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| MÓDULO | 8 | | PARA DESENVOLVER | Leitura 1. Neste capítulo diz-se que Carlos se desloca a Sintra com o objectivo de encontrar a senhora brasileira. Lê atentamente estes excertos. Carlos, no entanto, pensava no motivo que o trazia a Sintra. E realmente não sabia bem porque vinha: mas havia duas semanas que ele não avistava certa figura que tinha um passo de deusa pisando a Terra, e que não encontrava o negro profundo de dois olhos que se tinham fixado nos seus: agora supunha que ela estava em Sintra, corria a Sintra. Não esperava nada, não desejava nada. Não sabia se a veria, talvez ela ti- vesse já partido. Mas vinha: e era já delicioso o pensar nela assim por aquela estrada fora, penetrar, com essa doçura no coração, sob as belas árvores de Sintra... Depois, era possível que daí a pouco, na velha Law- rence, ele a cruzasse de repente no corredor, roçasse talvez o seu vestido, ouvisse talvez a sua voz. Se ela lá estivesse, decerto viria jantar à sala, aquela sala que ele conhecia tão bem, que já lhe estava apetecendo tanto, com as suas pobres cortininhas de cassa, os ramos toscos sobre a mesa, e os dois grandes candeei- ros de latão antigo... Ela entraria ali, com o seu belo ar claro de Diana loira; o bom Dâmaso apresentaria o seu amigo Maia; aqueles olhos negros que ele vira passar de longe como duas estrelas, pousariam mais de- vagar nos seus; e, muito simplesmente, à inglesa, ela estender-lhe-ia a mão... – Nós não vamos para a Lawrence – disse Carlos, saindo bruscamente do seu silêncio e espertando os cavalos. Vamos para o Nunes, estamos lá muito melhor! Era uma ideia que lhe viera de repente, apenas passara as primeiras casas de S. Pedro, e o break co- meçara a rolar naquelas estradas onde a cada momento ele a poderia encontrar. Tomara-o uma timidez, a que se misturava um laivo de orgulho, o receio melindrado de ser indiscreto, seguindo-a assim a Sintra, ainda que ela o não reconhecesse, indo instalar-se sob as mesmas telhas, apoderando-se de um lugar à mesma mesa... E ao mesmo tempo repugnou-lhe a ideia de lhe ser apresentado pelo Dâmaso: via-o já, bo- chechudo e vestido de campo, a esboçar um gesto de cerimónia, a mostrar o seu amigo Maia, a tratá-lo por tu, afectando intimidades com ela, cocando-a com um olho terno... Isto seria intolerável. – Vamos para o Nunes, que se come melhor! Cruges não respondeu, mudo, enlevado, recebendo como uma impressão religiosa de todo aquele es- plendor sombrio de arvoredo, dos altos fragosos da serra entrevistos um instante lá em cima nas nuvens, desse aroma que ele sorvia deliciosamente, do sussurro doce de águas descendo para os vales... Só ao avistar o Paço descerrou os lábios: E foi o que mais lhe agradou – este maciço e silencioso palácio, sem florões e sem torres, patriarcal- mente assentado entre o casario da vila, com as suas belas janelas manuelinas que lhe fazem um nobre semblante real, o vale aos pés, frondoso e fresco, e no alto as duas chaminés colossais, disfor- mes, resumindo tudo, como se essa resi- dência fosse toda ela uma cozinha talhada às proporções de uma gula de Rei que cada dia come todo um reino... II I 5 10 15 20 25 30 35 Capítulo VIII

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| MÓDULO | 8 || PARA DESENVOLVER |

Leitura

1. Neste capítulo diz-se que Carlos se desloca a Sintra com o objectivo de encontrar a senhorabrasileira. Lê atentamente estes excertos.

Carlos, no entanto, pensava no motivo que o trazia a Sintra. E realmente não sabia bem porque vinha:

mas havia duas semanas que ele não avistava certa figura que tinha um passo de deusa pisando a Terra, e

que não encontrava o negro profundo de dois olhos que se tinham fixado nos seus: agora supunha que ela

estava em Sintra, corria a Sintra. Não esperava nada, não desejava nada. Não sabia se a veria, talvez ela ti-

vesse já partido. Mas vinha: e era já delicioso o pensar nela assim por aquela estrada fora, penetrar, com

essa doçura no coração, sob as belas árvores de Sintra... Depois, era possível que daí a pouco, na velha Law-

rence, ele a cruzasse de repente no corredor, roçasse talvez o seu vestido, ouvisse talvez a sua voz. Se ela

lá estivesse, decerto viria jantar à sala, aquela sala que ele conhecia tão bem, que já lhe estava apetecendo

tanto, com as suas pobres cortininhas de cassa, os ramos toscos sobre a mesa, e os dois grandes candeei-

ros de latão antigo... Ela entraria ali, com o seu belo ar claro de Diana loira; o bom Dâmaso apresentaria o

seu amigo Maia; aqueles olhos negros que ele vira passar de longe como duas estrelas, pousariam mais de-

vagar nos seus; e, muito simplesmente, à inglesa, ela estender-lhe-ia a mão...

– Nós não vamos para a Lawrence – disse Carlos, saindo bruscamente do seu silêncio e espertando os

cavalos. Vamos para o Nunes, estamos lá muito melhor!

Era uma ideia que lhe viera de repente, apenas passara as primeiras casas de S. Pedro, e o break co-

meçara a rolar naquelas estradas onde a cada momento ele a poderia encontrar. Tomara-o uma timidez,

a que se misturava um laivo de orgulho, o receio melindrado de ser indiscreto, seguindo-a assim a Sintra,

ainda que ela o não reconhecesse, indo instalar-se sob as mesmas telhas, apoderando-se de um lugar à

mesma mesa... E ao mesmo tempo repugnou-lhe a ideia de lhe ser apresentado pelo Dâmaso: via-o já, bo-

chechudo e vestido de campo, a esboçar um gesto de cerimónia, a mostrar o seu amigo Maia, a tratá-lo por

tu, afectando intimidades com ela, cocando-a com um olho terno... Isto seria intolerável.

– Vamos para o Nunes, que se come melhor!

Cruges não respondeu, mudo, enlevado, recebendo como uma impressão religiosa de todo aquele es-

plendor sombrio de arvoredo, dos altos fragosos da serra entrevistos um instante lá em cima nas nuvens,

desse aroma que ele sorvia deliciosamente, do sussurro doce de águas descendo para os vales...

Só ao avistar o Paço descerrou os lábios:

E foi o que mais lhe agradou – este maciço e silencioso palácio, sem florões e sem torres, patriarcal-

mente assentado entre o casario da vila,

com as suas belas janelas manuelinas

que lhe fazem um nobre semblante real,

o vale aos pés, frondoso e fresco, e no

alto as duas chaminés colossais, disfor-

mes, resumindo tudo, como se essa resi-

dência fosse toda ela uma cozinha

talhada às proporções de uma gula de

Rei que cada dia come todo um reino...

II

I

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Capítulo VIII

| MÓDULO | 8 || PARA DESENVOLVER |

2. Apesar de não ter a certeza de encontrar “certa figura que tinha um passo de deusapisando a Terra”, Carlos antecipa emoções a viver na velha Lawrence. Inesperada-mente, muda de ideias e prefere ir para o Nunes. 2.1. Explica esta mudança de planos.

3. Cruges, que nunca tinha ido a Sintra, ficou agradavelmente surpreendido.3.1. Preenche a tabela de modo a obteres algumas das características de Sintra que causaram o

espanto do maestro.

Funcionamento da Língua

1. Lê as seguintes frases.a) Carlos, no entanto, pensava no motivo que o trazia a Sintra… (linha 1)

b) Não sabia se a veria… (linha 4)

c) …ela estender-lhe-ia a mão… (linha 12)

d) Tomara-o uma timidez… (linha 16)

e) …via-o já, bochechudo e vestido de campo… (linhas 19-20)

f) …a tratá-lo por tu, afectando intimidades com ela…. (linhas 20-21)

1.1. Indica o referente retomado pelos pronomes sublinhados.

1.2. Reescreve as frases b), c), e) e f) substituindo o pronome pelo nome que retoma.

2. Atenta nas expressões seguintes.a) Vamos para o Nunes, que se come melhor!b) Ainda que ela o não reconhecesse….c) Mas havia duas semanas que ele não avistava certa figura…d) Se ela lá estivesse, decerto viria jantar à sala.

2.1. Identifica o conector utilizado em cada uma das frases, indicando o seu valor lógico.

2.2. Refaz as frases, substituindo o articulador por outro de valor equivalente.

Escrita

1. “Cruges não respondeu, mudo, enlevado, recebendo como uma impressão religiosa detodo aquele esplendor”. Também tu já ficaste, com certeza, boquiaberto perante umapaisagem/espaço/lugar….1.1. Relata esse momento, num texto narrativo coeso e coerente, com cerca de 200/250 palavras,

seguindo as indicações.– localização do acontecimento no tempo e no espaço;– identificação e caracterização das personagens intervenientes;– identificação e descrição do espaço/lugar/paisagem…;– acontecimentos vividos…;– (…)

Descrição

arvoredo

serra

água

| MÓDULO | 8 || PARA DESENVOLVER |

Leitura

1. O poema a seguir apresentado dá conta de uma realidade citadina nocturna. Lê-o aten-tamente antes de resolveres as actividades apresentadas.

IINoite fechada

Toca-se às grades, nas cadeias. SomQue mortifica e deixa umas loucuras mansas!O aljube, em que hoje estão velhinhas e crianças,Bem raramente encerra uma mulher de «dom»!

E eu desconfio, até, de um aneurismaTão mórbido me sinto, ao acender das luzes;À vista das prisões, da velha Sé, das cruzes,Chora-me o coração que se enche e que se abisma.

A espaços, iluminam-se os andares,E as tascas, os cafés, as tendas, os estancos;Alastram em lençol os seus reflexos brancos;E a Lua lembra o circo e os jogos malabares.

Duas igrejas, num saudoso largo,Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero:Nelas esfumo um ermo inquisidor severo,Assim que pela História eu me aventuro e alargo.

Na parte que abateu no terremoto,Muram-me as construções rectas, iguais, crescidas;Afrontam-me, no resto, as íngremes subidas,E os sinos dum tanger monástico e devoto.

Mas, num recinto público e vulgar,Com bancos de namoro e exíguas pimenteiras,Brônzeo, monumental, de proporções guerreiras,Um épico doutrora ascende, num pilar!

E eu sonho o Cólera, imagino a Febre,Nesta acumulação de corpos enfezados;Sombrios e espectrais recolhem os soldados;Inflama-se um palácio em face de um casebre.

Partem patrulhas de cavalariaDos arcos dos quartéis que foram já conventos;Idade Média! A pé, outras, a passos lentos, Derramam-se por toda a capital, que esfria.

Triste cidade! Eu temo que me avivesUma paixão defunta! Aos lampiões distantes,Enlutam-me, alvejando, as tuas elegantes,Curvadas a sorrir às montras dos ourives.

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E mais: as costureiras, as floristasDescem dos magasins, causam-me sobressaltos;Custa-lhes a elevar os seus pescoços altosE muitas delas são comparsas ou coristas.

E eu, de luneta de uma lente só,Eu acho sempre assunto a quadros revoltados;Entro na brasserie; às mesas de emigrados,Ao riso e à crua luz joga-se o dominó.

2. O texto centra-se num tempo e num espaço específicos.2.1. Comprova a afirmação anterior com três indicadores temporais. 2.2. Apresenta dois elementos textuais relativos ao espaço retratado.

3. O olhar do sujeito poético detém-se em determinadas realidades espaciais.3.1. Enumera-as.3.2. Explica a metáfora utilizada no verso “Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero”.

4. Certos acontecimentos histórico-culturais são evocados.4.1. Identifica-os.4.2. Justifica a sua inserção nesta passagem.

5. A oposição ricos/pobres surge, de novo, num determinado segmento textual.5.1. Transcreve-o.5.2. Destaca o carácter doentio que se faz sentir no espaço citadino.

6. Ao longo do texto são referidos diferentes tipos sociais.6.1. Procede ao seu levantamento.6.2. Caracteriza-os.

Escrita

1. O olhar do sujeito poético detém-se frequentemente nos mais desfavorecidos. Tratan -do-se de uma realidade intemporal, propõe-se que desenvolvas uma ou todas as acti-vidades de expressão escrita a seguir apresentadas.

A. Prepara uma entrevista ao primeiro-ministro, no sentido de satisfazeres a tua cu-riosidade no que diz respeito às medidas governamentais relativas:– à criação de emprego;– aos apoios sociais;– à educação;– à saúde.

B. Escreve um texto de opinião, de 150 a 200 palavras, acompanhado do respectivoplano textual, que reflicta a tua opinião pessoal relativamente ao aumento da po-breza e ao surgimento de novos pobres.

C. Prepara a escrita de um texto dramático, em que os intervenientes sejam o sujeitopoético, um pároco, uma velhinha, uma criança, uma modista, uma florista e umacomparsa, obedecendo aos seguintes requisitos:– o sujeito da enunciação inicia e fecha o diálogo;– cada interveniente tem dois turnos de fala;– o texto deve apresentar didascálias;– o número de palavras não deverá exceder as quatrocentos palavras;– o produto final deve ser dramatizado e gravado para posterior avaliação da oralidade.

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