parte xxviii

5
Quinta da Confusão – O nascimento de um império 136 espalhava o terror na Quinta da Confusão. O touro, exausto após 4 horas de luta, deixou-se cair pesadamente no chão e não teve forças para resistir quando os 5 animais lhe ataram fortemente as patas para não fugir. Estes estavam feridos e exaustos de tanto lutarem com o touro, tinham inúmeros golpes e arranhões e mal se aguentavam em pé, mas conseguiram prender o touro. Faltava agora levá-lo de carroça para Bragança. Assim, com a ajuda de outros animais o Grupo de Oposição ao Touro colocou-o em cima da carroça de um dos membros, e atou-o firmemente ao veículo. Cansado como estava, seria muito difícil para o touro escapar. Os 5 animais subiram depois para a carroça e fizeram os cavalos avançar, afastando-se da Quinta da Confusão. Os animais da quinta tinham ouvido os donos falar dos pontos cardeais, e conheciam-nos. Por isso, os 5 animais que capturaram o touro sabiam que tinham de ir para norte, e foi nessa direcção que seguiram. Pouco conheciam do caminho para Bragança: sabiam apenas que ao fim de 10 km deparar-se-iam com uma estrada, e teriam que seguir para oeste até chegarem a Carrazeda de Ansiães. Para o resto teriam que confiar na sinalização das estradas. A viagem seria longa, mas os animais não se importavam. A jornada até serviria para descansarem, e assim os animais nem se deram ao trabalho de apressarem os cavalos. Devagar, a Quinta da Confusão foi desaparecendo até não se ver mais nada no horizonte que não o campo, rochas e árvores, tudo branco de neve. Tinham muito caminho pela frente, mas o importante era que tinham o touro bem preso e incapaz de fugir. Além disso, tinham caixas de ervas para irem comendo, portanto não passariam fome durante a viagem. Assim, apertados na carroça, os animais seguiram viagem para Bragança. Os 5 animais que tinham descoberto a uva, tal como tinham previsto hora e meia antes, puderam constatar que em muitas plantações que viam haviam parreiras a crescer, que daí a poucas horas dariam colheitas de uvas. A uva ainda era um produto raro, mas não tardaria a tornar-se banal sob os esforços dos agricultores em plantar parreiras. Assim, os 5 animais decidiram retomar a procura de uma mina de ferro que substituísse a da Quinta da Confusão. Dessa vez, optaram por ir para oeste da quinta. Subiram para os cavalos e rapidamente saíram da quinta, através de uma abertura na cerca já existente. A zona onde estavam era relativamente plana, não tendo montes muito relevantes. Havia uma excepção: um monte 300 metros a oeste da Quinta da Confusão, comprido, estreito e de encostas inclinadas, mesmo no caminho dos animais. Tinha cerca de 5 metros de altura, mas bastava para chamar a atenção. Os animais dividiram-se quando alcançaram o monte: dois seguiam pela esquerda, outros dois pela direita e o último subia ao monte. O objectivo era encontrar grutas ou buracos na elevação, mas nenhum dos animais encontrou algo. Assim, seguiram em frente deixando para trás o monte de meio km de comprimento. A 1,5 km

Upload: miguel-goncalves

Post on 14-Mar-2016

213 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Parte XXVIII de «O nascimento de um império»

TRANSCRIPT

Quinta da Confusão – O nascimento de um império

136

espalhava o terror na Quinta da Confusão. O touro, exausto após 4 horas de luta, deixou-se cair pesadamente no chão e não teve forças para resistir quando os 5 animais lhe ataram fortemente as patas para não fugir. Estes estavam feridos e exaustos de tanto lutarem com o touro, tinham inúmeros golpes e arranhões e mal se aguentavam em pé, mas conseguiram prender o touro. Faltava agora levá-lo de carroça para Bragança. Assim, com a ajuda de outros animais o Grupo de Oposição ao Touro colocou-o em cima da carroça de um dos membros, e atou-o firmemente ao veículo. Cansado como estava, seria muito difícil para o touro escapar. Os 5 animais subiram depois para a carroça e fizeram os cavalos avançar, afastando-se da Quinta da Confusão. Os animais da quinta tinham ouvido os donos falar dos pontos cardeais, e conheciam-nos. Por isso, os 5 animais que capturaram o touro sabiam que tinham de ir para norte, e foi nessa direcção que seguiram. Pouco conheciam do caminho para Bragança: sabiam apenas que ao fim de 10 km deparar-se-iam com uma estrada, e teriam que seguir para oeste até chegarem a Carrazeda de Ansiães. Para o resto teriam que confiar na sinalização das estradas. A viagem seria longa, mas os animais não se importavam. A jornada até serviria para descansarem, e assim os animais nem se deram ao trabalho de apressarem os cavalos. Devagar, a Quinta da Confusão foi desaparecendo até não se ver mais nada no horizonte que não o campo, rochas e árvores, tudo branco de neve. Tinham muito caminho pela frente, mas o importante era que tinham o touro bem preso e incapaz de fugir. Além disso, tinham caixas de ervas para irem comendo, portanto não passariam fome durante a viagem. Assim, apertados na carroça, os animais seguiram viagem para Bragança.

Os 5 animais que tinham descoberto a uva, tal como tinham previsto hora e meia antes, puderam constatar que em muitas plantações que viam haviam parreiras a crescer, que daí a poucas horas dariam colheitas de uvas. A uva ainda era um produto raro, mas não tardaria a tornar-se banal sob os esforços dos agricultores em plantar parreiras. Assim, os 5 animais decidiram retomar a procura de uma mina de ferro que substituísse a da Quinta da Confusão. Dessa vez, optaram por ir para oeste da quinta. Subiram para os cavalos e rapidamente saíram da quinta, através de uma abertura na cerca já existente. A zona onde estavam era relativamente plana, não tendo montes muito relevantes. Havia uma excepção: um monte 300 metros a oeste da Quinta da Confusão, comprido, estreito e de encostas inclinadas, mesmo no caminho dos animais. Tinha cerca de 5 metros de altura, mas bastava para chamar a atenção. Os animais dividiram-se quando alcançaram o monte: dois seguiam pela esquerda, outros dois pela direita e o último subia ao monte. O objectivo era encontrar grutas ou buracos na elevação, mas nenhum dos animais encontrou algo. Assim, seguiram em frente deixando para trás o monte de meio km de comprimento. A 1,5 km

Quinta da Confusão – O nascimento de um império

137

da Quinta da Confusão encontraram um marco que delimitava a fronteira entre os distritos de Vila Real e Bragança. Os animais sabiam que estavam no distrito de Bragança, pelo que tinham noção de que estavam a entrar no distrito de Vila Real. Quem saberia se esse distrito teria alguma mina de ferro inexplorada, para ser ocupada pela Quinta da Confusão. Os animais seguiram em frente, sempre observando o terreno à sua volta em busca de alguma gruta ou buraco. A 2,5 km da quinta de origem os animais encontraram por fim aquilo que procuravam: uma mina de ferro. Mas não da forma que esperavam. Quando os animais se deram conta, estavam perante uma larga abertura no chão, com uma rampa de terra que descia para o seu interior (os mineiros da Mina de Ferro da Quinta da Confusão usavam uma corda para entrarem e saírem da mina, porque a entrada era vertical). Ao pé da abertura haviam troncos onde estavam presos cavalos atrelados a carroças, possivelmente os dos mineiros. Uma placa ao pé da entrada da mina, escrita através de instrumentos pontiagudos, dizia «Mina de Ferro da Quinta da Perfeição». Sulcos e marcas de cascos na neve iam da mina até a uma quinta que se via muito ao fundo, a uma distância que os animais calcularam ser de 500 metros. Na quinta, quase imperceptíveis de tão longe que estavam, estavam três edifícios, um deles a deitar fumo do tecto. Era a Quinta da Perfeição, a quinta descoberta pelos 5 animais.

Os animais não sabiam como reagiriam os habitantes da Quinta da Perfeição se fossem descobertos, pelo que preferiram não dar a entender as suas origens. Amarraram as rédeas dos cavalos aos troncos que estavam a entrada da mina e entraram lá dentro. Candeeiros de ferro e de um material que os animais perceberam ser vidro, aquilo que havia nas janelas dos donos, iluminavam o interior da mina, onde vários mineiros trabalhavam escavando a terra com as patas. A entrada da mina era um átrio quadrado com alguns metros de lado, por onde saíam 5 túneis com alguns metros de comprimento. Um ia para a frente, 2 para os lados e os restantes dois para trás, descendo de nível. Em toda a mina havia animais a trabalhar, escavando a terra com as patas. No átrio troncos escoravam o tecto para não abater, sendo que a superfície não estava a mais de 2,5 metros do chão do átrio, metade da profundidade da Mina de Ferro da Quinta da Confusão. A mina não era em nada semelhante à da Quinta da Confusão, que consistia num único túnel largo iluminado por tochas e pelos altos-fornos (naquela mina não se via nem um) que trabalhavam sem parar. Tentando não provocar desconfianças, os 5 animais andaram de túnel em túnel, constatando que todos eles não tinham mais de 10 a 15 metros de comprimento. Escolheram um dos túneis que desciam de nível para trabalhar. Entraram nesse túnel, desceram a rampa que os levava aos 5 metros de profundidade e fixaram-se num local do túnel para escavar. Mas a sua verdadeira intenção era ouvir as conversas dos mineiros, para ouvirem alguma coisa que os informasse sobre a Quinta da Perfeição. Pelo

Quinta da Confusão – O nascimento de um império

138

que ouviram, a Quinta da Perfeição tinha um presidente, o porco 56, que fora eleito presidente pelos animais da quinta no Dia 4 após ter financiado a construção da primeira indústria da Quinta da Perfeição, a da madeira. Os animais não sabiam, até aí, o que era uma indústria, mas pelo que perceberam era um local onde se produzia um determinado produto em larga escala. A Quinta da Perfeição tinha três indústrias: a da madeira, a das armas e a dos minérios. Aquela mina pertencia à indústria dos minérios, e todos os mineiros que lá estavam eram trabalhadores da empresa. Os animais também ouviram que todas as 3 indústrias tinham máquinas a vapor, mas eles ficaram sem saber o que era isso.

Quando os 5 animais acharam que já tinham obtido informações suficientes sobre a Quinta da Perfeição, tentaram sair da mina sem despertar suspeitas. Um a um, regressaram ao exterior, pegaram nos cavalos e regressaram à Quinta da Confusão. Mas houve um mineiro que desconfiara deles desde tinham chegado ao túnel onde fingiram trabalhar. Os 5 animais pareciam demasiado atentos às conversas dos outros mineiros, e conversavam entre si num tom baixo sem dirigirem a palavra a mais ninguém como se partilhassem segredos. Depois, tinham-se ido embora pouco depois de aparecerem e sem uma única pedra de minério de ferro. O mineiro esperou algum tempo antes de também sair da mina, para ver onde estariam os 5 animais. Quando o fez, chegou ao exterior a tempo de ver os animais a afastarem-se a galope, na direcção oposta à da Quinta da Perfeição e da indústria dos minérios. As marcas dos cascos na neve demonstraram ao mineiro que eles tinham chegado até ali pelo caminho que seguiam agora, prova de que eles eram habitantes de outra quinta que não a Quinta da Perfeição. O mineiro não sabia se os animais tinham chegado ali por acaso ou se tinham ido espiar ao serviço do seu presidente (o mineiro não sabia que a Quinta da Confusão não tinha presidente), pelo que decidiu ir informar o presidente da Quinta da Perfeição, o porco 56, da situação. Ao contrário dos animais da Quinta da Confusão e da Quinta da Perfeição, o presidente dessa última quinta tinha uma casa fixa. A feira da Quinta da Perfeição funcionava no rés-do-chão do celeiro, e a casa do presidente era no andar de cima dessa construção. O celeiro estava no centro da quinta, pelo que o presidente podia abrir a janela da sua casa e observar a quinta que governava a 5 metros do chão. O mineiro foi então ao celeiro falar com o presidente, e explicou-lhe o que vira. O animal não duvidou do que o mineiro disse, pois sempre achara que algures haveriam outras quintas com animais racionais. Então, pagou ao mineiro para, ao seu serviço, seguir as marcas dos cavalos dos 5 animais que descobriram a Quinta da Perfeição e encontrar a sua quinta de origem. O animal aceitou, e partiu a galope para este. Ao fim de 3 km deparou-se com a Quinta da Confusão, e voltou para trás para informar o porco 56. Essa espionagem era

Quinta da Confusão – O nascimento de um império

139

só a primeira de outras que a Quinta da Confusão sofreria nessa tarde, pois ele interessou-se pela quinta e foi-lhe enviando mais espiões.

Um animal encontrou, a sul da Quinta da Confusão, uma porção de areia junto à ribeira e decidiu ir recolhê-la. Usou uma escada para saltar a cerca, e recolheu alguma areia com um balde. Mas ele não sabia o que fazer com a areia, e então entregou-a a um cientista fabricante de instrumentos para a analisar. O cientista não conseguiu encontrar nada de interessante ao observar a areia, então despejou o balde no seu alto-forno, encheu-o de lenha e acendeu-o. Ao fim de algum tempo, a areia fundiu-se e escorreu para um molde de argila posto na outra ponta do forno. Quando a areia solidificou, o cientista viu que se transformara numa substância transparente, o vidro. Inventava-se assim o vidro, o material que os donos tinham nas suas janelas. Com o modo de fabrico do vidro descoberto o cientista pôde criar janelas, que também eram uma nova invenção, fazendo novos moldes e despejando o vidro derretido lá para dentro. Quando o vidro arrefecia era só tirá-lo do molde e pô-lo no caixilho da janela. A feira e a Casa da Moeda compraram janelas para pôr nos espaços das paredes que faziam de janelas, à frente das portadas de madeira. A feira encarregou-se também de comprar e instalar as janelas para o abrigo nocturno. Mas, fora isso, não havia nenhuma aplicação para as janelas. Foi então que o cientista se lembrou de criar um novo tipo de veículo, sem semelhança com as carroças, que incluísse janelas. Projectou o veículo e, com a ajuda do animal que encontrara a areia, que era madeireiro, construiu a primeira carruagem da Quinta da Confusão.

Índice de Tecnologia:

Militar -1 (escudos de árvore) Transportes-5 (Aéreos-0) (Marítimos -2) (barco a remos de Modelo 1 e de Modelo 2) (Terrestres-3) (carroça de 2 rodas, carroça de 4 rodas, carruagem) Civil -16 (arado, foice, madeira, caixa de madeira, ferro, pregos, balde, escada, botijas de ar, machado, banheira, canalizações, corda, argola de couro, vidro, janela) Construções-5 (estufas, abrigo nocturno, Casa da Moeda, feira, altos-fornos)

A carruagem era um veículo com 4 rodas de raios, rodeadas por ferro para prevenir o desgaste e eventuais danos, o que por si só já era uma inovação (as rodas das carroças eram pedaços maciços de madeira). A carroçaria era um paralelepípedo de madeira fechado, com 2 janelas e 1 porta de cada lado. Tinha uma pequena plataforma à frente para o condutor

Quinta da Confusão – O nascimento de um império

140

e um acompanhante guiarem os cavalos, que deveriam ser 4. Dentro da carruagem havia duas tábuas de madeira suficientemente largas para servirem de banco, forradas a couro cozido com tiras finas também de couro e com mais couro no interior para tornar os assentos mais confortáveis. A carruagem tinha espaço para ao todo 8 animais: 2 na plataforma do condutor e mais 6 dentro do veículo. Outra inovação do veículo era ter uma suspensão de tiras de couro, que tornavam mais confortáveis as viagens. Vazia, a carruagem podia atingir 60 km\h se os cavalos fossem a todo o galope, mas com mais carga a velocidade máxima era menor tal como nas carroças.

Ilustração 17 – Carruagem usada pelos serviços postais dos Estados

Unidos no século XIX, parecida com a carruagem inventada na Quinta

da Confusão

Mas a verdadeira intenção do cientista ao criar a carruagem foi criar também um local onde os animais pudessem guardar as suas coisas e dormir sem os apertos do abrigo nocturno, e ainda assim resguardados dentro da carroçaria da carruagem. Como seria de esperar, a Quinta da Confusão recebeu muito bem o veículo. Vários animais acorreram para comprar o veículo que também servia de casa móvel. Outros, no entanto, acharam que não valia a pena gastarem dinheiro (a carruagem era, de todos os veículos da Quinta da Confusão, o mais caro de todos eles) a comprar a carruagem, porque o número de coisas que tinham não o justificava. Além disso, o abrigo nocturno iria estar tão vazio nessa noite que não haveria