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8º Encontro da ABCP
1 a 4/08/2012, Gramado, RS
Área Temática: Ensino e Pesquisa em Ciência Política e Relações Internacionais
Para além dos conceitos: pensando práticas e métodos de ensino de Ciência Política no Ensino Médio.
Alexander Soares Magalhães ([email protected])
Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca / RJ
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Para além dos conceitos: pensando práticas e métodos de ensino de Ciência Política no Ensino Médio
Alexander Soares Magalhães1
Resumo: O trabalho tem como objetivo refletir sobre o ensino de Ciência
Política no Ensino Médio, pensando questões que vão além da discussão de
conceitos consagrados no escopo da disciplina. Para tal, são discutidos
práticas e métodos que, através da prática docente, se mostraram adequados
para este nível de ensino. Defende-se no trabalho que, diante do desafio de
refletir com alunos de ensino médio sobre a política, um tema que no
imaginário popular do jovem, remete a corrupção e descaso – a escolha de
formas atrativas de abordagem é decisiva para a que aprendizagem dos alunos
atinja os níveis desejados. Os dados para a pesquisa foram gerados a partir da
construção de um diário de atividades e entrevistas qualitativas com
determinados alunos, de diferentes aproveitamentos acadêmicos. O período da
pesquisa compreende os anos letivos de 2009, 2010 e 2011.
Palavras chave: Ensino médio, Ciência Política, Escola.
Introdução
Este trabalho é fruto da atuação do autor como docente no CEFET-RJ,
no período compreendido entre os anos letivos de 2009 e 2011, trabalhando
com diferentes turmas e programas, conteúdos do campo de saber da Ciência
Política inseridos na disciplina Sociologia, regular nas três séries desde 2010
na escola supracitada. Desde o seu início, tive a preocupação de perceber,
avaliar e trabalhar com os saberes da Ciência Política em sala de aula.
Institucionalmente, o caminho da Ciência Política no Ensino Médio
começa a ser pavimentado a partir da promulgação dos Parâmetros
1 Professor de Sociologia do CEFET-RJ, Uned Nova Iguaçu. Doutorando em Ciências Sociais
pela UERJ. Mestre em Ciência Política pela UFF. Bacharel e licenciado em Ciências Sociais pela UFF.
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Curriculares Nacionais, em 2000, onde na seção “Conhecimentos de
Sociologia, Antropologia e Política”, integrante da parte das “Ciências Humanas
e suas Tecnologias”, era previsto que se trabalhasse com conceitos próprios da
Ciência Política. Todavia, na prática, esse espaço ainda era diminuto, já que
não havia a obrigatoriedade da disciplina Sociologia no Ensino Médio. Esta
trajetória ganha outro rumo quando, em 2 de junho de 2008, o então presidente
da república em exercício, José Alencar, sancionou a lei de nº 11684, que
alterava a LDB2, tornando obrigatória à inclusão da Filosofia e da Sociologia
como disciplinas obrigatoriamente presente em todas as séries do ensino
médio. Consideramos este o marco principal que efetivamente cria condições
para que a Ciência Política seja uma área de conhecimento que possa
reivindicar seu espaço dentre os assuntos trabalhados no Ensino Médio.
O Ensino Médio e seus objetivos institucionais
O objetivo desta seção é fazer um breve panorama do Ensino Médio no
Brasil, refletindo sobre seus objetivos e necessidades básicas e conjugar estas
reflexões com o ensino de Ciência Política nesta modalidade da educação
básica. O público do Ensino Médio no Brasil é bastante heterogêneo e
multifacetado. Segundo dados do INEP3, no ano de 2009 foram matriculados
em todo o Brasil, 9.831.664 de estudantes no Ensino Médio. Obviamente,
dentro deste universo de alunos, existem inúmeras realidades
socioeconômicas distintas entre si. Desta forma, é impossível construir uma
proposta única curricular ou programática de qualquer área de conhecimento.
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais, a:
(...) formação do aluno deve ter como alvo principal a aquisição de conhecimentos básicos, a preparação científica e a capacidade de utilizar as diferentes tecnologias relativas às áreas de atuação. Propõe-se, no nível do Ensino Médio, a formação geral, em oposição à formação específica; o desenvolvimento
2 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
3 Disponível em http://www.inep.gov.br/basica/censo/Escolar/Sinopse/sinopse.asp
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de capacidades de pesquisar, buscar informações, analisá-las e selecioná-las; a capacidade de aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício de memorização (MEC, 2000).
Desta forma, oficialmente deseja-se que o Ensino Médio seja a etapa
da educação que os alunos devem ter acesso as diferentes teorias científicas,
assim como a começar a ter a capacidade de desenvolver suas próprias
concepções acerca do mundo e da sociedade.
Sendo a etapa final da educação básica, nos parece que o Ensino
Médio ainda carece de uma definição mais clara de seus objetivos e de um
diálogo mais próximo com as demandas educativas dos jovens. Com a marca
histórica de ser um nível de ensino seletivo, no sentido em que é ainda é muito
pautado pelos vestibulares, e apenas nos últimos anos conseguiu ampliar sua
cobertura tornando-se mais acessível à população como um todo, intento que
foi mais claramente alcançado após a implementação da LDB, em dezembro
de 1996. Ainda restam dúvidas se ele está próximo de seu objetivo de ser
universalizado
Há pouca visibilidade e discussão pública sobre as reais funções do
Ensino Médio, tanto na mídia, quanto nos governos em seus diferentes níveis.
E mesmo nas próprias escolas, que se depara com uma política educacional
que tende a reproduzir, no Ensino Médio, o modelo do Ensino Fundamental.
Mas me pergunto se ele consiste apenas na continuidade do Ensino
Fundamental, ou deve ser organizado a partir de objetivos específicos que
considerem as necessidades educativas de seu público? O Ensino Médio deve
preparar os alunos para a vida adulta, para a universidade, para o mercado de
trabalho ou apenas para o exercício pleno da cidadania? São perguntas que
ainda seguem sem respostas de consenso dos principais agentes sociais
envolvidos nesta discussão, inclusive os docentes, que em muitos casos não
tem o preparo necessário para desempenhar suas funções com a qualidade
que seria desejável, fato que também envolve as Faculdades de Educação de
todo o país. Como se vê, é neste contexto complexo e desafiador que o ensino
de Ciência Política, como componente da disciplina Sociologia se insere e
pretende reivindicar seu espaço, ainda que modesto.
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Pressupostos teóricos
O objetivo desta seção é apresentar o ponto de partida teórico da qual
partem minhas ações. Contudo, não parto especificamente de nenhuma escola
teórica específica das teorias sobre ensino e aprendizagem em voga nas
Faculdades de Educação. Desta forma, oriento minha prática pedagógica em
uma ideia simples, mesmo que esta simplicidade abra margem para críticas:
como educador de ensino médio, penso ser um facilitador entre as teorias (no
caso políticas) e o aluno, buscando traduzi-las para seu mundo sem perder a
profundidade das mesmas.
Obviamente, não penso que possa ser isento nesta tarefa, uma vez que
até mesmo na seleção dos temas e autores que utilizo e excluo uso minhas
preferências e julgamentos do que seja mais adequado para ser trabalhado.
Embora não exista um currículo obrigatório, não há liberdade absoluta de
temas.
Do ponto de vista oficial, ou seja, as recomendações que são feitas pelo
MEC através dos PCNs4, podemos perceber que existem alguns conteúdos
específicos da Ciência Política que devem ser ensinados. O trecho abaixo
reproduz estes conteúdos e sugestões de como eles devem ser trabalhados:
(...) Outro objetivo é ampliar a concepção de política, entendida como algo também presente no cotidiano, e permitir uma reflexão sobre as relações de poder, que estruturam o contexto social brasileiro atual. Ampliar a noção de política, enquanto um processo de tomada de decisões sobre os problemas sociais que afetam a coletividade permite ao aluno, por um lado, perceber como o poder se evidencia também nas relações sociais cotidianas e nos vários grupos sociais com os quais ele próprio se depara: a escola, a família, a fábrica etc.. E por outro, dimensionar o erro de assumir uma postura que negue a política enquanto uma prática socialmente válida, uma vez que no discurso do senso comum ela é vista apenas como mera enganação. Até mesmo porque negar a política seria contrariar a lógica da cidadania, que supõe a participação nos diversos espaços da sociedade. Neste aspecto, as Ciências Sociais contribuem para uma reflexão que tenta identificar práticas políticas mais éticas, muito embora o contexto brasileiro seja profundamente marcado por práticas paternalistas, clientelísticas, fisiológicas etc. O estudo do conceito de
4 Parâmetros Curriculares Nacionais
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Estado deve considerar que o homem é um ser histórico e cultural, que está sempre ligado a uma determinada ordem normativa e política. Dentro do campo do Direito, da Política e da própria Economia, o conceito de Estado aparece enquanto uma instância que, ao mesmo tempo, racionaliza a distribuição do poder legítimo dentro de uma nação e desenvolve sistemas econômicos complexos para distribuir bens, muitas vezes de maneira desigual (MEC, 2000).
Percebe-se que os conceitos centrais de Ciência Política a serem
trabalhados, segundo a visão dos PCNs são política e Estado. Estes conceitos
devem ser trabalhados de forma histórica e situados na realidade brasileira,
sem negar as várias formas negativas que eles se manifestam na sociedade
brasileira.
Todavia, um dos objetivos, imagina-se, é justamente contribuir para
que esta visão negativa de senso comum seja superada em favor de uma visão
mais complexa e conectada com o conceito de cidadania, que por sua vez é
uma ideia central em toda a “missão” da qual o próprio Ensino Médio possui, na
medida em que uma de seus objetivos seria justamente a promoção de
condições intelectuais e objetivas para que o aluno possa exercer sua
cidadania.
Parte-se da ideia que a melhor forma de construir um programa que dê
conta da pluralidade de temas e correntes dentre as possíveis abordagens da
Ciência Política no ensino médio, tentando não privilegiar determinada corrente
teórica, tendo como argumento a reflexão de Weber em A Ciência como
vocação e sua ideia de objetividade do professor. Uma das discussões
preliminares que se costuma fazer ao pensar na questão sobre o que deve ser
trabalhado em um programa de Ciências Sociais, e também particularmente de
Ciência Política é sobre a escolha de que temas devem ser trabalhados, tendo
como parâmetros o tempo disponível (geralmente menor que o desejado) e a
própria familiaridade do profissional com as diferentes temáticas. Desta forma,
entende-se que a forma mais adequada de elaboração de uma programação
deve obedecer a dois critérios básicos: primeiramente garantir que o educando
tenha acesso aos conteúdos básicos da disciplina, entendendo que isso é um
direito do aluno, e, portanto ponto inegociável. O segundo critério é informar ao
aluno que existem diferentes formas de se pensar sobre as mesmas questões
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– em suma, divergências teóricas – esclarecer que do ponto de vista científico
não existem critérios definidos para que se possa escolher uma “verdade”
única, e que as várias formas de reflexões sobre os temas são meramente
versões sobre a realidade.
Várias tendências pedagógicas têm defendido a presença dos “saberes
da prática” como fonte orientadora das propostas político-pedagógicas vigente
em variados contextos educacional. Grosso modo, podemos identificar duas
características básicas desta concepção: a defesa dos “saberes da prática”
como centrais para a formação pedagógica dos professores e a adoção destes
como referenciais de conteúdo a serem ensinados aos educandos. Como
consequência, os conhecimentos teóricos e científicos, fundamentais para o
desenvolvimento humano e corresponsável pelos avanços do progresso
material que desfrutamos, são relegados ao segundo plano. Dentre a defesa
dos saberes da prática como centro da reflexão, argumenta-se, por exemplo,
que os que os conteúdos teóricos apreendidos na universidade, tanto das
disciplinas específicas quanto das licenciaturas, não são, na prática, nem os
conteúdos ensinados, nem os conteúdos aplicados pedagogicamente, o que
implicaria em um distanciamento entre a teoria e a prática. Como consequência
disso, estaria o professor produzindo um saber escolar - próprio do âmbito da
sala de aula, construído com os alunos – e produzindo um saber pedagógico,
que leva em conta as situações contextuais e que opera com saberes
diferentes daqueles produzidos no âmbito da academia. Ora, mas não seria o
professor exatamente o responsável por realizar esta mediação entre o
conhecimento científico e a realidade escolar?
Neste sentido:
Evidentemente o papel de mediação exercido
em torno da análise dos conteúdos exclui a não-
diretividade como forma de orientação do trabalho
escolar, porque o diálogo adulto-aluno é desigual. O
adulto tem mais experiência acerca das realidades
sociais, dispõe de uma formação (ao menos deve dispor)
para ensinar, possui conhecimentos e a ele cabe fazer a
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análise dos conteúdos em confronto com as realidades
sociais (LIBANEO, 2006: 33).
Assim, o papel de mediador defendido aqui não exclui a ideia que o
professor deve exercer seu papel de ser a autoridade em sala, tanto do ponto
de vista intelectual, quanto do ponto de vista prático. Desta forma, defende-se
neste trabalho que os saberes da prática podem ter um papel importante na
contextualização dos conhecimentos a serem trabalhados, mas não podem ser
o centro da reflexão a ser feita em sala de aula. Ao trabalhar os conteúdos
como o eixo central da reflexão e do próprio trabalho em sala de aula, garante-
se que os alunos terão acesso a necessária teia de conhecimentos produzidos
dentro dos rigores específicos da metodologia científica. Assim, concordamos
com Libâneo, que afirma:
A difusão de conteúdos é a tarefa primordial.
Não conteúdos abstratos, mas vivos, concretos e,
portanto, indissociáveis das realidades sociais. A
valorização da escola como instrumento de apropriação
do saber é o melhor serviço que se presta aos interesses
populares, já que a própria escola pode contribuir para
eliminar a seletividade social e torná-la democrática. Se a
escola é parte integrante do todo social, agir dentro dela
é também agir no rumo da transformação da sociedade.
Se o que define uma pedagogia crítica é a consciência de
seus condicionantes histórico-sociais, a função da
pedagogia "dos conteúdos" é dar um passo à frente no
papel transformador da escola, mas a partir das
condições existentes (ibidem: 29).
Deste modo, reforça-se a valorização da escola como instrumento de
apropriação do saber teórico-científico, mas não de forma estanque e
descolado da rica dinâmica na qual é produzido, fato que torna necessária a
ação do professor de demonstrar que a própria pluralidade na qual são
produzidos estes saberes são mediadas por relações sociais envoltas da
prática política.
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A abordagem como chave do processo de aprendizagem
Defende-se que o ensino de Ciência Política deve apresentar
explicitamente aos alunos as diferentes concepções teórico-metodológicas que
o constituem, permitindo aos alunos a identificação destas correntes através de
diferentes autores e temas conceituais, garantindo assim liberdade de escolha
de identificação por parte dos educandos desta ou aquela corrente teórica.
Deve-se também apresentar um caráter histórico-crítico destas correntes, afim
de que os alunos possam compreender que estes são ligados à dinâmica
sociopolítica presente na experiência humana.
Os dados da pesquisa demonstram que uma das chaves do sucesso
do trabalho é abordagem escolhida, de modo que ela provoque alguma reação
ao aluno. Neste sentido, as atividades5 que fujam do padrão normal de aulas
expositivas, no mínimo enquanto uma problematização inicial demonstrou que
os alunos revelavam mais interesse em discutir o assunto e seus resultados em
notas também foram superiores.
Debates com convidados como lideranças políticas locais e exibição
comentada de filmes de sucesso comercial como V de vingança e O bem
amado produziram debates interessantes sobre temas como engajamento
político, corrupção e patrimonialismo. Não raro aparecerem nos relatórios de
atividades dos alunos expressões como “nunca tinha visto esta questão desse
jeito”
Uma atividade notável que fizemos foi uma visita com alunos do 3º ano
ao Congresso Nacional em Brasília no ano de 20106. A visita mobilizou
bastante os alunos envolvidos, que produziram ótimos relatórios da viagem e
alguns escreveram artigos de boa qualidade. Esta atividade deu a oportunidade
de que os alunos tivessem contato com importantes figuras da vida política
brasileira e conhecerem in loco o ambiente onde algumas das mais importantes
decisões que afetam a vida do país são tomadas.
5 Obviamente fatores como disponibilidade de recursos físicos, didáticos e até financeiros são
condicionantes importantes para a realização destas atividades. 6 Não teria como deixar de agradecer a meu colega Thiago Esteves que organizou comigo esta visita, e
ao CEFET-RJ, que viabilizou a viagem de mais de 60 alunos de Nova Iguaçu (RJ) à capital federal.
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Pesquisa com alunos
Para tentar verificar se a visão dos alunos acerca da política tinha sido
transformada ao longo do Ensino Médio, pedi a um aluno que aplicasse um
pequeno questionário com alunos concluintes (alunos da 3ª série), sem que o
mesmo revelasse que era uma pesquisa do professor deles, para que suas
respostas não fossem influenciadas por esse fato. Obviamente outros fatores
de influência não puderam ser controlados por mim.
Foram entrevistados 17 alunos concluintes de dois anos letivos distintos.
A idade média dos mesmos é de 18 anos, sendo 9 mulheres e 8 homens, todos
moradores do Grande Rio de Janeiro7. Evidentemente esta amostra não pode
servir como base para qualquer generalização, mas penso que ela indica
algumas questões interessantes para serem analisadas, que podem antecipar
algumas tendências específicas de jovens da região. Outro material importante,
e que serve de complemento, são os relatórios de atividades que os alunos
produziram ao longo da pesquisa, além de algumas entrevistas não
estruturadas feitas por mim com alguns alunos, de todas as séries do Ensino
Médio.
A seguir, nos gráficos 1 e 2, perguntas que visam medir como o Ensino
Médio (no qual o ensino da Ciência Política dentro da disciplina Sociologia está
inserido) impacta na visão dos alunos sobre a política em geral:
Gráfico 1
7 As perguntas encontram-se no anexo 1 deste trabalho.
Votar faz diferença
sim
não
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Gráfico 2
Estas duas questões nos demonstram que dentre o universo
pesquisado, temos uma visão geral otimista dos jovens formandos acerca da
política, de um ponto de vista mais geral. Todavia, os resultados devem ser
parcialmente relativizados, uma vez que o grupo de alunos não foi escolhido
com qualquer critério técnico para representar uma população específica.
Os relatórios e entrevistas qualitativas reafirmam as tendências
demonstradas, na medida em que lemas como a favor de não participação de
eleições ou apoio ao voto nulo são pouco citados. A questão de modificação de
visão pelas aulas não pode ser explorada por estes outros meios, uma vez que
a minha mediação influenciaria a opinião dos alunos e por isso decidi não
abordar diretamente esta questão nas entrevistas e relatórios.
Acredita que as aulas modificaram a visão da
política
sim
não
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Gráfico 3
O gráfico 3 mostra algumas questões mais específicas acerca da
percepção dos alunos sobre a temática. Destaque para a baixa confiança nos
políticos, que é recorrente em todos os públicos e amostras que tive contato
em qualquer pesquisa de opinião sobre o assunto. Em geral, alguns relatos de
alunos marcam o oportunismo dos políticos, seja próxima ou distante, a falta de
confiança nos mecanismos de controle de conduta e ação destes agentes
políticos e até mesmo no sistema político institucional como um todo. Neste
sentido, a percepção que tenho é que a escola não consegue (não estou certo
se deveria fazê-lo) modificar esta pesada imagem que é construída da política
institucional. Nem mesmo o grupo que foi visitar o Congresso teve alguma
percepção diferenciada no que diz respeito a esse ponto.
O destaque positivo, que também aparece no relatório dos alunos, é a
importância – ou reconhecimento – que se dá a questão da cidadania. O
próprio conceito de cidadania é sempre complexo de ser trabalhado, uma vez
que se trata de uma palavra muito utilizada nos meios de comunicação, sob
contextos e significados diversos. Ao elegê-la como tema central, tenho a
preocupação de apresentar conceituações distintas entre si e tomá-la como um
dos eixos fundamentais da discussão sobre a política, até para afirmar que a
0
1
2
3
4
5
6
7
8
Principal atividade é o
voto
Cidadania é um tema que me interessa no
dia a dia
Não vejo diferença entre
os políticos
Acho que o envolvimento
na políticaserve mais para fins pessoais que
para fins coletivos
Discorda muito
Discorda um pouco
Não concorda nem discorda
Concorda pouco
Concorda muito
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atividade política e cidadão tem a mesma significação semântica8. Ao
problematizar com uma abordagem próxima do cotidiano dos alunos, o tema da
cidadania ganha corpo e a discussão torna-se mais profícua, o que é
especialmente pontuado nos relatórios dos alunos.
A questão sobre o envolvimento na política para fins pessoais ou
coletivos mostrou um grande equilíbrio. Analisando-a com mais acuidade,
penso que ela reflete tanto a desconfiança sobre os agentes políticos, mas em
parte revela que os alunos creem em uma margem de transformação da
sociedade pela política, mesmo que de forma parcial.
Observando esta pesquisa sob perspectiva, posso relatar que,
cotidianamente, o ensino de Ciência Política mobiliza mais alguns alunos que
outros (acredito que isso ocorra com a maioria das disciplinas), e certamente
isso tem impacto decisivo no trabalho como um todo. É preciso salientar mais
uma vez que a conjuntura política também mostra certa influência na
mobilização dos alunos para com o assunto: em época eleitoral ou de
escândalos na política (fato que, infelizmente torna-se corriqueiro) costuma
motivar mais os alunos para a discussão.
Considerações finais
A guisa de conclusão do trabalho farei um breve resumo das
principais questões que foram levantadas aqui. Partindo de um universo de
trabalho complexo, heterogêneo e multifacetado, que é o Ensino Médio,
situamos o local do ensino de Ciência Política. Dentre algumas abordagens,
afirmou-se que o sucesso da ênfase da política do cotidiano e local, que além
de trazer a dinâmica da política para perto do aluno, os auxilia a compreender
melhor o fenômeno complexo da política.
Defende-se que, a despeito da influência que concepções
pedagógicas defensoras dos “saberes da prática” possuem nas escolas e na
academia, o ensino focado nos conhecimentos teóricos e científicos é mais
adequado no que diz respeito em possibilitar que os alunos tenham melhores
condições de produzir conhecimentos críticos e autônomos sobre a realidade
8 Como é sabido, pólis palavra grega e a palavra latina civitas possuem o mesmo significado:
cidade. Entre outros estudos, cf. SARTORI, 1994.
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sociopolítica em que estão inseridos, através das ferramentas teóricas e
conceituais da Ciência Política.
Neste contexto, afirmo que o professor funciona como um mediador
entre estes conhecimentos produzidos no âmbito da academia e dos centros
de pesquisa e a linguagem e realidade específicas da escola básica. Como
palavras finais, reafirmamos a importância que o ensino dos conhecimentos da
Ciência Política tem para que o Ensino Médio seja uma etapa da educação em
que o aluno tenha realmente acesso a ferramentas teóricas adequadas para
construir concepções próprias e originais sobre a sociedade na qual ele está
inserido e refletir sobre as relações de poder que permeiam a ação humana.
Saliento novamente que não de pode cair no engano que apenas o
ensino de Ciência Política tem a capacidade ou a obrigação de dotar o aluno
dos conhecimentos políticos básicos para que ele possa exercer plenamente
sua cidadania. Desta forma, os resultados de nossas entrevistas indicam que o
Ensino Médio enquanto etapa da formação escolar é capaz de modificar a
visão do aluno acerca da política. Mais uma vez, é necessário afirmar que o
processo educacional como um todo, incluído aí o papel da família e das
demais instituições sociais é que deve ser responsável pela formação política
(em um sentido de ser um cidadão pleno) dos jovens. De toda forma, as
contribuições da Ciência Política, embora modestas, são importantes para o
intento árduo e necessário da consolidação da cidadania para todos em um
ambiente de consolidação democrática, que se configura com um dos grandes
desafios das próximas décadas possa ser alcançado.
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Referências bibliográficas
LIBÂNEO, José. Democratização da escola pública: A pedagogia crítico-social
dos conteúdos. São Paulo: Loyola, 2006.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Parâmetros curriculares nacionais: ensino
médio. 2000a.
________________________. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino
Médio. Parte IV Ciências Humanas e suas Tecnologias. 2000b.
SARTORI, Giovanni. A teoria da democracia revisitada – v. 1: o debate
contemporâneo. São Paulo: Ática, 1994.
WEBER, Max. A ciência como vocação In Ciência e política: duas vocações.
São Paulo: Martin Claret, 2002.
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Anexo 1
Questionário Ensino de Ciência Política
Instruções: Responda as questões sem consultas a qualquer material,
seja ele didático ou eletrônico.
1)Você acredita que o votar em nosso contexto político faz diferença?
2) Você acredita que as aulas do Ensino Médio modificaram sua visão acerca
da política?
3) Numa escala de 1 a 5, em que 1 significa discorda muito e 5 concorda muito,
você concordaria com as frases:
a) “A principal atividade política das pessoas é o voto”.
b) “Cidadania é um tema que me interessa no dia-a-dia”.
c) ”Não vejo diferença entre os políticos”.
d) “Não vejo diferença entre os partidos políticos”.
e) “Acho que o envolvimento na política serve mais para fins pessoais do que
para fins coletivos”.
Obrigado pela participação!
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Anexo 2
Fotos de atividades com alunos
Alunos com a deputada Andréia Zito (RJ) no salão verde da Câmara de Deputados.
Alunos em atividade especial em uma sala de comissões, na Câmara dos Deputados.