parte 5 matemática básica 1 parte 5 matemática básica 2 · (passo indutivo) suponha que p(k)...

25
Matemática Básica Humberto José Bortolossi Departamento de Matemática Aplicada Universidade Federal Fluminense Parte 5 Parte 5 Matemática Básica 1 Números Parte 5 Matemática Básica 2 O que é um número? Dicionário Aurélio: Número. [Do lat. numeru.] S. m. 1. A soma total dos elementos ou unidades de um conjunto, série, etc. 2. Porção ou parcela de um grupo, conjunto, etc. 3. Nome, símbolo ou representação de uma quantidade. [Cf. numeral (3).] 4. Entidade abstrata que corresponde a um aspecto ou a uma caraterística mensurável de algo (quantidade, grandeza, intensidade, etc.) e que é matematicamente definida como conjunto de todos os conjuntos equivalentes a um conjunto dado. Parte 5 Matemática Básica 3 O que é um número? Wikipédia: Número é a essência e o princípio de todas as coisas (Pitágoras). Número é a relação entre a quantidade e a unidade (Newton). Número é um composto da unidade (Euclides). Número nada mais é do que a proporção de uma magnitude com relação a outra considerada arbitrariamente como unidade (Euler). Número é uma coleção de objetos de cuja natureza fazemos abstração (Boutroux). Número é o resultado da comparação de qualquer grandeza com a unidade (Benjamin Constant). Número é o movimento acelerado ou retardado (Aristóteles). Número é uma coleção de unidades (Condorcet). Número é a expressão que determina uma quantidade de coisas da mesma espécie (Baltzer). Número é a classe de todas as classes equivalente a uma dada classe (Bertrand Russell). Parte 5 Matemática Básica 4

Upload: truongkhanh

Post on 12-Dec-2018

236 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Matemática Básica

Humberto José Bortolossi

Departamento de Matemática Aplicada

Universidade Federal Fluminense

Parte 5

Parte 5 Matemática Básica 1

Números

Parte 5 Matemática Básica 2

O que é um número?

Dicionário Aurélio:

Número.[Do lat. numeru.]S. m.1. A soma total dos elementos ou unidades de um conjunto, série, etc.2. Porção ou parcela de um grupo, conjunto, etc.3. Nome, símbolo ou representação de uma quantidade. [Cf. numeral (3).]4. Entidade abstrata que corresponde a um aspecto ou a uma caraterística

mensurável de algo (quantidade, grandeza, intensidade, etc.) e queé matematicamente definida como conjunto de todos os conjuntosequivalentes a um conjunto dado.

Parte 5 Matemática Básica 3

O que é um número?

Wikipédia:

Número é a essência e o princípio de todas as coisas (Pitágoras).

Número é a relação entre a quantidade e a unidade (Newton).

Número é um composto da unidade (Euclides).

Número nada mais é do que a proporção de uma magnitude com relação a outra consideradaarbitrariamente como unidade (Euler).

Número é uma coleção de objetos de cuja natureza fazemos abstração (Boutroux).

Número é o resultado da comparação de qualquer grandeza com a unidade (BenjaminConstant).

Número é o movimento acelerado ou retardado (Aristóteles).

Número é uma coleção de unidades (Condorcet).

Número é a expressão que determina uma quantidade de coisas da mesma espécie (Baltzer).

Número é a classe de todas as classes equivalente a uma dada classe (Bertrand Russell).

Parte 5 Matemática Básica 4

Page 2: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

O que é um número?

Não é uma definição formal, mas nos revela para que servem e porqual motivo foram inventados os números:

Número é o resultado da comparação entre uma grandeza e uma unidade. Sea grandeza é discreta, essa comparação chama-se uma contagem e o resultadoé um número inteiro; se a grandeza é contínua, a comparação chama-se umamedição e o resultado é um número real.

Parte 5 Matemática Básica 5

Números naturais

Parte 5 Matemática Básica 6

Números naturais

númerosnaturais

númerosordinais

númeroscardinais

(substantivo) (adjetivo)

interpretados como interpretados como

Parte 5 Matemática Básica 7

Números naturais como números ordinais

N é um conjunto, cujos elementos são chamados númerosnaturais. Seu uso e suas propriedades são regidos pelas seguintespropriedades:

(a) Todo número natural tem um único sucessor.(b) Números naturais diferentes têm sucessores diferentes.(c) Existe um único número natural, chamado um e representado

pelo símbolo 1, que não é sucessor de nenhum outro.(d) (Axioma da Indução) Seja X um subconjunto de números

naturais. Se 1 ∈ X e se, além disso, o sucessor de todo elementode X ainda pertence a X , então X = N.

Axiomas de Peano

Parte 5 Matemática Básica 8

Page 3: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Números naturais como números ordinaisN = {1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, . . .}.

2 é o sucessor de 13 é o sucessor de 24 é o sucessor de 3...

......

Deve ficar claro que o conjunto N = {1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, . . .} dos númerosnaturais é uma sequência de objetos abstratos que, em princípio, sãodesprovidos de significado. Cada um desses objetos (um número natural)possui apenas um lugar determinado nesta sequência. Nenhuma outrapropriedade lhes serve de definição. Todo número tem um sucessor (único)e, com exceção de 1, tem também um único antecessor (número do qual ésucessor).

[Lima, Carvalho, Wagner e Morgado, 2003]

Parte 5 Matemática Básica 9

Números naturais como números ordinais: símbolos

Sucessor de n é {n}0 ∅

1 {∅} {0}2 {{∅}} {1}3 {{{∅}}} {2}...

......

n {n − 1}

Parte 5 Matemática Básica 10

Números naturais como números ordinais: símbolos

Sucessor de n é n ∪ {n}0 ∅

1 {∅} 0 ∪ {0}2 {∅, {∅}} 1 ∪ {1}3 {∅, {∅}, {∅, {∅}}} 2 ∪ {2}...

......

n (n − 1) ∪ {n − 1}

Parte 5 Matemática Básica 11

Números naturais como números ordinais: símbolos

Escrita Cuneiforme Babilônica

Parte 5 Matemática Básica 12

Page 4: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Números naturais como números ordinais: símbolos

Escrita Maia

Parte 5 Matemática Básica 13

Números naturais como números ordinais: símbolos

Escrita Chinesa

Parte 5 Matemática Básica 14

Números naturais como números ordinais: símbolos

Escrita Romana

1 2 3 4 5 10 50 100 500 1000I II III IV V X L C D M

Parte 5 Matemática Básica 15

Números naturais como números ordinais: símbolos

Escrita Egípcia

Parte 5 Matemática Básica 16

Page 5: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Números naturais como números ordinais: símbolosEscrita Egípcia

Parte 5 Matemática Básica 17

Números naturais como números ordinais: símbolos

Escrita Braille

Parte 5 Matemática Básica 18

Números naturais como números cardinais

Apresentaremos os números naturais como números cardinaisposteriormente!

Parte 5 Matemática Básica 19

O Princípio da Indução Finita

Parte 5 Matemática Básica 20

Page 6: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

O Principio da Indução Finita

(d) (Axioma da Indução) Seja X um subconjunto de númerosnaturais. Se 1 ∈ X e se, além disso, o sucessor de todo elementode X ainda pertence a X , então X = N.

Axioma da Indução de Peano

Considere uma sentença da forma “∀n ∈ N,P(n)” (estamos escrevendo P(n)ao invés de P para enfatizar o fato de que o predicado P depende de n). Seja

X = {n ∈ N | n satisfaz o predicado P}.

Se mostramos que

(1) (Passo básico) 1 ∈ X (isto é, que 1 satisfaz o predicado P ou, ainda,que P(1) é verdadeira),

(2) (Passo indutivo) k ∈ X ⇒ k + 1 ∈ X (isto é, que se k satisfazo predicado P, então k + 1 também satisfaz o predicado P ou, ainda,que se P(k) é verdadeira, então P(k + 1) é verdadeira),

então, pelo Axioma de Indução de Peano, X = N, isto é, todo númeronatural n ∈ N satisfaz o predicado P e, assim, a sentença “∀n ∈ N,P(n)”é verdadeira!

Parte 5 Matemática Básica 21

O Principio da Indução Finita

Moral:

O Princípio da Indução Finita é uma técnica para tentardemonstrar que sentenças do tipo “∀n ∈ N,P(n)” sãoverdadeiras!

Parte 5 Matemática Básica 22

Protocolo de uma prova por indução

Uma demonstração por indução segue o seguinte esquema:

(1) Diga que a demonstração é por indução. Assim, o leitor já saberá qual seráa estrutura da demonstração.

(2) Especifique o predicado P(n) que se quer demonstrar que é verdadeiro para todon ∈ N (isto é, que é satisfeito para todo n ∈ N).

(3) Passo básico: mostre que P(1) é verdadeira (isto é, que n = 1 satisfazo predicado P).

(4) Passo indutivo: mostre que se P(k) é verdadeira (isto é, se k satisfazo predicado P), então P(k + 1) também é verdadeira (isto é, k + 1 também satisfazo predicado P).

Parte 5 Matemática Básica 23

ExemploMostre que ∀n ∈ N, 1 + 2 + · · ·+ n =

n (n + 1)2

.

Demonstração. A prova será feita por indução. Considere o predicado

P(n) : 1 + 2 + · · ·+ n = n (n + 1)/2.

(Passo básico ) Devemos mostrar que P(1) é verdadeira, isto é, que 1 satisfaz o predicado P. Em nosso caso,isso significa mostrar que 1 = (1)(1 + 1)/2. Mas (1)(1 + 1)/2 = 2/2 = 1.

(Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira (isto é, que k satisfaz o predicado P). Devemos mostrar queP(k + 1) também é verdadeira (isto é, que k + 1 também satisfaz o predicado P). Agora, se P(k) é verdadeira,então

1 + 2 + · · ·+ k =k(k + 1)

2. (hipótese de indução)

Para mostrar que P(k + 1) é verdadeira, devemos mostrar que 1 + 2 + · · ·+ k + (k + 1) =(k + 1)((k + 1) + 1)

2.

Mas,

1 + 2 + · · ·+ k + (k + 1) (∗)=

k (k + 1)2

+ (k + 1) =k (k + 1) + 2 (k + 1)

2=

(k + 1)(k + 2)2

=(k + 1)((k + 1) + 1)

2,

onde, em (∗), usamos a hipótese de indução.

Parte 5 Matemática Básica 24

Page 7: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

ExemploMostre que ∀n ∈ N, 3 é divisor de n3 − n.

Demonstração. A prova será feita por indução. Considere o predicado

P(n) : 3 é divisor de n3 − n.

(Passo básico ) Devemos mostrar que P(1) é verdadeira. Em nosso caso, isso significa mostrar que 3 édivisor de (1)3 − 1. Mas (1)3 − 1 = 0 e 3 é divisor de 0.

(Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira. Devemos mostrar que P(k+1) também é verdadeira.Agora, se P(k) é verdadeira, então 3 é divisor de k3−k . Para mostrar que P(k+1) é verdadeira, devemosmostrar que 3 é divisor de (k + 1)3 − (k + 1). Agora:

(k + 1)3 − (k + 1) = k3 + 3 k2 + 3 k + 1 − (k + 1) = k3 − k + 3 k2 + 3 k .

Pela hipótese de indução, 3 é divisor de k3 − k . Como 3 também é divisor de 3 k2 + 3 k , segue-se que 3é divisor de k3 − k + 3 k2 + 3 k = (k + 1)3 − (k + 1).

Parte 5 Matemática Básica 25

Onde está o erro?Todos os cavalos têm uma mesma cor.

“Demonstração”. A prova será feita por indução. Considere o predicado

P(n) : em todo conjunto com n cavalos, todos os cavalos têm uma mesma cor.

(Passo básico ) Se n = 1, então todo cavalo em um conjunto com um único cavalo tem uma mesma cor.Logo, P(1) é verdadeira.

(Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com kcavalos, todos os cavalos têm uma mesma cor (hipótese de indução). Devemos mostrar que P(k + 1)é verdadeira, isto é, devemos mostrar que em todo conjunto com k + 1 cavalos, todos os cavalos têmuma mesma cor. Considere então um conjunto com k +1 cavalos: {c1, c2, . . . , ck , ck+1}. Pela hipótese deindução, os k primeiros cavalos têm uma mesma cor: {c1, c2, . . . , ck}. Também pela hipótese de indução,os k últimos cavalos também possuem uma mesma cor: {c2, . . . , ck , ck+1}. Logo todos os cavalosem {c1, c2, . . . , ck , ck+1} têm uma mesma cor.

O erro está no passo indutivo: para concluir que todos os cavalos em {c1, c2, . . . , ck , ck+1} têm uma mesma cora partir do fato de que todos os cavalos em A = {c1, c2, . . . , ck} e B = {c2, . . . , ck , ck+1} possuírem uma mesmacor, usou-se que existe pelo menos um cavalo em comum aos dois conjuntos A e B. Mas, se k = 2, então A = {c1},B = {c2} e A ∩ B = ∅.

Parte 5 Matemática Básica 26

Ainda SobreO Princípio da Indução Finita

Parte 5 Matemática Básica 27

Ainda sobre o princípio da indução finita

Vimos que o Princípio da Indução Finita pode ser usada para demonstrar que sentençasdo tipo ∀n ∈ N = { 1, 2, 3, . . .}, P(n) são verdadeiras!

Mas, de fato, ele também pode ser usado para demonstrar que sentenças do tipo

∀n ∈ A = { 2, 3, 4, . . .}, P(n)

∀n ∈ B = { 3, 4, 5, . . .}, P(n)

∀n ∈ C = { 0, 1, 2, . . .}, P(n)

∀n ∈ D = {−1, 0, 1, . . .}, P(n)

são verdadeiras! Afinal, em termos dos Axiomas de Peano, os conjuntos A, B, C e Dsão tão bons quanto o conjunto N.

Parte 5 Matemática Básica 28

Page 8: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

ExemploMostre que ∀n ∈ B = {3, 4, 5, . . .}, n2 − n − 6 ≥ 0.

Demonstração. A prova será feita por indução. Considere o predicado

P(n) : n2 − n − 6 ≥ 0.

(Passo básico ) Devemos mostrar que P(3) é verdadeira. Em nosso caso, isso significa mostrar que32 − 3 − 6 ≥ 0. Mas 32 − 3 − 6 = 0, logo 32 − 3 − 6 ≥ 0.

(Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira. Devemos mostrar que P(k+1) também é verdadeira.Agora, se P(k) é verdadeira, então k2 − k − 6 ≥ 0. Para mostrar que P(k + 1) é verdadeira, devemosmostrar que (k + 1)2 − (k + 1)− 6 ≥ 0. Agora:

(k + 1)2 − (k + 1)− 6 = k2 + 2 k + 1 − k − 1 − 6 = k2 − k − 6 + 2 k .

Pela hipótese de indução, k2 − k −6 ≥ 0. Como 2 k ≥ 0 para todo k ∈ B, segue-se que k2 − k −6+2 k =(k + 1)2 − (k + 1)− 6 ≥ 0.

Parte 5 Matemática Básica 29

O Segundo Princípio da Indução Finita

Parte 5 Matemática Básica 30

O Segundo Princípio da Indução

Dado um predicado P(n),• se P(1) é verdadeira e (Passo básico )• se P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira, (Passo indutivo)

então P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Primeiro Princípio da Indução

Dado um predicado P(n),• se P(1) é verdadeira e (Passo básico )• se P(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira, (Passo indutivo)

então P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Segundo Princípio da Indução

Parte 5 Matemática Básica 31

ExemploMostre que todo número inteiro n ≥ 2 pode ser escrito como produto de números primos (admitindo-seo caso de um produto com um único fator caso n seja um número primo).

Demonstração. Usaremos o Segundo Princípio da Indução. Considere o predicado

P(n) : n pode ser escrito como produto de números primos.

(Passo básico ) Devemos mostrar que P(2) é verdadeira. Em nosso caso, isso significa mostrar que 2pode ser escrito como produto de números primos. Mas 2 é um número primo, logo 2 pode ser escritocomo um produto de números primos com um único fator (o próprio 2).

(Passo indutivo) Suponha que P(2) ∧ P(3) ∧ · · · ∧ P(k) seja verdadeira. Devemos mostrar que P(k + 1)também é verdadeira. Agora, se P(2)∧P(3)∧ · · · ∧P(k) é verdadeira, então todo número ≥ 2 e ≤ k podeser escrito como produto de números primos. Para mostrar que P(k + 1) é verdadeira, devemos mostrarque k + 1 pode ser escrito como produto de números primos. Se k + 1 é um número primo, nada há parase fazer: k +1 pode ser escrito como um produto de números primos com um único fator (o próprio k +1).Se k + 1 não é um número primo, então ele pode ser escrito na forma k + 1 = a b, com 2 ≤ a ≤ k e2 ≤ b ≤ k . Pela hipótese de indução, a e b podem ser escritos como produto de números primos. Logok + 1 = a b também pode ser escrito como produto de números primos.

Por que o Segundo Princípio da Indução é útil aqui? Considere k = 24 = 4 ·6. Para mostrar que P(24) é verdadeirausando essa decomposição, precisamos usar que P(4) e P(6) verdadeiras. A hipótese de indução do PrimeiroPrincípio permite usar apenas que P(23) é verdadeira, o que não nos ajuda aqui.

Parte 5 Matemática Básica 32

Page 9: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Exemplo (sem pegar pela mão)Mostre que todo número inteiro n ≥ 2 pode ser escrito como produto de números primos (admitindo-seo caso de um produto com um único fator caso n seja um número primo).

Demonstração. Usaremos o Segundo Princípio da Indução. P(2) é verdadeira, pois 2 é um número primo.Suponha que todo número ≥ 2 e ≤ k pode ser escrito como produto de números primos. Queremosmostrar que k + 1 também pode ser escrito como produto de números primos. Se k + 1 é um númeroprimo, nada há para se fazer. Suponha então que k + 1 não seja um número primo. Portanto, ele podeser escrito na forma k + 1 = a b, com 2 ≤ a ≤ k e 2 ≤ b ≤ k . Pela hipótese de indução, a e b podem serescritos como produto de números primos. Logo k + 1 = a b também pode ser escrito como produto denúmeros primos.

Parte 5 Matemática Básica 33

O Segundo Princípio da Indução

Dado um predicado P(n),• se P(1) é verdadeira e (Passo básico )• se P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira, (Passo indutivo)

então P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Primeiro Princípio da Indução

Dado um predicado P(n),• se P(1) é verdadeira e (Passo básico )• se P(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira, (Passo indutivo)

então P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Segundo Princípio da Indução

Teorema: os dois princípios são equivalentes, isto é, quem tem um, demonstrao outro. Moral: qualquer demonstração usando um dos princípios pode serconvertida em uma demonstração usando o outro.

Parte 5 Matemática Básica 34

Demonstração do teorema

Dado um predicado P(n),• se P(1) é verdadeira e (Passo básico )• se P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira, (Passo indutivo)

então P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Primeiro Princípio da Indução

Dado um predicado P(n),• se P(1) é verdadeira e (Passo básico )• se P(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira, (Passo indutivo)

então P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Segundo Princípio da Indução

(Primeiro Princípio ⇒ Segundo Princípio) Seja P(n) um predicado tal que P(1) é verdadeira e tal queP(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira. Queremos mostrar que P(n) é verdadeira para todon ∈ N. Defina P̃(n) = P(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(n). Note que P̃(1) = P(1) é verdadeira. Se P̃(k) éverdadeira, então P(1)∧P(2)∧· · ·∧P(k) é verdadeira. Por hipótese, P(k +1) também é verdadeira. LogoP(1)∧P(2)∧ · · · ∧P(k)∧P(k + 1) é verdadeira, isto é, P̃(k + 1) é verdadeira. Pelo Primeiro Princípio daIndução (aplicado ao predicado P̃(n)), P̃(n) = P(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(n) é verdadeira para todo n ∈ N. Emparticular, P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Parte 5 Matemática Básica 35

Demonstração do teorema

Dado um predicado P(n),• se P(1) é verdadeira e (Passo básico )• se P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira, (Passo indutivo)

então P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Primeiro Princípio da Indução

Dado um predicado P(n),• se P(1) é verdadeira e (Passo básico )• se P(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira, (Passo indutivo)

então P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Segundo Princípio da Indução

(Segundo Princípio ⇒ Primeiro Princípio) Seja P(n) um predicado tal que P(1) é verdadeira e tal queP(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira. Queremos mostrar que P(n) é verdadeira para todo n ∈ N. Afirmamosque o predicado P(n) também é tal que P(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(k) ⇒ P(k + 1) é verdadeira. De fato: seP(1) ∧ P(2) ∧ · · · ∧ P(k) é verdadeira, em particular, P(k) é verdadeira. Por hipótese, P(k + 1) também éverdadeira. Pelo Segundo Princípio da Indução, P(n) é verdadeira para todo n ∈ N.

Parte 5 Matemática Básica 36

Page 10: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Outros nomes para o Segundo Princípio da Indução

O Segundo Princípio da Indução também é conhecido como

Princípio da Indução Completaou

Princípio da Indução Forte.

Parte 5 Matemática Básica 37

Outras Aplicações

Parte 5 Matemática Básica 38

ExemploQuais são os valores que podem ser gerados com selos de 3 e 5 centavos?

Linhas: quantidade selos de 3 centavos. Colunas: quantidade de selos de 5 centavos.

0 1 2 3 4 5 · · ·0 0 5 10 15 20 25 · · ·1 3 8 13 18 23 28 · · ·2 6 11 16 21 26 31 · · ·3 9 14 19 24 29 34 · · ·4 12 17 22 27 32 37 · · ·5 15 20 25 30 35 40 · · ·...

......

......

......

. . .

Parte 5 Matemática Básica 39

ExemploÉ possível produzir qualquer quantia n ≥ 8 (em centavos) com selos de 3 e 5 centavos.

Demonstração. Usaremos o Segundo Princípio da Indução. Considere o predicado:

P(n) : existem inteiros r ≥ 0 e s ≥ 0 tais que 3 r + 5 s = n.

(Passo básico ) O predicado P(n) é verdadeiro para n = 8, n = 9 e n = 10, pois 8 = 3 (1) + 5 (1),9 = 3 (3) + 5 (0) e 10 = 3 (0) + 5 (2).

(Passo indutivo) Se k ≥ 10, suponha que P(l) seja verdadeira para todo l ∈ {8, . . . , k}, isto é, suponhaque qualquer quantia em centavos l ∈ {8, . . . , k} possa ser produzida com selos de 3 e 5 centavos. Vamosmostrar que P(k+1) também é verdadeira, isto é, a quantia em centavos k+1 também pode ser produzidacom selos de 3 e 5 centavos. Pela hipótese de indução, existem inteiros r ≥ 0 e s ≥ 0 tais que

k − 2 = 3 r + 5 s.

Então, k + 1 = k − 2 + 3 = 3 r + 5 s + 3 = 3 (r + 1) + 5 s = 3 r̃ + 5 s, com r̃ = r + 1 ≥ 0 e s ≥ 0.

Mais do que uma demonstração, o Princípio da Indução nos dá um algoritmo para calcular os valores de r e s:

23 = 20 + 3 = 17 + 3 (2) = 14 + 3 (3) = 11 + 3 (4) = 8 + 3 (5) = 5 + 3 (6) = 5 (1) + 3 (6).

Desta maneira, a quantia de 23 centavos pode ser produzida com 1 selo de 5 centavos e 6 selos de 3 centavos.

Parte 5 Matemática Básica 40

Page 11: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

ExemploPara todo n ≥ 1, existe um ladrilhamento por ladrilhos em formato de L ( ) para um jardim 2n × 2n com

a estátua de Bill em um quadrado central.

B B

Parte 5 Matemática Básica 41

ExemploPara todo n ≥ 1, existe um ladrilhamento por ladrilhos em formato de L ( ) para um jardim 2n × 2n com

a estátua de Bill em um quadrado central.

Demonstração. A prova será por indução, mas usaremos um predicado mais forte: P(n) : existe umladrilhamento por ladrilhos em formato de L para um jardim 2n × 2n com a estátua de Bill em qualquerquadrado.

(Passo básico ) P(1) é verdadeira: B , B ,B

,B

.

(Passo indutivo) Suponha que exista um ladrilhamento por ladrilhos em formato de L para jardins 2k × 2k

com um quadrado removido. Considere um jardim 2k+1 × 2k+1. Divida o jardim em 4 quadrantes 2k × 2k .O quadrante que contém a estátua de Bill pode ser ladrilhado com ladrilhos no formato de L (hipótesede indução). Coloque um ladrilho no formato de L na posição central de forma que cada um dos trêsquadrados do L esteja nos três quadrantes restantes. Tudo o que falta é ladrilhar cada um dos trêsquadrantes excluindo o quadrado central já ladrilhado, o que pode ser feito pela hipótese de indução.

B

2k

2k

2k 2k

2k+1

Parte 5 Matemática Básica 42

Exemplo: A Torre de Hanoi

Torre A Torre B Torre C

4

3

2

1

O objetivo desse jogo é mover todos os anéis de uma torre para a outra obedecendo duasregras:

(1) Apenas o anel mais acima de cada torre pode ser movido.(2) Um anel maior não pode ser colocado sobre um anel menor.

Este jogo foi criado pelo matemático francês Édouard Lucas em 1883. Há uma lenda que diz queexiste uma sala em um certo monastério com três grandes torres, uma delas com 64 anéis de ouro.Os monges desse monastério estão transferindo os anéis seguindo as regras acima. A lenda diz queo mundo terminará quando os monges conseguirem terminar a transferência.

Parte 5 Matemática Básica 43

Torre de Hanoi com 1 Anel

1

Parte 5 Matemática Básica 44

Page 12: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 1 Anel

1

Anel transferido da torre A para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 45

Torre de Hanoi com 1 Anel

1

OK

Parte 5 Matemática Básica 46

Torre de Hanoi com 2 Anéis

21

Parte 5 Matemática Básica 47

Torre de Hanoi com 2 Anéis

2 1

Anel transferido da torre A para a torre B.

Parte 5 Matemática Básica 48

Page 13: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 2 Anéis

1 2

Anel transferido da torre A para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 49

Torre de Hanoi com 2 Anéis

21

Anel transferido da torre B para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 50

Torre de Hanoi com 2 Anéis

21

OK

Parte 5 Matemática Básica 51

Torre de Hanoi com 3 Anéis

321

Parte 5 Matemática Básica 52

Page 14: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 3 Anéis

32

1

Anel transferido da torre A para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 53

Torre de Hanoi com 3 Anéis

3 2 1

Anel transferido da torre A para a torre B.

Parte 5 Matemática Básica 54

Torre de Hanoi com 3 Anéis

3 21

Anel transferido da torre C para a torre B.

Parte 5 Matemática Básica 55

Torre de Hanoi com 3 Anéis

21

3

Anel transferido da torre A para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 56

Page 15: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 3 Anéis

1 2 3

Anel transferido da torre B para a torre A.

Parte 5 Matemática Básica 57

Torre de Hanoi com 3 Anéis

1 32

Anel transferido da torre B para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 58

Torre de Hanoi com 3 Anéis

321

Anel transferido da torre A para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 59

Torre de Hanoi com 3 Anéis

321

OK

Parte 5 Matemática Básica 60

Page 16: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 4 Anéis

4321

Parte 5 Matemática Básica 61

Torre de Hanoi com 4 Anéis

432

1

Anel transferido da torre A para a torre B.

Parte 5 Matemática Básica 62

Torre de Hanoi com 4 Anéis

43

1 2

Anel transferido da torre A para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 63

Torre de Hanoi com 4 Anéis

43

21

Anel transferido da torre B para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 64

Page 17: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 4 Anéis

4 3 21

Anel transferido da torre A para a torre B.

Parte 5 Matemática Básica 65

Torre de Hanoi com 4 Anéis

41

3 2

Anel transferido da torre C para a torre A.

Parte 5 Matemática Básica 66

Torre de Hanoi com 4 Anéis

41

32

Anel transferido da torre C para a torre B.

Parte 5 Matemática Básica 67

Torre de Hanoi com 4 Anéis

4 321

Anel transferido da torre A para a torre B.

Parte 5 Matemática Básica 68

Page 18: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 4 Anéis

321

4

Anel transferido da torre A para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 69

Torre de Hanoi com 4 Anéis

32

41

Anel transferido da torre B para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 70

Torre de Hanoi com 4 Anéis

2 3 41

Anel transferido da torre B para a torre A.

Parte 5 Matemática Básica 71

Torre de Hanoi com 4 Anéis

21

3 4

Anel transferido da torre C para a torre A.

Parte 5 Matemática Básica 72

Page 19: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 4 Anéis

21

43

Anel transferido da torre B para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 73

Torre de Hanoi com 4 Anéis

2 1 43

Anel transferido da torre A para a torre B.

Parte 5 Matemática Básica 74

Torre de Hanoi com 4 Anéis

1 432

Anel transferido da torre A para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 75

Torre de Hanoi com 4 Anéis

4321

Anel transferido da torre B para a torre C.

Parte 5 Matemática Básica 76

Page 20: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Torre de Hanoi com 4 Anéis

4321

OK

Parte 5 Matemática Básica 77

Exemplo: A Torre de HanoiA Torre de Hanoi possui solução para qualquer número n ∈ N de anéis. Mais ainda, se Tn é o númeromínimo de movimentos para transferir n anéis de uma torre para outra, então Tn+1 = 2 Tn + 1, comT1 = 1. Em particular, Tn = 2n − 1.

Demonstração. Vamos mostrar primeiro que o problema tem solução. Isso será feito por indução. Sen = 1, basta transferir o único anel de uma torre para outra. Suponha que seja sempre possível transferirk anéis de uma torre para outra. Queremos mostrar que é possível transferir k +1 anéis. Se os k +1 anéisestão, digamos, na torre A, transfira os k primeiros anéis para a torre B. Transfira então o (k + 1)-ésimoanel para a torre C e, em seguida, transfira os k anéis da torre B para a torre C.

A solução que propomos para o problema nos mostra que Tn+1 ≤ 2 Tn + 1. Vamos agora mostrar que,também, Tn+1 ≥ 2 Tn + 1. No processo de transferir os n + 1 anéis, em algum momento, os n anéissuperiores devem estar em uma torre, pois (1) não é possível mover o anel n + 1 sem que os n anéissuperiores tenham sido movidos e (2) esses n anéis devem todos estar em uma mesma torre para deixaruma torre vazia, uma vez que o (n + 1)-ésimo anel só pode ser movido para uma torre vazia. Assim,usamos pelo menos Tn movimentos. Ao transferir o (n+1)-ésimo anel, usamos 1 movimento. Ao transferiros n anéis menores para a torre onde o anel n+1 foi colocado, usamos pelo menos outros Tn movimentos.Logo, Tn+1 ≥ 2 Tn + 1.

Temos assim que T1 = 1 e Tn+1 = 2 Tn + 1. Escrevendo Un = Tn + 1, então U1 = T1 + 1 = 1 + 1 = 2 e

Tn+1 = 2 Tn + 1 ⇔ Un+1 − 1 = 2 (Un − 1) + 1 ⇔ Un+1 = 2 Un.

Assim, Un = 2n e, portanto, Tn = 2n − 1.

Parte 5 Matemática Básica 78

Exemplo: A Torre de Hanoi

Para n = 64 anéis são então necessários

T64 = 264 − 1 movimentos.

264 − 1 = 18446744073709551615.

Se os monges moverem um anel por segundo, serão necessários mais de

584 bilhões de anos

para eles transferirem todos os 64 anéis!

Parte 5 Matemática Básica 79

Exemplo: Permutações

Quantas e quais são as permutações da lista (a, b)?Resposta: são 2 permutações, a saber,

(a, b), (b, a).

Quantas e quais são as permutações da lista (a, b, c)?Resposta: são 6 permutações, a saber,

(a, b, c), (a, c, b), (b, a, c), (b, c, a), (c, a, b), (c, b, a).

E o caso geral?

Parte 5 Matemática Básica 80

Page 21: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Exemplo: PermutaçõesO número de permutações de uma lista com n elementos é igual a 1 · 2 · · · · · n = n!.

Demonstração. A prova será por indução. O número de permutações de uma lista com um únicoelemento é igual a 1 = 1!. Suponha que o número de permutações de uma lista com k elementos sejaigual a k !. Queremos mostrar que o número de permutações de uma lista (a1, a2, a3, . . . , ak , ak+1) comk + 1 elementos é igual a (k + 1)!. Ora, as permutações de (a1, a2, a3, . . . , ak , ak+1) podem ser divididasem k + 1 grupos:

(a1 , permutações de a2, a3, . . . , ak , ak+1

),(

a2 , permutações de a1, a3, . . . , ak , ak+1

),

...(ak , permutações de a1, a2, . . . ,ak−1, ak+1

),(

ak+1, permutações de a1, a2, . . . ,ak−1, ak

).

Logo, o número total de permutações da lista (a1, a2, a3, . . . ,ak , ak+1) é igual a

k ! + k ! + · · ·+ k ! + k !︸ ︷︷ ︸k+1 vezes

= (k + 1) k ! = (k + 1)!.

Note que a demonstração por indução que fizemos nos dá um algoritmo recursivo para calcularpermutações de listas.

Parte 5 Matemática Básica 81

Exemplo: subconjuntos de um conjunto finito

Quantos e quais são os subconjuntos de {a, b}?Resposta: são 4 subconjuntos, a saber,

∅, {a}, {b}, {a, b}.

Quantos e quais são os subconjuntos de {a, b, c}?Resposta: são 8 subconjuntos, a saber,

∅, {a}, {b}, {a, b},

∅ ∪ {c}, {a} ∪ {c}, {b} ∪ {c}, {a, b} ∪ {c}.

E o caso geral?

Parte 5 Matemática Básica 82

Exemplo: subconjuntos de um conjunto finitoO número de subconjuntos de um conjunto com n elementos é igual a 2n.

Demonstração. A prova será por indução. O número de subconjuntos do conjunto vazio ∅ (com n = 0elementos) é igual a 1 = 20. Suponha que o número de subconjuntos de um conjunto com k elementosseja igual a 2k . Queremos mostrar que o número de subconjuntos de um conjunto {a1, . . . , ak , ak+1}com k + 1 elementos é igual a 2k+1. Ora, os subconjuntos de {a1, . . . , ak , ak+1} podem ser divididos em2 grupos: os subconjuntos de {a1, . . . ,ak , ak+1} dos quais ak+1 não é um elemento e os subconjuntosde {a1, . . . ,ak , ak+1} dos quais ak+1 é um elemento. O número de subconjuntos do segundo grupo é igualao número de subconjuntos do primeiro grupo pois, se retirarmos o elemento ak+1 de um subconjuntodo segundo grupo, obteremos um subconjunto do primeiro grupo. Agora, os subconjuntos do primeirogrupo são subconjuntos do conjunto {a1, . . . ,ak} com k elementos. Portanto, pela hipótese de indução,segue-se que existem 2k subconjuntos no primeiro grupo. Somando-se o número de subconjuntos dosgrupos, concluímos que existem 2k + 2k = 2 · 2k = 2k+1 subconjuntos do conjunto {a1, . . . , ak , ak+1}.

Note que a demonstração por indução que fizemos nos dá um algoritmo recursivo para calcular os subconjuntos deum conjunto finito.

Parte 5 Matemática Básica 83

Números Naturais (Continuação)

Parte 5 Matemática Básica 84

Page 22: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Números naturais como números cardinais

X Y

Parte 5 Matemática Básica 85

Números naturais como números cardinais

X Y

Parte 5 Matemática Básica 86

Números naturais como números cardinais

A importância dos números naturais provém do fato de que eles constituem o modelomatemático que torna possível o processo de contagem. Noutras palavras, elesrespondem a perguntas do tipo: “Quantos elementos tem este conjunto?”.

Diz-se que dois conjuntos X e Y têm o mesmo número cardinal quando se podedefinir uma função bijetiva f : X → Y .

Diz-se que um conjunto X é finito, e que X tem n elementos quando sepode estabelecer uma função bijetiva f : In → X , onde n ∈ N eIn = {k ∈ N | 1 ≤ k ≤ n}. O número natural n chama-se então o número cardinaldo conjunto X ou, simplesmente, o número de elementos de X . Por convenção, oconjunto vazio é finito e diz-se que ele tem 0 elementos.

Diz-se que um conjunto X é infinito quando ele não é finito. Isto quer dizer que Xnão é vazio e que, não importa qual seja n ∈ N, não existe função bijetiva f : In → X .

Definições

Parte 5 Matemática Básica 87

Números naturais como números cardinais

X Y

Parte 5 Matemática Básica 88

Page 23: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Números naturais como números cardinais

Os segmentos X e Y possuem a mesma cardinalidade?

(Ir para o GeoGebra)

Parte 5 Matemática Básica 89

Números naturais como números cardinais

Os segmentos X e Y possuem a mesma cardinalidade?

(Ir para o GeoGebra)

Parte 5 Matemática Básica 90

Números naturais como números cardinais

O Hotel Infinito de Hilbert

Parte 5 Matemática Básica 91

Um pequeno comentário gramatical

Quando dizemos “o número um”, “o número dois” ou o “número três”, aspalavras “um”, “dois” e “três” são substantivos, pois são nomes de objetos.Isto contrasta com o uso destas palavras em frases como “um ano, doismeses e três dias”, onde elas aparecem para dar a ideia de número cardinal,isto é, como resultados de contagens. Nesta frase, “um”, “dois” e “três” nãosão substantivos. Pertencem a categoria gramatical que, noutras línguas(como francês, inglês e alemão, por exemplo) é chamada adjetivo numerale que os gramáticos brasileiros e portugueses, há um par de décadas,resolveram chamar numeral apenas. Este comentário visa salientar adiferença entre números naturais, olhados como elementos do conjunto N, eo seu emprego como números cardinais.

[Lima, Carvalho, Morgado e Wagner, 2003]

Parte 5 Matemática Básica 92

Page 24: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Semelhança dos nomes dos números

SânscritoGregoAntigo

Latim Alemão Inglês Francês Russo

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

100

1000

eka

dva

tri

catur

panca

sas

sapta

asta

nava

daca

cata

sehastre

en

duo

tri

tetra

pente

hex

hepta

octo

ennea

deca

ecaton

xilia

unus

duo

tres

quatuor

quinque

sex

septem

octo

novem

decem

centum

mille

eins

zwei

drei

vier

fünf

sechs

sieben

acht

neun

zehn

hundert

tausend

one

two

three

four

five

six

seven

eight

nine

ten

hundred

thousand

un

deux

trois

quatre

cinq

six

sept

huit

neuf

dix

cent

mille

odyn

dva

tri

chetyre

piat

shest

sem

vosem

deviat

desiat

sto

tysiaca

Parte 5 Matemática Básica 93

Giuseppe Peano

Matemático italiano (27 de agosto de 1858 – 20 de abril de 1932)

Parte 5 Matemática Básica 94

David Hilbert

Matemático alemão (23 de janeiro de 1862 – 14 de feveriro de 1943)

Parte 5 Matemática Básica 95

Existem “infinitos” diferentes!

Parte 5 Matemática Básica 96

Page 25: Parte 5 Matemática Básica 1 Parte 5 Matemática Básica 2 · (Passo indutivo) Suponha que P(k) seja verdadeira, isto é, suponha que em todo conjunto com k cavalos, todos os cavalos

Existem “infinitos” diferentes!

Os conjuntos

N = {1, 2, 3, . . .} e (0, 1) = {x ∈ R | 0 < x < 1}

são infinitos, mas não possuem o mesmo número cardinal.

Em um certo sentido, o intervalo (0, 1) é “mais infinito” do que oconjunto N dos números naturais!

Parte 5 Matemática Básica 97

O argumento da diagonal de CantorN e (0, 1) não possuem o mesmo número cardinal.

Demonstração.(1) Devemos mostrar que não existe uma bijeção entre N e (0, 1).(2) Suponha, por absurdo, que uma tal bijeção exista: f : N → (0, 1).(3) Assim, para cada n ∈ N, f (n) é um número real entre 0 e 1 e para cada número

real r entre 0 e 1 existe um único natural n tal que f (n) = r .(4) Para cada n, vamos representar o número real f (n) através de sua expansão

decimal. No caso de números com duas expansões decimais (por exemplo,0.5 = 0.49 = 0.4999 . . .), escolhemos aquela que é infinita (por exemplo, para0.5 escolhemos 0.49).

(5) Temos então:

f (1) = 0.d1,1d1,2d1,3d1,4 . . . ,

f (2) = 0.d2,1d2,2d2,3d2,4 . . . ,

f (3) = 0.d3,1d3,2d3,3d3,4 . . . ,

f (4) = 0.d4,1d4,2d4,3d4,4 . . . ,

...

Parte 5 Matemática Básica 98

O argumento da diagonal de Cantor(5) Temos então:

f (1) = 0.d1,1d1,2d1,3d1,4 . . . ,

f (2) = 0.d2,1d2,2d2,3d2,4 . . . ,

f (3) = 0.d3,1d3,2d3,3d3,4 . . . ,

f (4) = 0.d4,1d4,2d4,3d4,4 . . . ,

...

(6) Vamos construir um número real x = 0.p1p2p3p4 . . . da seguinte maneira:� Se d1,1 = 5, então p1 = 4. Caso contrário, p1 = 5.

� Se d2,2 = 5, então p2 = 4. Caso contrário, p2 = 5.

� Se d3,3 = 5, então p3 = 4. Caso contrário, p3 = 5.

� E assim por diante.

(7) O número real x = 0.p1p2p3p4 . . . pertence ao intervalo (0, 1), mas x = f (1) (poisp1 = d1,1), x = f (2) (pois p2 = d2,2), x = f (3) (pois p3 = d3,3), etc. Isto contradizo fato de f : N → (0, 1) ser sobrejetiva. Logo, não existe bijeção entre N e (0, 1).

Parte 5 Matemática Básica 99

Georg Cantor

Matemático alemão (3 de março de 1845 – 6 de janeiro de 1918)

Parte 5 Matemática Básica 100