todos os direitos reservados pela

EDITORA ULTIMATO LTDACaixa Postal 4336570-000 Viçosa, MGTelefone: 31 3611-8500 — Fax: 31 3891-1557

www.ultimato.com.br

PASTORAIS PARA O BRASIL

CATEGORIA: Aconselhamento | Liderança | Vida cristã

Sumário

Apresentação 5

Ouvidos bem abertos e boca bem fechada 6— Por Elben César

A reconciliação e o mistério do perdão triangular 8— Por Rubem Amorese

Boas novas de reconciliação 11— Por John Stott

Respeito quando ouvimos 13— Por John Stott

Cadeias do perdão 17— Por Wadislau Martins Gomes

Prática do Amor 19— Por Elben César

O dever terrível 25— Por C. S. Lewis

Construtores da Paz 27— Por Carlos Queiroz

Os mártires da ideologia étnica em Ruanda 32— Por Antoine Rutayisire

Chega de ódio! 41— Por Jake Deshazer

Apresentação

PASTORAIS PARA O BRASIL - Diálogo e reconciliação em tempos de crise é mais um livro digital que a Editora Ultimato oferece graciosamente aos seus leitores. Os textos aqui reunidos têm em comum a preocupação com o diálogo, a prática do perdão e o ministério da reconciliação entre os evangélicos brasileiros.

Pastorais para o Brasil reúne uma preciosa seleção de textos retirados da revista e de livros publicados pela Editora Ultimato. Em especial, queremos ajudar a igreja brasileira a conversar melhor sobre os desafios políticos do país. Enfim, queremos melhorar o nível do debate. Somos, igreja brasileira, construtores da paz. E, nossa realização e bem-aventurança é sermos pacificadores.

Com a publicação de Pastorais para o Brasil, a Editora Ultimato quer compartilhar com o leitor a produção e contribuição dos seus autores sobre temas importantes da fé cristã, bem como ajudar os cristãos a entender melhor e vivenciar o conteúdo das Escrituras.

Os Editores

Ouvidos bem abertos e boca bem fechada

— por Elben César

Lembrem disto, meus queridos irmãos: cada um esteja pronto para ouvir, mas demore para falar e ficar com raiva. – Tg 1.19

O QUE É MAIS FÁCIL, abrir os ouvidos ou a boca? O que deve vir primeiro, o ouvir ou o falar? Qual destas partes do corpo humano é mais importante: os ouvidos ou a língua?

A precipitação é mais um problema da fala do que da audição. Prático como demonstra ser em toda a carta, Tiago aconselha: cada um de vocês esteja mais pronto para ouvir do que para falar, seja mais rápido no ouvir e mais lerdo no falar, aprendam a primeiro ouvir e depois falar. É preciso disciplinar-se quanto a isso.

O controle da língua já havia sido prescrito no livro de Provér-bios: “Quanto mais você fala, mais perto está de pecar; se você é sábio, controla sua língua” (10.19) e “Quem toma cuidado com o que diz está protegendo a sua própria vida, mas quem fala demais destrói a si mesmo” (13.3).

OUVIDOS BEM ABERTOS E BOCA BEM FECHADA 7

Mas Tiago foi mais longe: é para ser lento para falar e lento para ter raiva. Uma coisa e outra. Essa frase pode ser traduzida assim: “todo homem deve ser pronto para ouvir, ponderado no falar e moroso em se irar” (HR). O crente não deve acender o pavio da cólera, não deve provocar a ira numa desastrosa explosão de gênio, não deve abrir a válvula da raiva. Quando dominado pela ira, a primeira reação do ser humano geralmente é gritar; só depois ele toma outras providências, cada vez mais drásticas.

Controlando a língua, ele controla a ira. Vem a propósito o conselho de Paulo: “Se vocês ficarem com raiva, não deixem que isso faça com que pequem e não fiquem o dia inteiro com raiva” (Ef 4.26). Mais à frente o apóstolo insiste: “Abandonem toda amargura, todo ódio e toda raiva. Nada de gritarias, insultos e maldades!” (Ef 4.31). Os chamados “acessos de raiva” são obras da carne (Gl 5.20). Enquanto a ira não for embora, é de todo prudente ficar de boca fechada.

A língua amarrada faz mais do que a língua solta!

Texto retirado de Refeições Diárias com os Discípulos, p. 33.

A reconciliação e o mistério do perdão triangular

— Por Rubem Amorese

O APÓSTOLO PAULO nos informa que Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo e que nos deu o ministério da reconciliação, fazendo-nos seus auxiliares nessa missão gigantesca (2Co 5.18-20).

Em que consiste essa comissão? Como cumpri-la, se nem sequer compreendemos seus mecanismos?

Pensei em puxar o fio da meada investigando o mistério da graça de Deus, mas achei a tarefa difícil demais. Optei, então, por partir das nossas próprias experiências, com o auxílio da Palavra.

Eis uma lição prática, de Jesus: “Deixa perante o altar a tua oferta, vai primeiro reconciliar-te com teu irmão; e, então, voltando, faze a tua oferta” (Mt 5.24). 

A RECONCILIAÇÃO E O MISTÉRIO DO PERDÃO TRIANGULAR 9

Sempre reverente diante do mistério, gostaria de extrair três lições dos dois textos bíblicos mencionados. E depois refletir sobre elas.

A primeira lição é que Deus se envolve com as brigas de seus filhos. A tal ponto que toda ira, separação ou ruptura assumem uma dimensão triangular: eu, meu irmão (ou inimigo) e Deus. “Quer me agradar? Então vá e se acerte com seu irmão; então volte e me ofereça esse gesto. E isso me será agradável”.

A segunda é que tanto o “devedor” quanto o “credor” estão envolvidos nesse triângulo, sem que o comportamento de um seja condição para o do outro. A um Deus diz: “Deixa no altar a tua oferta e vai procurar teu irmão”; a outro diz: “Se teu irmão te procurar, arrependido... perdoa”. Mais ainda: “Se teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer... abençoa”.

E a terceira lição é: quando Jesus me diz para deixar no altar minha oferta e procurar meu irmão, não esclarece se vou na condição de “devedor” ou de “credor”. Se eu me lembrar que ofendi meu irmão, devo procurá-lo para pedir-lhe perdão; mas o que faço se me considero “credor”? Devo procurá-lo, mesmo assim? Nesse momento, me vem à mente nosso exemplo maior. Não foi isso que Deus, em Cristo, fez? (Fl 2.7). Na encarnação, o ofendido nasceu, como criança, entre seus ofensores. E seu ministério entre nós envolveu o bater às portas...

Porém – dirá você –, e se aquele a quem ofendi nem me receber? Ou se meu ofensor me disser que nada me deve? E se eu achar que não devo nada ao irmão que me procura dizendo que o ofendi?

Sugiro que, neste momento, alcemos voo da fria mecânica do perdão para a dimensão da graça e do poder de Deus. Aqui, a triangulação se torna essencial. E a resposta que encontro a essas perguntas é uma só: oração. Passo a orar pelo irmão a quem ofendi, ou pelo irmão que me ofendeu, ou mesmo pelo irmão que diz que eu o ofendi. Oro para abençoar. Passo a orar insistentemente, inclusive por mim mesmo, pedindo que Deus me dê condições de prosseguir.

PASTORAIS PARA O BRASIL10

 Primeiro, peço o bem; em seguida, desejo o bem; e, finalmente, disponho-me a ser agente ou canal desse bem. Eis uma progressão emocional misteriosa. A princípio, cheia de impossibilidades. Contudo, prossigo em obediente oração. Se meu irmão não me perdoa, vou a Deus e oro por ele; se meu inimigo não me recebe, diante de Deus lhe ofereço “perdão liminar” (perdão a quem não o pediu). O resultado de tudo isso é o triângulo funcionando; e o ministério da reconciliação em curso.

“Mas nada mudou! Eu orei tanto...” – alguém poderia dizer.Nada mesmo? Observe melhor seu coração. E veja o que

Deus já fez.

Texto retirado da edição 338 da revista Ultimato.

Boas novas de reconciliação

— Por John Stott

Tudo isso provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo e nos deu o ministério da reconciliação.

– 2 Coríntios 5.18

DENTRE AS QUATRO principais expressões que aparecem no Novo Testamento como metáforas de expiação (propiciação, redenção, justificação e reconciliação), reconciliação é compreen-sivelmente a mais popular, por ser a mais pessoal. E das quatro principais passagens do Novo Testamento que falam sobre recon-ciliação, a de 2 Coríntios 5 é a mais notável e completa. Há três personagens envolvidos na trama:

Primeiro, Deus é o autor da reconciliação. “Tudo isso provém de Deus” (v. 18). Há oito verbos principais neste parágrafo e todos têm Deus como sujeito. A iniciativa partiu dele. Assim, qualquer relato de expiação que tira a iniciativa de Deus para concedê-la a Cristo, ou até mesmo a nós não pode ser bíblico.

PASTORAIS PARA O BRASIL12

Segundo, Cristo é o agente da reconciliação. “Deus é o autor e Cristo, o agente” — essa frase resume tudo. Os versículos 18 e 19 falam de Deus reconciliando “por meio de Cristo” ou “em Cristo”. P. T. Forsyth afirma: “Deus em Cristo estava ‘reconciliando’... reconciliando de fato, concluindo a obra.

Não era uma tentativa preliminar... a reconciliação foi consumada na morte de Cristo”. Como isso aconteceu? De duas maneiras: negativamente, Deus se recusou a levar em conta os nossos pecados (v. 19); positivamente, ele “tornou pecado por nós aquele [Cristo] que não tinha pecado” (v. 21) a fim de que em Cristo pudéssemos nos tornar justiça de Deus. Nas palavras de Richard Hooke: “Não importa se outros a consideram loucura ou delírio ou qualquer outra coisa. Ela é a nossa sabedoria e o nosso consolo; nenhum outro conhecimento é mais importante do que saber que o homem pecou e Deus sofreu; que Deus se fez pecado pelos homens e que os homens foram feitos justiça de Deus”.

Terceiro, somos os embaixadores da reconciliação. O minis-tério e a mensagem da reconciliação foram concedidos a nós. Assim, quando suplicamos às pessoas que se reconciliem com Deus, é como se Deus estivesse fazendo o seu apelo por nosso intermédio. Nossa primeira tarefa é expor aquilo que Deus fez na cruz e então lançar o apelo. Uma boa regra é não fazer apelo sem antes expor a Palavra, e não expor a Palavra sem fazer um apelo.

[Para saber mais: 2 Coríntios 5.11-21]

Texto retirado de A Bíblia Toda, O Ano Todo, p. 367.

Respeito quando ouvimos— Por John Stott

FAZER UMA PESSOA SE CALAR, pedir que ela se cale e se recusar a ouvi-la é tratá-la sem respeito, mas ouvi-la é expressar que percebemos seu valor. A Bíblia fala muito sobre a questão de ouvir: “O caminho do insensato parece-lhe justo, mas o sábio ouve os conselhos” (Pv 12.15); “Sejam todos prontos para ouvir, tardios para falar e tardios para irar-se” (Tg 1.19).

Tive uma experiência muito importante há cerca de quinze anos. Eu ainda era pastor da igreja All Souls. Foi nesses anos que formamos uma equipe pastoral e tínhamos em todas as segundas pela manhã uma reunião da equipe. Líamos as Escrituras e orávamos juntos, e, então, discutíamos o trabalho da igreja e examinávamos as atividades da semana que estava começando. Em uma ocasião, estávamos discutindo algo importante e, no

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meio da discussão, um de meus colegas interrompeu, virou-se para mim e disse: “John, você não está ouvindo”. Ele tinha toda a razão; eu não estava ouvindo. Achei a discussão um pouco entediante e confesso que minha mente se voltou para outra coisa. Essa contestação de um de meus colegas foi muito importante em minha vida e, daquele momento em diante, busquei a graça de Deus para ouvir. Creio que nossos relacionamentos se deterioram quando não ouvimos uns aos outros.

Deixe-me fazer três observações sobre a questão de ouvir. Primeiro, ouvir é bom em si mesmo porque demonstra respeito. Segundo, ouvir é terapêutico. Dá à pessoa que está falando a oportunidade de expressar em palavras o que a preocupa, e, quando expressamos nossos problemas em palavras, nós os diminuímos automaticamente. Nossos problemas ficam piores quando se escondem nos cantos escuros de nosso coração, mas, quando os trazemos à tona, os articulamos e os observamos, eles imediatamente se tornam menores. Portanto, ouvir uma pessoa que está revelando seus problemas é terapêutico para ela.

Terceiro, ouvir é produtivo, especialmente se estivermos ouvindo pessoas com as quais não concordamos. As pessoas que não concordam entre si normalmente se evitam. Elas se mantêm afastadas e, depois, escrevem coisas umas contra as outras e se atacam gratuitamente. Então, uma imagem grotesca dessa pessoa surge em minha mente, e posso ver claramente sua imagem, seus chifres, patas e cauda. Isso se desenvolve em minha mente quando a pessoa está a milhares de quilômetros de distância. Mas, uma vez que temos a coragem de nos encontrar, olhar-nos cara a cara e ouvir uma à outra, descobrimos, para nossa surpresa, que ela é um ser humano. E não somente um ser humano, mas um irmão ou irmã no Senhor, e alguém até razoável!

Tive uma série de exemplos assim em conferências interna-cionais. Deixe-me falar sobre uma conferência sobre a relação entre evangelismo e ação social. Houve um debate acalorado entre aqueles que acreditam que a missão da igreja é unicamente

RESPEITO QUANDO OUVIMOS 15

evangelística e aqueles para quem evangelismo e ação social caminham juntos na missão da igreja. Alguns de vocês conhecem o livro The Battle for World Evangelism [A batalha pelo evangelismo mundial], de Arthur Johnston, cuja tese pode ser resumida em quase três frases. O Conselho Mundial de Igrejas começou com um grande entusiasmo evangelístico em 1910, mas aos poucos foi perdendo seu ímpeto evangelístico. Essa análise histórica é precisa e útil. O segundo ponto é que o Movimento de Lausanne está seguindo na mesma direção. Está se tornando liberal em sua interpretação bíblica e vem abraçando o evangelho social. O terceiro ponto era este: o vilão da história é um homem chamado Stott.

Johnston e eu somos bons amigos agora, mas ele escreveu parte desse livro contra mim. Então, escrevi uma carta aberta a Arthur Johnston, a qual o editor da Christianity Today concordou em publicar, de modo que ali ficamos escrevendo um contra o outro. Depois disso, no entanto, escrevi a Johnston e sugeri que fizéssemos uma conferência sobre o assunto e nos encontrássemos pessoalmente. Ele e eu poderíamos ficar no comitê organizador e nos certificarmos de que nossos pontos de vista fossem adequa-damente representados.

Foi o que aconteceu quando nos encontramos em Grand Rapids, nos Estados Unidos. Quando cheguei, quase entrei em desespero porque haviam circulado muitos comentários. A discordância era muito nítida e alguns jornais eram rudes e até maliciosos em suas críticas. Eu me perguntava se conseguiríamos chegar a algum nível de acordo.

Nos primeiros três dias não fizemos progresso, uma vez que as pessoas só queriam expor suas convicções, mas, aos poucos, começamos a ouvir uns aos outros. Prestem atenção nisto: não só ouvimos o que as pessoas estavam dizendo, mas ouvimos o que estava por trás daquilo que elas estavam dizendo, quais eram suas reais preocupações e o que elas realmente queriam proteger. Então, para nossa surpresa, descobrimos que queríamos proteger

PASTORAIS PARA O BRASIL16

o mesmo também. Uma vez que ouvimos, de fato, uns aos outros, houve esperança. O resultado foi um documento sobre a relação entre evangelismo e ação social. Não expressa um acordo total, mas, sim, um acordo muito substancial.

Texto retirado de Desafios da Liderança Cristã, p. 47-50.

Cadeias do perdão— Por Wadislau Martins Gomes

A fim de que o possuísses para sempre, não já como escravo; antes, muito acima de escravo, como irmão caríssimo.

– Filemom 15-16

PARA MUITOS, quem perdoa esquece. Talvez porque o texto “jamais me lembrarei dos seus pecados” seja mal interpretado. Poderia o Deus que tudo sabe esquecer alguma coisa? Ele se lembrou por vezes dos pecados da peregrinação. O certo é que ele não leva mais em conta os nossos pecados porque eles foram pagos na cruz. Se esquecemos o pecado, não nos lembramos do perdão (2Pe 1.9). Lembrando, podemos corrigi-lo e aprender as boas obras (Ap 2.5).

O perdão é o instrumento de Deus para a reconciliação e a restauração. Mas, continua sendo o mais difícil de todos os bens e precisa ser motivado. Por isso, Paulo revelou a Filemom o propósito de Deus para o perdão: talvez Onésimo tivesse sido afastado dele temporariamente a fim de que, depois, o retivesse

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para sempre. Depois de que? Certamente depois do perdão. Assim como o arrependimento é a volta do ofensor, o perdão é a volta do ofendido. O ofendido se arrepende da justiça própria, da ira, da inimizade, do desejo idólatra de “ser Senhor”, e atribui ao ofensor a bênção que ele mesmo recebeu de Deus: o perdão.

O perdão eleva o ofensor à altura do ofendido. Assim como em Cristo os pecadores são feitos filhos de Deus, também em Cristo o ofensor é feito irmão do ofendido. “Já não como servo”, diz Paulo, “mas como irmão” — na carne e no Senhor!

O perdão é o elemento transformador da cadeia do arrepen-dimento.

Texto retirado de Devocionais para todas as estações, p 140. [Fora de catálogo]

Prática do Amor— Por Elben César

A prática do amor é arte de nos ligarmos a Deus de modo intenso, sincero e primordial, não para obter algum benefício, mas por causa do Senhor mesmo e da vontade de ter comunhão com ele, em resposta ao seu amor.

O AMOR é o mais poderoso sentimento do gênero humano. Como tudo mais, provém de Deus, que também sabe amar e gosta de amar (1Jo 4.7). Ninguém consegue conhecer plenamente as quatro medidas do amor de Cristo – “qual é a largura, e o compri-mento, e a altura, e a profundidade” (Ef. 3.18). Elas fazem parte do insondável que ronda todos os atributos de Deus. Na verdade, não há nenhuma medida disponível para medir o amor, a sabedoria, o poder, a santidade, a misericórdia e a glória de Deus. São atributos maravilhosos demais e sobremodo elevados que não podemos atingir (Sl 139.6).

O exemplo de cimaPara chegar perto do conhecimento do amor de Deus, convém recordar que:

PASTORAIS PARA O BRASIL20

1. Deus ama – “Deus amou ao mundo de tal forma que deu o seu Filho unigênito.” (Jo 3.16)

2. Deus faz declaração de amor – “Com amor eterno eu te amei” (Jr 31.3)

3. Deus prova o seu amor – “Dificilmente haverá quem morra por um justo. Talvez haja alguém que se atreva a morrer por um homem de bem. Mas Deus demonstrou seu amor para conosco pelo fato de Cristo ter morrido por nós, quando éramos ainda pecadores” (Rm 5.7-8, na tradução da Comunidade de Taizé).

4. Deus nos ama antes de ser amado – “Nós amamos porque ele nos amou primeiro” (1Jo 4.19).

5. No final das contas, Deus é amor – “Aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor” (1Jo 4.8).

O lugar privilegiado do amor

1. Na opinião de JesusOs fariseus compilaram 1226 regras de comportamento (613 preceitos, 365 proibições e 248 mandamentos). Quando um doutor da lei perguntou capiciosamente a Jesus qual dessas regras deveria ser chamada de “o grande mandamento”, o Senhor respondeu de pronto que o amor de Deus “é o grande e primeiro mandamento”. Mesmo sem ser consultado a respeito do mandamento que deveria vir em seguida, Jesus adiantou: “O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22.34-40). Para encerrar o assunto, o Senhor explicou: “[Todas as mil e tantas regrinhas que vocês têm] nascem destas duas leis e se cumprem se vocês lhes obedecer” (Mt 22.40, BV).

2. Na opinião de PauloA mais bela apologia do amor é da lavra de Paulo e foi endereçada a uma igreja cujos membros viviam em ciúmes, contendas e

PRÁTICA DO AMOR 21

divisões. Para ele, o amor é o “caminho que ultrapassa a todos” (1Co 12.31, EP) e é mais importante que o dom de falar em línguas, o dom de profetizar, a capacidade de fazer coisas espetaculares por meio da fé e a prática heróica da caridade desacompanhada de afeto. Apesar da grande importância da fé – sem ela “é impossível agradar a Deus” (Hb 11.6) – e da esperança – que é a “âncora da alma” (Hb 6.19) – , das três virtudes teológicas (fé, esperança e amor), a maior delas é o amor (1Co 13.13).

O mandamento do amor

O amor é muito mais do que um sentimento espontâneo. Ele é uma obrigação. Não se pode esperar indefinidamente a vontade de amar. É preciso abrir o coração, forçar e cultivar o amor. É preciso remover as pedras que estão no caminho do amor. É preciso destruir seja lá o que for – tanto a antipatia inicial (aversão) como a apatia pessoal (impassibilidade) – para se chegar ao amor. Se tal coisa não fosse possível, os mandamentos do amor que estão nas Escrituras Sagradas seriam figuras de retórica.

1. É para amar a Deus com força total: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força” (Mc 12.30).

2. É para amar o próximo com a mesma intensidade e since-ridade com que se ama: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mc 12.21). O “próximo” é qualquer pessoa com a qual nos encontramos.

3. É para amar o cônjuge com amor sacrificial: “Maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a Igreja e a si mesmo se entregou por ela” (Ef 5.25). A obrigação é também da esposa: “[As mulheres idosas devem ser mestras do bem] a fim de instruírem as jovens recém casadas a amarem ao marido e a seus filhos” (Tt 2.3-4).

PASTORAIS PARA O BRASIL22

4. É para amar o irmão em Cristo com dedicação e intensidade: “Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim como eu vos amei, que também vos ameis uns aos outros” (Jo 13.34). Paulo (Rm 12.10), Pedro (1Pe 1.22) e João (1Jo 3.18) batem na mesma tecla de amor fraternal.

5. É preciso amar o inimigo e orar por ele: “Amai os vossos inimigos e orai pelo que vos perseguem” (Mt 5. 44).

Amor e comportamento

O ser humano age em função do amor, seja ele qual for, o amor permitido ou o amor proibido. O amor está na frente de seus atos, dirigindo-o e encorajando-o, tanto para o bem como para o mal. A Bíblia contém exemplos convincentes a este respeito.

1. Quando era jovem, Salomão amou ao Senhor (1Rs 3.3) e, por esta razão, andou nos preceitos de seu pai Davi e ainda construiu em sete anos o templo de Jerusalém, para o qual recrutou o serviço de 180 mil trabalhadores (30 mil cortadores de madeira no Líbano, 70 mil carregadores, 80 mil talhadores de pedra nas montanhas) e 3.500 capatazes, todos sob sua direção (1Rs 5.13-18). Quando era velho, o mesmo Salomão se apegou pelo amor a suas mulheres estrangeiras e, por esta razão, elas lhe perverteram o coração e ele construiu para as esposas idólatras vários santuários dedicados a deuses estranhos em Jerusalém (1Rs 11.1-8). Esses templos só foram derrubados mais de 300 anos depois, por ocasião do 18° ano do reinado de Josias, por volta do ano 623 antes de Cristo (2Rs 23.13).

2. Judas amou o dinheiro e então criticou asperamente a homenagem de Maria a Jesus por causa dos trezentos denários (o valor do perfume) e entregou Jesus aos principais sacerdotes por causa de trinta moedas de prata (Jo 12.1-8, Mt 26.14-16)

PRÁTICA DO AMOR 23

3. Pilatos amou sua posição de governador (Jo 19.12-16) e então passou por cima de seu senso de justiça (quatro vezes ele declarou em público “Não vejo neste homem crime algum”) e por cima do dramático apelo de sua mulher (“Não te envolvas com este justo”) (Lc 23.4, 14-15, 22; Mt 27.19).

4. Demas amou este mundo (“apaixonou-se”, na NTLH) e então abandonou o apóstolo Paulo (2Tm 4.10), depois de cooperar com ele no evangelho (Cl 4.14, Fn 224).

Amor sob disciplina

A capacidade de amar faz parte da constituição física e psíquica do ser humano. A necessidade de amar e de ser amado é tremenda e irresistível.Como a queda dividiu a raça humana entre o bem e o mal, a capacidade de amar foi duramente atingida.

1. Ama-se mais facilmente o que não se deve amar – o que pertence aos outros (seus bens, seu cônjuge etc.), o mundo e “o que nele há”, isto é “o sistema de rebelião e orgulho que busca destruir a Deus e seu governo” (A Bíblia de Genebra) ou “o conjunto das forças maléficas que se fecham para Deus e para Cristo e que procuram demover-nos de fazer a vontade de deus” (nota de rodapé da Tradução Ecumênica da Bíblia).

2. Ama-se mais dificilmente o que se deveria amar – aquele que nos amou primeiro, o próximo, o irmão em Cristo, o cônjuge, o inimigo.

3. Chega-se então à conclusão de que a prática do amor precisa estar sob disciplina. A capacidade de amar é espontânea, mas a direção do amor e a intensidade do amor são práticas que devem ser aprendidas e cultivadas.

PASTORAIS PARA O BRASIL24

Exercícios de Reflexão

1. Você já conhece a largura, o comprimento, a altura e a profun-didade do amor de Cristo?

2. Qual é “o grande e primeiro mandamento”?

3. Qual é o “segundo mandamento”?

4. Você precisa aprender a amar pessoas e coisas que agora não ama?

5. Você precisa aprender a não amar pessoas e coisas que agora ama?

Texto retirado de Práticas Devocionais, p. 153-158.

O dever terrível— Por C. S. Lewis

[UMA DAS virtudes menos populares] está inserida na regra cristã: “Ame o próximo como a si mesmo”. Uma vez que na moral cristã “o próximo” inclui o “inimigo”, nos deparamos com esse terrível dever de amar nosso inimigo.

Todo mundo diz que o perdão é uma ideia adorável, até que tenha alguma coisa para perdoar, como nós tivemos durante a guerra. E então, apenas a menção do assunto é motivo para suscitar reações de ódio. Não que as pessoas achem essa virtude sublime e difícil demais de ser obtida; elas a consideram odiosa e desprezível. “Esse tipo de assunto as deixa doentes”, dizem. E aposto que você está louco para me perguntar: “Gostaria de saber como se sentiria com a ideia de perdoar a Gestapo se fosse um judeu ou polonês”.

PASTORAIS PARA O BRASIL26

Eu também queria saber. Eu me questiono muito sobre isso. Quando o cristianismo me diz que não devo negar a minha religião, nem mesmo para escapar da morte sob tortura, também fico me perguntando o que faria se a coisa chegasse a esse ponto. Não estou tentando lhe dizer o que eu poderia fazer quanto a isso — há bem pouca coisa que eu posso fazer. O que estou tentando é falar-lhe a respeito do cristianismo.

Não fui eu quem o inventou. E ali, bem no meio dele, me deparo com isso: “E perdoe os nossos pecados, assim como nós perdoamos aqueles que pecaram contra nós”. Isso não dá margem para o pensamento de que o perdão possa ser-nos oferecido sob qualquer outra condição.

— de Mere Christianity [Cristianismo Puro e Simples]

Texto retirado de Um Ano com C.S. Lewis, pág. 238.

Construtores da Paz— Por Carlos Queiroz

Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.– Mateus 5.9

A GUERRA é o extremo oposto da paz. É a forma mais brutal e desumana das cobiças, invejas, ressentimentos entre as pessoas. A guerra transformou-se numa epidemia generalizada. Temos hoje desde guerras por diamante e petróleo até guerras étnicas, guerras pela concorrência do tráfico de drogas, guerras de gangues urbanas organizadas, guerras religiosas, entre denominações cristãs. Ouvi de um amigo vitimado pela guerra civil em Angola: “As metralhadoras estão exaustas da guerra que os homens estão fazendo”. Aquele amigo parece ter percebido mais sensibilidade, mais fadiga na rajada das metralhadoras do que no sentimento dos líderes de seu país. Tenho percebido pitadas de guerra nas palavras das pessoas. Sinto-o em frases maliciosas. Em geral, tenho encontrado pessoas armadas umas contra as outras.

PASTORAIS PARA O BRASIL28

Às vezes imagino que há um texto diabólico zunindo nos ouvidos das pessoas: “Enquanto depender de vocês, façam o máximo de guerra com todas as pessoas que vocês puderem”. Esposos que jogam suas esposas contra os filhos, e vice-versa. Líderes religiosos tentando destruir colegas de ministério. Na política e nos negócios, a guerra é declarada — salve-se quem puder. Diante deste cenário, mais do que nunca, o mundo necessita da presença de construtores da paz.

Paz em Jesus

Paz, nos Evangelhos, não é somente ausência de guerra. Pode-se viver sem guerra e assim mesmo não viver em paz. Já o discípulo pode até viver num ambiente de guerra e ainda assim continuar em paz. Como as demais bem-aventuranças, a paz é uma condição interior, um estado de espírito.

Jesus faz uma distinção entre a paz que ele concede e a paz que o mundo oferece. A paz do discípulo depende da promessa da companhia de Jesus: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como a dá o mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize (...) Vou e volto para junto de vós” (Jo 14.27-28). Noutro texto, mais esclarecedor, Jesus se expressa da seguinte maneira: “Eis que vem a hora e já é chegada, em que sereis dispersos, cada um para sua casa, e me deixareis só; contudo não estou só, porque o Pai está comigo. Estas coisas vos tenho dito para que tenhais paz em mim” (Jo 16.32-33).

Paulo escreve sobre essa “paz de Deus, que excede todo o entendimento” e que guarda o coração e a mente do discípulo (Fp 4.7). A paz, nesta perspectiva, é mais do que uma intervenção de Deus; é a presença graciosa de Deus por meio de Jesus Cristo na vida do discípulo. Presença graciosa, invasão de Deus que gera segurança, tranquilidade, descanso. Imagine a criança que se sente segura simplesmente por desfrutar do colo paternal. Você já viu uma criança perdida na rua ou numa praia? Já observou

CONSTRUTORES DA PAZ 29

a expressão de alívio desse pequenino ao encontrar a mãe? O ambiente externo de encontro da criança com a mãe continua o mesmo; o que muda, de fato, é o seu estado de segurança interior. Esta analogia, por aproximação, pode ajudar-nos a entender o que significa descansar nessa paz propiciada pela companhia de Deus.

Intimidade paterno-filial

Paz é uma condição de amizade com Deus. Paulo diz: “Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus, por meio de nosso Senhor Jesus Cristo (...), por intermédio de quem acabamos agora de receber a reconciliação” (Rm 5.1, 11). Na verdade, a mais desgraçada de todas as guerras é aquela em que as pessoas se constituem inimigas de Deus. A verdadeira paz é marcada pela intimidade paterno-filial com o Pai — mulheres e homens que, de tão amigos de Deus, “serão chamados filhos de Deus”. Esse estado de pertencimento dá ao discípulo a certeza de proteção, acolhimento, plenitude.

E, claro, os filhos de Deus são tão pacificadores quanto o Pai. Não são pacificadores para serem chamados filhos de Deus; pelo contrário, por serem filhos de Deus, tornam-se construtores da paz, e por isso são felizes.

Jesus, o Príncipe da Paz, preferiu a cruz a apelar para a espada de Pedro, ou mesmo uma legião de anjos para guerrear em seu favor. O Príncipe da Paz sabia que através da cruz estaria recon-ciliando consigo o mundo. Pendurado no madeiro, estaria sendo o elo de ligação entre os seres humanos e Deus, e das pessoas entre elas mesmas. A cruz era, na verdade, uma forma de banir o paradigma da guerra, era uma maneira de construir uma cultura de paz, um modus vivendi vital a todo ser humano. Fora dessa condição natural as pessoas são infelizes.

Tenho tido a chance de intermediar conflitos familiares, em igrejas, em comunidades; e, por mais simples ou graves que sejam as situações, percebo que o problema está no estado emocional

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das pessoas, ou na cultura de guerra instalada no ambiente. É impressionante como, em muitos casos, as mesmas pessoas que estão interessadas em propósitos idênticos, propósitos bons, podem viver numa situação de guerra infernal. Tenho amigos que se consideram inimigos entre si. Quando mantenho contato com cada um eles, vejo-os como seres humanos especiais; todavia, se estiverem juntos, são capazes de destruir um ao outro. Até imagino que sejam pessoas com paz interior concedida pela graça de Deus, mas tudo indica que a habilidade “artesanal” de construir a paz não faz parte da cultura de suas vidas. Possivelmente aprenderam a viver num cenário de guerra, numa espiritualidade de competição, num paradigma de vencedores e vencidos. E desse modo, por mais que se esforcem, não conseguem entender o caminho do perdão, são incapazes de manusear os instrumentos da reconciliação. No ambiente de guerra, a grande alegria do guerreiro é ver seu inimigo sendo esmagado, humilhado, punido. Já o discípulo acolherá o mesmo evento com profundo pesar e tristeza. Não está na natureza do discípulo alegrar-se com a humilhação de ninguém. Sua memória está programada para vislumbrar abundância de paz. A cosmovisão do discípulo não consegue decodificar com passividade os campos de concentração, esquemas de guerra. Somente os infelizes encontram uma espécie de prazer sádico na construção de tais ambientes.

Serão chamados filhos de Deus

Fico impressionado com as pessoas que pregam o evangelho como se estivessem fazendo uma guerra contra seus ouvintes. Declaram que o outro é apenas criatura de Deus. “Eu, sim, sou filho de Deus”, afirmam. Jesus deixa claro em seu discurso que os pacificadores serão chamados filhos de Deus. Você deseja ser reconhecido como filho de Deus? Comece a exercitar a sua capacidade de pacificação. Não use seus métodos de evangelização como instrumento de agressão. Seja justo, fale a verdade em

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amor, use de misericórdia e, no conjunto de todas essas virtudes, mantenha no mastro a bandeira da paz.

O discípulo é feliz por ser um habilidoso construtor da paz; sua realização, sua bem-aventurança, consiste em ser pacificador. Sente-se realizado, de bem com a vida, quando, usando sua genialidade criativa, equaciona uma perfeita parceria entre a paz e a justiça. É, por natureza, um pacificador. E os pacificadores serão chamados filhos de Deus.

Texto retirado de Ser é o Bastante, de Carlos Queiroz, pág. 101-105.

Os mártires da ideologia étnica em Ruanda

— Por Antoine Rutayisire

Israel HavugimanaViveu o que pregou,

Morreu pelo que acreditava:Reconciliação.

ESTE É O EPITÁFIO no túmulo de Israel Havugimana, antigo líder de equipe da African Evangelistic Enterprise Rwanda, assassinado a tiros em 7 de abril de 1994, data do início do infame genocídio dos tutsis de Ruanda. Israel não era tutsi, ele era hutu, porém, a partir de suas convicções cristãs, ousou se opor e desafiar o ódio e as divisões étnicas. Israel é um verdadeiro mártir, uma testemunha que vive o que prega, e foi morto por causa de suas crenças religiosas e outras convicções. E ele é um dos casos entre muitos outros cristãos corajosos de Ruanda que foram perseguidos e ainda assim se recusaram a reverenciar o ídolo étnico. Alguns foram ameçados e abusados verbalmente, outros foram espancados e até mortos. Muitos desistiram, outros sustentaram suas opiniões e aguentaram as consequências.

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O objetivo deste estudo de caso é pesquisar como esses mártires resistiram à ideologia etinicista de segregação desde seu começo, nos anos 60, até culminar no terrível genocídio de 1994, no qual mais de um milhão de tutsis e hutus moderados foram mortos em menos de cem dias entre 7 de abril e 4 de julho. Uma pequena introdução é oferecida para explicar o contexto e as causas dessa loucura; em seguida, alguns casos de bravura de cristãos são apresentados e, finalmente, lições são tiradas para inspirar a forma como fazemos missão em diferentes contextos de coexistência e conflitos étnicos, tribais e raciais.

Entendendo a loucura

Ruanda é um país pequeno, espremido entre outros países no coração da África, com uma população de cerca de 10 milhões de pessoas cujas origens remontam a três grupos sociais: hutus, tutsis e twas. Os tutsis eram predominantemente criadores de gado, os hutus eram agricultores e os twas, caçadores e oleiros. A partir do nono século depois de Cristo, Ruanda se expandiu em um grande reino sob a liderança de reis tutsis, originários do clã banyiginya. O poder continuou nas mãos deles até 1959, quando, sob o estímulo e o apoio dos poderes colonizadores da Bélgica, os hutus se voltaram contra a liderança dos tutsis e os destronaram em um banho de sangue no qual mais de 30 mil pessoas foram mortas e mais de 300 mil foram enviadas para o exílio em países vizinhos, onde ficariam em campos de refugiados até 1994. Foi a segunda geração desses exilados – os filhos que cresceram nos assentamentos de refugiados – que, cansados de viver sem país, formaram a Frente Patriótica Ruandesa (RPF em inglês) e atacaram o país em 1990, deflagrando o efeito dominó que culminaria no genocídio de 1994 contra os tutsi. Esta é uma breve contextualização para estabelecer o cenário de nossa discussão do tema central deste capítulo.

Dizer que hutu, tutsi e twa são “grupos étnicos” ou “tribos” é usar termos impróprios porque esses três grupos sempre

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estiveram juntos desde tempos imemoriais e têm a mesma cor de pele, o mesmo idioma e a mesma cultura, vivendo perto uns dos outros em todo o território nacional. Não há algo como a vila dos hutus, a vila dos tutsis, a vila dos twas; não há o dialeto ou os costumes de cada um desses grupos. Essa situação desafia todas as definições científicas e antropológicas de grupo étnico, raça e tribo. Por conveniência usarei a expressão “grupo étnico” neste artigo. Algumas pessoas frequentemente perguntam como o genocídio poderia acontecer nesta situação, na qual não é fácil distinguir umas pessoas das outras através de suas características físicas e linguísticas. Para início de conversa, Ruanda é um país predominantemente rural, e as pessoas que sempre moraram próximas umas às outras conseguem definir facilmente seus ancestrais. Além disso, o colonizador introduziu um sistema de cartões de identidade diferenciados conforme a etnia, um sistema que foi mantido mesmo depois da independência e foi muito útil em ajudar a identificar quem deveria morrer e quem deveria ser poupado durante o genocídio.

O cristianismo e o problema da identidade étnica

O cristianismo chegou a Ruanda no começo do século 20 e, na época do genocídio (1994), o país contava com 90% de sua população de cristãos, sendo a maioria católica romana (63%) e uma presença que não se pode menosprezar de 27% de protestantes. A contradição de um genocídio em um país predominantemente cristão levantou muitas perguntas sobre o tipo de cristianismo que tínhamos no país. Como a etnia se tornou mais poderosa do que a fé cristã? Como cristãos podem se voltar contra outros cristãos em nome de diferenças étnicas? Será que lá havia cristãos que viviam sua fé e não negariam ao Senhor? Será que havia cristãos que aceitariam morrer com e pelos seus irmãos e irmãs? O que os motivava? O que os fortalecia? Que lições podemos aprender com eles? Essas são as principais questões que este artigo tenta responder.

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Está bem documentado que os primeiros missionários católicos vieram com a clara filosofia de missão de “converter os chefes locais para alcançar os cidadãos comuns mais facilmente”. Eles decidiram favorecer abertamente os chefes tutsis e seus filhos em seus programas de educação, tanto que o bispo Leon Classe, o primeiro primaz católico romano, veio a ser conhecido como o “pai da etnicidade em Ruanda”.1

Esta estratégia planejada rendeu seus frutos quando o rei Mutara Rudahigwa quis ser batizado em 1941 e, sob a inspiração e orientação do mesmo bispo Leon Classe, dedicou o país para Cristo Rei em 1946. Esses dois fatores desencadearam a “conversão nacional” à la Constantino, com a maioria dos chefes e subchefes seguindo o exemplo e sendo batizados. Em seguida, um grande número de pessoas comuns seguiu o fluxo sem muita mudança de caráter ou estilo de vida. Alguns dos missionários perceberam o perigo e questionaram o movimento, mas não conseguiram impedi-lo. O cristianismo nominal se tornou a norma, com muito sincretismo. As identidades étnicas não foram atingidas, pelo contrário, foram transferidas para dentro da igreja. Não era incomum (e ainda não é), por exemplo, ouvir falar de uma família tutsi que se recusou a dar a filha em casamento a uma família hutu, apesar de ambas frequentarem a mesma igreja. Era – e ainda é – inconcebível para alguns pensar em compartilhar o mesmo copo na Santa Ceia com um irmão ou irmã twa.

A maior falha da igreja, no entanto, se manifestou quando a etnia foi vagarosa e continuamente se tornando uma ideologia nacional e foi usada como uma pedra fundamental para o sistema político quando os hutus tomaram o poder em 1959. O que o bispo Classe tinha sido para o rei Mutara Rudahigwa, o novo primaz católico, bispo Andre Perraudin se tornou para o novo líder hutu Gregory Kayibanda, que antes tinha sido primeiro-secretário do bispo e passou a seu protegido político e seu mentoreado. A ideologia étnica que mais tarde culminou no genocídio foi gerada debaixo das asas da liderança da igreja.

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Quando a questão étnica estava passando de realidade social a ideologia política, aqueles que se opuseram a isso em nome dos direitos humanos ou da fé cristã foram perseguidos e até mortos.

Como a Igreja Católica Romana dominava a maior parte do sistema político, as outras igrejas não disseram nada e não vimos nenhuma levantando sua voz para lutar contra os sistemas injustos que se desenvolviam. Os bispos católicos que não apoiavam a causa sofreram grande perseguição. Já nos anos 60, o bispo Aloys Bigirumwami fez grande oposição aos desdobramentos das novas ideologias étnicas, porém seu superior, o bispo Perraudin, que estava em conluio com os poderes colonizadores e o novo regime hutu, conseguiu manter essa influência contrária à distância. O bispo Bigirumwami nunca abandonou sua forte convicção e chegou a ser forçado a se aposentar de forma prematura e morreu decepcionado, vivendo em sua casa de repouso isolada, à margem do lago Kivu. O caso mais chocante foi o do bispo Bernard Manyurane, que teria sido assassinado pela própria liderança da sua igreja. “A informação extra-oficial é de que ele foi envenenado por ter se recusado a seguir o caminho traçado. [...] Um bispo hutu que não era a favor da ideologia do seu grupo étnico era insuportável.”2

A situação piorou quando a identidade étnica se tornou o centro do conflito em 1990, quando a já mencionada RPF dos assentamentos de refugiados decidiu usar o poder de armas, uma vez que seus pedidos pacíficos para voltarem à terra natal não foram ouvidos. A RPF nunca usou a propaganda étnica, mas o governo hutu instalado em Kigali mobilizou todos os recursos para polarizar a população quanto às fronteiras étnicas. A propaganda de ódio foi espalhada em papéis, em discursos públicos e até nas igrejas. Naquele momento, a identidade cristã de todos nós passou por teste e foi quando um grande número de verdadeiros mártires surgiram. Tutsis foram perseguidos e mortos por causa de sua etnia e não serão considerados mártires neste contexto. Um grande número de hutus sofreram

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porque rejeitaram a ideologia de ódio e segregação de sua etnia, alguns fazendo isso por convicções pessoais, outros por causa de sua filiação a partidos políticos que eram contra essa linha pensamento e outros por causa da fé cristã. Em meu livro Faith Under Fire: Stories of Christian Bravery (1996), compilei e documentei testemunhos de cristãos que colocaram suas vidas em risco para salvar outros durante o genocídio. Eis dois casos extraídos desse livro:

Israel era um homem que vivia o que pregava... e frequentemente ele pregava contra ódio e segregação étnica. Nos massacres de 1972–1973 contra os estudantes tutsis, ele protegeu um colega tutsi aluno da Escola Secundária Shyogwe, cobrindo-o com seu próprio corpo e recebendo as surras até que conseguiu tirá-lo do alcance dos que o atacavam. Durante as tensões étnicas de 1990–1994 que levaram ao genocídio, Israel se manteve fiel ao seu compromisso cristão, liderando um ministério de reconciliação ao redor do país. Mas sua posição e sua eterna amizade com irmãos e irmãs tutsi eram vistas com maus olhos pelos extremistas hutus, e um grupo etnicamente diversificado de estudo bíblico que se reunia em sua casa toda terça-feira à noite foi erroneamente interpretado como uma reunião política para apoiar os rebeldes tutsis. Em fevereiro de 1994, uma granada de mão foi jogada na sala da sua casa como um aviso. Nós, então, nos reunimos para discutir a possibilidade de interromper nossas reuniões de estudos bíblicos para não comprometê-lo ainda mais. “Que testemunho cristão isso seria?” – ele nos perguntou – “Me afastar dos meus irmãos e irmãs em Cristo porque eles estão na mira! Eu sempre preguei a reconciliação e vou viver isso mesmo que tenha de pagar com minha vida”. Dois meses depois, ele pagou! No primeiro dia do genocídio contra os tutsis, Israel foi assassinado a tiros juntamente com suas três filhas, seu pai, que o estava visitando, seu empregado doméstico e outro hóspede que não foi identificado.

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Padre Jean Bosco Munyaneza era o curador da paróquia católica de Mukarange quando o genocídio começou. Muitos tutsis da área decidiram se refugiar na igreja dele, pois, em massacres anteriores, aqueles que se refugiaram na igreja e nas adjacências não foram incomodados. Só que dessa vez foi diferente! Os soldados e as milícias atacaram a igreja e, como o padre Bosco era hutu, pediram-lhe que saísse de lá. Eles imploraram para que saísse, mas ele foi firme: “Estas são ovelhas que o Senhor me deu para que eu cuidasse delas. Se elas devem morrer, eu devo morrer com elas. E se vocês quiserem salvar a minha vida, salvem as delas também”. As milícias, irritadas com a postura firme do pároco, recuaram e jogaram uma granada de mão no meio do grupo onde ele estava. Muitas pessoas foram feridas e o padre morreu alguns minutos mais tarde.

Uma observação cuidadosa das diferentes histórias no livro mostra que há diferentes reações entre os cristãos quando eles enfrentam injustiça social e violência étnica: 1) Do extremo negativo, há os líderes de igrejas e cristãos que abandonarão a fé e pactuarão com o seu “grupo étnico”. Em muitos casos, essas são pessoas cuja identidade étnica foi reforçada e a sua fé nunca foi desafiada. Por fora são cristãos, mas no seu íntimo são mais membros do grupo étnico do que do Povo Santo de Deus. 2) No meio está uma grande multidão que, por medo, não faz parte do conflito, mas também não tenta ajudar. Os de cima do muro vão fugir quando chegar a hora e a melhor tática dos perversos é transformar os bons em pessoas pacíficas em cima do muro. 3) O terceiro grupo é formado por aqueles que tomam atitudes para denunciar a ideologia e os atos de violência ou que se colocam silenciosamente ao lado dos oprimidos e os ajudam a se esconder ou a fugir. Os mártires da fé sempre virão deste último grupo. E é daqui que vem a ideia de que o martírio é um ato de amor. Cheios de amor pelo próximo e de fé em Deus, eles ousam desafiar o sistema até a morte, se necessário. Um escrutínio cuidadoso desse grupo mostra um denominador comum: essas

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são pessoas que conhecem seu Deus, conhecem o seu chamado como testemunhas de Jesus, mesmo em situações perigosas, e que têm uma clara compreensão de suas identidades em Cristo.

Conclusão

Muitas lições podem ser tiradas do caso de Ruanda. Primeiro, violência tribal ou étnica em um contexto predominantemente cristão é o que se chama de falha em missões. Quando as pessoas vêm a Cristo sem um senso de se tornarem “nova criatura”, quando elas vêm a Cristo sem se tornarem cidadãs do Povo Santo de Deus, dentro do qual não há gregos ou judeus, nem hutus, tutsis ou twas, então algo saiu errado no processo missionário. É fácil se regozijar pelo número de convertidos e batizados fazendo vista grossa quanto à qualidade do caráter que Cristo espera de seus discípulos. Quando o sangue do nosso ancestral fala mais alto do que o sangue de Cristo, estamos vivendo uma identidade cristã falha. Questões de etnia, tribalismo, racismo e outros “ismos” são sintomas de um cristianismo sem uma clara identidade cristã. Quando não usamos a mensagem da cruz para sanar as divisões em nossas comunidades, falhamos em nossa missão como cristãos. Além disso, as pessoas deveriam ser ensinadas e treinadas para articular uma teologia para sua nova identidade com sua missão na sociedade. E mais, construir uma mensagem de reconciliação que seja bem contextualizada deveria ser parte da missão. Curar as feridas do passado que geralmente são subjacentes às ideologias étnicas é a única maneira de impedir uma futura explosão de violência entre povos.

Questões para reflexão

1. Como a igreja foi influenciada pela ideologia nacional baseada na etnicidade? Quais foram algumas das causas desse enten-dimento antibíblico? Como os líderes da igreja contribuíram para esse desdobramento incoerente?

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2. Como os cristãos reagiram ao estímulo ao ódio e à violência étnicos? O que era marcante na vida daqueles que se tornaram mártires por causa de seu compromisso cristão? Que preço estavam dispostos a pagar por suas convicções?

3. Que lições, nós, que temos compromisso com missões, poderíamos aprender dessa história trágica em que cristãos mataram cristãos por causa de um pertencimento étnico? E daqueles que permaneceram fiéis ao chamado cristão?

Referências

DE LACGER, L. Rwanda. Kabgayi: Imprimerie de Kabgayi, 1962.

FROST, M. Exiles: Living missionally in a post-Christian culture. Peabody, MA: Hendrickson Publishers, 2006.

GATWA, T. The churches and ethnic ideology in the Rwandan crises 1900–1994. Oxford: Regnum Books International, 2005.

MUZUNGU, B. Eglise Catholiques Pendant le Genocide. In: Cahiers Lumiére et Societé. n. 43, março de 2010.

RUTAYSIRE, A. Faith under fire; stories of Christian bravery. Buchurst Hill, Essex: African Enterprise, 1996.

Texto retirado de Sangue, Sofrimento e Fé, p. 195-202.

Chega de ódio!— Por Jake Deshazer

EM ABRIL DE 1942, quinze dos dezesseis aviões americanos que bombardearam Tóquio de surpresa caíram por falta de combustível, quando retornavam às bases, na China. Os pilotos abandonaram a tempo os bombardeiros B-25 pulando de pára-quedas. Mas um deles caiu em território ocupado pelos japoneses e foi apanhado. O resto da história, baseada no folheto “Eu fui prisioneiro no Japão” e acrescida com informações históricas, você lerá em seguida.

Eu fui prisioneiro no Japão

Meu nome é Jake Deshazer. Sou americano. Estava servindo no exército na Califórnia quando ouvi pelo rádio a notícia do ataque de surpresa que os japoneses fizeram à nossa base naval de

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Pearl Harbor, no Havaí, um aglomerado de ilhas que forma o 50º estado americano. Fiquei com tanta raiva que joguei a batata que estava em minha mão de encontro à parede e disse a mim mesmo aos berros: “Japoneses, esperem para ver o que faremos a vocês!”

Um mês depois, me alistei como voluntário numa missão secreta, comandada pelo tenente-coronel James Doolitle. Em abril de 1942, quatro meses depois do ataque de 7 de dezembro, já estávamos a bordo do porta-aviões Hornet, a 1.050 quilômetros a leste de Honshu, no Japão. No dia 18, um esquadrão de dezesseis bombardeiros B-25 atacou Tóquio e outras cidades. O assalto surpreendeu os japoneses, que não acreditavam que os aviões aliados pudessem alcançar o Japão. Por falta de combustível, quinze dos dezesseis bombardeiros caíram antes de chegar às bases na China. Um deles aterrissou na Sibéria. A resistência secreta chinesa ajudou Doolitle e 63 aviadores a se refugiarem. Eu não tive tanta sorte. Pulei de pára-quedas em território ocupado pelos japoneses e me tornei prisioneiro de guerra.

Fiquei preso durante 40 meses, de abril de 1942 a setembro de 1945, quando a guerra terminou. Fui muito maltratado pelos japoneses, o que aumentou ainda mais o meu ódio por eles.

Quando fez dois anos que eu estava em cativeiro, ganhei uma Bíblia de presente. Comecei a ler a Palavra de Deus, que pouco a pouco foi falando comigo e me transformando. A Bíblia me mostrou duas coisas muito importantes. Primeiro, que o ser humano é mau por natureza. Segundo, que Jesus veio para tirar o pecado do mundo, para nos transformar. Em pouco tempo mudei por completo de atitude para com aqueles que me capturaram. Meu ódio foi embora e, em troca, o amor encheu meu coração. Eu mesmo me espantei. Resolvi no meu íntimo que, se eu fosse libertado, um dia voltaria ao Japão, dessa vez não como militar, mas como missionário. Iria então me esforçar para que os japoneses lessem a Bíblia e encontrassem nela o que eu havia encontrado.

CHEGA DE ÓDIO! 43

Finalmente, com a vitória dos aliados, fui libertado e voltei para os Estados Unidos. Passei um tempo no Seattle Pacific College para receber treinamento missionário. Então voltei ao Japão, onde servi ao Senhor por alguns anos.

Decidi escrever a história da minha conversão em forma de folheto, ao qual dei este título: Eu fui prisioneiro no Japão. A Bible Literature International se encarregou da tradução e impressão de milhares de cópias em várias línguas, especialmente o japonês.

Eu não poderia imaginar que o homem que comandou o ataque a Pearl Harbor e me enraiveceu profundamente seria alcançado pela graça de Deus ao ler esse folheto. Hoje, eu e Mitsuo Fuchida estamos curados do ódio que tínhamos um pela nação do outro e somos irmãos em Cristo! Paulo tem toda razão quando afirma que não se envergonha do evangelho, “pois ele é a força salvadora de Deus para todo aquele que crê, primeiro para o judeu, mas também para o grego” (Rm 1.16, CNBB). Eu diria em alto e bom som que o evangelho é a força salvadora de Deus para todo aquele que crê, “primeiro para o japonês, mas também para o americano!”

Texto retirado da matéria de capa Chega de Ódio, publicada na edição 275, da revista Ultimato.

Pastorais para o Brasil - Diálogo e reconciliação em tempos de crise reúne uma preciosa seleção de textos retirados da revista e de livros publicados pela Editora Ultimato.

Com a publicação de Pastorais para o Brasil, a Editora Ultimato quer compartilhar com o leitor a produção e contribuição dos seus autores sobre temas importantes da fé cristã, bem como contribuir com o diálogo, a prática do perdão e o ministério da reconciliação entre os evangélicos brasileiros.